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https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47885/a-im-prescritibilidade-do-
crime-de-tortura
INTRODUÇÃO
Tortura é um tema polêmico, desta maneira resolveu-se expor um breve estudo
crítico sobre a prescritibilidade ou imprescritibilidade do crime de tortura.
Após a segunda grande guerra, nasce um movimento mundial de repúdio à
tortura. A tortura ganhou força como método de adquirir provas se perpetuando como
forma de exercício de uma hierarquia, sempre pautada pela demonstração da força. Por
ferir bens como a liberdade e a dignidade do indivíduo, a tortura é um dos crimes mais
repudiados pela sociedade. Foram criados vários tratados, alguns ratificados pelo
Brasil (convenção contra a tortura ou tratamentos cruéis; convenção interamericana
para prevenir e punir a tortura; estatuto de Roma).
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, III, proíbe qualquer tratamento
desumano, cruel ou degradante e protege a integridade física e moral da pessoa
humana como direito fundamental de primeira geração, nos termos do artigo 60, §4º,
IV, da Constituição Federal. Mas a principal indagação hodiernamente sobre tortura é
se esta no rol de crimes imprescritíveis.
JURÍDICO BRASILEIRO
Historicamente, a tortura se apresentou como um instrumento para obtenção de
prova por meio de confissões. No Brasil o golpe militar de 1964 se utilizou
constantemente da prática da tortura como meio de obtenção dessas confissões de
crimes e em busca de informações relevantes para segurança nacional.
Hodiernamente, os atos praticados por meio da tortura ganharam a rejeição do
mundo civilizado, principalmente após a segunda guerra mundial. Com isso,
desencadeou o nascimento de vários instrumentos internacionais que proibiam a
tortura.
A tortura é crime que fere a dignidade da pessoa humana sendo equiparada a
crime hediondo pela Constituição Federal em seu art. 5º, XLIII. O primeiro dispositivo
legal que tipificou a tortura como crime no ordenamento jurídico brasileiro foi o art. 233
do Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 8.069/90, vejamos: “Submeter criança
ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a tortura”.
O artigo supracitado foi amplamente questionado, pois o tipo penal em questão
consagrava um tipo penal aberto, não definindo expressamente o que vinha a ser tortura,
como também, não indicava os meios de execução do delito.
A lei de tortura não define o que vem a ser tortura, entretanto, a Convenção da
ONU sobre tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes,
em seu art. 1º, vem a conceituar tortura como:
"Qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos, físicos ou
mentais são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de
obter, dela ou de terceira pessoa, informações ou confissões; de
castigá-la por ato que ela ou uma terceira pessoa tenha
cometido, ou seja suspeita de ter cometido; de intimidar ou
coagir esta pessoa ou outras pessoas; ou por qualquer motivo
baseado em discriminação de qualquer natureza; quando tais
dores ou sofrimentos são infligidos por um funcionário público
ou outra pessoa no exercício de funções públicas, por sua
instigação, ou com seu consentimento ou aquiescência. Não se
considerará como tortura as dores ou sofrimentos que sejam
consequência, inerentes ou decorrentes de sanções legítimas.
A Convenção Interamericana para prevenir e punir a tortura (ratificada pelo Brasil
pelo Decreto 98.386/89) também define tortura, vejamos:
“Art. 2º. - Para os efeitos desta convenção, entender-se-á
por tortura todo ato pelo qual são infligidos intencionalmente a
uma pessoa penas ou sofrimentos físicos ou mentais, com fins
de investigação criminal, como meio de intimidação ou castigo
pessoal, como medida preventiva ou com qualquer outro fim.
Entender-se-á também como tortura a aplicação, sobre uma
pessoa, de métodos tendentes a anular a personalidade da vítima,
ou a diminuir sua capacidade física ou mental, embora não
causem dor física ou angústia psíquica. Não estarão
compreendidos no conceito de tortura as penas ou sofrimentos
físicos ou mentais que sejam unicamente conseqüência de
medidas legais ou inerentes a elas, contato que não incluam a
realização dos atos ou aplicação dos métodos a que se refere
este Artigo”.
Logo após, veio a Lei 9.455/97, a lei da tortura, que revogou o art. 233 do Estatuto
da Criança e do Adolescente, protegendo não somente a criança e o adolescente, mas
também o adulto e o idoso. Vejamos:
“Art. 1º Constitui crime de tortura:
I - constranger alguém com emprego de violência ou
grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:
a) com o fim de obter informação, declaração ou
confissão da vítima ou de terceira pessoa;
b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;
c) em razão de discriminação racial ou religiosa;
II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou
autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a
intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar
castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.
Pena - reclusão, de dois a oito anos.
§ 1º. - Na mesma pena incorre quem submete pessoa
presa ou sujeita a medida de segurança, a sofrimento físico ou
mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou
não resultante de medida legal".
§ 2º Aquele que se omite em face dessas condutas,
quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na pena
de detenção de um a quatro anos”.
Da redação do artigo 1º da Lei 9.455/97 extraem-se as seguintes espécies de
tortura:
- Art. 1º, I, “a” – tortura-prova;
- Art. 1º, I, “b” – tortura-crime;
- Art. 1º, I, “c” – tortura-discriminação;
- Art. 1º, II – tortura-castigo;
- Art. 1º, §1º – tortura própria;
- Art. 1º, §2º – tortura omissão.
As Convenções e Tratados Internacionais (Convenção de Nova York sobre
direitos da criança, a Convenção contra a Tortura, adotada pela Assembléia Geral da
ONU, o Pacto de São José da Costa Rica) definem tortura como crime próprio (somente
pode ser praticado por agente do Estado), mas no Brasil, a Lei 9.455/97, reconhece
crime de tortura praticado por pessoa comum, nos termos do art. 1º supracitado.