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Do Constrangimento Ilegal (art.

146, do
CP)
» Valdinei Cordeiro Coimbra

No Código Penal brasileiro de 1940, o legislador tipificou ou crime de


constrangimento ilegal no seu artigo 146, com a seguinte redação:

Art. 146 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça,


ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a
capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o
que ela não manda:

Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.

Aumento de pena

§ 1º - As penas aplicam-se cumulativamente e em dobro, quando,


para a execução do crime, se reúnem mais de três pessoas, ou há
emprego de armas.

§ 2º - Além das penas cominadas, aplicam-se as


correspondentes à violência.

§ 3º - Não se compreendem na disposição deste artigo:

I - a intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento do


paciente ou de seu representante legal, se justificada por iminente
perigo de vida;

II - a coação exercida para impedir suicídio.

• Objeto Jurídico: proteger a liberdade pessoal (física ou psíquica),


ou seja, a liberdade de autodeterminação.

• Amparo Constitucional: art. 5° todos são iguais perante a lei, sem


distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade nos termos
seguintes: [...], II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de
fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
• Elementos subjetivos do tipo: é o dolo, que consiste na vontade
livre e consciente de constranger a vítima, mediante violência a não
fazer o que a lei permite ou a fazer o que a lei não permite.

• Espécies e formas de violência: 1ª) própria ou física: emprego de


força bruta; 2ª) imprópria: emprego de qualquer outro meio, como
hipnotismo, narcotização, sonífero, embriaguez pelo álcool etc.; 3ª)
moral: emprego de grave ameaça; 4ª) direta ou imediata: contra a
vítima, ex.: amordaçá-la, choques elétricos, fazê-la inalar gás, amarrá-
la; 5ª) indireta ou mediata: sobre coisa ou pessoa vinculada ao
sujeito passivo ex: violência contra o filho do coagido, a fim de que
este se sinta constrangido e realize o comportamento almejado pelo
coator, ou retirar as muletas de um aleijado ou o guia de um cego.

• Vítima constrangida a praticar uma infração penal – se a


violência empregada for irresistível, a vítima não responderá pelo
crime praticado, podendo o autor do constrangimento responder pelo
crime praticado em concurso material com o crime de constrangimento
ilegal.

• Vítima submetida à tortura a fim de praticar crime – A Lei n.


9.455/97 que define os crimes de tortura prevê na alínea “b”, do inc. I
do art. 1°, a tortura crime, com a seguinte redação:

Art. 1°. Constitui crime de tortura: I – Constranger alguém com


emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento
físico ou mental: [...]; b) para provocar ação ou omissão de natureza
criminosa; [..]

Capez[3] e Rogério Greco[4] se manifestam no sentido de que nestes


casos, apesar de se tratar de delito específico, o torturador
responderia pela tortura em concurso material com o crime praticado
pelo coagido.

• Sujeito ativo: qualquer pessoa, em se tratando de funcionário


público e o fato cometido no exercício da função, poderá caracterizar o
delito descrito no art. 350 do CP ou, conforme a hipótese, crime de
abuso de autoridade (Lei n. 4.898/65). [5]

• Sujeito passivo: É indispensável que possua capacidade de


autodeterminação, que significa liberdade de vontade, no sentido de o
cidadão fazer o que bem entenda, desde que não infrinja disposição
legal. No caso de criança ou louco, não há crime quando o fato é
praticado contra eles, desde que a idade e a situação mental não
permitam a liberdade de autodeterminação.
a) Atentar contra a liberdade pessoal dos Presidentes da República,
do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou do Supremo
Tribunal Federal (Lei n. 7.170, de 14-12-1983, art. 28) - Crime contra
a Segurança Nacional.

b) Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741, de 1º-10-2003). O art. 107 do


Estatuto do Idoso pune com pena de reclusão de dois a cinco anos o
fato de quem coage, de qualquer modo, o idoso (pessoa com
idade igual ou superior a 60 anos) a doar, contratar, testar ou
outorgar procuração.

c) Constrangimento ilegal na cobrança de dívida. Ver art. 71 da Lei


n. 8.078, de 11 de setembro de 1990 (crime contra as relações de
consumo).

• Delito subsidiário: somente caracterizar-se-á o constrangimento


ilegal se não for elementar de outro tipo penal, ou seja, ficará
absorvido pelo referido delito ex.: roubo, estupro, extorsão, etc.

• Constrangimento Ilegal x Exercício Arbitrário das Próprias


Razões: É necessário que seja ilegítima a pretensão do sujeito
ativo, i. e., que não tenha direito de exigir da vítima o comportamento
almejado. Tratando-se de pretensão legítima ou supostamente
legítima, há o crime de exercício arbitrário das próprias razões (CP,
art. 345). [6]

• Consumação: Ocorre no momento em que a vítima faz ou deixa de


fazer alguma coisa.

• Tentativa: É admissível[7].

• Aumento de pena (§ 1º)

§ 1º - As penas aplicam-se cumulativamente e em dobro, quando,


para a execução do crime, se reúnem mais de três pessoas (mínimo
4), ou há emprego de armas: (a) próprias: instrumentos destinados a
ataque ou defesa (de fogo, punhais, bombas, facões etc.); b)
impróprias: não são fabricadas com finalidade de ataque ou defesa,
mas têm poder ofensivo (machados, facas de cozinha, tesouras,
navalhas etc.)..

• Norma explicativa (§ 2º): Além das penas cominadas ao autor do


constrangimento ilegal, aplicam-se as correspondentes à violência.
Significa que, se o sujeito pratica constrangimento ilegal ferindo a
vítima, deve responder por dois crimes em concurso material:
constrangimento ilegal e lesão corporal leve, grave ou gravíssima[8].

CAUSAS ESPECIAIS DE EXCLUSÃO DA TIPICIDADE (§ 3º):

• Natureza penal: Trata-se de causas excludentes da tipicidade e não


da antijuridicidade. O Código Penal diz que determinados fatos “não
se compreendem na disposição” que define o constrangimento ilegal.
Se os fatos não se encontram compreendidos na norma penal
incriminadora, são condutas atípicas. Antes de esses comportamentos
serem ilícitos, ocorre a atipicidade, diante da inadequação à norma de
incriminação.

• Intervenção médica ou cirúrgica (I): Mesmo sem o consentimento


da vítima ou de seu representante legal, não há tipicidade do
constrangimento, desde que a intervenção ou a cirurgia seja
determinada por iminente perigo de vida. Trata-se de hipótese de
estado de necessidade de terceiro, capitulado pelo Código Penal
como excludente da tipicidade.

• Impedimento de suicídio (II): Embora não constitua ilícito penal, o


suicídio não deixa de ser conduta antijurídica. Assim, impedir,
mediante violência ou grave ameaça, que uma pessoa pratique ato
antijurídico não pode constituir constrangimento ilegal. Trata-se de
estado de necessidade de terceiro elevado à categoria de causa
excludente da tipicidade.

• Pena – Competência – Ação Penal – Suspensão Condicional do


Processo.

Detenção de 3 meses a 1 (um ano), ou multa – trata-se de crime de


menor potencial ofensivo, alcançado pelo conceito do art. 61 da Lei n.
9.099/95, portanto de competência dos Juizados Especiais Criminais
(inclusive nas hipóteses do § 1º), sendo possível a transação penal e
suspensão do processo. Ação penal é pública incondicionada. Nos
casos de condenação, será possível a substituição da pena de prisão
por restritiva de direitos, desde que preenchidos os requisitos do art.
44 do CP.

• Classificação doutrinária: crime comum (não exige qualidade


especial do sujeito ativo); doloso, material (pois somente se consuma
quando a vítima não faz o que a lei permite ou faz aquilo que ela não
manda); de forma livre, podendo ser praticada comissiva (ação) ou
omissivamente (status de garantidor); instantâneo (resultado
instantâneo que não se prolonga no tempo); subsidiário (só
caracteriza o delito quando não for elementar de outro crime);
monossubjetivo (pode ser praticado por um só agente);
plurissubsistente (via de regra, vários atos integram a conduta); e de
dano (consuma-se apenas com a efetiva lesão a um bem jurídico
tutelado)

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