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3-Questões Étnicas Na Diversidade Escolar o Indígena e A Educação
3-Questões Étnicas Na Diversidade Escolar o Indígena e A Educação
PROPÓSITO
Compreender as especificidades da educação indígena e do ensino da história indígena para
colocar em prática um projeto de educação baseado na garantia da diversidade.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
MÓDULO 2
MÓDULO 3
O fascínio inicial promovido pelos primeiros encontros, contudo, logo foi substituído por conflitos e
violências – físicas e simbólicas – decorrentes do empreendimento colonizador, que visava ao
apoderamento dos territórios recém-invadidos para a exploração dos recursos naturais, utilizando,
inicialmente, a força de trabalho compulsória dos nativos, aos quais atribuíram a denominação
genérica de “índios”.
Desse modo, no Brasil, para efetivar a dominação sobre as terras e os corpos ameríndios, os
colonizadores empregaram diferentes estratégias com o objetivo de reestruturar as formas
culturais – sobretudo da relação com o meio ambiente e com o universo religioso – dos ocupantes
originários da região, ou, em casos de reações contrárias ao projeto colonizador, praticaram
deliberadamente o genocídio.
O processo de intrusão nos territórios indígenas continua, paulatinamente, até os dias atuais, com
o uso de diferentes métodos ao longo do tempo.
MÓDULO 1
Neste módulo, analisaremos o modo com que a escolarização direcionada aos povos indígenas foi
adotada como uma das estratégias para o domínio dessas populações e como foi revertida pelos
índios em dispositivo de resistência.
É necessário distinguir a noção de escolas para índios, ou seja, as instituições criadas desde o
princípio da colonização, mantidas e adaptadas aos projetos assimilacionistas até o final do século
XX, da noção de escolas indígenas, aquelas integradas ao atual projeto de autonomia levado a
cabo pelos povos indígenas.
Com a chegada dos portugueses, implementou-se a instituição escolar desenvolvida por ordens
religiosas, especialmente a Companhia de Jesus, assentada por um projeto educativo que visava
à conversão dos nativos em cristãos e súditos da Coroa portuguesa.
Fonte: Benedito Calixto/Wikimedia
Figura 2. Anchieta e Nóbrega na cabana de Pindabuçu
Proibido de falar a própria língua e obrigado a aprender outra completamente estranha, proibido
de praticar seus próprios valores religiosos, de viver seu cotidiano de trabalho, lazer e interação
social conforme seus próprios costumes e cultura.
Essa dinâmica pode ser pensada como uma síntese de diferentes estratégias de assimilação e,
entre elas, encontravam-se orientações específicas da educação para os índios.
PRIMEIRA FASE
A primeira educação escolar para os índios teve início no período colonial e esteve nas mãos de
missionários, sobretudo dos jesuítas. Fase mais longa entre todas, durou do século XVI até o
início do século XX.
SEGUNDA FASE
Coincidiu com a criação do Serviço de Proteção ao Índio (SPI), em 1910, e se prolongou até a
política de ensino da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e a articulação com missões religiosas
como a Summer Institute of Linguistics (SIL).
TERCEIRA FASE
Entre o final da década de 1960 e a década seguinte, período em que surgiram as organizações
não governamentais, como o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), a Comissão Pró-Índio
(CPI), Operação Amazônia Nativa (OPAN) e o Centro de Trabalho Indigenista (CTI), mas
principalmente do movimento indígena.
QUARTA FASE
Última fase, teve início em meados da década de 1980 e foi uma iniciativa dos próprios povos
indígenas, que, de acordo com Benites (2018), passaram a reivindicar a construção e autogestão
da educação escolar indígena formal.
PERÍODO COLONIAL
As primeiras diretrizes elaboradas em prol de uma educação para os índios podem ser
encontradas em uma carta do Padre Manuel da Nóbrega, escrita em 1558, na qual é apresentado
o plano civilizador, que orientava os missionários católicos a impor um novo modo de vida aos
nativos:
Orientada por essas premissas, foram iniciadas as missões de catequese instauradas pela Igreja
Católica, que buscaram um controle incessante das condutas morais dos indígenas, alterando
instituições próprias como o xamanismo e o parentesco.
As famílias nativas de diferentes línguas e culturas foram direcionadas para aldeamentos, espaços
limitados pelos missionários, onde haveriam de trabalhar a terra sob os moldes do
empreendimento português, compelidas pelas circunstâncias – já que, se não aceitassem seriam
dizimadas pelas chamadas “guerras justas” – a despovoar o território de expansão da colonização
portuguesa.
XAMANISMO
Termo antropológico para definir a liderança que acumulava a condução espiritual e políticas
de grupos. Foi visto de forma pejorativa pela etnografia do século XIX, mas ressignificado
pela historiografia no século XX.
PARENTESCO
Modelos sociais também chamados de aldeamentos, clãs, entre outros termos específicos
europeus. É a organização marcada por uma dinâmica de posições familiares e que,
normalmente, valoriza o idoso.
Em decorrência das missões, implementou-se a modalidade escolar que teve como alvo
principal as crianças indígenas. Nessas escolas, vigorou o sistema do internato, durante o qual
as crianças eram isoladas do seu convívio familiar e da sua comunidade, submetidas ao ensino
obrigatório do português e à conversão religiosa.
Para viabilizar a assimilação das crianças indígenas, os jesuítas solicitaram que fossem enviados
para o Brasil alguns órfãos que ficavam sob os cuidados das instituições de caridade mantidas
pela Coroa portuguesa para conviver com os pequenos nativos e facilitar o processo de
implementação da cultura cristã.
Além da alfabetização que visava à catequese continuada, os jesuítas utilizavam outros recursos
didáticos como os cantos e métodos teatrais para encenação de passagens bíblicas, com o
intuito de tocar as almas pelo encanto ou pelo medo.
CANTOS E MÉTODOS TEATRAIS
Fonte: Wikipedia
Figura 4. Retrato do Marques de Pombal
Famoso pela reconstrução de Portugal após o grande terremoto de Lisboa, pela expulsão de
jesuítas. Mas é também um marco na história da educação no Brasil pela criação do modelo
de aulas régias.
O novo projeto tinha como objetivo principal a completa integração dos nativos à sociedade
nacional em termos comportamentais (por intermédio da escolarização) ou fenotípicos (por
meio da miscigenação biológica).
Para efetivação dessa demanda política, foram criadas distintas escolas com atividades
educativas direcionadas para os diferentes gêneros, em forma de colégio para os meninos e de
recolhimento para as meninas.
COLÉGIO
Os meninos recebiam a educação em escolas que tinham como atividades o ensino da leitura e
escrita do português, da matemática e argumentação, além de dedicarem atenção às orações. O
tempo de permanência nos colégios deveria ser o mínimo possível: tão logo aprendessem as
atividades básicas, retiravam-se para dar espaço aos novos alunos. Aqueles que apresentavam
mais aptidão, eram levados à capital para aprenderem alguns ofícios. As visitas aos familiares
eram permitidas nos feriados, contudo, não poderiam se comunicar na língua nativa, sob pena de
castigos físicos, o que dificultava a comunicação com os mais velhos.
RECOLHIMENTO
Eram admitidas as meninas indígenas com idade entre 6 e 12 anos. Nesse período, não podiam
receber nenhuma visita, nem manter contato com o mundo exterior. Além de aprender o português
e as orações, as atividades realizadas visavam ao aprendizado de todos os serviços domésticos
necessários ao bom funcionamento de uma casa aos moldes europeus. Ocupavam-se em
trabalhos de costura, tecelagem e fiação, para a confecção de enxoval. A educação escolar
dirigida às meninas indígenas tinha como objetivo prepará-las para os casamentos com homens
brancos para impulsionar a miscigenação. As propostas de casamentos eram comunicadas ao
governador e ele avaliava a qualidade do pretendente, permitindo ou não a união.
Apesar da expulsão dos jesuítas, outras missões de catequese continuaram a atuar nos
aldeamentos, como a Ordem Menor dos Frades Capuchinhos, e as ordens Salesianas e
Dominicanas. As atribuições dos missionários nas escolas continuavam a ser a catequização,
alfabetização e ensinar a contar.
Fonte: Benedito Calixto/Wikipedia
Figura 5. Fundação de São Vicente
No século XX, a educação escolar para índios foi marcada pela criação do Serviço de Proteção ao
Índio (SPI), em 1910, e se estendeu à política educacional praticada pela Fundação Nacional do
Índio (FUNAI), realizada sob estreita relação com o Summer Institute of Linguistics (SIL) e outras
missões religiosas. A premissa da educação para os índios dessas três instituições continuava a
ser a integração compulsória dos indígenas à sociedade nacional.
As estratégias adotadas pelo SPI para lidar com as diversas populações indígenas eram
acionadas conforme o grau de contato anterior estabelecido com cada uma delas: os índios eram
definidos como mansos (aliados) ou bravos (hostis).
Com base nessa classificação, o procedimento inicial para a intervenção com os índios bravos foi
a chamada pacificação, realizada por meio da doação de recursos, com o intuito de facilitar os
primeiros contatos e atraí-los para as reservas indígenas, iniciando o processo de
sedentarização desses índios e possibilitando o esvaziamento dos territórios antes
ocupados por eles.
A política indigenista instituída pelo SPI era estreitamente amparada pelos ideais positivistas,
segundo os quais as diversas populações humanas eram classificadas de acordo com o que
consideravam ser o seu estado evolutivo.
ESCOLA
Essa escola é bem diferente das atuais escolas indígenas, que também utilizam essas
categorias, tendo em vista seus diversos projetos educativos.
A partir de concepções racistas, julgavam que os europeus estariam no topo da escala evolutiva e,
quanto mais distantes estivessem os outros povos das suas práticas produtivas, formas de
organização política, cosmovisão e traços fenotípicos, mais abaixo estariam localizados na escala
da evolução humana.
De acordo com Rodrigues (2019), tendo em vista as características físicas e, sobretudo, o modo
de vida dos nativos do Brasil, os governantes positivistas concebiam que os indígenas se
encontravam, ainda, no primeiro estágio mental da humanidade. Para eles, os índios estariam
vivendo na fase da infância da civilização.
Com a extinção do SPI e a criação da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), em 1967, a educação
escolar para os índios assumiu uma forte ambiguidade em relação às suas atividades nas aldeias.
Sob responsabilidade da FUNAI, a escolarização indígena apresentou continuidade com os
modelos anteriores, já que manteve, essencialmente, sua estrutura e seu funcionamento com
base nos pressupostos ideológicos que pensavam a escola para índios como instrumento de
assimilação. Adotou-se o mesmo padrão da escola rural, sem levar em conta a diversidade
cultural de cada povo indígena e suas necessidades próprias.
Fonte: FUNAI
Figura 6. Marechal Rondon, fundador do Serviço de Proteção ao Índio
O convênio entre a FUNAI e o SIL apontava, novamente, para a influência missionária nas
aldeias, tendo em vista que esse instituto tem como objetivo estudar as culturas ágrafas para
traduzir a Bíblia nas suas diferentes línguas nativas e, assim, promover a conversão ao
protestantismo dos povos que as falavam.
De 1970 a 1983, o SIL atuou oficialmente na escolarização de 53 povos indígenas do Brasil com o
ensino bilíngue. Apesar de ter deixado de atuar diretamente, a ideologia do SIL continuou
presente nos programas de educação da FUNAI, que publicou os textos produzidos pelo instituto
até 1990.
Luciano (2011) aponta que o tipo de bilinguismo proposto pelo SIL não apresentava nenhuma
relação com a concepção de educação bilíngue reivindicada pelos diversos povos indígenas no
Brasil atualmente, já que visava ao uso instrumental da língua indígena para a promoção das
expectativas tanto dos missionários quanto do Estado, que tinham como base comum o interesse
no domínio dos povos indígenas.
A partir dos debates ocorridos durante os encontros de lideranças indígenas de todo o país, foi
definido que os índios deveriam intensificar suas lutas no sentido de assegurar suas
permanências nos seus territórios tradicionalmente ocupados, além de garantir melhorias na
saúde e, sobretudo, a construção de experiências escolares que respeitassem a diversidade
cultural existente no país.
Em 1991, após intensas reivindicações, a FUNAI deixou de ser responsável pela coordenação das
ações referentes à escolarização indígena, que passou a ser responsabilidade do Ministério da
Educação em cooperação com as secretarias de educação dos estados e municípios.
A escola passou a ser, para os indígenas, o espaço onde empreendem esforços para
reafirmar suas identidades perante a sociedade nacional, além de ser um poderoso instrumento
para a conquista dos meios necessários para o equilíbrio das divisões de poderes existentes nas
relações intersocietárias, e a garantia da autonomia para deliberar sobre suas vidas e a atuação
no cenário político do país.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. NO BRASIL, A EDUCAÇÃO INDÍGENA TEM UMA TRAJETÓRIA HISTÓRICA
PRÓPRIA QUE PODE E DEVE SER PENSADA DE MODO INDEPENDENTE
DAS DEMAIS MODALIDADES DE ENSINO. ESSA ESPECIFICIDADE
COINCIDE COM O PERCURSO DAS RELAÇÕES DE CONTATO INTERÉTNICO
ENTRE OS POVOS INDÍGENAS E NÃO INDÍGENAS, DESDE O PROCESSO
DE COLONIZAÇÃO ATÉ OS DIAS ATUAIS. SOBRE ESSA TRAJETÓRIA,
ASSINALE A ÚNICA ALTERNATIVA INCORRETA:
B) A terceira fase da história da educação indígena aponta para o sucesso das relações, alianças
e parcerias entre os povos indígenas e não indígenas no enfrentamento de uma política
indigenista desfavorável aos povos originários.
C) A trajetória histórica da educação indígena no Brasil costuma ser dividida em quatro diferentes
fases, sendo a primeira e mais extensa correspondente apenas ao período de domínio colonial e,
consequentemente, à dinâmica assimilacionista. Já as fases posteriores coincidem com o contexto
histórico pós-independência.
D) A quarta fase da trajetória histórica da educação indígena pode ser pensada como uma
experiência de ruptura com o projeto assimilacionista, tendo em vista as reivindicações dos povos
indígenas por protagonismo nos processos de elaboração e autogestão da educação escolar
indígena formal.
C) A diferença entre “educação escolar para os índios” e “educação escolar indígena” é de caráter
meramente terminológico e assinala apenas a substituição do termo “índio”, altamente
problemático, pelo termo “indígena”, mais bem aceito.
GABARITO
1. No Brasil, a educação indígena tem uma trajetória histórica própria que pode e deve ser
pensada de modo independente das demais modalidades de ensino. Essa especificidade
coincide com o percurso das relações de contato interétnico entre os povos indígenas e
não indígenas, desde o processo de colonização até os dias atuais. Sobre essa trajetória,
assinale a única alternativa incorreta:
2. A história da educação indígena no Brasil pode ser dividida em duas grandes tendências,
dentro das quais são comumente identificadas quatro fases históricas distintas. Essas
tendências são a da “educação escolar para os índios” e a da “educação escolar indígena”.
A respeito dessa distinção, assinale a alternativa correta:
A alternativa está correta porque assinala a raiz da diferença entre as expressões “educação
escolar para os índios” e “educação escolar indígena”. A diferença consiste em uma profunda
mudança de paradigma, pois se, no primeiro caso, temos um projeto educacional elaborado por
não indígenas e com o propósito de assimilar e dominar os povos indígenas, no segundo caso, a
expressão se refere a projetos educacionais elaborados por povos indígenas e direcionados a eles
com propósitos de soberania, autonomia e autogestão.
MÓDULO 2
PRIMEIRA FASE
Corresponde ao período imediatamente após a Segunda Guerra Mundial, durante o qual a Unesco
reconheceu que a educação e o conhecimento são centrais na construção de estratégias de paz.
Nesse contexto, a ideia de diversidade tinha um sentido ainda restrito às relações entre os
Estados-nação, entendidos como uma unidade de composição cultural homogênea.
SEGUNDA FASE
Ocorreu no mesmo período das guerras anticoloniais na África e na Ásia, com a consequente
emergência de nações independentes. Essas experiências levaram à reformulação do próprio
conceito de cultura, que passou a abranger também a questão da identidade individual e étnico-
racial, em sua reação aos efeitos homogeneizantes característicos da força e da ideologia dos
Estados imperialistas que emergiram com a Guerra Fria.
TERCEIRA FASE
Desenrolou-se quando o conceito de cultura foi associado ao princípio do desenvolvimento, isto é,
quando se reconheceu que a valorização da cultura é uma aliada não apenas dos processos de
paz, mas também do desenvolvimento de melhores índices econômicos.
QUARTA FASE
Tem como característica a correlação entre cultura e democracia, enfatizando a indispensabilidade
do princípio da tolerância, não apenas entre as nações, mas, sobretudo, no interior delas.
DIVERSIDADE NO BRASIL
No Brasil, a discussão sobre diversidade na educação tem um precedente nos movimentos sociais
que emergiram no final da década de 1970, em protestos contra a ditadura civil-militar. Esses
movimentos – negros, feministas, indígenas, LGBQT+, por exemplo – lutavam não só por
igualdade de direitos, mas contra a reprodução de estereótipos e preconceitos que historicamente
justificam e perpetuam a inferiorização e desumanização desses grupos sociais.
Fonte: FUNAI
Figura 9. Imagem do Acervo Histórico da FUNAI
Nas duas décadas seguintes, tanto em função do processo de redemocratização no Brasil quanto
pelas datas simbólicas e altamente controversas do centenário da abolição da escravidão (1988) e
dos 500 anos dos descobrimentos (1992/2000), o tema da diversidade cultural ganhou enorme
destaque.
Especificamente em relação à questão da diversidade cultural, a década de 1970 foi marcada pela
emergência e por grandes mobilizações dos movimentos indígenas que, aliados às organizações
indigenistas – civis ou eclesiásticas – surgidas também naquele período, empreenderam a
elaboração de projetos e reivindicações para ampliação dos direitos para os índios, entre os quais
a garantia dos territórios, da saúde e da escolarização indígena.
Com o fortalecimento dos movimentos indígenas – que passaram cada vez mais a realizar
assembleias e reuniões que visavam à articulação das lideranças indígenas até então isoladas no
cenário político nacional, pautadas no empenho dos índios de manterem suas formas específicas
de viver e pensar, do direito aos seus modos próprios de reprodução, reelaboração e transmissão
dos seus conhecimentos –, a mobilização por uma educação escolar sintonizada com seus
interesses ganhou força nesse novo processo político.
Essas ações foram empreendidas em localidades específicas, ainda de forma incipiente, entre os
povos indígenas com o apoio de seus aliados, ainda sem participação do Estado.
Nesse cenário, os professores indígenas assumiram uma função estratégica para o fortalecimento
e a efetivação do que deve ser assegurado pela Constituição Federal de 1988.
RECOMENDAÇÃO
Ao tratar dos fundamentos gerais para a Educação Escolar Indígena, o RCNE/Indígena ratifica
alguns princípios:
AUTODETERMINAÇÃO
O contato com valores, instituições e procedimentos diferentes dos vivenciados nas aldeias no
contexto atual dão possibilidade para que os povos indígenas possam fazer suas escolhas,
participando da elaboração dos projetos de futuro.
Deve-se entender que cada um desses povos é único, com identidade própria, fundada em sua
história, cosmologia e territórios onde habitam, com costumes e organizações sociais particulares.
Segundo Luciano (2011), a ideia mais aceita entre os professores indígenas sobre a educação
diferenciada é aquela que garante o fortalecimento e a continuidade dos saberes próprios de cada
comunidade indígena, na perspectiva de possibilitar a essas coletividades a reprodução de suas
memórias históricas, a reafirmação de suas identidades étnicas, valorização de suas línguas, a
defesa dos seus territórios e garantia de outros direitos básicos.
Fonte: Wikimedia
Figura 11. Imagem da rotina escolar de indígenas na atualidade
De acordo com a necessidade e vontade de cada povo, deve ser ainda uma educação que
possibilite a complementaridade de conhecimentos científicos e tecnológicos, e o acesso
adequado às informações da sociedade global.
RESISTÊNCIA E RESSIGNIFICAÇÃO
Os povos indígenas têm construído e reelaborado seus mecanismos de resistência. Assim, a
escola pode vir a ser não mais um instrumento de dominação sobre essas populações, mas um
recurso necessário para o domínio dos códigos básicos estruturantes da sociedade não indígena,
o que possibilita a formação da consciência cidadã, vista como um instrumento de sobrevivência,
e a reformulação de estratégias de resistência nos contextos de luta pelos direitos.
A escola indígena revela-se, portanto, como uma necessidade para a vida pós-contato, na qual
pratica-se a luta de poder e visão de mundo. Para a efetivação da educação escolar indígena
diferenciada é necessário que o seu controle esteja sob a responsabilidade da comunidade
indígena e de seus pensadores, sem deixar, contudo, de contar com o apoio dos aliados que
historicamente têm contribuído com as causas indígenas. Tendo em vista os recursos legais
conquistados ao longo dos anos, empreende-se ainda a luta para que o Estado assegure a
autonomia e a efetivação do ensino escolar indígena.
Quando, no entanto, falamos em ensino de história indígena nas escolas, estamos nos referindo à
obrigatoriedade do estudo da história e da cultura afro-brasileira e indígena no currículo dos
ensinos fundamental e médio (público e privado), previsto pela Lei n. 11.645/2008. No caso
específico do ensino de história indígena, podemos pensá-lo como uma resposta à demanda dos
movimentos e das organizações indígenas, especialmente aquela expressa no item 13 da
Declaração de Princípios, que fundamentou a construção da atual Escola Indígena.
SAIBA MAIS
Item 13 do RCNE/indígena - Esse item prevê que “Nas escolas dos não índios será corretamente
tratada e veiculada a história e cultura dos povos indígenas brasileiros a fim de acabar com os
preconceitos e o racismo” (PROEJA, 2007, Anexo I, p. 118).
Outros fatores igualmente perniciosos que precisam ser corrigidos dizem respeito às expectativas
de desaparecimento e aculturação dos povos indígenas. Essas expectativas, ainda que
contrariadas pelas evidências de crescimento das populações indígenas, têm como consequência
a negação de um devir indígena, na medida em que supõem seu desaparecimento inevitável
pela assimilação à sociedade nacional, como se fosse esse o movimento natural da história.
As raízes históricas dessa profecia do desaparecimento dos povos indígenas remonta ao século
XVIII e está associada à ideia de que os povos nativos das Américas representariam a infância da
humanidade, ou o equivalente a um estágio de selvageria a ser superada por força da própria
natureza da razão humana.
O princípio da perfectibilidade humana levantou, nos séculos XVIII e XIX, uma série de polêmicas
acerca do continente e dos povos americanos. Essas polêmicas foram sintetizadas pelo
historiador italiano Antonello Gerbi no livro O Novo Mundo: História de uma polêmica (1750-1900).
Esse livro informa que filósofos e naturalistas europeus como Buffon, David Hume, Francis Bacon,
Immanuel Kant, Cornelius de Pauw, entre outros, desenvolveram uma série de teorias a respeito
do que julgavam ser a inferioridade e imaturidade dos povos nativos das Américas.
Fonte: Wikipedia
Figura 12. Antonello Gerbi em 1939
Essas teorias foram difundidas, no Brasil, por Karl Friedrich Philipp von Martius, pesquisador
responsável pelo projeto sobre como deveria ser escrita a História do Brasil, apresentado e
posteriormente desenvolvido pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), no século XIX.
Martius é também autor do texto O estado do Direito entre os Autochtones do Brazil (1906), no
qual profetiza o desaparecimento dos povos indígenas ao afirmar que “Não há dúvida: o
americano está prestes a desaparecer. Outros povos viverão quando aqueles infelizes do Novo
Mundo já dormirem o sono eterno” (MARTIUS, 1906).
A profecia de Martius foi se atualizando década após década na história do Brasil e ainda ecoa no
imaginário social brasileiro. Contudo, os dados demográficos do IBGE (2011) apontam para uma
direção oposta à da expectativa do desaparecimento dos povos indígenas. O que o censo
realizado em 2010 revela é uma curva ascendente no número total de indígenas no Brasil.
O censo do IBGE também apresenta a grandeza da resistência dos povos indígenas no Brasil.
Afinal, ainda que historicamente submetidos a políticas indigenistas tanto exterminacionistas
quanto assimilacionistas (MUNDURUKU, 2012), os povos indígenas seguem resistindo e lutando
pelo direito à terra, à educação e à saúde indígenas, pelo direito, enfim, de existir na diversidade.
A comunicação entre as culturas indígenas e não indígenas é um caminho necessário que objetiva
romper com o paradigma assimilacionista, que busca garantir a continuidade e o dinamismo da
cultura dos povos indígenas e, ao mesmo tempo, educar a população não indígena para o
convívio relacional e não mais autorreferenciado, como preconizado pelo projeto de formação da
identidade nacional construído no século XIX, que negava aos povos indígenas um devir e
fantasiava para o Brasil um embranquecimento deliberado e paulatino.
Assistiremos a seguir a segunda parte do documentário sobre a questão indígena na diversidade
escolar.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
B) É notório o alinhamento entre a emergência dos movimentos sociais no Brasil das décadas de
1960 e 1970, especialmente o movimento indígena, e a quarta fase do debate sobre diversidade
cultural no âmbito da UNESCO, relacionada à política do reconhecimento não apenas entre
Estados-nação como também no interior desses Estados.
C) Os movimentos sociais, especialmente negros e indígenas, que surgiram nas décadas de 1960
e 1970 tiveram um papel decisivo na formulação de diretrizes para a educação baseada nos
princípios da diversidade étnico-racial que se viu implementar nas décadas seguintes,
especialmente na virada para o século XXI.
D) A preocupação com a diversidade cultural surge no contexto do pós Segunda Guerra Mundial,
em grande medida, devido às experiências traumáticas de racismo e genocídio perpetrados por
regimes fascistas na Europa, especialmente o nazismo alemão responsável pela morte de milhões
de pessoas.
2. É COMUM QUE SE ENTENDAM A EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA E O
ENSINO DE HISTÓRIA INDÍGENA NAS ESCOLAS COMO SENDO A MESMA
COISA. CONTUDO, APESAR DOS DOIS PROJETOS EDUCACIONAIS
DIALOGAREM COM O PRINCÍPIO DA COMUNICAÇÃO INTERCULTURAL,
SÃO BASTANTE DIFERENTES ENTRE SI. A RESPEITO DAS
ESPECIFICIDADES, DIFERENÇAS E CONFLUÊNCIAS ENTRE EDUCAÇÃO
ESCOLAR INDÍGENA E ENSINO DE HISTÓRIA INDÍGENA NAS ESCOLAS,
ASSINALE A SEGUIR A ALTERNATIVA CORRETA:
A) A educação escolar indígena nasce de demandas próprias aos povos indígenas e como forma
de resistência às políticas educacionais assimilacionistas. Já o ensino de história indígena nas
escolas corresponde aos projetos de educação indígena conduzidos por professores não
indígenas.
B) A educação escolar indígena e o ensino de história indígena nas escolas são as duas faces de
um projeto de comunicação intercultural que visa, de um lado, romper com os estereótipos
racistas contra os povos indígenas e, por outro, garantir o direito à educação diferenciada para os
povos indígenas.
C) Tanto a educação escolar indígena quanto o ensino de história indígena nas escolas têm
origem em demandas dos movimentos indígenas, contudo, apenas no segundo caso existe uma
lei que torna obrigatório o ensino.
GABARITO
A alternativa é incorreta porque supõe um sentido biológico para a definição de raça e etnia. Ao
sugerir que, com a miscigenação, brancos, negros e indígenas deixariam de ser autênticos
representantes de “raças biológicas”; o item desconsidera que raça e etnia, assim como o
racismo, são experiências de natureza sociológica.
A alternativa está correta porque assinala a comunicação intercultural como uma via de mão dupla
no processo educacional de indígenas e não indígenas. Tanto a educação escolar indígena quanto
o ensino de história indígena nas escolas contribuem com a construção de interseções entre as
culturas, promovendo a possibilidade de convivialidade entre elas.
MÓDULO 3
O primeiro grande cuidado que precisamos tomar ao tratar da educação escolar indígena é evitar
as generalizações. Essa, na verdade, é uma posição que deve ser tomada sempre que as
sociedades indígenas estiverem envolvidas. Isso se deve não apenas à evidente diversidade
sociolinguística e cultural dos povos indígenas que vivem no Brasil, mas, também, ao fato de que
cada um desses povos tem uma trajetória histórica própria e, consequentemente, demandas
e expectativas particulares e em concordância com suas trajetórias específicas.
Fonte: IBGE
Figura 13. Aldeia Velha, tribo de índios Pataxós em Arraial D’Ajuda, distrito de Porto Seguro,
Bahia.
Não poderia ser diferente com relação ao tema da educação escolar indígena, pois as demandas
pelas escolas não são homogêneas:
As escolas diferenciadas são uma conquista dos movimentos indígenas e uma expressão da
resistência às políticas de integração e assimilação preconizadas pela educação para os
índios.
A educação escolar indígena compreende uma série de políticas educacionais, entre elas:
MODALIDADE DE ENSINO
Outro fator importante do debate sobre educação escolar indígena diz respeito aos termos que
estão diretamente relacionados a essa modalidade de ensino. É fundamental se perguntar o que
os termos intercultural, bilíngue e escola diferenciada significam, o que varia não apenas entre
os atores indígenas e não indígenas, mas também entre os próprios povos indígenas.
Um exemplo flagrante dessa diferença de perspectivas sobre a educação escolar indígena pode
ser identificado no debate travado entre as décadas de 1970 e 1980 por educadores,
antropólogos, linguistas e pedagogos não indígenas a respeito do tema da alfabetização indígena.
Para muitos daqueles profissionais, o objetivo principal de formação deveria ser a alfabetização
dos indígenas em sua primeira língua, de modo a preservar e valorizar sua própria cultura e
protegê-la do risco do esquecimento, por intermédio da escrita.
Contudo, como lembra Ladeira (2016), essa expectativa se choca com as demandas de
professores indígenas em formação, já que eles sabem muito bem que é na relação de contato
entre línguas faladas no dia a dia que elas precisam ser consideradas e pensadas. Além
disso, mesmo quando se trata da alfabetização em língua portuguesa, esta é experimentada na
interseção com as culturas indígenas, tendendo à apropriação do significado da escrita e
consequente tradução para o universo indígena.
EXEMPLO
O uso da escrita entre os Timbira, analisado por Ladeira (2016), é bastante ilustrativo dessa
relação de apropriação/tradução que tão bem define o termo intercultural e também a ideia de
ensino bilíngue. Ainda segundo a antropóloga, os Timbira quase sempre se valem da escrita para
redigir cartas e pequenos bilhetes, em português, direcionados aos brancos que estão
espacialmente próximos, com o objetivo de solicitar algum tipo de auxílio para realização de seus
rituais. O que a autora observa é que a estratégia da escrita, no caso dos Timbira, serve à
comunicação com interlocutores não indígenas que estão próximos espacialmente, mas com
quem se pretende estabelecer uma distância social, pois, quando os mesmos interlocutores
brancos estão espacialmente distantes, os Timbira dão preferência às ligações telefônicas e,
portanto, à palavra falada.
A escrita dos Timbira assume um significado bem diferente do que é preconizado pela sociedade
não indígena e o uso que dela fazem não corresponde às expectativas dos educadores não
indígenas. Em resumo, o uso da escrita em língua portuguesa pelos Timbira é um exemplo de
política educacional indígena e para os indígenas, por intermédio das ferramentas do mundo
dos brancos e com o propósito de se relacionarem com eles de forma autônoma.
INTERCULTURALIDADE
A dinâmica de ensino-aprendizagem que envolve professores não indígenas e estudantes
indígenas é outro exemplo de desafio enfrentado no âmbito da educação escolar indígena. A
seguir, vamos analisar o caso dos Xikrin, bastante ilustrativo dessa realidade.
Conforme afirma Cohn (2016), em relação ao que a legislação chama de “processos próprios de
ensino e aprendizagem”, as escolas Xikrin seriam uma afronta a todos os seus preceitos. Isso
porque as crianças Xikrin aprendem vendo e ouvindo, a partir da participação de boa parte das
atividades da aldeia. A escola, nesse sentido, funciona como o exato oposto das experiências de
aprendizado Xikrin, pois encerra as crianças em salas de aula, onde precisam desenvolver
habilidades e competências individualmente.
Os Xikrin respeitam uma ética própria (Mebêngôkre) que prescreve que não se deve olhar nos
olhos de uma pessoa mais velha, assim como não se deve interromper quem ensina, tampouco
responder quem sabe mais. Como resultado, os professores não indígenas reclamam da falta
de interesse dos alunos indígenas, de sua timidez e falta de participação nas aulas.
Embora essa dinâmica possa soar como sintoma de um absoluto fracasso da experiência escolar
diferenciada Xikrin, o que Cohn (2016) observa é algo bem diferente. Os adultos Xikrin não
esperam que a escola seja um lugar em que os valores e conhecimentos Xikrin sejam ensinados
às crianças. Esperam que a escola seja um lugar que possibilite às crianças Xikrin aprenderem
com a alteridade.
Um caso bem diferente desse, é o dos Guarani e Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, com a
exigência de que todos os professores das escolas indígenas sejam indígenas. É um problema
compartilhado por outros povos indígenas, para implementar a educação diferenciada.
De acordo com Benites (2018), em um primeiro momento, o poder público quis enviar às aldeias
professores não indígenas para atuarem nas escolas indígenas, o que foi rejeitado pelas
lideranças indígenas Guarani e Kaiowá, especialmente em áreas litigiosas.
A partir da articulação das lideranças Guarani e Kaiowá e de entidades como o CIMI (Conselho
Indigenista Missionário) , no final dos anos 1990 e início dos anos 2000, a reivindicação por
professores indígenas começou a ser atendida.
Fonte: Wikimedia
É importante observar como uma demanda tende a gerar outra, complexificando e expandindo as
políticas educacionais indígenas. O caso Guarani e Kaiowá é exemplo disso, pois teve suas
demandas iniciais por uma educação básica conduzida por professores indígenas, que levou à
criação de um curso específico de formação de professores indígenas, seguido de novas
reivindicações indígenas, que levaram à criação da Faculdade Intercultural Indígena/FAIND/UFGD
da Universidade Federal da Grande Dourados, responsável por oferecer o curso de Licenciatura
Intercultural Teko Arandu e, desde 2014, o curso de pós-graduação em Educação Intercultural.
Segundo Giraldin (2018), com o crescimento do número de alunos concluintes do último ano do
ensino fundamental, gerou-se uma grande procura pelo ensino médio, incluindo demandas
específicas de jovens lideranças Krahô pela oferta de ensino médio nas próprias aldeias.
No caso dos Krahô, é possível identificar uma diferença muito grande entre as expectativas desse
povo e a dos órgãos públicos, no que diz respeito à educação escolar indígena.
Fonte: Wikipedia
Figura 16. Cesta artesanal Krahô
ENFRENTAMENTOS
O relato detalhado da professora Glicéria Tupinambá apresenta os vários desafios, divididos entre
gerais e específicos, enfrentados pelos professores no Colégio Estadual Indígena Tupinambá da
Serra do Padeiro (CEITSP) na aldeia Serra do Padeiro, Terra Indígena Tupinambá de Olivença,
na Bahia.
DESAFIOS GERAIS
São experimentados por outras escolas indígenas e não indígenas. Entre eles, estão o problema
da estrutura física da escola e o do transporte dos estudantes. Os professores lecionam em salas
improvisadas, pequenas e com uma grande quantidade de alunos. Não há estabilidade na relação
entre a empresa fornecedora do serviço de transporte e a escola, pois o recurso é disponibilizado
de modo irregular, fazendo com que as empresas de transporte evitem os contratos.
DESAFIOS ESPECÍFICOS
São próprios à realidade do Colégio Estadual Indígena Tupinambá da Serra do Padeiro. Glicéria
Tupinambá lista uma série de dificuldades enfrentadas no colégio onde leciona:
A análise desenvolvida por Dominique Gallois durante o seminário Políticas culturais e povos
indígenas. As escolas e outros problemas, realizado na USP em 2013, é bastante reveladora
nesse aspecto.
Fonte: CNPQ
Figura 17. Antropóloga brasileira Dominique Tilkin Gallois
Gallois (2013) observa que, inicialmente, a política de educação diferenciada para os povos
indígenas possibilitaria a valorização dos “conhecimentos tradicionais” e também o
reconhecimento das demandas próprias aos povos indígenas. No entanto, na maior parte dos
casos, esses objetivos não foram alcançados por causa das armadilhas das escolas como um
lugar institucional de domesticação de conhecimentos.
Na afirmação de Gallois (2013), a escola é a expressão dessa contradição, pois ao mesmo tempo
em que é capaz de promover autonomia e empoderamento, também leva à domesticação de
conhecimentos tradicionais em função de sua estrutura eurocêntrica.
Muitos educadores indígenas revelaram que suas críticas a um suposto fracasso das escolas
diferenciadas não são assim tão radicais. Suas críticas giravam mais em torno da necessidade de
políticas públicas complementares, tanto às escolas indígenas quanto às universidades, e suas
políticas de formação de professores indígenas. Segundo Gallois (2016), demandas como a
garantia de moradia e o manejo simétrico das horas aula, de modo a compatibilizar os
ensinamentos dos brancos e os conhecimentos dos índios, suplantaram quaisquer outras
críticas apontadas pelos atores não indígenas presentes no seminário.
Algumas demandas indígenas chegaram a surpreender, pois revelaram maior preocupação com o
acesso aos chamados conhecimentos universais, isto é, os conhecimento não indígenas, os
conhecimentos dos brancos. Como destacou a professora indígena Rita Potiguara (apud
GALLOIS, 2016), não é somente interculturalidade, precisamos formar advogados
indígenas, médicos indígenas, enfermeiros indígenas!
O que a fala da professora Rita Potiguara revela é a preocupação com a apropriação dos
conhecimentos hegemônicos para, por meio deles, garantir autodeterminação.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
C) A educação escolar indígena tem como referência a diversidade cultural entre os povos
indígenas e suas trajetórias históricas próprias, eliminando qualquer tendência à homogeneização
característica da educação assimilacionista.
D) Como qualquer outra abordagem relacionada aos povos indígenas, também no caso da
educação escolar indígena é preciso descartar a particularidade dos casos para se ter uma boa
dimensão do todo.
B) A interculturalidade diz respeito à relação entre indígenas e não indígenas no âmbito cultural,
excetuando, portanto, outras dimensões da sociabilidade humana como a economia e a política.
C) Por educação diferenciada, entende-se uma educação com mais qualidade e refinamento, um
tipo de educação privilegiada.
D) A dimensão de interculturalidade subjacente à política de educação escolar indígena leva em
consideração as diferenças culturais entre os povos indígenas e não indígenas e também a busca
pela comunicação entre ambas, apesar das diferenças.
GABARITO
Essa alternativa está correta porque nos lembra da diversidade existente entre os povos indígenas
e da impossibilidade de se tomar um único caso como representativo da totalidade das
experiências indígenas.
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pensar a própria escola como um desafio significa, antes de tudo, reconhecer que a cultura e, por
extensão, a comunicação intercultural é uma via de mão dupla. Portanto, a educação escolar
indígena não deve ser pensada como um espaço de preservação das culturas, dos valores e
conhecimentos tradicionais como se esses fossem peças imutáveis que compõem um acervo
museológico.
A educação diferenciada deve, antes, ser pensada como um espaço que promova e garanta a
autodeterminação e autonomia dos povos indígenas para que eles possam continuar existindo e
de modo dinâmico como qualquer outra cultura. Porque a cultura, como lembra Célia Xakriabá
(apud GALLOIS, 2016), “a cultura precisa você fazer parte, continuar com ela”. Afinal, o
dinamismo da cultura não é exclusividade do Ocidente.
AVALIAÇÃO DO TEMA:
REFERÊNCIAS
BENITES, T. A luta dos professores Guarani Kaiowá pela efetivação de educação escolar
indígena. In: REGO, A. A.; APOLINÁRIO, J. R. (Org.). Novas Histórias dos povos indígenas no
Brasil. Territorialidades da escrita interdisciplinar indígena e não indígena. Salvador: Sagga, 2018.
COHN, C. A cultura nas escolas indígenas. In: CUNHA, M. C. Políticas culturais e povos
indígenas. São Paulo: Unesp, 2016.
CUNHA, M. C. Políticas culturais e povos indígenas – Uma introdução. São Paulo: Unesp,
2016.
GERBI, A. O novo mundo: história de uma polêmica (1750-1900). São Paulo: Cia. das Letras,
1996.
GIRALDIN, O. Coisa de Kupẽ: a escolarização e sociabilidades entre os krahô. In: REGO, A. A.;
APOLINÁRIO, J. R. (Org.). Salvador: Sagga, 2018.
SOUZA, A. C. G. Escola e Reafirmação Étnica: O Caso dos Pataxó de Barra Velha, Bahia. 2001.
Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) - Universidade Federal da Bahia, 2001.
EXPLORE+
Para saber mais sobre a Educação Indígena assista aos vídeos:
Para saber mais sobre os saberes das culturas afrodescendentes, indígenas e populares
veja o Programa de Formação Transversal em Saberes Tradicionais, da UFMG.
O livro O Índio Brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos indígenas no Brasil de
hoje, de Gersem dos Santos Luciano.
Os Livros da série Povos Indígenas no Brasil, produzidos pelo Instituto Socioambiental (ISA).
O Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas.
CONTEUDISTAS
Ana Carolina Barbosa Pereira
CURRÍCULO LATTES
Larissa Santiago Hohenfeld
CURRÍCULO LATTES
Glicéria Tupinambá
CURRÍCULO LATTES