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Livrarias sentem crise e ‘efeito Amazon’

Com queda de vendas em volume e dificuldades para repassar a inflação aos preços
dos produtos, livrarias tradicionais buscam fusões e reduzem operações

Fernando Scheller e Luciana Dyniewicz ,


O Estado de S.Paulo

05 Março 2017 | 22h00

Vender livros no Brasil não é tarefa fácil, ainda mais quando a economia anda para trás.
Em 2016, a comercialização de livros no País recuou 8,9%, comprometendo a
rentabilidade de editoras e, principalmente, de livrarias. Enquanto os produtores de
livros sofreram com o cenário macroeconômico, o varejo tradicional teve de lidar
também com a migração do cliente para as vendas online e com a chegada de uma
poderosa concorrente: a americana Amazon.
O resultado foi um baque nas contas das grandes livrarias, que empreenderam uma forte
expansão nos últimos anos, incentivadas pelas empresas de shopping centers, que viam
as megastores culturais como “âncoras” de seus centros comerciais. “Muitas redes
cresceram de forma desordenada e fora das regiões onde tinham público cativo, nem
sempre com bons resultados”, disse uma fonte de mercado.

A dificuldade de repasse da inflação para os preços é um dos pontos de estresse do


setor. “Meu livro mais ‘pop’ de 2008 tinha preço de capa de R$ 29,90. No ano passado,
minha grande aposta custava, novamente, R$ 29,90”, compara uma fonte de uma grande
editora nacional. O valor médio por obra hoje é de R$ 38,66. Embora tenha havido uma
reposição de 15% nos últimos dois anos, o desconto médio aplicado pelo varejo é de
17,9%, o que faz o preço médio real ser de R$ 31,74. “Os custos cresceram, mas a
receita do setor não acompanhou”, diz Marcos Pereira, presidente do Sindicato Nacional
dos Editores de Livros (Snel).

Em dois anos, a Livraria Cultura viu sua receita cair 17%. Um dos grandes vilões da
operação da empresa foi a aposta em uma loja no centro do Rio de Janeiro, dizem fontes
do mercado editorial. Ao Estado, o presidente da Cultura, Sergio Herz, admitiu que a
unidade traz desafios, em grande parte por sofrer com a retração de vendas decorrente
da situação econômica do Rio e com os protestos que costumam ser realizados na
região, próxima à Câmara Municipal.
Segundo apurou o Estado, a empresa, que compra os livros por consignação, tem
repassado às editoras o dinheiro referente às vendas com atrasos que chegariam a seis
meses. “As editoras não têm condições de suportar esse atraso por muito tempo”, disse
uma fonte. Herz, porém, garante que não há atraso. Segundo ele, o que houve foi uma
renegociação dos prazos com as editoras.
Fnac. Além da Cultura, outras varejistas enfrentam desafios. Na semana passada, a
francesa Fnac anunciou que busca um parceiro no País, onde vem tendo resultados
abaixo do esperado. A Saraiva tem reduzido sua aposta nos livros e ampliado espaço
para tecnologia, games e aluguel de área para cafés. A companhia vendeu sua editora e,
mesmo assim, continua registrando prejuízo – nos nove primeiros meses de 2016, as
perdas foram de R$ 27,9 milhões.

A Livraria da Vila diminuiu o tamanho de sua loja no shopping Cidade Jardim, em São
Paulo, de 2,5 mil m2 para 400 m2 e deve fazer o mesmo na unidade do shopping JK
Iguatemi, que tem 1,7 mil m2. De acordo com o dono da empresa, Samuel Seibel, essas
operações não seguem o padrão da rede, cujas lojas têm em média 750 m2.

Justamente nos últimos dois anos, quando os resultados das livrarias começaram a
piorar, a gigante Amazon iniciou sua operação de livros físicos no Brasil. A companhia
americana caiu nas graças das editoras porque, ao contrário das principais livrarias
físicas, compra os livros, em vez de pegá-los em consignação.

Uma grande editora disse ao Estado que as vendas de seus livros por meio da Amazon,
que eram próximas de zero há dois anos, representaram 10% do faturamento em 2016.
Outra companhia afirmou que suas vendas dentro da Amazon cresceram 70% no ano
passado.
Segundo a empresa americana, ter estoque próprio ajuda a deixar a operação mais
“redonda”. Para Daniel Mazini, gerente-geral para livros impressos da Amazon Brasil, a
aquisição dos exemplares deixa o fluxo de caixa das editoras mais previsível. As
livrarias Cultura, Nobel, da Travessa e da Vila, no entanto, afirmaram ao Estado que a
Amazon ainda não as preocupa.

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