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Concepções de Determinismo no Behaviorismo1 Radical: Uma taxonomia23

Brent D. Slife
Brigham Young University
Stephen C. Yanchar
Morningside College
Brant Williams
Brigham Young University

RESUMO: Há muito tempo o determinismo tem sido uma suposição nuclear em muitas
formas de behaviorismo, incluindo o behaviorismo radical. Entretanto, essa suposição tem
sido um obstáculo para muitos – tanto dentro quanto fora do campo do behaviorismo radical –
resultando em mal-entendidos e deturpações. O seguinte artigo fornece uma taxonomia
descritiva de quatro tipos de determinismo assumidos ou defendidos na literatura behaviorista
radical. Esta taxonomia objetiva organizar tais posições determinísticas, fornecer definições
práticas, e explorar suas implicações. Por meio deste trabalho, espera-se que tanto
behavioristas quanto não-behavioristas possuam uma compreensão mais clara do
determinismo na Análise do Comportamento.

Na introdução de Sobre o Behaviorismo4, B. F. Skinner aludiu aos problemas que


muitos experienciaram na compreensão do behaviorismo radical. Skinner (1974) forneceu
uma lista de vinte críticas comumente atribuídas ao seu programa de pesquisa, e destacou
“Essas alegações representam, creio eu, um extraordinário mal-entendido acerca das
conquistas e significância de uma iniciativa científica” (p. 5). Embora Skinner não tenha
mencionado a noção de determinismo per se nessa passagem, ela claramente estava
subjacente a muitas dessas críticas. Skinner estava bastante ciente de como os mal-entendidos
sobre o determinismo obstruíram um verdadeiro entendimento de seu trabalho. Ele mostrou,
por exemplo, como muitos (não) entenderam que o behaviorismo (não) significava que um
behaviorista radical “. . . formula o comportamento simplesmente como um estado de

1
Nota do tradutor: Na presente tradução, o uso do termo “comportamentalismo” será evitado em função de sua
crescente utilização na literatura analítico-comportamental brasileira. Tal “apropriação” linguística da palavra
original visa, em certo sentido, destacar a particularidade teórico-conceitual das produções científicas brasileiras
no âmbito da Análise do Comportamento. Em se tratando de um trabalho dessa natureza, e reconhecendo-se a
fragilidade de traduções em um sentido mais amplo (Eco, 2014; Laurenti & Lopes, 2016), a escolha por não se
utilizar a versão brasileira do termo reflete o compromisso filosófico e conceitual que guia a construção da
versão em língua portuguesa.
2
Slife, B. D., Yanchar, S. C., Williams, B. (1999). Conceptions of determinism in radical behaviorism: a
taxonomy. Behavior and Philosophy, 27(2), 75-96.
3
Nota do tradutor: Tradução livre confeccionada pelo coordenador do Grupo de Estudos em Epistemologia da
Análise do Comportamento (GEpAC), Prof. Me. Christian Silva dos Reis (PUCPR – Campus Toledo). Uso
exclusivo para fins didáticos.
4
Nota do tradutor: Tradução livre do título original: “About Behaviorism” (Skinner, 1974).
respostas a estímulos, então representando uma pessoa como um autômato, robô, fantoche ou
máquina” (Skinner, 1974, p. 4)5.
Não surpreendentemente, Skinner procurou clarificar a posição behaviorista radical
acerca do determinismo por meio de seus muitos escritos. Entretanto, tais entendimentos
sobre o seu trabalho persistiram, particularmente fora do behaviorismo radical (cf., Rychlak,
1981; 1988; Ryckman, 1989; Viney & king, 1998). Outros behavioristas lamentaram a
aparente permanência de tais entendimentos questionáveis, argumentando que suas
proposições acerca de causalidade, determinismo, e concepções correlatas foram regularmente
mal construídas (Chiesa, 1992; Moore, 1990). Além disso, muitos autores observaram que os
mal-entendidos sobre o behaviorismo radical, incluindo aqueles pertencentes à causalidade,
são extremamente resistentes à mudança, mesmo em um curso universitário que foi planejado
para desfazer estes mitos (DeBell & Harless, 1992; Lamal, 1995).
Estes mal-entendidos levantam duas questões óbvias: (a) Por que os críticos tão
persistentemente não entenderam o determinismo implícito no behaviorismo radical? E (b)
Qual exatamente é a posição behaviorista radical sobre o determinismo? Embora uma
resposta completa à primeira questão seja mais complexa do que o espaço permite, uma parte
importante desta resposta originar-se-á de nossa resposta à segunda questão. Como este artigo
irá ilustrar, parece não haver uma definição padrão de determinismo na literatura behaviorista
radical. Alguns pesquisadores debateram o significado, a importância e as implicações de uma
perspectiva determinística na Análise Experimental do Comportamento (Chiesa, 1992; Marr,
1982; Moore, 1990; Rockwell, 1994; Vorsteg, 1974). De fato, concepções variadas dessa
ideia nuclear são ignoradas por diferentes autores, fomentando uma ambiguidade que pode, de
fato, impedir uma compreensão mais ampla na disciplina como um todo.
O propósito deste artigo, portanto, é clarear o que significa determinismo na literatura
behaviorista radical. Uma breve e descritiva taxonomia é proposta, visando sistematizar
quatro tipos básicos de determinismo encontrados na literatura – determinismo metafísico,
probabilismo metafísico, determinismo científico, e interdependência funcional – fornecendo
aos psicólogos, assim, uma estrutura conceitual para interpretar as alegações behavioristas

5
Nota do tradutor: A versão original deste excerto contém um recurso próprio da língua inglesa que é impossível
de reproduzir em português brasileiro. O uso dos termos “não” entre parênteses não deve ser ignorado, pois este
foi o recurso utilizado para “fazer jus” ao significado expresso no texto original. Assim, deve-se entender que
Skinner não defende a tese de que o behaviorismo, ou o behaviorista radical, interprete o comportamento
somente como um estado de respostas a estímulos, representando o indivíduo como um fantoche ou robô. Pelo
contrário, o uso da dupla negativa representada pelos termos “não” em parênteses procura, justamente, dirimir tal
contradição. Na passagem original em inglês lê-se: “He showed, for example, how many had (mis)understood
behaviorism to mean that a radical behaviorist ‘formulates behavior simply as a state of responses to stimuli,
thus representing a person as an automaton, robot, puppet, or machine” (Skinner, 1974, p. 4)”.
radicais. Acompanhando essa taxonomia, há uma discussão das implicações de várias
categorias de determinismos. Estas categorias, assim como suas implicações, podem ajudar
pesquisadores e teóricos a selecionar a posição determinística mais aplicável à sua própria
orientação teórica e filosofia da ciência, enquanto, ao mesmo tempo, clarificam um tema
nuclear do behaviorismo radical para seus estudantes e críticos.

A Natureza da Taxonomia

Taxonomias já serviram muito para reduzir a ambiguidade na psicologia de maneira


geral, e no behaviorismo radical em particular. Um exemplo é a taxonomia simples de
Skinner (1935) dos tipos de condicionamento, delineando a útil distinção entre
condicionamento operante e respondente. Outras taxonomias foram mais elaboradas, tais
como as que caracterizam diferentes tipos de operações ambientais (Schlinger & Blakely,
1994), ou de funções de estímulo (Michael, 1993). O propósito geral em todos os exemplos é
fornecer um sistema de classificação que clarifique a terminologia, promova precisão no
laboratório, e facilite a discussão.
O propósito da presente taxonomia não é exceção. Nossa revisão da literatura
behaviorista radical revelou uma variedade de concepções determinísticas, de modo que uma
abordagem taxonômica pareceu apropriada. Entretanto, essas concepções variaram bastante
entre aqueles que escreviam sobre o assunto. Alguns autores, por exemplo, tentaram ser
prescritivos, propondo como os behavioristas radicais deveriam ver o determinismo, enquanto
outros tentaram ser descritivos, mostrando como behavioristas de fato utilizam o conceito em
seus estudos. Dada a diversidade de perspectivas e contextos nessa literatura, foi difícil
categorizar de modo exaustivo todas as formas possíveis e determinismo. Ainda assim, nós
consideramos que as categorias aqui propostas são representativas das principais correntes
dentro do behaviorismo radical. Então, afirmamos que este sistema taxonômico será
heurístico para muitos leitores, a despeito de seu escopo possivelmente limitado.
Também houve dificuldade em categorizar programas de pesquisa, posições teóricas, e
mesmo cientistas e teorias em si mesmas. A complexidade da teorização pode fazer com que
categorias pareçam estereotipadas e simplificadas demais. Neste sentido, vemos nosso esforço
taxonômico como meramente o primeiro passo em um diálogo que deveria convergir em uma
consideração mais precisa e parcimoniosa das premissas determinísticas na literatura
behaviorista radical. Embora estejamos abertos à modificação da taxonomia que propusemos,
apressamo-nos em acrescentar que nossa proposta deverá facilitar esse processo ao sugerir tal
esclarecimento e fornecer uma linguagem emergente para sua realização.

Determinismo Metafísico

Talvez o determinismo mais comumente associado ao behaviorismo radical – a


despeito de tal associação ser correta ou incorreta – seja o determinismo metafísico. Esta
posição afirma que todos os eventos no universo, incluindo o comportamento dos organismos,
são o resultado necessário de condições antecedentes. Nada além do comportamento que, de
fato, ocorreu, poderia ter ocorrido, dadas as circunstâncias causais antecedentes.
Frequentemente considerou-se que Skinner estivesse filiado ao determinismo metafísico (e.g.,
Rychlak, 1981; 1988; Viney & King, 1998). E, como comentadores tais como Delprato e
Midgely (1992) mostraram, Skinner pareceu apoiar tipos metafísicos de determinismo ao
longo de sua carreira. Considere duas afirmações de Skinner sobre o assunto:
[Ciência] é mais do que a mera descrição de eventos conforme ocorrem. É a tentativa
de se descobrir ordem, de mostrar que certos eventos estão em relação nômica6 com
outros eventos . . . Se nós vamos utilizar os métodos da ciência no campo dos assuntos
humanos, devemos assumir que o comportamento é nômico e determinado. (Skinner,
1953, p. 6, itálicos adicionados)
Para que sequer haja uma ciência da psicologia, devemos adotar o postulado
fundamental de que o comportamento humano é um dado nômico, de que é
imperturbável por atos caprichosos de qualquer agente livre7 – em outras palavras, de
que é completamente determinado. (Skinner, 1947, p. 23, itálicos adicionados)

6
Nota do tradutor: O termo “nômico” é relativo a “nómos”, do grego, “lei”. Assim, uma relação nômica
descreve uma relação entre elementos regida por leis, e na qual não há possibilidade de variações, ou desvios. No
excerto original lê-se: “[Science] is more than the mere description of events as they occur. It is an attempt to
discover order, to show that certain events stand in lawful relation to other events . . .”.
7
Nota do tradutor: Na filosofia da ciência, a noção de “agência” denota uma instância iniciadora (comumente
postulada como sendo interna ao organismo) das ações de indivíduos (Ferrater Mora, 2004); exemplos
tradicionais seriam as noções de mente, inconsciente, volição etc. No comportamentalismo radical, no entanto, a
tese de que comportamentos sejam iniciados por qualquer instância interna aos organismos é sistematicamente
criticada tanto por Skinner quanto por comentadores (Skinner, 1969, 1971, 1974, 1981; Leão & Laurenti, 2012;
Lopes, 2008; Reis & Laurenti, 2019). Assim, na passagem, ao utilizar a expressão “atos caprichosos de qualquer
agente livre”, Skinner parece propor que a adoção de pressupostos científicos para o trato dos assuntos
comportamentais impugna a suposição de que há uma instância iniciadora interna aos indivíduos, o que culmina
na tese de que a explicação (e possível determinação) do comportamento deve ser compreendida no âmbito da
própria relação organismo-mundo.
Embora Moxley (1992) tenha notado corretamente que Skinner tentou mover-se de um
behaviorismo mecanicista para um funcionalista em seus trabalhos tardios, ele também
mostrou como Skinner continuou a ter simpatia pelo determinismo metafísico, como a seguir:
. . . [a] história ambiental ainda está no controle; a dotação genética das espécies
somada das contingências as quais o indivíduo foi exposto ainda determina o que ele
irá perceber. (Skinner, 1974, p. 82, itálicos adicionados)
O comportamento ocorre porque mecanismos apropriados foram selecionados no
curso da evolução. Os sentimentos são meros produtos colaterais das condições
responsáveis pelo comportamento. (Skinner, 1974, p. 52, itálicos adicionados)
Nevin (1991) e Baum (1994) também proferiram afirmações que parecem ser
compatíveis com o determinismo metafísico. Nevin (1991), por exemplo, deixou claro: “De
acordo com os princípios mais centrais de nossa crença, todo comportamento é determinado
por processos genéticos e ambientais” (p. 36). Similarmente, as observações diretivas de
Baum (1994) sobre o determinismo são facilmente interpretadas como de natureza metafísica.
Baum é destemido em considerar o determinismo como sendo “a noção de que o
comportamento é determinado somente pela hereditariedade e ambiente” (p. 11, itálicos
adicionados). Baum inclusive rejeita tentativas de conciliar o determinismo com o “livre-
arbítrio libertário” (p. 11-14), porque “o determinismo assevera que o livre-arbítrio é uma
ilusão baseada na ignorância acerca dos fatores que determinam o comportamento” (p. 15).
Para Baum, assim como para Nevin, a ciência em si mesma requer a “ideia de que todo
comportamento se origina de herança genética e de efeitos ambientais” (p. 15).
Embora não possamos saber ao certo que tipo de determinismo qualquer um destes
acadêmicos estava pretendendo defender a partir somente das passagens, o determinismo
metafísico parece uma interpretação válida. Esta interpretação é sustentada por afirmações
claras de que pessoas são organismos governados geneticamente, a serem futuramente
moldados por meio da experiência com o ambiente. De acordo com estes behavioristas, as
capacidades de uma criança, por meio de seu desenvolvimento, resultam da confluência de
pressões ambientais e genéticas. Nenhuma terceira categoria de variáveis auto iniciáveis (e
internas), tais como o livre-arbítrio (e.g., Howard, 1994) é postulada8. O comportamento é o
resultado necessário de dois conjuntos de forças causais, a ambiente e os genes. Essa
abordagem direta ao determinismo pode ser a mais comumente criticada ou caricaturizada em

8
Nota do tradutor: Ver nota 7.
explicações humanísticas ou cognitivas (e.g., Bandura, 1989; Rogers, 1970; Rychlak, 1981,
1998).
Entretanto, autores que parecem assumir este tipo de determinismo metafísico
discordam a respeito de quão exigente nosso conhecimento sobre este mundo determinístico
pode ser. Alguns autores (e.g., Baum, 1994; Czubaroff, 1991; Moore, 1990, 1992; Nevin,
1991) argumentam que um conhecimento completo e perfeito (ou quase perfeito) pode ser
obtido se a Análise do Comportamento tiver tempo suficiente para isolar as variáveis
relevantes, exercer controle, e fazer previsões informadas. Esta abordagem epistemológica
corresponde aproximadamente à visão tradicional de ciência, que sustenta que regularidades
nômicas, tal como discernidas por análises empíricas rigorosas, podem acuradamente
representar a realidade física (Moore, 1985, 1992; cf. Polkinghorne, 1983).
Outros analistas do comportamento argumentam que os aparelhos de medição e
instrumentação atuais limitam severamente a precisão com a qual previsões comportamentais
podem ser feitas (Espinosa, 1991; Fraley, 1994; Kanekar, 1992). Ainda assim, muitos destes
pesquisadores reconhecem que estimativas probabilísticas relativamente acuradas de eventos
físicos são alcançáveis. Assim, estes analistas do comportamento buscam cada vez mais
previsões acuradas com respeito ao comportamento, enquanto visam superar as limitações de
medição no futuro.
A despeito de tais discordâncias sobre a acurácia de medições e instrumentação, todos
os deterministas metafísicos parecem concordar que a natureza em si mesma é
fundamentalmente determinante, e que todos os eventos físicos ocorrem como um resultado
de causas naturais nômicas. Fraley (1994) explica:
A noção de que limitações físicas em processos de medidas comprometem o
determinismo parece exigir um salto inferencial injustificado que posicionaria a
natureza (o ambiente) como uma função do conhecer – este status ontológico é
adquirido somente a partir do conhecimento de alguém sobre ele . . . Mas os princípios
comportamentais postulam a direção reversa no controle, a saber, a de que o conhecer
é comportamento e, portanto, é controlado por uma natureza existente. (p. 73, itálicos
adicionados)
Assim, o determinismo metafísico permanece comprometido à determinação de
eventos naturais, incluindo o comportamento humano, e rejeita a alegação mais radical de que
a realidade física é, em si mesma, inerentemente probabilística. Esta alegação, feita por alguns
físicos e psicólogos, é assumida na segunda de nossas quatro categorias taxonômicas.
Entretanto, devemos primeiro explicar as implicações do determinismo metafísico.
Implicações do Determinismo Metafísico

Uma implicação dessa forma de determinismo, como sugerido acima, é a de que


noções convencionais, como liberdade e escolha – noções frequentemente tomadas como
certas no discurso popular – não são possíveis. O livre-arbítrio convencional requer o
potencial para agir de outro modo9 em relação ao que ditariam as forças genéticas ou
ambientais (Howard, 1994; Rychlak, 1992; Slife & Williams, 1995; Valentine, 1992; Van
Inwagen, 1986; Viney & King, 1998). Entretanto, o determinismo metafísico não deixa
espaço para qualquer autodeterminação no sentido de um livre-arbítrio. Alguns behavioristas
discutem fatores autodeterminantes (e.g., Skinner, 1953), mas eles o fazem no sentido de
causas anteriores (e, portanto, determinantes), que são, em si mesmas, causadas (e
determinadas) por causas anteriores, em uma cadeia causa-efeito que, em última análise, se
origina antes (e fora) do “self”10 em qualquer sentido convencional. Este tipo de determinismo
assume que fatores antecedentes ambientais e genéticos são necessários e suficientes para
controlar o comportamento. Pessoas podem parecer fazer escolhas, i.e., elas podem parecer
fazer outras coisas (em relação ao que determinam as causas ambientais e genéticas), mas
todas essas “escolhas” são, em última análise, determinadas por causas ambientais e genéticas
(ver Slife, 1993).
Uma implicação do determinismo metafísico relacionada envolve a questão da
responsabilidade pessoal (e.g., Rychlak, 1979). De acordo com a noção comum de
responsabilidade, não há sentido em atribuir mérito ou culpa a indivíduos se eles são
determinados no sentido metafísico aqui descrito. Mérito ou culpa só fazem sentido se existir
um agente que inicia a ação, que não foi, em última análise, causada por fatores ambientais e
genéticos (Baum, 1994, p. 166-171). Nesse sentido, Madre Teresa não deveria ser elogiada
por seus comportamentos de caridade. Estes comportamentos são, na realidade, somente sua
dotação genética interagindo de algum modo com seu ambiente para causar suas ações. Pela

9
Nota do tradutor: A expressão “agir de outro modo”, aqui, faz referência ao fato de que, na visão de mundo
(cosmologia, ontologia) que sustenta a noção de livre-arbítrio, indivíduos humanos seriam capazes de contrariar
as determinações genéticas e ambientais decidindo seu futuro por conta própria.
10
Nota do tradutor: A palavra self, na língua inglesa, é utilizada para designar um “recurso a si mesmo”,
exibindo um caráter reflexivo, no sentido mais próximo da língua portuguesa da palavra “auto”. No entanto, o
termo original em inglês também pode significar o que em português se designa pelo termo “eu”. Nesse sentido,
quando os autores utilizam a expressão “se origina antes (e fora) do self”, pode-se entender que estão se
referindo à noção psicológica de “eu”, ou àqueles comportamentos que indivíduos identificam como sendo
próprios (ou naturais) de sua própria constituição individual.
mesma razão, um assassino não deveria ser culpado por comportamentos de assassinar.
Alguma interação entre genética e ambiente deve ter causado essas ações assassinas.
Devemos notar que nem todos os aspectos da responsabilidade são descartados por tais
concepções determinísticas. Como Staddon (1995) mostrou, previsibilidade é importante a
algumas formas de responsabilidade legal. Ele afirma:
Se o comportamento criminoso é previsivelmente desencorajado pela punição, o
criminoso punido justamente está menos propenso a desobedecer a lei novamente, e
serve de exemplo a outros potenciais infratores da lei. Esta é a única justificação
objetiva para a punição. Mas se o comportamento fosse imprevisível e não afetado por
“contingências de reforçamento” – se ele fosse não-causado, na caricatura de Skinner
da liberdade – não haveria absolutamente nenhum ponto em favor da punição ou
qualquer outra forma de controle comportamental, porque não haveria efeito
previsível. Em poucas palavras, responsabilidade legal requer determinismo
comportamental. (p. 93)
É claro, este recurso do “determinismo comportamental” não nos diz qual tipo de
determinismo é o determinismo comportamental. Este é um dos propósitos do presente artigo
– clarificar quais opções determinísticas são viáveis e disponíveis ao behaviorista radical.
Nessa conjuntura, o determinismo metafísico é somente uma de quatro formas diferentes de
previsibilidade. Seja o comportamento metafisicamente determinado para ser previsível ou
não, e seja ou não a responsabilidade a mera utilização de certas contingências reforçadoras
ou punidoras, ainda é uma questão em aberto. Em qualquer evento, a noção habitual de
responsabilidade pessoal, em que uma pessoa é considerada responsável como um agente
iniciador, é evitada no determinismo metafísico.
Aqueles behavioristas radicais que endossam esta forma de determinismo não
esmoecem perante estas implicações provocativas. De fato, aqueles teóricos argumentam que
tais implicações devem ser aceitas, e que noções convencionais de livre-arbítrio e volição
devem ser abandonadas se quisermos ter uma compreensão acurada da condição humana.
Baum, por exemplo, assevera que: “Analistas do comportamento argumentam que enquanto
assumirmos o livre-arbítrio, iremos falhar em resolver nossos problemas sociais” (1994, p.
152; ver também Howard, 1994; Rychlak, 1979; Sappington, 1990). B. F. Skinner, é claro, é
também famoso por sua aceitação de implicações similares (e.g., Skinner, 1971, 1974). Como
veremos, entretanto, a abordagem de Skinner ao determinismo é mais complicada e mais
ambígua do que o simples determinismo metafísico.
Probabilismo Metafísico

Probabilistas metafísicos, em contraste aos deterministas metafísicos, olharam de


perto, e basearam suas premissas metafísicas nos desenvolvimentos da física contemporânea
(Alessi, 1992; Marr, 1982; Neuringer, 1991a, 1991b; Zeiler, 1979). Estes behavioristas
radicais contestaram que a instrumentação concreta envolvida na medição não somente limita
a habilidade dos cientistas de fazer previsões acuradas (como alegado por alguns
deterministas metafísicos), como também tende a codeterminar o fenômeno sob investigação
(cf. Bohr, 1935; Heisenberg, 1958; Rychlak, 1993; Snyder, 1983). Estes analistas do
comportamento notaram que a acurácia da previsão científica está comprometida, em
princípio, pelas limitações na instrumentação, limitações no conhecimento atual, e assim por
diante.
Além disso, analistas do comportamento que defendem o probabilismo metafísico
tipicamente assumem que eventos naturais ocorrem de modo metafisicamente caótico ou
estocástico11, em vez de de modo metafisicamente determinado. Dessa perspectiva, a
imprevisibilidade de eventos comportamentais resulta de uma interação entre a natureza da
realidade física e nossas técnicas observacionais, em vez de ser apenas proveniente de
instrumentação falha. Alessi (1992), por exemplo, argumentou que diferentes níveis de
evolução (i.e., filogenético, ontogenético e cultural) produzem variações aleatórias e que tais
variações aleatórias são então selecionadas por pressões ambientais.
Embora estes teóricos assumam a existência de forças determinísticas – viz., processos
evolucionários que produzem variações randômicas e performam seleção – a rede resultante
de tais forças é mais afeita à probabilidade do que ao determinismo (metafísico) tradicional.
Neuringer (1991a, 1991b), por exemplo, argumenta que um gerador de variação aleatória
endógeno, que constitui um processo determinístico subjacente, resulta em comportamento
aleatório e, portanto, até certo grau imprevisível. Como ele afirma (1991a, p. 10), “Assim,
poderíamos estar seguros na crença de que toda instância do comportamento é determinada,
em parte pelos trabalhos de um gerador caótico, mas incapazes de descobrir suas
características e, portanto, incapazes de prever instâncias”.
O sistema determinístico subjacente descrito por Neuringer é único no sentido de que
produz inerentemente aleatoriedade. Isto significa que mesmo que as condições determinantes
fossem conhecidas, algo imprevisível poderia acontecer. E, de fato, pesquisadores que

11
Nota do tradutor: Em teoria probabilística, o padrão estocástico é aquele cujo estado é indeterminado, com
origem em eventos aleatórios.
endossam o probabilismo metafísico debatem que este é frequentemente o caso. Muitos destes
pesquisadores tentaram mostrar que comportamentos espontâneos ou imprevisíveis ocorrem
frequentemente dentre os comportamentos dos organismos, e que somente estimativas
probabilísticas ou agregadas do comportamento podem ser obtidas em princípio (Marr, 1982;
Zeiler, 1979). Como sugere um autor: “Variações aleatórias no comportamento são
claramente reveladas mesmo sob condições altamente controladas utilizadas para estudar as
contingências de reforçamento” (Marr, 1982, p. 206).

Implicações do Probabilismo Metafísico

O probabilismo metafísico então assume que a psicologia nunca irá ser capaz de
atingir previsibilidade perfeita e que algumas relações variáveis serão sempre incertas e
desconhecidas. Pelo menos algum comportamento é imprevisível em princípio. Uma
implicação óbvia dessa posição é a limitação que ela coloca na compreensão científica e no
que pode ser conhecido sobre a realidade física, incluindo comportamentos individuais.
Embora nosso conhecimento possa aumentar conforme técnicas de medição e equipamentos
científicos se tornem mais acurados e precisos, tal acurácia e precisão são inerentemente, e em
última análise, limitadas pela natureza da observação e/ou realidade em si mesma.
Aparentemente, o próprio Skinner reconheceu as propriedades probabilísticas de seus
dados. Em um aparente contraste às suas declarações sobre o determinismo metafísico
(acima), Skinner (1974) descreveu o processo de condicionamento operante dessa forma:
Quando uma parte do comportamento tem o tipo de consequências denominadas de
reforçadoras, ela é mais provável de acontecer novamente. Um reforçador positivo
fortalece qualquer comportamento que o tenha produzido: um copo de água é
positivamente reforçador quando temos sede, e se então pegamos e bebemos um copo
de água, estamos mais propensos a fazê-lo novamente em ocasiões similares. Um
reforçador negativo fortalece qualquer comportamento que o reduz ou elimina: quando
tiramos um sapato apertado que está machucando, a redução na pressão é
negativamente reforçadora, e estamos mais propensos a fazê-lo novamente quando um
sapato apertar. (p. 51)
Nesse sentido, Skinner pareceu claramente reconhecer que os dados produziram
probabilidades em vez de determinações exatas. A questão é: Skinner assumiu que tais
probabilidades eram o resultado de medições (um determinismo metafísico limitado por
instrumentação), ou, de fato, o estado atual das variáveis em questão (probabilismo
metafísico)? A resposta parece ser a primeira, embora iremos discutir a possibilidade da
segunda também.
Considerando a primeira, Skinner parece ter a assumido que para que uma ciência do
comportamento fosse possível, e para que cientistas pudessem prever e controlar, o
comportamento humano deve ser completamente determinado (e.g. Skinner, 1974, p. 208).
Embora ele prontamente admita que ele não poderia conhecer tal determinação
absolutamente, a pesquisa o convenceu de sua veracidade. Como ele coloca em Sobre o
Behaviorismo:
Não podemos provar, é claro, que o comportamento humano é completamente
determinado, mas a proposição se torna mais plausível conforme os fatos se
acumulam, e eu acredito que se atingiu um ponto em que suas implicações devem ser
seriamente consideradas. (1974, p. 208, itálicos adicionados)
Se Skinner assumiu que o comportamento humano era, em última análise,
“completamente determinado”, tal como a passagem sugere, então é interessante notar que se
chegou a essa posição sem observação. Como ele mesmo admite, os dados de seus
experimentos não podem provar o determinismo; eles podem apenas mostrar que o
reforçamento aumenta a probabilidade de certo comportamento ser emitido no futuro. Estes
dados nunca podem mostrar que as variáveis são metafisicamente determinadas, porque
somente probabilidades estão disponíveis a partir do método empregado. O que Skinner fez,
como a passagem indica, foi fazer inferências com base nos dados, porque ele não podia, de
fato, observar o que ele inferiu. Nesse sentido, Skinner poderia ser descrito como sustentando
uma posição sobre como ele acreditava que a natureza estaria operando – de modo oposto ao
que ele podia, de fato, observar em seus dados (Moxley, 1992).
Por outro lado, se Skinner fosse um probabilista metafísico, então outras implicações
potencialmente problemáticas surgem. Como notamos, o probabilismo metafísico alega que
fatores ambientais específicos não eliciam exatamente a mesma resposta todas as vezes.
Fatores ambientais podem inclinar um organismo na direção de certo comportamento sem que
isso seja necessário12. Isto permite previsões cruas ou grosseiras, mas deixa de fora previsões
exatas, porque eventos probabilísticos poderiam sempre ter ocorrido de outra maneira,
conforme Rockwell (1994) observou. É claro, se eventos de fato podem ocorrer de outra
forma, então o comportamento de uma pessoa pode ocorrer de modo diferente do que seria

12
Nota do tradutor: Aqui, o uso do termo “necessário” faz referência à cláusula da necessidade de relações de
causalidade entre eventos. Quando há uma relação de necessidade entre dois termos, a existência de um é
obrigatória para que se constate a existência de outro.
previsto probabilisticamente. Isto é, o behaviorista radical somente seria capaz de prever
certas tendências gerais, ou inclinações da pessoa, dada a sua história de condicionamento,
mas mesmo tal previsão poderia ser violada em qualquer instância13 particular.
Assim, a pessoa seria imprevisível em princípio, porque o comportamento da pessoa é
sempre e em todo lugar composto de instâncias particulares. O experimentador nunca poderia
saber com certeza quando a pessoa iria se comportar em consonância com as tendências por
ele ou ela previstas, e quando a pessoa iria se comportamento de modo diferente das
tendências previstas. De fato, de acordo com o probabilismo metafísico, a pessoa poderia agir
diferentemente em cada momento, e então frustrar mesmo afirmações de “probabilidade
crescente”, porque a pessoa pode sempre agir de outra forma em relação ao comportamento
que é mais provável.
A maioria dos probabilistas metafísicos alegariam que esse “agir de outra maneira” é
improvável; eles acreditam que as pessoas tendem a permanecer consistentes com suas
tendências (Alessi, 1992; Neuringer, 1991b). Ainda assim, essa é uma suposição em vez de
um fato empírico, porque o probabilismo metafísico nunca pode descartar a possibilidade de
uma reviravolta de eventos completamente imprevisível em qualquer ponto. Nesse sentido, a
pesquisa pode somente indicar o que já ocorreu, não o que irá ocorrer. E embora previsões do
comportamento podem se tornar razoavelmente acuradas – com, digamos, uma pessoa agindo
de acordo com sua história de condicionamento por anos – essa pessoa pode agir de outro
modo em relação ao previsto em qualquer ponto com a ajuda de um fator perpétuo de acaso.
Já foi sugerido que essa imprevisibilidade e o fator “agir de outra forma” fornecem aos
pesquisadores o espaço conceitual necessário para admitir a possibilidade do livre-arbítrio.
Rockwell (1994) argumentou, por exemplo, que, como o condicionamento operante é apenas
probabilístico, não fornece razão para se rejeitar o livre-arbítrio. Ele afirmou: “Mas se o
impacto do condicionamento operante é somente probabilístico, cada [organismo] poderia ter
agido diferente mesmo se seus ambientes fossem exatamente os mesmos” (p. 64). De fato,
“ser capaz de agir de modo diferente, mesmo com tudo em volta sendo igual” é uma definição
comum de livre-arbítrio (cf. Howard, 1994; May, 1969; Rychlak, 1992, 1993; Slife & Fisher,
no prelo; Slife & Williams, 1995; Valentine, 1992, p. 8; Van Inwagen, 1986; Viney &
Crosby, 1994). Rockwell prossegue, argumentando que os próprios dados de Skinner

13
Nota do tradutor: Quando utilizam o termo “instância”, os autores se referem à uma forma específica de
produção de consequências no âmbito do comportamento operante. Segundo Reis e Laurenti (2019), operantes
podem ser entendidos como instâncias quando estamos nos referindo à emissão de uma única resposta que
produz consequências. Como explicam os autores: “Uma instância é definida pela ocorrência de dada ação com
tempo e local determinados, e nota-se que só poderá ser tratada como tal quando em relação com um estímulo
controlador ou com uma consequência por ela produzida (Skinner, 1953, 1969)” (Reis & Laurenti, 2019, p. 100).
mostram que o comportamento humano e animal, diferentemente do movimento de objetos
inanimados, não é determinado causalmente do mesmo modo naturalístico e determinístico.
O problema é que o livre-arbítrio tipicamente representa algum tipo de causa não-
causada, algum tipo de agência interna14 que é, em si mesma, a causa iniciadora dos eventos
(cf. Slife & Fisher, no prelo). Behavioristas radicais que endossam o probabilismo metafísico
geralmente postulam algum gerador de imprevisibilidade que determina a variação (e.g.,
Neuringer, 1991a). Embora essa variação seja, em princípio, imprevisível, ainda é produzida
por outra fonte que determina como é sua imprevisibilidade. Nenhum livre-arbítrio em
qualquer sentido convencional parece ser possível. Ademais, mesmo aqueles que advogam em
favor do livre-arbítrio (e.g., Howard, 1994; Rychlak, 1979; 1994) não o veem como uma
imprevisibilidade completa, mas sim como um tipo diferente de causalidade e, portanto,
determinismo (e.g. “causalidade final”, em oposição à “causalidade eficiente”15). O livre-
arbítrio, para eles, requer um propósito16 (e uma teleologia17) que processo caóticos e
estocásticos teriam dificuldade em produzir (Howard, 1994; Rychlak, 1981; 1988).

Determinismo Científico

Questões metafísicas, tais como as já expostas, levaram alguns behavioristas radicais a


rejeitar formas metafísicas de determinismo (acima) (e.g., Gazda & Corsini, 1980; Mazuer,
1986; Vorsteg, 1974). Eles consideram desnecessário isolar um conjunto físico de variáveis e
afirmar que elas determinam ou causam probabilisticamente outras variáveis. Seguindo
vagamente uma distinção proposta por filósofos da ciência tais como Toulmin (1953) e
Watkins (1958), estes behavioristas optam pelo determinismo científico ou metodológico.
Deterministas científicos distinguem os resultados de seus métodos de afirmações metafísicas
sobre a realidade. Eles acreditam que o mundo é mais bem estudado por meio da aplicação
cuidadosa do método científico. Previsões acuradas podem seguir-se deste estudo sistemático,

14
Nota do tradutor: Ver nota 7.
15
Nota do tradutor: A causa final representa o propósito da realização de um ato. Por exemplo, jogar a pedra na
janela para quebrar o vidro; o vidro estilhaçado representa a causalidade final. A causa eficiente representa o
agente que determina o fenômeno considerado, aqui no caso, o indivíduo humano.
16
Nota do tradutor: O termo original em inglês aqui é purposefulness, que em uma tradução mais direta seria
equivalente ao termo determinação. No entanto, neste contexto de discussão, a palavra propósito parece
expressar melhor o argumento delineado pelos autores, qual seja, o de que a noção de livre-arbítrio rejeita
qualquer tipo de determinação – seja ambiental ou genética – baseando-se, somente, na “vontade” ou “desejo”
individual.
17
Nota do tradutor: Do grego “finalidade” e “logia”, o termo se refere ao estudo filosófico dos fins, ou seja, do
propósito ou objetivo. Em linhas gerais, a noção de teleologia indica qualquer tipo de finalidade, meta, ou
objetivo que guiaria as ações individuais, considerando tal fim como princípio explicativo das ações em questão.
conforme tendências históricas são utilizadas para antecipar as respostas ainda não evocadas
do organismo.
Entretanto, essas premissas (e.g., previsibilidade) são puramente metodológicas para o
determinista científico; elas são inerentes ao método científico e seu uso, e não precisam ser
estendidas à realidade em si mesma. Deterministas científicos então sustentam que a previsão
de futuros estados de um sistema é possível, mas nenhuma declaração concernente ao status
metafísico da realidade ou ao status ontológico do determinismo é requerida. Mazur (1986)
argumentou dessa forma:
É necessário ser um determinista [metafísico] para perseguir o tipo de análise
científica do comportamento que é descrita [aqui]? Certamente não.
Independentemente de sua crença religiosa, ou de suas convicções filosóficas, você
pode se beneficiar de ler este livro contando que esteja disposto a observar que há
alguma regularidade e previsibilidade no comportamento de ambos, humanos e não
humanos . . . Podemos proceder dessa maneira sem tomar partido em relação à
controvérsia do livre-arbítrio/determinismo. (p. 17)
Outros na literatura concordam com Mazur. Gazda e Corsini (1980), por exemplo,
argumentaram que o livre-arbítrio não terá lugar na Análise do Comportamento como um
aspecto gerado evolutivamente de nossa dotação genética. Ainda assim, eles afirmam que o
status metafísico do livre-arbítrio ou do determinismo é, em sua maioria, irrelevante ao
avanço da Análise do Comportamento:
Que o comportamento humano é determinado, ou ao menos previsível, não é, é claro,
um fato empírico a ser confirmado ou refutado. É uma suposição com a qual a
abordagem científica geralmente procede . . . Entretanto, a teoria operante forneceu
muitas aplicações de seus princípios em situações humanas práticas. Prever e controlar
o comportamento humano em tais contextos é um teste severo de adequação dos
princípios comportamentais. (1980, p. 170)
O determinismo científico (ou probabilismo científico18) fornece uma posição que
muitos na disciplina podem considerar ser a mais palatável, porque assume um método

18
Nota dos autores: Uma divisão entre o determinismo científico e o probabilismo científico poderia ser paralela
à divisão entre o determinismo metafísico e o probabilismo metafísico. O determinismo científico faria
psicólogos perseguirem compreensões completas e perfeitas em princípio, enquanto o probabilismo científico
argumentaria que somente correntes probabilísticas podem ser aduzidas (mesmo que se assuma que a natureza
em si mesma seja determinada). Isto é, alguns pesquisadores poderiam assumir o determinismo como uma
conveniência metodológica e ainda acreditar que somente estimativas e previsões probabilísticas – em vez de
perfeitas – de comportamentos futuros podem ser obtidas a partir de nossa metodologia e instrumentação atuais.
Assim, a subcategoria do determinismo científico (como descrita neste artigo) incluiria teóricos que veem o
determinismo como um ponto de partida metodológico razoável, mas que não desejam fazer afirmações acerca
“neutro” – um método que supostamente não faz alegações (ou afirmações) sobre o mundo
que investiga. O método converge com fatos científicos, mas o faz sem decidir de antemão a
natureza destes fatos, ou legislando em favor de qualquer visão metafísica da realidade a
priori. Tal abordagem foi reclamada por uma variedade de psicólogos, de humanistas (e.g.,
Rychlak, 1988) a behavioristas (e.g., Mazur, 1986), como uma forma de evitar a metafísica
especulativa.

Implicações do Determinismo científico

Essa evitação da metafísica é atraente para alguns behavioristas radicais por muitas
razões. A primeira delas seja talvez representada pela unidade e objetividade que poderiam
ser trazidas para a psicologia e para a Análise do Comportamento. Proponentes de até mesmo
teorias não convencionais em psicologia, tais como o livre-arbítrio e a espiritualidade,
poderiam presumivelmente trabalhar dentro da comunidade de analistas do comportamento,
porque a natureza metafisicamente neutra da Análise do Comportamento não excluiria tais
concepções a priori. Nesse sentido, advogados do determinismo científico poderiam
promover um tipo de unidade científica por meio da aderência a regras e premissas da ciência
comumente aceitas em vez de em função de qualquer instância filosófica ou metafísica em
particular. Ademais, a investigação – em vez da filosofia – seria a juíza primária de validação.
Por mais positivo que isso pareça ser a alguns, muitos obstáculos teriam de ser
superados antes que este tipo de unidade e juízo pudessem ser alcançados. Alguns psicólogos,
por exemplo, argumentaram que métodos experimentais têm sido inapropriadamente
confundidos com certas teorias (e.g., Rychlak, 1988). Isto é, a neutralidade básica destes
métodos – necessária a qualquer determinismo científico – foi, em alguns contextos,
comprometida pela superposição ilícita de teoria sobre método. Como o historiador e filósofo
Edwin Burtt (1954) uma vez afirmou, há “forte e constante tentação em fazer uma metafísica
a partir do método [de alguém]” (p. 229). Em outras palavras, pesquisadores são tentados a
confundir suas próprias teorias e filosofias com seus métodos, e então enviesar uma
ferramenta de investigação que, não fosse isto, seria neutra.

das causas últimas dos seres humanos e que não acreditam que a Análise do Comportamento irá produzir nada
além de estimativas probabilísticas sobre o comportamento de um organismo.
Rychlak (1988), por exemplo, argumentou que o pareamento essencialmente neutro
VI-VD19 do método experimental foi historicamente confundido com a teoria do estímulo-
resposta de certos tipos de behaviorismo. Método e teoria se tornaram, com efeito, sinônimos:
variáveis independentes são simplesmente estímulos, e variáveis dependentes são
simplesmente respostas (e.g., Rychlak, 1988). Como resultado, uma noção metafísica (a de
que estímulos e respostas de fato existem, e que um determina o outro) foi forçada a se tornar
um arranjo experimental VI-VD supostamente neutro.
Como tal, o método pode somente corroborar a hipótese estímulo-resposta, e teorias
que não subscrevem a estímulos e respostas são excluídas antes que qualquer investigação
ocorra. Além disso, abordagens estímulo-resposta tornam-se difíceis de se falsear, porque são
assumidas a priori e confundidas com o método em utilização. Nesse sentido, um obstáculo
principal ao projeto do determinismo científico é o desentrelaçamento de tais compromissos
teóricos (e metafísicos) de uma ferramenta investigativa ostensivamente neutra.
Outros acadêmicos contemporâneos problematizaram a própria questão da
neutralidade metafísica (Hesse, 1980; Kuhn, 1970; Kukla, 1989; Lakatos, 1970; Robinson,
1985; Slife, 1993; Slife & Williams, 1995, 1997). De fato, tais acadêmicos argumentaram que
é ingênuo, se não inteiramente ilusório, argumentar que o método – qualquer método – age
como uma ferramenta investigativa metafisicamente neutra (cf. Czubaroff, 1991). Para serem
efetivos, todos os métodos fazem afirmações sobre a natureza do mundo que têm intenção de
investigar. Todos os métodos foram formulados para serem efetivos em um mundo particular
que foi assumido antes de que os métodos fossem utilizados para se investigar tal mundo.
De acordo com estes comentadores, todos os métodos são produtos de filosofias, e
todas as filosofias têm certos vieses que os métodos incorporam, estejamos nós (usuários dos
métodos) cientes deles ou não. Estas premissas – ontologia, causalidade, tempo,
epistemologia, e assim por diante – são elas mesmas noções metafísicas que informam e
modelam os tipos de abordagens apresentadas a partir da aplicação desses métodos.
Diferentes métodos, baseados em suposições fundamentalmente diferentes sobre o mundo,
produzirão diferentes tipos de resultados. Suposições metodológicas e, portanto,
compromissos metafísicos, não podem ser evitadas.

19
Nota do tradutor: As siglas VI e VD representam, neste trecho, os conceitos de Variável Independente (VI) e
Variável Dependente (VD). VIs e VDs são conceitos utilizados em contexto experimental para designar os tipos
de variáveis que estão sendo estudadas. VDs representam, tipicamente, elementos do comportamento estudado,
tais como respostas do organismo. VIs são, por sua vez, representantes das variáveis a serem manipuladas pelo
experimentador em contextos de investigação acerca de seus efeitos sobre o comportamento.
Dessa perspectiva, a tentativa de deterministas científicos de objetificar o método, ao
menos para desembaraçar a metafísica do método, está condenada ao fracasso. Como o
filósofo Karl Jaspers (1954) certa vez observou, “Não há escape da filosofia. A questão é
somente se [a filosofia] é consciente ou não, se é boa ou má, confusa ou clara. Qualquer um
que rejeita a filosofia está, ele mesmo, inconscientemente praticando uma filosofia” (p. 12).
Nesse sentido, a noção de que alguém tem um método metafisicamente neutro é pior do que
um audacioso comprometimento metafísico, porque representa a prática de um
comprometimento sem consciência.
Se tais comprometimentos realmente existem, e não são especificamente reconhecidos
no behaviorismo radical, então eles não podem ser discutidos, examinados, ou comparados no
contexto mais amplo de se aprender teoria. Um comprometimento metafísico explícito é,
portanto, preferível a um comprometimento metafísico implícito que é manifestado sem se ter
conhecimento em um método particular. Se estes acadêmicos estão corretos, e
comprometimentos metafísicos são inevitáveis, então a alegação em favor do determinismo
científico deve ser considerada com cuidadosa deliberação.

Interdependência Funcional

Uma quarta e final categoria de determinismo diz respeito à noção de interdependência


funcional. Esta noção se origina no trabalho no notável físico Ernst Mach (1959), e envolve
outra abordagem para evitar suposições metafísicas. A argumentação de Mach sobre a
causalidade, que foi, em si mesma, influenciada pela filosofia empirista de David Hume, é a
de que nunca podemos conhecer causa e efeito. Ou melhor, o que podemos conhecer é a
constante conjunção de eventos físicos.
Por exemplo, se vemos uma bola de bilhar correr ao longo de uma mesa e acertamos
uma segunda bola em uma caçapa, não poderíamos dizer que a primeira bola causou o
movimento da segunda bola. Hume diz que nós não vemos de fato a primeira bola produzindo
o movimento da segunda. Tudo o que vemos é uma bola rolando ao longo de uma mesa, um
barulho quando essa bola se aproxima da segunda bola, e então o movimento da segunda bola
rolando até a caçapa. Estas experiências certamente sugerem que o movimento da primeira
bola produziu o movimento da segunda. Entretanto, as mesmas experiências sensórias são
também consonantes com eventos que não acarretam tal produção. Por exemplo, ambas as
bolas poderiam ser controladas por imãs escondidos, e o som gerado por um autofalante.
Além disso, de acordo com Hume, conduzir este experimento de bolas de bilhar muitas vezes
e atingir a correlação perfeita destas experiências sensíveis nunca forneceria evidência
suficiente para garantir um status causal.
Quando essa perspectiva é aplicada à Análise do Comportamento, o trabalho do
behaviorista radical não é descobrir a causalidade, mas descrever relações funcionais
ocorrendo entre o organismo e o ambiente (Chiesa, 1992, 1994; Delprato & Midgely, 1992;
Miller, 1994; Moxley, 1992; Smith, 1986). Um exemplo proeminente é a concepção da
contingência de três termos (e.g., Baum, 1994; Chiesa, 1994; Skinner, 1957, p. 31). Partindo
dessa concepção, cientistas deveriam somente – e, em alguns casos, podem somente –
procurar pelas relações contingentes ou funcionais que ocorrem entre ambiente e organismo, à
medida que elas sistematicamente covariam20. Além disso, o tradicional vocabulário “causa e
efeito” da ciência é abandonado dentro desta visão. Conforme apontou Chiesa: “. . . uma
causa é substituída por uma mudança na variável independente, e um efeito por uma mudança
na variável dependente, o que, por sua vez, substitui a conexão causa-efeito pela relação
funcional” (1994, p. 113). Dessa perspectiva de interdependência funcional, então, a
explicação é substituída pela descrição. A necessidade de explicar como um evento causa
outro é eliminada, porque é trata-se de uma descrição de função em vez de uma relação causa-
efeito.

Implicações da Interdependência Funcional

A implicação mais óbvia da interdependência funcional é que o determinismo


tradicional, baseado em relações de causa-efeito, é eliminado. Teóricos que advogam em
defesa da interdependência funcional especificamente rejeitam a causalidade, argumentando
que ela impõe um status não garantido em qualquer evento. Dizer, por exemplo, que o
ambiente é responsável ou determinante do comportamento, garante um status causal ao
ambiente. Entretanto, como Mach e Hume e outros argumentaram, este status não pode ser
observado; somente a covariação entre ambiente e comportamento pode ser observada.
Mesmo a maioria dos testes estatísticos são baseados, em última análise, em modelo linear e,
portanto, correlacional. Como, então, o pesquisador justifica a alegação de status causal? Da

20
Nota do tradutor: O termo originalmente utilizado aqui é covary. Como não há palavra correspondente no
português que se aproxime de seu significado original, convencionou-se traduzir desta maneira. O termo
covariação, portanto, neste contexto, lança luz sobre o fato de que a relação entre organismo e ambiente ocorre
em termos de variações simultâneas, não sendo possível isolar um do outro, nem tampouco analisá-los sob a
lógica de causa-efeito.
perspectiva da interdependência funcional, o pesquisador pode somente focar em como
eventos se correlacionam ou covariam.
As implicações da interdependência funcional para o behaviorismo radical foram
exploradas por Chiesa (1992, 1994), que alega que a interdependência funcional requer uma
mudança no foco e visão de mundo de muitos analistas do comportamento. Pesquisadores
afeitos à interdependência funcional devem evitar conceder qualquer tipo de status
privilegiado (ou causal) a certas variáveis sobre outras variáveis. O trabalho de um cientista é
descobrir relações entre variáveis observáveis, enquanto evitando as muitas variações de
relações causa-efeito, tais como “responsáveis por”, “determinante de”, e assim por diante.
O próprio Skinner aclamou Mach como uma de suas influências primárias. Skinner
considerou a interdependência funcional? Chiesa parece acreditar que sim (ver também
Moxley, 1992, sobre este ponto). Por exemplo, ela menciona Skinner dizendo que:
Podemos agora considerar aquela visão de explicação e causalidade mais modesta que
parece ter sido sugerida primeiramente por Mach e é agora uma característica comum
do pensamento científico em que, em uma palavra, explicação é reduzida à descrição e
a noção de função substitui aquela da causalidade. (1994, p. 113)
Uma das dificuldades da interdependência funcional ainda permanece consistente com
seus princípios. Como Hume (1911) e comentadores mais recentes observaram (e.g., Moxley,
1992), há uma grande tentação em garantir status causal a certos fatores. O próprio Skinner
pode ter sofrido dessa inconsistência. (Isto pode explicar sua possível inclusão em pelo menos
três de quatro categorias de determinismo). Mesmo no trabalho mais tardio de Skinner, vemos
todo tipo de declaração de causa-efeito:
O comportamento operante é chamado de voluntário, mas não é realmente não-
causado; a causa é simplesmente mais difícil de se localizar. (Skinner, 1974, p. 60)
A Análise Experimental do Comportamento vai diretamente para as causas
antecedentes no ambiente. (Skinner, 1974, p. 34)
A própria abordagem de Chiesa à interdependência funcional também parece
evidenciar essa inconsistência. Similarmente à Skinner, ela não parece resistir à tentação de
garantir status causal ao ambiente. Isto é talvez mais claro em sua alegação de que “O
comportamento (a pessoa) está em posição de variável dependente com relação aos eventos
ambientais entendidos como variáveis independentes” (p. 122). Embora ela não utilize as
terminologias determinística ou de causa-efeito per se, sua terminologia metodológica
claramente trai o status que ela garante ao ambiente.
Estabelecer o ambiente como uma variável independente o atribui status causal por
dois motivos. Primeiro, a variável independente é manipulada, e pensa-se que seja
responsável por determinar as mudanças na variável dependente. Essa dependência em
relação à variável independente é, afinal, a razão pela qual essa variável é chamada de
variável “dependente”. Segundo, não há reciprocidade na relação variável independente-
variável dependente. Conforme o campo do delineamento experimental passou a ser
conhecido e compreendido, a variável dependente nunca foi considerada como sendo a causa
da variável independente, nem se pensou que a relação metodológica entre variáveis
independentes e dependentes era recíproca ou bidirecional. Nesse sentido, o uso de Chiesa das
metáforas para descrever uma relação funcional sugere que os significados de causa-efeito da
ciência tradicional foram, ao menos, implicitamente apoiados pela interdependência
funcional.
Outro problema da interdependência funcional diz respeito à questão do antecedente.
Antecedentes envolvem a tentação de atribuir algum tipo de status – seja pela causalidade,
determinismo ou uma variável independente – ao evento que ocorre primeiro (Slife, 1993).
Como o ambiente parece agir primeiro sobre o organismo, e então (em momento posterior)
uma mudança comportamental acontece, a tentação é considerar o ambiente como agente
causal. Um teórico da interdependência funcional, entretanto, não pode endossar eventos com
status causal somente porque eles precedem outros eventos no tempo (e.g., a primeira bola de
bilhar a rolar). Mach (1959) utilizou as engrenagens enredadas de um moinho para ilustrar
este problema. Apenas porque nós observamos uma das engrenagens se movimentar primeiro,
isso não significa que ela causa o movimento mútuo das engrenagens. A observação desse
movimento poderia ser o primeiro evento de uma interdependência funcional em vez de uma
relação causal.
O físico e filósofo Mario Bunge (1963) nota como frequentemente essa confusão entre
antecedente e causa ocorre: “A confusão entre antecedente e causa é tão comum que filósofos
acharam necessário, há muito tempo, cunhar uma frase para demarcar essa falácia – qual seja,
post hoc, ergo propter hoc” (depois disto, então por causa disto) (p. 189). O ponto é que
aqueles que argumentam em favor de uma visão de interdependência funcional do
determinismo não podem cair nessa tentação falaciosa. O principal ponto da interdependência
funcional é que eventos são apenas isso, interdependentes funcionalmente. Todos os fatores
na questão requerem que outros fatores existam funcionalmente, para que nenhum clame um
status privilegiado, independentemente de sua ordem observada ao longo do tempo (Slife,
1993).
Parte da tentação de atribuir um status privilegiado (ou causal) pode vir da natureza de
uma apreciação de interdependência funcional pura do mundo: ou seja, não é muito
heurística. Em algum nível, a asserção (ou conclusão) de que o comportamento e o ambiente
são “funcionalmente interdependentes” alega o óbvio. O se ganha com tal asserção? Essa
pode ser a razão pela qual pesquisadores, tais como Skinner e Chiesa, inevitavelmente
escorregam e caem em uma linguagem de causa-efeito e metáforas em suas abordagens. Estes
pesquisadores podem sentir que a funcionalidade não explica completamente a
interdependência de variáveis, ou não acrescenta o suficiente ao que já sabemos. Algum tipo
de metafísica determinística ou causal pode ser necessária para uma compreensão empírica
útil e heurística. Como o próprio Skinner afirmou:
[A ciência] é mais do que a mera descrição de eventos conforme ocorrem. É uma
tentativa de descobrir ordem, de mostrar que certos eventos estão em relação nômica
com outros eventos . . . Se vamos utilizar os métodos da ciência no campo dos
assuntos humanos, devemos assumir que o comportamento é nômico e determinado.
(Skinner, 1947, p. 6)
Nesse sentido, os problemas da interdependência funcional podem se originar do
desejo de se escapar de conceitos metafísicos. Este desejo é refletido nas tentativas de alguns
pesquisadores de serem puramente descritivos, e então evitar de vez a metafísica (e.g., Chiesa,
1994, p. 113). Como mencionado com respeito ao determinismo científico, muitos filósofos
da ciência, entretanto, questionam se esse desejo poderá, algum dia, ser realizado (e.g.,
Popper, 1959; Lakatos, 1970). Eles afirmam que o método científico é em si mesmo um
instrumento de metafísica (e.g., que a variável dependente é “dependente”). Este instrumento
não foi em si mesmo criado a partir de uma descrição pura ou método objetivo; o método
científico não foi em si mesmo empiricamente validado. O método científico tradicional foi
inventado por filósofos com certas premissas sobre o mundo (Polkinghorne, 1983). Como tal,
o método não é uma janela transparente à realidade, e por isso não pode gerar uma descrição
transparente para ela.
O resultado é que o método científico pode não ser capaz de uma proposição de
interdependência funcional pura da relação comportamento/ambiente. O método pode ter
muitas concepções metafísicas impregnadas nele para que seja possível tal empreitada
descritiva. Mesmo que tais elementos metafísicos pudessem ser libertos dos métodos
utilizados, não está claro, de modo algum, que uma descrição pura seria desejável. A ciência,
e por extensão, a Análise do Comportamento, pode precisar fornecer mais do que as muitas
formas a partir das quais o comportamento e o ambiente são funcionalmente interdependentes.
A investigação científica pode requerer alguma explicação dessa “interdependência
funcional” e, portanto, uma compreensão mais rica sobre seu uso em contextos terapêuticos e
educacionais.

Conclusão

O acima exposto identificou quatro amplas categorias para organizar os diferentes


tipos de determinismo aparentes na literatura behaviorista radical. As implicações que
acompanham cada uma dessas categorias são planejadas para clarificar o significado de cada
uma das categorias e alertar os pesquisadores em relação à possíveis problemas que surgem
dos níveis teórico e metodológico. Esperamos que esta taxonomia facilite a discussão aberta
sobre a potencial força e limitações de cada categoria, assim como um melhor entendimento
de preceitos teóricos que subjazem às ideias behavioristas radicais. Enquanto nenhuma
categoria de determinismo é privada de suas implicações, esperamos que esta taxonomia
possa permitir que pesquisadores selecionem a posição (e implicações) que forneça a melhor
fundação teórica para sua pesquisa e teorização particulares.
Suspeitamos que mais categorias tenham que ser adicionadas a esse sistema de
classificação, ou que alguma revisão possa ser necessária com a pesquisa e teorização
continuadas. Também suspeitamos que alguns teóricos e pesquisadores irão se encaixar, ao
menos de modo pouco preciso, em mais de uma categoria. A sobreposição21 de Skinner é
especialmente digna de se notar nesta consideração. Como um dos fundadores do
behaviorismo radical, seus muitos trabalhos podem ser plausivelmente incluídos em pelo
menos três das categorias taxonômicas. As razões dessa sobreposição, entretanto, requiririam
um outro artigo. Elas vão da complexidade da teorização de Skinner, à possível ambiguidade
de suas concepções em relação aos problemas inerentes desta taxonomia. Certamente, um
problema fundamental é a ortogonalidade destas categorias. Embora estas categorias sejam
amplamente utilizadas em círculos teóricos e filosóficos (cf. Valentine, 1992), sua
independência está evidentemente em questão. É possível, por exemplo, abraçar ambos, o
determinismo metafísico e a interdependência funcional?
Finalmente, algum fluxo das categorias ao longo do tempo é antecipado. A história
indica que tendências gerais a respeito de como o determinismo é conceitualizado modificam-
se e evoluem com as mudanças nos contextos da ciência (e.g., Chiesa, 1992). De fato, a

21
Nota do tradutor: Em relação às categorias de determinismo expressas neste artigo.
evanescência da ciência, e a contínua exploração e descoberta, demandam que qualquer
taxonomia teórica esteja aberta à revisão ou definitiva rejeição. A natureza flexível da
presente taxonomia assegura que alteração e revisão são possíveis à medida que prossiga o
diálogo acerca destas questões.

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