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Universidade Católica de Moçambique

Faculdade de Direito

A gestão do domínio público das autarquias locais‫ ׃‬sua implicação e desafios futuros

Nelson Tarcísio

Nampula, Abril de 2023


Nelson Tarcísio

A gestão do domínio público das autarquias locais‫ ׃‬sua implicação e desafios futuros

Trabalho de carácter avaliativo da cadeira


de Administração Autárquica, leccionada
pelo docente‫ ׃‬Aboochama Vontade

Nampula, Abril de 2023


Índice

Introdução.............................................................................................................................. 4

1. A gestão do domínio público das autarquias locais‫ ׃‬sua implicação e desafios futuros ..... 5

1.1. Política governamental ............................................................................................. 6

1.2. A Lei dos órgãos locais ............................................................................................ 6

2. Desafios de contexto e oportunidades.............................................................................. 7

2.1. Contexto socioeconómico de globalização ............................................................... 9

Conclusão ............................................................................................................................ 12

Referências bibliográficas .................................................................................................... 14


Introdução
O presente trabalho aborda sobre “A gestão do domínio público das autarquias locais‫ ׃‬sua
implicação e desafios futuros” como requisito parcial para a avaliação da cadeira de
Administração Autárquica. Enquanto matéria de grande importância para o ensino e
aprendizagem da mesma. Durante a realização do tema em alusão debruçou – se sobre a
política governamental, a lei dos órgãos locais, desafios futuros para as autarquias.

Um dos grandes desafios para que a descentralização seja realmente efectiva, é que as
autarquias locais disponham de recursos que lhes permitam desenvolver o seu programa de
actividades em boas condições.

Em outros termos, se as autarquias locais não dispusessem de recursos suficientes, a sua


existência seria apenas uma ficção. Não é suficiente de ter largas competências, é necessário,
também, dispor de meios financeiros próprios, ou seja, criar as condições da sustentabilidade
financeira do exercício dessas competências.

Nesta perspectiva, a descentralização como um todo, é eficiente se as autarquias locais


dominarem, verdadeiramente, as suas finanças.

Quanto a estrutura o trabalho está organizado da seguinte forma: capa, introdução onde
trazemos de forma sintética os aspectos que serão abordados no decorrer da pesquisa;
desenvolvimento que é fundamentação teórica, conclusão onde vai encontrar o que se
entendeu depois da realização do trabalho; por fim a bibliografia donde espelham-se as
referências que usamos na elaboração desta pesquisa.

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1. A gestão do domínio público das autarquias locais‫ ׃‬sua implicação e desafios
futuros
De acordo com o Ministério do Plano e Finanças da República de Moçambique (2004)

“A articulação do processo de planeamento e gestão orçamental das autarquias


com o sistema nacional é um grande desafio, caso estes órgãos recentemente
criados venham a crescer e a desenvolver – se. Há duas opções para que isso
seja possível. Por um lado existem condições para uma coordenação
mutuamente vantajosa no planeamento entre as autarquias e os níveis
subnacionais do sistema macro – estatal, por outro lado há necessidade de
reconhecer plenamente na prática a autonomia das autarquias e as suas
competências e aumenta – las se tal for apropriado ”(p.118).

Acrescenta que a necessidade de uma abordagem coordenada para o planeamento é


particularmente aguda em certas circunstâncias. Exemplo disto são‫ ׃‬primeiro, no caso das
povoações onde a autarquia abrange a sede distrital e os seus arredores imediatos, a
administração distrital e a autarquia tem responsabilidades concorrentes, no que diz respeito
por exemplo ao abastecimento de água.

Esta é uma anomalia que deveria ser resolvida pela eliminação da sobreposição de
competências que dispersa a já fraca capacidade dois órgãos numa área geográfica contígua.

Haverá quem argumente que dada a falta de capacidade das autarquias nestas povoações, as
competências devem ser transferidas para os distritos. No entanto, isso iria reduzir ainda mais
o já limitado papel das autarquias, além disso, também pouca a capacidade dos próprios
distritos.

No mínimo deveria haver uma cooperação e uma coordenação estreitas entre estes dois órgãos
de modo que os recursos disponíveis pudessem ser utilizados tao eficientemente quanto
possível. Pode dar – se o caso de por exemplo certos serviços ou funções serem solicitados
pela autarquia ao distrito, ou vice-versa, evitando – se uma sobreposição de funções dentro de
uma determinada área geográfica.

Segundo Ministério do Plano e Finanças da República de Moçambique (2004), há outras áreas


onde mesmo sem responsabilidades concorrentes, é necessária alguma coordenação, como por
exemplo no que diz respeito ao funcionamento do mercado municipal, dado que muitos dos

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produtos vendidos e muitos vendedores provem de zonas do distrito, mas localizadas fora dos
limites da autarquia.

1.1. Política governamental


Tanto as administrações distritais como as autarquias entrevistadas no decurso deste estudo
manifestaram o desejo de uma maior coordenação nestas áreas. Até certo ponto, isto pode vir
a acontecer como correr do tempo, tal como os conflitos iniciais entre distritos e as autarquias
sobre afectação de pessoal e as instalações foram resolvidos, tendo – se criados um modus
vivendi.

Também pode ser útil rever a metodologia de produção dos planos distritais de
desenvolvimento para que estes tenham em conta as autarquias sempre que estas se
sobreponham a parte do território distrital

Mas adiante o Ministério do Plano e Finanças da República de Moçambique (2004), da um


outro exemplo da necessidade de uma nova abordagem coordenada do planeamento diz
respeito aos municípios, equivalentes as autarquias que herdaram as competências dos
extintos conselhos executivos. Com efeito, os municípios partilham o mesmo território com
os Governos distritais (ou, no caso de Maputo, com o Governo provincial).

Estes últimos detêm as responsabilidades do sistema macro – estatal e dos respectivos


ministérios sectoriais, através das suas estruturas desconcentradas. Por exemplo, os
representantes dos ministérios da Educação e da Saúde nos municípios prestam contas em
sentido ascendente, seguindo as hierarquias sectoriais.

1.2.A Lei dos órgãos locais


A medida que as autarquias crescem em termos de capacidade e de população, vão surgindo
condições para a transferência de mais responsabilidades para elas. A vantagem é o aumento
da prestação de contas em sentido descendente.

Por exemplo a assembleia municipal numa cidade do tamanho de Maputo, Nampula, ou Beira
deveria ter algum grau de influência na prestação de serviços educacionais, o que poderia ser
concretizado através de por exemplo da transferência da responsabilidade pela prestação dos
serviços de ensino primário para o município, que passaria por sua vez, a receber maiores
transferências do Orçamento do Estado possivelmente consignadas para o ensino primário a
fim de cobrir os custos adicionais associados a gestão da rede de escolas primárias.
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Neste cenário, a competência do Ministério da Educação, no que diz respeito ao ensino
primário nos municípios, seria desempenhar um papel de apoio, de regulamentação e de
supervisão através de aquisição e distribuição dos livros escolares, formação de professores,
exames, inspecção escolar.

Os funcionários do Ministério da Administração Estatal asseguram que uma tal transferência


seria possível em termos constitucionais e legais. Contudo salientam que a Constituição exige
que o Estado central esteja representado em todos os níveis territoriais, porem esta questão
tem suscitado algum debate.

Será que os governadores provinciais já desempenham essa função em relação aos


municípios? Ou terá de haver sempre uma representação mínima do Estado central junto dos
municípios?

Dentro das próprias autarquias, há condições para aplicar uma metodologia mais elaborada de
planeamento territorial. No caso de Mocuba, a autarquia desenvolveu um sistema rotativo no
qual em cada ano, um grupo de bairros beneficia dos fundos de investimento FIL que o fundo
de iniciativa local.

Contudo em Nacala embora o município apresente um desempenho exemplar em termos de


geração de receitas, reconheceu – se que ele tinha ainda um longo caminho a percorrer em
termos de planeamento territorial ou de programação de iniciativas de desenvolvimento
dentro do território municipal. Este tipo de planeamento abriria a possibilidade de atribuir
pequenos fundos de desenvolvimento a cada bairro empregado metodologias participativas de
planeamento para decidir sobre o seu uso.

É de notar que esta abordagem foi experimentada em autarquias tais como a Ilha de
Moçambique no âmbito do Projecto de Apoio a Descentralização e Municipalização
(PADEM) financiado pela Suíça.

2. Desafios de contexto e oportunidades


No actual contexto político – económico, de globalização, de crise económica, mas também
tantas vezes de carências sociais graves, novos desafios se impõem às estruturas de governo
local e particularmente aos municípios.

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Primeiro dos desafios, que compete a todos, a todas as instituições públicas e nesse contexto
também aos municípios, parece residir na necessidade de inverter uma tendência generalizada
de afastamento por parte dos cidadãos da sua actividade e do exercício dos seus direitos, mas
também das suas responsabilidades políticas perante o sistema democrático vigente.

Para Santos (2005), a prova disso são os estudos que indicam o continuado afastamento dos
cidadãos dos actos eleitorais a que são chamados a manifestar a sua opinião. Apesar de este
fenómeno não ser exclusivo de Portugal e de, em outros países ter uma expressão mais
significativa, têm – se verificado um forte crescimento da abstenção, facto que deve merecer a
devida atenção.

Para Santos (2005:291), a globalização é também responsável por alguns dos efeitos que se
verificam nas democracias modernas. Para este autor, tais efeitos seguem duas linhas
aparentemente opostas, mas que na sua opinião são complementares. Numa perspectiva,
antevê um certo afastamento, em determinadas matérias, do centro de decisão política à escala
nacional, para uma escala supranacional, em resultado de um “alargamento” mesmo que
virtual das fronteiras (integração do país em órgãos de decisão supranacionais).

Em sentido oposto, antevê uma tendência para a revalorização e o reforço dos poderes dos
órgãos da administração local, fundamentando a sua opinião na proximidade destes órgãos
com os destinatários das respectivas medidas (aproximação aos centros de decisão) e no
potencial efeito de promoção da participação dos cidadãos.

Para além de antever estas perspectivas, que lançam necessariamente novos desafios à
administração, para este autor, existe hoje um reconhecimento generalizado de que é ao nível
do governo local e designadamente através dos municípios, que até hoje se tem exercido da
melhor forma, a aproximação entre os eleitos e os eleitores, aproximando os cidadãos da
concepção das políticas que se lhes destinam.

A este propósito o autor afirma que:


Com o poder local coincide a melhor democracia, porque é uma democracia de
proximidade, em contraponto da democracia de distanciamento, quando não de
alheamento, próprios da democracia representativa. Com o poder local
coincide a melhor forma de aproximar os eleitos dos eleitores, porque

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reciprocamente se conhecem, se influenciam e se esclarecem. (Santos,
2005:284).

Sendo os municípios as estruturas locais com competência para responder à generalidade dos
problemas que se colocam aos cidadãos e às colectividades no seu dia – a – dia, devido à sua
proximidade e ao conhecimento mais real das necessidades, aplicando o princípio
constitucional da subsidiariedade, é natural que os seus desafios e as suas responsabilidades
sejam também eles proporcionais ao acréscimo de competências.

Na opinião de Pereira e Castro (1985) “Como entidades públicas de administração, são as


Autarquias Locais que realmente têm a ver com o dia – a – dia de cada cidadão dizendo – lhe
bastante mais do que outras instâncias de poder, de facto mais longínquas e diluídas no que
respeita ao quotidiano das populações locais.” (p.13).

2.1.Contexto socioeconómico de globalização


O contexto socioeconómico de globalização provoca mudanças e desenvolvimento rápido na
sociedade actual, o que na opinião de Gómez (2006), são factores que induzem novos desafios
ao nível dos governos locais, os quais se vêm cada vez mais na necessidade de responder com
rapidez às mudanças de carácter social, económico, tecnológico e no âmbito da gestão
pública.

Este autor alerta para alguns desajustes entre a prática política e as suas estruturas
exemplificando o que sucede com a perda de operacionalidade e legitimidade do estado
nação, no âmbito da globalização e os reflexos que tal está a ter ao nível local.

Para este autor, a insuficiência financeira dos entes locais, a deficiente legislação, a inércia da
perspectiva ideológica neoliberal, a fragilidade de um tecido associativo fragmentado e com
dificuldades para se organizar e se adaptar às novas condições e o esgotamento de uma cultura
reivindicativa, são factores que promoveram a implantação de um modelo de gestão
empresarial dos governos locais, essencialmente nas grandes cidades e, em consequência de
uma visão muito distante da participação da cidadania.

Assim, num contexto de globalização, de perda de competências das estruturas de governo


central, mas com acréscimo ao nível das estruturas locais, parece ser inevitável a necessidade

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de “manter” equilibradas as contas públicas e de fazer coincidir, uma grande flexibilidade na
forma de organização das estruturas de governo locais, maior flexibilidade no seu modo de
gestão (o que não pode significar menor rigor na utilização das disponibilidades públicas,
antes pelo contrário deve originar mais e melhores sistemas internos e externos de controlo).

Deverão ocorrer maiores responsabilidades em áreas anteriormente da competência do


governo central, (particularmente na área social), maior abertura das instituições locais e dos
seus órgãos à discussão pública dos assuntos respeitantes à comunidade, bem como a
necessidade dos municípios virem a assumir maiores responsabilidades ao nível da cobrança
de impostos que sejam sua receita. Mesmo, no futuro, poderemos considerar como hipótese o
aumento da sua receita fiscal tendo em consideração a transferência de competências a que se
assiste e à aplicação do princípio da autonomia e independência financeira.

De acordo com Carvalho (2010), a este propósito parece oportuno tecer as seguintes
considerações:
A implementação das regiões administrativas seria sem dúvida uma forma de
descentralização de atribuições e competências do Estado. Contudo, a rejeição deste
processo impulsionou a reforma no sentido de uma descentralização directa da
administração central para a administração local e particularmente para os municípios;
Face à evolução das atribuições e competências transferidas da administração central
para os municípios deve questionar-se qual o papel de alguns organismos da
administração central (se se justifica ou não a sua coexistência ou se ficaram
desprovidos de competências) e ainda se não é necessário existir uma entidade que
coordene as políticas públicas a nível supramunicipal, mas simultaneamente infra
estadual.

Todos estes factores representam novos desafios que certamente conduzirão a uma gestão
mais próxima da sociedade e ao convite à maior participação e discussão pública dos cidadãos
e das suas estruturas sociais, de forma a tentar inverter a tendência de afastamento acima
referida. Acima de tudo representam um desafio à capacidade das organizações em geral, da
administração central e dos municípios em particular, para manterem uma dinâmica
socioeconómica local activa, que justifique e sustente a própria estrutura político-
administrativa e assim seja capaz de tornar mais democrático o sistema que assim se diz, mas

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que tantas vezes receia auscultar a opinião soberana do povo conforme determina a
Constituição.

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Conclusão
Chegados ao término do presente trabalho, foi importante compreender e sanar alguns
aspectos tais como‫ ׃‬O aumento das transferências do governo moçambicano para os governos
locais requer, do nosso ponto de vista, pelo menos três acções corajosas por parte do governo.

A primeira e o alargamento do quadro da descentralização fiscal existente, de forma a incluir


unidades distritais e subdistritos. Isto promoveria não só o seu direito legal a transferências e a
uma base fiscal própria, mas também a negociação de uma fórmula de partição da receita,
com vista a distribuição horizontal (geográfica) e vertical das receitas fiscais do Estado
central, que tenha em conta dados „objectivos‟, tais como território, dimensão populacional e
perfis de necessidades.
A segunda e o investimento em sistemas de Gestão de Finanças Publicas muito mais a medida
das necessidades dos governos locais e mais adequados a eles. Apesar de anteriores
programas apoiados por doadores terem investido recursos consideráveis na criação, testagem
e redimensionamento de, por exemplo, pacotes de gestão financeira municipal, incluindo a
harmonização com o sistema de Gestão de Finanças Publicas do governo central (e-
SISTAFE), não esta claro qual e a política do governo em relação a uma revisão do quadro
legal e institucional do e-SISTAFE para melhor servir as necessidades de ambos os tipo de
governos locais.

Um terceiro elemento importante neste contexto seria um fortalecimento substancial de


mecanismos de controlo financeiro interno, isto e, um exercício mais rigoroso e consequente
da função de tutela financeira do Ministério das Finanças, sobre as quase inexistentes
unidades de controlo interno nos municípios, bem como o investimento na capacidade de
auditoria externa da Secção de Auditoria Geral do Tribunal Administrativo.

Finalmente, dada a ausência de uma política e de uma estratégia de descentralização explícita,


seria importante, nesta fase do processo de descentralização, formular uma política que, sendo
largamente consensual, reflectisse não só as ideias e as preferências estratégicas do governo
central, mas também das partes interessadas locais, incluindo as elites e a sociedade civil.

Se tal estratégia resultasse num entendimento claro e num quadro legal de subsidiariedade (ou
seja, o principio segundo o qual ao nível de governo mais adequado para solucionar questões

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de fornecimento e gestão de serviço local são dados a autoridade e os recursos para o fazer)
estaria vencida uma batalha crucial rumo a descentralização efectiva. Uma estratégia explicita
poderia também alcançar melhores condições de enquadramento da descentralização – uma
mais ampla aceitação por parte do eleitorado e dos contribuintes, especialmente se
conseguisse simplificar o vasto conjunto de leis e de instrumentos legais que regulam a
descentralização e condensa-los num quadro institucional fácil de entender e fácil de usar para
os governos e para a governação locais.

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Referências bibliográficas
Carvalho, M. F. (2010). A governação local no Algarve no Contexto de Financiamento e
Responsabilidades. Universidade do Aveiro.

Cistac, G. (2012). Moçambique‫ ׃‬Institucionalização, organização e problemas do poder


local. Lisboa‫ ׃‬UEM.

Gómez, J. A, (2006). Poder local e participação democrática. Lisboa.

Ministério do Plano e Finanças da República de Moçambique (2004). Descentralização e


Municipalização em Moçambique. Maputo.

Santos, A. A. (2005). O Poder Local em Tempo de Globalização: Uma História e um futuro.


Imprensa da Universidade de Coimbra / CEFA.

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