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A Relação Terapêutica na Psicoterapia Comportamental


Pragmática
Dados do Autor:
Carlos Augusto de Medeiros
Referência:

MEDEIROS, C. A. A Relação Terapêutica na Psicoterapia Comportamental


Pragmática. In: Elayne Nogueira, Esequias Neto, Maria Ester e Natalie Brito. (Org.).
Terapia Analítico Comportamental: dos pressupostos teóricos às possibilidades de
aplicação. 1ed. Santo André: ESETEC, 2012, v. 1, p. 79-101

Desde a proposta de clínica comportamental apresentada por Kohlenberg e Tsai


(1991/2001), a relação terapêutica assumiu um papel protagonista na clínica
comportamental, tanto na condição de instrumento para se atingir objetivos terapêuticos,
como objeto de um exame mais sistemático e aprofundado de analistas clínicos do
comportamento. Apesar de tardio, o reconhecimento da relevância da relação
terapêutica representa um grande avanço para a clínica comportamental.
Parece, de fato, um contrassenso a forma com que a relação terapêutica ficou
relegada a um plano secundário nas ditas terapias comportamentais, já que ela, em si,
representa uma oportunidade observação e registro in vivo dos comportamentos do
cliente. Mais do que isso, nela é possível o uso das reações do terapeuta para modelar os
comportamentos alvo que surgem na interação entre terapeuta e cliente (FERSTER,
1972, KOHLENBERG; TSAI, 1991/2001; MEDEIROS, 2002; ALVES; ISIDRO-
MARINHO, 2010).
A Análise do Comportamento se constitui numa abordagem psicológica
conhecida pelo seu rigor metodológico, na medida em preconiza a medição confiável do
fenômeno comportamental estudado (KELLER; SCHOENFELD, 1950/1973). A
despeito da atuação do psicólogo comportamental clínico não ser a mesma do
pesquisador básico, é inegável o desconforto que a dependência do relato verbal produz
no contexto clínico. O relato verbal, conforme discutidos por diversos autores
(SKINNER, 1957/1978, RIBEIRO, 1989/2005, MEDEIROS, 2002, BEKERT, 2005,
WHESLER; AMARAL, 2009), não se constitui em fonte de dados confiável acerca dos
eventos que ocorreram fora da terapia. Logo, a amostra de comportamentos do cliente
mais confiável é aquela que ocorre dentro da sessão na presença do terapeuta.
A Terapia Comportamental Tradicional resolvia esse problema com medidas
auxiliares, como, por exemplo, o galvanômetro1 (RANGÉ, 1995). Entretanto, tais
equipamentos são úteis para fornecer medidas do comportamento respondente, que
ocupa atualmente um papel muito restrito na Terapia Analítico Comportamental, cuja
ênfase é dada ao comportamento operante (RODRIGUES-RIBEIRO, 2001).
Outra justificativa para a importância da relação terapêutica na clínica
comportamental decorre da generalização. Conforme atestam Ferster (1972) e Alves e
Isidro-Marinho (2010), os comportamentos alvo do cliente, na medida em que são, em
sua maioria, sociais, tenderão a se generalizar, ocorrendo na presença do terapeuta. Para
os autores, além de estar em posição privilegiada para observar e registrar estes
comportamentos, o terapeuta pode aplicar procedimentos comportamentais (e.g., o
reforçamento diferencial) para modificá-los.

1
Dispositivo elétrico que mede a condutibilidade da pele. Uma das respostas eliciadas comum na
ansiedade é a mudança na condutibilidade da pele.
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A Psicoterapia Comportamental Pragmática (PCP), conforme proposta por


Medeiros e Medeiros (2012), portanto, confere um papel crucial à relação terapêutica na
coleta de dados e na intervenção comportamental propriamente dita. O presente capítulo
se destina a apresentar, exemplificar e discutir como a relação terapêutica é trabalhada
na PCP. Inicialmente serão discutidos os tipos de comportamento alvo com os quais o
terapeuta trabalha; em seguida será feita uma breve discussão sobre reforçadores sociais
naturais e arbitrários; o próximo tópico trata da intervenção propriamente dita com o
uso de audiência não punitiva, reforçamento diferencial e questionamento reflexivo
acerca da relação em si; por fim, serão apresentadas as considerações finais.

COMPORTAMENTOS ALVO2 EMITIDOS E RELATADOS


No fim das contas, o clínico lida com duas amplas categorias comportamentais,
os comportamentos alvo que ocorrem na presença do terapeuta, sejam eles verbais ou
não, e o relato dos comportamentos ocorridos fora da sessão (MEDEIROS;
MEDEIROS, 2012). Os comportamentos alvo emitidos na sessão são de fácil
observação por parte do terapeuta. Para tanto, como atestam Kohlenberg e Tsai
(1991/2001), é fundamental que o terapeuta esteja atento aos chamados
comportamentos clinicamente relevantes (CCR’s), ou seja, que seus comportamento no
contexto clínico fiquem sob o controle discriminativo dos comportamentos emitidos
pelo cliente durante a sessão e não apenas sob o controle da topografia de seu relato.
É comum terapeutas concentrarem-se nos relatos do cliente numa tentativa de
ajudá-los a solucionar os problemas pelos quais estão passando. Entretanto, podem
negligenciar outros comportamentos alvo que estão ocorrendo naquele momento na
sessão que seriam muito mais proveitosos de se trabalhar do que os relatados. De fato, o
próprio comportamento de relatar muitas vezes representa um comportamento alvo. Por
exemplo, R. L. N., uma mulher de aproximadamente 30 anos, veio à terapia queixando-
se de insegurança quanto a sua competência no novo emprego de maior status social.
Ao longo do relato das situações, R. L. N. sempre justificava seus erros e suas falhas na
medida em que os relatava: “Eu não consegui responder a pergunta que o rapaz de outro
setor me fez, mas eu comecei a lidar com esse projeto só agora”; “Eu demorei duas
semanas para responder aquele e-mail que a minha chefe tinha pedido para eu
responder. Só que eu estava com muitas coisas para fazer, que eu tive que priorizar as
mais urgentes.”.
Muito mais importante do que tentar pensar junto com R. L. N. formas de ela
não cometer os mesmos erros, é perceber que justificar todos os erros espontaneamente
pode se constituir em um comportamento alvo em si. Essas justificativas provavelmente
têm uma função de esquiva da possível crítica advinda do ouvinte, no caso, o terapeuta.
Se essa hipótese estiver correta, alguns desdobramentos são plausíveis: o primeiro é a
de que ela deva se comportar assim com as demais pessoas com as quais ela se
relaciona; a outra é a de que o julgamento e a opinião dos outros, ou seja, o conjunto de
continências sociais é relevante no controle do seu comportamento; por fim e, talvez, o
mais relevante, que os erros possuem forte função aversiva condicionada. Tais hipóteses
estão em consonância com a sua queixa inicial. Não caberia ao terapeuta, portanto,
endossar ou não essas justificativas, avaliando se são, ou não, pertinentes como
explicação dos erros. E sim, analisar o fato de ela se justificar com essa frequência e
qual a sua função.

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Medeiros e Medeiros (2012) definem comportamento alvo como aquele objeto de análise e intervenção
dentro processo terapêutico. Tratam-se dos comportamentos cuja mudança na frequência representa um
dos objetivos terapêuticos.
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Trabalhar a relação terapêutica, portanto, envolve lidar, principalmente, com os


comportamentos alvo emitidos, mais do que os relatados. O que não quer dizer que não
há espaço para trabalhar com os relatados na PCP. De fato, os relatados, ou seja, os que
acontecem fora da terapia são os mais importantes, porém, a forma com que a PCP lida
com eles será discutida em outro tópico que não o da relação terapêutica. Ao mesmo
tempo, com a mudança de comportamentos emitidos na sessão, principalmente com o
uso de reforçadores sociais naturais, é esperado que os comportamentos de mesma
classe que ocorrem fora da terapia também se modifiquem. No caso acima, seria
esperado que R. L. N. passasse a relatar seus erros sem justificá-los dentro e fora do
consultório.

Reforçamento Social, Natural e Arbitrário


A distinção entre reforçadores naturais e arbitrários, principalmente após as
críticas de Ferster (1972) e Goldiamond (1974) ao uso do reforçamento arbitrário em
excesso por modificadores do comportamento, é um ponto relevante e problemático em
Análise do Comportamento. Tal discussão veio à tona principalmente com o advento da
Psicoterapia Analítica-Funcional – FAP que defende enfaticamente o uso de
reforçamento natural em detrimento do arbitrário. Dentre os efeitos colaterais
indesejáveis do uso de reforçamento arbitrário, é possível salientar a possiblidade de
contra-controle por parte do cliente, como distorções do relato, por exemplo; a menor
probabilidade de generalização das mudanças comportamentais para contextos fora da
terapia onde não há o reforçamento arbitrário; e, por fim, o fato de que os reforçadores
arbitrários podem exercer função aversiva na medida em que fica clara a relação de
poder entre o terapeuta e o cliente.
A despeito de seus efeitos colaterais e das recorrentes recomendações do uso de
reforçamento natural no contexto clínico, o uso de reforçadores arbitrários é muito mais
frequente do que se imagina dentro dos consultórios da Terapia Analítico-
Comportamental. Em um estudo feito por Falcão (2011), foram analisados 15 diálogos
entre terapeutas e clientes relatados na literatura. Falcão observou uma incidência de
emissão de reforçadores arbitrários pelos terapeutas em aproximadamente 90% dos
diálogos, como base nos critérios utilizados no estudo para se contabilizar a emissão de
reforçadores arbitrários.
Aparentemente, essa falta de correspondência dizer-fazer dos próprios terapeutas
analíticos comportamentais decorre de uma falta de consenso da diferença entre
reforçadores naturais e arbitrários. As definições de que os reforçadores naturais são
aqueles que normalmente mantêm uma resposta (MOREIRA; MEDEIROS, 2007) é
insatisfatória, na medida em que resta definir funcionalmente o "normalmente". Uma
alternativa é tratar todos os reforçadores advindos de outras pessoas (i.e., reforçadores
sociais) como arbitrários. Os reforçadores naturais, portanto, se restringiriam aqueles
advindos das relações mecânicas e químicas com o ambiente não social. No exemplo
clássico, uma criança vestiria um casaco para retirar a sensação térmica de frio, a qual
seria aversiva. Nesse caso, a baixa temperatura seria o reforçador negativo natural de
vestir o casaco, ao passo que o elogio advindo de um cuidador, por exemplo, (e.g., “Que
linda, conseguiu vestir o casaco sozinha!”) seria considerado um reforçador positivo
arbitrário. Mesmo com essa definição trazendo certa tranquilidade conceitual, ela deixa
de fazer distinções que talvez fossem úteis na discussão dos efeitos colaterais do uso de
reforçadores arbitrários no contexto aplicado como aquela trazida por Ferster (1972),
Goldiamond (1974) e Kohlenberg e Tsai (1991/2001), entre outros. Desse modo, a PCP
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trabalha com uma nova taxonomia quanto a essa categorização de tipos de reforçadores
(MEDEIROS; MEDEIROS, 2012).
A proposta envolve o uso dos conceitos propostos por Skinner (1953/1994) de
agente controlador e de agente controlado. Medeiros e Medeiros (2012) definem
reforçadores naturais de forma negativa, ou seja, seriam aqueles não arbitrários. Já os
arbitrários são consequências impostas artificialmente por um agente controlador
(experimentadores, pais, professores, terapeutas, padres, pastores, maridos, esposas etc.)
tendo como reforço a mudança ou manutenção da frequência dos comportamentos de
agentes controlados (sujeitos de pesquisa, filhos, alunos, clientes, fiéis, esposas, maridos
etc.). Um terapeuta que elogia quando um cliente solicita diretamente a mudança de
assunto, ao invés de chorar como sempre faz diante de perguntas sobre o pai, está
utilizando um reforçador arbitrário. O reforçador que controla o mando3 “vamos falar de
outra coisa, por favor?” é a mudança de assunto. Quando o terapeuta adiciona
artificialmente um elogio como consequência a um mando, está atuando como agente
controlador. Seu comportamento de elogiar o cliente está sob o controle do aumento na
frequência de emissão de mandos emitidos pelo cliente na condição de agente
controlado.
Cabe ressaltar no exemplo acima, que o reforço para o mando do cliente, ou seja,
a mudança de assunto, seria um reforçador social já que foi proporcionado por outra
pessoa. Porém, de acordo com a definição proposta por Medeiros e Medeiros (2012),
não se trataria de um reforçador arbitrário, já que quando um ouvinte reforça um mando,
não o faz como agente controlador com a função de fortalecer a emissão de mandos por
um agente controlado. Segundo Skinner (1957/1978), o ouvinte reforça o mando de um
falante provavelmente porque, no passado, falantes consequenciaram a recusa do
ouvinte com estímulos aversivos com ameaças ou ofensas (e.g., “já falei para mudar de
assunto. É melhor você falar de outra coisa, senão...”). Logo, alguns
reforçadores condicionados e sociais poderiam ser considerados naturais de acordo com
tal definição, já que não são utilizados por um agente controlador tendo a função de
manipular o comportamento do agente controlado (i.e., reforçadores
arbitrários). Obviamente, para o presente trabalho, todo reforçador arbitrário é social,
mas não necessariamente todo reforçador social seria arbitrário.
No caso do mando, fica mais fácil compreender o papel dos reforçadores sociais.
Já no tato4 e demais operantes verbais, a situação é mais complicada porque os
reforçadores são generalizados e não específicos (SKINNER, 1957/1978). Por exemplo,
qual é o reforçador natural que controla o comportamento contar uma história. Não seria
um comentário do tipo: “Nossa que história legal! Parabéns!”. Tais consequências
seriam impostas pela cultura como um todo para aumentar a probabilidade dos falantes
emitirem tatos. Da mesma forma, um recepcionista de hotel que informa ao futuro
hóspede que tem feito frio (i.e., emite um tato sob o controle discriminativo do clima)
tem seu tato reforçado por um “Obrigado!”. Logo, existiria um agente controlador num
sentido mais amplo.
E se, ao invés do comentário “Nossa que história legal! Parabéns!”, a
consequência fosse o ouvinte prestar atenção à história com acenos de cabeça e com
perguntas sobre mais detalhes? O aceno com a cabeça talvez se configurasse na mesma

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Skinner (1957/1978) define mando como o operante verbal controlado por uma condição de privação ou
estimulação aversiva. A topografia do mando especifica o estímulo reforçador que o controla. Pedidos,
solicitações, ordens e súplicas exemplificam mandos na linguagem cotidiana.
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Tatos são operantes verbais cuja topografia é controlada por estímulos antecedentes não verbais
(Skinner, 1957/1978). Os tatos são mantidos por reforçadores generalizados. Na linguagem cotidiana,
referem-se às narrativas, descrições, comentários etc.
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categoria do elogio, ou seja, seria uma forma da comunidade verbal manter a emissão de
tatos que são úteis para a cultura como um todo. Daí surge um problema: ou definem-se
todos os reforçadores generalizados como arbitrários, ou será necessário o
desenvolvimento de uma nova taxonomia especificamente para os operantes verbais
mantidos por reforçamento generalizado. Taxonomia esta que pudesse separar os
reforçadores generalizados naturais e arbitrários.
Um terapeuta ouvir com atenção um relato de seu cliente e perguntar mais
detalhes provavelmente tem função reforçadora sobre o comportamento de relatar. Esse
tipo de reforçamento, apesar de generalizado, pode se constituir em reforçamento
natural, já que o que controla a apresentação dessa consequência é a obtenção de mais
contato com a condição de estimulação não verbal que controla o tato do falante e não o
fortalecimento da emissão de tatos. Em outras palavras, o ouvinte, ao fazer mais
perguntas sobre o que o falante está falando, tem seu comportamento reforçado por mais
detalhes, e não necessariamente pelo aumento da frequência de um dado operante
verbal.
Já o “hum, hum” assim como o aceno de cabeça entrariam como reforçadores
arbitrários tomando-se a própria comunidade verbal como um agente controlador no
sentido mais amplo conforme discutido acima, já que teriam sim a função de manter o
falante se comportando verbalmente. A despeito de serem arbitrários, reforçadores desse
tipo tendem a produzir menos efeitos colaterais, já que o agente controlador não é um
indivíduo, e sim a sociedade. Ao mesmo tempo, o “hum, hum” e o aceno de cabeça são
muito comuns no dia-a-dia, de modo que não prejudicariam necessariamente a
generalização dos efeitos da terapia para a vida do cliente.
Voltando ao exemplo do terapeuta, caso ele faça “hum, hum”, acene com a
cabeça e faça mais perguntas sobre determinado tema para que o cliente passe a falar
mais sobre esse tema estará, sem dúvida, atuando como um agente controlador, logo,
reforçando arbitrariamente. Mesmo no caso dos mandos, quando o terapeuta faz um
esforço para mudar o horário da sessão mediante o pedido de seu cliente para treinar
mandos puros também atuará como agente controlador e estará reforçando
arbitrariamente. Desse modo, sempre que o terapeuta provê consequências ao
comportamento de seu cliente tendo como reforçador a modelagem de comportamentos
alvo estará provendo consequências arbitrárias. Diante desse quadro, então, não faria
sentido mesmo em se falar da distinção entre reforçadores naturais e arbitrários no
contexto clínico.
Uma saída para esse debate poderia ser a forma como o terapeuta dá
consequências ao comportamento de seu cliente em relação aos efeitos colaterais do uso
de reforçamento arbitrário. Infelizmente não existem estudos empíricos a esse respeito.
Entretanto, em termos teóricos, quanto mais o terapeuta tentar prover os reforçadores
sociais de forma similar aos reforçadores naturais, menos efeitos colaterais do uso de
reforçadores arbitrários serão observados. Em termos práticos, portanto, seria preferível
o terapeuta meramente trocar o horário da sessão com base em um mando direto do
cliente do que dizer que ele pediu de forma apropriada. Ou, por exemplo, seria
preferível o terapeuta pedir detalhes de relatos da emissão de comportamentos
desejáveis fora da sessão do que dizer que o cliente está progredindo. Uma alternativa
útil seria perguntar especificamente sobre as consequências reforçadoras de emitir um
comportamento desejável fora da sessão de terapia ao invés de falar sobre elas para o
cliente.
Intervenção
Ao se falar em intervenções sobre a relação terapêutica, o primeiro passo é
detectar que o cliente se comporta na presença do terapeuta de forma similar àquela
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como se comporta com seus conviventes. Em outras palavras, identificar a emissão de


comportamentos alvo emitidos dentro da sessão.
O primeiro passo para realizar essa análise é observar os efeitos que o
comportamento do cliente produz no próprio terapeuta (VELASCO; CIRINO, 2002).
Clientes queixosos e que se vitimizam com frequência tendem a evocar respostas
emocionais de pena do terapeuta, por exemplo (OLIVEIRA, 2009; VALLS, 2010;
DIAS-GOMES, 2011). Os efeitos emocionais que o cliente produz no terapeuta podem
ser bons indícios dos efeitos que seu comportamento produz em seus conviventes.
O mais importante para se identificar se o comportamento emitido na sessão se
trata de um comportamento alvo é a noção de comportamento operante. Os
comportamentos operantes são determinados principalmente pelos estímulos
consequentes e não apenas pelos antecedentes (MOREIRA; MEDEIROS, 2007). Isso
precisa ser lembrado principalmente no comportamento verbal. Muitos terapeutas
tratam o comportamento verbal de seus clientes como se fossem determinados pelos
eventos que ocorreram no dia a dia ou na sua história, seus sentimentos, pensamentos,
opiniões, entre outros eventos antecedentes. É fundamental reconhecer, como sustenta
Medeiros (2002), que o comportamento, em especial, o verbal, é uma forma de operar
sobre o mundo. Ou seja, seus principais determinantes são as consequências. Logo, se
um terapeuta observa em si mesmo respostas emocionais de pena, deve ficar atento que
talvez, tais respostas emocionais sejam a variável controladora do comportamento
queixoso do cliente. Nesse exemplo, os clientes relatam suas tristes histórias mais sob o
controle dos efeitos que produzem nos ouvintes do que sob o controle dos
acontecimentos em si.
O terapeuta deve, portanto, se questionar pragmaticamente o que o cliente
consegue se comportando assim. Lembrar que os comportamentos operam no meio,
principalmente no meio social, é de fundamental importância para se identificar e
analisar comportamentos alvo emitidos na sessão.
O terapeuta também pode criar condições para que o cliente emita
comportamentos alvo dentro da sessão. Principalmente quando se tratarem dos
comportamentos alvo desejáveis. Com a emissão desses comportamentos pelo cliente, o
terapeuta pode reforçá-los naturalmente de forma imediata. Caso um cliente se descreva
de forma pejorativa com alta frequência tendo função de produzir a discordância do
ouvinte que lhe faz elogios, deveres de casa podem ser propostos para que o cliente
traga uma lista dos aspectos que mais admira em si. Deveres de casa assim são muito
úteis para a execução do reforçamento diferencial conforme será discutido em seguida.
Provavelmente o cliente com histórico de reforçamento de seus comportamentos
autodepreciativos trará tanto aspectos que admira em si, quando os defeitos que costuma
relatar. Nesse momento, o terapeuta pode ouvir os relatos dos defeitos do cliente sem
perguntar sobre eles (i.e., por o relato indesejável em extinção) e perguntar de forma
enfática sobre as qualidades relatadas (i.e., reforçar os relatos desejáveis). Essa
combinação de reforçamento e extinção é chamada de reforçamento diferencial
(MOREIRA; MEDEIROS, 2007).
A principal forma de intervenção sobre os comportamentos alvo emitidos na
sessão, portanto, é o reforçamento diferencial (ALVES; ISIDRO-MARINHO, 2010,
OLIVEIRA, 2010; VALLS, 2010; DIAS-GOMES, 2011; MEDEIROS; MEDEIROS,
2012). O reforçamento diferencial diz respeito ao reforçamento contingente às respostas
de uma classe específica e extinção para aquelas resposta que não pertençam a essa
classe (KELLER; SCHOENFELD, 1950/1973). Um exemplo clínico clássico disso é o
do cliente que termina com sua namorada de forma recorrente. A namorada do cliente
apresenta comportamentos que são aversivos, como implicar com os amigos dele, tratar
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mal seus familiares, não deixa-lo jogar futebol, investigar seu perfil em redes sociais, ter
ciúmes de suas amigas, brigar por motivos irrelevantes etc. As reclamações desse
cliente, como: “não seja grossa comigo assim”, “seja menos ciumenta”, “eu queria que
você tentasse se dar bem com meu amigos” entre outras não são reforçadas com
mudanças no comportamento da namorada. Logo, essas variações comportamentais
estão em extinção. Por outro lado, quando o cliente rompe o relacionamento, ela pede
que ele não termine com ela e diz que vai mudar. De fato, ela passa algumas semanas se
comportando do jeito que gosta, voltando a se comportar como antes em seguida.
No exemplo acima, está ocorrendo o reforçamento diferencial, de modo que as
solicitações do cliente para que a namorada mude não são reforçadas, ao passo que os
términos ou ameaças de término, sim. Com isso, a tendência é a diminuição na
frequência dos mandos diretos por mudanças no comportamento da namorada e o
aumento na frequência de términos manipulativos, ou seja, mandos disfarçados de tato5
(MEDEIROS, 2002).
É importante notar que a namorada do cliente não está aplicando o reforçamento
diferencial de modo a manipular o seu comportamento de forma deliberada. Ela o faz
sobre o controle de contingências aversivas em curto e em longo prazo que não cabem
aqui serem discutidas. O relevante dessa discussão é que o reforçamento diferencial
ocorre no ambiente social ou não, o tempo todo. Por outro lado, ele pode ser utilizado
como um procedimento que atua diretamente sobre os comportamentos alvo do cliente
que ocorrem na sessão. O terapeuta pode reforçar comportamentos alvo desejáveis e por
em extinção ou reforçar com menor frequência e magnitude6 os comportamentos
indesejáveis. Trata-se, portanto, da forma mais eficaz de, não só, enfraquecer
comportamentos indesejáveis, como também, fortalecer os desejáveis que os
substituirão.
Uma alternativa comum a esse procedimento, julgada por muitos, como mais
eficaz, é simplesmente tatear o comportamento indesejável emitido na sessão e mandar
a emissão de um comportamento desejável que o substituía. O cliente do exemplo acima
elogia o trabalho do terapeuta, assim como sua inteligência, preparo e perspicácia,
quando está prestes a relatar que terminara novamente o relacionamento de forma
manipulativa. O cliente, em outro momento da terapia já havia reconhecido os prejuízos
desse comportamento para a sua relação em longo prazo e afirmado que não mais iria
fazê-lo. Logo, seus elogios antes de relatar um comportamento indesejável possuem
função de esquiva de possíveis críticas do terapeuta. Padrão comportamental que
provavelmente emite na presença de pessoas do seu convívio.

O cliente inicia o diálogo da seguinte forma: “Tem me feito muito bem fazer terapia
contigo. Fico impressionado com as suas sacadas. Você me faz ver coisas que eu não
conseguiria enxergar sozinho. Não sei por que as pessoas têm tanto preconceito com
terapia. Eu mesmo recomendo para todo mundo. O seu trabalho comigo me fez perceber

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Mandos disfarçados de tato são definidos por Medeiros (2002) como respostas verbais com topografia
de tato que, ao invés de ficarem sob o controle dos estímulos antecedentes não verbais, são determinadas
por reforçadores específicos.
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Frequência e magnitude são parâmetros do estímulo reforçador. A frequência diz respeito ao número de
vezes que uma resposta é reforçada no tempo e a magnitude é quantidade de estímulo reforçador que ela
produz (MOREIRA; MEDEIROS, 2007). A ideia comum que se tem é a de que o reforçamento
intermitente aumenta a resistência à extinção. De fato isso ocorre quando só existe uma alternativa para se
comportar. Entretanto, em uma situação de escolha, se um comportamento produz reforçadores em
esquema de reforço contínuo e a outra produz em esquema intermitente e com menor magnitude, a
tendência é de o organismo passar a responder com uma frequência muito maior na alternativa que
produz reforçadores mais frequentes e de maior magnitude.
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que eu não preciso me relacionar com alguém que me trata desse jeito. Que eu tenho
que me amar e mereço alguém que me respeite. Por isso tomei coragem e rompi com ela
novamente, mas agora sei que foi definitivo”.
Terapeuta: “Você já percebeu que toda vez que me conta que terminou seu namoro
novamente me faz vários elogios? Imagino que você tema que eu o critique por terminar
o namoro, já que você se comprometeu a não fazê-lo. Caso eu esteja certo, fica claro
que você ainda não confia em mim totalmente e que teme que eu possa julgá-lo como as
outras pessoas te julgam. Você precisa confiar e mim e, saber que eu não estou aqui
para julgá-lo. Esse é a única forma de você aprender a se entregar para as pessoas ao seu
redor”.
Com essa intervenção, o terapeuta tateia o padrão comportamental do cliente, ou
seja, devolve sua análise funcional em forma de interpretação e solicita uma mudança
de comportamento. Para Medeiros (2010), o terapeuta do exemplo emitiu duas regras7,
uma com a interpretação e a outra com o mando. A interpretação do terapeuta tem uma
alta probabilidade de funcionar como um estímulo aversivo, pois o terapeuta está
criticando o caráter manipulativo do comportamento do cliente. Além disso, está
fazendo a análise funcional pelo cliente, diminuindo a probabilidade dele aprender a
fazê-la por si só. Já a segunda regra, além de diminuir a probabilidade de o cliente
desenvolver autorregras8 que solucionariam os problemas com os quais se depara, é
paradoxal com a primeira. Como o cliente vai passar a confiar num terapeuta que ele
não irá criticá-lo logo após de receber uma crítica do mesmo?
Como um psicoterapeuta pragmático atuaria nesse caso com o reforçamento
diferencial? Obviamente não puniria o comportamento manipulativo de elogiar nem
tampouco o relato de ter terminado o namoro novamente. Por outro lado não se furtaria
de fazer perguntas que levassem o cliente a discriminar que seu término fora
manipulativo e que levaria a estímulos aversivos de maior magnitude ou perda de
reforçadores em longo prazo.
Pergunta do terapeuta após a fala do cliente apresentada acima: “Qual foi a reação dela
quando terminaram?”
Cliente: “A de sempre. Aquela choradeira. Disse que ia mudar. Que agora era para valer
e blá, blá, blá. Mas eu não arredei o pé e fui embora. Passei uns dois dias sem atender os
telefonemas dela.”
Terapeuta: “Quantas vezes vocês já se falaram depois disso?”
Cliente: “Umas duas ou três vezes. Depois que ela me ligou algumas vezes, eu fiquei
preocupado e resolvi atender.”
Terapeuta: “Me fale das diferenças entre o que está acontecendo agora e as vezes que
você terminou no passado?”
Cliente: “Pensando bem, não teve muita diferença.”
Terapeuta: “Qual o desfecho provável dessa história <nome do cliente>?”
Cliente: “É... Acho que vamos acabar voltando mesmo.”
Terapeuta: “Sendo assim. Qual foi o seu objetivo ao terminar?”
Cliente: “Pois é. É que eu fico enfurecido com o que ela faz. Me dá vontade de terminar.
Mas quando eu me acalmo e vejo as promessas de mudanças dela, sinto saudades e
acabo voltando.”

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Skinner (1969/1984) define regras como estímulos discriminativos verbais que descrevem relações de
contingências. Na linguagem cotidiana, instruções, recomendações, conselhos são exemplos de regras.
Como observado por Falcão (2011), terapeutas analítico comportamentais emitem regras com muita
frequência. Medeiros (2010) discute aprofundadamente os efeitos colaterais desse tipo de intervenção.
8
Autorregras são variações de regras que são emitidas e seguidas pela mesma pessoa (Skinner,
1969/1984).
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Terapeuta: “Eu gostaria que você imaginasse por alguns segundos a cena de você
terminando com ela com um desfecho diferente. Ela não te pedindo para reconsiderar,
não insistindo para voltarem, não prometendo mudanças, não te ligando várias vezes
nos dias seguintes.”
O terapeuta espera alguns segundos e continua: “Me diga o que você sentiu <nome do
cliente>:”
Cliente: “Não foi legal! Acho que eu espero que ela reaja assim. Meu medo é que um
dia ela faça isso mesmo.”
Terapeuta: “O que costuma acontecer com términos que não são definitivos?”
Cliente: “Não são levados a sério. É... é verdade. Vai ter uma hora que não vai colar
mais. Aí, vai ser definitivo mesmo. Não por mim. Mas por ela.”
Terapeuta: “Qual o efeito em longo prazo desses términos para a qualidade da sua
relação?”
Cliente: “Só pode ser ruim. Ela fica insegura e assim, cada vez mais agressiva, ciumenta
e controladora. E cada término é um sofrimento para nós dois. É uma choradeira
danada. A única coisa boa é o sexo de reconciliação.” O cliente ri.
Ao final desse longo diálogo, o terapeuta pragmático levou o cliente a
discriminar o caráter manipulativo do seu término e as possíveis consequências de agir
assim. Com isso, os elogios com função de esquiva no início da fala do cliente não
foram reforçados, já que o cliente acabou entrando em contato, ainda que no âmbito
verbal, com as consequências aversivas do término manipulativo. Porém, tais
consequências não foram administradas arbitrariamente pelo terapeuta, e sim, emitidas
pelo próprio cliente. Caso o mesmo cliente, em outro momento, começasse seu relato da
seguinte forma:
“Não brigue comigo, mas fiz de novo. Perdi a cabeça com uma crise de ciúmes dela e
acabei terminando. Eu sei que vamos acabar voltando, mas não sei como fazer com que
ela mude de outra forma. Queria que você me ajudasse nisso.”
Nesse caso, o cliente emitiu um mando direto que será reforçado pelo terapeuta.
Não serão feitas perguntas que levem o cliente a discriminar os estímulos aversivos que
entrará em contato no futuro com esse comportamento. O psicoterapeuta pragmático
começaria a questionar o cliente de modo que ele próprio formulasse formas alternativas
de melhorar relação. Desse modo, o terapeuta estaria reforçando também o segundo
mando direto emitido pelo cliente. Em outras palavras, executou o reforçamento
diferencial, colocando em extinção os elogios manipulativos e reforçando os mandos
diretos.
Uma pergunta comum é como o cliente vai emitir o comportamento desejável?
Nesse caso, descobrir que basta pedir para não ser criticado, por exemplo, ao invés de
elogiar. Uma consequência da extinção é o aumento na variabilidade comportamental
(MOREIRA; MEDEIROS, 2007). Isto significa que, caso um comportamento deixe de
produzir os reforçadores que o mantinham, além da redução na sua frequência, é
observado um aumento na frequência de outros comportamentos que potencialmente
produzam o mesmo efeito. Até que um deles seja reforçado (i.e., o desejável) e com
isso, se torne mais provável.
Um novo exemplo clínico pode ajudar a ilustrar esse ponto. J. B. T. é uma
cliente que se queixa de insegurança e profunda dificuldade em tomar decisões. Desde a
primeira sessão, solicita conselhos do terapeuta para resolver os problemas com os quais
se depara. Ao ser questionada com que frequência pede conselhos para as pessoas, J. B.
T. relatou que o faz o tempo todo, “que não consegue decidir nada sem opinião das
outras pessoas”. Com base nisso, o terapeuta conclui que o comportamento de J. B. T.
em pedir conselhos é um comportamento alvo indesejável que ocorre na sessão.
10

Obviamente, de acordo com Medeiros (2010), caso o terapeuta dê os conselhos


solicitados, ela dificilmente conseguirá aprender a decidir sozinha. Solicitar conselhos
provavelmente é uma resposta de esquiva de cobranças caso suas decisões impliquem
em punição e não reforçamento. Aparentemente, a responsabilidade pelo fracasso, na
condição de estímulo punitivo condicionado generalizado é mais aversiva que as
consequências naturais do fracasso.
L. B. T. inicia o diálogo da seguinte maneira: “Preciso decidir se troco de carro agora ou
não. Gosto tanto do meu carro, mas meu marido fala que não devemos deixar passar
mais de quatro anos de uso senão começa a dar defeito deprecia demais. O que você
acha que eu devo fazer?”
Terapeuta: “Fale-me das qualidades do seu carro?” (O terapeuta nesse ponto coloca em
extinção o mando acerca de conselhos. Entretanto, permanece no assunto perguntando
sobre a questão do carro. Sua pergunta tem função reforçadora no sentido em que
mostra para a cliente que o comportamento do terapeuta está sob o controle
discriminativo do que ela estava falando, ou seja, o terapeuta está dando atenção).
Cliente: “Ele é pequeno e fácil de estacionar. É confortável: tem ar condicionado e
direção hidráulica. Faz 15 quilômetros com um litro de gasolina e eu adoro a cor dele.”
Terapeuta: “Quais as qualidades do novo?”
Cliente: “Ainda não sei, mas com a grana que eu tenho não poderei comprar um com
tantos opcionais. Ainda mais porque meu marido quer que eu compre um modelo mais
caro.”
Terapeuta: “Qual a importância desses opcionais para você?”
Cliente: “Eu adoro. Depois que a gente tem essas coisas num carro, fica difícil se
imaginar sem elas.”
Terapeuta: “Quem dirigirá o carro?”
Cliente: “Sou eu. Mas meu marido fala que eu tenho que trocar, senão começará a dar
problemas e vou perder dinheiro na hora da troca por outro.”
Terapeuta: “Compare a importância dos opcionais para você com o fato de ter que por
mais dinheiro na compra de um carro no futuro:” (Até aqui, o terapeuta está fazendo
perguntas para buscar informações e para ajudá-la a decidir. Ele conduz o processo
fazendo com que a cliente emita o que Skinner, em 1969, chamou de comportamentos
pre-correntes9. Comportamentos essenciais para a solução de problemas. A meta é a de
que cliente seja capaz no futuro de emitir tais comportamentos sem a ajuda do
terapeuta).
Cliente: “No futuro eu posso até pegar um financiamento. Agora não dá porque ainda
estamos pagando o meu carro e o dele. Eu queria ficar com o meu carro, mas tenho
medo de errar e ele me cobrar no futuro.” (Nessa parte do diálogo, a cliente esgota os
argumentos práticos para a sua relutância em decidir e entra no cerne da questão: a
função aversiva condicionada dos erros. Com essa fala, ela apresenta um estímulo
discriminativo fundamental para que o terapeuta inicie um questionamento reflexivo
conforme será descrito abaixo para que ela conclua, por si só, a forma de superar o
efeito que a possibilidade do erro exerce sobre o seu comportamento).
Terapeuta: “Qual o problema de errar?”
Cliente: “Eu não gosto de errar. Para mim é péssimo. Ainda mais quando eu sei que
serei cobrada em um assunto sério como esse.”

9
Comportamentos pre-correntes são aqueles que produzem estímulos, os quais evocam novas respostas
em cadeias comportamentais que culminam na emissão de um comportamento final que produza o
reforçamento (Baum, 1994/2006). Skinner (1974/2003) sustenta que os comportamentos pré-correntes
são emitidos quando o organismo está diante de um problema, isto é, uma situação de estímulos que não
evoque uma única resposta no repertório do indivíduo que produza reforçamento.
11

Terapeuta: “Qual chance de alguém acertar sempre... em todas as suas iniciativas?”


Cliente: “Muito pequena.”
Terapeuta: “Qual a única maneira de não errar nunca, portanto?”
Cliente: “É não fazer. Não decidir.”
Terapeuta: “Qual foi a sua queixa para procurar à terapia mesmo?”
A cliente ri e diz: “É verdade. Tenho que aprender a errar. Tenho que tentar e ver no que
acontece. Senão, não conseguirei decidir nada nunca na vida.”
Terapeuta: “Com base nessa sua conclusão. O que pretende fazer quanto ao carro.”
Nesse diálogo, muito complexo, é possível observar que o terapeuta põe em
extinção os mandos por conselhos, que foram considerados comportamentos
indesejáveis emitidos na sessão. Essa extinção aumenta a variabilidade comportamental,
ou seja, a cliente começa a refletir soluções com base nas perguntas do terapeuta.
Quando ela formula um conselho para ela mesma, isto é, emite uma autorregra, o
terapeuta reforça seu comportamento. Isso exemplifica o reforçamento diferencial, de
modo que no futuro, provavelmente a cliente, ao invés de solicitar um conselho,
exponha um problema ao terapeuta e comece a emitir alternativas de solução para que
pensem juntos. Obviamente, esse não é um processo rápido. Diálogos similares serão
necessários para que ocorra a substituição dos comportamentos indesejáveis (e.g., pedir
conselhos) pelos desejáveis (ventilar alternativas de solução por si mesma).
Uma desvantagem do procedimento do reforçamento diferencial é que ele pode
ser demorado, já que o cliente precisa encontrar a resposta dentre um conjunto de
variações, na medida em que o comportamento indesejável diminui de frequência. O
questionamento reflexivo (ver MEDEIROS; MEDEIROS, 2012 para mais detalhes
sobre esse procedimento) é uma alternativa para acelerar o processo. Só que, ao invés,
de o questionamento envolver perguntas sobre os comportamentos relatados, ele
compreenderá perguntas sobre os comportamentos emitidos na sessão. No exemplo do
cliente que emite términos manipulativos, o terapeuta pode questionar: “Com que
frequência você me faz elogios?”; “O que há de comum em todas essas ocasiões?”; “Me
fale de situações em que você elogia alguém:”; “Que efeito seus elogios produzem na
pessoa?”; “Que efeito você pretende produzir em mim ao me elogiar?”. Já com a cliente
J. B. T.: “Quantos vezes você já me pediu conselhos?”; “Quantas vezes eu te dei
algum?”; “O que você acha que me motiva a não te dar conselhos?”; “Com base na sua
queixa inicial, o que eu quero que você aprenda ao não te aconselhar?”; “Como você
poderia aplicar isso em sua vida?”. Com sequências de perguntas como essas, o
terapeuta pode levar o próprio cliente a emitir tatos acerca de seu comportamento
emitido na sessão e de suas variáveis controladoras. Resumindo, o terapeuta, ao agir
assim, treina o cliente a fazer análises funcionais não só de seus comportamentos
relatados, como de seus comportamentos emitidos durante a sessão.
A PCP assinala que o ideal é a utilização dos dois procedimentos quando
possível, já que aliados podem propiciar a modificação do comportamento emitido
durante a sessão. Essa forma de trabalhar a relação terapêutica é menos diretiva em
relação às intervenções em que o terapeuta tateia o comportamento do cliente dentro da
sessão e suas variáveis controladoras. Medeiros (2010) e Medeiros e Medeiros (2012)
apresentam diversos argumentos que suportam atuações menos diretivas, dentre elas
uma diminuição da relação de dependência, e uma probabilidade maior de seguimento
de autorregras do que de regras, como evidenciado por Souza, Medeiros, Aragão,
Medeiros e Azevedo (2010).
Em se falando de diretividade, uma postura muito comum de terapeutas de
orientação comportamental é a de utilizar a punição como forma de enfraquecer
comportamentos alvo indesejáveis emitidos na sessão. Esse tipo de intervenção objetiva
12

enfraquecer em curto prazo a frequência de comportamentos indesejáveis. A PCP


desaconselha o uso de procedimentos aversivos como esse pelos efeitos colaterais
extensamente descritos na literatura (SKINNER, 1953/1994; FERSTER,
KULLBERTSON; PERROT-BOREN, 1968/1977; SIDMAN, 1989/1995; MOREIRA;
MEDEIROS, 2007). Dentre esses efeitos no contexto clínico é possível citar a emissão
de respostas emocionais, o enfraquecimento do vínculo e o fortalecimento de respostas
de fuga e esquiva indesejáveis, como faltas, atrasos, relatos distorcidos e o próprio
abandono da terapia. Desse modo, a PCP defende enfaticamente o uso da audiência não
punitiva descrita por Skinner (1953/1994) como a não apresentação de estímulos
aversivos pelo terapeuta contingentes ao comportamento do cliente. Ao se pensar que
boa parte dos comportamentos alvo dos clientes são decorrentes direta ou indiretamente
de histórico de controle aversivo, a simples escuta sem punição já produz efeito
terapêutico. Por outro lado, caso o terapeuta puna os comportamentos alvo do cliente
estará agindo como as pessoas que ajudaram a estabelecer os seus comportamentos alvo
indesejáveis.
Considerações Finais
Esse breve capítulo teve como objetivo apresentar, discutir e exemplificar a
forma com a qual a Psicoterapia Comportamental Pragmática lida com a relação
terapêutica. Com base nesse capítulo, foi possível observar que a relação terapêutica
ocupa um protagonismo no processo terapêutico para essa abordagem de psicoterapia
comportamental. Sua importância se dá na medida em que na relação com o terapeuta
são emitidos comportamentos alvo que podem ser analisados e modificados pela própria
relação no momento em que ocorrem.
A forma com que se trabalha a relação terapêutica na PCP possui algumas
peculiaridades como a postura crítica com a emissão de regras pelo terapeuta na
condição de interpretações e mandos acerca dos comportamentos alvo emitidos pelo
cliente na sessão; a defesa do uso da audiência não punitiva para reestabelecer
comportamentos suprimidos pela história de punição e enfraquecimento de respostas de
fuga e esquiva; e, por fim, o uso do reforçamento diferencial com manipulação de
reforçadores o mais próximo possível da situação natural.
A maneira em que a relação terapêutica é tratada na PCP tem recebido apoio
empírico como se pôde observar nos trabalhos de Oliveira (2009); Souza et al. (2012) e
Dias-Gomes (2011). Além disso, o seu suporte teórico advém de um histórico
consolidado de pesquisas básicas em Análise Experimental do Comportamento. Não
obstante, novas pesquisas empíricas necessitam ser realizadas de modo a replicar suas
predições no contexto aplicado.
Por fim, a forma com que a relação terapêutica é abordada na Psicoterapia
Comportamental Pragmática lhe confere um caráter menos diretivo, na medida em que
atribui ao cliente um papel mais ativo em seu tratamento.
13

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