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LITERATURA BRASILEIRA I

O ROMANTISMO: A INVENÇÃO
/RENOVAÇÃO DAS ORIGENS

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Olá!
Ao final desta aula, o aluno será capaz de: 1. Conhecer o contexto histórico e político do século XIX, da chegada da

Família Real; 2. Identificar as principais características do Romantismo; 3. Aprender a noção de nativismo e

como ela será construída ao longo do século XIX.

https://www.youtube.com/watch?v=Tn_4p1K4Aew

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Você acabou de ouvir uma das mais belas e significativas composições de Chopin, um ícone da música erudita do

Romantismo, período que estudaremos nesta aula.

O Romantismo durou mais de meio século e pode ser datado do final do século XVIII até meados do século XIX.

Mesmo que saibamos pouco de música, ou que não tenhamos apreço por música erudita, percebemos algumas

características próprias do período estético presentes na composição, começar pelo título “Polonaise”, em

homenagem ao país natal de Chopin, Polônia, além da emoção intensa proporcionada pela rica melodia.

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Observe a imagem:

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Note que a mulher, carregando a bandeira no centro da tela, é uma alegoria. Ela carrega o significado do que

seria a liberdade. Não é à toa que o nome desse quadro de Delacroix é A liberdade guiando o povo.

Esse quadro é muito famoso e inspirou outros artistas a comporem músicas e estátuas, como a Estátua da

Liberdade.

A força da imagem reside, também, na obstinação do menino, caminhando ao lado da liberdade, em busca de

uma sociedade mais justa.

Mesmo que para isso seja necessário matar ou morrer, conforme vemos os corpos em primeiro plano no quadro.

Quando abraçamos ideais de forma cega, sem pesar os dissabores ou perdas que teremos, podemos classificar

essa atitude como romântica.

Diz-se, também, que romântica é aquela pessoa que vive os sentimentos e emoções de forma mais intensa, ou

mesmo mais subjetiva.

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3 Mas o que essas definições têm a ver com o Romantismo?
Isso é o que veremos nesta aula.

Ao final do século XVIII, várias mudanças aconteciam na sociedade europeia. O Iluminismo lançara as bases para

uma revolução mental que abalou os alicerces da sociedade absolutista e o sistema colonial.

A assinatura da Declaração dos Direitos do Homem, a Independência dos Estados Unidos e a Revolução Francesa

transformaram o mapa do mundo e trouxeram certezas e desejos, pelos quais valia a pena lutar.

Por outro lado, a racionalidade proposta pelo Neoclassicismo não supria a força das emoções despertadas pelo

momento histórico. O envolvimento e a participação do homem em fatos que mudaram as estruturas sociais

passaram a ser representados por uma arte que procurava ressaltar a visão emotiva e subjetiva do mundo.

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Assim, sentimentos como o patriotismo, o nacionalismo e o reformismo são temas constantes das obras da

época, assim como a valorização da natureza, que tanto pode ser a expressão dos sentimentos do artista ou a

natureza exótica, representada por florestas e terras selvagens.

No entanto, a sociedade que se desejava não se concretizou. O homem percebeu que os ideais endossados por

sua luta não representaram uma mudança social significativa. Os privilégios mudaram de mãos, passaram da

nobreza para a burguesia, mas os pobres continuaram sendo explorados. Em outras palavras, a liberdade não se

converteu em igualdade.

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O artista desse período também registrou em suas obras a melancolia e o desalento diante da impotência e da

impossibilidade de mudança e traduziu para a arte seus sentimentos em forma de escapismo e melancolia.

Observe que o período denominado Romantismo é extenso e rico em manifestações e diversidade. Alguns

autores afirmam que nasceu na Alemanha, outros na Inglaterra, e ainda na França. Se não há uma unanimidade

quanto à origem, perdura um consenso quanto à importância da expressão desse movimento estético e das

gerações dele decorrentes.

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6 O romantismo no Brasil
Como a política pode interferir na produção estética?

Historicamente, o nosso país, no final do século XVIII, esboçara um movimento de insatisfação com o sistema

colonial, configurando a Inconfidência Mineira em 1789.

Na virada do século XVIII para XIX, Portugal viu-se pressionada pelas tropas napoleônicas que exigiam um

posicionamento quanto ao Bloqueio Continental à Inglaterra. Nossa metrópole, contudo, devia politicamente e

economicamente muito ao país bretão e não podia, naquele momento, contrapor-se a seu aliado. A solução

encontrada foi a mudança de toda a família real para a Colônia mais próspera, o Brasil.

Elevada à condição de vice-reino, a Colônia foi sacudida pela necessidade de se adequar ao novo cenário e às

novas necessidades de seus habitantes recém-chegados.

Em 1808, a Corte portuguesa se mudou para o Rio de Janeiro, provocando uma série de mudanças na vida social

brasileira, uma vez que, enquanto Colônia, não havia aqui bibliotecas, museus, teatros, nem mesmo tínhamos

permissão para a publicação de jornais e livros.

Os ventos europeus que sopravam os ideais libertários e românticos chegam também aqui, colidindo com a

presença da metrópole, estabelecida em nossas terras.

De forma que, em 1822, a Independência do Brasil, proclamada pelo descendente da monarquia portuguesa, não

é um paradoxo histórico, mas uma solução pacífica para as aspirações políticas, as pressões econômicas e os

anseios sociais.

O país, todavia, ainda se apoiava em uma estrutura agrária, latifundiária e escravocrata, muito distante dos ideais

de liberdade e igualdade difundidos na Europa.

É nesse panorama que surge o Romantismo no Brasil: da tensão entre a emergência da imagem de país

independente e a presença das marcas coloniais.

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Daí a importância da literatura para a constituição da personalidade cultural do país naquele momento, pois as

circunstâncias delegaram aos artistas o papel de forjar a identidade de nossa cultura e, como extensão, de nossa

nacionalidade.

Leia o trecho de Antônio Candido, de sua obra Formação da literatura brasileira:

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“Se o Brasil era uma nação, deveria possuir espírito próprio, como efetivamente manifestara pela

proclamação da Independência; decorria daí, por força, que tal espírito deveria manifestar-se na

criação literária, que sempre o exprimia, conforme as teorias do momento.” (CANDIDO, Antonio.

Formação da literatura brasileira. P. 304)

8 Nascimento de um Brasil: um parto nada natural


A abertura da Ópera O Guarani, de Carlos Gomes.

https://www.youtube.com/watch?v=rRUMTl4gIng

A música que você está ouvindo é a abertura da ópera O Guarani, de Carlos Gomes. Essa passagem da

composição ficou famosa por ser a música que tematizava a abertura do Jornal radiofônico “A voz do Brasil”.

Carlos Gomes inspirou-se no romance O guarani, de José de Alencar, para criar a ópera, que estreou em 1870.

Perceba a grandiosidade do tema, explorada na ênfase dada aos instrumentos de sopro.

O índio, protagonista da obra, foi um tema muito explorado pelo Romantismo, principalmente nos romances de

José de Alencar. Isso se explica por três razões.

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1. O empenho em traduzir as tendências vindas de fora fez-se sentir na adaptação dos temas à realidade e à

paisagem brasileira, de forma que a presença de elementos da natureza se tornou uma exigência para se

considerar a obra visceralmente pertencente à literatura de nossa terra. A esse traço deu-se o nome de “cor

local”.

Em 1826, foram publicadas duas obras importantes para a literatura brasileira: o Bosquejo da história da poesia

e língua portuguesa, de Almeida Garret, e Résumé de l‘Histoire Littéraire du Brésil, de Ferdinand Denis. Ambas

as obras reconhecem a existência da literatura brasileira. A primeira sugere que se deveria substituir a mitologia

pela realidade local ao traçar o primeiro panorama evolutivo da literatura portuguesa. A segunda, mais incisiva,

sugere não apenas a recusa à mitologia, mas também, e principalmente, a inserção da descrição da natureza, do

índio e do colono.

2. A busca pelo primitivo revelou-se como tendência na literatura europeia, e não apenas brasileira. A natureza,

no Romantismo, representa um refúgio e o cenário do homem puro. Essa idéia está relacionada ao mito do “bom

selvagem”, defendido por Rousseau.

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Assim, de forma complementar a esse aspecto, o retorno ao passado procura recuperar o estado de pureza. No

caso das expressões artísticas europeias, essa tendência se observa na valorização da Idade Média. Na literatura

brasileira, o indígena da colonização consegue personificar e reunir os elementos necessários às duas

determinações: o nacionalismo e o primitivismo. A essa tendência deu-se o nome de nativismo.

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Como bem observou Afrânio Coutinho (COUTINHO, A. Introdução à literatura brasileira. 17 ed. Rio de Janeiro:

Bertrand Brasil, 2001. p. 152-152):

“Foi graças ao próprio senso de relativismo do movimento, que ele se adaptou à situação local,

valorizando-a, de acordo com a regra romântica de exaltação do passado e das peculiaridades

nacionais. Assim, o Romantismo, no Brasil, assumiu um feitio particular, com caracteres especiais e

traços próprios, ao lado dos elementos gerais, que o filiam ao movimento europeu. De qualquer

modo, tem uma importância extraordinária, porquanto foi a ele que deveu o país a sua

independência literária, conquistando uma liberdade de pensamento e de expressão sem

precedentes” (COUTINHO, 2001. p. 152-153).

Mas é importante notar que, ao descrever a fauna e a flora brasileiras em sua pujança e exotismo, na verdade, os

escritores davam a conhecer o olhar do estrangeiro sobre o Brasil. Em outras palavras, ainda não nos víamos por

nossos próprios olhos e pela nossa experiência, pois o pitoresco e o seu traço caricatural exageram o que deveria

ser tratado como natural.

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ASSIS, Machado. Dom Casmurro. Disponível em:http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa

/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=1888 .

Em Dom Casmurro, Machado de Assis institui um narrador em 1ª pessoa, Bento, ou Bentinho, o próprio

Casmurro. Ao fim da vida, já idoso, o narrador resolve contar o seu passado. A despeito de, no primeiro capítulo,

esvaziar a importância do que vai confidenciar ao leitor, fazendo referência ao tédio dos que não têm nada

melhor a fazer, o narrador relata o adultério de sua esposa.

Sabemos que o tema do adultério é comum no Realismo, pois serve de base aos romances de tese, que procuram

provar a total degradação da sociedade, apontando as mazelas de seu pilar, a família. No entanto, o romance

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desconstrói as certezas dos lugares sociais: marido provedor, mulher frívola, amigo traidor; enfim, esses

personagens apresentam nuances que não podem ser creditadas ao narrador, já que ele apresenta o seu libelo de

defesa – advogado, que se constitui, da própria causa.

Maria Capitolina, Capitu, traiu ou não traiu Bentinho? Não é esse o ponto principal da narrativa, mas como se

elabora a defesa do suposto traído, que julgou, sentenciou e exilou mulher e filho.

Você poderia perguntar: qual é o motivo de ter-se tornado tão famoso o romance?

Há bons motivos para isso. Dom Casmurro é focalizado a partir da primeira pessoa, Bento Santiago, um filho

mimado, cujos motivos e angústias são tão egoístas e frívolos, que permitem transparecer a ironia sonsa, por

detrás do texto, de outro narrador. Esse outro narrador é que coloca em dúvida a veracidade dos fatos, já que são

contados a partir do olhar ou da memória de alguém, que não deveria merecer nenhum crédito.

Além disso, a escrita primorosa de Machado, o uso de metáforas inesperadas e a erudição de suas fontes se

constituem em aspectos que se combinam à genialidade da expressão do conteúdo, firmando a sua posição

destacada pela crítica mundial.

CONCLUSÃO
Nesta aula, você:
• Contexto histórico do Romantismo na Europa;
• Contexto histórico do Romantismo no Brasil;
• Principais características do movimento;
• Articulação das características ao panorama brasileiro.

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