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A realizaçã o d o trabalho que a seguir apresentam os só foi possí vel

d ad o o financiam ento d a JN ICT (Junta N acional d e Investigaçã o Cientí fica


e Tecnológica) que perm itiu a aquisiçã o d e equipam ento inform á tico e d e
program as d e alto ní vel. Esse apoio financeiro viabilizou tam bém o funcio-
nam ento d e um a equipa d e três recém -licenciad os em H istória pela
Faculd ad e d e Ciências Sociais e H um anas d a Universid ad e N ova d e Lis-
boa, constituí d a por Cristina Joanaz d e Melo, Margarid a Lopes e N uno
Pousinho, que, com um inexced í vel em penho, se entregou à á rd ua tarefa
d e reconstituiçã o d a antiga d ivisã o ad m inistrativa.

Mas os resultad os alcançad os d evem -se, em grand e parte, à s excelen -


tes relações d e trabalho e am izad e estabelecid as com os responsá veis e
técnicos d a em presa EREN A - Ord enam ento e Gestã o d e Recursos
N aturais L.d a., em cujo equipam ento e com cujo softw are d ecorreu inicial-
m ente o processam ento d a inform açã o geográ fica. Um a m ençã o especial é
d evid a à engª . H elena Sim ões pela eficiência com que oper ou com o SIG
(Sistem a d e Inform açã o Geográ fica) e pela sim patia e solicitud e com que
respond eu a tod os os nossos ped id os.

N ã o pod í am os d eixar d e referir tam bém o Prof. Marco Painho, pela


form a com o acolheu no ISEGI (Instituto Superior d e Estatí stica e Ge stã o d e
Inform açã o) o projecto d e prod uçã o d o CD. O José Marques e o Ed uard o
Sereno, pela m aneira com o d eram vid a a esse projecto, têm igualm ente d e
ser lem brad os.

O constante em penho, em tod o o processo d a ed içã o, d o Miguel


Rod rigues, d a Patrim onia, bem com o a sua perm anente d isponibilid ad e
nã o d evem cair d o esquecim ento.

Prefá cio 7
As últim as palavras sã o para record ar alguns colegas e am igos: o
Paulo Jorge Azeved o Fernand es, pelas repetid as ajud as que prestou nos
m om entos finais d e preparaçã o d o livro e d o CD; o Carlo s N ogueira, pela
d ecisiva intervençã o na d efiniçã o d a estética d o CD, e o Ped ro Tavares d e
Alm eid a, pela leitura atenta d o original d o livro. Mas serí am os injustos se,
entre tod os, nã o d estacá ssem os o N uno Gonçalo Monteiro, nã o só pelos
contributos que d eu neste ou naquele m om ento, m as, acim a d e tud o, pelo
perm anente estí m ulo intelectual que a sua convivência tem representad o,
d esd e há anos.

A tod os, nesta oportunid ad e, apresentam os os nossos agrad ecim en-


tos.

8 Prefá cio
Com o é sabid o, entre 1832 e 1836, a organizaçã o d o território portu -
guês sofreu um a profund a rem od elaçã o d a qual nasceu a d ivisã o ad m inis -
trativa actual.
A reform ulaçã o d o espaço entã o operad a constitui um a d im ensã o e
um legad o fund am ental d a Revolu çã o Liberal e é, em si m esm a, um objecto
d e estud o d e grand e interesse. Para além d isso, ela tem colocad o aos his -
toriad ores problem as sérios: a um ní vel bá sico, há d ificuld ad e em enqua -
d rar na nova d ivisã o ad m inistrativa inform ações avulsas relativas ao An-
tigo Regim e e vice-versa; a um ní vel m ais com plexo, a reorganizaçã o d o es-
paço tem constituí d o um obstá culo inultrapassá vel à prod uçã o d e carto -
grafia com pará vel, representand o d ad os recolhid os antes e d epois d a Re -
voluçã o Liberal. De facto, com o com parar variá veis agregad as em com ar-
cas com variá veis agregad as em d istritos? Com o com parar inform ações
sobre concelhos anteriores e posteriores à profund a reform a d e 1836?
Exem plos d as d ificuld ad es referid as pod er -se-ã o encontrar em vá rios tra-
balhos recentes d e grand e m érito.
Estes problem as, com o seria d e esperar, nã o afectam som ente os his-
toriad ores portugueses. N um sem iná rio realizad o no Instituto
Universitá rio Europeu d e Florença, em 1994, o tem a d a com parabilid ad e d e
d ad os georeferenciad os no contexto d e m ud anças d o espaço polí tico-
ad m inistrativo foi abord ad o por vá rios d os presentes em relaçã o a paí ses
tã o d iversos com o a Grécia, a H oland a, a Bélgica e a N oruega .1

1 Michael Goerke (ed .) - Coordinates for Historical M aps, Gottingen, Max-Planck-Institut,


1994.

Introd uçã o 11
SILVEIRA

Os objectivos d o trabalho cujos resultad os agora se apresentam fo-


ram os seguintes: por um lad o, prod uzir cartografia, tã o rigorosa quanto
possí vel, d a d ivisã o ad m inistrativa d o continente antes e d epois d a Revo -
luçã o Liberal; por outro, resolver os problem as d e com parabilid ad e enun -
ciad os.
A aplicaçã o inform á tica d esenvolvid a, com binand o um a base d e d a-
d os e um SIG (Sistem a d e Inform açã o Geográ fica) respond e plenam ente a
estes objectivos. As cartas prod uzid as, que pod em ser im pressas a esca las
d iversas, contêm erros d e traçad o d e d ois tipos: uns, d ecorrentes d e d e-
cisões involuntariam ente incorrectas; outros, resultantes d e problem as que
fom os incapazes d e resolver ou d a própria m etod ologia ad optad a. N atu -
ralm ente, os erros d o prim eiro tipo sã o d esconhecid os; os d o segund o, no
entanto, sã o parcialm ente controlá veis, quantificá veis e até suscep tí veis d e
serem representad os nos m apas.
Além d isso, é agora possí vel agregar e cartografar a inform açã o pro -
d uzid a no final d o Antigo Regim e d e acord o com as circunscrições em vigor
no perí od o liberal, d esd e que os d ad os d e base se refiram à s freguesias.
Quer isto d izer que o obstá culo acim a referid o foi ultrapassad o e que pas -
sá m os a d ispor d e um instrum ento pod eroso que perm ite recuar no tem po,
em espaços com pará veis, a aná lise d e variá veis georeferenciad as.
Em relaçã o à cartografia publicad a até agora, referente à época a que
tem os alud id o e a séculos anteriores, existem sem elhanças e d iferenças d e
m etod ologia.2 Aquelas têm a ver com o facto d e tam bém nós term os se-
guid o o m étod o retrospectivo na construçã o d os m apas. As d iferenças d e -
correm d o ní vel d e porm enor a que trabalhá m os e d a utilizaçã o d o SIG,
cujas capacid ad es d e aná lise espacial m al explorá m os por agora. 3
As cartas que a seguir apresentam os referem -se a três anos: 1826,
1834 e 1842. A escolha d o prim eiro ano justifica-se pelo facto d e nele ain-

2 O m étod o por nós seguid o encontra-se exposto no anexo I. Sobre outros trabalhos ver
Joã o José Alves Dias - Gentes e Espaços (Em Torno da Populaçã o Portuguesa na Primeira
M etade do Século X V I), vol. I, Lisboa, Fund açã o Calouste Gulbenkian,1996; António Manuel
H espanha - A s V ésperas de Leviathan. Instituições e Poder Polí tico - Portugal Sec. X V II, Lis-
boa, ed . d o autor, 1987, 2 vols.; Fernand o Onório e António Eanes - Comarcas e Concelhos de
1826, escala 1:500000.
3 Russell G. Congalton e Kass Green - The ABC of GIS. An Introd uction to Geographic In -
form ation System s, in Journal of Forestry, 90, 11, 1992, pp. 13-20; Maria H elena Dias (coord .)
– Os M apas em Portugal. Da Tradiçã o aos N ovos Rumos da Cartografia, Lisboa, Cosm os, 1995.

12 Introd uçã o
TERRITÓRIO E PODER

d a estar em vigor a d ivisã o ad m inistrativa d o Antigo Regim e e d e existir


um a carta d e com arcas e concelhos d e boa qualid ad e que funcionou com o
um a form a d e controlo final d a que nós próprios prod uzim os. As circuns -
crições d e 1834 correspond em à prim eira tentativa d e reorganizaçã o ad -
m inistrativa liberal. Finalm ente, se bem que a criaçã o d os d istritos d ate d e
1835 e a grand e reform a d os concelhos d e 1836, d urante os anos seguintes
vá rios ajustam entos foram send o introd uzid os. Por isso optá m os por car -
tografar a d ivisã o polí tico-ad m inistrativa em 1842, por correspond er a um
m om ento d e relativa estabilizaçã o d o sistem a.
A ferram enta inform á tica que d esenvolvem os tem aplicaçã o em vá -
rios d om í nios d a aná lise histórica, esperand o nós que nos próxim os anos
ela possa d ar um contributo interessante para o avanço d esta á rea cientí -
fica.
Por agora, vam os apresentar as cartas prod uzid as e vam os estud á -
-las d o ponto d e vista d a evoluçã o d o espaço polí tico -ad m inistrativo.
Utilizarem os d ois suportes d istintos, que pod em ser usad os d e form a
ind epend ente, m as com plem entar.
O suporte trad icional (o papel) foi consagrad o à exposiçã o d o es-
tud o sobre a organizaçã o d o território. Com eçam os por analisar essa or-
ganizaçã o no final d o Antigo Regim e, tentand o com preend er as suas ca rac-
terí sticas próprias, d ecorrentes d o sistem a d e pod er e d a socied ad e d a
época. A im agem e os conhecim entos que os portugueses tinham d o espaço
que habitavam serã o igualm ente abord ad os. Dad a a espessura tem poral
d as realid ad es que analisam os na prim eira parte, em m uitos casos terem os
d e recuar bem longe, aos tem pos d a reconquista e d a form açã o d o reino.
Deste capí tulo inicial resulta um conjunto d e id eias essenciais para com -
preend er a transform açã o que a Revoluçã o Liberal introd uziu, ao criar um
quad ro institucional e um a organizaçã o d o espaço que é, basicam ente,
aquela em que aind a hoje vivem os. O segund o capí tulo é consagrad o à nar -
rativa d este processo, à exposiçã o d as soluções ensaiad as e d as reacções
que suscitaram . N o terceiro capí tulo, apresenta-se o ponto d e chegad a d e
tod as estas alterações, procurand o-se d estacar as peculiarid ad es d a his-
tória nacional.
N ã o faria sentid o com as tecnologias hoje d isponí veis m ultiplicar o
núm ero d e pá ginas com a reprod uçã o d os m apas d e porm enor. A apresen -

Introd uçã o 13
SILVEIRA

taçã o d estes e d as cartas gerais é feita, d e form a interactiva, em suporte


m agnético. O texto é aí red uzid o, d and o-se relevo à im agem , estand o a
inform açã o estruturad a d e form a a perm itir um a navegaçã o fá cil e
intuitiva.

14 Introd uçã o
Um território precocemente definido

H á factos que, à força d e serem repetid os, se tornam óbvios, evid en -


tes, m as que por este m otivo nã o perd em a sua im portâ ncia. O cará cter
precoce d as fronteiras portuguesas está neste caso e nã o pod e d eixar d e se r
record ad o num texto em que se trata d o território porque, com o se verá
ad iante, ele constitui um d ad o relevante para entend erm os algum as carac-
terí sticas próprias d a organizaçã o d o espaço nacional.
Convirá , pois, record ar que, poucos anos após a d oaçã o d o Cond ad o
Portucalense a D. H enrique (1096), o território d e Portugal continental, tal
com o o conhecem os hoje, se encontra praticam ente d efinid o: a reconquista
d as terras algarvias está term inad a em 1250 e, em 1297, Portugal e Castela
assinam o tratad o d e Alcañices que d elim ita a fronteira entre os d ois reinos
em term os m uito próxim os d os actuais. A grand e e últim a alteraçã o terri -
torial ocorre em 1801, na sequência d a Guerra d as Laranjas, com a am pu -
taçã o d a regiã o d e Olivença.1
A ind ivid ualizaçã o d o território d e Portugal, d esd e um a época tã o
recuad a, é um facto que contrasta com a história d e d ois outros paí ses, a
França e a Espanha, com os quais irem os com parar, em vá rios passos, a
história portuguesa. Esta com paraçã o justifica -se porque am bos tiveram u m a
enorm e influência sobre as soluções ad optad as entre nós, quanto à
reorganizaçã o d o espaço, na época d a Revoluçã o Liberal. Com preend er-
m os as d iferenças existentes no m om ento em que a revoluçã o ocorre em

1 O traçad o d as fronteiras portuguesas, que separam regiões peninsulares naturalm ente


sem elhantes, tem a sua origem na d ivisã o ad m inistrativa rom ana, sobre a qual se im plantou
m ais tard e a organizaçã o eclesiá stica cristã (A. H . d e Oliveira Marques - História de Portugal,
vol. I, Lisboa, Ágora, 1972, p. 25). Sobre as flutuações d a fronteira até Alcañices ver José
Mattoso - A Identificaçã o de um Paí s. Ensaio sobre as Origens de Portugal, 1096-1325, vol. II,
Lisboa, Estam pa, 1985, pp. 194-196.

O Antigo Regim e 17
SILVEIRA

cad a um d os estad os, d iferenças que resultam d e percursos históricos d is-


tintos, ajud a-nos a entend er as caracterí sticas peculiares d a evoluçã o por -
tuguesa no perí od o contem porâ neo. Por outro lad o, é ind iscutí vel que a
história nacional se torna m uito m ais inteligí vel quand o integrad a no con -
texto peninsular.
N o caso d a França, é preciso esperar pelo século XVI para que as
á reas confinantes com o Atlâ ntico sejam integrad as no respectivo território;
a d efiniçã o d a fronteira com a Espanha só no século seguinte se verifica;
m ais tard ia é, aind a, a d elim itaçã o d as fronteiras terrestres N orte e Leste
que, estand o consum ad a no século XVIII, conhecerá , contud o, oscilações
significativas até ao século XX.2
Quanto à m onarquia espanhola, os passos d ecisivos serã o d ad os no
século XV, com a uniã o d e Castela e Aragã o e a conquista d e Granad a, e, no
século XVI, com a incorporaçã o d e N avarra. 3
Retenham os por agora estes factos. Mais à frente d ir -se-á algo sobre o
ní vel d e integraçã o espacial em Portugal, França e Espanha.
N a Id ad e Méd ia, os lim ites d o território portug uês eram m ais vagos
d o que hoje e o espaço fronteiriço era m arcad o pelos castelos que iam
send o ed ificad os.4 N o iní cio d o século XVI, Duarte Darm as d esenhou, com
rara beleza, essas fortalezas que, d esd e Cam inha a Castro Marim , traçam
um a linha contí nua d e d efesa. Aond e nã o existiam acid entes naturais -
cursos d e á gua, serras - a separaçã o era m ais d ifí cil d e estabelecer. De
N orte a Sul havia pontos d e con flito que, por vezes, envolviam os
m agistrad os locais, portugueses e castelhanos, d isputand o á reas d e
jurisd içã o ou, com m ais frequência, as populações raianas, d iscutind o a
posse d e terras d e pasto ou d e cultivo. Por isso, no século XVI, a coroa fez
um esforço d e d elim itaçã o d e fronteiras que m arcavam espaços d e

2 Daniel N ord m an e Jacques Revel - La Form ation d e l’ Espace Français, in Jacques Revel
(d ir.) - L’ Espace Français, Paris, Seuil, 1989, pp. 43-55.
3 Lu is Gonzá lez Antón - El Territorio y Su Ord enación Politico-Ad m inistrativa, in
Miguel Artola (d ir.) - Enciclopedia de Historia de España, tom o II, Mad rid , Alianza Ed itorial,
1988, pp. 11-92. Ver tam bém o tom o VI d a m esm a enciclopéd ia, contend o um a d esenvolvid a
cronologia e um a boa colecçã o d e m apas.
4 A respeito d o conceito d e fronteira na Id ad e Méd ia ver o artigo d e Rita Costa Gom es -
Sobre as Fronteiras Med ievais: A Beira, in Revista de História Económica e Social, n.º 21,
1987, pp. 57- 71.

18 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

exercí cio d e soberania e eram , ao m esm o tem po, fonte d e rend im ento,
através d a cobrança d e d ireitos alfand egá rios. 5
N o século XVIII, a Intend ência Geral d a Polí cia, criad a em 1760, co -
ord enava a vigilâ ncia d a fronteira a cargo d os juí zes d as terras. Vigilâ ncia
que, em tem pos d e agitaçã o, constituí a um a preocupaçã o d om inante d os
m agistrad os territoriais.
De qualquer m od o, no iní cio d o século XIX a fronteira nã o era um a li-
nha d e separaçã o absoluta. Por exem plo, em Trá s-os-Montes, no couto
constituí d o pelas povoações d e Santiago, Meã os e Rubiã es, um a d as zonas
em d isputa três séculos antes, viviam galegos e portugueses; na regiã o d a
Beira, a vila d a Bouça, situad a no paí s vizinho, era habitad a por portu -
gueses e, um pouco m ais a Sul, os m orad ores d e Malpica lavravam terras
em Espanha; m ais curioso, talvez, é o caso d e Moura que, até 1893, parti-
lhava a propried ad e d e um bald io com d uas ald eias espanholas.6 Por ou-
tro lad o, o regulam ento geral d e polí cia d e 1863 d ispensava os habitantes
d a zona d a fronteira d a necessid ad e d e apresentar passaporte e p erm itia-
lhes que entrassem e saí ssem livrem ente d esd e que fossem “ conhecid os
com o and and o em contí nuo giro com ercial” .(art. 2º )

D iversidade natural, diversidade humana

N o interior d o território português as cond ições naturais criam espa-


ços d iversos. N u m a visã o am pla d o m osaico que esse território constitui, é
possí vel estabelecer algum as d istinções bá sicas, nom ead am ente, entre o
N orte e o Sul, ou o Portugal d as terras m ontanhosas, que vêm m orrer quase
junto à costa, e o Portugal d as terras baixas, d as extensas planí cies; o Por-
tugal “ m ais atlâ ntico, rico d e á guas, verd ejante” e o Portugal “ m ais m ed i-

5 Joaquim Rom ero d e Magalhã es - O Enquad ram ento d o Espaço N acional, in id em


(coord .) - N o A lvorecer da M odernidade (1480-1620), Lisboa, Cí rculo d e Leitores, 1993, pp. 13-
59, col. José Mattoso (d ir.) - H istória d e Portugal, vol. III.
6 Sobre Moura ver Albert Silbert - Le Portugal M éditerranéen à la Fin de l’ A ncien Régime,
2ª ed ., vol. II, Lisboa, IN IC, 1978, p. 421; para os outros ca sos ver Fernand o d e Sousa - A
Populaçã o Portuguesa nos Iní cios do Século X IX , Porto, 1979, pp. 114, 122 e 127.

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SILVEIRA

terrâ neo, ressequid o por longos estios” . N o N orte, o contraste entre o lito-
ral e a zona interior, é outra d iferença a nã o esquecer. 7
A d iversid ad e natural, que Orland o Ribeiro tã o bem d escreveu, re-
flectiu -se ao longo d o tem po na econom ia, na estrutura social, no com por ta-
m ento d em ográ fico e no povoam ento. Aquela d iversid ad e, que quase se
d iria constitutiva, foi m esm o o quad ro conceptual a partir d o qual Jo sé
Mattoso procurou pensar as origens d e Portugal. 8
Os contrastes N orte/ Sul e litoral/ interior, acim a referid os, sã o bem
visí veis no m apa n.º 1 que representa a d ensid ad e populacional por conce -
lho em 1828.9 A separaçã o entre as d uas prim eiras zonas faz-se, neste
caso, pela linha d o Tejo. N a m etad e N orte, a populaçã o concentra -se num a
faixa litoral entre os rios Minho e Mond ego, penetrand o para o interior, ao
longo d os principais cursos d e á gua. É nesta regiã o que se situam as m ais
altas d ensid ad es d o paí s, com o o segund o m apa m ostra. A partir d este
núcleo, os valores vã o progressivam ente d im inuind o à m ed id a que se cam i-
nha para leste. Em torno d e Lisboa, a norte e a sul d a foz d o Tejo, d ese-
nha-se um a outra m ancha d e concelhos com elevad as d ensid ad es, que s e
tornaria m ais visí vel aind a, se existissem d ad os d em ográ ficos sobre a capi -
tal.
N a m etad e Sul d o paí s, na zona d o Alentejo, a baixa d ensid ad e po -
pulacional ressalta com clareza, contrastand o com o que suced e no N orte,
funcionand o a d icotom ia litoral/ interior no sentid o inverso ao que se refe-
riu antes: a populaçã o ad ensa-se um pouco na á rea d e Portalegre, no eixo
Cam po Maior-Elvas-É vora e na regiã o d e Beja. N o litoral algarvio, por úl-
tim o, a d ensid ad e volta a aum entar.
N os últim os cem anos a paisagem agr o-florestal sofreu m od ificações
profund as. De facto, só um terço d a á rea d o continente estava cultivad o

7 Orland o Ribeiro - Portugal, O M editerrâ neo e o A tlâ ntico, 4ª ed ., Lisboa, Sá d a Costa,


1986. Citações retirad as d a p. 131.
8 José Mattoso - A Identificaçã o de Um Paí s.
9 Apesar d a qualid ad e d os d ad os d o censo d este an o, com entad a no anexo II, os resulta-
d os sã o interessantes e consistentes com outras inform ações d ispon í veis, reflectind o, ao fim e
ao cabo, caracterí sticas estruturais d o territór io. Calculá m os a d ensid ad e populacional para
778 concelhos, um a vez que nã o há inform açã o, em sim ultâ neo, sobre á rea e populaçã o
para os restantes 26. Lisboa e Porto figuram entre estes últim os. N ã o foram contabilizad os
2,4% d o total d e ind iví d uos apurad o pelo recenseam ento d e 1828 e 1,7% d a á rea d o conti-
nente.

20 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

cerca d e 1875.10 Com o seria d e esperar, a d istribuiçã o d estas terras, que


nã o sofreu m od ificações substanciais em relaçã o à prim eira m etad e d o sé -
culo XIX, correspond ia à s zonas acim a assinalad as ond e a populaçã o era
m ais d ensa: o litoral ao norte d o Tejo, acom panhand o para leste o curso
d os rios; a sul d o Tejo, concentraçã o em torno d os centros d e po voam ento
d o interior que pareciam autênticas ilhas perd id as na vastid ã o d a charneca
alentejana. Um a últim a faixa d e terras cultivad as d istribuí a -se ao longo d a
costa d o Algarve.11
Da im pressã o causad a pelo contraste entre um Alentejo fracam ente
povoad o e quase por d esbravar e um Minho d ensam ente habitad o e labo -
riosam ente cultivad o, vá rios escritores nos d eram testem unho, d o fim d o
século XVIII ao fim d o século seguinte. Mas a necessid ad e d e equilibrar o
território, que H erculano já sentia, ad quiriu, anos d epois, na pena d e Oli-
veira Martins, um cará cter d e urgência: é que este nã o entend ia com o é que
um paí s ond e a em igraçã o tinha entretanto d isparad o nã o conseguia fixar
essa populaçã o exced entá ria, em grand e parte m inhota, nas terras d o Sul.12
Escrevia este autor: “ N o litoral d o N orte tem os um a lavoura quase
hortí cola, um a populaçã o d ensí ssim a, um a em igraçã o abund ante e capitais
m óveis a preços relativam ente í nfim os; no litoral d o Sul, no centro m erid io -
nal e ao longo d e tod a a fronteira d e Leste, vêem -se estepes com o as d a
Rússia, d esertos com o o Sara e um a penúria d e capitais com juros que tam -
bém , já hoje, apenas sã o correntes fora d a Europa. O vale oblí quo d o Tejo
pod e d izer-se que d ivid e o Portugal povoad o d o d eserto, o Portugal culto
d o inculto; e a prim eira necessid ad e d a nossa econom ia interna é com pen-
sar estas d uas m etad es, unificar estas d uas partes, traslad ar para as
regiões d eficientes aquilo que há nas opí paras: o hom em , os capitais. É

10 Gerard o Augusto Pery - Geografia e Estatí stica Geral de Portugal e Colónias, Lisboa, Im -
prensa N acional, 1875, pp. 108-109 e Eu génio Castro Cald as - A A gricultura Portuguesa no
Limiar da Reforma A grá ria, Oeiras, Fund açã o Calouste Gulbenkian, 1978.
11 Ver o m apa respectivo em Relatório A cerca da A rborizaçã o Geral do Reino, Lisboa,
Tipografia d a Acad em ia Real d as Ciências, 1868.
12 António H enriques d a Silveira - Racional d iscurso sobre a Agricultura e Populaçã o
d a Proví ncia d o Alentejo, in M emórias Económicas da A cademia Real das Ciências de Lisboa, Tom o
I, Lisboa, 1789, pp. 50-51; Alexand re H erculano - Os Ví nculos, in Opúsculos, tom o II, ed .
crí tica, Lisboa, Presença, 1983, p. 50 (1ª ed ., 1856); Oliveira Martins - Projecto d e Lei d e Fo-
m ento Rural, in Fomento Rural e Emigraçã o, Lisboa, Guim arã es Ed itores, 1956. O projecto d e
lei foi apresentad o à Câ m ara d os Deputad os em 1887.

O Antigo Regim e 21
SILVEIRA

realizar d entro d as fronteiras d o reino um m ovim ento d e translaçã o que


hoje se faz, sim , m as para fora d o paí s.” 13
N a actualid ad e as preocupações sã o outras e têm a ver com a con -
centraçã o d a populaçã o no litoral N orte. Ora, a com paraçã o d o m apa n.º 1
com cartas equivalentes para 1706 e 1991, que neste m om ento nã o pod e ir
além d e consid erações gerais, d ad a a d iferença d e qualid ad e d os d ad os e
d os critérios d e elaboraçã o d a cartografia, perm ite nã o só constatar, sem
surpresa, o cará cter estrutural d os contrastes N orte/ Sul, litoral/ interior,
que, em últim a aná lise se d etectam no perí od o m ed ieval, com o lançar um a
hipótese a d esenvolver em investigações futuras d e form a m ais precisa: a
litoralizaçã o d a populaçã o é um fenóm eno em m archa há vá rios séculos
que se acentuou na época contem porâ nea.14

Um território mal conhecido

A representaçã o m ental que os nossos antepassad os faziam d o terri-


tório tem d e ser, necessariam ente, d iferente d a que hoje possuí m os. É que,
instrum entos d e conhecim ento actualm ente banais, ou nã o existiam até
certa altura, ou tinham pouca d ifusã o. Dispom os d e um a carta d e Portugal
d esd e 1561 e outras foram d epois send o elaborad as. Mas um d os
problem as que afectou a cartografia portuguesa até ao século XIX foi a
escassez d e oficinas ond e efectuar a reprod uçã o d os m apas, o que
naturalm ente d ificultava a sua d ivulgaçã o.15 É verd ad e que no século XVIII
se assistiu à sua inclusã o em livros, m as a circulaçã o d estes restringia -se à
pequena elite cultural d a época. De resto, “ possivelm ente porque o acesso
à boa Cartografia nacional era m uito d ifí cil, ou m esm o im possí vel, para o

13 Oliveira Martins - Projecto de Lei de Fomento Rural, pp. 22-23.


14 A carta d e d ensid ad e populacional por concelho para 1706 d eve-se a António Manuel
H espanha que a publicou originalm ente em A s V ésperas de Leviathan, vol. I, p. 109, d a qual
existem vá rias reprod uções. A d e 1991 pod e ver -se em Lu í s Valente d e Oliveira - Regionaliza-
çã o, Porto, Asa, 1996, p. 44.
15 Maria Fernand a Alegria e Joã o Carlos Garcia - Aspectos d a Evoluçã o d a Cartografia
Portuguesa (Séculos XV a XIX), in Maria H elena Dias (coord .) - Os M apas em Portugal, pp. 27-
84.

22 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

grand e público, m anteve-se até tard e [fim prim eira m etad e d o século
passad o] o uso d e fund os d e m apa perfeitam ente antiquad os.” 16
Só em 1865 se publicou o que pod e ser consid erad o “ o prim eiro
m apa geral m od erno d o Paí s, construí d o com sólid as bases cientí ficas” , a
Carta Geográ fica de Portugal, à escala d e 1:500 000. Este m apa foi o culm i-
nar d e um m ovim ento d e interesse pela cartografia d o território d o conti -
nente que rem onta ao século XVIII. A fund açã o, em 1779, d a Acad em ia
Real d e Marinha e d a Acad em ia d as Ciências constituiu, d este ponto d e
vista, um m arco im portante e foi seguid a, em 1798, pela criaçã o d a Socie -
d ad e Real Marí tim a, Militar e Geográ fica para o Desenho e Im pressã o d as
Cartas H id rográ ficas, Geográ ficas e Militares. Os esforços d esencad ead os
por estas instituições esm oreceram n o com eço d o século XIX, tend o rece-
bid o um novo e d ecisivo estí m ulo com a criaçã o d o Ministério d as Obras
Públicas, Com ércio e Ind ústria em 1852. 17
O m esm o m ovim ento intelectual que levou ao d esenvolvim ento d a
cartografia teve reflexos na prod uçã o d e estatí sticas sobre o território.
Desd e o final d o século XVI que existem d escrições d o paí s e, no iní cio d o
século XVIII, publica-se a im portante Corografia Portuguesa d o Pad re Carva-
lho d a Costa, seguid a d e outras obras d o género. 18 N esta literatura, no en -
tanto, o núm ero é m ais um objecto d e curiosid ad e d o que um instrum ento
d e d escriçã o capaz d e perm itir um a intervençã o transform ad ora d a reali-
d ad e.19
A fund açã o d a Acad em ia d as Ciências constitui, d e novo, um a refe -
rência im portante, pelo im pulso d ad o à prod uçã o d e M emórias sobre os
m ais d iversos aspectos d o Portugal d a época. Em 1790, a própria coroa
suscitou, através d os seus m agistrad os, um a grand e recolha d e d ad os so-
bre o paí s que, infelizm ente, só em parte foi efectuad a.20 Alguns anos d e-

16 Suzanne Daveau e Júlia Galego - Difusã o e Ensino d a Cartografia em Portugal, ibidem,


pp. 87-123.
17 Maria Fernand a Alegria e Joã o Carlos Garcia - A spectos da Evoluçã o da Cartografia
Portuguesa, pp. 71-76.
18 Sobre as d escrições m ais antigas ver Joaquim Rom ero d e Magalhã es - O Enquadramento
do Espaço N acional, pp. 15-23.
19 Fernand o d e Sousa - A Populaçã o Portuguesa nos Iní cios do Século X IX , p. 29 e segs.
20 Ana Cristina N ogueira d a Silva - O M odelo Espacial do Estado M oderno. Projectos Por-
tugueses de Reorganizaçã o Territorial nos Finais do A ntigo Regime, Lisboa, Instituto d e Ciên cias
Sociais, 1997, policopiad o.

O Antigo Regim e 23
SILVEIRA

pois (1798) levou -se a cabo um recenseam ento d a populaçã o, por fogos, e
em 1801, sob o im pulso d e D. Rod rigo d e Sousa Coutinho, o m esm o que
estivera por d etrá s d a fund açã o d a Socied ad e Real Marí tim a, proced eu -se
a um novo censo populacional. N o entanto, já d epois d a Revoluçã o Libe-
ral, é frequente ouvirem -se queixas na Câ m ara d os Deputad os, sobretud o
por parte d os parlam entares envolvid os nos trabalhos d e reorganizaçã o d o
território, m otivad as pela falta d e d ad os estatí sticos.
Por outro lad o, os portugueses viajavam pouco e faziam -no, essen-
cialm ente, na faixa litoral entre Lisboa e Porto ou na regiã o d o Minho, ond e
o trâ nsito era m ais fá cil. Em 1873 Ed uard o Coelho reuniu em livro narrati-
vas d e três viagens que efectuara pelo paí s, originalm ente publicad as na
im prensa periód ica. N a prim eira jornad a, saí u d e Lisboa d e com bóio em
d irecçã o à Mealhad a. Aí apanhou a d iligência que, pela estrad a d o Luso,
Santa Com ba Dã o e Manguald e, o levou até Viseu. Com enta o autor: “ Foi
pelo interior d a Beira Alta a m inha prim eira excursã o, por uns sí tios na
m á xim a parte só falad os em tem pos d e revoluçã o ou d e eleições, pouco
frequentad os pelos touristes e pouco tratad os nas revistas literá rias e nos
rom ances, em bora povoad os d e assuntos.“ A d escriçã o d a segund a via-
gem , d e Lisboa à Covilhã , que alcançou um enorm e sucesso, tem m esm o o
sabor d e um a aventura por terras algo exóticas e pouco conhecid as. 21
N ad a d isto surpreend e se pensarm os que os transportes em Portugal
eram trad icionalm ente m aus. Até à segund a m etad e d o século XIX, foi pe -
queno o investim ento realizad o nas estrad as e os rios, com excepçã o d o
Douro, d o Mond ego e d o Tejo, só eram navegá veis em pequenas d istâ ncias
para além d a foz. Em consequência, o interior a norte d o Tejo, isolad o pe-
las m ontanhas, era um a zona d e d ifí cil acesso e assim perm anecerá até ao
final d o século passad o. O litoral, por seu lad o, era beneficiad o pelo relevo
e pela existência d e portos, entre os quais existia um a im portante navega-
çã o d e cabotagem . 22
Em qualquer caso, as d eslocações eram lentas. Em 1798, d epois d a
abertura d a nova estrad a Lisboa-Coim bra, um d os poucos m elhoram entos

21 Ed uard o Coelho - Passeios na Proví ncia, Lisboa, Tipografia Universal, 1873.


22 Artur Teod oro d e Matos - Transportes e Comunicações em Portugal, A çores e M adeira (1750-
1850), Ponta Delgad a, Universid ad e d os Açores, 1980 e David Justino - A Formaçã o do Espaço
Económico N acional, Lisboa, Vega, 1988-1989.

24 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

d a época, criou -se a prim eira carreira d e transportes terrestres em Portugal:


as m od ernas d iligências saí am d a capital à s 5 d a m anhã e chegavam ao
seu d estino à s 18 horas d o d ia seguin te, d epois d os passageiros pernoita-
rem no cam inho. Anos m ais tard e, em 1821, foi introd uzid a a navegaçã o a
vapor, a grand e inovaçã o nos transportes em Portugal antes d o cam inho d e
ferro. N a carreira regular estabelecid a entre as d uas principais cid ad es d o
paí s, a viagem levava entre 17 a 20 horas, m as pod ia chegar à s 33 horas d e
d uraçã o.23

Percepçã o da diversidade,
ausência de poderes regionais

Os testem unhos d a noçã o que os portugueses tinham d a d iversid ad e


d o território sã o antigos. A prim eira referên cia a grand es regiões surge no
testam ento d o rei D. Dinis, em 1299: o m onarca alud e aí ao Antre Douro e
Minho (que incluiria a zona que hoje d esignam os por Trá s-os-Montes), ao
Antre Douro e Mond ego (que correspond eria à á rea litoral, em torno d e
Coim bra), à Beira (zona d a Guard a), à Estrem ad ura (em torno a Santarém e
Lisboa), e, finalm ente, ao Antre Tejo e Od iana e Moura e Serpa (com -
preend end o tod o o Alentejo, m as m arcand o a d istinçã o d as á reas aquém e
além Guad iana). O Algarve nã o é referid o, constand o, n o entanto, d o tí tulo
d o rei com o um reino.24
N o século XIV, os espaços regionais transform am -se m esm o em cir-
cunscrições ad m inistrativas, as com arcas, sob a autorid ad e d e um funcio -
ná rio régio, o correged or. Existiam entã o, as seguintes: Entre-Douro-e-Mi-
nho, Trá s-os-Montes, Beira, Estrem ad ura, Alentejo e Algarve. 25
N o século XVI estes territórios perd em a sua funçã o ad m inistrativa,
send o substituí d os, com o ad iante verem os, pelas novas com arcas, d e ex-

23 Artur Teod oro d e Matos - Transportes e Comunicações em Portugal, pp. 379 e 453.
24 José António Santos - Regionalizaçã o. Processo Histórico, Lisboa, Livros H orizonte, 1985,
p. 26 e José Mattoso - A Identificaçã o de Um Paí s, vol. II, p. 190.
25 A. H . d e Oliveira Marques - Portugal na Crise dos Séculos X IV e X V , Lisboa, Presença,
1986, pp. 295-297.

O Antigo Regim e 25
SILVEIRA

tensã o m uito m ais red uzid a e em m aior núm ero d o que as ant eriores. As
unid ad es prim itivas passam , entã o, a ser d esignad as por proví ncias, à s
quais, d esd e m ead os d o século XVII e até à Revoluçã o Liberal, correspon -
d erá , som ente, um governo m ilitar. 26
Paralelam ente, a id eia d e proví ncia persistirá com o um conceito e s-
sencial na d escriçã o d o território. A Constituiçã o d e 1822 refere-se à quelas
m esm as seis proví ncias, ao enum erar as partes d o Reino Unid o d e Portu -
gal, Brasil e Algarves no continente europeu.
A cad a proví ncia atribuí am os geógrafos e corógrafos as suas carac-
terí sticas especí ficas, que d istinguiam tam bém os portugueses nascid os em
cad a um a.27 N o entanto, esta consciência d a d iversid ad e nã o se trad uziu
na existência d e regiões d otad as d e um a forte id entid ad e própria. O es-
tud o d a d iscussã o sobre a reorgan izaçã o d o território no final d o século
XVIII confirm a esta id eia: nem os m agistrad os, nem as câ m aras que inter -
vieram neste processo d eixaram transparecer projectos d e tipo regionalista.
A única zona ond e pod erá ter existid o um a certa consciência d a sua u ni-
d ad e terá sid o o Algarve.28
Por outro lad o, se a separaçã o d as proví ncias se fazia por referência
aos rios e serras, estes nã o constituí am fronteiras naturais d elim itad oras
d e espaços cuja id entid ad e fosse legitim ad a através d o recurso à natureza.
N em a serra d o Marã o, nem o Mond ego, nem o Tejo assum iram tal papel
no fim d o século XVIII. Os acid entes geográ ficos eram encarad os, sim ples -
m ente, com o obstá culos à circulaçã o d as pessoas que, um a vez d efinid os
com o lim ites, d ariam lugar a circunscrições m ais facilm ente percorrí veis.29
Finalm ente, na É poca Mod erna nã o existiam regiões com órgã os pró-
prios d e pod er, situad os num plano interm éd io entre o pod er central e os
pod eres locais, que constituí ssem um a em anaçã o d a socied ad e d esses ter -
ritórios, com o trabalhos recentes têm sublinhad o. 30

26 José António Santos - Regionalizaçã o.


27 Ana Cristina N ogueira d a Silva e António Manuel H espanha - A Id entid ad e Portu gue-
sa, in O A ntigo Regime (1620-1807), Lisboa, Cí rculo d e Leitores, 1993, pp. 26-28, col. José
Mattoso (d ir.) - H istória d e Portugal, vol. IV.
28 Ana Cristina N ogueira d a Silva - O M odelo Espacial. pp. 210, 252 e 326.
29 Ana Cristina N ogueira d a Silva, ibidem, pp. 164, 195-198.
30 Maria Alexand re Lousad a – A s Divisões A dministrativas em Portugal, do A ntigo Regi-
me ao Liberalismo, Universid ad e d e Leon, 1991; N uno Gonçalo Monteiro - Os Pod eres Locais

26 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

A ausência d e fortes id entid ad es e d e pod eres regionais pod erá ser


explicad a pelo processo d e form açã o d o reino que, expand ind o -se a partir
d e um núcleo inicial, rapid am ente atingiu os seus lim ites territoriais. Mas se
os contrastes naturais e hum anos entre o N orte e o Sul eram nessa altura
tã o pronunciad os, porque é que nã o se constituí ram d uas nações, inter-
roga-se José Mattoso? Porque os factores d e integraçã o foram m ais fortes.
Entre estes factores ind iquem -se “ as transferências d a populaçã o que tra-
zem d o N orte os exced entes populacionais e os d istribuem pelo Centro e
Sul [contribuind o para a unificaçã o d a lí ngua], o d esenvolvim ento econó-
m ico e tecnológico, que uniform iza a civilizaçã o m aterial e d esenvolve as
trocas a p artir d as cid ad es, a form açã o d e um a classe d om inante nacional
com um à s d iversas regiões e a ed ificaçã o d e um Estad o único personifi-
cad o no rei.” 31
Do ponto d e vista d a integraçã o espacial, a situaçã o d e Portugal con -
trastava com a d e França ou com a d e Espanha. N o prim eiro caso, as 61
proví ncias, territórios progressivam ente incluí d os no d om í nio real, pos -
suí am instituições representativas, os Estad os Provinciais, com postos por
d eputad os d o clero, d a nobreza e d as cid ad es, d otad os d e am plos pod e-
res, nos séculos XIV e XV. A reuniã o periód ica d estes órgã os foi regred ind o
com o tem po, m as m anteve-se em vá rias regiões no século XVIII. Além
d isso, “ as proví ncias, m esm o quand o os seus Estad os já nã o eram convo -
cad os regularm ente, conservavam a sua personalid ad e m oral e o seu ser ju -
rí d ico. Elas continuavam a form ar corpos. Elas pod iam ped ir ao rei para
reunir as gentes d os seus três estad os para um assunto d eterm inad o. A
prá tica m anteve-se em tod as as proví ncias para os assuntos im portantes,
quand o estava em causa o bem d o serviço d o rei, o bem d os seus súbd itos
e o bem d a proví ncia.“ 32
Quanto à Espanha, no século XV, a uniã o d as coroas d e Castela e
Aragã o é m eram ente polí tica e nã o jurí d ica e a incorporaçã o d e N avarra é
feita a tí tulo d e reino separad o. Em qualquer d os casos, m antiveram -se
fronteiras internas, instituições d e governo e regim es jurí d icos próprios. Só

no Antigo Regim e, in César Oliveira (d ir.) - História dos M unicí pios e do Poder Local, Lisboa,
Cí rculo d e Leitores, 1995, pp . 113-118.
31 José Mattoso - A Identificaçã o de Um Paí s, vol. II, p. 13 e 178 e segs.
32 Roland Mousnier - Les Institutions de la France sous la M onarchie A bsolue, Tom o I,
Paris, PUF, 1974, p. 470 e segs.

O Antigo Regim e 27
SILVEIRA

no século XVIII d esapareceram as Cortes privativas d e Aragã o (que estava


longe d e constituir um território uniform e), m as, neste novo passo d e inte -
graçã o d a m onarquia espanhola, os Bourbons transigiram com a m anuten -
çã o d e alguns particularism os: m anteve-se o d ireito civil próprio, um sis-
tem a fiscal d iferente e até m oed as d istintas. Quanto a N avarra, só em
1841 foram extintos os seus órgã os d e governo, nom ead am ente as Cortes, e
os seus privilégios em m atéria fiscal e d e recrutam ento m ilitar. Mais arras -
tad o foi o processo d e integraçã o d as proví ncias bascas que, unicam ente,
em 1877 perd eram os seus foros, que se trad uziam , entã o, em privilégios
sem elhantes aos que existiram em N avarra até 1841. Mas o sistem a finan cei-
ro local continuou, aind a assim , a ser d iferente. 33
A especificid ad e institucional portuguesa era um facto já d estacad o
em pleno século passad o. Dizia Joaquim Tom á s Lobo d ’ Ávila, referind o-se
ao perí od o d a m onarquia absoluta e utilizand o o conceito d e d istrito com o
sinónim o d e regiã o (pois, com o verem os, na acepçã o actual d a palavra os
d istritos nã o existiram antes d a Revoluçã o Liberal): “ N ã o houve porém en -
tre nós a vid a provincial ou d istrital, caracterizad a, com o a concelhia ou
m unicipal, por um a ad m inistraçã o própria. N ã o tivem os nenhum a junta ge -
ral d eliberativa, ou sequer m eram ente consultiva, ao lad o d o d elegad o d o
pod er central no d istrito, para representar os interesses d os povos na ge-
rência provincial e harm onizar esses interesses com os d os m unicí pios.
Destruí d os os privilégios d a nobreza e d o clero, ficou o pod er real em pre -
sença d o m unicí pio isolad o que, nestas cond ições, nã o pod ia d eixar d e ser
absorvid o.” Ávila expressava aqu i a opiniã o corrente no século passad o
sobre a vid a m unicipal no Antigo Regim e, m uito d iferente d a que se tem
hoje, com o se verá ad iante. Mas é interessante verificar que possuí a um a
consciência clara d a inexistência d e pod eres regionais. 34

A configuraçã o das proví ncias

A trad uçã o espacial d as proví ncias, sobretud o d a Beira, Estrem a-


d ura e Alentejo, variou consid eravelm ente. Isto é especialm ente verd ad e a

33 Lu is Gonzá lez Antón - El Territorio y Su Ordenación Politico-A dministrativa.


34 Joaquim Tom á s Lobo D' Ávila - Estudos de A dministraçã o, Lisboa, 1874, p. 90.

28 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

respeito d a Estrem ad ura, cujas alterações afectaram d e form a significativa


as regiões confinantes. De facto, se aquela proví ncia, d esd e o século XV até
m ead os d a centúria seguinte, se estend ia por um a faixa litoral que ia d o
Tejo ao Douro, a partir d e entã o red uziu -se substancialm ente a norte e, em
com pensaçã o, alargou -se seriam ente pela m argem sul d o Tejo. É essa confi-
guraçã o que m antém no iní cio d o século XIX, com o se pod e ver no m apa 3
ond e estã o representad as as proví ncias em 1826. 35
A id entificaçã o d os territórios d as proví ncias, com o se d isse, pod ia
ser feita por referência aos acid entes naturais qu e as d elim itavam , os quais
acabaram por ficar incorporad os nos nom es d e algum as, m as pod ia tam -
bém ter em conta as unid ad es ad m inistrativas que as com punham . Por ve -
zes usavam -se até os d ois sistem as conceptuais em conjunto, com pouca
precisã o. Sirva d e exem plo a introd uçã o à d escriçã o d a Estrem ad ura pelo
P. Carvalho d a Costa. Diz ele: “ A Salubérrim a Proví ncia d a Estrem ad ura
(cujo nom e lhe d eu o seu lugar, pois é o extrem o d e tod a a Lusitâ nia, cuja
m aior linha ao N orte d a foz d o Tejo chega à d o Mond ego, que a separa
com o rio Zêzere d a Proví ncia d a Beira, com o o Tejo d a d o Alentejo) tem
trinta e nove léguas d e com prid o e d ezoito d e largo. Confina pela parte d o
Ocid ente com o m ar Atlâ ntico, pela d o Oriente e N orte com a Proví ncia d a
Beira e pela parte d o Sul com a d o Alentejo. Divid e-se em sete Com arcas
que sã o a d e Torres Ved ras, Alenquer, Leiria, Tom ar, Santarém , Setúbal e
Lisboa, as quais d escreverem os nos seguintes Tratad os […].” 36
Carvalho d a Costa nã o parecia nad a incom od ad o com o facto d a
correiçã o d e Setúbal ser a sul d o rio Tejo, para além , portanto, d o lim ite
natural por ele próprio assinalad o. Assim com o nã o parece estranhar,
quand o d escreve a Beira, que nos concelhos d e Eixo, Paus, Óis d a Ribeira e
Vilarinho d o Bairro entre em correiçã o o ouvid or d e Barcelos, ou seja, que
aquelas terras pertençam à com arca d e Barcelos, que, por sua vez, fazia
parte d a proví ncia d o Minho. 37 É esta circunstâ ncia, no entanto, que ex-
plica que no m apa 3 haja encravam entos d o Minho na Beira. Facto sem e -

35 Para épocas anteced entes ver a respectiva cartografia em José António Santos - Regio-
nalizaçã o. N o m apa 3, com o nos restantes, as m anchas brancas correspond em à s zonas d a
carta actual para as quais nã o foi encontrad a equivalência no passad o.
36 Corografia Portuguesa e Descripçam Topográ fica do Famoso Reyno de Portugal, tom o III,
Lisboa, 1712.
37 Ibidem, tom o II, Lisboa, 1708.

O Antigo Regim e 29
SILVEIRA

lhante explica a existência d e um ped aço d o Alentejo em pleno Algarve.


N este caso trata-se d o concelho d e Alcoutim que, por se encontrar sob a
jurisd içã o d a Casa d o Infantad o, estava integrad o na com arca d e Beja
(pertencente à quela Casa), proví ncia d o Alentejo.
N o fim d o século XVIII, o correged or d e Tavira achava que na d em ar -
caçã o d as com arcas se d evia contem plar as proví ncias separad am ente
“ sem que parte algum a d e um a fique m etid a em outra.” 38 É um sinal d e
que a m entalid ad e estava a m ud ar. N ã o ad m ira que, m ais tard e aind a, P i-
nho Leal se referisse ao enclave m inhoto acim a m encionad o nos seguintes
term os: “ Antes d e 1834 era Eixo cabeça d e um juí zo d e fora, ao qual per ten-
ciam as vilas anexas d e Paus, Óis d a Ribeira e Vilarinho d o Bairro, d a
com arca d e Barcelos. A razã o d e tã o d isparatad a d ivisã o territorial era
porque tod as estas terras pertenciam a um só senhorio, a casa d e Bra -
gança.” 39
Ao fim e ao cabo, a d efiniçã o d as proví ncias com base na enu m era-
çã o d as com arcas fazia com que os próprios territórios provinciais se to r-
nassem d escontí nuos e fossem afectad os pelas caracterí sticas peculiares d a
organizaçã o ad m inistrativa.

A divisã o administrativa

A d ivisã o ad m inistrativa que chega até ao com eço d o século XIX, por
um lad o, é o resultad o d a sobreposiçã o d e circunscriçõ es com um a exis-
tência m ultissecular, criad as com m otivações d iferentes e em m om entos d i -
ferentes; por outro lad o, aquela d ivisã o é a trad uçã o espacial d o sistem a
polí tico d o Antigo Regim e.40

38 Ana Cristina N ogueira d a Silva - O M odelo Espacial. p. 252.


39 Augusto Barbosa Pinho Leal e Ped ro Augusto Ferreira - Portugal A ntigo e M oderno,
vol. III, Lisboa, 1874. De facto, d esd e 1429, aquelas quatro terras surgem no patrim ónio d os
Duques d e Bragança (Mafald a Soares d a Cunha - Linhagem, Parentesco e Poder. A Casa de
Bragança (1384-1483), Lisboa, Fund açã o d a Casa d e Bragança, 1990, pp. 36-37 e 98).
40 Sobre o pod er no Portugal d e Antigo Regim e ver António Manuel H espanha - Poder e
Instituições no A ntigo Regime. Guia de Estudo, Lisboa, Cosm os, 1992. Ver aind a as bibliografias
que acom panham os d ois trabalhos d e sí ntese d e N uno Gonça lo Monteiro - Os Concelhos
e as Com unid ad es, in António Manuel H espanha (coord .) - O A ntigo Regime (1620-1807),

30 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

Este tinha por base um a concepçã o orgâ nica d a socied ad e, ond e o


pod er era naturalm ente partilhad o entre os d iversos corpos ou órgã os. A
cabeça (a coroa), sem d eixar d e afirm ar a sua suprem acia, respeitava a au -
tonom ia d as partes, fossem elas o clero, a nobreza ou os concelhos, e as -
sum ia a funçã o d e m anutençã o d a harm onia global. É certo que, na se-
gund a m etad e d o século XVIII, com o Pom balism o, a situaçã o se altera, im -
pond o- -se a id eia d o cará cter ilim itad o e absoluto d o pod er régio. A uni-
d ad e d a soberania com eça, entã o, a ter efeitos prá ticos, o m ais im portante
d os quais será a red uçã o d os pod eres jurisd icionais d os d onatá rios verifi-
cad a em 1790.41 Mas as antigas unid ad es espaciais m antiveram -se apesar
d e tud o.
A sobreposiçã o d e circunscrições historicam ente d istintas, a sua rela -
çã o com o sistem a pluralista d e pod er e o d eficiente conhecim ento d o terri-
tório explicam a ausência d e racionalid ad e d a d ivisã o ad m inistrativa d o
final d o Antigo Regim e.
Por esta altura, o espaço d o continente encontrava -se d ivid id o, em
três circunscrições bá sicas: com arcas, proved orias e concelhos.

Comarcas e provedorias

À origem d as com arcas já antes nos referim os. Vim os que no iní cio
d o século XIV existiam seis d ivisões d este tipo, abrangend o vastas á reas, e
que no século XVI, m ais precisam ente, no reinad o d e D. Joã o III, no â m bito
d e um a profund a reorganizaçã o territorial, a d esignaçã o d e com arca pas -
sara a ser aplicad a à s novas e m ais pequenas circunscrições em que o terri -
tório d as anteriores se fragm entara. Em 1541 existiam 28 com arcas; em

Lisboa, Cí rculo d e Leitores, 1993, pp. 303-331, col. José Mattoso (d ir.) - H istória d e Portugal,
vol. IV e Os Poderes Locais no A ntigo Regime.
41 António Manuel H espanha em vá rios d os seus trabalhos tem insistid o na id eia d a alte -
rid ad e d o sistem a polí tico d o Antigo Regim e. Ver A s V ésperas de Leviathan; A Revoluçã o e os
Mecanism os d o Pod er, in António Reis (d ir.) - Portugal Contemporâ neo, vol. I, Lisboa, Alfa,
1990, pp. 107-136; Poder e Instituições no A ntigo Regime; id em (coord .) - O A ntigo Regime
(1620-1807), Lisboa, Cí rculo d e Leitores, 1993, col. José Mattoso (d ir.) – H istória d e Por-
tugal, vol. IV.

O Antigo Regim e 31
SILVEIRA

1640 o seu núm ero tinha aum entad o para 32; em 1801 eram 44 e, em 1826,
45.42
N o século XVI, a com arca era o espaço d e jurisd içã o d o correged or,
um m agistrad o nom ead o pela coroa, seu principal representante no territó-
rio. Os correged ores acum ulavam , com o era caracterí stico d a ad m inistra-
çã o d o Antigo Regim e, im portantes funções jud iciais e ad m inistrativas: jul-
gavam as causas em segund a instâ ncia, estavam encarregad os d o policia -
m ento e fiscalizavam a acçã o d as câ m aras. Controlavam , aind a, o proces-
so d e eleiçã o d os m agistrad os m unicipais. 43
Um século volvid o, com o se d isse, a coroa criara novas circunscri-
ções, aum entand o, aind a, o seu núm ero no século XVIII. Ora, a esm agad ora
m aioria d estas unid ad es recém -constituí d as, equivalentes à s com arcas,
reunia concelhos d os d onatá rios e à sua frente estav a nã o um correged or,
m as um ouvid or, nom ead o pelos senhores, d esem penhand o funções id ênti-
cas aos m agistrad os d a coroa. Esta situaçã o m anteve-se até 1790, altura
em que as ouvid orias foram extintas e transform ad as em com arcas. Aind a
assim , no final d o Antigo Regim e os d onatá rios d e m aior im portâ ncia
(Casa d e Bragança, Casa d as Rainhas e Casa d o Infantad o) nom eavam os
correged ores que superintend iam nas suas terras.
O m apa d e com arcas d e 1826 (n.º 4) poucas d iferenças tem em rela-
çã o ao que Fernand o Onório e António Eanes prod uziram . Os seus traços
caracterí sticos sã o o grand e núm ero d e circunscrições, a d esiguald ad e em
term os d e á rea e, sobretud o, a d escontinuid ad e territorial d as unid ad es
ad m inistrativas.

42 1541: Joã o José Alves Dias - Gentes e Espaços, vol I, p. 238; 1640: António Manuel
H espanha - A s V ésperas de Leviathan, vol. I, pp. 137-141;1801: Fernand o d e Sousa - A Popu-
laçã o Portuguesa nos Iní cios do Século X IX , p. 10 e segs.; 1826: contagem nossa. Ver, aind a, em
N uno Gonçalo Monteiro - Os Poderes Locais no A ntigo Regime, pp. 86-87, a com pilaçã o d as
cartas prod uzid as por Joã o José Alves Dias, António Manuel H espanha e Fernand o Onório e
António Eanes.
43 N uno Gonçalo Monteiro - Os Poderes Locais no A ntigo Regime, pp. 85-88 e Lu í s
Vid igal - O M unicipalismo em Portugal no Século X V III, Lisboa, Livros H orizonte, 1989,
p. 41.

32 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

Quad ro I - Comarcas de 1826


Código Comarca Indiví duos Área (Km2) D ensid. pop. N .º de territórios
1 Alcobaça 20 026 573,01 34,95 1
2 Alenquer 41 499 1 133,06 36,63 4
3 Arganil 41 699 1 145,53 36,4 2
4 Aveiro 102 148 1 497,17 68,23 2
5 Avis 22 520 3 203,72 7,03 3
6 Barcelos 135 398 1 527,14 88,66 14
7 Beja 53 740 5 466,36 9,83 6
8 Braga 53 099 342,28 155,13 8
9 Bragança 86 446 4 027,96 21,46 2
10 Castelo Branco 62 213 4 533,08 13,72 1
11 Chã o d e Couce 5 243 124,77 42,02 1
12 Coim bra 153 060 2 580,96 59,3 3
13 Crato 30 812 1 969,27 15,65 1
14 Elvas 25 323 1 325,06 19,11 3
15 É vora 46 727 4 276,03 10,93 1
16 Faro 42 624 1 176,17 36,24 2
17 Feira 77 497 785,41 98,67 2
18 Guard a 110 224 3 096,01 35,6 3
19 Guim arã es 132 833 1 494,98 88,85 2
20 Lagos 30 004 1 437,96 20,87 2
21 Lam ego 101 503 1 629,96 62,27 2
22 Leiria 43 993 1 445,2 30,44 2
23 Linhares 18 779 448,82 41,84 3
24 Lisboa 45 566 545,73 83,5 1
25 Mirand a 30 408 2 045,14 14,87 4
26 Moncorvo 54 283 2 516,45 21,57 2
27 Ourém 18 489 636,31 29,06 1
28 Ourique 48 492 6 282,14 7,72 1
29 Penafiel 58 812 541,18 108,67 1
30 Pinhel 12 302 579,11 21,24 2
31 Portalegre 30 971 1 721,25 17,99 1
32 Porto 176 266 1 340,46 131,5 3
33 Ribatejo 12 928 283,76 45,56 2
34 Santarém 73 481 3 399,57 21,61 1
35 Setúbal 65 897 4 104,38 16,06 1
36 Tavira 33 348 1 897,46 17,58 2
37 Tentúgal 24 588 625,39 39,32 11
38 Tom ar 76 084 2 715,83 28,02 5
39 Torres Ved ras 52 972 1 056,69 50,13 3
40 Trancoso 69 824 2 842,95 24,56 5
41 Valença 34 597 413,22 83,73 3
42 Viana 129 679 1 866,13 69,49 1
43 Vila Real 98 376 2 187,26 44,98 2
44 Vila Viçosa 32 905 2 670,3 12,32 5
45 Viseu 159 502 2 756,78 57,86 3
Total 2 777 180 88 267,4 130
————————————————————————————————————

N ota: á rea para a qual nã o se encontrou correspond ência nas antigas com arcas: 474,82
Km2, correspond end o a 0,54% d a superfí cie total d o con tinente e a 26 territórios.
N ã o inclui os habitantes d as paróquias urbanas d o Porto e d e Lisboa (ver anexo II).

O Antigo Regim e 33
SILVEIRA

De facto, a par d e com arcas d e grand e d im ensã o, encontram os ou-


tras d e tam anho red uzid o: Ourique com os seus 6282,14 km 2 representa o
extrem o superior e Chã o d e Couce, com 124,77 Km 2, a com arca m ais pe-
quena (ver quad ro I). A variaçã o d o núm ero d e habitantes é igualm ente
m arcad a. Mas o traço m ais singular d este m apa, já sublinhad o por N uno
Gonçalo Monteiro 44, parece-nos ser a grand e quantid ad e d e encravam en -
tos, que confere à carta um recorte d everas irregular: só 13 com arcas pos -
suem um espaço contí nuo, enquanto 9 estã o fragm entad as em 4 ou m ais
territórios.
O m apa d as com arcas d o século XVI já possuí a encravam entos e eles
sã o tam bém visí veis na carta d o século XVII. Mas, em 1826, o seu núm ero é
m uito superior. Significa isto que a irracionalid ad e d o m apa se agravou
com o resultad o d a consagraçã o d o pod er d os d onatá rios, atra vés d a
criaçã o d as ouvid orias/ com arcas.
Alguns exem plos ilustram bem esta evoluçã o: o núm ero m á xim o d e
territórios é atingid o por Barcelos, um a com arca d a Casa d e Bragança, re-
partid a por 14 á reas d istintas (m apa n.º 5); em segund o lugar vem Tentú -
gal, com 11 territórios pertencentes à Casa d e Cad aval (m apa n.º 6); logo
após, Braga, reunind o terras d a Sé, d istribuí d as por 8 á reas (m apa n.º 5).
Vale a pena aind a ind icar o caso d e Beja, d a Casa d o Infantad o (m apa n.º
4). Os efeitos d a configuraçã o d esta com arca e d a d e Barcelos sobre o d e -
senho d as proví ncias ficaram bem à vista na carta respectiva.
A d im ensã o exagerad a d e algum as com arcas e a irregularid ad e d o
seu traçad o constituí am im portantes obstá culos à acçã o d os correged ores.
Acçã o que era aind a m ais d ifí cil enquanto existiram ouvid orias, ond e, em
certos casos, os correged ores nã o pod iam entrar. A existência d e á reas d e
jurisd içã o d istintas e encravad as d ava origem a conflitos entre m agistrad os
e perm itia a fuga à justiça d os crim inosos. 45
N o final d o século XVIII esta situaçã o é d enunciad a pelo correged or
d e Trancoso, nos seguintes term os: “ N o interior d esta com arca existem vá -
rias terras d e d onatá rios que a fazem irregular, d e que nã o só resultam in -
cóm od os aos seus habitantes para recorrerem à s suas capitais d ispersas, e
situad as d istantes léguas, send o-lhe necessá rio transitarem nas suas jorna -

44 Os Concelhos e as Comunidades, pp. 313-315.


45 Ana Cristina N ogueira d a Silva - O M odelo Espacial do Estado M oderno. p. 245.

34 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

d as por terras d ela. Mas juntam ente servem aquelas m esm as ter ras d e ver-
d ad eiras m ad rastas à boa ad m inistraçã o d e justiça, que se d eve praticar
para com os crim inosos e facinorosos d esta com arca. Porque refugiad os
neles [sic] se alentam para novos d elitos fazend o d ificultoso o justo
castigo.” 46
Além d o m ais, com o afirm a o correged or d e Trancoso, a d ispersã o
geográ fica d os territórios d as com arcas era prejud icial aos povos, que se
viam obrigad os a grand es d eslocações nos julgam entos d os seus recursos
perante os tribunais d e segund a instâ ncia. Por este m otivo, em 1821, os
habitantes d e Buarcos, Penacova e Mortá gua protestaram contra a d epen -
d ência em que se encontravam d a vila d e Tentúgal, sed e d a com arca a que
aqueles lugares pertenciam (m apa n.º 6). 47
N o século XVI os correged ores tam bém exerciam tarefas ligad as à
ad m inistraçã o financeira d a coroa. N o entanto, d urante esta centúria essas
funções passaram para a alçad a d os proved ores, m agistrad os régios que
supervisionavam a cobrança d os im postos e as finanças d os m unicí pios,
hospitais e m isericórd ias.48 As proved orias eram os espaços sob a respon -
sabilid ad e d estes m agistrad os. O núm ero d e proved orias existentes em
1811 é significativam ente m enor d o que o d as com arcas (m apa n.º 7 e
quad ro II). As d isparid ad es d e á rea tam bém sã o evid entes neste caso: a
pequena proved oria d e Braga contrasta com a enorm e proved oria d e
É vora. Mas a proporçã o d e circunscrições com um espaço contí nuo é
grand e. Contud o, o m apa nã o d eixa d e ser m arcad o pelos encravam entos.
Além d o m ais, nã o havia correspond ência entre o território d as
proved orias e o d as com arcas.49

46 Ana Cristina N ogueira d a Silva, ibidem, p. 246.


47 José Manuel Tengarrinha - M ovimentos Populares A grá rios em Portugal, vol. II, Mem
Martins, Eu ropa-Am érica, 1994, p. 183. Ver exem plos d e queixas sem elhantes em Ana Cristi-
na N ogueira d a Silva - O M odelo Espacial. p. 245 e ss.
48 Joã o José Alves Dias - Gentes e Espaços, vol. I, pp. 209-210 e Joaquim Rom ero d e Maga-
lhã es - Os Concelhos in id em (coord .) - N o A lvorecer da M odernidade (1480-1620), Lisboa,
Cí rculo d e Leitores, 1993, p. 178, col. José Mattoso (d ir.) - H istória d e Portugal, vol. III.
49 O m apa d e proved orias foi elaborad o com base no d e concelhos d e 1826 e nos d ad os d o
M appa A lfabético das Povoações de Portugal, que Tem Juiz de Primeira Instâ ncia […],
Lisboa, Im pressã o Régia, 1811.

O Antigo Regim e 35
SILVEIRA

Quad ro II
Provedorias de 1811
Código Provedoria Área (Km2) N .º de
territórios
1 Algarve 4110,61 1
2 Aveiro 2375,11 1
3 Beja 5912,13 4
4 Braga 342,28 8
5 Castelo Branco 4533,08 1
6 Coim bra 2999,54 4
7 Elvas 2247,36 2
8 É vora 7374,78 1
9 Gu ard a 3769,27 1
10 Gu im arã es 4122,87 3
11 Lam ego 4935,62 2
12 Leiria 2295,38 2
13 Lisboa 521,85 1
14 Mirand a 4235,99 3
15 Moncorvo 3001,39 3
16 Ou riqu e 6282,14 1
17 Penafiel 523,32 1
18 Portalegre 2611,94 1
19 Porto 1326,97 3
20 Santarém 4720,07 1
21 Setúbal 4104,38 1
22 Tom ar 4964,69 4
23 Torres Ved ras 2473,51 2
24 Viana 3598,39 5
25 Viseu 4391,07 2
Total 87773,74 58
—————————————————————————————————————

N ota: á rea para a qual nã o se encontrou correspond ência nas proved orias : 968,48
Km2, correspond end o a 1 % d a superfí cie total d o continente e a 45 territórios.

36 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

Concelhos

Abaixo d as com arcas e proved orias encontram os os concelhos. A ori-


gem d estes é objecto d e d iscussã o entre os historiad ores. Defend em alguns
que os concelhos portugueses estariam relacionad os com o m unicí pio ro -
m ano; sugerem outros que os seus anteced entes se d everiam encontrar no
perí od o visigótico e outros, aind a, nas com unid ad es rurais pré-estabeleci-
d as, cuja organizaçã o as futuras cartas d e foral con sagrariam .
Embora os forais m ais antigos sejam anteriores à fund açã o d o reino,
foram os m onarcas portugueses os responsá veis pela m ultiplicaçã o d o
núm ero d e concelhos, unid ad es que criaram com o fim d e povoar o
território, com propósitos m ilitares, fiscais e tam bém com o form a d e
contrabalançar o pod er d os senhores. Mas estes últim os nã o d eixaram
igualm ente d e conced er alguns forais d e m od o a atrair gentes para as suas
terras. De qualquer m aneira, no século XIV, os concelhos, entend id os com o
espaços d otad os d e form as d e autogoverno, d istintos d os senhorios, nã o
cobriam a totalid ad e d o território português. 50
N o final d a Id ad e Méd ia e iní cio d a É poca Mod erna verificaram -se
d ois factos relevantes e interligad os: por um lad o, a progressiva confusã o
entre senhorio e m unicí pio e, por outro, um a relativa uniform izaçã o d as
norm as jurí d icas por que se regia este últim o. 51 A uniform izaçã o resultou
d a legislaçã o publicad a d esd e o século XIV, nom ead am ente a ord enaçã o
d os pelouros d e 1391, que regulava a form a d e eleiçã o d as câ m aras, legis-
laçã o que foi d epois recolhid a e ad aptad a nas Ord enações Afonsinas, Ma -
nuelinas e Filipinas. Decisiva foi, aind a, a revisã o d as antigas cartas d e fo-
ral, no século XVI, que d eu origem aos cham ad os Forais N ovos. Contud o,
estes nã o só uniform izavam d ireitos consignad os nos forais antigos, pagos
ao Rei e aos senhores, com o reconheciam d ireitos d evid os a estes últim os
que nã o estavam basead os em carta d e foral.

50 José Mattoso - Identificaçã o de um Paí s, vol. I, p. 289 e segs.; Maria H elena d a Cruz
Coelho - Os Concelhos in Maria H elena d a Cruz Coelho e Arm and o Lu í s Carvalho H o m em
(coord .) - Portugal em Definiçã o de Fronteiras (1096-1325), Lisboa, Presença, 1996, pp. 554-
584 e A. H . d e Oliveira Marques - Portugal na Crise dos Séculos X IV e X V , p. 315.
51 Sobre estes aspectos ver N uno Gonçalo Monteiro - Os Poderes Locais no A ntigo
Regime, pp. 31-32.

O Antigo Regim e 37
SILVEIRA

Esta circunstâ ncia e a d oaçã o régia d e concelhos aos senhores, entre -


tanto verificad a, contribuiu para a sobreposiçã o parcial entre senhorio e
m unicí pio que persistirá até à Revoluçã o Liberal. De facto, nesta altura os
pod eres senhoriais trad uziam -se no d ireito d e confirm açã o d a eleiçã o d os
juí zes e vereações e/ ou no recebim ento d e d ireitos fund iá rios e fiscais con -
signad os nas cartas d e foral.
Em resultad o d a evoluçã o esboçad a, a partir d o século XVI pod em os
falar d a existência d e um a m alha d e concelhos, sob d enom inações d iver sas,
é certo, com um estatuto relativam ente uniform e, abrang end o agora o
conjunto d o território continental. Esta caracterí stica d istingue Portugal d a
França e d a Espanha, paí ses ond e a d iversid ad e d as instituições d e gover-
no local era m uito grand e.52
Segund o cá lculos recentes, em 1532 havia 762 concelhos 53, núm ero
que, d esd e esta altura, foi variand o em resultad o d e algum as extinções,
m as sobretud o d e criações.54 Três séculos m ais tard e, em razã o d a elevad a
quantid ad e d e circunscrições, d o escasso conhecim ento d o território e d os
objectivos que presid iram à elaboraçã o d as vá rias fontes, é d ifí cil estabele-
cer com precisã o o total d e m unicí pios existentes: Fernand o d e Sousa, com
base no recenseam ento d e 1801, contabilizou 841; N uno Gon çalo Monteiro,
em relaçã o a 1826, ind ica 816.55 Usand o a m esm a lista, nós trabalh á m os
com 804 unid ad es, correspond end o a d iferença a m inúsculas circunscrições
que nã o pod í am os cartografar já que estavam com preend id as d entro d e
paróquias.
À frente d os concelhos encontravam -se as câ m aras que tanto pod iam
ser presid id as por um juiz d e fora, com o por um juiz ord iná rio. Os juí zes
d e fora eram letrad os, nom ead os pela coroa ou pelos d onatá rios; por sua
vez, os juí zes ord iná rios eram eleitos por um ano, em conjunto com os ve -
read ores (em núm ero m í nim o d e d ois) e o procurad or. As eleições eram in-

52 Sobre Portugal, ver Maria Alexand re Lousad a - A s Divisões A dministrativas em Portugal e


N uno Gonçalo Monteiro - Os Poderes Locais no A ntigo Regime; sobre a França, Ro-
land Mousnier - Les Institutions de la France, Tom o I, pp. 428-469 e, finalm ente, sobre a Es-
panha, Concepción d e Castro - La Revolución Liberal y los M unicipios Españoles (1812-1868),
Mad rid , Alianza Ed itorial, 1979.
53 Joã o José Alves Dias - Gentes e Espaços, vol. I, p. 207.
54 N uno Gonçalo Monteiro - Os Poderes Locais no A ntigo Regime, pp. 40-43.
55 Fernand o d e Sousa - A Populaçã o Portuguesa nos Iní cios do Século X IX , pp. 19-20;
N uno Gonçalo Monteiro - Os Poderes Locais no A ntigo Regime, p. 40.

38 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

d irectas, estand o em princí pio a participaçã o restrita à nobreza d as ter ras,


d esd e o século XVII. Os resultad os d o acto eleitoral eram d epois sujeitos a
confirm açã o por parte d a coroa ou d os senhores.
A aplicaçã o d este sistem a teve efeitos d iferenciad os, consoante a d i-
m ensã o d os concelhos. Assim , nos grand es m unicí pios a vid a polí tica es -
tava d om inad a por grupos oligá rquicos, enquanto nas pequenas m unicipa -
lid ad es existia um a m aior d em ocraticid ad e. Do m esm o m od o, a com posiçã o
social d as elites locais era variá vel, ind o d esd e as câ m aras fid algas até
à s câ m aras d e extracçã o popular.56
A nom eaçã o d os juí zes d e fora, cargo cuja criaçã o d ata d os princí -
pios d o século XIV, era trad icionalm ente encarad a com o um d os sinais d a
afirm açã o d o pod er régio. A am plitud e e o significad o d a presença d estes
m agistrad os à frente d as câ m aras têm vind o, no entanto, a ser d iscutid os.
Se bem que o núm ero d e juí zes d e fora haja aum entad o m uito d esd e o final
d o século XVI, a verd ad e é que nos com eços d o século XIX eles só exist iam
em cerca d e 20% d os concelhos; m as com o estes eram os m unicí pios d e
m aior d im ensã o, o m apa publicad o por Maria Alexand re Lousad a m ostra
que a á rea por eles controlad a no fim d o Antigo Regim e era m uito signifi ca-
tiva.57 Contud o, a coroa só nom eava 62% d estes m agistrad os.
Finalm ente, a presença d e um juiz d e fora n ã o era sinónim o im ed iato
d e controlo d o pod er local: nas suas d eslocações pelos territórios
concelhios o juiz era substituí d o pelo veread or m ais velho e, em vá rias
ocasiões, os m agistrad os, id entificand o-se com os interesses locais,
actuavam d e acord o e nã o contra as câ m aras. 58
Por sua vez, o d om í nio d os senhores sobre os concelhos tam bém tem
sid o questionad o: nã o só o núm ero d e territórios sob jurisd içã o d e senho rios
leigos e eclesiá sticos d im inuiu significativam ente a partir d a Restaura-

56 Sobre a oligarquizaçã o d o pod er concelhio ver Maria H elena d a Cruz Coelho e


Joaquim Rom ero d e Magalhã es - O Poder Concelhio: Das Origens à s Cortes Constituintes,
Coim bra, Centro d e Estud os e Form açã o Autá rquica, 1986. N uno Gonçalo Monteiro em Os
Concelhos e as Comunidades, pp. 324-327, sublinha a m aior rotativid ad e no exercí cio d os car-
gos nos pequenos m unicí pios e a varied ad e d os pad rões d e recrutam ento social. Esta varie -
d ad e fica patente nos vá rios estud os citad os na bibliografia, cobrin d o o perí od o d o final d o
Antigo Regim e.
57 N uno Gonçalo Monteiro – Os Poderes Locais no A ntigo Regime, p. 84; Maria Ale-
xand re Lousad a - A s Divisões A dministrativas em Portugal, p. 308.
58 N uno Gonçalo Monteiro - Os Poderes Locais no A ntigo Regime, pp. 84 -85.

O Antigo Regim e 39
SILVEIRA

çã o, em favor d a coroa e d as casas d a fam í lia real, com o “ na m aior parte


d os casos, os d onatá rios nã o conseguiam controlar as câ m aras por eles
confirm ad as.” 59
De tud o isto resulta, com o tend ência d om inante na historiografia ac-
tual, a afirm açã o d a autonom ia d o pod er d os m unicí pios. Um a autonom ia
tolerad a ou, na óptica d e Joaquim Rom ero d e Magalhã es, d esejad a e ali-
m entad a por um a coroa que, nã o d ispond o d e um aparelho ad m inistrativo
num eroso, se servia d os concelhos para controlar o território. Um a auto-
nom ia d ecrescente, no final d o Antigo Regim e, em consequência d a acçã o
d e correged ores e proved ores, com o se conclui d o trabalho d e José Ca-
pela.60
Até à Revoluçã o Liberal, as câ m aras d ispuseram d e um am plo leque
d e atribuições no d om í nio d a justiça (julgand o em prim eira instâ ncia), d o
policiam ento, d a econom ia (fixand o os preços d os prod utos artesanais e
agrí colas e os salá rios d os jornaleiros, controland o a circulaçã o d e cereais
nos seus territórios, vigiand o os m ercad os e os pesos e m ed id as, gerind o os
bens d os concelhos) e d a fiscalid ad e concelhia e régia. O governo local re-
gia-se pelas posturas que d eviam ser respeitad as pelos oficiais d a coroa,
d esd e que nã o contrariassem as leis gerais d o reino. 61
N o m apa d os concelhos d e 1826 (n.º 8), m uito sem elhante ao d e Fer -
nand o Onório e António Eanes, estã o representad as 788 circunscrições. As
16 que nã o foi possí vel d esenhar sã o pequenas unid ad es com um a só fre -
guesia. Os traços m ais salientes d este m apa resid em no elevad o núm ero d e
m unicí pios, na presença d e inúm eros pequenos concelhos e nas d isparid a -
d es d e á rea d entro d e um a m esm a regiã o. A d escontinuid ad e territorial, se
bem que m enos im portante d o que no caso d as com arcas, afectava aind a
54 concelhos. Estas caracterí sticas sã o igualm ente verificá veis nas cartas
d os séculos XVI e XVII.

59 N uno Gonçalo Monteiro - Os Poderes Locais no A ntigo Regime, pp. 51-54, 158-161.
60 Joaquim Rom ero d e Magalhã es - As Estruturas Sociais d e Enquad ram ento d a Eco-
nom ia Portuguesa d e Antigo Regim e: Os Concelhos in N otas Económicas, n.º 4, 1994, pp. 30-
47; José Viriato Capela - O M inho e os Seus M unicí pios. Estudos Económico-A dministrativos so-
bre o M unicí pio Português nos Horizontes da Reforma Liberal, Braga, Universid ad e d o Minho,
1995.
61 N uno Gonçalo Monteiro - Os Poderes Locais no A ntigo Regime, pp. 121-136; Lu í s Vid i-
gal - O M unicipalismo em Portugal no Século X V III, p. 80 e segs.

40 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

Os d ad os sobre a á rea d os concelhos d e 1826 encontram -se nos qua-


d ros III a VI.
Quad ro III
Concelhos de 1826 - Área
Área (Km2) N .º de concelhos % % acum.
0 - 9 115 14,59 14,59
10 - 19 132 16,75 31,35
20 - 29 94 11,93 43,27
30 - 39 56 7,11 50,38
40 - 49 45 5,71 56,09
50 - 59 27 3,43 59,52
60 - 69 27 3,43 62,94
70 - 79 27 3,43 66,37
80 - 89 23 2,92 69,29
90 - 99 17 2,16 71,45
>=100 225 28,55 100,00
Total 788 100,00
—————————————————————————————————————

N ota: núm ero d e concelhos cuja á rea nã o foi d eterm inad a - 16; á rea para a qual nã o se
encontrou correspond ência nos concelhos d e 1826: 616,06 Km2, correspond end o a 0,69% d a
superfí cie total d o continente .

Quad ro IV
Concelhos de 1826 - Área
Área (Km2) N .º de concelhos % % acum.
0 - 99 563 71,45 71,45
100 - 199 110 13,96 85,41
200 - 299 39 4,95 90,36
300 - 399 27 3,43 93,78
400 - 499 11 1,40 95,18
500 - 999 29 3,68 98,86
>=1000 9 1,14 100,00
Total 788 100,00
—————————————————————————————————————

N ota: ver quad ro III.

O Antigo Regim e 41
SILVEIRA

Quad ro V
Concelhos de 1826 - Área por proví ncia
Proví ncia\ Área (Km2) 99 199 299 399 499 999 1000 Total
Alentejo 40 26 11 9 4 8 6 104
Algarve 6 1 2 2 1 4 16
Beira 267 41 10 4 1 8 331
Estrem ad ura 81 14 5 7 4 4 2 117
Minho 127 16 3 3 1 150
Trá s-os-Montes 42 12 8 2 1 4 1 70
Total 563 110 39 27 11 29 9 788
—————————————————————————————————————

Área (Km2): os valores inscritos nesta linha ind icam o lim ite superior d a classe.
N ota: ver quad ro III.

Quad ro VI
Concelhos de 1826 - Área média por proví ncia
Proví ncia Área média (km2)
Minho 50,11
Beira 68,33
Estrem ad ura 136,23
Trá s-os-Montes 153,95
Alentejo 259,96
Algarve 306,49

Conform e se pod e verificar, m etad e d os concelhos tinha m enos d e 40


Km 2 e cerca d e 70% m enos d e 100 Km 2 (quad ros III e IV). A grand e
m aioria correspond ia, portanto, a circunscrições d e pequena ou m uito
pequena d im ensã o. N o entanto, em conjunto os concelhos com m enos d e
100 Km 2 representavam som ente 19,7% d a á rea total d o continente. Se
bem que existissem em tod as as proví ncias, eles concentravam -se na Beira
e no Minho (quad ro V e m apa n.º 9). Lad o a lad o com estes concelhos,

42 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

existiam em tod as as regiões m unicí pios incluí d os nos escalões d e á rea


superiores (id em ). Em term os m éd ios, é flagrante o contraste entre o Minho
e a Beira, por um lad o, e o Alentejo e o Algarve, por outro, colocand o -se a
Estrem ad ura e Trá s-os-Montes num a posiçã o interm éd ia (quad ro VI).

Quad ro VII
N úmero de indiví duos por concelho em 1828
N .º de indiví duos N .º de % % acum.
concelhos
0 - 999 290 36,57 36,57
1000 - 1999 185 23,33 59,90
2000 - 2999 85 10,72 70,62
3000 - 3999 67 8,45 79,07
4000 - 4999 32 4,04 83,10
5000 - 9999 70 8,83 91,93
10000 - 19999 45 5,67 97,60
> = 20000 19 2,40 100,00
Total 793 100,00
—————————————————————————————————————

N ota: núm ero d e concelhos para os quais nã o foi possí vel calcular a populaçã o: 9. Para
além d isso foram excluí d os os concelhos d e Lisboa e Porto, d ad o a inform açã o nestes casos
ser incom pleta (ver anexo II).

A d istribuiçã o d o núm ero d e ind iví d uos por concelho reforça a id eia
d a red uzid a d im ensã o d a m aioria d estas unid ad es: repare-se que 37% ti-
nha m enos d e 1000 habitantes e 70% m enos d e 3000.62

62 Os concelhos com um a populaçã o até 200 fogos eram na época consid erad os com o
m uito pequenos. Ver a este respeito o Projecto nº 150 sobre a Divisã o d o Território Apresen -
tad o à Câ m ara d os Deputad os em 20 d e Março d e 1827 in Marcelo Caetano - Os A nteceden-
tes da Reforma A dministrativa de 1832 (M ouzinho da Silveira), Lisboa, 1967, p. 37. Pelo exam e
d a populaçã o d os concelhos d e 1828, verifica -se que aquele núm ero d e fogos pod ia corres-
pond er até 965 ind iví d uos.

O Antigo Regim e 43
SILVEIRA

A divisã o eclesiá stica. As paróquias

Em sim ultâ neo com a organizaçã o territorial d o Estad o existia a d ivi-


sã o eclesiá stica. Deste ponto d e vista, o espaço continental estava d ivi-
d id o em d ioceses, reunind o um núm ero m uito d esigual d e paróquias.
Um a parte d os bispad os portugueses tem origem no perí od o rom ano
e outros rem ontam aos séculos VI e VII. A m aioria vem a ser restaurad a d u -
rante a Reconquista, até m ead os d o século XIII. Só no século seguinte as
fronteiras eclesiá sticas coincid em com as d o reino, na altura em que Braga
perd e a ascend ência sobre alguns bispad os galegos e os bispos espa nhóis
d eixam d e ter territórios d epend entes em Portugal. N o século XV existiam
10 d ioceses, send o o seu núm ero aum entad o para 13 na centúria seguin te,
ao m esm o tem po que o respectivo m apa era profund am ente alte rad o. N a
segund a m etad e d o século XVIII surgiram 4 novas d ioceses, pelo que
o total, no fim d o Antigo Regim e, atingia as 17. 63
N o com eço d o século XIX, estas grand es d ivisões eclesiá sticas pos -
suí am á rea e populaçã o m uito d iferenciad as e nã o tinham correspond ência
com a d ivisã o civil. N esta altura, a autorid ad e d os arcebispos e bispos nã o
se estend ia aind a a tod o o território nacional, já que existiam freguesias
isentas, sujeitas a ord ens m ilitares ou a m osteiros.64
A origem d as paróquias é coetâ nea d as d ioceses. Aquelas surgiram
com o igrejas d epend entes d as cated rais situad as nas cid ad es. N o iní cio, as
paróquias possuí am á reas relativam ente extensas que, com o and ar d os
tem pos, se foram fragm entand o. Até ao século XIII, à sem elhança d as d io-
ceses, nã o teriam um território claram ente d efinid o: “ A igreja paro quial
concebia-se m ais com o um lugar ond e se reuniam pessoas d o que com o cen -
tro d e um espaço geográ fico; pertenciam à paróquia os fiéis que nela se
baptizavam e recebiam os sacram entos.“ É a cobrança d os d í zim os, que se
vai tornand o obrigatória naquele século, que leva à necessid ad e d e d elim i-

63 Fortunato d e Alm eid a - História da Igreja em Portugal, nova ed içã o, Porto, Portuca-
lense, 1967-1971; A. H . d e Oliveira Marques - História de Portugal, vol. I, pp. 26-30 e 41-42;
id em - Portugal na Crise dos Séculos X IV e X V , pp. 365-367; Maria Alegria Fernand es Mar-
ques - Organizaçã o Ad m inistrativa d o Clero Secular in Maria H elena d a Cruz Coelho e Ar-
m and o Lu í s Carvalho H om em (coord .) - Portugal em Definiçã o de Fronteiras (1096-1325), pp.
225-230; Joã o José Alves Dias - Gentes e Espaços, vol. I, pp. 239-279.
64 Fernand o d e Sousa - A Populaçã o Portuguesa nos Iní cios do Século X IX , pp. 23-26.

44 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

tar a á rea paroquial e a subm eter ao pá roco os habitantes d e um a d eterm i -


nad a zona. Entretanto, d esd e o século XI, vã o-se aperfeiçoand o os m eca-
nism os d e ligaçã o entre os curas e os bispos. 65
O núm ero d e paróquias no território português terá aum entad o d u -
rante o perí od o d a Reconquista. N o século XV haveria cerca d e 2500. O
crescim ento posterior d a populaçã o levou à m ultiplicaçã o d estas unid ad es
bá sicas d a organizaçã o eclesiá stica. De facto, Fernand o d e Sousa ind icou a
existência d e 4092 em 1801 e nós contabilizá m os 4088 em 1826, após um a
pequena correcçã o introd uzid a na fonte que seguim os. 66
A carta n.º 10 possui um a m argem d e erro que convém sublinhar.
Conform e o quad ro VIII m ostra, nã o foi possí vel representar um total d e
447 paróquias: 283 que nã o conseguim os integrar nas freguesias ac-
tualm ente existentes e 164 que, d epois d e 1826, foram agregad as a ou tras e
que, d ad o o m étod o que seguim os, nã o era possí vel separar. Além d isso,
há que m encionar a á rea d as freguesias d e hoje em relaçã o à s quais nã o se
conseguiu estabelecer equivalência no passad o, que é, apesar d e tud o, d es -
prezí vel (ver nota ao quad ro VIII).
O erro d a carta é m aior em Trá s-os-Montes e no Alentejo, m as em
term os d e populaçã o nã o representa m ais d o que 8,4% d o total d esta úl-
tim a proví ncia e 7,4% d aquela.

65 Avelino d e Jesus d a Costa - Paróquia, in Dicioná rio de História de Portugal, Vol. III,
Lisboa, Iniciativas Ed itoriais, s. d ., pp. 309-310 e José Mattoso - Identificaçã o de um Paí s, vol.
I, pp. 398-403 (d ond e a citaçã o foi retirad a) e vol. II, p. 194.
66 A. H . d e Oliveira Marques - Portugal na Crise dos Séculos X IV e X V , p. 367 e Fernand o d e
Sousa - A Populaçã o Portuguesa nos Iní cios do Século X IX , p. 25. José António Santos em A s
Freguesias. História e A ctualidade, Oeiras, Celta Ed itora, 1995, p. 37 e 56, refere a existência
d e 4232 paróquias em 1798 e d e 4093 em 1826.

O Antigo Regim e 45
SILVEIRA

Quad ro VIII
Paróquias de 1826 nã o cartografadas - D istribuiçã o por proví ncia
Proví ncia Total de paróquias Paróquias nã o cartografadas %
Minho 1231 50 4,06
Beira 1251 108 8,63
Trá s-os-Montes 699 159 22,75
Estrem ad ura 472 46 9,75
Algarve 67 3 4,48
Alentejo 368 81 22,01
Total 4088 447 10,93
—————————————————————————————————————

N ota: á rea para a qual nã o se encontrou correspond ência nas paróquias d e 1826:
1648,62 Km2, equivalend o a 1,86% d a superfí cie total d o con tinente.

Quad ro IX
Paróquias de 1826 - Área
Área (Km2) N .º de paróquias % % acum.
0- 9 1557 42,76 42,76
10 - 19 925 25,41 68,17
20 - 29 426 11,70 79,87
30 - 39 228 6,26 86,13
40 - 49 125 3,43 89,56
50 - 59 77 2,11 91,68
60 - 69 48 1,32 93,00
70 - 79 36 0,99 93,99
80 - 89 29 0,80 94,78
90 - 99 22 0,60 95,39
>=100 168 4,61 100,00
Total 3641 100,00
—————————————————————————————————————

N ota: núm ero d e paróquias cuja á rea nã o foi d eterm inad a : 447.

46 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

Quad ro X
Paróquias de 1826 - Área média por proví ncia
Proví ncia N .º de paróquias Área média (km2)
Minho 1181 6,35
Beira 1143 19,51
Trá s-os-Montes 540 19,94
Estrem ad ura 426 36,82
Algarve 64 70,49
Alentejo 287 91,75
Total 3641

Quad ro XI
N úmero de indiví duos por paróquia em 1828
N .º de indiví duos N .º de paróquias % % acum.
0 - 99 134 3,34 3,34%
100 - 199 414 10,31 13,65%
200 - 299 614 15,30 28,95%
300 - 399 536 13,35 42,30%
400 - 499 425 10,59 52,89%
500 - 599 317 7,90 60,79%
600 - 699 268 6,68 67,46%
700 - 799 197 4,91 72,37%
800 - 899 169 4,21 76,58%
900 - 999 145 3,61 80,19%
>= 1000 795 19,81 100,00%
Total 4014 100,00
—————————————————————————————————————

N ota: núm ero d e paróquias em relaçã o à s quais nã o foi possí vel calcular a populaçã o: 74.
Fonte: ver anexo II.

O Antigo Regim e 47
SILVEIRA

Se a respeito d os concelhos falá vam os d e unid ad es d e pequena d i-


m ensã o, que ad jectivo d evem os em pregar para nos referirm os a esses pe-
quenos territórios que surgem na carta d e 1826 e que na zona N orte m ais
nã o sã o d o que m inúsculos pontos?
N a realid ad e, os núm eros sã o im pressionantes: 40% d as paróquias
tem m enos d e 10 Km 2 e 80% m enos d e 30 Km 2. Só um a pequena m inoria
supera os 100 Km 2 (quad ro IX). Em term os regionais o contraste N orte/ Sul
é acentuad o. Tend o em consid eraçã o a á rea m éd ia, as m icroscópicas
paróquias m inhotas estã o a enorm e d istâ ncia d as freguesias d o Algarve e
d o Alentejo, ocupand o as outras proví ncias os escalões interm éd ios
(quad ro X).
O núm ero d e ind iví d uos por paróquia nã o é m enos significativo: 50%
nã o atinge os 500 habitantes e 80% está abaixo d os 1000, send o verd ad e
que um a percentagem razoá vel supera este patam ar (quad ro XI).
Estas sã o as células bá sicas d e organizaçã o social. As paróquias
possuem um a estabilid ad e territorial geralm ente reconhecid a que, no pró-
prio século XIX, nã o foi abalad a senã o ao d e leve, ao contrá rio d as circuns -
crições ad m inistrativas. Constituem m icrocosm os num paí s ond e, m esm o
no fim d o século passad o, a m obilid ad e interna é escassa. 67 Microcosm os
que, sobretud o na zona interior ao norte d o Tejo, lentam ente, ao ritm o d e
um paulatino progresso d os transportes, se abrem ao exterior. Universos
m iniaturizad os, ond e as relações d e vizinhança assum em im portâ ncia fun -
d am ental e sã o perm anentem ente reforçad as pela prá tica religiosa, trad u -
zid a na frequência d a m issa d e d om ingo, na pertença à s irm and ad es e na
participaçã o nas procissões.
As paróquias tinham aind a form as próprias d e autogoverno, m ais ou
m enos com plexas, relacionad as com o exercí cio d a justiça, com a gestã o
d os bald ios ou com atribuições m ais vastas. N este últim o caso está Mon -
forte, um a freguesia d o term o d e Castelo Branco, que possuí a um a organi-
zaçã o quase m unicipal, com um juiz e procurad ores que geriam o prod uto
d os pastos com uns (objecto d e d isputa com a câ m ara d a cid ad e) e lança-
vam im postos localm ente, aplicand o as receitas gerad as em obras públicas

67 Joaquim d a Costa Leite - Portugal and Emigration, 1855-1914, Colu m bia University,
1994, p. 594.

48 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

d o interesse d os “ lavrad ores rústicos e ignorantes” , com o o po vo d a ald eia


a si próprio se referia.68
Paróquias à frente d as quais está um pá roco, em tantos casos auxi-
liad o por outros clérigos, presente nos actos essenciais d a vid a d os ind iví -
d uos, cujos registos controla, assim com o controla as consciências através
d a confissã o. Um pá roco que, a julgar pelos d ad os conhecid os para a d io -
cese d o Porto, pastoreia um rebanho no seio d o qual ele próprio nasceu. 69
Um pá roco letrad o, num m und o d e analfabetos, que por isso m esm o tantas
vezes é o m ed iad or entre a com unid ad e local e o exterior. Com o ocorreu em
Monsarros, ond e o presbí tero lia a constituiçã o d iocesana na m issa, d e
m od o a explicar ao povo os d í zim os que d evia pagar ao cabid o d e Coim bra,
e ond e era o único capaz d e ler o foral antigo e d e esclarecer até ond e
ia o d ireito d o m esm o cabid o d e cobrar as prestações senhoriais. 70
O clero paroquial nã o é, no entanto, um grupo hom ogéneo: se os pá -
rocos têm em com um a influência que a posiçã o social lhes confere, nã o
possuem , contud o, os m esm os ní veis d e rend im ento. N a com ar ca eclesiá s-
tica d e Penafiel em 1825, a grand e m aioria d os presbí teros tinha um réd ito
que os colocava d entro d a estreita faixa d e portugueses que, no ano se -
guinte, pod eriam votar nas eleições para d eputad os. Contud o, o fosso
existente entre os proventos d os abad es, ocupand o um extrem o d a escala,
e os curas, situad os no outro extrem o, era m uito grand e. Aqueles eram fa -
vorecid os, evid entem ente, pelo acesso d irecto aos d í zim os d a sua paróquia
que, na m aior parte d os casos, os próprios abad es se encarregav am d e co-
brar. Reitores, vigá rios e curas recebiam côngruas pagas por outros benefi-
ciá rios d o d í zim o.71

68 Ver d e Albert Silbert - Um a Ald eia Com unitá ria d a Beira Baixa no Iní cio d o Século
XIX: Monforte, in id em - Do Portugal de A ntigo Regime ao Portugal Oitocentista, 2ª ed . Lisboa,
Livros H orizonte, 1977, p. 105 e segs.
69 De acord o com Fernand o d e Sousa em O Clero d a Diocese d o Porto ao Tem po d as
Cortes Constituintes, in Revista de História, Porto, vol. II, 1979, p. 7, 70% d os sacerd otes
exerciam o seu m agistério nas freguesias d e que eram oriund os.
70 M anifesto das Contendas do Cabido da Sé de Coimbra com o Prior e M oradores do Couto
de V ila N ova de M onsarros, Lisboa, Im pressã o Régia, 1815.
71 Sobre a com arca d e Vila Real, ver Fernand o d e Sousa - O Clero d a Diocese d o Porto,
pp. 13-15. Ver tam bém Daniel Ribeiro Alves - Os Últimos 5 A nos dos Dí zimos: Produçã o
A grí cola, Rendimentos e Relações Sociais na Regiã o de V iana no Final do A ntigo Regime, Lis-
boa, 1996, policopiad o.

O Antigo Regim e 49
SILVEIRA

Até á sua aboliçã o, em 1832, esta prestaçã o d e natureza eclesiá stica


constituí a a principal contribuiçã o sobre o rend im ento agrí cola existente
em Portugal. Se no fim d o Antigo Regim e os d í zim os eram usufruí d os es -
sencialm ente pela Igreja, havia ind iví d uos e instituições laicas que d eles
beneficiavam tam bém . Send o a sua cobrança organizad a com base na pa -
róquia, o que aí ficava para pagam ento d o clero e d a fá brica d a igreja era
um a fracçã o m inoritá ria. Conventos, com end as, a Igreja Patriarcal d e Lis -
boa, cabid os, bispos, casas nobres e até câ m aras m unicipais encontravam -
se entre os interessad os neste rend im ento partilhad o d e form a extrem a -
m ente com plexa.
Entre os lavrad ores e os beneficiá rios d os d í zim os existiam , aind a,
ou funcioná rios, trabalhand o por conta d os interessad os, ou um a espan-
tosa red e d e rend eiros, grupo social m al conhecid o entre nós, m as que tinha
um papel relevante na socied ad e d e Antigo Regim e.72 N a regiã o d e Viana,
os que arrend avam a cobrança d os d í zim os eram , m aioritariam ente,
pequenos rend eiros, trabalhand o no concelho d a sua resid ência ou na á rea
d o m unicí pio lim í trofe, sós ou em socied ad e, para um ou m ais interessa-
d os. Mas tam bém havia rend eiros resid entes na capital d o reino, negocian -
tes, a cobrar em nom e d e com end as ou d a Igreja Patriarcal. 73
Um d os casos m ais interessantes d e que tem os conhecim ento é o d e
Joã o Ferreira Troca, negociante, vivend o em 1836 na freguesia d e Santa
Justa, em Lisboa, que, entre 1827 e 1831, arrend ou os d í zim os d e d iversas
entid ad es nos concelhos d e Soure, Peniche, Ald eia Galega d a Merceana,
Torres Ved ras, Mafra, Ribald eira, Sobral d e Monte Agraço, Vila Franca d e
Xira e Grâ nd ola; que, pela m esm a altura, trazia arrend ad as terras na zona
d as lezí rias d o Tejo; que tinha gad o a pastar no concelho d e É vora
(com arca d e Alcobaça) no iní cio d a d écad a d e 1820; que, em socied ad e,
arrem atara as rend as senhoriais que a prebend a d e Coim bra recebia no
concelho d e Penela (com arca d e Coim bra), ond e, em 1816, um conflito d e
d im ensões consid erá veis rebentou com os lavrad ores locais. 74

72 As petições publicad as por Albert Silbert em Le Problème A graire Portugais au Temps


des Premières Cortès Libérales, Paris, PUF, 1968 e por José Manuel Tengarrinha em M ovimentos
Populares A grá rios em Portugal, m ostram , claram ente, a im portâ ncia d este grupo social.
73 Sobre a partilha d o d í zim o, form as d e cobrança e rend eir os ver Daniel Ribeiro Alves -
Os Últimos 5 A nos dos Dí zimos.
74 Sobre a activid ad e com o rend eiro d os d í zim os ver Dulce Freire - Os Dí zimos no

50 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

O m apa d as freguesias d e 1826, por tud o o que se d isse sobre o clero


paroquial, é tam bém , o retrato d a im plantaçã o territorial d a Igreja, q ue
nad a tem d e sem elhante com a d o Estad o. Este, vim o-lo já , estava presente
através d e correged ores, proved ores e juí zes d e fora, com tod as as lim ita -
ções d e que tam bém já falá m os. A Igreja estava representad a por um nu -
m eroso clero paroquial à razã o d e 1 clérigo para 233 habitantes (d iocese
d o Porto em 1822), 1 para 123 (Minho, em 1800), 1 para 97,5 (Trá s-os-
Montes, em 1796), e, finalm ente, 1 para 346 (d iocese d e Beja, fim d o
século XVIII).75

Uma reforma malograda

Regressem os ao ní vel d o Estad o. Os factores d e irracionalid ad e que


afectavam a d ivisã o ad m inistrativa, nom ead am ente, a excessiva d im ensã o
d e algum as com arcas e a pequenez d e outras, bem com o os encravam entos
territoriais, eram um obstá culo a um eficaz exercí cio d a justiça, com o vi-
m os. O m esm o acontecia com a existência, em paralelo, d as ouvid orias.
N os últim os anos d o século XVIII, esta situaçã o com eçava a tornar-se d i-
fí cil d e aceitar: as id eologias tinham evoluí d o e a coroa afirm ava agora o
cará cter absoluto d o pod er d o rei que o d evia exercer em nom e d a realiza-
çã o d a felicid ad e d os súbd itos.76
Send o assim , a m onarquia vai d esencad ear a reform a d as com arcas,
através d a carta d e lei d e 19 d e Julho d e 1790 e d o alvará d e 7 d e Janeiro

Distrito de Lisboa: Os Últimos Cinco A nos (1827-1831), Lisboa, 1996, policopiad o e Arnald o
Silva- Os Dí zimos nas V ésperas da sua A boliçã o: Produçã o A grí cola, Rendimentos e Relações
Sociais na Regiã o de Coimbra (1827-1831), Lisboa, 1996, policopiad o; sobre o pasto d o gad o
em É vora e sobre o arrend am ento d e d ireitos senhoriais em Penela, ver José Manuel Tengar -
rinha - M ovimentos Populares A grá rios em Portugal, vol. II, pp. 104 e 212.
75 Fernand o d e Sousa - O Clero da Diocese do Porto, pp. 5-6; id em - Subsí d ios para a
H istória Social d o Arcebispad o d e Braga. A Com arca d e Vila Real nos Fins d o Século XVIII,
in Bracara A ugusta, Tom o XXX, nº 70, 1976; Jacques Marcad é - La Diocèse d e Beja d ans la Se-
cond e Moitié d u XVIIIe Siècle, in Bulletin des É tudes Portugaises, XXXII, 1971, p. 59.
76 Este ponto baseia-se, essencialm ente, no trabalho d e Ana Cristina N ogueira d a Silva - O
M odelo Espacial. À bibliografia aí ind icad a d eve-se acrescentar o livro,
recentem ente publicad o, d e Fernand o d e Sousa e Jorge Fernand es Alves - A lto M inho. Popula-
çã o e Economia nos Finais de Setecentos, Lisboa, Presença, 1997, ond e se ed ita m ais um d ocu -
m ento resultante d o processo d e reform a d as com arcas.

O Antigo Regim e 51
SILVEIRA

d e 1792, com o objectivo explí cito d e garantir a iguald ad e e uniform id ad e


na aplicaçã o d a justiça. Para este fim , d eterm inava -se a extinçã o d as ou vi-
d orias; quand o estas tivessem d im ensã o suficiente, transform avam -se em
com arcas, presid id as por um correged or; caso contrá rio, nom ear -se-ia um
juiz d e fora para superintend er nestes territórios que seriam integrad os nas
com arcas existentes ou a criar. Com o as ouvid orias nã o tinham continui-
d ad e espacial, d eclarava-se que as novas circunscrições se d everiam for-
m ar com os concelhos ad jacentes à antiga capital, se necessá rio agregand o
á reas d as com arcas régias. E com o entre estas havia algum as d e d im ensã o
d esm ed id a, previa-se a possibilid ad e d o seu fraccionam ento.
Ou seja, o que a coroa pretend ia era um com pleto reord enam ento d o
m apa d as com arcas que d everiam passar a ser unid ad es d e d im ensã o m ais
equilibrad a e contí nuas e tod as sujeitas à autorid ad e d os correged ores. Por
outro lad o, em bora a legislaçã o nã o d esse m uita relevâ ncia a este facto, a
recom posiçã o d o m apa im plicava que alguns concelhos perd essem a sua
autonom ia e ficassem d epend entes d os juí zes d e fora d e outros m unicí -
pios, juí zes cujo núm ero d evia aum entar. A própria existência d e alguns
concelhos, em casos extrem os, pod ia estar em causa. Puxava-se um a ponta
e o rosá rio d e problem as com eçava a d esfiar -se.
N o seio d a elite intelectual portuguesa d o final d o Antigo Regim e, es -
tava a vulgarizar-se um a atitud e crí tica face à generalid ad e d a ad m inistra -
çã o m unicipal, cujo governo económ ico era acusad o d e constituir um en -
trave ao d esenvolvim ento (por bloquear a livre circulaçã o d e m ercad orias)
e cujo sistem a d e im postos era tid o por injusto (por recair sobre os m ais
pobres).
Mas, para além d isto, existia um a im agem especialm ente negativa
d os pequenos concelhos, que nã o conseguiam fazer face aos seus com pro -
m issos financeiros. Segund o se afirm ava, este facto provocava a fuga aos
cargos m unicipais por parte d os ind iví d uos m ais capazes, que nã o esta-
vam d ispostos a assum ir a responsabilid ad e e os custos d a ad m inistraçã o
d e tais m unicí pios. Em consequência, estes concelhos eram governad os por
pessoas inaptas que com etiam tod o o tipo d e irregularid ad es.
N as representações d as câ m aras m aiores e d e alguns m agistrad os
que intervieram na reform a surgem , entã o, d uas id eias associad as: “ a d e
que, abaixo d e um certo lim iar populacional, ficava em risco a « boa or-

52 O Antigo Regim e
TERRITÓRIO E PODER

d em » d a justiça e d o governo concelhio; e a d e que essa ord em e justiça só


pod iam ser preservad as d esd e que o governo d as terras estivesse nas m ã os
d e pessoas instruí d as e com rend im entos. Consagrava -se, com isso, a afir-
m açã o d a incapacid ad e polí tica d os iletrad os, assim com o a d os que nã o
tinham rend im entos, num d iscurso que atingia em cheio as autorid ad es
trad icionais d os pequenos concelhos d o Reino.” 77
Globalm ente, a reform a constituí a um passo im portante na uniform i-
zaçã o d a justiça e na afirm açã o d a ad m inistraçã o régia. De qualquer
m od o, os d onatá rios continuariam a ter um a intervençã o significativa. As -
sim , estava previsto que a Casa d as Rainhas e a Casa d o Infantad o no -
m eassem os correged ores para as suas novas com arcas e que os restantes
senhores ind icassem os juí zes d e fora a nom ear.
Da realizaçã o d esta reform a foi incum bid o, em 1790, o Tribunal d o
Desem bargo d o Paço. N o entanto, três anos d epois, provavelm ente com o
resultad o d as d ificuld ad es sentid as, foram nom ead o s juí zes d em arcantes
para cad a um a d as proví ncias. Ficavam encarregad os d e propor a red efi-
niçã o d os territórios d as com arcas, após um a am pla recolha d e inform a-
ções e um levantam ento cartográ fico d e cad a regiã o e d epois d e consultas a
efectuar junto d os correged ores, proved ores e câ m aras m unicipais.
Embora nesta época existissem já projectos d e d ivisã o geom étrica d o
espaço, à boa m aneira ilum inista, os juí zes efectuaram propostas d e
grand e m od eraçã o, tentand o introd uzir as alterações estritam ente necessá -
rias para conseguir os fins em vista, respeitand o as capitais d e com arca
existentes e procurand o com pensar os interesses d os d onatá rios, d os m a -
gistrad os e d os concelhos atingid os pela m ud ança que se pretend ia. Mod e -
rad os foram tam bém os correged ores e prov ed ores que se pronunciaram , os
quais m uitas vezes se m ostravam preocupad os com a perd a d os seus pró-
prios rend im entos. As sed es d e com arca lutaram pela m anutençã o d a d i-
m ensã o d os seus territórios, ind issociá vel d a posiçã o que ocupavam na
hierarquia sim bólica d as terras, e as câ m aras revelaram um espí rito con ser-
vad or, localista, cioso d a sua autonom ia, recusand o m assivam ente a sujei-
çã o aos juí zes d e fora d e outros concelhos.
Esta reform a, com o algum as outras que a m onarquia procurou levar a
cabo no final d o Antigo Regim e, abrangend o os forais e os d í zim os, por

77 Ana Cristina N ogueira d a Silva - O M odelo Espacial do Estado M oderno, p. 230.

O Antigo Regim e 53
SILVEIRA

exem plo, red und ou num enorm e fracasso, d ela nã o resultand o m ais d o que
a supressã o d as ouvid orias. Os obstá culos foram m uitos: os juí zes d em ar -
cantes, um cargo d e natureza com issarial, paralelo à m agistratura régia, ti-
veram d ificuld ad e em im por a sua autorid ad e; a colaboraçã o d os correge -
d ores, proved ores e câ m aras, essencial à consecuçã o d o seu trabalho, nã o
foi fá cil d e conseguir; as próprias instituições centrais - Secretaria d os N e-
gócios d o Reino e Tribunal d o Desem bargo d o Paço - m anifestaram resis-
tências; d epois houve insuficiência d e m eios hum anos e financeiros e falta
d e conhecim ento d o território, o que im possibilitou aqueles juí zes d e fazer
face aos argum entos d as autorid ad es locais.

54 O Antigo Regim e
Quand o a Revoluçã o chega a Portugal, no ano d e 1820, existiam pelo
m enos d ois m od elos d e im plantaçã o territorial d o Estad o que pod eriam
servir d e referência: o inglês e o francês, este últim o d epois ad optad o em
vá rios paí ses, com o, por exem plo, em Espanha e na Prússia. Os nossos
liberais conheciam m elhor a ad m inistraçã o francesa e a espanhola, pelo
m enos através d a leitura, m as a em igraçã o nas d écad as d e 1820 e 1830
perm itiu -lhes um contacto d irecto com a realid ad e inglesa.
Os d ois m od elos d istinguiam -se, essencialm ente, pelo peso d a m á -
quina estatal, m aior nos paí ses d o continente, e pelo papel reservad o à s
elites locais, m aior em Inglaterra. Deste últim o ponto d e vista, no entanto,
as d uas fórm ulas tend eram a convergir a partir d a d écad a d e 1830. Passe-
m os rapid am ente em revista a organizaçã o periférica d o Estad o em In -
glaterra, França e Espanha, pois isso vai-nos perm itir um entend im ento
m ais claro d a evoluçã o portuguesa. 1

O modelo inglês

A im agem d e um a socied ad e europeia pós-revolucioná ria d om inad a


por um a burguesia triunfante está hoje d efinitivam ente posta em causa. A
Inglaterra é, justam ente, o exem plo d e um paí s controlad o até ao século XX
por um a aristocracia que, m ed iante um a gestã o inteligente d o pod er,
consegue fazer face à contestaçã o que lhe foi m ovid a e é capaz d e viabili-
zar, ao m esm o tem po, um pod eroso processo d e m od ernizaçã o e d esen-

1 Elem entos para um a com paraçã o d os m od elos inglês e francês e d a variante alem ã en -
contram -se no estim ulante artigo d e Christophe Charle - Légitim ités en Péril. É lém ents pour
une H istoire Com parée d es É lites et d e l’ É tat en France et en Eu rope Occid entale (XIXe -XXe
Siècles), in A ctes de la Recherche en Sciences Sociales, 116/ 117, 1997, pp. 39-52.

A Revoluçã o 57
SILVEIRA

volvim ento económ ico. A d om inaçã o aristocrá tica, d e tã o evid ente, nunca,
d e resto, foi verd ad eiram ente posta em causa pelos historiad ores. O que se
d iscutiu nos últim os anos foi o cará cter d as classes m éd ias inglesas, d efen -
d end o alguns a sua d ebilid ad e e incapacid ad e d e tom ar o pod er, lem -
brand o outros a especificid ad e d a sua cultura e a d esnecessid ad e d essa
tom ad a d e pod er.2
Para além d e d om inar o Estad o central (câ m ara alta d o parlam ento,
governo, ad m inistraçã o), a aristocracia controlava tam bém o pod er local.
A este ní vel, o sistem a d e ad m inistraçã o nascid o no iní cio d a É poca Mo -
d erna sobreviveu até ao final d o século XIX. H á , no entanto, que d istinguir
entre as cid ad es e o cam po. Os centros urbanos, que conheceram um vigo ro-
so crescim ento d esd e o século XVI, eram trad icionalm ente governad os
por corporações. Em 1835 estes velhos organism os foram substituí d os por
ad m inistrações eleitas através d e um sufrá gio censitá rio. Isto provocou um
enfraquecim ento d a influência aristocrá tica que, apesar d e tud o, se m an -
teve nalguns casos.3
N a Inglaterra rural a situaçã o era d iferente. À frente d o cond ad o es-
tava um governad or (lord -lieutenant) nom ead o pelo pod er central. O go-
vernad or tinha a seu cargo a m ilí cia e d ispunha d e um a grand e capacid ad e
d e intervençã o na organizaçã o d as eleições para a câ m ara baixa d o parla -
m ento. Durante o século XVIII os governad ores ganharam o m onopólio d a
nom eaçã o d os juí zes, papel d e que só abd icaram em 1910. O cargo d e
“ lord -lieutenant” era invariavelm ente d esem penhad o por um m em bro d a
nobreza titular.
O posto m ais im portante no governo local era o d e juiz d e paz
(justice of the peace). Originalm ente, com o o nom e ind ica, estes juí zes eram
responsá veis pela m anutençã o d a paz. Mas d epois d o século XVI as suas
funções foram -se am pliand o. Entre as novas atribuições contam -se: a regu -
laçã o d os preços e salá rios, o licenciam ento d os botequins, a reparaçã o d as
pontes e estrad as, a ad m inistraçã o d o auxí lio aos pobres e a cobrança d e
im postos para estes fins. Os juí zes d e paz reuniam -se trim estralm ente no

2 A bibliografia sobre estas m atérias é extensí ssim a. Sirva d e introd uçã o o excelente ar -
tigo d e M. J. Daunton - “ Gentlem anly Capitalism ” and British Ind ustry 1820-1914, in Past
and Present, 122, 1989, pp. 118-158.
3 F. M. L. Thom pson - Tow n and City, in id em (ed .) - The Cambridge Social History of Bri-
tain 1750-1950, vol. I, Cam brid ge, University Press, 1990, pp. 1-86.

58 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

que pod ia ser consid erad o o parlam ento d o cond ad o, as “ quarter ses-
sions” , ond e eram tratad as as questões ad m inistrativas e legais a seu
cargo.
Eram eles que governavam a naçã o. Por isso o seu recrutam ento era
selectivo, send o exigid o um m í nim o d e rend im ento anual a quem exercia o
lugar. Até ao últim o quartel d o século XIX este posto foi um m onopólio d a
nobreza rural inglesa (gentry), cujo pod er estava basead o na propried ad e
d a terra.
A erosã o d a influência d os juí zes d e paz com eçou com o apareci-
m ento d as juntas encarregad as d e tratar d o auxí lio aos pobres, d a saúd e
pública ou d as estrad as, por exem plo. Quand o eram eleitas, perm itiam a
entrad a d e lavrad ores e com erciantes, m as os juí zes continuaram aí bem
representad os. Mais im portante foi a profissionalizaçã o d o governo local,
d e que é exem plo a polí cia d os cond ad os, surgid a nas d écad as d e 1840 e
1850. A verd ad eira reform a, no entanto, só aconteceu em 1888 com o
“ County Councils Act” que criou os conselhos eleitos. Mesm o assim , a
substituiçã o d a antiga elite foi grad ual.
Em conclusã o, a Inglaterra possu í a um a aristocracia que encarava a
sua participaçã o no pod er nã o só com o um d ireito, m as com o um d ever.
Durante boa parte d o século XIX “ o governo local foi essencialm ente pater -
nalista, d esd e a ad m inistraçã o d a justiça até ao pagam ento d a assistência
aos pobres. Em parte isto foi possí vel porque ele perm aneceu um a coutad a
d e senhores nã o rem unerad os e a Inglaterra nã o d esenvolveu um a burocra -
cia profissional, enquanto o facto d a sua sobrevivência sugere que ele
foi relativam ente bem suced id o.” 4

O modelo francês

N ã o é fá cil fazer com parações entre a Inglaterra e a França d o Antigo


Regim e. As socied ad es e as instituições eram m uito d iferentes. A nobreza
francesa era d istinta d a aristocracia inglesa e o Estad o francês tinha um a

4 Para tod a esta d escriçã o ver a excelente sí ntese d e J. V. Beckett - The A ristocracy in En-
gland (1660-1914), Oxford , Blackw ell, 1986, pp. 374-402.

A Revoluçã o 59
SILVEIRA

m aior presença, com o o processo d e transform açã o d o sistem a d e trans-


portes no século XVIII, num e noutro paí s, m ostra. De resto, a França pas -
sou por um a d ram á tica revoluçã o d epois d e 1789 que afectou tam bém a
estrutura d o Estad o.
Deste ponto d e vista, tratou -se d e substituir o antigo sistem a ad m i-
nistrativo por um novo, basead o num a d ivisã o regular d o território, cond i-
çã o d o exercí cio d e um a ad m inistraçã o eficiente e d a afirm açã o d a autori-
d ad e pública sobre o conjunto d o espaço nacional. Ao m esm o tem po, o
novo sistem a d evia perm itir a participaçã o d os cid ad ã os, através d e elei-
ções, na form açã o d as novas instâ ncias d e pod er regional e local, d e
acord o com a d outrina d a soberania popular.
Mas a criaçã o d e um a nova d ivisã o territorial correspond ia tam bém à
necessid ad e d e com bater os particularism os provinciais. N o século XVIII
registaram -se tentativas d e reform a d a ad m inistraçã o d as cid ad es france-
sas e tam bém houve projectos reform istas que ultrapassaram o â m bito lo-
cal. N o entanto, tais projectos nunca puseram em causa as proví ncias. Em
89 a postura era outra: agora tratava-se d e criar um a d ivisã o geom étrica
d o espaço, apagand o os lim ites provinciais, d e m od o a instaurar a unid ad e
d a naçã o. Este propósito ganhou um cará cter d e urgência d epois d os acon -
tecim entos d a noite d e 4 d e Agosto d e 1789, em que a Assem bleia Consti-
tuinte proclam ou a aboliçã o d os privilégios particulares d as proví ncias,
principad os, regiões, concelhos, cid ad es e com unid ad es d e habitantes.
Do d ebate d a proposta rad ical d o Com ité d a Constituinte, que foi
confrontad a com as reivind icações locais, face à s quais a assem bleia se
m ostrou tolerante, nasceu o m apa ad m inistrativo d a França, estruturad o
em d epartam entos, d istritos e com unas. Se este m apa fazia concessões à s
fronteiras d o Antigo Regim e, ele nã o d eixava d e consagrar os princí pios d a
proposta inicial que tend iam para a criaçã o d e um a d ivisã o ad m inistrativa
uniform e em tod o o território.5
Os d epartam entos, que poucas m ud anças sofreram até à actuali-
d ad e, ao recortarem os antigos espaços d as proví ncias, revelaram -se fun-

5 Marie-Vic Ozouf-Marignier - De L’ Universalism e Constituant aux Intérêts Locaux: Le


Débat sur la Form ation d es Départem ents en France (1789-1790), in A nnales, É conomies, So-
ciétés, Civilisations, nº 6, 1986, pp. 1193-1213; Daniel N ord m an e Jacqu es Revel - La
Formation de l’ Espace Français, pp.132-140.

60 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

d am entais: “ Foi por ele [pelo d epartam ento] que passou o lento processo
d e integraçã o d a naçã o.” A ele se ad aptaram d epois os restantes ram os d a
ad m inistraçã o (as d ivisões m ilitar, jud icial e d e ensino). 6
Entretanto, a Constituinte d efinia tam bém os novos órgã os d e pod er,
eleitos em eleições censitá rias, ind irectas no caso d os d epartam entos e d is -
tritos e d irectas nas com unas. N este sistem a o pod er central pouca influên-
cia tinha. A d itad ura jacobina vibrará os prim eiros golpes neste ed ifí cio, no
sentid o d a centralizaçã o, que N apoleã o plenam ente consagrará . A partir
d e 1800, m antend o-se a d ivisã o territorial, a França passa a d ispor d e um a
organizaçã o ad m inistrativa fortem ente hierarquizad a, existind o à frente d e
cad a circunscriçã o um funcioná rio nom ead o pelo pod er central, com capa -
cid ad e executiva, assistid o por órgã os colegiais, tam bém nom ea d os, com
pod er d e d eliberaçã o.
N a d écad a d e 1830 este sistem a foi ad aptad o ao liberalism o repre -
sentativo: assim , conservou -se o cará cter centralizad o d a m á quina ad m i-
nistrativa, que continuou a basear-se em funcioná rios nom ead os, com po-
d er executivo, e órgã os colegiais d eliberativos; m as intro d uziu -se a eleiçã o
censitá ria d estes últim os. Destaque-se que o presid ente d a câ m ara
(“ m aire” ) passou a ser seleccionad o através d e um processo m isto, send o
escolhid o pelo governo entre os cid ad ã os eleitos para o órgã o colegial d a
com una. Estand o d epend ente d as autorid ad es ad m inistrativas, o “ m aire”
constituí a o ponto d e intersecçã o entre o pod er central e o pod er local re-
presentativo.7
Verificava-se assim a passagem d o sistem a napoleónico ao d os notá -
veis, em que o pod er a ní vel local tend ia a id entificar -se com a elite eco-
nóm ica e social. Deste ponto d e vista, a França aproxim ava-se d a Ingla-
terra. Contud o, este sistem a perm anecia unid o ao napoleónico pela centra -
lizaçã o, ao m esm o tem po que o pod er d os notá veis era m inad o pela con -
corrência d e elites profissionais ligad as a um Estad o m uito m ais anónim o
d o que o inglês.8

6 Daniel N ord m an e Jacques Revel - La Formation de l’ Espace Français, p. 141.


7 Roger Dupuy (d ir.) - Pouvoir Local et Révolution 1780-1850. La Frontière Intérieure, Ren-
nes, Presses Universitaires d e Rennes, 1995; Concepción d e Castro - La Revolución Liberal y
los M unicipios Españoles, pp.14-20.
8 Christophe Charle - Légitimités en Péril.

A Revoluçã o 61
SILVEIRA

O caso espanhol

Os vá rios regim es liberais espanhóis (1810-1814, 1820-1823 e d e


1833 em d iante) foram confrontad os com problem as id ênticos aos que se
colocaram em França aquand o d a Revoluçã o d e 1789: d eficiente integraçã o
territorial, trad uzid a na persistência d e regionalism os, e necessid ad e d e ra -
cionalizaçã o d a organizaçã o d o Estad o, garantind o a representativid ad e
d os novos órgã os d e pod er. As respostas d ad as foram fortem ente influen -
ciad as pela experiência francesa.
N o século XVIII surgiram as prim eiras form ulações d a nacionalid ad e
espanhola. Mas, em sim ultâ neo, tornaram -se evid entes os sinais d e um a
vid a cultural regional: no paí s basco, por exem plo, proced eu -se a um a re-
cuperaçã o e sistem atizaçã o d a lí ngua, à prod uçã o d e o bras sobre a história
d as suas vá rias zonas e à fund açã o d e um a socied ad e d e am igos d o paí s.
Em consequência d estas tend ências, a “ Espanha aparecia com o um a red e
social d e regiões naturais ou históricas m al ou insuficientem ente integra -
d as.” 9
N ã o ad m ira, p ois, que o problem a regional surgisse aquand o d a pri-
m eira tentativa d e im plantaçã o d o regim e liberal. Ouviram -se, por esta al-
tura, ecos d o d iscurso revolucioná rio francês: d izia o Semaná rio Patriótico,
em 1811, que a base d o regim e havia d e ser um a “ constituiçã o ad aptad a à s
nossas circunstâ ncias que faça d e tod as as proví ncias que com põem esta
vasta Monarquia um a N açã o verd ad eiram ente una, ond e tod os sejam
iguais em obrigações, iguais em tributos. Com ela d evem cessar aos olhos
d a Lei as d istinções d e valencianos, aragoneses, castelhanos, biscaí -
nhos…” 10
O confronto entre unitarism o e particularism o fez -se sentir nas Cortes
d e Cá d is, m as o prim eiro triunfou claram ente. Ora, o processo d e consti-
tuiçã o d a naçã o passava, tam bém nestes caso, pelo d esenho d e um a nova
d ivisã o territorial. Dizia um d eputad o, exprim ind o as posições rad icais,
nã o d om inantes: “ …chegou o m om ento d e esquecer os nom es d os senhorios

9 Juan Pablo Fusi - La Organización Territorial d el Estad o in id em (ed .) - España.


A utonomí as, Tom o V, Mad rid , Espasa-Calpe, 1989, pp. 14-16.
10 Cit. por Lu is Gonzá lez Antón - El Territorio y Su Ordenación Politico-A dministrativa, p. 73.

62 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

e reinos que com põem a Monarquia espanhola, d e que nã o se voltem a ou-


vir as d enom inações d e catalã es, aragoneses, castelhanos […], ad optand o
outros vocá bulos aind a para a d enom inaçã o d as proví ncias ou ao m enos
d ivid ind o o território sem consid eraçã o d os seus antigos lim ites…” 11
As Cortes com eçaram por d ivid ir, provisoriam ente, o território espa -
nhol em 32 proví ncias e, em 1813, form ularam um prim eiro projecto, m od e-
rad o, sobre a m atéria que, tod avia, nã o chegou a ser aprovad o. Com o re -
gresso ao Absolutism o voltou -se à ord enaçã o territorial d o Antigo Regim e.
Por sua vez, o Parlam ento d o Triénio Liberal r etom ou o assunto e, em
1822, aprovou um a nova d ivisã o provincial, d esta feita com m enos conces -
sões à s fronteiras históricas. Esta nã o chegou, tod avia, a vigorar, porque o
regim e caiu em 1823.
Dez anos d epois, logo após a m orte d e Fernand o VII, a questã o ficou
d efinitivam ente resolvid a. Data d e 30 d e N ovem bro d e 1833 o d ecreto d a
autoria d o m inistro Javier d e Burgos que criou a d ivisã o provincial espa -
nhola, a qual, com pequenas alterações, chegou até à actualid ad e. Burgos
inspirou -se no projecto d e 1822, m as m od erou -o, contem porizand o com a
organizaçã o trad icional d o espaço. De facto, partiu d a estrutura d os reinos
ou grand es d istritos antigos e d ivid iu -os em proví ncias.12 O m inistro, que
era um afrancesad o, estava sobretud o preocupad o com a racionaliz açã o
d a ad m inistraçã o. Criou um a d ivisã o provincial uniform e, sobre a qual,
com o em França, se organizaram os restantes ram os ad m inistrativos e as
instâ ncias jud iciais. Javier d e Burgos “ nã o optou por um a soluçã o à fran -
cesa: nã o quis nem acabar com tod os os vestí gios d os territórios históricos,
nem criar regiões geom etricam ente uniform es.” Este facto, se fez com que o
sistem a nã o provocasse contestaçã o, teve consequências im portantes: o
particularism o basco, por exem plo, m anteve-se e d esenvolveu -se no quad ro
provincial.13
Do ponto d e vista ad m inistrativo, sob o regim e liberal a Espanha ficou
organizad a em proví ncias e m unicí pios. Com o o governo local era
m uito d iverso, o novo regim e, d esd e as Cortes d e Cá d is, teve d e o unifor -
m izar. Para tanto, reconheceu os m unicí pios existentes e m ultiplicou o seu

11 Cit. por Lu is Gonzá lez Antón, ibidem, p. 75.


12 Lu is Gonzá lez Antón, ibidem, pp. 74-78.
13 Juan Pablo Fusi - La Organización Territorial del Estado, pp. 19, 21-23.

A Revoluçã o 63
SILVEIRA

núm ero, d ecretand o em 1812 a sua criaçã o em tod as as localid ad es que,


por si só ou com o seu território, atingissem 1000 alm as. Este lim ite em
1835 foi red uzid o para os 500 habitantes, fixand o-se em 150 d ez anos d e-
pois.14
Quanto à organizaçã o d o pod er, os parlam entares d e Cá d is ad opta -
ram um figurino inspirad o no exem plo francês, com binand o traços d o sis -
tem a d escentralista d e 1789 e d o sistem a napoleónico: ao ní vel d a proví n-
cia, colocaram um chefe polí tico d e nom eaçã o régia, d etentor d o pod er exe-
cutivo, junto d o qual existia um a “ d iputación” eleita em eleições ind irectas
censitá rias; por seu lad o, o governo m unicipal estava a cargo d a câ m ara
(“ ayuntam iento” ) - escolhid a em eleições tam bém ind irectas, em que parti-
cipavam os chefes d e fam í lia resid entes - presid id a pelo “ alcald e” , eleito
com o os “ regid ores” e o procurad or ou procurad ores. O chefe polí tico pre-
sid ia à câ m ara d a capital ond e resid ia e pod ia fazê -lo tam bém em outra
qualquer d a sua proví ncia, tend o voto em caso d e em pate. 15
Esta legislaçã o, d e 1812-1813, vem a ser reform ad a pela lei d e 23 d e
Fevereiro d e 1823 que separava as funções ad m inistrativas e económ icas,
próprias d as câ m aras e “ d iputaciones” , d as d e polí tica e d e ord em pú-
blica, entregues aos “ alcald es” e chefes polí ticos. O “ alcald e” , para além
d esta á rea d e com petência especí fica, que exercia sob a vigilâ ncia d o chefe
polí tico, assum ia agora o pod er executivo. Esta legislaçã o m al chegou a ser
aplicad a, d ad o que, aind a em 1823, se verificou a restauraçã o d o Absolu -
tism o e a consequente anulaçã o d a legislaçã o liberal. 16
A partir d e 1833, a reform a d a ad m inistraçã o voltou a estar na or-
d em d o d ia. Defrontaram -se, entã o, d uas correntes: m od erad os e progres-
sistas. Aqueles procuravam reforçar a autorid ad e d o governo e aprofund a -
vam a separaçã o d e funções executivas e d eliberativas, já antes prevista.
Entregavam aquelas ao chefe polí tico e ao “ alcald e” e as d eliberativas aos
órgã os colegiais, “ d iputación” e câ m ara, am bas eleitas por sufrá gio censi-
tá rio, m ais apertad o no caso d o órgã o provincial. Por outro lad o, m anti-
nha-se a nom eaçã o régia d o chefe polí tico. A grand e inovaçã o foi o proces-
so d e selecçã o d o “ alcald e” , escolhid o pelo governo entre os eleitos par a a

14 Concepción d e Castro - La Revolución Liberal y los M unicipios Españoles, pp. 61-62.


15 Concepción d e Castro, ibidem, pp. 70, 73, 84 e 92.
16 Concepción d e Castro, ibidem, p. 99.

64 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

câ m ara. Estava aind a prevista a possibilid ad e d e nom eaçã o governa-


m ental d e “ alcald es” extraord iná rios para substituir os ord iná rios, sem pre
que tal se revelasse necessá rio. Para os m od erad os, o “ alcald e” era, antes
d e tud o, o representante d o governo no m unicí pio.
Os progressistas, por seu lad o, concord avam com boa parte d estas
propostas, aind a que tend essem a d im inuir o censo exigid o aos eleitores. A
grand e e insaná vel d ivergência entre os d ois grupos, contud o, centrou -se na
figura d o “ alcald e” . Os progressistas até aceitavam a sua cond içã o d e re-
presentante d o governo e a subord inaçã o ao chefe polí tico. O que eles nã o
queriam era a interferência d o pod er central na sua nom eaçã o, na escolha
d a pessoa que iria exercer o lugar, d efend end o, por isso, o cará cter electivo
d o cargo. A im portâ ncia d este aspecto estava relacionad a com a interven-
çã o d o “ alcald e” nas eleições para d eputad os, que lhe perm itia cond icio-
nar os resultad os, e levou m esm o ao golpe d e Estad o progressista d e 1840,
lid erad o p or Espartero.17
O m od elo m od erad o esteve em vigor em 1844-1854 e 1856-1868. A
legislaçã o d e 1823, que os próprios progressistas já nã o consid eravam ad e -
quad a, vigorou entre 1836 e 1843 e d epois, parcialm ente, entre 1854 e
1856.18

A evoluçã o portuguesa

O programa liberal

Com a Revoluçã o d e 1820 sobe ao pod er um a elite polí tica forte-


m ente influenciad a pelo pensam ento francês e pela experiência liberal es -
panhola. Um a elite que acred ita na id eia d a unid ad e d a soberania, a qual
já vinha a ser d efend id a e até m aterializad a pela m onarquia absoluta. A
d iferença, d o ponto d e vista id eológico, está na afirm açã o d a origem d essa
soberania: entend em os liberais que ela resid e na naçã o, a qual é com posta

17 Concepción d e Castro, ibidem, pp. 121-130 e 160.


18 Alfred o Gallego Anabitarte - España 1812: Cá d iz, Estad o Unitario, en Perspectiva
H istórica, in Miguel Artola (d ir.) - Las Cortes de Cá diz, Mad rid , Marcial Pons, 1991, pp. 125-
-166. Revista Ayer, n.º 1.

A Revoluçã o 65
SILVEIRA

por cid ad ã os d otad os d e d ireitos e d everes. Consequentem ente, o pro-


gram a liberal vai im plicar, d e form a inequí voca, a consagraçã o d o m ono -
pólio d a autorid ad e pública d o Estad o e a realizaçã o d os d ireitos e d eve-
res ind ivid uais. Ora, tud o isto era irrealizá vel sem um a red efiniçã o d o es-
paço polí tico-ad m inistrativo e a criaçã o d e novas instâ ncias d e pod er.
Com o d ecorre d o que até agora se escreveu, o espaço nã o é só um re -
flexo, m as é tam bém um elem ento estruturante d as relações sociais e, con -
sequentem ente, d as relações d e pod er. A alteraçã o d o espaço polí tico-ad -
m inistrativo afecta as relações estabelecid as, tornand o -as m ais ou m enos
eficazes, m ais ou m enos intensas, pod end o fazer entrar em jogo novos ac-
tores e im plicar um a red istribuiçã o d e papéis d esem penhad os.
Os polí ticos liberais estavam conscientes d estas realid ad es. H á um a
afirm açã o d o d eputad o Francisco António d e Cam pos, nas Cortes d e
1828, que m erece ser transcrita: "Divid ir m uito o Território é com plicar a
Ad m inistraçã o, exigir um grand e núm ero d e Empregad os e enfraquecer os
interesses gerais, tirand o-lhes a força que lhe d á um a m aior reuniã o; nã o o
d ivid ir suficientem ente é enfraquecer, pelo contrá rio, a Autorid ad e que nã o
se exerce com tanta activid ad e em grand es m assas, com o em porções d e
m ais com preensí vel extensã o."19
O id eá rio liberal está bem sintetizad o no passo seguinte: “ Se a bem
entend id a d ivisã o d o território é, portanto, o canal seguro por ond e sobe
ao Governo o conhecim ento d os recursos que tem d e ad m inistrar e [sic] ela
é reciprocam ente o único m eio que o Governo tem d e fazer d escer aos
povos as provid ências e benefí cios d a sua ad m inistraçã o. Mas para que
este m eio possa correspond er a tod os os fins d e utilid ad e geral, cum pre
que seja estabelecid o por um sistem a que tenha por base as necessid ad es e
os interesses d esses povos; isto é, que regule e facilite o uso d os seus
d ireitos polí ticos; que afiance, com gozo d a sua liberd ad e ind ivid ual, a
segurança d as suas vid as e d as suas propried ad es e que fiscalizasse [sic]
convenientem ente a arrecad açã o e bom uso d os d inheiros com que eles
concorrerem para as d espesas d e interesse público. Daqui resulta pois, que
um a d ivisã o bem entend id a d e [sic] território, na sua m aior generalid ad e,
d eve ser consid erad a com o polí tica, judicial ou administrativa: a subd ivisã o

19 Apud José António Santos - Regionalizaçã o, p. 72.

66 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

d estes três grand es capí tulos form a o d esenvolvim ento d o plano d a


Ad m inistraçã o geral, no qual vêm d epois colocar -se naturalm ente, ou por
m eio d e com binações fá ceis, tod as as outras d ivisões secund á rias, com o a
Eclesiá stica, a Militar, a instrutiva, etc., etc., etc.” 20
Consequentem ente, a d ivisã o territorial pré -existente, que estava em
contrad içã o com as próprias id eias polí ticas em voga no final d a m onar-
quia absoluta, nã o pod ia subsistir e d everia ser substituí d a por um a outra
basead a em critérios d e racionalid ad e, salvaguard and o aind a a uniform i-
d ad e d os seus d iversos ní veis, com o o trecho acim a citad o afirm a clara -
m ente.
O choque entre as necessid ad es d ecorrentes d o novo sistem a polí tico
e a estruturaçã o d o território herd ad a d a m onarquia absoluta é bem paten-
te quand o se trata d e organizar as eleições. Um d os hom ens m ais activos
em tod o o processo d e preparaçã o d as reform as d o m apa ad m inistra tivo
nas d écad as d e 1820 e 1830, Marino Miguel Franzini, d izia em 1822, ao
apresentar o seu projecto d e d elim itaçã o d os cí rculos eleitorais: “ a actual
d ivisã o d o território português era a m ais d efeituosa que se conhecia,
achand o-se as com arcas com inum erá veis encravam entos que causam o
m aior incóm od o e confusã o aos habitantes” .21 Mas a verd ad e é que, qua-
tro anos d epois, o m apa d e proví ncias que serviu d e base à s eleições para
d eputad os foi aqu ele que anteriorm ente apresentá m os.

Traços distintivos da situaçã o portuguesa

A reorganizaçã o era, pois, inevitá vel. Deste ponto d e vista, a questã o


era sem elhante à que os revolucioná rios franceses e espanhóis haviam en -
frentad o. Mas havia um a d iferença substantiva, um traço que d istinguia a
situaçã o portuguesa e que já foi d estacad o: no nosso paí s nã o existiam
particularism os provinciais a apagar, nã o havia regionalism os a d estruir.

20 Relatório d o d ecreto d e 28 d e Junho d e 1833, in Colecçã o de Decretos e Regulamentos


[…], 2ª série, Lisboa, Im prensa N acional, 1836, p. 330.
21 Diá rio das Cortes, tom o VI, Lisboa, 1822, p. 443. Sobre Franzini ver Maria d e Fá tim a
N unes - O Liberalismo Português. Ideá rios e Ciências. O Universo de M arino M iguel Franzini
(1800-1860), Lisboa, IN IC, 1988.

A Revoluçã o 67
SILVEIRA

Consequentem ente, a d iscussã o em torno d as unid ad es territoriais acim a


d o m unicí pio nad a tem que ver com este tipo d e problem as, m as sim com a
eficá cia d o exercí cio d o pod er central e, m ais aind a, com o equilí brio entre
essa eficá cia e a liberd ad e.
O segund o elem ento caracterí stico d a situaçã o portuguesa prend e -se
com a existência, tam bém já assinalad a, d e um a red e d e m unicí pios co -
brind o o território d o paí s, d otad a d e um a certa uniform id a d e institucional
e d e um a certa autonom ia. Ora, esta trad içã o vai cond icionar,
sobrem aneira, as soluções ad optad as em Portugal quanto à estrutura d o
Estad o pós-revolucioná rio.
É a partir d estas d uas id eias que vam os reanalisar os d eb ates e as
opções tom ad as no perí od o d a Revoluçã o Liberal, acrescentand o factos
novos, corrigind o perspectivas e apresentand o a cartografia.

A discussã o parlamentar de 1821-1823

Estand o em bora conscientes d a im portâ ncia d a d ivisã o territorial, os


d eputad os presentes no Parlam ento em 1821-1822 tinham com o tarefa pri-
oritá ria a elaboraçã o d a Constituiçã o e foi a ela que consagraram o es sen-
cial d os seus esforços.
O projecto d e Constituiçã o incluí a um tí tulo sobre o governo ad m i-
nistrativo. Quand o a d iscussã o d este se iniciou estava-se em Março d e
1822 e, apesar d as Cortes já terem d ebatid o algum as m ed id as sobre os
m unicí pios, na realid ad e nad a se tinha alterad o no governo d estes últim os
em relaçã o ao Antigo Regim e. Por isso os d eputad os resolve ram inverter a
ord em d as m atérias contid as no projecto d e Constituiçã o sobre a ad m inis -
traçã o e com eçar o d ebate pelos artigos referentes à s câ m aras. 22
“ De um a m aneira geral, os prim eiros liberais portugueses, reunid os
em Cortes d esd e o iní cio d e 1821, queriam um pod er m unicipal forte e re-
novad o, apresentand o sem pre um a grand e d esconfiança em relaçã o à s an -
tigas elites que asseguravam a d irecçã o d o pod er concelhio. Viam as novas

22 Tu d o o que afirm o sobre esta d iscussã o baseia -se em Paulo Jorge Azeved o Fernand es -
A s Faces de Proteu. Elites Urbanas e Poder M unicipal em Lisboa de Finais do Século X V III a
1851, Lisboa, 1997, policopiad o, pp. 136-140 e 149-162.

68 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

câ m aras com o um m eio d os cid ad ã os participarem no governo d as suas


com unid ad es e com o um a via d e d ifusã o e d ivulgaçã o d o novo id eá rio po -
lí tico, m as d iscord avam , fund am entalm ente, no grau que d evia ser conce -
d id o a essa participaçã o popular.” 23
Assim , d urante o d ebate m anifestaram -se d uas tend ências. Um a,
centralizad ora, que d efend ia a sujeiçã o d as câ m aras a órgã os d e tutela, a
red uçã o d as atribuições d os m unicí pios, a m anutençã o d o núm ero d e
concelhos e a eleiçã o ind irecta d as vereações. A opçã o por este m étod o
eleitoral era justificad a pela preocupaçã o d e que os m unicí p ios fossem
governad os por hom ens d a confiança d o Congresso, pensand o esta
corrente que aquele m étod o era o m ais ad equad o para atingir este fim .
A outra tend ência, d escentralizad ora, assum ia posições opostas so-
bre tod as as questões em d ebate. Pretend ia um m unicí pio liberto d e tutelas
e com um vasto leque d e atribuições; estava d isponí vel para aceitar o au -
m ento d o núm ero d e concelhos - pretensã o que, num paí s com um a m alha
m unicipal com o a portuguesa, só se entend e pela influência que sobre estes
d eputad os exercia o processo revolucioná rio espanhol - e, finalm ente, d e-
fend ia a eleiçã o d irecta d as vereações. Tam bém estes d eputad os critica-
vam os governos m unicipais d e Antigo Regim e pelo seu cará cter oligá r -
quico, pela d istinçã o que se fazia entre nobres e nã o nobres. Mas os parla -
m entares d esta tend ência queriam que tod os os cid ad ã os pud essem parti-
cipar na escolha d as novas autorid ad es: negar essa participaçã o era
“ roubar ao povo os d ireitos que ele tinha” 24. Além d isso, as eleições m u -
nicipais tam bém pod eriam servir com o um a escola para as futuras eleições
d e d ep utad os.
A generalid ad e d os m em bros d as Cortes era d a opiniã o d e que d evia
existir um ní vel d e ad m inistraçã o acim a d o m unicí pio. Aind a que alguns
parlam entares aventassem a h ipótese d e criar, para alguns efeitos, um grau
interm éd io entre este últim o e o ní vel superior, o projecto d e Constituiçã o
sim plificava essa hierarquia, prevend o unicam ente a existência d e conce-
lhos e proví ncias. É d urante a d iscussã o d esta m atéria, em Julho d e 1822,
que se ad opta a d ivisã o em d istritos. Mas esta palavra tinha, na altura, um
sentid o vago: a Constituiçã o aprovad a naquele ano, por exem plo, falava

23 Paulo Jorge Azeved o Fernand es, ibidem, p. 161.


24 Apud Paulo Jorge Azeved o Fernand es, ibidem, p. 144.

A Revoluçã o 69
SILVEIRA

nas câ m aras d o d istrito (sentid o m od erno) e no d istrito d as câ m aras


(sentid o antigo, d e circunscriçã o).
N o Congresso Constituinte triunfaram as posições d a corrente d es -
centralizad ora. A prim eira Constituiçã o portuguesa acabou por consagrar
um a ad m inistraçã o em d ois graus, d istritos e concelhos. À frente d aqueles
estaria um ad m inistrad or geral, nom ead o pelo rei, auxiliad o por um a junta
com posta por representantes d os m unicí pios, eleitos d irectam ente com o os
m em bros d as vereações.
Previa a Constituiçã o a possibilid ad e d e existirem câ m aras “ em to-
d os os povos, ond e assim convier ao bem público” (art. 219). Estas d eviam
ser eleitas anualm ente, d e form a d irecta, tend o d ireito d e voto, salvo ex-
cepções, tod os os m orad ores d o concelho, m aiores d e vinte e cinco anos d e
id ad e, send o exigí vel aos eleitos nã o um censo pecuniá rio d efinid o, m as
tã o-só a posse d e “ m eios honestos d e subsistência” (art. 222). Às câ m aras
era atribuí d o o governo económ ico e m unicipal, send o red uzid os ao m í -
nim o os pod eres d e tutela d os órgã os d istritais. Face ao Antigo Regim e, as
câ m aras perd iam o pod er jud icial, m atéria em que, d esd e sem pre, houve
acord o no Parlam ento.25
Em conclusã o, nas prim eiras Cortes portuguesas vingou um m od elo
d e ad m inistraçã o inspirad o nos exem plos francês e espanhol, m ais pró-
xim o d a experiência francesa d e 1789 e m ais d escentralizad o d o que
aqu ele que as Cortes d e Cá d is havia d efinid o e, sobretud o, d o que as Cor-
tes d o Triénio Liberal espanhol haviam d e consagrar na legislaçã o d e 1823.
O que ficou consignad o na Constituiçã o foi d epois transposto para o
m apa no projecto d e d ivisã o d o território d a Com issã o d e Estatí stica d as
Cortes legislativas d e 1823. Dessa com issã o faziam parte Marino Miguel
Franzini, que foi relator, Francisco Soares Franco, Francisco Sim ões Margio -
chi, Agostinho José Freire e Francisco d e Paula Travassos.
N ã o tem sid o d evid am ente sublinhad o, m as este projecto, com o nã o
pod ia d eixar d e ser, previa unicam ente a existência d e d uas circunscrições
ad m inistrativas: as proví ncias, referid as, significativam ente, com o
“ Distritos d os Ad m inistrad ores Gerais” , e os concelhos. Porque as proví n-
cias entã o existentes “ nã o tinham relaçã o com a configuraçã o fí sica d o ter -

25 Sobre a reform a d a justiça ver Bened ita Maria Duque Vieira - A Justiça Civil na Tran-
siçã o para o Estado Liberal, Lisboa, Ed ições Joã o Sá d a Costa, 1991.

70 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

reno” e porque eram m uito grand es, previa -se agora a criaçã o d e 11 cir-
cunscrições d este tipo. Quanto aos concelhos, a com issã o referia a d esi-
guald ad e d e superfí cie, a “ configuraçã o sum am ente irregular e m onstruo-
sa” e, esquecid as as veleid ad es d e aum entar o núm ero d e m unicí pios,
falava antes na necessid ad e d e o red uzir. A justificaçã o d esta m ed id a re-
tom ava um argum ento que já no século XVIII era utilizad o contra as peque-
nas câ m aras: a d ificuld ad e d e encontrar pessoas “ d ignas” para exercer o
governo m unicipal. N o entanto, d ad a “ falta d e conhecim entos e inform a -
ções” , a reform a d os concelhos era d eixad a para m ais tard e. 26
H avia, aind a, um outro m otivo que recom end ava o d iferim ento d a
nova form açã o d os concelhos: a reorganizaçã o d as paróquias, aspecto que
tam bém nã o tem recebid o m uita atençã o d os historiad ores. A necessid ad e
d esta m ed id a estava relacionad a, nã o só com a pretend id a coincid ência
d os vá rios ní veis d a d ivisã o d o território (ad m inistrativa, jud icial, ecle -
siá stica, …), com o com o problem a d a sustentaçã o d o clero secular.
A figura d o pá roco, ao contrá rio d a d o frad e, era querid a à nova elite
polí tica. Longe d e qualquer m anifestaçã o d e ateí sm o, esta elite era crente e,
por outro lad o, tinha em d evid a conta a im portâ ncia d a religiã o com o ins -
trum ento d e coesã o social. Deste ponto d e vista, a m issã o d o pá roco era
inquestioná vel. Para além d isso, pela í ntim a relaçã o que tinha com os p o-
vos, o clero paroquial pod eria aind a ter um a funçã o relevante na d ifusã o
d a nova ord em polí tica. Assim , o pá roco inspirava sim patia e à utilid ad e e
im portâ ncia d a funçã o que d esem penhava d everia correspond er um rend i-
m ento d igno.
Já tivem os ocasiã o d e com entar a d im ensã o d as paróquias portugue-
sas. Ora, algum as havia em que, m esm o d epois d e atalhad os os abusos
existentes em torno d a repartiçã o d os d í zim os, seria d ifí cil sustentar o pá -
roco. Por outro lad o, os povos queixavam -se d aqueles abusos nas petições
que enviavam à s Cortes e o Estad o vivia nestes anos m om entos d e aperto
financeiro. Conjugavam -se, pois, factores d iversos para im por a necessi-
d ad e d e um a reform a que, pela red uçã o d as paróquias, perm itisse um a d e -
cente sustentaçã o d o clero e que, pela d im inuiçã o d os benefí cios sem cura
d e alm as, libertasse recursos financeiros para o Estad o. Se bem que um

26 Sobre o projecto ver José António Santos - Regionalizaçã o, pp. 57-62 e Diá rio do Gover-
no, n.º 92, d e 18 d e Abril d e 1823.

A Revoluçã o 71
SILVEIRA

grand e inquérito tivesse sid o lançad o em 1821, a reform a d as paróquias


nã o foi, no entanto, levad a a efeito.27
Sem efeito ficaram tam bém tod as as iniciativas tom ad as no perí od o
d e 1820-1823 porque neste ano se verificou o regresso ao Regim e Absoluto.
Por pouco tem po, no entanto, já que, em 1826, d epois d a m orte d e D. Joã o
VI e d o reconhecim ento d o prí ncipe D. Ped ro com o rei este d eu à naçã o
um a Carta Constitucional, inaugurand o assim um a segund a experiência li-
beral.

Os debates de 1826-1828

O problem a d a ad m inistraçã o voltou a ser d ebatid o no Parlam ento


eleito em 1826, até porque a Carta Constitucional era m uito vaga a este
respeito, estabelecend o som ente alguns princí pios a serem regulad os, pos -
teriorm ente, por lei.28
Constituí ram -se, entã o, d uas com issões na Câ m ara d os Deputad os:
a d a d ivisã o d o território e a d o cód igo ad m inistrativo. A prim eira era
com posta por Francisco d e Paula Travassos, Lourenço José Moniz, Ale-
xand re Tom á s d e Morais Sarm ento, José António Ferreira Bracklam i e Ma -
nuel Gonçalves d e Mirand a. A d o cód igo ad m inistrativo por Francisco Soa -
res Franco, José Joaquim Cord eiro e Luí s António Rebelo d a Silva. 29
Im porta referir os nom es porque alguns d estes d eputad os já haviam
participad o nos d ebates e com issões parlam entares sobre estas m atérias
em 1821-1823 e outros voltarã o a fazê-lo d epois d a guerra civil. O que

27 José Ed uard o H orta Correia - Liberalismo e Catolicismo. O Problema Congreganista


(1820-1823), Coim bra, Universid ad e d e Coim bra, 1974, pp. 51-63. As petições e os resultad os
d o inquérito d esencad ead o em Maio d e 1821 encontram -se no Arquivo H istórico Parlam en tar.
28 Diz, no seu tí tulo VII, que “ a Ad m inistraçã o d as Proví ncias ficará existind o d o m e s-
m o m od o que actualm ente se acha, enquanto nã o for por lei alterad a. “ (art. 132); prevê que
“ em tod as as Cid ad es e Vilas, ora existentes e nas m ais que para o futuro se criarem , haverá
câ m aras, à s quais com pete o Governo Económ ico e Municipal d as m esm as Cid ad es e Vilas”
(art. 133); afirm a que essas câ m aras serã o eleitas e com postas d o núm ero d e veread ores que a
lei d esignar, send o presid ente o veread or m ais votad o (art. 134); e que, finalm ente, as
atribuições d as câ m aras serã o regulad as por lei (art. 135).
29 O que afirm am os sobre os d ebates parlam entares d esta época baseia -se nos d ocu m en-
tos publicad os por Marcelo Caetano em Os A ntecedentes da Reforma A dministrativa de 1832.

72 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

perm ite concluir pela existência d e um núcleo restr ito d e ind iví d uos preo-
cupad os com as questões d e ad m inistraçã o e que as reform as levad as a
cabo d epois d e 1834, se bem que executad as com a precipitaçã o que a agi-
taçã o polí tica im punha, foram longam ente am ad urecid as. As posições que
alguns tom aram nesta ocasiã o, observad as d este m od o, d eixam d e parecer
m anobras d e puro oportunism o polí tico e ganham um a outra consistência.
A com issã o d e d ivisã o d o território apresentou um projecto d e d ivi-
sã o polí tica (eleitoral), jud icial e ad m inistrativa. Enunciava os princí pios e
queixava-se d a falta d e d ad os estatí sticos. Tend o em conta esta lacuna e a
com plexid ad e d a tarefa, suscitava a atençã o d a câ m ara para a apreciaçã o
d e um plano nã o d efinitivo.
Previa a com issã o a existência d e proví ncias, com arcas e concelhos,
m as tinha d úvid as sobre a necessid ad e d a d ivisã o ad m inistrativa se com -
por d estes três graus, pelo que d eixava o assunto à consid eraçã o d os d e-
putad os. N a sua proposta, a proví ncia era um a circunscriçã o eleitoral.
Com provand o que os problem as regionais nã o existiam , a com issã o até en -
tend ia que se pod iam m anter os lim ites d as proví ncias d o Antigo Re gim e,
com a novid ad e d a fragm entaçã o d a Beira em d uas.
A proposta m ais inovad ora consistia na d ivisã o d o reino em 17 co -
m arcas. “ Com o fim d e se evitarem questões d e suprem acias locais, e tud o
quanto pod eria excitar pretensões d e preferências, concord ou a Com issã o
em que as Com arcas se d esignassem , nã o pelos nom es d as Povoações prin -
cipais, ond e os Ad m inistrad ores ou Contad ores houvessem d e resid ir, m as
pelos d os rios e m ontanhas notá veis, ou pelos d os lugares históricos que
existem nos seus Distritos. Ad optou -se nesta parte o m esm o que os
Franceses praticaram a respeito d os seus Departam entos.” 30 A com issã o
retalhou o território sem respeitar as fronteiras trad icionais, com o se havia
feito em terras d e França, m as com intenções d iferentes: as proví ncias anti-
gas até se m antinham .
Quanto aos concelhos, esta com issã o, tal com o a d e 1823, apesar d o
que estava escrito no artigo 133 d a Carta, voltava a m anifestar a necessi-
d ad e d e suprim ir os m ais pequenos e d e d ivid ir os m aiores. N a d efesa d a

30 Apud Marcelo Caetano - Os A ntecedentes da Reforma A dministrativa de 1832, pp. 36-


-37.

A Revoluçã o 73
SILVEIRA

supressã o reinvocava o argum ento d a d ificuld ad e d e encontrar pessoas


com o rend im ento exigid o para o exercí cio d os cargos d a vereaçã o.
A organizaçã o ad m inistrativa em três ní veis nã o era consensual. A
com issã o d e d ivisã o d o território hesitava, com o se viu, e alguns d eputa-
d os eram frontalm ente contra. N o d ebate sobre esta m atéria, Francisco An -
tónio d e Cam pos m anifestou, em term os vivos, a sua oposiçã o a tal id eia,
criticand o, sobretud o, o excessivo pod er d os ad m inistrad ores gerais d e
proví ncia, d elegad os d o governo, figuras m ais próprias d e um a m onarquia
absolu ta d o que d e um sistem a representativo. 31
N o entanto, a com issã o d o cód igo tinha um a opiniã o d iferente. Inspi-
rand o-se explicitam ente no m od elo francês napoleónico, esta com issã o d e -
fend ia um sistem a basead o na d ivisã o em proví ncias, com arcas e conce-
lhos, cad a qual com os seus m agistrad os d e nom eaçã o régia. N os d ois pri-
m eiros ní veis, estes m agistrad os d etinham o pod er executivo e eram coad -
juvad os por órgã os d eliberativos, eleitos ind irectam ente pelos cid ad ã os e
com postos por ind iví d uos possuid ores d o ní vel d e rend im ento que se exi-
gia aos d ep utad os. Junto d o m agistrad o d a proví ncia, e p resid id o por ele,
existia aind a um conselho ad m inistrativo, perm anente, d e nom eaçã o régia,
com atribu ições ad m inistrativas e contenciosas. Os funcioná rios régios e o
conselho ad m inistrativo d e proví ncia exerciam funções d e tutela d a activi-
d ad e d as vereações. A instâ ncia d e pod er colegial no m unicí pio era a câ -
m ara que continuava a d ispor d e um presid ente.
Repare-se, e isto é fund am ental, este projecto nad a m ais d izia sobre
as câ m aras. A explicaçã o d este facto encontra -se num a intervençã o d e
Rebelo d a Silva. O extracto é longo, m as im portante o que aí se afirm a:

“ Senhores, em tod os os Governos Moná rquicos o Rei governa e faz


executar as Leis; se as leis versam sobre objectos com etid os ao exercí cio d o
Pod er Jud icial, pertence-lhe vigiar sobre a observâ ncia fiel d aquelas Leis; se
as Leis versam sobre objectos Ad m inistrativos, tocantes ao tod o d a Socie -
d ad e, a execuçã o d estas Leis pertence privativam ente ao Governo, porque
a Ad m inistraçã o Geral é o apaná gio privativo d o Governo; se os objectos
Ad m inistrativos nã o se referem ao tod o d a Socied ad e, m as sim aos cóm o-

31Marcelo Caetano, ibidem, p. 11.

74 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

d os e incóm od os d os m orad ores d e um Distrito, na sua relaçã o d e vizi-


nhos, a gerência im ed iata d estes objectos pertence à s respectivas Câ m aras
em conform id ad e d as Leis que lhes servem d e Regim ento. Eis aqui os prin -
cí pios consagrad os em tod os os Paí ses Moná rquicos e na Carta Fund a-
m ental, d a qual nos nã o é lí cito separar.
Verem os agora cair tod as as opiniões contrá rias. Com o a Ad m inis -
traçã o Geral pertence exclusivam ente ao Governo, segue-se que ela há -d e
ser exercitad a por Agentes d o m esm o Governo e nã o pod e com unicar -se
aos Mem bros d as Câ m aras por serem d e eleiçã o popular, segund o a Carta e
porque as suas atribuições segund o a Carta sã o m eram ente Municipais, e
nã o pod em ser outras; tam bém nã o pod em com unicar-se aos Empregad os
d o Pod er Jud icial, cujo exercí cio é d e sua natureza restrito aos objectos d a
sua partilha; e para sair d ela perd eria necessariam ente a sua Ind epend ên-
cia Constitucional. Fica portanto d em onstrad o que a organizaçã o d a Ad -
m inistraçã o Geral nã o pod e d eixar d e ser m ontad a com Agentes nom ead os
pelo Governo e que nã o pod e aproveitar -se nem d os Mem bros d as Câ m a-
ras, nem d os Empregad os d o Pod er Jud icial.” 32

N este passo, Rebelo d a Silva d efend e, portanto, a separaçã o d e po-


d eres entre o jud icial e o executivo, ao qual incum be a aplicaçã o d as leis
ad m inistrativas. Mas neste â m bito d istingue a ad m inistraçã o geral e a m u -
nicipal, cuja esfera d e autonom ia respeita. Ao m unicí pio é reconhecid o um
pod er próprio, ao qual correspond e um a form a especí fica d e legitim açã o
d os seus agentes, a eleiçã o, d istinta d a nom eaçã o d os em pregad os ad m i-
nistrativos. Certam ente por isso o projecto d a com issã o nã o consagrava a
id eia que um d os seus m em bros, Soares Franco, d efend era num opúsculo
d e 1822: que o presid ente d a câ m ara, à sem elhança d o “ m aire” francês,
fosse nom ead o pelo rei e transform ad o em representante d o executivo nos
concelhos, com o tend ia a acontecer com o “ alcald e” espanhol. 33 Em 1812,
aquand o d o enfrentam ento d as colónias am ericanas contra a m etrópole,
m as reflectind o a m entalid ad e d os liberais espanhóis, d izia um d epu tad o
nas Cortes d e Cá d is: “ As câ m aras sã o essencialm ente subalternas ao

32 Apud Marcelo Caetano, ibidem, pp. 13-14.


33 Marcelo Caetano, ibidem, p. 8.

A Revoluçã o 75
SILVEIRA

pod er executivo, um instrum ento d este” . 34 O regim e entã o aprovad o em


Espanha era aind a tí m id o d este ponto d e vista, m as, com o vim os, em 1823
e, sobretud o, d epois d e 1833, cam inhou -se no sentid o d e integrar o
“ alcald e” na hierarquia ad m inistrativa.
Com o havia ocorrid o antes, as d iscussões parlam entares d e 1826-
-1828 nã o tiveram consequências prá ticas, pois, nem a d ivisã o d o
território, nem o cód igo ad m inistrativo foram aplicad os, d ad o o regresso
ao Absolu tism o no últim o d aqueles anos.
Os d ois passos polém icos - estabelecim ento d e um a ad m inistraçã o em
três graus e sujeiçã o d as câ m aras ao pod er executivo - serã o d ad os em
1832.

A legislaçã o de Mouzinho da Silveira

É a guerra civil d e 1832-1834 que cria as circunstâ ncias polí ticas


propí cias para executar m ud anças que há tantos anos vinham a ser d eba-
tid as. Sob este ponto d e vista, a viragem é iniciad a pelo d ecreto d e 16 d e
Maio d e 1832 d e Mouzinho d a Silveira.
Os episód ios essenciais d a vid a d e Mouzinho sã o conhecid os. Mas
vale a pena record ar que nasceu em Castelo d e Vid e em 1780. Era um ho-
m em que conhecia por d entro o funcionam ento d a ad m inistraçã o periférica
d o Estad o d o Antigo Regim e. De facto, tend o obtid o a form atura em Leis
na Universid ad e d e Coim bra (1797), ingressou na carreira d a m agistratura:
foi juiz d e fora em Marvã o (1809) e em Setúbal (1813) e proved or em Por-
talegre (1817). Além d isso, ocupara cargos na ad m inistraçã o central: ad -
m inistrad or-geral d a Alfâ nd ega Grand e d o Açúcar, em Lisboa, entre 1821 e
1823, e m inistro d a Fazend a neste últim o ano, tend o sid o nom ead o poucos
d ias antes d o golpe d e estad o absolutista. Apesar d estes acontecim entos, é
confirm ad o no cargo, ficand o num governo ond e havia aind a liberais m od e -
rad os. Acaba, no entanto, por ser d em itid o. A rad icalizaçã o d a situaçã o
polí tica leva-o à prisã o em 1824. Após a libertaçã o reocupa o cargo na Al-
fâ nd ega e, em 1826, é eleito d eputad o. Dois anos d epois, quand o D. Mi-

34 Concepción d e Castro - La Revolución Liberal y los M unicipios Españoles, p. 84.

76 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

guel regressa a Portugal, Mouzinho, com o tantos outros, aband ona o paí s,
ind o viver para França. A sua estad ia neste paí s é d ecisiva para com pr e-
end er a legislaçã o que publica aquand o d a sua passagem pelo governo em
1832, em plena guerra civil, pois ela perm itiu -lhe um a observaçã o d irecta
d o funcionam ento d as instituições francesas. 35
Mouzinho partia d a id eia d a necessid ad e d e introd uzir um a pro-
fund a m ud ança em Portugal, que se tinha tornad o inevitá vel d epois d a
perd a d a colónia brasileira. Para além d isso, o nosso paí s tinha d e acom -
panhar a transform açã o que se vivia na Europa d a época. A base para a
m ud ança era a Carta Constitucional d e 1826, que havia que escorar através
d e leis regulam entares que tornassem o novo regim e um a realid ad e irre-
versí vel.
É o que Mouzinho vai fazer com os num erosos d ecretos que rubricou,
com os quais vai procurar m aterializar os d ois grand es princí pios d o Libe-
ralism o: Liberd ad e e Propried ad e. Para que a m ud ança pretend id a fosse
alcançad a, havia aind a que reform ar o Estad o. É este o propósito d os 3
d ecretos d e 16 d e Maio d e 1832 sobre Fazend a, Justiça e Ad m inistraçã o. 36
As bases que regulam esta últim a foram tom ad as d a legislaçã o d e
França, com o o próprio afirm a no preâ m bulo d o respectivo d ecreto. Este,
para além d e consagrar o princí pio d a separaçã o d o pod er d e ad m inistrar
e julgar, consensualm ente aceite, d ava corpo à s concepções d e um a cor-
rente que se vinha a m anifestar d esd e 1821, d efensora d e um a ad m inistra -
çã o centralizad a e hierarquizad a em três ní veis. N o entanto, ao atribuir ao
proved or d o concelho, funcioná rio d e nom eaçã o régia, o pod er d e executar
as d eliberações d as câ m aras, Mouzinho u ltrapassou um a fronteira até en-
tã o respeitad a.
Salvo esta d iferença essencial, sã o flagrantes as sem elhanças entre a
estrutura criad a em 1832 e a que Rebelo d a Silva projectara em 1827. 37 O

35 Joel Serrã o - Mouzinho d a Silveira, in id em (d ir.) - Dicioná rio de História de Portugal,


vol. III, Lisboa, Iniciativas Ed itoriais, s. d ., pp. 886-891; Miriam H alpern Pereira (coord .) -
M ouzinho da Silveira. Obras, Lisboa, Fund açã o Calouste Gulbenkian, 1989, 2 vols.
36 Sobre o pensam ento polí tico d e Mouzinho ver Miriam H alpern Pereira - Estad o e So-
cied ad e - Pensam ento e Acçã o Polí tica d e Mouzinho d a Silveira, in id em (coord .) - M ouzinho
da Silveira. Obras, vol. I, pp. 19-119.
37 Marcelo Caetano em Os A ntecedentes da Reforma A dministrativa de 1832 cham ou a
atençã o para as sem elhanças.

A Revoluçã o 77
SILVEIRA

quad ro junto esquem atiza essa estrutura, ond e os m agistrad os, d e nom ea-
çã o régia, d etinham o pod er executivo e os corpos ad m inistrativos d elibe -
ravam . Estes eram eleitos pelos cid ad ã os, no caso d as câ m aras, ou pelos
próprios corpos, elegend o as câ m aras as juntas d e com arca e estas as d e
proví ncia. O conselho d e prefeitura tinha funções contenciosas e era d e
nom eaçã o régia.

Quad ro XII
Magistrados e corpos administrativos
D ecreto de 16 de Maio de 1832
Circunscriçã o Magistrado Corpos administrativos
Proví ncia Prefeito Ju nta Geral d e Proví ncia Conselho d e Prefeitu ra
Com arca Su bp refeito Ju nta d e Com arca
Concelho Proved or Câ m ara Mu nicip al

O d ecreto d e 16 d e Maio d e 1832 era om isso quanto à d ivisã o d o ter -


ritório. Esta só será publicad a um ano d epois, com o d ecreto d e 28 d e
Junho d e 1833, ind icand o as circunscrições que integravam a nova d ivisã o e
d eterm inand o o iní cio d os trabalhos d e d em arcaçã o d os concelhos, a levar
a cabo pelas novas autorid ad es. Por últim o, em 3 d e Junho d e 1834, a or -
ganizaçã o prevista no d ecreto anterior foi especificad a até ao ní vel d a pa-
róquia.
As cartas resultantes d este conjunto d e d iplom as estã o reprod uzid as
ad iante (n.os 11 a 14). Com o seria d e esperar, tend o em conta a letra d os
d ecretos, os m apas d e paróquia e d e concelho sã o praticam ente iguais aos
d e 1826. É ao ní vel d as proví ncias e d as com arcas que as novid ad es sur -
gem : as m od ificações introd uzid as nas prim eiras sã o conhecid as, enquanto
as transform ações sofrid as pelas com arcas têm sid o errad am ente d espre -
zad as.
Em relaçã o à s proví ncias as alterações têm a ver com a criaçã o d a
proví ncia d o Douro, o d esd obram ento d a Beira, a red efiniçã o d a Estrem a -
d ura, que perd e a sua extrem id ad e sul, e o alargam ento inusitad o d o Al-
garve. Este últim o parece ser o aspecto m ais interessante, d and o -nos um a
im agem d o grau d e liberd ad e d e intervençã o no território que entã o se sen -
tia. Observou José António Santos que este d esenho d o Algarve tinha ori-

78 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

gem na proposta d e d ivisã o jud icial d o paí s feita em 1827-1828. A criaçã o


d a proví ncia d o Douro e a d ivisã o d a Beira em d uas inspirava-se no d ese-
nho d as proví ncias m ilitares existentes. 38 A supressã o d os encravam en tos
m ais im portantes é outra caracterí stica d o m apa.
O d esenho d as com arcas, com o a sim ples vista d a carta perm ite
constatar, sofreu profund as alterações em relaç ã o a 1826. Suprim iram -se
14 d estas circunscrições, m etad e d as quais eram unid ad es d e m uito pe-
quena d im ensã o, e criaram -se 9, passand o o núm ero d e com arcas para 40.
Mais im portante, no entanto, foi a sim plificaçã o d o m apa com a substan-
cial red uçã o d os encravam entos que d e 85 territórios passaram para 22. A
m aior parte d as com arcas tornaram -se unid ad es territorialm ente contí -
nuas. À escala d a carta apresentad a, é d ifí cil verificar o arred ond am ento
(era este o term o usad o na época) por que passou a com arca d e Barcelos,
m as já o caso d e Beja é perfeitam ente observá vel.
À luz d estas conclusões, o m apa d a d ivisã o territorial que resulta
d os d ecretos d e 1832-1834 assum e um a nova im portâ ncia: ele constitui,
nã o um projecto, m as sim a prim eira ten tativa d e efectiva reform a d o es-
paço polí tico-ad m inistrativo. Repare-se aind a que, ao m esm o tem po que
esta carta entrava em vigor, eram d efinitivam ente extintos os d ireitos d e
jurisd içã o exercid os pelos senhores d as terras, o que perm itia ao Estad o,
finalm ente, unificar o seu d om í nio sobre o território.

38 José António Santos - Regionalizaçã o, p. 51 e segs. O prim eiro esboço d a carta d e


proví ncias d e 1834 crem os que foi publicad o na obra d e Eu génio Castro Cald as e Manuel d e
Santos Loureiro - Regiões Homogéneas no Continente Português. Primeiro Ensaio de Delimita-
çã o, Lisboa, Fund açã o C. Gulbenkian, 1966, p. 87.

A Revoluçã o 79
SILVEIRA

Quad ro XIII - Comarcas de 1834


Código Comarca Indiví duos Área (Km2) D ens. pop. N .º de territórios
1 Alenquer 42 336 1 243,02 34,06 2
2 Am arante 69 527 680,89 102,11 1
3 Aveiro 70 837 1 211,95 58,45 1
4 Barcelos 96 618 976,69 98,92 1
5 Beja 46 538 4 946,49 9,41 1
6 Braga 74 930 655,3 114,34 3
7 Bragança 57 389 3 619,58 15,86 1
8 Castelo Branco 86 999 5 496,42 15,83 2
9 Chaves 78 600 2 944,97 26,69 1
10 Coim bra 103 203 1 653,12 62,43 3
11 Elvas 42 706 2 405,59 17,75 1
12 Estarreja 64 268 726,96 88,41 1
13 Estrem oz 33 898 3 097,99 10,94 1
14 É vora 31 728 3 275,94 9,69 2
15 Faro 39 080 1 344,39 29,07 2
16 Feira 68 742 724,96 94,82 1
17 Figueira 65 316 985,39 66,28 1
18 Guard a 84 777 3 576,53 23,70 2
19 Guim arã es 95 235 1 112,32 85,62 3
20 Lagos 36 314 1 994,71 18,21 1
21 Lam ego 105 993 1 849,46 57,31 2
22 Leiria 74 547 2 504,79 29,76 1
23 Lisboa 54 956 688,17 79,86 1
24 Monçã o 74 645 1 009,97 73,91 1
25 Moncorvo 53 219 2 728,03 19,51 1
26 Ourique 48 001 6 203,89 7,74 1
27 Penafiel 85 392 856,75 99,67 4
28 Ponte d e Lim a 74 754 1 011,77 73,88 3
29 Portalegre 40 779 3 978,3 10,25 1
30 Porto 125 158 763,98 163,82 2
31 Santarém 78 126 4 629,91 16,87 1
32 Seia 79 310 1 641,88 48,30 1
33 Setúbal 63 427 3 318,16 19,12 1
34 Tavira 34 365 1 564,72 21,96 3
35 Tom ar 112 236 3 837,73 29,25 2
36 Tond ela 68 856 1 111,04 61,97 1
37 Torres Ved ras 62 276 1 260 49,43 1
38 Trancoso 89 936 3 319,01 27,10 1
39 Vila Real 87 861 1 601,51 54,86 1
40 Viseu 85 678 1 596,41 53,67 2
Total 2 788 556 88 148,69 62
—————————————————————————————————————

N ota: á rea para a qual nã o se encontrou correspond ência nas com ar cas d e 1834: 593,52
km 2, equivalend o a 0,67% d a superfí cie total d o continente e a 26 territórios.
Fonte dos dados sobre populaçã o: ver anexo II.

80 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

O nascimento da divisã o administrativa contemporâ nea:


as câ maras municipais, o Parlamento, o governo e o espiã o

Para se entend er a luta polí tica d o perí od o posterior à guerra civil d e


1832-1834 e as d iscussões em torno d a reform a ad m inistrativa, torna -se
necessá ria um a explicaçã o prévia. O fim d o conflito, em Maio d e 1834, sig -
nificou um a d eslocaçã o d o eixo d o com bate polí tico: se antes se enfrenta -
ram liberais e absolu tistas, agora, com a vitória d os prim eiros, vieram à luz
d o d ia as d issensões entre liberais que a luta contra o regim e m iguelista fi -
zera passar para segund o plano.
Quand o o Parlam ento abre, em Agosto d e 1834, existem d ois grupos
na Câ m ara d os Deputad os, que a si próprios se d enom inam esquerd a e
d ireita, cuja presença se faz sentir igualm ente noutros palcos polí ticos
(m unicí pios, im prensa). Contud o, estes grupos nã o têm organizaçã o
interna e nã o sã o estanques: as flutuações d as posições ind ivid uais d e voto
d os parlam entares sã o significativas. Do ponto d e vista id eológico, as
d iferenças tam bém nã o sã o m arcad as. Para além d isso, no interior d e cad a
form açã o os ind iví d uos agrupam -se em torno d e personalid ad es influentes,
frequentem ente, em luta um as contra as outras.
N ã o estam os, portanto, em face d e partid os polí ticos, no sentid o
m od erno d o term o, m as antes perante form ações proto -partid á rias.39 A
m açonaria d ava algum a estrutura a este universo pulverizad o, d e algum a
m aneira d esem penhand o o papel d os partid os. De facto, no im ed iato pós-
-guerra existiam três obed iências m açónicas: o Grand e Oriente Lusitano, a
Maçonaria d o N orte e a Maçonaria d o Sul. A prim eira, politicam ente m o -
d erad a, tinha com o grã o-m estre Silva Carvalho e com o grand e ad m inistra-
d or Agostinho José Freire, d ois m inistros influentes d os governos d e D. Pe -
d ro d urante a guerra. A Maçonaria d o N orte era lid erad a por d ois hom ens
d a esquerd a, os irm ã os Passos, e a Maçonaria d o Sul tinha com o figura
principal o general Sald anha, cuja posiçã o polí tica evoluiu d a esquerd a
para a d ireita.40

39 Ver Maria d e Fá tim a Bonifá cio - “ A guerra d e tod os contra tod os” (ensaio sobre a
instabilid ad e polí tica antes d a Regeneraçã o), in A ná lise Social, n.º 115, 1992, pp. 91-134.
40 A. H . d e Oliveira Marques - História da M açonaria em Portugal, vol. II, 1ª parte, Lis-

A Revoluçã o 81
SILVEIRA

A aplicaçã o d os d ecretos d e 1832-1833 sobre a reform a ad m inistra-


tiva gerou um a grand e contestaçã o d e que foram porta -vozes as câ m aras
m unicipais e os d eputad os d a esquerd a, num m ovim ento claram ente
articulad o. De facto, na sequência d a publicaçã o d o d ecreto d e 9 d e Janeiro
d e 1834, que m and ou proced er à s eleições nos concelhos ond e tal fosse
possí vel, os d ois principais m unicí pios d o paí s foram conquistad os pela
esquerd a: o d e Lisboa passou a ser presid id o por Francisco António d e
Cam pos - um hom em ligad o ao m und o d os negócios, sócio fund ad or e
presid ente d a Associaçã o Mercantil Lisbonense em 1834 - e o d o Porto por
José Passos.
As câ m aras, com aquelas d uas cid ad es à cabeça, em petições envia-
d as ao Parlam ento, atacavam o d ecreto d e 1832 porque punha em causa a
trad icional autonom ia d os m unicí pios: contestavam , assim , as novas au -
torid ad es ad m inistrativas, sobretud o o proved or d o concelho, que possuí a
a liberd ad e d e aplicar (ou nã o) as d ecisões cam ará rias, e os prefeitos, cujos
vastos pod eres eram consid erad os excessivos. Para Francisco António d e
Cam pos era o retom ar d as crí ticas que proferira na Câ m ara d os Deputa-
d os, em 1828, ao projecto entã o em d ebate. Por outro lad o, a contestaçã o
atingia tam bém a d ivisã o territorial um a vez que, na sequência d o d ecreto
d e 1833, os prefeitos e os proved ores tinham d ad o iní cio aos trabalhos d e
reord enam ento d os concelhos: os protestos d irigiam -se, entã o, contra a
anexaçã o ou d esanexaçã o d e freguesias e contra um a hipotética extinçã o
d o m unicí pio. Em d efesa d as suas posições, as câ m aras invocavam a
antiguid ad e e os serviços prestad os à m onarquia, nom ead am ente nas
cam panhas m ilitares d a Restauraçã o ou na época d a s invasões francesas;
lem bravam a com od id ad e d os povos que (d izia -se) nos pequenos
concelhos resolviam os seus assuntos com m ais fa cilid ad e; cham avam a
atençã o para as relações económ icas entre povoa ções d e há m uito
integrad as no m esm o m unicí pio e, finalm ente, record avam as cond ições
favorá veis d a vila para sed e d e concelho.41

boa, Presença, 1996, pp. 51-62; Fernand o Catroga - A Maçonaria e a Restauraçã o d a Carta
Constitucional em 1842. O Golpe d e Estad o d e Costa Cabral, in Revoltas e Revoluções, Revista
de História das Ideias, n.º 7, Coim bra, 1985 pp. 155-181.
41 António Ped ro Manique - M ouzinho da Silveira. Liberalismo e A dministraçã o Pública,
Lisboa, Livros H orizonte, 1989, pp. 103-120 e 146-154.

82 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

Em conjugaçã o com este m ovim ento, que ela própria anim ava, a
oposiçã o à facçã o m od erad a no governo, iniciou no Parlam ento o com bate
contra a m esm a legislaçã o, logo em Outubro d e 1834. N ã o vale a pena d es-
crever as d iscussões em porm enor, porque isso já foi feito. 42 Interessa tã o-
-só sublinhar as id eias essenciais e rever interpretações. De resto, este
d ebate constitui um excelente exem plo, d ocum entad o, d a form a com o se
m anipu lavam as d ecisões parlam entares.
Os d eputad os d a esquerd a atacavam a legislaçã o ad m inistrativa nos
m esm os pontos em que as câ m aras o faziam . Levantavam -se contra os
prefeitos, expressivam ente apod ad os d e paxá s, “ Reis d e p roví ncia, com o
seu Conselho d e Estad o e com as suas Cortes” (António Luí s Seabra,
Gazeta do Governo, 8 d e Outubro d e 1834). A este respeito d izia o
d eputad o Galvã o Palm a: “ fico satisfeito contanto que d ê um vivo golpe
nesse gigante - Prefeituras - que, nascend o na ilha [sic] d os Açores em 16
d e Maio d e 32, tend o apenas três anos d e id ad e, já se reputava com forças
atléticas para, por si e seus subalternos, praticar atentad os que d e tod os
os pontos d a naçã o têm ressoad o nesta Assem bleia. Se quand o m í nim o era
já tã o m em brud o, tã o m onstruoso, que fisionom ia apresentaria se o
d eixá ssem os chegar ao estad o d e ad olescência e com a id ad e ad quirisse
robustez? Se aind a no berço m anejava um pod er d iscricioná rio, d ictatório,
d eportand o, prend end o, soltand o, d em itind o autorid ad es a seu belo
prazer, atacand o o d ireito d e propried ad e, m and and o arrancar vinhas,
reputand o-se com pod er legislativo, im pond o tributos, que aconteceria se o
d eixá ssem os m ed rar?” (Diá rio da Câ mara dos Senhores Deputados, Lisboa,
Im prensa N acional, 1835, p. 813).
A esquerd a tem ia a concentraçã o d e pod er nos prefeitos, represen -
tantes d o executivo nas proví ncias, pod erosos instrum entos na luta polí -
tica contra a oposiçã o; por outro lad o, criticava tam bém a actuaçã o con-
creta, arbitrá ria, d os ind iví d uos que haviam sid o nom ead os. O governo,
por seu turno, reconhecia estas irregularid ad es publicam ente, em portarias
em que repreend ia os abusos que alguns haviam praticad o. 43 Mas esse re-
conhecim ento tam bém transparecia d a correspond ência particular. N um a

42 Marcelo Caetano - A Cod ificaçã o Ad m inistrativa em Portugal (Um Século d e Ex-


periência: 1836-1935) in Revista da Faculdade de Direito, Lisboa, II, 1934, pp. 334-338.
43 António Ped ro Manique - M ouzinho da Silveira, p. 113.

A Revoluçã o 83
SILVEIRA

carta d irigid a a Agostinho José Freire, m inistro d a Guerra, enviad a d o


Porto, em 15 d e Maio d e 1834, referiam -se as “ m uitas arbitraried ad es e
vexam es” com etid os pelas autorid ad es nom ead as; e em 28 d e Dezem bro
d o m esm o ano, acrescentava-se: ” o prefeito interino, tend o principiad o d e-
baixo d e m uito m elhores auspí cios que o Mirand a [Manuel Gonçalves d e
Mirand a], está hoje coberto d e ód io, pelo louco orgulho que tem m anifesta -
d o, especialm ente nas exéquias d o Im perad or [D. Ped ro] e no acto d e vota -
çã o para a câ m ara; os seus subalternos sã o os d eixad os pelo Mirand a e
cad a vez m ais od iad os.” 44
O prefeito, para além d e possuir pod er, estava investid o d e im ensa
honraria: o d ecreto d e 1832 d ava-lhe o tratam ento d e excelência e o tí tulo
d e conselheiro e reservava-lhe o prim eiro lugar em tod os os actos públicos
d a proví ncia (art. 32). Para além d isso, auferia um vencim ento significa-
tivo.
António Girã o, m em bro d a Câ m ara d os Pares, em 24 d e Ma io d e
1835, sabend o que estava prestes a ser d em itid o d o lugar d e prefeito d a
proví ncia d a Estrem ad ura, apressou -se a escrever a Agostinho José Freire,
agora m inistro d o Reino. Respond end o à s crí ticas que lhe eram feitas,
lem brava com o a sua repartiçã o estava bem arranjad a, com o rapid am ente
se localizava qualquer papel; que nã o havia excesso d e gente, m uito pelo
contrá rio, pois outro d ia um d os oficiais, d e tã o cansad o, saí ra a d eitar
sangue pela boca; que a polí cia era activa, já que os m iguelistas estavam a
ser reprim id os; que tinha sid o d iligente na avaliaçã o d os bens na cionais;
que nã o tinha d eportad o ninguém , nem feito prisões injustas; lem brava
tud o isto porque, subentend e-se, nã o queria perd er o lugar, nem o
rend im ento que este lhe d ava: “ Eu d igo com franqueza a v. ex., que em m i-
nha casa tenho m uito d e que passar cóm od a e patriarcalm ente e com o res -
peito que ad quiriram m eus antepassad os pelo espaço d e trezentos anos; se
tenho repugnâ ncia a viver na proví ncia, é por ter ali to d os os m eus paren-
tes com prom etid os na usurpaçã o e nem m e é conveniente viver com eles em
harm onia, nem tam bém em guerra aberta. Fora d e casa nã o posso tirar o
rend im ento suficiente para sustentar a d ignid ad e e d ecência que com pete a
um par d o reino, nem parece bem que eu seja alvo d as sá tiras d os m eus

44 Correspond ência d e António Dias d e Oliveira em António Viana (com p.) - José da Silva
Carvalho e o seu Tempo, vol. II, Lisboa, Im prensa N acional, 1894, p. 151 e 166.

84 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

colegas aristocratas, principalm ente send o um a criatura d e v. ex. e tid o e


havid o por m inisterial.” 45
Mas o problem a d o novo sistem a ad m inistrativo nã o resid ia só na fi-
gura d o prefeito. Para a esquerd a era essencial o respeito pela autonom ia
d o m unicí pio e, em consequência, insuportá vel a acçã o d o proved or. N um a
carta d e António Dias d e Oliveira a Agostinho José Freire, d atad a d o
Porto, d e 24 d e Maio d e 1835, afirm ava-se sobre a opiniã o d a esquerd a em
relaçã o ao d ebate que d ecorria no Parlam ento: “ Sobre o executarem as câ -
m aras as suas d eliberações, repito a v. ex. que é cousa essencial para esta
gente, a qual antes quer ver restringir m uito as suas atribuições, d o que fica -
rem os ad m inistrad ores, m esm o electivos, send o os executores m unici-
pais.” 46
Quem é António Dias d e Oliveira? Explica Silva Carvalho num a nota
a um a outra carta rem etid a ao m esm o Agostinho José Freire, em 26 d e
Setem bro d e 1835, assinad a “ De v. ex. am iga cord ial e obriga d í ssim a. Ber-
nard a Clara” : “ N ota d e Silva Carvalho - Esta D. Bernard a é António Dias
d e Oliveira, hoje Desem bargad or d o Porto - que foi nosso espiã o.” N em
m ais nem m enos.47
Oliveira, m em bro d a m açonaria, d esd e 1833 que, secretam ente, d e -
sem penhava no Porto, um bastiã o d a esquerd a, as funções d e inform ad or
d e Freire e Silva Carvalho. A sua activid ad e, d iligente, terá sid o útil
quand o, em 1834, a oposiçã o tom ou a câ m ara d aquela cid ad e, send o vá -
rias as m issivas que a esse assunto se referem . Se os prefeitos trabalhavam
m al, lá estava Oliveira oferecend o os seus préstim os para “ fabricar” elei-
ções. Em troca ped ia ao m inistro a m elhor atençã o para o bacharel José Vi-
torino, portad or d a m issiva, “ m oço d e m uito m erecim ento e gosto liter á -
rio” que estava a necessitar d e em prego.48

45 António Viana (com p.) - José da Silva Carvalho e o seu Tempo, vol. II, pp. 181-183.
46 António Viana (com p.), ibidem, vol. II, p. 180.
47 António Viana (com p.), ibidem, vol. II, p. 210. Dias d e Oliveira, para além d e d epu tad o
em vá rias legislaturas d esd e 1834 a 1864, ch egou a ser presid ente d as Cortes em 1837. Entre
Junho e Agosto d este ano foi presid ente d o conselho d e m inistros. N a carreira d a m agis -
tratura atingiu o cargo d e juiz d o Suprem o Tribunal d e Justiça (ver N otí cia dos M inistros e
Secretá rios de Estado do Regimen Constitucional nos 41 A nos Decorridos desde a Regência Ins-
talada na Ilha Terceira em 15 de M arço de 1830 até 15 de M arço de 1871, Lisboa, Im prensa N a-
cional, 1871, pp. 6, 21-22 e 24).
48 António Viana (com p.), ibidem, vol. II, p.152. Sobre a filiaçã o m açónica d e António

A Revoluçã o 85
SILVEIRA

Para que tud o corresse d e feiçã o, Oliveira recom end ava a Freire, em
Julho d e 1835, “ o m aior segred o nas nossas ligações e até certa aparência
d e hostilid ad e” 49. Pouco tem po havia passad o, nesta altura, sobre a
d iscussã o parlam entar d a lei d e criaçã o d os d istritos, em que am bos
tiveram papel relevante, com o verem os.
N a Câ m ara d os Deputad os, a esquerd a batia forte na legislaçã o d e
Mouzinho d a Silveira. N a d ireita, no entanto, poucos se levantavam em
d efesa d o d ecreto d e 1832. Erguia-se o próprio Mouzinho, para record ar
que esse d ecreto m al havia sid o aplicad o e que o facto d e o ter sid o no
m eio d a luta contra os absolutistas fazia com que o sistem a ad m inistrativo
parecesse m au, d espótico, m as que isto nã o tinha fund am ento. (Diá rio da
Câ mara dos Senhores Deputados, 1835, p. 810). Levantava-se tam bém
António José d e Ávila para d efend er a existência d e um a hierarquia d e três
funcioná rios d e nom eaçã o régia (ibidem, pp. 811-812), em nom e d a eficá cia
d a m á quina ad m inistrativa e d a possibilid ad e d a real extensã o d o pod er
d o executivo a tod o o território. Mas na d ireita havia d ivergências sobre
esta m atéria, d iferentes opiniões, com o se verá .
Send o assim , o entend im ento vai ser possí vel. Sigam os, no essencial,
o cam inho percorrid o. Em 6 d e Outubro d e 1834, um grupo d e d eputad os
d a oposiçã o, encabeçad o por António Luí s Seabra, propôs a extinçã o d os
prefeitos e d os proved ores d e concelho. O executivo ficava, entã o, repre -
sentad o pelos subprefeitos, ao ní vel d as com arcas, passand o as
atribuições d os proved ores para as câ m aras m unicipais.
A 30 d o m esm o m ês, a com issã o d e Ad m inistraçã o Pública d a Câ -
m ara d os Deputad os, com posta m aioritariam ente por oposicionistas, em i-
tind o um parecer sobre a proposta anterior, d ecid iu am pliá -la, d e acord o
com o seu autor. Assim , os subprefeitos passavam a d enom inar -se ad m i-
nistrad ores d e com arca e continuavam a ser nom ead os pelo governo; m as,
a grand e novid ad e era o aparecim ento d a figura d o ad m inistrad or d e con-
celho, encarregad o d a ad m inistraçã o geral e d a polí cia, tam bém nom e ad o
pelo governo, sob proposta d as câ m aras, que viam reconhecid a a sua esfe-
ra d e actuaçã o própria. Deste ponto d e vista, tratava -se d e um a filosofia

Dias d e Oliveira ver A. H . d e Oliveira Marques - História da M açonaria em Portugal, vol. II,
2ª parte.
49 António Viana (com p.) - José da Silva Carvalho e o seu Tempo, vol. II, p. 191.

86 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

sem elhante à d o p rojecto d e Rebelo d a Silva d e 1827, o qual tam bém era
m em bro d esta com issã o d e ad m inistraçã o em 1834. N o d ocum ento agora
apresentad o, d ispersava-se o pod er d e um grupo lim itad o d e prefeitos por
vá rios ad m inistrad ores d e com arca e recuperava-se a figura d o ad m inis-
trad or d e m unicipalid ad e tam bém prevista em 1827.
A este parecer respond eu o governo, em 20 d e Janeiro d e 1835, com
um a proposta assinad a, nã o pelo m inistro d o Reino, m as, o que pod erá ser
ind icativo d e d ivergências no seio d o m inistério, pelo Duqu e d e Palm ela,
com o presid ente d o conselho, cargo que nã o existia na lei, m as que o Duque
tinha assum id o. N este texto o governo m antinha um funcioná rio ao ní vel
d a proví ncia, agora cham ad o governad or civil, elim inava os seus re -
presentantes na com arca e aceitava a existência d e um ad m inistrad or d e
concelho a ser nom ead o pelo governo entre os eleitos para a câ m ara. A
grand e inovaçã o era o aparecim ento d o cargo d e reged or d e paróquia,
d elegad o d o ad m inistrad or d e concelho e presid ente d a junta d e paróquia,
cuja existência havia sid o d ecretad a em 1830 nos Açores e abolid a por
Mouzinho d ois anos d epois.
N o d ia seguinte a oposiçã o, pela voz d e Seabra, contrapôs um pro-
jecto em que retom ava as suas id eias anteriores: d ivisã o d o paí s em com ar -
cas - precisand o-se, pela prim eira vez, que d eviam ser d ezassete - e conce-
lhos, existind o naquelas um ad m inistrad or d e com arca, d e nom eaçã o régia,
e nestes um ad m inistrad or d e concelho, nom ead o pelo governo, sob pro -
posta d a câ m ara m unicipal. Para que nã o restassem d úvid as, explicitava-
se que as d ecisões d as câ m aras seriam postas em execuçã o pelo seu presi-
d ente.
As propostas d o governo e d a oposiçã o estavam a convergir: am bos
concord avam com um único grau d e ad m inistraçã o acim a d o m unicí pio e
am bos aceitavam que o representante d o executivo no concelho fosse no-
m ead o por um processo m isto, com intervençã o d a câ m ara ou d os eleitores
m unicipais. A grand e d ivergência estava no facto d a proposta d o Duque
d e Palm ela prever que a execuçã o d as d eliberações cam ará rias ficava a
cargo d o ad m inistrad or d e concelho. Entretanto, novos sinais d e entend i-
m ento surgiram : a proposta d o executivo foi enviad a para apreciaçã o d e
um a com issã o d a Câ m ara d os Deputad os em que figuravam elem entos im -
portantes d a oposiçã o e tam bém d o lad o d o governo.

A Revoluçã o 87
SILVEIRA

A sessã o parlam entar corria para o fim , sem que qualquer d ecisã o
fosse tom ad a. É , entã o, que um vasto grupo d e d eputad os oposicionistas
d ecid e apresentar um projecto sum á rio, em 7 artigos, contend o as bases d o
sistem a d e ad m inistraçã o e um a autorizaçã o ao governo para, posterior-
m ente, legislar em conform id ad e d o que fosse aprovad o. Retom avam -se os
d ezassete cí rculos ad m inistrativos, agora d enom inad os d istritos, ad m inis -
trad os por um m agistrad o d e nom eaçã o régia; os d istritos d ivid ir -se-iam
em concelhos, ond e existiria um ad m inistrad or, d e nom eaçã o m ista; have-
ria aind a um a junta electiva em cad a paróquia. Quand o à execuçã o d as
d eliberações d as câ m aras, m atéria d e m ais d ifí cil consenso, usava -se um a
expressã o vaga. Ad vinhe-se quem era o prim eiro subscritor d o projecto:
D. Bernard a Clara, quer d izer, António Dias d e Oliveira, o espiã o. Estava -
-se a 8 d e Abril d e 1835.
Perfeitam ente por acaso, d ir-se-ia, na m esm í ssim a sessã o, o hom em
que em Fevereiro d esse ano assum ira a pasta d o Reino, Agostinho José
Freire, apresentava tam bém um ped id o d e autorizaçã o legislativa para o
governo, a que Palm ela continuava a presid ir, reform ar o sistem a ad m inis -
trativo, extinguind o um a d as três escalas existentes, aum entand o o núm ero
d os cí rculos m aiores e red uzind o o d os con celhos. Com o se im agina, a par-
tir d aqui o entend im ento entre a esquerd a e a d ireita foi relativam ente sim -
ples e facilitad o por oportunas intervenções d e Freire e Dias d e Oliveira.
O m inistro estava claram ente d isposto a ced er quanto aos escalões
d o sistem a ad m inistrativo. Preferia até que as circunscrições m aiores fos-
sem m enos d o que d ezassete (Diá rio da Câ mara dos Senhores Deputados,
1835, p. 810). Record e-se que Freire havia feito parte d a Com issã o d e
Estatí stica d as Cortes legislativas d e 1823 que tinha proposto um m apa
ad m inistrativo com 11 d istritos. Por isso, em 1835, foi aprovad o que
haveria até 17 d istritos ad m inistrativos. A nom eaçã o m ista d os
ad m inistrad ores d e concelho nã o levantava problem as.
Freire aceitava tam bém a autonom ia d as câ m aras: “ na m inha opiniã o
é um a injustiça m and ar-se um proved or ad m inistrar os interesses d os m u -
nicí pios, porque isto será o m esm o que substituir os juí zes d e fora.”
(ibidem, p. 811)
Este era um ponto essencial para a esquerd a. Dizia Barjona: “ o pre -
sid ente d as câ m aras m unicipais d eve ser o executor d as suas ord ens”

88 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

(ibidem, p. 837); “ que o presid ente d as câ m aras m unicipais seja o executor


d as resoluções d ela, ficand o assim verd ad eiram ente separad o; e executor
para a ad m inistraçã o geral o ad m inistrad or d e concelho ” (ibidem, p. 835).
Acrescentava Rebelo d a Silva, enaltecend o o papel d os m unicí pios: “ Eu,
Sr. Presid ente, estou convencid o que vejo a im portâ ncia polí tica e ad m inis -
trativa d este reino, que vejo que as autorid ad es m unicipais sã o as prerro-
gativas d a liberd ad e e base essencial d o verd ad eiro sistem a representativo,
que só nós os portugueses tem os e m ais nenhum a naçã o.” (ibidem, p. 834)
Mas, apesar d as d iferenças d e opiniã o d o lad o d ireito sobre a autonom ia
d as câ m aras, com o o acord o seria m ais d ifí cil d e conseguir, d eixou -se cair
o assunto.
Curiosam ente, a esquerd a nã o estava unid a quanto à criaçã o d as jun -
tas d e paróquia: Rebelo d a Silva e Barjona eram contra, por tem erem que
em pecessem a activid ad e d as vereações; Manuel Passos era a favor
(ibidem, pp. 832, 834, 837 e 845). Assim , o assunto foi tam bém d eixad o
cair.
O projecto passou à Câ m ara d os Pares ond e a d iscussã o foi m uito
rá pid a. De essencial, resultou a reintrod uçã o d as juntas d e paróquia. Re-
giste-se, aind a, o d ebate sobre o representante d o execut ivo no concelho,
provocad o pelo par Sarm ento que queria atribuir essa funçã o ao presid en te
d a câ m ara. Respond eu -lhe o m inistro Freire, com o apoio d o par Girã o, o
tal que nã o queria perd er o lugar d e prefeito d a Estrem ad ura, que isso nã o
era possí vel: “ confund ir os em pregad os propriam ente ad m inistrativos com
os m unicipais, ou querer que os Presid entes d as Municipalid ad es se tornem
uns agentes d irectos d o Pod er Executivo, sem que este tenha algum a acçã o
d irecta sobre eles, nã o intend o que possa ser” (Freir e, in A ctas da Câ mara
dos Pares do Reino de Portugal, Lisboa, Im prensa N acional, 1835, p. 334).
Por últim o, na Câ m ara d os Pares d iscutiu -se a respeito d e nom es.
Sarm ento, que havia pertencid o à com issã o d e d ivisã o d o território em
1826-1827, preferia que, em vez d e d istritos, as circunscrições acim a d os
concelhos se cham assem com arcas. Isto d eu azo a que o m inistro d o Reino
explicasse que nã o se tinha usad o a palavra proví ncia, porque elas fica-
riam pequenas e para nã o confund ir esta lei com a d as eleições; que se ti-
nha aband onad o a palavra com arca, porque nã o se julgou essencial; final-

A Revoluçã o 89
SILVEIRA

m ente, preferira-se “ a palavra Distrito [que] é um a d icçã o vaga, que nad a


influi” (ibidem, p. 330)
Assim se form ou a lei d e 25 d e Abril d e 1835 que d eu origem ao sis -
tem a ad m inistrativo contem porâ neo, basead o nos d istritos, concelhos e
freguesias. Com o se viu, esta lei nã o resultou d e um a im posiçã o d a es -
querd a, antes foi o resultad o d e um a negociaçã o entre os d ois lad os d a
Câ m ara d os Deputad os. Com ela resolveu -se o problem a d o núm ero d e es-
calões supram unicipais, regressand o-se à opçã o d as Cortes constituintes
d e 1821-1822. Por outro lad o, prolongou -se o sistem a ad m inistrativo até
ao ní vel í nfim o d a paróquia.
A questã o d o pod er m unicipal só foi d ecid id a através d o d ecreto d e
18 d e Julho d e 1835 que regulam entou a lei acim a citad a. Com este d e creto
o m unicí pio recuperou em Portugal a capacid ad e d e execuçã o d as suas
d ecisões. Mas, a com issã o que preparou este d iplom a, nom ead a pelo m i-
nistro Freire, se incluí a alguns pares d a esquerd a, era m aioritariam ente
com posta por d eputad os d a d ireita. Por outro lad o, o d ecreto foi referen -
d ad o por um d estes d eputad os, Rod rigo d a Fonseca Magalhã es, entretanto
nom ead o m inistro d o Reino.
Sem esquecer a im portâ ncia d as d ecisões tom ad as na seq uência d o
d ebate parlam entar d escrito, pod em os d izer que, apesar d e tud o, a legisla -
çã o d e 1835 se fund ou no m od elo subjacente ao d ecreto d e 16 d e Maio d e
1832, no sentid o em que, com excepçã o d o concelho, criou um sistem a ba -
sead o em m agistrad os d e nom eaçã o, d etentores d o pod er executivo, e cor -
pos eleitos, com pod er d eliberativo. Por outro lad o, o que é im portante, a
legislaçã o d e 1835 m od ificou a form a d e legitim açã o/ escolha d os m agis -
trad os e d e eleiçã o d os corpos.

90 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

Quad ro XIV
Magistrados e corpos administrativos. Legislaçã o de 1835
Circunscriçã o Magistrado Corpos administrativos
Distrito Governad or Civil Ju nta Geral d e Dis- Conselho d e Distrito
trito
Concelho Ad m inistrad or d e Câ m ara Mu nicip al
Concelho
Fregu esia Com issá rio d e Ju nta d e Paróqu ia
Paróqu ia
—————————————————————————————————————

N ota: entre 1836 e 1842 o governad or civil cham ou -se ad m inistrad or geral d e d istrito,
regressand o-se nesta d ata à d esignaçã o anterior. O com issá rio d e paróquia, d epois d e 1836,
foi d esignad o por reged or d e paróquia. Em 1840, os órgã os paroquiais, em bora continuassem
a existir, d eixaram d e fazer parte d a or ganizaçã o ad m inistrativa. N este ano foi criad o o con -
selho m unicipal.

Do ponto d e vista funcional, a partir d e 1835, os órgã os d istritais


sã o um a ad aptaçã o d os que em 1832 foram d efinid os para a proví ncia.
Isto m esm o foi corroborad o por Agostinho José Freire, num a intervençã o na
Câ m ara d os Pares sobre o conselho d e d istrito: “ O Prefeito, para m uitos
casos, vai ser substituí d o pelo Magistrad o ad m inistrativ o d e Distrito com
o respectivo Conselho que d eve servir d e o [sic] auxiliar” (A ctas da Câ mara
dos Pares do Reino de Portugal, Lisboa, Im prensa N acional, 1835, p. 333).
N este prim eiro escalã o, d e 1832 para 1835, verificou -se, essencialm ente, um
aum ento d o núm ero d e circunscrições, com a consequente d iluiçã o d os
pod eres d os m agistrad os régios.
A figura d o ad m inistrad or d e concelho é inspirad a na d o proved or,
perd end o, no entanto, a capacid ad e d e executar as d ecisões d as câ m aras.
Estas, com o em 1832, nã o exerciam funções jud iciais, m as m antiveram um
conjunto im portante d e atribuições d elegad as e próprias, e ficaram , relati-
vam ente, libertas d e tutelas.
Os órgã os paroquiais constituí am um a novid ad e face à legislaçã o d e
Mouzinho. A junta ad m inistrava a fá brica d a igreja e os bens d a paróquia,
e o com issá rio, para além d e executar as d eliberações d a junta, ficava en -
carregad o d a ord em pública e d as funções ad m inistrativas d elegad as pelo
ad m inistrad or d e concelho.

A Revoluçã o 91
SILVEIRA

Do ponto d e vista d a nom eaçã o d os m agistrad os e d a form açã o d os


corpos, as alterações introd uzid as em 1835 foram no sentid o d e d im inuir a
influência d o pod er central e d e reforçar a intervençã o d os cid ad ã os. As-
sim , se o governad or civil, com o o prefeito, era nom ead o pelo governo, a
escolha d os outros m agistrad os resultava d e um m étod o m isto: o ad m inis-
trad or d o concelho era seleccionad o pelo governo d e entre um a lista d e
ind iví d uos eleitos no respectivo m unicí pio e o com issá rio d e paróquia era
escolhid o p elo ad m inistrad or d e concelho a partir d e um a list a eleita na
freguesia. Finalm ente, os corpos ad m inistrativos passaram a ser form ad os
por eleiçã o d irecta d os cid ad ã os possuid ores d o censo pecuniá rio exigid o
na lei. A excepçã o era o conselho d e d istrito, integrad o por m em bros d esig -
nad os pela junta geral d e d istrito.
Com esta legislaçã o inaugurou -se, portanto, um ciclo d e d escentrali-
zaçã o relativa. Face ao d ecreto d e 1832, o m unicí pio viu reforçad o o seu
pod er e encontrou -se num a situaçã o d istinta d a que se verificava pela
m esm a época em França ou em Espanha. Por outro lad o, o Estad o pene-
trou, ou tentou penetrar, na esfera d a vid a paroquial.
Entretanto, na sequência d a revoluçã o d e 9 d e Setem bro d e 1836, a
esquerd a subiu ao pod er. Mas o prim eiro cód igo ad m inistrativo português,
d e 31 d e Dezem bro d este an o, referend ad o por Manuel Passos, na sua
qualid ad e d e m inistro d o Reino, poucas alterações introd uziu em relaçã o à
legislaçã o prod uzid a em 1835. De resto, no relatório que anteced e o cód igo,
o m inistro elogia a lei d e 25 d e Abril d e 1835, cujos princí pios foram
“ lealm ente d esenvolvid os” no d ecreto d e 18 d e Julho seguinte. 50 N ota-se
um a preocupaçã o d e d esenvolver as atribuições d as câ m aras em m atéria
d e saúd e, segurança, com ércio, urbanism o, assistência e ensino, e d e espe-
cificar as fu nções d as juntas d e paróquia, que passaram tam bém a actuar
com o com issões d e beneficência e a velar pelos expostos. Sublinhe-se aind a
que d eixou d e ser exigid o qualquer m í nim o d e rend im ento para se ser elei-
tor ou m em bro d estas juntas.
Quanto à reorganizaçã o d o espaço, o m apa d os d istritos d e 1835 re-
tom ava, com pequenas d iferenças, o d as 17 com arcas que havia sid o apre -
sentad o na Câ m ara d os Deputad os na sessã o d e 1827, com o José António

50 Código A dministrativo Português d e 31 d e Dezem bro d e 1836, 3ª ed . oficial, Lisboa,


Im prensa N acional, 1837, p. 6.

92 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

Santos m ostrou.51 Até 1842 as fronteiras d os d istritos foram sofrend o al-


gum as m od ificações, m as, d esd e a origem , aquele m apa era já m uito sem e-
lhante ao actual, com o verem os.
A reform ulaçã o d o território nã o estava, no entanto, concluí d a, um a
vez que a reform a d os concelhos, há tanto tem po projectad a, aind a nã o se
tinha efectivad o. As Juntas Gerais d e Distrito, recentem ente criad as, reuni-
ram -se em 1836 para d iscutir a m atéria e, em 29 d e Setem bro d o m esm o
ano, foi nom ead a um a com issã o que, d epois d e apreciar o trabalho d as
juntas, aprovou o projecto elaborad o por d ois d os seus m em bros, Marino
Miguel Franzini e José Joaquim Leal, o qual serviu d e base ao d ecreto d e 6
d e N ovem bro d e 1836.
Um a vez m ais, em bora tenha sid o publicad o já d epois d a Revoluçã o
d e Setem bro, este d ecreto nã o foi obra d a esquerd a: a convocaçã o d as jun-
tas é anterior à Revoluçã o e é feita por sugestã o d e Franzini, um hom em
que, pela sua com petência, d esd e 1834 era solicitad o pelos vá rios governos
a d ar parecer sobre a d ivisã o d o território e que participara na elaboraçã o
d o projecto apresentad o no Parlam ento em 1823. Com entav a o próprio,
com certo hum or, num a intervençã o nas Cortes em 1837: “ Desd e a restau -
raçã o [d o regim e liberal, em 1834] tenho eu sid o em pregad o constante-
m ente em fazer e d esfazer d ivisões d o território, segund o os variad os sis -
tem as ad optad os p elas sucessivas ad m inistrações que se tem suced id o
um as à s outras com tanta rapid ez, e posso d izer que tenho sid o um a es-
pécie d e m á quina d e vapor d as d ivisões territoriais, ad m inistrativas e ju -
d iciá rias, pois um a d as cond ições constantem ente exigid as pelos Ministros
foi a d a rapid ez d a execuçã o.” 52
Com o vim os, aind a que a id eia d e aum entar o núm ero d e concelhos
tivesse sid o d efend id a por alguns d eputad os nas Cortes Constituintes d e
1821-1822, certam ente sob influência d o exem plo espanhol, d esd e ced o
prevaleceu a opiniã o oposta. Para este resultad o contribuiu, seguram ente, a
experiência d o quotid iano d a m ultiplicid ad e d e pequenos m unicí pios
d esd e longa d ata existentes em Portugal, cuja crí tica há m uito vinha a ser
feita, com o se com entou atrá s. Mas, para o m esm o resulta d o tam bém foi
im portante a vontad e d e fortalecer o m unicí pio. A im agem d e um concelho

51 Sobre a origem d o m apa d os d istritos, ver José António Santos - Regionalizaçã o, p. 84.
52 Apud Maria d e Fá tim a N unes - O Liberalismo Português, p. 150.

A Revoluçã o 93
SILVEIRA

sem recursos financeiros e sem gente capaz d e exercer a governança, d ivul -


gad a no Antigo Regim e, passou para a m onarquia liberal. Sã o estes os
argum entos invocad os no relatório d o d ecreto d e 6 d e N ovem bro para
justificar a d rá stica red uçã o entã o operad a. Segund o a com issã o teriam
sid o suprim id os 465 concelhos, continuand o a existir 351. 53
A d im inuiçã o verificad a tam bém pod erá estar relacio nad a com a
opçã o por um a ad m inistraçã o com um só ní vel acim a d o m u nicí pio. De
facto, para garantir um funcionam ento eficaz d o sistem a seria útil red uzir o
núm ero d e funcioná rios sob as ord ens d os ad m inistrad ores gerais d e
d istrito. É igualm ente aceitá vel pensar que o crescim ento em á rea e
populaçã o d os concelhos, que ad iante analisarem os, estim ulou a id eia d e
integrar a p aróquia na ad m inistraçã o civil. António José d e Ávila d esen -
volveu este argum ento, com clareza, na d iscussã o d a lei d e 25 d e Abril d e
1835, quand o se d ebateu o núm ero d e entid ad es acim a d o m unicí pio.
Dizia este d eputad o: “ Que se laborava noutro m ui grand e equí voco,
quand o se supunha que o artigo que se d iscutia sim plificava o pessoal ad -
m inistrativo, porque nã o se pod ia perd er d e vista que, havend o em Portu-
gal oitocentos e seis concelhos, tocarã o cinquenta, com pouca d iferença, a
cad a ad m inistrad or d e d istrito, e que era absolutam ente im possí vel que
este fu ncioná rio pud esse inspeccionar e d irigir a acçã o d e cinquenta subal-
ternos; que esta circunstâ ncia havia pois traz er necessariam ente após si a
necessid ad e d e suprim ir pelo m enos a m etad e d os concelhos e que, ha-
vend o quatro m il freguesias, cad a concelho com preend eria d ez d estas, o
que exigiria aind a a criaçã o em cad a um a d e um d elegad o d o ad m inistra-
d or d o concelho, o qual seria consequentem ente o único ad m inistrad or d e
facto; que d esta form a, em lugar d e oito prefeitos terí am os d ezassete ad -
m inistrad ores d e d istrito, em lugar d e trinta e d ous subprefeitos quatrocen -
tos ad m inistrad ores d os concelhos e em lugar d e oitocentos e seis proved o-

53 O relatório d a com issã o está transcrito em Fausto J. A. d e Figueired o - A Reforma Con-


celhia de 6 de N ovembro de 1836, Lisboa, Tip. Em presa N acional d e Publicid ad e, 1951. É
d ifí cil quantificar com rigor a red uçã o d o núm ero d e concelhos entã o verificad a, facto que se
d eve à im precisã o d as vá rias listas publicad as na época. A com issã o, com o se d iz acim a, fa-
la em 465 concelhos suprim id os; Fausto d e Figueired o refere 498 e Maria Alexand re Lousad a
494 (A s Divisões A dministrativas em Portugal, p. 313). Em bora tam bém nã o haja acord o
quanto ao núm ero d e concelhos pré-existentes, a im portâ ncia d a reform a d e 1836 é ind iscutí -
vel.

94 A Revoluçã o
TERRITÓRIO E PODER

res d os concelhos quatro m il ad m inistrad ores d e Paróquias.” (Diá rio da


Câ mara dos Senhores Deputados, Lisboa, Im prensa N acional, 1835, p. 812)
De qualquer m od o, a reorganizaçã o d o território seguiu em Portugal
um a via com caracterí sticas próprias. Inventou -se um entid ad e supram u -
nicipal, com o em França ou em Espanha, m as a criaçã o d os d istritos nã o
foi m otivad a pela luta contra qualquer particularism o regional. Ela resultou
antes d e um a tentativa d e evitar um a excessiva concentraçã o d e pod er nas
m ã os d os m agistrad os régios, com o se tem ia que resultasse d a opçã o pelas
proví ncias. Por outro lad o, existind o em Portugal um a red e d e concelhos,
red uziu -se o seu núm ero, ao contrá rio d o que ocorreu naqueles paí ses, e
d eu-se ao m unicí pio um a nova e m aior d im ensã o. Finalm ente, integrou -se a
unid ad e paroquial na d ivisã o ad m inistrativa.
Ao contrá rio d a criaçã o d os d istritos, que pouca polém ica levantou,
o d ecreto d e 6 d e N ovem bro d e 1836 gerou um a ond a d e protestos nos
d ois anos seguintes. Dizia Fran zini em 1837, referind o-se a esse d esconten-
tam ento e à s queixas, m uitas d as quais consid erava injustas, “ […] pois
igualm ente proced em d as vistas particulares d os ind iví d uos interessad os
na conservaçã o e governança d e seus pequenos ou Grand es concelhos, o s
quais excitam os povos à d esobed iência. N em um só d os pequenos Conce -
lhos quer d escer d a sua categoria e os grand es fazem tod a a resistência
para ced erem algum a freguesia aos contí guos m ais d im inutos.” 54
N ã o há d úvid a d e que a resistência d as elites locais é um a variá vel a
ter em conta, m as a contestaçã o m obilizava agora argum entos sem elhantes
aos que haviam sid o usad os em 1834-1835 que, m uitas vezes, sã o um tes-
tem unho d a consciência d e si d estas pequenas com unid ad es. Esta nova
vaga d e protestos d istingue-se d a anterior, no entanto, por um “ ní tid o au -
m ento d a violência por parte d as populações reclam antes, chegand o a
atingir-se situações d e insurreiçã o d e freguesias inteiras, que se recusam a
reconhecer as autorid ad es d os novos concelhos a que sã o anexad as.” 55
Em resposta a esta contestaçã o, as Cortes aprovaram , d urante os
anos d e 1837-1838, vá rias leis alterand o o d ecreto d e 1836 (ver legislaçã o
no anexo III).

54 Apud Maria d e Fá tim a N unes - O Liberalismo Português, p. 151. Sobre os d istritos ver
António Ped ro Manique - M ouzinho da Silveira, p. 154.
55 António Ped ro Manique - M ouzinho da Silveira, p. 158.

A Revoluçã o 95
O funcionamento do sistema administrativo de 1835

Os prim eiros anos d o regim e liberal foram tem pos extrem am ente
com plicad os. O paí s, saí d o d e um a guerra civil, vivia um a época econom i-
cam ente d ifí cil, m otivad a pela d esestruturaçã o d o im pério colonia l e pela
natural d esorganizaçã o d a ind ústria e d a agricultura, que sofriam tam bém
as consequências d a m ud ança d o quad ro legal em que operavam . As d ifi-
culd ad es económ icas m ultiplicavam os pobres que se juntavam aos jovens
que aband onavam o exército e am bos alim entavam um surto d e band itism o
um pouco por tod o o lad o.
Os liberais, longe d e estar unid os, d iglad iavam -se entre si, sem conse-
guirem chegar a acord o quanto ao sistem a constitucional. Este, por sua vez,
era incapaz d e d ar soluçã o aos conflitos polí ticos que, am iúd e, se trans-
form avam em confrontos m ilitares. Por outro lad o, os m iguelistas, d errota -
d os na guerra, espreitavam a sua oportunid ad e, em conjugaçã o com a
evoluçã o d a situaçã o espanhola, ond e, record e-se, a prim eira guerra civil
entre liberais e absolutistas d urou até 1839.
A conflitualid ad e era aind a agravad a pela legislaçã o revolucioná ria
que, d esd e 1832, vinha a ser publicad a e que afectava quase tod os os sec-
tores d a socied ad e. Entre estes cite-se a Igreja, d uram ente atingid a pela ex-
tinçã o d os d í zim os e d as ord ens religiosas m asculinas. As relações com o
novo regim e foram aind a agravad as pelas d isputas em torno d a nom ea çã o
d os bispos, d and o origem a que um a parte d eles, os que haviam sid o pro -
postos por D. Miguel, nã o fossem reconhecid os pelos liberais e que os bis -
pos apresentad os por estes últim os nã o fossem aceites por Rom a. As d i-
vergências com a Santa Sé levaram m esm o ao rom pim ento d as relações
d iplom á ticas em 1833. A questã o religiosa, nom ead am ente a oposiçã o d e
um a parte d o clero ao novo regim e, contribuiu grand em ente para a d ifí cil
situaçã o em que se vivia.

Em busca d a estabilizaçã o 99
SILVEIRA

Além d isto, o Estad o tinha grand es d ificuld ad es d e financiam ento,


send o incapaz d e cobrar receitas e d e efectuar pagam entos. N estas circuns -
tâ ncias, o recurso ao créd ito nã o era fá cil. O d esacord o quanto à polí tica
financeira era um a d as grand es d ivergências entre a esquerd a e a d ireita li -
berais. Record e-se, aind a, que o próprio Estad o era atravessad o pela con -
flitualid ad e. Por um lad o, gerou -se um clim a d e suspeiçã o e d e perseguiçã o
aos funcioná rios conotad os com o m iguelism o e, por outro, após a Revolu -
çã o d e Setem bro d e 1836, foram m uitos os em pregad os civis e m ilitares que
se d em itiram ou foram d em itid os por razões polí ticas.
Finalm ente, o Estad o passava por um a profund a transform açã o que,
inevitavelm ente, o d ebilitava. Com o vim os, as alterações introd uzid as na
legislaçã o em 1835 iam , precisam ente, no sentid o d e d im inuir o pod er d o
centro sobre a periferia d o sistem a ad m inistrativo. Os testem unhos sobre a
aplicaçã o d as leis d e 1835-1836 sã o unâ nim es na d escriçã o d a falência d e
tal sistem a.
N um ofí cio confid encial d irigid o ao m inistro d o Reino, em Dezem bro
d e 1839, d izia o conselheiro J. J. Galvã o que ocupava interinam ente o cargo
d e Ad m inistrad or Geral d e Castelo Branco: "Depois d e seis anos d e um
Governo d espótico" [1], "Conviria logo no princí pio nã o d ar passos agigan -
tad os, ir a pouco e pouco acostum and o os Povos ao regim e d a Liberd ad e e
cim entar esta por m eio d a Instruçã o Pública". [1] N o entanto, "As Leis d e
sangue foram d e repente substituí d as pelas m ais Liberais d a Europa, e d e
tã o repentina m ud ança provém o estad o d e d esorganizaçã o em que hoje
nos acham os. " [1v.]
Isto pod erá parecer excessivo para quem resid e na capital. Porém
"quem vive nas Proví ncias sabe por um a triste experiência quanto ela [a
frase anteced ente] é verd ad eira" [2v.]. 1
Sabem os, pela própria legislaçã o, que a relaçã o hierá rquica que entre
si ligava os órgã os d o sistem a ad m inistrativo, relaçã o caracterí stica d a
ad m inistraçã o contem porâ nea, nã o funcionava. A lei d e 29 d e Outubro d e
1840 confessa-o ao criar a possibilid ad e d as autorid ad es superiores faze-
rem cum prir as suas d ecisões por d elegad os seus especiais quand o as infe -

1 Arquivo N acional d a Torre d o Tom bo, Ministério d o Reino, A.S.E., m aço 1941. Agrad e -
cem os ao Dr. N uno Pousinho a ind icaçã o d este d ocum ento.

100 Em busca d a estabilizaçã o


TERRITÓRIO E PODER

riores se m ostrassem om issas, negligentes e refractá rias. O próprio cód igo


ad m inistrativo d e 1842 incorporou estas d isposições.
Por outro lad o, o m étod o m isto d e nom eaçã o d os reged ores d e paró-
quia e, sobretud o, d os ad m inistrad ores d e concelho nã o garantia um eficaz
cum prim ento d as d ecisões d o governo. Afirm ava o ad m inistrad or d e Cas -
telo Branco:

"Os Ad m inistrad ores d e Concelho sã o os principais Agentes d a


Ad m inistraçã o; o d esem penho d e suas Atribuições d em and a
qualid ad es e conhecim entos especiais que se nã o encontram
facilm ente e m uito m enos se encontrarã o enquanto estes Magistrad os
forem d e Eleiçã o Popular.
Eles d evem ser puram ente os Delegad os d o Pod er Executivo e
com o tais d e livre nom eaçã o d o governo, sem d epend ência d os
sufrá gios d a urna. Só assim é que d esem penharã o os seus d everes no
que toca à fiscalizaçã o d os rend im entos públicos, ao recenseam ento
d as recrutas, à captura d os crim inosos e prevençã o d os crim es;
porque, enquanto estes Funcioná rios estiverem na d epend ência d as
Câ m aras para lhes arbitrarem m aior ou m enor gratificaçã o, enquanto
eles forem d e Eleiçã o Popular, o interesse público há -d e ser
sacrificad o ao particular, a Lei ao arbí trio, o d ever à von tad e d o
influente intriguista d e que d epend e a sua futura Eleiçã o." [2v -3]

A breve d uraçã o d a generalid ad e d os cargos e, em especial, d as câ -


m aras, eleitas por um ano, im p ed ia um bom d esem penho d as funções, por
falta d e tem po, e provocava a necessid ad e d e realizaçã o perm anente d e
eleições a que os povos se m ostravam ind iferentes.
Além d isso, a criaçã o d as juntas d e paróquia representava um a in -
trom issã o na vid a d as com unid ad es rurais. As paróquias tinham em m ui-
tos casos form as próprias d e governo, com o referim os atrá s, com as quais
as juntas vinham concorrer. E em causa estava nã o só a ad m inistraçã o d a
fá brica d a igreja, com o tam bém a d os bald ios.
A própria posiçã o d o pá roco estava a ser am eaçad a pelo regim e libe-
ral. De facto, a extinçã o d os d í zim os nã o significava som ente o d esapare -
cim ento d e um a fonte d e rend im ento d o clero paroquial. Ela trazia consigo

Em busca d a estabilizaçã o 101


SILVEIRA

um a m ud ança d e estatuto d os pá rocos que d everiam passar a ser pagos


pelo Estad o. Com o o Tesouro nã o tinha d inheiro para satisfazer estes en -
cargos, a partir d e 1838 as côngruas acabaram por provir d e um a d erram a
lançad a sobre os fregueses. A legislaçã o ad m inistrativa, d esd e 1832, pre -
tend ia aind a retirar aos pá rocos o registo civil para o entregar aos m agis-
trad os ad m inistrativos d e concelho e paróquia, m as esta d isposiçã o nã o
foi regulam entad a, pelo que essa funçã o continuou a ser d esem penhad a
pelo clero.
Acresce a tud o isto o facto d e, em 1835 e d epois d e 1840, só pod e-
rem votar e ser escolhid os para as juntas d e paróquia os ind iví d uos que
possuí ssem o m í nim o d e rend im ento exigid o. N ã o ad m ira, por isso, a
reacçã o d as com u nid ad es rurais a esta novid ad e. Em m uitas paróquias, as
juntas nã o eram eleitas: aind a na segund a m etad e d o século XIX, m ais
precisam ente entre 1857 e 1865, entre um terço e m etad e d as freguesias d o
concelho d e Viana d o Castelo viram as suas eleições anulad as ou nã o as
realizaram por falta d e votantes. 2 N a d écad a d e 1830, quand o as eleições
ocorriam , as juntas ou eram d om inad as pelos pá rocos, ou entravam em
conflito com eles sobre a gestã o d os rend im entos paroquiais, com o explica
o ad m inistrad or d e Castelo Branco.
Por últim o, há ind icações d e que os lugares d as câ m aras e d as juntas
d e paróquia estavam a ser “ invad id os por hom ens sem recursos que os
procuram com o um m od o d e vid a, que fazem lucrativo, atropeland o as leis
e d efraud and o a fazend a pública.” 3

A reforma do sistema

Os próprios partid á rios d a Revoluçã o d e Setem bro reconheciam estes


problem as e d esd e 1838 em preend eram a revisã o d o cód igo ad m inistrativo
publicad o d ois anos antes. Mas foi Rod rigo d a Fonseca Magalhã es, o

2 Rui Graça Feijó - Liberalismo e Transformaçã o Social. A Regiã o de V iana do A ntigo Re-
gime a Finais da Regeneraçã o, Lisboa, Fragm entos, 1992, p. 208.
3 Declaraçã o d o m inistro d o Reino em Fevereiro d e 1839, na Câ m ara d os Deputad os,
apud Marcelo Caetano - A Codificaçã o A dministrativa em Portugal, p. 343.

102 Em busca d a estabilizaçã o


TERRITÓRIO E PODER

m esm o que referend ara o d ecreto d e 18 d e Julho d e 1835, que levou essa re -
visã o até ao fim , vind o a rubricar a lei d e 29 d e Outub ro d e 1840.4
Esta lei e a d e 27 d e Outubro d o m esm o ano, sobre o m od o d e verifi-
caçã o d o censo eleitoral, com plem entad as pela d e 16 d e N ovem bro d e
1841, sobre o conselho m unicipal, invertem a tend ência d escentralizad ora
iniciad a em 1835, reforçand o a influência d o pod er central e apertand o o
controlo d a ad m inistraçã o cam ará ria. Restringem aind a o eleitorad o a ní vel
local, aum entand o o pod er d os hom ens m ais ricos nos concelhos. Por outro
lad o, os órgã os paroquiais, se bem que continuem a existir, d eixam d e fazer
parte d a organizaçã o ad m inistrativa.
O cód igo ad m inistrativo d e 1842, publicad o após a Restauraçã o d a
Carta Constitucional, que m arcou a subid a ao pod er d a facçã o liberal ul-
traconservad ora, m ais nã o fez d o que sistem atizar as inovações d a legisla -
çã o d e 1840-1841, aprofund and o aind a a tutela d a acçã o d os m unicí pios,
ao exigir a aprovaçã o prévia pelo conselho d e d istrito d e m uitas d as d eci-
sões d as câ m aras.
Deste m od o, regressá m os a um sistem a ad m inistrativo m ais próxim o
d aquele que Mouzinho d a Silveira havia pretend id o im plantar. De acord o
com o cód igo d e 1842, que esteve em vigor até 1878, os m agistrad os ao ní -
vel d o d istrito e d o concelho sã o nom ead os pelo rei e o próprio reged or d e
paróquia, que perd eu a qualid ad e d e m agistrad o ad m inistrativo, send o
proposto pelo ad m inistrad or d e concelho, é nom ead o pelo governad or ci-
vil. Este últim o e o reged or d e paróquia possuem o pod er d e executar as
d eliberações d os corpos eleitos nas respectivas circunscrições.
A junta geral d e d istrito é, com o a junta d e p roví ncia d e 1832, o re-
sultad o d e um a escolha orgâ nica, send o eleita pelas câ m aras e conselhos
m unicipais. N ela pod em ter assento, com o acorria d esd e 1835, os ind iví -
d uos com rend im ento suficiente para serem d eputad os. É um corpo que
reúne, ord inariam ente, um a vez por ano, d urante 15 d ias, com funções d e -
liberativas lim itad as.

4 Rod rigo d a Fonseca reassum iu a pasta d o Reino em 26 d e N ovem bro d e 1839, no m inis -
tério d e transiçã o presid id o pelo Cond e d e Bonfim , em que a esquerd a e a d ireita esta vam re-
presentad as.

Em busca d a estabilizaçã o 103


SILVEIRA

A ní vel d istrital, o órgã o m ais im portante é o conselho d e d istrito,


cujas sessões sã o sem anais, e que, além d e tribunal ad m inistrativo, inter-
fere a partir d e 1842 no funcionam ento d os m unicí pios. Se os seus m em -
bros eram até aqui d esignad os pela junta d e d istrito, passaram agora a ser
nom ead os pelo rei, sob proposta d a m esm a junta, em lista trí plice. Para in -
tegrar este órgã o, presid id o pelo governad or civil, era necessá rio possuir
um ní vel d e rend im ento igual ao d os procurad ores à junta d e d istrito.
As câ m aras, tend o recuperad o em 1835 o pod er d e executarem as
suas d ecisões e d ispond o d esd e entã o d e certa autonom ia, vêem esta úl-
tim a red uzir-se d epois d e 1840. Mantêm , no entanto, um leque d e funções
m uito vasto que a legislaçã o foi, progressivam ente, d iscrim inand o. Face ao
Antigo Regim e perd eram , no essencial, o exercí cio d e atribuições jud iciais.
Com o se verificava d esd e 1835, as câ m aras eram escolhid as em elei-
ções d irectas, pelos ind iví d uos possuid ores d e um rend im ento m í nim o
anual igual ao que era exigid o aos eleitores d e “ 1º grau” que votavam nas
eleições d e d eputad os. Os m esm o cid ad ã os, d esd e 1835, pod iam integrar
as vereações. Em 1840, no entanto, foi introd uzid a um a alteraçã o que fazia
com que, à m ed id a que a populaçã o d os concelhos aum entava, subia tam -
bém o ní vel d e rend im ento requerid o para se ser veread or. N os concelhos
com m ais d e 6 000 fogos esse censo era igual ao d os elegí veis d eputad os. A
estes requisitos juntava-se, em relaçã o aos m em bros d as câ m aras, a exigên-
cia d e saber ler, escrever e contar, feita pelo cód igo d e 1842.
N o governo d os m unicí pios intervinha, aind a, d esd e 1840, o conselho
m unicipal, um órgã o inicialm ente com posto, em m etad es iguais, pelos
m aiores e m enores contribuintes, m as que, d epois d e 1841, passou a incluir
som ente aqueles. Este conselho d iscutia e aprovava, em conjunto com a
câ m ara, a contracçã o d e em préstim os, o estabelecim ento d e hipotecas, o
lançam ento d e contribuições m unicipais e o orçam ento d o m unicí pio.
A junta d e paróquia, que d eixou d e fazer parte d a organizaçã o ad -
m inistrativa em 1840, continuava a estar encarregad a d a ad m inistraçã o d a
fá brica d a igreja e d os bens d a paróquia e a actuar com o com issã o d e be ne-
ficência. Procurand o resolver os conflitos acim a d escritos, d esd e 1840 tam -
bém , é presid id a pelo pá roco e tem vogais escolhid os em eleições d irectas.
Pod iam votar e ser eleitos os m esm os que elegiam a câ m ara m unicipal.

104 Em busca d a estabilizaçã o


TERRITÓRIO E PODER

Record e-se, para term inar, que, a partir d e 27 d e Outubro d e 1840, o


rend im ento exigid o nas eleições locais e d e d eputad os passou a ser verifi -
cad o pelas contribuições pagas ou pelos vencim entos e pensões recebid os
d o Estad o, o que perm itia um controlo m ais eficaz d o recenseam ento elei-
toral.

Centralizaçã o legal, centralizaçã o real

N a letra d a lei, o regim e estabelecid o pelo cód igo d e 1842 era, ind is -
cutivelm ente, centralizad or. Mas com o d ecorreu a sua aplicaçã o prá tica?
Para que a centralizaçã o legal passasse a ser real, era necessá rio que
o Estad o possuí sse um a m á quina ad m inistrativa eficiente, d ispond o d e
m eios m ateriais e d e um funcionalism o suficiente em núm ero e com petente.
Com o aquele a que Mouzinho d a Silveira se referia neste passo: “ Sexta
Tese: A falta d e um a lei, que tolha os requerim entos para em prego s d e Fa-
zend a a quem nã o tiver ad quirid o os conhecim entos necessá rios para os
d esem penhar - Quand o eu propus ao Sr. D. Ped ro o d ecreto d a
organizaçã o elem entar d a Fazend a estabeleci este princí pio e em tod os os
Estad os bem governad os os cand id atos [passam ] para tud o por um a
rigorosa fieira d e exam es, e na Prússia aond e isto tem sid o levad o ao
m á xim o rigorism o os em pregad os sã o óptim os, e o filho d o Rei que nã o
satisfez em público aos exam es requerid os e que se nã o m ostra m elhor que
os seus concorrentes para o lugar d e alferes nunca é alferes.” 5
A instituiçã o d o concurso público para o recrutam ento d os funcioná -
rios d o Estad o procurava assegurar a iguald ad e d e oportunid ad es d os
cand id atos e um a selecçã o basead a no m érito, em d etrim ento, portanto, d e
privilégios d e grupo e d e consid erações d e cará cter pessoal ou polí tico. A
aplicaçã o d este proced im ento representava um progresso no plano d os d i-
reitos d o ind iví d uo e era, ao m esm o tem po, um a form a d e conseguir o
aperfeiçoam ento d a m á quina estatal.

5 Parecer sobre os princí pios que d evem reger o funcionam ento d as alfâ nd egas. Sem
d ata, possivelm ente d o iní cio d a d écad a d e 1840, in Miriam H alpern Pereira (coord .) - M ou-
zinho da Silveira. Obras, vol. I, p. 973.

Em busca d a estabilizaçã o 105


SILVEIRA

O concurso público foi ad optad o na Prússia no iní cio o século XVIII e


em França após 1791, d ifund ind o-se, em seguid a, d e form a lenta pelos ou-
tros paí ses europeus.
Em Portugal, os textos constitucionais garantiam , d esd e 1822, o d i-
reito d os ind iví d uos serem ad m itid os aos cargos d o Estad o sem outra d is -
tinçã o que nã o fosse a d os seus talentos e virtud es. A concretizaçã o d este
princí pio constituí a um a preocupaçã o após o estabelecim ento d o regim e li -
beral, com o o texto d e Mouzinho d a Silveira testem unha, tanto m ais que a
luta polí tica entre as facções estava associad a à partilha d os em pregos
públicos. A verd ad e é que, só na segund a m etad e d o século passad o, os
concursos foram introd uzid os na ad m inistraçã o central: 1859 representou
o ano d e viragem no processo d e d ifusã o d este m ecanism o d e selecçã o.
Em Portugal, com o nos outros paí ses, nã o bastava a form alid ad e d o
concurso para assegurar um recrutam ento isento e para pôr fim à prá tica
d o favorecim ento pessoal. Contud o, a consagraçã o d aquele processo d e
escolha d os funcioná rios é um sinal d e m od ernizaçã o burocrá tica. Ora, na
ad m inistraçã o d os d istritos o concurso (d ocum ental) só foi introd uzid o em
1878 e na ad m inistraçã o concelhia em 1892. 6
Dez anos passad os sobre a entrad a em vigor d o cód igo d e 1842, o
Estad o tinha pouco pessoal na ad m inistraçã o periférica. Por exem plo, no
d istrito d e Leiria, em 1852, existiam 1 governad or civil, 1 secretá rio d o
governo civil e 9 em pregad os na respectiva repartiçã o. H avia 1
ad m inistrad or para cad a concelho, tend o ao seu serviço entre 2 a 4 fu ncio-
ná rios (escrivã es, am anuenses, oficiais d e d iligência). Com o encargo d a fa -
zend a, funçã o que só em 1849 se autonom izou em relaçã o à ad m inistraçã o
civil, existiam , na capital d o d istrito, 1 d elegad o d o tesouro, 1 tesoureiro e
5 em pregad os na repartiçã o. Em cad a concelho, o leque d e funcioná rios
d este ram o com pletava-se com 1 escrivã o e 1 recebed or. Um a á rea bas-
tante d esenvolvid a, em term os d e pessoal, era a d a justiça, contrastand o
com o ensino ou o correio e a saúd e. Mas nã o entrarem os, neste m om ento ,
no respectivo exam e. N a paróquia, cujos órgã os haviam d eixad o d e per-

6 Ver, sobre esta m atéria, António Ped ro Ginestal Tavares d e Alm eid a - A Construçã o do
Estado Liberal. Elite Polí tica e Burocracia na “ Regeneraçã o” (1851-1891), vol. II, Lisboa, 1995,
pp. 260-268.

106 Em busca d a estabilizaçã o


TERRITÓRIO E PODER

tencer à hierarquia ad m inistrativa, havia 1 reged or, auxiliad o, em m éd ia,


por 23 cabos d e polí cia.
Além d e poucos, um a parte d os funcioná rios recebia os seus ord ena -
d os ou gratificações d as câ m aras. Assim , se o governad or civil, o secretá rio
d o governo civil, os em pregad os na respectiva secretaria e os d o sector d a
Fazend a eram pagos pelo orçam ento d o Estad o, os funcioná rios d a ad m i-
nistraçã o concelhia venciam um ord enad o fixad o e satisfeito pelo m unicí -
pio. O ad m inistrad or d e concelho auferia som ente um a gratificaçã o d a
câ m ara.
Tirand o o governad or civil e o secretá rio, os vencim entos eram baixos
e a gratificaçã o d o ad m inistrad or d o concelho era, por vezes, m uito red u -
zid a: no d istrito d e Leiria, m etad e d os ad m inistrad ores recebia até 50$000
réis anuais e, nalguns casos, nã o m ais d e 30$000 réis.
Para além d isto, os lugares d as juntas e conselhos d e d istrito, verea-
çã o e conselhos m unicipais, juntas d e paróquia, reged or e cabos d e polí cia
eram gratuitos.
A gratuitid ad e d os cargos pod eria ser com pensad a pela honra e pelo
pod er que lhe estavam associad os, m as há sinais d e que a eficá cia d o sis -
tem a ad m inistrativo era abalad a. Dizia o secretá rio d o governo civil d e
Leiria: “ A experiência prova que o trabalho gratuito é m au e feito d e ruim
vontad e. O serviço público pad ece. Oxalá que as provas nã o fossem evi-
d entes e que d estas faltas nã o houvesse tã o justas queixas.” 7
A m esquinhez d a gratificaçã o d o ad m inistrad or d e concelho punha
m esm o em causa o seu prestí gio e autorid ad e: “ Ad m inistrad ores d e conce -
lho servind o com m eras gratificações d e 30 e 40$000 réis nã o pod em d e -
sem penhar bem o seu lugar. O ad m inistrad or é o chefe d o concelho, o re -
presentante d a autorid ad e pública. N ecessita de prestí gio. Um a d as razões
porque a autoridade nã o tem no paí s a força necessá ria é por nã o ser d e
ord iná rio com preend id a a sua m issã o. O paí s parece-m e que avalia pouco
m ais no funcionalism o, além d o serviço d e sim ples exped iente. A autorid a -
d e local nã o está p opularizad a. Digam o que quiserem , nã o está . Ad m inis-

7 D. António d a Costa d e Sousa d e Maced o - Estatí stica do Distrito A dministrativo de


Leiria, Leiria, 1855, p. 23.

Em busca d a estabilizaçã o 107


SILVEIRA

trar nã o é assinar ofí cios, é com prar m uitos livros, estud ar m uitas
questões, […]” [itá licos nossos]. 8
A d ebilid ad e d a ad m inistraçã o periférica fazia com que o Estad o,
para controlar o território, se apoiasse no pod er d as elites locais. É esse o
sentid o d a exigência d e um m í nim o d e rend im ento que, d esd e 1835, se fa-
zia para se ser eleitor ou elegí vel para os vá rios corpos d a ad m inistraçã o
d istrital, concelhia e paroquial, a que se juntava a necessid ad e d e resid ên-
cia na respectiva circunscriçã o. E os requisitos d e rend im ento, bem com o a
sua verificaçã o, foram reforçad os pelas reform as d e 1840-1841, com o vi-
m os. Por outro lad o, se o governad or civil era nom ead o livrem ente pelo go -
verno, aos ad m inistrad ores d e concelho (até 1842) e aos com issá rios/
/ reged ores d e paróquia eram feitas as m esm as exigências d e rend im ento e
resid ência que aos m em bros d os correspond entes corpos ad m inistrativos.
Do ponto d e vista d a relaçã o com as elites locais, o Estad o portuguê s
aproxim ou -se d os seus congéneres d a época. Por outro lad o, esta relaçã o
com as elites é sem elhante à que existia no Antigo Regim e, d urante o qual,
por nã o d ispor d e um funcionalism o num eroso e por acred itar na autori-
d ad e natural e na m aior isençã o no d esem penho d os cargos, d ecorrente d a
posse d e recursos próprios, a coroa confiava o exercí cio d o governo m uni-
cipal à gente nobre d a governança. O que agora se alterou foi o critério d e
form açã o d as elites que d eixou d e ser basead o no sangue, para se fund ar
na riqueza.9
Quais foram as repercussões d esta m od ificaçã o no recrutam ento
efectivo d as elites m unicipais? Dispom os d as conclusões d o estud o d e al-
guns casos e d e elem entos d e outras investigações aind a a d ecorrer que,
globalm ente, nos d ã o um a im agem d iferenciad a.
Assim , num a regiã o d e pequena propried ad e e num d os poucos con -
celhos d o paí s cujo território nã o sofreu m od ificações, Vale d e Cam bra, o
governo d o m unicí pio, no Antigo Regim e, era d esem penhad o por proprie -

8 D. António d a Costa d e Sousa d e Maced o - Estatí stica, p. 150. Sobre tod os estes aspec-
tos, ver Lu í s N uno Espinha d a Silveira - Estad o Liberal e Centralizaçã o. Reexam e d e um
Tem a, in id em (coord .) - Poder Central, Poder Regional, Poder Local. Uma Perspectiva His-
tórica, Lisboa, Cosm os, 1997.
9 Sobre o Antigo Regim e ver N uno Gonçalo Monteiro - Os Poderes Locais no A ntigo Re-
gime, p. 63.

108 Em busca d a estabilizaçã o


TERRITÓRIO E PODER

tá rios e lavrad ores e esta situaçã o nã o se alterou ou no perí od o d e 1834 a


1851. Está , no entanto, por apurar a continuid ad e ou d escontinuid ad e em
term os d e pessoas e fam í lias d epois d a Revoluçã o Liberal. 10
A im agem d e relativa estabilid ad e transm itid a pelo caso d e Vale d e
Cam bra contrasta com o que aconteceu em É vora. A vereaçã o d este conce -
lho, na m onarquia absoluta, estava na posse d a principal nobreza d a ci-
d ad e, em alguns casos fid algos d a Casa Real, grand es proprietá rios locais,
cujo patrim ónio estava na m aior parte vinculad o. A Revoluç ã o prod uziu
um efeito d e abertura, d e alargam ento d este grupo, antes m uito fechad o, e
um a recom posiçã o com base na riqueza. Deste m od o, a “ elite m unicipal
tend eu a id entificar-se com a elite económ ica. Entre 1838 e 1847, pratica -
m ente só foram eleitos para a vereaçã o titulares ou fam iliares d os m aiores
contribuintes d o concelho. O recrutam ento fez -se essencialm ente entre os
m aiores proprietá rios, lavrad ores e negociantes.” Um a parte significativa
pertencia a fam í lias que ocuparam cargos no aparelho m unicipa l no últim o
m eio século d o Antigo Regim e. 11
Mais aind a, “ em m ead os d o século XIX a vid a polí tica eborense era
com pletam ente controlad a pelos m aiores contribuintes […]. Efectivam ente,
a partir d e 1842 foram raros os titulares d os principais cargos d a ad m inis -
traçã o pública regional e m unicipal recrutad os ou eleitos fora d o grupo. A
única excepçã o foi o lugar d e governad or civil, cu ja lógica d e nom eaçã o
obed ecia a interesses m ais alargad os, d epend entes d o governo central.”
Os m aiores contribuintes eram , essencialm ente, proprietá rios d e préd ios
rústicos e/ ou urbanos, possuí am um estilo d e vid a sim ilar e, a atestar a
sua forte coesã o enquanto grupo, estavam ligad os por estreitos laços d e
parentesco.12
Montem or-o-N ovo apresenta sem elhanças com a evoluçã o d e É vora.
Assim , no final d o Antigo Regim e, os veread ores pertenciam ao grupo d as
pessoas principais d a vila, alguns eram fid algos e praticam ente tod os eram

10 Elem entos d a d issertaçã o d e m estrad o d e Am í lcar Braga, em elaboraçã o no Depar ta-


m ento d e H istória, Faculd ad e d e Ciências Sociais e H um anas d a U.N . L.
11 H eld er Ad egar Fonseca - Socied ad e e Elites Alentejanas no Século XIX in Economia e
Sociologia, É vora, 45/ 46, 1988, pp. 63-106.
12 H eld er Ad egar Fonseca - O A lentejo no Século X IX . Economia e A titudes Económicas,
Lisboa, Im prensa N acional/ Casa d a Moed a, 1996, pp. 194, 220, 221 e 223.

Em busca d a estabilizaçã o 109


SILVEIRA

grand es proprietá rios. Quase m etad e possuí am ví nculos. Com o em É vora,


entre 1834 e 1851, verifica-se que um a parte d esta elite antiga continua a
estar representad a na câ m ara, m as ao seu lad o vem os surgir um a gente
nova, recrutad a entre os proprietá rios locais, alguns acum uland o esta con -
d içã o com a d e negociantes; surgem tam bém , em núm ero m inoritá rio, al-
guns ind iví d uos ligad os exclusivam ente ao negócio, m éd icos e até um sapa -
teiro. Parte d estes novos m em bros tinham d esem penhad o cargos ligad os à
câ m ara no Antigo Regim e, com o os d e procurad or d o concelho, escrivã o ou
chanceler.13
O caso d e Torres Ved ras é d istinto d estes últim os, pois antes d e
1834 a elite local nã o tinha o m esm o grau d e coesã o, nem era tã o fechad a
quanto as anteriorm ente d escritas. Assim , se um red uzid o núm ero d e
ind iví d uos assegu rava um a certa continuid ad e no governo m unicipal, a
verd ad e é que o elenco d e veread ores conhecia algum a renovaçã o. A m aior
parte d os m em bros eleitos tinha estatuto d e nobre, sem atingir grand es
d istinções, d e resto, m as alguns nã o o possuí am . Do ponto d e vista socio -
profissional, a m aioria era com posta por proprietá rios, a que se juntavam
os oficiais ad m inistrativos e os negociantes. Um pouco m ais d e m etad e d os
veread ores pertencia a 17 fam í lias, algum as ligad as entre si pelo
casam ento, vá rias incluind o ind iví d uos nascid os fora d o concelho que, ou
iniciaram um a “ linhagem local” , ou casaram com gente d a terra. A chegad a
à vila d e hom ens com estatuto d e nobreza trad uzia -se, com algum a
facilid ad e, num a integraçã o polí tica.
Depois d a guerra civil, verificou -se um a d iversificaçã o na origem
social d os veread ores e um a renovaçã o d os apelid os. Os proprietá rios
continuaram a ser d om inantes e com o tem po aum entaram o seu peso; os
funcioná rios continuaram a estar presentes, os negociantes d esapareceram
e, no seu lu gar, surgiram ad vogad os, um m éd ico, boticá rios, lojistas e um
confeiteiro. A m aioria d os veread ores possuí a ní veis d e rend im ento
elevad os e um pouco m ais d e m etad e fazia parte d a lista d e m aiores
contribuintes d o concelho.

13 Elem entos d a d issertaçã o d e m estrad o d e Paulo Jorge d a Silva Fernand es, em ela bora-
çã o no Departam ento d e H istória, Faculd ad e d e Ciências Sociais e H um anas d a U.N . L.

110 Em busca d a estabilizaçã o


TERRITÓRIO E PODER

N o regim e liberal, poucos m em bros d a câ m ara tinham ligações fam i-


liares à gente d a governança d o perí od o anterior e nã o se vislum bra, com o
no Antigo Regim e, a existência d e frequentes relações d e parentesco entre
os veread ores. A m ud ança em term os d e ind iví d uos e fam í lias parece ser o
resultad o m ais interessante d a evoluçã o d e Torres Ved ras, em relaçã o a um
passad o caracterizad o pela existência d e um a elite relativam ente aberta,
sem grand e coesã o, com algum a d iversid ad e d e estatuto social e
profissional.14
Finalm ente, em Lisboa a Revoluçã o foi, na verd ad e, um a Revoluçã o,
um corte com o passad o. A câ m ara d a capital, d urante a m onarquia abso-
luta, ao invés d o que ocorria no resto d o paí s, era m aioritariam ente no -
m ead a pelo rei: assim acontecia com o seu presid ente, d esd e a segund a m e -
tad e d o século XVIII um nobre grand e d o reino, e com os veread ores, esco -
lhid os entre os d esem bargad ores d a Casa d a Suplicaçã o; a estes juntavam --
se os procurad ores d a cid ad e, ind icad os pela própria câ m ara, e os procu -
rad ores d os m esteres, eleitos pela Casa d os Vinte e Quatro. N os seus tra-
ços essenciais, esta estrutura m anteve-se d esd e 1572. Grupos d e grand e d i-
nam ism o, riqueza e notoried ad e na vid a d a capital e d o próprio paí s es -
tavam arred ad os d o governo d a cid ad e por um quad ro institucional rí gid o,
incapaz d e reflectir a evoluçã o social. A Revoluçã o d e 1820 constituiu um
ensaio d a m ud ança que a im plantaçã o d efinitiva d o Liberalism o consagra -
ria: a partir d e 1834, a câ m ara foi, praticam ente, d om inad a pelos proprie -
tá rios e negociantes.15
A d ebilid ad e d o aparelho periférico d o Estad o teve tam bém com o
consequência a d esconcentraçã o d e funções essenciais a favor d os m unicí -
pios. Assim , estes tinham um a acçã o im portante no recrutam ento m ilitar;
entre 1840 e 1852 foram responsá veis pelo recenseam ento para as eleições
d e d eputad os e, d esd e 1836, através d o presid ente, veread ores e outras
pessoas nom ead as pela câ m ara para a presid ência d as assem bleias eleito -
rais, tiveram um papel relevante no d ecorrer d o próprio acto eleitoral. Por
últim o, m as nã o m enos im portante, as câ m aras possuí am um a intervençã o

14 Joã o Manuel Rod rigues Pereira - Elites Locais e Liberalismo. Torres V edras 1792-1878,
Lisboa, 1997, policopiad o.
15 Paulo Jorge Azeved o Fernand es - A s Faces de Proteu, pp. 238-240.

Em busca d a estabilizaçã o 111


SILVEIRA

significativa no lançam ento d os im postos d irectos: vá rios foram os siste-


m as experim entad os, m as os resultad os nunca foram brilhantes. 16
Com o eram , entã o, as relações entre o Estad o central e os pod eres
periféricos? Ped ro Tavares d e Alm eid a sugere a existência, na segund a m e -
tad e d o século XIX, à sem elhança d o que acontecia noutros paí ses, d e
“ um a d inâ m ica contratual nas relações entre a periferia e o centro” . Os go -
vernad ores civis nã o seriam , entã o, “ m eros instrum entos passivos ou cor -
reias d e transm issã o d o pod er governam ental” , actua nd o “ tam bém com
frequência com o verd ad eiros m ed ianeiros entre as im posições d o centro
polí tico e as exigências locais, procurand o harm onizar interesses e regular
conflitos.” De resto, m uitos governad ores exerciam o cargo nos d istritos a
cuja elite pertenciam e outros, send o exteriores a esta, acabavam por criar
relações pessoais neste m eio. 17
Em relaçã o aos m unicí pios é legí tim o postular a existência d e um es -
paço d e m anobra significativo nas suas relações com o pod er central, rela -
ções que nã o pod em ser red uzid as a um a sim ples subm issã o d aqueles a
este. O governo era capaz d e cond icionar os resultad os d as eleições m uni-
cipais no conjunto d o paí s: assim , em 1847 saiu vitorioso em 83% d as
câ m aras, d eixand o as restantes à oposiçã o que só triunfou num m unicí pio
im portante, É vora.18 Mas o Estad o nunca foi capaz d e cobrar eficazm ente
im postos d irectos em Portugal. N ã o o fazia porque os povos resistiam ao
seu pagam ento e porque as elites nunca estiveram d ispostas nem a pagar,
nem a im por a sua cobrança.19

16 Em 1835 e 1836 as câ m aras nom eavam os vogais d as juntas d e lançam ento, capa cid ad e
que perd eram em 1837 quand o aquelas juntas passaram a ser constituí d as por m em bros
ind icad os pelo ad m inistrad or geral d e d istrito e por m em bros eleitos. Após 1838 o Es tad o
procu rou lançar os im postos através d os seus funcioná rios, m as em 1852 ped iu, d e novo, a
colaboraçã o d as câ m aras que voltaram a d esignar um a parte d os vogais d as juntas d e re -
partid ores (escolhid os, segund o a lei, entre os proprietá rios) e aind a os avaliad ores.
17 António Ped ro Ginestal Tavares d e Alm eid a - A Construçã o do Estado Liberal. vol. I, pp.
167-169.
18 Paulo Jorge Azeved o Fernand es - A s Faces de Proteu, pp. 224-225
19 Ver Lu í s N uno Espinha d a Silveira - Estado Liberal e Centralizaçã o. Sobre o problem a
d a cobrança d e im postos em Espanha ver Juan Pro Ruiz - Las Elites Locales y El Pod er Fiscal
d el Estad o en la España Contem porá nea, in Les É lites Locales et l’ É tat dans l’ Espagne M oder-
ne, X V I-X IX Siècle, Paris, CN RS, 1993, pp. 283-294.

112 Em busca d a estabilizaçã o


TERRITÓRIO E PODER

Por outro lad o, há sinais d e que, m esm o num perí od o geralm ente
visto com o correspond end o a um a fase d e centralizaçã o d o pod er, a d é-
cad a d e 1840, o controlo d as câ m aras era m uito m enos eficaz d o que se
supõe: no d istrito d e Leiria, por exem plo, alguns m unicí pios nã o prestaram
contas entre 1843 e 1852.
Os próprios órgã os d istritais tinham d ificuld ad e em im por as suas
d eliberações. N a assistência aos expostos, um a com petência d escentrali-
zad a, as juntas d e d istrito tinham capacid ad e d e d ecisã o e d e regulam en -
taçã o. Um a vez m ais recorrend o ao exem plo d e Leiria, verificam os que, en -
tre 1838 e 1852, nenhum a câ m ara pagou o que d evia e, em alguns anos, al-
gum as nã o pagaram nad a, porque tinham d í vid as d e im postos que nã o
queriam cobrar, o que as d eixava com falta d e recursos, e porque nã o con -
cord avam com o regulam ento d a assistência. Só quand o este foi alterad o a
situaçã o se com eçou a regularizar. 20
Para concluir, d urante a Revoluçã o Liberal a reform a d o Estad o por -
tuguês seguiu o m od elo francês. Mas, nã o d ispond o d e um a burocr acia
abund ante e com petente, aquele apoiou -se no pod er d as elites locais, com o
ocorreu em França ou em Espanha, cujos sistem as se aproxim avam , d este
ponto d e vista, d o m od elo inglês.
O que é especí fico d a evoluçã o nacional é o respeito pelo espaço
próprio d o m unicí pio, d efend id o pela esquerd a e tam bém por sectores d a
d ireita liberal, o que nã o aconteceu em França ou em Espanha. Em Portu -
gal, reconquistad a um a relativa autonom ia em 1835, quand o a centraliza-
çã o se reforçou, anos m ais tard e, o controlo d o m un icí pio, d e acord o com a
lei, fazia-se através d o exercí cio d a tutela pelos órgã os d istritais, o que é
substancialm ente d iferente d o que ocorreu naqueles paí ses, ond e o presi-
d ente d a câ m ara era nom ead o pelo governo. N a prá tica, em Portugal, a
d ebilid ad e d o Estad o central d eixou ao m unicí pio algum espaço d e actua -
çã o e algum a capacid ad e d e resistência face aos representantes d o pod er
central e m esm o face aos órgã os d istritais.
N ã o d evem os, no entanto, exagerar nesta tentativa d e rever a im agem
d o m unicí pio no século passad o. É essencial lançar, d e form a fund am en -

20 Ver Lu í s N uno Espinha d a Silveira - Estado Liberal e Centralizaçã o.

Em busca d a estabilizaçã o 113


SILVEIRA

tad a, novas id eias que sejam capazes d e aliviar o peso esm agad or d os es -
critos d e autores com o Alexand re H erculano, H enriques N ogueira ou Lobo
d ’ Ávila, id eias que sustentem novas investigações. Mas nã o exagerem os.
O m unicí pio português no século XIX apresenta evid entes sinais d e d ebili-
d ad e. Exam inem os, sinteticam ente, d ois aspectos essenciais: as eleições e
as finanças locais.
Face ao Antigo Regim e, as eleições censitá rias representaram um pro -
gresso: alargou -se, em regra, o núm ero d e eleitores, ultrapassand o -se o es-
trito cí rculo d a gente nobre d a governança. Aquele núm ero continuava, no
entanto, a ser m uito restrito. N as eleições m unicipais d e 1847 variou entre
os 1 659 cid ad ã os no conjunto d os concelhos d o d istrito d e Beja e os
14 034 no d o Porto 21. Dois terços d os m unicí pios tinham m enos d e 500
ind iví d uos inscritos no recenseam ento eleitoral. Dad a a precaried ad e d as
estatí sticas d em ográ ficas, é aventuroso estabelecer a relaçã o entre os
eleitores e a populaçã o total: d e form a aproxim ad a, no concelho d e Lisboa,
aqueles correspond eriam a 8,4% d esta. O núm ero d e elegí veis que, na
d écad a d e 1840, variava consoante a d im ensã o d o concelho, era aind a
m ais red uzid o: em Lisboa correspond ia a 1,7% d o total d a populaçã o.
Razã o tinham aqueles que se queixavam d o d esinteresse d os povos
em relaçã o aos actos eleitorais: nas m esm as eleições m unicipais d e 1847, a
abstençã o m éd ia para o conjunto d o paí s foi d e 58,1%. N os m unicí pios
m ais urbanizad os este valor d im inuí a um pouco e na capital d o paí s, ond e
as eleições se revestiam d e um cará cter algo m ais m od erno, a abstençã o fi -
xou -se em 46,7%. A polí tica, m esm o a m unicipal, era apaná gio d e um nú -
m ero m uito pequeno d e cid ad ã os. 22
Por outro lad o, o m unicí pio era um a entid ad e, em regra, pobre. É cer -
tam ente necessá rio introd uzir um a d istinçã o entre os concelhos d as cid a-
d es m ais im portantes e os restantes. Lisboa com os seus 206 contos d e réis
d e receita em 1850 é um caso absolutam ente excepcional. 23 Mas os m unicí -
pios d e algum as capitais d e d istrito nã o fugiam à im agem geral d e po breza.

21 N ote-se que nã o há d ad os globais para os d istritos d e Braga e d e Lisboa (Paulo Jorge


Azeved o Fernand es - A s Faces de Proteu, pp. 219 e 231-232).
22 Paulo Jorge Azeved o Fernand es - A s Faces de Proteu, p. 232.
23 Sinopse dos Principais A ctos A dministrativos da Câ mara M unicipal de Lisboa, Lisboa,
Câ m ara Municipal d e Lisboa, 1834-1851.

114 Em busca d a estabilizaçã o


TERRITÓRIO E PODER

N o com eço d a segund a m etad e d o século XIX, o governad or civil d e Leiria


tinha um vencim ento anual ilí quid o d e 1 000$000 réis e a câ m ara d esta ci-
d ad e, em 1852, apresentava no orçam ento um a receita d e 5 021$223 réis;
as receitas d e m etad e d os concelhos d este d istrito eram m esm o inferiores
ao ord enad o d aquele m agistrad o.
As câ m aras d o d istrito d e Leiria, nesta altura, viam os seus parcos
rend im entos escoar-se no pagam ento d os expostos, encargo que satisfa-
ziam com grand es d eficiências, com o vim os, e d o pessoal. As obras tinham
um significad o m uito pequeno.
Tod as as câ m aras d o d istrito d e Leiria acum ulavam fortes d í vid as
activas e passivas. Aquelas provinham sobretud o d os im postos d irectos,
constituí d os por um ad icional à s contribuições d irectas d o Estad o. A pos -
sibilid ad e d e lançar este tipo d e tributos foi a principal novid ad e introd u -
zid a pelo Liberalism o, em 1835, nas receitas d os m unicí pios. Contud o, a
m aior parte d as câ m aras evitava recorrer a esta fonte d e financiam ento e,
quand o o fazia, d eparand o com resistência por parte d os povos, nã o es-
tava d isposta a forçar um a cobrança eficaz. O m unicí pios eram tam bém
cred ores d e d í vid as provenientes d os im postos ind irectos. Os d eved ores,
neste caso, eram os rend eiros a quem as câ m aras, por nã o d isporem d e
pessoal, arrend avam a cobrança d aqueles tributos. Os m unicí pios esta-
vam , assim , d uplam ente prisioneiros, d os contribuintes e d os rend eiros.
Com o no caso d o Estad o, a d eficiente cobrança d os im postos estava rela-
cionad a com a d ebilid ad e d as estruturas ad m inistrativas, m as era tam bém
um problem a social: d e resistência d os contribuintes e d e falta d e vontad e
d as elites, cham ad as a participar na ad m inistraçã o fiscal, em pagar e im -
por o pagam ento.24

24 Ver Lu í s N uno Espinha d a Silveira - Estado Liberal, Centralismo e A tonia da V ida Lo-
cal, no prelo.

Em busca d a estabilizaçã o 115


SILVEIRA

As proví ncias

Exam inem os agora a outra d im ensã o essencial d a Revoluçã o Liberal,


a reorganizaçã o d o espaço, no qual o Estad o, através d as suas estruturas
centrais e periféricas, as câ m aras e os órgã os paroquiais exerciam os seus
pod eres. Com o vim os, d atand o a legislaçã o fund am ental d e 1835-1836,
nos anos seguintes a d ivisã o territorial aind a sofreu alterações. Vam os, en -
tã o, exam inar as cartas d e 1842, que sã o o resultad o d e tod o este processo
e que correspond em a um a certa estabilizaçã o d o sistem a.
N o capí tulo II, afirm á m os que um d os traços d istintivos d a situaçã o
portuguesa, na altura em que ocorreu a Revoluçã o Liberal, era a inexistên-
cia d e particularism os provinciais que o m ovim ento revolucioná rio tivesse
d e com bater, com o aconteceu noutros p aí ses. Em apoio d esta id eia m os-
trá m os que o projecto d a com issã o d e d ivisã o d o território apresentad o à
Câ m ara d os Deputad os em 1827, até previa a m anutençã o d as proví ncias
d o Antigo Regim e, com algum as ad aptações. N o d ebate d e revisã o d a le-
gislaçã o d e Mouzinho d a Silveira, que d ecorreu após a instauraçã o d o re -
gim e liberal, vim os com o a exclusã o d a proví ncia d o sistem a ad m inistra-
tivo apenas teve que ver com o problem a d a concentraçã o d e pod er nas
m ã os d os representantes d o governo central nessas grand es unid ad es terri-
toriais.
Ora, é im portante realçar que a proví ncia, no Antigo Regim e um a cir -
cunscriçã o em inentem ente m ilitar, ganhou com o Liberalism o um a nova e
d ecisiva funçã o: ela constituiu em 1820 e em tod as as eleições realizad as
ao abrigo d a Carta Constitucional até 1859 (1826, 1834, 1835, Julho d e
1836 e d e 1842 em d iante) o cí rculo por ond e eram eleitos os d eputa d os.25
Se o m apa que serviu d e base à s d e 1820 e d e 1826 era o d o Antigo Regim e,
reprod uzid o no capí tulo I, o d e 1834, com o se pôd e ver no capí tulo II,
apresentava grand es d iferenças face ao anteced ente; as cartas d e 1835 e

25 N as eleições d e 1822 e nas d e N ovem bro d e 1836, que tiveram lugar na vigência d a
Constituiçã o d e 1822, bem com o nas d e 1838 e 1840, quan d o esteve em vigor a Constituiçã o
d e 1838, o paí s foi d ivid id o em cí rculos que pod iam ou nã o coincid ir com os d istritos. É
interessante notar que, ao contrá rio d o que aconteceu nos casos ind icad os no texto, nas
eleições d e 1822, d e 1838 e d e 1840 exigia -se que tod os ou parte d os d eputad os fossem na -
turais ou resid entes na proví ncia a que pertencia o cí rculo d e eleiçã o.

116 Em busca d a estabilizaçã o


TERRITÓRIO E PODER

1836 sã o d ifí ceis d e d esenhar com rigor, pois a legislaçã o eleitoral, em bora
m antenha as proví ncias previstas em 1834, nã o especifica a correspond ên-
cia entre elas e os d istritos. Mas nã o d evem ser m uito d istintas d o m apa d e
1842 (n.º 15).
Este últim o, se tem um núm ero d e d ivisões id êntico ao d e 1834, d ifere
m uito nas suas fronteiras interiores, e estas d iferem tam bém d os lim ites
d as proví ncias que chegaram até 1826. Trá s-os-Montes e o Algarve sã o as
regiões que em 1842 m ais sem elhanças têm com as d o passad o.
É certo que a m anutençã o d a proví ncia com o circunscriçã o eleitoral
d ecorria d e um a exigência d o próprio texto d a Carta. Contud o, um regim e
que estivesse apostad o em d issolver antigas id entid ad es, nã o pod eria atri -
buir à s proví ncias, m esm o m od ificad as, um a funçã o tã o d ecisiva.

Os distritos

Os d istritos sã o um a criaçã o d o Liberalism o, sem qualquer antece -


d ente histórico. A sua origem rem onta ao m apa d as com arcas apresentad o
em 1827 à Câ m ara d o Deputad os pela com issã o d e d ivisã o d o território
(ver capí tulo II). A inspiraçã o francesa d o projecto é confessad a pela pró-
pria com issã o, m as os critérios em que se baseou, ao fim e ao cabo, sã o os
m esm os que estavam subjacentes à reform a d as com arcas que a coroa por -
tuguesa d esencad eou em 1790. Send o os objectivos, por um lad o, facilitar a
acçã o d o governo e fazê-la chegar a tod os os pontos d a m onarquia e, por
outro, proporcionar aos cid ad ã os o recurso cóm od o à s autorid ad e s, os
princí pios seguid os no d esenho d a carta foram o equilí brio entre a
extensã o e a populaçã o d as circunscrições, e as caracterí sticas fí sicas d o
espaço que cond icionam as com unicações, porque as “ Autorid ad es e os
Cid ad ã os nã o pod em consid erar-se com o pontos civis colocad os em um
plano geom étrico. Sã o hom ens e habitad ores d as d iversas Povoações
espalhad as pelo Território Português” . 26
O projecto d e 1827 foi recuperad o, com pequenas alterações, em
1835 e sofreu ad aptações d e porm enor nos anos seguintes (ca pí tulo II). Em

26 Apud Marcelo Caetano - Os A ntecedentes da Reforma A dministrativa de 1832, pp. 28-29.

Em busca d a estabilizaçã o 117


SILVEIRA

1842, o m apa tem contornos m uito próxim os d o actual, send o a grand e d i-


ferença entre os d ois o resultad o d a d esanexaçã o d o d istrito d e Setúbal d o
d e Lisboa em 1926 (m apas n.os 16 e 17).
A carta d e sobreposiçã o d os d istritos d e 1842 e com arcas d e 1826
(n.º 18) encerra um a com paraçã o entre d ois sistem as d e pod er, d uas for-
m as d iferentes d e apreensã o d o território: um a trad icional, prod uto d a
H istória; a outra racional, resultad o d e um a intervençã o voluntarista sobre
o espaço. Pouco têm em com u m as antigas e novas d ivisões, algum as fron -
teiras som ente: a que separa o d istrito d e Vila Real d o d e Braga e Porto; a
linha d efinid a pelo rio Douro; um a parte im portante d as fronteiras Leste,
Sul e Oeste d e Viseu; o lim ite Sul d e Aveiro; o m esm o em É vora e a linha
que d ivid e trad icionalm ente o Algarve e o Alentejo.
Com o as cartas d e porm enor m ostram (n. os 19 e 20), os d istritos d e-
finem á reas absolutam ente novas e novas relações d e d epend ência. Para
capitais, no projecto d e 1827, escolheram -se 11 d os 22 centros com catego-
ria d e cid ad e existentes no paí s 27 e ad icionaram -se 6 outras povoações
pela posiçã o que ocupavam no território d os respectivos d istritos. Em
1835, 3 d estas últim as foram preterid as a favor d e outras tantas cid ad es
(Guim arã es por Braga, Trancoso pela Guard a e Crato por Portalegre);
Ponte d e Lim a foi trocad a por Viana, que tinha m uito m ais populaçã o, e,
juntam ente com Vila Real e Santarém , que se m antiveram d o projecto d e
1827, passaram a constituir as 3 únicas capitais d e d istrito que nã o eram
cid ad es.28

27 Porto, Bragança, Viseu, Aveiro, Coim bra, Castelo Branco, Leiria, Lisboa, É vora, Beja
e Faro.
28 Em 18 d e Julho d e 1835 Viseu viu negad a a cond içã o d e capital d e d istrito a favor d a
cid ad e d e Lam ego, m as por d ecreto d e 15 d e Dezem bro d o m esm o ano reconquistou -a.

118 Em busca d a estabilizaçã o


TERRITÓRIO E PODER

Os concelhos

A carta n.º 22, representand o a evoluçã o d os concelhos entre 1826 e


1842, e o quad ro XV d em onstram a profund id ad e d as transform ações so -
frid as pelos m unicí pios. Com o se pod e ver os concelhos suprim id os foram
m uitos, aind a que representassem um a á rea red uzid a. Tã o im portante
quanto este facto, é verificar que o núm ero d os que atravessaram o perí od o
d e 1826 a 1842 sem sofrer alterações é red uzid í ssim o, correspond end o -lhe
um a percentagem d a superfí cie total m uito pequena. O m esm o quad ro
m ostra, aind a, que 282 concelhos continuaram a existir, m as é preciso su -
blinhar que sofreram , em geral, profund as m od ificações d e fronteiras,
send o o seu novo contorno m uito d iferente d o anterior. Finalm ente, entre
1826 e 1842 foram criad os 30 novos m unicí pios. Consequentem ente, o
m apa d este últim o ano (n.º 21) pouco tem que ver com o que chegara ao
final d o Antigo Regim e e que rem ontava, nos seus traços gerais, pelo m enos
ao iní cio d o século XVI.

Quad ro XV
Evoluçã o dos concelhos 1826-1842
Classes N .º de concelhos % Área (Km2) %
1 70 8,88 14 570,05 16,53
2 436 55,33 16 551,45 18,78
3 282 35,79 57 004,67 64,69
Total 788 100,00 88 126,17 100,00
—————————————————————————————————————

Classes: 1 - concelhos que m antêm fronteiras inalterad as; 2 - concelhos extintos;


3 - concelhos que perm anecem , sofrend o m od ificações d e fronteiras.
N ota: neste quad ro só estã o contabilizad os os concelhos que foi possí vel representar no
m apa d e 1826. Os 16 que aí nã o figuram foram igualm ente extintos.

A transform açã o operou -se através d e um corte rad ical d o núm ero d e
concelhos com m enos d e 100 Km 2 d e á rea (ver quad ros IV, XVII e m apa n.º
23), tend o-se d issipad o, em especial, a nuvem d e m unicí pios m inúsculos,
que nã o iam além d e 40 Km 2 (quad ros III e XVI). Em consequência, a á rea
m éd ia d os concelhos subiu d e 112 para 232 Km 2. Um terço d estas circuns -

Em busca d a estabilizaçã o 119


SILVEIRA

crições aind a continuou a ficar abaixo d os 100 Km 2; um outro terço passou


a estar situad o no escalã o seguinte (quad ro XVII), m as 40 % ultrapassavam
agora os 200 km 2 d e á rea.
Em term os regionais, observe-se o quase d esaparecim ento d e conce-
lhos com á rea inferior a 100 Km 2 d e proví ncias com o o Alentejo, o Algarve
e a Beira Baixa (quad ro XVIII e m apa n.º 23) e que os concelhos acim a d os
500 Km 2, que em 1826 existiam no Minho, na Beira (em zonas com o Viseu,
Lafões e Coim bra) e em Trá s-os-Montes, d epois d e 1842 só se m antêm
nesta últim a proví ncia e na regiã o m ed iterrâ nica.

Quad ro XVI - Concelhos de 1842 - Área


Área (Km2) N .º de concelhos % % acum.
0- 9 1 0,26 0,26
10 - 19 0 0,00 0,26
20 - 29 4 1,05 1,31
30 - 39 12 3,14 4,45
40 - 49 14 3,66 8,12
50 - 59 11 2,88 10,99
60 - 69 19 4,97 15,97
70 - 79 28 7,33 23,30
80 - 89 12 3,14 26,44
90 - 99 14 3,66 30,10
>=100 267 69,90 100,00
Total 382 100,00
—————————————————————————————————————

N ota: núm ero d e concelhos cuja á rea nã o foi d eterm inad a - 0; á rea para a qual nã o se
encontrou correspond ência nos concelhos d e 1842: 321,01 Km2, correspond end o a 0,36% d a
superfí cie total d o continente .

Quad ro XVII - Concelhos de 1842 - Área


Área (Km2) N .º de concelhos % % acum.
0 - 99 115 30,10 30,10
100 - 199 114 29,84 59,95
200 - 299 55 14,40 74,35
300 - 399 45 11,78 86,13
400 - 499 15 3,93 90,05
500 - 999 30 7,85 97,91
>=1000 8 2,09 100,00
Total 382 100,00
—————————————————————————————————————

N ota: ver quad ro anterior.

120 Em busca d a estabilizaçã o


TERRITÓRIO E PODER

Quad ro XVIII
Concelhos de 1842 - Área por proví ncia
Proví ncia\ Área (Km2) 99 199 299 399 499 999 1000 Total
Alentejo 2 9 5 13 4 11 6 50
Algarve 2 4 3 2 4 15
Beira Alta 22 13 4 1 40
Beira Baixa 5 15 10 7 4 6 47
Douro 32 36 8 1 77
Estrem ad ura 30 18 10 8 3 6 2 77
Minho 12 11 4 5 32
Trá s-os-Montes 10 8 11 9 3 3 44
Total 115 114 55 45 15 30 8 382
—————————————————————————————————————

Área (Km2): os valores inscritos nesta linha ind icam o lim ite superior d a classe.
N ota: ver quad ro XVI.

Quad ro XIX
Concelhos de 1842 - Área por distrito
D istrito\ Área (Km2) 99 199 299 399 499 999 1000 Total
Aveiro 9 12 3 24
Beja 1 2 1 2 7 4 17
Braga 10 3 4 2 19
Bragança 1 9 4 3 2 19
Castelo Branco 1 5 3 3 5 17
Coim bra 12 16 3 1 32
É vora 2 1 5 2 2 2 14
Faro 2 4 3 2 4 15
Guard a 5 14 5 4 1 1 30
Leiria 6 5 2 1 1 1 16
Lisboa 20 9 4 2 1 2 1 39
Portalegre 1 5 3 6 2 2 19
Porto 11 8 2 21
Santarém 4 4 4 5 1 3 1 22
Viana 2 8 3 13
Vila Real 10 7 2 5 1 25
Viseu 22 13 4 1 40
Total 115 114 55 45 15 30 8 382
—————————————————————————————————————

Área (Km2): os valores inscritos nesta linha ind icam o lim ite superior d a classe.
N ota: ver quad ro XVI.

Em busca d a estabilizaçã o 121


SILVEIRA

Quad ro XX
Concelhos de 1842 - Área média por proví ncia
Proví ncia Área média (Km2)
Douro 115,82
Beira Alta 118,93
Minho 152,17
Estrem ad ura 227,49
Trá s-os-Montes 247,87
Beira Baixa 267,36
Algarve 326,92
Alentejo 479,68

Quad ro XXI
Concelhos de 1842 - Área média por distrito
D istrito Área média (Km2)
Porto 108,98
Aveiro 114,78
Viseu 118,93
Coim bra 121,09
Braga 143,39
Viana 165,01
Vila Real 173,13
Lisboa 183,55
Guard a 195,45
Leiria 213,27
Portalegre 297,13
Santarém 315,71
Faro 326,92
Bragança 346,22
Castelo Branco 394,26
É vora 522,16
Beja 648,73

122 Em busca d a estabilizaçã o


TERRITÓRIO E PODER

A d istribuiçã o d a á rea m éd ia por proví ncia (quad ro XX) m ostra um a


zona litoral norte, incluind o o Minho, o Douro, a Beira Alta e a Estrem ad u-
ra com valores abaixo d a m éd ia nacional. Esta últim a proví ncia se nã o
fosse a inclusã o d os concelhos a sul d o Tejo e d o d istrito d e Santarém veria
a sua m éd ia baixar. A zona interior norte e o sul apresentam , por seu lad o,
valores acim a d aquela m éd ia.
Os encravam entos territoriais, tã o caracterí sticos d as cartas d o An-
tigo Regim e aind a afectam 26 concelhos em 1842.
Para analisar a transform açã o verificad a em term os d e populaçã o,
agregá m os o núm ero d e ind iví d uos d o recenseam ento d e 1828 d e acord o
com a d ivisã o ad m inistrativa d e 1842. Esta opçã o, m antend o o efectivo
populacional constante, perm ite isolar o efeito d a reorganizaçã o espacial e,
consequentem ente, estud á -lo m elhor. O núm ero d e habitantes que nã o se
consegue reclassificar é pequeno, conform e se pod e ver na nota ao quad ro
XXII.

Quad ro XXII
N úmero de indiví duos por concelho de 1842
N .º de indiví duos N .º de concelhos % % acum.
0 - 999 1 0,26 0,26
1 000 - 1 999 11 2,89 3,16
2 000 - 2 999 40 10,53 13,68
3 000 - 3 999 65 17,11 30,79
4 000 - 4 999 66 17,37 48,16
5 000 - 9 999 129 33,95 82,11
10 000 - 19 999 53 13,95 96,05
>=20 000 15 3,95 100,00
Total 380 100,00
—————————————————————————————————————

N ota: d ad os populacionais d o censo d e 1828. Deste quad ro foram excluí d os os concelhos


d e Lisboa e Porto, com o traçado que têm em 1842, d ad o que nã o existe inform açã o para as
paróquias urbanas d e am bas as cid ad es. Ver nota ao quad ro XXVIII, anexo II.
N úm ero d e ind iví d uos que nã o se consegue reclassificar d e acord o com a d ivisã o
ad m inistrativa d e 1842: 17 083, correspond end o a 0,61% d o total d o censo d e 1828.

Em busca d a estabilizaçã o 123


SILVEIRA

Repare-se, entã o, que houve um corte rad ical, em núm eros absolutos,
d os concelhos com m enos d e 2000 ind iví d uos e m uito pronunciad o na
classe seguinte. Por outro lad o, verificou -se um reforço substancial d os
m unicí pios cuja populaçã o se situava entre os 4000 e os 10000 habitantes.
Em term os percentuais, um pouco m enos d e m etad e d os concelhos ficou
com m enos d e 5000 ind iví d uos, registand o-se um peso relativo acentuad o
d a classe entre os 5000 e os 10000 habitantes.
Os núm eros apresentad os retratam um traço m uito original d a evolu -
çã o portuguesa: o red im ensionam ento d os concelhos, que crescem em á rea
e populaçã o, obtid o através d a red uçã o rad ical d o seu núm ero e d a red efini-
çã o d as suas fronteiras. Em Espanha, com o vim os (capí tulo II), a Revolu çã o
m ultiplicou -os e foi d im inuind o o m í nim o d e habitantes exigid o para
constituir um m unicí pio d os 1000, d ecretad os em 1812, até aos 150,
fixad os em 1845. Daqui resultou que, em finais d o século passad o, a
m aioria d os 9287 m unicí pios espanhóis tinha m enos d e 1000 alm as,
enquanto em Portugal, em 1826, antes, portanto, d a reform a, 37% d os
concelhos estava nessas cond ições. Estam os, portanto, perante realid ad es
substancialm ente d iferentes.29
A intervençã o registad a entre nós em 1836 nã o teve, apesar d e tud o,
a profund id ad e necessá ria, pois, o problem a d a d im ensã o d os m unicí pios
continuará a ser d iscutid o ao longo d o século XIX, send o um factor im por -
tante para explicar a sua d ebilid ad e financeira. Em 1855 nova red uçã o se
verificou, passand o entã o a existir 256 concelhos. 30

As freguesias

Quanto à s freguesias, integrad as na d ivisã o ad m inistrativa em 1835 e


excluí d as entre 1840 e 1878, com ecem os por com entar o erro d a carta res -
pectiva (quad ro XXIII e m apa n.º 24). Globalm ente, o núm ero d as que nã o
foi possí vel cartografar baixou m uito, em relaçã o a 1826, quer em term os

29 Concepción d e Castro - La Revolución Liberal y los M unicipios Españoles, pp. 61-62. As


d iferenças d e populaçã o entre os concelhos portugueses e espanhóis m antêm -se na actualid a-
d e. Ver a este respeito Lu í s Valente d e Oliveira - Regionalizaçã o, p. 45.
30 Maria Alexand re Lousad a - A s Divisões A dministrativas em Portugal, p. 316.

124 Em busca d a estabilizaçã o


TERRITÓRIO E PODER

absolutos, quer relativos. Sublinhe-se que só nã o conseguim os d eterm inar o


d estino d e 91 paróquias; nos 95 casos restantes trata -se d e freguesias que,
d epois d e 1842, se uniram a outras e que nós nã o pod í am os d esagregar. A
á rea d as freguesias actuais para que nã o foi possí vel estabelecer corres -
pond ência no passad o continua a ser d esprezí vel (ver nota ao quad ro
XXIII).
Em term os regionais, o erro só é im portante no Alentejo, m as a popu -
laçã o d as freguesias nã o representad as na carta equivale som ente a 8,3%
d o total d e habitantes d a proví ncia. De resto, d as 67 paróquias assinala-
d as no quad ro, d esconhecem os o d estino d e 27, pertencend o as outras 40
ao grupo d as que vieram a ser fund id as e que, seguind o a m e tod ologia
ad optad a, nunca pod erã o ser d esenhad as na carta.
Um d os d ad os para que é interessante cham ar a atençã o, tanto m ais
que é pouco referid o, é que o núm ero d e paróquias portuguesas d im inuiu
entre 1826 e 1842.31 N o entanto, o corte nã o tem qualquer sem elhança com
o que afectou os concelhos: abrangeu som ente 320 freguesias, equiva lend o a
7,8% d as que existiam no prim eiro d aqueles anos. O fenóm eno d e
aglutinaçã o d e paróquias foi especialm ente im portante em Trá s -os-Montes
explicand o um a d im inuiçã o 21% d o seu núm ero entre aquelas d atas.

Quad ro XXIII
Freguesias de 1842 nã o cartografadas - D istribuiçã o por proví ncia
Proví ncia Total de freguesias Freguesias nã o cartografadas %
Alentejo 314 67 21,34
Algarve 62 1 1,61
Beira Alta 348 5 1,44
Beira Baixa 499 18 3,61
Douro 732 15 2,05
Estrem ad ura 472 28 5,93
Minho 785 21 2,68
Trá s-os-Montes 556 31 5,58
Total 3768 186 4,94
—————————————————————————————————————

N ota: á rea para a qual nã o se encontrou correspond ência nas freguesias d e 1842:
1173,57 Km2, equivalend o a 1,32% d a superfí cie total d o con tinente.

31 Ver d ad os sobre a evoluçã o d o núm ero d e freguesias ao longo d os séculos XIX e XX


em José António Santos - A s Freguesias, pp. 56-59.

Em busca d a estabilizaçã o 125


SILVEIRA

Quad ro XXIV
Freguesias de 1842 - Área
Área (Km2) N .º de freguesias % % acum.
0- 9 1508 42,10 42,10
10 - 19 906 25,29 67,39
20 - 29 424 11,84 79,23
30 - 39 236 6,59 85,82
40 - 49 127 3,55 89,36
50 - 59 77 2,15 91,51
60 - 69 46 1,28 92,80
70 - 79 36 1,01 93,80
80 - 89 28 0,78 94,58
90 - 99 23 0,64 95,23
>=100 171 4,77 100,00
Total 3582 100,00
—————————————————————————————————————

N ota: núm ero d e freguesias cuja á rea nã o foi d eterm inad a - 186;
Área para a qual nã o se encontrou correspond ência nas freguesias d e 1842: 1173,57 Km2,
equivalend o a 1,32% d a superfí cie total d o continente.

Quad ro XXV
Freguesias de 1842 - Área média por proví ncia
Proví ncia N .º de freguesias Área média (Km2)
Minho 764 6,35
Douro 717 12,36
Beira Alta 343 13,86
Trá s-os-Montes 525 20,68
Beira Baixa 481 26,00
Estrem ad ura 444 38,18
Algarve 61 80,39
Alentejo 247 96,69
Total 3582
—————————————————————————————————————

N ota: ver quad ro XXIV.

126 Em busca d a estabilizaçã o


TERRITÓRIO E PODER

Quad ro XXVI
Freguesias de 1842 - Área média por distrito
D istrito N .º de freguesias Área média (km2)
Braga 487 5,56
Porto 360 6,35
Viana 277 7,73
Viseu 343 13,86
Aveiro 172 15,95
Guard a 335 17,34
Vila Real 248 17,42
Coim bra 185 20,73
Bragança 277 23,60
Leiria 107 30,74
Lisboa 203 34,82
Castelo Branco 146 45,87
Santarém 134 49,20
Portalegre 77 73,32
Faro 61 80,39
É vora 78 93,72
Beja 92 118,78
Total 3582
—————————————————————————————————————

N ota: ver quad ro XXIV.


Quad ro XXVII
N úmero de indiví duos por freguesia de 1842
N .º de indiví duos N .º de freguesias % % acum.
0 - 99 32 0,87 0,87%
100 - 199 245 6,68 7,55%
200 - 299 505 13,77 21,32%
300 - 399 521 14,20 35,52%
400 - 499 430 11,72 47,25%
500 - 599 324 8,83 56,08%
600 - 699 275 7,50 63,58%
700 - 799 211 5,75 69,33%
800 - 899 164 4,47 73,80%
900 - 999 142 3,87 77,67%
>= 1000 819 22,33 100,00%
Total 3668 100,00
—————————————————————————————————————

N ota: núm ero d e freguesias em relaçã o à s quais nã o foi possí vel calcular a populaçã o -
100.
Fonte: ver anexo II.

Em busca d a estabilizaçã o 127


SILVEIRA

Em term os d e á rea d as freguesias cartografad as nã o se regista qual-


quer alteraçã o significativa entre 1826 e 1842 (quad ros IX e XXIV). Do
ponto d e vista regional, m antém -se a d iferença entre o N orte e o Sul quanto
à á rea m éd ia, m as a aná lise d a d istribuiçã o d istrital d esta variá vel
(quad ro XXVI) perm ite precisar que a linha d e fronteira se situa nos d istritos
d e Castelo Branco, Leiria e Santarém . Lisboa, se nã o incluí sse as freguesias a
sul d o Tejo, veria a sua m éd ia bastante red uzid a.
Quanto à populaçã o, regista-se um a d im inuiçã o sensí vel d o núm ero
d e freguesias com m enos d e 200 habitantes (quad ro XXVII). Mas nã o se
pod e d izer que, globalm ente, tenha havid o um a alteraçã o qualitativa im -
portante. Quase m etad e d as paróquias continuava a ter m enos d e 500 al-
m as.

128 Em busca d a estabilizaçã o


Para term inar, vim os que o território português rapid am ente se d efi-
niu e que m anteve fronteiras está veis d esd e épocas recuad as. N o interior
d este espaço, natural e hum anam ente d iverso, os factores d e unid ad e so -
brepuseram -se aos elem entos d e d iferenciaçã o e, na É poca Mod erna, Por-
tugal caracterizava-se pela ausência d e fortes id entid ad es e pod eres regio -
nais, d istinguind o-se d a França e d a Espanha d este ponto d e vista.
Entre os séculos XIV e XVI as grand es á reas que os portugueses reco -
nheciam no território existiram com o circunscrições ad m inistrativas. Perd e -
ram entã o esse estatuto para, d o século XVII até à Revoluçã o Liberal, m an -
terem um a funçã o m ilitar. Os portugueses continuaram , no entanto, a refe -
rir-se à s proví ncias, cuja configuraçã o espacial tinha alguns traços surpre-
end entes.
Desd e o século XVI, para fins ad m inistrativos e jud iciais, o paí s es-
tava d ivid id o em com arcas, proved orias e concelhos. Esta d ivisã o e o res -
pectivo m apa eram a expressã o d o esforço d a coroa para controlar o es-
paço, m as trad uziam tam bém os pod eres d os d onatá rios laicos e eclesiá s -
ticos e d os concelhos. A existência d e um a red e d e m unicí pios, esten-
d end o-se por tod o o território, sujeita a regras d e d ireito relativam ente uni-
form es, é outro traço d istintivo d a situaç ã o portuguesa em com paraçã o
com outros paí ses d a época.
Em paralelo com a organizaçã o ad m inistrativa, e sem correspond ên cia
com ela, existia a d ivisã o eclesiá stica, cuja base era a d ensí ssim a m alha
d e paróquias. O m apa d estas últim as é um retrato d a im plantaçã o territo-
rial d a Igreja que nã o é com pará vel com a d ébil presença d o Estad o.
Malograd a um a reform a d as com arcas, no final d o século XVIII, a Re -
voluçã o Liberal vai rom per com este quad ro m ultissecular d e organizaçã o
d o espaço, substituind o-o pelo qu e aind a hoje vigora. A d iscussã o em
torno d as circunscrições supram unicipais, que d ecorreu d esd e 1821 até
1835, nad a teve que ver com a luta contra a id entid ad e d as regiões, com o

Conclusã o 131
SILVEIRA

aconteceu em França com a criaçã o d os d epartam entos ou, em m enor grau,


em Espanha, aquand o d a d efiniçã o d as proví ncias. Em Portugal, com o
Liberalism o a proví ncia ganhou m esm o um im portante papel com o cí rculo
eleitoral.
A opçã o pelo d istrito, com o grand e circunscriçã o ad m inistrativa, a
que se chegou por negociaçã o entre a esquerd a e a d ireita liberais, d ecorreu
som ente d o tem or d o excesso d e pod er d os representantes d o governo cen -
tral nas proví ncias, pod er que se procurou d ispersar por um núm ero m aior
d e m agistrad os. O m apa d os d istritos, um a criaçã o d o Liberalism o que
rom pe com as form as anteriores d e ord enam ento d o território, procura
criar um enquad ram ento espacial racionalizad o para o exercí cio d o pod er
d o Estad o.
Ao invés d a vitalid ad e d as proví ncias, a Revoluçã o Liberal portu gue-
sa foi cond icionad a pela existência d e um m unicí pio trad icionalm ente d o-
tad o d e um a certa autonom ia. Com excepçã o d a legislaçã o d e Mouzinho
d a Silveira, que d espertou um a significativa resistência, esta autonom ia foi,
em geral, respeitad a e foi m esm o apoiad a pelos liberais d a esquerd a e d e
sectores d a d ireita d epois d e 1835. O reforço d o pod er central, após 1842,
d evia ser conseguid o através d o aum ento d os pod eres d e tutela d os órgã os
d istritais. N o plano legal, a situaçã o d o m unicí pio português era m uito d i -
ferente d a que se verificava em França, ond e o presid ente d a câ m ara era
nom ead o pelo governo, ou em Espanha, ond e este facto tam bém se d ava e
ond e liberais, m od erad os e progressistas, viam o “ alcald e” com o represen -
tante d o pod er central e aceitavam a sua subord inaçã o ao m agistrad o d e
proví ncia. N a prá tica, em Portugal, d ad a a d ebilid ad e d a ad m inistraçã o
pública periférica, a centralizaçã o era m ais legal d o que real, tanto m ais
que o Estad o para controlar o território e para o exercí cio d e funções
essenciais nã o pod ia d ispensar o concurso d as elites e pod eres locais.
Os m esm os liberais que em 1835 libertaram o m unicí pio d a sujeiçã o
ao representante d o governo, em 1836 red esenharam o m apa d os concelhos
e, red uzind o d ram aticam ente o seu núm ero, fizeram -nos crescer em á rea e
populaçã o. O m unicí pio saiu fortalecid o, m as nã o o suficiente, pois conti-
nuou a apresentar sinais d e d ebilid ad e, nom ead am ente, no d om í nio finan -
ceiro. Anos m ais tard e, em 1855, verificou -se um a nova red uçã o d os
concelhos.

132 Conclusã o
TERRITÓRIO E PODER

Por outro lad o, em 1835, parte d os liberais d a esquerd a e d a d ireita


tiveram a tentaçã o d e integrar as paróquias no sistem a ad m inistrativo.
Mas a resistência passiva d os povos, que levava à nã o realizaçã o d e elei-
ções para m uitas juntas, os conflitos a que os novos órgã os d eram origem e
a d ificuld ad e d e encontrar cid ad ã os capazes d e preencher os car gos
electivos, fizeram com que em 1840 as freguesias perd essem esse novo es -
tatuto.
A reorganizaçã o d o Estad o português d urante a Revoluçã o Liberal
foi inspirad a, claram ente, pelo m od elo francês e, em certos m om entos, pela
experiência espanhola. A relaçã o estabelecid a com as elites locais, a partir
d a d écad a d e 1830, salvaguard ad as as d evid as d iferenças, aproxim ou es-
tes três casos d o m od elo inglês. N o entanto, a evoluçã o portuguesa carac-
teriza-se por algum a originalid ad e, sobretud o no que respeita ao m unicí -
pio.
Em vá rios aspectos d o processo d escrito, a continuid ad e e a m u-
d ança face ao Antigo Regim e estã o associad as. Isto é verd ad e a respeito
d a red efiniçã o d o espaço, que constitui um d os grand es legad os d a Revolu -
çã o Liberal. Essa red efiniçã o representou um a ruptura com os quad ros es -
paciais anteriores, m as m anteve d ois traços caracterí sticos d a evoluçã o
histórica nacional. Por um lad o, continuaram a nã o existir fortes pod eres
regionais. De facto, o d istrito foi um a instâ ncia d e afirm açã o d o pod er cen -
tral ou, quand o m uito, d e negociaçã o entre o centro e a periferia e, salvo a
curta experiência d e 1878-1892, nã o representou um espaço d e autonom ia.
Por outro lad o, à custa d e um a d olorosa intervençã o, a Revoluçã o Liberal
viabilizou a persistência d e um a red e d e concelhos que, d e acord o com as
caracterí sticas próprias d e cad a época, com m aior ou m enor vitalid ad e,
constituiu a expressã o d a vid a local.

Conclusã o 133
Anexo I
Metodologia de elaboraçã o das cartas geográ ficas

Tratamento das fontes

Com o explicá m os na introd uçã o, neste trabalho procurá m os reconsti-


tuir a d ivisã o ad m inistrativa em 1826, 1834 e 1842. A justificaçã o d a esco-
lha d estes anos foi aí igualm ente exposta.
As fontes cartografad as estã o ind icad as na bibliografia, na rubrica
Fontes bá sicas sobre a divisã o do território. Com o tivem os ocasiã o d e referir no
texto, estas e outras listas publicad as na época contêm falhas, por vezes
explicitam ente ad m itid as. Send o assim , acrescentá m os ao d ecreto d e 3 d e
Junho d e 1834 vinte e oito freguesias que existiam em 1801 ou 1826 e, d e
novo, em 1836. Dezassete d estas constituí am d ois concelhos inteiros, Vila
Chã e Albergaria, proví ncia d o Minho. Tratava -se, assum im o-lo, d e om is-
sões. 1
Em relaçã o à lista d e 1826, lim itá m o-nos a acrescentar a freguesia d e
Sabóia, concelho d e Od em ira, que figurava no censo d e 1801 e no d ecreto
d e 6 d e N ovem bro d e 1836, e S Juliã o d a Barra, concelho d e Oeiras. Por ou -
tro lad o, d e m od o a garantir a equivalência em relaçã o à lista d e 1834, as
freguesias d e S And ré e S Marinha, e S Tiago e S Tom é, concelho d e Lisboa,
que em 1826 estavam tod as separad as, m antiveram -se unid as d uas a
d uas. Já as freguesias d e Barã o d e S Miguel e Bud ens, concelho d e Lagos,
que estavam unid as em 1826, ficaram separad as.
Em relaçã o à lista d e 1842 nã o proced em os a qualquer correcçã o.

1 O d ecreto d e 6 d e N ovem bro d e 1836, por exem plo, ad m ite ter om itid o freguesias. Sobre
a d ificuld ad e d e tratam ento d este tipo d e fontes, d ad as as falhas que contêm , ver Fausto J. A.
d e Figueired o - A Reforma Concelhia de 6 de N ovembro de 1836.

Anexos 137
SILVEIRA

A ortografia d os nom es foi actualizad a, send o usad as algum as abre -


viaturas: N (N osso ou N ossa); S (Santa, Santo ou Sã o), Sª (Senhora).
Quand o a grafia d a fonte suscitava d úvid as seguiu -se a actual.

Metodologia de elaboraçã o das cartas

O objectivo d este trabalho, convém record á -lo, nã o consistia som ente


em d esenhar os m apas d a d ivisã o ad m inistrativa antes e d epois d a
Revolu çã o, m as tam bém em estabelecer a ligaçã o entre eles, d e form a a
obter um a base d e representaçã o com um (veja -se o que se d isse na
introd uçã o).
O sistem a inform á tico concebid o assenta no m od elo relacional d e
base d e d ad os, no qual um a d as tabelas, que correspond e à d ivisã o ad m i-
nistrativa d e 1991, estabelece a ligaçã o com o ficheiro grá fico. Este ficheiro
contém a inform açã o que perm ite d esenhar as freguesias actuais e foi pro -
d uzid o pelo CN IG (Centro N acional d e Inform açã o Geográ fica). 2
Ad optá m os a freguesia com o unid ad e bá sica e com eçá m os por pre-
encher as d iferentes tabelas d a organizaçã o ad m inistrativa referentes aos
anos d e 1826, 1834 e 1842, nas quais cad a registo correspond e a um a fre -
guesia a que foi atribuí d o um cód igo próprio. Utilizand o o nom e d a paró-
quia, o passo seguinte consistiu na aná lise d as vá rias tabelas com o fim d e
d efinir as relações possí veis e, consequentem ente, a form a d e estabelecer a
ligaçã o entre elas, a qual se efectua através d os cód igos d e registo.
Com o a figura seguinte m ostra, as tabelas d e 1826 e 1834 têm um a
relaçã o d e um para um (o que significa que um a freguesia d e 1826 corres -
pond e a um a freguesia d e 1834 e vice-versa); am bas e a d e 1842 apresen-
tam um a relaçã o d e m uitos para um (o que quer d izer que vá rias freguesias
d e 1826, por exem plo, pod em correspond er a um a freguesia d e 1842 e um a
freguesia d este ano pod e correspond er a vá rias d e 1826); finalm ente, as ta -
belas d e 1826, 1834 e 1842 apresentam um a relaçã o d e m uitos para m uitos
com a d e 1991 (ou seja, um a freguesia d e 1826 p od e equivaler a m uitas

2 Divisã o d o Atlas d o Am biente - Carta A dministrativa de Portugal, Versã o 2, 1991, carta


d igitalizad a pelo Centro N acional d e Inform açã o Geográ fica.

138 Anexos
TERRITÓRIO E PODER

freguesias d e 1991 e vice-versa). Este facto levou -nos a criar m ais três tabe-
las para as interligar.

Relaçã o entre as tabelas da base de dados

A ligaçã o entre as tabelas d e 1826, 1834 e a d e 1991 foi feita m a -


nualm ente. A ligaçã o entre a d e 1842 e a d e 1991 foi efectuad a pelo pró-
prio sistem a e posteriorm ente corrigid a.
A possibilid ad e d e ligar a tabela d e 1991 à s restantes, d epois d e al-
gum tratam ento d e d ad os para red esenhar os lim ites ad m inistrativos, per-
m itiu -nos prod uzir os d iferentes m apas para os d iferentes anos. Por ou tro
lad o, as ligações entre as vá rias tabelas tornam possí vel a perm uta d e in -
form açã o ao ní vel d as freguesias, a sua posterior agregaçã o em unid ad es
ad m inistrativas d e m aior d im ensã o e, d e seguid a, a sua representaçã o car -
tográ fica. As á reas foram calculad as pelo Sistem a d e Inform açã o Geográ -
fica (SIG).
Usá m os o Microsoft Access com o base d e d ad os e o Arc Cad com o
softw are d e SIG.

Anexos 139
SILVEIRA

Problemas

O m étod o seguid o baseia-se na reconstituiçã o d as freguesias antigas


a partir d as actuais, partind o d o pressuposto d e que a freguesia é um a
unid ad e relativam ente está vel, seguram ente a m ais está vel d e tod as, com o
tivem os ocasiã o d e m ostrar no texto. 3 H ouve evid entem ente fenóm enos d e
reuniã o e d ivisã o d e freguesias, m as a reorganizaçã o d o espaço, na m aior
parte d os casos, respeitou a integrid ad e d estas form as bá sicas d e organi-
zaçã o d o território e processou -se através d a sua transferência entre con -
celhos ou outras unid ad es ad m inistrativas d e m aior d im ensã o.
Os problem as com que nos d efrontá m os prend em -se, essencialm ente,
com a reconstituiçã o d a evoluçã o d as freguesias: m uitas m ud aram d e nom e
ao longo d o tem po e, acim a d e tud o, no perí od o d e cerca d e 150 anos que
m ed eia entre a tabela m ais antiga e a m ais recente, m uitas outras se fund i -
ram ou foram d ivid id as. Procurá m os ultrapassar estas d ificuld ad es, recor -
rend o a fontes d iversas.4
Os resultad os alcançad os contêm d iferentes tipos d e erros, a que já
fizem os referência ao longo d este texto. Sabem os que algum as freguesias
que aind a hoje existem pod em ter m ud ad o os seus lim ites territoriais ao
longo d a época estud ad a. Atend end o à s pequenas d im ensões d as unid a-
d es a que nos referim os, resolvem os d esprezar essas alterações e assum ir
que constituem um a falha d o nosso trabalho. Por outro lad o, utilizand o o
m apa d igitalizad o d e 1991, é im possí vel d esenhar as fronteiras d as paró-
quias que existiam no século passad o m as que, entretanto, foram agrega-
d as a outras. Finalm ente, há freguesias actuais em relaçã o à s quais nã o
conseguim os estabelecer equivalência no passad o e existem freguesias anti-
gas cujo d estino ignoram os. Com excepçã o d o prim eiro tipo d e problem as,
com o m ostrá m os ao longo d o texto, é possí vel quantificar o ní vel d e erro e
m esm o cartografar alguns d eles.

3 O m étod o retrospectivo foi igualm ente usad o noutros trabalhos d e cartografia h istórica.
Ver a sua ind icaçã o na nota 2 d a introd uçã o.
4 Ver na bibliografia a ind icaçã o d as Obras de Referência sobre a Evoluçã o do Território.
O anexo ao d ecreto d e 6 d e N ovem bro d e 1836 foi um auxiliar precioso para a com pre ensã o
d a transform açã o operad a neste ano ao ní vel d os concelhos. Em certos casos, consultá m os
aind a trabalhos especí ficos sobre algum as localid ad es, os quais estã o igualm ente cita d os na
bibliografia.

140 Anexos
TERRITÓRIO E PODER

Anexo II
A qualidade dos dados do censo de 1828

Desd e há bastante tem po que se conhece o m apa n.º 1, anexo ao d e -


creto eleitoral d e 3 d e Junho d e 1834, contend o “ os Concelhos, Paróquias e
núm ero d e ind iví d uos d e cad a um a, segun d o os recenseam entos enviad os à
Com issã o d e Estad í stica, pelos respectivos Pá rocos, até ao ano d e 1828” . 5
N o entanto, nã o só Joel Serrã o, na sua com pilaçã o d e fontes d e cará cter
d em ográ fico, nã o o cita, com o ele tem sid o ignorad o nos trabalhos sobre a
populaçã o d esta época.6
Com o é sugerid o pelo respectivo tí tulo, os d ad os contid os neste
m apa terã o resultad o d e um recenseam ento eclesiá stico realizad o até 1828,
provavelm ente no â m bito d os trabalhos d as Cortes constitucionais até en-
tã o reunid as. A d espeito d e um a busca realizad a no Arquivo H istórico
Parlam entar, nã o encontrá m os os originais d este recenseam ento, nem tã o -
-pouco sabem os as cond ições em que foi realizad o. Os seus d ad os sã o, no
entanto, d o m aior interesse, já que nã o se conhecem para estes anos outras
fontes que especifiquem o núm ero d e ind iví d uos ao ní vel paroquial.
N os term os d escritos, nã o é fá cil proced er a um a crí tica d esenvolvid a
d o d ocum ento. Aind a assim , algum as observações sã o possí veis. O m apa
referid o contém d uas lacunas essenciais: n ã o ind ica a populaçã o d as paró-
quias urbanas d o Porto e d e Lisboa. A ausência d e inform açã o sobre as
prim eiras é justificad a em nota com a inexistência d os respectivos origi-
nais. Quanto a Lisboa, é-nos d ito, tam bém em nota, que o “ Recenseam ento
ind ivid ual fornecid o pelos Mapas d as Paróquias é excessivam ente d im i-
nuto por efeito d e m uitas causas que tend em a prod uzir um sem elhante re -
sultad o nas grand es Cid ad es” . Assim send o, no anexo ao d ecreto optou -se

5 Fausto J. A. d e Figueired o, por exem plo, refere-o em A Reforma Concelhia de 6 de N ovem-


bro de 1836.
6 Joel Serrã o - Fontes de Demografia Portuguesa 1800-1862, Lisboa, Livros H orizonte, 1973;
Maria Lu í s Rocha Pinto e Teresa Rod rigues - A Evoluçã o d a Populaçã o Portu guesa ao
Longo d o Século XIX - Um a Perspectiva Global, in Forum Sociológico, n.º 3, 1993, pp. 145-172.

Anexos 141
SILVEIRA

por nã o se ind icar d etalhad am ente o núm ero d e ind iv í d uos d e cad a fre-
guesia d e Lisboa, apresentand o-se antes um a estim ativa para o conjunto
d a cid ad e, basead a nos nascim entos d e um quinquénio.
Estes d ois casos põem -nos d e sobreaviso quanto à qualid ad e d o re-
censeam ento efectuad o: há originais que se perd eram ; há inform ações
pouco exactas. Contud o, a atitud e assum id a em relaçã o à capital m ostra
tam bém que houve um certo cuid ad o aquand o d a publicaçã o d os núm eros,
preferind o-se apresentar um d ocum ento com lacunas a um d ocum ento com
d ad os que na altura pareciam suspeitos. A realizaçã o d as eleições, para as
quais a inform açã o d em ográ fica era fund am ental, aconselhava prud ência.
Por outro lad o, a leitura d o m apa m ostra que o núm ero d e ind iví d uos
nã o resulta nem d e um cá lculo arred ond ad o, nem d e um a m ultiplicaçã o d o
núm ero d e fogos por um coeficiente.
Finalm ente, a com paraçã o d os d ad os referentes a 1828 com os d o
M apa da Populaçã o do Reino de Portugal em 1820 (quad ro XXVIII), aponta no
sentid o d a verosim ilhança d os núm eros cuja qualid ad e tem os estad o a co -
m entar. A evoluçã o d o conjunto d a populaçã o portuguesa, na prim eira m e -
tad e d o século XIX, está praticam ente por estud ar. Os únicos d ad os segu -
ros que possuí m os referem -se a 1801 e resultam d o trabalho d e Fernand o
d e Sousa. Para os anos posteriores pouco m ais se tem feito d o que repro -
d uzir as inform ações d a época. Os elem entos d isponí veis sugerem um a
quase estagnaçã o ou, quand o m uito, um crescim ento lento d a populaçã o
d o continente: em 1801 haveria 2 912 673 ind iví d uos; em 1820, 3 013 900;
em 1835, 3 061 684. Os 3 006 045 d e 1828, núm ero a que se chega d epois
d e suprid as, d e form a rud im entar (ver nota ao quad ro XXVIII), as lacunas
d o recenseam ento d este ano, nã o d estoam d esta evoluçã o. 7

7 1801: Fernand o d e Sousa - A Populaçã o Portuguesa nos Iní cios do Século X IX ; 1820: A l-
manaque Português, Lisboa, 1826, pp. 1-5; 1835: Joel Serrã o – Fontes de Demografia Portugue-
sa, p. 122.

142 Anexos
TERRITÓRIO E PODER

Quad ro XXVIII
Comparaçã o dos dados dos censos de 1820 e 1828
Proví ncia N .º freguesias Indiví duos
1820 1828 1820 1828 1828-1820
Alentejo 368 368 289640 291490 1850
Algarve 66 67 113600 105976 -7624
Beira 1261 1251 904270 933339 29069
Estrem ad ura 475 472 652490 456178 -196312
Minho 1230 1231 750820 720684 -30136
Trá s-os-Montes 701 699 267750 269513 1763
Total 4101 4088 2978570 2777180 -201390
—————————————————————————————————————

Fontes: Censo d e 1820 - A lmanaque Português, Lisboa, 1826, pp. 1-5. Censo d e 1828 -
Decreto d e 3 d e Junho d e 1834, Mapa n.º 1, in An tónio Delgad o d a Silva - Colecçã o da
Legislaçã o Portuguesa desde a última Compilaçã o das Ordenações. Legislaçã o de A gosto de 1833
a Dezembro de 1834, Lisboa, 1837, pp. 472-589.
N ota: Para que esta com paraçã o fosse possí vel, os d ad os d o recen seam ento d e 1828,
publicad os d e acord o com a d ivisã o ad m inistrativa d e 1834, foram rea grupad os segund o a
d ivisã o ad m inistrativa d e 1826, a qual servira igualm ente d e base à publicaçã o d o censo d e
1820. N o entanto, com o se pod e ver, há d ivergência no total d e freguesias. N o quad ro nã o
foi consid erad a a correcçã o introd uzid a aquand o d a publicaçã o d o censo d e 1820, referente
à tropa d e linha, religiosos e religiosas, 35 330 ind iví d uos no total, por nã o estar d istribuí d a
geograficam ente. A transposiçã o d a inform açã o d o recenseam ento d e 1828 d e um a para
outra d as d ivisões ad m inistrativas provocou um a perd a d e 11 376 ind iví d uos,
correspond end o a 0,4% d o total entã o apurad o (2 788 556).
Repare-se que o recenseam ento d e 1828 nã o inclui os ind iví d uos d as paróquias urbanas
d o Porto e d e Lisboa. Se aos 2 788 556 habitantes subtrairm os os d o term o d o Porto (10 900)
e d e Lisboa (41 611) e lhe ad icionarm os a populaçã o d os d ois concelhos em 1820 (60 000 no
caso d o Porto e 210 000, no d e Lisboa), obtem os um total d e 3 006 045 ind iví d uos em 1828.

Anexos 143
SILVEIRA

Anexo III
Legislaçã o sobre a divisã o do território
(1832-1840)

Decreto d e 16 d e Maio d e 1832 Estabelecend o o princí pio d a d ivi-


sã o d o território em proví n cias,
com arcas e concelhos (referen -
d ad o por Mouzinho d a Silveira)

Decreto d e 28 d e Jun. d e 1833 Estabelecend o a d esignaçã o e o


núm ero d as proví ncias, com arcas
e concelhos e ord enand o um a no-
va d em arcaçã o d estes últim os (re-
latório assinad o por Câ nd id o José
Xavier, d ecreto referend ad o por
tod os os m inistros)

Decreto d e 28 d e Dez. d e 1833 Criand o a paróquia d e Belém na


cid ad e d e Lisboa (referend ad o
por José d a Silva Carvalho)

Decreto d e 3 d e Jun. d e 1834 Decreto eleitoral especificand o as


freguesias pertencentes a cad a um
d os concelhos d esignad os no d e-
creto d e 28 d e Junho d e 1833 (re-
ferend ad o por Bento Pereira d o
Carm o)

Carta d e Lei d e 25 d e Abril d e 1835 Estabelecend o a d ivisã o d o ter-


ritório em d istritos e concelhos e
prevend o a possibilid ad e haver
um a junta d e paróquia em cad a
freguesia

144 Anexos
TERRITÓRIO E PODER

Decreto d e 18 d e Jul. d e 1835 Regulam entand o a Lei anterior.


Estabelece a existência d e d istri-
tos, concelhos e freguesias. De-
clara que o núm ero d e concelhos e
freguesias será oportunam ente re-
gulad o (referend ad o por Rod rigo
d a Fonseca Magalhã es)

Decreto d e 15 d e Dez. d e 1835 Transferind o a capital d o d istrito


d e Lam ego para Viseu (referen -
d ad o por Luí s d a Silva Mouzinho
d e Albuquerque)

Decreto d e 6 d e N ov. d e 1836 Proced end o à d em arcaçã o d os


concelhos (referend ad o por
Manuel d a Silva Passos)

Carta d e Lei d e 28 d e Abril d e 1837 Alterand o a d ivisã o d o território


prevista no d ecreto d e 6 d e N o-
vem bro d e 1836

Carta d e Lei d e 12 d e Jun. d e 1837 Id em

Carta d e Lei d e 4 d e Jul. d e 1837 Id em

Carta d e Lei d e 27 d e Set. d e 1837 Id em

Carta d e Lei d e 7 d e Out. d e 1837 Id em

Carta d e Lei d e 22 d e Dez. d e 1837 Id em

Carta d e Lei d e 2 d e Jan. d e 1838 Id em

Carta d e Lei d e 22 d e Fev. d e 1838 Id em

Carta d e Lei d e 17 d e Abril d e 1838 Id em

Carta d e Lei d e 29 d e Out. d e 1840 A freguesia d eixa d e fazer parte


d a organizaçã o ad m inistrativa

Anexos 145
Fontes
Manuscritas
A rquivo Histórico do M inistério das Obras Públicas
Com issã o Encarregad a d e Prop or o Plano d a N ova Divisã o Eclesiá stica e
Ad m inistrativa. Map a Alfabético d as Fregu esias d o Continente d o Reino con-
form e a N ova Divisã o Territorial Civil, Ju d iciá ria, Eclesiá stica e Militar, com
referência ao Sistem a Antigo [até Od eleite], caixa 6

A rquivo N acional da Torre do Tombo


Ministério d o Reino, A. S. E., m aço 1941

Impressas

Cartas geográ ficas

Câ mara Municipal de Lisboa - Freguesias de Lisboa, 1990, escala 1:10 000


Câ mara Municipal de Lisboa - Freguesias de Lisboa anterior em 1958 [sic],
1995, escala 1:10 000
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