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O conceito de catarse é central para a arte, pois talvez ele seja um divisor de
águas entre o que seja arte e o que seja puro entretenimento. Aquilo que é
catártico mexe com o espectador, transforma-o, e por isso mesmo permanece
além do seu tempo e ultrapassa seu espaço. As tragédias de Shakespeare, por
exemplo, são referências até hoje pela capacidade que elas têm de emocionar,
de criar essa purificação.
Por definição, catarse refere-se à purificação das almas por meio de uma
descarga emocional provocada por um drama. É aquele choro - por vezes
convulsivo, em outras represado - que você tem no final de uma história, o
grito em determinadas cenas, a angústia que uma história desperta.
A catarse trabalha com uma lógica muito usada na psicanálise para lidar com
medos: a purgação. Ao invés de esconder e reprimir o medo, os psicanalistas
acreditam que devemos tirá-lo de dentro de nós, purgando-o, assim como
antigamente as pessoas tomavam purgantes e faziam sangramentos para "tirar
a doença de dentro do corpo". Assistir a uma tragédia, sentir a tensão e o
medo seria uma forma de purgar tais sentimentos, purificando nossas almas.
Muitos anos depois Edgar Allan Poe, ao abordar o efeito como primeira
consideração para a escrita de um conto, retoma o conceito aristotélico, ainda
que o desvincule da tragédia, ampliando o conceito para outros efeitos que
não apenas o de catarse.
Com o passar dos anos, a sociedade passou a se sentir mais protegida, e não
faria sentido lembrar de graves dramas como mortes, assassinatos, traições,
por vezes envolvendo inclusive crianças. Talvez por isso quando Walt Disney
começou a adaptar os contos tradicionais dos irmãos Grimm, fez uma enorme
alteração no tom e nos finais. Apenas para dar um exemplo, em João e Maria
eles não se perdem na floresta: eles são deixados para morrer de fome pela
própria mãe. E não uma, mas duas vezes! Em Cinderela, as irmãs cortam
partes de seus pés para que o sapato do príncipe pudesse entrar nelas.