Você está na página 1de 181

Copyright © 2023 Grupo Editorial Portal

Capa
Dennis Romoaldo

Diagramação
Mylene Ferreira

Revisão
Sônia Carvalho

Livro Digital
1ªEdição
Isabela M.O.T

Todos os direitos reservados.


É proibido o armazenamento ou a reprodução de qualquer parte desta obra,
qualquer que seja a forma utilizada – tangível ou intangível, incluindo
fotocópia – sem autorização por escrito do autor.
Esta é uma obra de ficção. Nomes de pessoas, acontecimentos e locais que
existam ou que tenham verdadeiramente existido em algum período da
história foram usados para ambientar o enredo. Qualquer semelhança com a
realidade terá sido mera coincidência.
Sumário
Dedicatória
Sinopse
Capítulo 01
Capítulo 02
Capítulo 03
Capítulo 04
Capítulo 05
Capítulo 06
Capítulo 07
Capítulo 08
Capítulo 09
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
(14 anos atrás)
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Epílogo
Agradecimentos
Leia Também:
Dedicatória
A todas as mulheres que reúnem forças o suficiente para cortarem as
cordas com que pessoas maliciosas tentam amarrá-las para as controlarem.
Vocês são inspirações e merecem companheiros, não donos.
Sinopse
Yakov Dobrow é um líder Vor leal ao seu Pakhan, que é obrigado a
se casar com a única filha e a herdeira da máfia russa Zhertva. Ele enxerga
o futuro matrimônio como uma missão, mas conforme os dias passam e a
convivência com sua noiva se torna mais próxima, as certezas do soldado se
dissolvem e ele descobre estar envolvido em um esquema de manipulação
perversa, misturado a forte atração que sente pela criatura que o fascinou.
Seria a herdeira uma inimiga com truques de sedução para fazê-lo se
render às suas vontades?
Alya Semyonova Rurik aceitou seu destino desde pequena, a mulher
de olhos de tigre e rosto de anjo retornou ao seu lar com um noivado que
ela desconhecia, mesmo assim decidiu acatar os desejos de seu pai. A
promessa de ser a nova Pakhan, e a primeira a assumir tal poder, dependia
de um casamento arranjado e ela precisava enfrentar a descrença de seus
aliados e o fervor de seus inimigos... até daqueles que dormiam na mesma
casa.
Age gap + casamento de conveniência + stranger to love.
Capítulo 01

Olhos de tigre em um rosto de anjo.


Foi assim que a enxerguei em um átimo de segundo, em meio a
corpos jogados no chão e o sangue escorrendo de sua mão para a pequena
adaga que ela segurava firme. Não tremia, sequer podíamos ouvir sua
respiração, seu rosto também foi manchado com o tom vermelho carmesim.
Realmente, o sangue é mais denso do que a água. Ali eu tive a
versão feminina do nosso Pakhan, a única herdeira que foi sequestrada na
noite anterior, enquanto retornava à sua casa de infância. Seu caminhar a
trouxe para nós, ninguém ousou dizer nada, todos completamente
extasiados pela forma pequena, mas tão severa daquele anjo da morte.
— Nome? — perguntou-me sem me encarar.
— Dobrow, Yakov Dobrow, senhorita Rurik.
— Vor[1] ou conselheiro? — Finalmente me encarou, após limpar
sua adaga em uma parte rasgada de seu vestido preto.
— Vor, sou o líder direto.
Ela assentiu devagar, ergueu seu vestido expondo o início de sua
coxa direita, onde tinha o suporte da sua pequena adaga, a guardou
tranquilamente e depois sorriu.
— Espero que meu pai não esteja aborrecido com a demora.
Por um momento, pensei ter sido uma miragem a visão daquela
mulher diante de tanto sangue e inimigos, observando os arredores como
um felino em caça. Aquela que sorria parecia completamente diferente.
— Claro que não, senhorita Rurik. O Pakhan a aguarda.
Rapidamente sinalizei para que trouxessem algum lençol ou coberta
que estivesse no carro para o resgate, o soldado lhe entregou, ela apenas se
enrolou no pano e seguiu caminhando para se acomodar no banco traseiro.
Antes que ela fechasse a porta eu segurei e me abaixei analisando-a um
pouco mais.
— Não há ferimentos? — questionei preocupado.
Se a herdeira surgisse diante de seu pai, depois de anos afastada
estudando, com qualquer ferimento devido a seu sequestro relâmpago,
todos nós corríamos risco de morte. Era inadmissível tal situação. Aqueles
que estavam no aeroporto preparados para recepcioná-la já não respiravam
por sua falha brusca ao perderem a princesa dos Zhertva, e por isso,
andávamos na corda bamba.
— Fique tranquilo, soldado. Não permitiria chegar tão longe.
Fechei a porta e segui para o banco do passageiro, dando sinal para
que o motorista desse a partida. Ela se deitou e acompanhei cada
movimento pelo espelho retrovisor.
— Descansarei um pouco, avise-me quando chegarmos em casa.
— Sim, senhorita!
Aquela realidade soava distante para todos os meus homens, no
entanto, convivendo com o nosso Pakhan, percebi o seu afeto por sua única
filha. Ele não a enxergava como uma mulher a ser trocada em algum acordo
proveitoso para a máfia. Alya era a princesa que tomaria posse de seu trono
quando fosse a hora, um arranjo perigoso e que arrecadou muitos desafetos.
Mudar a estrutura de uma organização tão grande e poderosa era arriscado,
ele tinha completa noção disso, então por que seria estúpido de criar uma
mulher frágil e cega sobre os acontecimentos da organização?
Poupá-la dessa vida só lhe traria problemas, a garota seria
dependente de seu pai, fraca nas decisões e fácil de manipular. Mas, se
treinada devidamente, se tornaria a arma perfeita. Astuta com uma
inteligência única, forte o suficiente para se livrar de problemas e ágil com
objetos que lhe trariam vantagens, ao mesmo tempo que linda e sutil, com
um sorriso que convenceria qualquer um a se ajoelhar diante de seus pés.
A princesa dos Zhertva carregava a beleza de sua mãe e a fúria de
seu pai, porém, existia algo que não me deixava relaxar, sussurrando ao pé
do meu ouvido que eu deveria me manter em alerta quanto a ela. Talvez a
filha fiel e que nutria admiração pelo seu querido pai, não fosse mais a
mesma, a responsabilidade jogada em suas costas pesaria em algum
momento de sua vida, e como ela lidaria com o fato de ter conhecido o
mundo e de repente precisar retornar para ser presa a uma função que não
desejou para si?
Com esses pensamentos, chegamos à mansão dos Rurik, ninguém
veio recebê-la na porta, nem mesmo os empregados. Alya saiu do carro
assim que indiquei nossa chegada, eu a segui como forma de prevenção,
vendo seus cabelos loiros esvoaçarem com a brisa leve de fim de tarde, em
um outono ainda tímido. Sua pele era clara como a de seu pai, mas todo o
resto pertencia à sua bela mãe.
A frieza daquele dia não começou quando ela abriu a porta do carro,
mas sim, quando ela olhou de um lado a outro no hall de entrada de sua
casa de infância e não encontrou nem mesmo uma alma caminhando ao
redor. Seu sorriso se esticou de maneira travessa e seus pulmões foram
esvaziados sem qualquer delicadeza.
— Pode se retirar, soldado. Finalmente, estou de volta onde
pertenço.
Sem olhar para trás, ela seguiu escada acima, provavelmente para
seu quarto.
Uma vez escutei que os tigres eram fraternais com seus irmãos e
filhotes apenas até a idade adulta, depois que eles aprendiam a caçar e como
se manter na vida selvagem, seguiam caminhos separados e não ousavam
invadir o território um do outro, pois seria carnificina na certa. O sorriso de
Alya ao pôr os pés dentro da mansão dos Rurik me fez imaginar um tigre
branco com manchas negras caminhando pelo território onde um dia foi
amado por seus pais, esperando pelo momento que teria de enfrentá-los
para dominar tudo que lhe pertenceu.
Minha missão era proteger o Pakhan, fosse de seus inimigos ocultos
ou sua própria família. Aquela mulher tinha o sangue Zhertva, mas somente
Deus poderia dizer se a alma também.

**
O escritório parecia menor e mais sufocante do que a última vez que
estive aqui, a poltrona grande se esquentava ao meu redor e o olhar escuro
de Semyon me fazia questionar o motivo de estarmos tão quietos, mesmo
que tenha sido ele quem mandara me buscar para uma conversa. A porta
rangeu indicando mais um visitante, e antes que eu pudesse virar meu rosto,
escutei os passos de um salto batendo contra o piso frio e o olhar do meu
Pakhan saiu do modo inexpressivo para algo radiante.
— Alya, sente-se, querida! — Ele indicou a poltrona ao lado da
minha, bastou que ela se acomodasse para ele retornar ao modo negociador,
ajeitando-se e voltando a me encarar. — Podemos começar agora, já que
todas as partes interessadas estão aqui.
Não entendia a urgência dessa reunião, muito menos o porquê de
nós dois precisarmos estar presentes. Minha função era simples e eu a
cumpria com louvor sempre. Odiava ter olhos mirando-me o tempo todo, as
ordens vinham e iam através de mensagens codificadas e apenas isso me
bastava.
Na máfia todo cuidado é pouco, ainda mais quando nosso líder
altera, sem se importar com a opinião geral, a estrutura das negociações.
Semyon se desvinculou dos Bratva exatamente para enterrar essa visão de
gângsters sanguinários que foi associada a eles. Apesar de sabermos como
agir em situações extremas, ele passou a priorizar uma boa conversa regada
a favores e vantagens. Zhertva deixou de ser uma rede oculta com capangas
mal-encarados e tornou-se uma grande empresa de construção com bons
acordos políticos e empresariais.
A corrupção ainda circulava pelas entranhas do seu negócio, assim
como a venda de drogas e armas, porém, com muito mais cuidado e
organização, procurando sempre manter a situação apaziguada.
Nem todos gostaram disso, os mais velhos preferiam a velha mão de
ferro, somente desse jeito eles se sentiam no controle de algo, tratando a
todos abaixo deles como lixo e, sem perceber, conseguindo mais inimigos
dentro de seu próprio meio.
Semyon floresceu onde eles cuspiam, negligenciando seus soldados,
violando suas mulheres e marcando o corpo de crianças sem qualquer pena.
Foi através das dores dessas pessoas que meu Pakhan conseguiu formar
uma família segura, implacável e com boas relações. As formigas operárias
finalmente enxergaram suas forças e dedicações e resolveram trocar seus
reis e rainhas, entregando-as nas mãos de um Rurik jovem e ganancioso,
mas que nunca se esqueceu de seus operários.
Eu não fantasiava com um líder perfeito, sabia o quanto sua mão
poderia ser pesada e que segundas chances não faziam parte da sua vida,
mas ainda assim ele era melhor do que o lixo anterior. Por isso, seria
sempre grato e leal ao meu Pakhan, pois, encontrar alguém com o mínimo
de decência nesse mundo sujo era quase impossível.
Enquanto as palavras escapavam de seus lábios, firmes e afiadas
como a adaga que vi sua filha empunhar, eu me perguntava o motivo de ter
sido escolhido para aquele arranjo. Um relancear para o lado e encontrei a
postura ereta da herdeira mais cobiçada de toda a Rússia, seus lábios
comprimidos e o olhar tão indiferente que, mesmo sendo de cores
diferentes, lembrava demais o de seu pai.
— Não entendo, por que eu? — perguntei quando ele se calou.
— Por que não, Yakov?
Ele sabia os vários motivos que impediam tal loucura. O sorriso
ladeado e carregado de maldade me dizia algo como: “ouse dizer em voz
alta”.
— Sou apenas um Vor, creio que sua filha concorda que não serei de
grande utilidade...
— Na verdade, confio nas decisões do meu pai. — Ela sobrepujou
minha fala. — Ele não entregaria sua única filha a um louco inconsequente.
— Continuo sendo um Vor, mesmo que o líder, não passo de um
soldado.
— Seja mais gentil consigo, Yakov — Semyon se ergueu,
aproximando-se e ficando entre nós, de pé.
Era dessa forma que ele demonstrava um pouco mais de sua
superioridade. Ainda que parecesse brando em vista de outros Pakhan e
líderes, era tão feroz quanto. Ele preferia não derramar sangue, no entanto,
não se negava a fazê-lo se preciso. A hierarquia ainda importava e isso
significava jamais desrespeitar sua autoridade.
— Minha filha será a rainha deste castelo quando chegar a hora, não
tenho qualquer intenção de usá-la como moeda de troca. — Franzi o cenho.
— Não estou procurando um idiota arrogante, e sim um bom homem que
possa caminhar ao seu lado e a proteger se for necessário.
Certo. Começava a desenhar suas intenções em minha mente. Talvez
ambos acreditassem que seria fácil me manipular a ponto de não ser um
risco para o seu comando, de qualquer forma, nunca tive a ambição de
ascender como Pakhan, porque era o tipo de responsabilidade que nunca
desejei. O único problema consistia em fazê-lo dentro de uma união
matrimonial, conseguiria proteger a herdeira como guarda-costas, não
existia necessidade para tal aprisionamento entre nós.
Jamais daria a Alya o amor que ela merecia.
— Acredito que posso cuidar do bem-estar da senhorita Rurik sem
necessariamente me casar com ela.
Um toque gentil em meu braço me fez encará-la curioso, ela
inclinou a cabeça e ergueu um pouco suas sobrancelhas. O rosto de um
anjo, tingido com algumas sardas em seu nariz e bochechas.
— Minha aparência não te agrada, soldado?
Aquela pergunta me paralisou. Como ela poderia dizer algo do tipo?
E na frente de seu pai?
— Claro que... claro que agrada, quer dizer, senhorita Rurik, não
tem nada a ver com isso. — Eu simplesmente não conseguia desviar o
olhar.
— Não será difícil estar ao meu lado e além de me proteger, quero
que me satisfaça. Somos uma família cheia de superstições e não quebrarei
nenhuma delas. — Sorriu de canto, o olhar ficando mais doce à medida que
seu toque deslizava delicadamente por meu braço, esquentando e tornando-
me consciente de seus movimentos. — Você também me agrada, Senhor
Dobrow.
De repente me tornei ciente da presença de seu pai naquele
escritório e me ajeitei, afastando-me delicadamente dela e voltando a
encará-lo. Ele não parecia desagradado com a situação, porém não abusaria
da sorte.
— Yakov, se estiver com medo de algo e precisar de garantias,
estamos dispostos a fazer um contrato com cláusulas de segurança para
você, não haverá um prazo, mas os dois estão livres para debaterem sobre
um possível divórcio.
O contrato era para me assegurar, mas pelo seu tom de voz e olhar,
não existia uma chance para negar seu “pedido”. Eu, um mero soldado, me
casaria com a princesa da máfia russa, a mulher que foi estudar fora do país,
aprendeu mais de dois idiomas e é cobiçada por sua beleza e importância.
Seria isso sorte ou revés?
Não importava mais, o jogo havia começado entre os dois, as cartas
foram lançadas e eu só estava na mesa, sem saber o quanto valia e nem a
quem pertencia, torcia para que ambos estivessem do mesmo lado.
Capítulo 02

O cheiro que se espalhava no ar me lembrava da infância, uma em


que aproveitei cada segundo, pois desde que nasci fui destinada a algo que
me ultrapassaria conforme os anos. Saber aproveitar esses momentos foi o
grande ponto de viver nessa casa, sorri enquanto meus dedos deslizavam
pela parede em tom marfim, nada extravagante, ela odiava chamar a
atenção.
Parei quando sua silhueta se tornou aparente, uma forma esguia e
carregada de elegância parada diante da vidraça ao final daquele mesmo
corredor. Eu me perdi um pouco e por isso demorei a notá-la, acreditava
que a sua situação era a mesma, já que seus olhos continuavam firmes no
que existia do lado de fora.
— Já faz um tempo, Mãe! — Seus ombros ficaram tensos e ela me
destinou apenas um leve virar de cabeça, sem realmente me encarar.
— Soube que irá se casar.
O sorriso em meus lábios morreu, ainda tão longe de mim, fria
como o inverno russo, congelando até os ossos qualquer um que ousasse se
aproximar.
— Como tem passado? — aproximei-me um pouco mais, somente
para analisar melhor seu perfil.
— Ainda tenta desviar do que realmente importa? — disse jocosa.
— É mesmo uma cria de Semyon.
— E sua também — rebati. Vi um sorriso desdenhoso escapar de
seus lábios. — Há quem diga que sou uma cópia de você, não acha isso
engraçado?!
— De fato é uma piada de mau gosto. Jamais me sujeitaria a um
casamento miserável com um soldado, entregando meu corpo a qualquer
vira-lata.
Umedeci os lábios.
— Prefiro um vira-lata que posso adestrar e controlar a um de raça
que me aprisione. Mas não importa, a minha vida não diz respeito a você,
não é mesmo?
— Está certa. Então me poupe de sua presença.
Assenti, vendo-a abaixar a cabeça e virar-se completamente de
novo. Saí em passos lentos, absorvendo aquele primeiro contato. Foi melhor
do que eu esperava, ela ao menos me olhou e demonstrou algum
sentimento, ainda que fosse de ódio ou desprezo.
Houve um tempo que a enxerguei como vítima, e enquanto estava
fora do país resolvi investigar o passado da minha família, de qualquer
forma precisaria estar ciente de tudo ou nunca seria capaz de assumir o
poder.
E só pude descobrir algumas informações depois de alguns anos,
quando a sorte veio direto à minha procura.
Cheguei a ponto de realizar um teste de DNA para comprovar que
Natalya Rurik era minha mãe. Seria mais fácil entendê-la se a resposta fosse
negativa, o motivo estaria claro e até mesmo compartilharia de sua dor, era
comum que homens como meu pai obrigassem suas esposas de
conveniência a criarem filhos de outras mulheres como se fossem seus, no
entanto, eu saí daquele corpo, fui amamentada por seus seios e carregava
cada traço de sua beleza: olhos, formato dos lábios, cor do cabelo e pele.
Doeu mais.
Natalya só não amava sua filha de sangue. Ela apenas me rejeitava,
mesmo antes de lhe dar motivos suficientes para isso.
Assim que completei meus vinte anos tentei me aproximar, viajei
para Londres quando soube de sua estádia lá; a encontrei tomando café na
varanda de um pequeno e luxuoso prédio, seus olhos encontraram os meus e
cada detalhe de uma face feliz foi derretido quando isso aconteceu.
Ela me desprezava, foi quando entendi que não importava o quanto
eu tentasse, aquela mulher nunca me olharia com compaixão, não teria seu
amor, pois para mim, ela reservou apenas o ódio. Então desisti. Fui embora
sabendo que ela ficaria satisfeita dessa forma, treinei como nunca e decidi
ser dona do meu destino. Não me transformaria naquela casca vazia que
desfilava de um lado a outro sem vida, desfrutando de um dinheiro que foi
incapaz de lhe gerar alguma satisfação.
Eu ainda a amava, mas entre ela e eu, escolhi a mim.
Fora sua falta de interesse na vida de sua única filha, não tive
motivos para reclamar. Ainda que precisasse treinar, me machucar e ser
dura com minhas decisões, nunca fui tratada como inferior pelo meu pai. O
Pakhan não sentiu falta de um filho, supri cada uma de suas necessidades...
era o que pensava.
Mas a ingenuidade se foi há muito tempo, o amor dele não seria
suficiente para me cegar, neste mundo de dominação e poder não existia
confiança extrema, tolo era aquele que entregava todas as suas fichas por
causa de sangue ou paixão. A história costumava se repetir, alguém perdia
seu reinado para quem menos esperava, meu pai fez parte disso, traiu seu
antecessor de dentro para fora, pegou onde doía e fez a ferida abrir
silenciosamente.
Desde que voltei para a Rússia, me senti encurralada, sendo um
fantoche de suas vontades. Enquanto digo sim para seus planos, ele sorri e
me abraça, porém, me pergunto como irá reagir no segundo que eu disser
“não” e lhe enfrentar?!
Para me tornar digna de liderar os Zhertva, teria que cortar o cordão
umbilical que Semyon vem puxando com força por trinta anos, ainda não
chegou esse momento, no entanto, ele sabia muito bem que um dia eu
deixaria de ser sua filha para me tornar a primeira mulher a ocupar um
espaço de poder dentro da máfia russa, não seria tranquilo, muito menos
limpo.
O pequeno sequestro do aeroporto foi nada comparado ao que me
esperava no futuro, me preparei por anos visando esse momento.
Casar-me com aquele soldado não incomodava em nada, ele me
agradava em sua aparência, supriria minha necessidade quanto casal,
poderia até mesmo ser o pai do próximo herdeiro ou herdeira, mas jamais
teria controle sobre mim.
Era eu a nova esperança para os Zhertva, e provaria isso a todos
eles.
**

A mesa de jantar era grande o suficiente para impor uma distância


segura e cômoda a todos, apenas o barulho dos talheres ecoava pelo lugar.
O olhar do meu pai encontrava o meu quase sempre, como se a ansiedade o
estivesse corroendo por dentro, algo fora do habitual quando se tratava dele.
Aquela encenação me cansava. O fardo de parecer a mesma
menininha inocente pesava sobre meus ombros, contudo, eu precisava
entender o terreno, onde pisar e com qual força. Apesar de amá-lo, não o
via como aliado.
— Estou preparando um contrato para Yakov se sentir mais
confortável, há algo que queira incluir? — ele perguntou após me ver
abaixando os talheres.
— Não. Ele parece ser um bom homem, me servirá como marido e
creio que saiba seu lugar ao meu lado.
— Sim. O escolhi porque conheço bem da sua história, ele é perfeito
para os nossos planos.
Nossos?
Ergui os olhos e sorri de canto.
— E qual é a história?
— Não muito interessante, porém, suficiente para torná-lo um cão
fiel, ele jamais agirá com ganância.
Assenti, deixando de lado esse assunto, poderia ser uma armadilha,
questionar demais significaria desconfiança e disse que confiava
plenamente em suas decisões.
— Sua mãe ficará responsável pela organização do jantar de
anúncio, quero que seja o quanto antes para acalmar os ânimos daqueles
que são contra...
— Acha mesmo que um homem ao meu lado será suficiente para
estabilizar as opiniões?
Sabíamos que não. Esquadrinhei cada detalhe de seu rosto, vendo o
brilho de malícia e diversão passar por suas íris.
— Creio que dará tempo para que possa se preparar.
— Quando se aposentará? — Ele soltou um riso baixo, olhando-me
com certa admiração.
— Quer se livrar tão rápido assim do seu pai?
— Disse que ficaria comigo, como um conselheiro, lembra? —
Beberiquei o copo com água.
— Voltou apenas para tomar seu lugar como herdeira? Pensei que
sentisse falta da sua família.
Umedeci os lábios, espalhando um pouco da água que ainda estava
em minha língua para hidratá-los.
— Dramas nunca foram seus preferidos, Pai. Seu gosto mudou
conforme o tempo? — Ele riu.
— Estou feliz em tê-la de volta à sua casa, minha princesa.
Cumprirei com tudo que te prometi, apenas tenha paciência.
— Estou segura de que sim, meu pai. Não sou uma mulher afobada,
mas gosto de estar preparada para tudo que acontece na minha vida.
O rangido da cadeira sendo arrastada nos fez encarar a mulher
apática que decidiu se calar até aquele momento, seus olhos deslizaram por
nós com tanto desprezo que foi impossível dela conter o enrugar de seus
lábios.
— A casa nunca foi sua — grunhiu, reclinei-me na cadeira
observando-a. — Nada dessa casa te pertenceu, deveria apenas ter ficado
longe daqui. — Cerrou seus punhos, podia ver seu maxilar rígido, a força
com a qual se segurava. Havia muito mais que ela queria deixar sair. —
Teria poupado a vida de um pobre soldado e o meu tempo. Esse casamento
será o maior fracasso de nossa família e você, Semyon, trouxe isso para
nós.
Natalya saiu com passos firmes, ainda que sentisse o mundo
desabando ao redor, ela nunca chorava, uma das poucas coisas que aprendi
com ela. Meu pai suspirou pesadamente e buscou pelo meu olhar.
— Como pode ver, sua mãe é contra minhas decisões.
— Na verdade, ela é contra qualquer coisa que tenha relação
comigo. — Levantei-me devagar e sorri para ele. — Tenha uma boa noite,
pai.
Eu me retirei, sabendo que aquela era a minha família, imperfeita
como qualquer outra que fosse estabelecida a base do sangue alheio, nada
poderia nos salvar, nos restava apenas apreciar o que podia ser bom, aceitar
os castigos de Deus e assim seguir com nossa missão.
Em poucos meses, nem mesmo meu pai poderá me impedir de ser
quem eu nasci para me tornar.
Capítulo 03
O cigarro de menta não fez efeito naquela manhã. A casa do nosso
Pakhan estava uma loucura e nada disso me importaria se não estivesse
enfiado em seus planos absurdos. A preparação para o jantar de noivado
acontecia diante dos meus olhos, e ainda parecia irreal, como um sonho
doido que tive.
Os passos arrastados do soldado Yuri pararam ao meu lado,
relanceei o olhar e o encontrei sorrindo enquanto também admirava a
quantidade de carros e pessoas se movimentando na casa principal.
— Então é verdade, nosso querido líder tirou a sorte grande!
— Gostaria de ser tão otimista quanto você, Yuri.
Ele puxou um maço do seu bolso e juntou-se a mim para fumar.
— Ela não aparenta ser do tipo carente e você também soa como um
homem que gosta do seu espaço, não é perfeito que seja assim? — tragou
enquanto esperava uma resposta que não dei, soltou um riso curto e tocou
meu ombro. — Vai estar por perto de qualquer forma, Yakov, pode vir nos
visitar sempre que sentir saudade.
Revirei os olhos, mas acabei deixando-o ver o sorriso ladeado. A
minha relação com meus homens era de fraternidade, um ensinamento que
Semyon me deu e tomei como parte da minha vida. Ser temido era bom,
mas ser admirado e respeitado trazia muitos benefícios para todos os
envolvidos. Esses soldados fariam de tudo para salvar seus companheiros e
me seguiam sem pestanejar, confiando em meus julgamentos.
Traidores existiriam em qualquer lugar onde o dinheiro passar,
todavia, o número de Vor leais sempre foi maior, me possibilitando
identificar as maçãs podres e exterminá-las sem problemas. No entanto, não
significava tratá-los docilmente, a firmeza acompanhava a disciplina e a
recompensa alimentava o orgulho deles, uma troca vantajosa.
Aqueles homens confiavam em mim e eu os retribuía deixando-os
pensar que estávamos no mesmo patamar, ainda que eu fosse o único com
acesso à casa principal e as ordens do Pakhan.
— Descobriram algo sobre o motivo do sequestro dela? — mudei de
assunto, deixando a fumaça se misturar com o ar.
— Ah, ainda não entendeu o que aconteceu? Pensei que fosse mais
próximo do nosso Pakhan, Yakov.
Virei-me em sua direção, franzindo o cenho como forma de solicitar
uma explicação rápida, ele tragou primeiro, depois apagou a ponta com o
polegar e indicador e umedeceu os lábios.
— Foi um pequeno teste, senhor! — Sua postura se tornou-se mais
formal, respeitando-me e deixando claro que não brincava mais. — Não foi
uma movimentação inimiga e creio que a senhorita Rurik já sabe disso.
Assenti e tratei de apagar o meu cigarro também, Yuri caminhou ao
meu lado retornando para os nossos dormitórios.
— Minha cabeça estava cheia com outras preocupações, não me
atentei as informações — sibilei irritado, odiava estar um passo atrás do que
qualquer um dos meus homens, eu os liderava, porém, a partir do momento
que assinei aquele maldito contrato com Semyon, abdiquei do meu papel de
Vor e me tornei apenas o noivo de sua filha. — Então se não tivéssemos
chegado...
— Ah, não... pelo que soube as ordens eram para tratá-la sem
diferenciação, aqueles homens foram contratados de fora, não a conheciam
de fato.
— Semyon quem os mandou?
— Não sei ao certo, senhor.
— E de onde vieram essas informações? — Toquei seu braço,
fazendo-o parar ao meu lado. Ele tentou desviar o olhar, mas sabendo da
minha persistência e o quanto poderia prejudicá-lo fisicamente, apenas me
deu o que pedi.
— Nem mesmo o medo de morrer consegue deter a língua de
fofoqueiros. — Deu de ombros e respirei fundo. — Funcionários ouviram
uma conversa de telefone em que a senhorita Rurik deixava claro que sabia
do que se tratava seu sequestro, ela parecia calma quanto a isso e não tinha
preocupações de quem foi o mentor.
Claro que não, ela provavelmente reconheceu a tática e agiu da
maneira que esperavam, um teste simples para um soldado experiente,
porém, seria suficiente para uma herdeira treinada fora do país? Ao que
tudo indica, eles tiveram sua resposta.
Com quem será que ela conversava?
Separei-me de Yuri e não pude frear meus pensamentos quanto
àquela criatura intrigante.
Ela não falava muito, seus olhos transitavam entre frieza e doçura
conforme sua vontade, a adaga parecia ser parte dela quando a
encontramos, assim como pela forma como os corpos foram rasgados com
tanta facilidade e agilidade. Alya não cortou locais aleatórios, acertou-os
somente onde seria mortal, pois claramente não queria perder tempo.
A herdeira dos Zhertva não discutiu com seu pai por ter sido levada
em um teste perigoso, quase como se já esperasse por isso. Não questionou
sua decisão sobre o nosso casamento e nem pareceu preocupada com
possíveis consequências em relação a isso.
Teria ela guardado algum rancor de seu pai? Será mesmo que seu
treinamento foi tão efetivo que ela não se importou ou temeu perder a sua
vida por causa de algo feito pelos seus próprios aliados?
Soava estranho aos meus ouvidos, mesmo com toda a paciência que
aprendi a acumular com o tempo e experiência, não seria capaz de esquecer
tal ato de violência. Aqueles homens poderiam tê-la machucado ou até
mesmo violado seu corpo como forma de se sentirem superiores. Não havia
garantias, afinal, ela passou tempo demais longe dos olhos de sua família,
como o Pakhan confiaria em suas habilidades sem tê-las visto ainda?
Foi imprudente!
Se ele tivesse compartilhado comigo esse plano ridículo, o teria
alertado de todos os riscos e jamais concordaria com uma ação imatura. O
teste poderia ser feito com calma, depois de vê-la com alguns soldados no
combate e, quem sabe, em algumas missões.
Ri sozinho, me livrando do casaco pesado e me sentando na cama
barulhenta que sempre rangia com meu peso.
Obviamente que o tratamento com alguém que assumirá o poder
total da organização seria diferente, o que estava pensando, que ele pegaria
leve por ser sua única filha?
Apostava uma perna que levaria um belo tapa se demonstrasse
preocupação por ela, apenas porque é uma mulher. Alya com certeza sabe o
que a espera, não retornaria se não tivesse confiança em si, tampouco teria
lavado em sangue aquele lugar onde a prenderam.
Talvez eu tivesse ficado mole com os anos de tranquilidade. Poucas
vezes tive que torturar e matar alguém, principalmente do sexo feminino ou
que fossem crianças inofensivas. Graças a Semyon, os tempos de chacina se
tornaram lembranças fracas do passado. Ainda que meu corpo fosse
treinado para o combate e dentre as minhas habilidades, o escalpelamento
seja a mais notória, já não os usava com frequência.
Perder, me fez ganhar também.
Penteei meus cabelos para trás e encarei a parede pintada de cinza,
aquele lugar deixaria de ser meu pequeno cantinho de sossego, meus dias
seriam recheados com compromissos que nada tinham a ver comigo e a
noite... não sabia bem o que esperar.
“— Não será difícil estar ao meu lado, além de me proteger, quero
que me satisfaça. Somos uma família cheia de superstições e não quebrarei
nenhuma delas.”
Eu não era um cara com uma vida sexual movimentada, mas sabia
como agradar uma mulher na cama, no entanto, algo me dizia que com Alya
as coisas não seriam simples, me causando uma pequena ansiedade quanto
ao que esperar da minha lua de mel.
Meu passado foi pintado em dor e cheiro de podre, sabia ser incapaz
de amar alguém novamente e temia as consequências de não atingir as
expectativas de uma criatura tão única e indecifrável.
De repente me imaginei com um corpo frio e distante dormindo ao
meu lado, um relacionamento fadado ao fracasso entre uma mulher que
apenas seguia pela vontade de seu pai para poder garantir posição no
comando e um homem tão fodido pela vida que já não se importava com
seus próprios sentimentos. Seria um desastre para nós dois, pior ainda se
colocássemos uma criança no meio dessa bagunça.
Uma criança?
Sacudi a cabeça, me levantando e seguindo para o banheiro, pois
esse tipo de bobagem estava surgindo na minha mente por andar estressado
com o rumo da minha vida. Jamais seria tão imprudente a ponto de gerar
um filho com aquela mulher.

**
A mensagem era curta e o número desconhecido, porém, eu sabia
quem era seu remetente.
Olhei-a mais uma vez: “me encontre atrás da casa principal”.
Bufei e enfiei o celular no bolso, uma madrugada fria como aquela
não deveria ser subestimada, talvez ela estivesse tão acostumada com o
clima no exterior que se esqueceu de como as coisas funcionavam em sua
terra natal, não existia inimigo mais sorrateiro do que o frio de anúncio ao
inverno.
Uma silhueta esguia se atreveu a se aproximar, tão rápida e
silenciosa que se eu não estivesse atento, jamais a teria notado. Um capuz
foi abaixado, mostrando bochechas vermelhas, marcadas pela brisa gelada e
olhos de um azul tão intenso que poderiam me guiar através da escuridão da
floresta mais ao fundo do terreno, seus cabelos dourados presos em um rabo
de cabelo bem-alinhado e alto, com apenas alguns fios que se soltaram com
o movimento do capuz.
— Me desculpe pelo horário, a casa está uma bagunça por causa do
jantar de amanhã e minha presença é constantemente solicitada. — Sorriu,
parecendo não se incomodar nem um pouco com o clima ou o fato de estar
carregada com roupas pesadas.
— Não deseja mesmo me acompanhar até algum lugar quente e...
— Não há necessidade — cortou-me, estendeu as mãos que estavam
cobertas por luvas grosas e felpudas e pegou as minhas, que permaneciam
nuas por ter saído apressado. Ela as esfregou, como se estivesse preocupada
com o quanto poderiam estar frias. — Serei breve, não quero atrapalhá-lo
mais.
Assenti, ainda tendo o seu toque persistente, não quis afastá-la, de
qualquer forma, parecia mais como um movimento involuntário vindo de
alguém acostumado a cuidar dos outros, algo que me surpreendeu.
— Sei que as coisas estão desordenadas e isso gera dúvidas e
confusões. — Seus olhos mapearam o local uma vez mais antes de finalizar
sua frase. — Mas não sou uma inimiga infiltrada, não pude te mostrar quem
sou por causa da pressa do meu pai, porém desejo que esse casamento seja
bem-sucedido, espero que possa ser meu companheiro, Yakov.
O brilho em suas íris me confundiu, assim como o calor que passava
de suas mãos para as minhas e o leve umedecer de lábios que a levou a
colocar a língua para fora desenhando o contorno de sua linda e pequena
boca.
Todavia, sorri e acenei, a tentativa de me seduzir foi bem aplicada,
sem grandes exageros em seus gestos, e as palavras usadas cuidadosamente.
Ela poderia só querer o melhor para nós e estava usando o que sabia a seu
favor ou tentava conseguir minha confiança para me manipular em seu jogo
obscuro.
— Amanhã teremos muitos líderes e políticos nos observando, a
maioria não aprova a decisão do nosso Pakhan, por isso, mesmo que não
seja da sua vontade permanecer ao meu lado por muito tempo, seja o mais
convincente possível e me ajude na tarefa de fazê-los acreditar que temos
sentimentos um pelo outro.
— E por que isso importa?
Ela mordiscou o lábio e soltou minhas mãos, recuando um passo
para me olhar.
— Quais motivos teria um Pakhan, para casar sua filha com um cão
de guarda leal e experiente? Senão por fazer as vontades de sua única filha
mimada, então por quê?
As engrenagens em minha cabeça voltaram a funcionar com a falta
do contato físico, me lembrando que, por mais que tenha notado sua
tentativa de sedução, me deixei levar o suficiente para não enxergar a
situação como um todo.
— Eles podem pensar que o senhor Rurik deseja fazer uma nova
limpeza entre seus aliados — balbuciei e ela apenas concordou. — Com o
seu retorno isso pode ser mais consistente e gerar uma revolta, se houver
muitos inseguros podem se unir e causar uma grande dor de cabeça...
— Não precisa ser delicado... eles não causariam uma grande dor de
cabeça, e sim, aproveitariam a oportunidade para matarem a única herdeira
em seu momento mais frágil na organização.
Ela estava certa. Engoli em seco.
— Por que não vi isso chegando?
— Não importa, apenas me ajude, certo? É melhor que eles me
enxerguem como uma mulher mimada por seu pai, que criou uma paixão
por seu soldado mais antigo e presente na casa. Farei com que pensem que
irei embora com você e não tenho interesse no comando.
— E quanto ao seu sequestro?
— Nenhum deles sabe que fui eu quem me salvei. — Ela se
aproximou de novo, tocando meu peito e se inclinando em minha direção,
seu olhar tornou-se brando outra vez, quase tão doce quanto uma mulher
verdadeiramente apaixonada. — Para eles, foi meu lindo e forte Vor quem
me salvou do pior.
— Me diga exatamente o que deseja, senhorita Rurik?
Seus dedos subiram até que a luva felpuda chegasse à minha
bochecha.
— Comece me chamando apenas de Alya — hesitei por um
momento, querendo me livrar do seu toque, mas ela não permitiu, se
aproximando ainda mais de mim e invadindo meu espaço pessoal. — Não
desvie, devemos parecer acostumados um ao outro e não se preocupe, não
irei abusar do momento. — Seus olhos não deixaram os meus fugirem,
sempre me buscando o suficiente para me prender, eu já não sabia se aquilo
era sua sinceridade ou manipulação.
— Tudo bem, farei o que for preciso. Saiba que nunca fui bom com
carinhos, então peço que me ajude com isso, certo? — Ela sorriu, não como
uma fera tendo mais do sabor da sua presa, era algo parecido com uma
criança ganhando um presente que desejava muito.
— É melhor terminarmos por aqui, saiba que serei espontânea,
porém, sem exageros, precisamos passar a mensagem de nossa intimidade
com sutileza, para que pensem estarmos nos contendo. Obrigada, Yakov. —
Alya se esticou e fechei os olhos ao sentir seus lábios gelados contra minha
bochecha.
Nunca pensei que alguém me faria baixar a guarda tão fácil como
ela, isso me perturbou, nublando meus pensamentos enquanto a via se
afastando após me desejar um boa noite.
Por segundos não reconheci o que acontecia, ela parecia ser apenas
uma mulher comum se despedindo de um namorado ou amigo, e eu, parado
ainda sentindo seus lábios em minha pele, poderia ser confundido com um
homem ganancioso, desejando muito mais do que podia ter.
Capítulo 04
Yuri estava em silêncio, seu olhar atento e os passos sincronizados
com os meus demonstravam sua preocupação quanto às pessoas ao nosso
redor. Obviamente que minha morte seria de interesse para muitos que
estavam ali. Um mero soldado tomar o lugar de noivo da única herdeira do
Pakhan não soava certo aos seus ouvidos.
— Daqui a alguns minutos o senhor será oficialmente o noivo da
herdeira, como se sente sobre isso? — Yuri brincou, assim que ficamos a
sós no quarto que me foi destinado para me preparar.
— Igual sempre. — Dei de ombros.
Ele vistoriou os arredores, por mais que eu o tenha feito antes,
deixei que cumprisse seu papel como meu soldado pessoal, ao menos até o
final da cerimônia de hoje. Nós éramos o mais próximo de amigos que um
dia pude ter, não que me sentasse com ele para beber e contar sobre a vida
de forma casual, porém sentia-me confortável com sua presença e podia
ouvir algumas de suas reclamações que me soavam mais como piadas.
— Não diga besteiras, até mesmo suas roupas serão completamente
diferentes, vai andar por essa casa como um verdadeiro príncipe.
— Acho que estou velho para isso. — Ri. Yuri ficou sério de
repente.
— Então devo dizer... como um verdadeiro rei?!
Franzi o cenho e deixei minha postura ereta, lembrando-o sutilmente
que, mesmo estando em bons termos, éramos de níveis diferentes na
hierarquia e ele me devia respeito.
— Insinua algo? Acha mesmo que de todos, eu seria tão arrogante
assim?
Ele negou, relaxando os ombros e desviando o olhar.
— Desculpe, é difícil assimilar todas essas mudanças...
— Você acha? — Ri jocoso.
Tudo estava exposto sobre a cama para que me preparasse, suspirei
e comecei tirando a roupa formal e que me fazia sentir sufocado.
— Quer dizer que não é igual, no fim das contas? — brincou,
tentando voltar a um clima agradável.
Dei de ombros mais uma vez, ainda observando aquela parte da
minha vida que nunca previ e começava a me engolir de pouco em pouco.
— Yuri, tem ouvido mais alguma coisa dos funcionários? — ele
pareceu alarmado com a pergunta repentina, logo se recompôs e se colocou
ao meu lado, tocando meu ombro.
— A única coisa que dizem pelos corredores, é o quanto tudo está
sendo apressado, nada mais que isso, senhor!
Acenei.
— Está na hora de eu me arrumar, pode sair e checar se todos estão
se preparando também, e aproveite para pontuar possíveis problemas. —
Encarei-o e ele soube exatamente do que estava falando.
Não seria incomum ter um ou dois rebeldes que se precipitassem em
momentos de euforia.
Infelizmente, muitos destes herdeiros ricos acreditavam ser
intocáveis, levavam a vida no limite e pouco se importavam com negócios
arriscados. Muitos vivem drogados e são constantemente cobrados por seu
comportamento exagerado. Um evento como esse é perfeito para essas
pessoas perderem a cabeça e agirem feito idiotas.
Nem mesmo Semyon conseguiu conter ou se desvencilhar desse tipo
de pessoa, são como vermes que rastejam entre o dinheiro e a podridão. São
eles que tornam nossos negócios difíceis. Imaturos demais para entenderem
que a roupa de bom negociador e o olhar acolhedor de Semyon Rurik são
apenas uma bela e agradável fachada.
Deixei com o meu soldado a missão de identificar esses merdas, era
um dia para me fingir de apaixonado, entregue aos desejos pela linda filha
do Pakhan, uma ousadia que eu jamais teria, no entanto, poderia ser
facilmente explicada devido à beleza de Alya.
Vestir-me feito alguém que não sou. Mal conseguia me encarar
diante do espelho, as roupas limpas demais com um tecido que meu corpo
poderia se acostumar facilmente, os meus cabelos penteados para trás com
um pouco de gel os ordenando e mantendo-os no lugar e aquele perfume
suave, mas tão diferente do cheiro de sangue, lama e poeira que costumava
ter.
Ela estava tentando dizer algo quando colocou o frasco junto das
roupas?
Cocei a cabeça encarando-o... bom, era o suficiente de qualquer
jeito.
Algumas batidas delicadas na porta me fizeram ter noção de quem
era e o quanto aquela loucura estava mais perto de se tornar real. Olhei no
meu relógio de pulso e vi que ainda faltavam pelo menos duas horas para
começarmos nosso pequeno teatro, logo sua visita deveria ser para alinhar
nossas ações.
Abri a porta e encontrei a criatura mais linda que meus olhos já
puderam admirar, isso era um fato ao qual não pude ignorar nenhuma vez.
Seu sorriso curto deixou as maçãs de seu rosto mais proeminentes, dando-
lhe uma fofura que parecia errada, em vista de tudo que já a vi fazer.
— Tudo bem se eu entrar? — Abri espaço, meio desajeitado por ter
ficado encarando-a ao invés de agir rapidamente. — Vejo que usou tudo que
enviei.
Ela usava um vestido branco com detalhes em azul-claro, tudo
parecia ornar com sua beleza, acompanhando as cores de seus olhos ou com
pequenos toques de dourado como seus cabelos. Sua aproximação me
deixou atento, porém, ela apenas ficou nas pontas dos pés, apoiando as
palmas contra meu peito e levando seu nariz até meu pescoço.
— Eu sabia que esse perfume combinaria com você. — Sorriu,
afastando-se um pouco. — Fico feliz de não ter recuado.
— Foi um teste? — perguntei confuso, ela caminhou pelo quarto,
então se sentou na beirada da cama.
De algum jeito minha mente se desviou para o quanto era errado tê-
la sozinha comigo em um quarto. Ainda existia a pequena barreira com as
escritas “filha do Pakhan” em evidência, brilhando para mim como um
alerta.
— Talvez. — Esticou mais os lábios e o movimento me deu a
sensação de que seus olhos sorriam também. — Quero que fique
confortável comigo, Yakov. Consigo ver em seus olhos o desespero a cada
vez que se lembra de quem sou filha.
Mordisquei o lábio, quase soltei um riso. Ela era boa em ler as
pessoas, também gostava de tornar o ambiente leve, quase não dava para
perceber que a pequena criatura à minha frente era mais sorrateira do que
um tigre escondido observando sua presa.
— Não é algo que vai mudar de repente...
— Concordo. Mas há um método bem eficaz. — Cerrei o olhar em
sua direção. — Por que não tentamos um beijo? — perguntou como se não
fosse nada demais.
Então seria Alya a conduzir nossa relação? Não me importaria de
verdade, desde que fosse somente sobre o contato que teríamos. Para sua
própria confiança, era bom deixá-la seguir com o controle, afinal, que
mulher não se sentiria intimidada por um homem mais velho e treinado para
matar, estando sozinha com ele e tendo que suportá-lo por causa de um
acordo? Quem poderia lhe garantir que eu não me aproveitaria dessa
situação?
Caminhei até estar a centímetros de distância de seu corpo, ajoelhei-
me, ficando com meu rosto na altura do seu e comecei a me aproximar
devagar.
— Como quiser, Alya!
Suas mãos vieram até minha nuca, o que pensei que seria um beijo
tímido e apenas de reconhecimento, se tornou agressivo quando ela fincou
as unhas em minha pele e tomou minha boca com ganância. Sua língua
contornou meus lábios antes de pedir passagem e sem perceber, eu já a
tinha envolvida em meus braços.
Não deveria ser tão quente... isso estava longe do que eu esperava
encontrar.
Alya fervia, sua boca se movendo decidida e roubando de mim o
fôlego, os sons baixos que escapavam de sua garganta me provocavam, um
único beijo foi capaz de esvaziar minha mente por longos segundos.
Quando se afastou, aliviou o aperto em minha nuca e acariciou meu rosto,
sua cabeça inclinada e os olhos ferozes mirando minha boca.
— O que achou, Yakov? Sirvo para ser sua esposa? — O ar escapou
dos meus pulmões e parecia se recusar a voltar, ela se inclinou novamente,
mordiscando meu lábio inferior, suas unhas voltaram para a minha nuca,
arranhando sutilmente, atiçando minha pele. — Acha que pode ficar
excitado comigo?
Sussurrou lascivamente, deixando seu hálito quente bater contra a
minha orelha depois de deslizá-lo para lá. Engoli em seco, minhas mãos
desobedientes apertavam sua cintura, mesmo que eu quisesse me afastar,
simplesmente não podia. Ela estava me enfeitiçando?
— Eu... eu acho que...
— Vai ser capaz de me enxergar como mulher quando estivermos na
cama? — continuou, cada palavra soava como um encantamento que fazia
meu sangue ferver e correr direto para o meu pau.
Eu estava duro e bastaram alguns toques, beijos e palavras para isso.
— Por favor... senhorita Rurik...
— Alya. — Afastou-se o suficiente para me encarar. — Apenas
Alya.
Assenti, podendo puxar um pouco de ar para dentro, voltando a
lembrar como se respira.
Ela sorriu pretensiosamente, esfregando na minha cara o quanto
gostou de brincar comigo, então se levantou e se afastou, me deixando
ajoelhado diante da cama.
— Nos vemos daqui a pouco, Yakov.
O barulho da porta se fechando foi o que me tirou do pequeno
transe. Meu pau pulsou, se sentindo sufocado pelas roupas. Foi patético
como me deixei ser levado, apenas fiquei ali, obedecendo suas vontades e
nem foi por causa da porcaria do meu dever. Seria assim sempre?
Não. Não quando estivesse fora do quarto. Alya poderia ter todo o
comando entre quatro paredes, fora disso seria perigoso demais.
Olhei para baixo, gemi derrotado. Precisava cuidar daquela maldita
ereção, ainda tinha um tempo até alguém vir me buscar para o jantar de
noivado. Levantei-me e segui até o banheiro, não poderia sujar aquela
roupa, então decidi tomar outro banho.
Enquanto a água morna caía nas minhas costas, me masturbava com
força, apertando a minha mão ao redor do meu pau, o pior era a imagem
que vinha à minha cabeça toda vez que fechava os olhos para me
concentrar. Meu corpo se arrepiou e estremeci sentindo minhas bolas
repuxarem conforme imaginava olhos azuis e luxuriosos me encarando,
aquela boca pequena e rosada entreaberta esperando pela minha porra,
sussurrando meu nome e me pedindo para gozar.
Gemi rouco, o líquido pegajoso jorrou contra a parede deixando
alguns resquícios escorregando por minha mão. Lavei-me devagar, vendo
aquele pecado descer pelo ralo, lembrando-me do quanto pequenos desejos
como aquele poderiam se tornar em problemas gigantescos na minha vida.
Capítulo 05

Meu pai estava feliz, me expondo como um maldito troféu para


aquele bando de abutres famintos, que babavam sobre mim e sorriam tão
largo que podia ver o podre de seus dentes. Odiava socializar com esse tipo
de gente, mas para a diplomacia era preciso, por mim só me encontraria
com eles em situações restritas e com objetivos claros o suficiente para que
nenhuma reunião demorasse mais do que o necessário.
Seu braço estava agarrado ao meu, parando de pessoa em pessoa,
dizendo nomes como se eu não tivesse lido e decorado uma lista com todos
eles. Não era inteligente se jogar em um mar desconhecido, nunca entrei
despreparada em locais cheios de inimigos e falsos aliados, do tipo que
bastaria uma escorregada minha para fazê-los me trair.
Enquanto passeava com meu pai ao lado, os organizadores daquela
palhaçada conduziram Yakov para a mesa principal, pude vê-lo de longe, o
penteado para trás deixando-me ver seu rosto pálido, os olhos castanhos
sondando o local, pois tornou-se costume para ele mapear áreas, a roupa lhe
caiu muito bem, seus ombros largos acompanhados da altura lhe deram um
porte elegante e se não fosse o olhar hesitante, diria que ele estava longe de
ser um soldado fora de seu ciclo social.
Brincar com ele foi mais interessante do que imaginei, suas
respostas às minhas provocações ascenderam o tesão que reservo apenas
àqueles de extrema confiança para mim. Eu precisava manter uma imagem
de que sou intocável, deixando claro que só se aproximava de mim quem
fizesse esforço suficiente para tal, e Yakov foi o soldado com ousadia o
bastante para me fisgar e ganhar a bênção do meu pai, do contrário sofreria
com rumores e poderia despertar o senso de rebeldia desses velhos nojentos
e seus filhos mimados.
Transformar Yakov em alguém importante aos olhos deles, enquanto
por detrás dos bastidores movo as cordas da minha marionete linda e forte.
Aquela mão grande seria útil, assim como os lábios frios no começo e
quentes no processo. O desejo andaria na corda bamba do poder, caberia a
mim conquistar a lealdade do meu futuro marido.
Ele seria capaz de ser fiel a mim, mais do que um dia foi para o meu
pai?
Quando chegar a hora de cortar a última e fina cordinha que o
Pakhan mantém presa em mim, ele se uniria aos meus ideais e me
acompanharia nessa batalha?
Pisquei algumas vezes e admirei o perfil sorridente do meu pai.
Um homem bonito, forte e revolucionário. Alguém que tirou o
aspecto de gângster dos Zhertva, aliou-se à Bratva e pegou para si todos os
bons frutos que nasceram de lá, o mesmo que agora desafiava sua própria
organização ao colocar sua única herdeira, uma mulher, no poder. Seria uma
linda história para contar no futuro e ele amava ser o marco central de algo,
aquele de quem todos vão se recordar. Uma pena que nada que sai de sua
boca é com uma intenção nobre e simplória.
Ele me criou bem... bem demais para acreditar nesses devaneios.
— Ele já parece um de nós — murmurou, seu olhar de desdém me
chamou atenção.
— Se continuar olhando-o assim, ficarei com ciúmes — respondi
em tom sarcástico, ele relanceou o olhar e depois deu de ombros.
— Seremos todos família de qualquer jeito.
Não esperava por isso e antes que digerisse os pensamentos que se
confrontaram em minha mente já estávamos de frente para a mesa principal,
sendo recebida por meu noivo e me sentando ao seu lado. Um calafrio
percorreu meu corpo me fazendo ficar em alerta.
Talvez devesse olhar toda essa situação de outro ponto, um ângulo
mais obscuro, levando em conta as histórias passadas de nossa família, não
seria impossível pensar que havia muito mais sujeira escondida nesse
noivado repentino.
Virei-me para Yakov e sorri segurando suas mãos, a mesa fervia
com conversas diversas, todos tentando puxar saco do meu pai e mãe,
apenas para garantirem algum tipo de status. Isolei-nos em nosso pequeno
contato e aproximação, roubando para mim toda a sua atenção, meu polegar
não parou de esfregar sutilmente sobre seu pulso.
— Me dei conta de que preciso saber mais sobre você. — Inclinei
levemente a cabeça e ele seguiu com o olhar em direção à minha boca. Tive
certeza de que se lembrava do que fizemos mais cedo. — Você deve saber o
suficiente sobre mim, sinto que preciso ter o mesmo de você.
As palavras foram soltas como sussurro, apenas para ele, mesmo
que em meio a tantas pessoas. Agir assim era arriscado, no entanto causava
fascinação ao destinatário, ainda que houvesse um salão cheio com
conversas abertas sobre coisas banais, escolhi confidenciar um desejo,
deixando todos de fora e valorizando-o como um parceiro.
Yakov engoliu em seco.
— Poderemos conversar sobre isso, senhor... — ele se interrompeu,
comprimindo os lábios e depois corrigindo suas palavras. — Alya.
Era como domesticar um animal filhote, eu tinha que indicar os
caminhos e acompanhar seus passos, tranquilizá-lo e corrigi-lo sem que ele
percebesse minhas verdadeiras intenções, ele precisava receber para
começar a doar por vontade própria e se apegar a mim.
Seria formidável tê-lo como um cão de guarda, astuto,
completamente fiel à sua dona, amável e ansioso pelas recompensas e
carinhos, ao mesmo tempo que feroz contra possíveis ameaças.
Para mim, só existiam vantagens em tê-lo.
Deixei que o toque continuasse como se tivesse me esquecido e o
movimento tenha se tornado natural, ele virou seu corpo para a frente, mas
não puxou a mão e estava bem consciente do carinho que recebia.
— O que está achando da festa? — Deslizei meus olhos pelos
convidados, agora a maioria já estava acomodado em seus lugares.
— Talvez um exagero? — Sorri de canto. Concordava quanto a isso.
— Mas não faço ideia de como deveria ser de fato.
Então ele nunca teve um relacionamento que chegasse ao noivado
ou mesmo que tenha tido, não dava importância às convenções e nem à sua
ex-noiva?
Descobriria um pouco mais de sua vida pessoal, teria que tirar
algumas pedras do muro que construímos para não deixar ninguém ver
muito de perto.
— Precisava ser feito, essas pessoas têm que entender nossa
relação... diria que eles sentem necessidade de ver para crer.
Soltei seu pulso e ergui a mão até seu rosto, acariciando sua
bochecha. Ele apenas esticou os lábios na tentativa falha de um sorriso,
parecendo nervoso demais com minha aproximação, no entanto não recuou.
— Relaxe um pouco mais, Yakov. Não quero que nenhum desses
homens pensem ter chances comigo.
Ele me encarou com o cenho franzido.
— Ousariam se aproximar mesmo com o noivado aprovado pelo
Pakhan?
— Há sempre alguém que se sente especial demais para ser a
exceção, por isso preciso tampar as frestas. — Deslizei meus dedos por seu
pescoço parando no colarinho, então voltei a segurar sua mão. — Também
não anseio por uma relação distante a ponto de não nos tocarmos
confortavelmente. Serei sua esposa, não sua boneca.
Os olhos de Yakov escureceram e me senti sendo jogada para fora
do seu alcance, quase como se fosse expulsa da sua casa no meio de uma
chuva forte tendo o vento gelado lambendo a minha pele e me causando
arrepios. Afunilei o olhar, buscando o motivo de tal atitude, ele não era do
tipo expressivo de qualquer forma, contudo, seus olhos estavam sendo
sinceros comigo, até aquele momento.
Poderia estar entendendo errado, mas aquele soldado realmente
acreditou que me teria como enfeite?!
— Não vamos ultrapassar a linha, Alya. Serei o seu marido pelo
tempo que for útil aos planos do nosso Pakhan, mas estou longe de ser o
homem que possa desejar em sua cama.
Ergui uma sobrancelha, foi como ver a transformação do médico e o
monstro ao vivo, ele também sabia jogar e a menção do meu pai como líder
me serviu de alerta: “estou fazendo isso por ele, não por você”.
— Prefiro quando se dirige a mim com mais ternura, soldado —
sussurrei, aproximando-me de propósito e praticamente colando minha boca
contra sua orelha. — É da vontade do Pakhan ter um neto.
Afastei-me, vendo sua expressão se tornar uma careta de
incredulidade, isso bastou para trazer meu humor de volta e acreditar que
ainda estava com a vantagem naquele jogo. Determinei ali o fim da nossa
pequena conversa privada.
Ficamos por uma hora recebendo cumprimentos, assistindo a uma
banda que tocava músicas clássicas e bebendo champanhe caro, em alguns
momentos meus olhos se encontravam com os de Natalya e nada parecia
surgir dali, apenas o tédio de termos que conviver outra vez.
Sorrir. Acenar. Falar bobagens. Ter a mão beijada.
Há anos não tinha que lidar com toda essa merda. Ao invés disso eu
treinava, socava rostos de homens e mulheres que estavam naquele lugar
pelo mesmo motivo, então me recordava do dia que subi naquele maldito
avião e sumi da vida do meu pai e mãe. Foi logo depois de cumprir minha
primeira missão como herdeira, um teste que eu não sabia estar
participando, e o momento que deixei de enxergar Semyon Rurik como um
simples homem que amava muito sua filha.
Foi a primeira vez que minha mãe demonstrou algum sentimento
por mim: o ódio.
O mais engraçado era sentir falta daquele antro de loucura e traição.
Aprendi a aproveitar os bons momentos, sem nunca deixar de esperar pelo
fim trágico.
Era de certo que alguém me trairia, fosse por ganância, vingança ou
porque existiam outras prioridades. Não me ressentia de nenhum deles,
foram importantes de certa maneira. Aquelas pessoas me fizeram ser mais
forte, arrancaram de mim a ingenuidade e me ensinaram a usar a
sagacidade, Alya Rurik nunca foi tão filha de Semyon como a mulher que
voltou do exterior, e este deveria ser o seu maior medo.
— Bom, agora gostaria de fazer o anúncio oficial! — Meu pai se
levantou sorridente, sua esposa ao lado sem qualquer expressão
significativa. — Todos sabem o motivo de estarem aqui, só irei reforçar o
quanto estou orgulhoso da minha princesa. — Encarou-me com certo
divertimento, sabia que eu odiava aquela encenação toda. — Nunca
imaginei que seria um dos meus soldados o sortudo a conquistar seu
coração e tinha como objetivo jamais atrapalhar sua escolha com relação ao
seu marido, como minha única filha, não pude negar seu pedido de
abençoar seu casamento. Viva os noivos! — Ergueu a taça e me forçou a
levantar também, carregando Yakov comigo. Era exaustivo sem qualquer
motivo justo, porém pôde me ajudar a entender uma coisa ou outra sobre
seus planos.
Aquele homem ao meu lado com olhar penetrante e lábios esticados
em um sorriso nada natural tentava apenas realizar sua função, qualquer
sinal de desvio ele recuava sem pensar duas vezes, quase como se fosse
programado para ser assim, e meu pai o exibia com orgulho como noivo de
sua filha, o mostrava a todos os inimigos com tanta prepotência... ele não
temia pela vida da sua marionete com mais fios firmes.
Yakov Dobrow era apenas o show principal do primeiro ato, e fiquei
curiosa para saber quem ele escondia nos bastidores. O Pakhan nunca
planejou me levar no altar até aquele Vor, pelo contrário, ele desejava a
morte dele.
Capítulo 06

Tudo naquele lugar parecia exagerado e quase me deixei levar pelo


toque daquela mulher com olhos de tigre, mas bastou ela me lembrar de
algo que ansiei com outra pessoa para me puxar de volta à razão. Nada
importava mais do que a segurança do nosso Pakhan.
Pude respirar tranquilo quando todos se foram e fui autorizado a
voltar para o que seria meu novo quarto. Como forma de manter a tradição
ficaríamos em quartos separados por ainda não estarmos casados, o noivado
poderia durar meses ou anos dependendo dos planos daqueles dois.
Sem perder tempo, tirei toda a minha roupa e me fechei no banheiro,
nunca tinha experimentado uma banheira e a cobicei desde o momento que
a vi pela primeira vez. Deixei que enchesse enquanto explorava um pouco
mais os produtos do lugar, tinha tantos que me perdi em qual poderia jogar
na água, acabei escolhendo um que deixava claro ser relaxante e sem cheiro
forte. Despejei metade do frasco, que já era pequeno, e fechei a água assim
que chegou na altura ideal para cobrir todo meu corpo quando entrasse.
Podia escutar os sinos de aleluia tocando em minha cabeça quando
finalmente pude deixar a tensão sair de meus ombros e costas, a água morna
lambendo cada cantinho de pele exposto, meus olhos pesando e um sorriso
de satisfação escapando pela primeira vez.
Mas meus ouvidos treinados não permitiram que esse momento
durasse por muito tempo, definitivamente alguém havia entrado no quarto,
apesar de ser quase imperceptível, ouvi quando se descuidou perto da porta
do banheiro. Levantei-me devagar, virei meu corpo quando a silhueta
ousada adentrou, peguei o frasco do produto que usei e arremessei em sua
direção, causando distração o suficiente para sair da banheira e avançar em
sua direção.
A figura desviou do frasco, no entanto, não pôde recuar ao meu
ataque, agarrei seus braços e a virei de costas, deixando seu rosto contra a
parede. A água pingava pelo meu corpo, os movimentos precisavam ser
bem cuidadosos para que não escorregasse e a nudez já não me importava
àquela altura.
Não consegui ver seu rosto, pois o capuz do casaco escuro encobria
tudo.
— Quem é você e porque entrou aqui? — bradei.
Estranhei sua altura, parecia familiar e menor comparada aos
assassinos que enviavam para me matar. Curioso, antes mesmo de ouvir a
resposta daquela pessoa, livrei uma das mãos, usando-a para puxar o capuz,
revelando a cabeleira loira e comprida e a virei de frente imediatamente.
— O que faz aqui, Alya?
Ela engoliu em seco, depois seus olhos deslizaram por todo meu
corpo e pararam na direção da minha virilha, foi assim que fiquei
consciente da minha exposição. Rapidamente tampei o que pude com a mão
e procurei ao redor por alguma toalha, me lembrando que deixei todas as
malditas roupas espalhadas do lado de fora.
— Não vou devorá-lo vivo, soldado — brincou, escorregou o casaco
grande demais para ela pelos seus ombros e o estendeu para mim.
Sem muitas opções, o peguei de suas mãos e me vesti como pude,
cobrindo ao menos da cintura para baixo. Ainda parecia muito errado,
principalmente se levasse em conta o ambiente.
— É melhor sair! — falei rude, encarando-a o suficiente para que
temesse minhas reações e desistisse de qualquer coisa que a levasse para o
meu quarto.
Alya sorriu e não satisfeita, lambeu seus malditos e carnudos lábios.
— Você tem um bom corpo.
— Saia! — repeti mais enérgico, me aproximando dela e
consequentemente da porta, com a intenção de expulsá-la de uma vez.
— Sou sua noiva, não precisa ficar tímido na minha presença.
Tentei abrir a porta, esticando meu corpo ao lado do seu, mas ela se
recostou mais, usando do seu peso para me impedir. Suas mãos chegaram
até minha nuca, enlaçando-se em mim como uma cobra silenciosa e
traiçoeira, aconchegando-se de maneira que me tirou o ar.
— O que... o que está fazendo? — Minhas mãos foram para a sua
cintura com o intuito de afastá-la, porém, logo entendi que não foi uma boa
ideia tocar seu corpo, mesmo por cima do vestido mais leve e simples do
que o anterior, era bom de pegar. — Não podemos ultrapassar os limites...
— Que limites, soldado? — Seus olhos me esquadrinharam com
malícia. — Eu disse que gostaria de me aproximar, pensei que fosse seu
desejo também, mas tentou me empurrar para longe e agiu como se
pretendesse me tratar friamente. Então irei te esclarecer uma coisa: não terei
um marido incapaz de tocar minha pele e me satisfazer na cama, tenho
desejos que precisam ser atendidos, consegue entender isso, Yakov?
Era a isso que ela se referia antes? Franzi o cenho, minhas palmas
desobedientes se recusavam a deixar seu corpo e meus olhos continuavam
inquietos, buscando suas íris intensas em um azul profundo e a carne
suculenta de seus lábios.
— Falava somente sobre sexo?
— Obviamente que não. — As unhas vieram em uma dança suave
contra minha nuca, fortes o suficiente para me provocarem, mas longe de
me ferirem. — Quero o companheirismo, a segurança e o sexo. — Ficou na
ponta dos pés e esfregou a boca contra a minha. — Assim como não serei
sua boneca, não pretendo que seja meu fantoche.
Cada vez que ela respirava, ficava mais consciente de todo seu
corpo vestido, colado ao meu quase nu. Engoli em seco. Nunca tive esse
tipo de desejo por mulheres como ela, era irreal para mim.
Minha mente começou a circular por uma zona perigosa, o aperto
em sua cintura ficou mais forte e mesmo sabendo disso não pude me
afastar.
— Eu vi a tatuagem, por que tão diferente do que costumam ser
feitas nos soldados rebeldes? — pisquei, voltando a focar em seu rosto.
Ela mudou de assunto de propósito e quase a agradeci como um
idiota.
Após a liderança de Semyon, as tatuagens trocaram de função
dentro dos Zhertva, quanto mais visíveis, menor seu nível dentro da
organização. O próprio Pakhan não tinha nenhuma pelo corpo, pois para
circular entre empresários hipócritas e políticos corruptos era necessário
vestir uma pele inversa ao que continha por dentro. Sem marcas, limpa
como se jamais pudesse ser profanada por nada e nem ninguém.
A minha tatuagem era grande, pegando minhas omoplatas, única
dentro da organização. Era o símbolo da misericórdia do meu Pakhan e a
marca de um segredo que compartilhávamos. Uma grande rosa dos ventos
com uma cobra negra embolada nela.
Aquilo significava quem eu era para Semyon e como perdi tal
privilégio, mesmo que para mim não fizesse diferença.
— Não somos mais soldados da Bratva, com os Zhertva as coisas
funcionam diferentes, então as regras para tatuagens também.
— Eu tenho conhecimento disso, Yakov. — Mordiscou o lábio e
recuou um pouco. — Só fiquei curiosa do motivo de você, o Vor mais leal e
honrado do meu pai, ainda assim ter uma marcação de vergonha tão grande,
mesmo que escondida, e por que uma rosa dos ventos sufocada por uma
cobra? — inclinou a cabeça. — O que fez de tão errado e como conseguiu o
perdão dele?
— Isso não vem ao caso, senhorita Rurik.
Alya sorriu pretensiosamente, deslizou suas mãos por meus braços
até as ter agarrando meus pulsos e sem nenhuma vergonha ou medo,
começou a me conduzir por seu corpo, o olhar felino retornando com tanta
determinação que eu soube: ela poderia me devorar sem hesitar.
Minha respiração pesou, cada parte de mim esquentando e o sangue
correndo para um lugar bem específico. Logo aquela porcaria de casaco não
seria suficiente para esconder a marcação do meu pau duro.
— Podemos começar pelo sexo, depois o companheirismo e quando
estiver pronto, será meu ponto de segurança — sussurrou, a voz falhando
como se ela também não pudesse suportar a tensão entre nós.
O banheiro ficou pequeno, me obrigando a apertá-la mais contra a
porta. Apalpei seus seios com força, sedento de uma maneira que
desconhecia, nunca tive tanta fome de contato, misturado à fúria por ser
incapaz de pará-la.
— Não deveríamos...
— Por quê? — Um gemido baixo escapou de seus lábios. Porra...
até isso soava tão selvagem nela. — Consegue sentir o quão já estão
sensíveis? — Esfregou-se contra minhas palmas. Os bicos entumecidos de
seus seios pareciam querer rasgar o tecido fino do vestido. — Mesmo com
essa roupa atrapalhando... parece tão bom... tão torturante também.
As bochechas de Alya tinham um tom rosado adorável,
completamente diferente da maneira safada com a qual se movia contra
mim, roçando em busca de qualquer contato e eu me permiti ser guiado,
desfrutando do calor de seu corpo.
— Alya...
— Vai me rejeitar, noivo? — choramingou. O brilho do tesão em
suas íris davam um toque lascivo quando se unia ao tom manhoso de sua
voz. — Não quer me tocar? — Naquele ponto eu já havia me perdido,
minha mente em branco, empurrando para um quarto escuro qualquer razão
e preocupação que poderia ter. — Se não quiser, me coloque para fora do
seu quarto e não voltarei, mas se aceitar... apenas me pegue do jeito que
desejar, soldado. Hoje serei a sua princesa obediente.
E aquilo foi a quebra do último fio de aço que ainda me segurava
parado, mesmo que cada imagem depravada estivesse passando em minha
mente.
Capítulo 07

Eu sabia que aquelas mãos eram boas, assim como a força seria útil
nesses momentos, mas me surpreendi quando o barulho do vestido sendo
rasgado no decote dos meus seios foi mais alto do que nossas respirações se
misturando. Sua boca faminta se fechou na pele exposta da minha clavícula,
lambendo, mordiscando e descendo cada vez mais. Não usava sutiã, meus
seios saltaram livres e duros, ansiando pela pele na pele.
Algo ainda faltava, precisava de mais, então deixei um pouco à parte
o bom senso e ergui minha coxa esquerda, a prendendo em seu quadril.
Aquele pequeno roçar gostoso naquela forma grossa e tão dura... tão
pronto.
Homens como Yakov precisavam perder a cabeça para fazerem algo
imprudente no sexo, era o tipo que vivia no controle de seus desejos, no
entanto, isso tinha um lado fragilizado e o exploraria com todo prazer. A
tensão se foi, seus movimentos mais naturais e intensos e os sons roucos
que escapavam de sua garganta a cada vez que sua língua provava da minha
pele.
Meu noivo com certeza não transava há um tempo, a pressa o
denunciava.
O hálito quente sobre o bico do meu seio me arrepiou inteira, depois
a língua veio circulando-o cuidadosamente, ainda que seu toque com as
mãos fosse bruto, era como se ele equilibrasse suas vontades para não me
ferir. Poderia ser um detalhe ínfimo, mas vinha de um homem perdido em
seus desejos, tendo apenas um deslumbre de sanidade o barrando de me
tratar como uma boneca inflável.
Sua atenção foi aos dois seios e meus olhos não conseguiam se
desviar do seu rosto, suas íris afogadas em prazer, tão ousada e vulnerável,
direcionados unicamente a mim.
A ganância sussurrou em meu ouvido: tome-o para si.
Entretanto apenas fechei meus olhos e me permiti sentir o prazer
contorcendo meu ventre, cada músculo do meu corpo tensionando e aqueles
arrepios que pareciam me eletrizar.
Mais um barulho de tecidos sendo rasgados. Sorri quando mirei o
pedaço de pano ao redor de mim, um dia aquilo foi um vestido casual,
agora não era nada além de provas da minha rebeldia contra meu pai.
Yakov continuou descendo, sua boca sem deixar minha pele,
ajoelhou-se diante de mim, sem títulos o fazendo hesitar, sem matrimônio
nublando nossos deveres, sem nada além de dois corpos sedentos um pelo
outro. Enfiei meus dedos em seus cabelos, vendo minha pele branca se
misturando aos castanhos de seus fios, seu nariz cutucando minha vulva
enquanto os lábios deslizavam com a missão de me chupar com força,
estremecendo minhas coxas e me tirando do eixo.
Foi uma boa ideia agarrar seus cabelos, pude me apoiar graças a
isso.
Ele parou e se afastou somente para ver minha reação. Eu deveria
estar uma bagunça, mas ele... os lábios molhados da minha lubrificação, o
olhar faiscando e o pau marcando e manchando com pré-gozo o casaco que
usou para se cobrir mais cedo.
— Um Vor não deveria ser tão erótico assim — murmurei, segundos
depois ele sorriu de canto e se afundou novamente, me fazendo apoiar
minhas pernas em seus ombros.
Ele me devorou, dentes beliscando minha carne sempre que eu
estava prestes a gozar, então se afastava e soprava, voltando a me chupar e
lamber, brincando com meu clitóris, prolongando o momento de maneira
enlouquecida.
Como ele podia ser tão paciente em um momento desses? Eu já
melava minhas coxas e seu rosto inteiro com minha lubrificação.
— Peça, princesa... peça e te darei.
Pisquei, aturdida, ele ficou calado, aguardando uma resposta e
somente segundos depois que entendi.
Aquele cretino queria me ver implorar, me fazer perder a razão da
mesma forma que o fiz perder antes.
— Por favor... me deixe gozar, noivo — balbuciei, nossos olhares
pregados um ao outro.
Yakov sorriu satisfeito e logo senti meu clitóris ser sugado, não foi
com força, apenas uma sucção gentil e persistente que me levou à ruína. Ele
me daria esse tipo de orgasmo? Minhas costas apenas com a parte de cima
apoiada na parede, tão arqueada e perdida dentro de mim mesma, quase
como se meu sangue tivesse sido roubado e eu viajasse para perto da
inconsciência, e ele usou apenas a boca.
Ainda estava me recuperando quando ele me ajeitou e me fez ficar
de pé. Juntei as sobrancelhas sem entender o que ele pretendia, até vê-lo
remover o casaco e me virar de costas para ele.
— Aperte bem suas coxas — obedeci sem perceber, a voz rouca em
um comando firme. — Isso... — Deixou um beijo suave em meu pescoço,
segundos depois senti seu pau invadindo entre minhas coxas, arfei. Ele
prendeu minhas mãos apoiadas na parede, sem me permitir mover. — Estou
sem camisinhas aqui, princesa, por ora será o suficiente.
Sentia os movimentos de quadril, sua pélvis batendo contra mim.
Seus grunhidos e a respiração vibravam contra a curva do meu pescoço e,
principalmente, seu pau indo e vindo entre minhas coxas, atiçando meu
clitóris e me fazendo contorcer, querendo mais do que ele estava disposto a
me dar.
— Não parece o suficiente para mim — resmunguei, o pulsar do seu
pau só me deixava mais ansiosa por tê-lo dentro de mim.
Sua risada contra minha pele me fez arrepiar novamente, ele
entrelaçou nossos dedos e tornou o aperto mais pesado, me fazendo sentir
seu verdadeiro peso contra minhas costas. Bombando forte, gemendo mais
alto e acrescentando mordidas em seus beijos.
Ansiava pela penetração, tanto pelo prazer quanto pelo meu plano,
movia meu quadril com o pouco espaço que tinha, mesmo assim ele não
cedeu, soube que aquilo seria o máximo que arrancaria dele.
— Vou te deixar gozar de novo..., mas..., porra! — Sua cabeça se
recostou em mim, o pulsar de seu pau foi mais forte e então o líquido
quente começou a escorrer por minha pele.
Algo nisso me excitou, saber que seu gozo denso estava deslizando
em mim, um prazer que ele se negava a ter, mas sucumbiu, ainda que não
do jeito que almejei para nós essa noite.
Ele se afastou devagar, tomando cuidado para me segurar, me virou
de frente e sem aviso, puxou-me pela nuca roubando um beijo mais brando,
como se me agradecesse por ter insistido um pouco mais. Não havia
arrependimento, esperei ouvir palavras como: “não deveríamos ter feito”;
“vamos fingir que nunca aconteceu” ou “isso foi um erro que não
repetiremos”. Porém, tudo que recebi naquele momento foi um beijo
cadenciado
— Sente-se na pia.
Assenti e caminhei até a pedra fria de mármore, um exagero que
meu pai fez questão em todos os banheiros, me apoiei devagar, ainda estava
um pouco trêmula, mas assim que me ajeitei ele retornou com uma toalha
pequena molhada, a água estava morna e pareceu beijar minha pele, como
ele fez minutos antes. Yakov limpou todo o seu gozo, tão devagar e
carinhoso que pensei ter sido enganada: onde estava o homem que fodeu
minhas coxas como se fosse um animal?
Seus olhos focaram em meu rosto, a seriedade me fez voltar a todas
aquelas frases clichês que homens soltam para voltarem atrás de suas
decisões.
— Prometi que a faria gozar de novo, então abra bem suas pernas,
noiva.
Mal abri a boca para respondê-lo e tive minhas pernas separadas e
seu corpo entre elas, sua boca parecia conhecer muito bem os caminhos do
meu prazer, dessa vez seus dedos também resolveram participar. Com
movimentos lentos e constantes de seu indicador e médio, ele não os fazia ir
e vir, e sim como formato de um gancho.
Gemi alto quando sua língua sincronizou a velocidade, tornando
tudo mais intenso e me fazendo explodir novamente, tão fácil e rápido.
Talvez já estivesse no limite, certo?
Eu estava completamente em branco, sabia que em algum momento
ele me carregou até a banheira e senti suas mãos lavando meu corpo, a
moleza que me abateu foi novidade para mim e meu corpo resistente o
suficiente para aguentar dois ou mais dias sem comer e sem se hidratar
devidamente. Obviamente que os dois orgasmos foram os culpados, junto
de um estresse que tentei suprimir e as preocupações de como lidar com
tudo e ainda me manter sobre total controle dos meus pensamentos e
sentimentos.
Aquele momento insignificante de prazer foi o pavio aceso para
explodir a bomba que me tornei desde que pus meus pés nesse país.
Ser treinada não me isentava de ser humana. Eu ainda tinha que
lidar com a exaustão e todos os pensamentos intrusivos que poderiam me
visitar durante momentos difíceis, a única diferença era como respondia
àquilo.
Mirei suas mãos grandes enquanto me secava devagar, tomando
cuidado para não esfregar demais minha pele e acabar me causando
vermelhidão. Sorri. Há tempos ninguém cuidava de mim desse jeito, como
se eu valesse mais do que uma joia rara. Pequenos gestos que me permiti
apreciar, afinal, era o cachorrinho leal do meu pai comigo, não alguém que
se aproximou dizendo querer ser meu amigo ou namorado.
Yakov agia daquele jeito apenas por ser ele, não por uma intenção a
mais, do mesmo jeito que me pegou sem ressalvas no sexo. Não tinha uma
expressão naquele rosto que fosse minimamente fingida.
Ele demonstrava dois estados: expressivo de menos ou demais.
Meios termos não faziam parte da sua vida.
Mesmo que me trouxesse um certo conforto, era um ponto a se
prestar atenção, se aquele soldado se rendesse a mim, seria tão devoto que
poderia se tornar obsessivo, já que a natureza do nosso relacionamento seria
mais carnal do que qualquer outra que ele teve enquanto Vor. Mas se ele
negasse a mim, eu teria grande dor de cabeça para me livrar dele quando
chegasse a hora.
Um esfregar gostoso sobre meu lábio inferior me fez encará-lo, seus
olhos escuros pareciam curiosos, mas ele se deteve.
— Não vá para outro lugar durante o tempo em que estiver comigo
ou ficarei desconfiado. — Lambi a ponta do seu polegar e ele ousou colocá-
lo mais para dentro, me fazendo lambê-lo e então chupá-lo como se fosse
seu pau.
— Tem alguma camisinha pelo quarto, soldado? Ou eu devo ir
buscar no meu?
Ele piscou, afastando-se repentinamente. Esquadrinhou o local,
voltou com o casaco gigante que usei para vir até seu quarto e o esticou
para mim.
— É melhor terminarmos essa noite por aqui. Seu pai pode
desconfiar que saiu e não acho que ele aprovaria nada do que fizemos hoje.
— Também acho que não. — Levantei-me, minhas costas
queimaram com sua encarada assim que virei de costas e me enfiei no
casaco, fechando-o bem na frente também e colocando o capuz, só depois o
mirei sorridente. — Ele ficaria decepcionado em saber que perdemos a
chance de lhe dar um neto. — Pisquei e passei por ele, saindo de seu
banheiro e quarto, o abandonando com os pensamentos tão inquietos quanto
os meus.
Não completei minha missão da maneira que gostaria, mas foram
bons avanços. Yakov me mostrou um lado vulnerável e não fui a única
exposta diante da luxúria.
Capítulo 08

A rosa dos ventos era vista pela Bratva como uma identificação de
alto escalão dentro da organização, se fosse nos joelhos significava o quanto
aquele soldado não se ajoelhava nem mesmo para Deus, no ombro era como
se aquele Vor fosse o braço direito de seu Pakhan, eu receberia as três se
Semyon não tivesse mudado todo o sistema e revertido esse tipo de imagem
para algo negativo, estava satisfeito em não ter nenhuma marca em meu
corpo, era apenas um homem servindo ao seu chefe, sem perguntas demais,
ainda que fosse completamente atento ao meu redor.
Ele não precisava me dizer toda a situação, era meu dever entendê-
la com poucos elementos presentes, do contrário não seria mais do que
todos os outros soldados.
Semyon Rurik me notou ainda na adolescência, um garoto astuto,
mesmo que um pouco encrenqueiro demais. Barulhento. Orgulhoso. Coisas
que para ele foram perfeitas, como um ponto de partida.
No começo todos pensavam que eu estava sendo criado para
substituir o filho que sua esposa não pôde lhe dar, no entanto, ele nunca me
viu dessa maneira.
Fui jogado aos porcos com feridas por todo o corpo assim que
completei dezoitos anos. Pensei que a viagem para a Itália era um presente
de aniversário, completamente alheio à guerra fria que a máfia italiana vivia
com a Bratva, os fazendo odiar qualquer russo que pisasse em seu território.
Semyon era apenas um conselheiro de confiança do Pakhan da
Bratva, seus olhos já tinham a ganância pelo poder e fui seu primeiro
recruta. Ele cuidou de mim, mas se esqueceu de me avisar sobre a
emboscada feita para “criar meu caráter”, se eu sobrevivesse aos italianos
malditos, me tornaria um soldado e poderia me mudar para o dormitório dos
Vor.
Não fui morto imediatamente porque eles acharam meu rosto e
corpo agradáveis e foi graças aos caprichos de um dos homens do Don que
pude ser jogado ainda com vida aos porcos, após apanhar de mim por toda a
noite que tentou me estuprar, ele achou que dar alguns socos e abrir duas ou
mais feridas em meu corpo seria o suficiente para me deixar fraco e me
fazer ser a refeição dos porcos gigantes e gordos de sua pequena fazenda.
Foi Semyon quem me resgatou e tratou das minhas feridas, assim
como foi ele quem assumiu meu treinamento e me ensinou metade de tudo
que sei, a outra parte tratei de correr atrás sozinho, principalmente depois de
ouvir seu plano de criar uma nova organização com apoio de políticos da
Rússia e do exterior, levando os homens que não se sentiam confiantes com
a liderança da Bratva, fomentando a sede por reconhecimento nos soldados.
Minha lealdade poderia ser baseada apenas nessas situações, na
verdade, entendia que ser leal a Semyon seria o mínimo que eu poderia
fazer, como uma troca por toda a sua ajuda anterior, ele esperava por isso.
Então conheci a sua irmã mais nova, uma linda mulher de cabelos
castanhos e olhos grandes da mesma cor, seu sorriso poderia iluminar uma
floresta no meio da noite, era o que eu acreditava. Yelena era destemida,
responsável e uma força da natureza... pensando bem, ela e Alya se dariam
muito bem se pudessem se conhecer.
Aquela tatuagem nas minhas costas me fazia lembrar que foi graças
a um sentimento arrogante mascarado de paixão que traí meu Pakhan, o
único homem que salvou minha vida quando jovem, aquele que me
resgatou de uma organização que apenas me usava como escudo. Quis
Yelena para mim, a desejei com tanta força que pude tê-la em meus braços,
ninguém nunca ousou se aproximar dela como eu, não apenas por causa de
seu irmão, mas a própria mulher impunha limites bem claros a todos os
homens, menos a mim.
Pensando bem, seria melhor se ela o tivesse feito.
Os olhos de Alya me incomodavam por se parecerem tanto com os
de sua mãe na cor e com o de seu pai na intensidade. Odiava aquela cor e
sentia culpa quando era alvo daquela intensidade.
Um passado que minha noiva nunca chegou perto. Uma tia que ela
jamais conhecerá e sua história que foi apagada como se não valesse a pena
ser lembrada.
A maneira como a herdeira age não é exatamente igual a de Yelena,
mas em pequenos gestos e alguns detalhes de sua personalidade; me fazem
lembrar dela, não sempre... em momentos específicos. Era por isso que
preferia me afastar, mas o Pakhan escolheu a mim como seu genro, e depois
de tudo que compartilhamos não era justo negar.
Nunca mais poderia negar nada a Semyon.
Tirei de nós o direito de ver sua linda e radiante irmã sorrir.
Ousei tocar no fruto proibido da árvore mais importante para os
Zhertva.
Sentir a maciez da pele de Alya soou como profanação, indecente de
um jeito que perdi minha moral e razão, foi fácil demais ceder aos seus
pedidos, me deixar levar pelo tesão em seus olhos e experimentar daquele
corpo sensível.
Foi como se voltasse no tempo e repetisse meus erros, mas dessa
vez com a permissão de Semyon. Algo nisso me incomodava e me causava
certa ansiedade.
O que poderia esperar de um relacionamento fadado a dar errado? E
que direito eu tinha de ser feliz com uma mulher cujo sangue que corria em
suas veias era o mesmo de outra a qual roubei a vida?
Alya sabia até onde sua mãe era capaz de ir para ter o que quer?
Ignorei essa coceira que vez ou outra aparecia debaixo da minha
pele, bem onde meu coração estava. Mesmo que fosse insistente e pedisse
para ser coçada...
O escopo de uma vida muito bem planejada foi riscado com uma
caneta preta e pesada do destino, redesenhando novos caminhos com fins
bem parecidos ao anterior. Eu me vi encarando a janela daquele quarto,
vendo o dormitório ao longe e a movimentação dos meus soldados, a
porcaria de um espectador de algo que semanas atrás também me pertencia:
a vida fútil de um Vor dos Zhertva. O que a herdeira decidida e de olhos
ferozes pensaria de mim, se soubesse que foi sua destemida e jovem tia a
minha última vítima.
A tatuagem parecia queimar em minhas costas, voltando a coçar
com uma história trágica... Yuri e os outros corriam em volta do terreno e eu
continuava quieto os observando, talvez minha vida existisse apenas para
ser assim: trágica e moldada na solidão. O que mais um ser insignificante
como eu poderia ter?
Semyon se arrependeria de sua decisão, me dar sua filha como
forma de demonstrar sua confiança em mim, mesmo que seu sangue já
tenha pingado de meus dedos.
A cobra que esmagava minha rosa dos ventos, era minha ganância
roubando meu título de conselheiro fiel. A memória de alguém que eu
poderia ter sido.
Aceitei minha punição, mesmo que ainda acreditasse ser branda em
vista do meu crime, deixar de ser parte da nata política e empresarial e viver
arriscando minha vida na linha de frente, sendo o único marcado com uma
tatuagem, ainda frequentar a casa do Pakhan, e agora o primeiro Vor a ter
autorização para se juntar em matrimônio com uma herdeira tão importante.
Não fazia sentido. Soava errado, como se a vida de repente,
estivesse me poupando demais.
Algumas batidas na porta foram responsáveis por me tirarem do
pequeno devaneio, poucas coisas na minha vida me pertenciam, de fato, e
assim que girei a maçaneta tive mais certeza disso.
— Deseja algo, senhora Rurik? — Mal pude disfarçar o desprezo.
Há mais de oito anos venho evitando qualquer tipo de contato com
esta mulher, sequer existiam motivos para termos qualquer interação, no
entanto, lá estava ela, encarando-me indiferentemente, como se nada nunca
a abalasse. A postura de uma esposa diligente e elegante.
— Posso entrar? — Obriguei-a a recuar alguns passos enquanto
fechava a porta e me colocava do lado de fora.
— Temo que não é de bom grado ter a minha sogra sozinha comigo
em meu quarto.
— Não é uma conversa que pode chegar aos ouvidos curiosos de
alguns subordinados.
— E por que motivo teríamos uma conversa desse nível? — Sorri de
canto, tentando suprimir a vontade de lhe dizer tudo que guardei por anos.
— Não quero parecer rude, senhora, mas faz anos que não nos dirigimos a
palavra, então não vejo o porquê de tanto mistério.
Ela olhou ao redor, depois suspirou e tocou meu braço, me afastei
imediatamente, apenas o roçar de seus dedos em mim, me causava repulsa.
— Está sendo ridículo, Yakov Dobrow! — Não a respondi, ainda
negando-me a deixá-la entrar em meus aposentos. — Que seja, vamos
caminhar pelo pequeno jardim de inverno, serei rápida de qualquer forma.
Aceitei apenas para finalizar qual fosse a pendência que a trouxe
direto a mim. Todo cuidado era pouco quando se tratava da família do
Pakhan. Cometi erros severos o suficiente, ele não seria tão benevolente
uma segunda vez.
— Pode falar, não há ninguém por aqui. — Eu a apressei.
Caminhamos na mesma velocidade, porém tão longe um do outro
que um muro poderia ser construído entre nós, e era essa distância que eu
queria manter dela.
Em uma primeira olhada descuidada, poderiam confundi-la com sua
filha, entretanto se prestássemos atenção, veríamos as discrepantes
diferenças. O tom do loiro de seus cabelos, o tipo de azul e os pequenos
detalhes de formatos de seus olhos, os lábios de Alya eram maiores também
e a personalidade dela encantaria qualquer um, ao contrário de sua mãe que
sempre olhava a todos de forma vazia, fútil.
— Faça com que ela desista disso!
Não pude conter o riso jocoso que escapou de minha garganta.
Natalya nunca pedia, ela ordenava.
— Sinto muito, não interfiro nas decisões do Pakhan, peça você
mesmo que ele cancele meu noivado.
Encarei-a, a expressão soberana caindo por terra, me deixando ver,
mais uma vez, aquela amargura que ela escondia muito bem.
— Você sabe que ele não me ouve.
— Então converse com sua filha, senhora.
— Ela muito menos — grunhiu irritada. — Você é o único que pode
ter a decência de interromper essa loucura, sabe que nada de bom vem
desse tipo de união.
Parei e ela fez o mesmo quando percebeu, ficando apenas alguns
passos mais à frente de mim.
— Irá mesmo reproduzir os erros de antes?
— Você a ama? — perguntou de supetão, o olhar transparecendo o
pouco da loucura que um dia conheci. — Sente algo por ela ou apenas
enxerga Yelena quando a vê? — Franzi o cenho e ela sorriu arrogante. —
Não é engraçado? — Seus olhos inquietos me causaram um desconforto
familiar. — A minha filha parece mais com aquela mulher do que comigo
— divagou por um segundo, depois se recompôs e voltou à postura de
sempre.
— Não importa o que sinto, tampouco Alya se interessa por isso.
Acabou de dizer absurdos, me permita voltar para o meu quarto...
— Não quero competir com ela, nunca quis isso — interrompeu-me.
Natalya se aproximou. — Não sou uma vilã, Yakov. Eu desejava ser livre e
até hoje sonho com essa utopia. Você me perguntou se eu queria reproduzir
o passado? É exatamente por não querer isso que te suplico... convença-a,
acabe com esse noivado o quanto antes.
Ela passou por mim, me deixando sozinho com aquelas recordações
incômodas, mexendo com minha cabeça mais uma vez.
Não permitiria que me manipulasse, estava cansado dos joguinhos
que ela gostava de fazer com todos ao seu redor. Nem mesmo sua filha foi
capaz de amolecer seu coração, talvez nem existisse um batendo naquele
peito.
Capítulo 09

Aquelas páginas só falavam a respeito de um ou dois contratos da


empresa de construção do meu pai, a parte legal dos nossos negócios, no
entanto, eu sentia falta de algo mais. Reli novamente toda a papelada,
depois ergui meus olhos das folhas para o homem imponente sentado do
outro lado daquela mesa imensa.
— Pai, onde estão os livros fiscais? — Ele ergueu as sobrancelhas.
— Precisa deles para algo? — Inclinou-se sobre o tampo de madeira
e apoiou o cotovelo direito nele para que sua cabeça descansasse em sua
mão.
— Só posso vê-los em situações especificas? — rebati. — Se um dia
terei controle sobre tudo isso, preciso acompanhar a situação, não acha?
— Se tem desconfianças, compartilhe comigo, por favor.
Suspirei, ajeitando minha postura na cadeira e colocando os papéis
na parte desocupada de sua mesa.
— Não é nada, apenas gosto de ter as informações completas, do
contrário vou pensar que está tentando me direcionar e não me deixar a par
de tudo.
Ele sorriu de lado.
— É tão exigente quanto eu, gosto disso, princesa.
Segurei-me para não revirar os olhos. Ele ainda pensava que me
tratar como antes, elogiando e nos comparando como se fosse a pessoa mais
genial à sua frente, surtiria algum efeito. A bajulação feita na medida certa e
nos momentos devidos poderia se tornar uma bela arma de manipulação.
Ignorei suas palavras.
— Onde está Yakov? O mandou fazer algo hoje?
Ele negou, empertigando-se todo e me encarando com mais dureza.
— Seu noivo não é mais um soldado para cumprir ordens tão bobas
vindas de mim, ao que sei, esteve caminhando com sua mãe. — Congelei,
meus lábios comprimidos e minhas mãos fechadas em punhos. — Já deve
ter retornado ao quarto dele. — Deu de ombros, sabendo bem que aquela
pequena informação foi capaz de me deixar alerta.
— Acredito que já vi o suficiente por hoje, se puder, me traga os
livros fiscais da próxima vez.
Ele concordou, o sorriso escorregando de volta aos seus lábios.
— E pai... — chamei-o antes de sair. Ele inclinou a cabeça. —
Vamos automatizar essas informações, a empresa não pode ficar para trás
no que diz respeito à tecnologia e não há nada nela que mereça ser
escondido, ou há? — Ele não respondeu, apenas voltou à seriedade. —
Entendo o cuidado no que diz respeito aos outros negócios, mas a
construtora é muito mais do que um lugar para lavarmos o dinheiro.

**

Meus passos se tornaram mais apressados à medida que me


aproximava da porta de seu quarto. Não que estivesse sendo descuidada,
queria que meu pai pensasse em mim como uma mulher impulsiva que se
permitiria apegar a alguém que nunca viu antes. Chegar mais rápido até
Yakov me ajudaria em duas questões: teria minhas respostas o quanto antes
e meu pai se alimentaria de sua arrogância, atestando que sou exatamente o
que montou em sua mente.
Mal ergui a mão para bater na porta quando ela se abriu sozinha,
olhos escuros me miraram com certa curiosidade, as rugas em sua testa
causadas pelo franzir pertinente e a maneira como sua mandíbula estava
sendo forçada sem que ele se desse conta, me indicaram o desconforto que
foi se encontrar com sua sogra.
— Posso entrar? — Essa frase pareceu despertá-lo, ele piscou antes
de focar seu olhar em mim, então apenas acenou e saiu do caminho para me
deixar passar. — Soube que teve visitas hoje.
— Sim.
Ríspido de um jeito que nunca foi comigo, mesmo quando tentava
me manter distante era no mínimo cordial. Yakov ainda estava preso no seu
encontro indesejado, seus pensamentos flutuando em algo que lhe foi dito e
isso atiçou minha curiosidade ao mesmo tempo que me preocupou.
Natalya não teria poder sobre esse soldado se já não existisse uma
história a ser contada, faz anos que ela não se movimentava dentro dessa
casa, pois apesar de morar no exterior, nunca deixei de monitorar seus
passos.
A cautela que aprendi a ter não era somente sobre meu pai, acima de
todas as pessoas que pude irritar, foi dela quem tirei a maior diversão.
— O que ela queria? — perguntei direta, ele não estava em
condições de jogar.
— Ainda não pretendo te dizer, princesa.
Aproximei-me o suficiente para segurar seu rosto e impedi-lo de
fugir de mim.
— Mas e ao seu Pakhan? — ele comprimiu os lábios. — Dirá para
ele?
— Se ele me perguntar, sim direi.
Afunilei o olhar, aquilo me deu uma leve irritação. Com certeza
tinha a ver com nosso casamento, do contrário ele não se negaria a dizer
livremente, já que uma das coisas que aprendi sobre Yakov foi na facilidade
que ele tinha de simplesmente acabar com um assunto que ele sabia ser
desnecessário.
Respirei fundo e, de repente, fiquei consciente das minhas palmas
esquentando seu rosto e o fato de ele não ter se afastado em nenhum
momento, pelo contrário, parecia satisfeito com o carinho, como se aquele
pequeno gesto fosse suficiente para aliviar um pouco de seus tormentos.
— Tudo bem, eu te entendo. — Juntei mais meu corpo no seu. —
Posso te beijar, soldado?
Meu futuro marido me esquadrinhou com atenção, seus lábios
entreabriram e pensei que diria algo para me afastar, no entanto, suas mãos
me prenderam mais perto com uma firmeza que podia jurar ser para que eu
não fugisse. Antes que um sorriso se formasse em minha boca ele me
tomou sem me responder.
Foi um beijo lento, primeiro apreciando minha carne, depois
introduzindo sua língua e explorando minha boca, degustando o suficiente
para me abraçar como se quisesse se fundir ao meu corpo. Logo o beijo
cadenciado se tornou mais bruto, meus pés sendo empurrados para trás até
que minhas costas sentissem a frieza da parede.
— Está melhor? — Ele demorou alguns segundos para entender ao
que me referia e isso apenas me fez esticar mais os lábios em satisfação.
— Sim — murmurou um pouco envergonhado.
Percebi que Yakov nunca recuava depois de dar o primeiro passo,
mesmo que seus olhos me dissessem que ele queria poder correr para longe
de mim, se mantinha no lugar, tendo-me em seus braços.
No final, até mesmo um soldado como ele podia ser carente de
contato, a ponto de se apegar desesperadamente ao mínimo calor que outra
pessoa pudesse oferecer.
Abracei-o pela nuca, escondendo meu rosto na curva de seu
pescoço, me questionando onde minha sanidade havia se escondido ao
mesmo tempo que tentava me convencer de que era somente um jeito de
conseguir sua lealdade para mim.
Não foi ruim sentir sua respiração batendo quente contra a minha
pele, nem mesmo os batimentos fortes de seu coração esmurrando tanto seu
peito que conseguia ditar exatamente o seu ritmo.
— Você não gosta desse arranjo, Yakov? — Eu me vi perguntando
em voz alta algo que deveria ficar apenas em meus pensamentos.
Congelei quando seu corpo todo ficou tenso. Nenhum de nós ousou
se afastar para nos olharmos.
— Não acha ruim estar presa a um soldado marcado, que teve a
pena do seu pai como único motivo de mantê-lo vivo? Sequer sou forte o
suficiente para receber a honra de me casar com a herdeira.
Aquelas palavras me pegaram desprevenida. Então era isso que
passava em sua cabeça todas as vezes que o assunto casamento o atingia?
De todas as coisas que ele poderia tirar vantagem, ainda se sentia indigno
de mim.
Embora odiasse ser tratada como um objeto pertencente ao Pakhan,
sabia o quanto minha posição na família era sedutora a olhos atentos e
gananciosos. Qualquer outro pisaria em ovos comigo, mas principalmente,
assumiriam com facilidade o cargo de “marido da herdeira”.
Com um conselho ridículo e machista, seria fácil para ele se reunir
com os outros e exigir uma liderança, me deixando de canto e me
transformando em sua esposa problemática, pois jamais me calaria diante
disso.
Yakov genuinamente não soava como um desses. Ele estava apenas
seguindo com sua vida e cumprindo mais uma ordem do seu líder, sendo
devoto de tal maneira que fez meu sangue borbulhar por saber as intenções
do meu pai. Sua vida era dedicada a alguém que não piscaria antes de
destruí-la. Uma fraqueza que me dava náuseas e fascinava também.
— Creio que nosso Pakhan não seja tão bondoso assim, se ele te
manteve vivo, foi por saber sua força e reconhecer o quanto você vale
muito mais respirando.
Minhas mãos acariciaram sua nuca, um movimento de afeto, mais
uma vez me peguei pensando o que estava acontecendo comigo.
Aquele homem que me pegou com tesão e brutalidade há poucos
minutos, parecia um filhote mendigando por carinho para sua dona, de
algum jeito isso me fez querer protegê-lo, colocá-lo debaixo das minhas
asas e fazer os movimentos que ele, sendo fiel como era, jamais seria capaz,
mesmo se soubesse o quanto sua vida não valia tanto assim para o seu líder.
Não adiantaria de nada revelar minhas suspeitas para Yakov. Ele
apenas ignoraria o perigo, impondo uma nova barreira entre nós e ainda
obedecendo ao meu pai.
— Percebo que é um homem único, Yakov. — Finalmente pude me
afastar um pouco, mirando pequenas avelãs brilhantes, mas ainda sem uma
gota de lágrima. — Mas temo que agora não é o momento para deixar
alguém te afetar dessa forma. Você também não respondeu a minha
pergunta...
— Não. Eu não gosto desse arranjo. — Fiquei inquieta. Imaginava
isso, mas suas palavras pareceram mais afiadas do que gostaria. — Não
gosto de pensar que estamos juntos por causa de uma ordem e que você tem
que me suportar ao seu lado, mesmo que muitos odeiem isso. Você poderia
estar com alguém de quem goste e...
— Acredita mesmo nisso? — eu o interrompi, uma risada jocosa e
curta escapou ardida pela minha garganta. — De que se não fosse você,
seria alguém que eu desejasse em minha vida? — Deslizei meus dedos por
seu pescoço e fui descendo até a barra de sua camisa, ele me permitiu,
focando seus olhos nos meus. — Eu nunca tive o direito de escolha,
soldado. Por isso estou feliz que seja alguém como você, que seria incapaz
de me ferir.
Era óbvio que não acreditava naquilo, se eu tentasse matar o seu
Pakhan tão precioso, ele com certeza me eliminaria, porém, era bom me
iludir, mesmo que por um segundo, que aquilo fosse possível, que aquele
homem era capaz de decepar alguém com poucos golpes, mas jamais
conseguiria desferir um tapa contra mim.
Capítulo 10

Depois de ter cometido tantos erros no passado, aprendi a ficar na


minha, seguir a minha vida e aceitar as ordens que Semyon me dava,
independentemente do que fosse. Tive que sujar minhas mãos com diversos
tipos de pessoas, desde as genuinamente ruins até aquelas que só estavam
no lugar e hora errados.
No entanto, pela primeira vez em anos, me perguntei se seria capaz
de cumprir uma ordem se envolvesse a morte da herdeira.
Esse pensamento passou rápido, enquanto olhos azuis de tigre me
encaravam com certa ternura. A realidade vinha como socos em momentos
como esse.
Seria instintivo rir e dizer que não era garantido, porém, eu não
consegui. Ainda a tinha em meus braços e meu corpo se recusava a se
afastar, a tensão sexual pairava como uma nuvem fraca que indica a chuva,
mas parece distante o suficiente para que possamos nos proteger do
temporal. O problema era que eu não tinha medo de me molhar.
— Porque insiste em uma relação mais próxima, não seria
suficiente o casamento e fingirmos diante de outras pessoas?
Tentei mudar de assunto e quebrar aquela tensão.
— Acho que comentei sobre a pequena superstição de família,
certo? Para ser sincera, é algo que meus tataravôs criaram sendo bons
supersticiosos que eram, e ninguém ousou quebrar até hoje. — Ela parecia
mais relaxada, apoiava-se em mim de maneira descontraída e seu olhar
suavizou muito. Alya não desgostava das histórias de sua família.
Começávamos a ver outras nuances de nós. Era tentador descobrir
um pouco mais da mulher que conseguiu sozinha derrubar mais de quatro
homens.
— Tratasse de fazer sexo um dia antes de qualquer evento
importante. — Lambeu os lábios lascivamente, voltando a uma postura
predatória. Sinceramente, me perguntava se todos se sentiam intimidados
por ela ou esse olhar era dedicado somente a mim. — O líder da família,
que geralmente era um homem, passava a noite anterior regado a putaria,
para resumir tudo.
Como ela conseguia falar daquilo com tanta naturalidade e leveza?
Sem notar, já estava sorrindo e imaginando o quão ofendido o
Pakhan ficaria se ouvisse seu “resumo” de algo tão tradicional e intrínseco
em sua família.
— Por isso precisa ficar mais perto de mim?
— Também. Ao contrário dos homens, não posso me dar ao luxo de
correr atrás de prostitutos sempre que precisar saciar meus desejos, ter um
marido é cômodo e seguro. — Deslizou a mão ousada por debaixo da
minha camisa, esquentando minha pele e me fazendo consciente do seu
toque, ainda que suas falas fossem casuais. — Preciso parecer uma mulher
de um único homem, uma hipocrisia que vai levar anos para derrubar.
— Com todo o dinheiro e poder, não conseguiria agir igual a um
homem?
Alya piscou rapidamente, seu riso foi como se eu tivesse dito algo
muito divertido e inocente.
— Yakov, esse é o problema de várias sociedades existentes. Não
importa o quanto de poder e dinheiro eu tenha nas minhas mãos, se não
aparentar ser fiel, serei a vagabunda traidora. Não há meios-termos para
nós. Esse tipo de repercussão só me geraria mais dores de cabeça e
sinceramente, não tenho uma autoestima frágil suficiente para tentar
compensar em atividades desnecessárias. Estou longe de ser conservadora e
cheia de regras para a minha vida sexual, se eu quiser, faço, mas jamais será
para compensar algo que me falta. Em outras palavras... prefiro ter meu
marido me satisfazendo de todas as formas possíveis a me arriscar.
Claramente falhei em minha tentativa, puxei o assunto mais
inapropriado possível para discutir com alguém como ela, Alya não se
envergonhava de falar sobre sexo e não teria problema algum escutar um
pouco mais se não fosse pela vontade que eu estava sentindo, queria provar
do seu corpo inteiro novamente e ver qual seria sua expressão enquanto
meu pau estivesse a penetrando devagar ou quem sabe meteria de uma
única vez, lhe proporcionando aquela pequena dor misturada ao prazer.
— ...vamos tentar! — disse por fim.
Minha atenção havia escapado até seus lábios, inundando minha
imaginação de imagens dela nua, gemendo para mim sem qualquer tipo de
restrição. Ela desceu as mãos até a braguilha da minha calça, causando-me
um instante de clareza.
— O que disse? Tentar o quê?
— Saber se seremos compatíveis, se poderemos viver juntos dando
e recebendo. — Lambeu os lábios devagarinho, me distraindo o suficiente
para me deixar a par de suas intenções depois de ouvir o barulho do meu
zíper sendo descido. Toquei suas mãos rapidamente. — Yakov, você é meu
noivo, mas se realmente não gosta disso... bom... se a gente testar primeiro
podemos decidir melhor como será nossa relação, o que acha?
— Ainda estou perdido... aqui. — Engoli em seco, já era tarde para
controlar minha ereção.
— Vamos fazer um acordo — soprou, sua voz baixa e lenta era
como o sussurro da cobra do jardim do Éden, pedindo para que a maçã seja
mordida. — Se não gostar de me foder, nunca mais encosto em você e dou
um jeito de continuar com a superstição da família Rurik, o que acha?
Assenti, sem saber bem com o que concordava, afinal o calor de
suas palmas já estavam se arrastando por cima da minha cueca, esfregando
o volume que minha ereção formou embaixo do tecido. Sua boca se fechou
em meu queixo em uma mordiscada suave, a minha calça escorregou depois
de ela abaixar até metade das minhas coxas.
— Será do seu jeito de novo, soldado. Mas se entrarmos em
consenso sobre manter essa relação, terei a chance de fazer o que quiser
com você, entendeu?
Concordei. Àquela altura a minha cabeça já sofria com a falta de
sanidade, lucidez era a última coisa que existia naquele quarto.
Alya desceu o tecido que escondia meu pau, de repente senti minha
pele sensível demais, a ponto de me arrepiar com suas unhas arrastando-as
suavemente pela minha virilha, sem saber como me controlar e deixá-la
seguir em seu tempo, me concentrei em seus lábios, beijando-a devagar, as
duas sensações misturadas me enchiam daquele tesão desmedido, o
sufocamento que apenas quem está loucamente entorpecido de estímulos
consegue saber. Sua língua se movendo em minha boca como se estivesse
me mostrando o que faria com a minha ereção, a palma da mão gananciosa,
esfregando o comprimento devagar até chegar à glande e finalmente se
fechar, me fazendo grunhir em sua boca.
Ela disse que seria do meu jeito, mas a pequena agonia causada pela
demora me agradou mais do que imaginei, deixaria que minha paciência se
esgotasse com suas brincadeiras em forma de preliminares, então depois a
faria ver o que significava me provocar daquela maneira.
Agarrei sua nuca prendendo em meus dedos um pouco dos seus
cabelos, mantendo-a com a cabeça parada, afastei um pouco meu rosto
quebrando o beijo e apreciando a imagem de seus lábios inchados e rosto
corado, o olhar em puro deleite com pupilas dilatadas escondendo naquele
escuro de luxúria o azul profundo e tão feroz que ela costumava ter.
— Pretende apenas usar a mão, princesa? — Minha voz saiu mais
rouca do que planejado, mas a forma como ela sorriu foi suficiente para
entender que gostou de ouvi-la.
O apelido soava mais como sacarmos, porque sabia que ela odiava
ser tratada dessa forma. Alya não era uma princesa e sim uma guerreira
prestes a tomar o trono de rainha.
Afrouxei um pouco o aperto e ela aproximou seu rosto do meu
pescoço dando mordidinhas ao passo que suas mãos voltaram para a barra
da minha camisa, mas dessa vez a puxando para cima junto, só se afastou
da minha pele para se livrar dela, tendo a minha ajuda. Joguei a peça para
longe e a deixei acariciar cada centímetro meu que estava exposto.
Seus beijos retornaram, começando pelo tórax e descendo
preguiçosamente. Um dia acreditei que aquela mulher fosse fria como a
neve que cai do céu no inverno, nunca estive tão errado. A pequena de
olhos feroz e rosto de anjo era tão quente que desconfiava estar lidando com
a própria Lilith, vinda do inferno para me enlouquecer. Minha respiração
pesava a cada vez que descia com aquela boca indecente.
Seus joelhos se dobraram conforme seu olhar permaneceu mirando-
me com uma devoção lasciva, pensei que gozaria naquele mesmo instante e
passaria vergonha diante daquela criatura única e tão envolvente. Não era a
imagem de uma mulher pronta para levar meu pau na boca, e sim de uma
fera se rendendo de forma pacífica com a única intenção de aliviar seus
próprios desejos, preparada para me devorar sem qualquer compaixão. O
hálito quente tocando na minha glande enquanto sua mão se fechava em
minha extensão me levou a fechar os olhos por dois segundos.
Não. Ela não seria piedosa, então por que eu deveria ser?
O pensamento surgiu junto do meu sorriso quando voltei a
esquadrilhar seu rosto, a pele macia aceitava meus dedos calejados, deslizei
para os lábios, puxando o inferior um pouco e me incomodei de ainda tê-la
vestida, ao mesmo tempo que era erótico demais observar apenas a pele do
topo de seus peitos. Soava como algo proibido e odiava admitir que isso
apenas acrescentava mais pontos ao tesão que sentia.
Sua mão começou a se mover, masturbando-me com delicadeza,
provocando sem intenção de me dar tudo que eu queria. Movi meu quadril
para a frente, propositalmente tocando minha glande no lábio inferior que
puxei, ela entendeu o recado e abriu a boca pondo a língua para fora e me
deixando colocar a cabeça do meu pau naquele buraco tão molhado e
quente. Alya deixou que eu continuasse metendo bem devagar, então ela
fechou os lábios ao redor da minha ereção e tomou o controle de volta,
chupando-me com mais força e circulando a língua molhando-o todo a
ponto de escorrer.
Agarrei sua cabeça e a ajudei a ir mais fundo, gemendo rouco,
perdendo a postura e me entregando ao prazer. Gozaria logo, sentia isso.
Suas unhas se fincaram em minhas coxas, e o barulho molhado que
escapava a cada vez que ela engolia meu pau, me deixou prestes a perder a
cabeça e invadir sua garganta sem pena alguma.
— Me mostre seus peitos, princesa. Me deixe gozar neles — disse
entre falhas, com meus olhos focados naquela cena tão depravada.
Alya não tinha mais a postura de intocável aos meus olhos, estava
ajoelhada com meu pau na boca e o rosto uma completa bagunça, a pele
avermelhada do esforço e falta de ar por todas as vezes que a fiz ir um
pouco mais fundo. Ela assentiu e sem parar de me chupar, agora sem ir tão
fundo, começou a deslizar a parte de cima do seu vestido o deixando cair
até sua cintura e me expondo os seios fartos. O fato de ela odiar usar sutiã
começava a me agradar.
Apertei os olhos, vendo aqueles montes deliciosos balançando a
cada movimento dela, a boca engolindo meu pau e o olhar escuro ainda
preso em mim.
— Isso... Alya... Alya — O gemido escapou quase como um rugido
da minha garganta, minhas bolas repuxando e meu pau pulsando forte. —
Tire a boca.... a boca...
Ela obedeceu, seus lábios deixaram meu pau, mas suas mãos
continuaram me masturbando fazendo com que gozasse em seu colo e seios
quase de imediato.
Ofeguei, quando voltei à lucidez fiquei completamente incrédulo
com o que fiz à herdeira. Nunca agi igual a um louco durante o sexo, mas
com aquela criatura felina me senti no dever de aproveitar cada segundo de
depravação.
Meu gozo decorando sua pele, cada vestígio da nossa insensatez
escorrendo por ela.
— Vai me deixar assim, soldado?
Engoli em seco, inquieto com meus pensamentos e ações.
— Vou te limpar, espere um pouco — falei sem pensar, vendo seu
olhar mudar e se tornar algo mais agressivo.
— Então não pretende retribuir? — Cerrei o maxilar, mas porra...
aquela imagem me embriagava de excitação, não demoraria a ficar duro de
novo.
— Claro que farei, preciso apenas limpar... isso. — Desviei o olhar,
e enquanto ia até o banheiro ela ria se deleitando com as minhas reações.
Nunca fui um homem inocente, na verdade, fui tão arrogante e
safado que corri atrás de alguém em quem jamais deveria ter encostado um
dedo. No entanto, o prazer nunca foi tão denso, sufocante a ponto de me
fazer perder a razão e agir antes de qualquer coisa.
Precisava tomar cuidado com aquela mulher, não deveria ser tão
fácil assim me prender em uma bolha de tesão, me cegando para o mundo.
Voltei do banheiro com a toalha umedecida em água morna para
limpá-la e a encontrei completamente nua, deitada de barriga para cima e
balançando as pernas casualmente. Aquela cena me fez imaginar uma vida
em que encontrá-la assim em cima dos meus lençóis fosse uma rotina. Meu
peito aqueceu e caminhei tranquilamente até estar sentado ao seu lado, ela
me observou sorrindo calorosamente e parou de se mover.
A cada toque da toalha a sua pele arrepiava, deixando os bicos dos
seios entumecidos e a respiração mais pesada do que o normal. Ela ainda
estava excitada, pedindo pela minha atenção já que a negligenciei mais
cedo. Deixei o pano de lado quando tirei todos os meus vestígios e
escorreguei minha mão por seu corpo. Era lindo ver cada pequeno pulsar e
estremecer, a forma como levantava sutilmente o quadril ou como abria as
pernas um pouco mais a cada vez que eu me aproximava de sua vulva.
Abri passagem entre seus grandes lábios usando meu dedo indicador
e médio, ignorando seu clitóris que já estava um pouco maior e durinho,
porém ainda não era o seu momento. Arrastei até a entrada da sua boceta,
olhando cada uma de suas expressões e as gravando dentro de mim. Sexo
era troca de vulnerabilidade e duvidava ter outros homens sortudos por aí,
que viram essa criatura dúbia tão entregue ao prazer quanto eu a via.
Como forma de recompensá-la pela obediência, me curvei beijando
seus lábios e mordiscando o inferior.
— Hoje você irá gozar no meu pau, Alya.
Continuei esfregando meus dedos apenas na sua entrada, sentindo a
lubrificação, quando achei ser o suficiente, arrastei-os de volta ao seu monte
carnudo e o acariciei, ela gemeu e arqueou as costas, a sensibilidade
aflorada pelas pequenas provocações.
Poderia conter suas reações e forçá-la a aguentar muito mais antes
de finalmente me colocar entre suas pernas, porém o dolorido repuxar das
minhas bolas me deixaram impaciente, meu pau duro outra vez, pulsando e
já melado na glande ao escorrer o pré-gozo. Estiquei-me o suficiente para
alcançar a mesa de canto e abri a gaveta, peguei um pacote laminado e me
afastei de seu corpo para abri-lo mais rápido.
— Saiba que estou aceitando fazer isso porque sou seu noivo de
qualquer forma e não me agrada colocar sua segurança em risco por causa
de sexo.
Dizia as palavras ao mesmo tempo que tentava me convencer de
cada uma delas.
Subi na cama e me enfiei entre suas coxas, a acomodando melhor
sobre o colchão, seu sorriso era de satisfação e ironia. Ela não levou a sério
nenhuma palavra que escapou da minha boca. Um pouco irritado e muito
excitado, posicionei meu pau em sua entrada e esfreguei minha glande, o
suspiro sôfrego saiu de nós dois, se misturando ao som dos gemidos no
instante que comecei a penetrá-la.
Alya era tão apertada e quente que a sensação se misturava entre o
prazer e a dor.
Então ela realmente se guardou para o marido?
Abri a minha boca para perguntar quando fui interrompido por um
gemido mais manhoso, suas pernas se enroscaram em minhas costas, me
prendendo no lugar.
— Yakov... por favor... por favor, me fode de uma vez — disse em
meio a gemidos baixos.
Capítulo 11

Tão obediente e ao mesmo tempo tão depravado e possessivo.


De qualquer forma, não era o momento de termos cuidado,
necessitava do toque bruto daquelas mãos grandes e calejadas, da firmeza
da sua boca chupando meu seio e os dentes fortes se fechando no bico.
Eu queria tudo que ele pudesse me dar enquanto inebriado com
aquele lado sem pudor, fechando os olhos para títulos que pudessem pesar
na sua maneira de me tratar.
O seu corpo suado e pesado sobre o meu, enquanto seu pau estocava
fundo e alargava meu hímen, sendo o primeiro homem que permiti ter essa
parte minha. A dor não se comparava ao prazer, e mesmo que ela fosse
maior, não me importaria. Ansiei por isso e o aproveitei em cada detalhe.
Meus gemidos se misturaram aos seus quando começou a se mover,
no início mais contido, porque Yakov me dava aquilo que eu pedia, ainda
que inconscientemente, se o mandasse parar e sair, ele faria. Essa confiança
não poderia ser sentida com qualquer um. Para que uma mulher tenha um
homem entre suas coxas, metendo seu pau que não é nada pequeno e está
longe de ser fino e ainda se sentir segura de que ele desistiria de tudo,
mesmo no calor do momento, no segundo que ouvisse um “não continue”,
realmente era preciso muita confiança.
Foi um dos fatores que me atraiu naquele soldado.
Yakov era um tipo perdido entre milhares de farsantes. Como boa
observadora e predadora, não me contive ao farejar esse diamante bruto.
Assim que aquele pequeno e quase inexistente incômodo sumiu
entre seus movimentos contidos, movi meus quadris em um pedido
silencioso.
Quero mais forte. Mais rápido. Quero todo dentro.
Ele desceu a boca de volta ao meu seio, intercalando as mordiscadas
e chupadas, depois suas estocadas ficaram mais fortes, me deixando sentir o
bater duro de sua pélvis. Talvez eu ficasse rouca no dia seguinte, mas me
negava a silenciar o quão gostoso aquele homem fazia, e o melhor, ele
também gemia.
Minha mente ficou em branco, meu corpo sendo consumido e me
deixando ciente de cada movimento dele. Agarrei-me em seus braços,
fincando minhas unhas, os sons que fugiam da minha garganta pararam,
ainda que o movimento de abrir a boca não. Era como estar colapsando,
mas de uma forma muito boa e bem mais intensa do que quando ele usou as
mãos e boca para fazê-lo.
A primeira vez que gozei, chamei seu nome em desespero, olhando
no fundo de suas íris e vendo o tamanho do tesão que aquele pequeno
momento lhe proporcionou, causando efeito imediato em mim, um choque
tão gostoso que me fez agarrá-lo com força e obrigá-lo a apoiar a cabeça em
meu ombro, suavizando suas estocadas no processo.
No entanto, os planos de Yakov eram diferentes dos meus, que
exausta pensava ter acabado, pois o senti pulsar tão forte que acreditei ter
gozado junto comigo. O soldado se afastou quando lhe dei liberdade dos
meus braços, olhou-me por alguns segundos e depois segurou minha cintura
me girando na cama e me posicionando de quatro, erguendo meus quadris
ao seu bel prazer. Ofeguei, ele parecia fora de si, guiado pelo tesão.
— Eu ainda não gozei, princesa, mas se me disser para parar... eu
deixo você ir — sussurrou em meu ouvido, seu corpo completamente
curvado sobre o meu e seu pau se esfregando na minha bunda.
Umedeci os lábios e me dei conta de que qualquer pedido feito por
ele, naquele tom de voz, enquanto pelado perto de mim; seria atendido.
Rebolei devagar, indicando minha resposta, mal tinha fôlego para
emitir algum som. Yakov virou meu rosto e esquadrinhou-o com cuidado,
confirmando se estava lhe dando permissão ou apenas me movendo
involuntariamente. O escuro de seus olhos me captou para um lugar tão
seguro e confortável que esqueci de onde vinha e qual era a minha situação.
Pude fingir ser apenas uma mulher regada de lascívia, sem preocupações
fora daquele quarto, podendo viver uma vida simples e normal com único
medo de não saber lidar com meus sentimentos depois de tanto prazer com
um homem ferido e desconfiado como ele.
Meu noivo se acomodou atrás de mim, sua palma grande e quente
deslizando da minha nuca até a minha bunda, deixando um tapa leve que
me fez sobressaltar de surpresa, pois nunca imaginei que Yakov teria essa
ousadia. Suas mãos apertaram minhas bochechas como se fossem
massinhas de modelar, até finalmente as separar um pouco e então
escorregar seu pau de volta para dentro de mim.
Uma estocada funda e forte que me fez enfiar o rosto nos lençóis
para conter um pequeno grito.
Eu, Alya Semyonova Rurik, me deixei ser completamente dominada
por um soldado marcado que se assemelhava a um cão de guarda do meu
pai. Entretanto, lá estava seu corpo se movendo ferozmente, seus agarres
pesados em minha pele, os quais com certeza deixariam marcas e seus
gemidos roucos e quase animalescos ecoando pelo lugar.
O mais assustador... Eu estava amando cada detalhe disso. Cada vez
que ele entrava em mim, a cada segundo que perdia o ar por ter sua mão
pesada em minha nuca me fazendo colar o rosto contra o colchão,
montando-me sem medo porque ele sabia que eu aguentava e se não
gostasse o faria parar no mesmo instante.
O segundo orgasmo me fez desmoronar, deitando-me
completamente porque meu corpo estava trêmulo e sem forças. Senti seus
beijos por toda a minha coluna, suaves e contraditórios à maneira que ele
ainda movia seu quadril, metendo forte e não me deixando se recuperar.
— Alya... — gemeu rouco. — Você é quente... não deveria ser tão
quente — ele parecia divagar.
Seu pau pulsou forte em minha boceta e eu o apertei como
movimento involuntário. Yakov saiu de dentro de mim e após alguns
segundos, senti o líquido quente tocando minha bunda e cóccix.
— Vou limpá-la....
Ele continuou falando, porém, eu me deixei cair no mundo dos
sonhos, tendo meu corpo todo relaxado e frágil, tão exposta como nunca
estive com um homem, confiando que Yakov seria incapaz de se aproveitar
de mim. Naquela noite eu dormi em seu quarto e só fui capaz de acordar
quando a claridade já surgia pelas frestas das janelas.
**

O café da manhã foi servido e a variedade de ovos, mingau e pães


não parecia agradar à minha mãe, que olhava a tudo enojada... ou talvez
fosse a presença de Yakov, sentado ao meu lado que a incomodasse daquele
jeito.
Desde que eles conversaram percebi essa animosidade. Natalya que
sempre foi indiferente a tudo, agora deixava marcado em seu rosto o seu
descontentamento, e Yakov se remexia na cadeira, inquieto com toda a
situação. Encarei meu pai procurando por algum indício, mas carregava o
mesmo sorriso falso, ignorando completamente o clima ao seu redor.
Agi em reflexo a ele, fingindo não notar o elefante em cima da
mesa, deixando que o café da manhã passasse e cada um seguisse para os
seus aposentos.
Quando acordei na cama de Yakov, notei que ele tinha me limpado
inteira com bastante cuidado, os lençóis também foram trocados, porém os
que usamos na noite anterior estavam enrolados no cesto de roupas sujas.
Eu os conferi e sorri satisfeita ao encontrar a pequena e vermelha prova do
nosso ato libidinoso.
Guardei-os comigo, em um momento oportuno seriam necessários,
mesmo que soasse tão rude e estúpido. Usar aquele soldado foi parte do
meu plano desde o instante que ele surgiu, meu pai não o escolheu à toa,
tampouco arriscou alianças por causa de uma atitude altruísta. Enquanto
dizia palavras bonitas e carregadas de sentimentalismo, eu lia as entrelinhas
e me preparava. Algum dia, no meio dessa loucura, precisaria me defender
ou atacar.
Amor nunca seria o suficiente na nossa família, na verdade, era o
motivo principal de todas as desgraças que nos acompanharam. Foi por
amor que matei um homem e condenei meu destino a um único caminho.
Assim como foi por amor que minha mãe decidiu que eu não valia a pena, e
há quem diga que foi por amor que meu pai se tornou quem é hoje.
Segredos não duram para sempre quando bocas sussurram rumores,
e o Pakhan, mais do que ninguém, sabe que esse é o problema de manter
pontas soltas... outra pessoa pode agarrá-las.
Yakov talvez seja uma dessas pontas, mas a principal delas fui eu
quem peguei e escondi fora do alcance de seus olhos. Se Semyon tivesse
um pouco mais de fé em si mesmo, jamais baixaria tanto a guarda para a
cópia que criou, seria esperto o bastante para olhar o reflexo e ver através
das minhas ações, mas ele deixou a vaidade crescer em sua alma e acreditou
cegamente em uma lealdade que nunca jurei lhe dar.
Amava meu pai, e por saber que só amor não bastava, me tornei a
espada de dois gumes que irá feri-lo ao mesmo tempo que se fere.
Capítulo 12

Semanas se passaram e Alya ficou tão ocupada quanto eu, sua


presença era solicitada em almoços ou jantares importantes com outras
mulheres da alta classe russa, mas também participava de reuniões do
conselho da construtora que era usada para lavar dinheiro do tráfico de
drogas e armas. Quanto a mim, fui restringido a passar todos os comandos
para Yuri, mostrando-lhe um pouco da parte diplomática e mais chata do
nosso trabalho. Ser um soldado direto do Pakhan exigia postura, ele não
precisava ser um cavalheiro elegante, mas tinha que manter uma educação e
saber os momentos de ser mais incisivo ou brando.
Lidar com gente rica não era fácil. Existiam os excêntricos que
odiavam muitas coisas como: toques, falar alto, barulhos de embalagens,
encaradas fora de hora ou sorrisos demasiados. Também tinham aqueles que
acreditavam ser donos de tudo e todos que pisassem em seu território, eles
tentariam ludibriá-lo, em determinados casos até mesmo prendê-lo em seu
domínio. Semyon não gostava desse tipo de gente, porém nem sempre
podia escolher com quem negociava e de longe o soldado era sua maior
preocupação nessas situações.
Yuri foi uma boa escolha para o cargo. Um garoto centrado, leal e
que me seguiu sem desviar os olhos dos nossos objetivos. Um pouco
fofoqueiro, entretanto, sem causar transtornos ou espalhamento das
informações, ele gostava de saber sobre tudo e todos, todavia, se mantinha
indiferente quando era necessário.
De manhã eu seguia para os dormitórios e reunia todos os soldados,
tomávamos café e conversávamos sobre as missões que acabei perdendo
enquanto permanecia na mansão. Era como ter um pedaço da minha vida de
volta e sobre meu controle. Rostos conhecidos e amigáveis, histórias
divertidas ou assustadoras as quais conseguia visualizar tranquilamente e
um mundo que fez parte de mim.
Durante a tarde me dedicava a treinar Yuri com relação a tudo que
Semyon esperava dele e tirava de sua cabeça qualquer fantasia romantizada
de como era trabalhar diretamente para o nosso Pakhan, mesmo que fosse
sossegado na maioria das vezes, não significava que ele poderia baixar a
guarda.
Quando se trata da segurança do líder dos Zhertva, é preciso
cuidado máximo, pois o perigo pode vir de onde menos se espera.
Finalmente a noite chegava e eu retornava à mansão, me arrastava
para o quarto sempre dando uma desculpa para não jantar com os membros
da família Rurik. Esperei por ela todas as vezes, mesmo que sem perceber,
me via ansioso olhando para a porta e desejando ver a maçaneta sendo
girada e um corpo curvilíneo e pequeno passando para dentro. Alya não
invadiu meu quarto nenhuma noite, não foi o mesmo com meus sonhos, no
entanto.
As cenas eram tão vívidas, seu corpo me recebendo tão bem,
apertando meu pau implorando para receber a minha porra.
Acordava sempre agitado e extremamente excitado, sendo obrigado
a resolver a minha situação no chuveiro. A gente mal se via pelos
corredores e quando acontecia, era como se conversássemos pelo olhar, um
dizendo ao outro que desejava ter mais momentos como aquele.
Já se tornava difícil não me imaginar com uma aliança dourada em
volta do meu dedo anelar esquerdo, combinando com a dela. O dia do
casamento sequer foi revelado, mas eu sentia vontade de antecipar, no
começo achei ser por culpa, afinal, fui o responsável por tirar sua
virgindade e seguindo as tradições dentro da máfia, teria que me casar com
Alya ou jogá-la aos leões dos puteiros aos quais a Bratva era responsável.
Um dos acordos entre eles e nós da Zhertva, foi sempre direcionar mulheres
rebeldes ou condenadas por algum crime dentro da organização, para os
seus estabelecimentos de prostituição.
Ser um homem educado dentro das leis da máfia me tornava frio o
suficiente para virar a cabeça para o outro lado quando os assuntos não me
incluíam diretamente, nunca era um bom passo se meter onde não era
requisitado. Yelena foi uma exceção, e venho carregando a culpa de ter
aparecido em sua vida desde então.
Semyon não era um herói, ele apenas revolucionou a organização
para algo mais lucrativo e confortável para si mesmo, isso já estava sendo
feito pelos japoneses com os Gokudos[2] e alguns coreanos. Era mais fácil se
safar da lei sendo membro do colarinho branco. A parte ilegal dissecava
seus inimigos, apunhalava suas mulheres e vendia seus corpos como se não
fossem nada, Semyon terceirizou a prostituição para os Bratvas, mas isso
não o exime da culpa, nem a mim. Somos todos cúmplices!
Se caso tivesse tirado a virgindade de outra mulher antes de me
envolver com Alya, assumiria as consequências e responsabilidade, porém
não é o mesmo para outros homens da Zhertva.
Apenas esse pensamento seria suficiente para me fazer subir ao altar
junto de Alya, no entanto não era o único motivo. Eu me vi desejando ser
essencial em sua vida. Desejando fazer parte dos seus pensamentos e
ansiando pelo próximo segundo que poderia ver seu sorriso e ouvir sua voz.
Uma versão romântica de mim que jurei ter enterrado há anos.
— Quando decidir voltar para a terra, nós continuamos...
Yuri tocou meu ombro, me despertando de meus devaneios, o
quadro branco à sua frente todo preenchido com as regras que precisaria
começar a seguir, sorri de canto.
— Vejo que já entendeu.
— Te acompanhei por muito tempo, Yakov, seria impossível não ter
memorizado algumas coisas. — Ele pausou, me encarando, claramente
queria me dizer algo, mas estava procurando as palavras certas. — Você
realmente está bem com tudo isso? — Franzi o cenho, fingindo não
entender do que ele falava. Suspirou esfregando os cabelos. — Os
funcionários estão dizendo que você e a herdeira estão próximos... eles até
acreditaram na historinha de amor de adolescência e depois à distância.
Não pude conter o riso baixo. Qualquer ideologia romântica acerca
do nosso envolvimento soava como piada. Era puramente um acordo de
interesses, no entanto, um soldado é tão dispensável e inútil aos olhos da
alta classe e seus subordinados, que uma história de pano de fundo
incluindo um romance proibido automaticamente fazia mais sentido em
suas cabeças.
Foi o que Alya disse, só teriam dois motivos para uma mulher como
ela ser entregue para um Vor como eu: movimentação arriscada de jogo ou
amor de longa data.
Cabia aos outros acreditarem no que lhes eram apresentados. Eu
ainda teria de protegê-la de possíveis assédios ou era o que pensava, até ser
jogado na direção oposta.
— De novo ouvindo fofocas, Yuri? — repreendi o encarando, ele
deu de ombros e desviou o olhar, ainda carregava o respeito por mim. Os
murmurinhos ajudariam a espalhar aquilo que mais nos deixaria
confortáveis naquela situação, porém, não gostava desse comportamento
em meus soldados. — Aprenda a se conter quanto a isso, um Vor
diretamente ligado ao Pakhan não deve ser um intrometido sem cuidado.
— Jamais faria tal burrice.
— Então pare de dar atenção às conversas dos funcionários!
— Quer dizer que a resposta para a minha pergunta é “não”? —
insistiu, voltando a me observar.
Umedeci os lábios e penteei os cabelos para trás.
Forcei-me a pensar sobre isso, e por Deus, claro que estava bem,
após sentir todo o calor que aquela criatura felina tem para me oferecer, eu
apenas ansiava por mais, a ponto de ficar irritado por fazer tanto tempo que
não a sentia em meus braços. Esse sentimento era perigoso para mim.
Sacudi a cabeça e me levantei da pequena cadeira de madeira no
meio da sala de treinamento teórico.
— Deveria manter seu foco no que estou te ensinando, Vor. A
zhertva precisa de alguém centrado, forte e inteligente o suficiente para
saber qual o seu lugar. — Cruzei os braços o esquadrinhando, Yuri se
encolheu diante de mim, seus olhos inquietos, sabendo bem que errou.
— Estou preocupado com você, não como soldado, Yakov, mas
como um amigo — revelou envergonhado, deixei meus braços caírem
vendo toda sua sinceridade escancarada em íris tímidas. — Você sempre
esteve com a gente, todos gostam da sua liderança... só não queremos que
se torne um daqueles miseráveis de nariz em pé e infeliz.
Ri, me aproximando dele e o fazendo se levantar também, apertei
seus ombros, buscando seus olhos e permitindo que soubesse o quanto
aquilo me trouxe conforto. Viver tanto tempo com esses caras nos fez ser
uma pequena e incomum família. Existiam uma ou duas maçãs podres de
tempos em tempos, mas nada que comprometesse toda a nossa relação, e
Yuri era o mais próximo de mim.
— Não seja um bebê carente, soldado — brinquei e ele revirou os
olhos. — Ainda estarei por perto para conferir o andamento das coisas,
serei o marido da herdeira, nada além disso.
Ele assentiu, e assim o soltei, seguindo em direção à porta.
— Por hoje é o suficiente, dê um jeito em suas roupas, se preciso
compre novas e me mande a conta. Você ficará em evidência ao começar a
andar com o senhor Rurik, então não pode andar esfarrapado.
Saí direto para a mansão, a caminhada não era tão longa, porém me
deu tempo para colocar a cabeça no lugar e remoer as memórias daquele dia
desde cedo. Conviver com Alya não foi penoso como imaginei, esperava
uma garota mimada e cheia de si, mas encontrei uma predadora esperta que
observava primeiro para falar depois.
A vida não estava tão difícil e nesses momentos a estranheza me
pegava de guarda baixa e a ansiedade sussurrava tudo que poderia dar
errado, como se o desastre me esperasse nas sombras, rindo da minha cara
por me ver tão tranquilo e acostumado a uma vida que não me pertencia.
Talvez estivesse perdendo o foco da minha missão, sendo entorpecido pelo
cheiro e toque daquela mulher de olhos de tigre.
Encarei a grande porta, ouvi os burburinhos dos funcionários
papeando ao redor, e foi como flutuar feito um fantasma, sem existir de fato
naquele mundo, desde o momento que abri a porta e caminhei sem estar
nervoso ou inquieto, afinal só colocava os pés naquela casa quando era
solicitado pelo Pakhan e o único lugar que visitava era seu escritório. Mas
ali estava eu, subindo as escadas para o andar dos quartos e desfilando pelo
corredor cheio de quadros familiares e fotos da construção da empresa.
Eu não fazia parte daquilo.
As fotos me acusavam disso a cada passo.
Alya sorrindo no colo do pai e sua mãe ao lado, parecendo distante
demais dos outros dois.
O casamento de Semyon e Natalya.
O terreno da construtora ainda sem nenhum prédio da matriz.
A primeira foto com a herdeira em sua adolescência, um pouco
antes de ir embora para fora do país.
Eu estava em alguns desses eventos, sendo cinco anos mais velho
que Alya e mesmo assim participando ativamente de toda a bagunça que foi
aquele tempo até nos tornarmos quem somos hoje.
Capítulo 13

O tempo que fiquei fora desta casa me serviu para ver toda a
situação como uma mera expectadora, podendo analisar ponto a ponto de
ângulos que a convivência massiva não me permitiria. Retornar foi um
choque que eu já esperava, sentir o cheiro, ver as cores e dimensões, tocar
em tudo que participou da minha infância e início da adolescência me
trouxeram lembranças que poderiam ser pequenas armadilhas, porém não
recuaria.
Usar a racionalidade não significava deixar de lado os sentimentos,
estúpidos eram aqueles que acreditavam poder controlá-los com
indiferença, a menos que seja um psicopata de alto nível, é impossível. A
questão toda girava em torno de como aceitá-los. Nunca deixaria de amar
meu pai, mas isso não significava fechar meus olhos aos seus absurdos ou
permitir que me molde conforme sua maldita forma, e no mundo em que
vivemos, matar seu próprio sangue era apenas mais um ato de sacrifício.
A sexta-feira finalmente havia chegado, dando um tempo nas
reuniões entediantes onde mais procuravam me bajular e persuadir do que
tratar de assuntos realmente importantes. Semyon seguiu cada um de meus
passos, seu olhar de águia junto de um instinto quase perfeito o alertando de
que há mais do que pode ver nas minhas ações.
Com toda a perturbação das semanas anteriores, não pude me
aproximar mais de Yakov, isso me trouxe problemas para relaxar, por causa
do meu plano e também pelo desejo que ardia em meu ventre. Não era
verdadeiramente virgem e explicaria isso ao soldado quando chegasse o
momento, embora não fosse um assunto primordial e não mudaria nossa
situação, foi ele o primeiro homem a sentir minha boceta ao seu redor. O
problema estava no quanto ele fez isso ser bom, não dormia em paz até ter
me masturbado enquanto relembrava seu toque firme, a voz rouca e falhada,
a grossura do seu pau indo e vindo atingindo todos os meus pontos
sensíveis... sem se esquecer de dar atenção ao meu clitóris com seu dedo
calejado.
Começava a desconfiar de que todos os compromissos foram
planejados com a intenção de me separarem do soldado, como se meu pai
tivesse farejado a sua utilidade para mim e tentasse cortar o mal pela raiz.
Meus saltos batiam contra o piso refinado e sempre tão limpo do
corredor de acesso ao escritório do Pakhan, anunciando minha chegada e o
quanto algo me desagradava, ainda que dos meus lábios ele não fosse ouvir
nada parecido com reclamações.
Bati uma única vez e empurrei a porta de madeira que pesava mais
do que o necessário para algo tão fútil. Ele ergueu os olhos em minha
direção, rapidamente colocou um sorriso falso no rosto.
— Querida, pensei que estaria em reunião com o...
— Foi rápido, afinal ele queria apenas me dizer as qualidades de seu
filho, o que só o fez parecer mais incompetente. — Soltei um riso fraco de
desdém, da mesma forma que meu pai costumava fazer quando queria
diminuir os seus “aliados”. — Quem manda o pai para conquistar o coração
de uma possível pretendente? — Umedeci os lábios, ele se endireitou na
cadeira e cruzou os braços, o seu olhar mudou da mesma forma que o clima
em torno de nós pesou. — O que me faz pensar em algo engraçado. Porque
meu pai agendaria uma reunião tão ridícula com um homem desprezível em
plena sexta-feira, mesmo que tenha sido ele quem me noivou com seu
soldado leal?
Nossos olhares travavam uma batalha silenciosa, sua mente
meticulosa bolando qualquer desculpa que me fizesse sair da sua frente e
seguir com o planejado dele. Soltou o ar devagar e se levantou, caminhando
para mim como se cada passo lhe desse uma nova palavra para acrescentar
à sua mentira.
Suas mãos tocaram meus ombros e, sem que eu esperasse, me
puxaram para um abraço esquisito e apertado o suficiente para parecer uma
prisão.
— Minha linda e determinada princesa, está desconfiando de mim?
— Apertou-me mais. Engoli em seco. — Se pretende assumir um posto de
liderança, terá que saber lidar com todo tipo de gente, inclusive os
desprezíveis. — Soltou-me um pouco, encarando meus olhos com a
intensidade de uma fera prestes a atacar seu oponente. — Nenhuma aliança
é ridícula quando se trata de poder, até mesmo os ratos sabem qual caminho
seguir em momentos de crise.
Ele não recuou, esperou como um animal que tenta reafirmar seu
poder sobre outro, ansioso pelo momento em que eu desviaria meu olhar,
mas não o fiz.
— Não quando estou noiva! — Permaneci de queixo erguido, sendo
branda em meu tom de voz e gestos, alcançando seu rosto e o acariciando,
mantendo nosso contato na mesma linha de poder. — É como se
desrespeitasse meu futuro marido e afrouxasse a mão, dando a estes homens
mais motivos para se sentirem no direito de ocuparem uma hora do meu dia
com futilidades, como se eu fosse uma maldita mimada que não tenho nada
mais para fazer. Onde está o mérito neste tipo de reunião?
Ele não encontrou palavras suficientes para me responder, apenas
cerrou o maxilar, sem me afastar.
— Creio que não é da sua intenção, me tornar frágil diante de leões
babões, certo?!
Sim, era.
Seu jogo consistia em me iludir com um título que jamais pretendeu
me fornecer, aumentar meu preço de leilão para os homens de seu interesse
e causar a morte do meu noivo usando de algum idiota desesperado que
esteja disposto ou tenha dinheiro o suficiente para lidar com as
consequências. Ele sairia de mãos limpas, seria meu herói e ainda fecharia
um acordo bom para os seus negócios.
Só me faltava enxergar quem era seu alvo.
Semyon Rurik não entraria em uma corrida sem ter a faixa de
chegada em seu ponto de visão. O filho daquele babaca não se enquadrava,
o pai era um idiota falastrão, seus negócios precisavam mais de nós do que
o contrário, talvez ele fosse o responsável pelo atentado? Alguém
desesperado, querendo uma única chance de sair do poço puxado pelas
mãos sujas de sangue do Pakhan.
— Obviamente que não. Minha filha será a primeira mulher a ser
Pakhan, uma conquista única em toda a Rússia. Uma mulher que tratará de
negócios até mesmo com os Bratvas.
Sorri de canto, fingindo gostar de ouvir suas palavras enganosas e
carregadas de um mel que jamais provaria.
— Então posso te pedir por algo? — Afastei-me um pouco,
deixando o clima mais leve entre nós. Assentiu, esquadrinhando-me com
certa desconfiança, mas aceitando. — Me deixe ter uma semana com o seu
soldado. — Afunilou o olhar e abriu a boca com a negativa na ponta de sua
língua, porém, eu fui mais rápida. — Apenas para conhecer um pouco do
homem que estará ao meu lado por algum tempo. Não acha que mereço
saber em que terras estou pisando, já que aceitei todas as suas imposições
até agora? — Inclinei levemente a cabeça. — Me negar isso seria fazer
comigo o mesmo que todos os Zhertva e Bratvas já fazem com suas
mulheres, me jogando no escuro com alguém que não conheço nada.
Ele rangeu os dentes e fechou o punho.
— Disse para confiar em mim...
— E eu o fiz, não foi? Estou pedindo apenas uma semana de folga
para nós dois, posso tê-la ou serei tratada como um objetivo pelo meu
próprio pai?
Semyon já me enxergava dessa forma, mesmo que
inconscientemente. No entanto, tentava me fazer acreditar que eu era
especial, uma mulher diferente das outras de nossa organização. Ele tentava
plantar na minha cabeça uma arrogância que não me cabia, enaltecendo o
quanto eu teria, e em como nenhuma outra pôde desfrutar de tal capricho,
mesmo que no fundo minha situação fosse igual a delas. Ainda tive um
casamento arranjado sem a minha permissão e participação, fui obrigada a
retornar sem escolhas e estava sendo usada como peça-chave em seu
joguinho de poder.
— Está proibida de visitar seu quarto, sabe que quero lhe dar total
liberdade, mas não abro mão de casar minha filha virgem!
Sorri o mais doce que pude, entretanto, em minha cabeça se
passavam cenas da noite que Yakov teve para si o que meu pai tentava tanto
proteger. Ironia ou não, foi para o cão treinado dele que me entreguei, o
mesmo que ele estava disposto a sacrificar por motivo nenhum.
E se não fosse por motivo nenhum?
Analisei-o com mais cuidado, seu olhar afiado e ao mesmo tempo
desesperado, puxei uma lufada de ar e endireitei meus ombros, dando-lhe o
melhor dos meus sorrisos.
— Fique tranquilo, passaremos o dia juntos pelos arredores da
mansão e quando sairmos da propriedade, me assegurarei de levar alguém,
até porque devemos estar sempre em segurança, certo?
Feria meu orgulho ter esse tipo de conversa com ele, como se
estivesse, de fato, pedindo permissão para viver a porcaria da minha vida,
só mais um lembrete que aquela conversinha dele não era real. Patético
como ele ainda acreditava estar diante da garotinha devota e apaixonada
pela versão poderosa de seu pai, a mesma que decidiu ser a sua sucessora
porque o admirava mais do que tudo, sendo capaz até mesmo de ferir o
coração de sua mãe matando um homem diante de seus olhos.
Todavia era preciso ter o papel da menininha do papai, a filha
obediente que saiu do país como forma de acalmar a situação dentro de casa
e melhorar minhas habilidades nos negócios. Ele só não imaginava que
encontraria alguém que me faria ver toda aquela situação de outro ângulo,
uma pessoa que conheceu a tia que jamais me foi apresentada e sequer
existem fotos suas por qualquer lugar desta casa.
O Pakhan ovacionado pelos Zhertvas era uma farsa montada por
uma mente mais perturbada do que o líder do Bratvas, ele soube aonde ir e
qual dor sanar, observou as fraquezas da organização e se enfiou naquela
cicatriz a abrindo e conseguindo uma legião de admiradores e aliados.
Nenhum soldado trairia Semyon, porque a maioria veio de tempos
difíceis, onde eram usados sem qualquer restrição. Nenhum político
fecharia os olhos para os Zhertvas, porque ele não só fazia bem a parte
ilegal como também sabia se portar diante de uma reunião com pessoas
importantes para o país. Derrubar um homem que conseguiu poder à base
da força era fácil, mas derrubar alguém que conquistou o respeito de
diversos soldados e a confiança de empresários e políticos.... Bom, era
quase impossível.
Semyon Rurik soube disso antes que outro pudesse enxergar a mina
de ouro diante de seus olhos. Ele não fez movimentos pensando na dor do
outro, almejava somente a vitória em suas mãos.
— Que assim seja, Alya, espero que não me decepcione.
— Não o farei, papa!
Serei exatamente a filha que você merece ter!
Capítulo 14

Parecia a sua primeira vez andando pelos arredores da mansão, a


estação começava a mudar, trazendo um clima mais ameno com noites de
brisas suaves. Vê-la com o brilho do sol destacando-a em meio à paisagem
era como analisar uma obra de arte, a cada vez que prestava mais atenção
encontrava detalhes novos que a tornavam mais linda.
Um soldado de pouco estudo e tendo a tortura e perseguição como
minhas melhores habilidades não deveria ter direito a tal visão, me sentia
como um ladrão, roubando aquela mulher para mim e me obrigando para
dentro da sua vida. A situação, no entanto, era o contrário. Foi o acordo
com Semyon que a fez pular direto para o meu colo e a cada dia que
pensava sobre isso, me questionava quanto às suas intenções.
Começava a ficar guloso. Desejando devorar pedaços inteiros
daquela criatura fascinante, e ela permanecia segura demais, caminhando
com leveza, sorrindo para mim e me encarando com aqueles olhos de tigres,
só que mansos e tão ternos que me fazia sentir honrado de ter o carinho
daquela fera para mim.
Ela me escondia algo. Mas quem naquela casa não o fazia, afinal, eu
precisava apenas cumprir ordens e não me meter demais em seus assuntos.
O maior medo de Alya era ser colocada de canto por todos e ter que passar
sua posição de liderança para mim.
Enquanto isso, o meu maior sonho era viver tranquilamente, como
se nada do meu passado pudesse voltar para me assombrar, e de vez em
quando eu me permitia imaginar em uma vida com ela ao meu lado.
Algum dia seria possível?
Claro que não!
— Está pensando em quê, soldado? — Não percebi quando ela se
aproximou tanto de mim, a pergunta soou divertida, porém identifiquei a
curiosidade no sorriso contido.
— Apenas o quanto as coisas mudaram, você não pensa nessas
coisas também? — Tentei desviar o foco de mim.
Começamos a caminhar lado a lado, como um casal passeando ao
final de tarde para depois assistirem ao pôr do sol.
— Não costumo deixar minha mente flutuando pelo passado, prefiro
me atentar ao que está acontecendo.
— Acho que estou ficando mole. Em outros tempos concordaria
com você, Alya. Mas não consigo deixar de pensar o quanto minha vida
deixou de ser... — Calei-me, aquelas palavras poderiam soar como
reclamações e algum mal-entendido.
— Deixou de ser sua? — respondeu tranquila, ainda concentrada ao
redor.
A propriedade era tão grande quanto dois campos oficiais de
futebol, em algumas áreas a vegetação era densa, tendo uma ou duas trilhas
até as montanhas, o espaço onde foi construída a mansão, os dormitórios
dos soldados que eram separados em um grande galpão há alguns
quilômetros de distância dela, os dormitórios dos empregados que ficavam
na parte detrás, o jardim de inverno e o jardim principal, fora o centro de
treinamento dos soldados. Uma área grande o suficiente para ser percorrida
com carros dependendo de onde quer ir.
Existiam lugares de sobra para se caminhar por ali, e estávamos
seguros com todos os homens de confiança pelo local.
— Não quero colocar dessa maneira, até porque o acordo não será
para sempre.
Ela tocou meu braço, chamando a minha atenção e me fazendo parar
com ela.
— Há alguma chance da nossa relação ser real, Yakov?
— Temo que não! — respondi, pensei ter visto decepção em seu
olhar, mas foi rápido demais para ter certeza.
— Tenho o direito de saber o motivo? — Enroscou seu braço ao
meu e voltou a andar, me levando junto.
A história toda era uma tragédia que não poderia ser mudada, as
palavras não deveriam sair da minha boca, pois perdi o direito de falar
sobre ela quando entrei em sua vida e causei o seu fim. Para Alya, cabia
apenas o mínimo.
— Somente eu tenho que viver as consequências dos meus pecados,
não vou arrastá-la para isso...
Alya soltou um riso que se transformou em uma risada mais alta, o
som diferente invadiu meu corpo inusitadamente, me assustando com
aquelas reações. A leveza em seu rosto era um momento ainda mais raro, o
sol deixando a cor de suas íris ainda mais incríveis, assim como o brilho ao
redor de seu sorriso largo.
— Não creio que seja tão ingênuo assim, Yakov. — Grudou-se mais
em mim, de maneira descontraída, me fazendo sentir sujo por ter ficado tão
tenso por um contato mínimo e sem malícia. — Que tal se pensarmos de
outra forma?
— O que quer dizer?
— Ao invés de viver essas consequências sozinho, podemos somar
as suas com as minhas e então compartilhá-las, o que acha? — Piscou
matreira. — Ou você realmente acredita que a mulher que encontrou
daquela vez, ensanguentada e cheia de corpos ao redor, não tem pecados a
perseguindo?
Não a respondi, aceitar aquilo seria o mesmo que lhe dar esperanças,
e mesmo que a admirasse mais do que quando a encontrei pela primeira
vez, não se tornaria mais do que uma relação carnal envolvida em respeito,
amor não se enquadra em nós.
Ela suspirou, percebendo que o assunto não seguiria para os rumos
que ela imaginava, porém a calmaria durou apenas alguns minutos, pois
Alya me arrastou para um lugar mais afastado, as desculpas escapavam de
seus lábios como sussurros feitos direto por Lilith e eu me deixei ser
levado, jurando a mim mesmo que era para protegê-la de si e suas loucuras.
Este jardim se diferenciava completamente do que ficava mais
próximo da casa e era de inverno. Aqui as plantas pareciam mais vivas, suas
cores vibrantes e um cheiro suave que tornava o local agradável. Nenhum
soldado rondava aquele lugar.
— Esse jardim é da minha mãe — falou baixo, só confirmando que
não deveríamos estar ali. — Ela não permite o acesso a ninguém, mas
descobri sua existência quando era pequena e passei a usá-lo como
esconderijo quando meu pai me irritava ou exigia demais. — Sorriu sem
mostrar os dentes, tipo melancólico até.
— Então por que estamos aqui?
Alya se colocou à minha frente, enlaçando minha nuca e colando
seu corpo ao meu.
— Porque não pretendo deixar ninguém nos atrapalhar e muito
menos ver o que meu noivo pode fazer comigo.
Eram sopros de ousadia e luxúria que adentravam por meus ouvidos
e atiçavam meu corpo inteiro, como se tivessem se instaurado em minha
circulação tão rápido que mal pude pensar direito.
Minhas mãos desobedientes como sempre, agarraram sua cintura
com força, enquanto eu ainda batalhava com ela pelo olhar, querendo lhe
dizer para não me provocar e respeitar o local que não nos pertencia. Alya
parecia ter algum tipo de feitiço sobre mim, bastava um sorriso mais
esticado e malicioso junto daqueles olhos felinos para me pôr de joelhos às
suas vontades.
— E o que exatamente você pretende? — perguntei entredentes,
contendo o pouco de razão que ainda me restava.
— Eu disse que se entrássemos em consenso, seria a minha vez, não
disse? — Arrastou a unha da minha nuca até próximo onde sabia ter uma
das pontas da rosa dos ventos tatuada em minhas costas. — Não temos
muito tempo, então serei sucinta. — Lambeu os lábios devagar, esfregando-
se ainda mais em mim. — Me faça gozar com seu pau, soldado!
Era uma ordem. Uma a qual não tive estruturas para negar. O tipo de
comando que meu corpo obedecia antes mesmo da minha mente assimilar.
Era uma ordem vinda da criatura que profanou toda a minha resistência,
impeliu qualquer tentativa de jogá-la fora da minha vida.
Sentia-me controlado por Alya, e incrivelmente tranquilo e satisfeito
com isso.
Já não cabia espaço para negação. Pouco tempo atrás pensei que ela
seria o tipo de pessoa ao qual só ouvi falar e vi uma vez. A mulher que um
simples Vor jamais tocaria.
Eu a tinha entre os diversos cheiros suaves de flores bem-cuidadas,
escondido de todos e ao mesmo tempo exposto demais para ficar seguro. E
eu pouco me importava de ser pego. Porque eu a tinha em minhas mãos, a
pele febril, implorando para ser tocada. O olhar maldito de um tipo de ser
que hipnotizava e os lábios lascivos de uma fêmea dominante e sedenta.
Afundei meu rosto na curva do seu pescoço em uma tentativa fútil
de voltar a mim e só me perdi mais. O cheiro daquela pele macia rebateu
direto no meu pau. Ofeguei. Apertei ainda mais seu corpo contra o meu.
— Se demorar mais, perderemos a nossa chance — sussurrou
libidinosa.
Esse era o tormento de ser seduzido enquanto consciente do ato?
Eu estava sendo jogado naquela loucura por uma voz suave e
provocante, sabia das consequências e o quanto minha vida poderia estar
fodida, e mesmo assim era tudo que eu mais queria. A prioridade de
satisfazer nossos corpos se tornou a mais importante.
Foda-se a nossa segurança.
Foda-se se alguém aparecer.
Fodam-se os títulos que carregamos dentro da organização.
Foda-se o mundo, porque aquela boceta estava molhada para mim, e
aqueles malditos olhos me diziam isso.
— Vire-se! — Praticamente rosnei.
Antes que ela obedecesse por conta própria, eu o fiz, a girando e
deixando seu corpo de frente de uma das grandes mesas, o local era coberto
de verde pelas paredes e chão, com alguns canteiros coloridos de outros
tipos de plantas e flores, essa era a única mesa com alguns equipamentos de
jardinagem e vasos vazios ao lado de sacos de terra. Estávamos
praticamente camuflados.
— Se não quiser ter outro vestido rasgado, sugiro que o levante —
disse baixo, ela soltou um riso curto, olhou-me por sobre o ombro.
— Aquele vestido vai te custar caro, Yakov, mas agora realmente
preciso do seu pau dentro de mim.
Tratei de tirar minhas roupas do caminho e quando ergui o olhar me
surpreendi ao encontrá-la resgatando um pequeno vibrador de dentro de sua
boceta. Minha mente ficou em branco, meus sentidos se tornaram
descontrolados e tudo que pude fazer foi ajudá-la a se livrar daquela porra.
— Você veio me encontrar com isso funcionando dentro de você?
— perguntei incrédulo, apesar de ter todas as provas de que sim, ela fez
exatamente isso.
O sorriso foi interrompido por uma leve mordiscada de lábio. Alya
não perdeu tempo tentando me explicar, apenas se empinou mais, me
deixando vê-la toda molhada e passou seus dedos, abrindo-se ainda mais
para mim.
— Yakov... eu estou esperando.
A cada vez que meu corpo ia e voltava, sentia-me mais completo ao
mesmo tempo que submerso naquela sensação de formigamento, angústia e
tesão.
Queria gozar logo, e não queria.
Desejava ver seu rosto, mas também adorava observar sua nuca
quando jogava seus cabelos de lado.
— Porra... isso tá me enlouquecendo — resmunguei, estocando cada
vez mais bruto, sendo guiado por suas reações.
Um gemido mais alto escapou de seus lábios e instintivamente me
colei em suas costas e alcancei sua boca com meus dedos, a forçando a abri-
la de maneira que não conseguiria falar ou gemer muito alto. A maldita
decidiu chupá-los para se calar, lançou-me um rápido olhar por sobre os
ombros e remexeu o quadril junto comigo.
Apressei-me em deslizar a mão livre para seu clitóris, esfregando-o
delicadamente, porém, de maneira persistente. Alya mordeu meus dedos
com força quando o gozo a atingiu e eu me neguei a libertar sua boca.
Devolvi sua mordida deixando uma pequena marca em seu pescoço.
Meu pau foi apertado por sua boceta quando começou a gozar e pulsar, me
sugando com tanta força que foi impossível me segurar, tirei meu pau
segundos antes do meu gozo jorrar, vendo meu esperma escorrendo da
polpa da sua bunda até a parte interna de suas coxas.
Agarrei seus quadris a mantendo presa ao meu corpo, minha
respiração batendo sobre o local onde deixei indícios do que fizemos às
escondidas no jardim de sua mãe.
— Vou limpá-la agora, Alya. — Deixei um beijo em sua pele e tratei
de nos ajeitar e sair o quanto antes dali.
Capítulo 15

Uma vez fiquei preso com alguns soldados dentro de um pequeno


bar, a neve não nos deixou sair naquele inverno e tivemos que passar três
dias com os corpos de nossos alvos e sobrevivendo com o estoque daquele
lugar podre. A pequena televisão não passava nada além de documentários
sobre animais, e nunca irei me esquecer de como os movimentos e
informações sobre tigres me fisgaram. Um animal forte e estratégico que
prefere caçar sozinho e parece se esquecer de toda sua família quando
atinge a vida adulta, territorialista e atento a tudo ao seu redor.
Sentado naquela mesa de jantar com a família Rurik à minha volta e
Alya com olhar afiado e postura ereta ao meu lado, me fez sentir como uma
presa entre uma família de tigres que está começando a se separar e definir
quem será dono daquele território. O clima pesava e mal dava para respirar.
A hierarquia sempre foi importante para mim, a respeitei de todas as
formas que pude e só fiz merda quando conheci Yelena. Estar ali com a
herdeira soou como um desafio, mesmo Semyon, que me colocou naquela
situação, não se agradava com a nossa aproximação.
Diferentemente do mundo animal, aqui os predadores são
cinicamente insossos, tentam dar um ar de superioridade e indiferença,
quando em seus olhos posso ver o desprezo e ódio. Engoli em seco, era
exatamente esse tipo de ambiente que eu evitava a todo custo desde que
perdi Yelena, entre pessoas que jamais diriam o que sentem ou querem, mas
te cercariam até vê-lo ceder em sua própria desgraça.
Desviei meus olhos para Alya, o som dos talheres cortando o ar
como raios que poderiam, a qualquer momento, cair sobre minha cabeça.
Ela sorriu de canto e voltou a comer.
Como soldado, meus deveres eram claros e diretos, as missões
precisavam de força bruta e o mínimo de estratégia apenas para sairmos
vivos. Não era o caso para aquele campo minado, dependendo de onde e
como pisar, posso me explodir sozinho ou com todos dessa casa.
— Princesa, como tem aproveitado esse pequeno período de
descanso? — Semyon perguntou à filha, mas seu olhar estava focado em
mim.
Suas íris brilharam com um tipo de desprezo diferente, não como
um soldado que poderia ser facilmente descartado se cometesse outro erro,
afinal, ele já me perdoou demais, tinha essa aura de ciúmes e desconfiança.
Meu Pakhan não queria esse casamento e muito menos que sua filha e eu
nos déssemos bem, e naquele momento eu me questionei sobre seus planos
para mim.
Se o incomoda tanto me ver perto de Alya, por que propôs que nos
casássemos?
— Muito bem, hoje caminhamos um pouco e descobrimos melhor
sobre nossas preferências. — Tocou minha mão, engoli em seco diante do
olhar fumegante de seu pai.
— Entendo. — Ele umedeceu os lábios e pensou um pouco sobre o
que falaria a seguir, então optou por se calar e apenas sorrir forçadamente.
— Quando vão parar com todo esse show? — A voz de Natalya
ressoou, e a tensão que já era grande, tornou-se insuportável.
— Não sei do que está falando...
— Pare, Semyon! — ela o cortou. — Dê um basta nisso, resolva
seus problemas sem joguinhos que podem prejudicar a si mesmo.
— Natalya, acredito que se excedeu em suas palavras, é melhor ter
cuidado.
— Ou o quê? Vai me matar? — Ela se levantou, mirando sua filha
como alvo. — Faça. Me mate e acabe com isso, destrua de uma vez essa
família e sorria diante das nossas covas, nunca fui o que desejava, Semyon,
mas Deus te puniu diante da sua ganância e agora quer retribuir sendo pior
do que antes? Espero que seu fim seja tão doloroso quanto viver ao seu lado
todos esses anos.
O barulho estridente dos pés da cadeira sendo arrastados foi o corte
final daquele jantar estranho e acometido de palavras não ditas, mas
entendidas o suficiente.
Todos nos retiramos em silêncio, apenas o som de nossos passos
seguindo pelas escadas e depois corredor, com o toque final da batida
moderada de cada porta de quarto.
Quando finalmente estava isolado daquela família, respirei fundo e
me sentei na cama, olhando fixamente a porta do quarto que me separava
dos meus.
As palavras de Natalya poderiam não significar nada a quem estava
alheio sobre as entrelinhas, não era meu caso, no entanto.
Punição...
Essa palavra pairou sobre mim, assombrando meus pensamentos e
me fazendo retornar a um passado onde uma jovem linda se envolveu com
um soldado estúpido, um romance que jamais terminaria em final feliz.
Yelena carregava o mesmo castanho-escuro que encontro em Semyon
quando o encaro, embora todo o resto fosse completamente diferente. Sua
vida era regrada dentro da mansão, quase nenhum soldado a via mais do
que cinco minutos e mesmo assim ela carregava uma esperança única, que
se refletia em seus olhos e lábios sorridentes.
Pensar sobra ela me feria.
Lembrar-me dos nossos beijos escondidos e toques gentis, fazia a
culpa crescer em meu coração.
Ainda que não diretamente, a matei.
Soltei o ar devagar. A punição de Deus caiu sobre mim também,
mas me causou medo perceber que Yelena começou a se tornar uma
memória bonita e cruel que aos poucos vai perdendo seu peso em minha
vida. Eu não desejava ter seus beijos de volta, nem mesmo provar a textura
de sua pele, apenas a queria feliz em algum lugar.
O vazio que ela deixou ainda existia, porém diminuía um pouco a
cada dia. Talvez fosse meu luto chegando ao fim depois de tantos anos,
naquela época Alya deveria ter apenas quinze anos enquanto eu já
desfrutava dos meus vinte e um. Sua convivência era tão apagada que nem
mesmo sua sobrinha a reconheceria se a visse andando pelos corredores.
Nunca entendi o motivo de tanta proteção, quando nem mesmo a
esposa do Pakhan tinha tal tratamento.
Todavia já diziam os mais velhos: o sangue é mais denso que a água.
Mesmo que este sangue tenha saído do corpo de um Rurik, certo?
Naquela noite eu dormi inquieto.
Sonhei com uma linda mulher parada diante de um altar, suas costas
cobertas pelo branco do vestido pesado, o sentimento que carregava era de
completa angústia, porque eu sentia que algo estava errado. Ao me
aproximar, o vestido de branco começou a ser tingido de vermelho
carmesim, o sangue escorria dela, que ainda se mantinha de pé, até onde eu
estava, como se nos conectasse.
Acordei afobado, não pude ver o rosto da mulher, mas algo dentro
de mim, sabia muito bem de quem se tratava.
Quais eram os planos do Pakhan para esse casamento?
De repente, a fé que eu tinha em suas atitudes, começou a ruir, assim
como a tatuagem em minhas costas parecia queimar como um alerta.
Eu temi estar sendo manipulado pela filha, entretanto, teria que
passar a tomar cuidado com as estratégias do seu pai também. Semyon tinha
muito mais em suas mãos do que a minha vida ou de Alya, ele carregava
pessoas influentes o suficiente para causarem problemas a um país, mais
fácil ainda: ele poderia destruir sua própria organização em um piscar de
olhos.
Capítulo 16

Yakov não estava acompanhando os seus passos, desde cedo,


quando bati na porta de seu quarto, notei a inquietude. Apesar de seus
ouvidos atentos aos arredores e olhos rápidos, seus pensamentos se
deslocavam para algum lugar que não pude ter acesso.
Segurei seu braço o forçando a parar.
— Não somos a família que esperava ver? — Tentei soar o mais
descontraída possível, no entanto, ele apenas desviou o olhar. — Yakov. —
Peguei seu queixo e o fiz voltar para mim. — Pensei que tivesse visto o
suficiente para saber que somos tão fodidos quanto qualquer um desse
meio.
— Pouco me importa a relação entre seus familiares, Alya. Desde
que não me coloquem no meio.
— Está dizendo que não liga pra mim?
— Quê?... não foi isso que quis dizer... não é bem assim. — Ele
esfregou o local que franzia enquanto falava. Suspirou e se acalmou, dando-
me atenção, finalmente. — Alya, pretende mesmo se casar comigo ou sou
apenas uma distração que será tirada do jogo antes de assinarmos aquele
maldito papel?
E lá estava a rachadura, aquela que esperei ansiosa para ver, por
onde eu me infiltraria e traria aquele cão tão lindo e obediente para a minha
coleira.
— Desde o dia que concordamos com o casamento, naquele
escritório, nunca pensei em voltar atrás, pelo contrário. — Deslizei minhas
mãos até sua nuca, acariciando-a do jeito que ele gostava e se derretia. —
Só tive mais certeza de que quero fazer isso. E quanto a você, Yakov?
Ele me puxou para si, havia tanta coisa misturada naquele olhar,
batalhando ferozmente contra seus próprios pensamentos, talvez até criando
uma desculpa para me soltar sozinha naquele lugar.
Antes que ele encontrasse algum motivo para se afastar, fiquei na
ponta dos pés e selei nossos lábios, depois o esquadrinhei com paixão.
Poderia ser uma boa atuação, no entanto, eu realmente começava a
gostar da ideia de ter aquele homem comigo para sempre, torná-lo meu e
me permitir ser dele. Yakov era um soldado raro, mesmo que pudesse
escalpelar alguém com precisão e rapidez, não se deixava tornar um ser
desprezível e sem compaixão. Eram qualidades que dentro de uma
organização como os Zhertvas poderiam se tornar defeitos. Todavia, eu
estaria lá para ele, poderia acordar todos os dias e encontrar o brilho dentro
das íris castanhas e o sorriso tão difícil de conseguir daquele rosto bonito.
Eu o quero para mim!
Peguei sua mão e o pensamento que veio tão rápido quanto uma
estrela cadente causou um grande reboliço em meu corpo.
— Vamos, quero ouvir sua resposta no escritório do meu pai.
— O quê? Mas ele não está em casa hoje?
— Não. Mas fique tranquilo, ele levou Yuri junto e minha mãe está
enfiada em seu jardim.
Vi como seu olhar fugiu de mim quando mencionei o local que
ontem foi recheado com nossos gemidos.
— Ela não notou nada de diferente, soldado. Pode voltar a respirar
— disse entre risos, arrancando uma careta dele e aproveitando para puxá-
lo de volta à mansão.

**

Olhá-lo recostado na mesa grande de madeira do escritório do meu


pai, me fez ter tantas e tantas ideias, mesmo que seu corpo estivesse duro
como rocha e seu rosto tenso, ele me acompanhou.
Mais um indício de que o soldado começava a ceder aos meus
avanços e aos poucos me permitia chegar perto de ter sua lealdade. Porém,
eu me questionava se ficaria satisfeita apenas com isso.
— Agora sente-se ali. — Apontei com a cabeça para a poltrona do
Pakhan.
— Está louca? Claro que não farei isso... se tiver câmeras por aqui
ou ele chegar?
Rapidamente começou a escanear o ambiente procurando por
qualquer pontinho de luz que pudesse indicar uma câmera escondida. Ri
curto, me aproximando dele e colocando uma perna entre suas coxas, subi
devagar meu joelho e pressionei o suficiente para ele se sobressaltar no
lugar, encarando-me surpreso. Toquei o colarinho do seu casaco o ajeitando,
mirando sua boca e aflorando o desejo que só crescia dentro de mim.
— No dia que tivemos uma reunião aqui, eu esperei meu pai sair e
varri cada cantinho desse escritório, pode ter certeza de que não há câmeras.
— Ele pode ter colocado depois — respondeu firme, mas já me
apertava contra si, prendendo meu corpo e aproximando seu rosto do meu.
Yakov não se continha tanto quanto antes, seus gestos vinham
primeiro, como se estivesse acostumado comigo, me tocar se tornava sua
prioridade quando sozinhos, puxado por essa atração que nem eu sabia
explicar. Sabia de tudo isso pelo simples fato de sentir o mesmo.
Ver meu noivo tão próximo e não ter minhas mãos em contato com
sua pele era torturante, por isso odiava os jantares em família, seria muito
melhor se fôssemos apenas nós dois.
— Acompanhei cada passo dele, visitei esse lugar mais algumas
vezes depois e conferi se não estava sendo vigiada, pode confiar em mim,
soldado. — Toquei seu rosto, me esticando para ter meu hálito misturado ao
dele. — Podemos fazer o que quisermos aqui sem medo de sermos pegos.
Ele engoliu em seco e aproveitei para lamber o contorno de seus
lábios. A forma como ele se libertava quando via meu lado safado era
sublime. Sempre sentia estar tirando do cativeiro uma versão inédita
daquele homem que se apresentou tão controlado para mim.
Por algum motivo, ele se permitia ser inundado pelas minhas
loucuras e exigências, porque eu sabia que no momento que Yakov
decidisse me empurrar para longe, não existiria nada que eu pudesse fazer
para reverter isso.
— Quero ouvir sua resposta, noivo. Mas preciso te ver sentado
naquela poltrona.
Yakov me pegou pela nuca e tomou meus lábios fervorosamente,
parecia me punir com a boca e língua, tornando-se agressivo e tão lascivo
quanto eu. Gemi entre o beijo, aproveitando para esfregar seu pau por cima
da calça e pressionar minha boceta contra sua coxa. Não era o suficiente, o
beijo sendo cada vez mais bruto e exigente, nossos corpos acompanhando o
ritmo e se misturando naquelas sensações de luxúria.
Afastei-me para puxar o ar, sorri o encarando com a boca inchada,
provavelmente a minha também se encontrava do mesmo jeito. Toquei seu
lábio inferior com o polegar o encarando.
— Vai me obedecer? — questionei maliciosa, recuando um pouco e
o libertando para se mover até a poltrona.
Como um bom soldado, ele obedeceu à sua superior, e apenas esse
pensamento já fazia meu ventre se remexer em expectativa e satisfação.
Quando decidi seguir os passos do meu pai, ainda jovem e sem a
visão geral de sua personalidade de merda, o fiz por admirá-lo, acreditando
que aquele homem estaria ao meu lado em todos os momentos difíceis e de
conquista. Todavia, nunca almejei o poder, somente estar com ele e ser
reconhecida como igual. Depois que limpei a sujeira que ele queria e
arranquei da minha mãe o seu amante e único amor, matando-o com minha
pequena adaga que ganhei de presente do meu pai, entendi que era apenas
mais um de seus bonecos controlados por fios, agindo conforme suas
expectativas e sendo útil aos seus planos.
A partir do momento que conheci meu verdadeiro eu e experienciei
diversas traições enquanto estava no exterior, pude analisar melhor nossa
relação. Sempre foi uma ponte suspensa, onde ele me jogava no abismo e
depois sorria me estendendo a mão e jurando que nada tinha a ver com
aquela merda e que na verdade, era meu herói, por isso eu deveria amá-lo e
ser leal. Ele fez o mesmo com Yakov.
Pela primeira vez em anos, entendi meu pai.
Ter nas mãos a coleira daquele soldado era divino. Poder ver a
devoção em seus olhos castanhos no instante em que me obedecia sem
questionar, era viciante.
Eu o quero.
Eu preciso tê-lo somente para mim.
Ele não deve olhar mais ninguém desse jeito.
Yakov Dobrow nunca mais fugirá das minhas mãos.
A cada segundo que o olhava, esses pensamentos se tornavam mais
fortes. Ele se sentou na poltrona, suas mãos apertando com nervosismo os
apoios macios e o corpo ereto.
Tão lindo quanto uma escultura feita pelas mãos habilidosas de
Michelangelo[3], imóvel em seu lugar de poder, um que me pertencia por
direito, porém naquele momento eu o cederia de bom grado para Yakov.
Somente para o meu próprio bem e desfrute.
Aproximei-me, mordiscando o lábio sapeca e vendo como sua
pupila dilatava rápido a cada vez que chegava mais perto.
— Feche um pouco mais as pernas, soldado... assim mesmo. Me
deixe sentar confortável.
Coloquei um joelho de cada lado das suas coxas e me posicionei em
seu colo, ele apertou mais o apoio, parecendo temer me tocar. Sorri. Meu
noivo esperava pacientemente por novas ordens.
Ergui a saia do vestido que vinha até metade da coxa, a meia-calça
preta que vestia, me permitia sentir o volume formado por debaixo da calça
jeans dele, rebolei devagar, aproveitando aquela pequena sensação de
agonia, onde o prazer é instigado a precisar de muito mais.
Inclinei-me e mordisquei seu lábio superior.
— Quero ouvir agora, Yakov.
Ele grunhiu, erguendo um pouco o quadril para ter mais fricção e
rapidamente me levantei mais, impedindo o contato. Yakov me encarou
bravo, não existia a sombra daquele homem mais contido de cedo.
Suas mãos vieram pesadas para minhas coxas, me forçando a sentar
novamente, me surpreendi, a força aplicada foi suficiente para marcar seus
dedos na minha pele, tinha certeza disso.
— A ideia de desistir de tudo passou pela minha cabeça uma ou
duas vezes... — murmurou, enfiou seu rosto em meu pescoço, lambendo e
beijando, suas palmas deslizando das minhas coxas para minha bunda, ele
agarrou cada bochecha, mais uma vez aplicando força bruta. Gemi. — Mas
se dissipou pouco a pouco, conforme passava meus dias perto de você. É
como uma bruxa, Alya. Me enfeitiçou e agora não sei o que faria se
dissesse para mim que tudo está acabado.
Gemi tão alto quanto o barulho da minha meia-calça sendo rasgada,
expondo toda a região da minha bunda, porém ele não parou, seus dedos
cravando cada vez mais no tecido fino e o puxando, até ter minha boceta,
bunda e inícios das coxas livres para suas mãos. Minha calcinha era
pequena, assim que ele descobriu isso, a colocou para o lado e deslizou dois
dedos pela parte da frente. Yakov moveu seus dedos no mesmo ritmo que
fiz com meus quadris quando o provoquei, dando-me um pouco do meu
próprio veneno.
Tentei escapar de seu toque, nervosa com a demora em aprofundar
os movimentos, mas o abraço que recebi, sendo enlaçada pelo seu braço
esquerdo e apertada contra seu corpo, me impediu de sair daquela situação.
Mordi seu ombro e ele respondeu lambendo meu pescoço, me remexi e só
piorei aquela brasa que começava a se tornar em fogaréu.
— Agora que te respondi, terei minha recompensa, princesa.
Capítulo 17

Fartei-me com seus gemidos, vendo em primeira fila o rosto de Alya


se contorcendo em prazer e raiva por fazê-la esperar para ter o meu pau. O
cenário, mais uma vez, pouco importou, outro dia sendo arremessado com
êxito para longe do meu controle.
Mordi sua clavícula, punindo-a pelo atrevimento de ter despertado
esse desejo dentro de mim, me tirando da ignorância e colocando em minha
boca o gosto doce da perversão. Eu vivia bem no escuro, sendo guiado
pelas ordens de quem me deu o direito de permanecer vivo, um cavalo que
não podia olhar para os lados e previa um fim insignificante, como todo
soldado dos Zhertva.
— Erga o seu quadril, Alya. — Seu olhar em um azul-escuro
embebecido de tesão fixou-se em meu rosto, sua mão veio até minha barba
rala, acariciando. — Não quer meu pau?
Ela umedeceu os lábios e então seguiu minha instrução, tratei de
desatar o cinto e descer o zíper o mais rápido que pude, arrastei a cueca
somente o necessário para colocar meu pau para fora.
Alya não esperou nenhum tipo de comando, agarrou minha ereção
com uma das mãos e puxou a calcinha para o lado com a outra, confiando
em mim para segurar sua cintura e mantê-la firme na posição que estava,
então sorriu, olhando no fundo dos meus olhos.
E novamente entendi que jamais ficaria satisfeito com aquela
vida planejada sem sua presença. Aquela aura potente de uma mulher que
nunca deixaria meus dias serem suficientes sem seu cheiro ao meu redor.
— Relaxa as mãos, soldado, que a sua noiva vai te fazer gozar só
cavalgando.
Sorri pretensioso acreditando que ela não seria capaz de colocar
meu pau todo de uma vez, principalmente em uma posição que o faria ir
fundo, mas me esqueci de que aquela maldita mulher nunca era tão óbvia e
muito menos leviana com suas palavras. Assim que seu quadril desceu e ela
sentiu a minha glande toda dentro da sua boceta, ela apoiou as mãos no
encosto da poltrona e sentou-se até que seu clitóris se esfregasse em minha
pélvis. O gemido rouco me escapou com a surpresa.
Dali em diante ela me mostrou o quanto levava a sério suas
promessas, quicando em ritmos alternados, buscando sempre a minha boca
para calar nossas vozes e rebolando para fazer pequenas pausas na
cavalgada. Sua boceta me sugava com força, me fazendo sentir que se
ousasse tirar meu pau, o perderia no processo. Ainda estávamos
completamente vestidos e por algum motivo isso tornou a situação mais
excitante.
O esfregar das roupas em nossos corpos assanhava nossa pele,
arrepiando cada parte e intensificando o que já parecia sufocante. Nossos
corpos ficando tensos, chegando ao limite daquele prazer, acompanhados
pelo suspense de sermos pegos pelo dono do local.
Aquela poltrona faria parte da nossa história de loucura e desejos
carnais fortes demais para serem ignorados.
Minhas mãos apertavam sua bunda, ajudando-a em seus
movimentos, meu pau pulsando em aviso do orgasmo que logo viria.
Deslizei meu dedo indicador até seu cuzinho, rodeando e investigando o
quanto mais ela me deixaria ir. Sem ouvir reclamações; comecei a penetrar
devagar, sentindo-a apertá-lo e seus gemidos parecerem mais insistentes
enquanto ela me beijava com o intuito de se calar.
Decidi ajudá-la um pouco mais, erguendo meu quadril de encontro
às suas quicadas, estocando com força, ela largou meus lábios e precisei
tapar sua boca com a mão livre. Alya tinha meu pau e meu dedo a fodendo
e foi questão de minutos para que seu orgasmo a fizesse cair com a cabeça
na curvatura do meu pescoço. Deixei-me ir logo em seguida, gozando em
sua boceta pela primeira vez e me sentindo mais saciado do que nunca.
— Quando a pegar de novo, vai ser aqui que vou colocar meu pau
— disse retirando meu dedo devagar. Ela mordeu meu pescoço e o sorriso
em meu rosto foi inevitável.
Em que momento se tornou natural esse tipo de expressão na minha
cara? Em qual dia, ela me deixou tão à vontade, a ponto de transar no
escritório do Pakhan e me sentir mais livre do que angustiado?
Soltei o ar com força.
E como pude gozar dentro sem me preocupar com nada?
Rapidamente a segurei pelos braços e encarei seus olhos com certo
desespero.
— Não usamos preservativos.
— É melhor me levantar e limpar um pouco dessa bagunça, não
queremos sujar sua calça.
Sacudi a cabeça, pouco ligando para aquela merda de roupa.
— Alya, não usamos preservativos! — disse com mais ênfase.
Ela inclinou a cabeça e percebendo o porquê aquilo me agoniava,
apenas beijou o canto da minha boca e saiu, devagar, do meu colo.
— Eu tomo anticoncepcional, fica tranquilo, sem bebês aqui. —
Piscou, depois esticou a mão na direção de um armarinho de canto de sala.
— Ali deve ter lenços ou alguma coisa útil para nos limparmos.
Meus passos seguintes foram no automático, limpando seu corpo
com cuidado e a ajudando a colocar tudo no lugar, menos a meia-calça que
estraguei.
— Ainda não está preparado para me dizer o que te incomodou
tanto naquele jantar desastroso?
Ergui meus olhos e procurei por algo que não entendia bem, os
sentimentos se embaralhavam em meu peito, sufocando minhas decisões e
gerando dúvidas que em anos de trabalho ao lado de Semyon nunca tive, na
verdade, aquela vida bastava para mim, se ele se decidisse pela minha
morte em prol dos Zhertva, eu lhe entregaria sem qualquer queixa.
Eu quero viver... quero viver esta vida com Alya.
Meus lábios quase se moveram, as palavras sendo mais fortes do
que nunca faziam meu coração acelerar e cada uma das minhas certezas se
dissiparem no ar.
Eu não quero morrer agora.
Não desejo perder a chance de tê-la como minha.
Preciso ser mais do que uma carta descartável nesse jogo.
Minha garganta ficou seca, arranhando e amargando minha boca.
Olhando ao redor naquele escritório eu entendi que nunca estive perto de
resolver minha situação com o Pakhan, talvez Alya não soubesse de nada, e
esse plano não fosse parte das suas ambições. Semyon não me queria como
genro, ele nunca me perdoou de verdade.
— Yakov? — Mãos quentes, pequenas e macias agarraram meu
rosto, me forçando a focar. — As palavras de Natalya significaram algo
para você?
Franzi o cenho.
Talvez ela não tenha nada a ver com as minhas suspeitas.
Alya nem mesmo deve saber o que aconteceu com sua tia, para
todos de fora, foi um suicídio devido à depressão e todo o medo do mundo
criminoso que Yelena não suportou.
— Hey, soldado. — Pisquei, engolindo em seco todas as imagens de
um passado que fingi ter ficado para trás, mas que estava acorrentado em
minhas pernas e apenas me acostumei com o fardo. — Está preparado para
ser meu?
— Do que está falando?
Ela deu mais um passo à frente e me puxou o suficiente para
podermos alinhar nossos olhares, com apenas uma frase e com aquela
conexão, eu pude entender aquela criatura astuta.
— Já posso tê-lo para mim, Yakov? — perguntou baixo, com uma
determinação envolvente.
— Sim... — murmurei, devolvendo a mesma firmeza. — Nada vai
me impedir de ser teu marido, princesa.
— Isso é bom, porque não abro mão desse casamento e muito
menos de você!
Aquele assunto não dizia respeito a um matrimônio, e sim a um
acordo para toda a vida que ia muito além de relações amorosas. A herdeira
merecia minha lealdade mais do que seu pai, e talvez assim eu pudesse
finalmente deixar aquela corrente que me prendia ao passado, ser quebrada.
O caos dentro do meu peito e cabeça suplicavam por aquele breve
conforto dentro do abraço quente, a criatura mulher beirava a lar ou o mais
perto disso para mim. No entanto, como poderia confiar em um sangue de
traidores?
Afunilei o olhar.
— Prometa que me fará confiar plenamente em você.
Alya inclinou a cabeça e recuou um passo, os braços agora
cruzados, como se tentasse se proteger de algo, ou talvez fosse de mim.
— Se eu te contar um pequeno segredo de família, poderei tirar essa
desconfiança de você?
Assenti, de todo jeito eu estava desesperado para apenas fechar
meus olhos a todo o resto e chutar cada uma das incertezas quanto a
herdeira com olhos de tigre, precisava de uma pequena e simbólica
desculpa.
Passei anos me agarrando a futilidades e acenando para todos os
comandos do meu Pakhan, pertencer a Alya não me causaria mais danos do
que isso... era no que eu acreditava ao menos.
Capítulo 18

A história de Yelena Rurik teria sido enterrada e esquecida por todos


daquela mansão, se um funcionário esperto o suficiente para sair em
silêncio da cena do crime não tivesse fugido para o mais longe que deu. Eu
nunca saberia sobre minha única e falecida tia, caso este mesmo funcionário
não aparecesse desesperado na porta da faculdade que eu cursava,
implorando para ser ouvido... prometendo que daria em minhas mãos o
maior trunfo contra Semyon.
Aquele funcionário só veio até mim, porque sabia de planos que
foram feitos para Yelena, mas recaíram sobre meus ombros após sua morte.
Contar sobre minha tia para Yakov foi torturante em vários níveis.
Eu sabia do seu envolvimento com ela, graças ao funcionário
fugitivo, e a cada reação de ódio estampada em sua face, me peguei ansiosa.
Contudo, existia a necessidade de nos ligarmos por algo maior além
do tesão, promessas de um casamento em harmonia não soavam o
suficiente para transformar aquele soldado em um traidor de seu Pakhan.
Pouco importava naquele momento, o amargo em minha boca ao ver a cor
avelã de suas íris morrer em um preto opaco, nem mesmo deveria ficar
inquieta ao ver seus punhos se fecharem com indignação a cada ponto
essencial daquela história.
Não cabia em mim, espaço para ter ciúmes, então por que senti tanta
raiva a ponto de não repetir mais o nome daquela mulher?
Era ridículo. Yelena não teve culpa do seu destino, tampouco vivia
para poder ser uma ameaça à minha relação com Yakov, e mesmo diante de
tantos fatos a meu favor, me via completamente desconfortável em
mencioná-la para ele, em ver suas reações por causa dela.
Pensando sobre tudo que aconteceu no escritório do meu pai, engoli
o amargor da vodka pura e deixei que queimasse junto das loucuras
desnecessárias que minha mente perturbada cismava em trazer à tona.
Bom... aquele homem não era tão insignificante para mim, afinal.
Todavia pude tirar algo bom dessa conversa sufocante sobre minha
tia. O muro de lealdade que Semyon ergueu com tanto orgulho e dedicação
na cabeça de Yakov, foi quebrado com sucesso. Se tivesse me apressado e
contado o que sabia sobre a tragédia que aconteceu com a minha tia,
poderia ter falhado, pois o soldado se negaria a acreditar em minhas
palavras, talvez até se afastasse de mim por ter usado o nome da mulher que
ele foi apaixonado.
Yakov realmente a amou?
Haveria lugar em seu coração para outra mulher?
Eu seria capaz de roubar todos os seus sentimentos para mim?
Mais um gole, junto de um riso curto pelas bobagens que se
passavam em meus pensamentos.
Era chegada a hora de acabar com a espera. Peguei meu celular
descartável e restrito, garantindo que Semyon não teria acesso àquela
conversa e caminhei para o banheiro, liguei o chuveiro e enquanto a água
corria em meu pé, disquei para Grigori, o Pakhan dos Bratvas.
A verdade por detrás do surgimento dos Zhertvas não é exemplo de
bravura ou tem qualquer relação com justiça como a grande maioria dos
soldados imaginava. Existiam os bastidores mais feios e desonrosos que
qualquer crime cometido pelos próprios Pakhans envolvidos. Grigori amava
meu pai como um irmão mais novo, lhe ensinou sobre os negócios, colocou
em suas mãos um cargo de conselheiro poderoso e o fez conhecer pessoas
influentes, mas a Bratva tinha uma aparência feia diante da sociedade, suas
tatuagens grotescas de membros que vieram da cadeia para se juntar à
máfia, a forma de lidar com situações extremas, aplicando violência sem
restrições.
A visão de Semyon foi boa o suficiente para enxergar além do
grotesco, aquele dinheiro que chamava seu nome e que também poderia
chamar os de outros, afinal, riqueza encantava e adoçava a boca de qualquer
um. Um dia meu pai decidiu levar sua ideia para Grigori, e foi bem
acolhido, porém metade dos membros nunca se encaixariam naquele ideal
de organização e o líder jamais abandonaria seus soldados.
Como em todo lugar, a Bratva tinha suas ervas daninhas e também
não era exemplo de lugar para se trabalhar. As punições pesadas nunca
condiziam com o crime cometido, pouco importava o quanto fez para eles,
sempre acabaria morto se tentasse sair, entre outras coisas que todos já
conhecem do mundo obscuro dos negócios ilegais.
Foram esses soldados que temiam a fúria de Grigori que se uniram
para construir os Zhertvas junto do meu pai, cegados pela ilusão de um
lugar melhor para serem criminosos, buscando um sonho de família que era
vendido em filmes sobre máfias, e entregando suas lealdades àquele homem
que foi capaz de reconhecer seus pontos fortes. Contudo, para Semyon eles
não passavam de presas fáceis de manipular, e dessa forma ele os prendeu
em suas cordinhas e iniciou seu show de marionetes.
Yelena deveria ter se casado com Grigori, mas com a separação dos
dois amigos, quase irmãos, foi rompido o acordo e no lugar do casamento,
outras mulheres foram negociadas. Toda mulher que se rebela contra a
organização ou marido é jogada nas mãos de Grigori e colocada nos seus
puteiros insalubres e clandestinos.
Semyon não salvou Yelena de um casamento por amar sua
irmãzinha, ele o fez por ser obcecado por ela e se recusar a entregá-la para
outro.
Tão podre e violento, só sua irmã era capaz de acalmá-lo, no
entanto, com o passar do tempo, ele precisou se casar e assim minha mãe
foi jogada nessa casa, com um marido infiel que fodia sua própria irmã.
Yelena não entendia a gravidade daquela relação, foi criada somente com
meu pai, vivendo aquela realidade como única, sendo mais um fantoche em
sua mão e acreditando amar com todas as forças o seu irmão mais velho.
Grigori não sabia disso, nem mesmo Yakov, que se meteu sem
imaginar o quanto mudaria as coisas dentro daquela casa.
Foi nessa falha de Semyon que consegui adentrar com folga. Um
funcionário atordoado querendo dinheiro e sabendo de coisas que poderiam
destruir o Pakhan, suplicando para que sua filha fosse alguém melhor que o
pai, ajudando-o no processo.
— Pensei que nunca mais me procuraria — falou com sua voz rouca
de tantos charutos e cigarros que fumou em sua vida.
Sorri de canto, vendo a água escorrer da minha pele.
— Como eu poderia ignorar meu sogro?
Grigori puxou o ar com força.
— Decidiu por mantê-lo vivo, então?
— Sim... Yakov pode não saber, mas ele se parece muito com você
em algumas coisas.
— Algumas coisas?
— Ele é leal demais àqueles que gosta ou acredita ter alguma dívida,
e costuma deixar o coração vir antes da razão.
Grigori bufou, sabendo ao que me referia.
— Alya, não ouse voltar atrás com sua promessa, sabe que ele me
pertence.
— Não sou tão superficial quanto meu pai, Grigo. Entregarei quem
deseja e tomarei a frente dos Zhertvas, preciso apenas de uma ajuda... quero
que seja meu faxineiro e lhe garanto que serei bem generosa com a divisão
dos lucros que colher após minha ascensão.
— Não precisamos de você ou dos Zhertvas para nos mantermos,
garota. Desde que me traga quem eu quero, farei tudo o que precisa.
Desligou. Ele se fingia de forte, mas suas ambições eram frutos de
sentimentos inúteis.
Magno, o funcionário fugitivo, rezou para que eu fosse melhor que
meu pai... Deus atendeu aos seus pedidos, eu definitivamente era melhor
que Semyon em planejar o meu futuro e como usar as cartas que tinha em
mãos.
Yakov não fazia parte dos meus movimentos, esperava outra pessoa
sendo jogada nesse casamento mal-arranjado que meu pai inventou para me
manter ocupada. Entretanto, sua existência já era de meu conhecimento, o
filho bastardo do Pakhan da Bratva que foi abandonado pelo pai e tratado
como um soldado qualquer, o mesmo que Semyon botou as mãos com a
intensão de se autossatisfazer.
O quão era bom para o seu ego ter retirado grande parte dos
soldados e negociadores da Bratva, e ainda ter o único herdeiro bastardo do
Pakhan deles em suas mãos, como um cãozinho fiel?
Podia imaginar o deleite de Semyon.
Chegava a hora de deixar tudo isso no passado, o nosso casamento
não mudaria nada com relação a Bratva e Zhertva, porque Grigori nunca
almejou colocar seu filho bastardo no poder e muito menos se preocupava o
suficiente com sua vida para pedir por sua segurança.
Todavia, consegui a informação por ser precavida, nada era ao acaso
quando se tratava do meu pai, essa obsessão por manter Yakov perto não
era diferente.
Decidi por tomar meu banho e descansar, as estrelas e lua brilhavam
no céu, tão radiantes quanto meu sorriso, por saber que logo me livraria de
tudo que poderia me impedir de fechar todo aquele poder em minhas mãos.
Capítulo 19
(14 anos atrás)

— Princesa, acorde.
O leve sacolejar do meu corpo me fez abrir os olhos
preguiçosamente, queria continuar no sonho gostoso em que viajava o
mundo. Pisquei e esfreguei minhas pálpebras, encontrando meu pai meio
atordoado diante de mim.
— Pai, o que aconteceu?
Ele segurou minha mão e me forçou a abrir a palma, colocou uma
pequena adaga sobre ela e me encarou com determinação.
— O papai precisa de um grande favor, querida.
Ele estava inquieto e toda aquela agitação me fez sentar e engolir
em seco, a adaga queimava sobre minha pele, trazendo calafrios ao meu
corpo. Eu sabia que um dia chegaria meu momento de agir, que todas
aquelas lutas com o mestre Grigori e ele não foram em vão, mas nunca
imaginei que seria tão cedo, sequer completei meus dezessete anos.
— Pai... está me assustando.
— Alya, olhe aqui. — Puxou meu rosto com as mãos, sua voz baixa,
porém firme. — Não é o momento de ficar assustada. — Suspirou,
recuando um pouco e esfregando seu rosto. — Você tem uma escolha: mate
o homem que está com a sua mãe no terceiro quarto deste corredor ou eu a
matarei com minhas próprias mãos.
Suas palavras me cortaram como se aquela lâmina da adaga tivesse
escapado em minha mão.
— O que será, princesa? — Buscou meu olhar e sorriu em desgosto,
vendo a minha hesitação. Ele puxou minhas cobertas, me fazendo
sobressaltar e, realmente, me cortar com a adaga ao fechar minha palma no
impulso. — Essa é sua primeira decisão difícil, querida, mas não será a
única.
Assenti devagar, as lágrimas se acumulando em meus olhos
enquanto lutava para segurá-las, então me levantei e segui para a porta.
— Se entrar naquele quarto com essa adaga e não for até o final,
saiba que será o seu cadáver no chão, porque ele não vai pensar duas vezes
ao te atacar.
Acenei.
Ser filha de um mafioso era aceitar que a vida jamais seria normal,
que dias leves se tornariam cada vez mais raros conforme os anos fossem
passando. Mesmo sabendo disso e fazendo de tudo para me encaixar
naquele estilo de vida, não conseguia ficar confortável ou sequer indiferente
a esse tipo de situação.
A cada novo passo para mais perto da porta indicada pelo meu pai,
meu coração saltava e as perguntas flutuavam em minha cabeça.
Quem era aquele homem?
Por que estava sozinho com a mamãe?
Não era para o papai estar viajando a negócios hoje?
Se é tão importante matá-lo, qual a necessidade de ser eu a fazê-lo?
Minhas pernas tremiam a ponto de me apoiar nas paredes para
conseguir continuar de pé, a pequena arma branca em minha mão brilhando,
parecendo tão letal como nunca.
Treinei com facas e armas de fogo, odiava a primeira opção. Era
preciso muita técnica, rapidez e frieza para matar alguém com uma lâmina,
sentindo a pele abrir, ouvindo o barulho daquele corte sendo feito e ainda
recebendo o sangue em si, dependendo de onde acertar. Preferia arma de
fogo, rápido e podia ser feito à distância, o estampido do disparo te impede
de ouvir muito mais ao redor e treinando a mira é possível terminar o
trabalho com um único tiro.
Mas o meu pai queria que eu fizesse isso com uma pequena adaga; a
minha primeira morte seria por uma lâmina de quinze centímetros, me
obrigando a ficar bem próxima da vítima correndo o risco de ter retaliação,
em frente da minha mãe e dentro da minha casa, um lugar que eu deveria
me sentir segura.
Por que ele estava fazendo isso comigo?
A terceira porta do corredor não estava trancada, um leve girar de
maçaneta foi capaz de me expor os corpos nus de duas pessoas na cama, o
maior permanecia por cima, movendo-se ritmado e nenhum notou minha
presença.
Então ela o traiu... e seria eu a matar seu amante.
Observei rápido a cena, assim como Grigori tinha me ensinado em
uma das nossas lutas: “nunca dê o primeiro passo sem saber onde vai ser o
segundo!”.
A posição deles me favorecia, o homem cobria toda a visão da
minha mãe da porta e ele estava de costas para mim, cada passo que dei a
partir dali foi silencioso, feito com as habilidades de uma bailarina que foi
interrompida em seu sonho para viver o que lhe foi planejado.
Respirei fundo e posicionei a adaga confortavelmente em minha
mão. Quando vi os olhos da minha mãe se fecharem junto de um gemido
mais estridente, saltei na cama e fiquei de pé atrás dele, o susto o deixou
sem reação e foi nesse instante que puxei seus cabelos para trás e passei a
lâmina de uma ponta a outra em seu pescoço.
— Eu te amo! — minha mãe sussurrou segundos antes de sentir o
sangue encobrir seu rosto e ver sua única filha de pé na cama, atrás dele.

**

Abri os olhos e umedeci os lábios.


Dava para entender o ódio dela por mim, as imagens vividas
daquela lembrança de vez em quando retornavam em meus sonhos. Aquele
homem foi minha primeira vítima, e saber que as palavras que nunca ouvi
de sua boca saltaram tão fáceis e rápidas para ele, me fez sentir bem por ter
sido a causadora de sua morte.
Depois dos seus gritos ultrapassarem as paredes do quarto, meu pai
apareceu e me puxou para si. Mesmo com as mãos cheias de sangue e
ouvindo o choro contínuo da mulher que me deu à luz, me senti acolhida
em seus braços e satisfeita por ter cumprido a missão.
Era esse o nível de amor que eu tinha por ele, e o tamanho do seu
controle sobre mim.
Sentei-me na cama, esfregando meu rosto.
Aquela versão minha beirava o patético, caçando conforto e carinho,
suplicando para ser vista e adorada. Se minha mãe tivesse me estendido a
mão antes de tudo isso acontecer, jamais ouviria o pedido do meu pai, agi
na intenção de mostrar força e só soei mais ridícula ainda.
Daí em diante minha vida foi coordenada pelo meu Pakhan, a
viagem para estudar fora que ele pensou ser um agrado, me pareceu um tipo
de castigo. Como poderia construir novas relações? Quem me daria carinho
e atenção?
Foram tantas traições por causa desse comportamento deplorável
que aprendi a me preservar, a dependência emocional saiu de fraqueza para
nada, ninguém nunca mais me enganaria com migalhas de afeto.
A mensagem de que Semyon me queria de volta depois de anos e
desejava me tornar sua sucessora, mesmo que ainda estivesse em plena
condição de continuar no poder, foi suficiente para me preparar, pesquisar e
usar a carta na manga que havia me procurado dois anos antes.
Todo o período que vivi naquela mansão, vi minha tia Yelena apenas
duas vezes; ela não saía do quarto nem mesmo para as refeições, e somente
o fazia quando viajávamos ou era muito tarde para que eu e mamãe
estivéssemos acordadas. Cega pelo meu egoísmo e desespero em ser notada
pelo meu pai, nunca questionei sua existência e muito menos quis investigar
sobre ela, até Magno aparecer e me contar o quanto meu pai foi ao fundo do
poço como ser humano.
Incesto, cárcere privado e violência sexual; todos os crimes que o
Pakhan tão honrado do Zhertva cometeu com sua própria irmã. O maior
motivo para ele se desligar de Grigori e criar uma narrativa de herói. Ele de
todos os homens que comandava, era o sangue mais sujo e digno de ser um
Bratva, um maldito gangster com desejos podres que se escondia em uma
pelagem de diplomata inteligente.
Semyon foi o pai que eu amei, da mesma forma que um dia foi o
irmão que Yelena admirou, e nenhuma de nós pôde evitar reconhecer o
monstro dentro dele.
Ao contrário da minha tia, eu não morreria tentando me esconder ou
fugir, preferia olhar nos olhos dele e fazê-lo entender que quanto maior a
presa, mais paciente é preciso ser. Ele me subestimou... jamais cometeria
um erro tão estúpido como esse.
Um dia ele foi o caçador, agora havia se tornado a caça.
Capítulo 20

— Isso foi decidido quando? — Minha pergunta ecoou pela sala de


jantar, os talheres de Semyon tilintaram quando ele os apoiou
tranquilamente de cada lado do seu prato.
— Pai, pensei que teria uma semana de folga de compromissos...
Ele suspirou, como se nossas indagações o irritassem, a máscara de
homem sorridente e paciente caindo diante dos meus olhos, apenas
confirmando que sua intenção nunca foi altruísta, muito menos sem um
plano que provavelmente teve que ser recalculado por causa da minha
aproximação com a herdeira.
— Não querem se casar? Chegaram nesse acordo e se esqueceram
de me informar? — Empertigou-se em seu assento. — É melhor que me
digam agora se essa foi a decisão.
— Claro que não é isso! — Alya assumiu a conversa, sua voz serena
e os cantos dos seus lábios levemente arqueados, quem a visse de fora, diria
que estava sendo apenas educada, mas eu sabia que ela se controlava para
não deixar a fúria vir à tona. — Só queríamos um tempo para nos
conhecermos...
— Nunca precisei disso com a sua mãe — bradou.
Aquela versão do Pakhan era a verdadeira? Olhar frio e indiferente
aos nossos apelos, seguindo adiante com suas vontades e impondo-as aos
outros, sem querer ouvir qualquer tipo de reclamação.
— Adiantar o casamento de vocês é algo bom, não acha, Alya? —
Virou-se para ela. — Significa um passo a mais na direção do poder —
sorriu desdenhoso. — Depois que disser sim no altar, não haverá desculpas
para que você não seja a nova rainha dos Zhertva.
O que pode ter acontecido para uma mudança brusca?
Olhei de relance para minha noiva, e encontrei a mesma pergunta
circulando por suas íris inquietas, apesar da sua voz permanecer sempre
suave quando direcionada ao seu pai.
— Se deseja assim, então faremos.
— Mas como arrumaremos tudo até semana que vem? — questionei
incrédulo.
Natalya continuou em silêncio, mesmo com o tempo mais quente,
vestia roupas de mangas longas e se encolhia a cada palavra de seu marido,
afunilei o olhar em sua direção. A esposa do Pakhan sequer erguia sua
cabeça, movendo sua mão tão lento que parecia sentir dor a cada garfada
que levava à boca.
— Minha esposa cuidará disso!
Apenas nesse momento ela nos mirou, foi por segundos e sem emitir
qualquer som. Alya notou o mesmo que eu, sem poder mais fingir
indiferença, ela riu jocosa, levantando-se da mesa em um impulso violento.
Semyon claramente não esperava essa reação, erguendo-se também e a
enfrentando. Os punhos de Alya se fecharam e seu sorriso foi apagado por
um esticar de lábios tenebroso, tão ameaçador quando seus olhos ferozes.
— É do meu casamento que estamos falando, se tem por intenção
adiantá-lo, tudo bem, aceito seus termos. Contudo serei eu, a noiva, quem
acompanhará os preparativos, deixe Natalya fora disso e leve esse termo
para você também.
— Pensei que queria descansar um pouco mais — disse com
sarcasmo.
— Sei das minhas prioridades!
O silêncio cortou o ambiente. Engoli em seco, me sentindo preso em
uma jaula com dois predadores famintos pela minha carne.
Era horrível ter esse tipo de sensação sendo um homem com
habilidades únicas em tortura. De repente, meu orgulho decaiu e me
questionei o quanto fui, verdadeiramente, útil para o Pakhan a ponto de ser
perdoado e ainda comandar seus soldados. Yuri com certeza foi a melhor
escolha para esse momento, mas e quanto a mim, fui, de fato, a melhor
escolha de Semyon?
Lealdade e boas técnicas de escalpelamento não eram suficientes
para desempenhar tal papel.
Olhando minha noiva de pé, encarando seu pai de igual sem desviar
os olhos, me lembrei do quanto o chão já fazia parte das minhas memórias
por encará-lo com frequência quando estava na presença de Semyon; das
vezes que hesitei em cumprir uma missão por ver uma mulher ou criança na
outra ponta, vomitando e chorando de culpa por fazer um trabalho tão
desgraçado, para logo depois ser colocado em missões mais tranquilas de
reconhecimento de local ou tratativas com aqueles riquinhos frescos e
cheios de manias esquisitas.
Não existia nada de honroso na minha vida de Vor, então por que me
escolher para ser noivo de sua filha? Qual o sentido de ter alguém tão fraco
emocionalmente ao lado de uma criatura cheia de vigor como Alya?
Outra vez nada encaixava, a não ser pelo que ouvi da boca da minha
noiva e fez meu sangue ferver.
— Podemos então chegar a um acordo — bradou, como se houvesse
plateia ao redor. — Minha única e querida filha, finalmente irá se casar!
Semyon nos deixou, aquele clima pesado que indicava algo nas
entrelinhas, como se alguma sentença tivesse sido decretada sem um
julgamento justo e todos ficassem insatisfeitos, porém omissos para não
perderem também.
— Vamos, soldado, há algo que precisamos conversar.
Ela me pegou pelo pulso, orientando-me para fora da mansão,
deixando para trás aquela figura miserável de sua mãe, sentada sozinha
diante de uma grande mesa de jantar em que nenhum dos outros presentes
tocou na comida.
A decadência da família Rurik chegava silenciosamente e sendo
expressa com aquela imagem deplorável.

**
Seus olhos azuis gelo escanearam os arredores com precisão, a porta
de ferro fez um rangido quando ela a puxou, aquele lugar era o armazém
dos Vor, todas as munições e equipamentos necessários ficavam guardados
ali, o que me fez cruzar os braços assim que ela nos fechou dentro, pois
somente autorizados tinham a chave para acessar aquele local.
Contudo, antes de abrir a boca, uma nova silhueta surgiu detrás de
algumas caixas de madeira.
— Ei, Yakov, pensei que só te veria na próxima semana. — Yuri riu
se aproximando, deu um leve tapinha em meu ombro e se colocou ao lado
de Alya.
Deixei meus braços caírem, aquela sensação de estar sendo
enganado aumentando e pressionando meu orgulho, esmagando-o como
uma máquina de compressão faz.
— Que porra está fazendo aqui? — Encarei Alya, de certo o que
mais me deixou em alerta era sua proximidade com outro soldado, em que
momento isso ocorreu?
Quantos outros Vor ela teve contato sem que eu soubesse?
— Calma, cara...
— Sem enrolação, Yuri — insisti.
Minha noiva não disse nada, acompanhou nossa interação com
curiosidade e até mesmo admiração, isso apenas aumentou minha raiva.
Eu me vi cansado de ser um brinquedo nas mãos dos Rurik, aquela
família tinha problemas demais e não queria fazer parte de nada disso.
Acompanhei Semyon por acreditar que seu modo de tratar a todos os
soldados era mais digno do que Grigori, que sequer se apresentava para
seus homens. Meu destino foi traçado desde o meu nascimento, jogado nas
mãos de mafiosos impiedosos para ser um cão de caça e nada além, no
entanto, eu quis sonhar com um futuro menos turvo, ainda que enraizado
naquela merda de vida obscura, tendo um pouco do meu orgulho salvo e
ficando mais tempo longe de violência, como um dia prometi a Yelena.
Eu nunca seria um homem comum, mas precisava ser alguém
melhor do que a porra de um açougueiro de humanos.
— Yakov, você está se irritando à toa...
— Não é uma decisão sua, me diga o que faz aqui e eu mesmo bato
o martelo se é ou não besteira.
Ele assentiu, seu olhar escorregando de mim para Alya.
— Sua noiva está há dois anos protegendo alguém que amo, prometi
que a ajudaria e farei isso, principalmente por saber que querem te
machucar também, cara.
Franzi o cenho, sequer imaginei que Yuri estivesse em algum
relacionamento, ele sempre foi reservado demais para falar de sua vida
pessoal, presumi que sua história não fosse tão diferente da minha ou que
era jovem demais para ter se envolvido com alguém.
— Seu soldado te admira o suficiente para não te colocar em risco, e
isso é suficiente para que ele esteja nesse plano, mas é verdade que tenho
alguém sobre meus cuidados e essa pessoa interessa demais a ele.
— Essa mulher vale tanto assim? Está disposto a trair seu Pakhan
para protegê-la, assim como proteger a mim? — perguntei mais calmo.
Yuri abaixou um pouco a cabeça e fugiu do meu olhar, suas mãos se
apertaram e vi quando engoliu em seco.
— Não é uma mulher! — Foi a voz de Alya que cortou aquele
silêncio esquisito.
Seria hipocrisia minha se dissesse que não fiquei surpreendido,
todavia, a vida pertencia a ele e suas escolhas não mudavam nada entre nós,
embora seu relacionamento jamais possa ser revelado, pois ele e seu
parceiro morreriam por linchamento diante dos outros soldados. A Rússia
ainda achava ter o direito de mandar na sexualidade alheia, punindo aqueles
que não seguissem o padrão quadrado a que se apegaram tanto.
— Mais ninguém pode saber disso — soltei aflito.
— Irei embora assim que tudo estiver resolvido — respondeu
hesitante, ainda sem saber meu posicionamento quanto a isso.
— É melhor dessa forma, seja feliz com seu companheiro longe
daqui, Yuri. Não arrisquem suas vidas em um lugar que não os aceita.
Apertei seu ombro, e ele sorriu de canto, concordando comigo.
— Pensei que negaria minha ajuda quando descobrisse...
— Eu te disse que Yakov não tinha tempo e nem forças para se
preocupar com a sexualidade alheia, não disse? — Alya completou antes de
mim, rindo e se aproximando de nós. — Agora que a seção ciúme
desnecessário e revelações acabou, podemos nos concentrar aqui?
Concordei, respirando fundo e parando para ouvi-la. Contudo, eu
ainda não estava satisfeito com todo aquele jogo feito às escondidas.
Alya tinha muita coisa oculta, enquanto sabia tudo sobre mim.
Capítulo 21

A casa lotada mais uma vez, talvez a última por um longo tempo.
Meus sentimentos em relação a Yakov mudaram conforme as
estações em que convivemos, o verão chegou com um clima agradável e
mais cheio de luz, possibilitando que nosso casamento fosse no grande
jardim dos fundos com decorações coloridas e floridas. Eu escolhi cada
detalhe, principalmente as nossas roupas, afinal, fazia parte do show que
daríamos dali a algumas horas.
Foi uma semana recheada de discussão com meu pai e mãe, cada um
tentando me controlar sobre os preparativos da festa ao seu modo. Acatei
algumas sugestões, dispensei outras e nesse meio tempo não pude me
encontrar apropriadamente com Yakov, ficando a cargo de Yuri alinhar
nosso plano com ele, embora algo em seus olhos, da última vez que nos
vimos, me deixava inquieta quanto à sua lealdade.
Será que mesmo depois de saber de tudo que aconteceu com Yelena
ele continuaria fiel ao seu Pakhan?
Essa dúvida me corroía, tanto quanto a sensação de estar disputando
o afeto de um homem com uma mulher morta, pior ainda, uma que foi
minha tia. Era estupidez ter essa insegurança, porém, me vi enciumada com
tão pouco, apenas porque ele demonstrou ódio ao ouvir sobre um passado
de Semyon que a envolvia.
Mas quem não sentiria isso?
Somente aqueles cujo coração esfriou demais para deixar de ter
empatia pela dor alheia. Até mesmo eu, quando soube das atrocidades
praticadas contra minha tia, tive raiva do meu pai.
E não era por isso que seguia adiante com meu plano, mesmo
sabendo as consequências que trariam para ele?
A pergunta circulou em letras garrafais acima da minha cabeça,
quase me esmagando ou culpando, pois, a resposta era um grande e egoísta
NÃO.
Continuava minha trajetória por mim, a partir do momento que
escolhi que eu seria a minha única prioridade. Posso ter mudado alguns
caminhos para encaixar Yakov na minha jornada e tê-lo como parceiro para
toda a minha maldita vida, mas sempre com o foco na minha sobrevivência
nesse mundo pajeado por homens.
Se não fosse eu por mim, ninguém seria capaz de me proteger.
Entretanto, gostei da ideia de ter um soldado empenhado nessa
missão, não somente de me manter a salvo, como se fosse a porra de um
príncipe encantado; alguém com brio e paixão, capaz de me foder como
uma cachorra no cio e depois me abraçar com tanta ternura que me faria
crer valer mais do que os tesouros valiosos.
Yakov parecia ser esse tipo de homem. Mesmo sem amor envolvido
em nossa relação, ele cuidava, sempre vindo com suavidade limpar minha
pele depois de espalhar todo seu gozo derivado de um sexo bruto e sem
ressalvas. Seus olhos castanhos brilhavam com a preocupação e satisfação.
A mistura perfeita do homem que sempre desejei ter em minha vida.
O que ele faria comigo, quando descobrisse que apenas minha
boceta era intocável pelos meus parceiros?
Sorri sozinha, então escutei um turbilhão de vozes irritantes se
aproximando e suspirei pesado, logo batidas na porta me tiraram da minha
tranquilidade.
— Senhorita Rurik, viemos ajudá-la com seu vestido.
Revirei os olhos e elas se calaram quando perceberam que o tal
vestido já estava em meu corpo. A lateral aberta até o joelho tinha uma
função bem clara, assim como o pequeno suporte agarrado firmemente na
mesma coxa do corte lateral, onde minha adaga descansava e minha Taurus
85S[4].
— Bom... podemos seguir para o penteado e maquiagem...
Uma delas tentou aliviar o desconforto. Não as culpava, foram
contratadas para dar conta de tudo que dizia a respeito do meu conforto e
para mostrar serviço ao Pakhan fariam de tudo. Assenti, sem vontade de
discutir, o que precisava da minha atenção sem olhares curiosos já foi
resolvido.
O vestido era branco com um forro extra que mandei colocarem por
precaução, não era possível ver a silhueta de nenhuma das minhas armas,
apesar disso, o tecido pode ser facilmente rasgado caso necessário.
As mulheres começaram suas tarefas, o penteado simples em um
coque alto e com enfeites brancos, assim como a maquiagem só tinha um
pouco de cor no batom levemente rosado, um tipo quase nude.
Queria ver meu noivo, enxergá-lo no terno que escolhi e o qual tem
dois bolsos falsos por dentro também equipado com armas de sua
preferência e a cada vez que chegava mais perto desse momento, ficava
ansiosa.
Nunca tive tal sensação, não depois de completar meus vinte e um
anos.
Yakov era pelo menos oito anos mais velho do que eu, em toda a
minha adolescência devo tê-lo visto uma ou duas vezes e com certeza foi
rápido demais para ficar guardado na memória, e agora estávamos nos
preparando para o nosso casamento.
— Senhorita, acabamos.
Abri meus olhos devagar, vendo como tudo ficou e sorri de canto, as
mulheres soltaram o ar de alívio e pareciam felizes com o resultado.
— Muito obrigada.
Elas saíram devagar, e segundos depois minha mãe adentrou o
quarto.
— Está linda!
Pela primeira vez não ouvi sarcasmo em sua voz, as pequenas
manchas de seu rosto e pescoço que não se curaram a tempo, foram
disfarçadas com maquiagem.
Nunca presenciei essa versão deplorável de Natalya Rurik, pensei
que me sentiria bem ou até indiferente, mas fiquei incomodada.
Um dia poderia ser eu naquela posição de mulher agredida por seu
marido, se não tomasse o controle da minha vida, provavelmente a perderia
para algum desgraçado autoritário.
— Obrigada.
Um silêncio esquisito perdurou até ela se mover para o pequeno sofá
do outro lado do quarto.
— Eu sinto muito por não ter sido capaz de te amar, Alya. Gerar
você nunca fez parte dos meus desejos... mesmo assim... — Apertou os
olhos e se recompôs, Natalya não chorava diante de ninguém. — Pensei que
quando a visse em meus braços minha opinião mudaria, mas tudo que senti
foi desespero e raiva.
— Como devo digerir isso, mãe? — Ela virou o rosto, fugindo de
mim.
— Não quero que me perdoe, tampouco estou aqui para prometer
que serei alguém diferente. Você matou o único homem que amei em toda a
minha vida medíocre e sem propósito, não posso... não posso enxergá-la
como filha. É tarde demais para recuperar essa relação…
— Então o que faz aqui?
— Te peço para não se deixar levar por Semyon, ele... ele nunca
soube o que era afeto.
Ri jocosa. Levantei-me e parei de frente para ela.
— Sei disso há muito tempo, Natalya. Obrigada, mas dispenso seus
avisos e conselhos.
Ela acenou e ergueu-se, nunca ficamos tão perto uma da outra. Seus
olhos me mirando sem aquele desprezo cotidiano.
— Yakov é diferente dele, por isso é fraco demais para te proteger,
assim como Grigori foi fraco para Yelena e Nero para mim. Espero que
você seja mais forte do que nós e que seu futuro não seja vendo quem ama
sendo roubado de você.
Pude ver o marejar em seus olhos, mas como sempre, ela não
permitiu que nenhuma gota caísse. Saiu como se suas palavras não tivessem
o poder de me fazer sentir culpada, afinal, fui eu a responsável por roubar
seu amor, mesmo que a mando do meu pai, foi a minha adaga que dilacerou
a garganta dele bem na sua frente.
A menção de Grigori com relação a Yelena me fez entender a última
peça do quebra-cabeça. Meu noivo não poderia proteger alguém que ele
sequer sabia estar em perigo, mas Grigori conhecia bem a personalidade
podre de seu ex-conselheiro e teve sua noiva tirada de suas mãos.
Todavia, acabaria o reinado de Semyon no segundo que meus pés
tocassem naquele altar.
Capítulo 22

O gosto do poder já descia pela minha garganta, mas ao contrário do


sabor doce da glória, eu senti o azedo fervendo e ficando marcado na ponta
da minha língua.
Natalya era uma mulher criada em uma casa cheia de princípios
destorcidos, assim como seu casamento, toda a sua maldita vida foi criada
em torno de uma mentira, chegou a ponto de nem mesmo ela saber quem
era, e com isso a indiferença se transformou em sua melhor amiga. Entendia
isso, passei noites me convencendo de ser alguém diferente, lutando pela
minha liberdade e jurando que todo aquele treinamento me resgataria de um
futuro tão apagado e sem graça quanto o dela. Apenas uma história triste
lhe restava como lembrança de um pouco de vida própria.
A sua filha matou o único homem que foi capaz de tirar algum
sentimento dela.
Como ela poderia ser capaz de me amar?
Todavia, a culpa dessa merda toda não era minha, esse fardo não
deveria cair sobre meus ombros e não existiam finais felizes em relações
desgraçadas por tanto tempo e de maneira tão cruel. Meu pai sabia disso, foi
a cereja do bolo para soterrar qualquer vestígio de humanidade de sua
esposa.
Contudo, isso não bastou. A criança que ela pariu não poderia amá-
la e muito menos ter seu amor.
Existiam coisas que nunca deveriam ganhar a luz. Talvez fosse
melhor se ela nunca tivesse proferido nenhuma daquelas palavras.
Se eu não pensasse tanto sobre a minha mãe e no que fiz a pedido do
meu pai, jamais ficaria desconfiada a ponto de enxergar seu plano sujo. Se
Magno não fosse ao meu encontro por medo de ter sido encontrado pelo
meu pai, eu não saberia sobre Yelena. Se Yakov não fosse tão ingênuo e
leal, jamais o teria poupado.
O calor das lágrimas me fez notá-las escorrendo pelo meu rosto, e só
não estragaram a maquiagem feita com tanto profissionalismo, por ser à
prova d’água. Fechei meus punhos e respirei fundo. Algo não parecia certo
em meu corpo, o compasso do meu coração e o movimento da minha caixa
toráxica sendo forte e ininterrupto.
Por que me faltava ar?
Por que nasci naquele tipo de lar?
Por que meu pai destruía todas as mulheres de sua vida?
Por que não tinha ar?
Por...
... que?
Era como se uma represa de mágoas explodisse diante dos meus
olhos, fazendo a água escapar pelos meus canais lacrimais e pressionando
meu peito devido a tanta força.
As desgraças que se sucederam na minha vida não foram motivadas
pela máfia, por causa dos Zhertva, nem das guerras internas e frias entre
aliados que não concordavam em ter o título de Pakhan passado para uma
mulher.
Semyon as causou.
Semyon as plantou fundo em cada uma de nós.
Matar Yakov depois de nos fazer assinar um contrato de casamento
tinha a ver com me desestabilizar diante de todos os que sempre se
opuseram a mim. Tornar-me fraca, incapaz de salvar meu marido, acabaria
com minha imagem de intocável. Então ele estaria ali, estendendo a mão,
me consolando como o ótimo pai que era, dizendo tudo que eu precisaria
fazer para me recuperar.
Ele me ofereceria a outro ou apenas me manteria calada dentro de
casa até resolver a minha utilidade?
A última marionete em suas mãos que permanecia tendo demais da
vida, ele jamais aceitaria isso.
Duas lebres em um único tiro. Yakov, o filho de Grigori, seria morto
em frente ao seu pai na cerimônia, sem ao menos saber de suas raízes. A
herdeira continuaria cobiçada pelos filhos da alta classe, a pobre noiva que
nem pôde se casar com o homem que amava.
Que nojo.
Senti minhas unhas ferirem as palmas das minhas mãos e pisquei
algumas vezes, peguei um papel seco e com cuidado para não esfregar a
pele bem-feita, limpei os rastros da minha fraqueza momentânea.
Não existiam motivos ou chances para ter minha mãe por perto, mas
o soldado que cativou minha atenção e carinho em meses precisava
permanecer vivo.
Era o fim do legado de Semyon, o hipócrita russo que odiava suas
mulheres enquanto fingia amá-las.

**

A música ao fundo ficou abafada diante da minha concentração,


como planejado, Grigori estava entre os convidados e apesar da idade,
parecia mais ativo do que nunca. Ele não tinha intenção de se casar com
Yelena em busca de uma relação entre marido e mulher, ele percebeu algo
estranho na casa dos Rurik e por gostar da garotinha sorridente, aceitou a
proposta para tirá-la de lá.
Não que ele fosse generoso, isso o ajudaria a crescer nos negócios e
como não sabia quem era o verdadeiro problema, apenas seguiu o fluxo e
decidiu fazer por ela o que foi incapaz de fazer pelo seu filho. Outro
hipócrita que tentava se redimir sem ter responsabilidades reais.
A cada passo podia sentir os olhares queimando minha pele e o peso
do braço do meu pai pendurado no meu, o silêncio para que apenas o som
melodioso ressoasse. O homem bem-vestido, de ombros largos e olhar
penetrante, me esperava quieto com suas mãos apertadas à frente do corpo.
Ele sabia o que aconteceria, no entanto, não existia um pingo de ansiedade
em seus gestos ou olhar.
Sabia o quanto conduzir aquela situação poderia ferir seu orgulho,
ele além de homem era um soldado aplicado e sempre orientava sua equipe
em missões, de repente se ver envolvido em um plano que não ajudou a
estruturar... realmente mexia com sua cabeça, notei isso quando nos
encontramos com Yuri no armazém de munições.
Mas confiar naquela versão inicial de Yakov não era uma opção,
mesmo com o suporte de Yuri, ele se manteria ao lado do meu pai. Aquele
soldado precisava enxergar o verdadeiro Semyon sozinho, contar sobre
minha tia foi parte arriscada, porém feita no momento exato.
Quanto mais perto, mais meu coração batia forte.
Depois que tudo isso passar, irei roubá-lo para mim e faremos as
coisas do jeito certo.
Sorri com o pensamento, ele ergueu as sobrancelhas como se
tentasse me desvendar. Por segundos esqueci daquela presença incômoda ao
meu lado e só voltei a notá-lo quando ele estendeu minha mão a Yakov.
— Cuide bem da minha princesa, rapaz!
— Farei isso, senhor!
Meu pai beijou minha testa e saiu sorridente, seguindo para o seu
lugar no grande altar criado no jardim.
A mão quente de Yakov sobre a minha foi um pequeno instante de
utopia em meio à loucura que tudo aquilo significava. Pude fingir que
estava sendo entregue ao meu primeiro e único amor, afastada de tudo que
dizia respeito à máfia e meus problemas familiares, no entanto, foi um erro
fatal me deixar levar.
O tiro soou alto e o sangue espirrou no meu colo e rosto, meus olhos
vidrados vendo a mancha de sangue se formando por debaixo do tecido,
traiçoeira como todos que já passaram em minha vida, puxando minha
mente para a realidade brutal de ser quem era.
— Yakov! — Eu o segurei, nos abaixando da forma que pude. —
Olhe pra mim.
Ao redor outros disparos começaram, a voz do meu pai gritou meu
nome, mas não me importei.
— Alya, vá agora... — murmurou se recostando em um canto mais
longe de vista, comigo ao seu lado. — Seu pai vai te proteger, saia agora.
— Não era esse o plano. — Escorreguei a mão para a lateral da
coxa, tocando minha arma, porém ele me impediu.
Ergui os olhos no momento que Grigori girou o corpo e baleou um
dos atiradores. Era chegada a hora de fazer uma pequena faxina entre os
nossos aliados, obviamente que eu não seria capaz de tal ato, por isso era
melhor que a culpa caísse sobre os ombros da Bratva.
— Porra, ele esperou você levar um tiro para agir. — Fiquei em
guarda.
— Alya, saia daqui, vou ficar bem...
— Cala a boca e pega a sua arma, se alguém se...
— Sei o que devo fazer — cortou-me brusco e se sentou melhor,
retirou o revólver de dentro do bolso falso e voltou a me encarar. — Se
você morrer antes de ser a minha esposa, te buscarei no inferno.
Assenti.
— O mesmo para você, querido.
Deixei um selinho em seus lábios e sai dali, precisava encontrar meu
pai e cumprir a minha parte do acordo, enquanto isso Grigori e seus homens
deixavam nosso jardim enfeitado de vermelho carmesim.
Capítulo 23

Vê-la agir tão rápido e sorrateira me fez sorrir sem perceber.


Gostava de saber que ela não era uma princesa que precisava ser salva,
mesmo que isso ferisse um pouco meu orgulho como soldado.
A dor latejou e gemi enquanto me levantava devagar, os tiros
ficaram mais distantes, indicando que houve uma perseguição. A cena à
minha frente era lamentável, corpos de filhos e políticos famosos da Rússia,
alguns de fora do país, o verdadeiro caos, aquele incidente demoraria a ser
esquecido, no entanto, cada rosto sem vida naquele chão pertencia a um
aliado que logo se tornaria inimigo de Alya, nenhum deles admitiria uma
mulher no poder.
Era como fazer uma faxina, primeiro foi preciso bagunçar, colocar
tudo que precisava ser jogado fora à vista, para depois separá-los em sacos
e descartá-los como o lixo que eram.
— Garoto! — Uma voz rouca de fumante me chamou atenção.
Assim que me virei, tive a imagem de um corpo caindo próximo de
mim, a cada respiração meu ombro doía e isso estava começando a
interferir nos meus sentidos. Ergui o olhar para quem me salvou de tomar
outro tiro e dessa vez ser morto e encontrei Grigori, o primeiro Pakhan que
tive o desgosto de conhecer.
Por algum motivo ele me odiava, jogou-me direto na mão dos seus
soldados, achando que eu seria fraco e morreria nos primeiros dias de
convívio, depois que notou minha resistência, me enviou para a Itália junto
com Semyon, com a desculpa da minha festa de aniversário. Foi por causa
dele que não pensei duas vezes antes de seguir o pai de Alya.
— Obrigado — grunhi, virei as costas e comecei a me afastar.
— Você precisa se cuidar melhor.
Revirei meus olhos, mas continuei caminhando com destino ao
interior da casa, os tiros cessaram, todos os inimigos estavam no chão,
inclusive o idiota que me acertou por puro despeito por não ter sido
escolhido como noivo no meu lugar.
— Semyon pertence a mim, se sua garota não cumprir com a
promessa, seu corpo estará no meio de todos esses merdas — disse risonho,
o tom provocativo me irritou.
Algo em Grigori sempre me deixou curioso, seu olhar castanho
brilhava com certo desdém quando direcionado a mim, porém, nunca teve
coragem de colocar suas mãos para acabar com a minha vida de uma vez e
usava outros métodos, como um maldito covarde.
— Se fosse homem o bastante para isso, já teria feito — respondi
me virando e o encarando.
— Como é ser fraco a ponto de depender da sua mulher para
protegê-lo? Aquele lixo realmente te tornou um frouxo — cuspiu.
O meu sangue ferveu e icei a arma antes de raciocinar melhor, não
demorou para que outros soldados da Bratva nos cercassem, defendendo
seu líder. Ri sozinho, vendo outros agindo da mesma forma devota que eu
um dia ofereci a Semyon.
— Não me importo de morrer como fraco, desde que ela viva em
toda sua glória e força. Alya não precisa de mim e mesmo assim me
escolheu para ficar ao seu lado...
— Então por que ainda mantém essa arma apontada para mim?
— Apenas por ser divertido ter a cabeça do homem mais desprezível
que conheci na mira, saber que basta um aperto do meu indicador para ver
seus miolos espalhados pelo chão, é realmente revigorante.
Grigori riu alto, uma gargalhada que só me trouxe mais raiva.
— Se não fosse fruto de uma relação de desprezo, eu teria orgulho
de chamá-lo de filho.
— O que disse?
— Deixem o garoto, ele não faria algo tão estúpido estando perto de
conseguir tudo que quer. – Sinalizou para que seus soldados abaixassem as
armas, mesmo que a minha continuasse erguida. — Não seja idiota,
aproveite a oportunidade que a vida está te entregando de bandeja.
Grigori virou as costas e começou a caminhar entre os corpos,
chutando um ou outro para fora do seu caminho.
— Essa chacina vai ficar por nossa conta, ninguém fora daqui
saberá o motivo real do derramamento de sangue — disse ainda de costas e
um pouco mais distante. — Yelena será vingada, mas não pelas suas mãos...
as minhas têm mais experiência para cuidar dele.
Entendi o recado: não toque em Semyon, ele pertence a mim.
Antes que sumisse pelo portão principal, já me virava em direção à
mansão, atrás da mulher que ainda precisava assinar aquela merda de
documento e me tornar seu marido.
Minha vista ainda meio turva e a adrenalina começando a sumir do
meu corpo para dar lugar à dor excruciante do meu ferimento quase me
impediram de pensar direito enquanto me arrastava para dentro. Mas algo
pude ter como certo, não me importava em nada ser quem cede, o ponto
mais passivo dessa relação, desde que ela estivesse ao meu lado e confiasse
em mim o suficiente para me incluir em seus planos.
Foi isso que me irritou de verdade, pensar que até mesmo Yuri sabia
tudo que se passava em sua cabeça enquanto eu ficava de fora.
Alguns segundos após entrar na mansão, me vi preocupado com o
silêncio profundo, era para ter empregados correndo por todos os lados ou
uma discussão entre Alya e seu pai.
Apressei o passo, mesmo que doesse e me colocasse mais perto da
exaustão do meu corpo. Os corpos de todos os empregados estavam
estirados pela sala de descanso, o sangue deles se uniam formando uma
pequena piscina no centro daquele lugar.
Não havia nada que pudesse fazer por eles, no entanto, meu sangue
ferveu e jurei que se Semyon tivesse tocado em um fio de cabelo da minha
mulher, o escalpelaria sem me importar com qualquer acordo feito com
Grigori.
A porta do escritório estava fechada, e sabendo que era a prova de
som, me peguei no fio de esperança de encontrá-los ali, a empurrei devagar,
vendo Natalya ajoelhada em frente a Semyon, seu pescoço tinha um corte
aberto escorrendo sangue e a cabeça só permanecia em pé por causa da mão
de seu marido a segurando pelos cabelos.
— Assim como ela e Yelena, você nunca será livre, princesa. Suas
lembranças irão te afundar, o medo vai corroer seu sangue fraco e cada vez
que se olhar no espelho vai voltar para este momento. — Ele sorriu com
sadismo. — Todos morreram por sua culpa, todos perderam a chance de
serem felizes, porque você foi egoísta e quis tomar um poder ao qual não
está pronta para assumir.
— Cale a boca!
Nunca ouvi sua voz tão hesitante, seu corpo trêmulo enquanto os
punhos fechados ficavam mais vermelhos pela força que usava, sua adaga
estava na mão livre de Semyon e a arma que carregava, foi atirada para
longe de seu alcance. Ela não conseguiria lutar naquele estado, ele sabia
disso e ela também.
Alya tentava ganhar tempo para respirar fundo, e mesmo que
dissesse cem mil vezes que não se importava com sua mãe, ainda deveria
doer vê-la morrer na sua frente, pelas mãos do seu pai.
Não era o mesmo que observar um estranho perder a vida.
— Você está errado! — falei firme, apontei minha arma em direção
ao seu ombro direito, o mesmo que segurava a adaga de Alya. — Elas se
tornaram livres quando se livraram de você. — Atirei e sorri satisfeito ao
vê-lo gritar de dor e recuar, o corpo de Natalya caiu, e antes que aquele
merda pudesse se recompor eu avancei. — Mas acontece que pretendo
viver muito ao lado da sua linda filha, Semyon, e se preciso me livrar de
você para que ela seja feliz, então farei com todo prazer.
Chutei-o usando todo o resto de força que ainda tinha, por sorte meu
ombro ferido era o esquerdo e eu não era canhoto. Ele se arrastou para trás,
tateando o chão tentando encontrar a arma que empunhava antes, fiz
questão de resgatá-la do chão.
— Minha noiva precisa assinar um documento muito importante
para nós e prometemos que você seria entregue a outra pessoa, por isso
farei isso rápido e sem danos a sua vida. – Pisquei, ele apenas arregalou os
olhos e tentou me atacar usando suas pernas.
Alya o segurou, me surpreendendo ao sair de seu estado de paralisia
por tudo que teve que presenciar, o olhar felino brilhava em puro ódio, mas
permitiu que eu apenas continuasse com o que planejava, quase como se ela
soubesse das minhas intenções, ajudou-me o segurando com força, ouvindo
seus pedidos e xingamentos enquanto eu me sentava em seu tórax
imobilizando seus membros superiores com minhas coxas e peso.
— Grigori não vai reclamar se faltar um pouco de pele e couro
cabeludo, desde que esteja respirando, ainda estaremos cumprindo com a
promessa.
E assim comecei a escalpelá-lo e foi uma das sensações mais
prazerosas da minha vida. A cada som da pele se rasgando e dos gritos
daquele homem nojento que um dia admirei, me sentia mais completo. Ele
desmaiou no processo, mas permaneceu vivo, foram apenas dez centímetros
retirados, uma parte que sempre lhe faltará, ele também teria algo para se
olhar no espelho e se recordar desse dia.
— Vamos, Alya, depois que estivermos oficialmente casados, nos
preocuparemos com arrumar a bagunça.
Ela me encarou atônita.
— O padre ainda está vivo?
Assenti.
— Ele se escondeu nos fundos da casa junto com alguns poucos
convidados que sobraram.
— Acha que ele vai aceitar terminar a cerimônia em meio a tanto
sangue? — indagou.
Sorri a puxando para fora daquele escritório e abraçando sua cintura
logo em seguida.
— Ele não terá opção, nós não passamos por tudo isso para não
assinarmos nosso matrimônio.
Ela me abraçou, escondendo seu rosto na curvatura do meu pescoço.
Por mais que doesse toda aquela situação, Alya sabia que precisava seguir
em frente, pessoas como nós não tinham tempo para lamentar.
— Vamos logo soldado, vou deixar Grigori saber onde buscar sua
encomenda.
Eu a beijei, foi suave, como um aviso sutil de que seríamos nós dois
contra o mundo se fosse preciso, mas eu sempre estaria ali para ela. Eu a
faria feliz, mesmo que significasse ceder o controle sobre a minha vida para
a minha rainha.
Epílogo

A liberdade se mostrou relativa, não existia de fato uma maneira


única de explicá-la quando colocada na realidade dos seres humanos. Você
pode viajar o mundo e ainda se sentir preso, viver uma vida considerada
perfeita e continuar odiando-a quando está sozinha.
Um dia pensei que minha liberdade viria quando entendesse a
cabeça da minha mãe e alcançasse as expectativas do meu pai, então
poderia desfrutar da felicidade de finalmente tirar esse fardo dos meus
ombros. Com o tempo percebi que seria impossível ser livre, a máfia me
prenderia aos Zhertva, meu pai acorrentaria minhas pernas na mesa de seu
escritório e minha mãe jamais se preocuparia em olhar na minha direção.
Ser livre... eu já nem desejava mais essa utopia, apenas rezava para
o dia que poderia, pelo menos, me vingar por ter sido carregada do berço
para essa prisão enfeitada.
Quando conheci Yakov, eu o vi como uma marionete ingênua, rara
entre tantos soldados maliciosos, a primeira sensação que tive foi de roubá-
lo do meu pai, como uma criança boba que tira o brinquedinho do outro
apenas para irritá-lo, depois eu vi o quanto me agradava tê-lo por perto e
sentir o calor do seu corpo, passei a desejá-lo... em algum ponto entre essas
fases eu passei a admirá-lo e acabei me apaixonando.
Contudo, agora vejo com clareza, Yakov é a minha liberdade.
Mesmo tendo que lidar com a burocracia e todos os burburinhos
após o conflito causado no meu casamento, pude suportar a tudo com um
sorriso nos lábios. Já que dois dias depois daquilo, eu descobri estar grávida
de duas semanas.
Ainda que muitos desconfiassem da mentira que contei para abafar
todo o assunto sobre as mortes causadas pela Bratva e o porquê não haveria
retaliações a eles, consegui colocar ordem entre soldados e aliados,
trazendo pessoas que realmente me importavam e eu já tinha em lista para
substituir os falecidos.
Yakov me ouviu, entendeu meus motivos para não ter contado meu
plano e o envolvimento de Grigori, seu pai, em toda essa bagunça. A nossa
diferença de idade não afetou nossa relação e muito menos o fez se impor
sobre minhas decisões.
E meu marido foi minha liberdade ainda maior quando se ajoelhou
diante de mim e beijou minha barriga demonstrando devoção a nós, a mãe
do seu bebê e ao pequeno que crescia ali.
Foram meses enfrentando as consequências daquele fatídico dia,
quase não conseguíamos nos ver, apenas para nos deitarmos e dormir.
Os empregados que foram mortos pelo meu pai não passavam de
vítimas que estavam no lugar errado e na hora errada, ele o fez por puro
capricho, tentando me mostrar o quanto não se importava em tirar vidas que
nem afetariam a sua rotina. Cuidei de cada familiar que teve que lidar com
o luto e o desespero, o que estava em meu alcance foi feito. Não por culpa,
mas pelo mínimo de justiça que ainda me cabia.
Estava exausta, minha lua de mel foi adiada por seis meses e a
barriga começava a aparecer, sendo a Pakhan oficial dos Zhertva, tentava ao
máximo não transparecer o cansaço, e foi usando desse tempo em casal que
não pudemos ter, que meu marido conseguiu me arrastar para uma pequena
viagem para a Finlândia, afinal, não poderíamos ir muito longe, ainda não
era tempo de deixar o ninho para atravessar o mundo.
O hotel pequeno e confortável estava cercado por dispositivos de
segurança e foi verificado mais de uma vez por Yakov e Yuri.
Sorri enquanto o via ajeitando as malas no canto do quarto, a cama
grande me chamou e me estiquei sobre ela, o observando se aproximar de
mim, sentou-se próximo dos meus pés e começou a massageá-los. Meu
corpo sempre correspondia bem a cada toque do meu marido, mas tivemos
poucas oportunidades para explorarmos o sexo da forma que gostávamos,
com um pouco mais de brutalidade...
Mordisquei o lábio, suas mãos subindo pela minha canela,
circulando e pressionando cada pedaço de pele e carne.
— Você precisa descansar, seus pés ficaram inchados de novo.
Encarou-me como se me advertisse.
— Estou bem, isso faz parte do processo de carregar nosso filho. —
Ele sorriu de canto, sempre que ouviu a frase “nosso filho” ou “nosso
bebê”, ele esticava os lábios e seus olhos brilhavam. — Na verdade, estou
tão bem que nem a dificuldade por causa do tamanho da barriga me
impediu de fazer algo interessante para você...
Ele se ajeitou na cama, sua expressão mudando para alguém curioso
e preocupado.
— O que fez?
Levantei-me o deixando sentadinho analisando todo meu corpo,
então tirei peça por peça bem devagar, agradecendo por ter colocado uma
saia com elástico próprio para grávidas e fácil de tirar.
— Veio todo o caminho sem calcinha?
— Também, mas a surpresa não está na parte da frente.
Assim que me virei e apoiei as mãos no guarda-roupa para empinar
bem minha bunda, ouvi seu silvo alto e os ofegos que vieram a seguir.
— Porra, Alya, você ainda tem mania de enfiar coisas em você?!
Ri alto. O farfalhar de roupas me deu ideia da sua pressa.
— Tem lubrificante na minha bolsa de mão — confessei.
— Caralho... você ainda vai ser capaz de me matar... — resmungou
já a abrindo. — Abra mais as pernas — murmurou ao pé do meu ouvido.
Obedeci e logo senti o líquido gelado sendo derramado ao redor do
plug anal, gemi manhosa quando ele começou a puxá-lo devagar, era
tamanho médio, mas daria para afrouxar o suficiente a fim de amenizar a
dor de recebê-lo no começo. Yakov não o tirou de imediato, fez
movimentos de vai e vem com o objeto de aço, me preparando um pouco
mais.
— Eu prometo ser o mais gentil que puder.
— Não faça promessas inúteis quando tudo que desejo é o contrário.
Ele finalmente retirou o plug de mim, jogando-o em algum lugar do
quarto, escutei o pacote de camisinha sendo rasgado e logo em seguida a
sua glande pedindo espaço. Gememos juntos quando ele se forçou para
dentro com força, me dando a brutalidade que pedi e tanto senti falta,
abrindo-me apenas para depois ser pressionado dentro de mim.
— Alya... se continuar me apertando assim...
Sua frase foi cortada por um gemido rouco. Yakov deslizou a mão
até alcançar meu clitóris, seus dedos me masturbando junto da sensação do
seu pau me preenchendo inteira foi o suficiente para me fazer gozar,
contraindo ainda mais e o fazendo guinchar de prazer, mas meu marido não
tinha acabado, seus movimentos mais ritmados me inundaram, e os dedos
que antes me masturbavam foram para dentro da minha boceta, me
tornando cheia demais e explodindo em um segundo orgasmo que se
prolongou até que ele finalmente gozasse comigo.
Meu corpo trêmulo foi segurado e acolhido pelo seu, me levando
para a cama e só depois de me deixar confortável sobre o colchão que se
preocupou com a bagunça que fizemos.
Eu amava o nosso sexo, e amava ainda mais como ele cuidava de
mim nos pós-ato, limpando-me com delicadeza, sem permitir que eu
movesse um dedo para arrumar as roupas jogadas no chão ou qualquer
vestígio de nós dois espalhados.
Com ele eu podia respirar tranquila, porque meu marido me
devolveu a confiança que há muito tempo tentaram me roubar, ele era a
minha liberdade por ser a única pessoa na terra que eu seguiria de olhos
fechados.
— Amo você, soldado — sussurrei contra seus lábios antes de
deixar um selinho de boa noite, ele ficou me encarando por segundos,
depois agarrou meu queixo e me tomou um beijo mais longo e carregado de
sentimentos.
— E eu amo você, minha rainha.

FIM.
Agradecimentos
Esse livro foi um processo de retorno à rotina de escrita, por isso
tornou-se importante para mim, como um marco na minha carreira do qual
irei sempre me recordar.
Agradeço ao Grupo Editorial Portal por confiar no meu trabalho e
me impulsionar nessa trajetória. Ao meu marido por todo apoio e paciência
em me compartilhar com Alya e Yakov rsrs.
Agradeço a vocês leitoras, por todo o tempo dedicado a essa
história, pelo apoio que dão às minhas redes e acompanhando todos os
meus trabalhos, vocês motivam a minha escrita e são parte importante e
definitiva no meu trabalho.
Obrigada a todas as autoras que me incentivaram em um momento
de dúvida e medos, que me ajudaram a prosseguir, principalmente a Mari
Sales, pois seus ensinamentos foram essenciais para me reverberarem na
volta à disciplina da escrita.
E agradeço a Alya e Yakov por terem me emprestado suas vozes
para construir essa história.
Leia Também:

Acordo com Mafioso

Link: https://a.co/d/ephOFQo
Sinopse:
Ao tocar o cartel de drogas que herdou do pai, Andrés Maldonado
era conhecido em Barichara, na Colômbia, como: dueño del miedo. Dono
do medo.

Solitário e tão atraente quanto perverso, ocupava suas noites com


orgias e buscava em mulheres aleatórias um sentimento maior que apenas o
tesão momentâneo, queria algo que pudesse esquentar seu coração frio. No
entanto, foi à luz do dia que uma jovem desbocada o incendiou, quando ao
quase atropelá-la, ela o afrontou como ninguém na cidade ousava.

Luz Ramírez desde que se tornou órfã era moradora de rua. Aos
dezenove anos se via entre dias e noites de desespero sem saber como
seriam as próximas horas da sua vida. Em uma reviravolta do destino,
mesmo sem nunca ter sido tocada por um homem, acaba no prostíbulo de
Alba Caldeiron, sendo leiloada como virgem e arrematada pelo temido
mafioso da cidade, que mais cedo ela afrontou sem saber quem era.

Ele não a tocaria se ela não quisesse e assim fecharam um acordo.

E com essa união acabaram tendo que lidar com um desejo intenso,
sentimentos reprimidos e um acordo de sexo sem compromisso. Além de
que, com a convivência, desvendaram um novelo de segredos e armações
que corriam em sigilo e colocariam o cartel Los Maldonados em perigo.
A verdade do CEO

Link: https://a.co/d/hiQht3P
Sinopse:
Ele é CEO da Instituição de Ensino Gonzaga e filho.

Ela é a nova professora de Artes.

Ele conhecia bem aquele nome e por mais que tivesse ficado
quebrado com a sua partida, decidiu contratá-la e faria de tudo para
descobrir de uma vez por todas o motivo dela ter sumido de sua vida.

Helena não era uma mulher que guardava rancor, contudo havia
um único momento de sua vida que ela fingia não existir, mas em uma
virada, sua vida mudou. Ela foi obrigada a retornar para sua cidade natal.
Será que Fábio conseguirá entender o motivo da partida de
Helena?
Resgatada por um mafioso
(Máfia Lansky Livro 1 )

Link: https://a.co/d/6DsOH1a
Sinopse:
Lucian Lansky, o chefe da máfia italiana nos Estados Unidos, é um
homem que tem o que quer e forja o mundo à sua vontade. Entretanto sua
vida sofre uma reviravolta quando a sua esposa é assassinada, deixando-o
viúvo e com um filho pequeno. Três anos se passaram e a caça às bruxas
não o levou ao federal responsável pela morte dela.

O que o poderoso mafioso não esperava era que, em uma noite, ele
conheceria uma mulher que se tornaria seu maior objetivo, mesmo ela
estando ao lado dos seus inimigos.
Fragilizada, Fernanda Silva perdeu tudo com a morte dos pais,
inclusive a confiança nela mesma. Minada por quem deveria protegê-la, não
tinha ideia do abismo em que estava até Lucian encontrá-la.
Ela não deveria se deixar seduzir. Ele não deveria se aproximar
dela, mas o mafioso não resistirá a mulher que poderá ser a sua ruína.
ATENÇÃO! Essa história contém cenas impróprias para menores
de dezoito anos. Contém gatilhos, palavras de baixo calão e conduta
inadequada de personagens. Apesar de ter a máfia como plano de fundo,
esse não é um romance dark, se você espera cenas de abuso sexual, esse
livro não corresponderá as suas expectativas.
Proibida para o Mafioso
(Máfia Lansky Livro 2)

Link: https://a.co/d/0osJ6CM
Sinopse:
Logan Lansky é o consigliere da máfia italiana nos Estados
Unidos, um homem poderoso com regras rígidas de dever e honra. Perdeu
os pais quando era muito jovem e foi criado pelo seu tio, o chefe,
aprendendo a colocar a máfia sempre acima de tudo, inclusive dos seus
desejos.

Lauren Lansky é a princesinha da máfia, filha do chefe, ela poderia


fazer o que quisesse, mas precisou lidar com as consequências de ter
nascido mulher. Seu irmão mais velho, o atual no comando, a prometeu em
matrimônio para o líder de uma máfia rival, a fim de que os conflitos
terminassem. Fiel a família, ela estava disposta a aceitar seu destino e ser
dada como moeda de troca em um casamento arranjado, mesmo que isso
custasse o seu coração para sempre.

Logan e Lauren são primos, fiéis a família e a máfia onde foram


criados e estão determinados a seguir esses preceitos a todo custo, mas a
atração entre eles pode ser forte o bastante para mergulhá-los em uma
guerra com inimigos e com os próprios sentimentos.

Aviso: Proibida para um Mafioso, livro 2 da máfia Lansky, é um


volume único. Por ser com casais diferentes, cada livro da série pode ser
lido separadamente, mas o posterior contém spoilers do anterior.
A redenção do mafioso

Link: https://a.co/d/28Q815P
Sinopse:
Escondido sob a fachada de rico empresário, o mafioso Liam
Costello construiu sua fortuna por meios ilícitos. Cercado pelo luxo, ele é
dono de uma boate, coleciona mulheres em sua cama e as descarta como
bem entende, mas é surpreendido quando uma delas volta com uma menina
de sete anos e a deixa aos seus cuidados.
Liam não tinha envolvimentos duradouros e não esperava ser pai,
porém, quando se viu responsável pela criança, percebeu que precisava de
ajuda.
Samantha Smith é uma professora que alcançou o fundo do poço.
Sozinha e desamparada, fugiu para recomeçar.
Ao começar a trabalhar em uma nova cidade, ela se aproxima de
uma aluna e resolve ajudar o pai da menina. O que não esperava era que o
sedutor milionário fosse tirá-la do eixo. Disposta a se permitir mais, Sam
embarca numa perigosa aventura, mas não sabe se será capaz de superar
seus fantasmas.
Ambos possuem segredos e um passado que os assombra. Quando
a verdade vier à tona, o sentimento cultivado entre eles pode não ser o
bastante.

ATENÇÃO! Essa história contém cenas impróprias para menores


de dezoito anos. Contém gatilhos, palavras de baixo calão e conduta
inadequada de personagens.
[1]
Denominação simplificada para soldados da máfia russa.
[2]
Gokudo é a organização criminosa japonesa também conhecida como Yakuza.
[3]
Michelangelo foi um famoso arquiteto, pintor e escultor italiano, ele gostava do estudo da
anatomia humana e por isso suas esculturas tinham grande realismo.
[4]
Modelo de arma pequena de 5 disparos que pode ser carregada em bolsas e outros locais.

Você também pode gostar