MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 1 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 2 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS ESTUDOS DA INFÂNCIA. - Ter uma educação de boa qualidade; BEBÊS, CRIANÇAS E A ESPACIALIDADE - Ter acesso à cultura e aos meios de comunicação e DAS INSTITUIÇÕES ESCOLARES. APROXIMAÇÕES informação; ENTRE INFÂNCIA, LINGUAGEM E CULTURA - Poder brincar com outras crianças da mesma idade; - Não ser obrigado a trabalhar como adulto; CONCEITO DE INFÂNCIA AO LONGO DA HISTÓRIA - Ter uma boa alimentação que dê ao organismo todos Idade média os nutrientes que precisam para crescer com saúde e Na idade média a criança era vista como um adulto em energia; miniatura, trabalhavam nos mesmos locais, usavam as - Receber assistência médica gratuita nos hospitais mesmas roupas. “A criança era, portanto, diferente do públicos sempre que precisarem de atendimento; homem, mas apenas no tamanho e na força, enquanto as - Ser livre para ir e vir, conviver em sociedade e outras características permaneciam iguais” (ARIÈS, 1981, expressar ideias e sentimentos; p.14). Por essa visão, foi um período onde a infância era - Ter a proteção de uma família seja ela natural ou caracterizada pela inexperiência, dependência e adotiva, ou de um lar oferecido pelo Estado se, por incapacidade pois não tinha as mesmas compreensões que infelicidade, perderem os pais e parentes mais próximos; um adulto. Por não haver distinções entre adulto e criança, - Não sofrer agressões físicas ou psicológicas por parte cabia a elas aprender as tarefas do dia a dia, a trabalhar, daqueles que são encarregados da proteção e educação ou ajudar os mais velhos nos serviços, e a passagem que de qualquer outro adulto; tinham por sua família era muito breve, pouco depois que se - Ser beneficiada por direitos, sem nenhuma passava o período de amamentação a criança já passava a discriminação por raça, cor, sexo, língua, religião, país de fazer companhia aos adultos para que aprendesse a servir e origem, classe social ou riqueza e toda criança do mundo trabalhar, eram criadas por outras famílias para que nesse deve ter seus direitos respeitados; novo ambiente aprendessem um oficio. - Ter desde o dia em que nasce um nome e uma nacionalidade, ou seja, ser cidadão de um país Renascimento É no decorrer do século XVII que se da os primeiros História social da infância, concepção de infância e passos para a separação do adulto e da criança, por meio da de criança escolarização. Antes, por não haver a distinção entre idades, O tratamento dado à criança, pela família e sociedade, todos aprendiam da mesma maneira e sobre as mesmas tem sofrido profundas modificações durante a história, temáticas. No fim deste século que pode-se notar as estando relacionado à visão política, social e econômica de primeiras mudanças do conceito de infância. Um dos cada etapa de vida em sociedade. Cada sociedade, em certo maiores contribuintes para tal mudança foi a igreja, que teve momento histórico, apresenta uma visão a respeito da um papel fundamental ao associar a imagem das crianças infância e os direitos a ela conferida, bem como ao papel com a de anjos, que refletiam inocência e pureza, sendo atribuído à família. assim, Deus as favoreciam devido a sua singeleza e A visão sobre a infância varia amplamente: de centro das suavidade, que se aproxima da impecabilidade, impondo atenções do mundo adulto, quando considerada como um uma necessidade de amar as crianças e tornando a adulto em potencial, até o completo abandono à sua própria educação obrigatória, contrariando a indiferença existente a sorte. Segundo o autor, quanto mais se retorna ao princípio tanto tempo. A partir daí, a iconografia começou a ser da história da humanidade, mais se encontram pais e demonstrada na figura de crianças-anjos, estabelecendo sociedade pouco envolvidos com os cuidados de seus filhos. uma religião para as crianças (ARIÈS, 1981, p.14). O fim Portanto, falar de família envolve definições muito deste século foi considerado o marco na evolução dos complexas e, quando se fala de criança na família, a sentimentos em relação a infância, onde começaram complexidade torna-se maior à medida da necessidade de se realmente falar na fragilidade da criança, nas suas discorrer sobre a trajetória histórica da convivência dessas peculiaridades e a se preocupar com a formação moral e duas realidades. As relações entre crianças e adultos foram construção da mesma. se transformando ao longo da história. Durante muito tempo, a criança foi vista, como miniatura de adulto, passando por Nascimento da concepção de infância sucessivas mudanças, a partir do século XV. Então, a partir do século XVIII, as crianças começaram a Conforme Ferriani (1992) verifica-se que a infância, ser reconhecidas em suas particularidades, começaram a independentemente da classe social, era considerada uma possuir um quarto único, alimentação considerada específica fase bastante curta, pois assim que demonstravam e adequada, começaram a ocupar um espaço maior no meio condições de viverem sem os cuidados básicos maternos social. Ali nascia a concepção de infância. Antes, como se para sua sobrevivência, as crianças ingressavam no mundo viu, a infância era considerada um período sem valor. Agora dos adultos passando a ser consideradas iguais. a família começa a dar ênfase ao sentimento que tem em Dentro do contexto familiar, não era considerada relação à criança. Considera-se uma revolução este novo importante, sendo, não raramente, considerada um sentimento dirigido à criança. Ela começa a ser importante, verdadeiro transtorno. Ignoravam-se as etapas de apreciada por sua família e a infância é reconhecida como crescimento e desenvolvimento infantil. Inexistia registro de uma época da vida merecedora de orientação e educação. nascimento, uma vez que era pouco significativa a idade real Vemos que, enquanto na idade média a criança era sem para identificar as pessoas. valor e suas responsabilidades eram trabalhar e chegar o O infanticídio ocorria frequentemente nas famílias mais mais rápido possível na fase adulta, no Renascimento se da pobres da sociedade e na maioria das vezes de maneira o início do processo de escolarização infantil. acidental, quando, ao dormirem, os bebês morriam asfixiados na cama dos pais. Para essas famílias, o filho A infância nos dias de hoje chegava a ser uma ameaça à própria sobrevivência dos pais Com o passar dos anos os direitos das crianças foram sendo frequentemente abandonado. sendo cada vez mais fortes, embora por muitas vezes Até o início do século XVI, as crianças não eram funcione só no papel, já pode ser considerado um grande diferenciadas dos adultos, não havendo preocupação social avanço. Na visão de muitos autores a criação do Conselho com essa fase do desenvolvimento do homem. Segundo da Criança e do Adolescente é vista como um marco no diz Áries, a aprendizagem infantil era transmitida de uma respeito ao reconhecimento e valorização da infância por parte das políticas públicas. Segundo o ECA (Estatuto da geração à outra de forma direta, porém, as crianças de 7 a 9 Criança e do Adolescente), os principais direitos das crianças anos de idade, de qualquer classe social, eram enviadas são: para casas alheias a fim de serem educadas.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 3 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Durante aproximadamente 7 a 9 anos passavam com século XIX, surge um tipo de família na qual existe uma famílias alheias, e, quando retornavam, eram totalmente maior igualdade entre os sexos, a natalidade é mais estranhos à família. controlada e o número de casamentos e de separações A partir da influência dos eclesiásticos, as crianças aumenta, porém, ainda é forte a dupla moral sexual. Os passaram a serem consideradas com “anjos”. Com essa casamentos passam a ser efetivados a partir de escolhas nova visão, instituiu-se a necessidade de proteção especial individuais e as mulheres começam a entrar no mercado de às mesmas, com o objetivo de protegê-las do “perverso” trabalho. A partir do fim do século XIX e começo do XX a mundo dos adultos. Esse pensar sobre a infância ganhou palavra “menor” aparece frequentemente no vocabulário apoio dos moralistas, que se preocupavam, no momento, jurídico brasileiro. Antes dessa época, o uso da palavra não com o bem comum, com a saúde e com a moral social. era tão comum e tinha significado restrito. Assiste-se dessa forma, profundas alterações, ocorridas durante o século XVI, marcadas por grandes mudanças de Concepção de criança e infância costumes, fruto da influência de religiosos e moralistas. A concepção de criança é uma noção historicamente Quanto a área educacional, durante todo o século XVI, construída e consequentemente vem mudando ao longo dos crianças e adultos eram educadas conjuntamente, não tempos, não se apresentando de forma homogênea nem havendo separações entre as diferentes idades. A partir do mesmo no interior de uma mesma sociedade e época. Assim século XVII, intensifica-se a preocupação em educar é possível que, por exemplo, em uma mesma cidade existam separadamente crianças e jovens, visando a transmissão de diferentes maneiras de se considerar as crianças pequenas disciplina e o aperfeiçoamento espiritual e moral. Surgem, dependendo da classe social a qual pertencem do grupo nessa época, os primeiros colégios, “instituições complexas étnico do qual fazem parte. Boa parte das crianças pequenas de ensino, vigilância e enquadramento da juventude“. O brasileiras enfrenta um cotidiano bastante adverso que as internato de crianças passou a se tornar prática aceitável no conduz desde muito cedo a precárias condições de vida e ao final do século XVII, com a criação dos grandes colégios trabalho infantil, ao abuso e exploração por parte de adultos. internos, para onde a burguesia levavam seus filhos, e com a Outras crianças são protegidas de todas as maneiras, instalação dos conventos onde as meninas se preparavam recebendo de suas famílias e da sociedade em geral todos para o casamento, “ao abrigo de todas as tentações os cuidados necessários ao seu desenvolvimento. Essa contrárias à virtude”. dualidade revela a contradição e conflito de uma sociedade Havia, portanto, até o início do século XVII, grande que não resolveu ainda as grandes desigualdades sociais diferenciação entre a educação destinada as crianças do presentes no cotidiano. A criança como todo ser humano, é sexo masculino e as do sexo feminino, assim com destinada um sujeito social e histórico e faz parte de uma organização as famílias burguesas e as famílias operárias. Às meninas, familiar que está inserida em uma sociedade, com uma cabia apenas uma educação visando a formação de donas determinada cultura, em um determinado momento histórico. de casa, sendo que somente no final do século foi criada a É profundamente marcada pelo meio social em que se primeira instituição voltada para a educação feminina. desenvolve, mas também o marca. A criança tem na família, Do século XVII ao século XIX, as representações sociais biológica ou não, um ponto de referência fundamental, sobre a infância, bem como a forma de lidar com os apesar da multiplicidade de interações sociais que problemas do qual eram vítimas, se alteravam: de miniatura estabelece com outras instituições sociais. de adulto, exigindo dela responsabilidade de adulto, a caso As crianças possuem uma natureza singular, que as de polícia, às tratando com objeto de tutela judicial. Com o caracteriza como seres que sentem e pensam o mundo de surgimento do sistema de produção capitalista, percebe-se um jeito muito próprio. Nas interações que estabelecem uma crescente preocupação com a infância, iniciando um desde cedo com as pessoas que lhe são próximas e com o movimento para mudar o conceito de amor materno. meio que as circunda, as crianças revelam seu esforço para Acentua-se, ainda, a distinção na educação entre crianças compreender o mundo em que vivem, as relações pobres e ricas, onde os filhos de burgueses passam a contraditórias que presenciam e, por meio das brincadeiras, frequentar os liceus e colégios de educação secundária, e os explicitam as condições de vida a que estão submetidas e filhos da classe operária a escola primária. O início dos seus anseios e desejos. tempos modernos é também marcado por uma divisão da No processo de construção do conhecimento, as população em classes sociais, tendo-se que anteriormente crianças se utilizam das mais diferentes linguagens e existia uma certa mistura e proximidade tanto entre as exercem a capacidade que possuem de terem ideias e idades, como entre as condições de vida. hipóteses originais sobre aquilo que buscam desvendar. Verifica-se que a evolução do conceito de infância e Nessa perspectiva as crianças constroem o conhecimento a família é também acompanhada pela evolução do conceito de partir das interações que estabelecem com as outras classe. A configuração do lar operário da classe trabalhadora, pessoas e com o meio em que vivem. O conhecimento não no início da industrialização, não se limitava as atividades se constitui em cópia da realidade, mas sim, fruto de um domésticas, devido as condições precárias de sobrevivência. A intenso trabalho de criação, significação e ressignificação. família, para sua sobrevivência, dependia muito do trabalho As crianças são sujeitos históricos e de direitos que, nas das crianças de ambos os sexos, e a socialização era feita interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, mais no espaço da fábrica do que na casa. constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, Verifica-se que a mortalidade infantil, decorrente do fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, abandono dos pais, se tornara oneroso para o Estado. O questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a valor econômico do ser humano passa a ter grande sociedade, produzindo cultura. importância para o Estado. “Um Estado só é poderoso na Compreender, conhecer e reconhecer o jeito particular medida em que é povoado […] em que braços que das crianças serem e estarem no mundo é o grande desafio manufaturam e os que defendem são mais numerosos” da educação infantil e de seus profissionais. Embora os (DIREROT, in BADINTER,1985, p.154). conhecimentos derivados da psicologia, antropologia, A mentalidade quanto ao dever da família para com seus sociologia, medicina etc. possam ser de grande valia para filhos, altera-se. À mãe passa a ser requerido os cuidados desvelar o universo infantil apontando algumas aos filhos, a quem deve amamentar e cuidar até que se características comuns de ser das crianças, elas tornem independentes. permanecem únicas em suas individualidades e diferenças. É somente no século XX, que a criança deixa de ser A concepção de construção de conhecimentos pelas misturada aos adultos e de aprender a vida em contato com crianças em situações de interação social foi pesquisada, eles, sendo inventada, então, uma condição especial: a com diferentes enfoques e abordagens, por vários autores, infância. Legalmente, a criança só passa a ser considerada dentre eles: Jean Piaget, Lev Semionovitch Vygotsky e “pessoa” na segunda metade do século XX. No final do Henry Wallon.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 4 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Nas últimas décadas, esses conhecimentos que educação de qualidade, cuidados de saúde adequados, apresentam tanto convergências como divergências, têm proteção contra abusos e exploração, e participação ativa na influenciado marcadamente o campo da educação. Sob o vida social e política. Isso envolve o envolvimento de nome de construtivismo reúnem se as ideias que preconizam pesquisadores, profissionais da área da infância, tanto a ação do sujeito, como o papel significativo da formuladores de políticas e membros da sociedade civil na interação social no processo de aprendizagem e promoção de políticas e práticas que coloquem as desenvolvimento da criança. necessidades e interesses das crianças no centro das preocupações sociais. CONCEPÇÃO DE INFÂNCIA Em resumo, os Estudos da Infância representam um As concepções sobre criança e infância são construções campo dinâmico e interdisciplinar que busca compreender e sociais, históricas e culturais que se consolidam nos promover o desenvolvimento e o bem-estar das crianças em diferentes contextos nos quais são produzidas e a partir de diferentes contextos sociais, culturais e políticos. Ao múltiplas variáveis como etnia, classe social, gênero e reconhecer a importância da infância como uma fase única e condições socioeconômicas das quais as crianças fazem crucial da vida humana, os Estudos da Infância contribuem parte. Considerando tais elementos e a sua relação com a para a construção de sociedades mais justas, inclusivas e imagem de criança construída no tempo e na história, pode- centradas nas necessidades das crianças. se afirmar a existência de múltiplas infâncias e de várias formas de ser criança. A Espacialidade das Instituições Escolares: Visando à construção de uma Pedagogia para/com a Considerações sobre Bebês e Crianças Infância, que, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente - A espacialidade das instituições escolares desempenha ECA, se estende até aos doze anos, permeando tanto a um papel significativo no desenvolvimento e bem-estar de Educação Infantil quanto o Ensino Fundamental, defende-se bebês e crianças. A maneira como os espaços são organizados, designados e utilizados pode influenciar uma concepção de criança contextualizada em sua concretude diretamente suas experiências de aprendizado, interação de existência social, cultural e histórica, participante da social e desenvolvimento emocional. Neste texto, sociedade e da cultura de seu tempo e espaço, modificando e discutiremos a importância da espacialidade nas instituições sendo modificada por elas. escolares para bebês, crianças e seus processos de Dessa forma, considera-se que essas concepções se aprendizagem. revelam, sobretudo, na forma como as Unidades de Em primeiro lugar, é essencial reconhecer que bebês e Educação Infantil organizam espaços, tempos, materiais, crianças têm necessidades específicas em relação ao relações e currículo para a construção de um trabalho ambiente físico em que passam seu tempo. Para bebês, por pedagógico que considere a criança em sua integralidade, ou exemplo, a criação de espaços seguros, acolhedores e seja, que considere a criança como pessoa capaz, que tem estimulantes é fundamental para promover seu direito de ser ouvida e de ser levada a sério em suas desenvolvimento físico, cognitivo e emocional. Ambientes especificidades enquanto “sujeito potente”, socialmente que oferecem oportunidades de exploração sensorial, competente, com direito à voz e à participação nas escolhas; interação social e movimento livre são especialmente como pessoa que consegue criar e recriar, “verter e benéficos para bebês em fase de descoberta do mundo ao subverter a ordem das coisas”, refundar e ressignificar a seu redor. história individual e social; como pessoa que vê o mundo No que diz respeito às crianças em idade pré-escolar, a com seus próprios olhos, levantando hipóteses, construindo espacialidade das instituições escolares desempenha um relações, teorias e culturas infantis por meio da expressão e papel importante no apoio ao seu desenvolvimento da manifestação nas diferentes linguagens e nos diferentes socioemocional, criativo e cognitivo. Salas de aula bem modos de agir, construindo seus saberes e (re)ensinando organizadas e equipadas com materiais diversificados e aos adultos a olhar o mundo com “olhos de criança”. adequados às suas necessidades de aprendizado podem estimular a curiosidade, a imaginação e a autonomia das Estudos da infância crianças. Além disso, espaços externos, como playgrounds e Os "Estudos da Infância" constituem um campo áreas verdes, oferecem oportunidades valiosas para multidisciplinar de investigação que se concentra no estudo brincadeiras, exploração e atividades físicas, contribuindo da infância como uma fase única e importante do para o desenvolvimento motor e social das crianças. desenvolvimento humano. Este campo de estudo engloba A disposição dos espaços dentro das instituições uma ampla gama de disciplinas, como psicologia, sociologia, escolares também pode influenciar a interação social entre antropologia, pedagogia, saúde pública, entre outras, e bebês, crianças e adultos. Ambientes que facilitam a busca compreender os diversos aspectos da infância, comunicação, a colaboração e o trabalho em equipe incluindo o desenvolvimento físico, cognitivo, emocional, promovem o desenvolvimento de habilidades sociais e social e cultural das crianças. emocionais importantes, como empatia, respeito mútuo e Um dos principais objetivos dos Estudos da Infância é resolução de conflitos. Por outro lado, espaços superlotados, promover uma compreensão mais profunda das experiências desorganizados ou pouco convidativos podem dificultar a e perspectivas das crianças, reconhecendo sua agência e interação e o engajamento das crianças nas atividades capacidade de influenciar ativamente seu próprio propostas. desenvolvimento. Isso implica uma mudança de paradigma, Além disso, a espacialidade das instituições escolares onde as crianças são vistas não apenas como objetos pode refletir e reforçar valores e práticas educacionais passivos de estudo, mas como sujeitos ativos que participam específicas. Escolas que priorizam a criatividade, a ativamente na construção de seu mundo e de suas colaboração e a autonomia dos alunos tendem a ter espaços identidades. mais flexíveis, adaptáveis e abertos a diferentes formas de No campo dos Estudos da Infância, são explorados aprendizado. Por outro lado, escolas que adotam uma temas como a educação infantil, os direitos das crianças, as abordagem mais tradicional podem ter espaços mais políticas públicas voltadas para a infância, a família e a estruturados e orientados para o ensino direto. parentalidade, a saúde infantil, a brincadeira e o A relação entre a espacialidade das instituições desenvolvimento lúdico, a mídia e a cultura infantil, entre escolares e o desenvolvimento de bebês e crianças é um outros. Esses estudos buscam analisar como diversos tema que tem recebido crescente atenção na área da fatores, como o contexto social, cultural, econômico e educação e da arquitetura. Entender como o ambiente físico político, influenciam a experiência infantil e moldam o pode impactar o aprendizado, o bem-estar emocional e desenvolvimento das crianças. social, bem como o desenvolvimento físico dos alunos mais Além disso, os Estudos da Infância também têm como jovens, é essencial para criar espaços escolares que objetivo promover práticas e políticas que garantam o bem- atendam às suas necessidades de maneira eficaz. estar e os direitos das crianças, incluindo o acesso a uma
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 5 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Para bebês, por exemplo, a espacialidade das aprendizagem da linguagem, proporcionando às crianças instituições escolares desempenha um papel crucial no oportunidades de praticar e internalizar diferentes formas de estabelecimento de um ambiente seguro, acolhedor e comunicação verbal e não verbal. estimulante. Bebês em fase de desenvolvimento estão constantemente explorando o mundo ao seu redor por meio Cultura: de seus sentidos, e os ambientes físicos devem oferecer - A cultura refere-se ao conjunto de valores, crenças, oportunidades para essa exploração sensorial. Isso pode tradições, práticas e formas de expressão compartilhadas incluir a disponibilidade de materiais texturizados, coloridos e por um grupo de pessoas. A cultura desempenha um papel de diferentes formas, bem como espaços que promovam o fundamental na formação da identidade individual e coletiva movimento livre, como tapetes macios e áreas de das crianças, influenciando suas percepções, brincadeiras no chão. comportamentos e interações sociais. A disposição dos espaços também é importante para - Durante a infância, as crianças são expostas a bebês. Espaços que são organizados de forma a permitir que múltiplas influências culturais, incluindo a língua falada em bebês se movam livremente e explorem diferentes áreas de seu ambiente, as tradições familiares, as práticas forma independente promovem seu desenvolvimento motor e educacionais, as representações culturais nos meios de cognitivo. Da mesma forma, a presença de adultos comunicação e a diversidade cultural presente em sua cuidadores atentos e responsivos é fundamental para comunidade. garantir a segurança e o bem-estar dos bebês enquanto eles exploram o ambiente ao seu redor. A relação entre infância, linguagem e cultura é Para crianças em idade pré-escolar, a espacialidade das bidirecional e dinâmica. Por um lado, a linguagem é uma instituições escolares desempenha um papel importante no ferramenta essencial para a transmissão e reprodução da apoio ao seu desenvolvimento socioemocional, criativo e cultura, permitindo que as crianças aprendam e internalizem cognitivo. Ambientes físicos que são projetados para as normas, valores e conhecimentos de sua comunidade. promover a interação social, a colaboração e a resolução de Por outro lado, as experiências culturais das crianças problemas podem criar uma atmosfera propícia ao influenciam sua aquisição e uso da linguagem, moldando aprendizado e ao desenvolvimento das habilidades sociais e suas maneiras de pensar, comunicar e interagir com os emocionais das crianças. outros. Além disso, espaços externos, como playgrounds e áreas verdes, oferecem oportunidades valiosas para as Diferentes linguagens da criança crianças se engajarem em atividades físicas, explorarem a O trabalho da linguagem é, sem dúvidas, um importante natureza e desenvolverem habilidades motoras e de componente do processo educativo e não pode ser deixado coordenação. Esses espaços também proporcionam um de lado em nenhuma das etapas do aprendizado infantil. ambiente para brincadeiras criativas e imaginativas, A importância da linguagem está justamente no fato de promovendo o desenvolvimento da criatividade e da que ela torna o processo educativo mais eficaz, pois imaginação das crianças. proporciona ao aluno situações e momentos mais É importante ressaltar que a espacialidade das envolventes e dinâmicos. instituições escolares não se limita apenas às salas de aula e Através dessas situações dinâmicas os alunos podem aos espaços externos. Corredores, áreas comuns, refeitórios então não só desenvolver como também explorar os seus e banheiros também desempenham um papel importante no próprios instrumentos comunicativos e sociais. ambiente escolar e devem ser projetados levando em Assim sendo, é fundamental para o desenvolvimento da consideração as necessidades e interesses das crianças. linguagem que o professor crie situações e promova atividades nas quais essa habilidade possa ser incentivada Infância, Linguagem e Cultura por meio da participação das crianças. A relação entre infância, linguagem e cultura é intrincada Isso pode acontecer através de discussões, poesias, e complexa, influenciando diretamente o desenvolvimento conversas, leituras de historinhas, música, fantoches, teatro, cognitivo, social e cultural das crianças. Esses três exposições e muitos outros meios que possibilitam que a elementos estão profundamente interligados e se influenciam criança interaja e seja mais comunicativa com o grande mutuamente ao longo do processo de socialização e grupo. O fato é que, sem a menor sombra de dúvidas, um crescimento das crianças. Vamos explorar essa relação mais ambiente rico em atividades expressivas certamente irá detalhadamente: incentivar de forma significativa do desenvolvimento da fala infantil e o processo de aquisição da linguagem e é Infância: justamente por isso que esse tipo de trabalho em sala de - A infância é uma fase crucial do desenvolvimento aula deve sempre acontecer amparado por atividades humano, caracterizada por rápidas transformações físicas, significativas. cognitivas, sociais e emocionais. Durante esse período, as Assim sendo, o ideal é que as atividades sejam crianças estão constantemente explorando e interagindo com organizadas de maneira que o aluno possa transitar entre as o mundo ao seu redor, construindo sua compreensão do situações informais e coloquiais que já conheciam antes de mundo e de si mesmas. entrar na escola para situações mais estruturadas e formais, - A infância é marcada por momentos de aprendizado explorando o modo como funcionam e aprendendo a utilizar significativos, nos quais as crianças desenvolvem isso tudo da maneira correta. habilidades linguísticas, adquirem conhecimentos sobre sua cultura e comunidade, e internalizam normas sociais e Múltiplas linguagens na infância valores culturais. Cardoso (2003) e Santos (2007), em seus postulados, evidenciam o fato de os processos de ensino e de Linguagem: aprendizagem de uma maneira geral terem sido respaldados - A linguagem desempenha um papel central no pelas Tendências Pedagógicas Tecnicistas. Isso quer dizer desenvolvimento cognitivo e social das crianças. Através da que o fazer pedagógico presente nas unidades escolares linguagem, as crianças são capazes de expressar brasileiras respaldavam-se em pressupostos teóricos, que pensamentos, sentimentos e necessidades, interagir com os defendiam práticas mecânicas de reprodução. Nessa outros e construir significado sobre o mundo ao seu redor. perspectiva de ensino, havia ainda a ausência da diversidade - A aquisição da linguagem é um marco importante no de materiais e didáticos, visto que os fazer pedagógico desenvolvimento infantil, e ocorre de forma gradual e presente em tais unidades escolares brasileiras concedia progressiva desde os primeiros anos de vida. As interações primazia às Cartilhas e aos Livros Didáticos. Tais materiais sociais e culturais desempenham um papel fundamental na eram os únicos presentes nas práticas pedagógicas.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 6 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Consoante Kleiman (2004), esse quadro viria a ser discentes são estimulados a refletir, a partir de diversos modificado nos anos 70, quando se instaura, aqui, no Brasil, ângulos. a chama Crise da Leitura e da Escrita. Tal crise foi Corte Vitória (2010) postula que o trabalho pedagógico amplamente divulgada e, acima de tudo, criticada pela mídia envolvendo as múltiplas linguagens não se limita ao campo da época. Nesse contexto, no final dos anos 70, despontam educacional, mas abarca a dimensão sociocultural. As os primeiros paradigmas educacionais produzidos pela múltiplas e diversificadas linguagens são marcadas social e Psicologia, mais precisamente, pela Psicologia Cognitiva, culturalmente, na medida em que são constituintes da como evidencia Kleiman (2004). Mais à frente, nos anos 80, produção cultural da espécie humana. Na visão da autora, o chegam os paradigmas da Filosofia, da Psicologia e da contato com todos esses aspectos contribuem de forma Sociologia. Há, ainda, os paradigmas da Linguística e da substancial, para a formação da criança em sua totalidade. Pedagogia. A produção desses paradigmas tem a pretensão Em outras palavras, a criança não terá acesso apenas a de erradicar o quadro citado anteriormente sobre a leitura e a conteúdos e a saberes do currículo formal, mas ela terá escrita, conforme mostram Albuquerque (2006) e acesso a uma gama de saberes trazidos pelas práticas Albuquerque et al. (2008). sócio-históricas e culturais. Isso está em consonância com Uma proposta de mudança na forma de compreender a Pletsch (2005), que, em suas postulações, mostra como o linguagem e seu processo de aprendizagem iniciou-se de trabalho pedagógico envolvendo múltiplas e diversificadas fato a partir da década de 80 com a iniciativa de linguagens traz consigo uma relação intrínseca com as pesquisadores de algumas universidades do país, de manifestações socioculturais. educadores e de algumas Secretarias de Educação dos Pletsch (2005) aborda a relação entre o trabalho Estados. Pretendia-se superar o impasse desencadeado pedagógico com múltiplas linguagens, na Educação Infantil, pela prática educativa anterior que vinha dominando nossas e a leitura de mundo da criança. Para esse autor, a leitura de escolas desde o início dos anos 70. Um ensino de caráter mundo propicia a compreensão da realidade circundante, essencialista, conteudista, tecnicista e limitado à bem como a ampliação da visão de mundo da criança. Tal descontinuidade e fragmentariedade dos livros didáticos - prática transcende a leitura de elementos alfabéticos [signos resumindo-se a técnicas de redação, exercícios estruturais, e símbolos], na medida em que abarca a percepção e treinamento de habilidades de leitura - dominava não só as reflexão acerca das práticas sociais. Isso vai ao encontro de escolas como também o processo de formação de Silva et al. (2013), as quais abordam a multiplicidade de professores (CARDOSO, 2003, p. 9). habilidades de leitura. Ou seja, a leitura é uma competência Segundo Santos (2007), os paradigmas produzidos pelos linguística que se materializa não só através dos códigos e estudos realizados pelos campos do saber supracitados elementos alfabéticos. Pelo contrário, essa competência acima ensejam a modificação dos fazeres e práticas linguística tem sua materialização efetivada, a partir das pedagógicas presentes no campo educacional. Nas palavras atividades sociais presentes nas rotinas cotidianas. da autora, A prática da leitura é de extrema relevância para Nas duas últimas décadas tem sido observado um qualquer indivíduo, pois o ato da leitura se relaciona às deslocamento dos princípios orientadores do ensino em inúmeras atividades das sociedades modernas. Nos dias de diferentes áreas de saber. Deflagra-se um vigoroso processo hoje mais do que saber ler, ou seja, conhecer os elementos de questionamento e revisão do ensino vigente. É a gênese alfabéticos e a ligação existente entre eles é imprescindível de um movimento que se propõe a reconceitualizar não só que o sujeito possua diferentes tipos de habilidades de os objetivos do ensino, mas, sobretudo, os objetos de ensino, juntamente com os pressupostos e procedimentos leitura, não somente as aprendidas nos livros e na escola, didáticos (SANTOS, 2007, p. 787). mas sim, todas as formas de leitura que se encontram a sua Esses paradigmas vão repercutir mais tarde, mais volta para que assim consiga obter o máximo proveito das especificamente, em 1997, quando ocorre a publicação dos situações sociais que demandam tanto níveis de leitura Parâmetros Curriculares Nacionais [doravante PCNs]. Aqui, simples como níveis de leitura complexas (SILVA et al., emergem os debates acerca do uso de múltiplas linguagens 2013, p. 1). Nessa perspectiva, a prática de leitura de mundo no campo educacional. tem seu início antes da leitura de códigos e símbolos Nessa mesma linha, os mais recentes documentos alfabéticos, estando diretamente atrelada aos significados e oficiais destinados à Educação Infantil, como é o caso das aos sentidos dados às suas vivencias. Em outras palavras, Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil os significados e os sentidos construídos a partir dos eventos (2010), defendem um trabalho didático e pedagógico e das experiências sociais das crianças ensejam a produção pautado na multiplicidade de formas da linguagem. Nessa de novos saberes, como postula Martins (2003). Diante conjectura, a linguagem – escrita, falada, imagética etc. -, assim como uma gama de gêneros e suportes textuais são dessa acepção, o trabalho com a pluralidade de formas da inclusos nas rotinas educacionais das unidades escolares linguagem, no âmbito da Educação Infantil, causa voltadas à infância, com o propósito de carrear a possibilidades riquíssimas para o desenvolvimento da leitura apropriação, a construção e a (re)construção do repertório de de mundo da criança. conhecimentos das crianças. Ora, o trabalho pedagógico envolvendo a linguagem oral, Dizendo de outra maneira, as Diretrizes Curriculares corporal, gestual e visual pode trazer uma gama de Nacionais para a Educação Infantil (2010) postulam práticas conteúdos temáticos passiveis de leitura por parte da pedagógicas que “possibilitem às crianças experiências de criança. Segundo Figueiredo (2009), a Educação Infantil narrativas, de apreciação e interação com a linguagem oral e consiste em um espaço propício para aquisição das múltiplas escrita, e convívio com diferentes suportes e gêneros formas da linguagem, para a apropriação cultural, para a textuais orais e escritos” (BRASIL, 2010, p. 25). aquisição de valores sociais, para o desenvolvimento da No dizer de Pletsch (2005), as múltiplas linguagens autonomia e, sobretudo, para a construção do conhecimento. carregam consigo possibilidades temáticas extremamente O que está intimamente atrelado à prática da leitura de relevantes a serem abordadas no contexto educacional, o mundo por parte da criança. Martins (2003) define a leitura que atrela essas linguagens à constituição de valores da de mundo enquanto a forma como a criança produz criança e, conseguintemente, à construção do seu repertório significados e dá sentido às suas experiências sociais. Isto é, do conhecimento. Para a autora, o trabalho pedagógico com os significados e os sentidos dados aos eventos sociais dos as múltiplas e diversificadas linguagens acarreta quais as crianças são participantes concretizam a construção possibilidades de ver e perceber aspectos que nem sempre do seu repertório de conhecimentos atinentes ao mundo. estão evidentes. Ou seja, o trabalho com essas linguagens Esse conjunto de conhecimentos concernentes ao mundo traz novas formas de dar e construir sentido, a partir de reflete a sua leitura de mundo, o que está intrinsecamente novos materiais textuais. Com isso, nos dias de hoje, os ligado à construção da sua identidade.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 7 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Linguagem corporal no desenvolvimento da criança resultados, são uma forma de aliviar e relaxar a criança, Logo que rodeado com colegas de mesmo grupo a auxiliando na desinibição, contribuindo então para o criança acaba desenvolvendo seu poder de cultivar para si envolvimento social, e despertando noções de respeito e referenciais de comunicação, neste processo melhor e maior consideração pelo outro, e abrindo espaço para outras fica o vocábulo e, por consequente as possibilidades de aprendizagens. comunicação através da linguagem corporal. Vale ressaltar Segundo Garcia (200, p.12) é importante trabalhar a também o espaço em que a criança está desenvolvendo música para deixar fluir, a imaginação, a intuição e a através de adequados a precisão instantânea. Wayer (1984, sensibilidades dos alunos, pois, só assim lhes será oferecida p. 21) afirma que a criança toma consciência, une-se ao a possibilidade de diversidade de pensamentos linguagem. conhecimento e toma competência dos elementos que Desse modo a linguagem musical chega a ser um compõem o mundo dos objetos bem com suas mudanças e conhecimento que se constrói e possui estruturas e coordenação de seus movimentos, ou seja, graças a características próprias como a produção, à apreciação e a utilização mais precioso do próprio corpo. reflexão. O desenvolver movimentos, o dançar, o brincar, enfim Desde o nascimento, a criança tem necessidade de dentre outros estão ligados diretamente da motivação na desenvolver o senso de ritmo, pois o mundo que a rodeia, escola. Assim Carmo Junior (1995, p. 19) diz que no mundo expressa numa profusão de ritmos evidenciados por diversos da vida o ato criativo vem representando o momento lúdico aspectos: no relógio, no andar das pessoas, no voo dos extremamente profanador, violador, influente e que contem pássaros, nos pingos de chuva, nas batidas do coração, um movimento que não para. numa banda, num motor, no piscar de olhos e até mesmo na É obvio que a linguagem da fala é essencial para o voz das pessoas mais próximas. ensino, porém a linguagem corporal não fica nesse processo Compreender a música como linguagem é forma de de comunicação, assim dando forma de mudanças no ato de conhecimento e leva a ver a criança não como um ser ensinar. estático e sim como alguém que interage o tempo todo com o meio, organizando suas ideias e pensamentos. Linguagem digital Os primeiros anos de aprendizagem são propícios para A concepção de Infância mudou radicalmente. As que a criança comece a entender o que é linguagem musical, crianças de hoje mudaram o jeito de brincar, pensar o e aprender a ouvir os sons e a reconhecer diferenças entre mundo, se expressar, ou seja, ser criança. Nota-se uma eles. admiração pela imagem, por navegar entre os códigos Em qualquer ambiente que a criança esteja exposta eletrônicos e pela linguagem digital ofertada e consumida deverá ser estimulada a prestar atenção aos sons que com pelo mundo globalizado. certeza estão acontecendo e se possível identificá-los As crianças têm utilizado o computador como brinquedo, relacionando-os e nomeando-os. visto que cada vez saem menos de casa para interagir com A partir do momento em que a criança entra em contato seus pares, devido à violência social e até falta de tempo das com a música, seus conhecimentos se tornam mais amplos e famílias. O objeto desperta interesse e é comum ver crianças este contato vai envolver também o aumento de sua pequenas manipulando sozinhas ou usando outros recursos sensibilidade e fazê-la descobrir o mundo a sua volta de multimídia. forma prazerosa. Seus relacionamentos sociais serão Na sala de aula, os recursos tecnológicos estão pouco a marcados através deste contato e sua cidadania será pouco conseguindo espaço. É comum professores que trabalhada através dos conceitos que inevitavelmente são utilizam sons digitalizados, histórias multimídias, imagens, passados através das letras das canções. fotos digitalizadas ou até possibilitam que seus alunos manuseiem máquinas fotográficas ou filmadoras. Os A Importância da Cultura na Aquisição da Linguagem softwares educativos também são usados, seja como A aquisição da linguagem é um marco fundamental no atividades de entretenimento, seja como recurso pedagógico, desenvolvimento humano, permitindo que as pessoas se atraindo educadores e principalmente empresas produtoras comuniquem, expressem seus pensamentos e interajam com ou comerciantes desses produtos. o mundo ao seu redor. No entanto, a maneira como as crianças aprendem a linguagem não é apenas um processo Linguagem musical biológico, mas também é profundamente influenciada pelo A música é uma área de conhecimento, uma linguagem contexto cultural em que estão inseridas. Neste texto, com códigos específicos, uma forma de comunicação, discutiremos a importância da cultura na aquisição da através da qual o indivíduo vai dispor de meios para linguagem e como ela molda as experiências linguísticas das expressar-se. crianças. Para que isso ocorra, como em qualquer linguagem, a Em primeiro lugar, é importante reconhecer que cada capacidade de compreensão da música está relacionada cultura tem sua própria língua ou línguas, que refletem as com o domínio dos códigos musicais, que por sua vez tradições, valores, crenças e práticas de seu povo. Desde os prescindem de uma sensibilização auditiva, pois somente primeiros anos de vida, as crianças são expostas a essa assim a alfabetização musical será efetiva. diversidade linguística e cultural através das interações com Não basta apenas ouvir, é necessário compreender o suas famílias, comunidades e ambientes sociais. Essa que ouve. Quanto mais cedo a criança tiver a oportunidade de compreender o mundo sonoro em que ela está inserida, exposição precoce e constante desempenha um papel entrar em contato com músicas que tenham significação para fundamental na aquisição da linguagem, uma vez que as ela, maior e melhor será a sua percepção e sua sensibilidade crianças aprendem não apenas os sons e estruturas da com relação as sonoridades que a cercam. língua, mas também os significados e usos culturais Educar musicalmente é promover atividades onde haja a associados a ela. audição, a produção e a fruição dos sons, sejam eles Além disso, a cultura influencia diretamente a maneira musicais ou não e com eles interagir para expressar-se e como a linguagem é usada e interpretada em diferentes comunicar-se, é uma linguagem que apresenta a todos a contextos sociais e situacionais. Por exemplo, as normas de possibilidade de aprender a apreciar e envolver-se com a cortesia, os padrões de comunicação não verbal, as realização dos mais variados gêneros musicais e também de expressões idiomáticas e os rituais de conversação podem desenvolver habilidades de fazer música, se utilizando de variar amplamente de uma cultura para outra, influenciando a instrumento e/ou a voz estaremos possibilitando o forma como as crianças aprendem a se comunicar e a desenvolvimento das potencialidades das pessoas com interpretar as mensagens linguísticas ao seu redor. Assim, a necessidades especiais pelo seu caráter lúdico e de livre compreensão da cultura é essencial para uma comunicação expressão, não apresentam pressões nem cobranças de eficaz e significativa.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 8 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS A cultura também desempenha um papel crucial na intelectuais, necessárias para aprender a ler e escrever, é transmissão e preservação do conhecimento linguístico e resultado da maturação biológica, havendo nesse caso cultural de uma geração para outra. Através de histórias, pouca influência externa. Por meio de testes considera-se canções, jogos, tradições familiares e outras práticas possível detectar o momento para ter início a alfabetização. culturais, as crianças são expostas a uma riqueza de Por outro lado, há os que advogam a existência de pré- experiências linguísticas e culturais que contribuem para o requisitos relativos à memória auditiva, ao ritmo, à desenvolvimento de suas habilidades linguísticas e identidades culturais. Além disso, o contato com diferentes discriminação visual etc., que devem ser desenvolvidos para línguas e culturas pode enriquecer o repertório linguístico possibilitar a aprendizagem da leitura e da escrita pelas das crianças, tornando-as mais flexíveis e adaptáveis em crianças. Assim, os exercícios mimeografados de contextos multiculturais. coordenação perceptivo-motora, como passar o lápis sobre Por fim, a cultura também influencia o desenvolvimento linhas pontilhadas, ligar elementos gráficos (levar o de atitudes e crenças em relação à linguagem e à passarinho ao ninho, fazer os pingos da chuva etc.), tornam- diversidade linguística. Em algumas culturas, por exemplo, se atividades características das instituições de educação pode haver uma valorização particular de certas formas de infantil. Em outra perspectiva, a aprendizagem da leitura e da linguagem, dialetos ou sotaques, enquanto em outras escrita se inicia na educação infantil por meio de um trabalho culturas pode haver estigmas associados a certos usos com base na cópia de vogais e consoantes, ensinadas uma linguísticos. Essas atitudes e crenças podem afetar a de cada vez, tendo como objetivo que as crianças autoestima e a autoimagem das crianças em relação à sua relacionem sons e escritas por associação, repetição e própria linguagem e identidade cultural. memorização de sílabas. A prática em geral realiza-se de forma supostamente progressiva: primeiro as vogais, depois ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO: INTERAÇÕES DISCURSIVAS as consoantes; em seguida as sílabas, até chegar às NA ALFABETIZAÇÃO. SISTEMA ALFABÉTICO, palavras. PROCESSOS DE APRENDIZAGEM DA ESCRITA, Outra face desse trabalho de segmentação e VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E GÊNEROS DO DISCURSO. sequenciação é a ideia de partir de um todo, de uma frase, por exemplo, decompô-la em partes até chegar às sílabas. A linguagem oral está presente no cotidiano e na prática Acrescentasse a essa concepção a crença de que a das instituições de educação infantil à medida que todos que escrita das letras pode estar associada, também, à vivência dela participam: crianças e adultos, falam, se comunicam corporal e motora que possibilita a interiorização dos entre si, expressando sentimentos e ideias. As diversas movimentos necessários para reproduzi-las. Nas atividades instituições concebem a linguagem e a maneira como as de ensino de letras, uma das sequências, por exemplo, pode crianças aprendem de modos bastante diferentes. Em ser: primeiro uma atividade com o corpo (andar sobre linhas, algumas práticas se considera o aprendizado da linguagem fazer o contorno das letras na areia ou na lixa etc.), seguida oral como um processo natural, que ocorre em função da de uma atividade oral de identificação de letras, cópia e, maturação biológica; prescinde-se nesse caso de ações educativas planejadas com a intenção de favorecer essa posteriormente, a permissão para escrevê-la sem copiar. aprendizagem. Essa concepção considera a aprendizagem da Em outras práticas, ao contrário, acredita-se que a linguagem escrita, exclusivamente, como a aquisição de um intervenção direta do adulto é necessária e determinante sistema de codificação30 que transforma unidades sonoras para a aprendizagem da criança. Desta concepção resultam em unidades gráficas. As atividades são organizadas em orientações para ensinar às crianças pequenas listas de sequências com o intuito de facilitar essa aprendizagem às palavras, cuja aprendizagem se dá de forma cumulativa e crianças, baseadas em definições do que é fácil ou difícil, do cuja complexidade cresce gradativamente. Acredita-se ponto de vista do professor. também que para haver boas condições para essa Pesquisas realizadas, nas últimas décadas, baseadas na aprendizagem é necessário criar situações em que o silêncio análise de produções das crianças e das práticas correntes, e a homogeneidade imperem. Eliminam-se as falas têm apontado novas direções no que se refere ao ensino e à simultâneas, acompanhadas de farta movimentação e de gestos, tão comuns ao jeito próprio das crianças se aprendizagem da linguagem oral e escrita, considerando a comunicarem. Nessa perspectiva a linguagem é considerada perspectiva da criança que aprende. Ao se considerar as apenas como um conjunto de palavras para nomeação de crianças ativas na construção de conhecimentos e não objetos, pessoas e ações. Em muitas situações, também, o receptoras passivas de informações há uma transformação adulto costuma imitar a maneira de falar das crianças, substancial na forma de compreender como elas aprendem a acreditando que assim se estabelece uma maior falar, a ler e a escrever. aproximação com elas, utilizando o que se supõe seja a A linguagem oral possibilita comunicar ideias, mesma “língua”, havendo um uso excessivo de diminutivos pensamentos e intenções de diversas naturezas, influenciar e/ou uma tentativa de infantilizar o mundo real para as o outro e estabelecer relações interpessoais. Seu crianças. aprendizado acontece dentro de um contexto. O trabalho com a linguagem oral, nas instituições de As palavras só têm sentido em enunciados e textos que educação infantil, tem se restringido a algumas atividades, significam e são significados por situações. A linguagem não entre elas as rodas de conversa. é apenas vocabulário, lista de palavras ou sentenças. Apesar de serem organizadas com a intenção de É por meio do diálogo que a comunicação acontece. São desenvolver a conversa, se caracterizam, em geral, por um os sujeitos em interações singulares que atribuem sentidos monólogo com o professor, no qual as crianças são únicos às falas. A linguagem não é homogênea: há chamadas a responder em coro a uma única pergunta variedades de falas, diferenças nos graus de formalidade e dirigida a todos, ou cada um por sua vez, em uma ação nas convenções do que se pode e deve falar em totalmente centrada no adulto. Em relação ao aprendizado determinadas situações comunicativas. Quanto mais as da linguagem escrita, concepções semelhantes àquelas crianças puderem falar em situações diferentes, como contar relativas ao trabalho com a linguagem oral vigoram na o que lhes aconteceu em casa, contar histórias, dar um educação infantil. recado, explicar um jogo ou pedir uma informação, mais A ideia de prontidão para a alfabetização está presente poderão desenvolver suas capacidades comunicativas de em várias práticas. Por um lado, há uma crença de que o maneira significativa. desenvolvimento de determinadas habilidades motoras e
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 9 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Pesquisas na área da linguagem tendem a reconhecer de fato, a aprendizagem da leitura e da escrita. que o processo de letramento está associado tanto à Nos últimos dez anos, a quase-totalidade das redes de construção do discurso oral como do discurso escrito. educação pública desenvolveu, sob a forma de reorientação Principalmente nos meios urbanos, a grande parte das curricular ou de projetos de formação de professores em crianças, desde pequenas, estão em contato com a serviço (em geral os dois), um grande esforço de revisão das linguagem escrita por meio de seus diferentes portadores de práticas tradicionais de alfabetização inicial e de ensino da texto, como livros, jornais, embalagens, cartazes, placas de Língua Portuguesa. Seja porque a demanda quantitativa já ônibus etc., iniciando-se no conhecimento desses materiais estava praticamente satisfeita — e isso abria espaço para a gráficos antes mesmo de ingressarem na instituição questão da qualidade da educação —, seja porque a educativa, não esperando a permissão dos adultos para produção científica na área tornou possível repensar sobre começarem a pensar sobre a escrita e seus usos. as questões envolvidas no ensino e na aprendizagem da Elas começam a aprender a partir de informações língua, o fato é que a discussão da qualidade do ensino provenientes de diversos tipos de intercâmbios sociais e a avançou bastante. partir das próprias ações, por exemplo, quando presenciam Daí estes Parâmetros Curriculares Nacionais soarem diferentes atos de leitura e escrita por parte de seus como uma espécie de síntese do que foi possível aprender e familiares, como ler jornais, fazer uma lista de compras, avançar nesta década, em que a democratização das anotar um recado telefônico, seguir uma receita culinária, oportunidades educacionais começa a ser levada em buscar informações em um catálogo, escrever uma carta consideração, em sua dimensão política, também no que diz para um parente distante, ler um livro de histórias etc. respeito aos aspectos intra-escolares. Sem a pretensão de A partir desse intenso contato, as crianças começam a historiar a área, é possível descrever em linhas gerais o processo de transformação das ideias que, nas últimas três elaborar hipóteses sobre a escrita. Dependendo da décadas, têm circulado na escola e funcionado como importância que tem a escrita no meio em que as crianças referência para a prática dos professores das séries iniciais. vivem e da frequência e qualidade das suas interações com O conhecimento disponível nos anos 60 levava a buscar esse objeto de conhecimento, suas hipóteses a respeito de no aluno a causa do fracasso escolar — o que tinha sua como se escreve ou se lê podem evoluir mais lentamente ou lógica, visto que para uma parte dos alunos o ensino parecia mais rapidamente. funcionar. Uma boa ilustração dessa abordagem são os Isso permite compreender por que crianças que vêm de exercícios de — prontidão —. famílias nas quais os atos de ler e escrever têm uma Pensava-se que aos alunos que fracassavam devia faltar presença marcante apresentam mais desenvoltura para lidar algo, sendo, então, necessário compensar esse déficit para com as questões da linguagem escrita do que aquelas que pudessem, no início dos anos 80, começaram a circular, provenientes de famílias em que essa prática não é intensa. entre educadores, livros e artigos que davam conta de uma Esse fato aponta para a importância do contato com a mudança na forma de compreender o processo de escrita nas instituições de educação infantil. alfabetização; deslocavam a ênfase habitualmente posta em Para aprender a ler e a escrever, a criança precisa como se ensina” e buscavam descrever — como se aprende construir um conhecimento de natureza conceitual: precisa —. Tiveram grande impacto os trabalhos que relatavam compreender não só o que a escrita representa, mas resultados de investigações, em especial a psicogênese da também de que forma ela representa graficamente a língua escrita. Esses trabalhos ajudaram a compreender linguagem. Isso significa que a alfabetização não é o aspectos importantes do processo de aprendizagem da desenvolvimento de capacidades relacionadas à percepção, leitura e da escrita. Permitiram, por exemplo, que se memorização e treino de um conjunto de habilidades começasse a desvelar as razões pelas quais as crianças que sensório-motoras. vinham de famílias mais favorecidas pareciam ter muito mais É, antes, um processo no qual as crianças precisam desenvoltura para lidar com as demandas escolares que as resolver problemas de natureza lógica até chegarem a de famílias menos favorecidas. compreender de que forma a escrita alfabética em português Com o deslocamento do eixo da investigação das representa a linguagem, e assim poderem escrever e ler por questões do ensino para as questões da aprendizagem, foi si mesmas. possível compreender que as crianças sabiam muito mais do que se poderia supor até então, que elas não entravam na Leitura e Escrita escola completamente desinformadas, que possuíam um Desde o início da década de 80, o ensino de Língua conhecimento prévio. Mas, as de famílias mais favorecidas Portuguesa na escola tem sido o centro da discussão acerca tinham maiores oportunidades de participação em atividades da necessidade de melhorar a qualidade da educação no sociais mediadas pela escrita, possuíam muito mais País. No ensino fundamental, o eixo da discussão, no que se experiências significativas com a escrita do que as crianças refere ao fracasso escolar, tem sido a questão da leitura e da das classes menos favorecidas, e essa diferença, que se escrita. Sabe-se que os índices brasileiros de repetência nas expressava no desempenho, marcou a vida escolar dessas séries iniciais — inaceitáveis mesmo em países muito mais crianças desde o seu início. Os resultados dessas pobres — estão diretamente ligados à dificuldade que a investigações também permitiram compreender que a escola tem de ensinar a ler e a escrever. Essa dificuldade alfabetização não é um processo baseado em perceber e expressa-se com clareza nos dois gargalos em que se memorizar, e, para aprender a ler e a escrever, o aluno concentra a maior parte da repetência: no fim da primeira precisa construir um conhecimento de natureza conceitual: série (ou mesmo das duas primeiras) e na quinta série. No ele precisa compreender não só o que a escrita representa, primeiro, por dificuldade em alfabetizar; no segundo, por não mas também de que forma ela representa graficamente a conseguir garantir o uso eficaz da linguagem, condição para linguagem. que os alunos possam continuar a progredir até, pelo menos, A divulgação desses resultados de pesquisas por várias o fim da oitava série. secretarias de educação desencadeou em uma parcela Por outro lado, a dificuldade dos alunos universitários pequena (mas ativa e comprometida) de alfabetizadores e em compreender os textos propostos para leitura e organizar técnicos um esforço de revisão das práticas de alfabetização. ideias por escrito de forma legível levou universidades a A primeira prática questionada foi a dos exercícios de trocar os testes de múltipla escolha dos exames vestibulares prontidão. Também o silabário da cartilha — confundido por questões dissertativas e a não só aumentar o peso da muitas vezes com a própria ideia de alfabetização — tem prova de redação na nota final como também a dar-lhe um sido substituído por uma grande variedade de textos. A tratamento praticamente eliminatório. divulgação dessas novas propostas didáticas tem produzido Essas evidências de fracasso escolar apontam a bons resultados, mas também, infelizmente, bastante necessidade da reestruturação do ensino de Língua desinformação: as mudanças em pedagogia são difíceis, Portuguesa, com o objetivo de encontrar formas de garantir, pois não passam pela substituição de um discurso por outro, mas por uma real transformação da compreensão e da ação.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 10 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS As condições atuais permitem repensar sobre o ensino grafocêntrica, não garante (embora auxilie) a apropriação da leitura e da escrita considerando não só o conhecimento das relações existentes entre o que falamos e o que didático acumulado, mas também as contribuições de outras escrevemos. Estas apropriações são oriundas de um áreas, como a psicologia da aprendizagem, a psicologia trabalho explícito realizado com intencionalidade e cultural e as ciências da linguagem. sistematização, pois contrário ao aprendizado da fala que é O avanço dessas ciências possibilita receber natural (salvo exceções), a escrita é um produto cultural contribuições tanto da psicolinguística quanto da inventado pela humanidade (NAVAS e SANTOS, 2002). sociolinguística; tanto da pragmática, da gramática textual, Considerada a sua complexidade, alguns da teoria da comunicação, quanto da semiótica, da análise questionamentos se fazem presentes em sala de aula do discurso. No que se refere à linguagem oral, algo similar quando o objetivo é trabalhar o aprendizado inicial da leitura acontece: o avanço no conhecimento das áreas afins torna e da escrita com as crianças: De onde partir? Quais letras possível a compreensão do papel da escola no utilizar? Em que etapa escolar iniciar? desenvolvimento de uma aprendizagem que tem lugar fora O alfabeto é o conjunto de letras que corresponde à dela. Não se trata de ensinar a falar ou a fala “correta”, mas pauta sonora dos falantes de uma língua. O Português do sim as falas adequadas ao contexto de uso. Os esforços Brasil é estruturado com 21 consoantes e 5 vogais, sendo pioneiros de transformação da alfabetização escolar que a maioria das palavras seguem predominantemente a consolidaram-se, ao longo de uma década, em práticas de estrutura CV (consoante/vogal) e todas contêm pelo menos ensino que têm como ponto tanto de partida quanto de uma vogal (MORAIS, 2012). Logo, podemos inferir que, para chegada o uso da linguagem. Práticas que partem do uso escrever o que falamos ou pensamos precisamos utilizar possível aos alunos e pretendem provê-los de oportunidades letras de um repertório específico e finito. de conquistarem o uso desejável e eficaz. Segundo Morais (2012) o alfabeto é também Em que a razão de ser das propostas de leitura e escuta denominado de SEA (Sistema de Escrita Alfabética), escrita é a compreensão ativa e não a decodificação e o silêncio. alfabética, ou ainda, sistema alfabético, e é por meio dele Em que a razão de ser das propostas de uso da fala e da que nos tornamos alfabetizados. escrita é a expressão e a comunicação por meio de textos e Em síntese, a alfabetização é o processo de não a avaliação da correção do produto. Em que as aprendizagem do sistema alfabético e de suas convenções, situações didáticas têm como objetivo levar os alunos a ou seja, a aprendizagem de um sistema notacional que pensarem sobre a linguagem para poderem compreendê-la e representa por grafemas, os fonemas da fala (CEALE, 2004). utilizá-la adequadamente. Dito de outra forma, é a aprendizagem inicial da leitura e da A futurologia dos anos 60 gostava de afirmar escrita. categoricamente que o mundo da escrita daria lugar ao O dicionário Houaiss (2001, p. 678), apresenta duas mundo da imagem; que a mídia eletrônica destruiria o mundo definições sobre a palavra sistema que, a priori, converge cultural criado pelo livro impresso que propiciou a História, a com o contexto que abordamos: Ciência e a Literatura. Mas o que se viu nestes trinta anos 1) Conjunto de elementos, entre os quais haja alguma aponta em outra direção. Ser um usuário competente da relação, e escrita é, cada vez mais, condição para a efetiva participação 2) Disposição das partes ou dos elementos de um todo, social. Mas não são os avanços do conhecimento científico coordenados entre si, e que formam uma estrutura por si mesmos que produzem as mudanças no ensino. organizada. As transformações educacionais realmente significativas — que acontecem raramente — têm suas fontes, em Assim, o SEA envolve prioritariamente uma série de primeiro lugar, na mudança das finalidades da educação, isto propriedades (relação/estrutura organizada) específicas de é, acontecem quando a escola precisa responder a novas ordem conceitual e convencional. Conceitual porque exigências da sociedade. E, em segundo lugar, na estabelece questões que envolvem a essência do sistema de transformação do perfil social e cultural do alunado: a escrita que é a representação simbólica/notacional significativa ampliação da presença, na escola, dos filhos do (grafema/fonema). E convencional porque está no âmbito analfabetismo — que hoje têm a garantia de acesso mas não das convenções, que se configuram nas regras de sucesso — deflagrou uma forte demanda por um ensino estabelecidas: direcionamento da escrita – escrever de cima mais eficaz. Estes Parâmetros Curriculares Nacionais para baixo, da esquerda para a direita e com segmentação pretendem contribuir nesse sentido. entre as palavras – e a aquisição de suas regras morfológicas. Linguagem e participação social O domínio da língua tem estreita relação com a Escreve-se com letras que não podem ser possibilidade de plena participação social, pois é por meio inventadas, que têm um repertório finito e que são dela que o homem se comunica, tem acesso à informação, diferentes de números e de outros símbolos expressa e defende pontos de vista, partilha ou constrói No início da alfabetização é natural que as crianças visões de mundo, produz conhecimento. encontrem dificuldades para se registrarem de forma Assim, um projeto educativo comprometido com a convencional. Isso ocorre porque não compreendem a democratização social e cultural atribui à escola a função e a essência do sistema de escrita. Assim, para compreenderem responsabilidade de garantir a todos os seus alunos o esta propriedade, é necessário discernir entre números, acesso aos saberes linguísticos necessários para o exercício letras e outras formas gráficas. Para isso, o professor pode da cidadania, direito inalienável de todos. levar para a sala de aula diversas imagens, letras e números, Essa responsabilidade é tanto maior quanto menor for o e solicitar que as crianças as separem classificando-as por grau de letramento das comunidades em que vivem os meio de alguns critérios estabelecidos: conjunto de alunos. desenhos, conjunto de números ou, conjunto de letras. Considerando os diferentes níveis de conhecimento Assim, além de tornar o aprendizado mais interativo e lúdico prévio, cabe à escola promover a sua ampliação de forma faz com que as crianças compreendam a diferença, e a que, progressivamente, durante os oito anos do ensino funcionalidade de cada um dos símbolos no seu cotidiano. fundamental, cada aluno se torne capaz de interpretar diferentes textos que circulam socialmente, de assumir a As letras têm formatos fixos e pequenas variações palavra e, como cidadão, de produzir textos eficazes nas produzem mudanças na identidade das mesmas (p q b mais variadas situações. d), embora uma letra assuma formatos variados (P p P p) Estamos acostumados a olhar os objetos e, ainda que Sistema alfabético estejam em posições não convencionais, os identificamos O fato de as crianças estarem inseridas em uma cultura exatamente como são.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 11 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Um copo não deixa de ser copo apenas por estar de existente entre os grafemas (letras) e fonemas (sons) de cabeça para baixo. O mesmo, porém, não acontece com as uma palavra. letras. Se tomarmos como exemplo a letra “W” colocando-a em uma posição contrária teremos como resultado a escrita As letras têm valores sonoros fixos, apesar de da letra “M”. O “P”, também passa por essa questão quando muitos terem mais de um valor sonoro e certos sons não posicionado de maneira correta: ora vira b, ora vira d. poderem ser notados com mais de uma letra Por isso, estimular as crianças a representarem as letras Atividades que envolvam músicas, parlendas e trava- com o próprio corpo, e traçá-las em distintos suportes como línguas auxiliarão na tomada de consciência pela criança de caixas de areia, pátio da escola, quadro da sala, etc., além que muitas palavras começam, terminam ou possuem em de proporcionar momentos de destreza no manuseio dos seu interior sons semelhantes. registros, auxiliará na compreensão acerca dos formatos e a sua posição nas palavras. Além de letras, na escrita de palavras usam-se alguns acentos que podem modificar a tonicidade ou o A ordem das letras no interior da palavra não pode som das letras ou sílabas onde aparecem ser mudada O nome próprio é a primeira referência significativa de Os grafemas são letras que representam os fonemas (os palavra estável que as crianças reconhecem. Assim, utilizá- sons da fala). Assim, podemos considerar que as palavras los para que compreendam as diferenças existentes entre possuem um repertório estável de letras que não podem ser um som/pronúncia, irá permitir a compreensão de que certos modificadas para não alterarem o seu significado. Por acentos nos seus nomes, e também nos nomes dos seus exemplo, na palavra CURSO, se a criança porventura colegas são importantes na concepção de diferenças de colocar a letra C após a letra O, terá escrito outra palavra: sons e, por consequência, nas pronúncias de palavras que URSOC, inviável à compreensão no nosso idioma. lemos ou falamos. Logo, atividades em que as crianças possam brincar de inserir letras em palavras de destaque como os nomes dos As sílabas podem variar quanto às combinações colegas e da professora lhes proporcionarão a segurança entre consoantes e vogais necessária para compreenderem o sentido desta (cv/ccv/cvv/cvc/v/vc/vcc/ccvcc), mas a estrutura propriedade. predominante no português é a sílaba cv (consoante/vogal) e todas as sílabas do português Uma letra pode se repetir no interior de uma palavra contém ao menos uma vogal e em diferentes palavras, ao mesmo tempo em que Construir com as crianças uma lista de palavras partindo distintas palavras compartilham as mesmas letras de uma história contada ou de seus próprios nomes, auxiliará Estabelecer estratégias lúdicas para que as crianças na percepção de que há, no nosso idioma, uma série de percebam que a letra B de bola faz parte também do nome palavras que possuem diferentes combinações de letras. do Bruno e está presente nas palavras: cambalhota, cabide, Partindo do pressuposto que o aspecto da linguagem é etc. Para isso, o jogo palavra puxa palavra (MACACO – abordado no campo de experiência Escuta, fala, pensamento CACO – BONECA – BONÉ – SERPENTE – PENTE – e imaginação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) CAMALEÃO – LEÃO) é um excelente recurso, pois auxilia para o público da educação infantil, e que o princípio sobremaneira nessa percepção. alfabético (SEA) faz parte do conjunto das habilidades a serem desenvolvidas no ciclo inicial da alfabetização (1º/2º) Nem todas as letras podem ocupar certas posições também proposto por este documento, concluímos que, no interior das palavras e nem todas as letras podem vir desde os primeiros dias do ano escolar de uma criança o juntas de quaisquer outras alfabeto deve fazer parte da rotina didática em múltiplas e O sistema de escrita do português brasileiro apresenta diversificadas situações. muitas regras que devem ser trabalhadas com as crianças Logo, saber como direcionar esse trabalho é de suma por meio de jogos para facilitar as descobertas necessárias e relevância para o bom desenvolvimento do aprendizado do assim, compreenderem, por exemplo, que nenhuma palavra SEA, visto que suas propriedades descritas e pode ser iniciada com RR ou Ç e que antes de P e B só se contextualizadas acima denotam um aspecto rigorosamente escreve o M. complexo e necessário para que ocorra uma alfabetização eficiente e adequada para as nossas crianças. As letras notam ou substituem a pauta sonora das Quanto à escolha da letra ao iniciar o trabalho, como palavras que pronunciamos e nunca levam em conta as pudemos observar ao descrever as propriedades de número características físicas ou funcionais dos referentes que 2/3, o formato das letras carrega em si uma especial substituem exigência quanto aos seus traçados. Pensando nessa Não obstante, o português brasileiro seja mais complexidade, a escolha do tipo de letra tem uma importante transparente do que opaco (Soares, 2020) não há conotação. Temos uma infinidade de fontes, porém as quatro linearidade absoluta entre fala e escrita. Logo, nem todas as utilizadas em sala de aula para o ensino da língua, são: palavras que escrevemos têm exatamente o som das letras imprensa maiúscula (bastão), script e cursiva (maiúsculas e que pronunciamos, como táxi, exame, casa, etc. Nesse minúsculas). sentido, um ótimo recurso para se trabalhar estas A respeito da letra cursiva no trabalho inicial da complexidades linguísticas denominadas por Sônia Moojem alfabetização, Luzia Bomtempo explica em seu livro (2015) de irregularidades da língua, é o gênero textual lista “Alfabetização com Sucesso” que esta letra deve ser inserida de palavras, em que por meio de brincadeiras o (a) professor com as crianças quando elas estiverem no nível alfabético[5]. Morais (2012, p. 79) amplia a discussão enfatizando que as (a) juntamente com as crianças irá classificá-las objetivando letras de imprensa maiúsculas/bastão são “especialmente a compreensão da consciência das regras que possuem a adequadas para as atividades de reflexão sobre as palavras escrita convencional. e atividades, pois auxiliam as crianças a compreenderem as propriedades do SEA”. Assim, este autor recomenda a As letras notam segmentos sonoros menores que as utilização desse tipo de letra, no trabalho inicial da sílabas orais que pronunciamos alfabetização pelos seguintes motivos: Algumas letras possuem um som mais perceptivo – Apresenta menos desgaste cognitivo para o seu (audível) que outras como no caso das vogais e de algumas aprendizado, pois possui um traçado considerado simples e consoantes como V/F, ou seja, são letras que não competem limpo; “o que permite ao aprendiz concentrar-se melhor na seus sons com outras. Sendo assim, brincar de cruzadinha, tarefa de refletir sobre quais e quantas letras vai pôr e em de bingo ou outras situações lúdicas que evidencie o som que ordem vai dispô-las, ao escrever” (MORAIS, 2012, p. das letras auxiliará no trabalho de percepção da relação 142).
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 12 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS – Como as letras de imprensa maiúsculas se apresentam fonético. No Brasil, essa discussão caiu em desuso a partir de maneira delimitada (uma separada da outra), a criança da difusão do método, que na época foi identificado como visualiza melhor onde começa e onde termina cada uma “misto” – nada mais que nossa conhecida cartilha, baseada favorecendo, portanto, a percepção da “identidade de cada em análise e síntese e estruturada a partir de um silabário. letra da palavra, a ordem em que as letras aparecem, O segundo momento, cujo pico foi nos anos 60, teve por quantas letras compõem a palavra, e, também, quais são centro geográfico os Estados Unidos. A discussão das ideias iguais e quais são diferentes” (MORAIS, 2012, p. 143). sobre alfabetização foi levada para dentro de um debate Contudo, Bomtempo (2003) e Morais (2012) advertem mais amplo, em torno da questão do fracasso escolar. A luta que, embora se privilegie o trabalho com as letras de contra a segregação dos negros, com a consequente batalha imprensa maiúsculas no início do processo da alfabetização, pela integração nas escolas norte-americanas, contribuiu familiarizar os outros tipos de letras nos momentos oportunos para que se tornassem mais explícitas as dificuldades se faz relevante, uma vez que fazem parte do universo escolares dessas minorias. Muito dinheiro foi investido em cultural das crianças. pesquisas para tentar compreender o que havia de errado com as crianças que não aprendiam. Buscava-se no aluno a O processo de alfabetização na leitura e na escrita razão de seu próprio fracasso. O processo de alfabetização é uma discussão antiga São desse período as que hoje chamamos “teorias de entre os especialistas no assunto e entre os pais quando vão déficit”. Supunha-se que a aprendizagem dependia de pré- escolher uma escola para seus filhos começarem a ler as requisitos (cognitivos, psicológicos, perceptivo-motores, primeiras palavras e frases. No caso brasileiro, com os linguísticos...) e que certas crianças fracassavam por não elevados índices de analfabetismo e os graves problemas dispor dessas habilidades prévias. O fato de o fracasso estruturais na rede pública de ensino, especialistas debatem concentrar-se nas crianças das famílias mais pobres era qual seria o processo para revolucionar ou pelo menos explicado por uma suposta incapacidade das próprias melhorar a educação brasileira. Ao longo das décadas, famílias de proporcionar os estímulos adequados. houve mudança da forma de pensar a educação, que passou Um trabalho de investigação que desencadeou intensas a ser vista da perspectiva de como o aluno aprende e não mudanças na maneira de os educadores brasileiros como o professor ensina. compreenderem a alfabetização foi o coordenado por Emilia São muitas as formas de alfabetizar, e cada uma delas Ferreiro e Ana Teberosky, que foi publicado no Brasil com o destaca um aspecto no aprendizado. Desde o método fônico, título Psicogênese da língua escrita, em 1985. A partir dessa adotado na maioria dos países, que faz a associação entre investigação, foi necessário rever as concepções nas quais as letras e sons, passando pelo método da linguagem total, se apoiava a alfabetização. E isso tem demandado uma que não utiliza cartilhas, e o alfabético, que trabalha com o transformação radical nas práticas de ensino da leitura e da soletração, todos contribuem, de uma forma ou outra, para o escrita no início da escolarização, ou seja, na didática da processo de alfabetização. alfabetização; não é mais possível conceber a escrita Um dos mais antigos sistemas de alfabetização, o exclusivamente como um código de transcrição gráfica de método alfabético, também conhecido como soletração, tem sons, já não é mais possível desconsiderar os saberes que como princípio que a leitura parte da decoração oral das as crianças constroem antes de aprender formalmente a ler, letras do alfabeto e depois todas as suas combinações já não é mais possível fechar os olhos para as silábicas e, em seguida, as palavras. A partir daí, a criança consequências provocadas pela diferença de oportunidades começa a ler sentenças curtas e vai evoluindo até conhecer que marca as crianças de diferentes classes sociais. A histórias. respeito disto, Emília Ferreiro (1985, p. 16) afirma que Por esse processo, a criança vai soletrando as sílabas as mudanças necessárias para enfrentar sobre bases até decodificar a palavra. Por exemplo, a palavra casa novas a alfabetização inicial não se resolvem com um novo soletra-se assim c, a, ca; s, a, sa; casa. O método alfabético método de ensino, nem com novos testes de prontidão nem permite a utilização de cartilhas. com novos materiais didáticos. É preciso mudar os pontos As principais críticas a esse método estão relacionadas à por onde nós fazemos passar o eixo central das nossas repetição dos exercícios, o que o tornaria tedioso para as decisões. Temos uma imagem empobrecida da língua crianças, além de não respeitar os conhecimentos adquiridos escrita: é preciso reintroduzir quando encontramos a pelos alunos antes de eles ingressarem na escola. O método analfabetização, a escrita como sistema de representação da alfabético, apesar de não ser o indicado pelos Parâmetros linguagem. Curriculares Nacionais, ainda é muito utilizado em diversas Muitas são as causas que têm sido descritas por aqueles cidades do interior do Nordeste e Norte do país, já que é que se dedicam a estudar tal problema. Algumas das razões mais simples de ser aplicado por professores leigos, com a mais amplamente divulgadas dizem respeito a déficits visuais repetição das cartas de ABC, e na alfabetização doméstica. e auditivos e a um domínio pouco desenvolvido de fala e O modelo escolar de alfabetização nasceu há pouco linguagem, a problemas gerais de saúde e a maturidade, a mais de dois séculos, precisamente em 1789, na França, fatores emocionais, familiares e sociais. Sendo assim, após a Revolução Francesa. A partir de então, crianças são transformadas em alunos, aprender a escrever se sobrepõe podemos atribuir-lhes a motivação tanto a facilidade como a a aprender a ler, ler agora se aprende escrevendo; até esse dificuldade para aprender, atribuir-lhes as condições período, ler era uma aprendizagem distinta e anterior a motivadoras o sucesso ou o fracasso dos professores ao escrever, compreendendo alguns anos de instrução em tentar ensinar algo; dificilmente detectamos o motivo que ensino individualizado. É, então, no jogo estabelecido pela subjaz a algum tipo de comportamento. Revolução entre a continuidade e a descontinuidade do A motivação é, portanto, o processo que mobiliza o tempo, em que a ruptura vai sendo atropelada pela tradição, organismo para a ação, a partir de uma relação estabelecida que a alfabetização se torna o fundamento da escola básica entre o ambiente, a necessidade e o objeto de satisfação. e a leitura/escrita, da aprendizagem escolar. Isso significa que na base da motivação está sempre um Analisando a evolução da investigação e do debate em organismo que apresenta uma necessidade, um desejo, uma relação à alfabetização escolar no século XX, é possível intenção, um interesse, uma vontade ou uma predisposição definir, em linhas gerais três períodos. O primeiro para agir. corresponde, aproximadamente, à primeira metade do século, quando a discussão se dava estritamente no terreno O processo de aquisição da leitura e da escrita do ensino. Buscava-se o melhor método para ensinar a ler O processo de leitura e escrita emprega uma série de com base na suposição de que a ocorrência de fracasso se estratégias, isto é, um amplo esquema para obter, avaliar e relacionava ao uso de métodos inadequados. A discussão utilizar informação. A leitura e a escrita, como qualquer mais candente tornou-se entre os defensores do método atividade humana, são uma conduta inteligente.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 13 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS As pessoas não respondem simplesmente aos estímulos considerada um procedimento, tendo em vista que um do meio; encontram ordem e estrutura no mundo de tal procedimento seria um conjunto de ações ordenadas e maneira que podem aprender com base em suas finalizadas, isto é, dirigidas à consecução de uma meta. experiências, antecipá-las e compreendê-las. Os leitores Por outro lado, existem vários tipos de procedimento: uns desenvolvem estratégias para trabalhar com o texto, que exigem ações mais automatizadas, como o ato de construindo significado ou compreendendo-o. Usam-nas amarrar o cadarço do sapato, e outras que exigem tanto na leitura, quando podem se modificar e se capacidade de pensamento estratégico. As estratégias desenvolver durante tal processo. É óbvio que isso só ocorre usadas na compreensão de um texto estão enquadradas no se houver leitura. segundo tipo, ou seja, constituem um conjunto de ações Algumas considerações fundamentais sobre a leitura e a escrita: são atividades construtivas e criativas com quatro mentais desenvolvidas pelo leitor para construir o sentido. características fundamentais: objetiva, que lê-se por uma A utilização da escrita para registro do saber produtivo razão, com uma finalidade; a seletiva, presta-se atenção pelo homem é acompanhada por uma transformação naquilo que é relevante aos objetivos que se tem; a gradativa nos mecanismos de transmissão do conhecimento. antecipatória, os objetivos definem as expectativas diante do O homem, através dos tempos, comunica-se com gestos, texto; e a baseada na compreensão, em que a compreensão expressões e com a fala. A escrita tem origem no momento é a base e não a consequência da leitura. em que o homem aprende a comunicar seus pensamentos e Conhecimentos especiais que as crianças devem possuir sentimentos por meio de signos, signos que sejam para aprender a ler e não considerar o ensino da leitura compreensíveis por outros seres humanos que possuem absurdo são: a escrita é significativa, e a linguagem escrita ideias sobre como funciona esse sistema de comunicação. não é a mesma coisa que a fala (apesar da relação estreita Os signos passam a ter valores silábicos convencionais: entre ambas). convenção de forma e de princípios. Os signos foram Ler é extrair sentido dos textos. O objetivo principal da leitura é compreender um texto e, por ela, o que propõe, normalizados para que todos os desenhassem da mesma sugere ou instiga. A compreensão implica conhecer a maneira; estabeleceram-se correspondências entre signos, intenção do autor, identificar mensagens explícitas e palavras e sentidos. Houve, portanto, uma alteração implícitas, cotejar o que está no texto com o que o leitor já significativa nas convenções do sistema representativo. A sabe ou pensa a respeito do assunto. Em outras palavras: ler formalização da escrita exigiu não só o estabelecimento das é um processo permanente, ativo e interativo de análise e regras como também a aprendizagem efetiva das formas e síntese. princípios da escrita. A leitura envolve diversos níveis. O nível mais elementar A evolução da escrita sempre busca significação, é o fonológico, o nível de identificação pura e simples da economia e agilidade na representação. É sempre marcada palavra. Ouvimos mentalmente o som da palavra escrita e por necessidades historicamente determinadas. A identificamos em nosso dicionário mental a palavra lida. A possibilidade de divisão de uma palavra em sílabas rápida identificação da palavra depende de uma série de fatores. Numa leitura, interessa não apenas identificar componentes significa um grande avanço na compreensão rapidamente uma palavra, mas identificar rapidamente todas de um idioma. as palavras que compõem uma frase, um parágrafo ou A leitura e a escrita constituem símbolos externos de mesmo um conjunto de parágrafos. Daí a importância da uma nação, e esta é a razão pela qual os tesouros escritos fluência, que desempenha papel muito importante para a são o principal alvo de destruição dos conquistadores. compreensão até atingir certo limite. Cortez, ao conquistar o México, queimou os livros astecas A leitura e a escrita são práticas que se relacionam e que podiam trazer à população nativa recordações de seu complementam a formação de um leitor competente, o passado glorioso. A inquisição espanhola queimou os judeus objetivo maior da escola, pois a leitura e a escrita são os e seus livros talmúdicos em fogueiras. Os nazistas, para maiores instrumentos para a construção do conhecimento. destruir ideologias contrárias à sua, queimaram os livros dos Despertar no aluno o interesse pela leitura é o maior legado inimigos. Os Aliados, vitoriosos na Segunda Guerra Mundial, de uma prática constante da leitura de textos variados. ordenaram a queima de toda a literatura contaminada pelo O ser humano é capaz de refletir sobre a linguagem e analisá-la, e a linguagem é o próprio instrumento para essa nazismo. reflexão. Jesualdo (1993) aponta quatro elementos que poderão Para Kleiman (1993), a linguagem funcionaria, segundo despertar o interesse das crianças: o caráter imaginoso, o essa perspectiva, como um “repositório” de mensagens. Ao dramatismo, uma boa técnica de desenvolvimento e uma leitor seria dada a tarefa de extraí-las pelo domínio de linguagem em que se detectem as marcas da literalidade. palavras, numa atitude passiva. Exercícios como os de Sabe-se que ter imaginação é algo muito importante na substituição de palavras do texto por sinônimos ou as vida da criança, pois é com essa faculdade que a famosas questões de compreensão explorando apenas consciência infantil elabora aquilo que vai captando de forma informações óbvias estariam, segundo a autora, intuitiva no mundo que a cerca. As descobertas do mundo fundamentados nessa teoria, que vê a língua como um surgem para a criança como fantasia, como algo instrumento de comunicação. extraordinário, embora não se possa dizer que ela confunda O conceito de leitura mais completo está fundamentado os elementos do real com o do mundo irreal. nos estudos reconhecidos genericamente como Linguística No processo de alfabetização, a hipótese silábica é ao Pragmática, os quais, de acordo com Koch (1995), tratam mesmo tempo um grande avanço conceitual e uma enorme das manifestações linguísticas produzidas por indivíduos fonte de conflito cognitivo. concretos em situações concretas, sob determinadas No entanto, a hipótese silábica cria suas próprias condições de produção. Nessa perspectiva, ler seria igual a condições de contradição: contradição entre o controle construir sentido. silábico e a quantidade mínima de letras que uma escrita Para Fulgênio (1992), a leitura e a escrita são resultados deve possuir para ser interpretável (por exemplo, o das interações entre informações visuais e não visuais, ou monossílabo deveria se escrever como uma única letra, mas seja, quem lê e escreve constrói significados unindo todo o quando se coloca uma letra só o escrito não pode ser lido, ou seu conhecimento de mundo, seus esquemas mentais seja, não é interpretável); além disso, há contradição entre a relacionados ao conteúdo tratado no texto, às informações interpretação silábica e as escritas produzidas pelos adultos oferecidas pelo autor, expressas no papel. (que têm sempre mais letras do que as que a hipótese Conforme afirma Solé (1998), uma estratégia poderia ser silábica permite antecipar) (Ferreiro, 1979, p. 35).
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 14 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Para aprender a ler e a escrever é preciso pensar sobre se acomodar a essa teoria, o processo é caracterizado por a escrita, pensar sobre o que a escrita representa e como ela um investimento na cópia, na escrita sob ditado, na apresenta graficamente a linguagem. Algumas reflexões memorização pura e simples, na utilização da memória de didáticas favorecem especialmente a análise e a reflexão curto prazo para reconhecimento das famílias silábicas sobre o sistema alfabético de escrita e a correspondência quando o professor toma a leitura. Essa forma de trabalhar fonográfica. São atividades que exigem atenção à análise está relacionada à crença de que, primeiro, os alunos têm de tanto quantitativa como qualitativa, à correspondência entre aprender a ler e escrever dentro do sistema alfabético, segmentos falados e escritos. São situações privilegiadas de fazendo uma leitura mecânica, para só depois adquirir uma atividades epilinguísticas, em que basicamente o aluno leitura compreensiva. precisa Quando se trata de sair de um modelo de aprendizagem - Ler, embora não saiba ler; empirista para um modelo sociointeracionista, é preciso - Escrever, apesar de ainda não saber escrever. reconstruir toda a prática a partir de um novo paradigma teórico. O conhecimento não é concebido como cópia do Em ambas é necessário que ele ponha em jogo tudo o real, incorporado diretamente pelo sujeito, mas sim como que sabe sobre a escrita, para poder realizá-las. Nas uma atividade, por parte de quem aprende, na qual os novos atividades de “leitura”, o aluno precisa analisar todos os conhecimentos se organizam e se integram aos já indicadores disponíveis para descobrir o significado do existentes. Em se tratando da língua escrita, a aprendizagem escrito e realizar a “leitura” de duas formas: deve ser oferecida de forma funcional, isto é, tal como é - Pelo ajuste da “leitura” do texto, que conhece de cor, usada realmente. Quando alguém aprende a escrever, está aos segmentos escritos; aprendendo ao mesmo tempo muitos outros conteúdos além - Pela combinação de estratégias e antecipação (a partir do bê-á-bá, do sistema de escrita alfabética, por exemplo, as de informações obtidas no contexto, por meio de pistas) com características discursivas da língua, ou seja, as formas que índices providos pelo próprio texto, em especial os ela assume em diferentes contextos e por meio dos quais se relacionados à correspondência fonográfica. realiza socialmente. Pensando assim, o professor cria situações que Portanto, a leitura pode ter várias motivações; identificar permitam ao estudante vivenciar os usos sociais que se seu objetivo permite traçar as características do processo de fazem da escrita, como a elaboração de lista de alimentos leitura a ser feito e/ou as estratégias que serão para uma festa de aniversário, a escrita de uma carta para potencializadas. O ato de ler e compreender perpassa a um colega doente, o seguimento de uma receita na cozinha simples decodificação do código escrito, pois sob ele há uma pedagógica, a produção coletiva de textos e tantas outras estrutura básica que exige do leitor que coloque em jogo atividades que fazem parte do dia a dia de uma sala de aula. todos os aspectos cognitivos e repertório pessoal. Além Participando de situações reais de escrita, pensando sobre disso, quando alguém lê algo é porque tem um objetivo, ou os usos, as características e o funcionamento da língua seja, mesmo sem perceber, há implícita à situação um escrita, o estudante aprende muito mais do que a simples motivo gerador. Outra questão pertinente a esse momento é compreensão do sistema alfabético. que, ao ler, o leitor processa seus conhecimentos, O aprendiz, nesse contexto, é um sujeito protagonista do construindo sentido. seu próprio processo de aprendizagem; alguém que é capaz Historicamente, a teoria empirista é a que vem de transformar informações em conhecimento próprio; que influenciando as representações do que é ensinar, quem é o age sobre o objeto de conhecimento, pensa sobre ele, estudante, como ele aprende, o que e como se deve ensinar. significando-o; e que interage com outras pessoas e com o Esse modelo define a aprendizagem como substituição de meio. respostas erradas por respostas certas. Como consequência, Quando se acredita que o motor da aprendizagem é o a criança precisa memorizar e fixar informações, partindo esforço do sujeito para dar sentido à informação que está das mais simples para as mais complexas. O modelo típico disponível, tem-se uma situação bastante diferente daquela de cartilha está baseado nessa visão. As cartilhas trabalham em que o aprendiz apenas introjeta a informação que lhe é numa concepção de língua escrita como transcrição de fala; oferecida da maneira como é oferecida. seus textos são construídos com a função de tornar clara Para aprender algo, é preciso haver conhecimento essa relação de transcrição. Em geral, são palavras-chave e prévio, ou seja, existe uma permanente transformação a famílias silábicas usadas repetidamente, aí se encontram partir do conhecimento já adquirido. Se, por um lado, é o que coisas como “vovô viu a uva”, “o boi baba”, “Didi dá o dado a cada um possui de conhecimento que explica as diferentes Dedé”. A função do material escrito é apenas ajudar o formas e tempos de aprendizagem de determinados estudante a perceber o sistema alfabético: que b com a faz conteúdos que estão sendo tratados, por outro sabemos que ba e por aí afora. a intervenção do professor é determinante nesse processo; Centrada nessa visão que vê a língua como pura seja nas propostas de atividades, seja na forma como fonologia, a cartilha introduz o estudante no mundo da encoraja cada um de seus estudantes a se lançar na ousadia escrita apresentando-lhe um texto que, na verdade, é apenas de aprender, o professor exerce papel de grande relevância. um agregado de frases desconexas. Poderíamos dizer que, na concepção empírica, o conhecimento está “fora” do ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS sujeito e é internalizado por meio dos sentidos, ativados pela E ADULTOS TRABALHADORES ação física e perceptual. O sujeito da aprendizagem seria “vazio” na sua origem, sendo “preenchido” pelas Contribuição de Paulo Freire na educação de jovens experiências que tem com o mundo. e adultos Nessa concepção, o aprendiz é alguém que vai juntando O analfabetismo de jovens, adultos e idosos em nosso informações. Ele aprende o ba, be, bi, bo, bu; depois o ma, país ao longo dos últimos anos foi marcado por avanços e me, mi, mo, mu; e supõe-se que, em algum momento, ao retrocessos, pois essa modalidade de ensino vem longo desse processo, tenha uma espécie de “estalo” e oportunizar pessoas a terem uma vida mais digna, inseri-los comece a perceber o que o ma, o me, o mi, o mo, o mu têm em uma sociedade letrada é oportunizar ao cidadão a em comum. Acredita-se que ele seja capaz de aprender chance de recomeçar vida nova e melhor exercer sua exatamente o que lhe ensinam e ultrapassar um pouco isso, cidadania. fazendo uma síntese a partir de determinada quantidade de Essas pessoas são o público que se dirige aos informações. Programas de alfabetização de Educação de Jovens e Algumas crianças entendem o sistema logo que Adultos. Programa, em educação, trata-se de um conjunto aprendem algumas poucas famílias silábicas, enquanto organizado de matérias e atividades ordenadas em função outras chegam ao z, de zabumba, sem compreendê-lo. Para do nível de estudos e dos objetivos pretendidos.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 15 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Geralmente os públicos atendidos pelos Programas de Muitas vezes, esses indivíduos enfrentam barreiras alfabetização vivem em condição precária, possui baixo adicionais, como a falta de tempo devido a compromissos de salário, e tem gastos com moradia, saúde, alimentação, trabalho e familiares, baixa autoestima devido ao fracasso transporte o que aumenta ainda mais seu custo de vida. Para escolar prévio, ou até mesmo dificuldades econômicas que esses cidadãos, sair do analfabetismo representa melhoria limitam seu acesso à educação formal. Neste contexto, é na condição de vida e valorização em meio à sociedade essencial desenvolver estratégias eficazes para promover a letrada, que seleciona e favorece apenas pessoas com alfabetização e a educação básica entre essa população. diploma (FONSECA, 2015). Um dos principais desafios enfrentados na alfabetização A história da EJA no Brasil está muito ligada a Paulo de jovens e adultos trabalhadores é a falta de tempo Freire. O projeto de alfabetização que foi implantado por ele disponível para frequentar aulas regulares. Muitos desses no ano de 1963 atendeu 380 trabalhadores em Angico-RN, indivíduos trabalham em jornadas longas e têm repercutindo por todo o país, mas foi bastante prejudicado responsabilidades familiares, o que torna difícil encontrar pelo golpe militar de 1964 (FREIRE, 2013; CARDOSO; tempo para dedicar-se aos estudos. Nesse sentido, é PASSOS, 2019). importante oferecer opções flexíveis de educação, como Esse programa se configura como uma inovação na cursos noturnos, finais de semana ou aulas online, que se educação brasileira, tanto por buscar atender uma camada adequem à disponibilidade de tempo desses alunos. da população já excluída do processo educacional, quanto Além disso, é fundamental adaptar os métodos de ensino por buscar a integração entre formação geral e profissional e e aprendizagem para atender às necessidades específicas que pode significar efetivamente o acesso dos trabalhadores dos jovens e adultos trabalhadores. Isso inclui o uso de que apresentam distorção idade/escolaridade a um ensino abordagens pedagógicas mais práticas e contextualizadas, que possibilite qualidade na formação geral e na profissional que estejam relacionadas com as experiências e (VIRIATO; GOTARDO, 2009). conhecimentos prévios dos alunos, bem como o uso de As pesquisas mostram que os anos 50 ficaram marcados materiais educativos que sejam relevantes e acessíveis para pelo surgimento diferente de alfabetizar do educador Paulo esse público. Freire e ainda dos círculos populares de cultura, Outro desafio importante é a superação das barreiras acontecimentos esses que proporcionaram a sistematização emocionais e psicológicas que muitos jovens e adultos de um ideário e de experiências que se conhece hoje como trabalhadores enfrentam em relação à aprendizagem. Muitos educação popular. desses alunos podem ter baixa autoestima devido a O método Paulo Freire tinha como principal experiências anteriores de fracasso escolar ou a sentimentos característica, e que acaba chamando muito a atenção dos de vergonha em relação à sua falta de habilidades de leitura educadores e políticos por isso, seu método acelerava o e escrita. Nesse sentido, é essencial criar um ambiente de processo de alfabetização de adultos e tinha como ponto aprendizagem acolhedor e inclusivo, onde os alunos se fundamental as palavras geradoras, sendo assim pode sintam seguros para expressar suas dificuldades e receber afirmar que seu método consiste em três momentos apoio emocional e acadêmico adequado. entrelaçados: Além disso, é importante reconhecer e valorizar as O primeiro momento é a investigação temática, pela qual habilidades e conhecimentos prévios dos jovens e adultos professor e aluno buscam, no universo vocabular do trabalhadores. Muitos desses alunos têm experiências de educando e da sociedade onde vive as palavras e temas vida e trabalho que podem ser aproveitadas como recursos centrais de sua biografia. Esta é a etapa da descoberta do para o processo de aprendizagem. Portanto, é essencial criar universo vocabular, em que são levantadas as palavras e oportunidades para que esses alunos compartilhem suas temas geradores relacionados com a vida cotidiana dos alfabetizandos e do grupo social a que eles pertencem. experiências e conhecimentos com os colegas e se sintam Essas palavras geradoras são selecionadas em função da valorizados como membros da comunidade educacional. riqueza silábica, do valor fonético e principalmente em Por fim, é fundamental garantir o acesso igualitário à função do significado social, trazendo a cultura do aluno para educação básica para todos os jovens e adultos dentro da sala de aula. O segundo momento a tematização, trabalhadores, independentemente de sua condição pela qual professor e aluno codificam e descodificam esses socioeconômica, raça, gênero ou outras características. Isso temas, buscando seu significado social, tomando assim requer investimentos significativos em políticas públicas e consciência do mundo vivido e é nesta fase que são programas educacionais que visem atender às necessidades elaboradas as fichas para a decomposição das famílias específicas desse público e promover a igualdade de fonéticas dando para a leitura e a escrita. O terceiro, a oportunidades na educação. problematização na qual eles buscam superar uma primeira Em resumo, a alfabetização de jovens e adultos visão mágica por uma visão crítica, partindo para a trabalhadores é um desafio complexo que requer transformação do contexto vivido, nesta ida e vinda do abordagens pedagógicas flexíveis, sensíveis às concreto para o abstrato e do abstrato para o concreto, volta- necessidades e realidades desse público. Ao reconhecer e se ao concreto problematizando, descobrindo limites e valorizar as experiências e conhecimentos prévios dos possibilidades existenciais captadas na primeira etapa. A alunos, criar ambientes de aprendizagem acolhedores e realidade opressiva é experimentada como um processo inclusivos, e garantir o acesso igualitário à educação básica, passível de superação, a educação para a libertação deve podemos promover a alfabetização e o desenvolvimento desembocar na práxis transformadora. (FREIRE, 1979, pessoal e profissional desses indivíduos, contribuindo para p.72). uma sociedade mais justa e inclusiva. Portanto, percebe-se que Paulo Freire elabora uma forma de educação baseado na interdisciplinaridade, PRÁTICAS DE LEITURA E ESCRITA COM BEBÊS E objetivando sempre a libertação dos oprimidos, ou seja, a CRIANÇAS. LIVROS INFANTIS: ACERVOS E MEDIAÇÕES humanização do mundo por meio da ação cultural libertadora, eliminando os métodos lógicos mecanicistas que considera a consciência como criadora da realidade, e o A literatura infantil sempre esteve e está presente em mecanismo objetivismo, que considera a consciência como nossas vidas muito antes da leitura e da escrita, seja por cópia da realidade. meio das cantigas de ninar, das brincadeiras de roda ou das contações de histórias realizadas pelos familiares. Porém Desafios e Estratégias na Alfabetização de Jovens e quando as crianças chegam à escola é que a literatura passa Adultos Trabalhadores a ter o poder de construir uma ligação lúdica entre o mundo A alfabetização de jovens e adultos trabalhadores é um da imaginação, dos símbolos subjetivos, e o mundo da desafio significativo em muitos países ao redor do mundo. escrita, dos signos convencionais impostos pela cultura sistematizada.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 16 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Sabemos que a partir do momento em que a criança tem aspectos do livro e da leitura. Afirmando que o mesmo livro acesso ao mundo da leitura, ela passa a buscar novos textos que une pode separar. “Os contos, as histórias, as cantigas literários, faz novas descobertas e consequentemente amplia de ninar ajudam nessa importante tarefa de comunicação, de a compreensão de si e do mundo que a cerca. Nesse elo entre a criança e seus pais, mas permite também a cenário, professores e coordenadores pedagógicos devem construção de um espaço próprio da criança, que sua atuar em sintonia, assegurando que o trabalho com a imaginação permite criar”. literatura infantil aconteça de forma dinâmica, por meio de Outro aspecto relevante, de acordo com a mesma autora práticas docentes geradoras de estímulos e capazes de Parreiras (2012), é a importância do adulto se propor a influenciar de maneira significativa o desenvolvimento de aprender com a criança, saber escutá-la em sua habilidades orais, leitoras e escritoras. A contação diária de individualidade como um ser de características próprias e histórias é bastante significativa, porque proporciona um únicas. momento mágico de valor educativo sem igual na correlação Do ventre ao colo, do som a literatura, título da obra de destes três eixos: leitura, escrita e oralidade. Parreiras (2012), nos remete à ideia do quanto somos As atividades de leitura devem ocorrer desde os imersos na linguagem, na troca corporal e afetiva, por isso, é primeiros dias de aula, mesmo com crianças que ainda não tão importante o contato do bebê desde o ventre da mãe, conhecem nenhuma letra, pois, por meio da visão e da com a Literatura, criando-se elos afetivos e não somente audição, elas realizam a leitura de ilustrações e cognitivos. acompanham a leitura do texto feita pelo professor. Nessa Para Parreiras (2012), pode-se perceber, que as fase inicial, em contato com os livros, elas aprendem a transformações emocionais da mãe na gravidez são um manuseá-los, a reconhecer suas formas, a perceber a misto de sentimentos que se alternam, assim, como o feto diagramação e iniciam suas experiências com os modos de sente a mãe, a mãe sente o filho, o que demonstra o quão composição textual. Uma boa obra literária é aquela que importante é a troca de sensações, pois é recíproca, isto apresenta a realidade de forma nova e criativa, deixando posto; o bebê ainda no ventre é capaz de apreciar as espaço para o leitor descobrir o que está nas entrelinhas do sensações da leitura e se beneficiar com elas. texto. Ainda nesse contexto, há que se falar sobre a A interação da criança com a literatura possibilita uma importância de se estreitar o elo entre filhos e pais, pelo formação rica em aspectos lúdicos, imaginativos e motivo de que essa relação salutar faz com que no futuro o simbólicos. O desenvolvimento dessa interação, com sujeito em formação seja um indivíduo seguro e mais feliz. procedimentos pedagógicos adequados, leva a criança a compreender melhor o texto e seu contexto. A literatura infantil e o auxílio do professor Com o intuito de formar leitores, a literatura A Literatura Infantil tem papel importante para o especializada aconselha os professores e a escola a utilizar aprendizado da criança, pois relaciona essa com suas alguns procedimentos pedagógicos como: convívio contínuo experiências pessoais. Nesse sentido, a criança amplia o com histórias, livros e leitores; valorização do momento da senso crítico, quando, no momento de uma leitura, ela fala, leitura; disponibilidade de um acervo variado; tempo para ler, pergunta e aceita ou não a opinião do autor, também amplia sem interrupções; espaço físico agradável e estimulante; a arte por meio da fantasia alcançando espaço sem fim na ambiente de segurança psicológica e de tolerância dos sua imaginação, com resultado de novos textos, pinturas, educadores em relação às singularidades e às dificuldades desenhos, colagens etc. de aprendizagem de cada criança; oportunidades para que A literatura é essencial por evidenciar uma visão de expressem, registrem e compartilhem interpretações e mundo, e cria o próprio mundo interagindo com ambos emoções vividas nas experiências de leitura; acesso à (BARROS, 2013) Segundo Mallmann (2011, p.14), “a orientação qualificada sobre por que ler, o que ler, como ler e literatura infantil é um recurso fundamental e significativo, quando ler. Nessa perspectiva, é importante ressaltar a para a formação do sujeito, de um leitor crítico e ainda pode relevância do contato permanente das crianças com os desenvolver os valores morais”. Considerada uma grande livros, para que elas possam conviver com suas histórias auxiliadora durante o processo de alfabetização, a literatura desde cedo. infantil auxilia e facilita o aprendizado, e também desenvolve O trabalho com a literatura infantil deve ter como um dos a imaginação, a criatividade e o prazer por ler. pontos norteadores a preocupação em formar leitores Colocar a literatura infantil no processo de alfabetização autônomos e críticos. Isso exige dos professores um olhar e aprendizado das letras tem por significado incluir a criança atento e tenaz para as metodologias que devem ser em um mundo de aprendizado lúdico e com prazer, onde há empregadas, bem como para o material a ser utilizado (livros um maior estímulo ao aprender a ler e escrever, ela permite só com textos; livros com textos e imagens; livros só com que a criança vivencie situações, que no cotidiano não é imagens; livros com recursos audiovisuais, entre outros). É possível (MATHEUS, 2014). importante ressaltar que esses materiais, quando bem A criança precisa habituar com a variedade de textos e trabalhados, atraem bastante as crianças. Além disso, estilos desde o começo da vida na escola, isso acontece podem ser explorados em atividades de ordenação das porque nessa fase da escola, a criança se encontra em narrativas e de (re)criação de histórias orais ou escritas. processo de aprendizado e de desenvolvimento de suas capacidades, mesmo que não tenha domínio da língua, ela Literatura e desenvolvimento infantil necessita dessa relação com a literatura para no futuro, Com a Literatura absorvida pode-se chegar a épocas nas serem leitores críticos. Este é o instante de incentivar a quais não se pode mais viver. Com a leitura pode-se ainda habilidade de compreender e de pensar da criança transportar-se a lugares distantes e inatingíveis, entra-se em (MALLMANN, 2011). contato com pessoas que nunca serão conhecidas A literatura infantil tem a capacidade de trazer um pessoalmente. E isso desde a mais tenra infância. emaranhado de emoções, sentimentos, sentidos e Quando da admiração, com a magia, o colorido, a forma significados, a partir da sua interação com o meio em que a e a maneira de cada criança; ao sentir a leitura (estória) que criança vive, através dos livros adaptados para o perfil dessa se é contada, com surpresas e olhinhos brilhantes, ao ouvir criança. Nesse instante inicia o encantamento da criança ou sentir a festa de palavras; começa aí a formação de pela literatura, porque estão num período de mesclar fantasia leitores não só pela fala, mas pelas páginas impressas. e realidade, e a nesse sentido a literatura infantil propicia o De acordo com Abramovich (1993) o intérprete deve desenvolvimento da imaginação, pensamentos e valores atribuir veracidade ao enredo de forma tal que o ouvinte morais de maneira prazerosa. A literatura transmite valores tenha despertado em si o desejo de participar da estória, positivos como o respeito ao próximo, a solidariedade, o passando a vê-la como real, empolgar-se com o depois e até respeito à natureza e a autonomia, tendo uma contribuição modifica-la. Parreiras (2012, p. 86), ressalta diversos importante para a criação de cidadãos mais solidários.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 17 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Para que os alunos criem gosto pela literatura, os incitar a criança a aprender a ler e escrever”. professores das séries iniciais têm como meta incluir os É preciso que o professor esteja sempre lendo para os alunos no mundo da leitura, é indispensável que esses alunos e estimulando-os a ler, pois, a leitura é um profissionais que ensinam práticas de leitura para crianças componente da educação sendo um processo, aponta para a tenham conhecimento das concepções de linguagem e de necessidade de buscas constantes de conhecimento, pois é leitura que se ampliaram com o tempo (SCANTAMBURLO, lendo cada vez mais que aprendemos a ler e a escrever com 2012). competência. Destacando a influência do meio cultural e o empenho ANTUNES (2004, p. 60) observa que a maturidade de dos professores, é possível que o aluno das séries iniciais escrever textos adequados e relevantes “é uma conquista, compreendam o quanto é importante o hábito de ler, e assim, uma aquisição, isto é, não acontece gratuitamente, por ter o entendimento que a leitura em relação a literatura acaso, sem ensino, sem esforço, sem persistência. Supõe demanda uma estrutura concentrada de movimentos orientação, vontade, determinação, exercício, prática, contínuos de um texto que estando no seu natural será bem tentativas”. codificado (SCANTAMBURLO, 2012). A literatura é A escola tem uma responsabilidade ao ser a facilitadora imprescindível na escola por ser a ferramenta necessária e formadora de seus alunos. O professor por sua vez, com para que a criança entenda o que verificar ao seu redor, suas habilidades e técnicas, deverá levar o aluno ao gosto tenha capacidade de explicar diversas situações e eleger de ler e o prazer em escrever, garantindo a construção dos caminhos com os quais se reconhece. Porém, diversos conhecimentos necessários para a aprendizagem das professores não conhecem como a leitura e a literatura é crianças. importante, resumindo sua prática pedagógica, diversas O prazer da leitura e escrita vezes, em textos que se repetem com exercícios Formar leitores e escritores é algo que requer condições direcionados e sem liberdade, nos quais a área de reflexão favoráveis para a prática de leitura e escrita. Portanto, para sobre si e sobre o mundo dificilmente encontra lugar que este prazer seja despertado nas crianças é relevante (BARROS, 2013). que o educador tenha uma relação favorável com a leitura e Assim, é preciso que no ambiente escolar o professor a escrita. Assim, ele certamente terá mais chances de trazer estabeleça situações em que a criança tenha capacidade de seus alunos para este universo, pois, funcionará como efetuar sua própria leitura, mesmo que de maneira não modelo de referência para os mesmos. tradicional, desenvolvendo uma maneira crítica e específica Conforme o Referencial Curricular Nacional da Educação de pensar (BARROS, 2013). Infantil (BRASIL, 1998, p.135): É necessário ao professor ter preocupação com a A leitura pelo professor de textos escritos, em voz alta, criança, disponibilizando a ela, textos e leituras adequadas e em situações que permitem a atenção e a escuta das diversas para cada idade. É imprescindível que os crianças, seja na sala, no parque debaixo de uma árvore, professores das séries iniciais se mobilizem em favor das antes de dormir, numa atividade específica para tal fim etc., crianças incentivando-as à leitura, através dos livros fornece às crianças um repertório rico em oralidade e em sua adaptados para eles (SCANTAMBURLO, 2012). O professor relação com a escrita. exerce papel fundamental dentro do processo de Cabe ao educador a tarefa de apresentar uma aprendizagem em relação à literatura infantil, ele precisa ser diversidade de livros e de diferentes gêneros textuais que o parceiro, intercessor e articulador de muitas e diversas promovam o interesse da criança e ampliem suas leituras, e sabem que a literatura precisa servir como capacidades comunicativas, levando-as para o mundo da maneira de enriquecimento. O desejo do professor deve ser escrita, pois, o despertar pela leitura prazerosa irá contribuir o de despertar nas crianças o prazer e gosto pela leitura, para que a criança comece a compreender o processo de destacando que essa tem necessidade de ser prazerosa e escrita e possam apropriar-se dela com autonomia. Através feita por lazer, sendo um estudo com entretenimento da maneira como o professor conduzirá as leituras com (BARROS, 2013). estratégias dinâmicas, os alunos se sentirão motivados a A atuação do professor com o propósito de fomentar a estarem sempre lendo, desta forma ampliando seus alfabetização no ambiente escolar, utilizando várias vertentes conhecimentos, como também sentindo a vontade e o prazer oferecidas pela Literatura Infantil, necessita ser uma ação de de produzirem seus textos. Contudo, a proximidade com o maneira a propiciar divertimento e uma leitura significativa mundo da escrita, por sua vez, facilita a aprendizagem, para as crianças, sem dispor do ensino da tradicional preparando as crianças para a continuidade dos estudos. gramática ou da ortografia como ênfase principal, mas sempre dando estímulo ao prazer de ouvir, ver e ler. A importância do ensino de literatura e leitura em sala de aula A indissociabilidade do ato de ler e escrever O processo do ensino de Literatura e leitura em sala de A leitura é um processo que está ligado a escrita, pois, aula requer renovações de conceitos e práticas elas se complementam, ou seja, são duas faces de uma metodológicas superando as metodologias tradicionais tão mesma moeda. Da mesma forma que a leitura não pode ser presentes no ensino. só decifração, a escrita não se inicia no ato de escrever. A leitura literária é tema de discussão onde os teóricos Ambas precisam ser desenvolvidas com significado para a questionam seu desenvolvimento para compreensão da criança. realidade da sociedade. Além disso, para que se tenha um Geralmente quando a criança é incentivada ao hábito da melhor aproveitamento do uso de textos antigos, já que leitura e desperta pelo prazer de estar lendo diariamente, ela alguns professores que desenvolvem no aluno a ideia de que passa a ter um excelente avanço na escrita, ou seja, ela a Literatura não faz parte do mundo contemporâneo, escreve as palavras corretamente e evolui progressivamente tornando sem proveito o seu estudo. em suas produções textuais, tendo ideias mais avançadas. Definindo a importância da Literatura em sala de aula, “A leitura seria a ponte para o processo educacional Martins (2005) diz que aprender a ler significa também eficiente, proporcionando a formação integral do indivíduo”. “aprender a ler o mundo, dar sentido a ele e a nós próprios, o (MARTINS, 1994, p.25 ). que, mal ou bem, fazemos mesmo sem ser ensinados”. Por esse motivo, notamos que é função primordial e Diante disso, o professor deve apresentar ao aluno o texto essencial da escola o ensinar a ler como também ampliar o literário ou não literário como um conjunto de produções em domínio da leitura e orientar por meio dos professores a linguagem carregada de sentidos. Isso significa universalizar, escolha dos materiais de leitura. Cabe formalmente a escola, na escola, a concepção de leitura como uma modalidade desenvolver na criança as relações entre leitura e escrita em artística de linguagem que veicula componentes temáticos e todas as suas interfaces. “O uso significativo da leitura e da ideológicos a partir dos quais é possível aprimorar a escrita na escola, também é muito motivador e contribui para compreensão das diversidades sociais, econômicas e culturais do mundo em que vivemos.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 18 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Percebe-se que a Literatura é tão importante quanto os los mais especificamente. Neste sentido, estreitamente demais conhecimentos transmitidos aos alunos do Ensino ligado com o ensino/aprendizagem de Literatura e leitura, é Médio. O ensino da literatura, bem como o de outras artes, essencial à compreensão do ato de ler. desenvolve o cumprimento do art. 35 da Lei de Diretrizes e Ao relevar a leitura como importância no ensino escolar Bases do Ensino Médio, que preceitua como um de seus do indivíduo, estão ato de ler, para que possa possibilitar o objetivos no inciso lll: “aprimoramento do educando como desenvolvimento de capacidades cognitiva e intelectual. As pessoa humana, incluindo a formação ética e o escolas e os professores têm um grande obstáculo a desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento superar, que é formar leitores críticos, reflexivos e crítico” (BRASIL,1996). conscientes. Caberia então à Literatura e à escola ter como meta o desenvolvimento do humanismo, da autonomia intelectual e A leitura desde o berço do pensamento crítico, não importando se o educando Atualmente, diversos estudos vêm abordando a questão continuará os estudos ou ingressará no mercado de trabalho. da leitura e a sua importância para o desenvolvimento dos Desta forma, caberia ao professor o papel de formar o bebês. É fato que a literatura está presente em nosso leitor literário, ou seja, um leitor reflexivo, crítico, que sabe cotidiano, inclusive dos bebês, em diferentes formas, desde apropriar-se daquilo que tem direito, visto. aquelas mais informais (como nas cantigas de ninar, Assim, quando o aluno não tem interesse pela leitura parlendas) até as materializadas nos livros de imagens, literária, cabe ao professor motivá-lo com suas habilidades. É álbuns com palavras, contos infantis, poesias, dentre outros. preciso que a escola e o professor criem e organizem O contato precoce com a literatura estimula a condições para que os discentes do Ensino Fundamental imaginação e também permite que o bebê construa possam praticar a leitura literária. O professor tem que estar conhecimento sobre o mundo, sobre as pessoas e sobre si envolvido com o ato de ler, onde o aluno possa fazer da mesmo. É também um recurso que oferece elementos para leitura um hábito e este se torne um processo de construir seu mundo simbólico, o que é fundamental para o aprendizagem, onde a leitura possa ser desenvolvida desenvolvimento cognitivo e linguístico. Sendo assim, a juntamente com a compreensão e a interpretação por meios relação com livros e leitura contribui para o desenvolvimento diversos. integral do bebê, conforme destacam Vigotski (2009), Reyes Além disso, é necessário que os alunos tenham acesso (2010), Lopez (2016) e Faria (2016), dentre outros ao mundo letrado e que a escola e os professores ampliem estudiosos da área. suas tarefas ao ensino da leitura e fortaleçam os meios para Em seus estudos sobre bebês e leitura, Reyes (2010) que o discente possa se dedicar a esta tarefa essencial à defende que as mediações de leitura podem começar antes sua formação. A leitura desempenha um papel fundamental mesmo do nascimento do bebê, quando a gestante lê e no nível individual e coletivo do aluno, contribuindo para seu canta em voz alta para o feto. Desse modo, as experiências enriquecimento pessoal, possibilitando-o a ter uma visão real que o feto tem são as sonoras, associadas ao barulho das do mundo. pulsações, dentre outros sons. Com o desenvolvimento da Kleiman (2001) afirma que: “ninguém consegue fazer audição no decorrer das primeiras semanas de vida aquilo que é difícil demais, nem aquilo do qual não consegue intrauterina, o feto já percebe novos sons e distingue a voz extrair sentido” (p.16). Neste contexto, cabe ao professor materna e de outras pessoas que estão ao redor. Embora negociar para poder ensinar, é preciso usar estratégias de não distinga o conteúdo daquilo que a mãe canta ou fala, o leituras. Nesse sentido Lajolo (1997) afirma que todas “as contato com as histórias, as cantigas e outras formas atividades escolares das quais o texto participa precisam ter literárias já pode existir desde o período gestacional e esse sentido, para que o texto resguarde seu significado maior.”. contato terá repercussões no desenvolvimento integral do Uma saída seria o professor fornecer modelos de bebê. estratégias, fazendo com que o aluno interaja com o texto, Sendo assim, ao nascer, o bebê reconhece a voz com o professor e com o restante da turma. Inclusive porque materna e aquelas experiências precoces de leitura também “para elaboração de uma hipótese de leitura é necessário contribuem para fortalecer os vínculos de afeto entre mãe e ativar o conhecimento prévio do leitor sobre o assunto” até bebê. Nesse processo, a criança aprende a distinguir que este se torne um “leitor experiente”, ou seja, até que sua emissões sonoras e vai construindo sua capacidade de leitura se torne uma atividade consciente, reflexiva e compreender e de se comunicar verbalmente. Por sua vez, a intencional. (KLEIMAN, 2001, p.56). mãe também aprende a “ler” o choro, para poder atender às A Literatura como uma disciplina que envolve necessidades de seu bebê, e é daí que inicia a comunicação conhecimentos variados, necessita de complementação entre eles (LÓPEZ, 2016). teórica que facilite a compreensão do aluno com o texto. O Pode-se afirmar, portanto, que se estabelece uma professor pode, assim, fornecer materiais que facilitem a relação precoce de afeto entre o mediador, o livro e o bebê. compreensão e façam com que o aluno se sinta motivado a Reyes (2010), afirma que as situações de leitura com bebês buscar novas fontes para sanar suas dificuldades e estabelecem um “ritual” que se transforma em um “triangulo” curiosidades. Segundo Mazzoni (2003), na “formação formado pelo bebê, o mediador e juntos trabalham um intelectual, que envolve um processo lento e contínuo, é terceiro elemento que é “o livro”, formando assim uma ponte necessário que o professor esteja qualificado e apto a para o conhecimento de si e do outro, mediado por afetos. motivar alunos com pensamentos mais críticos, e para que Outra dimensão que pode ser identificada quando estes busquem seu próprio conhecimento intelectual”. tratamos de bebês leitores são os aspectos cognitivos que (2003.p.1) estão relacionados também ao interesse e o prazer pela Cândido (2000) afirma que a “posição social [do artista] é leitura e pela literatura em si. A leitura ajuda a criança a um aspecto da estrutura da sociedade”. E, ainda, “o público é desenvolver a comunicação, enriquecendo o vocabulário e o fator de ligação entre o autor e sua obra”. (p.p. 22-3). Ao estimulando a imaginação e a percepção e outras dimensões levar o leitor a perceber tal fato, o autor propõe exagerar que influem no pensamento e na criatividade (FARIA, 2016; essas “verdades” a fim de que o aluno se sinta interessado VIGOTSKI, 2009). em analisar não somente a intimidade das obras, como Quando tratamos sobre bebês leitores destacamos, também os fatores internos que participam de sua portanto, que a mediação desde cedo proporciona diversos construção através do social e das características que benefícios ao bebê. O contato com livros acaba ajudando a tornam o texto uma obra de arte. criança a compreender e a cultivar o gosto pela leitura, como Há vários fatores que prejudicam o ensino da Literatura. também a ouvir e a se concentrar nas histórias Desde as estruturas físicas da sala de aula e da escola, até proporcionando aos pequenos a capacidade de pensar sobre fatores externos que dificultam o acesso a livros literários ou a realidade ampliando assim o seu universo simbólico e sua de estudos da Literatura. Aos poucos, pretende-se apontá- capacidade de perceber e de se posicionar no mundo.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 19 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Na perspectiva sociointeracionista, entende-se que o eram contadas somente pelos pais e avós na cabeceira da desenvolvimento do bebê em contato com histórias e livros cama ou ao redor de uma fogueira. No entanto, na passa, necessariamente, pelas interações sociais e atualidade e em contextos urbanos, a contação se tornou simbólicas nelas envolvidas. uma profissão e está presente na família como também nas rotinas de creches, CMEIs e escolas. No atual contexto, Interação bebê, mediador e processo criativo muitas vezes é através do mediador que os bebês conhecem Conforme anunciado na apresentação deste artigo, esse mundo mágico e fascinante. Sendo assim, Jambersi adotamos como referencial a teoria de desenvolvimento e da (2012), nos mostra que existem várias possibilidades de aprendizagem da criança inspirada nos estudos de Vigostki propiciar contato com histórias, tanto no ambiente familiar (2009). O autor destaca a linguagem e principalmente a como na Educação Infantil, que permitirá ao mediador linguagem literária, e a sua importância para o contribuir para o desenvolvimento cognitivo do bebê. desenvolvimento da memória, da imaginação, da emoção e Se é importante que o adulto esteja presente na da linguagem da criança. Vigotski dedicou anos de estudos introdução de práticas culturais como são a roda de leitura e para compreender a relação entre a imaginação e a criação a contação de histórias, é possível também perceber que a na infância, direcionando pesquisas que tinham como cada história contada, o bebê também atua de forma a objetivo analisar o desenvolvimento oral e cognitivo da contribuir para o desenvolvimento dessas ações. Sendo criança. assim, [...] os comportamentos infantis podem ser Para o psicólogo soviético, mesmo antes de dominar a influenciados pelo ambiente físico e social organizado pelos linguagem oral a criança demonstra capacidade de resolver adultos de acordo com os seus objetivos e suas concepções problemas práticos, de utilizar instrumentos e meios que sobre os comportamentos e desenvolvimento infantil. Por estejam a seu alcance para atingir seus objetivos. Antes de outro lado, a criança participa ativamente de seu adquirir a linguagem oral, os bebês também recorrem a desenvolvimento através de suas relações com o ambiente manifestações verbais, como o choro e o riso, manifestações físico e social, dentro de um contexto-histórico específico. estas que têm a função de aliviar emocionalmente, mas (RAMOS, 2010, P. 39). Para que esse desenvolvimento também servem como um meio de comunicação, ocorra, destaca-se a influência primeiro da família e depois especialmente a partir da interpretação que o adulto dá para da escola. Entendemos que os “pais são mediadores de a intenção expressa pela criança. leitura por excelência, por ocuparem lugar privilegiado no Além do desenvolvimento da oralidade, para Vigotski a que diz respeito à oferta dos livros e de outros materiais de imaginação criativa mobilizada pela literatura também leitura no âmbito domiciliar, transformando-o em um contribui, de modo geral, para o desenvolvimento cognitivo. ambiente leitor” (ROBLEDO, 2010, p. 40). No ambiente de Conforme a sua teoria, ele defende que tanto os fatores creche e do CMEI, também se espera que outros adultos emocionais quanto os intelectuais são imprescindíveis para o proporcionem o contato da criança com livros e histórias, ato da criação. Segundo o autor, isso gera necessidades, lendo em voz alta para elas (DAHER, 2017). anseios e desejos que põem em movimento o processo de imaginação. De acordo com Vigotski (2009), em todo Importância dos livros infantis e da medicação no processo de educação da criança, a imaginação não tem processo da leitura apenas um significado particular do exercício e do A literatura infantil desempenha um papel fundamental desenvolvimento de alguma função separada, mas um no desenvolvimento cognitivo, emocional e social das significado geral que se reflete em todo o comportamento crianças, além de estimular a imaginação, a criatividade e o humano. gosto pela leitura desde cedo. Neste contexto, os acervos e Ao abordar o tema da criação literária na idade escolar, mediações de livros infantis desempenham um papel crucial ele convida os pedagogos a refletirem sobre os na promoção do acesso, da apreciação e do engajamento procedimentos didáticos que as escolas promovem, ao das crianças com a literatura. Neste texto, discutiremos a afirmar que a: importância dos acervos e das mediações de livros infantis e Educação, entendida correta e cientificamente, não como eles podem contribuir para o desenvolvimento infantil. significa infundir de maneira artificial, de fora, ideais, Em primeiro lugar, é importante destacar a importância sentimentos e ânimos totalmente estranhos às crianças. A de disponibilizar acervos variados e ricos em livros infantis educação correta consiste em despertar na criança aquilo em diferentes contextos, como escolas, bibliotecas, creches que existe nela, ajudar para que isso de desenvolva e e espaços comunitários. Esses acervos devem incluir uma orientar esse desenvolvimento para algum lado (VIGOTSKI, ampla diversidade de gêneros, estilos, autores e temas, para 2009, p. 72). atender às diferentes preferências e interesses das crianças, De um modo geral ele nos mostra que o campo bem como promover a diversidade cultural e social. Além educacional não só aborda questões relacionadas aos disso, é importante garantir que os livros estejam em boas procedimentos didáticos do professor, mas também supõe a condições de conservação e sejam acessíveis para todas as imersão da criança na sua cultura, a construção da sua crianças, independentemente de sua condição personalidade, e pode favorecer que a criança desenvolva socioeconômica. sua capacidade de criação oral e literária. Além da disponibilidade de livros, as mediações Neste mesmo campo de reflexões, Brandão e Rosa realizadas pelos adultos têm um papel fundamental na (2011) defendem que atividades de contação de histórias e promoção da leitura infantil. Os mediadores, sejam eles pais, rodas de leitura que ocorrem com crianças na etapa da educadores, bibliotecários ou outros profissionais, Educação Infantil além de motivarem as crianças à leitura desempenham um papel importante ao incentivar e orientar criam expectativas inserindo-as na prática social da escrita, as crianças na escolha, leitura e interpretação dos livros. estimulando o desenvolvimento e a aprendizagem de Eles podem criar momentos de leitura compartilhada, onde estratégias cognitivas que são adotadas no processo de as crianças têm a oportunidade de discutir, questionar e leitura, mesmo antes da aquisição da habilidade de ler com refletir sobre as histórias, promovendo o desenvolvimento de autonomia. Outro argumento que reforça a importância da habilidades de compreensão, análise crítica e expressão roda de histórias é apresentado por Jambersi (2012) quando oral. Além disso, os mediadores podem atuar como modelos afirma que: Um contador de histórias jamais para de de leitura, demonstrando o prazer e a importância da leitura aprender, pois, por mais que ele tenha o domínio da por meio de suas próprias práticas de leitura. Eles também oralidade, ele sempre aprenderá algo novo ao contar uma podem fornecer orientações sobre como selecionar livros história, ainda que já a tenha contado várias vezes. E, cada adequados para a idade e interesses das crianças, bem vez que contar a mesma história, ele irá se surpreender. como aproveitar ao máximo a experiência de leitura. Essas (JAMBERSI, 2012, p. 21). mediações são essenciais para promover uma relação Em outros momentos e contextos culturais, as histórias positiva e significativa com a literatura desde cedo.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 20 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Por fim, é importante destacar o papel dos livros infantis Da mesma forma que o conceito de décimo está como ferramentas de aprendizagem e desenvolvimento diretamente vinculado ao conceito de unidade, os conceitos infantil. Além de estimular a imaginação e a criatividade, os de centésimo e de milésimo estão relacionados tanto entre si livros infantis também podem contribuir para o como com o conceito de unidade; o mesmo princípio desenvolvimento da linguagem, do vocabulário, da cognição relacional está subjacente aos múltiplos da unidade, tanto e da empatia das crianças. Eles podem fornecer insights entre si como quando relacionados com a própria unidade. sobre questões complexas, como diversidade, inclusão, O estabelecimento de relações exige que se analise respeito às diferenças e valores morais, ajudando as cada situação em particular, fazendo sínteses, abstrações e crianças a compreender e lidar com o mundo ao seu redor. generalizações que possibilitem identificar o princípio geral (a sua lei matemática) que fundamenta o sistema de Livros infantis para serem trabalhados em sala de numeração decimal, caracterizado como um sistema de aula conhecimentos. Existem diversos tipos de livros infantis que podem ser Nesse sentido, o exemplo ilustra a concepção de trabalhados com crianças, cada um com suas características Vygotsky quanto à ideia de generalização ao caracterizá-la e potenciais para promover o desenvolvimento infantil de como tomada de consciência e sistematização de conceitos. diferentes maneiras. Além disso, corrobora a afirmação de que “o conceito Livros de Contos de Fadas: São clássicos da literatura científico pressupõe seu lugar definido no sistema de infantil que contam histórias fantásticas e encantadoras, conceitos, lugar esse que determina a sua relação com muitas vezes com princesas, bruxas, fadas e animais outros conceitos” (2000, p. 293). falantes. Esses livros estimulam a imaginação e a Além da generalização do princípio que constitui o criatividade das crianças, além de transmitir importantes sistema de numeração decimal como um sistema de valores morais e éticos. conhecimentos, é preciso destacar as operações Livros de Fábulas: As fábulas são histórias curtas que matemáticas que o envolvem. apresentam animais antropomórficos e transmitem lições de No processo de apropriação do significado das moral. Elas são ótimas para ensinar valores como operações com os respectivos algoritmos, o que vai sendo honestidade, solidariedade e respeito, de forma lúdica e aprofundado é o nível de consciência em relação aos divertida. conceitos e em relação ao próprio sistema de Livros de Aventura: Esses livros apresentam narrativas conhecimentos. emocionantes e cheias de suspense, que prendem a atenção No conjunto das figuras geométricas, por exemplo, pode- das crianças e as incentivam a explorar novos mundos e se distinguir entre quadriláteros, triângulos, círculos, sendo experiências. São ideais para estimular o gosto pela leitura e que a palavra quadrilátero é um signo que designa figuras a curiosidade. formadas com quatro lados (quadrado, retângulo, losango, Livros de Poesia: A poesia infantil utiliza rimas, ritmo e paralelogramo, trapézios e quadriláteros quaisquer); a imagens vívidas para cativar as crianças e despertar sua palavra trapézio, como um signo, inclui quadrados, sensibilidade artística. São ótimos para desenvolver a retângulos, losangos e paralelogramos, se considerarmos a linguagem, a criatividade e a apreciação estética desde existência de um par de lados paralelos como única cedo. característica de classificação. Livros Interativos: São livros que convidam as crianças A capacidade para classificar agrupando objetos com um a participarem da história de diferentes formas, seja por meio atributo comum pressupõe a abstração de elementos, de abas para levantar, janelas para abrir, texturas para sentir isolando-os da totalidade da experiência concreta, o que ou atividades para completar. Esses livros estimulam a requer a combinação da análise e da síntese. coordenação motora, a atenção e o engajamento das Dessa forma, cuidar para que o processo de formação crianças na leitura. de conceitos na escola seja caracterizado como um processo Livros Didáticos: Livros voltados para ensinar conceitos que possibilite a formação de sistemas de conhecimento traz específicos, como cores, números, formas, letras, animais, implicações educacionais que podem provocar mudanças entre outros. São úteis para auxiliar no processo de qualitativas para o processo ensino-aprendizagem e, por aprendizagem e desenvolvimento cognitivo das crianças de consequência, para o desenvolvimento intelectual dos maneira lúdica e divertida. participantes desse processo. Livros de Histórias Sociais: Esses livros abordam temas como diversidade, inclusão, emoções, amizade, A aprendizagem e a interação social resolução de conflitos, entre outros, de forma acessível às Apropriar-se dos sistemas de conhecimento implica crianças. São importantes para promover a compreensão e o mediação do conhecimento, o que se caracteriza como respeito às diferenças e estimular a empatia desde cedo. aprendizagem. Significa que o conhecimento como forma culturalmente ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO PARA A construída, passa a ser internalizado à medida que ocorrem ALFABETIZAÇÃO MATEMÁTICA. O LÚDICO, interações sociais, que podem se dar tanto entre as pessoas OS JOGOS E O ENSINO DA MATEMÁTICA. como entre as pessoas e os próprios objetos de conhecimento. A construção dos conceitos matemáticos A concepção de que a aprendizagem pode determinar o A necessidade de identificar a relação existente entre os desenvolvimento mental, ativando e desenvolvendo as diferentes conceitos científicos evidencia que, no processo funções psicológicas, remete-nos a uma questão que tem de sua formação, existem conceitos correlacionados que feito parte das discussões relacionadas à educação, ou seja, propiciam a sua generalização. o que é, de fato, a aprendizagem? Como se dá esse Para Vygotsky, “generalização significa ao mesmo processo? Como podemos verificar se houve aprendizagem? tempo tomada de consciência e sistematização de E ainda, a partir disso, como podemos verificar se houve conceitos” (2000, p. 292). desenvolvimento mental? Na perspectiva histórico-cultural, “nos conceitos Essas questões teóricas provocam o educador no científicos que a criança adquire na escola, a relação com sentido de planejar situações didáticas desafiadoras que um objeto é mediada, desde o início, por algum outro proporcionem a interação entre os participantes do processo conceito” (Vygotsky, 1998, p. 116). ensino-aprendizagem. Por exemplo, o conceito de unidade no sistema de E quando, de fato, acontece um processo de ensino- numeração decimal está relacionado ao conceito de número, aprendizagem, novas formas de pensamento (mais assim como o conceito de unidade está relacionado a cada evoluídas, mais avançadas) serão geradas tanto por parte do um dos conceitos que formam o respectivo sistema. aluno como por parte do professor.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 21 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS As reflexões em torno daqueles questionamentos serão envolvendo algumas profissões nas quais os conceitos feitas à luz de autores relacionados à psicologia histórico- matemáticos são utilizados, analisando para que e como são cultural. Tomemos o exemplo do sistema de numeração utilizados. Na escola, juntamente com os professores, é decimal. importante que se discutam outras formas de Para que haja a apropriação dos conhecimentos aí contextualização, que possam contribuir para a compreensão envolvidos como um sistema de conhecimentos, várias da dialética que está subjacente ao conhecimento, ou seja, a funções serão colocadas em funcionamento inter- matemática como objeto de conhecimento e a matemática relacionando-se e influenciando-se mutuamente. como ferramenta (Douady, 1996). Por exemplo, será preciso analisar cada situação proposta, comparar com outros sistemas de numeração, Os números relacionar com o conhecimento anterior, abstrair os traços Os números estão nas portas das casas, em placas de fundamentais e isolá-los momentaneamente dos rua ou dos carros, no dinheiro, no tênis e no chinelo, nas secundários, fazer sínteses, fazer o movimento de ir do etiquetas das roupas, nas páginas dos livros, na televisão particular ao geral, do geral ao particular, enfim, combinar etc. Presentes em muitos lugares, eles certamente todas essas operações mentais na busca da apropriação dos despertam a curiosidade das crianças. A Matemática significados compreendidos no sistema em questão. Esse processo será favorecido pela interação social também está em outras situações do cotidiano delas. Brincar proporcionada em sala de aula, incluindo o discurso de cada de colocar areia em potes, por exemplo, é ter contato com aluno na explicação ou defesa de suas ideias. medidas. Assim a mediação do conhecimento passa a se dar na Ajudar o professor a distribuir os materiais que a turma dinamicidade das relações que se fazem no processo vai utilizar é lidar com quantidade. Até mesmo a ensino-aprendizagem, na busca do professor e do aluno pelo movimentação de bebês pela sala ajuda a desenvolver entendimento, pela aprendizagem dos conhecimentos que noção espacial. estão sendo veiculados. Se os conceitos matemáticos estão inseridos no mundo, O processo de aprendizagem ativando e desenvolvendo nada mais natural que as crianças queiram saber mais sobre funções psicológicas, tais como de análise, síntese, eles. Elas observam tudo e desde pequenas perguntam comparação, diferenciação, abstração e generalização, muito, levantam hipóteses e fazem conclusões. Sendo a permite que o aluno avance no seu desenvolvimento, escola de Educação Infantil um espaço de descobertas e de atingindo novos níveis intelectuais. experiências diversas, a Matemática deve entrar nas Contextualização do conhecimento matemático investigações propostas pelo professor. Fazer matemática Em educação, fala-se muito em contextualização como neste período é dar sentido aos questionamentos das uma das preocupações dos envolvidos no processo ensino- crianças de maneira intencional. Focar nessa área de aprendizagem. conhecimento não significa seguir a lógica adulta de se Na realidade, pode-se falar em contextualização ou relacionar com a Matemática, nem antecipar a aprendizagem recontextualização (ressignificação). Uma das formas de do Ensino Fundamental. Tudo deve ser feito respeitando a recontextualizar o conhecimento na escola pode ser através maneira como as crianças aprendem, que é pela brincadeira, do estudo da história da ciência, e aqui, especificamente, pela observação e pelas perguntas. história da matemática. Não existe idade mínima para o planejamento de A contextualização, por sua vez, pode dar-se, por atividades relacionadas a esses conteúdos. O docente pode exemplo, através de investigações feitas pelos participantes do processo educativo - professor e aluno - que possam propor situações de acordo com a faixa etária da turma e ver identificar e analisar os conhecimentos que estão como ela reage. O importante é que as experiências deixem subjacentes às práticas sociais da comunidade escolar. de ser ocasionais e passem a ser intencionais. Só assim Se, na escola, tivermos consciência da dinâmica podem se tornar mais ricas. contextualização/descontextualização, poderemos evidenciar outras formas alternativas de contextualizar/recontextualizar Alfabetização matemática e numeramento o conhecimento na interação em sala de aula. Os Parâmetros Curriculares Nacionais para a área de Miguel (1997) discute as potencialidades pedagógicas da Matemática no ensino fundamental estão pautados por história da matemática mostrando que uma história da princípios decorrentes de estudos, pesquisas, práticas e matemática pedagogicamente orientada, que se caracteriza debates desenvolvidos nos últimos anos. São eles: como uma história viva, humana, esclarecedora e dinâmica, — A Matemática é componente importante na pode constituir-se como referência para uma prática construção da cidadania, na medida em que a sociedade se pedagógica problematizadora. Também, D’Ambrósio (1996, p. 10), ao discutir a história utiliza, cada vez mais, de conhecimentos científicos e da matemática e educação, diz que uma das finalidades recursos tecnológicos, dos quais os cidadãos devem se principais da história da matemática, para alunos, apropriar. professores, pais e público em geral, é a de “situar a — A Matemática precisa estar ao alcance de todos e a matemática como uma manifestação cultural de todos os democratização do seu ensino deve ser meta prioritária do povos em todos os tempos, (...)”, além de “mostrar que a trabalho docente. matemática que se estuda nas escolas é uma das muitas — A atividade matemática escolar não é “olhar para formas de matemática desenvolvidas pela humanidade”. coisas prontas e definitivas”, mas a construção e a Com essas concepções, os Parâmetros Curriculares apropriação de um conhecimento pelo aluno, que se servirá Nacionais apontam a história da matemática como um dele para compreender e transformar sua realidade. “instrumento de resgate da própria identidade cultural”. — No ensino da Matemática, destacam-se dois aspectos Além disso, pode constituir-se como fonte de esclarecimento de ideias matemáticas para o aluno, básicos: um consiste em relacionar observações do mundo respondendo os seus questionamentos contribuindo, assim, real com representações (esquemas, tabelas, figuras); outro para uma análise mais crítica do conhecimento (Brasil, consiste em relacionar essas representações com princípios 1997). Outra forma de contextualização se refere à e conceitos matemáticos. Nesse processo, a comunicação verificação do modo como o conhecimento matemático está tem grande importância e deve ser estimulada, levando-se o sendo utilizado em práticas sociais, principalmente nas aluno a “falar” e a “escrever” sobre Matemática, a trabalhar comunidades em que as escolas estão inseridas. com representações gráficas, desenhos, construções, a Poder-se-ia, juntamente com os alunos, fazer um estudo aprender como organizar e tratar dados.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 22 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS — Aprendizagem em Matemática está ligada à utilizadas. Esses conhecimentos servem como ponto de compreensão, isto é, à apreensão do significado; apreender partida para a construção de conceitos mais universais e o significado de um objeto ou acontecimento pressupõe vê-lo para tanto cabe à escola levar a criança a desenvolver-se e em suas relações com outros objetos e acontecimentos. se apropriar de outras novas percepções. Assim, o tratamento dos conteúdos em compartimentos A alfabetização matemática é o processo de organização estanques e numa rígida sucessão linear deve dar lugar a dos saberes que a criança traz de suas vivências anteriores uma abordagem em que as conexões sejam favorecidas e ao ingresso no Ciclo de Alfabetização, de forma a levá-la a destacadas. O significado da Matemática para o aluno construir um corpo de conhecimentos matemáticos resulta das conexões que ele estabelece entre ela e as articulados, que potencializem sua atuação na vida cidadã. demais disciplinas, entre ela e seu cotidiano e das conexões Esse é um longo processo que deverá, posteriormente, que ele estabelece entre os diferentes temas matemáticos. permitir ao sujeito utilizar as ideias matemáticas para — A seleção e organização de conteúdos não deve ter compreender o mundo no qual vive e instrumentalizá-lo para como critério único a lógica interna da Matemática. Deve-se resolver as situações desafiadoras que encontrará em sua levar em conta sua relevância social e a contribuição para o vida na sociedade. Isso não significa unicamente o domínio desenvolvimento intelectual do aluno. Trata-se de um de uma linguagem simbólica, pois os símbolos matemáticos processo permanente de construção. devem aparecer não apenas como componentes — O conhecimento matemático deve ser apresentado característicos do conhecimento matemático, mas como aos alunos como historicamente construído e em elementos criadores da comunicação. Por isso, não se trata permanente evolução. O contexto histórico possibilita ver a de tentar levar a criança a escrever corretamente os Matemática em sua prática filosófica, científica e social e algarismos ou a repetir sequências numéricas até certo contribui para a compreensão do lugar que ela tem no limite, em situações de contagem desprovidas de significado. mundo. O trabalho com as operações aritméticas vai além da — Recursos didáticos como jogos, livros, vídeos, utilização ou memorização de técnicas operatórias únicas, calculadoras, computadores e outros materiais têm um papel uma vez que a etapa de alfabetização matemática importante no processo de ensino e aprendizagem. Contudo, caracteriza-se, principalmente, pela compreensão dos eles precisam estar integrados a situações que levem ao significados das operações e de cálculo efetuado exercício da análise e da reflexão, em última instância, a mentalmente, motores do desenvolvimento da alfabetização base da atividade matemática. matemática. Trata-se então do momento em que a criança — A avaliação é parte do processo de ensino e começa a organizar estratégias mais sistematizadas que vão aprendizagem. Ela incide sobre uma grande variedade de permitir, em etapas posteriores, a compreensão de outros aspectos relativos ao desempenho dos alunos, como procedimentos de cálculo. As relações entre causa e efeito e aquisição de conceitos, domínio de procedimentos e as inferências lógicas também começam a aparecer na etapa desenvolvimento de atitudes. Mas também devem ser de alfabetização matemática. avaliados aspectos como seleção e dimensionamento dos Os estudantes começam a descobrir propriedades e conteúdos, práticas pedagógicas, condições em que se regularidades nos diversos campos da Matemática. A processa o trabalho escolar e as próprias formas de alfabetização matemática demanda a passagem por avaliação. situações que promovam a consolidação progressiva das ideias matemáticas, evitando antecipar respostas a A importância do trabalho com Matemática nos anos problemas e questionamentos vindos da criança em um iniciais A Matemática nos anos iniciais é de suma processo cuja característica é desenvolver nela o importância para os alunos, pois ela desenvolve o comportamento questionador que, como resultado final, pensamento lógico e é essencial para construção de permite desenvolver o pensamento lógico. No entanto, conhecimentos em outras áreas, além de servir como base convém notar que a sistematização excessiva e o abuso da para as séries posteriores. linguagem matemática podem ser prejudiciais ao Essa importância também é destacada nos Parâmetros desenvolvimento autônomo da criança em período de Curriculares Nacionais (1997): É importante, que a alfabetização. Matemática desempenhe, equilibrada e indissociavelmente, A alfabetização matemática não pode ser reduzida ao seu papel na formação de capacidades intelectuais, na domínio dos números e suas operações. Nessa fase de estruturação do pensamento, na agilização do raciocínio escolaridade, a criança deve construir as primeiras noções dedutivo do aluno, na sua aplicação a problemas, situações de espaço, forma e suas representações. As ideias iniciais da vida cotidiana e atividades do mundo do trabalho e no de grandezas, como comprimento e tempo, por exemplo, apoio à construção de conhecimentos em outras áreas também começam a ser organizadas no Ciclo de curriculares. Alfabetização. Apresentar aos alunos as influências que a Matemática A necessidade de organizar e de comunicar informações tem no cotidiano, ajuda na aproximação entre eles e a de maneira eficaz também faz parte do processo de disciplina, assim podendo vê-la como necessária para sua alfabetização matemática. O contato da criança com os vida. meios de comunicação pode levá-la a reconhecer tabelas e A Matemática deve causar nos alunos descobertas, e o gráficos simples, como elementos facilitadores da professor ser o mediador dos questionamentos e das compreensão de determinadas informações. A proposta de investigações, fazendo com que estas causem nos alunos alfabetização matemática é o “alfabetizar letrando”, não interesse pela disciplina. dissociando ou sequenciando os processos de alfabetização e letramento. A alfabetização matemática e a criança As formas de pensamento lógico em Matemática Como a A criança, antes de chegar à escola, desenvolve um Matemática deve ser compreendida como instrumento para conjunto de saberes matemáticos construídos em interação interpretação do mundo complexo e marcado por seus com seu meio social. Crianças brincando são capazes de diversos contextos, alguns aspectos da lógica podem ser realizar operações simples, de estabelecer categorias e âncoras para o desenvolvimento de conceitos e utilização de equivalências, de reconhecer e diferenciar figuras e formas procedimentos. Ela está presente nas conversas informais e, geométricas, de estabelecer parâmetros pessoais para medir por sua característica interdisciplinar, também está presente grandezas e de servir-se de diversos outros conceitos nos conteúdos curriculares das demais disciplinas. matemáticos. Diversas formas de pensamento lógico-matemático A relação da criança com o conhecimento matemático é, foram desenvolvendo-se ao longo da história da humanidade de início, marcadamente egocêntrica (“minha conta”, “ meu e possuem características que, em alguns casos, se número” etc.), bem como as representações por ela complementam e, em outros, parecem antagônicas.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 23 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS De maneira geral, pode-se dividir as formas de situação. pensamento lógico em três grupos mais importantes: a lógica Segundo Kishimoto (1994), o jogo estimula a exploração clássica, a lógica matemática e a lógica dialética. e a solução de problemas e, por ser livre de pressões cria A primeira estuda argumentos dedutivos, através de um clima adequado para a investigação e a busca de regras que procuram compreender o mundo por leis que se soluções. repetem, independentemente da situação ou do objeto. A O jogo pode ser trabalhado individualmente, em duplas segunda busca estabelecer, por meio de leis e regularidades, ou em grupos, mas deve ser algo em que crie um espaço de formas de pensamento e de argumentação (dedução, confiança e criatividade para ser desenvolvido de maneira indução, formulação de hipóteses etc.) dos conceitos agradável e espontânea. matemáticos. É comum identificar a lógica matemática à Por essas características é que se pode afirmar que o simbologia própria da linguagem matemática, denominando- jogo propicia situações que, podendo ser comparadas a a lógica simbólica. problemas, exigem soluções vivas, originais, rápidas. Nesse A terceira caracteriza-se por argumentar através de processo, o planejamento, a busca por melhores jogadas e a oposições (tese, antítese e síntese), buscando compreender utilização de conhecimentos adquiridos anteriormente a realidade por suas contradições ou pela própria evolução propiciam a aquisição de novas ideias, novos conhecimentos histórica dos fatos. A Matemática é uma área que favorece o [...] (SMOLE, 1996, p. 138) Os jogos trazem situações de desenvolvimento do raciocínio lógico, mas não é a única que problemas onde cada indivíduo deve encontrar o caminho o faz. No entanto, ela pode ajudar a estabelecer competência correto para chegar ao final, com isso, a criança aprende a em estruturar logicamente uma mensagem, um discurso ou desenvolver diferentes estratégias a partir de cada desafio uma argumentação, além de desenvolver a capacidade de criado nos jogos. generalização ao longo dos nove anos do Ensino Fundamental. Na alfabetização matemática, as estruturas O Jogo e a Matemática lógicas elementares – de classificação e seriação – Desde tempos atrás, nota-se os problemas do ensino da impulsionam tanto o desenvolvimento das operações matemática, onde muitos alunos não se interessam por ela, aritméticas, quanto das operações geométricas espontâneas. tornando assim o ensino da matemática cada vez monótono Para classificar, a criança estabelece relações de e maçante. semelhança, juntando objetos que possuem características Com o passar do tempo, vários métodos foram sendo comuns e separando-os dos que não possuem essas colocados em prática. Desta forma os jogos foram trazidos características. para a sala de aula, tornando o aprendizado mais lúdico. Assim, ela pode classificar objetos, alternando o atributo/ Nesta perspectiva, o jogo torna-se conteúdo assumido, com critério dos agrupamentos: separa-os pela cor, pela forma, a finalidade de desenvolver habilidades de resolução de pelo tamanho, ou por outro critério de semelhança, sempre problemas, possibilitando ao aluno a oportunidade de comunicando qual foi o atributo que escolheu para reunir os estabelecer planos de ação para atingir determinados que se parecem. Uma propriedade importante no objetivos [...] (KISHIMOTO, 2000, pp. 80 - 81) desenvolvimento da estrutura de classificação é a inclusão Os jogos, no ensino da matemática, proporcionam a de classes. Nesse sentido, é condição necessária à sensação de prazer e bem estar, devolvem o gosto pelos consolidação da estrutura lógica de classificação, e essa números, deixando a criança livre para se expressar, não propriedade estará presente na construção de conceitos de tendo medo de errar e expor as suas opiniões. todas as áreas de conhecimento e, em especial, da própria Para as crianças a serventia dos jogos, no ensino da Matemática. Para seriar, a criança estabelece relações de matemática, se tornou algo mais do que necessário para a ordem, enfileirando – do menor ao maior (série ascendente) aprendizagem, pois é jogando e brincando que todos irão se ou do maior ao menor (série descendente). Ao ser definido o entender e compreender melhor. critério de ordenação, cada elemento possuirá uma única O jogo na educação matemática passa a ter o caráter de posição na série, coordenada com a posição de seu material de ensino quando é considerado promotor de antecessor e de seu sucessor, salvo se for o primeiro ou o aprendizagem, pois é jogando e brincando que todos irão se último elemento ordenado. As crianças têm o direito de entender e compreender melhor. vivenciar diferentes contextos próprios das culturas da infância que provoquem a necessidade de estabelecer “Matematicando” ou “matematifrendo”? relações de ordem. Quando a criança é solicitada para uma A matemática na vida da criança de 0 a 6 anos e como a atividade de ordenamento, considerando a ordem da escola a faz lidar com ela: BRINCANDO ou SOFRENDO. narrativa, além de coordenar relações, seriando os objetos, A matemática se faz presente na vida do ser humano ela também é convocada a estabelecer uma desde muito cedo. Quando o bebê é amamentado de três em correspondência ordinal espaço-temporal, pois a disposição três horas, ele pode vivenciar determinados intervalos de no espaço dos elementos seriados corresponderá à ordem tempo; quando estranha pessoas que não pertencem ao temporal da narrativa ou da situação proposta. conjunto da sua família está procedendo a uma classificação. Esse tipo de relação é fundamental para a criança Ao começar a brincar com outras crianças, demonstra ter aprender a quantificar os objetos de uma coleção, como noção de quantidade quando pega para si a maior porção de também para avançar em suas concepções acerca da leitura peças de um determinado brinquedo. Antes de chegar à e da escrita, já que as relações que a criança precisa escola já conhece algumas funções dos números, utilizando- estabelecer sobre os conteúdos da língua falada e escrita os para indicar sua idade, número de telefone, da casa, etc. também são de natureza lógico-matemático. Sabe os números e também contar algumas sequências. A criança vive e brinca com a matemática durante A importância do lúdico na matemática na educação grande parte de seu tempo, independentemente da atividade infantil em que estiver envolvida. O lúdico proporciona sensação de prazer e bem estar. “No seu processo de desenvolvimento a criança vai Kishimoto (1994) afirma que o jogo é importante para o criando várias relações entre objetos e situações vivenciadas desenvolvimento infantil, porque propicia a descontração, a por ela e, sentindo a necessidade de solucionar um aquisição de regras, a expressão do imaginário e a problema, de fazer uma reflexão, estabelece relações cada apropriação do conhecimento. vez mais complexas que lhe permitirão desenvolver noções O aprendizado lúdico desenvolve a confiança, fazendo matemáticas mais e mais sofisticadas”. com que a criança participe ativamente de cada atividade Nas relações que a criança estabelece com os outros ela sem ter medo de errar. Desta forma cria-se um ambiente vivência a matemática : “Fui o primeiro a chegar....Sou mais para o trabalho em grupo, em que as crianças aprendem a alto que você...”, são comparações que se ouve compartilhar, dividir e ajudar o próximo em qualquer frequentemente entre as crianças.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 24 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Através do movimento e manipulação de objetos não irão colocar o chapéu nos pés e o sapato na cabeça. desenvolvem noções espaciais importantes para o estudo da Relacionar conjuntos de objetos tipo: três peixinhos com três geometria. Utilizam-se da contagem, agrupam, repartem, anzóis, dois pires com duas xícaras, etc., é uma atividade distribuem, para poderem organizar suas brincadeiras que pode ser superada por outras muito mais significativas. Se a matemática é algo tão natural para a criança antes Ex.: Jogar boliche, registrando os pinos derrubados. Este de entrar na escola, por que vem a tornar-se uma das registro acontecerá da forma que a criança optar: através do maiores dificuldades posteriormente? Imaginemos nossos desenho dos pinos, de traços representando os pinos alunos agindo como Marcelo (personagem da história infantil, derrubados ou do numeral correspondente, se o mesmo já “Marcelo, Marmelo, Martelo, de Ruth Rocha que resolveu for do seu conhecimento. que as coisas deveriam ter um nome mais apropriado. Por Poderíamos continuar exemplificando e certamente para exemplo: cadeira seria chamada de sentador, travesseiro de cada atividade mecânica encontraríamos uma brincadeira cabeceiro e casa de moradeira. Como definiriam nossos que contenha o mesmo conteúdo. Salientamos ainda que as alunos o ato de aprender matemática? Estariam atividades mecânicas nos remetem a duas conclusões: “Matematicando” ou “Matematifrendo”? Brincando ou - Se a criança não dominar o conteúdo, não será capaz sofrendo com a matemática? de realizar a tarefa. Considerando que brincar é a principal atividade da - Se dominar o conteúdo, a tarefa é desnecessária. criança pequena, e sabendo-se que “a criança aprende Sabemos que enquanto brincam as crianças constroem brincando, motivada pela alegria e curiosidade de descobrir a consciência da realidade, ao mesmo tempo em que vivem os segredos que a vida lhe oferece”, não podemos ignorar a uma possibilidade de modificá-la. Entendendo que um dos relevância desta atividade no que concerne à construção do objetivos da Educação Infantil é ampliar o conhecimento que conhecimento matemático. a criança já possui, a ação pedagógica deverá aproveitar os “As crianças pequenas ainda não vivenciaram as momentos em que a criança estiver “matematicando” para estereotipias trazidas por uma educação viciada, talvez não fazê-la refletir sobre sua ação, reconstruindo desta forma tenham ouvido falar da dificuldade que é aprender conceitos matemáticos mais avançados. Explorar a matemática, ou pelo menos não têm ideia do que isso matemática no corpo da criança, nos objetos, nos jogos, na significa. Assim, elas estão dispostas a transcender as natureza é uma das formas de levá-la a sentir a matemática fronteiras das quais estão pelo menos perifericamente como algo prazeroso, que está na vida e que lhe possibilita conscientes; elas se jogam em seu brinquedo, em seu compreender o mundo que a cerca. A verbalização e o trabalho e nos desafios propostos com grande dose de registro das situações matemáticas vivenciadas levarão a entusiasmo, paixão e criatividade; as crianças criança a refletir sobre as ações praticadas e a fazer uma frequentemente usam formas originais de resolver problemas análise do real. a elas colocados, não têm medo de ousar e não se intimidam As instituições de Educação infantil devem organizar o diante do novo.” Se ao lobo mau foi atribuído o papel de vilão tempo e o espaço para que a criança possa “Matematicar” e das histórias infantis, à matemática foi atribuído o mesmo não fazê-la “Matematifrer”. papel na vida escolar de nossas crianças. Sabemos que essas crianças não se acovardam diante do lobo mau. São A matemática na BNCC capazes de inventar inúmeras maneiras para derrotá-lo. Por O conhecimento matemático é necessário para todos os que, então, se acovardam frente à matemática? alunos da Educação Básica, seja por sua grande aplicação Podemos deduzir que em virtude de sua capacidade de na sociedade contemporânea, seja pelas suas fantasiar, a criança traz o lobo das páginas do livro para um potencialidades na formação de cidadãos críticos, cientes de mundo real, onde poderá utilizar-se do que conhece ou sabe suas responsabilidades sociais. que existe para dominá-lo: cordas, armas, injeção com A Matemática não se restringe apenas à quantificação de anestésico, gás paralisante, etc. fenômenos determinísticos – contagem, medição de objetos, Com a matemática tem acontecido o processo inverso: a grandezas – e das técnicas de cálculo com os números e escola a tem retirado da vida do aluno para colocá-la em com as grandezas, pois também estuda a incerteza livros e cadernos. E aquele que era capaz de dominá-la no proveniente de fenômenos de caráter aleatório. A seu dia-a-dia... Não sabe o que fazer com números sobre Matemática cria sistemas abstratos, que organizam e inter- folhas de papel. relacionam fenômenos do espaço, do movimento, das A criança precisa da matemática para brincar e precisa formas e dos números, associados ou não a fenômenos do brincar para aprender matemática. Cabe à escola não mundo físico. Esses sistemas contêm ideias e objetos que impedir que isso aconteça. Considerando as características são fundamentais para a compreensão de fenômenos, a da criança de 0 a 6 anos, ratificamos a ideia de que a mesma construção de representações significativas e aprende brincando e, portanto estes momentos devem ser argumentações consistentes nos mais variados contextos. privilegiados, deixando-se de lado atividades mecânicas e Apesar de a Matemática ser, por excelência, uma ciência sem significado. hipotético-dedutiva, porque suas demonstrações se apoiam Vamos procurar fazer um paralelo entre atividades sobre um sistema de axiomas e postulados, é de normalmente propostas à crianças em idade pré-escolar com fundamental importância também considerar o papel o objetivo de “ensinar” matemática e algumas brincadeiras heurístico das experimentações na aprendizagem da em que estes conteúdos estão naturalmente inseridos. Cabe Matemática. ao professor incentivar a criança a refletir matematicamente No Ensino Fundamental, essa área, por meio da suas brincadeiras. articulação de seus diversos campos – Aritmética, Álgebra, Procurando “ensinar” noções de espaço, é solicitado que Geometria, Estatística e Probabilidade -, precisa garantir que a criança pinte o que está dentro do círculo e faça um X nos os alunos relacionem observações empíricas do mundo real objetos que estão fora deste. Muito mais naturalmente estas a representações (tabelas, figuras e esquemas) e associem noções são trabalhadas através da tradicional brincadeira de essas representações a uma atividade matemática roda “A Linda Rosa Juvenil”, onde a Rosa se encontra dentro (conceitos e propriedades), fazendo induções e conjecturas. da roda e o príncipe e a bruxa fora desta. No momento Assim, espera-se que eles desenvolvam a capacidade de apropriado os dois últimos entram na roda. identificar oportunidades de utilização da matemática para Os exercícios que propõem à criança ligar certos objetos resolver problemas, aplicando conceitos, procedimentos e aos pares correspondentes (chapéu – cabeça, luva – mão, resultados para obter soluções e interpretá-las segundo os sapato – pé), podem ser tranquilamente substituídos por contextos das situações. A dedução de algumas atividades reais e lúdicas. propriedades e a verificação de conjecturas, a partir de Ex: Colocar à disposição das crianças roupas e outras, podem ser estimuladas, sobretudo ao final do Ensino acessórios para brincar de faz-de-conta. Certamente elas Fundamental.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 25 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS O Ensino Fundamental deve ter compromisso com o princípios éticos, democráticos, sustentáveis e solidários, desenvolvimento do letramento matemático, definido como valorizando a diversidade de opiniões de indivíduos e de as competências e habilidades de raciocinar, representar, grupos sociais, sem preconceitos de qualquer natureza. comunicar e argumentar matematicamente, de modo a - Interagir com seus pares de forma cooperativa, favorecer o estabelecimento de conjecturas, a formulação e trabalhando coletivamente no planejamento e a resolução de problemas em uma variedade de contextos, desenvolvimento de pesquisas para responder a utilizando conceitos, procedimentos, fatos e ferramentas questionamentos e na busca de soluções para problemas, de matemáticas. É também o letramento matemático que modo a identificar aspectos consensuais ou não na assegura aos alunos reconhecer que os conhecimentos discussão de uma determinada questão, respeitando o modo matemáticos são fundamentais para a compreensão e a de pensar dos colegas e aprendendo com eles. atuação no mundo e perceber o caráter de jogo intelectual da matemática, como aspecto que favorece o desenvolvimento FORMAÇÃO DA SOCIEDADE BRASILEIRA. do raciocínio lógico e crítico, estimula a investigação e pode DIFERENTES MANIFESTAÇÕES CULTURAIS. O ENSINO ser prazeroso (fruição). DE CIÊNCIAS NATURAIS E CIÊNCIAS HUMANAS O desenvolvimento dessas habilidades está intrinsecamente relacionado a algumas formas de A população brasileira é o resultado de uma grande organização da aprendizagem matemática, com base na mistura de culturas e características físicas de diversas análise de situações da vida cotidiana, de outras áreas do partes do mundo. conhecimento e da própria Matemática. Os processos São índios, portugueses, africanos, árabes, italianos, matemáticos de resolução de problemas, de investigação, de espanhóis, alemães, japoneses e muitos outros povos que desenvolvimento de projetos e da modelagem podem ser ajudaram a formar a população brasileira. Porém, dentre citados como formas privilegiadas da atividade matemática, todos esses povos, pode-se destacar três nações que foram motivo pelo qual são, ao mesmo tempo, objeto e estratégia fundamentais na origem do povo brasileiro: os indígenas, os para a aprendizagem ao longo de todo o Ensino portugueses e os africanos. Fundamental. Durante vários anos, os costumes, as línguas, crenças e Esses processos de aprendizagem são potencialmente formas diferentes de viver desses três povos foram se ricos para o desenvolvimento de competências fundamentais misturando e formando a base de nossa cultura. para o letramento matemático (raciocínio, representação, comunicação e argumentação) e para o desenvolvimento do A presença indígena pensamento computacional. Considerando esses Os povos indígenas são os habitantes originários do pressupostos, e em articulação com as competências gerais Brasil, quando o território ainda não tinha esse nome. da Educação Básica, a área de Matemática e, por Existiam inúmeras etnias indígenas que viviam na região e consequência, o componente curricular de Matemática ocupavam diferentes espaços do território. devem garantir aos alunos o desenvolvimento de Nessa época, viviam em grandes comunidades, competências específicas. chamadas de tribos, e tinham sua subsistência baseada na utilização do que era provido pela natureza: caça, pesca e Competências específicas de matemática para o colheita de alimentos. ensino fundamental Estima-se que cerca de 3 milhões de indígenas - Reconhecer que a Matemática é uma ciência humana, habitavam a região no momento da chegada dos fruto das necessidades e preocupações de diferentes portugueses. Segundo a FUNAI (Fundação Nacional do culturas, em diferentes momentos históricos, e é uma ciência Índio), apenas 150 depois, em 1650, a população indígena já viva, que contribui para solucionar problemas científicos e havia sido reduzida para cerca de 700 mil pessoas. tecnológicos e para alicerçar descobertas e construções, Atualmente, conforme o IBGE (Instituto Brasileiro de inclusive com impactos no mundo do trabalho. Geografia e Estatística), a população indígena é de - Desenvolver o raciocínio lógico, o espírito de aproximadamente 800 mil pessoas. investigação e a capacidade de produzir argumentos convincentes, recorrendo aos conhecimentos matemáticos Os colonizadores portugueses para compreender e atuar no mundo. O primeiro acontecimento que marca o início da mistura - Compreender as relações entre conceitos e do povo brasileiro é a chegada dos colonizadores procedimentos dos diferentes campos da Matemática portugueses à região brasileira, datada de abril de 1500. (Aritmética, Álgebra, Geometria, Estatística e Probabilidade) Ao chegarem, os portugueses depararam-se com a e de outras áreas do conhecimento, sentindo segurança grande população indígena que já vivia em terras brasileiras. quanto à própria capacidade de construir e aplicar A chegada dos portugueses não foi um processo pacífico conhecimentos matemáticos, desenvolvendo a autoestima e para a região e para os habitantes que já viviam no território, a perseverança na busca de soluções. visto que os colonizadores se interessaram pela diversidade - Fazer observações sistemáticas de aspectos de riquezas naturais encontradas nas terras brasileiras. quantitativos e qualitativos presentes nas práticas sociais e Foi a partir desse acontecimento que ocorreram as culturais, de modo a investigar, organizar, representar e primeiras miscigenações, pelo nascimento de novas comunicar informações relevantes, para interpretá-las e gerações compostas por filhos de indígenas brasileiras e avaliá-las crítica e eticamente, produzindo argumentos colonizadores portugueses. convincentes. - Utilizar processos e ferramentas matemáticas, inclusive Os Africanos na formação do Brasil tecnologias digitais disponíveis, para modelar e resolver Os africanos foram trazidos para serem escravos nas problemas cotidianos, sociais e de outras áreas de Américas. No entanto, cada indivíduo trouxe seu idioma, sua conhecimento, validando estratégias e resultados. fé e suas habilidades. Desta maneira, este saber foi se - Enfrentar situações-problema em múltiplos contextos, disseminando tanto nas fazendas onde trabalhavam como incluindo-se situações imaginadas, não diretamente nos quilombos, que eram espaços de liberdade. relacionadas com o aspecto prático-utilitário, expressar suas Apesar de toda brutalidade da escravidão no Brasil, os respostas e sintetizar conclusões, utilizando diferentes africanos introduziram alimentos, como o feijão e o quiabo. registros e linguagens (gráficos, tabelas, esquemas, além de Na música, sua influência daria a cadência e o ritmo texto escrito na língua materna e outras linguagens para sincopado próprio da música popular brasileira. descrever algoritmos, como fluxogramas, e dados). Igualmente, na dança, verificamos que o jeito de mover a - Desenvolver e/ou discutir projetos que abordem, cintura foi herdada dos africanos, o que originou uma sobretudo, questões de urgência social, com base em infinidade de bailes como o maxixe e o samba.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 26 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Os africanos, como os povos iorubás e jejes, trouxeram a indispensável da cozinha baiana atualmente. Um dos pratos religião e seus orixás, que foram misturados com a crença típicos da Bahia feito com azeite de dendê é o acarajé. cristã. Isto deu origem aos terreiros de Candomblé e, posteriormente, à Umbanda no Brasil. Influência dos imigrantes Além disso, várias palavras africanas foram incorporadas Os primeiros imigrantes foram os portugueses, que ao português brasileiro, como quilombo, marimbondo, colonizaram o território brasileiro por 322 anos. A sua moleque, farofa, cochichar, quitute, etc. principal influência foi, sem dúvida, a língua portuguesa - língua oficial e falada em todo o território brasileiro. Diversidade cultural nas regiões do Brasil A outra influência portuguesa de grande destaque foi o A cultura brasileira começa a ser formada com a catolicismo. O catolicismo esteve na base da sociedade chegada dos portugueses ao Brasil e o início da colonização brasileira ao longo de sua história e continua sendo a religião do território, que era ocupado por indígenas de diversos com mais adeptos no país. grupos étnicos. A partir do século XIX, outros imigrantes europeus Em seguida, o colonizador europeu trouxe milhões de começaram a chegar no Brasil, muitos deles para trabalhar negros africanos para trabalhar como escravos no Brasil. A nas lavouras de café. Os italianos e os alemães foram os escravidão foi utilizada durante todo o período da grupos mais expressivos, mas também vieram grandes colonização portuguesa e também durante o período grupos de suíços, espanhóis, poloneses e ucranianos. imperial. A influência dos povos europeus é observada na A partir do século XIX, diversos imigrantes europeus culinária, na arquitetura, nas manifestações culturais e até vieram trabalhar em terras brasileiras, com destaque para os mesmo no idioma - em algumas cidades do Rio Grande de italianos e alemães. E no início do século XX, o Brasil Sul e Santa Catarina é possível encontrar habitantes que também recebeu uma grande quantidade de japoneses. ainda falam alemão, por exemplo. Cada um desses grupos étnicos teve forte influência na cultura brasileira, trouxeram suas tradições, manifestações Norte Na região norte acontecem dois importantes eventos culturais, religiões e culinária. culturais: o Festival de Parintins no Amazonas e o Círio de Esses elementos culturais não apenas foram Nazaré em Belém do Pará. reproduzidos em território brasileiro, como foram se fundindo O Festival de Parintins conta com apresentações e se transformando em novos elementos culturais, que no semelhantes ao carnaval, com fantasias, alegorias e enredo seu conjunto são a base de toda a cultura brasileira. e acontece uma competição entre o boi caprichoso e o boi garantido. Influências indígenas O Círio de Nazaré é uma manifestação religiosa cristã de Os indígenas viviam nesse território há milhares de anos devoção à Nossa Senhora de Nazaré e reúne cerca de 2 e pertenciam a diferentes etnias. Dentre as de maior milhões de pessoas. destaque durante o período da colonização estão os tupis e Nessa região, a culinária apresenta forte influência os guaranis. indígena, sobretudo na utilização do peixe e da mandioca. Os nativos tinham língua, religião, culinária e tradições Também são pratos típicos dessa região a carne de sol, o próprias, mas foram violentamente reprimidos pelos jambu e o tucupi (caldo de mandioca cozido). colonizadores. Por meio da Companhia de Jesus, por exemplo, diversos padres jesuítas vinham para o Brasil com Nordeste o objetivo de catequizar os povos originários. No nordeste, uma das manifestações artísticas mais Apesar da dura repressão, muitos elementos culturais de tradicionais é a literatura de cordel, que é um gênero literário herança indígena ainda estão presentes na sociedade produzido em versos. Os textos são escritos em folhetos e brasileira atual, como o hábito de dormir em redes e a pendurados em cordas nas apresentações, por isso o nome confecção de objetos em cerâmica. “cordel”. Na culinária, alguns pratos de origem indígena são a Outras tradições famosas dessa região são o maracatu, maniçoba, uma espécie de ensopado feito com carne e com o bumba meu boi, o carnaval, a capoeira, o frevo, o coco, a a folha da mandioca e servido com arroz e farinha. E o ciranda, a festa de Iemanjá, a marujada e a lavagem das tacacá, prato preparado com tucupi, mandioca, jambu e escadarias do Bonfim. camarão. Os pratos típicos da região são: acarajé, vatapá, caruru, Muitas palavras da língua portuguesa também são de sarapatel, carne de sol, bolo de fubá, arroz doce, canjica, origem indígena. Jacaré, gambá, pirarucu, sabiá, tamanduá, buchada de bode, tapioca, pamonha, feijão verde e cocada. tucano, perereca e jiboia são exemplos de alguns nomes de animais. Centro-Oeste Ibirapuera, Curitiba, Macapá, Sergipe, Sapucaí, Guarujá O centro-oeste é uma região de grande diversidade e Iguaçu são palavras que se referem a lugares e também devido às influências de outros estados, de povos indígenas foram incorporadas à língua portuguesa. e até mesmo de outros países como a Bolívia e o Paraguai. O folclore brasileiro também absorveu muito das lendas Nessa região, algumas das manifestações culturais indígenas. Um dos exemplos mais famosos é o caipora, um famosas são a cavalhada, o fogaréu e o cururu. E dentre os menino que anda montado em um porco pela floresta e tem pratos típicos estão o arroz com pequi, o angu, o arroz como função proteger as cachoeiras, os rios e os animais da boliviano o cural e os peixes do pantanal. floresta. Sudeste Influência africana No sudeste, algumas das tradições são as festas do Os africanos foram trazidos para o território brasileiro em divino, o carnaval, o bumba meu boi, o peão boiadeiro, o navios de tráfico negreiro e foram escravizados pelos samba de lenço, o caiapó, a dança de velhos, a folia de reis colonizadores por mais de 300 anos. Esses africanos eram e o jongo. de diferentes etnias, falavam línguas distintas e tinham Os pratos típicos dessa região são o cuscuz paulista, culturas próprias. aipim frito, moqueca capixaba, pão de queijo, feijoada, tutu Assim como os indígenas, os negros escravizados foram de feijão, feijão tropeiro, queijo minas, farofa e bolinho de bacalhau. proibidos de professar sua fé e de realizar suas manifestações culturais. Mas apesar da repressão, muito de sua cultura foi absorvida pela população brasileira. Sul Na culinária, destaca-se o azeite de dendê, um óleo O sul tem diversas manifestações culturais relacionadas bastante utilizado na culinária africana e que é ingrediente aos imigrantes europeus, principalmente alemães, italianos e japoneses.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 27 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Os grupos descendentes desses imigrantes preservam pensarem diferentes culturas e sociedades, em seus tempos práticas culturais de dança, culinária e também na históricos, territórios e paisagens (compreendendo melhor o arquitetura. É comum encontrar cidades inteiras construídas Brasil, sua diversidade regional e territorial). E também que em estilo alemão, por exemplo. os levem a refletir sobre sua inserção singular e responsável No que se refere a culinária, destacam-se o chimarrão, na história da sua família, comunidade, nação e mundo. especialmente no Rio Grande do Sul, o pirão de peixe, o Ao longo de toda a Educação Básica, o ensino das barreado (carne cozida em panela de barro) e a produção de Ciências Humanas deve promover explorações vinho. sociocognitivas, afetivas e lúdicas capazes de potencializar sentidos e experiências com saberes sobre a pessoa, o O Ensino de Ciências Naturais e Ciências Humanas mundo social e a natureza. Dessa maneira, a área contribui A área de Ciências Humanas contribui para que os para o adensamento de conhecimentos sobre a participação alunos desenvolvam a cognição in situ, ou seja, sem no mundo social e a reflexão sobre questões sociais, éticas e prescindir da contextualização marcada pelas noções políticas, fortalecendo a formação dos alunos e o de tempo e espaço, conceitos fundamentais da desenvolvimento da autonomia intelectual, bases para uma área. Cognição e contexto são, assim, categorias atuação crítica e orientada por valores democráticos. elaboradas conjuntamente, em meio a circunstâncias Desde a Educação Infantil, os alunos expressam históricas específicas, nas quais a diversidade humana deve percepções simples, mas bem definidas, de sua vida familiar, ganhar especial destaque, com vistas ao acolhimento da seus grupos e seus espaços de convivência. No cotidiano, diferença. O raciocínio espaço-temporal baseia-se na ideia por exemplo, desenham familiares, identificam relações de parentesco, reconhecem a si mesmos em fotos de que o ser humano produz o espaço em que vive, (classificando-as como antigas ou recentes), guardam datas apropriando-se dele em determinada circunstância histórica. e fatos, sabem a hora de dormir e de ir para a escola, A capacidade de identificação dessa circunstância impõe-se negociam horários, fazem relatos orais e revisitam o passado como condição para que o ser humano compreenda, por meio de jogos, cantigas e brincadeiras ensinadas pelos interprete e avalie os significados das ações realizadas no mais velhos. Com essas experiências, começam a levantar passado ou no presente, o que o torna responsável tanto hipóteses e a se posicionar sobre determinadas situações. pelo saber produzido quanto pelo controle dos fenômenos No decorrer do Ensino Fundamental, os procedimentos naturais e históricos dos quais é agente. de investigação em Ciências Humanas devem contribuir A abordagem das relações espaciais e o consequente para que os alunos desenvolvam a capacidade de desenvolvimento do raciocínio espaço-temporal no ensino de observação de diferentes indivíduos, situações e objetos que Ciências Humanas devem favorecer a compreensão, pelos trazem à tona dinâmicas sociais em razão de sua própria alunos, dos tempos sociais e da natureza e de suas relações natureza (tecnológica, morfológica, funcional). A Geografia e com os espaços. A exploração das noções de espaço e a História, ao longo dessa etapa, trabalham o tempo deve se dar por meio de diferentes linguagens, de reconhecimento do Eu e o sentimento de pertencimento dos forma a permitir que os alunos se tornem produtores e alunos à vida da família e da comunidade. leitores de mapas dos mais variados lugares vividos, No Ensino Fundamental – Anos Iniciais, é importante concebidos e percebidos. valorizar e problematizar as vivências e experiências Na análise geográfica, os espaços percebidos, individuais e familiares trazidas pelos alunos, por meio do concebidos e vividos não são lineares. Portanto, é lúdico, de trocas, da escuta e de falas sensíveis, nos necessário romper com essa concepção para possibilitar diversos ambientes educativos (bibliotecas, pátio, praças, uma leitura geo-histórica dos fatos e uma análise com parques, museus, arquivos, entre outros). Essa abordagem abordagens históricas, sociológicas e espaciais (geográficas) privilegia o trabalho de campo, as entrevistas, a observação, simultâneas. Retomar o sentido dos espaços percebidos, o desenvolvimento de análises e de argumentações, de concebidos e vividos nos permite reconhecer os objetos, os modo a potencializar descobertas e estimular o pensamento fenômenos e os lugares distribuídos no território e criativo e crítico. É nessa fase que os alunos começam a compreender os diferentes olhares para os arranjos desses desenvolver procedimentos de investigação em Ciências objetos nos planos espaciais. Humanas, como a pesquisa sobre diferentes fontes Embora o tempo, o espaço e o movimento sejam documentais, a observação e o registro – de paisagens, categorias básicas na área de Ciências Humanas, não se fatos, acontecimentos e depoimentos – e o estabelecimento pode deixar de valorizar também a crítica sistemática à de comparações. Esses procedimentos são fundamentais ação humana, às relações sociais e de poder e, para que compreendam a si mesmos e àqueles que estão especialmente, à produção de conhecimentos e saberes, em seu entorno, suas histórias de vida e as diferenças dos frutos de diferentes circunstâncias históricas e espaços grupos sociais com os quais se relacionam. O processo de geográficos. O ensino de Geografia e História, ao estimular aprendizagem deve levar em conta, de forma progressiva, a os alunos a desenvolver uma melhor compreensão do escola, a comunidade, o Estado e o país. É importante mundo, não só favorece o desenvolvimento autônomo de também que os alunos percebam as relações com o cada indivíduo, como também os torna aptos a uma ambiente e a ação dos seres humanos com o mundo que os intervenção mais responsável no mundo em que vivem. cerca, refletindo sobre os significados dessas relações. As Ciências Humanas devem, assim, estimular Nesse período, o desenvolvimento da capacidade de uma formação ética, elemento fundamental para a formação observação e de compreensão dos componentes da das novas gerações, auxiliando os alunos a construir um paisagem contribui para a articulação do espaço vivido com sentido de responsabilidade para valorizar: os direitos o tempo vivido. O vivido é aqui considerado como espaço humanos; o respeito ao ambiente e à própria biográfico, que se relaciona com as experiências dos alunos coletividade; o fortalecimento de valores sociais, tais como em seus lugares de vivência. a solidariedade, a participação e o protagonismo voltados Na passagem para o Ensino Fundamental – Anos Finais, para o bem comum; e, sobretudo, a preocupação com os alunos vivenciam diversas mudanças biológicas, as desigualdades sociais. Cabe, ainda, às Ciências psicológicas, sociais e emocionais. Eles ampliam suas Humanas cultivar a formação de alunos intelectualmente descobertas em relação a si próprios e às suas relações com autônomos, com capacidade de articular categorias de grupos sociais, tornando-se mais autônomos para cuidar de pensamento histórico e geográfico em face de seu próprio si e do mundo ao seu redor. Se, no Ensino Fundamental – tempo, percebendo as experiências humanas e refletindo Anos Iniciais, o desenvolvimento da percepção está voltado sobre elas, com base na diversidade de pontos de vista. para o reconhecimento do Eu, do Outro e do Nós, no Ensino Os conhecimentos específicos na área de Ciências Fundamental – Anos Finais é possível analisar os Humanas exigem clareza na definição de um conjunto de indivíduos como atores inseridos em um mundo em objetos de conhecimento que favoreçam o desenvolvimento constante movimento de objetos e populações e com de habilidades e que aprimorem a capacidade de os alunos exigência de constante comunicação.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 28 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Nesse contexto, faz-se necessário o desenvolvimento de Humanas, promovendo o acolhimento e a valorização da habilidades voltadas para o uso concomitante de diferentes diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, linguagens (oral, escrita, cartográfica, estética, técnica etc.). identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de Por meio delas, torna-se possível o diálogo, a comunicação e qualquer natureza. a socialização dos indivíduos, condição necessária tanto Comparar eventos ocorridos simultaneamente no mesmo para a resolução de conflitos quanto para um convívio espaço e em espaços variados, e eventos ocorridos em equilibrado entre diferentes povos e culturas. O desafio é tempos diferentes no mesmo espaço e em espaços variados. grande, exigindo capacidade para responder de maneira Construir argumentos, com base nos conhecimentos das crítica, propositiva e ética aos conflitos impostos pela Ciências Humanas, para negociar e defender ideias e história. opiniões que respeitem e promovam os direitos humanos e a Progressivamente, ao longo do Ensino Fundamental – consciência socioambiental, exercitando a responsabilidade Anos Finais, o ensino favorece uma ampliação das e o protagonismo voltados para o bem comum e a perspectivas e, portanto, de variáveis, tanto do ponto de vista construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva. espacial quanto temporal. Isso permite aos alunos identificar, Utilizar as linguagens cartográfica, gráfica e iconográfica comparar e conhecer o mundo, os espaços e as paisagens e diferentes gêneros textuais e tecnologias digitais de com mais detalhes, complexidade e espírito crítico, criando informação e comunicação no desenvolvimento do raciocínio condições adequadas para o conhecimento de outros espaço-temporal relacionado a localização, distância, lugares, sociedades e temporalidades históricas. Nessa fase, direção, duração, simultaneidade, sucessão, ritmo e as noções de temporalidade, espacialidade e diversidade conexão. são abordadas em uma perspectiva mais complexa, que deve levar em conta a perspectiva dos direitos humanos. Geografia no ensino fundamental – anos iniciais: Essa é uma questão complexa, que envolve a unidades temáticas, objetos de conhecimento e compreensão do conceito de Estado e dos mecanismos habilidades institucionais dos quais as diferentes sociedades dispõem No contexto da aprendizagem do Ensino Fundamental – para fazer justiça e criar um novo campo republicano de Anos Iniciais, será necessário considerar o que as crianças direitos. Portanto, o desafio não está apenas no campo da aprenderam na Educação Infantil. produção e reprodução de uma memória histórica, mas nos Em seu cotidiano, por exemplo, elas desenham questionamentos com vistas a uma posição ética dos familiares, enumeram relações de parentesco, reconhecem- indivíduos em relação ao passado e ao presente. Vários se em fotos (classificando-as como antigas ou recentes), temas decorrem dessa reflexão, tais como a guardam datas e fatos, sabem a hora de dormir, de ir para a interculturalidade e a valorização das diferenças, em meio a escola, negociam horários, fazem relatos orais, revisitam o um intenso movimento das populações e dos direitos civis. passado por meio de jogos, cantigas e brincadeiras O Ensino Fundamental – Anos Finais tem o ensinadas pelos mais velhos, posicionam-se criticamente compromisso de dar continuidade à compreensão dessas sobre determinadas situações, e tantos outros. noções, aprofundando os questionamentos sobre as Tendo por referência esses conhecimentos das próprias pessoas, os grupos humanos, as culturas e os modos de crianças, o estudo da Geografia no Ensino Fundamental – organizar a sociedade; as relações de produção e de poder; Anos Iniciais, em articulação com os saberes de outros e a transformação de si mesmos e do mundo. O componentes curriculares e áreas de conhecimento, desenvolvimento das habilidades voltadas para identificação, concorre para o processo de alfabetização e letramento e classificação, organização e comparação, em contexto local para o desenvolvimento de diferentes raciocínios. ou global, é importante para a melhor compreensão de si, do O estudo da Geografia permite atribuir sentidos às outro, da escola, da comunidade, do Estado, do país e do dinâmicas das relações entre pessoas e grupos sociais, e mundo. Dá-se, assim, um passo importante para a desses com a natureza, nas atividades de trabalho e lazer. É responsabilização do cidadão para com o mundo em que importante, na faixa etária associada a essa fase do Ensino vive. Fundamental, o desenvolvimento da capacidade de leitura Em suma, a área de Ciências Humanas deve propiciar por meio de fotos, desenhos, plantas, maquetes e as mais aos alunos a capacidade de interpretar o mundo, de diversas representações. Assim, os alunos desenvolvem a compreender processos e fenômenos sociais, políticos e percepção e o domínio do espaço. culturais e de atuar de forma ética, responsável e autônoma Nessa fase, é fundamental que os alunos consigam diante de fenômenos sociais e naturais. saber e responder algumas questões a respeito de si, das Considerando esses pressupostos, e em articulação com pessoas e dos objetos: Onde se localiza? Por que se as competências gerais da Educação Básica, a área de localiza? Como se distribui? Quais são as características Ciências Humanas deve garantir aos alunos o socioespaciais? Essas perguntas mobilizam as crianças a desenvolvimento de algumas competências específicas. pensar sobre a localização de objetos e das pessoas no mundo, permitindo que compreendam seu lugar no mundo. Competências específicas de ciências humanas para “Onde se localiza?” é uma indagação que as leva a o ensino fundamental mobilizar o pensamento espacial e as informações - Compreender a si e ao outro como identidades geográficas para interpretar as paisagens e compreender os diferentes, de forma a exercitar o respeito à diferença em fenômenos socioespaciais, tendo na alfabetização uma sociedade plural e promover os direitos humanos. cartográfica um importante encaminhamento. - Analisar o mundo social, cultural e digital e o meio “Por que se localiza?” permite a orientação e a aplicação técnico-científico-informacional com base nos conhecimentos do pensamento espacial em diferentes lugares e escalas de das Ciências Humanas, considerando suas variações de análise. significado no tempo e no espaço, para intervir em situações “Como se distribui?” é uma pergunta que remete ao do cotidiano e se posicionar diante de problemas do mundo princípio geográfico de diferenciação espacial, que estimula contemporâneo. os alunos a entender o ordenamento territorial e a paisagem, - Identificar, comparar e explicar a intervenção do ser estabelecendo relações entre os conceitos principais da humano na natureza e na sociedade, exercitando a Geografia. curiosidade e propondo ideias e ações que contribuam para “Quais são as características socioespaciais?” permite a transformação espacial, social e cultural, de modo a que reconheçam a dinâmica da natureza e a interferência participar efetivamente das dinâmicas da vida social. humana na superfície terrestre, conhecendo os lugares e - Interpretar e expressar sentimentos, crenças e dúvidas estabelecendo conexões entre eles, sejam locais, regionais com relação a si mesmo, aos outros e às diferentes culturas, ou mundiais, além de contribuir para a percepção das com base nos instrumentos de investigação das Ciências temáticas ambientais.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 29 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS A ênfase nos lugares de vivência, dada no Ensino regras de convívio Fundamental – Anos Iniciais, oportuniza o desenvolvimento em diferentes de noções de pertencimento, localização, orientação e espaços (sala de organização das experiências e vivências em diferentes aula, escola etc.). locais. Observar e Essas noções são fundamentais para o trato com os descrever ritmos conhecimentos geográficos. Mas o aprendizado não deve naturais (dia e ficar restrito apenas aos lugares de vivência. Outros Conexões e Ciclos naturais e a noite, variação de conceitos articuladores, como paisagem, região e território, escalas vida cotidiana temperatura e vão se integrando e ampliando as escalas de análise. umidade etc.) em De maneira geral, na abordagem dos objetos de diferentes escalas conhecimento, é necessário garantir o estabelecimento de espaciais e relações entre conceitos e fatos que possibilitem o temporais, conhecimento da dinâmica do meio físico, social, econômico comparando a sua e político. Dessa forma, deve-se garantir aos alunos a realidade com compreensão das características naturais e culturais nas outras. diferentes sociedades e lugares do seu entorno, incluindo a Descrever e noção espaço-tempo. Mundo do Diferentes tipos de comparar trabalho trabalho existentes diferentes tipos de Assim, é imprescindível que os alunos identifiquem a no seu dia a dia moradia ou objetos presença e a sociodiversidade de culturas indígenas, afro- de uso cotidiano brasileiras, quilombolas, ciganas e dos demais povos e (brinquedos, comunidades tradicionais para compreender suas roupas, características socioculturais e suas territorialidades. Do mobiliários), mesmo modo, é necessário que eles diferenciem os lugares considerando de vivência e compreendam a produção das paisagens e a técnicas e materiais inter-relação entre elas, como o campo/cidade e o utilizados em sua urbano/rural, no que tange aos aspectos políticos, sociais, produção. culturais, étnico-raciais e econômicos. Descrever Essas aprendizagens servem de base para o atividades de trabalho desenvolvimento de atitudes, procedimentos e elaborações relacionadas com o conceituais que potencializam o reconhecimento e a dia a dia da sua construção das identidades e a participação em diferentes comunidade. grupos sociais. Criar mapas Esse processo de aprendizado abre caminhos para mentais e práticas de estudo provocadoras e desafiadoras, em desenhos com situações que estimulem a curiosidade, a reflexão e o base em itinerários, protagonismo. Pautadas na observação, nas experiências contos literários, diretas, no desenvolvimento de variadas formas de Formas de histórias inventadas expressão, registro e problematização, essas práticas representação Pontos de e brincadeiras. envolvem, especialmente, o trabalho de campo. e pensamento referência Elaborar e utilizar espacial mapas simples GEOGRAFIA – 1º ANO para localizar UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES elementos do local TEMÁTICAS CONHECIMENTO de vivência, considerando Descrever referenciais características espaciais (frente e observadas de atrás, esquerda e seus lugares de direita, em cima e O modo de vida vivência (moradia, embaixo, dentro e das crianças em escola etc.) e fora) e tendo o diferentes lugares identificar corpo como semelhanças e referência. diferenças entre O sujeito e seu esses lugares. Descrever lugar no Identificar características de mundo semelhanças e seus lugares de diferenças entre vivência jogos e relacionadas aos brincadeiras de Natureza, Condições de vida ritmos da natureza diferentes épocas e ambientes e nos lugares de (chuva, vento, calor lugares. qualidade de vivência etc.). vida Associar mudanças Identificar e relatar de vestuário e semelhanças e hábitos alimentares diferenças de usos em sua do espaço público comunidade ao Situações de (praças, parques) longo do ano, convívio em para o lazer e decorrentes da diferentes lugares diferentes variação de manifestações. temperatura e Discutir e elaborar, umidade no coletivamente, ambiente.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 30 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS GEOGRAFIA – 2º ANO Formas de orientação e Identificar objetos e UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES representação representação lugares de vivência TEMÁTICAS CONHECIMENTO e pensamento espacial (escola e moradia) Descrever a espacial em imagens aéreas história das e mapas (visão migrações no vertical) e bairro ou fotografias (visão Convivência e comunidade em oblíqua). interações entre que vive. Aplicar princípios pessoas na Comparar de localização e comunidade costumes e posição de objetos tradições de (referenciais diferentes espaciais, como O sujeito e seu populações frente e atrás, lugar no inseridas no bairro esquerda e direita, mundo ou comunidade em em cima e que vive, embaixo, dentro e reconhecendo a fora) por meio de importância do representações respeito às espaciais da sala diferenças. de aula e da Comparar escola. diferentes meios de Reconhecer a Riscos e cuidados transporte e de importância do solo nos meios de comunicação, e da água para a transporte e de indicando o seu Natureza, Os usos dos vida, identificando comunicação papel na conexão ambientes e recursos naturais: seus diferentes entre lugares, e qualidade de solo e água no usos (plantação e discutir os riscos vida campo e na cidade extração de para a vida e para materiais, entre o ambiente e seu outras uso responsável. possibilidades) e os Reconhecer impactos desses Experiências da semelhanças e usos no cotidiano comunidade no diferenças nos da cidade e do tempo e no espaço hábitos, nas campo. relações com a Conexões e natureza e no GEOGRAFIA – 3º ANO escalas modo de viver de UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES pessoas em TEMÁTICAS CONHECIMENTO diferentes lugares. Identificar e Analisar mudanças comparar aspectos Mudanças e e permanências, culturais dos grupos permanências comparando sociais de seus imagens de um lugares de vivência, mesmo lugar em seja na cidade, seja diferentes tempos. no campo. Relacionar o dia e O sujeito e A cidade e o Identificar, em seus a noite a diferentes seu lugar no campo: lugares de vivência, tipos de atividades mundo aproximações e marcas de sociais (horário diferenças contribuição cultural Tipos de trabalho escolar, comercial, e econômica de Mundo do em lugares e sono etc.). grupos de diferentes trabalho tempos diferentes Descrever as origens. atividades Reconhecer os extrativas diferentes modos de (minerais, vida de povos e agropecuárias e comunidades industriais) de tradicionais em diferentes lugares, distintos lugares. identificando os impactos ambientais. Identificar e Explicar como os elaborar diferentes processos naturais e formas de Paisagens históricos atuam na representação Conexões e naturais e produção e na (desenhos, mapas escalas antrópicas em mudança das mentais, maquetes) transformação paisagens naturais e para representar antrópicas nos seus componentes da lugares de vivência, paisagem dos comparando-os a lugares de outros lugares. Localização, vivência. Identificar alimentos,
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 31 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS minerais e outros GEOGRAFIA – 4º ANO produtos cultivados UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES Mundo do Matéria-prima e e extraídos da TEMÁTICAS CONHECIMENTO trabalho indústria natureza, Selecionar, em seus comparando as lugares de vivência atividades de e em suas histórias trabalho em familiares e/ou da diferentes lugares. comunidade, Identificar e Território e elementos de interpretar imagens diversidade distintas culturas Formas de bidimensionais e cultural (indígenas, afro- representação Representações tridimensionais em brasileiras, de e pensamento cartográficas diferentes tipos de outras regiões do espacial representação país, latino- cartográfica. americanas, Reconhecer e europeias, asiáticas elaborar legendas etc.), valorizando o com símbolos de que é próprio em diversos tipos de O sujeito e cada uma delas e representações em seu lugar no sua contribuição diferentes escalas mundo para a formação da cartográficas. cultura local, Relacionar a regional e brasileira. produção de lixo Descrever doméstico ou da Processos processos escola aos migratórios no migratórios e suas problemas causados Brasil contribuições para a Produção, pelo consumo formação da circulação e excessivo e construir sociedade brasileira. consumo propostas para o Distinguir funções e consumo consciente, papéis dos órgãos considerando a Instâncias do do poder público ampliação de poder público e municipal e canais hábitos de redução, canais de de participação reuso e participação social social na gestão do reciclagem/descarte Município, incluindo de materiais a Câmara de consumidos em Vereadores e Natureza, casa, na escola e/ou Conselhos ambientes e no entorno. Municipais. qualidade de Investigar os usos Reconhecer vida dos recursos especificidades e naturais, com analisar a destaque para os Relação campo e interdependência do usos da água em cidade campo e da cidade, atividades cotidianas Conexões e considerando fluxos (alimentação, escalas econômicos, de higiene, cultivo de informações, de plantas etc.), e ideias e de pessoas. discutir os problemas Unidades político- Distinguir unidades ambientais administrativas do político- provocados por Brasil administrativas esses usos. oficiais nacionais Impactos das Identificar os (Distrito, Município, atividades cuidados Unidade da humanas necessários para Federação e grande utilização da água região), suas na agricultura e na fronteiras e sua geração de energia hierarquia, de modo a garantir a localizando seus manutenção do lugares de vivência. provimento de água Identificar e potável. descrever territórios Comparar impactos étnico-culturais das atividades existentes no Brasil, econômicas urbanas Territórios étnico- tais como terras e rurais sobre o culturais indígenas e de ambiente físico comunidades natural, assim como remanescentes de os riscos quilombos, provenientes do uso reconhecendo a de ferramentas e legitimidade da máquinas. demarcação desses territórios.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 32 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Trabalho no Comparar as enfrentamentos e da batalha para a produção de sentidos e campo e na características do significados, que são constantemente reinterpretados por cidade trabalho no campo e diferentes grupos sociais e suas demandas – o que, na cidade. consequentemente, suscita outras questões e discussões. Mundo do Produção, Descrever e discutir O exercício do “fazer história”, de indagar, é marcado, trabalho circulação e o processo de inicialmente, pela constituição de um sujeito. Em seguida, consumo produção amplia-se para o conhecimento de um “Outro”, às vezes (transformação de semelhante, muitas vezes diferente. matérias-primas), Depois, alarga-se ainda mais em direção a outros povos, circulação e com seus usos e costumes específicos. Por fim, parte-se consumo de para o mundo, sempre em movimento e transformação. Em diferentes produtos. meio a inúmeras combinações dessas variáveis – do Eu, do Outro e do Nós – inseridas em tempos e espaços Sistema de Utilizar as direções específicos, indivíduos produzem saberes que os tornam orientação cardeais na mais aptos para enfrentar situações marcadas pelo conflito localização de ou pela conciliação. componentes físicos Entre os saberes produzidos, destaca-se a capacidade Formas de e humanos nas de comunicação e diálogo, instrumento necessário para o representação paisagens rurais e respeito à pluralidade cultural, social e política, bem como e pensamento urbanas. para o enfrentamento de circunstâncias marcadas pela espacial Elementos Comparar tipos tensão e pelo conflito. A lógica da palavra, da argumentação, constitutivos dos variados de mapas, é aquela que permite ao sujeito enfrentar os problemas e mapas identificando suas propor soluções com vistas à superação das contradições características, políticas, econômicas e sociais do mundo em que vivemos. elaboradores, Para se pensar o ensino de História, é fundamental finalidades, considerar a utilização de diferentes fontes e tipos de diferenças e documento (escritos, iconográficos, materiais, imateriais) semelhanças. capazes de facilitar a compreensão da relação tempo e Conservação e Identificar as espaço e das relações sociais que os geraram. Os registros degradação da características das e vestígios das mais diversas naturezas (mobiliário, Natureza, natureza paisagens naturais instrumentos de trabalho, música etc.) deixados pelos ambientes e e antrópicas (relevo, indivíduos carregam em si mesmos a experiência humana, qualidade de cobertura vegetal, as formas específicas de produção, consumo e circulação, vida rios etc.) no tanto de objetos quanto de saberes. Nessa dimensão, o ambiente em que objeto histórico transforma-se em exercício, em laboratório vive, bem como a da memória voltado para a produção de um saber próprio da ação humana na história. conservação ou A utilização de objetos materiais pode auxiliar o degradação dessas professor e os alunos a colocar em questão o significado das áreas. coisas do mundo, estimulando a produção do conhecimento histórico em âmbito escolar. Por meio dessa prática, HISTÓRIA docentes e discentes poderão desempenhar o papel de Todo conhecimento sobre o passado é também um agentes do processo de ensino e aprendizagem, assumindo, conhecimento do presente elaborado por distintos sujeitos. O ambos, uma “atitude historiadora” diante dos conteúdos historiador indaga com vistas a identificar, analisar e propostos, no âmbito de um processo adequado ao Ensino compreender os significados de diferentes objetos, lugares, Fundamental. circunstâncias, temporalidades, movimentos de pessoas, Os processos de identificação, comparação, contextualização, interpretação e análise de um objeto coisas e saberes. As perguntas e as elaborações de estimulam o pensamento. hipóteses variadas fundam não apenas os marcos de De que material é feito o objeto em questão? Como é memória, mas também as diversas formas narrativas, ambos produzido? Para que serve? Quem o consome? Seu expressão do tempo, do caráter social e da prática da significado se alterou no tempo e no espaço? Como cada produção do conhecimento histórico. indivíduo descreve o mesmo objeto? Os procedimentos de As questões que nos levam a pensar a História como um análise utilizados são sempre semelhantes ou não? Por quê? saber necessário para a formação das crianças e jovens na Essas perguntas auxiliam a identificação de uma questão escola são as originárias do tempo presente. O passado que ou objeto a ser estudado. deve impulsionar a dinâmica do ensino-aprendizagem no Diferentes formas de percepção e interação com um Ensino Fundamental é aquele que dialoga com o tempo mesmo objeto podem favorecer uma melhor compreensão atual. da história, das mudanças ocorridas no tempo, no espaço e, A relação passado/presente não se processa de forma especialmente, nas relações sociais. O pilão, por exemplo, automática, pois exige o conhecimento de referências serviu para preparar a comida e, posteriormente, teóricas capazes de trazer inteligibilidade aos objetos transformou-se em objeto de decoração. Que significados o históricos selecionados. Um objeto só se torna documento pilão carrega? Que sociedade o produziu? Quem o utilizava quando apropriado por um narrador que a ele confere e o utiliza? Qual era a sua utilidade na cozinha? Que novos sentido, tornando-o capaz de expressar a dinâmica da vida significados lhe são atribuídos? Por quê? das sociedades. Portanto, o que nos interessa no A comparação em história faz ver melhor o Outro. Se o conhecimento histórico é perceber a forma como os tema for, por exemplo, pintura corporal, a comparação entre indivíduos construíram, com diferentes linguagens, suas pinturas de povos indígenas originários e de populações narrações sobre o mundo em que viveram e vivem, suas urbanas pode ser bastante esclarecedora quanto ao instituições e organizações sociais. Nesse sentido, “O funcionamento das diferentes sociedades. Indagações sobre, historiador não faz o documento falar: é o historiador quem por exemplo, as origens das tintas utilizadas, os instrumentos fala e a explicitação de seus critérios e procedimentos é para a realização da pintura e o tempo de duração dos fundamental para definir o alcance de sua fala. Toda desenhos no corpo esclarecem sobre os deslocamentos operação com documentos, portanto, é de natureza retórica.” necessários para a obtenção de tinta, as classificações A história não emerge como um dado ou um acidente sociais sugeridas pelos desenhos ou, ainda, a natureza da que tudo explica: ela é a correlação de forças, de comunicação contida no desenho corporal.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 33 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Por meio de outra linguagem, por exemplo, a diversidade de sujeitos e histórias estimula o pensamento matemática, podemos comparar para ver melhor crítico, a autonomia e a formação para a cidadania. semelhanças e diferenças, elaborando gráficos e tabelas, A busca de autonomia também exige reconhecimento comparando quantidades e proporções (mortalidade infantil, das bases da epistemologia da História, a saber: renda, postos de trabalho etc.) e, também, analisando a natureza compartilhada do sujeito e do objeto de possíveis desvios das informações contidas nesses gráficos conhecimento, o conceito de tempo histórico em seus e tabelas. diferentes ritmos e durações, a concepção A contextualização é uma tarefa imprescindível para o de documento como suporte das relações sociais, as conhecimento histórico. Com base em níveis variados de várias linguagens por meio das quais o ser humano se exigência, das operações mais simples às mais elaboradas, apropria do mundo. Enfim, percepções capazes de os alunos devem ser instigados a aprender a contextualizar. responder aos desafios da prática historiadora presente Saber localizar momentos e lugares específicos de um dentro e fora da sala de aula. evento, de um discurso ou de um registro das atividades Todas essas considerações de ordem teórica devem humanas é tarefa fundamental para evitar atribuição de considerar a experiência dos alunos e professores, tendo em sentidos e significados não condizentes com uma vista a realidade social e o universo da comunidade escolar, determinada época, grupo social, comunidade ou território. bem como seus referenciais históricos, sociais e culturais. Ao Portanto, os estudantes devem identificar, em um contexto, o promover a diversidade de análises e proposições, espera-se momento em que uma circunstância histórica é analisada e que os alunos construam as próprias interpretações, de as condições específicas daquele momento, inserindo o forma fundamentada e rigorosa. Convém destacar as evento em um quadro mais amplo de referências sociais, temáticas voltadas para a diversidade cultural e para as culturais e econômicas. múltiplas configurações identitárias, destacando-se as Distinguir contextos e localizar processos, sem deixar de abordagens relacionadas à história dos povos indígenas lado o que é particular em uma dada circunstância, é uma originários e africanos. Ressalta-se, também, na formação da habilidade necessária e enriquecedora. Ela estimula a sociedade brasileira, a presença de diferentes povos e percepção de que povos e sociedades, em tempos e culturas, suas contradições sociais e culturais e suas espaços diferentes, não são tributários dos mesmos valores articulações com outros povos e sociedades. e princípios da atualidade. A inclusão dos temas obrigatórios definidos pela O exercício da interpretação – de um texto, de um legislação vigente, tais como a história da África e das objeto, de uma obra literária, artística ou de um mito – é culturas afro-brasileira e indígena, deve ultrapassar a fundamental na formação do pensamento crítico. Exige dimensão puramente retórica e permitir que se defenda o observação e conhecimento da estrutura do objeto e das estudo dessas populações como artífices da própria história suas relações com modelos e formas (semelhantes ou do Brasil. A relevância da história desses grupos humanos diferentes) inseridas no tempo e no espaço. Interpretações reside na possibilidade de os estudantes compreenderem o variadas sobre um mesmo objeto tornam mais clara, papel das alteridades presentes na sociedade brasileira, explícita, a relação sujeito/objeto e, ao mesmo tempo, comprometerem-se com elas e, ainda, perceberem que estimulam a identificação das hipóteses levantadas e dos existem outros referenciais de produção, circulação e argumentos selecionados para a comprovação das transmissão de conhecimentos, que podem se entrecruzar diferentes proposições. Um exemplo claro são as pinturas de com aqueles considerados consagrados nos espaços El Greco. Para alguns especialistas, tratam-se de obras que formais de produção de saber. abandonam as exigências de nitidez e harmonia típicas de Problematizando a ideia de um “Outro”, convém observar uma gramática acadêmica renascentista com a qual o pintor a presença de uma percepção estereotipada naturalizada de quis romper; para outros, tais características são resultado diferença, ao se tratar de indígenas e africanos. Essa de estrabismo ou astigmatismo do olho direito do pintor. problemática está associada à produção de uma história O exercício da interpretação também permite brasileira marcada pela imagem de nação constituída nos compreender o significado histórico de uma cronologia e moldes da colonização europeia. realizar o exercício da composição de outras ordens cronológicas. Essa prática explicita a dialética da inclusão e Por todas as razões apresentadas, espera-se que da exclusão e dá visibilidade ao seguinte questionamento: “O o conhecimento histórico seja tratado como uma forma de que torna um determinado evento um marco histórico?” Entre pensar, entre várias; uma forma de indagar sobre as coisas os debates que merecem ser enunciados, destacam-se as do passado e do presente, de construir explicações, dicotomias entre Ocidente e Oriente e os modelos baseados desvendar significados, compor e decompor interpretações, na sequência temporal de surgimento, auge e declínio. em movimento contínuo ao longo do tempo e do espaço. Ambos pretendem dar conta de explicações para questões Enfim, trata-se de transformar a história em ferramenta a históricas complexas. De um lado, a longa existência de serviço de um discernimento maior sobre as experiências tensões (sociais, culturais, religiosas, políticas e econômicas) humanas e as sociedades em que se vive. entre sociedades ocidentais e orientais; de outro, a busca Retornando ao ambiente escolar, a BNCC pretende pela compreensão dos modos de organização das várias estimular ações nas quais professores e alunos sejam sociedades que se sucederam ao longo da história. sujeitos do processo de ensino e aprendizagem. Nesse A análise é uma habilidade bastante complexa porque pressupõe problematizar a própria escrita da história e sentido, eles próprios devem assumir uma atitude considerar que, apesar do esforço de organização e de historiadora diante dos conteúdos propostos no âmbito do busca de sentido, trata-se de uma atividade em que algo Ensino Fundamental. sempre escapa. Segundo Hannah Arendt48, trata-se de um Cumpre destacar que os critérios de organização das saber lidar com o mundo, fruto de um processo iniciado ao habilidades na BNCC (com a explicitação dos objetos de nascer e que só se completa com a morte. Nesse sentido, conhecimento aos quais se relacionam e do agrupamento ele é impossível de ser concluído e incapaz de produzir desses objetos em unidades temáticas) expressam um resultados finais, exigindo do sujeito uma compreensão arranjo possível (dentre outros). Portanto, os agrupamentos estética e, principalmente, ética do objeto em questão. propostos não devem ser tomados como modelo obrigatório Nesse contexto, um dos importantes objetivos de História para o desenho dos currículos. no Ensino Fundamental é estimular a autonomia de Considerando esses pressupostos, e em articulação com pensamento e a capacidade de reconhecer que os as competências gerais da Educação Básica e com as indivíduos agem de acordo com a época e o lugar nos competências específicas da área de Ciências Humanas, o quais vivem, de forma a preservar ou transformar seus componente curricular de História deve garantir aos alunos o hábitos e condutas. A percepção de que existe uma grande desenvolvimento de competências específicas.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 34 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Competências específicas de história para o ensino seres humanos pode ser diferente do número que se usa fundamental para contar mandiocas, como acontece com os membros da Compreender acontecimentos históricos, relações de etnia palikur. O que isso significa? Se na tradição de matriz poder e processos e mecanismos de transformação e grega, a unidade é o um (1), para muitos povos indígenas manutenção das estruturas sociais, políticas, econômicas e originários, a unidade é o dois (2). Para os xavantes, por exemplo, a ideia de paridade é um princípio ordenador, pois culturais ao longo do tempo e em diferentes espaços para em torno dela existe uma espécie de modelagem do mundo. analisar, posicionar-se e intervir no mundo contemporâneo. Identificar essas diferenças significa tomar consciência de Compreender a historicidade no tempo e no espaço, que existem várias formas de apreensão da realidade. relacionando acontecimentos e processos de transformação Não são apenas os sistemas numéricos que explicam e manutenção das estruturas sociais, políticas, econômicas e variações de linguagem. Existem inúmeras maneiras de se culturais, bem como problematizar os significados das comunicar por meio de expressões corporais, sonoras ou lógicas de organização cronológica. gustativas – como o que se come ou não se come. No Brasil, Elaborar questionamentos, hipóteses, argumentos e por exemplo, não se comem cachorros; prefere-se carne de proposições em relação a documentos, interpretações e vaca ou uma dieta à base de vegetais. Por quê? E a cobra, é contextos históricos específicos, recorrendo a diferentes uma boa opção para quem? Essas descobertas simples linguagens e mídias, exercitando a empatia, o diálogo, a resultam em um aprimoramento dos mecanismos de resolução de conflitos, a cooperação e o respeito. comunicação e se constituem, posteriormente, no substrato Identificar interpretações que expressem visões de para a elaboração do diálogo e da resolução de conflitos. diferentes sujeitos, culturas e povos com relação a um Aprender a identificar códigos variados é tarefa mesmo contexto histórico, e posicionar-se criticamente com necessária para o desenvolvimento da cognição, base em princípios éticos, democráticos, inclusivos, comunicação e socialização, competências essenciais para o sustentáveis e solidários. viver em sociedade. Analisar e compreender o movimento de populações e Retomando as grandes temáticas do Ensino mercadorias no tempo e no espaço e seus significados Fundamental – Anos Iniciais, pode-se dizer que, do 1º ao 5º históricos, levando em conta o respeito e a solidariedade ano, as habilidades trabalham com diferentes graus de com as diferentes populações. complexidade, mas o objetivo primordial é o reconhecimento Compreender e problematizar os conceitos e do “Eu”, do “Outro” e do “Nós”. Há uma ampliação de escala procedimentos norteadores da produção historiográfica. e de percepção, mas o que se busca, de início, é o Produzir, avaliar e utilizar tecnologias digitais de conhecimento de si, das referências imediatas do círculo informação e comunicação de modo crítico, ético e pessoal, da noção de comunidade e da vida em sociedade. responsável, compreendendo seus significados para os Em seguida, por meio da relação diferenciada entre sujeitos diferentes grupos ou estratos sociais. e objetos, é possível separar o “Eu” do “Outro”. Esse é o ponto de partida. No 3º e no 4º ano contemplam-se a noção de lugar em História no ensino fundamental – anos iniciais: que se vive e as dinâmicas em torno da cidade, com ênfase unidades temáticas, objetos de conhecimento e nas diferenciações entre a vida privada e a vida pública, a habilidades urbana e a rural. Nesse momento, também são analisados A BNCC de História no Ensino Fundamental – Anos processos mais longínquos na escala temporal, como a Iniciais contempla, antes de mais nada, a construção do circulação dos primeiros grupos humanos. sujeito. O processo tem início quando a criança toma Essa análise se amplia no 5º ano, cuja ênfase está em consciência da existência de um “Eu” e de um “Outro”. O pensar a diversidade dos povos e culturas e suas formas de exercício de separação dos sujeitos é um método de organização. A noção de cidadania, com direitos e deveres, conhecimento, uma maneira pela qual o indivíduo toma e o reconhecimento da diversidade das sociedades consciência de si, desenvolvendo a capacidade de pressupõem uma educação que estimule o convívio e o administrar a sua vontade de maneira autônoma, como parte respeito entre os povos. de uma família, uma comunidade e um corpo social. Para evitar uma visão homogênea, busca-se observar Esse processo de constituição do sujeito é longo e que, no interior de uma sociedade, há formas de registros complexo. Os indivíduos desenvolvem sua percepção de si e variados, e que cada grupo produz suas memórias como do outro em meio a vivências cotidianas, identificando o seu elemento que impulsiona o estabelecimento de identidades e lugar na família, na escola e no espaço em que vivem. O o reconhecimento de pertencimento a um grupo social aprendizado, ao longo do Ensino Fundamental – Anos determinado. As memórias podem ser individuais ou Iniciais, torna-se mais complexo à medida que o sujeito coletivas e podem ter significações variadas, inserindo-se em reconhece que existe um “Outro” e que cada um apreende o uma lógica de produção de patrimônios (materiais ou mundo de forma particular. A percepção da distância entre imateriais) que dizem respeito a grupos ou povos objeto e pensamento é um passo necessário para a específicos. autonomia do sujeito, tomado como produtor de diferentes Convém observar que é pressuposto dos objetos de linguagens. É ela que funda a relação do sujeito com a conhecimento, no Ensino Fundamental – Anos Iniciais, sociedade. Nesse sentido, a História depende das analisar como o sujeito se aprimorou na pólis, tanto do ponto linguagens com as quais os seres humanos se comunicam, de vista político quanto ético. Entretanto, respondendo aos entram em conflito e negociam. desafios contemporâneos marcados por grandes A existência de diferentes linguagens pode ser explicada movimentos populacionais e pela globalização, considerou- pela análise, por exemplo, de sistemas numéricos utilizados se uma nova dimensão para o projeto pedagógico. por distintas culturas. Compreender a enorme variedade de Nessa perspectiva, emerge um sujeito coletivo mais sistemas (com base um, com base dois, com base dez etc.) desenraizado, seja por contingências históricas (migrações), é um bom exercício, assim como refletir sobre as ideias de seja, ainda, em razão de viver em uma época em que se adição, subtração, multiplicação e divisão, evitando um olhar buscam múltiplos referenciais identitários que questionam as universalizante para os números. antigas construções do ideário do Estado-nação. Seja como Em determinadas culturas, o número usado para contar for, em ambos os casos, os indivíduos devem se preparar para enfrentar os desafios do mundo contemporâneo.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 35 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS HISTÓRIA – 1º ANO motivos que UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES A noção do “Eu” e aproximam e TEMÁTICAS CONHECIMENTO do “Outro”: separam as Identificar aspectos comunidade, pessoas em As fases da vida e a do seu crescimento convivências e diferentes Mundo ideia de por meio do registro interações entre grupos sociais pessoal: temporalidade das lembranças pessoas ou de meu lugar (passado, presente, particulares ou de parentesco. no mundo futuro) lembranças dos Identificar e membros de sua descrever família e/ou de sua práticas e papéis comunidade. sociais que as Identificar a relação pessoas As diferentes formas entre as suas A comunidade e exercem em de organização da histórias e as seus registros diferentes família e da histórias de sua comunidades. comunidade: os família e de sua Selecionar vínculos pessoais e comunidade. situações as relações de Descrever e cotidianas que amizade distinguir os seus remetam à papéis e percepção de responsabilidades mudança, relacionados à pertencimento e família, à escola e à memória. comunidade. Selecionar e Identificar as A noção do “Eu” e compreender o diferenças entre os do “Outro”: significado de A escola e a variados ambientes registros de objetos e diversidade do em que vive experiências documentos grupo social (doméstico, escolar pessoais e da pessoais como envolvido e da comunidade), comunidade no fontes de reconhecendo as tempo e no espaço memórias e especificidades dos histórias nos hábitos e das regras âmbitos pessoal, que os regem. familiar, escolar A vida em casa, a e comunitário. vida na escola e Identificar Formas de registrar Selecionar formas de semelhanças e e narrar histórias objetos e representação diferenças entre (marcos de documentos social e espacial: os jogos e brincadeiras memória materiais pessoais e de jogos e brincadeiras atuais e de outras e imateriais) grupos próximos como forma de épocas e lugares. ao seu convívio interação social e e compreender espacial sua função, seu Conhecer as uso e seu Mundo histórias da família e significado. pessoal: eu, da escola e Identificar e meu grupo A vida em família: identificar o papel organizar, social e meu diferentes desempenhado por temporalmente, tempo configurações e diferentes sujeitos fatos da vida vínculos em diferentes cotidiana, espaços. usando noções Identificar mudanças O tempo como relacionadas ao e permanências nas medida tempo (antes, formas de durante, ao organização familiar. mesmo tempo e Reconhecer o depois). A escola, sua significado das Identificar e representação comemorações e utilizar diferentes espacial, sua festas escolares, marcadores do história e seu papel diferenciando-as das tempo presentes na comunidade datas festivas na comunidade, comemoradas no como relógio e âmbito familiar ou da calendário. comunidade. Compilar histórias da HISTÓRIA – 2º ANO As fontes: relatos família e/ou da UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES orais, objetos, comunidade TEMÁTICAS CONHECIMENTO imagens (pinturas, registradas em Reconhecer As formas de fotografias, vídeos), diferentes fontes. espaços de registrar as músicas, escrita, Identificar sociabilidade e experiências da tecnologias digitais objetos e identificar os comunidade de informação e documentos comunicação e pessoais que
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 36 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS inscrições nas remetam à diferentes grupos paredes, ruas e própria sociais e culturais, espaços sociais experiência no com especial âmbito da família destaque para as e/ou da culturas africanas, comunidade, indígenas e de discutindo as migrantes. razões pelas Os patrimônios Identificar os quais alguns históricos e culturais patrimônios objetos são da cidade e/ou do históricos e culturais preservados e município em que de sua cidade ou outros são vive região e discutir as descartados. razões culturais, Identificar sociais e políticas diferentes para que assim formas de sejam considerados. trabalho Identificar os marcos existentes na históricos do lugar comunidade em em que vive e O trabalho e a A sobrevivência e a que vive, seus A produção dos compreender seus sustentabilidade relação com a significados, marcos da memória: significados. na comunidade natureza suas os lugares de Identificar os especificidades e memória (ruas, registros de importância. praças, escolas, memória na cidade Identificar monumentos, (nomes de ruas, impactos no museus etc.) monumentos, ambiente edifícios etc.), causados pelas O lugar em discutindo os diferentes que vive critérios que formas de explicam a escolha trabalho desses nomes. existentes na Identificar comunidade em semelhanças e que vive. A produção dos diferenças marcos da memória: existentes entre HISTÓRIA – 3º ANO formação cultural da comunidades de sua UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES população cidade ou região, e TEMÁTICAS CONHECIMENTO descrever o papel Identificar os grupos dos diferentes populacionais que grupos sociais que formam a cidade, o as formam. município e a A produção dos Identificar modos de região, as relações marcos da memória: vida na cidade e no estabelecidas entre a cidade e o campo, campo no presente, eles e os eventos aproximações e comparando-os com que marcam a diferenças os do passado. formação da cidade, Mapear os espaços como fenômenos públicos no lugar em O “Eu”, o “Outro” e migratórios (vida que vive (ruas, os diferentes grupos rural/vida urbana), praças, escolas, As pessoas sociais e étnicos desmatamentos, hospitais, prédios da e os grupos que compõem a estabelecimento de Prefeitura e da que cidade e os grandes empresas A cidade, seus Câmara de compõem a municípios: os etc. espaços públicos e Vereadores etc.) e cidade e o desafios sociais, Selecionar, por meio privados e suas identificar suas município culturais e da consulta de áreas de funções. ambientais do lugar fontes de diferentes conservação Identificar as onde vive naturezas, e ambiental diferenças entre o registrar A noção de espaço doméstico, acontecimentos espaço os espaços públicos ocorridos ao longo público e e as áreas de do tempo na cidade privado conservação ou região em que ambiental, vive. compreendendo a Identificar e importância dessa comparar pontos de distinção. vista em relação a Identificar diferenças eventos entre formas de significativos do trabalho realizadas local em que vive, na cidade e no aspectos campo, relacionados a A cidade e suas considerando condições sociais e atividades: trabalho, também o uso da à presença de cultura e lazer tecnologia nesses
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 37 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS diferentes contextos. circulação de pessoas e Comparar as produtos mercadorias, relações de trabalho analisando as e lazer do presente formas de com as de outros adaptação ou tempos e espaços, marginalização. analisando As rotas terrestres, Identificar e mudanças e fluviais e descrever a permanências. marítimas e seus importância dos impactos para a caminhos HISTÓRIA – 4º ANO formação de terrestres, fluviais UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES cidades e as e marítimos para TEMÁTICAS CONHECIMENTO transformações do a dinâmica da meio natural vida comercial. Reconhecer a A ação das história como Identificar as pessoas, grupos resultado da ação transformações sociais e do ser humano no ocorridas nos comunidades no tempo e no meios de Transformações tempo e no espaço, com base comunicação e permanências espaço: na identificação O mundo da (cultura oral, nas trajetórias nomadismo, de mudanças e tecnologia: a imprensa, rádio, dos grupos integração de televisão, cinema, humanos agricultura, escrita, permanências ao navegações, longo do tempo. pessoas e as internet e demais indústria, entre Identificar exclusões sociais tecnologias outras mudanças e e culturais digitais de permanências ao informação e longo do tempo, comunicação) e discutindo os discutir seus sentidos dos significados para grandes marcos os diferentes da história da grupos ou humanidade estratos sociais. (nomadismo, O surgimento da Identificar as desenvolvimento espécie humana motivações dos da agricultura e no continente processos do pastoreio, africano e sua migratórios em criação da expansão pelo diferentes tempos indústria etc.). mundo e espaços e Identificar as avaliar o papel O passado e o transformações desempenhado presente: a noção ocorridas na pela migração de permanência e cidade ao longo nas regiões de as lentas do tempo e destino. transformações discutir suas Os processos Analisar sociais e culturais interferências nos migratórios para a diferentes fluxos modos de vida de As questões formação do populacionais e seus habitantes, históricas Brasil: os grupos suas tomando como relativas às indígenas, a contribuições ponto de partida o migrações presença para a formação presente. portuguesa e a da sociedade Identificar as diáspora forçada brasileira. relações entre os dos africanos Analisar, na indivíduos e a Os processos sociedade em natureza e migratórios do final que vive, a discutir o do século XIX e existência ou não significado do início do século XX de mudanças A circulação de nomadismo e da no Brasil associadas à pessoas e as fixação das As dinâmicas migração (interna transformações no primeiras internas de e internacional). meio natural comunidades migração no Brasil humanas. a partir dos anos Relacionar os 1960 processos de ocupação do A área de ensino religioso campo a Ao longo da história da educação brasileira, o Ensino intervenções na Religioso assumiu diferentes perspectivas teórico- natureza, metodológicas, geralmente de viés confessional ou Circulação de interconfessional. A partir da década de 1980, as pessoas, avaliando os resultados dessas transformações socioculturais que provocaram mudanças produtos e paradigmáticas no campo educacional também impactaram intervenções. culturas no Ensino Religioso. Em função dos promulgados ideais de Identificar as transformações democracia, inclusão social e educação integral, vários ocorridas nos setores da sociedade civil passaram a reivindicar a A invenção do processos de abordagem do conhecimento religioso e o reconhecimento comércio e a deslocamento das da diversidade religiosa no âmbito dos currículos escolares.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 38 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS A Constituição Federal de 1988 (artigo 210) e a LDB nº atitudes de reconhecimento e respeito às alteridades. Trata- 9.394/1996 (artigo 33, alterado pela Lei nº 9.475/1997) se de um espaço de aprendizagens, experiências estabeleceram os princípios e os fundamentos que devem pedagógicas, intercâmbios e diálogos permanentes, que alicerçar epistemologias e pedagogias do Ensino Religioso, visam o acolhimento das identidades culturais, religiosas ou cuja função educacional, enquanto parte integrante da não, na perspectiva da interculturalidade, direitos humanos e formação básica do cidadão, é assegurar o respeito à cultura da paz. Tais finalidades se articulam aos elementos diversidade cultural religiosa, sem proselitismos. Mais tarde, da formação integral dos estudantes, na medida em que a Resolução CNE/CEB nº 04/2010 e a Resolução CNE/CEB fomentam a aprendizagem da convivência democrática e nº 07/2010 reconheceram o Ensino Religioso como uma das cidadã, princípio básico à vida em sociedade. cinco áreas de conhecimento do Ensino Fundamental de 09 Considerando esses pressupostos, e em articulação com (nove) anos51. as competências gerais da Educação Básica, a área de Estabelecido como componente curricular de oferta Ensino Religioso – e, por consequência, o componente obrigatória nas escolas públicas de Ensino Fundamental, curricular de Ensino Religioso –, devem garantir aos alunos o com matrícula facultativa, em diferentes regiões do país, desenvolvimento de competências específicas. foram elaborados propostas curriculares, cursos de formação inicial e continuada e materiais didático-pedagógicos que Competências específicas de ensino religioso para o contribuíram para a construção da área do Ensino Religioso, ensino fundamental cujas natureza e finalidades pedagógicas são distintas da Conhecer os aspectos estruturantes das diferentes confessionalidade. tradições/movimentos religiosos e filosofias de vida, a partir Considerando os marcos normativos e, em conformidade de pressupostos científicos, filosóficos, estéticos e éticos. com as competências gerais estabelecidas no âmbito da Compreender, valorizar e respeitar as manifestações BNCC, o Ensino Religioso deve atender os seguintes religiosas e filosofias de vida, suas experiências e saberes, objetivos: em diferentes tempos, espaços e territórios. a.Proporcionar a aprendizagem dos conhecimentos Reconhecer e cuidar de si, do outro, da coletividade e da religiosos, culturais e estéticos, a partir das manifestações natureza, enquanto expressão de valor da vida. religiosas percebidas na realidade dos educandos; Conviver com a diversidade de crenças, pensamentos, b.Propiciar conhecimentos sobre o direito à liberdade de convicções, modos de ser e viver. consciência e de crença, no constante propósito de Analisar as relações entre as tradições religiosas e os promoção dos direitos humanos; campos da cultura, da política, da economia, da saúde, da c.Desenvolver competências e habilidades que ciência, da tecnologia e do meio ambiente. contribuam para o diálogo entre perspectivas religiosas e Debater, problematizar e posicionar-se frente aos seculares de vida, exercitando o respeito à liberdade de discursos e práticas de intolerância, discriminação e violência concepções e o pluralismo de ideias, de acordo com a de cunho religioso, de modo a assegurar os direitos Constituição Federal; humanos no constante exercício da cidadania e da cultura de d.Contribuir para que os educandos construam seus paz. sentidos pessoais de vida a partir de valores, princípios éticos e da cidadania. Ensino religioso no ensino fundamental – anos O conhecimento religioso, objeto da área de Ensino iniciais: unidades temáticas, objetos de conhecimento e Religioso, é produzido no âmbito das diferentes áreas do habilidades conhecimento científico das Ciências Humanas e Sociais, ENSINO RELIGIOSO – 1º ANO notadamente da(s) Ciência(s) da(s) Religião(ões). Essas UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES Ciências investigam a manifestação dos fenômenos TEMÁTICAS CONHECIMENTO religiosos em diferentes culturas e sociedades enquanto um Identificar e acolher dos bens simbólicos resultantes da busca humana por as semelhanças e respostas aos enigmas do mundo, da vida e da morte. De diferenças entre o modo singular, complexo e diverso, esses fenômenos eu, o outro e o nós. alicerçaram distintos sentidos e significados de vida e O eu, o outro e o Reconhecer que o diversas ideias de divindade(s), em torno dos quais se nós seu nome e o das organizaram cosmovisões, linguagens, saberes, crenças, demais pessoas os mitologias, narrativas, textos, símbolos, ritos, doutrinas, identificam e os tradições, movimentos, práticas e princípios éticos e morais. Identidades e diferenciam. Os fenômenos religiosos em suas múltiplas manifestações alteridades Reconhecer e são parte integrante do substrato cultural da humanidade. respeitar as Cabe ao Ensino Religioso tratar os conhecimentos características religiosos a partir de pressupostos éticos e científicos, sem Imanência e físicas e subjetivas privilégio de nenhuma crença ou convicção. Isso implica transcendência de cada um. abordar esses conhecimentos com base nas diversas Valorizar a culturas e tradições religiosas, sem desconsiderar a diversidade de existência de filosofias seculares de vida. formas de vida. No Ensino Fundamental, o Ensino Religioso adota a Sentimentos, Identificar e acolher pesquisa e o diálogo como princípios mediadores e Manifestações lembranças, sentimentos, articuladores dos processos de observação, identificação, religiosas memórias e lembranças, análise, apropriação e ressignificação de saberes, visando o saberes memórias e desenvolvimento de competências específicas. Dessa saberes de cada maneira, busca problematizar representações sociais um. preconceituosas sobre o outro, com o intuito de combater a Identificar as intolerância, a discriminação e a exclusão. diferentes formas Por isso, a interculturalidade e a ética da alteridade pelas quais as constituem fundamentos teóricos e pedagógicos do Ensino pessoas Religioso, porque favorecem o reconhecimento e respeito às manifestam histórias, memórias, crenças, convicções e valores de sentimentos, ideias, diferentes culturas, tradições religiosas e filosofias de vida. memórias, gostos e O Ensino Religioso busca construir, por meio do estudo crenças em dos conhecimentos religiosos e das filosofias de vida, diferentes espaços.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 39 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS ENSINO RELIGIOSO – 2º ANO orações, UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES Práticas festividades, TEMÁTICAS CONHECIMENTO celebrativas peregrinações, Reconhecer os entre outras) de diferentes espaços diferentes tradições de convivência. religiosas. O eu, a família e o Identificar Caracterizar as ambiente de costumes, crenças práticas convivência e formas diversas Manifestações celebrativas como de viver em religiosas parte integrante do variados ambientes conjunto das de convivência. manifestações Identificar as religiosas de diferentes formas diferentes culturas e de registro das sociedades. Identidades e memórias Reconhecer as alteridades Memórias e pessoais, familiares indumentárias símbolos e escolares (fotos, (roupas, acessórios, músicas, símbolos, pinturas narrativas, Indumentárias corporais) utilizadas álbuns...). religiosas em diferentes Identificar os manifestações e símbolos presentes tradições religiosas. nos variados Caracterizar as espaços de indumentárias como convivência. elementos Identificar, integrantes das distinguir e identidades Símbolos religiosos respeitar símbolos religiosas. religiosos de distintas ENSINO RELIGIOSO – 4º ANO manifestações, UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES tradições e TEMÁTICAS CONHECIMENTO instituições Identificar ritos religiosas. presentes no Exemplificar cotidiano pessoal, alimentos familiar, escolar e considerados comunitário. sagrados por Identificar ritos e Manifestações Alimentos diferentes culturas, suas funções em religiosas sagrados tradições e diferentes expressões manifestações e religiosas. tradições religiosas. Identificar Ritos religiosos Caracterizar ritos de significados iniciação e de atribuídos a passagem em alimentos em diversos grupos diferentes religiosos manifestações e Manifestações (nascimento, tradições religiosas. religiosas casamento e morte). Identificar as ENSINO RELIGIOSO – 3º ANO diversas formas de UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES expressão da TEMÁTICAS CONHECIMENTO espiritualidade Identificar e (orações, cultos, respeitar os gestos, cantos, diferentes espaços dança, meditação) e territórios nas diferentes religiosos de tradições religiosas. Espaços e diferentes tradições Identificar Identidades e territórios e movimentos representações alteridades religiosos religiosos. religiosas em Caracterizar os diferentes espaços e territórios Representações expressões religiosos como religiosas na arte artísticas (pinturas, locais de realização arquitetura, das práticas esculturas, ícones, celebrativas. símbolos, imagens), Identificar e reconhecendo-as respeitar práticas como parte da celebrativas identidade de (cerimônias, diferentes culturas e tradições religiosas.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 40 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Identificar nomes, estudantes, em um sentido mais amplo, e cujo significados e desenvolvimento deve ser atrelado a situações didáticas representações de planejadas ao longo de toda a educação básica, de modo a divindades nos possibilitar aos alunos revisitar de forma reflexiva seus Crenças contextos familiar e conhecimentos e sua compreensão acerca do mundo em religiosas e Ideia(s) de comunitário. que vivem. Sendo assim, o ensino de Ciências deve filosofias de divindade(s) Reconhecer e promover situações nas quais os alunos possam: vida respeitar as ideias de divindades de Definição de problemas diferentes - Observar o mundo a sua volta e fazer perguntas. manifestações e - Analisar demandas, delinear problemas e planejar tradições religiosas. investigações. - Propor hipóteses. O ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS NOS ANOS INICIAIS: Levantamento, análise e representação CONCEPÇÕES, CAPACIDADES/HABILIDADES; - Planejar e realizar atividades de campo (experimentos, ESTRATÉGIAS E PRÁTICAS observações, leituras, visitas, ambientes virtuais etc.). - Desenvolver e utilizar ferramentas, inclusive digitais, A sociedade contemporânea está fortemente organizada para coleta, análise e representação de dados (imagens, com base no desenvolvimento científico e tecnológico. Da esquemas, tabelas, gráficos, quadros, diagramas, mapas, metalurgia, que produziu ferramentas e armas, passando por modelos, representações de sistemas, fluxogramas, mapas máquinas e motores automatizados, até os conceituais, simulações, aplicativos etc.). atuais chips semicondutores, ciência e tecnologia vêm se - Avaliar informação (validade, coerência e adequação desenvolvendo de forma integrada com os modos de vida ao problema formulado). que as diversas sociedades humanas organizaram ao longo - Elaborar explicações e/ou modelos. da história. - Associar explicações e/ou modelos à evolução histórica No entanto, o mesmo desenvolvimento científico e dos conhecimentos científicos envolvidos. tecnológico que resulta em novos ou melhores produtos e - Selecionar e construir argumentos com base em serviços também pode promover desequilíbrios na natureza evidências, modelos e/ou conhecimentos científicos. e na sociedade. - Aprimorar seus saberes e incorporar, gradualmente, e Para debater e tomar posição sobre alimentos, de modo significativo, o conhecimento científico. medicamentos, combustíveis, transportes, comunicações, - Desenvolver soluções para problemas cotidianos contracepção, saneamento e manutenção da vida na Terra, usando diferentes ferramentas, inclusive digitais. entre muitos outros temas, são imprescindíveis tanto conhecimentos éticos, políticos e culturais quanto científicos. Comunicação Isso por si só já justifica, na educação formal, a presença da - Organizar e/ou extrapolar conclusões. área de Ciências da Natureza, e de seu compromisso com a - Relatar informações de forma oral, escrita ou formação integral dos alunos. multimodal. Portanto, ao longo do Ensino Fundamental, a área de - Apresentar, de forma sistemática, dados e resultados Ciências da Natureza tem um compromisso com o de investigações. desenvolvimento do letramento científico, que envolve a - Participar de discussões de caráter científico com capacidade de compreender e interpretar o mundo (natural, colegas, professores, familiares e comunidade em geral. social e tecnológico), mas também de transformá-lo com - Considerar contra-argumentos para rever processos investigativos e conclusões. base nos aportes teóricos e processuais das ciências. Em outras palavras, apreender ciência não é a finalidade Intervenção última do letramento, mas, sim, o desenvolvimento da - Implementar soluções e avaliar sua eficácia para capacidade de atuação no e sobre o mundo, importante ao resolver problemas cotidianos. exercício pleno da cidadania. - Desenvolver ações de intervenção para melhorar a Nessa perspectiva, a área de Ciências da Natureza, por qualidade de vida individual, coletiva e socioambiental. meio de um olhar articulado de diversos campos do saber, precisa assegurar aos alunos do Ensino Fundamental o Considerando esses pressupostos, e em articulação com acesso à diversidade de conhecimentos as competências gerais da Educação Básica, a área de científicos produzidos ao longo da história, bem como a Ciências da Natureza – e, por consequência, o componente aproximação gradativa aos principais processos, práticas e curricular de Ciências –, devem garantir aos alunos o procedimentos da investigação científica. desenvolvimento de competências específicas. Espera-se, desse modo, possibilitar que esses alunos tenham um novo olhar sobre o mundo que os cerca, como Competências específicas de ciências da natureza também façam escolhas e intervenções conscientes e para o ensino fundamental pautadas nos princípios da sustentabilidade e do bem Compreender as Ciências da Natureza como comum. Para tanto, é imprescindível que eles sejam empreendimento humano, e o conhecimento científico como progressivamente estimulados e apoiados no planejamento e provisório, cultural e histórico. na realização cooperativa de atividades investigativas, bem Compreender conceitos fundamentais e estruturas como no compartilhamento dos resultados dessas explicativas das Ciências da Natureza, bem como dominar investigações. Isso não significa realizar atividades seguindo, processos, práticas e procedimentos da investigação necessariamente, um conjunto de etapas predefinidas, científica, de modo a sentir segurança no debate de tampouco se restringir à mera manipulação de objetos ou questões científicas, tecnológicas, socioambientais e do realização de experimentos em laboratório. mundo do trabalho, continuar aprendendo e colaborar para a Ao contrário, pressupõe organizar as situações de construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva. aprendizagem partindo de questões que sejam desafiadoras Analisar, compreender e explicar características, e, reconhecendo a diversidade cultural, estimulem o fenômenos e processos relativos ao mundo natural, social e interesse e a curiosidade científica dos alunos e possibilitem tecnológico (incluindo o digital), como também as relações definir problemas, levantar, analisar e representar resultados; que se estabelecem entre eles, exercitando a curiosidade comunicar conclusões e propor intervenções. para fazer perguntas, buscar respostas e criar soluções Dessa forma, o processo investigativo deve ser (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das entendido como elemento central na formação dos Ciências da Natureza.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 41 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Avaliar aplicações e implicações políticas, podem ser usados de socioambientais e culturais da ciência e de suas tecnologias forma mais para propor alternativas aos desafios do mundo consciente. contemporâneo, incluindo aqueles relativos ao mundo do trabalho. Construir argumentos com base em dados, evidências e informações confiáveis e negociar e defender ideias e pontos de vista que promovam a consciência socioambiental e o respeito a si próprio e ao outro, acolhendo e valorizando a Localizar, nomear e diversidade de indivíduos e de grupos sociais, sem representar preconceitos de qualquer natureza. graficamente (por Utilizar diferentes linguagens e tecnologias digitais de meio de desenhos) informação e comunicação para se comunicar, acessar e partes do corpo disseminar informações, produzir conhecimentos e resolver humano e explicar problemas das Ciências da Natureza de forma crítica, Corpo humano suas funções. significativa, reflexiva e ética. Respeito à Discutir as razões Conhecer, apreciar e cuidar de si, do seu corpo e bem- diversidade pelas quais os estar, compreendendo-se na diversidade humana, fazendo- hábitos de higiene do se respeitar e respeitando o outro, recorrendo aos corpo (lavar as mãos conhecimentos das Ciências da Natureza e às suas antes de comer, tecnologias. escovar os dentes, Agir pessoal e coletivamente com respeito, autonomia, limpar os olhos, o responsabilidade, flexibilidade, resiliência e determinação, Vida e nariz e as orelhas recorrendo aos conhecimentos das Ciências da Natureza evolução etc.) são necessários para tomar decisões frente a questões científico-tecnológicas para a manutenção e socioambientais e a respeito da saúde individual e coletiva, da saúde. com base em princípios éticos, democráticos, sustentáveis e Comparar solidários. características físicas entre os colegas, Ciências no ensino fundamental – anos iniciais reconhecendo a Antes de iniciar sua vida escolar, as crianças já convivem diversidade e a com fenômenos, transformações e aparatos tecnológicos em importância da seu dia a dia. Além disso, na Educação Infantil, como valorização, do proposto na BNCC, elas têm a oportunidade de explorar acolhimento e do ambientes e fenômenos e também a relação com seu próprio respeito às corpo e bem-estar, em todos os campos de experiências. diferenças. Assim, ao iniciar o Ensino Fundamental, os alunos Identificar e nomear possuem vivências, saberes, interesses e curiosidades sobre diferentes escalas de o mundo natural e tecnológico que devem ser valorizados e tempo: os períodos mobilizados. Esse deve ser o ponto de partida de atividades diários (manhã, tarde, que assegurem a eles construir conhecimentos noite) e a sucessão sistematizados de Ciências, oferecendo-lhes elementos para de dias, semanas, que compreendam desde fenômenos de seu ambiente Terra e Escalas de tempo meses e anos. imediato até temáticas mais amplas. Universo Selecionar exemplos Nesse sentido, não basta que os conhecimentos de como a sucessão científicos sejam apresentados aos alunos. É preciso de dias e noites oferecer oportunidades para que eles, de fato, envolvam-se orienta o ritmo de em processos de aprendizagem nos quais possam vivenciar atividades diárias de momentos de investigação que lhes possibilitem exercitar e seres humanos e de ampliar sua curiosidade, aperfeiçoar sua capacidade de outros seres vivos. observação, de raciocínio lógico e de criação, desenvolver posturas mais colaborativas e sistematizar suas primeiras CIÊNCIAS – 2º ANO explicações sobre o mundo natural e tecnológico, e sobre seu corpo, sua saúde e seu bem-estar, tendo como UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES referência os conhecimentos, as linguagens e os TEMÁTICAS CONHECIMENTO procedimentos próprios das Ciências da Natureza. Identificar de que É necessário destacar que, em especial nos dois materiais (metais, primeiros anos da escolaridade básica, em que se investe madeira, vidro etc.) são prioritariamente no processo de alfabetização das crianças, feitos os objetos que as habilidades de Ciências buscam propiciar um contexto fazem parte da vida adequado para a ampliação dos contextos de letramento. cotidiana, como esses objetos são utilizados e CIÊNCIAS – 1º ANO com quais materiais UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES eram produzidos no TEMÁTICAS CONHECIMENTO passado. Propriedades e usos Propor o uso de Comparar dos materiais diferentes materiais para características de Prevenção de a construção de objetos diferentes materiais Matéria e acidentes de uso cotidiano, tendo presentes em objetos energia domésticos em vista algumas de uso cotidiano, propriedades desses Matéria e Características dos discutindo sua materiais (flexibilidade, energia materiais origem, os modos dureza, transparência como são etc.). descartados e como Discutir os cuidados
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 42 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS necessários à prevenção de som e luz. de acidentes domésticos Identificar (objetos cortantes e características sobre o inflamáveis, eletricidade, modo de vida (o que produtos de limpeza, comem, como se medicamentos etc.). reproduzem, como se Descrever deslocam etc.) dos características de animais mais comuns plantas e animais Características e no ambiente próximo. (tamanho, forma, cor,Vida e desenvolvimento Descrever e fase da vida, local ondeevolução dos animais comunicar as se desenvolvem etc.) alterações que que fazem parte de seu ocorrem desde o cotidiano e relacioná-las nascimento em ao ambiente em que eles animais de diferentes vivem. meios terrestres ou Investigar a importância aquáticos, inclusive o Seres vivos no da água e da luz para a homem. Vida e ambiente manutenção da vida de Comparar alguns evolução Plantas plantas em geral. animais e organizar Identificar as principais grupos com base em partes de uma planta características (raiz, caule, folhas, flores externas comuns e frutos) e a função (presença de penas, desempenhada por cada pelos, escamas, bico, uma delas, e analisar as garras, antenas, patas relações entre as etc.). plantas, o ambiente e os Identificar demais seres vivos. características da Descrever as posições Terra (como seu do Sol em diversos formato esférico, a Movimento aparente horários do dia e presença de água, Terra e do Sol no céu associá-las ao tamanho solo etc.), com base Universo O Sol como fonte de da sombra projetada. na observação, luz e calor Comparar o efeito da manipulação e radiação solar comparação de (aquecimento e reflexão) diferentes formas de em diferentes tipos de representação do superfície (água, areia, planeta (mapas, solo, superfícies escura, globos, fotografias clara e metálica etc.). Características da etc.). Terra Observar, identificar e Terra e Observação do registrar os períodos CIÊNCIAS – 3º ANO Universo céu diários (dia e/ou noite) UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES Usos do solo em que o Sol, demais TEMÁTICAS CONHECIMENTO estrelas, Lua e Produzir diferentes planetas estão visíveis sons a partir da no céu. vibração de variados Comparar diferentes objetos e identificar amostras de solo do variáveis que influem entorno da escola nesse fenômeno. com base em Experimentar e características como relatar o que ocorre cor, textura, cheiro, com a passagem da tamanho das Produção de som luz através de objetos partículas, Matéria e Efeitos da luz nos transparentes (copos, permeabilidade etc. energia materiais janelas de vidro, Identificar os Saúde auditiva e lentes, prismas, água diferentes usos do visual etc.), no contato com solo (plantação e superfícies polidas extração de materiais, (espelhos) e na dentre outras intersecção com possibilidades), objetos opacos reconhecendo a (paredes, pratos, importância do solo pessoas e outros para a agricultura e objetos de uso para a vida. cotidiano). Discutir hábitos CIÊNCIAS – 4º ANO necessários para a UNIDADES OBJETOS DE HABILIDADES manutenção da saúde TEMÁTICAS CONHECIMENTO auditiva e visual Identificar misturas na considerando as Misturas vida diária, com base condições do Matéria e Transformações em suas propriedades ambiente em termos
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 43 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS energia reversíveis e não físicas observáveis, Identificar os pontos reversíveis reconhecendo sua cardeais, com base composição. no registro de Testar e relatar diferentes posições transformações nos relativas do Sol e da materiais do dia a dia sombra de uma vara quando expostos a (gnômon). diferentes condições Pontos cardeais Comparar as (aquecimento, Calendários, indicações dos pontos resfriamento, luz e Terra e fenômenos cíclicos cardeais resultantes umidade). Universo e cultura da observação das Concluir que algumas sombras de uma vara mudanças causadas (gnômon) com por aquecimento ou aquelas obtidas por resfriamento são meio de uma bússola. reversíveis (como as Associar os mudanças de estado movimentos cíclicos físico da água) e da Lua e da Terra a outras não (como o períodos de tempo cozimento do ovo, a regulares e ao uso queima do papel etc.). desse conhecimento Analisar e construir para a construção de cadeias alimentares calendários em simples, diferentes culturas. reconhecendo a posição ocupada AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM. A AVALIAÇÃO COMO pelos seres vivos PROCESSO CONTÍNUO, INVESTIGATIVO E INCLUSIVO nessas cadeias e o papel do Sol como Obs: Parte desse conteúdo já foi abordado em fonte primária de “Fundamentos da Educação”. energia na produção de alimentos. A avaliação no contexto educacional é um processo Descrever e destacar fundamental para entender o progresso dos alunos, semelhanças e identificar suas necessidades e orientar o desenvolvimento diferenças entre o do ensino. Quando concebida como um processo contínuo, ciclo da matéria e o investigativo e inclusivo, a avaliação se torna uma ferramenta Cadeias fluxo de energia entre poderosa para promover a aprendizagem significativa e o Vida e alimentares os componentes vivos desenvolvimento integral dos estudantes. evolução simples e não vivos de um Primeiramente, ao considerar a avaliação como um Microrganismos ecossistema. processo contínuo, reconhecemos que ela não se limita a Relacionar a momentos pontuais, como provas ou testes, mas é integrada participação de ao cotidiano escolar. Isso significa que os professores estão fungos e bactérias no constantemente observando, monitorando e analisando o processo de desempenho dos alunos em diversas atividades e situações decomposição, de aprendizagem, utilizando uma variedade de estratégias e reconhecendo a instrumentos de avaliação. Essa abordagem permite uma importância ambiental compreensão mais abrangente do progresso dos alunos ao desse processo. longo do tempo e proporciona feedback regular para orientar Verificar a seu desenvolvimento. participação de Além disso, a avaliação como um processo investigativo microrganismos na envolve a busca ativa por compreender o processo de produção de aprendizagem dos alunos, suas dificuldades, seus interesses alimentos, e suas formas de construir conhecimento. Os professores combustíveis, são incentivados a fazer perguntas, a explorar diferentes medicamentos, entre abordagens pedagógicas e a envolver os alunos na reflexão outros. sobre seu próprio aprendizado. Dessa forma, a avaliação se Propor, a partir do torna uma oportunidade de investigação e descoberta mútua, conhecimento das onde tanto os professores quanto os alunos podem aprender e crescer juntos. formas de Por fim, a avaliação inclusiva reconhece a diversidade de transmissão de habilidades, experiências e formas de aprender dos alunos e alguns busca garantir que todos tenham oportunidades equitativas microrganismos de demonstrar seu conhecimento e seu potencial. Isso (vírus, bactérias e implica em utilizar uma variedade de métodos e estratégias protozoários), atitudes de avaliação que sejam acessíveis e relevantes para todos e medidas adequadas os alunos, independentemente de suas características para prevenção de individuais. Além disso, a avaliação inclusiva também doenças a eles envolve a participação ativa dos alunos no processo de associadas. avaliação, dando-lhes voz e autonomia para expressar suas necessidades e contribuir para seu próprio desenvolvimento.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 44 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS NA PRÁTICA: O ATO DE AVALIAR malsucedidas. (LUCKESI, 2003, p.23). O ato de avaliar de acordo com Luckesi (2000), precisa Hoffman (2003) afirma, que o objetivo da avaliação é estar concernente com o acolhimento, que é a aceitação do acompanhar o processo de ensino e aprendizagem do aluno, educando na sua subjetividade, pois se não acontecer o e se perdermos o foco, perdemos o significado essencial da acolhimento não haverá uma avaliação de qualidade. Se o avaliação. Não tem como dissociar o educar do avaliar, educador valorizar de fato, toda a produção do educando, portanto, classificá-los ao final de um período, em aprovado partindo de seus avanços ou dificuldades para o ou reprovado, não é o caminho para se atingir o crescimento direcionamento de novas práticas educativas, estará, e o aprendizado dos alunos. Sabemos que o educador tem certamente, tornando-os participantes do processo de ensino um papel importante sobre as práticas avaliativas, ele pode e aprendizagem, mas isso dependerá também dos despertar no aluno o interesse de adquirir um conhecimento instrumentos que serão utilizados nessa avaliação. “A para além de um bom resultado obtido através da avaliação, pedagogia que sustenta o exame se contenta com a fazendo com que o aluno aprenda de forma significativa, e classificação, seja ela qual for; a pedagogia que sustenta o não por medo, tendo em mente apenas atingir uma boa nota, ato de avaliar não se contenta com qualquer resultado, mas pois sabemos que medir a capacidade apenas por seu somente com o resultado satisfatório’’. Nesse sentido, a resultado obtido na prova, não significa que o houve avaliação não propõe o caráter qualitativo, o ato de avaliar aprendizagem. Para que aconteça a aprendizagem é preciso deve investigar a qualidade da realidade, que caberá ao que o educador busque através do erro que o aluno cometeu gestor da ação decidir o uso que se fará dos resultados na prova uma nova prática avaliativa que vai nortear o ensino desse ato investigativo. que auxiliará o aluno nesse processo de ensino A avaliação que acolhe e também avalia acontece de aprendizagem. forma intencional com o intuito de promover o ensino e a Enxergar a avaliação como um caminho de crescimento aprendizagem do educando a um processo contínuo e não sadio e feliz, faz-nos pensar no objetivo principal da estático. De semelhante modo, o ato de avaliar a avaliação que é a aprendizagem, e usá-la como suporte, aprendizagem escolar tem por objetivo diagnosticar o para se chegar ao conhecimento é preciso um diagnóstico do desempenho do educando na aprendizagem dos conteúdos aluno. “O que já aprendeu está bem; mas, o que não trabalhados e subsidiar novas decisões com a finalidade de aprendeu (e necessita de aprender, porque é essencial) alcançar o resultado qualitativo desejado, segundo Luckesi indica a necessidade da intervenção de reorientação..., até (2005). que aprenda”. Dessa forma, será utilizado o resultado da A atuação do docente na sua prática pedagógica no avaliação como um processo continuo e não excludente. processo de avaliação daaprendizagem tem se tornado uma das grandes causas do fracasso escolar. Segundo Luckesi AS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS E SUAS (2003) a prática pedagógica escolar tem deixado de ser uma IMPLICAÇÕES NA PRÁTICA PEDAGÓGICA pedagogia centralizada no processo de ensino e aprendizagem e tem se transformado em uma pedagogia do De forma geral, as DCNs são normas obrigatórias para exame, que tem como objetivo a promoção. Esse resultado é orientar o planejamento curricular das escolas e sistemas de esperado tanto pelos discentes como também pelos pais que ensino. São as definições doutrinárias sobre princípios, veem as notas como o fator mais importante. Dessa forma fundamentos e procedimentos da Educação Básica. Luckesi (2003) afirma: As Diretrizes Curriculares Nacionais servem para orientar Pais, sistema de ensino, profissionais de educação, as escolas e demais instituições de ensino sobre como vão professores e alunos, todos têm suas atenções centradas na montar suas grades curriculares. Em outras palavras, as promoção, ou não, do estudante de uma série de DCNs ajudam na organização, articulação, desenvolvimento escolaridade para outra. O sistema de ensino está e avaliação de propostas pedagógicas. interessado nos percentuais de aprovação/reprovação do Portanto, podemos conceituar essas diretrizes como o total dos educandos; os pais estão desejosos de que seus mecanismo, a base, para a formação da grade escolar e filhos avancem nas séries de escolaridade; os professores se currículos da rede de ensino. É a partir delas que se utilizam permanentemente dos procedimentos de avaliação determina a base do que será ensinado nas escolas do país. como elementos motivadores dos estudantes, por meio da As DCNs são fixadas e definidas pelo Conselho Nacional ameaça; os estudantes estão sempre na expectativa de de Educação (CNE). A origem dessas diretrizes é a Lei de virem a ser aprovados ou reprovados e, para isso, servem-se Diretrizes e Bases da Educação (LDB), do ano de 1996. dos mais variados expedientes. O nosso exercício pedagógico escolar é atravessado mais por uma pedagogia Princípios das DCNs do exame que por uma pedagogia do ensino/ aprendizagem. Um dos princípios-chave das Diretrizes Curriculares (LUCKESI 2003, p. 18). Nacionais é a equidade. Isso significa que as diretrizes A arbitrariedade exercida pela maioria dos professores é buscam assegurar que todos os alunos tenham igualdade de de grande relevância, pois eles usam a prova/exame como acesso, permanência e sucesso na educação, um instrumento de ameaça, sendo assim a avaliação tem independentemente de suas origens sociais, econômicas, perdido o seu real significado que é o de proporcionar culturais ou regionais. A flexibilidade é outro princípio crucial decisões que produzam um resultado satisfatório na das DCNs. Reconhecendo a diversidade de contextos aprendizagem. No entanto, quando a avaliação é utilizada educacionais em todo o país, as diretrizes permitem a apenas como um meio de promover o aluno, sem se adaptação dos currículos às características locais e às preocupar com o conhecimento obtido, dando ênfase apenas necessidades específicas das comunidades e dos alunos. aos registros finais, a avaliação perde as propostas que Ao promover a integração entre diferentes áreas do deveria seguir e se torna final e burocrática, que além de conhecimento, as diretrizes incentivam os alunos a fazerem diminuir as chances do aluno ter uma aprendizagem conexões entre os conteúdos e a desenvolverem uma significativa, torna-se uma avaliação opressiva, fazendo com compreensão mais ampla e holística dos temas abordados. que o aluno sinta medo e se preocupe apenas com a nota. Isso contribui para uma visão mais abrangente do Neste caminhar Luckesi (2003) afirma: conhecimento, propiciando a interdisciplinaridade. [...] Nem sempre se leva em consideração o que é Além disso, as DCNs enfatizam a importância da ensinado. Mas importante do que ser uma oportunidade de formação integral dos indivíduos. Isso vai além da formação aprendizagem significativa, a avaliação tem sido uma acadêmica e inclui o desenvolvimento de habilidades oportunidade de prova de resistência do aluno aos ataques socioemocionais, éticas e cidadãs. Os alunos são do professor. As notas são operadas como se nada tivessem incentivados a se tornarem cidadãos conscientes e a ver com a aprendizagem. As médias são médias entre responsáveis, capazes de lidar com desafios do mundo números e não expressões de aprendizagem bem ou atual.
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 45 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Por fim, as DCNs também valorizam os profissionais da Ao definir a educação da criança pequena as DCNEI educação. Elas promovem a valorização e a formação afirmam como contínua dos educadores, reconhecendo seu papel Primeira Etapa da Educação Básica, oferecida em fundamental na promoção de uma educação de qualidade e Creches e Pré-escola, as quais se caracterizam como no desenvolvimento dos alunos. Espaços Institucionais não domésticos que constituem estabelecimentos educacionais públicos ou privados que Importância educam e cuidam de crianças de 0 a 5 anos de idade no As Diretrizes Curriculares Nacionais possuem uma período diurno, em jornada integral ou parcial, regulados e importância fundamental para a educação nacional. supervisionados por órgão competente do sistema de ensino Primeiro, porque são elas os pilares fundamentais para a e submetidos a controle social (BRASIL, 2009a). organização do ensino no país. Imagine um país de Essa é uma das concepções que orientam as DCNEI, no proporções continentais, como o nosso, que não tem um que diz respeito às definições indispensáveis para Educação sistema de ensino uniforme em relação ao currículo escolar. Infantil e que fortalecem o significado de ser criança na Possivelmente, haveria diferenças enormes entre o que é sociedade, na família, na escola, sendo percebida como ensinado em um estado no Sul para um na região Nordeste. cidadã de direitos a partir de seu nascimento. Com as diretrizes esse risco é eliminado, e um currículo Ao definir Currículo, as DCNEI utilizam como conceito, básico e uniforme para as instituições de ensino no país é Conjunto de práticas que buscam articular as experiências e preservado. os saberes das crianças como os conhecimentos que fazem Outro fator importante das Diretrizes Curriculares parte do patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e Nacionais é que elas não são totalmente rígidas e tecnológico, de modo a promover o desenvolvimento integral determinadas apenas pela União. de crianças de zero a 5 anos de idade (BRASIL, 2009a). Estados e o Distrito Federal, bem como os Municípios e De acordo com Maria Luiza Rodrigues Flores e Simone entidades como Consed (Conselho Nacional dos Secretários Santos de Albuquerque (2015), são essas concepções que Estaduais de Educação) e a Undime (União Nacional dos fortalecem o significado de ser criança na sociedade, na Dirigentes Municipais de Educação) tem participação ativa família e na escola, sendo percebida como cidadão de na formação dos currículos escolares. direitos desde o seu nascimento. Sobre esses direitos, Outro ponto é que as DCNs ainda preservam a As atuais DCNEI qualificam esse direito e o lugar em que autonomia dos professores, das escolas e de suas propostas ele se efetiva, definindo o espaço coletivo de educação para pedagógicas. Desde que cumprindo os requisitos previstos crianças pequenas como uma escola que legitima sua pelas DCNs, as entidades e profissionais de ensino têm experiência de infância, a partir da efetivação de um currículo liberdade para ensinar conteúdos e disciplinas que acharem que valoriza as práticas sociais e culturais das crianças e pertinentes. suas comunidades, oferecendo oportunidades para a ampliação de conhecimentos em relação a si, aos outros e As diretrizes curriculares para educação infantil e ao mundo (FLORES; ALBUQUERQUE, 2015, p. 19). sua importância pedagógica Ao objetivar a concretização dessas práticas diárias na A Resolução CNE/SEB N.5 de 17 de dezembro de Educação Infantil, as DCNEI foram desdobradas, apoiando- 2009a, que fixa as diretrizes, estabelece no seu art.1º que as se em cinco princípios educativos que são: Diversidade e DCNEI devem ser observadas na organização de propostas singularidade; Democracia, sustentabilidade e participação; pedagógicas na Educação Infantil. É no art. 2º que as DCNEI Indissociabilidade entre educar e cuidar; Ludicidade e se articulam com as Diretrizes Curriculares Nacionais da brincadeira; Estética como experiência individual e coletiva Educação Básica e reúnem princípios, fundamentos e (BRASIL, 2009a, p. 56). Flores e Albuquerque (2015), trazem procedimentos definidos pela Câmara de Educação Básica à reflexão questionamentos de como esses princípios se do Conselho Nacional de Educação, para orientar as efetivam nas práticas. políticas públicas na área e a elaboração, planejamento, Como as crianças vivenciam esses princípios na escola? execução e avaliação de propostas pedagógicas e Para responder a esses questionamentos, as autoras curriculares. destacaram o documento apresentado pelo MEC, que trata O Ministério da Educação – MEC que deve induzir os das Práticas Cotidianas na Educação Infantil – Base para a estados e municípios à implementação de políticas que Reflexão sobre as Orientações Curriculares (2009) em que O concretizem o ordenamento legal vigente, o que foi possível pensamento pedagógico tem como objetivo de investigação somente no ano de 2008, por meio do programa currículo em dos sistemas de ação inerentes às situações educativas, ou movimento e a implementação do Projeto de Cooperação seja, a materialização da experiência educativa. A pedagogia Técnica entre o Ministério da Educação, por intermédio da descreve, problematiza, questiona e complementa. Assim, Secretaria de Educação Básica e da Coordenação da onde estiver presente uma situação de produção de Educação Infantil – SEB/COEDI, e a Universidade Federal conhecimento, de saber, de aprendizagem, onde houver uma do Rio Grande do Sul (UFRGS). O objetivo desse projeto foi prática social de construção de conhecimentos, também produzir incentivo para a implementação de políticas públicas estará presente uma pedagogia (BRASIL, 2009d, p. 42). Por comprometidas com a qualidade e a expansão da Educação isso, entende-se que o grande desafio para os profissionais Infantil no Brasil, em que o cerne foi a elaboração de que atuam nessa etapa da Educação é essa ação orientações curriculares para as práticas do dia a dia na pedagógica que se propõe com crianças pequenas em Educação Infantil. espaços coletivos. As DCNEI representam, a partir do ano de 2009, um À medida que se reconhece a necessidade de construir marco na história da Educação Infantil brasileira, por terem um currículo que não seja focado em áreas do sido construídas, conforme já mencionado, com a desenvolvimento, em áreas de conhecimento e objetivos participação de pesquisadores, professores e de movimentos predeterminados nacionalmente ou currículos estruturados a ligados à defesa da Educação Infantil, porque ao ouvirem partir de sequências de atividades ou de festividades com diferentes sujeitos trouxeram a criança como centro do base no calendário cultural brasileiro ou local, que não sejam planejamento e o currículo pensado a partir de diferentes currículos centrados em rotinas padronizadas, que objetivam linguagens. Nesse sentido, as DCNEI, ao conceituar a muito mais o disciplinamento, desconsiderando o que as criança a declara como Sujeito histórico e de direitos, que, crianças já trazem como conhecimento e as necessidades de nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, suas famílias. Na perspectiva das novas DCNEI, o que se constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, pretende é um currículo que estabeleça experiências e fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, aprendizagens a partir das práticas sociais e linguagens, em questiona e constrói sentimentos sobre a natureza e íntima relação com a vida cotidiana. sociedade, produzindo cultura (BRASIL, 2009a).
MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL 46 MANUAL DE ESTUDOS CURSO OFICIAL