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Remanescente do contrato e licitante remanescente


Qual é a diferença?

 07/03/2022 07:00   

a A Artigo

Por Ronaldo Correa (Comprador Público, articulista, docente e conteudista na área de licitações e contratos)

Introdução

Por mais que se tenha cada vez mais projetos públicos preconizando o uso da linguagem simples e outras estratégias
que facilitem a comunicação, como é o caso do legal design e do visual law, incorporado recentemente em alguns
documentos jurídicos elaborados pela Advocacia-Geral da União - AGU, em alguns casos específicos ainda faz-se

necessário o cuidado no uso da correta terminologia técnica, como forma de evitar procedimentos equivocados ou
mesmo ilegais.

No cumprimento do dever de demonstrar a subsunção do fato à norma (ou seja, demonstrar que o caso concreto ali
tratado se enquadra corretamente naquela hipótese legal), o gestor público precisa ter cautela no uso da terminologia

correta, evitando a adoção de termos do senso comum ou que possam gerar falhas de interpretação e dúvidas, acerca
do correto enquadramento legal do ato administrativo.

Um desses termos que eu tenho visto ser utilizado eventualmente de forma equivocada é a palavra remanescente, que

tanto pode representar o saldo não executado de um contrato que foi rescindido, como o licitante que restou
classificado na licitação mas não foi declarado vencedor ou mesmo o licitante que figurou em cadastro de reserva no
Sistema de Registro de Preços. E é tentando auxiliar na diferenciação dessas situações que escrevo o presente
artigo.

Remanescente do contrato

Como forma de não deixar a Administração Pública desassistida caso um contratado deixe de executar o contrato, o
legislador previu uma hipótese específica de Dispensa de Licitação, para que se possa dar prosseguimento à
execução da parte do objeto não executada pelo contratado anterior.

Art. 24. É dispensável a licitação:

XI - na contratação de remanescente de obra, serviço ou fornecimento, em conseqüência de rescisão

contratual, desde que atendida a ordem de classificação da licitação anterior e aceitas as mesmas
condições oferecidas pelo licitante vencedor, inclusive quanto ao preço, devidamente corrigido;

Dentre as condições legais para o uso dessa hipótese de contratação direta, o legislador previu que deve haver a
rescisão do contrato anterior. Neste caso, há dúvidas se a rescisão pode ser feita de forma concomitante ou se deve
ser sempre prévia à assinatura de novo contrato. Mas tenho a impressão de que a rescisão não precisa ser prévia,
caso se demonstre que causaria prejuízos à Administração. A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro
(LINDB) preconiza a adoção do consequencialismo, de forma que o gestor deve considerar as consequências práticas

de cada decisão que tomar.

E além disto, exige-se que para a substituição do contratado anterior, a Administração respeite a ordem de
classificação da licitação que deu origem ao contrato rescindido. De forma que aqui também há dúvidas se "respeitar
a ordem de classificação" implica em vedação à contratação de empresa que não participou da licitação, caso os

licitantes classificados não queiram firmar o contrato por Dispensa de Licitação. Novamente, tenho a impressão de
que a finalidade desse dispositivo legal é dar guarida à Administração para que não fique sem contrato, indicando
talvez que não se trata de uma exclusividade para os licitantes remanescentes, mas sim um mero direito de
preferência.

Uma última exigência legal imposta como condição para essa hipótese específica de Dispensa de Licitação é que o
novo contratado aceite as mesmas condições oferecidas pelo licitante vencedor que havia sido contratado
anteriormente. E por "mesmas condições", entende-se que devem ser mantidas a contagem de prazo de vigência,
prazos para reajuste e outras condições do contrato anterior, e não somente o preço, que inclusive pode ser corrigido

mediante os mecanismos contratuais de manutenção das condições efetivas da proposta, tais como reajuste,
repactuação e revisão.

Neste caso, a expressão "remanescente de obra, serviço ou fornecimento" indica claramente que se trata do saldo
remanescente do contrato rescindido. Ou seja, é uma hipótese de dispensa de licitação que busca garantir a

continuidade da execução do que remanesce do contrato anterior sem ser executado pelo contratado que ganhou a
licitação.

Observe-se ainda que não se trata mais de um procedimento de licitação e sim de uma contratação direta
expressamente prevista em lei como sendo uma hipótese de dispensa de licitação. E o seu uso independe da
modalidade da licitação que deu origem ao contrato rescindido.

Licitante remanescente

Como bem ilustra o talentoso professor Dawison Barcelos, do TCU, em seu site O Licitante, a legislação prevê solução
para várias situações onde o licitante ou não assinou o contrato ou deixou de executá-lo parcial ou totalmente. E para
cada uma dessas situações a lei impõe condições específicas, como por exemplo a manutenção ou não das mesmas
condições da proposta do licitante que foi declarado inicialmente como vencedor da licitação.
Da ilustração acima, concluímos que temos três hipóteses onde a Administração irá convocar os licitantes que
restaram classificados na licitação e, a partir daí seguir para o julgamento da proposta, habilitação, adjudicação e
julgamento, da mesma forma que havia sido feito quando da última sessão pública desta licitação. É o que
chamamos de volta de fase. A quarta hipótese é a contratação direta por Dispensa de Licitação, que já comentamos
no tópico anterior.

Notem que para o caso onde o vencedor original da licitação assinou o contrato mas não iniciou a sua execução, não
há previsão legal expressa para contornar o problema. Porém, não é difícil concordar com a sugestão do professor
Dawison quanto à aplicação analógica da Lei nº 8.666, de 1993, conforme excerto abaixo transcrito.

Art. 64, § 2o É facultado à Administração, quando o convocado não assinar o termo de contrato ou
não aceitar ou retirar o instrumento equivalente no prazo e condições estabelecidos, convocar os
licitantes remanescentes, na ordem de classificação, para fazê-lo em igual prazo e nas mesmas
condições propostas pelo primeiro classificado, inclusive quanto aos preços atualizados de
conformidade com o ato convocatório, ou revogar a licitação independentemente da cominação
prevista no art. 81 desta Lei.

Neste caso, a expressão "licitantes remanescentes" indica que se trata dos demais licitantes que participaram da
licitação mas não haviam sido declarados vencedores inicialmente. Ou seja, é uma hipótese de retomada da mesma
licitação, a partir da fase de julgamento das propostas, convocando-se o próximo colocado para que ele tenha a sua
proposta e condições de habilitação julgadas e, se atendidas as condições do edital seja declarado como novo
vencedor e só então possa assinar um novo contrato para a execução do objeto licitado.

Por mais que no caso específico da contratação direta à qual se refere o Art. 24, XI da Lei nº 8.666, de 1993, exige-se
o respeito à ordem de classificação da licitação de origem, no caso da convocação dos licitantes remanescentes não
se trata de uma hipótese de contratação direta, mas sim de volta de fase para a retomada da mesma licitação

anterior.

Note-se que em alguns casos o contrato original já teve a sua execução iniciada. O que pode dificultar a volta de fase,
por existir Nota de Empenho emitida e eventualmente liquidada e paga, mesmo que parcialmente. No SIASG, por
exemplo, a volta de fase normalmente só é possível quando todos os empenhos podem ser anulados, para que então
seja possível cancelar a homologação e voltar para a fase de julgamento das propostas. Mas nem sempre tal
anulação é possível, especialmente quando já houver liquidação e pagamento realizados.

Frise-se ainda que os demais licitantes que participaram da licitação não se obrigam a manter suas propostas caso

elas já estejam vencidas. Neste caso, a volta de fase mesmo quando for possível pode se tornar inócua, devido à não
obrigação dos licitantes remanescentes em manterem suas propostas. Por este e outros motivos, tenho defendido a
previsão de um prazo de proposta mais dilatado, conforme se pode verificar no artigo que escrevi para o Portal
Sollicita sobre o tema.

E, por fim, note-se que há uma aparente antinomia entre o regulamento federal do Sistema de Registro de Preços e o
regulamento federal do pregão eletrônico, pois enquanto o regulamento do pregão eletrônico indica a volta de fase
para convocar o próximo colocado em suas próprias condições, o regulamento do SRP indica como obrigatória a
manutenção das mesmas condições do primeiro colocado, possivelmente por conta da previsão do cadastro de

reserva, ao qual nos referimos a seguir. Neste caso, penso que prevaleça o regulamento mais específico, que é o do
SRP.

Decreto nº 10.024, de 2019

Art. 48, § 2º Na hipótese de o vencedor da licitação não comprovar as condições de habilitação


consignadas no edital ou se recusar a assinar o contrato ou a ata de registro de preços, outro licitante
poderá ser convocado, respeitada a ordem de classificação, para, após a comprovação dos requisitos
para habilitação, analisada a proposta e eventuais documentos complementares e, feita a negociação,

assinar o contrato ou a ata de registro de preços, sem prejuízo da aplicação das sanções de que trata o
art. 49.

Decreto nº 7.892, de 2013

Art. 13, Parágrafo único. É facultado à administração, quando o convocado não assinar a ata de
registro de preços no prazo e condições estabelecidos, convocar os licitantes remanescentes, na ordem
de classificação, para fazê-lo em igual prazo e nas mesmas condições propostas pelo primeiro
classificado.

Cadastro de reserva

Além das duas situações acima detalhadas, temos no regulamento do Sistema de Registro de Preços a previsão do
cadastro de reserva, que possui como principal característica a aceitação, pelos demais licitantes, do mesmo preço
ofertado pelo primeiro colocado.
Art. 11, II - será incluído, na respectiva ata na forma de anexo, o registro dos licitantes que aceitarem
cotar os bens ou serviços com preços iguais aos do licitante vencedor na sequência da classificação do
certame, excluído o percentual referente à margem de preferência, quando o objeto não atender aos
requisitos previstos no art. 3º da Lei nº 8.666, de 1993;

§ 1º O registro a que se refere o inciso II do caput tem por objetivo a formação de cadastro de reserva
no caso de impossibilidade de atendimento pelo primeiro colocado da ata, nas hipóteses previstas nos
arts. 20 e 21.

§ 3º A habilitação dos fornecedores que comporão o cadastro de reserva a que se refere o inciso II do
caput será efetuada, na hipótese prevista no parágrafo único do art. 13 e quando houver necessidade

de contratação de fornecedor remanescente, nas hipóteses previstas nos arts. 20 e 21.

A adoção do cadastro de reserva se daria nas hipóteses de cancelamento do registro de preços, e a habilitação dos
licitantes que compõem o cadastro de reserva ocorreria somente quando houvesse necessidade de contratação de
fornecedor remanescente.

Neste caso, a expressão "fornecedor remanescente" faz menção ao integrante do cadastro de reserva, que somente
será acionado em caso de cancelamento do registro de preços.

No entanto, há dúvidas acerca do enquadramento do cadastro de reserva nas hipóteses de volta de fase ou de
contratação direta, já que o cancelamento do registro de preços pode ocorrer por razões distintas, conforme fixa o
Decreto nº 7.892, de 2013, cujo excerto é transcrito abaixo.

Art. 20. O registro do fornecedor será cancelado quando:

I - descumprir as condições da ata de registro de preços;

II - não retirar a nota de empenho ou instrumento equivalente no prazo estabelecido pela


Administração, sem justificativa aceitável;

III - não aceitar reduzir o seu preço registrado, na hipótese deste se tornar superior àqueles
praticados no mercado; ou

IV - sofrer sanção prevista nos incisos III ou IV do caput do art. 87 da Lei nº 8.666, de 1993, ou no art.
7º da Lei nº 10.520, de 2002.

Parágrafo único. O cancelamento de registros nas hipóteses previstas nos incisos I, II e IV do caput
será formalizado por despacho do órgão gerenciador, assegurado o contraditório e a ampla defesa.

Art. 21. O cancelamento do registro de preços poderá ocorrer por fato superveniente, decorrente de
caso fortuito ou força maior, que prejudique o cumprimento da ata, devidamente comprovados e
justificados:

I - por razão de interesse público; ou

II - a pedido do fornecedor.

Até o presente momento não se tem notícia de que o sistema eletrônico adotado pelos órgãos federais do SISG tenha
sido adaptado para operacionalizar o cadastro de reserva. Mas como não se trata de remanescente de contrato e sim
de ata, não creio que seria adequado aplicar a hipótese de dispensa de licitação, mas sim a volta de fase.

Conclusões
A simples coincidência no uso do termo “remanescente” não significa que em todo caso a norma estará tratando da
mesma situação jurídica, podendo se tratar de contratação direta por Dispensa de Licitação, volta de fase no âmbito
da mesma licitação ou acionamento do cadastro de reserva no caso do uso do sistema de registro de preços.

No caso da contratação direta por dispensa de licitação, a expressão "remanescente de obra, serviço ou
fornecimento" faz menção ao saldo remanescente do contrato rescindido.

No caso da volta de fase no âmbito da mesma licitação, a expressão "licitantes remanescentes" indica os demais
licitantes que participaram da licitação mas não haviam sido declarados vencedores inicialmente.

No caso do cadastro de reserva, a expressão “fornecedor remanescente” faz menção ao integrante do cadastro de
reserva, que somente será acionado em caso de cancelamento do registro de preços.

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