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EXCLUSÃO DA HERANÇA POR INDIGNIDADE

Docente: Prof. Dr. Gustavo Henrique Velasco Boyadjian

Discentes: Enzo Bellini Machado (11821DIR001), Lucas Paschoal Moreira


(11821DIR016), Marco Antônio Pereira Jarczewski (11821DIR011), Pedro
Augusto Medeiros Rezende (11821DIR006)

Turma: 77 - A Disciplina: Direito Civil VI

1. Introdução

Como primeiro trabalho apresentado à matéria, não poderíamos abrir


mão da oportunidade de fazer uma breve conceituação acerca do “Direito das
Sucessões” em si. Segundo cátedra de Carlos Roberto Gonçalves1, temos que:
“O referido ramo do direito disciplina a transmissão do patrimônio, ou seja, do
ativo e do passivo do de cujus ou autor da herança a seus sucessores.”
Isto é, conforme entendemos, possível se faz defini-lo como o conjunto
de normas que disciplinam e regulam a transferência do patrimônio daquele
que faleceu ao herdeiro, seja em virtude de lei ou de testamento. O direito à
herança trata-se de direito fundamental garantido, pois, constitucionalmente,
disciplinado no artigo 5º, inciso XXX2, assegurando aos sucessores do falecido
haver seu patrimônio via transmissão causa mortis3.
Da mesma maneira, o artigo 1.784 do Código Civil, dispõe que aberta a
sucessão transmitem-se os bens do morto, gizando o princípio de saisine, in
verbis: “Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros
legítimos e testamentários”. O princípio tem a sua origem na Gália moderna,
podendo ser definido como aquilo que permite que se adquira a herança
[...] automaticamente, com a abertura da sucessão. O direito brasileiro
difere de outros sistemas jurídicos porque admite a transmissão
automática, sem necessidade de consentimento ou aceitação dos

1
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: 7, direito das sucessões. 14. ed. São
Paulo: Saraiva Educação, 2020. 584 p.
2
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XXX - é garantido o direito
de herança;”.
3
Tradução literal do latim: Em decorrência da morte.
herdeiros beneficiados ou decisão de qualquer natureza. Ainda que o
herdeiro não tenha conhecimento da abertura da sucessão, a
transmissão dá-se a seu favor, desde o preciso momento da morte do
autor da herança. A transmissão é por força de lei. O que uma pessoa
herdou e ainda não sabe, ou não aceitou, já ingressou em seu
patrimônio, conquanto não definitivamente.4

Todavia, existem algumas situações previstas em lei, bem como atos de


última vontade do autor da herança, em que esse direito sucessório é excluído
do herdeiro5 ou legatário (aqueles que recebem uma coisa certa). O artigo
1.814, da codificação material civil, prevê (taxativamente), as hipóteses de atos
lesivos que podem ser cometidos contra o autor para gerar a exclusão da
herança por indignidade.
De maneira resumida, as hipóteses são as 3 (três) a seguir: 1) o
herdeiro ou legatário ter participado de homicídio DOLOSO, ou tentativa de
homicídio DOLOSO contra o autor ou contra sua esposa6, companheira, pais,
ou filhos; 2) ter acusado caluniosamente em processo judicial o autor da
herança, ou praticar crime contra sua honra, ou de sua esposa; 3) dificultar ou
impedir, por meio violento ou fraudulento7, que o autor da herança disponha
livremente de seus bens por testamento por meio de ato que expresse sua
vontade.
De antemão, é importante frisarmos que, conforme alerta Giselda Maria
Fernandes Novaes Hironaka8, em comentários ao Código Civil, não se pode
confundir falta de legitimidade com exclusão por indignidade e deserdação,
afinal, não diz respeito à matéria objetiva, e sim subjetiva. Na exclusão da
herança por indignidade e deserdação, o afastamento desse direito é por razão
subjetiva, posto que nessa modalidade o herdeiro legítimo na linha de

4
LÔBO, Paulo. Direito constitucional à herança, saisine e liberdade de testar. Famílias:
Pluralidade e Felicidade, Belo Horizonte, v. 9, p. 35-46, 2015. Anual. Disponível em:
https://ibdfam.org.br/assets/upload/anais/231.pdf. Acesso em: 12 jan. 2022.
5
“legítimos (aqueles definidos por lei: descendentes, ascendentes, cônjuge sobrevivente e
colaterais); necessários (qualidade dada a somente alguns dos parentes próximos ao “de
cujus”: descendentes, ascendentes e cônjuges); testamentários (aqueles que têm seu quinhão
definido através de testamento pelo autor da herança) [...]”. Fonte:
https://deboraspagnol.jusbrasil.com.br/artigos/467733117/a-indignidade-como-causa-de-exclus
ao-de-heranca. Acesso em: 12 jan. 2022.
6
Aqui, adotar-se-á o gênero masculino para o autor e o feminino para os seus pares,
simplesmente para evitar redundâncias e retrabalhos desnecessários.
7
Com relação ao entendimento literal de Gonçalves: “A violência se traduz em ação física; a
fraude, em psicológica.” (p. 124).
8
HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes; JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio.
Comentários ao Código Civil: parte especial : do direito das sucessões : da sucessão em geral;
da sucessão legítima : (Artigos 1.784 a 1.856). [S.l: s.n.], 2003.
sucessão é considerado como desprovido de moral para receber a herança,
em razão da prática de atos indignos.
Assim, surgem, como penas civis de exclusão da herança, os conceitos
de indignidade sucessória e deserdação, aquele, por sua vez, será abordado a
seguir. Pena a qual foi dada à Suzane Von Richthofen9, condenada por
participação, em outubro de 2002, no assassinato dos pais, Mandred e Marísia
Von Richthofen, em luxouso condomínio de casas na cidade de São Paulo,
capital. Suzane, que tinha 18 anos, permitiu a entrada dos executores do crime,
os irmãos Cristian e Daniel Cravinhos, na casa da família, que deram ensejo à
execução do crime.
Em 2006, Suzane foi condenada a 39 anos de prisão em regime
fechado. Em 2011, a 1ª Vara de Família e Sucessões de Santo Amaro decidiu
pela exclusão da condenada da relação de herdeiros, a pedido do irmão,
Andreas. Caso o irmão desistisse da ação, segundo a legislação à época,
Suzane continuaria tendo direito à metade dos bens. Porém, com as mudanças
propostas no PLS 118/2010, o Ministério Público poderia intervir em casos
como esse para promover a ação.10 O que veio com o advento da Lei n.º
13.532/2017, a qual, além do mais, incluiu o § 2º no artigo 1.81511 da
codificação material civil.
Oportuno se faz trazer inferência de Lacerda de Almeida12: “[...] a
indignidade é uma pecha em que incorre o herdeiro e que o faz perder o que
havia adquirido”. À frente, as questões mais pragmáticas em respeito das
regras que permeiam o instituto da exclusão da herança por indignidade, serão
melhor destrinchadas e trabalhadas, destacando-se a distinção entre os

9
Caso que nunca saiu da mídia, mas que voltou à tona ao final do ano passado, com o
lançamento de 2 (dois) filmes pela Amazon Prime Video: “A menina que matou os pais” e “A
menina que matou meus pais”. Fontes:
https://www.primevideo.com/detail/0LVOTHY4HCRCWLAY1KTDR0XQNH/ref=atv_hm_hom_1_
c_8o26tb_awns_3_3?language=pt_br e
https://www.primevideo.com/detail/0RNW90VC2ECX8B71EE8CSX90W9/ref=atv_dp_amz_det_
c_Iw3Dma_1_1?language=pt_br.
10
Fonte:
https://ibdfam.org.br/noticias/na-midia/7794/Descen-%20dentes+de+herdeiro+indigno+tamb%c
3%a9m+podem+ser+proibidos+de+receber+bens. Acesso em: 12 jan. 2022.
11
“Art. 1.815. A exclusão do herdeiro ou legatário, em qualquer desses casos de indignidade,
será declarada por sentença. [...] 2 o Na hipótese do inciso I do art. 1.814, o Ministério Público
tem legitimidade para demandar a exclusão do herdeiro ou legatário.”
12
GONÇALVES, p. 126, 2020.
institutos assemelhados citados acima, assim como maiores referências
catedráticas.

2. Construção social e moral para a exclusão por indignidade

Inicialmente, a construção desse instituto, está atrelada de maneira


direta à concepção de família. O artigo 226 da Constituição Federal de 1988,
descreve essa entidade como a base da sociedade, ensejando a tutela e
proteção de seus princípios pelo Estado. Diante desse espectro, os motivos
elencados no artigo 1.814 do ordenamento civil brasileiro de 2002, são ações
que atacam frontalmente os pilares construídos pelo núcleo familiar.
A principal lesão é observada na dignidade da pessoa humana, bem
como no princípio da solidariedade familiar13, pois o primeiro núcleo de
proteção que um indivíduo tem contato em sua vida é justamente a família, que
nutre, protege e auxilia o desenvolvimento para a obtenção de uma vida plena.
Dessa forma, ao final de uma vida plena, há que se considerar os feitos
patrimoniais construídos por um sujeito, momento no qual a matéria da
sucessão surge para selar a finalização de um ciclo de vida.
É indubitável que o patrimônio, assim como o acúmulo de feitos
materiais são questões externas à família em sua essência abstrata. Todavia,
basta a simples observação empírica, para elucidar que a transmissão dos
bens de uma pessoa que deixa esse plano, se trata de uma questão natural
enraizada na cultura humana.
Enxerga-se que a moral é o principal motivo para excluir um herdeiro ou
legatário da divisão de bens, pois para receber os frutos de um trabalho de
uma vida, a preservação do respeito pelo falecido é o mínimo imprescindível.
Assim, conforme é cediço, para a consecução da indignidade, é necessário que
o sucessor excluído tenha praticado ato contra a vida, honra ou contra a
liberdade de testar do autor da herança. Ações extremas e em suma
gananciosas, que revelam o caráter inimigo do indigno.

13
O doutrinador Rolf Madaleno define em sua obra Direito de Família, 10ª edição, a
solidariedade familiar como: “É princípio e oxigênio de todas as relações familiares e afetivas,
porque esses vínculos só podem se sustentar e se desenvolver em ambiente recíproco de
compreensão e cooperação, ajudando-se mutuamente sempre que se fizer necessário.” (2020,
p. 183.)
3. O inciso primeiro do artigo 1.814 e a controvérsia legitimidade de
propositura de ação pelo Ministério Público.

Em paralelo, observa-se que Ministério Público desde 2017, com a


entrada em vigência da Lei n.º 13.532, tornou-se legitimado para a propositura
da ação de indignidade, na hipótese do inciso I do artigo 1.814, in verbis:
[...] que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio
doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se
tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente.

Essa legitimidade é matéria de controvérsia, pois o Ministério Público,


em tese, está autorizado a intervir em uma matéria de direito patrimonial e
disponível de um terceiro.
Para o professor e advogado José Fernando Simão, a atribuição de
legitimidade do Parquet para ajuizar essa ação é em decorrência da discussão
do politicamente correto, conforme sustenta em seu artigo14 publicado sobre o
assunto:
Qual é o conceito de interessado em sentido jurídico? A ação conduz
a um benefício: receber quinhão ou bem que o autor da ação não
receberia ou aumentar a quota-parte do herdeiro ou legatário sobre
certo bem ou quinhão. Dessa nota óbvia percebe-se que o MP não
pode nem poderia propor a ação em questão, pois estará defendendo
direito patrimonial e disponível de terceiro. Frise-se: patrimonial e
disponível de um particular. (SIMÃO, 2018).

Todavia, tal questão se reflete em uma reação ao interesse público, que


extrapola o simples politicamente correto, que sequer deve ser aplicado nessa
discussão, pois é destinado à conscientização pela defesa de não ofender
determinados grupos. Mas sim, para que haja a proteção dos pilares morais e
familiares, contra casos como o de Suzane Von Richthofen, já discorrido acima,
e de Leandro Boldrini, popularmente conhecido na mídia pelo Caso Bernardo,
condenado pelo papel de mentor intelectual do assasinato de seu próprio filho,
Bernardo Uglione Boldrini, por motivações de cunho patrimonial após a morte
de sua esposa, autora da herança, sendo a ele aplicada a pena de 33 anos e 8

14
SIMÃO, José Fernando. Legitimidade do MP para propor ação de exclusão do sucessor por
indignidade. PROCESSO FAMILIAR, Consultor Jurídico, p. 1, 28 jan. 2018. Disponível em:
https://www.conjur.com.br/2018-jan-28/processo-familiar-legitimidade-mp-acao-exclusao-sucess
or-indignidade. Acesso em: 15 jan. 2022.
meses de prisão pelo homicídio quadruplamente qualificado, 2 anos por
ocultação de cadáver e 1 ano por falsidade ideológica.
A sucessão, surge por consequência da morte, logo, aquele que força a
sucessão ou a altera em sua ordem, para o simples e exclusivo benefício
próprio está agindo contra a solidariedade familiar, a proteção da dignidade
humana, bem como o dever de cuidado e amparo.
O que se discute é, se hipoteticamente, Andreas, irmão de Suzane,
desistisse da ação e por consequência permitisse o acesso da irmã,
condenada pela morte dos ascendentes, ao quinhão legítimo. E no caso de
Leandro Boldrini, e se permite-se que o mesmo receba a herança deixada por
sua esposa mesmo após ter arquitetado o assassinato do menor?
Tais hipóteses revelam que, mesmo o assunto sendo patrimonial e
disponível, essa não pode ser admitida, pois representaria sequer a
possibilidade da discussão judicial de indignidade, garantido o sucesso do
plano de homicídio puro e simplesmente por ganância, em razão de uma
brecha legal, o que é um ataque direto à própria ordem social.
Ressalte-se que, quando analisado à tentativa, ou homicídio de cônjuge,
companheiro, ascendente ou descendente, ainda haveria a possibilidade de
haver o perdão, não havendo o que se discutir em legitimidade do Ministério
Público.
É válida ainda, a discussão sobre a manifestação de um perdão
subjetivo e não manifestado pelo de cujus. Não obstante, cabe ao operador do
direito ponderar tal questão, permitindo o estabelecimento do contraditório,
estando em consonância, inclusive com o artigo 1.818 que será analisado a
seguir, sendo matéria de mérito e não de direito.
4. Dos efeitos da exclusão por indignidade

Em sequência ao já apresentado, a exclusão por indignidade, está


prevista no capítulo V do quinto livro do Código Civil, denominado de “Dos
Excluídos da Sucessão”, a partir de uma análise sintética, os efeitos
ocasionados àqueles que se enquadram nas hipóteses são pessoais, isso é,
aplicados de maneira exclusiva ao indivíduo condenado por sentença.
correspondente a ordem imposta pelo artigo 1.816 da codificação material civil,
in litteris; “São pessoais os efeitos da exclusão; os descendentes do herdeiro
excluído sucedem, como se ele morto fosse antes da abertura da sucessão.”
Do caput, depreende-se uma explicação clara e objetiva, quanto aos
sucessores localizados aos graus abaixo do indigno, os quais, serão
convocados à sucessão por representação, mantendo o direito. Por essa razão
o parágrafo único deste dispositivo é voltado a impedir que o indigno se
aproveite da quota parte transmitida a seus sucessores de maneira oblíqua,
impedindo o usufruto, a administração, bem como a eventual sucessão desses
bens.
Resta ainda, o cenário em que ocorre alienação onerosa a terceiros de
boa-fé ou atos de administração praticados pelo herdeiro, antes da sentença de
exclusão. Para esses casos, o artigo 1.817, torna válidas as ações do indigno,
afastando a discussão de nulidade.
Tal questão está embasada na aparência de validade, atraindo
segurança jurídica para os atos que permeiam essa seara, principalmente com
o norte da proteção de terceiros de boa-fé, Por outro lado, os demais herdeiros
quando prejudicados poderão ingressar com ação de perdas e danos.
Ainda como desdobramento dessa questão, é estabelecido no parágrafo
único do artigo mencionado, o surgimento da obrigação do herdeiro/legatário
restituir os frutos e rendimentos percebidos, como também o excluído poderá
ser indenizado pelas despesas geradas na conversação do bem.
Em última análise, o artigo 1.818, elenca a possibilidade do indigno
participar da sucessão, mesmo incorrendo nos atos descritos pelos incisos do
artigo 1.814. O que se assemelha a uma espécie de “perdão”. Para isso, deve
o de cujus ofendido proceder a reabilitação expressa do indigno em testamento
ou em outro ato autêntico. Contudo, a construção da reabilitação “expressa” é
admitida, ainda, nos casos em que há omissão, caso o indivíduo indigno seja
incluído pelo testador, em momento posterior ao conhecimento da prática da
indignidade, conforme regula o parágrafo único.

5. Exclusão por indignidade e deserdação.

É válido mencionar que além da exclusão por indignidade existe um


instituto semelhante, mas que possui diferenças em sua aplicação, localizado à
frente da exclusão, no capítulo X do mesmo livro: a deserdação. Trata-se de
uma disposição testamentária, ou seja, que representa ato de última vontade
do autor da herança.
Tal hipótese é aplicada apenas aos herdeiros necessários que incorrem
nos atos previstos pelos artigos: 1.962, referente à deserdação dos
descendentes por seus ascendentes, 1.963, referente à deserdação dos
ascendentes por seus descendentes e também nos atos descritos pelo artigo
1.814, todos do Códex.
Ao contrário da exclusão por indignidade, a deserdação atinge somente
os herdeiros necessários e exige manifestação da vontade do de cujus. Dessa
forma prevê o artigo 1.965: “Ao herdeiro instituído, ou àquele a quem aproveite
a deserdação, incumbe provar a veracidade da causa alegada pelo testador.”
Motivo pelo qual, a deserdação também só será definida por sentença se
houver contestação pelo herdeiro deserdado até o prazo de 4 (quatro) anos,
conforme se prevê no parágrafo único do dispositivo retromencionado.

6. Conclusão

Assim, após a exposição das questões conceituais, processuais e


práticas desse instituto jurídico, cabe aos operadores do direito refletirem
acerca de sua estrutura e seu objetivo. É essencial entendermos que as
interações sociais são incubidas de verdadeiros limites, sendo estes expostos
taxativamente na exclusão por indignidade, bem como em sua base fática e
objetiva. Resta claro que, apesar da função estrutural do que significa Família,
esta também é composta por um véu emocional e de vínculos afetivos, assim,
embora as situações abarcadas sejam do mundo dos fatos, nada mais são que
um reflexo de uma ausência de preenchimento afetivo e dignidade perante ao
membro da família que foi prejudicado.
Ao deixar de lado os fatores técnicos e positivistas da organização do
pensamento jurídico, podemos expor que o Direito é criado por e para pessoas,
de modo que em uma análise profunda e teleológica do que foi trabalhado no
presente artigo, podemos resumir como a tentativa do Estado em repudiar a
quebra da lógica familiar, assim como sentimentos primários como: ingratidão,
egoísmo e, como próprio nome diz, indignidade.
Dessa forma, a exclusão representa a intervenção nos casos mais
extremos e objetivos de atitudes contra o autor da herança, o que representa
até uma parcela pequena do que poderia ser analisado caso queiramos ir além
do fático. Afinal, há um espaço subjetivo para o controle de quem “merece” e
de quem não “merece” receber a herança, no entanto, seria impossível
controlar seus efeitos, pois se trata de uma questão abstrata, por exemplo,
abandono afetivo ou falhas no papel de sujeito familiar. Logo, como não cabe
ao Estado discutir sobre questões da alma, resta legislar acerca das questões
do mundo, sendo essas as três previsões do art. 1814.
Além disso, podemos citar o fato de que a exclusão por indignidade
cumpre um papel de não permitir que o bônus visado como objetivo primário da
conduta do indigno seja percebido, esse, muitas vezes, representa o desejo de
obter maior benefício patrimonial, seja em quantidade ou em tempo. Logo,
resta claro que além do repúdio moral e social da conduta, a exclusão
representa uma barreira para o gozo de qualquer benefício desejado
anteriormente, de forma a não premiar o indigno por sua conduta errônea.
Como dito no início do artigo, “o direito brasileiro difere de outros
sistemas jurídicos porque admite a transmissão automática, sem necessidade
de consentimento ou aceitação dos herdeiros beneficiados ou decisão de
qualquer natureza”. Caso fôssemos levados por essa lógica, não importaria os
meios, após a morte haveria transmissão. Todavia, a exclusão por indignidade
é elucidada para interromper a mesma e incidir perguntas como: “esse herdeiro
deveria ser beneficiado?”, nos levando a concluir que há exceções ao princípio
de saisine e que há casos em que a punição civil é necessária.
Nas palavras de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona:
Trata-se, pois, de um instituto de amplo alcance, cuja natureza é
essencialmente punitiva, na medida em que visa a afastar da relação
sucessória aquele que haja cometido ato grave, socialmente
reprovável, em detrimento da integridade física, psicológica, ou moral,
ou, até mesmo, contra a própria vida do autor da herança.Afinal, não
é justo, nem digno, que, em tais circunstâncias, o sucessor
experimente um benefício econômico decorrente do patrimônio
deixado pela pessoa que agrediu 15

Por fim, deixamos a concepção aristotélica de justiça na qual se deve


tratar os iguais, igualmente e os desiguais, desigualmente. Dessa forma,
apesar da lógica representar que, em sua maioria, os herdeiros necessários
serão concebidos com sua herança, a partir de uma atitude desigual, nesse
caso, uma atitude de violência física ou moral contra o autor da herança,
teremos uma consequência desigual que será tratar como se morto fosse o
herdeiro indigno.

15
GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Manual de direito civil. São Paulo:
Saraiva, 2017. 1768 p. v. único.

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