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1·.

A Gênese e o Surgimento
da Vocação Psicanalítica
de Melanie Klein

,
1. A INFÂNCIA.E A JUVENTUDE DE MELANIE KLEIN

Melanie Reiz.es nasceu a 30 de março de 1882 em Vien4) A família


era jú"°dia e o pai médico, mas os Reizes não p~ecem ter evoluído nos mes-
mos círculos que a família Freud. De qualquer fonna, Melanie Reizes
depois Melariie Klein, não tinha conhecimento ai m de psicanálise ante~
de ler fortuitamen · · dJ2mt_Ço aptes da guerra de 19 4.
Melanie era a a de uatro filh . De sua irmã mais velha não sabe-
' mos quase nada; conhecemos melhor seu irmão Emmanuel, nascido em
1877, e sua irmã Sidonie, nasci~a em 1878. O ~ai dela, o Dr. Reizes, tinha
mais de cinqüenta anos na _ocasião d~ se~ nascimento. Proveniente de um
meio judeu ortodox~, de~~a a pnmeira _Parte de sua existência a estu-
dos religiosos e estava destmado a ser rabmo. Com a idade de 37 anos
rompera com as suas origens e empreendera estudos de medicina, sem d , :
vida em condições difíceis. 'fal passado_valeu-~he a admiração da caçu~a
pelo seu espírito independente e sua atitude científicat. -
O Dr · Reizes exercia a medicina na capital austríaca Sabem
correspondência de Fre~d co!11 s~a noiva,
· · qu~ era difíctl
· • para
• · nm os, pela
roédi
d esproy1•do tftnlos umvers1tá.r
de ---
__ -- 1
É os de prestígm • e -
por cima JR
- ---- • d eu co
jir uma client~la nesta cidade. ?rováveJ que-0-~R., _8aran-

e
i O relativamente malsucedido. De qual uer forma sua ClZes..te-
brir uma loja de modo a complementai:_élSJ:enda ' d esposa teve
~ª . . -s . af.amília
(ato revela certamente uma d.ificuldade, ois er ·
_ s da é oca ue a es osa e um m dico exer . a cont ·
pa roe • . d " . cess . os
t~;temunha ainda a energia e a m ependenc1a de espírºt . .. .
I o daque1 o,
a Que as-
MELANIE KLEIN I

sim se opunha a preconceitos arraigados, para ajud .


gurar uma boa educação aos filhos. . ar seu mando e.asse-
I
(' ,li No decorrer de seus primeiros anos de vida, a pequen M .
\11'
,1
1
se muito à mãe e, em circunstâncias trágicas, à irmã Sid~ ; arue ª!"@a-
1
,.1 ~(') vemente enferma em 1886, tendo, então oito anos e Me1anie. sta cai gra.
.J , d d . . ' e quatro. Ob •_
1 1 ga a a permanecer acama a, S1dome empenha-se na instru d n
1\ \

Deste modo, Melanie aprende aos cinco anos a leiturª a es':::ºt ª caçula.
n,.e.n~os_d..e_c.álc1;1lo,..atr és.cdo.amor_de sua-1-rma,-eoma_qu.al~m
-isr~
,,\I,,. (i · - ~ ~uudi-
1

l I r~laça~ af~t1ya mtensa_ que_a m~cará para_sempr_e. Sidonie morre em


1~ / é o pnmeiro_dos.. lutos que balizarão _a_existência de Melanie Klein 7·
,,JI! L,. •
Lf'·· . _ Algu?s anos mais tarde, ter~ uma relaç~o comparável a esta com
1 irmao mais velho Emmanuel. Assim que marufesta sua intenção de ent 0
no ginásio (equivalente aos liceus clássicos franceses), recebe a ajuda/:
encorajamentos deste. Graças às lições do irmão, que se revela um efi-
ciente professor, é bem-sucedida no concurso de entrada para esse estabe-
lecimento secundário reputado, a única escola que prepara moças para
\
ingressar na universidade. Adolescente, partilha dos gostos literários e ar-
tísticos do irmão, que ·parece ter sido um rapaz brilhante e bem dotado,
pianista e escritor nas horas vagas. No meio intelectual dos amigos do ir-
= mão, desenvolve seus interesses e sua curiosidade, vivamente estimulada
.1 ,' • pela confiança e admiração que Emmanuel não dissimu]a quanto aos dons

t_ - naturais da irmã caçula. Mas esta relação afetiva e intelectual intensa tam-
/, :/1 bém seria interrompida pela morte. Emmanuel sofria desde a infância de
I
J problemas cârdíaç_os e2 ua irmã ! al?fa, ªssim como ele mesmo, que estava
destinado a morrer muito jovem. Efetivamen!~, I eio a falecer eill 1~2,
·om ·. a idade de vinte e cinco anos.. -- - -
Nesta data Melanie Reizes já era noiva há três anos e Arthur Klein.
vés de estudar medicina como pretendera, fre .. nta cursos de arte
ória na Universidade de Viena. ~ s~:se,,_e,m_l9g desd~ então acom-
seu marido, engenheiro químico, pelas diferentes localidades da Eu-
a.C_e ntral, onde este exerce sua profissão. No decorre! destes anos te:
filho~: Melitta, nascida em 1904, Hans, em 1907, Ench, em 191 4. S a
s que ª.1filp.ília_!Çlei_!1._§~ inst~la em Budapest alg~s anos ~tes
eira .Gue:r.r~ ~°ºdjal e illi permançc~ até a revoluçao de B~la Ku ·
uda est--9.!!~...~elanie co~e9~ ~-le1t~~~ da obra de Freu .

ncontro <;om a Psicanálise,


. ,. '· , ,: . . . d r Sandor Ferenczi du-
·-;v Sabe.mos que Melanie .Kle~n fm psica~~~-.! Pº. -- ráficas" que acom-
a
rante :erimeim.Qu~rr-ª.Mund1al. As "n:ferencias b~o~s Contributions to
panham á edição francesa de su~ cole!an~a d~ a~t!; Em Budapest.
;/ i
Psycho-Analysis nos dão as segumtes m dicaçoes. 916 com Ferénczi,
Após a leitura das obras de Fréud e u~a análise pesso: línica de Buda-
começa sua carreira de psicanalista de cnanças numa po alie•dade os fatos
pest sob a direção de seu· antigo
• ana1is· t a , , 2 . Mas ' na. re '
alimentavam a es-
' 'd
não se desellfolaram esta manerra.· Freud . , .e Ferenczt ·
wn instituto de ~s1ca-
perança de montar em Budapest uma pohchmca e · ,F eund disc1pulo

l
nálise ~·graças a uma importante doação de Anton vo~ r '
, '

- 1n ,
A Gi!NESE E O SURGIMENTO DA VOCAÇÃO ... 3

de Freud e rico cervejeiro de Budapest, que se tornaria membro do _famo-


so comitê secreto constituído, após a dissidência de Jung, pelos mais pró-
ximos discípulos de Freud, por instigação de Ernest Jones, a fim de de-
fender a psicanálise e seu fundador e administrar o movimento. !_l:I~a~t
teria se tornado destamaneira..o..ptlncipaLcentro da psicanálise. Tais pro-
jêiõs-iõram concebidos apenas em 1918, durante as semanas agitadas do
Congresso de Budapest, no decorrer do qual a nova ciência pareceu est~
próxima de beneficiar-se do apoio das autoridades, em função dos servi-
ços que ela prestara no tratamento das neuroses de guerras3 • Em 27 de
agosto de 1918, um mês antes do Congresso, Karl Abraham ainda não
conhece Anton von Freund e Freud lhe escreve então: "Creio que Sachs
deu-lhe algumas informações sobre o Dr. von Freund que acabo de des-
crever aqui ... é de prever que Budapest se torne a central de nosso mQ.vi-
f m.en~. Na verdade a doação de um milhão de coroas que von Freund
havia prometido foi reduzida à uma quantia inferior, em razão da doença
e morte do doador, e sobretudo seu valor efetivo foi reduzido a quase na-
da devido à brutal desvalorização das moedas dos Impérios Centrais, ap~~-
a derrota. Qudapest nã_o._se_torna a central do movimento psicanalítico e
o_projeto...de...fundaçãa..de.JJID.a...policlínica..não se concretiza . De fato, sa- :V
bemos atualmente__qu_e_Melanie..K.lein..nunca..exei:ceu..psicanálise em Rnda- Í'

~~J~&et_omar-einos.-em-br-eve-à-questãe-àa-natw:eza-de_suas ati:rida_d.e.5-..P-si- ·
canalíticas...na..Huagllia.

Em contrapartida, é certa sua análise com Ferenczi. O que não pode-


ríamos afirmar com exatidão é quando ocorreu esse tratamento. Pode-
mos, com toda certem, excluir alguns períodos determinados. Não é im-
possível que Melanie Klein tenha consultado Ferenczi, principal discípulo
húngaro de Freud e que já gozava, em sua cidade, de lisonjeira reputa-
ção, nos meses que se seguiram ao início da guerra. Mas o tratamento
não pode ter começado neste momento: por volta de 20 de outubro de
1914, Ferenczi foi mobilizado como major-médico de um ·regimento de
hussardos, sendo enviado com seu corpo de tropa a Papa, cidade situada
a mais de 160 km por via .férrea, tendo então que abandonar sua
5
clientela • Perm~ece ali até janeir~ ~u fevereiro de 1916, data em que
é nomeado médico-chefe de uma clíruca neurológica militar~ Não é im;.
pos~ível que este ~ornem com tantas atividades tenha então retomado os
pa_cre?átes_ em::;~se. KarAlllAbra~am, também responsável por um serviço
ps1qu1 !nco tar em en_stem, perto de Koenigsberg, havia assu ·d
o atendimento de alguns pacientes naquela localidade6. É port t mi 0
sível que a análise de Melanie Klein tenha ocorrido nest; mo ano, pos-
tal hipótese, ela teria sido interrompida ou finalizada em m :e~o. Em
reiro de 1917. Com efeito, nesta data Ferenczi foi aco . ea os e feve-
lose pulmonar. Sofre tambêm de bócio exoftálmi dmetido de tubercu-
~eses em um sanatório, em Semmering, estação de:, evend~ Passar três
ximad:tmente a 60 km ao sul de Viena. Retorna a BuOntanha s1t~ada apro-
~e maio, após longas entrevistas com Freud n d dapest no fim do mês
tiram as concepções de Lamarck sobre a ' 1º ..eco~rer das Quais d1'sc
· n~m uQ J1DCJnrod,o.J>.,:azu.,. . evo0
A '"' ,I p . , . · na....
uçao·. Iní • narn
. CIO u-
. • ..,,.._!e!? o,,outr: ,;~ • 1'- -!? 11 Dl,. do
a. ,Ferenczí, resi-
3. ERNEST JONES, La vie et /'
4. SIGMUND FREUD e KARL c;;vre de Freud, P.U.F., v II
5. ERNEST JONES, La vie et /'o RAHAM, Correspor,d, · , P-211.
6. SIGMUND FRPTTn º v A ....y euvre de Freurl n YT _ arice, N_» to
dindo desde então em Budapest encarre d . ·
de verão de Freud nos Tatras erd 19l? e ga-se orgamzação das féri
que se verifica em Budapest de 28 a 29 ~a: ~ngresso de Psicanáij~
a análise de Melanie Klein pode ter sido inis~ edm ro de 1918. Portantoe
de 1917. eia a ou retomada, em mai~

Não sabemos no que consistiu este tratamento · Corno Sandor Fer


elaborava durante os anos de guerra os princípios d ,, é . _enCZi
que comporta in~nções e interdições dirigidas ao ~::nt: cruca ativa'',
por sem grandes nscos de erro que este homem íntegro ' tpo~emos su.
· · l e en us1asta q
nunca fazia coisas pe a metade,
. Kl . & • aplicava a sua técnica a todos os pacien
' . ue
t es que Melame ein -1oi tratada desta maneira_ &ta técnica desti ·
se_a acelerar os períodos inertes do. trabalho analítico · Num P • . nava-
nmerro mo-
_men_to,_ o anali_st a ordena ao paciente que realize suas tendências sexuais
rep~das. Num segund? momento, estas satisfações são interditadas e
analisa~as pelo estabelecimento da relação com afetos e cenas infanf
Ferenczi recebera a ap~o~aç~o de Freud, que iria, aliás, formular expli::
tamente a regra da abstinenaa apenas em 1918, precisamente no Congresso
de ~udapest7_. Além disso, Ferenczi mostra-se muito circunspecto, em seus
escntos técnicos, no que concerne às indicações sobre seu método8• De
qualquer modo, Melanie Klein ficou impressionada com a personalidade-
brilhante de seu analista. Ela escreve no prefácio da primeira edição da
\ Psicanálise da Criança, em 1932:
Foi Ferenczi quem me iniciou na psicanálise. Foi ele quem me fez compreen-
der sua verdadeira natureza e significado. Era dotado de uma sensibilidade une-
ta e profunda em relação ao inconsciente e ao simbolismo e uma intuição es-
sa diante de tudo que diz respeito à alma infantil; ele me ajudou, com seu
que me marcou, a compreender a psicologia da criança pequena. Foi ele
primeiro a assinalar minhas aptidões para a análise de crianças por cujo
teve o maior interesse, encorajando-me a me dedicar a esse campo da
ítica, ainda muito pouco explorado na época. Fez tudo que pôde para
eus primeiros esforços neste caminho. É a ele que devo meus primeiros
o ofício de psicanalista9 • ·

hemos peÍo testemunho de Willy Hoffer que Melanie Klein &!§is-


ongresso de Psicanális~_d_e Budapest em setembrocle 1918. Ela
m omesmo direito que um público bastante numeroso: º..C~n-
,.. o era reservado unicamente aos psicanalistas e as conferem;~as
-se no grande auditório da Academia de Ciências da Hun~a.
reud pela primeira vez. Contrariamente a seu hábito d! fp
ações, f reud lê seu artigo "Linha!_de Progresso d!:Tera~ ~-
Ji_ca' Melªm..e Iq~in,_@JP..AJÍviçla, entus~asmou-se c_Q!!l_es~ ~ - Ill~
. men.t_e_çxc~pQQ.IJa~,..!!,Q.-ª2ÇP-.~! .P~!!l quahd~de das comurucaçc;;;nte a
'nçipalmente-p,or_.s_ua_.a.tmQ~iera. A psicanálise estava ~parent:m rece-
nto de ser reconhecida pelas ~utoridades, os congressistas f~r- . cu-
7

dos oficialmente
·
p'elámunicip'
·
alidade de Budapeste

uma peuçao ~irça'"o
a ena
a entre os estudantes da Universidade, no se~tido de req11;erer A doa-
uma cadeira de psicanálise que teria FerencZI como seu titular·
1 ··~

' '

.' • • •· '· . .
,m
· . · ; ; · e ta tech nique
7. S. FREUD, "1..es voies nouvelles de la tbérap1e psychanalytique , .v
psychanalytique, P.U.F. . :_ ·,' , . , . ' · . , ,, Jnternationale
8.· S. FERENCZI~ "Technische Schwi~rigkeiten einer Hyste:°~alyse •
• ... "A.Jn.L:,a.,u:. .o V i:)UKUl~NTO DA VOCAÇÃO ... 5

ção de Anton von Freund suscitava grandes esperanças. Tudo isto toma-
ria outro rumo cerca de dois meses mais tarde, em conseqüência do esbo-
roamento dos Impérios Centrais.

Quando Melan~e Klein faz, fil> ano seguinte, sua primeira comunica-
~º :!-Socie~ e Hl!.~ 1!!.~ ~ ~ n do.(-'.9,.;tc-
elogiada por Ferenczi e von Freund, que lhe cojocmn..q~_es.Jlatticular-
ment~rU~i!e~ ~ - ª - ªjJldam._a amadur.e.cer..algumas..de...snas..cíl.UCep-
__çõe$. Ferenczi apresenta-a em seguida, por ocasião do Congresso Inter-'
nacional de Psicanálise de Haia, em setembro de 1920, a Karl Abraham,
que a convida para ir a Berlim. Mas parece certo que .teiamgi
tou em seu trabalho e o su erv1s1ono u rimeiro tra-
balho psiCI1halítico. imitou-se a encora ·á-la e em restar-lhe livros -~-
lanie Klein foi eleita membro titular da Sociedade Húngara a 13 de julho
de 191.2.z_ logo após à exposição que fez de seu primeiro artigo. Não havia,
ainda, começado a praticar a psicanálise, ao menos no sentido como a
entendemos hoje.

/ Com-efeito, Melanie Kleie deixara Budapest-em mai:ç0-de 1919 em ·


' y.irtnruul_uit:ua.çãa política. A 31 de outubro de 1918, o Império Austro-
Húngaro chegou ao fim, devido à derrota das Potências Centrais. A· Re-
pública Húngara fora proclamada a 16·de·novembro e Mihaly Károlyi fo-
ra designado presidente provisório. A derrota e a ocupação dos Aliados
acarretaram dificuldades econômicas e perturbações políticas, quando se
evidenciou a intenção dos vencedores de amputar da Hungria dois terços
dos seus territórios anteriores. Neste contexto, a 20 de março de 1919 so-
breveio o levante dirigido por Béla Kun e pelo Partido Comunista, que
instaurou a República dos Conselhos. O levante de Béla Kun instalou, por
quatro meses, um regime que se mostrou muito favorável à psicanálise:
uma cadeira de psicanálise foi criada para Ferenczi e outra, de psicanálise
aplicada, foi confiada a Géza Róheim. Isto não impede que Melanie Klein
parta para Ruzomberok 11 , uma pequena cidade da Eslováquia, com os
filhos e o marido, lugar onde este aparentemente tinha laços de família,
o que talvez o tenha induzido a conduzi-los para lá. Daí retorna em julho
a B.udapest para assistir ~ ã o dª-Sociedade de Psicanálise, no decorrer
da qual lê seu artigo~an;~e cerca de um aõm
Seu primeira artigo não se baseia nos dados recolhidos no decurso
de uma psicanálise clássica, mas sim na observação do desenvolvimento T7
13
!!,e uma crianca • durante o período em que recebe de sua mãe esclareci- V J7
.IDentôs que devem satisfazer sua curiosidade sexual, qlle fica manifesta 4' "

por numerosas perguntas. O artigo descreve os efeitos destes esclarecim :.n-

~
tos sobre a criança. Estamos em condições de afirmar que esta cri~

'rf,!('r 'Í )
ão Erich: .º segundo, fil~o de Melanie Klein, então
/ ·1'-o.u 11 oo o., l,IJ-.L::!_ c•J . .
co:
10. Cf. WILL Y HOFFER, "Melanie Klein", lnternationa/ Journ
v.42, 1961, pp.1-3 . . ai 01 Psycho-Ana/ysis
11. Cf. WILLY HOFFER, "Melanie Klein" Jntern - '
v .42, 196 l, pp. 1-3. O autor d á o endereço de Melanie
, Kla1.1ona/ Journa/ oif Psycho-An .
Director Julius Klein, Ruzomberok, Tcheco-EsJová . em em 1919: Fr. Melanie l(J ~')ls,s, 1
I 2. Anunciado no Internationa/ Journa/ ofP. huia. em e/o
Mrs . Melanie Klein: Remarks on the InteUect :s'YDc o-Ana/ysis, v.I, 1920 p •,
1 37
6 MELANIE KLEIN I

cinco anos de idade14 • O trabalho de educação sexual da crian a i . .


se em março de 1919, logo após a chegada da família Klein mciou.
rok, e continuou.após .a leitura. do artigo,
. para se transformaª
r emuzom?e-
seguid
em uma ver d a d eira psicoterapia psicanalítica do menino por su - ª
Ruzomberok e depois em Berlim. Esta psicoterapia durou até ~~;e, em
lanie Klein, que descreve a terapia de Erich, dando-lhe O pseudo" • · Me-
. especiºfºicou repetiºd as vezes que não havia analisado outras mmo
Fntz, · de
ate' sua ch egada a Ber1·im: "Meu · pnmeuo
· · paciente
· foi um meninocnanças
d 10.
co anos de idade. Referi-me a ele sob o nome de Fritz no primeiro : ; •
que publiquei. .. Entre 1920 e 1923 adquiri mais experiência com ourtigo
·
casos d e crianças .. . " , escreve 1s . E ntre 1920 e 1923 achava-se em Berliros
onde começou a análise de outras crianças além da de seu filho. m,

Não temos quase documentos referentes ao fim de 1919 e ao começo


de 1920. De 8 a 12 de setembro de 1920 assiste ao Congresso de Psicanáli-
se de Haia, o primeiro a desenvolver-se sem a presença de Freud, e tam-
, bém o primeiro que, após a guerra, reúne os psicanalistas do mundo anglo-
saxão e os da Europa Central. J:erenczi, no decorrer do Congresso, apre-
senta M. Klein a Karl Abraham, que dirige a Sociedade Berlinense de Psi-
c_~ álise. Ela impressiQnou suficientemente Abraham -homem pruden-
te e reflexiyp____mas dado o bastante a entusiasmos imediatos - para gue
ele lhe sugira, ao longg_d,Q Co.ngr.,e.s.s..Q,_que se.instale em Berlim e gue ãti
pratiqµ~ a p§_i.canálise de cria.J!Ç!s. _Aceitando o convite, dispõe-se a mu-
dar para.Berlim. No Congresso de l:laia, teve tambem a ocasião de ouvir
roximar-se de Hermine von Hug-Hellmuth, que era cosiderada, na
a principal especialista em análise de crianças. O contato foi muito
rva por parte de Hemine von Hug-Hellmuth em relação a essa
tusiasta e desprovida de qualquer formação universitária; de-
Melanie Klein, que logo iria constatar que sua colega mais ve-
ha muito a lhe ensinar. As duas mulheres coexistirão na Socie-
1canalítica de Berlim , porém sem colaboração mútua:

No início de dezembro de 1920, Melanie Klein encontra-se em Buda-


Assiste a uma sessão científica da Sociedade de Psicanálise em 5 de
· bro e·ali' faz'uma comunicação intitulada ("Contribuiç~o à Análise
.meira Infância") 16 • Por volta do final do mesmo ano o se~ primeiro
, publicado aparece na Iniernationale Zeitschrift für Psychoanalyse
sob o títuÍo de "Der Familienroinan in-Sfatu Nascendi": trata-se de um
episódio destacado,do ,caso Erich ("Fritz") 17 e não do texto do primei~~
trabalho lido em julho de 1919, o qual.será publicado apenas em 1921_ ·
Em 14 de ,.dezémbro, tendo déixado Budapest, escreve a Ferenczi, pedin-
do que lhe envie um livro 19 • Passa as festas de fim de ano em Ruzo~ be-
r~ p..ara Alemaµha ___Está- aco.mµanhada _de seus:Jilhos,

i
1
11
1
14. No que se refere à ~omprovaçã~ desta afirmativa, pedimos ~o leitor que leia ª P,- ·
1~. "The Psycho-Analytical Pla,y-Technique; His History and Significance" , New Dz:ec-
1:

l tions in Psycho-Analysis, Maresfield' ~eprints, Londres, p. ,4. "My first patient was a fi~e-
years-old boy. I referred do .Júm under the name Fritz in my firs,t published paper .. • Between
1920 and 1923 l gained some further experienée with other child cases ... " .
16. Mencionaéla nó International Journat of Psycho-Ana/ysis, 1920, I, p.370.
17. Intérnatidnale Zeitschrift. '. ., v,VI, 1-920, pp.151-155. , '
18. fmago, v .IX, ' 1921. ,
19 .' Cf. 'lnternational Journal of Psycho-Analysis, 1961, pp .1 -3.
. . · ---

A U.bNESE E O SURGIMENTO DA VOCAÇÃO ...


7

v
o
mas não do marido, que encontrou. UDLemp.rego-aa-Suooia--e-ali--se-imtala.
~ ~~-ª-~~par.a_Ç.ão_serádefinitiv..a~_send.Q_o_diyórcio_p[Qnunciado pouco depois.
1~2. Os anos berlinenses (_p i}~ft, ( f3;;J2rm) --, cl,;,,ór;;;_?
-- -----~·------
- •·-

Melanie Klein chega a Berlim em janeiro de 1921. Continua a "psi-


canálise'' de Erich e recebe preciosos conselhos de Abraham20• Já em 3
de fevereiro, uma sessão da Sociedade de Psicanálise é consagrada à sua
exposição da segunda parte da educação psicanalítica de Erich, sendo que
a sessão da semana seguinte é totalmente dedicada à discussão dessa co-
municação. A 5 de maio faz uma exposição sobre os problemas da orien-
tação de crianças. Essa exposição permaneceu inédita, mas o seu conteú-
do foi retomado na "Análise de Crianças Pequenas"21 •
fjm 1922, figw;:a na lista dos membros associados da Socied.a.de.J>si-
~ ica de Berlim. Começa a trabalhar na Eoliclínica. Prossegue a psi-
coterapia de Erich e multiplica as comunicações, geralmente curtas e de-
dicadas a pontos clínicos, nas sessões científicas da Sociedade Berlinense:
"Uma Anedota Trrada da Vida de Walter Scott", a 24 de janeiro; - ""Uma
'Neurose de Domingo' numa Criança", a 24 de fevereiro: trata-se do re-
lato de um caso visto na Policlínica e que confirma os pontos de vista de
Ferenczi sobre as neuroses de domingo22; - "Algumas Notas sobre a An-
siedade Latente'', a 21 de março, texto que é certamente idêntico ao arti-
go intitulado "Ansiedade Infantil e sua Importância para o Desenvolvi-
mento da Personalidade'', que faz parte da bibliografia dos Essaisl.3, com-
pilada por Lola Brook, que foi durante os quinze últimos anos a secretá-
ria e amiga íntima de M. Klein, que indica sua existência e utilização para
a redação da '' Análise de Crianças Pequenas''; '' Algumas Observações
sobre uma Composição Escolar", a 11 de abril; - e a 2 de maio "Com-
pulsão à Dissimulação e à Mitomania". A 25, 26 e 27 de setembro o Con-
gresso Internacional de Psicanálise se reúne em Berlim; Freud está pre-
sente e lê um texto que permaneceu inédito: ''Algumas Notas sobre o In-
consciente". Este será seu último congresso. O nível científico do concla-
ve é particularmente elevado, dando motivos para sonhar: Abraham lê
24
seu texto sobre a melancolia ; Ferenczi apresenta e resume Thalassa2s.
Gé~a Róh~im lê "Apó~ a Morte do Pai Primitivo" 26 • ,Melanie Klein ex~
~nmenta
d "O D imensaI alegn a em ler, na presença de.Freud, um artigo · f t _
rn..-·n ," • • ~ lll J u
0

a o
t d d , esenv 1 s A tidões na Crian " ·
ar eara o esseociaa ""'--t+41•~ -@-Cr-1a t1ças~ ~'.
· 1 r1 , , A .... 1 • • ue mais
Melanie Klein prossegue durante o ano de 1923 su . _
científicas à Sociedade Psicanalítica de Berlim· "N t as ~omumcaçoes
de uma Criança" a 2713 de fevereiro·_ "O Jog~ d ~a:d~o re a Análise
Crianças o Jogam" a 10 de abril;~ uma P O Ic~ Tal Qual as
. equena comunicação cl' .
1n1ca
. 20. Cf. ''.The Psycho-Analytic Play Techni ,, . . •
resf1eld Reprmts, p. 4. que , New D1rections in P. ·
2 1. ln Essais de Psychanalyse Pay t 'SYcho-Ana/ysis M
22. S. FERENCZI "N' ' • PP.110-141. ' a-
' evroses du D1manche" .
23. MELANIE KLEIN, Essais d P. , 10 Oeuvres C ,
_ABRAHAM. n,,," __'! 'SYchanafvsP º~-- omnlo,,.._
/ \/ 8 -
MELANIE KLEIN I

no dia 8 de maio. eleita, a 20·qe fevereiro , membro titular de .


?'4; -º~ ~ a~, certamente, o essencial nã-o reside nessas comun· s~a ~ ie-
_;;; ,., peito de, detalhes. No-decorrer deste_ano e icaçoes a res-
. ' , 1. .,., . ., l' . , . . - numa se unda exp
: 1 \, , n enc1a ll§lCana It , , en.®-9.J!e...a.,~ . e-
l 1' . llih.Q}...$... inyen~a :a tégriç' de briocar_que...s.erá.._o_fullílam ªt°!'li~ ~eu
suas..de-soohei:tas.
_ -postéFiér-es.
, Karl Abraham com~nica 0e~~o ae ~od~ reud-as
qu~•nao reage- a 7 de outubro de 1923: ' ' A senhoraKlein ac b d 1
b t ,1 . a a e evar
a o,~ e~o.1 n;~es u/1~dos meses, a psicanálise de uma criança de três
anos .,28 . Riol;ll e e1tod, . 01 urant<: o verão que M~lanie Klein analisara a

'l pequena ta, com 01s,anos·,., e t res meses de idad\) no início de seu t rata-
mento, and..ális_ e que durarba ~res ou quatro meses . O trabalho verificava-se
na casa a cna,nça, que nncava espontaneamente com seus brinq d
M 1 . Kl . b · r
: e-·~e ·ªbn~e e1fn ~na ISava o drmcar, como h~via feito com Erich. 1, técni-
ue os
1 cw,u 0, rmcar 01, ortanto e al 1m osta pelas próprias criân-
! ~- ,.. ·, ~o_ín~te n?m se_g~mdo moment~, ªº.longo deste mesmo..ano..rut1,223,
que Me}fnie Klem....iiiíííiiiid~xp__enência obtida com.oJnício...da.análise
· de .Rita...~ cide a11ali.sit,as c~anç~ em_s_uji_ças,a.._ª1jm de evitar a.i~ e-
f 1rência da família no tratament.o...,.e_é aí que lhe vem a idéia de lhes forne-
• ,., 1, c~r os brinquedos,J ra ·· ando" assim, um fenômero ej gontãn_e.o..nu-
-. '~f ma-técnica-plane-j análise de Rita nfirma os dados colhidos ao
• , ~,••• ~ ~7· loµgo da de Erich e per
1
e novas aqµisições: <:.Yidencia a existência e a ti
-'· · y
1
s~veridade de ~mainsJ;ãnci~ crítica in~t:rna des~6lt~nra idade, 8:_importân-J(-
1

. ., \': c1a_g.as fantasias sado-anais e uretra1s e as pnmeu as percepçoes sobre a


situaÇ.ã o _de ansiedade...típic.á..da menina_ Marca, assim, os verdadeiros iní-
a
J

. s da psicanálise kleiniana tal qual conhecemos atualmente. É tam-


no ano de 1923 que se dá a or:ganização e publicação de dois artigos
sos, baseados no material colhido ao longo da experiência com Erich
primeiras análises conduzidas em 1921 e 192229 • Mostraremos mais
0 que e~ ~á contêm uma concepção muito original _das r~-
s entre::!epressão, inibição sublir@&!o, concepção que Melarue Klem
'ficará mais tarde, mas que fornece o suporte teórico da técnica do
,,_:_CllÍQSTesultados·-de..v..eria.m conduzir ao abandono de tal concep-
- o de 1923 marca;·portanto, uma virada decisi~áf7 •
' ' os mui~o o .cÍa particular de Mela:nie Klein nesta épo-
divorciara-se Além disso, sem que possamos estabele-
- o entre estes dois,fatos: começa uma análise com Karl Abra-
a
·_ ~ 1924~De·22 23 de abril, participa do Congresso In~er-
. ãlzburg,''o segündo,a acontec~r nesta cidade. Freud, abatido
. por sua doençá, não está. presénte.' No curso deste congresso, A~rahKl~
.• , ·( nu · I t ac1·onal Melame em
- é eleit9 presidente da,,Assoc!aç~o Psi,çan<U,1;t1ca n ern · .ca da Análi-
lê nesta ocasião uma comunicaçãq intitulada "Sobre a Técm . bl'1 a
,se das Crianças' muito '•P equenas' ' ~1• 'Esta comunicação não fopi ~u , c1.05..
. , · ·· . 6 b e "Princ101u~
da. Consisté ná primeira versão do c~lebre artigo de 192 so r~ ,
, • 1 { ,',

·., í . 1
" (:' \ } ,,-
li ' '
, - ' 1

3
,28~ s~,.FREUD, K. ABRAHAM, éorresp0nd~nré: N.R.F '. , _P• ~·e "Análise ~e crian-
,.
29. ',' O i>ape( da Escôla nq,Desénvolvimento L1b~dinal pa Criança ,
"!'~ ças Pequenas", in Essais qe Psyéhan~lyse, Pay9t,. ·p~.9()-141 : · , . , ,
, 30. Cf. Cap. '·. • ,, •. , ':" ·· : . Klein a seu tradutor J .B.
31. Obedecendo aç,s conselhos dados pela próP,na Me1an_~c 1•m O título Zur Tech-
~ oulanger (cf. Lf!,psj,chanalysedesenf,{!,nts, P.U:F, P-,9~, tr~duz~m~sa;; que é "imprópria e
111/é der frühen Analyse, a fim de evit~ ,o emprego da. palavra pr, co '
,' J ,
A GÊNESE E O SURGIMENTO DA VOCAÇÃO ... 9

~icológicos da_AnáHse de Criança~qu_enas" 32 que é geralmente con- ~


,s iderado como o primeiro texto a conter as idéias kleiniana.s. Sabemos, t:,N-
por uma nota de Melanie Klein (&sais, p. 167), ter ela sustentado, em
Salzburg, que as crianças , no âmbito...das..prin1eh:as-ferm~s teorias se-
xuais infantis, if oncebem e desejam_o coito como um ato oralJ;ias é pro-
vável que as três teses fundamentais de 1926 não estivessem presentes, t~
das as três neste texto, sob sua forma definitiva: o complexo de Édipo
c2~~5-~do imediatamente após o desmame, a introjeção do superego descle j/-
os primórdios do conflito edipiano, ·a eiisiêndã-Cfã transferência na técni- -
~ii-âã-p~~-~~~f ãe- CfÍai!_ç_ª~--mu_ffQ P.~~~nas,~cÕ~ _Ü_myapef V
a.o desempenhado_no adulto. Apenas esta úlitma era sem dúvida formula-
da com nitidez, pois a análise de Rita dera ensejo a importantes reflexões
de ordem técnica, enquanto que a importância do sadismo oral foi revela-
da pelas análises de Ruth, Trude, Peter e Erna33 , iniciadas todas as qua-
tro em 1924 e ainda, talvez, pela própria psicanálise de Melanie Klein com
Abraham que estava, nós o sabemos 34 , muito atento a tudo que se refere
a esta questão . Q trabalho apresentado por Melanie KleiJ!_.t}Q_Congress
causou uma forte imp_ressão em Erne~t Jones_,_.Dfesidente da Sociedade Bri-
tâajca de P sicanálise ~ prjncil}al resppnsável pelo Intemational Journal
of Ps~c~º-A.na/ysis . .Ele_abriudhe-as. colunas_de.sua_i:e.Y.ista e a convid9u
ii fr â Lond_Ies _n o ano seguinte, com o intuito de __al!_~~!...!!..1!1ª sérJ~ de con-
-.(er~~~!ª S.:...:Afg~_n§ psicanalistas ingleses, notadamente Alix StrJ!kh~y_e_lo~ - - -
B!Yi~_j á __!_].aviam pressentido a importância dos trah~fo.s de Me1ame
Klein,_ap.oiando.. .a-desde-o-in-íGior •O-qu e-lhe..f.oi~alioso .

Na época em que trata das quatro crianças mencionadas acima faz,


neste mesmo ano de 1924, algumas comunicações nas sessões da Socieda-
de Psicanalítica de Berlim: - ''Efeito Produzido na Análise de Crianças
pelas Interrupções do Tratamento" e "A Atividade do Superego no Quarto
Ano de Vida de uma Criança", ambas em 6 de maio; - em 14 de junho,
em colaboração co · colegas, apresenta interpretações de desenhos
infantis. A análise e Erna ·' está suficientemente adiantada no outono
deste ano para que u, .......... 1e Klein possa expô-la sob o título de "Extrato
14....

da Análise de uma Neurose Obsessiva numa Criança de Seis Anos'', du-


rante o encontro dos psicanalistas alemães que Abraham organiza em 11
e 12 de outubro em Würzburg. Após ouvir esta exposição, Abraham de-
clarou, no debate que se segue: ''O futuro da sicanálise reside na psica-
nálise de crianças". Esta declaração surpreende e ame em, gue não
tfnha consc1ênc1~ ~ " · de suas des~bertas e considera-
va-se uma fiel discíp.ula..d~r.eu(L~.b tahani. Parecia- e que seus esen-
volvimentos eram tão naturais e evidentes que qualquer outro aluno de
Freud poderia ter chegado às mesmas conclusões e que as particularida-
des de suas concepções eram o reflexo direto daquelas do psiquismo da
criança pequena. Em 11 de novembro de 1924, trata das "Manifestações
Infantis do Sentimento de Culpa". Em 13 de dezembro, finalmente, apre-

32. Essais de Psychanalyse, Payot, pp.166-177.


33. Melanie Klein clarifica a importância do sadismo oral no "The p h
Technique' ' . syc o-Analyt'IC PI ay
34. Cf. ABRAHAM, Oeuvres Completes, Payot, v.11, e notad:im,.,,+.. __ ,.,.,.,,,. __ _
11v
/
f MELANIE KLEIN I

senta uma comunicação sobre a ''Princípios Psicológico d .


Infância''._C~ntr~and? o h~bito ber~en~e de dÕ~uni~\~álise na
tas, a sessao mte1ra foi dedicada a este artigo comprovadili.... cas CUr.
.
e importante I
no pano t eónco
. 36. E' necessário, provavelment-.ente
ºd lon . go
e! ta comunicação com o célebre artigo "Princípios PsicaJógie•~ficar
17 Iise a e Crianças Pequenas" publicado a_12enas em IM.6,_o_QUaJc~n,..... ~á-
ra retrospectivamente lllll.Y.er.dadeinunani(esto das idéias k ~ a-
- efeito, em dezembro de 1924 a análise de Trude termina· as êf'~· Com
Ruth estão bem adiantadas; a de Ema já dura mais de s~is m~ eter a
prolongará ainda por dezoito meses). Melanie Klein percebe ne:t
(e se
! 1 1
\Í :µiento, os elos do sadismo com a fase inicial do complexo d ~ ~-
\ ,c.enJral sobre o qual se funda o__ai:tigg_de 1926. - o,~
J F
r
Intervém pouco nos debates da Sociedade Psicanalítica de Berlim ao
longo do ano de 1925. Faz apenas uma breve comunicação em fevereir
sobre "U~~ Analogia Entre Certos Crimes e as Fantasias das Crianças'~•
Em contrap'éH"tida, publica sua ''Contribuição à P sicogênese dos Tiques';
no volume X'I da Internazionale Zeitschrift Jür Psychoanalyse3 7 , artigo
que ainda não cont~m nenhuma das novas idéias e prolonga diretamente
os textos de 1923. ~ arece estar, nesta época, totalmente absorta em sua
análise com Abraham. Este, que sofria de efizema, vai fazer três confe-
_rências na Holanda, Volta no início de junho, acometido daquilo que pensa
' ser uma bronquite, devendo ~ntão permanecer acamado . Assim,'--a análise
, de Melanie Klein é interrompida ao final de catorze meses, e-jamais seria
·, , ' retomada. Na.realidade Abr(!JÍam havia ferido a faringe com uma espi-
ha _de_peixe,_na Holand<!_, Q_que lhe causou uma broncopneumonia in-
iosa, _s~g_µjda _de_un1-abscesso_no pu1mãa , e por fim de um absce.sso
·êniçp, ·Os acessos de febre alternavam-se com intervalos livres e com
os de euforia,__dando::lbu.Jl!!são de que a cura estava próxima, até
· ·,t :"~aneiro_de_l926, data de sua mo® Nesse meio tempo, não
e retomar suas atividades 38 • -

:p_QUc.o__apg_~jnt~[!]!p_ção_ _c!_~_~\1ª_.P~iç_análise, Melanie Klein, que es-


~ra coITI__9__J:_p_d_o_s_ umasura rápida de seu anal~J-ª.• parte para a lnglate?'ª•
. fim_de_p__r.oferjr as confer.ên.cias..-r-equisitadas-porJ.ones no ano antenor.
li permanece por _'__s_emanas,.pronunci.ª1.!Q_'2_ seis conferências per~te
s membros. d-a - -~--A dade Britânica de Psica_!!_ªlisê? Recebe uma acolhi_da
calorosa e uma adesão geral às suas idéias, o 9.!!.~- ªJurpreeu.4.e de maneira
J~!i~~- ern__Berl!!Ili a~~a~_A!'.i~Ji~~~va _y_s,rgª9eir_a~~!!1~-"-Ern~t 1~
n.eSJ;.omâda-a~.Jiesta_v.ez,...a_viJ:..i11~tª!ªr:-_se 1rnJ!!gJ.at~r_rª-·ªº- meno~QQUI
ann. ...Colegas _pe.dcm:lh~ ..~~u.§_Jggos •
De volta a Berlim acompanha os progressos da doença de A?raKhl~·
Quando este morre, o ' luto é_ce!!~..!!!~!!tt:_.! 9ng_º·-~-_pe~Q.8-.Q_,:·-
· Melame em,
·- :rifo- ublica
c:Q mumenTe tao ativa, não faz.mais nenhuma _c_oEIUTT. 1.~?.Ç_~o -~ . P. --Ió-
__e_~m~~"i,-}Ii,o_-ateO·Iim-deT928.· = -com ·excéÇ~O dos '' PrntciplOS ;~1::va-
icos da Análise âê -CriãiiçãsPéquenas" publicado em 19~6 •
elmente redigido ou pelo menos iniciado em 192439 • Alem os
;ª efeitos

36. International Joumal of Psycho-Analysis, 1924, n? 4.


37. Retomado em Essais de Psychanalyse, Payot, PP-142- 16~- nota.
38. Cf. S. FR~UD, K. ABRAHAM, Correspondance, N .R. ·• p. 388 '
39. CL supra, pp .7-8.
' r_}I()//€) c-/?.J ~-, ;fJ/4t(ú () 1(f dflf V \7/ J'GW v~ / (C/1/0)1,~J
/h @ )
~rJ dv
A GÊNÊS~ E O SURGIMENTO DA VOCAÇAO...
- --- - 11

perturbadores próprios a este gênero de situação, Melanie Klein perde com


Abraham seu principal garante no plano científico e seu único suporte i:._eal
;:;,em Berlim. Torna-se-lhe difícil suportar a Sociedade Berlinense de Psica-
nálise. ~ s propostas britânicas se Jbe apresentam e:Atão sob uma no,;a luz.
EÍãqueria afastar-se de Berlim enquanto Abraham era vivo, pois, segun-
do a expressão de Maria Torok e Nicolas Abraham, autores da introdu-
ção à edição francesa dos Essais de .Psychanalyse, "esperava conquistar
no divã dele o que já sabia dispensar às crianças" 40 • Após o desapareci-
rmento de Abraham~ aceita as ofertas de ErAest Joues, termina as análises
em andamento, notadamente a de Erna, e toma providências para instalar-
se em Londres. Conta então 44 anos. PJ:aticamente nada mais a pren~e
~o C~ntinente. Começa uma nova etapa de sua carreira, que a tornará
~ inspiraaora da Escola Inglesa de Psicanálise: ·
1 - , .

2. A EDUCAÇAO PSICANALITICA DE FRITZ-ERICH

2.1. A Questão da Identidade do Pequeno Fritz

Relatando em 1953 as circunstâncias da invenção de sua técnica de


psicanálise de crianças pelo brincar, Melanie Klein declarava:

Meu primeiro paciente foi um menino de cinco anos de idade. Referi-me a ele
sob o nome de ''Fritz'' em meu primeiro artigo publicado. Aprincípio julguei que
seria suficiente influenciar a atitude da mãe. &µgeri-Jbe que dexia encorajar a crimiça
a' discutir livremente caro e)a ouroerasas pecg1mtas inexpressas que estavam obvia-
mente ocultas em sua mente e que impediam seu desenvolvimento intelectual. Isso
deu bons resultados, mas suas dificuldades neuróticas não foram suficientemente
atenuadas e logo decidiu-se que eu deveria psicanalisá-lo41 •

De fato, o caso dé Fritz desempenhou um papel considerável nos pri-


meiros · elanie Klein. O artigo publicado em 1921, composto
de as partes recr · as, uma em 1919 (lida na Sociedade Psicanalítica
de Bu apes , em 13 de julho deste ano42), a outra em 1921 (Essais p. 57
n. 2) e que constitui
3
o primeiro dos artigos reunidos nos Es~ais d;
Ps°J!cha~alyse4 , é_ integralmente d~~cado a este caso. Este é retomado em
do•s.~1~os publicados em 1923: O Papel da Escola no Desenvolvimen-
to L1b1dmal da Criança" (Essais, pp. 90-109) e "Análise de Crianç'as p
quenas" (Essa is, pp. 110-141). e-

Em "O Desenvolvimento de uma Criança" (1921) Melanie Kl ·


senta esta criança nos seguintes termos: ' ein apre-

criança em questão é um menino, o pequeno Fritz c ·


A .
cem à ~inha família, moram na minha vizinhança. Esta' ci~Jos P~s,. que Perten-
oportumdade de estar muitas vezes na companhia' da cr· cunstanc1a deu-me a
trangimento. Além disso, como a sua mãe segue t~das d ianç~, sem qualquer cons-
Posso exercer uma influência de longo alcance na educa - ads Illlnhas recomendações
çao e seu filho (& . ,
'SUIS, p. 30).
L2
MELANIE KLEIN I

Ao escrever estas linhas, Meb~nie Klein reside na Es .


de podemos deduzir que a criança também mora em R lovábquia, de on-
em "A áli" d C · , P ,, · · uzom erok l..-
11 • se · e . nanç~s equenas md1ca-nos O fato de t . · iv1as,
a análi~e <l;o menino quando este conta com um pouco men erd retomado
P:P rtanto, · ~m 1921 . . Ora, nesta epoca,
' 1 se· encontrà
e~ . os lie sete
em Be É an0 s,.
so, pois, que a família da criança também se tenha, por um: e~- P~eci-
ria coincidência, transferido para Berlim, ou então, 0 que ima; rao rdtná-
pou~o plausíve~, que criança t:nha ~id? enviada a Berlim par::~º~ ser
segw . . r sua anáhse. Ve10-nos entao a 1dé1a de qu~ esta criança era P os-
lm
ve. ~nte o f1_'lhº. mais . novo d e M eIame· Kle1n,
· Erich,
· nascido em Prova-e
cuJa,~~dade c01nc1de exat~ente com.ª do peq~eno Fritz. Assim PQ.Çlemos 1914
c~9mpreender por que a cnanca seguw Melame Klein para a Ã.lemanil
"d d d . , . ae
p9_~_~e la ~o e, es_e o •~º~-m;exc;u._e.c.e~ocilidade da mãe êm
nl,-

s_egmr seµs conselhos e da ..m.fl.uenc1a_que. ela_po.dia...assim exerceuru,re


q.J~.du.ca,c.ã.o de. ''Eritz''.

Por outro lado,,convém ressaltar uma inexatidão nas declarações da


fundadora da técnica do brincar segundo as quais ''O Desenvolvimento
de uma Criança" seria seu primeiro artigo publicado. De fato, a primeira
parte deste texto é realmente a primeira comunicação feita por Melanie
Klein a um público, o dos memb;ros da Sociedade Húngara de Psicanáli-
se. Porém, foi editado apenas em•1921, junto com a segunda parte, sob
o título e na forma que conhecemos aty~mente. Ora, em 1920 a Jnterna-
tionale Zeitschrift für Psychoanalyse .bavia publicado, na sua rubrica re-
lar de "Comunicações sobre a Vida Psíquica Infantil", um artigo de
nie Klein (Budapest) intitulado "O Romance Familial in Statu Nas-
44. Este artigo, mencionado por Lôla Brook na bibliografia que
nha os Essais de Psychanalyse, é um âos raríssimos textos de Me-
ein que nunca foi traduzido para o inglês nem reeditado. Quando
ina este texto, compreende-se a razão pela qual foi deixado no es-
uecimento: seu conteúdo com pouca coisa a menos reaparece integral-
ente no "Desenvolvimento de uma Criança" 45 e consiste no seguinte:
róximo à Pascoa, a criança ficara visivelmente decepcionada pelas expli-
ções de sua mãe relativas à inexistência do "coelho da Páscoa"; que
'aquele que, nos países germânicos, supostamente traz para as crianç,as
rinquedos e guloseimas, que são escondidos no jardim na manhã d~ Pas-
,coa. A criança mostrara certa frieza após este fato e apegara-se a cnanças
vizinhas que lhe asseguravam que o "coelho da Páscoa" existia real_men-
te. Nesse momento, a mãe aproveita uma conversa para instruir a cnanç_a
obre a gravidez e o nascimento de bebês: as explicações são mal rece~-
as e, dois dias após essa conversa, o menino anuncia que vai trocar e
· is e pretende ir morar na casa dos vizinhos. Melanie Klein descrev~lio
ódio de maneira detalhada e relaciona esse desejo de trocar de famt ª
mação do romance familial descrito por Freud46 • Mas a criança em
ão,· cuja identidade com Fritz é manifesta, acha-se aí explicitamente
nada como o filho de Melanie Klein: "Meu filho Erich, agora com

44. In ternationale Zeitschrift für Psychoanalyse, v.VI, 19~0. "Mitteilu~gen ~u~,d~ ~::
fantile seelenleben", J'. "Der Familienroman in Statu Nascend1, von Melame Klem ( u
pest), pp.151-155.
45.MELANIE KlEIN , Essais de Psychanalyse, Payot, pp.32-3 3.
J. - - - -# _... ,,. . . ,,nrc:'Írln .
V A gENESE b u ;:)UAU U YJ..LJ, , .. -- -

cinco anos, é uma criança saudável e vigorosa ... Estávamos próximos da


Páscoa e ele ouvira falar coisas muito bonitas sobre o coe!ho da P~-
coa' ,41 . Indubitavelmente foi esse dado tão revelador que motivou a OilllS-
são do artigo nas coletâneas publicadas em seguida.
Deste modo, ~igem da técnica kleiniana da psicanálise das cria~-
r-:JIO: atraY és_clo brincar está na relação que Melanie Klein teve com sey_ f1-
d " ' li "
lho__evtre...os dia~ p.re.c.edentes_à_:eáscaa_em 1919 e o ftmesta ana
y ,.!&>L-' • •

em 192). _El.a..lllesmanos..chama-a..aten.çã.Lu.obre a importância desta rela-


çãõ'_p.ru-a_o pr.osseguimento-de-suU>ln=a\
...
~ ra:~ se_marca o começo da técnica psicanãlit1ca a rav s o bnncãt? llill"-
gue desde o início a cria~ ~rimiu suas ansiedades e...~ ~ias ~ssencia)me~te
': ao brincar e eu Interpretava regw,Mm~ nte",_para_ela..o...seu_s1gni.ficado~ oJD..Q...eie1to
cieque surgia matenal adicional em_~uA.t>~eir-ª.· Isso quer dizer que eu já em-
pregava, cõmess e p ~cial do método da interpretação que se tornou
48
característico da minha técnica • ·

Não podemos deixar de estabelecer uma relação entre o caso de Erich


e do pequeno Hans, cuja análise, a primeira psicanálise de uma criança
50
pequena49 , foi relatada por Freud •
Em ambos ps casos, a análise foi efetuada por um dos pais da crian-
ça. O que hoje nos parece estranho, parecia como algo que se impunha
por si e mesmo com a condição de possibilidade de análise de criançasL
muito novas:
Apenas a reunião da autoridade paterna e da autoridade médica, em uma úni-
ca pessoa, e o encontro nesta de um interesse ditado pela ternura e de um interesse
de ordem científica, permitiram, neste caso, fazer do método uma aplicação ao qual,
51
sem esta, não teria sido eficaz •

Assim como mais tarde Melanie Klein será encorajada por Ferenczi
também os pais do pequeno Hans, ambos ''adeptos achegados'' de Freud'
foram P?r ele incentivados a observar seu filho, então com menos de trê~
~os de idade, s?b, um p~~to de vista psicanalítico, a fim de verificar prin-
cipalmente as hipoteses Ja formuladas no ano anterior nos Três E · ·
sobre a Teoria
· da1Sexualidade nsaws
• (1905). Suas observaço~es multi'plicaram-se
e Freud f01 regu armente mformado a respeito (Idem, p. 94).
A intenção inicial dos pais não era apenas estudar O des 1·
de Hans, mas'' ... educar seu primeiro filho sem maiores env,? v1mento
as que fossem absolutamente necessárias p~a manter u ~oerçoes do que
~e~to. E, à medida que a criança, desenvolvendo-se : om comporta-
mmnho alegre, bom e vivaz, a experiência de deixá-1 o' crescer
tomava um me-
e expressar-

47· Internationale Zeitschrift Jür Psychoanalyse 1V ·


48. MELANIE KLEIN, "The Psycho-Anal i ' vo. 1, 1920, p.154.
Psycho-A nalysis, Maresfield Reprints, p.4. yt e Play Technique", New Di .
. ~9. FREUD tratou pela psicanálise antes d 1 . rections in
mais Jovens histéricos" de 12 anos (A In~er e_ 900, cnanças maiores E .
terpréta~i,on rêves, PUF, pp.462,463):pretaçao dos Sonhos, vols.IV /e cita "U.m destes
50. Análise de uma Fobia em um Meni d . 'Imago ed.). (l'In
pp.93 - 198 . no eCmcoAnos" inc· -
51. Idem, pp.93-94. ' mqPsychana/yses, PU . .F.,
14 MELANIE KLEIN I

s~ ,se?1 inthnidações p~o~s~gµdiu s~tisfa~riamente'' (Idem, p. 94). Porém


d
. Jit @~:to,:meses ap 6· s o 1ruc10 e ,suas o~etvaçõe.s, co,statai;n. a instai '
, ~} ~
1
,:sintoma_fóbicoe.opait~rna a deeis~o de:entl•,encter a an~io
~/~~wiça. !~bem no cas0 de Bnc~, Melan1e Klein se propõe inicialinent
--~ •a um•'10b~et1vo puramente educativo. Mas a educação traasfonnã:se . ~e
se
-an~se' q:u~db, torn_a evidente ~1:1e.. a .criança não manifesta a
ne1~ad,e 1~~P,f ~~~a e ap_resenta um moremento de seus traços neuróticos.
espo;:
Assim; po.~e~ os ,~ons1derar que ela part~ em 1919 do preciso ponto..de'7
onde_Frendl~'.~·· p~·do pequ~no 1;!ans..part1~~ elés ·mesmos doze a ~ .an- /
· )7 (~_~,.•Entretanto _ela oderá Ir ma1s·Ion e ra ·as à compreensão do sitnb~- ,J,1

lism~_das._b ·~ , . :.~.~. da crian .ª o ue lhe er~ itirá ~uperar o maio ;


o~staculo ass1n~o ~or ~reu~ 918, g_ue ~ons1ste na mcapacid~ e d !}
cnança em produz1e liu.euw~iaç~~- Y.erb.aiss2. .

2.2. Os Objetivos Pedagógicos Iniciais de Melanie Klein

1A -'a mbiçªo i~i~ial-~lanie Klei~~ -p_ur.am-:t_e_pe al mas é


_ d_ag_ó_g_ic--,

l
grandiosa e é acompanhada de; '.µm (om de entusiasmo militante: não se
',, trata de curar perturbações neuróticas, de-cuidar, de readaptar a criança
:1 a seu meio e de permitir sua entra<la na média, o que será mais tarde o
objetivo de Anna Freud. A perspecti'fi completamente diferente: a hu-
manidade média não é normal, é doentia sem o seu conhecimento. A doen-
ça mais disseminada é a inibição intelectuàl que Melanie Klein passa em
vista nas manifestações mais banais, fundamentando-se constantemen-
o seguinte postulado, que permanece implícito ~s nem por isso é me-
atentemente operante: i.Ó é verdadeiramente·normal uma athddade
tLJ:aJ g11~_cJ>.mp.01:te_a_cap,âcjdade_de cobrir a extensão.do..campo.QOs
sses e a canacidad~_de.p~netração aprofundada,J mlicável tanto ao
_ iÓ -prático como ao domínio científico e especulativ.o,j ntegralmen-
subordinada ao teste -de realidade e liberada, em particular, da ilysão
·giosa. Todas as formas de "graves prejuízos causados à capacidade
lectual", que descreve em julho de 191953 , repousam na supressão,
o efeito da repressão, de uma ou outra dessas aptidões que parecem
e pleno direito, sob o ponto de vista de Melanie Klein, o resultado
desenvolvimento natural das capacidades do ser humano. Esta crenç_a
tentada pela freqüente observação do contraste entre a espontane~-
e e a vivacidade intelectual da criança pequena e o caráter mais contl-
, de alguma forma "achatado", dos interesses intelectuais da criança
idade escolar. A diferença se explica pela repressão da curiosidade se-
ai inerente ao complexo de Édipo.
O inventário dos tipos de inibição por ela levantados merece que nos
nhamos por um instante nele. A ''repugnância pela pesquisa funda-
mental desinteressada" não é um fato natural, mas procede diretam~nte
da oposição dos adultos à curiosidade sexual da criança: nas pesqu!sas
profundas, a criança que permanece no adulto teme descobrir "as c01sas

52. 'S. Freud escreve: "A análise praticada diretamente numa criança neurótica deve, des-
de o principio, parecer digna de fé, mas não pode ser muito rica em material; é preciso colocar
à disposição da criança muitas palavras e muitas idéias; ainda assim, as camadas mais profun-
das de seu psiquismo se acharão impenetráveis à consciência" (S. FREUD, Cinq Psychanaly-
ses. P.U.F _. n n.li,
A G~NESE E O SURGIMENTO DA VOCAÇÃO.·· 15

proibidas" outrora por seus pais. ~ gui,n.te,...ela_-s~eà~ f)effilffir-


se uma curiosidaqe..s.upetficial. Em outros casos, a at1v1dade mtelectu~
p~~manece possível, podendo mesmo ser brilhante, mas apenas d~ m~e1-
ra setorial: o sujeito detém-se diante das conseqüências em que 1mpbca-
riam suas idéias; em particular, tem medo de questionar as "idéi~s q~e
lhe são autoritariamente impostas como verdadeiras''. Num terceuo ti-
po, o do ''investigador'' ;'a inteligência sofre uma redução em extensão;
atraído por um único problema, o sujeito '' ... pode dedicar-se ao traba-
lho de uma vida inteira sem manifestar nenhum interesse particular fora
da esfera restrita que lhe convém''. Um outro tipo de pesquisador escapa
a esta restrição do campo de interesse, mas "fracassa totalmente diante
das grandes ou pequenas realidades da vida cotidiana'';\a hipótese de uma
retra~º-~<?..i}!!~.!'esse,_ pelo investimento exclus.iyp do pens~ nto
abstrato, pare_c_~-ª-M.elajç_J9einJ nac.eitáv..el:_ap.enas__u~gre.ssão., que.na
infância pesçm.SQbI:~Jt.conhecimento..das..realid~des concretas de ordem
s_~xual, po~~ ~?(:Pli.~ar _o d~~(ª1ecimento.da inteligência.no....domíoia..p.ráti--
~ -Todo~~J~~!~dos_g~_realizaçjo _intelectual diminuíd_asão consegüência
d~ car~ter !~pressivo de uma educação que interdita as manifestações da
c:urio§ida<le sexuatda..c.riança.1 Da mesma forma, a educação exerce um
efeito perturbador quando se opõe ao livre funcionamento do teste de rea-
lidade, impondo à criança idéias prontas, sem lhe deixar a possibilidade
de elaborá-las por um esforço pessoal e julgar por si mesma acerca do
verdadeiro e do falso:

_ A_ submissão permanente ao princípio da autoridade, a dependência e a fra-


q_~e~ mtelectu~ permanentes têm por base esta primeira e importantíssima expe-
nenc1a d~ autoridade, q~e c~nstituem as relações entre os pais e a criança peque-
na. O efe1t? desta :xpenenc1a é fo~alecido e sustentado pela massa das idéias éti-
cas e morais_ que sao apresentadas Já completas à criança e que constituem outras
tantas barreiras à liberdade de seu pensamento (Idem, p. 54).

~No entanto, a espontaneidade intelectual da criança resiste a esta in-


~rusao d? mundo dos adultos: '' ... um intelecto infantil mais dotad
Ja capacidade de resistência tenha sido menos deteriorada d o, _cu-
vezes travar contra elas uma batalha mais ou menos bem-su~l~a~' muitas
p. 54). Talvez a criança chegasse a preservar sua liberdad . 1 (Idem,
?J ,~dultos não dispusessem de um recurso absoluto· a ilusãe mte ~ctual se
1 eia d~ uma deidade invisível, onipotente e onisci~
ra a 7nança ... " (Idem, p. 54). Esta idéia de Deus ~ti
o re giosa: '' A
\:imaga~ora pa-
na c~ança, devido à sua experiência arcaica de de d8: . ente mcutida
;;~açao à ~ãe; quando cresce e " ... se dá conta
,qu~za diante das grandes forças da vida
cie~
enci~ a~soluta em
ua solidao e de sua
Propna dependência, por meio de uma re ; ... _procura então negar a sua
a protegiam na infância"s4_A crianç: r::!va ~ess~rreição das forças
onf;o{ue a protegerã da Hi/flosigkeit em fac!ªd~ idéia de um Deus pro-
ci ente protege o lactente Além di mundo, como ~

de r . e on1potencia que contribuiu


I::.ª
n~ dos pensamentos fornece ~m inotiv;so, a crença infantil na o . a II_!ae
rne~: r~laçã~ de~ca~alidade circular, ~ceitaçãoda idéia :P~ten-
ia e Deus ali eus:
eahzar o teste de realidade acha-se d~ª.
s~a aceitação ~nta o senti-
e iIUtivamente alt . capacidad
s4 _s. F "
erada Pela sep e_
Se/ecionad REUD, Leonardo da Vinci e . a
as de Freud, PsychoanaIYtisch umVa Lembrança d
er erJa
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v·1ena1zua sua
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•u eia•• (1
nque, P.83 9 10), in Ob
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-~a~o-' tâ~,~~e,t:, ~~~~,m~d;~, ·ctt~ijÜCe1,ciJ,o ,1Jarc1s1smo inf.â•ti: · , ; · ._ -
.;.i _. ;~ . .• _

..rê •'·', •. 111- ',., '- ·:.lii:1, ; ' ' d" •. '-"Aai tO.,.c ti ·, .......
-~S.0'ti,alização:dâ-. : -· ··-~u-
ni.. ·;e. .
.f' :.:a·ena,-~~• ;O:~~~m
u ,1pqa,1;1.la·y,a1 ~. rep~~~
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cus,t âtqe 'µrii2\ ·muti~ç~o. d~,suad1iteliêtl••Jfct tal fonna -~ ue~~ça às


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-. , .
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. . :
,ynerlsame'ntb
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indepead.êti•\.,
.
W["""'...ií... -,-~ ã.~_r_
f181'~~...,
.Jcep~·ClOnal:
sunpies

CQstumam,p.~Pf~_ st~ homem1gem à "çer~~\@~ pensador qUe, opon


ao costJ:lDle à_ autor~~ade, ~9~~5p.ie ~evar ..av~~~ pesqµisa·s.·intejramente ori ~~se
N~ caso~ cnanças, ·elas,pr~ ~~, .r~ente, ~.ó·de~sa "coraaem", inas~s.
b_ern de est3!, dotadas de_u~. ~s.pín~o mut~~-e~pec1~ ~q~~ lhes permitÚetolvertaJn-
s1 mesmas, c9~tra a opos1~P.~as 1~ ~ál~s au~o~ dades" , os ~untos m~lindrOSOf P<>r
lhe são, em párf:e, 'nega4.~:s~ em parte, recuiádosj 5. ·· ··' · · ClUc
,,p.

_atitude ~o e~µcadot ~~<>cup~do ~1?1 ap~,icar :~ 'Conl~me~tOJjfsi-


,.-'.i

canalít1~0~ sera, porta~1Jo,,~~ t~te st~Ptt,=ausência ,qe ~du;,êação,t~Ifilo-


s~, abohçao dos tabus r~!ere!lte~,~ c1:1~0~1.fü~d~. ~~~ual_',~ /rlança,
çao sexual, luta contra a crença,. no m;;µ--avJJltoso e·contra as tnanif~
da'' .. . megalomania incurável do ser'liumano" 56 que ·se exprime pem-fen.
tini~~to êt~ o,nípotência dos pens~éntos.
'
, Tal programa traz indiscutivelmente a -marca da influêruria de Su-
4or .Ferenczi. A variedade de seus temas de·intêr,esse.era tal que'fret1üen-
. temente esquecemos que sua entrada no círculo d~.dl~pulos de Freud•deu-
se a partir da leitura, em 1908, no Congrés~o' de Salzburg, de um artigo
, no qual coloca a seguinte questão: "Que ensinamentos prâticos a pedago-
1 gia pode tirar das observações obtidas pela pesquisa psicanalítica?"57 In-
siste aí sobre um dos mais graves erros da educação'' ... à saber, a repres-
são das emoções e das representações. Poderíamos até mesmo dizer que
cultiva a negação das emoções· e das idéias''. Mas, como Freud havia mos-
do, o reprimido sempre retorna, e as tendências reprlinidas pela educa-
ó podem permanecer assim às custas da edificação de ''organizações''
ivas poderosas, cujo funcionamento é automático e cuja atividade
e muita energia psíquica" (Idem, p. 50). Deste modo, a personali-
nsciente é enfraquecida pela incessante luta travada com 0

clucação moral edificada sobre a repressão produz em todo homem saudá-


erto grau de neurose e dá origem às condições sociais atualmente em vigor•
lavra de ordem de patriotismo recobre qualquer evidência dos interesses
de sob a bandeira da ventura social da humanidade propaga-se o esma-
ânico da vontade individual, onde se veneya na religião quer um re~é-
edo da morte (orientação egoísta) quer um modo lícito da intoleran-
em, p. 54).
e o egoísmo hipócrita são portanto o resultado de urna educação
ogmas, que negligencia a verdadeira psicologia do homem (Idem

.O que pressiona nestes textos de Ferenczi é o fato de que os efeitos


dá kepressão são remetidos em sua totalidade a influências educativas e

SS. MELANIE(KLEIN, Essais de Psychanalyse, Payot, p.54.


56. S. FERENCZI, ''Le développement du sens de realité et ses stades", in Psychana/yse,
Payot, II, p.61. .
57. S. FERENC21_ "Psychanalyse et Pédagogie", in Psyéhanalyse, Payot, I, p.50.
A GÊNESE E O SURGIMENTO DA VOCAÇÃO ... 17

que a psicanálise aparece aí como devendo inspirar uma reelaboração das


atitudes pedagógicas que permitiriam a prevenção das neuroses e dos ma-
les causados pela educação: "Uma questão surge então espontaneamen-
te: qual seria o meio terapêutico e profilático contra estes males?'' (Idem,
p. 54). E como em Ferenczi a reposta nunca se faz esperar muito tempo,
escreve em seguida: "A pedagogia está para a psicologia, assim como a
jardinagem está para a botânica" (Idem, p. 51). Estamos muito próximos
das idéias expressas pelo próprio Freud nessa época: é a_moral sexual ''ci-
vilizada'' que esmaga e, mdivídu_o. O progresso da educação passa pela
supressão da idéia de Deus e pela introdução da educação sexual:

Considero um avanço muito significativo na educação da crian~ que na França


0
Estado tenha introduzido, em lugar do catecismo, um livro elementar que dá à
criança as primeiras informações sobre a posição cívica e sobre os deveres morais
que deverá assumir um dia. No entanto, essa educação elementar continuará ver-
gonhosamente incompleta enquanto não compreender também a vida sexuaIS 8•

Contudo, tanto para Ferenczi como para Freud, o objetivo procura-:


do quando se imagina uma pedagogia inspirada na psicanálise é o flores-
cimento da personalidade da criança em todas as suas dimensões, sendo
a ªnfase colocada, sobretudo em Ferenczi, na preservação e no increme~
to da capacidade de vivenciar prazer: o mal que guer evitar é gue a edl}ca
ção torne o indivíduo '' ... inapto a gozar sem inibições os prazeres nat.
r.ais..da_yida" (Idem, 51). Este objetivo faz parte das preocupações de Me-
lanie Klein em 1919. Mas o que ela acrescenta aí, _e que lhe é peculiar,
é o privilégio concedido à inteligência e à autonomia intelectual. Para ela, /
nesta época, o sintoma mais preocupante é a falta de espontaneidade in-
telectual. O objetivo da educ.a.Ç.ãQ_nsicanalítica do pegU:eno Erich será prin-
.cinalmente o de liberar sWL..C.ll[io_sidade-s.atisfa.ze.n.do_s.ua curiosidade se-
~al e evitando a repressão.
1

2.3. O Desenvolvimento de Erich antes de 1919

A educação psicanalítica de Erich começa alguns dias antes da Pás-


coa de 1919. O menino conta com quatro anos e nove meses. Portanto,
nasceu em torno de junho de 1914. Seu pai esteve ausente durante um ano
!ua~do Erich tinha entre seis e dez.oito meses. Por volta do vigésimo mês
~ru~~stou um amor exagerado pelo pai. Começou a·falar, segundo sua
mae, somente aos dois anos'': Melitta e Hans foram aparentemente mais
~r~coces e podemos ver na observação de Melanie Klein um sinal da in-
P~~e: atençã~ ·que dedica ao desenvolvimento ·intelectual de seus filhos,
En~s f~to a idade na qual Erich começa a falar é perfeitamente normal.
mes:e fois e ,três anos ele sofre terrores noturnos. Aos dois anos e nove
de ref _oge: e encontrado em uma rua vizinha contemplando uma vitrine
três a~~~ar~a. 1:1ma certa tendência à fuga persiste ,durante seis meses. Aos
• ve O irmão nu durante o banho e exclama, feliz: "Karl ( = Hans)

58. S. FREU " . . . . . .


~--13 . Cf. igualmeD, Les e~plications sexuelles données aux enfants", m La vie sexuelle, p .U .F.,
e Justo que ind nte suas hnhas escritas em 1908 na mesma coletânea, p.46: "Em vista disso
C.. ). Certamen ag~emos se a nossa moral sexual 'civilizada' vale o sacrifício que nos impo~e'
def e naodé at ~1·bmçao
n ~nder a urgência · - do médico
• propor reformas, mas me pareceu que eu poderia
0
civos da nossa e tais reformas se ampliasse a exposição de von Ehrenfeis sobre os efeit
moral sexual 'civiliz~ufa' " os
18 MhLANIE KLEIN I j

i
tambçip. teD1,,unt\·pipi! '' e lhe diz:
. . •.. •r
','for
,' E . favor, n_ergunt . _e. a .Lena,
, ~ 1( - · . "
P! ·
.. . , 4, :i.: •
. ta)~ ela !,. -:aem:::"rn _um Pf ~J Pr!sS~:~~ ê9~Jtáµleni~·áÔs tiês
-~ e sei~ ~e,s~s,·~ ~ -~ · e ~t~~-' ;J,~ 3'.°1ais ctt,üv0.,~ 1pro~un~i~ ·aquél 1

pressões., 1:1ptãv~~~\F. ex~~ 7,as, qt,t~~re êostutfla ou\'ir dosT ãbio~de cr{
1
de tenra 1:aade mais beni dotadas. .
1

A despeit<;> cUstp1_el~ dar ai.~-i~P,S.sio, !~nto _noq·set.1: as~ 0 COtllo


no se~ compo.~ain,~~'~' de s.•~,. um~ ,-: "iinta vtta e 1.~~gétt'te'1•~ Se · 11_
do o Jul~ame~t? ~d~:JS~~
nar noçoes d1st1n~ ... $lSi: nomma-,ás.
ltí~, .~~ s~eya mwto tempo para
os ~O .aiú1s"de
Aos quatro anos e três meses .com~ a 'f àzêr.:perguntas:··"Para que s~·
um papai~" e '~P~a gu~ serve..~à m~~~?'' O _s~gniÍ!~º profundo~
i.
J:n_

tas questoes nao sao co~preendidos e. llie é respqndidó: ''Para te atnar


e cuidar de você" . A crian~ não 'pê~siste riés9.'t8 perguntas. êom a idaae
de quatro anos e seis meses, altquire,'.,l, no~s çle on~~m, hoje e amanhã.
Sua mãe o considera atrasado quaníô ao c!ominio prático: ele não enten-
de por que é necessário pagar aos comercfantes e se esp~ta que as pe,s-
soas que têm tantas coisas e em tais quantidades não .v~aBÍ a idá-Ias.
Na mesma época o número de perguntas que faz aumerlta êónsicferavel-
mente. O sentimento de onipotência permanec~ arraigado: assegura que
sabe cozinhar, ler, escrever etc .. . , contra qti'a lquer e,vidência. Um dia, pe-
de à sua mãe que cozinhe espinafres para que se tàfnem batatas, o g'ile
é por ela interpretado como crença em sua onipo~ên, ,fl, De outra feifa
pede à mãe que lhe dê imediatamente a cidade B onde~déveriam, em prin-
cípio, passar o verão seguinte. Manifesta uma acentuad,arep11gnância por
estradas e ruas. No entanto, tem énorme interesse por vefcul()s e banca
incansavelmente de cocheiro ou chofer. ·, · ·
Como podemos notar ao término deste arrolamento de informaçijes
fornecidas por Melanie Klein e distribuídas no decorrer cios qua~9. uti-
os que expõem seu caso entre 1919 e 1923, o progresso de Erich anterior
início de sua educação psicanalítica é normal. O que deve ser ressalta-
, que sua mãe se preocupa reiteradamente, sem uma verdadeira razão,
seu desenvolvimento intelectual .

. A Primeira Fase da Educação Sexual

Devemos insistir sobre a extrema brevidade da experiência de Mela-


lein expostas na Sociedade Psicanalítica de Budapest em 13 de julho
l9. A observação total durou menos de três meses . As intervenções
ógicas dividiram-se em dois curtos períodos. Um de três dias , e ou-
quatro, separados por um breve intervalo. Os resultados são ava-
partir da evolução da criança nas seis semanas seguintes.
? rocesso começa casualmente. Sabemos que Erich fazia perguntas
lil tresvn,eses. Neste momento Melitta e Hans evocam em sua presença
~ntecimentos que ignora e ex~licam-se-lhe que ele ainda não havia nas-
Cid<;> na época. Erich parece muito decepcionado com a idéia de não ter
estado sempre ali. Pergunta: "Onde estava eu antes de ter nascido? " e
um pouco ~ais tarde: " Como é que se faz uma pessoa? " Melanie Klein
dá explicações sobre o crescimento no interior do corpo materno, sem
az.er alusão alguma ao papel desempenhado pelo pai na concepção, con-
e a regra que ela se impusera inicialmente: ''Permitiremos à criança

;oi
fr~irir conhecimentos sexuais na medida de sua curiosidade" (Idem, p.
Esta regra implica um aspecto positivo: responde-se totalmente à per-
.ta da criança, sem desviar o assunto antes que ela mesma o faça; ain-
aspecto restritivo: informam-se apenas os fatos suscitados por suas
ª tões. Erich reage às explicações de sua mãe, mostrando-se distraído
~~~~fuso, mas repete, a princípio, cotidianamente a pergunta. Em segui-
d dirige-se a Hans e à governanta que lhe contam a fábula da cegonha
~hes repete a mesma pergunta várias vezes. Depois de alguns dias volta-
e de novo para mãe, repetindo a pergunta da seguinte forma: "Como
se faz uma pessoa?" e desta vez reage diferentemente às explicações: opõe
le esposta de Melanie Klein a fábula das cegonhas que é por ela desmenti-
d;; e quando ela a desment,e, o fato pr?voca uma r~isão ~eral_ das cren-
ças infantis: o coelho da ~ascoa, Papai N?el e os anJ_os nao existem; e!11
contrapartida os serralheuos realmente existem. A cnança começa entao
a adquirir referências intelectuais para o teste de realidade. Entretanto,
sobrepõem-se acontecimentos que e~id~nci~m as _d~fi~uldad~s da cr!~nça
em assimilar a educação sexual. O prmc1pal e o ep1sod10 refendo em Ro-
mance Familial in Statu Nascendi", o qual se liga às dificuldades encon-
tradas na instauração do teste de realidade. Algumas semanas antes deste
episódio Melanie Klein havia desmentido a fábula do coelho da Páscoa
contada pelas crianças da vizinhança. Como essa estória lhe agradava mui-
to, Erich recebeu mal as explicações de sua mãe. Reagiu da mesma ma-
neira quando esta lhe disse que o diabo, de quem também falavam as crian-
ças L. (as crianças dos vizinhos), não existia. Em ambos os episódios, ten-
tara mostrar à sua mãe o coelho de Páscoa e o diabo; ~mas se tratava de
um coelho e de um potro vistos em um prado. Na época, a família L. cons-
tituía um meio cuja influência contrariava as explicações de sua mãe. Dois
dias após a conversa sobre a origem das crianças, o coelho da Páscoa,
o Papai Noel etc., Erich anuncia que vai trocar de família. Será, doravan~
te, o irmão das crianças. Mantém esta decisão durante o dia todo , recusa- .

s!! a obedecer a Melanie Klein a quem não considera mais como sua mãe.
E preciso pedir aos vizinhos que o mandem embora para que volte para
a casa à noite. Reconcilia-se com sua mãe e a recebe na manhã seguinte
com a pergunta: "Mamãe, por favor, como é que você veio ao mundo?"
~ ela~e Klein, que relata este incidente a Ferenczi, adota a seguinte inter-
P etaça?, que es~e lhe sugere: Erich estava muito perturbado em razão das
r~pressoes anteriores, pelas explicações de sua mãe· quisera escolher ·p ara
sr uma f ! tão desagradável e
tã ami'lia na qual nao
- se nasce de uma maneua
0
comum, mas sim de uma forma mais poética e refinada.
raçã;: 1i:? c~so, a volta à casa de sua ~ãe é acompanhada de uma libe-
do cresci n osidade. Durante algum tempo faz perguntas sobre detalhes
Num dia Jento do f~to e sobre o próprio mecanismo deste crescimento.
tência de ~~~uva, ~rrcunstâncias fortuitas levam a abrir a questão da exis-
tempo vai h s. Ench pergunta se Deus realmente sabe durante quanto
fazia a eh e over. Melanie Klein lhe responde "que não era Deus quem
uva mas
0 _ mecanismo;, li
que a chuva provmha . .
das nuvens e explicou-lhe todo
t~es : sobre a or/ dem , p. ~4). No dia seguinte ele repropõe as três ques-
disso a questão -~~: das crianças, seu crescimento e a chuva. Coloca além
numa Posição e. b as Deus realmente existe?" Melanie Klein vê-se então
a_seus filhos Enmt araçosa: é atéia e não deu nenhuma educação religiosa
giosa . · de retanto · d a epoca
, .
e a 1déia D , O ensmo comporta uma mstrução reli-
eus acha-se presente na educação das crianças. Arthur
:\ Klei11, o. '" '~dp de M~l;~ ~\ que não é pra~!çattte, m'ltitém
itJãseada.IJ.~ ~ncepçao . ~teísta .~ di~dlifé~, (Jd'i) · ..Utna cre· -.
tã~.;ttio ~o~titiuap~oblema até~~~ã(re €êl~ ,•toiliàvj;:~:~J~•J,t .
a este respeito. Após algum~,.~es,~tação, ~la re$p().ade-~ u /, 1na~o ., .
. e acr~sc~nta,.erp. r~~~ta ~-~ ~.d bj~r~~,B,~mi:·qt(Chriuitas~us não
tas nao est,ã o bem~.Pfí cla&\~otsas e ttiopodeín ·falar-co · > -~asadlll-
-te
peito. Tal 'tottyersailêlà·o~ ehii o atêbtar enteriltir Ute?~ente.a tts,.
t~ncia e percep~°,:atual·:·_~~uilo que ele vê, ~xisttdfi-~·· po~ç: ~re.~
ve tudo que extste~~9r e ,, \o ·a casa:·de'! suai1tia que nãoq .. dr~o Uln
u!
q~ele momento? S~J1:1~e i(a,~s.ma, <ij:(Íê'1ll lde q\Je ele?~ .~•Vet , ..
i,

nao ver esta casa, s1ttfâ$1~: ,. : ;, m'itral\ êiê~ ,? Em 8 ·,:i: . ;- ; ,Ela Pt>tle·Ou
:.J:8•
1

bre a origelll do Sol etó•. A 'noite · 'q'tiando··.·~5-·~~- ~- Íilteltoga


. ·10.
, . . ' ., ..,,u Y - ·... Pata casa e àiffes
que sua mãe possa colocá-lo a par.dos acontecitl1~t6s a:~ri~ . .
ta sua opinião sobre a existên~ia de·{Qeus.. 'Arthur Kle~ápoftle: 1110-
ti~ame1:te. Sua e~posa_ apare~é' n~:mo~~~!o::ê1~(qu,e·a com ~ -
d1scussao e o pai explica entao: "., .. mngu· érii ·amats
· ,• 1 ·
~.li,._. n'•.. . . eça uma
VIU. .uçUS, IDQ.S algu-
m_as pe,.,ssoas cree~ '!ue ~le extste, e ·outras, não. ~u actêffito; mas sua lile
,., • ,rt

nao cre na su~ extst~cia" (Idem, p. 35). Es~ respaít~ trán:qüffiia BriGi
que estava mmto ans10so no início da cem~ ..AP6_ $,-íé~ 'peri\llltàs·ek .
( 1
a opinião de sua mãe: Deus não existe, ·m~ -~i"'tl:Jrsas que.. podemos t er
existem, principalmente os bondes elétricos·~··t ·
Este dia parece ter marcado uma mudança deqsiva. anch adquiriu
um critério da existência dos objetos. ·
Pela primeira vez constata uma divergência de opinião entre seus pais
de realizar sua primeira escolha intelectual. Os objetivos de sua mãe
çam a ser alcançados: a autoridade dos pais é abalada-~nquanto cri-
de verdade e este referencial, não estando disponível, le:va-o a ques-
r a idéia de Deus através de um método de verificação tirado da re-
ão sobre sua experiência pessoal. Deste dia em diante, as interroga~
ções da criança se multiplicam em diferentes direções.
O material recolhido por Melanie Klein durante as seis seman~ se-
guintes classifica-se segundo dois eixos maiores: liberação e sublimaç~' da
uriosidade sexual e fortalecimento do senso de realidade correlaciol\~do
om o declínio do sentimento de onipotência. No que concerne ao pri~ei-
ro tópico, as questões relativas ao nascimento mud~ de natureza_, vers:
do agora sobre comparação entre o homem e o ammal. As questoes so..
a origem e o modo de formação das coisas aplicam-se a todos os órg:_os
O
e partes do corpo humano, aos animais, às plantas e suas part~s e aos
tos inanimados. A curiosidade da criança se volta para o mtenor ~o codes-
e seus conteúdos: urina, fezes. Certo dia, enquanto aj~da s~a ma~~ta a
cascar ervilhas, faz a seguinte observação que Melame Klem _s~ bUJil·
mencionar6-J: "... disse que faria uma lavagem na vagem, lhe abf1!1ª inter·
-bum e lhe tiraria os cocôs". Ele se interessa também pelo mecalll!~ os Si-
no .das coisas, pelo sistema de circulação de água, e jog?s mecam..co s~bre
m~eamente, emergem qu:8tões que testemu~am uma mterrog~~seIIlPre
ª ~<:llf~nça dos sexos: sua mae fora sempre menm~, ele ~esmo fo intelecto,
menmo?· Tui processo corresponde a uma dupla hbera?ao _de seu e,q,eriên·
em eKteosão e em profimdidade. Melanie_Kiein tem pela pnmerra vezª acidade
·eia-do.que havia postulado: a redução da repressão acarreta uma..cap centro
de sublimação. A descrição e explicação de tal conceituação estai:a0 n;de.
1
,,, suas primeiras teorias pessoais, formuladas três anos mais ª
.de
6Ó. Ela só irá interpretar fantasias deste tipo após 1925.
A GÉNESE E O SURGIMENTO DA VOCAÇÃO ... 21

No que concerne ao segundo tópico de desenvolvimento o senso de


realidade progri?e rapid~ente no menino. Sua adapta~ão prática
aprimora-se: admite n:cess1dades do comércio, interessa-se pelo dinheiro,
começa a recorrer rrma para que esta lhe leia os artigos da enciclopédia
sobre o diabo, a fim de formar uma opinião definitiva sobre a questão
de sua existência. Com muita dificuldade acaba por admitir que as crian-
ças dos vizinhos, que há algum tempo o maltratam e lhe contam menti-
ras, comportam-se mal com relação a ele. Desiste de lhes inventar descul-
pas e procura outros companheiros de jogos. Coloca à prova a onipotên-
cia de seus pais, reconhece progressivamente os limites de seu poder, en-
contrando, nisto, ora prazer (não são muito mais poderosos que ele), ora
desprazer (se eles não podem fazer certas coisas, conseqüentemente, ele
0
também não o pode). Aprende a discernir a diferença de sentido entre que-
rer e poder. Entrega.:.se a uma pesquisa sistemática sobre pontos que inte-
ressam especialmente à sua relação com os pais: o que lhe é permitido fa-
zer? Por quê'? Quais são seus deveres e seus direitos'? E o de seus pais'?
Exige que lhe dêem motivo a qualquer interdição que lhe seja feita e argu-
menta, com pertinência, quando lhe são impostas ordens sem uma razão
plausível. Ao final de ·seis semanas, é capaz de discriminar, ele mesmo,
na maior parte dos casos, as "estórias" que são belas, porém irreais, e
os "casos verdadeiros" que não são necessariamente belos, mas que real-
mente existem, e elabora uma noção geral destas duas categorias.
Melanie Klein esboça.uma explicação dinâmica e econôm,i.Qa.dos fe-
nômenos que c_QDStata (Ide_m, pp. 46-47J.;.. a evoJuç,ão_do_c..rulfli~ ntI.e a
curiosiçi-ª'º-~-se~yal ~ endência àJ:.epre_ssão.~__assumiu..u.m__pap.el.motor
nQ. conflito entt:e a_cr~nça..na.onip.otência..doS-pensamentos.-(inspii:ada pe-
lQ_.QI.incím_q__do_p.razer)...e....o_.prin.c.iRio_g~J.ealidade. É o encontro dos inte-
resses sexuais_e das ioteresses.Jntelectuais_qu.e.Jhe.s. permitiu tQ.DUJ.I.em-se
mais fortes do que o a~ go_à..ilusão_da-onipJltêJlcia. Na origem de todo
esse processo, a "tendência à repressão" foi vencida, pois seus referen-
ciais encontrados anteriormente na relação com seus pais foram retira-
dos: as explicações sobre o processo do nascimento e a divergência entre
os pais a respeito da existência de Deus enfraqueceram sua posição.
Tais são os fatos e as idéias que Melanie Klein expõe em sua primeira
comunicação. É muito bem recebida pelos psicanalistas de Budapest cita-
dos anteriormente, sendo então eleita membro da sociedade. Durante a
discussão, Anton von Freund lhe faz uma crítica e uma sugestão. \Reco-
nhece o caráter ~icanalítico de suas observações, mas lhe critica o fato
de que suas_interv:enções-llão- tiv.er.am-Denhum._c,an\!g_P-stÇfill_aliti@.;__el ·
não comunicou à criança nenhuma interpretação.1.Jeyando em_ç__Qllta...ape-
nas as questoes expressas ea ÇJ~-!.W.Sicmde CQnsciente_c,1ª._criJmça. Uma edu-
;~ção v~r_g.adeir-alnentênsfcânalítica.-deyerÍaleLalllfSma consideraçãn pelas
_questões inconscientes" e dar-lhes re!Q_Qstas. Naquele momento Mela-
nie Klein defende sua posição, mas posteriormente reconhecerá,·o caráter
f~ndamentado deste reparo. Em segundo lugar, von Freund (que está ·
sivelmente a par da identidade de Fritz e de Erich não dissimulad Vl-
Melanie Klein durante sua exposição) sugere que ela diferencie O a por
to da "análise" dos outros momentos e também de aspecto d mome_?-
entre .ª mãe e a criança, estabelecendo um lugar e uma h s a relaçao
est e ~1po de conversação, que compreenderia esclarecime ora fixos para
xu~hd~d~ e eventualmente interpretações. Tal conselh ntos sqbre a se-
sera reJe1tado de início e aceito posteriormente. o, como o anterior
'
2. 5. O ·Segundo Período da· Educação Psicanalftica

Após esta,prim~r,~f~se, ~rich, ~ontinu~ colo,caµdo inúmeras


tas e .desenvolve,ndo se,. se~~o ~r~t,~. durante dois ou três .ril'.e ·P.,er~ -
gress1vamente per~_ebe--~e qu~ r~p:, tê ,.mdefinidam~nte QÜestões se~. ~:Põ-
postas conhece há'il\~it~.jiM~l~, f ~ ein ,câ m, ça a S,uspeftar qu!';::.,~, -
vação de vo~ Freund·~,. v~~~g~irt ?Jt~re~r.~ss~o está longe de _ ser·elúài, :
da~ as questoes_ que ele n~o ~<llo9~ya e Jamais colocar~ sobfe:o i,ipel~
pai na c~ncepçao e sobr~ o fl1:~-,S.~~ufl P;etturba~~-pP inCOJ!i clentemellt~
e traduziam-se ~m qu~sto~s 'qtspr?~d,~::de spn,J•do a cons~ência. No
entanto, Melan1eKlein nao poe._ ai_nd~ em prágpa.~~I .co~:Selho, contentan-
do-se _apenas em º?servar .. As co~sas <!_egr~~~-s~ rapidamente: durante
os d~1s meses segu~ntes Ench qua~,'i nao C?l°.ç' nenhupia questão no\'a,
repetindo compulsivamente questoes estenqt1padas. Depois disto apare-
ce, sucessivamente, uma atitude de recollµmft\to 1
e inibição para o brin-
car. Erich dá sinais de aborrecimento mesino quafi•do está com sia mãe
não demonstra mais nenhum interesse pelas ·êstón as que ela lhe conta. Â
distração manifestada no início da educação analítica ao escutar as res-
postas que lhe eram dadas reaparece. Desinteressa'."se pelas outras crian-
ças sem saber o que fazer quando se encontra em sua companhia. Apre-
senta algumas dificuldades alimentares. Além disso, ~J"~~u o prazer de
brincar, até mesmo de cocheiro e de motorista, o que anteriormente po-
dia ocupá-lo durante horas. A mudança não constitui uma neur:ose carac-
terizada, o sono e a saúde da criança permanecem normais, m,as .Melanie
Klein tem aí sua primeira derrota e, sem dúvida, uma grande·d~cepção.
Acaba por concordar com a opinião de Anton von Freund, interpretan-
do, agora, a inibição generalizada de Erich como conseqüência do triun-
da tendência à repressão:

pois de haver feito muitas e diferentes perguntas em substituição daquelas


imira, no curso posterior do desenvolvimento ele tinha chegado ao P?nto
vitava completamente as perguntas e se recusava a ouvir estórias, p~1s es-
as podiam, inesperadamente, fornecer-lhe os esclarecimentos que nao de-
bter61.

avaliação do período consecutivo à primeira fase de esclarecimen-


ais deveria mudar: a emergência das guestões, seu núme,ro.,_sua
e profundidade eram o sinal de um recuo da repressãJ2-de--Uma
.~!!! iç~,!ós
-erJnç_üi_d-ª._çe_y.sura f _}?_r~q~gQJnc.Qn.w.ent~~~~
_al da ~E~!~fãQ _cJ.~t~!l!Y.~- E preciso portanto reto~ar pela ões
a educação sexual da criança, dando-lhe, agora, 1nform~Ç,..
. Frente a isto, Melanie Klein sobrepuja suas próprias re~tSíe?-
e se expressavam até então por uma filosofia otimista e pela i~u_sao
e que explicações, no fim de contas, muito superficiais, seriam suficien-
tes .. Este _aprofundament9.J, tanto pessoal quanto teórico, v~ acar~tar, u~
e~guecnnento _nos se»~ ~-º-~~§._Q~_.P!:QÇ~,d,et,.R"nc.Qt1tra,rá o brinc~faas 1~
tasia, ®e estarao..ultenormente...no_centr.g_de~.s.u..ª_t.~_Ç !li~~çdo '·';
a yma ab~rdagein ..que. se tornªr4._Htm.l;>~p;i caract~t(~ti~-º-~~~~!l- º!eto e·
e ~e consiste em ir mui_!~~~!~ da,~_p~eo~E~~Qes manifesJas...da-cnança.
23
A GÊNESE E O SURGIMENTO DA VOCAÇÃO ...

. certo dia, o menino pergunta como crescem as plantas a partir


terior~entes e sua mãe explica-lhe o processo de fecundação: a criança

.f
d8.:i se cuta suas explicações e a interrompe rapidamente. Em outra opor-
fll de menciona que para que uma galinha ponha ovos, é necessário
tuJll/m ~m galo, mas logo abandona o assunto e sua atitude geral per-
taill ~e inibida em todos os domínios. A liberação sobrevém bruscamen-
Jllaneós alguns dias, quando Melaine Klein, dando-lhe um bombom, con-
te ':::e uma estória que lhe agrada muito: o bombom, esperava-o há muito
ta- po e a aventura do b~mbom dá lugar a um relato que encanta Erich
teill
depois a outro. A partrr. deste momento a cnança
. conta espont aneament e
e tórias fantásticas, cada vez mais ricas e longas com uma fluência ex-
traordinária. ~e1a•KI'
es me em começa_ e~ta~ - a comumcar-
. 1he prud ente~en-
te interpretaçoes para romper as res1stenc1as, que por vezes mterromp1am
as narrativas, e descobre assim a função dinâmica da interpretação, que
assumirá ulteriormente uma considerável importância em sua técnica psi-
canalítica. Após algum tempo, reaparecem também as questões referen-
tes à origem e fabricação das coisas.
Simultaneamente, Erich restabelece contatos com outras crianças e
recomeça a brincar sozinho ou em companhia. As pulsões edipianas são
agora claramente reconhecíveis em suas fantasias e·suas brincadeiras: nas
fantasias, duas vacas caminham juntas, sendo que uma pula sobre o dor-
so da outra, e monta em cima dela; certa manhã, diz à sua mãe: ''Eu vou
subir em cima de você; você é uma montanha e eu vou escalar você". Ex-
prime o desejo de ver sua mãe nua e de ver "a imagem que está em seu
estômago" ou seja, o lugar onde se encontrava antes de nascer. Nas brin-
cadeiras duas peças de um jogo de xadrez são um soldado e um rei. O
soldado injuria o rei, que o prende e ele morre; mas volta à vida, prome-
tendo não mais cometer o mesmo crime e desta vez é apenas detido. Duas
figurinhas representando cachorros são seu pai e ele, um é bonito(ele),
o outro é sujo(seu pai). Esta manifestação da vida de fantasia edipiana
é acompanhada de uma mudança geral. A criança está cada vez mais ale-
gre e loquaz. Em muito pouco tempo e com pouca ajuda aprende a ler
e com tal avidez " ...que parece quase precoce" (Idem, p. 65). Quando
se rememora a preocupação manifestada por Melanie Klein diante dos su-
p~stos atrasos de seu filho, imagina-se facilmente que tenha ficado satis-
feita com esta evolução. ·
O episódio decisivo desta segunda fase da educação analítica é uma
~o~versa realizada após o reaparecimento, nas brincadeiras e fantasias de
nc~, da teoria sexual infantil da criança na fase anal, segundo a qual ");
as cna~ças são feitas de alimentos e são idênticas às fezes: sentado em
~~~pemc? oco~ria-lhe dizer que suas ''cacas'' eram crianças malvadas que
m quenam Vlf ou ameaçar bater nelas, porque eram muito duras e de-
oravam para chegar.
"cac;~~to d~a, Erich, sentado em seu penico, explica à sua mãe que as
des s 5 ubir~m ~orrendo para a varanda ( = estômago) e não quere
ess::r para o Jardim ( ~ penico). Melanie Klein interpreta: "Então !"
rea e as tuas cnanças que nascem no teu estômago?" e, como a cri' sao
ent~ :avoravelmente, prossegue seus esclarecimentos sobre a dit ança
pa~
0uma e.
f~' e cnanças, relembra as explicações dadas sobre O at0 erença
0 es~er~a, dos óvulos. Erich exprime o desejo de" sexual,

fazer cnança e f e1ta por dentro desse jeito" e logo em seg . ver como
cada h:ma. Melanie Klein comunica-lhe, então, a interdiçãUI 0 da de lhe
mem tem apenas uma mulher, ela é mulher do pai d 8 incesto·
e nch, quan~
L.4 MELANIF T(LEIN I

d~. ele for grande"1 e~3: e~t~@\Y~füâ-•e. ·el~•ir,á·:iSê, ~.~ -t ,JJ'Ill uma .-bel·-,; ·.__ .
, E;ich está prestes a'>·~orar m,ae.~-lt-~·<tüe~-1apêsar dis~:J~~-
ra com ele .e em segtll~a fa~ uma~ .,,J,_·:~-d:eJta . ;• tas ,s0. ~~u~._b, ..,i.:,..,cr- !9_,··Y\tt;.
esc
66:._6~). APÓ;St''ª:•-v;: ~ía
, :·, I L ,· ,
/ r·,'"' . ~•rn.....
, ;~.+J.f, .... U,,
dp feto (Ide";, pp. a c -;~simil ~t:nto
ment~, em mvel conscient~., a\ i~-~ ~d~. ~~1, ~,p~~ ·rtçebid~~bv.a~
nuncia, em gra1:de parte, à t,eori,a.Ffa .~ n~!~f~~,tlnteressa;.~e muito ~e-
nos por seu_ estomago, ~o qu_a:l_falav,.~~.µi,tb atfventãf. NU ,4q; ·"~
,seguem, a vida de fantasia edip)fiDa é ç'<;tª,~Yt-·mlia élàta e sua·mlV~.se
1

terpreta num es~il~ já ''kl~iniano' :A~~iqi;'é Êriok,"


'.

abord~ uma estona comphcada onde .aparecem um•~~de~,m.Peqifjn~


a~~-~,-~:--
automovel que entr~ n~ bonde, sendQ, ~ue o pequ~Q rÔ;f.Jp •tre o •lbln-
de e~ bo?de. Sua ~ae mterpre:a: "Exp~c_oór~o me~~o·qtte dgran~u-
tomovel e seu papai, o bonde e a mamae ·e -,o peqµeno automóvel é efe
mesmo, que se _colocou entre o papai e a manÍãe, porque gq)fari'I lffllit~
de afastar o pai completamente, para ficar sozinho com 1a f:tt~âe; f~
com ela o que somente o papai está autorizado a ·(azer'' 62 • Tal iítterpre-
tação provoca, após uma leve hesitação, a retomada do relato. Novos carros
entr'a m em cena, dois motoristas se agridem, sendo· que um.,deles -é seu
, avô. Após ·um silêncio e um olhar inquieto dirigido à mãe, desenvolve .0
relato.da briga. Melanie Klein pergunta-lhe, então, quem é-:o adversário ..
O menino responde imediatamente: ''Eu'', e transformasuaaarrativaem
aventuras guerreiras cada vez mais complicadas. À medida que· as fanta-
sias e brincadeiras deste tipo multiplicam-se, sua mãe diminui o número
interpretações: considera que ''uma parte destes complexos 'tom~
sciente ou, no mínimo, pré-consciente" e que isto era suficiente .., ..
Esta segunda fase de intervenção analítica durou aproximadameJ;JJ1'
s meses, a partir do episódio do bombom que o haviéJ. desencadeadij~
m.
ão é demais insistir sobre a importância que ela nos parece ter no apt~f
undamento da relação com Erich e para o futuro da técnica psicanalíticá
o brincar.
1
, • Duas transfarmações lo_çali~ª!l):::_~~IJ.~Stª-f as~ ºma diz respeJ!,<!..~~ó-
·a atitu4~.d~Melanie Klçin:!}lede melhQr.a profundidadeqa repressao
___ as fantasias inconscientes. Sobretudo, _par,ec.e;nos..q u e _ a ~ s
obj'et1Yns:infc[á1s~<5ciêsên;olvimento d.a,c.uriosidade intelect~ª_LQ;~ªJ!e
s~r PQntOJit!IDQnJial, tudo-se i)ã"~;a como se ela ·se
Oístiindasse do seu
d~seio narcísico de fazer d~.Erich.1una.n0Ya.edição. de Emmanuel, um ser
8
~ri9.Ln.o_pJaruuntelectual. Ela se viu às voltas com um malogro que
levou_a compreender, posteriormente o alcance das observações de An-
ton vbe-Freund. Tem-se a impressão 'quando se comparam os dois mo-
~entos~ intervenção, que tlo primei;o momento a abordagem do i~c?ns-
~nte é apel!as .!!.IJLtp-eio -~..!~D:'içp __q_e_ym_ :tu:Q,ieto....de._neilagogia ~ ttst~~
~ont~xto de 11ma..1deologia. mº-~!Q m:óxhn.a 4.-ª_A.iálflarnng....a..filos.~fl._
,1

'
,~-cion~ sta ~as lu_zes._d_Q.espJ!!~9.__ crí!!_ço, _do. livr~_pen~e.ut.o.,_ d~ reJet
?:°
!/~;f ª
~\ 3:11tond ade e...das.r.eligiões. Na prática real de Melanie Klein, esta
~!~rve de.,-atjonalização ao investimento narcísico em Erich.\~
\ 4°.~
a'<:f segun
, SW1 o·plano 0
mento, pe~ c~~trário, as~rspectivas eda ó icas as .
apa -- - -- . • - ro-
e> c.lamadastn • .. recem con:i--;-uII@_conotacao menos ideológ1ca e s.~~ P
- quá d · •-~ · um tom menos m1btante. Por este fato podem lograr exito e,
n o-suamãem d d . - - ' · ar
· :~ u a e atitude, Erich pode, então, não apenas bnnc

62. Idem, 68-69.


25

. ·nar mas aprender a ler em algumas semanas, dando a impressa~o


1magi
e recocidade.1 ' É nes t a r~spos t a d~.Erºich que resiqe
· a 'segunda
·' ti-ansfor-j
de:ão: agora que sua mae renunciou parêiaiment~ a pro1etar sobre ele
IIl~~ císico, ek.no~e eXl)~sar-se segunclo_seus..meios, o bri.ucar
~ tasia...Enc_eta-se entao_, durante alg_umas s~µianas, uma extraordi-
nária comunica?alaodde Éfadi~tasias entre a mae e a cnança, que permite UJDa
elucidação parei o po, no _momento e,:µ qu~ el~ atin~e su~ intensi-
ade máxiIJla. 1~ §~ .~ríod_o de ?l)iS meses traz à Mel~e Klem a compreen-
da eauivalenoa do bnncar, do sonho e da fantasia enquanto mariifes-
s~,,,...;-~ ..1-0Jn_ÇQil§.Çle.ll~--
· além de proporci9nar-
. lh,e a pnmeira
· experiência
ºdaç~ -
da,.SeQiiênda:.-eluCI ';les=~~apar~te-retwnada do brincar,.revelan~
\ t.w,<>-'t;)....UJ
/j--1\
9 d.QJI.u,.e_a_explicaçãa f?J ace_ita 1nconsc~entemente, ,se,qüência gye ela a,wi-
cará mais tarde à teona da mterpretaçao. Este penodo nos parece marcar
~unda etap,~ da "decolagem" kleinian~ que preludia elaboraçã~ da- a
quilo que chamaremos as teorias de 192363). ··

Este período tão intensamente rico é interrompido por circunstâncias


ex~ernas. Melanie Klein adoece por·dois meses, perto do final do ano de
1919, e não pode se dedicar tanto a Erich. Durante a doença da mãe, a
criança fica extremamente ansiosa. Tem dificuldades·eni adormecer. Está
mais contida, triste, brinca muito menos, manifesta um·zelo excessivo em
aprender a ler, o que Melanie Klein é doravamente capaz de reconhecer
como compulsivo, e desenvolve uma leve fobia com relação às crianças
encontradas na rua. Quando a mãe se restabelece~ seu primeiro cuidado
é lutar contra as manifestaçÕf!S de ansi~dade do seu filho.

2.6. O Terceiro Período e a Primeira Análise ·

Consiste num período de seis semanas, que Melanie Klein qualifica


®...neriõdo de "análise" em oposição às outras fase$ que são deµomina-
das "educação psicanalítica". Pareée ser neste p~ríodo que ela introduz
os dispositivos técnicos sugeridos por, ~ton von Freund: ''~eserv!!i uma
certa hora - mesmo que devesse o~asiqnalmente ser mudada - para a
análise, e essa hora foi respejtada., embora eu es_tivesse praticamente o dia
tod_o com a criança" (Idem, Jt
86). Q , material muda de _nat'4reza; es~á
'-? ~ ceíitrado DOS sonhos e fª"_Jasià) e muito menos no bnncat- Melanie
i
de
Klein procura interpretar os sonhos Erich seaµndq o método clássico
d_escrito por_Eww; recqrte dos etemeritos do conteúdo manifesto, asso-
ciaç~es de idéias..a.partir de cada nm deles. Chocá-:se com a ~fic~ldade
prevista por Freud: a criança não está ,apta .para a livre-assoe1açao sobf
pergunta. ~enuncia, então, parcialmente à exploracão sistemática do1s0-
1:1_hos e fundamenta suas.interpretações na -cnmparação dos ~oDAQs entre
81 e no simbolismo . , ··
-- .
. Esta fase da "análise" faz aparerer cc;,mponent~s homossexuais pro-
vementes do complexo de Édipo negativo do menino; Um de seus sonhos
de. ans1~dade,
· ·
no qual é perseguido por homens armados com bas-.qes, t,~ f~-
zis e baionetas propicia uma interpretação acompanhada de novas _eluci-
daçoes.. quando' Melanie Klein explica-lhe que os bastoes, - os fu~s · etc ...
repr. esentam o grande pênis de seu pai, 0 qual deseJa,
· porem ' teme, a cnança
·
0 bJet
a que "as armas eram ·duras , enquanto o p1p1· · era mo Ie" , o que per-

63. Cf. Cap. 2.


/

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