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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 23 de agosto de 2018

(recurso de uma sentença do tribunal administrativo e fiscal do Porto)

[…]
FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
A) O Autor encontra-se alistado na Polícia de Segurança Pública, desde 04 de
março de 1985, encontrando-se, desde 28 de dezembro de 2010, colocado no
posto de Chefe Principal [cf. nota de assentos de fls. 16 do processo
administrativo];
[…]

DE DIREITO
Está posta em causa a sentença que anulou o despacho proferido pelo Senhor
Ministro da Administração Interna que, em 14 de novembro de 2017, negou
provimento ao recurso hierárquico interposto pelo Autor da pena de suspensão
de 240 (duzentos e quarenta) dias que lhe havia sido aplicada por despacho do
Senhor Director Nacional da Polícia de Segurança Pública, proferido em 11 de
julho de 2017 […]
Na óptica do Recorrente a sentença padece de erro de julgamento de direito.
Assiste-lhe parcialmente razão.
Antes, atente-se no discurso jurídico fundamentador da sentença:
Eleitos os factos com relevo para apreciar o mérito da presente ação, cumpre
então averiguar se assiste razão ao Autor nas causas de invalidade assacadas
ao ato impugnado nos autos.
Por conseguinte, impera indagar se o despacho proferido pelo Ministro da
Administração Interna, de 14 de novembro de 2017, que negou provimento ao
recurso hierárquico interposto pelo Autor da pena disciplinar de 240 dias de
suspensão que lhe fora aplicada por despacho de 11 de julho de 2017 do
Diretor Nacional da PSP, se encontra inquinado de ilegalidade interna, seja por
eventual prescrição do procedimento disciplinar, seja por alegada violação dos
princípios da proporcionalidade, justiça e imparcialidade.
Vejamo-las especificadamente.
*
Da alegada prescrição do procedimento disciplinar
[…..]

*
Da alegada violação dos princípios da proporcionalidade, da justiça e da
imparcialidade
Resta-nos, pois, a questão de saber se sanção aplicada é desproporcionada e
inadequada, pois é este verdadeiramente o escopo da alegação do Autor.
Neste domínio, referir que tem constituído entendimento jurisprudencial
constante o de que se ao tribunal é possível analisar da existência material dos
factos imputados ao arguido e averiguar se os mesmos constituem infrações
disciplinares, já lhe não cabe apreciar a medida concreta da pena salvo se for
invocado, nomeadamente, o desvio de poder, o erro sobre os pressupostos, o
“erro grosseiro e manifesto”, a violação dos princípios da justiça e da
proporcionalidade, porquanto é uma tarefa da Administração que se insere na
chamada “discricionariedade […] administrativa” [cfr. entre outros e nos mais
recentes, Acs. do STA de 18.01.2000 - Proc. n.º 038605, de 17.05.2001 (Pleno)
- Proc. n.º 040528, de 07.02.2002 - Proc. n.º 048149, de 07.02.2004 - Proc. n.º
048149, de 12.10.2004 - Proc. n.º 0692/04, de 03.11.2004 - Proc. n.º
0329/04, de 31.05.2005 - Proc. n.º 02036/03, de 16.02.2006 - Proc. n.º
0412/05, de 21.03.2006 (Pleno) - Proc. n.º 020/03, de 08.05.2007 - Proc. n.º
01085/06, de 29.03.2007 (Pleno) - Proc. n.º 0412/05, de 02.07.2009 - Proc.
n.º 0639/07, de 07.09.2010 - Proc. n.º 01012/09 in: «www.dgsi.pt/jsta» e
«www.dre.pt/acordaos»].
Atente-se a este propósito na argumentação expendida no Acórdão do S.T.A. de
03.11.2004 [Proc. n.º 0329/04 supra citado], que aqui se acolhe, no sentido de
que é “… verdade, em primeiro lugar, que no domínio da fixação concreta de
uma sanção disciplinar, variável (com um limite máximo e um limite mínimo)
…, a Administração age no exercício do poder discricionário. (…) É vinculada,
por exemplo, a verificação dos factos de que depende a aplicação do critério da
medida e graduação das penas como é vinculada a verificação dos requisitos e
os limites (…). É vinculada a existência dos factos e a sua qualificação jurídica
como infração disciplinar. É vinculada também a verificação dos requisitos e a
duração da suspensão das penas disciplinares. (…) Porém a graduação da pena
… - questão concretamente levantada nestes autos - cabe no poder
discricionário (discricionariedade imprópria, ou justiça burocrática) da
Administração. (…) É verdade, …, que o exercício de tal poder só pode ser
sindicado, pelos vícios típicos de tal exercício. É certo que a fiscalização
contenciosa da atividade jurisdicional, devido ao aumento do número de
vinculações legais que a jurisprudência e a doutrina têm assinalado, tem vindo
também a aumentar. É o caso da (i) admissão do erro de facto, (ii) da existência
ou inexistência de pressupostos de facto, (iii) da fundamentação, (iii) da
sujeição aos princípios gerais de direito – audiência prévia, igualdade,
proporcionalidade, justiça e imparcialidade. (…) Em todos estes casos, porém,
não se põe em causa o núcleo de autonomia ou de reserva administrativa
insindicável jurisdicionalmente, uma vez que previamente são definidas as
vinculações legais. Como se disse, …, seguindo jurisprudência uniforme «os
tribunais não podem substituir-se à Administração na fixação concreta da
pena, pelo que a graduação da pena disciplinar, não sendo posta em causa a
qualificação jurídico-disciplinar das infrações, não é contenciosamente
sindicável, salvo erro grosseiro ou manifesto, ou seja, se a medida da pena for
ostensivamente desproporcionada, uma vez que tal atividade se insere na
chamada atividade discricionária da Administração». Erro grosseiro (..) que
pode consistir na manifesta desproporção entre a sanção e a falta cometida,
com violação clara do princípio da proporcionalidade (art. 266.º, n.º 2 da CRP),
princípio que funciona como limite intrínseco ao exercício de poderes
discricionários …”.
Ora, em aplicação deste critério, em face do conjunto da factualidade apurada
nos autos, é certamente possível detetar na determinação da pena disciplinar
visada nos autos a existência de uma grave e ostensiva disfunção capaz de
justificar a intervenção corretora do tribunal.
Na verdade, e explicitando pormenorizadamente este nosso juízo, o Autor foi
punido com a pena disciplinar de suspensão de atividade graduada em 240
dias, correspondente ao seu limite máximo.
Isto porque fez publicar na sua página pessoal do Facebook de uma cópia de
um louvor [que havia sido atribuído ao Agente M… do efetivo da Portaria das
Instalações Policiais da Bela Vista, do Núcleo de Apoio Geral do Comando
Metropolitano do Porto], acompanhada do seguinte título “Nunca esperei ver
isto em toda a minha carreira. Espero que todos os verdadeiros polícias
comentem de sua justiça” e de uma fotografia de meio corpo de um indivíduo
[não identificado] com uma pistola de silicone à cintura [publicação que viria a
ser comentada por outros elementos policiais].
Os serviços do Réu, por intermédio do respetivo instrutor, consideraram [e isso
não é aqui sindicado] que a conduta acabada de descrever violava o princípio
fundamental do pessoal com funções policiais [“o acatamento das leis e o
pontual e integral cumprimento das determinações que lhe sejam dadas em
matéria de serviço”], e, bem assim, os deveres de correção [artigo 13.º, n.º 1 e
2, alínea d), do RDPSP] e de aprumo [artigo 16.º, n.º 1 e 2, alínea f), do RDPSP].
Num primeiro momento, o instrutor deduziu acusação contra o Autor, aí se
defendendo que a infração cometida era passível de pena de suspensão, na
medida em que revelava acentuado desinteresse pelo cumprimento de deveres
profissionais e a afetar gravemente a dignidade e o prestígio profissional [artigo
25.º, n.º 1, alínea d), e 46.º do RDPSP].
Todavia, o Superintendente-Chefe do Núcleo de Deontologia e Disciplina do
Comando Metropolitano, entendendo que o Autor “não revelou ser merecedor
da confiança que os cidadãos e a Administração nele depositaram” e que era
hora de esta “se ver livre de quem se revelou pela sua conduta, não merecer
pertencer-lhe”, viria a determinar a anulação da acusação deduzida e a sua
substituição por outra que qualificasse a infração disciplinar ora descrita como
sendo passível de pena de aposentação compulsiva ou demissão [artigos 47.º a
49.º do RDPSP].
É assim que, num segundo momento, pese embora o instrutor do
procedimento haja deduzido [nova] acusação, e, em conformidade, proposto a
aplicação de uma pena de aposentação compulsiva ou demissão do Autor, o
Diretor Nacional da Polícia de Segurança Pública viria a discordar do referido
enquadramento [por entender que a infração em questão, pela sua gravidade,
não inviabilizava a manutenção da relação funcional], assim determinando a
aplicação de uma pena disciplinar [não expulsiva] de suspensão, pelo seu
limite máximo, ou seja, de 240 [duzentos e quarenta] dias [artigo 25.º, n.º 1,
alínea e) e 46.º, ambos do RDPSP].
Todavia, esta pena, assim determinada, carece de deficiente ponderação das
circunstâncias agravantes e atenuantes da conduta do Autor.
Na verdade, como se refere na decisão proferida pelo Diretor Nacional da PSP
[aqui mediatamente impugnada], militam contra o Autor 2 [duas]
circunstâncias agravantes [artigo 53.º, n.º 1, alíneas d) e f), do RDPSP], e a
favor do Autor 3 [três] circunstâncias atenuantes da responsabilidade
disciplinar [artigo 52.º, n.º 1, alíneas e), g) e h), do RDPSP, respetivamente]:
(1) A confissão espontânea dos factos [cf. auto de interrogatório de arguido a
fls. 24 e decisão de fls. 129, ambos do processo administrativo];
(2) O facto de lhe terem sido atribuídos vários louvores [cf. nota de assentos de
fls. 16 a 21 do processo administrativo];
(3) A boa informação de serviço do superior de que depende o Autor [cf. autos
de inquirição de testemunhas a fls. 60, 63, 64, 65, 110, 111 todas do processo
administrativo];
Ora, se assim é, ou seja, se a favor do Autor militam 3 [três] circunstâncias
atenuantes versus 2 [duas] circunstâncias agravantes, torna-se, desde logo,
manifesto que, sendo o número daquelas superior a estas, a medida da pena
de suspensão jamais poderia ter sido fixada no seu limite máximo [cuja
moldura se encontra prevista de “121 a 240 dias” – artigo 25.º, n.º 1, alínea e),
do RDPSP], mas sim, quando muito, perto daquele limite.
Caso contrário, de que valeria, por exemplo, a confissão espontânea?
Acresce que não se pode conceber que o objetivo [geral] corretivo da dignidade e
prestígio da função policial imponha, face ao conteúdo de uma
publicação/comentário como a que se encontra em causa nos autos, uma
suspensão de 240 [duzentos e quarenta dias] do respetivo infrator, sobretudo
se se tiver em conta que, contrariamente ao Autor, os outros dois agentes
policiais que, aproveitando aquela publicação para proferir comentários graves
e obscenos, foram punidos, de forma bem mais modesta, ou seja, com uma
pena de suspensão de 90 [noventa dias].
É verdade que, conforme defende o Réu, esta não é, naturalmente, uma
circunstância dotada de relevância atenuante da responsabilidade disciplinar
do Autor.
No entanto, no caso concreto, essa mesma factualidade acaba por se revelar
como assintomática, indiciária, da efetiva desproporcionalidade da pena de
suspensão máxima que lhe fora aplicada.
Para o efeito, basta comparar-se o teor da publicação efetuada pelo Autor [cuja
censura ético-jurídica, no plano disciplinar, claro está, não deve ser
menosprezada], com o conteúdo [“desprimoroso”] dos comentários que nela
foram formulados por outros cidadãos [v.g. pelos agentes policiais punidos com
a pena de suspensão de noventa dias a fls. 6, 7 e 8 do processo
administrativo].
Não se descortinam, por isso, nem o Réu tenta sequer adiantar, quais os
motivos que terão levado a suspender o Autor por um período correspondente a
quase o triplo [240-90=150 dias] daquele a que foram suspensos aqueles
agentes policiais.
E nem se utilize o argumento ad terrorem, segundo o qual o Autor já terá tido a
“sorte” [“não tendo que se queixar”, cf. artigo 54.º da Contestação], em ver-lhe
afastada a aplicação de uma pena expulsiva [aposentação compulsiva ou
demissão], uma vez que, como é bom de ver, tal decisão, para além de se ter
apresentado como estritamente vinculada [por se ter concluído não estar
preenchido o requisito da inviabilidade de manutenção do vínculo funcional],
não tem naturalmente a virtualidade de “apagar” o caráter desproporcional ou
excessivo da pena de suspensão concretamente fixada no seu limite máximo
[240 dias].
Se é certo que se concebe que a Polícia de Segurança Pública terá querido “dar
o exemplo” para o interior da corporação, não menos o é que a pena de
suspensão concretamente aplicada ao Autor pelo período máximo de 240
[duzentos e quarenta dias], embora adequada e necessária à gravidade dos
factos, mostra-se, quanto à sua medida, manifestamente desproporcionada,
excessiva, face ao conjunto das circunstâncias que rodearam a prática da
descrita infração [artigos 18.º, n.º 2, 19.º, n.º 4 da CRP, e 07.º, n.º 2, do CPA].
Pelo o que ficou dito, facilmente se percebe que a pena de suspensão de
atividade graduada em 240 dias, atento o supra exposto, não é justa,
adequada, necessária, equilibrada ou proporcional.
Tal é quanto basta para concluir-se, sem necessidade de discussão adicional,
que se mostra comprometida, irremediavelmente, a decisão punitiva aplicada.
Conclui-se, portanto, por tudo o quanto ficou exposto, que ato impugnado
enferma de vicio de violação de lei em análise, por erro nos pressupostos de
direito, e, bem assim, por excesso da medida da pena disciplinar aplicada ao
Autor.
Mercê de tudo o quanto ficou exposto, procederá integralmente o peticionado.
Assim se decidirá.

[…]
É também pacífico que o poder administrativo disciplinar encerra alguma
discricionariedade administrativa, não deixando, a este propósito, de salientar
que a medida da pena disciplinar se inscreve no poder discricionário da
entidade com competência disciplinar que, de acordo com a doutrina e a
jurisprudência uniforme só é sindicável, em caso de erro grosseiro ou palmar -
neste sentido, entre muitos outros, cfr. o Acórdão do STA de 22/06/2010, no
proc.° 0725/08, donde se extrai: A actuação da Administração, no exercício dos
respectivos poderes disciplinares, em sede de graduação da culpa e de
determinação da medida concreta da pena, não é judicialmente sindicável,
salvo se os critérios de graduação, que utilizou, ou o resultado que atingiu,
forem grosseiros ou ostensivamente inadmissíveis.
Trata-se de um poder-dever conferido pela lei a um órgão administrativo para
que este escolha, de entre uma série limitada ou ilimitada de comportamentos
possíveis, aquele que lhe pareça em concreto mais adequado à satisfação da
necessidade pública específica prevista na lei.
É pacífico que a fiscalização jurisdicional da discricionariedade administrativa
exerce-se quanto ao cumprimento dos princípios constitucionais e gerais da
actividade administrativa e contra o erro grosseiro de facto ou de direito.
E, in casu, tal como sentenciado, resultaram ofendidos aqueles princípios e
existe erro grosseiro.
Efectivamente, não se podendo pôr em causa o núcleo de autonomia ou de
reserva administrativa, insindicável jurisdicionalmente, uma vez que
previamente são definidas as vinculações legais, certo é que, como decidido
pelo Tribunal a quo, em face do conjunto da factualidade apurada nos autos, é
possível detectar na determinação da pena disciplinar visada nos autos a
existência de uma grave e ostensiva disfunção susceptível de justificar a
intervenção correctora do tribunal.
Na verdade, o Autor foi punido com a pena disciplinar de suspensão de
actividade graduada em 240 dias, correspondente ao seu limite máximo.
Isto porque fez publicar na sua página pessoal do Facebook uma cópia de um
louvor [que havia sido atribuído ao Agente M… do efetivo da Portaria das
Instalações Policiais da Bela Vista, do Núcleo de Apoio Geral do Comando
Metropolitano do Porto], acompanhada do seguinte título “Nunca esperei ver
isto em toda a minha carreira. Espero que todos os verdadeiros polícias
comentem de sua justiça” e de uma fotografia de meio corpo de um indivíduo
[não identificado] com uma pistola de silicone à cintura [publicação que viria a
ser comentada por outros elementos policiais].
Os serviços do Réu, aqui Recorrente, por intermédio do respectivo instrutor,
consideraram [e isso não é aqui sindicado] que a conduta acabada de descrever
violava o princípio fundamental do pessoal com funções policiais [“o
acatamento das leis e o pontual e integral cumprimento das determinações que
lhe sejam dadas em matéria de serviço”], e, bem assim, os deveres de correcção
[artigo 13.º, n.º 1 e 2, alínea d), do RDPSP] e de aprumo [artigo 16.º, n.º 1 e 2,
alínea f), do RDPSP].
Num primeiro momento, o instrutor deduziu acusação contra o Autor, aí se
defendendo que a infração cometida era passível de pena de suspensão, na
medida em que revelava acentuado desinteresse pelo cumprimento de deveres
profissionais e a afetar gravemente a dignidade e o prestígio profissional [artigo
25.º, n.º 1, alínea d), e 46.º do RDPSP].
Todavia, o Superintendente-Chefe do Núcleo de Deontologia e Disciplina do
Comando Metropolitano, entendendo que o Autor “não revelou ser merecedor
da confiança que os cidadãos e a Administração nele depositaram” e que era
hora de esta “se ver livre de quem se revelou pela sua conduta, não merecer
pertencer-lhe”, viria a determinar a anulação da acusação deduzida e a sua
substituição por outra que qualificasse a infração disciplinar ora descrita como
sendo passível de pena de aposentação compulsiva ou demissão [artigos 47.º a
49.º do RDPSP].
É assim que, num segundo momento, pese embora o instrutor do
procedimento haja deduzido [nova] acusação, e, em conformidade, proposto a
aplicação de uma pena de aposentação compulsiva ou demissão do Autor, o
Diretor Nacional da Polícia de Segurança Pública viria a discordar do referido
enquadramento [por entender que a infração em questão, pela sua gravidade,
não inviabilizava a manutenção da relação funcional], assim determinando a
aplicação de uma pena disciplinar [não expulsiva] de suspensão, pelo seu
limite máximo, ou seja, de 240 [duzentos e quarenta] dias [artigo 25.º, n.º 1,
alínea e) e 46.º, ambos do RDPSP].
Sucede que esta pena, assim determinada, ostenta deficiente ponderação das
circunstâncias agravantes e atenuantes da conduta do Autor.
Como se refere na decisão proferida pelo Director Nacional da PSP [aqui
mediatamente impugnada], militam contra o Autor 2 [duas] circunstâncias
agravantes [artigo 53.º, n.º 1, alíneas d) e f), do RDPSP], e a favor do Autor 3
[três] circunstâncias atenuantes da responsabilidade disciplinar [artigo 52.º,
n.º 1, alíneas e), g) e h), do RDPSP, respetivamente]:
(1)A confissão espontânea dos factos [cf. auto de interrogatório de arguido a fls.
24 e decisão de fls. 129, ambos do processo administrativo];
(2)O facto de lhe terem sido atribuídos vários louvores [cf. nota de assentos de
fls. 16 a 21 do processo administrativo];
(3)A boa informação de serviço do superior de que depende o Autor [cf. autos
de inquirição de testemunhas a fls. 60, 63, 64, 65, 110, 111 todas do processo
administrativo];
Ora, se assim é, ou seja, se a favor do Autor militam 3 [três] circunstâncias
atenuantes versus 2 [duas] circunstâncias agravantes, torna-se, desde logo,
manifesto que, sendo o número daquelas superior a estas, a medida da pena
de suspensão jamais poderia ter sido fixada no seu limite máximo [cuja
moldura se encontra prevista de “121 a 240 dias” - artigo 25.º, n.º 1, alínea e),
do RDPSP], mas sim, quando muito, perto daquele limite.
Caso contrário, de que valeria, por exemplo, a confissão espontânea?
Acresce que não se pode conceber que o objetivo [geral] corretivo da dignidade e
prestígio da função policial imponha, face ao conteúdo de uma
publicação/comentário como a que se encontra em causa nos autos, uma
suspensão de 240 [duzentos e quarenta dias] do respetivo infrator, sobretudo
se se tiver em conta que, contrariamente ao Autor, os outros dois agentes
policiais que, aproveitando aquela publicação para proferir comentários graves
e obscenos, foram punidos, de forma bem mais modesta, ou seja, com uma
pena de suspensão de 90 [noventa dias].
É verdade que, conforme defende o Réu, esta não é, naturalmente, uma
circunstância dotada de relevância atenuante da responsabilidade disciplinar
do Autor.
No entanto, no caso concreto, essa mesma factualidade acaba por se revelar
como assintomática, indiciária, da efetiva desproporcionalidade da pena de
suspensão máxima que lhe fora aplicada.
Para o efeito, basta comparar-se o teor da publicação efetuada pelo Autor [cuja
censura ético-jurídica, no plano disciplinar, claro está, não deve ser
menosprezada], com o conteúdo [“desprimoroso”] dos comentários que nela
foram formulados por outros cidadãos [v.g. pelos agentes policiais punidos com
a pena de suspensão de noventa dias a fls. 6, 7 e 8 do processo
administrativo].
Não se descortinam, por isso, nem o Réu tentou sequer adiantar, quais os
motivos que terão levado a suspender o Autor por um período correspondente a
quase o triplo [240-90=150 dias] daquele a que foram sujeitos aqueles agentes
policiais.
E nem se utilize o argumento ad terrorem, segundo o qual o Autor já terá tido a
“sorte” [“não tendo que se queixar”, cf. artigo 54.º da Contestação], em ver-lhe
afastada a aplicação de uma pena expulsiva [aposentação compulsiva ou
demissão], uma vez que, como é bom de ver, tal decisão, para além de se ter
apresentado como estritamente vinculada [por se ter concluído não estar
preenchido o requisito da inviabilidade de manutenção do vínculo funcional],
não tem naturalmente a virtualidade de “apagar” o caráter desproporcional ou
excessivo da pena de suspensão concretamente fixada no seu limite máximo
[240 dias].
Se é certo que se concebe que a Polícia de Segurança Pública terá querido “dar
o exemplo” para o interior da corporação, não menos o é que a pena de
suspensão concretamente aplicada ao Autor pelo período máximo de 240
[duzentos e quarenta dias], embora adequada e necessária à gravidade dos
factos, mostra-se, quanto à sua medida, manifestamente desproporcionada,
excessiva, face ao conjunto das circunstâncias que rodearam a prática da
descrita infração [artigos 18.º, n.º 2, 19.º, n.º 4 da CRP, e 07.º, n.º 2, do CPA].
Pelo que ficou dito, facilmente se percebe que a pena de suspensão de atividade
graduada em 240 dias, atento o supra exposto, não é justa, adequada,
necessária, equilibrada ou proporcional.
Em suma:
-o procedimento disciplinar não prescreveu;
-sem prejuízo da linha jurisprudencial que reiteradamente afirma que os
tribunais não podem substituir-se à Administração na fixação concreta da
pena, pelo que a graduação da pena disciplinar, não sendo posta em causa a
qualificação jurídico-disciplinar das infracções, não é contenciosamente
sindicável e bem assim que o fundamento do direito disciplinar assenta na
necessidade de garantir o bom funcionamento dos serviços, através de medidas
correctivas aos funcionários que violem os deveres impostos e,
consequentemente, embaracem ou prejudiquem o bom funcionamento dos
serviços e a prossecução do interesse público, certo é que a intervenção
correctora dos tribunais se impõe em situações de erro grosseiro ou manifesto,
ou seja, se e quando a medida da pena for ostensivamente desproporcionada,
como é o caso dos autos;
-o conjunto da factualidade apurada e atrás relatada denota, na determinação
da pena disciplinar aplicada, a existência de uma grave e ostensiva disfunção,
o que comprometeu, irremediavelmente, a decisão punitiva aplicada, conforme
bem observou o senhor juiz;
-acolhendo-se a leitura da sentença impugnada, naturalmente sucumbem as
conclusões da alegação com a manutenção daquela na ordem jurídica.
***
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pelo Recorrente.
Notifique e DN.
Porto, 23/08/2018
Ass. Fernanda Brandão
Ass. Paula Teixeira
Ass. Bárbara Teles

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