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A descriminação económica:
Patente não só na existência de uma medicina privada apenas aceitável à burguesia urbana,
mas também nas diferenças dos serviços e de preços dentro das próprias estruturas dos
serviços médicos governamentais.
A descriminação racial:
Descriminação geográfica:
Devido a diferentes facilidades de acesso a assistência medica nas zonas urbanas e nas
zonas rurais, caracterizado pelo reduzido número de unidades samintarias no campo, mas
mesmo a rede de cuidados sanitários urbanos era pobre em cuidados hoteleiros e em meios
auxiliares de diagnóstico, estes só existiam nas grandes cidades onde vivia apenas 7% da
população moçambicana.
As unidades sanitárias localizadas nas zonas de implantação dos colonos, serviam
essencialmente como uma triagem para meter ao colono endinheirado aos três grandes
centros urbanos onde existia uma florescente medicina privada;
A fraca extensão dos serviços médicos governamentais está bem patente no orçamento para
saúde em 1974, o qual consumia 3.7% do orçamento geral do estado.
Os serviços médicos caracterizam-se pela primazia absoluta da medicina privada e
lucrativa, o que tinha como consequência logica o seu caracter curativo sendo a medicina
preventiva quase inexistente.
V. O Hospital da universidade
Foi o instrumento mais referido da burguesia colonial para exercer uma influencia
ideológica reacionária nas várias gerações de trabalhadores de saúde. Ainda hoje se fazem
sentir profundamente sequelas graves desta acção. Houve que dissecar cuidadosamente este
triste legado do colonial-capitalismo para o denunciar perante todos trabalhadores de saúde
a quem é preciso fazer assumir um novo conceito de saúde, capaz de satisfazer as
necessidades e as aspirações profundas do povo.
A assistência do tipo exclusivamente curativo prestado pelo hospital da universidade, era
uma miscelânea de todo tipo de cuidados de saúde anteriormente mencionados e aquela
instituição reaccionária constituía, de facto, um poderoso instrumento da perpetuação e do
culto e de mentalidade elitista de medicina. Destinava-se a desenvolver no seio de
trabalhadores de saúde e na burguesia nacional nascente o culto de medicina privada
capitalista e de tecnologia sofisticada.
A actividade de medicina preventiva era teoricamente de uma serie de organismos que não
tinham qualquer estruturação logica e que não possuíam nenhuma actividade coordenada.
O combate aos grandes problemas de saúde pública estava a cargo de serviços verticais,
anquilosados, descoordenados, reduzidos a acções de fachadas.
No essencial, limitavam-se a acções conducentes a estabelecer uma cintura de proteção aos
centros urbanos onde viviam os colonos.
No domínio da proteção materno infantil, higiene nutricional, combate as doenças
transmissíveis, combate às doenças venéreas, saúde mental e dentaria, medicina no trabalho,
não existia qualquer programa nem atividade coordenada que desse cobertura a maioria da
população.
Os únicos aspectos dignos de menção foi uma certa acção no campo de saúde
escolar, mas, como não podia deixar de ser, efectuado no quadro das estruturas colonial-
fascistas, isto é, reservada exclusivamente às escolas oficiais, e concentradas sobre duas
maiores cidades.
A inexistência quase completa de acções de medicina preventiva era fruto directo do
sistema de exploração capitalista que caracterizava a prestação de cuidados de saúde, que
estava resumida na prestação de cuidados médicos (quase só curativos) a quem os podia
pagar.
A delegacia de saúde
As áreas libertadas foram divididas em províncias e estas em zonas e sectores. Em cada uma
destas áreas foram construídos hospitais e centros de saúde. Utilizaram para isso matéria
prima tradicional (pau e pique maticado) e organizou-se assim uma rede hierarquizada de
unidade sanitárias.
Em cada uma das províncias havia um hospital provincial, em cada zona um centro de saúde e em
cada sector, um posto de primeiros socorros.
Num documento de janeiro de 1968 descreviam-se assim as funções das diferentes unidades
sanitárias:
Hospitais provinciais
•Tratam-se outros problemas de saúde sobre tudo as doenças infecciosas e parasitarias;
Os casos que exigiam recursos que as unidades sanitárias não possuíam eram
transferidos para os países vizinhos. Em Mutarara, no Sul da Tanzânia a FRELIMO
possuía o Hospital Américo Boavida.
Os hospitais e centros de saúde eram construídos de baixo de árvores, pois, mesmo nas
zonas libertadas, havia ameaça da aviação colonial que diariamente lançava grandes
quantidades de bombas e napalm[2] nas florestas onde as forças terrestres coloniais não
conseguiam penetrar. Tanto os hospitais e escolas eram construídos pelo propiá população
com base nos recursos que os possuíam.
Houve que preparar mais pessoal num curto espaço de tempo e não podendo dispor senão
elementos com baixo nível escolar.
Pela primeira vez em Moçambique o pessoal treinado era oriundo das classes exploradas e,
portanto, em elas identificado, mas mesmo assim só se iniciava a preparação técnica no
campo de saúde após um treinamento militar que garantisse a identificação destes
trabalhadores de saúde com as massas camponesas.
Todos estes trabalhadores de saúde, assim como os guerrilheiros, não eram pagos, pois,
eram militantes da FRELIMO que viviam no seio do povo.
No mesmo documento relativo a situação da saúde nas zonas libertadas em Janeiro de 1968
fazia-se um apelo à solidariedade internacional.
A medicina preventiva já começava a ser encarada, diz-se nomeadamente:
Desenvolvimento de um programa intensivo de educação sanitária entre a população civil.
Consideramos este programa como as fundações de toda nossa estratégia na luta contra as
doenças parasitárias e tropicais do país.
No que se concerne a vacinação, já se apresentava nesse documento o balanço da
vacinação contra varíola em 1966 e 1967 de mais de 200 000 pessoas das zonas libertadas e
já se anunciavam em curso uma campanha organizada de vacinação contra variólica a toda
população das zonas libertadas, no decorrer da qual vieram a ser vacinadas cerca de 800
000 pessoas. Nas condições difíceis de guerra, não se dispondo de veículos nem cadeia de
frio apropriada, mostrava-se contudo o optimismo de levar a cabo com o sucesso esta
campanha baseada na organização da FRELIMO.
A educação sanitária da massa popular tornou-se um dever político. Iniciaram-se
campanha para introduzir hábitos higiénicos nas populações.
O saneamento do meio, higiene individual e das habitações e educação
nutricional tornaram-se armas decisivas no combate e prevenção das doenças, na
promoção de saúde. Construíram-se milhares de latrinas. Vacinaram-se mais de um milhão
de pessoas (quase todas pessoas das zonas libertadas) contra a varíola e cólera.
A promoção da saúde da comunidade torna-se uma tarefa da própria comunidade.
A medicina promotiva assume então sua verdadeira dimensão.
É neste contexto que os cuidados de saúde primários aparecem como a base em que
assenta toda a nossa política de saúde e que se espelha, as imensas transformações já
operadas no domínio da saúde desde que, em 20 de setembro de 1974, se instalou em
Moçambique o primeiro governo dirigido pela FRELIMO.
Neste período de reconstrução nacional, foi necessário nacionalizar a medicina (24 de Julho
de 1975) e interditar qualquer forma de seu exercício privado.
O objectivo da revolução era libertar o homem e estabelecer a justiça social. A
medida mais elementar era colocar a todo em pé de igualdade perante a adversidade e
impedir que a doença constituísse motivo de exploração.
Pela nacionalização da medicina, o estado passou a assumir a responsabilidade da
prestação dos cuidados de saúde à totalidade da população e assim se da o primeiro
grande passo para a roptura do sistema discriminatório da assistência colonial.
Em outubro de 1975 realizou-se o primeiro seminário, que reuniu durante uma semana os
responsáveis de saúde da Nação Moçambicana, analisa e compara as experiencias das áreas
libertadas com a situação das outras zonas do território nacional que só foram libertadas
quando a FRELIMO venceu.
Foi nesse seminário que lançou-se a campanha de Saneamento do Meio Ambiente que vem
a ter execução prática em toda a extensão do território nacional.
Ficaram pois assim criadas todas as condições para a organização de um Serviço Nacional
de Saúde (S.N.S) a partir de um conceito verdadeiramente científico de saúde da
comunidade. Esse conceito deriva de uma visão dialética, total da realidade a qual tem em
conta que o bem-estar físico e mental do homem é resultado da interação dinâmica
integrada de uma multiplicidade de factores sócio-económicos, positivos ou negativos para
saúde, dos quais a medicina é apenas uma parte e nem sempre é a mais determinante.
Assim nasce o conceito moderno de cuidados de saúde primários, constituídos
por conjunto de actividades e elementos susceptíveis de melhorar o estado de saúde da
comunidade e que representam o primeiro escalão de promoção da saúde e prevenção de
doenças, cura e reabilitação, devendo cobrir a população que neles participa
activamente.
Referência bibliográfica
MISAU. Cuidados de Saúde Primários em Moçambique, Republica Popular de
Moçambique. 128pp.
[1] Diz-se de instituição cuja atividade é de interesse público e que se rege por administração
própria, mas que é criada pelo Estado (empresa paraestatal)
[2] Napalm é um conjunto de líquidos inflamáveis à base de gasolina gelificada, utilizados como armamento militar.
Local: Moçambique
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