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Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco

Secretaria Executiva de Gestão do Trabalho e Educação na Saúde


Escola de Governo em Saúde Pública de Pernambuco

Curso Introdutório ao SUS


Livro didático do curso autoinstrucional

Pernambuco
Secretaria Estadual de Saúde
2023
Governo do Estado de Pernambuco
Governadora | Raquel Teixeira Lyra Lucena
Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco
Secretária | Zilda do Rego Cavalcanti
Secretaria Executiva de Gestão do Trabalho e Educação na Saúde
Secretária Executiva | Chrystiane Kelli de Araújo Barbosa
Escola de Governo em Saúde Pública de Pernambuco
Diretora | Célia Maria Borges da Silva Santana
Gerente | Luciana Camêlo de Albuquerque
Coordenação de Educação Permanente em Saúde da Escola de Governo em Saúde Pública de
Pernambuco
Coordenadora | Emmanuelly Correia de Lemos
Coordenação de Ensino à Distância da Escola de Governo em Saúde Pública de Pernambuco
Coordenadora | Thalia Ariadne Peña Aragão
Equipe Técnica da Coordenação de Educação Permanente em Saúde
Andréa Fernanda de Oliveira | Bárbara Paloma Marques de Luna | Natália Nunes de Lima |
Nathalia Ingrid dos Santos Silva Lucena | Tereza Adriana Miranda de Almeida
Equipe Técnica da Coordenação de Ensino à Distância
Adnan Gomes de Morais | Arnaldo César Alencar da Boaviagem | Maria Inez Nogueira Lima de Oliveira
Autoras
Natália Nunes de Lima | Glaucia Vivana Campos Xavier | Thalita Milena Araújo Xavier de Amorim |
Nathalia Ingrid dos Santos Silva Lucena | Bárbara Paloma Marques de Luna
Revisão
Emmanuelly Correia de Lemos | Luciana Camêlo de Albuquerque
Colaboradores que ministraram as aulas virtuais do curso
Garibaldi Dantas Gurgel Junior | Itamar Lages | João Carlos Batista Santos |
Priscilla Viégas Barreto de Oliveira | Eugênio Vilaça Mendes
Projeto Gráfico e Capa
Glaucia Vivana Campos Xavier | Bárbara Paloma Marques de Luna | Emmanuelly Correia de Lemos
SUMÁRIO

Módulo 1: História do Sistema Único de Saúde 8

Aula virtual módulo 1: História do Sistema Único de Saúde 60


Material complementar módulo 1 64

Módulo 2: A Organização do Sistema Único de Saúde 67

Aula virtual 1 módulo 2: Regionalização em saúde 133


Aula virtual 2 módulo 2: Redes de Atenção à Saúde 133
Material complementar módulo 2 140

Módulo 3: Planejamento, Governança e Financiamento 142


do Sistema Único de Saúde
Aula virtual 1 módulo 3: Instrumentos de planejamento 189
Aula virtual 2 módulo 3: Governança no SUS 190
Aula virtual 3 módulo 3: Financiamento do SUS 190
Material complementar módulo 3 196

Módulo 4: Democracia e Controle Social no Sistema 200


Único de Saúde
Aula virtual módulo 4: Democracia e Controle social no 228
Sistema Único de Saúde
Material complementar módulo 4 231
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Módulo 1 – História do Sistema Único
de Saúde (SUS)

1. Objetivos de aprendizagem:

a) Refletir a relação público-privada na conformação


histórica do sistema de saúde;

b) Reconhecer o SUS como meio garantidor da


consolidação da cidadania;

c) Reconhecer os princípios e diretrizes do SUS;

d) Compreender os modelos de atenção à saúde no


SUS.

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Módulo 1 – História do SUS

O Que Tínhamos Antes do SUS?

Para que entender a história das políticas de


saúde no Brasil? Já imaginaram se alguém que você
acaba de conhecer criasse um conceito sobre seu
modo de ser? Não seria nada bom. Para que
possamos compreender a essência de uma pessoa,
temos que conhecer seu contexto atual e um pouco
do seu passado. Assim é com o Sistema Único de
Saúde (SUS). Não podemos avaliá-lo, valorizá-lo e
aperfeiçoá-lo, entender seu momento atual, sua
legislação, sua organização, sem saber em que
contexto político e social ele foi concebido, além dos
avanços e desafios que sucederam a sua criação
(SOUZA, 2018).
É necessário saber o que tínhamos antes do SUS
para que possamos refletir a relação público-privada
na conformação histórica do Sistema de Saúde,
assim como compreender por que o SUS representa
um meio garantidor da cidadania e uma conquista do
povo brasileiro.

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Módulo 1 – História do SUS

1. Organização Sanitária do Brasil na


Colônia e no Império (1500 a 1889)

Quando o Brasil era uma colônia de Portugal, os


serviços de saúde das tropas militares
subordinavam-se ao cirurgião-mor dos Exércitos de
Portugal. Já o saneamento, a profilaxia das doenças
epidêmicas, assim como as questões relativas ao
trabalho de médicos, farmacêuticos, cirurgiões,
boticários e curandeiros, eram respondidas pelo
físico-mor ou por meio de seus delegados nas
capitanias. Os problemas de higiene eram de
responsabilidade das autoridades locais, que se
preocupavam com a sujeira das cidades, a
fiscalização dos portos e o comércio de alimentos. A
assistência aos pobres ficava por conta da caridade
cristã, que abrigava indigentes, viajantes e doentes.

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Módulo 1 – História do SUS

A vinda da família real ao Brasil criou


a necessidade da organização de uma estrutura
sanitária mínima, capaz de dar suporte ao poder que
se instalava na cidade do Rio de Janeiro. Destaca-se
que o interesse primordial estava limitado ao
estabelecimento de um controle sanitário mínimo da
capital do Império, tendência que se alongou por
quase um século.
Portanto, até 1850, as atividades de saúde
pública estavam limitadas à delegação das
atribuições sanitárias às juntas municipais e ao
controle de navios e saúde dos portos. Assim, ao
final do império, era rudimentar e centralizada a
organização sanitária brasileira, incapaz de
responder às epidemias e de assegurar a assistência
aos doentes, sem discriminação. As pessoas que
dispunham de recursos eram cuidadas por médicos
particulares, enquanto indigentes eram atendidos
pelas casas de misericórdia, pela caridade e
filantropia.

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Módulo 1 – História do SUS

Figura 1- Resumo da organização sanitária do Brasil e das ações de


saúde desenvolvidas entre 1500 e 1889

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Módulo 1 – História do SUS

2. A República Velha (1889 até 1930)

Neste período, o cenário político e econômico


girava em torno da instalação do modo de produção
capitalista e seu processo de industrialização. A
organização dos serviços de saúde predominava uma
espécie de “não-sistema de saúde”, com certa
omissão do poder público, baseado na concepção
liberal de que só cabia ao Estado intervir nas
situações em que o indivíduo sozinho ou a iniciativa
privada não fosse capaz de responder. Este “não
sistema” tem como característica a separação entre
as ações de saúde pública e as de assistência
médico-hospitalar.
O quadro sanitário era caótico devido a inexistência
de um modelo sanitário com predomínio de grandes
epidemias (febre amarela, peste, varíola) que
comprometeram a economia agroexportadora,
impondo ao poder público o saneamento dos portos,
a adoção de medidas sanitárias nas cidades, o

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Módulo 1 – História do SUS

combate a vetores e a vacinação obrigatória.


A saúde neste contexto era tratada mais como
caso de polícia do que como uma questão social. E o
órgão que cuidava da saúde pública vinculava-se ao
Ministério da Justiça e Negócios Interiores. A
realização de campanhas lembrava uma operação
militar, e muitas das ações realizadas inspiraram-se
no que se denominava polícia sanitária, a exemplo
destaca-se: a Revolta da Vacina, desencadeada pela
Lei Federal 1.261/1904, que tornava obrigatória a
vacinação contra varíola.
O processo de industrialização no Brasil foi
acompanhado de uma urbanização crescente e da
utilização de imigrantes como mão-de-obra nas
indústrias. Estes operários não tinham quaisquer
garantias trabalhistas (férias, pensão, aposentadoria,
jornada de trabalho definida), além das péssimas
condições de trabalho. Diante deste cenário, foram
realizadas duas greves gerais no país, uma em 1917 e
a outra em 1919 que resultaram na aprovação, pelo

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Módulo 1 – História do SUS

Congresso Nacional, da Lei Elói Chaves, em 24 de


janeiro de 1923, que instituiu as Caixas de
Aposentadoria e Pensão (CAPS), sendo esta lei o
marco da Previdência Social no Brasil, ou seja, o
primeiro momento que o Estado intervém frente às
condições de trabalho. A Figura 2 apresenta as
principais características das CAPS.

Figura 2- Principais características das Caixas de Aposentadoria e


Pensões (CAPs)

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Módulo 1 – História do SUS

3. A Era Vargas (1930-1964)


A crise do café e da República Velha desencadeou
um golpe de Estado conhecido como Revolução de
30. A indústria passou a ser a maior responsável pelo
acúmulo de capital. Neste período, o Departamento
Nacional de Saúde Pública foi transferido do
Ministério da Justiça para o Ministério da Educação e
Saúde (MESP). O MESP prestava serviços para os
identificados “pré-cidadãos”: os pobres, os
desempregados, os que exerciam atividades
informais, ou seja, pessoas que não eram seguradas
pela previdência social (BRASIL,2011).
Com a necessidade da política de Estado
estender a todas as categorias do operariado urbano
os benefícios da previdência em 1933, as CAPs foram
unificadas e criados os Institutos de Aposentadorias e
Pensões (IAPs). A Figura 3 apresenta as principais
características dos IAPs.

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Módulo 1 – História do SUS

Figura 3- Principais características dos Institutos de


Aposentadorias e Pensões (IAPs)

Em 1941 foi criado o Serviço Especial de Saúde


Pública (SESP) que tinha como atribuições centrais
sanear a Amazônia e a região do Vale do Rio Doce
(onde se produzia borracha e minério de ferro,
matérias-primas estratégicas para o esforço de guerra
americano na II Guerra Mundial), tendo em vista os
altos índices de malária e febre amarela que atingiam
os trabalhadores daquela região.

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Módulo 1 – História do SUS

Após a criação do Ministério da Saúde, em 1953,


o combate a certas doenças passou a ser realizado
por serviços específicos e centralizados. Entretanto, a
intervenção sob o modelo de campanhas persistiu
em relação ao combate à tuberculose, erradicação da
malária, e a vacinação contra a varíola. O SESP
transformou-se em fundação (Fsesp) e o
Departamento Nacional de Endemias Rurais
(DNERu), em 1960, foi substituído pela
Superintendência de Campanhas (Sucam).
Nesta época a saúde pública não tinha qualquer
integração com a medicina previdenciária, nem com
a saúde do trabalhador. Assim, a organização dos
serviços de saúde no Brasil viviam em mundos
separados: de um lado a saúde pública, com ações
voltadas a para prevenção, o ambiente e a
coletividade, de outro lado, a saúde do trabalhador,
inserida no Ministério do Trabalho; e ainda, as ações
curativas e individuais, integrando a medicina
previdenciária e as modalidades de assistência
médica liberal, filantrópica e, progressivamente,
empresarial.

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Módulo 1 – História do SUS

As condições de saúde da população se


modificaram do predomínio das doenças da pobreza
(tuberculose, desnutrição, verminose, doenças
sexualmente transmissíveis e outras doenças
infecciosas e parasitárias) para a chamada morbidade
moderna (doenças do coração, neoplasias, acidentes
e violências). Destaca-se uma redução da
mortalidade por doenças infecciosas e parasitárias e
o crescimento das doenças crônicas e degenerativas.

4. A Ditadura (1964-1984)

O regime militar implantou reformas


institucionais que afetaram profundamente a saúde
pública e a medicina previdenciária. Em 1966 ocorre
a unificação dos IAPs no Instituto Nacional de
Previdência Social (INPS) com a concentração de
todas as contribuições previdenciárias, ao mesmo
tempo que o novo órgão passa a gerir as
aposentadorias, pensões e a assistência médica de

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Módulo 1 – História do SUS

todos os trabalhadores formais.


Somente os brasileiros que estivessem
vinculados ao mercado formal de trabalho e com
carteira assinada teriam acesso à assistência médica
da previdência social. Aos demais, restavam poucas
opções: pagar pelos serviços médicos e hospitalares
ou buscar atendimento em instituições filantrópicas,
postos e hospitais de estados ou municípios. Esse
cenário destaca que o direito à saúde não estava
vinculado à condição de cidadania, cabendo aos
indivíduos a responsabilidade de resolver os seus
problemas de saúde, bem como de seus familiares.
Com a lei 6.229 sancionada em 1975, foi criado o
Sistema Nacional de Saúde e definidas suas
competências e componentes. Há época, também
houve reforço no orçamento para o Ministério da
Saúde, incorporados a programas voltados para
serviços de saúde em áreas rurais e de separação das
vigilâncias epidemiológica e sanitária, além de outros
programas voltados para populações específicas,
como o materno-infantil.

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Módulo 1 – História do SUS

Devido a complexidade do ponto de vista


administrativo e financeiro dentro da estrutura do
INPS, em 1978 foi criado o Instituto Nacional de
Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS).
Nesse contexto, consolida-se cada vez mais
como hegemônico o modelo privatista/curativo, que
tem como foco principal a doença e o doente, não
atuando sobre as necessidades reais da população.
Grandes hospitais são criados para atendimento
daqueles que contribuem, fortalecendo o caráter
excludente das ações e serviços de saúde.
Lembramos que o modelo sanitarista-campanhista
não deixou de existir, temos os dois modelos
coexistindo neste período.
Em 1978 ocorreu a Conferência Internacional
sobre Atenção Primária à Saúde, realizada em
Alma-Ata, que teve como ponto culminante a
discussão contra a elitização da prática médica, bem
como contra a inacessibilidade dos serviços médicos
às grandes massas populacionais. Nesta conferência

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Módulo 1 – História do SUS

reafirmou-se ser a saúde um direito humano


fundamental, sob responsabilidade política dos
governos, e reconheceu-se a sua determinação
intersetorial.
A população com baixos salários, contidos pela
política econômica e pela repressão, passou a
conviver com o desemprego, aumento da
marginalidade, das favelas e da mortalidade infantil.
O modelo de saúde previdenciário começou a
mostrar as suas mazelas. Por ter priorizado a
medicina curativa, o modelo proposto foi incapaz de
solucionar os principais problemas de saúde coletiva.
A Figura 4 apresenta as consequências do modelo
privatista/curativo.
Com o intuito de conter os custos e combater
fraudes, o governo criou em 1981 o Conselho
Consultivo de Administração da Saúde Previdenciária
(CONASP) que passou a absorver em postos de
importância alguns técnicos ligados ao movimento
sanitário (movimento social composto

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Módulo 1 – História do SUS

Figura 4- Consequências do modelo privatista/curativo

Consequências do modelo
privatista/curativo

por segmentos populares, estudantes,


pesquisadores, profissionais de saúde e categorias
sindicais que defenderam a democratização da saúde
e a reestruturação do sistema de saúde), o que deu
início a ruptura por dentro dos anéis burocráticos
previdenciários.

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Módulo 1 – História do SUS

Em 1983, foram implementadas as Ações


Integradas de Saúde (AIS) visando um novo modelo
assistencial de saúde que incorporava o setor público
de forma a integrar as ações curativas, preventivas e
educativas.

5. Fim da Ditadura e a Nova República


(1985-1988)

Este período tem como marco o movimento das


Diretas Já e a eleição do presidente Tancredo Neves,
gerando diversos movimentos sociais, inclusive na
área da saúde, que culminaram com a criação das
associações dos secretários de saúde estaduais
(Conass) e municipais (Conasems), e com grande
mobilização nacional por ocasião da realização da
VIII Conferência Nacional de Saúde, em 1986, a qual
lançou as bases da reforma sanitária e do Sistema
Único Descentralizado de Saúde (SUDS).

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Módulo 1 – História do SUS
Durante a VIII Conferência Nacional de Saúde
(CNS), que contou com a participação de milhares de
representantes de diversas entidades da sociedade
civil, profissionais de saúde, usuários do sistema e
prestadores de serviços de saúde públicos (PONTE et
al., 2010), foram sistematizados e debatidos por
quase cinco mil participantes diversos estudos e
proposições para a Reforma Sanitária Brasileira
(Figura 5).
Figura 5- Ilustrações de mobilizações em torno da VIII CNS na
construção do SUS

Fonte: Adaptado de PONTE et al. (2010).

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Módulo 1 – História do SUS

O relatório final do evento inspirou o capítulo


“Saúde” da Constituição de 1988, desdobrando-se,
posteriormente, nas Leis Orgânicas da Saúde
(8.080/90 e 8.142/90) que permitiram a implantação
do Sistema Único de Saúde (SUS). A figura 6 faz uma
síntese em relação à VIII CNS.

Figura 6- Síntese da VIII Conferência Nacional de Saúde

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Módulo 1 – História do SUS

Com a Constituição Federal de 1988, a saúde


passou a ser reconhecida como um direito social,
ou seja, inerente à condição de cidadão, cabendo ao
poder público a obrigação de garantia: no capítulo
VIII da ordem social e na seção II referente à saúde,
artigo 196:
A saúde é direito de todos e dever do
Estado, garantido mediante políticas
sociais e econômicas que visem à redução
do risco de doença e de outros agravos e ao
acesso universal e igualitário às ações e
serviços para sua promoção, proteção e
recuperação.
De acordo com o artigo 198, o SUS é definido como
um conjunto de ações e serviços públicos de saúde que
integram uma rede regionalizada e hierarquizada e
constituem um sistema único, organizado de acordo
com as seguintes diretrizes:
I- Descentralização, com direção única em cada
esfera de governo;
II- Atendimento integral, com prioridade para as
atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços
assistenciais;

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Módulo 1 – História do SUS
III- Participação da comunidade.
Quais as principais características do SUS?

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Módulo 1 – História do SUS

Quais os princípios e diretrizes que organizam o


SUS?
O SUS insere-se num contexto amplo da política
pública de seguridade social, que abrange as políticas
de Saúde, Previdência e Assistência Social. O
delineamento de um modelo de seguridade social no
Brasil significou, pela primeira vez na história do país,
a formulação de uma estrutura de proteção social
abrangente, justa, equânime e democrática, na qual
o Estado tem por dever o provimento da atenção à
saúde para toda a população.
Com essa nova configuração, há o rompimento
com o modelo de saúde excludente e meritocrático
anterior, e é firmado um compromisso com a
democracia, pois, a partir da instituição do SUS, o
Estado assume a Saúde como um direito de todos,
que deve ser assegurado por meio de políticas sociais
e econômicas, que visem a redução de risco de
doenças e outros agravos, bem como políticas de
saúde que garantam o acesso universal e igualitário a

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Módulo 1 – História do SUS
serviços de promoção, proteção e recuperação da
saúde a quaisquer pessoas no território nacional.
A Lei nº 8.080 foi promulgada em 1990, dois
anos após a instituição da Constituição Federal
brasileira, para organizar e reger o SUS. No bojo de
sua constituição, além do conceito ampliado de
Saúde, o SUS traz consigo a ideia de sistema e de
unicidade. Ou seja, a ideia de sistema significa dizer
que há um conjunto de instituições, nos três níveis do
governo e do setor privado conveniado
(filantrópico,sem fins lucrativos) e/ou contratualizado
(com fins lucrativos), que interagem para uma
finalidade comum. Ao passo que a ideia de unicidade
diz respeito a mesma doutrina e organização as quais
devem submeter-se esse sistema, baseado em certos
princípios e diretrizes estabelecidos em Constituição,
para todos os serviços da rede.
Os princípios e diretrizes do SUS estão
incorporados em suas bases históricas e filosóficas, e
servem para organizar e orientar o seu
funcionamento. Existem os chamados princípios
doutrinários, que dizem de um núcleo comum que

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Módulo 1 – História do SUS

fundamentam a existência do SUS, e os princípios


organizativos, que orientam uma forma de
operacionalização do Sistema.

Figura 7- Princípios organizativos e doutrinários do SUS

Aqui, abordaremos brevemente os principais


princípios que regem o SUS:

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Módulo 1 – História do SUS

1. Princípio da UNIVERSALIDADE do acesso

Este princípio refere-se à garantia de que


qualquer cidadão, sem privilégios ou barreiras, deve
ter acesso aos serviços de saúde, em todos os níveis
de atenção. Esse acesso será garantido por meio de
uma rede de serviços hierarquizada em diferentes
níveis de atenção à saúde. Dessa forma, todos os
cidadãos terão acesso, conforme sua necessidade,
dentro dos limites que o sistema possa oferecer.
Por exemplo, alguém que necessite da
atualização de alguma vacina, deverá encontrar esse
serviço no setor primário (que refere-se ao serviço de
equipamentos como as Unidades de Saúde da
Família, conhecidas como portas de entrada do
sistema), da mesma forma que alguém que demande
de uma intervenção cirúrgica, deverá ter garantido o
acesso ao procedimento no setor terciário (onde
localizam-se os serviços das especialidades focais,
como os hospitais).

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Módulo 1 – História do SUS
2. Princípio da INTEGRALIDADE da atenção

Este princípio diz respeito à garantia de acesso a


um conjunto articulado de ações e serviços de
prevenção e tratamento, a nível individual ou
coletivo, em todos os níveis de atenção do sistema,
de acordo com as necessidades dos sujeitos.
O princípio da integralidade surgiu em
contraposição ao contexto institucional de saúde que
segregava as ações de saúde pública e da medicina
previdenciária, buscando uma maior integração das
ações para uma garantia efetiva de saúde da
população.
É um princípio complementar à Universalidade,
pois de nada adiantaria um acesso universal à ações e
serviços desintegrados. O ser humano é complexo,
constitui-se em diversas esferas da vida, mas não
resume-se à mera soma das partes. Portanto, a
garantia da saúde dos cidadãos acontece mediante a
integração de ações que compreendam todas as
necessidades de um sujeito (individual ou coletivo),
de maneira articulada em sua complexidade.

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Módulo 1 – História do SUS
Para tanto, é necessária a articulação entre
diferentes níveis de governo (municipal, estadual e
federal) e da atenção (primário, secundário e
terciário), incluindo a promoção da saúde, a
prevenção de doenças, o tratamento e a reabilitação.

3. Princípio da EQUIDADE

Coadunante ao princípio da Integralidade, a


Equidade significa tratar desigualmente os desiguais.
Isso quer dizer que, apesar de todas as pessoas terem
o direito aos serviços do SUS, as pessoas não são
iguais e, portanto, possuem necessidades diferentes
umas das outras. Uma mulher, branca, jovem,
moradora de um bairro nobre têm necessidades em
saúde diferentes de um homem, negro, idoso e
periférico, por exemplo.
Assim, é um princípio cujo objetivo é a
diminuição das desigualdades, na medida em que a
oferta de ações e serviços deve ocorrer de acordo
com as especificidades de cada região e/ou

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Módulo 1 – História do SUS

população, o estabelecimento de prioridades e


investimento naqueles que tenham maiores
necessidades.

4. Princípio da DESCENTRALIZAÇÃO

Este princípio surge com o intuito de promover


maior democratização nos processos de tomada de
decisão na saúde, visto que, antes do SUS, esses
processos concentravam-se apenas no âmbito
federal. A descentralização é considerada uma
estratégia para o enfrentamento das desigualdades
regionais e sociais, visto que o Brasil é um país de
dimensões continentais e seu território é permeado
por uma infinidade de particularidades que variam
entre os diferentes locais. Tomando como exemplo o
próprio estado de Pernambuco, vemos que as
necessidades em saúde de um município do agreste
diferem fortemente daquelas da capital, não é
mesmo?

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Módulo 1 – História do SUS

A partir da descentralização, o poder de decisão


deixa de concentrar-se no nível federal e é
redistribuído para instâncias subnacionais do
governo, guardadas as atribuições e
responsabilidades de cada instância (União, estados
e municípios).
Com base nesse princípio, a população pode ter
um maior controle e acompanhamento das ações
públicas em saúde. Esse princípio fundamenta-se no
pressuposto de que quanto mais próximo o gestor
estiver dos problemas de um território, mais chance
ele terá de acertar na resolução deles.
Dessa forma, são os gestores locais quem
decidem as prioridades de cada região, levando em
conta as características geográficas,
epidemiológicas, a oferta de serviço e as
necessidades dos usuários. Cada esfera de governo é
autônoma e soberana nas suas decisões, desde que
respeite os princípios gerais do SUS e a participação
da sociedade. Para que a proposta da
descentralização de fato se efetive, é necessária a

37
Módulo 1 – História do SUS

solidariedade e cooperação entre os governantes,


além de transparência nos processos e
democratização das decisões.

5. Princípio de REGIONALIZAÇÃO e
HIERARQUIZAÇÃO

Os serviços devem ser organizados em níveis


crescentes de densidade tecnológica, delimitados
num território, planejados segundo critérios
epidemiológicos, com definição e conhecimento da
população a ser atendida.
A Regionalização é um processo de articulação
dos serviços já existentes numa área geográfica,
objetivando o comando unificado destes. Por
exemplo, um município que tenha uma infraestrutura
mais robusta de serviços de saúde, deve atender a
outros municípios que não possuam a mesma
estrutura. Essa articulação é feita a partir dos
convênios de saúde. Já a Hierarquização deve
respeitar a divisão dos níveis de atenção à saúde e

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Módulo 1 – História do SUS

viabilizar o acesso a serviços de saúde, a depender da


complexidade das necessidades de cada caso.

6. Princípio da PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE

Trata-se da garantia constitucional de


participação da população no processo de
formulação das políticas de saúde e do controle de
sua execução. Essa participação popular ocorre por
meio de entidades representativas expressas em
conselhos e conferências de saúde.
A partir da lei 8.142/1990, é definida a
configuração dos conselhos de saúde, em cada esfera
do governo, e a realização periódica das
conferências, a cada 4 anos, também em cada esfera
do governo.
A principal função dos conselhos é a formulação,
acompanhamento e controle das áreas do governo,
nos três níveis. Já as conferências, têm como
principal objetivo avaliar a situação de saúde e

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Módulo 1 – História do SUS
propor diretrizes para formulação de políticas de
saúde, nos diferentes níveis correspondentes.

Os princípios e diretrizes do SUS orientam os


gestores e governantes da saúde quanto às bases
para a construção de políticas de saúde. Apesar disso,
persistem dificuldades para a efetivação desses
princípios, que são remanescentes do processo
histórico de consolidação do SUS, cujos aspectos
anteriores de autoritarismo, centralização decisória e
prática clientelista, ainda deixam marcas na saúde
pública do país.
Um dos principais desafios está relacionado à
efetivação do princípio de descentralização. O Brasil
é um país bastante heterogêneo, comportando
estados e municípios que possuem diferentes
realidades financeiras, geográficas e populacionais.

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Módulo 1 – História do SUS

Além disso, a despeito da descentralização


administrativa, persistem problemas no federalismo
fiscal, como o fato de Estados e Municípios
precisarem de mais recursos para atender às suas
demandas e necessidades, enquanto a União tenta
manter a maior parte da arrecadação tributária.
Nesse cenário, observa-se uma relação de
subordinação dos Estados e dos Municípios perante a
União, incompatível com o efetivo federalismo fiscal
e que pode acentuar as disparidades locorregionais
(ENAP, 2017).
Outro desafio diz respeito à participação da
comunidade, pois existem dificuldades em alguns
segmentos sociais para se articularem como
propositores e controladores da política. Isso tem a
ver com a compreensão da noção de direito, que
denuncia a trajetória político-institucional recente do
Estado brasileiro. Assim, nos espaços de decisão
popular, acabam prevalecendo interesses individuais
e/ou corporativos, em detrimento de políticas mais
redistributivas e solidárias.

41
Módulo 1 – História do SUS

Quais os principais modelos de atenção à saúde?


Um modelo consiste numa representação
esquemática e simplificada de um sistema de saúde,
com relação à prestação da atenção. Nas palavras de
Mendes (2011), o modelo de atenção à saúde é:
[...] um sistema lógico que organiza o
funcionamento das Redes de Atenção à Saúde,
articulando, de forma singular, as relações entre
a população e suas subpopulações estratificadas
por riscos, os focos das intervenções do sistema
de atenção à saúde e os diferentes tipos de
intervenções sanitárias, definido em função da
visão prevalecente da saúde, das situações
demográfica e epidemiológica e dos
determinantes sociais da saúde, vigentes em
determinado tempo e em determinada
sociedade.

42
Módulo 1 – História do SUS

Levando em consideração o histórico da


conformação do sistema de saúde no país,
observamos que existem modelos assistenciais
hegemônicos e modelos alternativos. No Brasil, o
modelo médico ocupa lugar de hegemonia,
enquanto que o modelo sanitarista resiste enquanto
alternativo. Ambos os modelos são considerados
contraditórios ou complementares, porque nenhum
dos dois consegue contemplar plenamente o
princípio da integralidade: ou volta-se a atenção à
demanda espontânea (modelo médico), ou atende às
necessidades que nem sempre se expressam em
demandas (modelo sanitarista).
Frente a essas limitações, desde a 8ª
Conferência Nacional de Saúde são discutidos os
modelos assistenciais, no intuito de sanar
problemáticas relacionadas ao acesso a serviços,
adequação da atenção às necessidades, qualidade
das ações, entre outras.

43
Módulo 1 – História do SUS

Figura 8 - Modelos de Atenção à Saúde

Agora, nos debruçaremos sobre os principais


modelos existentes no país, dentre os hegemônicos e
alternativos, explicitados no texto de Paim (2008).

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Módulo 1 – História do SUS

1. Modelos hegemônicos
a. Modelo médico assistencial privatista
(PAIM, 2008)

Modelo centrado na clínica, para o atendimento


de demanda espontânea segundo procedimentos e
serviços especializados. É o modelo de atenção à
saúde mais conhecido e prestigiado no país, apesar
de não contemplar toda a complexidade dos
problemas de saúde da população.
O objeto desse modelo é a doença ou o doente; o
agente, o médico especialista; os meios de trabalho
são as tecnologias médicas; e a organização é dada
por meio da rede de serviços, com destaque para os
hospitais. Volta-se ao atendimento à demanda
espontânea, isto é, as pessoas que, ao sentirem-se
doentes, procuram os serviços de saúde para
tratamento. Caso as pessoas não percebam suas
questões de saúde, ainda que estejam em situação
de risco ou doentes, não irão ser atendidas pelo
sistema, o que deixa lacunas à integralidade da
atenção.

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Módulo 1 – História do SUS
Esse modelo fundamenta-se na medicina
flexneriana, caracterizada pela clínica individual,
especialismo da assistência, foco no curativismo,
valorização de hospitais em detrimento do serviço
ambulatorial e secundarização de ações de
promoção de saúde e prevenção de doenças. No
Brasil, o modelo tem origem atrelada à assistência
prestada em serviços filantrópicos e na medicina
liberal e tornou-se hegemônico não só no setor
privado, como também no setor público.

b. Modelo de atenção gerenciada (PAIM, 2008)

Surge com o crescimento de cooperativas


médicas e operadoras de planos de saúde privados,
fundamentado em pressupostos da Economia e da
Medicina Baseada em Evidências. O modelo estimula
o consumismo médico e privilegia a medicina
curativa, numa lógica de gerenciamento que
transforma a saúde em mercadoria, na qual há um
privilégio do biologicismo e quem busca o serviço em
saúde torna-se um consumidor. Diferentemente

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Módulo 1 – História do SUS

do modelo médico hegemônico, o modelo de


atenção gerenciada irá apostar na subprodução e
controle mais íntimo do trabalho médico, pois
objetiva a contenção da demanda e o racionamento
dos procedimentos e serviços especializados.

c. Campanhas sanitárias e programas especiais


(PAIM, 2008)

O modelo tem suas bases fundamentadas nas


Ciências Biológicas e Epidemiologia. Tem o foco da
atenção voltada a certos agravos e riscos, ou
determinados grupos populacionais, sem contemplar
os princípios da integralidade e descentralização dos
serviços.
Muitas campanhas acabaram tornando-se
programas especiais, posteriormente, mas o que
caracteriza o modelo campanhista é uma
administração vertical e atuação individualizada,
fragmentada e desintegrada. Existem diversos
programas específicos coordenados pelo Ministério

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Módulo 1 – História do SUS

da Saúde (hipertensão, tuberculose, diabetes, saúde


mental, saúde da criança, do adolescente, do idoso,
da mulher, do trabalhador, etc), que não conversam
entre si. Ou seja, é como se uma mulher adulta não
fosse uma trabalhadora, não pudesse ter diabetes ou
questões de saúde mental; ou como se uma criança,
um adolescente ou idoso não tivessem gênero.
Percebemos que a falta de intersecção entre
esses diversos programas acaba ampliando a
ineficiência deles, bem como aumenta as
dificuldades gerenciais e a burocratização das
atividades.

d. Vigilância sanitária e epidemiológica (PAIM, 2008)

De acordo com a Lei 8.080/90, a vigilância


sanitária compreende um conjunto de ações capazes
de eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde e de
intervir nos problemas sanitários decorrentes do
meio ambiente, da produção e circulação de bens e
da prestação de serviços de interesse da saúde. Esta

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Módulo 1 – História do SUS
fundamenta-se nos saberes biomédico, jurídico e
epidemiológico; intervenções voltadas para o
controle de riscos e proteção da saúde, com a
retaguarda de laboratórios.
Já a vigilância epidemiológica compreende um
conjunto de ações que proporciona o conhecimento,
a detecção ou a prevenção de qualquer mudança nos
fatores determinantes e condicionantes de saúde
individual e coletiva, com finalidade de recomendar e
adotar as medidas de prevenção e controle das
doenças e agravos. Baseia-se na epidemiologia,
clínica, estatística, imunologia e em outras disciplinas
biológicas, sendo composta por um conjunto de
atividades que objetivam produzir informações para
decisão e ação.

e. Pacs/PSF (PAIM, 2008)

Este modelo tem como expressão intervenções


focalizadas aos pobres e excluídos, que não diferem
muito dos programas especiais. Incluem ações
territoriais que extrapolam os muros das unidades de

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Módulo 1 – História do SUS

saúde, enfatizando atividades educativas e de


prevenção de riscos e agravos específicos, com ações
básicas de atenção à saúde de grupos prioritários.

2. Modelos alternativos (PAIM, 2008)

Na busca de alternativas aos modelos de


atenção hegemônicos, têm sido valorizadas diversas
propostas, tais como:

a. Oferta organizada (PAIM, 2008)

Tem sua fundamentação na Epidemiologia e no


planejamento, buscando compatibilizar a ideia de
impacto com o princípio de não rejeição à demanda.
A proposta tem como foco o nível local e procura
organizar a oferta a partir da identificação das
necessidades, mantendo as relações funcionais e
programáticas com a demanda espontânea no
interior da unidade de saúde. As noções de
territorialização, integralidade e impacto

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Módulo 1 – História do SUS

epidemiológico, embutidas nessa proposta,


reorientaram o planejamento de saúde para uma
base populacional específica. Portanto, a oferta
organizada tende a superar as formas de organização
de produção de ações de saúde vigentes nos
modelos de atenção hegemônicos, inclusive as
campanhas e os programas especiais.

b. Distritalização (PAIM, 2008)

Um distrito sanitário é uma unidade operacional


e administrativa mínima do sistema de saúde,
definida de acordo com a geografia, população, perfil
epidemiológico, critérios gerenciais e políticos de um
dado território. Nos limites do distrito localizam-se
recursos de saúde públicos e privados organizados
por meio de processos políticos institucionais com a
participação da sociedade organizada, para
desenvolver ações em saúde que visem à
integralidade.

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Módulo 1 – História do SUS

A proposta de implantação de distritos sanitários


busca organizar serviços e estabelecimentos de
saúde numa rede integrada que desenvolva um
modelo de atenção de base epidemiológica. A
proposta surgiu por volta dos anos 1990, em alguns
estados brasileiros, por meio da política dos Sistemas
Unificados e Descentralizados (Suds).
Existem 12 princípios organizativos-assistenciais
que orientam a distritalização, quais sejam: 1.
impacto; 2. orientação por problemas; 3.
intersetorialidade; 4. planejamento e programação
local; 5. autoridade sanitária local; 6.
corresponsabilidade; 7. hierarquização; 8.
intercomplementaridade; 9. integralidade; 10.
adscrição; 11. heterogeneidade; 12. realidade.
Embora parecida, essa proposta diferencia-se
dos sistemas locais de saúde porque a distritalização
privilegia a integralidade e a reorganização das
práticas de saúde em articulação com demais
práticas sociais.

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Módulo 1 – História do SUS
c. Ações programáticas de saúde (PAIM, 2008)

Trata-se da redefinição dos programas especiais


de saúde, a partir de um trabalho programático que
recomponha as práticas de saúde locais. O trabalho
baseado na programação tem por ponto de partida a
identificação das necessidades sociais de saúde de
uma população. Esse modelo guarda certa
semelhança ao da oferta organizada, pois em ambos
há a concentração das ações nas unidades de saúde.

d. Vigilância da saúde (PAIM, 2008)

O modelo da vigilância da saúde apoia-se na


ação intersetorial que procura reorganizar as práticas
de saúde de forma a atuar nas seguintes fases: 1)
intervenção sobre problemas de saúde (danos, riscos
e/ou determinantes); 2) ênfase em problemas que
requerem atenção e acompanhamento contínuos; 3)
utilização do conceito epidemiológico de risco; 4)
articulação entre ações promocionais, preventivas e
curativas; 5) atuação intersetorial; 6) ações sobre o

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Módulo 1 – História do SUS

território; e 7) intervenção na forma de operações.


Essas fases reforçam que, nesse modelo, são
destacadas as condições de vida, incluindo os fatores
determinantes e condicionantes de saúde,
relacionando-as com as necessidades e os problemas
de saúde na perspectiva do controle de causas, riscos
e danos. Algo que resultaria em uma dada situação
de saúde e qualidade de vida, também decorrentes
de práticas assistenciais e políticas setoriais e
intersetoriais em um determinado contexto político e
social (ARREAZA E MORAES, 2010).

e. Estratégia de Saúde da Família (PAIM, 2008)

Esse modelo diferencia-se dos programas até


então concebidos pelo Ministério da Saúde, que
tinham caráter vertical e paralelo às atividades dos
serviços de saúde. Surge com a proposta de ser uma
estratégia capaz de integrar e promover a
organização das atividades em saúde num território
definido. Fundamentado na perspectiva da vigilância

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Módulo 1 – História do SUS

à saúde, a Estratégia de Saúde da Família deve ser o


modelo substitutivo à rede básica tradicional, que
requer alta complexidade tecnológica e
desenvolvimento de novas habilidades e mudanças
de atitudes por parte dos profissionais.
A proposta visa promover uma reorientação da
atenção primária à saúde, a partir da articulação
entre ações de educação, vigilância, assistência e
reorganização da demanda espontânea, com vistas à
maior equidade e integralidade da atenção à saúde.

f. Acolhimento (PAIM, 2008)

Trata-se de uma proposta que busca inverter o


modelo assistencial, privilegiando uma organização
usuário-centrada do serviço. Volta-se, basicamente, à
demanda espontânea que chega nos serviços de
saúde, buscando o fortalecimento de vínculos entre
profissionais e usuários, no intuito de garantir uma
atenção mais singularizada e humanizada.

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Módulo 1 – História do SUS

Esse modelo de atenção baseia-se nas seguintes


premissas: a organização do serviço de saúde
centrado no usuário; a não rejeição à demanda;
reorganização do processo de trabalho, deslocando o
eixo central do médico para uma equipe profissional;
qualificação da relação trabalhador-usuário com base
em valores humanitários de solidariedade e
cidadania; fortalecimento de vínculos entre
profissionais e os usuários com vista a uma atenção
mais humanizada; mudanças no processos de “porta
de entrada”, recepção do usuário, agendamento das
consultas e programação da prestação de serviços a
partir da releitura das necessidades sociais de saúde.

g. Linhas de Cuidado (PAIM, 2008)

As linhas de cuidado compreendem um conjunto


de saberes, tecnologias e recursos acionados para
enfrentar riscos, agravos ou condições específicas
dos ciclos de vida. É um modelo de atenção
alternativo que baseia-se na perspectiva da

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Módulo 1 – História do SUS

regionalização da assistência à saúde e da articulação


interfederativa na busca da efetivação da
integralidade da atenção (BRASIL, 2011).
Alinhado na perspectiva da integralidade, as
linhas de cuidado são estruturadas por projetos
terapêuticos, tendo como premissa a valorização do
vínculo com o usuário a partir da atenção primária à
saúde, articulando-a com os serviços de apoio
diagnóstico e terapêutico, oferta de medicamentos,
serviço de especialidades e outros serviços. Também
visa a ampliação da oferta do nível secundário, a
regulação pública da rede do SUS, a montagem de
fluxos assistenciais sanitários centrados no usuário
com mecanismos de referência e contrarreferência,
bem como a responsabilidade da unidade básica de
saúde pelo projeto terapêutico a ser efetuado em
cada linha de cuidado.

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Módulo 1 – História do SUS

h. Promoção da Saúde

Este modelo busca a elaboração e


implementação de políticas públicas saudáveis; a
criação de ambientes favoráveis à saúde; o reforço da
ação comunitária; o desenvolvimento de habilidades
pessoais; a implantação das cidades saudáveis;
escolas promotoras de saúde; ambientes saudáveis.

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Módulo 1 – História do SUS

Inúmeros são os desafios para as políticas de


saúde no Brasil, mas podemos citar alguns que se
destacam:
● Lutar pela consolidação de um sistema de
proteção social universalista, que esteja
integrado a um modelo de desenvolvimento que
priorize a questão social;
● Superar as distorções histórico-estruturais do
sistema de saúde brasileiro;
● Ampliar a base social de apoio ao SUS;
● Assegurar o direito de todos os cidadãos à saúde,
de forma a respeitar a diversidade regional e a
necessidade de superação das desigualdades
sociais nas regiões e grupos da população;
● Assegurar uma distribuição eqüitativa de
profissionais de saúde no país;
● Investir no desenvolvimento e produção nacional
de tecnologias estratégicas;
● Instituir um modelo de atenção à saúde que
efetive os princípios doutrinários do SUS;
● Fortalecer a capacidade de gestão pública.

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Módulo 1 – História do SUS

Clicando na aula virtual abaixo, você poderá


ampliar seus conhecimentos sobre os conteúdos do
módulo 1:

Aula virtual: História do Sistema Único de Saúde


Professor Itamar Lages - UPE

Assista a aula por meio do link: https://youtu.be/6gU_9d_ZBqE

60
REFERÊNCIAS
BAPTISTA, Tatiana Wargas de Faria. História das políticas de saúde
no Brasil: a trajetória do direito à saúde. In: Matta, Gustavo Correia;
Pontes, Ana Lúcia de Moura (orgs.). Políticas de saúde: organização
e operacionalização do sistema único de saúde. Rio de Janeiro:
EPSJV/ Fiocruz, 2007.

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República


Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da
República. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.ht
m. Acesso em: 12 fev. 2023.

BRASIL. Lei Nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as


condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a
organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá
outras providências. Brasília, DF: Diário Oficial da União, 1990.
Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8080.htm. Acesso em: 12
fev. 2023.

BRASIL. Lei Nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990. Dispõe sobre a


participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde
(SUS) e sobre as transferências intergovernamentais de recursos
financeiros na área da saúde e dá outras providências. Brasília, DF:
Diário Oficial da União, 1990. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8142.htm. Acesso em: 12
fev. 2023.

61
REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto Nº 7.508, de 28 de junho de 2011. Regulamenta
a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, para dispor sobre a
organização do Sistema Único de Saúde - SUS, o planejamento da
saúde, a assistência à saúde e a articulação interfederativa, e dá
outras providências. Brasília, DF: Diário Oficial da União, 2011.

ENAP - Escola Nacional de Administração Pública. Conceitos


introdutórios sobre federalismo e federalismo fiscal. Brasília,
ENAP: 2017.

GIOVANELLA, L.; ESCOREL, S.; LOBATO, L. de V. C.; NORONHA, J.


C. de; CARVALHO, A. I. de. (Orgs.) Políticas e sistemas de saúde
no Brasil [online]. 2ª ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Editora
FIOCRUZ, 2012.

MENDES, E. V. As redes de atenção à saúde. Brasília: Organização


Pan-Americana da Saúde, 2011.

PAIM, J. S. Modelos de Atenção à Saúde no Brasil. In: Giovanella,


L; Escorel, S; Lobato, L.V.C; Noronha, J.C; Carvalho, A.I de. Políticas
e Sistemas de Saúde no Brasil. Fiocruz: Rio de Janeiro, 2008.

PAIM, J. S. O que é o SUS. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2009.

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REFERÊNCIAS
PONTE, C. F.; FALLEIROS, I. Na corda bamba de sombrinha: a
saúde no fio da história. EPSJV/COC, 2010.

SOUZA, N. O. de. Legislação do SUS esquematizada Comentada.


Natale Oliveira de Souza, Yara Cardoso Coletto. Salvador: SANAR,
2018.

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Módulo 1 – História do SUS
Material Complementar
Para dar apoio aos seus estudos sobre a “História
do Sistema Único de Saúde (SUS)”, disponibilizamos
aqui, outros materiais para complementar os
estudos:

• PONTE, C. F.; FALLEIROS, I. Na corda bamba de


sombrinha: a saúde no fio da história. EPSJV/COC,
2010.

•BERTOLLI FILHO, C. História da Saúde Pública no


Brasil. São Paulo: Ática, 1996.71p. (História em
movimento)

• MENICUCCI, T. M. G. História da reforma sanitária


brasileira e do Sistema Único de Saúde: mudanças,
continuidades e a agenda atual. História, Ciências,
Saúde, v. 21, p. 77-92, 2014. Disponível em: História
da reforma sanitária brasileira e do Sistema Único de
Saúde: mudanças, continuidades e a agenda atual

65
● Centro de Educação e Assessoramento Popular. O
SUS e a efetivação do direito humano à saúde.
Passo Fundo: Saluz, 2017.

● Vídeo Museu da Vida: Fiocruz. Um desenho sobre o


SUS. Disponível em: Um desenho sobre o SUS

● VideoSaúde: Fiocruz. A história da Saúde Pública


no Brasil- 500 anos na busca de solução. Disponível
em:A história da saúde pública no Brasil – 500 anos
na busca de soluções

● Vídeo Série SUS. Você já ouviu falar bem do SUS?.


Disponível em: VOCÊ JÁ OUVIU FALAR BEM DO
SUS?

● Vídeo Web Rádio AJIR - UECE. Políticas de Saúde


no Brasil- Um século de Luta pelo Direito à Saúde.
Disponível em: POLÍTICAS DE SAÚDE NO BRASIL -
UM SÉCULO DE LUTA PELO DIREITO À SAÚDE

● Saúde Amanhã - Fiocruz. Desafios do SUS -


Entrevista com o professor Eugênio Vilaça Mendes.
Disponível em: Desafios do SUS - Saúde Amanhã

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