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A REAÇÃO DA IMPRENSA DIANTE DAS CONSEQUÊNCIAS DO DECRETO-

LEI N° 1.261, DE 31 DE OUTUBRO DE 1904 – UM ESTUDO DA REVOLTA DA


VACINA

PRESS REACTION FACING THE CONSEQUENCES OF THE LAW NUMBER


1.261, FROM OCTOBER 31th, 1904 – A STUDY ABOUT THE VACCINE REVOLT

Jean Sulzbach Bender1

RESUMO

O presente artigo tem por objetivo principal realizar um estudo bibliográfico a respeito do
comportamento da imprensa durante o período da Revolta da Vacina. Pretende-se fazer uma
breve contextualização histórica a respeito dos acontecimentos sociopolíticos do ano de 1904
e, em seguia, discorrer subjetivamente sobre as publicações dos jornais da época, com ênfase
para o Correio da Manhã.

Palavras-chave: Revolta da Vacina. Imprensa. Jornal.

ABSTRACT

The presente article has as its main objective to do a bibliographic study about the press during
the Vaccine Revolt period. It is intended to do a brief historical contextualization about the
sociopolitical events in 1904 and, after that, subjectively discuss the newspaper publications of
the time, with a great emphasis in the “Correio da Manhã’ newspaper.

Keywords: Vaccine Revolt. Press. Newspaper.

1
Acadêmico do curso de História pela Universidade de Passo Fundo. Contato: 184358@upf.br.
INTRODUÇÃO

As ações que marcam a história sempre têm suas raízes em problemas sociais que se
agravam com o tempo e culminam em revolta quando as camadas desprivilegiadas não podem
mais suportar seu estado de miséria. Com a Revolta da Vacina, não foi diferente. No entanto,
as perguntas mais comuns acerca desse tema se fundamentam pela forma como a população
reagiu – de forma desordeira, provocando quebra-quebra e com total resistência – a algo que
lhes seria benéfico e, inclusive, salvaria vidas.

Para que seja possível compreender um pouco mais a respeito de como o povo do Rio
de Janeiro se sentiu ameaçado pela vacina desenvolvida a partir dos estudos de Oswaldo Cruz,
que combateria a varíola, é necessário que se retroceda ligeiramente no tempo, observando-se
a transformação pela qual passava a Cidade Maravilhosa no início do século XX. Em 1870,
por exemplo, o Rio de Janeiro prosperava abundantemente com as lavouras de café e outras
atividades agrícolas. O surgimento das estradas de ferro, nessa mesma época, também
impulsionou o Brasil a crescer comercial e financeiramente. Somado a tantos acontecimentos
positivos, o aumento do trabalho livre proporcionado pela abolição da escravatura concentrou
diversas parcelas da população nas cidades. No entanto, “apesar da formação de novos
bairros, iam se condensando na área central realidades críticas, oriundas da crescente
incompatibilidade entre a antiga estrutura material e as novas relações econômicas capitalistas
que nela se enraizavam.” (BENCHIMOL, J. L., 2019).

Em decorrência das transformações significativas pelas quais passava a cidade do Rio


de Janeiro, o governo de Rodrigues Alves, que havia declarado que seu governo se dedicaria
ao saneamento em decorrência de navios se negarem a atracar no porto por conta da grande
epidemia de Peste Bubônica, Febre Amarela e Varíola2, abordou a população com medidas
ligeiramente drásticas que, apesar de terem sido tomadas com intenção de resolver problemas,
acabaram por criar outros quase maiores. Sabendo-se que “oitenta por cento da população do
Rio de Janeiro não tinha participação política pelos mecanismos eleitorais” (DE
CARVALHO, J. M., 2019) e não possuía grande abrangência informativa se não por meio dos
jornais da época, é compreensível que houvesse

2
Discurso de posse de Rodrigues Alves, em 15 de novembro de 1902. In: Anais da
Assembléia Legislativa do Estado do Rio de janeiro. Disponível em:
http://www.ccs.saude.gov.br/revolta/revolta.html. Acesso em: 20 nov. 2022
manifestações populares de caráter público. Os cidadãos inativos pelo critério
constitucional revelavam-se então não só profundamente atentos a aspectos do
exercício do poder que lhes afetavam a vida cotidiana como também dispostos a ir
até as últimas consequências para defender o que consideravam seus direitos.
(IDEM)

Dessa forma, é totalmente compreensível que a população tenha ficado absurdamente


abismada com uma lei que demandava a obrigatoriedade da vacina contra a varíola, que, por
sua vez, era criada a partir do próprio vírus da varíola presente na vaca. Sustenta-se, pelo
contexto educacional da época, que os populares tenham compreendido de forma equivocada
a intenção do governo, mas, sobretudo, supõe-se que o medo que tomou conta deles era o de
que estivessem sendo submetidos à perversidade, uma vez que o investimento na vacina não
solucionava a desinformação que assombrava o povo na época.
A REAÇÃO DA IMPRENSA À REVOLTA DA VACINA

No período de 10 a 16 de novembro de 1904, os populares se organizaram, então, para


lutar pelo que acreditavam ser seu direito: não tomar a vacina. A partir desse contexto,
pretende-se observar, brevemente, as publicações dos jornais a respeito dos revoltados e do
próprio processo de vacinação. O Correio da Manhã, por exemplo, na edição de 11 de outubro
de 1904, publicou uma charge do Leônidas Freire, com uma personagem representando o
povo brasileiro e “dando uma rasteira” no Oswaldo Cruz, então responsável pelo
desenvolvimento da vacina contra a varíola.

Charge de Leônidas Freire (Léo) no Correio da Manhã, edição de 11 de outubro de


1904. Fonte: hemeroteca.3

O jornal, nesse caso, estava adiantando críticas a respeito da vacinação com certa
antecedência, uma vez que a Lei da obrigatoriedade da vacina foi aprovada pelo congresso em
31 de outubro, apenas. As edições das primeiras semanas de novembro apresentavam grande
ênfase na movimentação acerca da vacina, uma vez que a tensão que explodiria na revolta já
estava se estabelecendo de forma clara.

A edição do dia 14 de novembro, segunda-feira, apresentou o seguinte trecho:

3
Todas as edições do Jornal Correio da Manhã podem ser acessadas na íntegra por meio da hemeroteca.
Edição completa de 11 out. 1904 disponível em:
<http://memoria.bn.br/pdf/089842/per089842_1904_01216.pdf >. Acesso em 20 nov. 2022.
Recorte do Correio da Manhã. Fonte: hemeroteca.

Nesse trecho, é possível que se observe uma posição de também revolta em relação às
medidas tomadas pelo Diretório da Saúde da época para que a vacinação se cumprisse. Em
outras edições, o jornal também publicava avisos e dizeres daqueles que faziam parte da Liga
Contra a Vacinação Obrigatória, bem como reuniões de populares que precederam a revolta em
si.

Outros jornais, como o Gazeta de Notícias e O Paiz, também noticiavam, diariamente,


acontecimentos marcantes tanto por parte do governo, quanto por parte dos cidadãos e as
reações mais surpreendentes diante da obrigatoriedade da vacina. A seguir, um trecho do Gazeta
de Notícias em sua 319° edição, no dia 14 de novembro de 1904:
Recorte do Gazeta de Notícias. Fonte: hemeroteca.

Em sua edição de número 319, o Gazeta de Notícias publicou essa manchete e, em


seguida, diversos lugares diferentes do Rio de Janeiro junto dos acontecimentos dos revoltosos
que estavam se apresentando e dando forma à popular revolta. Além disso, o jornal também
publicou uma coluna a respeito do projeto de regulamento organizado por Oswaldo Cruz, o
então diretor geral de saúde pública.

Assim, a imprensa seguia uma linha geral de comunicação, tal qual era sua função. No
entanto, um estudo mais aprofundado de cada uma das primeiras páginas das edições dos jornais
da época permitiria que pudessem ser feitas algumas inferências a respeito da posição do
periódico perante ao governo e sua subjetividade discreta a respeito da vacinação em si. Por
outro lado, nada se encontra nos jornais em se tratando de informações concretas e sólidas sobre
o funcionamento da vacina propriamente dito ou uma lista sobre os benefícios que ela traria. A
revolta da vacina ocorreu, infelizmente, em meio a um cenário bastante crítico no Rio de
Janeiro, somando-se a eventos alarmantes e que tomavam a atenção do povo mais do que a
ideia de que poderiam observar outros experimentos de Oswaldo Cruz e constatar, por si
mesmos, que a vacinação estava sendo posta como um apelo à população para que outras áreas
de atuação do Brasil pudessem retomar seu curso normal, principalmente a do transporte, já que
outros países estavam se negando a atracar no porto por medo de contraírem as doenças que
estavam causando terror por aqui.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo teve como objetivo principal realizar um aprofundamento do estudo


da revolta da vacina e da reação da imprensa perante ao cenário que se desenrolava na época.
Fica claro que a área de abrangência dos estudos da área é muito vasta e poderia ser subdividida
em inúmeros estudos para uma melhor abordagem de cada aspecto. No entanto, buscou-se
compreender melhor como funcionavam os jornais e como eram estruturadas as publicações
feitas a respeito do governo e dos revoltantes. Ademais, foi abordada uma breve
contextualização do Brasil, mesmo que se tenha conhecimento da grandiosidade dos diversos
fatores que revoltavam a população quanto à vacinação obrigatória. Por fim, salienta-se a
importância da verificação da veracidade das fontes por meio das quais as notícias são recebidas
e o quando a imprensa pode influenciar nas decisões tomadas pelos populares, especialmente
aqueles que tem acesso restrito à informação.
REFERÊNCIAS

BUENO, Eduardo. A Revolta da Vacina | Eduardo Bueno. YouTube, 03 de janeiro de 2018.


Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=ToRMqivsS3w>. Acesso em: 20 de
novembro de 2022.

CRESCÊNCIO, Cintia Lima. Revolta da vacina: higiene e saúde como instrumentos


políticos. Biblos, v. 22, n. 2, p. 57-73, 2008.

DE CARVALHO, José Murilo. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não


foi. Editora Companhia das Letras, 2019.

FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. O Brasil Republicano: O


tempo do liberalismo oligárquico-vol. 1: Da Proclamação da República à Revolução de
1930. Editora José Olympio, 2019.

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