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Metodologia de Investigação em Ciências Sociais e Humanas: teoria e prática-

Clara Pereira Coutinho

Investigação Qualitativa- Resumo:

1.2.2 Perspetiva Qualitativa

- Esta surge na sequência das críticas ao positivismo (defendia que apenas


os conhecimentos científicos eram verdadeiros) e assim agregadas num
movimento que ataca o “mecanicismo” e o “reducionismo" desta visão
que menospreza a dignidade humana
- As 1ª críticas começaram com o existencialismo de Kierkegard que
recusa a possibilidade do comportamento humano se reger por leis-
cada homem é autónomo, logo a ciência é subjetiva
- Segue-se assim a psicologia humanista de Carl Rogers, que acreditava só
ser possível estudar o individuo e não grupos, afastando assim a
possibilidade de quantificar resultados
- Principais representantes do movimento antipositivista: fenomenologia,
etnometodologia e interacionismo simbólico
- Definição para a investigação qualitativa: “ não quantitativa” “ descreve
fenómenos por palavras em vez de números ou medidas”

- A nível conceptual: o objeto de estudo nas investigações são as


intenções e situações pois trata-se de investigar ideias, descobrir
significados nas ações individuais e nas interações sociais;

- A nível metodológico: a investigação baseia-se no método indutivo, pois


o propósito é desvendar a intenção, o propósito da ação estudando-a na
sua posição significativa onde o significado tem um valor enquanto
inserido nesse contexto adotando uma postura que tenta compreender
a situação e impor expectativas prévias ao fenómeno estudado.
A inter-relação do investigador com a realidade que se estuda faz com que a
construção da teoria se processe de modo indutivo e sistemático a partir do
próprio terreno à medida que os dados empíricos emergem, processo inverso
da investigação quantitativa

A teoria surge a posteriori dos factos e a partir da análise dados


fundamentando-se na observação dos sujeitos na sua interpretação de
significados próprios e não nas conexões prévias de investigadores
estatisticamente comprovados e generalizados.

Como considera Pacheco numa investigação qualitativa não se aceita uma


uniformização dos comportamentos, mas sim a riqueza da diversidade
individual:
“O interesse está mais no conteúdo do que no procedimento, razão pela qual a
metodologia é determinada pela problemática em estudo em que a
generalização é substituída pela particularização, e a relação causal e linear
pela relação contextual e complexa, os resultados inquestionáveis pelos
resultados questionáveis, a observação sistemática pela observação
experiencial ou participante,
A questionabilidade dos resultados impõe-se porque mais do que o estudo de
grandes amostras interessa o estudo de casos, de sujeitos que agem em
situações, pois os significados que compartilham são significados- em -ação.”
Como diria Shaw: mais importante que o rigor é a relevância dos significados e
daí que o propósito do investigador não seja generalizar, mas sim particularizar
e estudar os dados a partir de uma situação concreta buscando, tal como
sugere Erickson: os fatores universais concretos que possibilitam a comparação
de um caso específico com outros casos estudados anteriormente.

Para a obtenção e análise utilizam-se técnicas de observação , onde o objetivo


é recolher os dados no meio natural (observação naturalista) em que ocorrem
com a participação ativa do investigador ou seja (observação participante) ou
participação mediatizada ou seja para (observação participativa) como tudo na
investigação é particularmente útil uma metodologia mista em que se integra
um modelo quantitativo e o qualitativo, aquilo que Schulman designa de
“modelo ponte” entre a perspetiva quantitativa e a qualitativa.

A perspetiva qualitativa na relação teoria-prática perspetiva se numa


investigação de índole prática, onde o objetivo é de melhorar a prática
individual contribuindo para a descrição e compreensão situações com
concretas a teoria é interpretativa, ou seja, não é anterior aos dados, mas
surge a partir desses mesmos numa relação constante e dinâmica com a
prática sem intuitos precisos de normatividade.
A teoria hermenêutica é clarificadora iluminativa e articulada no seu esforço
de compreensão da prática social, compreender é a palavra de ordem da
teoria, por isso é que queremos compreender o que sucede numa situação
concreta, em vez de estabelecer controlo necessitamos de observar e interagir
entre todos os intervenientes de forma como operam no seu contexto natural.
O problema do estudo do investigador depende das questões práticas,
reclamando se uma maior interligação entre a teoria-prática e entre o
investigador-investigado.

1.2.3 Perspetiva orientada para a prática


- Emerge assim um terceiro enfoque na investigação das CSH denominada
de Investigação orientada ou ainda investigação aplicada (Bravo) e ainda
o modelo socio crítico (Pérez Serrano), sendo assim uma alternativa aos
dois enfoques anteriores.
- É uma investigação com forte carater instrumental, visando a tomada de
decisões, uma melhoria das praxis (união dialética entre teoria e
prática), o controlo da implantação de políticas socioeducativas ou
avaliação dos efeitos de outras já existentes.
- Numa perspetiva empírico-analítica centrada a explicação dos
fenómenos, ou numa humanístico-interpretativa na compreensão das
ações, tem por fim otimizar a prática social mediante a aquisição de
conhecimentos práticos.

- A nível conceptual, a inspiração filosófica marxista nas teorias críticas de


Adorno e Habernas à economia liberal de Marcuse á alienação
consumista das sociedades capitalistas, a nível pedagógico nas ideias de
Paulo Freire e mais recentemente de Michael Apple e Henry Giroux

O quadro teórico enquadra-se na linha de investigação por dois pressupostos


básicos:

a) Assumindo uma visão global e dialética da realidade, esta realidade não


pode ser compreendida á margem das condições ideológicas,
económicas, políticas e históricas
b) A investigação critica trata de ser uma prática social e intelectual
comprometida na luta ideológica dirigida a desvendar representações e
descobrir interesses, valores e crenças, muitas vezes implícitos na
prática social nos investigadores e investigados

- Em termos metodológicos: a investigação orientada não possui uma


metodologia própria uma vez que o objetivo do investigador crítico é
descobrir que condições objetivas e subjetivas limitam as situações e
como poderiam mudar umas e outras. A investigação implica a uma
participação e colaboração estreita entre os atores e criação de
comunidades críticas de investigação comprometidas em melhorar
práticas.

- Desta forma, o método requerido é a critica ideológica: neste método


os sujeitos são libertos da eficácia causal dos problemas sociais que
distorcem a comunicação. Para tal temos de ser reflexivos - reflexão do
sujeito sobre si mesmo ao mesmo tempo que reflete e interaje com os
outros. Este processo de reflexão é libertador do eu e dos seus
condicionamentos na busca da identidade. Este método está
direcionado a elaborar conhecimentos com fins emancipatórios e
libertadores.

- Na relação teoria-prática considera-se uma investigação de índole


prática uma vez que se articula, gera e organiza na prática desde a
prática, ou seja, esta centra-se em problemas da realidade social e na
prática dos sujeitos nela implicados, é orientada para a ação para a
resolução e problemas dessa realidade. Numa realidade em que a teoria
é emancipatória porque nasce na busca da modificação da situação real,
assumindo uma visão democrática do conhecimento.

- A teoria e a prática são chamadas a manter o que se designa por


constante tensão dialética:
O raciocínio dialético em vez de considerar os problemas da sociedade apenas
como os problemas de um agregado de indivíduos tenta descobrir inter-
relações dinâmicas interativas, mutuamente construtivas entre a vida do
sujeito e da vida social.

1.3 Tendência atual: Interação Metodológica

Surgiu um debate epistemológico entre os diversos paradigmas de enfoque


qualitativo e quantitativo.
Lukas e Santiago comenta que a polémica estaria viciada desde raiz pelas
seguintes razões:
a) Identifica-se um determinado método com um paradigma específico
b) fundamenta-se o debate paradigmático em pressupostos meta-teóricos
c) oculta se a possibilidade de utilização conjunta de métodos quantitativos
e qualitativos
Para Walker e Evers podem considerar-se 3 posições para o debate
epistemológico:
a) Incompatibilidade: os diferentes paradigmas 2 ou 3 são
epistemologicamente diferentes portão incomensuráveis e
irreconciliáveis esta posição é purista o monoteísta que tem sido
defendida por autores como Egon Guba e Yvonna Lincoln;
b) Complementaridade: tal como na postura anterior acredita-se que os
paradigmas são diferentes a nível ontológico e epistemológico, mas
aceita-se que o investigador não tenha de se enquadrar num deles como
único e melhor defende-se a complementaridade de métodos
quantitativos e qualitativos em função do que se afigura ser a melhor
solução do problema a estudar
c) Interação/ unidade epistemológica: rejeita-se o conceito de confronto
entre paradigmas advogando se alternativas que integrem ou superem o
velho conforto.

Encontramos assim diversas posições:


- Encontrando uma posição extrema que defende a adoção de um novo
paradigma a que Nisbet chama de “investigação orientada à decisão e à
mudança”.
- Howe nega a obrigatoriedade de opções metodológicas unívocas e
defende a necessidade das combinações metodológicas pois argumenta
que se o paradigma positivista é insustentável e o interpretativo está
incompleto há que encontrar uma perspetiva epistemológica capaz de
superar o antagonismo integrando aspetos de um e de outro dos
paradigmas diletantes.
- Outros consideram que a solução para o problema baseia-se em deixar
de lado os aspetos teóricos e epistemológicos do debate paradigmático
e centrar a discussão apenas no nível metodológico e técnico.
- Surge então a polémica do quantitativo vs qualitativo, onde se confunde
o método e o paradigma
- Este problema é reconhecido por Pérez Serrano reconhece que neste
equívoco é necessário aceitar que se trata de 2 níveis de decisão
diferentes e é preciso ter em conta:

a) Que a opção por um paradigma determinado não é exclusiva da


metodologia de investigação escolhida, que as metodologias não se
contradizem, mas sim se complementam;
b) Se um investigador vai empreender uma investigação qualitativa, não
implica que tenha de assumir todos os atributos do paradigma em
questão;
c) Os métodos quantitativos e qualitativos podem aplicar-se
conjuntamente dependendo das exigências da situação a investigar. A
ciência vale-se de todos os métodos, porque lhe proporcionam uma
visão mais ampla da realidade;
d) A utilização conjunta não está isenta de dificuldades, mas é a postura
cada vez mais aceite junto da comunidade científica em geral;

Observamos nos últimos anos diversas tentativas de integração das


perspetivas metodológicas quantitativa e qualitativa que nos deixam antever o
futuro de uma complementaridade metodológica em vez do antagonismo
tradicional com fins de superar a dicotomia qualitativo/quantitativo para
melhorar a conturbada reputação de utilidade e qualidade da investigação.

Para Salomon- transcender o debate qualitativo-quantitativo é uma


necessidade para quem investiga a complexa realidade social e educativa, seja
em escolas, famílias ou até culturas, onde se conglomera a intervenção de
variáveis interdependentes como comportamentos, perceções, atitudes e
expectativas. Esta análise não pode ser encarada como uma ciência exata onde
é possível isolar variáveis e factos individuais. É essencial então analisar os
problemas sociais com diversas abordagens que combinem a precisão analítica
do paradigma quantitativo com a autenticidade das abordagens sistémicas de
cariz interpretativo.
Campbell revaloriza a perspetiva qualitativa como um complemento
indispensável e insubstituível da quantitativa afirmando que os metodólogos
devem tentar conseguir uma epistemologia aplicada que interage com ambas
perspetivas.

Como comenta Anguera: “um investigador não tem de aderir cegamente a um


dos paradigmas podendo eleger livremente uma relação de atributos que
indistintamente provenham de um ou de outro se assim se conseguir uma
adaptação flexível à sua problemática.”

Bachelard considerava que captar a essência do fenómeno social era o cerne


da questão e cujas todas as opções metodológicas se deviam organizar por
essa mesma, designando-a por sentido do problema” e “o verdadeiro espírito
científico”

O investigador deve ter em mente uma estratégia flexível, adaptada não


apenas ao problema, mas também à forma como vai evoluir o decorrer da
pesquisa:

- 1º: cientista deverá estar equipado com técnicas não com métodos
- 2º: o cientista deverá ter a possibilidade de organizar e reorganizar as
estratégias adequadas às situações de investigação
- 3º: a pesquisa deverá ser perspetivada dentro de um quadro conceptual
que se aproxime cada vez mais de um sistema aberto de explicação.

Landsheere , diz que as diferenças entre quantitativo/ qualitativo ou ciências


de compreensão podem ser ultrapassadas a partir do “realismo
transcendental”, sendo este um procedimento que pressupõe a
interdependência ,por um lado, entre as análises causais e as interpretações ,e
por outro, entre as investigações quantitativas de regularidades e a
generalização.

Neste esquema observamos a forma como as duas abordagens se


complementam no processo da investigação social, consolidando teorias e o
progresso do conhecimento:

Wiersma fala num contínuo qualitativo- quantitativo em vez da existência de


diferenças conceptuais e metodológicas de cariz dicotómica entre ambos os
paradigmas:
Lukas e Santiago encontram pontos críticos de convergência entre
metodologias de investigação, quantitativas ou qualitativas. Assim, podemos
concluir que as tentativas de aproximação e o proliferar de planos multi e pluri
metodológicos combinando métodos quantitativos e qualitativos são uma das
características mais marcantes na investigação atual das ciências sociais e
humanas.
1.4 Métodos/Planos de investigação

No entanto, as designações que os autores mais conceituados propõem para


os diferentes modelos metodológicos nem sempre coincidem:

Com o objetivo de realizar uma abordagem clara e capaz de enquadrar a


generalidade dos focos de investigação ou métodos, destaco os seguintes
enfoques:

1. A conceção do fenómeno social: investigação nomotética - pretende


estabelecer leis gerais que implicam a utilização de métodos
quantitativos, a investigação ideográfica- que enfatiza o individual e
particular sem pretender chegar a lei gerais nem ampliar o
conhecimento teórico através do tratamento qualitativo de dados;
2. Finalidade: distingue-se a investigação pura ou básica, se o objetivo é
conseguir novos conhecimentos aumentar a teoria, da investigação
aplicada se está encaminhada para a resolução de problemas práticos
sem preocupações por generalizar resultados e incorporar teorias;
3. A natureza dos dados: a investigação pode ser quantitativa (objetivista,
nomotética, utilizando a recolha de dados com base em provas
objetivas, a aplicação de técnicas estatísticas para analise dados) ou
qualitativa (desde “dentro” -interpretativa- dirigida ao particular-
ideográfica);
4. A manipulação de variáveis: pode ser descritiva (não se manipulam as
variáveis) experimental (onde se manipulam as variáveis) ou ex post
facto (não se controla a variável independente porque ocorreu de forma
natural estuda-se o fenómeno depois de ter acontecido);
5. O objetivo: podemos considerar os métodos ou planos descritivos (que
descrevem um fenómeno), explicativos (onde o objetivo é explicar os
fenómenos), experimentais (onde o objetivo é controlar o fenómeno) ou
preditivos (onde o objetivo é prever o fenómeno);
6. O alcance temporal: a investigação é transversal se estas estudam um
aspeto dos sujeitos num dado momento, e longitudinal estuda os
sujeitos em diferentes momentos. Chama-se painel de observação se
incide sobre os mesmos sujeitos e de tendência se os sujeitos são
diferentes
7. Profundidade: é possível distinguir:

a) A investigação exploratória de caráter provisório na medida que se


realiza para obter um primeiro conhecimento da situação que se quer
estudar;
b) A investigação descritiva que tem como objetivo principal descrever os
fenómenos utiliza os métodos descritivos e inclui grande variedade de
estudos como os Survey;
c) A investigação comparativa ou causal quando se procura encontrar
relações causa efeito entre fenómenos sem manipular as variáveis
porque variável independente e fixa é o caso dos denominados ex pós
facto ou o comparativo-causal dos estudos correlacionais;
d) A investigação experimental onde se manipula uma variável
independente e estudou os efeitos sobre as variáveis dependentes em
grupos de sujeitos que devem ser equivalentes (selecionados de forma
aleatória) utilizando métodos quantitativos para análise de dados;
e) A investigação quase experimental que é semelhante à anterior, mas
para o caso de os grupos não serem equivalentes.

Dependendo do número de indivíduos, é usual distinguir os estudos de grupo,


que partem de grandes amostras selecionadas por técnicas de amostragem
probabilística para garantir representatividade, utilizando uma metodologia
quantitativa ou os estudos de sujeitos únicos, em q se analisa um só sujeito, ou
um grupo muito reduzido, este critério pode ser utilizado em metodologias de
cariz quantitativo ou qualitativo.

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