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A ANÁLISE DOS DEZ MANDAMENTOS NUMA PERSPECTIVA FILOSÓFICA

Este trabalho tem por objetivo uma análise filosófica dos dez mandamentos, lei que foi dada por Deus a
Moisés, no monte Sinai, segunda a Bíblia (Ex, 20, 1-17). Para tanto, se faz necessidade explanar alguns
subtemas que são a base de uma possível síntese entre filosofia e as dez leis sagradas do judaísmo: 1) é a
filosofia da religião que deve nortear tal tema; 2) a área filosófica do referido tema é a ética; 3) o filósofo
de base é Agostinho, ou Santo Agostinho.

1 FILOSOFIA E RELIGIÃO

Antes de entrar no ponto central deste trabalho, se faz necessário abordar essas duas disciplinas -
filosofia e religião - e como pode ser de grande valia o auxílio de uma a outra disciplina, tendo em vista
que ao longo da história, as duas foram tratadas em campos opostos.

A filosofia de tradição grega afirmava que é possível se chegar ao conhecimento das verdades eternas e
necessárias por um esforço do intelecto; a religião afirmava que sem o auxílio divino, o intelecto humano
não poderia chegar ao conhecimento das verdade eternas e necessárias.

Assim, esta polaridade, de uma certa forma, foi superada em partes na Idade Média com as correntes da
patrística e da escolástica: correntes filosóficas do cristianismo que tentou fundamentar a fé (teologia)
como sendo justificada pela razão (filosofia). Cabe registrar que no final da Idade Média, o filósofo
Guilherme de Ockham já dava sinais da crise que fez a filosofia romper com a teologia surgindo assim a
chamada Modernidade. Todavia, este trabalho é apenas um recorte, pois é evidente que o surgimento
da modernidade teve vários desdobramentos e não apenas este.

Embora a modernidade tenha causado um cisma entre filosofia e religião, não se pode negar que surgem
às vezes inquietações na religião que ela mesma não consegue explicar sem o auxílio da filosofia, tais
como: como podemos explicar a fé de forma racional? Como chegamos à ideia de Deus de forma
universal? E o problema que nos cabe neste trabalho: como explicar com base na filosofia, os dez
mandamentos como leis tão sintéticas e genéricas? Neste sentido é que a Filosofia pode ajudar a
religião.

2 A ÉTICA E NOS DEZ MANDAMENTOS

Concernente ao que foi desenvolvido antes, cabe explicar agora essa relação dos Dez Mandamentos com
a Ética. Antes disso é importante explicar também sobre a diferença entre mitologia e religião.

Segundo os estudiosos, a mitologia associava os fenômenos naturais como sendo manifestações das
divindades na terra, neste sentido, eram naturais a visão antropomórfica dos deuses que se
transformavam em seres humanos ou mesmo animais e fenômenos da natureza. Essa orientação mítica
foi comum na maioria dos povos antigos.

No entanto, a religião surge muito diferente das mitologias, sendo quase consenso que é no século VI a
IV a.c, que diversos povos começam a modificar sua interpretação do divino: surgindo a religião
monoteísta hebraica, o budismo oriental, e a religião órfica de tradição pitagórica na Grécia. Deste
modo, a principal diferença entre a interpretação das divindades para religião era que a natureza de
Deus não poderia se confundir com a natureza terrena, se rompe a confusão entre Deus e os fenômenos
naturais da mitologia; outro fato era que o Deus da religião surge como um mediador moral: as leis vêm
por ordem de Deus, que organiza esse cosmos de forma justa e boa.

Para ser feliz, os homens devem seguir as regras divinas. Deus não participa do mesmo ser das coisas
terrena, ao contrário, Deus tirou de si um fragmento do seu ser e deu as suas criaturas.

Veja que surge a chamada ética antiga, teleológica, baseada não apenas no telos (fim), que neste sentido
é a felicidade da humanidade, mas também uma ética teológica, sobre a ótica de um Deus ordenador, de
substâncias diferente da humana, mas que cria e ordena esse universo. Seguir uma religião é, ou era, a
garantia da felicidade do indivíduo. Não foi diferente no fundamento dos dez mandamentos da lei de
Moisés, assunto que trataremos de forma mais específica no próximo capítulo.

3 AGOSTINHO E A ILUMINAÇÃO DIVINA

Para o filósofo Agostinho de Hipona, o ser humano não chega às verdades eternas e necessárias por
meio do esforço do próprio intelecto. Agostinho se opôs a essa teoria que foi fundamentada por Platão.
O intelecto humano é iluminado pelo ser que foi doado por Deus. Essa ser é a alma elemento essencial
da natureza específica do ser humano.

Veja que se pode mesmo, assim como o filósofo Agostinho interpretar a passagem do Êxodo quando
Moisés recebe de Deus os Dez Mandamentos: Jeová, não é a lei, nem é o Monte, nem se manifesta no
corpo de Moisés, mas ele mesmo escreveu nas tábuas de pedra a sua lei. Lei esta que os homens devem
seguir para serem felizes em sociedade. Essas leis, ou aliança, começa com o povo eleito, mas deve ser
expandidas de modo universal.

Nota-se que, a justificação do surgimento dessas leis não são algo individual, surgindo de modo
particular, mas algo que vai além do físico, no caso da religião, vem de Deus: tais leis são universais,
devem funcionar para todos. Assim, se analisar os dez mandamentos, de forma mais geral, é possível
verificar que tais regras se aplicam a todos os povos, mesmo os que nunca tiveram contato com a Bíblia.

CONCLUSÃO

O que se pode concluir com este trabalho? Primeiro, foi visto que há questões na religião que se
necessita de explicações filosóficas, como este trabalho que aqui se desenvolve, a interpretação racional
dos dez mandamentos que não anula nem Deus nem a tradição bíblica, mas garante a justificativa do
caráter universal da lei do decálogo.

No segundo ponto, foi exposto a diferença da religião para com a mitologia: na primeira havia a
necessidade de explicar a divindade como ordenadora do cosmo com suas leis feita para a felicidade dos
humanos, também mostrar Deus como substância diferente dos fenômenos naturais. Na mitologia,
embora aborde a importância das divindades, temos uma mistura de fenômenos naturais e os deuses,
além dos deuses mitológicos serem responsáveis dos males humanos.

O terceiro tópico foi analisar de forma profunda a ideia de ética como conceito universal, tendo os dez
mandamentos como uma analogia interpretativa do fundamento ético divino das leis que devem ser
justas. O filósofo norteador foi Agostinho. Veja que na religião o mal, o fatalismo humano, não é de
responsabilidade de Deus, mas ao contrário. Para Agostinho, o mal é um afastamento das leis de Deus.
Deus não quer o mal, nem é responsável por ele. As leis de Deus se manifestam nos dez mandamentos
que orientam a felicidade que tem por base a personificação da justiça na terra. Veja que essas ideias
não são simplesmente religiosas, já que tem uma linha que se fundamenta em uma ética, não sendo
apenas particular de uma grupo mas do Bem a todos.

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