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FILOSOFIA

Tema 3 - Positivismo e Utilitarismo: de Comte a Bentham e Stuart Mill

Positivismo - O Positivismo é uma corrente de pensamento filosófico que surgiu na Europa,


mais precisamente na França, entre os séculos XIX e XX. Desenvolvida pelo pensador Auguste
Comte, defendia que o conhecimento científico era a única forma de conhecimento válido.

O positivismo é uma escola filosófica que sustenta que todo conhecimento genuíno é
verdadeiro por definição ou positivo – ou seja, fatos a posteriores a derivados pela razão e pela
lógica da experiência sensorial. Outras formas de conhecimento, como intuição, introspeção
ou fé religiosa, são rejeitadas ou consideradas sem sentido

O positivismo defende a ideia de que o conhecimento científico é a única forma de


conhecimento verdadeiro. De acordo com os positivistas, somente se pode afirmar que uma
teoria é correta se ela foi comprovada através de métodos científicos válidos. Os positivistas
não consideram os conhecimentos adquiridos por meio de crenças religiosas, superstição ou
qualquer outro, do campo espiritual, intuitivo ou transcendente, que não possa ser
comprovado cientificamente. Para eles, o progresso da humanidade depende exclusivamente
dos avanços científicos. Assim, o positivismo desenvolvido na segunda fase da carreira de
Comte, associa uma interpretação das ciências e uma classificação do conhecimento a
uma ética apenas humana radical.

Para Comte, o positivismo é uma doutrina filosófica, sociológica e política. Surgiu como
desenvolvimento sociológico do iluminismo, das crises social e moral do fim da Idade Média e
do nascimento da sociedade industrial, processos que tiveram como grande marco a
Revolução Francesa (1789-1799). Em linhas gerais, ele propõe à existência humana valores
completamente humanos, afastando radicalmente a teologia e a metafísica (embora
incorporando-as em uma filosofia da história).

Embora a abordagem positivista tenha sido um tema recorrente na história do pensamento


ocidental, o positivismo moderno foi articulado pela primeira vez no início do século XIX por
Auguste Comte. Sua escola de positivismo sociológico sustenta que a sociedade, como o
mundo físico, opera de acordo com leis gerais.

A ideia-chave do positivismo comtiano é a Lei dos três estados, de acordo com a qual o
entendimento humano passou e passa por três estágios em suas conceções, isto é, na forma
de conceber as suas ideias e a realidade:

1. Teológico: o ser humano explica a realidade por meio de entidades supranaturais (os
"deuses"), buscando responder a questões como "de onde viemos?" e "para onde
vamos?"; além disso, busca-se o absoluto;
2. Metafísico: é uma espécie de meio-termo entre a teologia e a positividade. No lugar
dos deuses há entidades abstratas para explicar a realidade: "o Éter", "o Povo", "o
Mercado financeiro", etc. Continua-se a procurar responder a questões como "de
onde viemos?" e "para onde vamos?" e procurando o absoluto. É a busca da razão e
destino das coisas.
3. Positivo: etapa final e definitiva, não se busca mais o "porquê" das coisas, mas sim o
"como", por meio da descoberta e do estudo das leis naturais, ou seja, relações
constantes de sucessão ou de coexistência. A imaginação subordina-se à observação e
busca-se apenas pelo observável e concreto.
Características do positivismo

Doutrina filosófica: a inspiração política do positivismo estava no Iluminismo. Os primeiros


filósofos iluministas defendiam que o conhecimento deveria ser universalmente estimulado,
mediante uma educação emancipadora para levar a autonomia social a um nível em que a
humanidade progrediria moralmente pelos frutos do progresso intelectual. Esse progresso
somente seria pleno, no momento em que todos se juntassem em prol da busca pelo
conhecimento esclarecedor sobre o mundo.

Doutrina sociológica: a ordem social estaria intimamente ligada ao desenvolvimento moral e


ao desenvolvimento científico. Portanto, seria necessário, além de entender a natureza,
entender o funcionamento da sociedade, levando em conta a atuação dos seres humanos e
criando teorias doutrinárias que ditassem um modo de agir que levasse ao progresso. O rigor e
a ordem eram imperativos nessas teorias, pois eram eles que garantiriam o pleno
desenvolvimento humano.

Doutrina política: a disciplina, o rigor e a ordem social eram requisitos políticos para a garantia
do avanço social na visão de Comte. Somente com ações voltadas para o desenvolvimento de
uma disciplina pessoal e coletiva, cultivada juntamente com o aprendizado das ciências e com
o trabalho sociológico, a política poderia render um estágio de progresso capaz de levar a
humanidade ao seu ápice.

Desenvolvimento das ciências e das técnicas: a tecnologia e a ciência eram partes


importantíssimas da teoria de Auguste Comte. Segundo o filósofo, nenhum progresso seria
possível no estágio positivo sem o alto grau de aperfeiçoamento científico aliado ao alto
desenvolvimento tecnológico, o que impulsionaria a humanidade sempre adiante.

Religião positiva: a religião sempre foi característica comum da humanidade. Os seres


humanos sempre buscaram o culto a algum tipo de divindade para explicar o inexplicável.
Como a busca por explicações mais elaboradas é marca comum do estágio positivo, a religião
tradicional daria lugar, segundo o pensamento positivista, a um novo tipo de religião, o
cientificismo. O cientificismo seria o ato de depositar nas ciências toda a fé em relação ao
conhecimento e ao desbravamento do mundo, entendendo que não há sobrenatural, mas
somente natureza. As ciências ocupariam, para os positivistas, o lugar que Deus ocupou nas
religiões desenvolvidas até então.

Utilitarismo - O utilitarismo é uma doutrina que avalia a moral e, sobretudo, as consequências


dos atos humanos. Caracteriza-se pela ideia de que as condutas adotadas devem promover a
felicidade ou prazer do coletivo, evitando assim as ações que levam ao sofrimento e a dor.

O utilitarismo de John Stuart Mill


John Stuart Mill é o defensor de uma teoria chamada «utilitarismo*. O utilitarismo caracteriza-
se por defender que: a única coisa que tem valor intrínseco é a felicidade; e a ação correta é
aquela, de entre as alternativas disponíveis, que mais promove a felicidade.

O princípio da utilidade (ou princípio da maior felicidade) Segundo Mill, o fundamento da


moralidade é aquilo a que ele decidiu chamar de «princípio da utilidade» (ou princípio da
maior felicidade). Este princípio estabelece que: «As ações são corretas na medida em que
tendem a promover a felicidade, e incorretas na medida em que tendem a gerar o contrario da
felicidade.». Mil justifica a sua perspetiva da seguinte forma: «A única prova que se pode
apresentar para mostrar que um objeto é visível é o facto de as pessoas efetivamente o verem.
A única prova de que um som é audível é o facto de as pessoas o ouvirem, e as coisas passam
se do mesmo modo com as outras fontes da nossa experiência. Similarmente, entendo que a
única evidencia que se pode produzir para mostrar que uma coisa ê desejável é o facto de as
pessoas efetivamente a desejarem. Se o fim que a doutrina utilitarista propõe a si própria não
fosse, na teoria e na prática, reconhecido como um fim, nada poderia alguma vez convencer
qualquer pessoa de que o era. Não se pode apresentar qualquer razão para mostrar que a
felicidade geral é desejável, exceto a de que cada pessoa, na medida cm que acredita que esta
é alcançável, deseja a sua própria felicidade. Isto, no entanto, sendo um facto, dá-nos não só
toda a prova que ocaso admite, mas toda a prova que é possível exigir, para mostrar que a
felicidade é um bem: que a felicidade de cada pessoa e um bem para essa pessoa e. logo, a
felicidade geral um bem para o agregado de todas as pessoas.»

A argumentação geral de MiII pode ser explicitamente formulada conforme se segue:

Assim, o padrão da maior felicidade do principio da utilidade ou principio da maior felicidade}


não se refere apenas à maior felicidade do próprio agente, mas sim à maior felicidade geral, ou
seja, à felicidade de todos os seres sencientes (incluindo animais não humanos} afetados pela
nossa ação. Isto significa que, para Mill, se tivermos de sacrificar o nosso bem pessoal para
garantir uma maior quantidade total de felicidade, então é precisamente isso que devemos
fazer. Eis o que Mill tem a dizer a este respeito:

«[A] felicidade que constitui o padrão utilitarista do que está correto na conduta não é a
própria felicidade do agente, mas a de todos os envolvidos - algo que os críticos do utilitarismo
raramente fazem a justiça de reconhecer. O utilitarismo exige que o agente seja tão
estritamente imparcial entre a sua própria felicidade e a dos outros como um espetador
desinteressado e benevolente.» Desta forma, Mill responde à acusação de que a ética
utilitarista é uma ética egoísta, focada apenas no interesse pessoal e na promoção daquilo que
é mais útil para o próprio agente. Com esta salvaguarda, Mill rebate facilmente essa crítica
afirmando que, uma vez que distorce e ridiculariza a doutrina utilitarista, esta crítica não passa
de uma falácia do espantalho (ou boneco de palha).

O hedonismo é a perspetiva de que a felicidade consiste apenas no prazer e na ausência de


dor.

“Por felicidade, entendemos o prazer, e a ausência de dor; por infelicidade, a dor, e a privação
de prazer.”

Mill argumenta que quem quer que tenha a experiência quer de prazeres
intelectuais/espirituais, quer de prazeres corporais não trocaria a oportunidade de fruir dos
primeiros por nenhuma quantidade imaginável dos segundos. Ora, isso indica que os prazeres
intelectuais/espirituais são qualitativamente superiores aos prazeres corporais e, por
conseguinte, devemos dar-lhes preferência, recusando-nos a trocá-los por uma quantidade
idêntica, ou mesmo maior, de prazeres corporais. Mill defende-se deste modo da acusação de
que, uma vez que defende que a vida humana não tem um fim mais elevado do que o prazer, o
utilitarismo ê *uma doutrina digna apenas de porcos- Para Mill, este tipo de acusação não
afeta tanto o utilitarismo quanto os seus críticos, pois são estes (e não a sua doutrina) que
parecem estar a pressupor que os seres humanos são incapazes de sentir prazeres além
daqueles que os porcos sentem.

De acordo com o que foi dito até agora, podemos concluir que para determinar se uma ação é
correta ou errada, tudo o que temos de fazer é pensar como é que ela afeta cada um dos
indivíduos envolvidos, ponderando imparcialmente os benefícios e os prejuízos que a sua
realização trará a todos os indivíduos afetados pela mesma. Ora, isto significa que. de acordo
com o utilitarismo, em qualquer situação, a ação correta é aquela que, comparada com todas
as alternativas, tem as melhores consequências, ou seja, aquela que gera o melhor estado de
coisas possível, independentemente das intenções e motivações do agente.

Diz-se que uma teoria moral e consequencialista quando esta estabelece que o estatuto moral
dos atos depende exclusivamente das suas consequências.

Uma teoria é agregacionista se, e só se, considera que um determinado estado de coisas é
melhor do que outro, no caso de ter um maior total de bem, independentemente da forma
como este se encontra distribuído.

Críticas à ética de Mill

O facto de algo ser desejado não prova que deve ser desejado, mas sim que pode ser

desejado (num sentido descritivo). Contudo, Mill pretende estabelecer que a felicidade de

cada pessoa é desejável para si mesma, num sentido normativo.

A falácia da composição consiste em atribuir ao todo características que apenas podem ser
legitimamente atribuídas a cada uma das suas partes. Por exemplo, considerar que do facto de
que cada um dos alunos da turma ser pessoa se segue que a turma é uma pessoa é incorrer na
falácia da composição. Alegadamente, Mill incorre nessa falácia ao considerar que o facto de a
felicidade de cada pessoa ser, por si mesma, desejável para cada uma delas é uma condição
suficiente para que a felicidade geral seja, por si mesma, desejável para o agregado das
pessoas.
Se o hedonismo fosse verdadeiro, estaríamos apenas interessados em obter o maior saldo
possível de experiências aprazíveis. Se estivéssemos apenas interessados em obter o maior
saldo possível de experiências aprazíveis, aceitaríamos ligar-nos a uma maquina que
subjetivamente nos desse o maior saldo possível de experiências aprazíveis. Não estamos
dispostos a ligar-nos a uma máquina como essa. Logo, não estamos apenas interessados em
obter o maior saldo possível de experiências aprazíveis. Logo, o hedonismo é falso.

À escala individual faz sentido tomarmos decisões com base num balanço entre perdas e
ganhos, ou seja, pode justificar-se fazer um determinado sacrifício pessoal, se isso nos permitir
obter uma maior satisfação global das nossas preferências. Mas isso só acontece porque a
pessoa que faz o sacrifício e a pessoa que recebe o benefício são uma e a mesma. Contudo, o
mesmo não se verifica se estivermos apenas a considerar o maior total de bem-estar da
sociedade como um todo, sem ter em conta a forma como este se encontra distribuído.

A conclusão repugnante, outra consequência repugnante relacionada com o caráter


agregacionista do utilitarismo de Mill é a seguinte: uma ação que resultasse numa sociedade
com um grande número de indivíduos com vidas que quase não merecem ser vividas seria
preferível a uma sociedade com poucos indivíduos com elevados índices de bem-estar.

Uma das críticas mais frequentes ao utilitarismo consiste na acusação de que, uma vez que
esta teoria estabelece que o estatuto moral dos atos depende apenas das consequências, não
há limites aquilo que é permitido.

Uma das críticas que se faz ao utilitarismo é que esse pensamento poderia nos levar a
considerar que os interesses de grupos minoritários podem ser facilmente sacrificados em prol
dos da maioria, o que é bem problemático.

Por fim, o utilitarismo também tem vindo a ser condenado por ser demasiado exigente isto
acontece porque esta teoria considera que é sempre errado fazer algo que não contribua para
a felicidade geral no maior grau possível, ou seja, nunca é aceitável fazer menos do que
maximizar a felicidade geral por maiores que sejam os sacrifícios pessoais que isso implique.

O utilitarismo de Bentham

Um dos antecessores de J.S. Mill, chamado Jeremy Bentham, defendia uma versão puramente
quantitativa de hedonismo. De acordo com esta perspetiva, para calcular a felicidade, ou bem-
estar, causada por uma dada ação temos de ver como ela afeta cada um dos indivíduos
envolvidos, subtraindo a quantidade de dor à quantidade de prazer que ela provoca. Essas
quantidades de dor e de prazer, por sua vez, seriam calculadas exclusivamente com base na
sua intensidade e na sua duração Bentham diria, por exemplo, que uma dolorosa visita ao
dentista poderia ainda assim revelar-se a coisa certa a fazer, desde que a dor intensa, mas de
curta duração, provocada por essa experiência fosse suplantada por um bem-estar futuro
bastante prolongado no tempo.

Mill estaria apenas parcialmente de acordo com o seu antecessor. Na sua opinião, além da
quantidade de prazeres era fundamental ter em conta a sua qualidade. Isto significa que,
contrariamente ao seu antecessor, Mill defendeu uma versão qualitativa de hedonismo.
Segundo Mill, existem prazeres qualitativamente superiores a outros, ou seja, há prazeres
intrinsecamente melhores do que outros.

DILEMA DO BONDE
Vejamos um exemplo do pensamento utilitarista: imagine um bonde desgovernado que está
indo em direção a cinco pessoas presas nos trilhos.

Se você pudesse mudar a direção do bonde para uma rota onde o bonde mataria apenas uma
pessoa, que decisão tomaria?

A questão em que reside a dificuldade, para muitos, é que deixar o bonde percorrer seu curso
normal e matar as cinco pessoas implica não tomar parte no acontecido, ou seja, implica
deixar o curso natural das coisas acontecer. Acionar a alavanca que faz o bonde mudar de
direção, entretanto, seria tornar-se responsável pela morte daquele um indivíduo.

De acordo com o utilitarismo, a decisão a se tomar é certamente a de mudar a rota do bonde,


já que, neste caso, morreriam menos pessoas.

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