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Teoria Política
2. O Welfarista - 16
O utilitarista tem assim uma conceção «welfarista» do bem, e é este o segundo traço essencial
da sua perspetiva.
Defende que o bem ou valor a promover consiste única e exclusivamente no bem-estar
(welfare ou Well-being).
3. O Agregacionismo - 16
E, se o welfarista for um utilitarista, dirá depois que não interessa como bem-estar se distribui
pelos diversos indivíduos em consideração: o melhor ato será simplesmente aquele que
resultar numa maior utilidade total.
Para avaliar o estado de coisas que engloba as consequências de cada ato, importa apenas
agregar o bem-estar que cada indivíduo obtém nesse estado de coisas e, dividir a utilidade
resultante da agregação pelo número de indivíduos.
Implica uma insensibilidade à distribuição do bem-estar (divisão da utilidade resultante da
agregação pelo nº de indivíduos).
1-BEM-ESTAR - 16
Os Utilitaristas divergem entre si quanto à conceção de bem-estar.
Os clássicos adotaram o hedonismo: Diz que o que faz a vida de um individuo correr melhor
para si é apenas a existência de experiencias boas e a ausências de experiencias más.
2
Bentham defende que os melhores prazeres são os mais intensos e prolongados.
O hedonismo afirma que o bem-estar depende apenas de certos estados mentais, de
determinadas experiencias que se tem ao longo da vida. - 17
Nozicque critica dizendo que se os hedonistas tivessem razão, seria irracional e pensando em
termos de interesse pessoal e Parfit defende que se adote uma situação híbrida, onde o bem-
estar dependa da presença de certos bens com valor, independentemente de serem desejados
ou de proporcionarem prazer. Porém, esses bens só contribuem para o bem-estar do individuo
se ele os desejar ou obter prazer com a sua realização.
Considere-se, por exemplo, uma situação em que uma grande maioria fanática deseja
intensamente que uma minoria inofensiva seja exterminada. Se o extermínio resultar numa
maior satisfação de preferências, o utilitarista terá de o aprovar.
De modo a excluir preferências eticamente condenáveis, como a de exterminar grupos de
inocentes, o utilitarista de preferências dispõe de duas hipóteses: - 18
1. Uma delas consiste em defender que aquilo que importa não é o que as pessoas
desejam de facto, mas aquilo que elas desejariam se estivessem devidamente
informadas ou fossem racionais.
2. O utilitarista pode também optar pela exclusão das preferências externas.
2-CONSEQUENCIALISMO - 19
Os utilitaristas discordam entre si não só quanto ao modo como concebem o bem-estar, mas
também quanto ao tipo de consequencialismo que consideram mais credível.
Diversas versões se desenvolveram ao longo do séc.XX, mas as duas que mais interessam são:
a) O consequencialismo dos atos:
Defendem a aplicação direta do padrão consequencialista a atos particulares, isto é, em todas
as circunstâncias, o ato obrigatório é aquela cuja realização resultar no máximo valor
impessoal. Cada um de nós deve pôr de lado os seus compromissos e projetos pessoais,
sempre que tal seja necessário para produzir as melhores consequências.
Um dos problemas dos consequencialistas dos atos é entrarem em conflito com as instituições
morais comuns. Por ex: opõem-se aos deontologistas, que defendem restrições gerais
centradas no agente e limitam o que cada um pode fazer a qualquer outra pessoa,
sustentando que há obrigações especiais que alguns indivíduos têm para com os outros em
virtude de manterem com eles uma certa relação. - 20
Defendem ainda que maximizar o bem não implica desrespeitar obrigações gerais ou
obrigações especiais, pelo que podemos desenvolver compromissos e projetos sem atender
sempre ao seu valor impessoal. - 20
Por exemplo, não podemos torturar uma pessoa para evitar que outros torturem várias
pessoas. - 20
3
Suponha-se que um agente tinha de escolher entre salvar o seu filho e salvar duas crianças
com as quais não mantinha qualquer relação relevante. Um consequencialista dos atos
aprovaria a segunda opção, ao passo que um deontologista em virtude de reconhecer
obrigações especiais, aprovaria a primeira. - 21
Uma das objeções recorrentes ao consequencialismo dos atos é a de ser demasiado exigente,
pois impõe sacrifícios que não são obrigatórios, ainda que fosse louvável fazê-los. - 21
Uma situação paradigmática é esta: um cirurgião pode salvar cinco pacientes se matar uma
certa pessoa e usar os seus órgãos em transplantes. - 21
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4-DEFESAS DO UTILITARISMO - 25
Em Filosofia, o utilitarismo é uma doutrina ética que prescreve a ação (ou inação) de forma a
optimizar o bem-estar do conjunto dos seres sencientes (que sentem: dor, prazer…).
O utilitarismo é então uma forma de consequencialismo, isto é, avalia uma ação (ou regra)
unicamente em função das suas consequências.
Filosoficamente, pode-se resumir a doutrina utilitarista pela frase: Agir sempre de forma a
produzir a maior quantidade de bem-estar (Princípio do bem-estar máximo).
Trata-se de um moral eudemonista (ética da busca de uma vida feliz com base em valores
morais), mas que, contrariamente ao egoísmo, insiste na consideração do bem-estar de todos
e não o de uma só pessoa.
Foram Jeremy Bentham (1748-1832) e John Stuart Mill (1806-1873) que sistematizaram o
princípio da utilidade e conseguiram aplicá-lo a questões concretas: sistema político,
legislação, justiça, política económica, liberdade sexual, emancipação feminina, etc.
Segundo Stuart Mill justificar o utilitarismo é mostrar que só a felicidade geral é desejável
como fim para o agregado de todas as pessoas e que só a felicidade de uma pessoa é um bem
para ela mesma. Aceitar a ética utilitarista implica uma forte disposição para o altruísmo. - 25
Princípio maximin de Rawls: Escolha da opção que tem o melhor pior resultado possível. - 28
5-JUSTIÇA E LIBERDADE - 29
Na esfera da política, a objeção mais comum ao utilitarismo diz respeito à justiça distributiva: o
utilitarismo sanciona distribuições injustas de bens porque nos diz que seria aceitável - ou
melhor, obrigatório - canalizar recursos dos mais pobres para um número suficientemente
vasto de pessoas bastante abastadas, se assim se obtivesse um maior bem-estar total ou
médio. Por exemplo, se manter alguns escravos resultar numa maior felicidade geral,
deveremos aceitar a escravatura. - 29
O utilitarista, sugere Rawls, estende impropriamente este princípio à sociedade como um todo,
pelo que toma obrigatório que alguns se sujeitem (ou sejam sujeitados) a enormes sacrifícios
para benefício de muitos outros. E esta extensão é inadequada porque ignora o facto de as
pessoas serem sujeitos distintos, com uma vida própria para viver.
Perante esta crítica, uma possibilidade é rejeitar o agregacionismo, mas preservar os outros
dois traços essenciais do utilitarismo, isto é, que seja consequencialista e welfarista. - 29
Muitos alegam que, devidamente aplicado em circunstâncias sociais realistas, o utilitarismo
sanciona um igualitarismo moderado. -29
De um modo geral, os utilitaristas aprovam políticas resolutas de redistribuição da riqueza ao
mesmo tempo que insistem na proteção de liberdades individuais, pelo que hoje parecem
aprovar o estado-providência que encontramos nas democracias liberais europeias. - 30
5
6-A RELEVÂNCIA DO UTILITARISMO - 31
Será apropriado ter em conta a perspetiva utilitarista quando nos ocupamos de questões
normativas, pois não é preciso aceitá-la para acreditar não só que um elemento importante na
avaliação de práticas, políticas e instituições é o seu impacto no bem-estar geral, mas também
que esse elemento é frequentemente decisivo. - 31
O utilitarismo talvez não nos dê, em última análise, tudo o que precisamos de levar em conta
quando examinamos questões morais e políticas, mas é difícil negar a relevância da perspetiva
utilitarista. - 31
1. O utilitarismo do ato estabelece que uma ação o é moralmente correta quando os seus
efeitos incrementam, em vez de diminuir, a felicidade geral; e,
2. O utilitarismo de regra sustenta que o princípio da utilidade não deve ser aplicado
diretamente para avaliar os atos individuais, mas deve-se aplicar às práticas, regras ou
instituições que sirvam para determinar a moralidade dos atos individuais. O ato de avaliar fica
assim submetido à aplicação de uma certa regra. Os seus adeptos postulam que esta mediação
entre o princípio de utilidade e os atos permite evitar certos resultados nefastos (ex: a
justificação da tortura de um inocente, para evitar males maiores a outros). Contudo, autores
como H. M. Hare sustentam que quando o utilitarismo de ato se combina com o princípio da
universalização, estamos dentro do utilitarismo de regra. Este autor propôs, em 1981, o
utilitarismo de preferência, frente ao utilitarismo de felicidade.
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TEMA 2 - LIBERALISMO IGUALITARIO
7
Hobbes chama a atenção para o facto de uns indivíduos terem menos e outros mais (força
corporal), mas também para o facto de que essas diferenças não são assim tão grandes que
impeçam o mais fraco de vencer o mais forte (pela astúcia). Da mesma forma, a igual
racionalidade e razoabilidade dos cidadãos em Rawls qualifica-os igualmente como seres
capazes de uma conceção do bem e de um sentido de justiça, ainda que eles não sejam
estritamente iguais nessas capacidades. - 39
Os princípios da justiça visam encontrar a forma mais adequada de distribuir os benefícios e
encargos, ou direitos e deveres, entre os cidadãos iguais, racionais e razoáveis, participantes
na cooperação social. - 39
Princípios da justiça - 40
Todos os valores sociais - liberdade e oportunidade, rendimento e riqueza, e as bases sociais
do respeito próprio - devem ser distribuídos igualmente, salvo se uma distribuição desigual de
algum desses valores, ou de todos eles, redunde em benefício de todos. - 40
Segundo Rawls, portanto, a intuição básica na primeira formulação da conceção de justiça é
puramente igualitária, mas, existe também uma ressalva. Não seria racional não admitir uma
distribuição desigual se fosse possível demonstrar que essa desigualdade relativa a um ou mais
bens sociais primários redundasse em benefício de todos. - 40
Se, em algum aspeto, a desigualdade na distribuição de bens sociais primários for benéfica
para cidadãos iguais nos seus poderes morais, não existirão com certeza boas razões para a
rejeitar. - 41
8
As desigualdades económicas e sociais devem ser balizadas por dois princípios: - 41
1. Um que diz respeito às oportunidades;
2. O outro que diz respeito ao rendimento e riqueza;
Portanto, as desigualdades existentes na sociedade terão de ser, de alguma forma, para
benefício de todos, mas também associadas à mobilidade social, isto é, ao acesso generalizado
às diferentes funções e posições.
Princípio da liberdade - 42
O primeiro princípio da justiça pode ser designado por «princípio da liberdade», mas a sua
designação mais adequada é a de «princípio das liberdades».
Assim, a liberdade é entendida como um conjunto de liberdades, no plural.
As liberdades são vistas como um sistema na medida em que elas têm de ser compatibilizadas.
Por exemplo, a liberdade de expressão de uns tem de ser compatibilizada com o direito ao
bom nome de outros. Todas as liberdades levantam problemas de compatibilização. - 42
As liberdades básicas incluem a liberdade de pensamento e consciência, as liberdades da
pessoa, a liberdade de expressão e reunião, a proteção face à prisão arbitrária, a propriedade
privada (mas não dos meios de produção: essa já não é uma liberdade básica).
Entre as liberdades básicas contam-se também as liberdades políticas, como as de votar e ser
eleito para cargos públicos. - 42
Princípio da Igualdade: - 43
O segundo princípio da justiça é especialmente complexo. Um primeiro ponto a notar é a
aceitação da existência de desigualdades económicas e sociais.
A existência de desigualdades de posição social e de remuneração ou riqueza constitui um
sistema de incentivos. - 43
Um segundo ponto a acentuar é a ideia de que as desigualdades só são moralmente
permitidas na medida em que estão associadas a duas condições: - 43
1. As desigualdades devem beneficiar a todos.
2. As desigualdades decorrem de alguma modalidade de igualdade de oportunidades.
A igualdade de oportunidades no sentido equitativo toma em conta os diferentes pontos de
partida dos indivíduos e procura retificá-los através da configuração das instituições. - 44
A mera igualdade formal não é suficiente para aproximar os pontos de partida individuais
determinados pela lotaria social. - 44
Daí a igualdade de oportunidades no sentido equitativo em que os indivíduos não são
moralmente responsáveis pelas circunstâncias do seu nascimento e, mais especificamente, por
nascerem numa família de perfil sócio-económico baixo. Ora, se os indivíduos não podem ser
responsabilizados por elas, seria inaceitável nada fazer para corrigir essa desigualdade. - 44
9
Princípio da diferença:
O benefício de todos alcança-se mediante a «maximização das expectativas daqueles que
estão em pior situação» à partida. O tipo de padrão distributivo fixado por este princípio da
diferença consiste pois numa atenção especial à classe mais desfavorecida da sociedade. - 45
Segundo o princípio da diferença as desigualdades sociais e económicas devem servir não
apenas para melhorar a situação dos mais desfavoreci- dos, mas também para a melhorar ô
mais possível. - 45
O princípio da diferença, associa-se ao princípio da igualdade de oportunidades compensando
os indivíduos pelos fatores igualmente arbitrários resultantes também da lotaria natural. - 46
Rawls considera que, tal como os princípios da justiça são prioritários em relação a qualquer
maximização da utilidade social, também internamente os devemos pensar como ordenados
segundo prioridades. - 47
Assim, o princípio das liberdades (primeiro princípio) é prioritário em relação ao segundo
princípio e, neste, o princípio da igualdade equitativa de oportunidades é prioritário em
relação ao princípio da diferença. - 47
Assim se impede não só que a justiça seja sacrificada em nome da utilidade, mas também que
uns bens sociais primários sejam sacrificados em nome de outros bens sociais primários. - 47
A liberdade não pode ser comprometida para a criação de mais oportunidades ou riqueza para
os desfavorecidos e este último objetivo não deve comprometer a igualdade de oportunidades
em sentido equitativo. - 47
Posição original: - 50
Qualquer um de nós pode, em qualquer momento, recorrer à ideia da posição original. Nela
não se encontram pessoas de carne e osso, como nós, mas «partes» que são nossas
representantes. As partes na posição original não têm as desvantagens que teríamos nós
enquanto pessoas concretas. - 50
As características dessas mesmas partes, assim como as condições especiais em que se
encontram, garantem que a escolha feita por elas será muito mais imparcial, muito mais
equitativa, do que uma escolha efetuada por pessoas reais, daí que Rawls chame à conceção
escolhida na posição original «justiça como equidade». - 51
10
Em primeiro lugar, as partes estão debaixo de um espesso véu de ignorância. Isso significa que
elas desconhecem as circunstâncias particulares das pessoas que representam: as suas
conceções particulares do bem, os seus rendimentos, o seu status social, etc.
A existência do véu de ignorância garante a razoabilidade da sua escolha.
As partes têm alguns conhecimentos gerais sobre a vida humana. Esses conhecimentos visam
conferir maior robustez à sua escolha. - 51
O raciocínio das partes assenta na chamada «regra maximin». - 52
As partes devem raciocinar de modo a maximizar o mínimo de resultados que podem obter.
Elas escolherão a conceção de justiça que, uma vez aplicada à estrutura básica, lhes garanta
essa maximização do índice de bens sociais primários. - 52
Em contraposição com o princípio de utilidade, os princípios de justiça de Rawls não permitem
nunca o sacrifício das liberdades básicas, da igualdade equitativa de oportunidades e da
distribuição de acordo com o princípio da diferença (note-se que este último é praticamente
uma paráfrase da regra maximin). - 53
É, portanto, claro que os princípios da justiça permitem maximizar o mínimo que cada uma das
partes pode obter, mas que o mesmo não acontece com o princípio de utilidade. - 53
O compromisso dos cidadãos numa sociedade utilitarista é difícil, na medida em que ela exige
demasiado a cada um com vista a maximizar o bem-estar e a situação é especialmente difícil
para aqueles que forem sacrificados em nome do bem-estar geral. - 54
Em contraste, parece ser muito mais fácil motivar a cooperação de todos numa sociedade
justa, pois neste quadro, as tensões do compromisso são bem menores na medida em que
todos sabem que terão acesso a um índice elevado de bens sociais primários, aos quais todos
os outros têm também acesso. - 54
Ninguém tem motivos para se sentir posto de lado e, portanto, para não cooperar.
Uma sociedade utilitarista é pouco estável. Se aqueles que se sentem prejudicados ou
sacrificados têm pouca motivação para cooperar, poderão ter motivação para se revoltar. - 54
Note-se que a estrutura básica é, em primeiro lugar, um conjunto integrado de regras ou, mais
exatamente, de leis. - 56
A justiça para Rawls consiste na existência de uma estrutura básica ordenada de acordo com
os princípios selecionados na posição original. - 56
11
Uma estrutura básica justa é aquela que engloba uma Constituição justa, isto é, uma
Constituição que realiza o primeiro princípio da justiça. - 56
Cabe então à legislação e ao governo o estabelecimento da justiça no plano social e
económico, ou seja, a realização institucional do segundo princípio da justiça. É a este nível
que tem lugar a tentativa de igualizar as oportunidades mediante o acesso à educação e à
cultura para todos os igualmente dotados. - 57
Na estrutura básica, portanto, está espelhada a prioridade do primeiro princípio em relação ao
segundo, o que corresponde exatamente à perspetiva do liberalismo igualitário. - 57
Mas, quanto às restantes liberdades, elas adquirem o seu pleno valor através da aplicação do
segundo princípio da justiça. - 57
É através de uma igualdade de oportunidades equitativa e de uma distribuição de acordo com
o princípio da diferença que será efetivamente possível aos diferentes indivíduos perseguir os
seus fins próprios e, dessa forma, fazer uso do sistema de liberdades básicas igual para todos.
Note-se que a estrutura básica de uma sociedade justa implica a existência de uma economia
de mercado. - 57
A verdadeira alternativa para a construção de uma sociedade justa, portanto, está localizada
na banda estreita entre um socialismo de base liberal, e aquilo que nós chamaríamos um
liberalismo social, segundo o qual a justiça consiste em garantir a todos e a cada um dos
indivíduos as liberdades básicas, mas também as condições efetivas para desenvolverem os
seus projetos de vida. O liberalismo igualitário de Rawls tem, pois, duas vias possíveis de
concretização. - 58
Liberalismo Igualitário: - 58
Uma sociedade justa de acordo com a perspetiva liberal igualitária é, necessariamente, uma
sociedade pluralista. - 58
A consagração constitucional das liberdades permite ultrapassar as guerras de religião e, ao
mesmo tempo, contribui para o aprofundamento do pluralismo não só das visões religiosas,
mas também de todas as outras conceções do mundo e da vida, de tipo filosófico e moral. - 58
A conceção liberal igualitária da justiça deverá poder ser apoiada por todos aqueles" que
defendem doutrinas abrangentes racionais e razoáveis, por muito diferentes que elas sejam
umas das outras. - 60
Ou seja, embora os cidadãos discordem quanto às doutrinas abrangentes que professam, eles
podem concordar com um mesmo núcleo de valores políticos fundamentais: aqueles que têm
a ver com o apoio a uma constituição justa, mas também aos aspetos sociais e económicos da
justiça. - 60
12
2-NATUREZA E ALCANCE DA IGUALDADE LIBERAL - 61
Rawls advoga a realização da igualdade democrática mediante a adoção de um princípio de
oportunidades equitativas, cruzado com uma distribuição de riqueza de acordo com o princípio
da diferença. - 61
A teoria rawlsiana não parece contemplar as desvantagens especiais de alguns quanto aos seus
dotes naturais, nomeadamente os deficientes físicos ou mentais. - 62
Igualdade de recursos: 62
Segundo Dworkin, a concepção rawlsiana da igualdade democrática falha ao não levar
suficientemente a sério a responsabilidade individual. - 62
Ora, parece intuitivamente convincente que a justiça deve também eliminar as desvantagens
especiais produzidas pela pura má sorte - o que não está previsto na formulação de Rawls.
Mas, segundo Dworkin, a teoria rawlsiana é também, num outro sentido, indevidamente
igualitária, uma vez que não é suficientemente sensível aos gostos e ambições de cada um. Se
alguém decide dedicar o seu tempo a catividades de lazer, enquanto outros optam por
trabalhos exigentes e extenuantes, o princípio da diferença acabaria por premiar os primeiros.
O sistema de transferências do Estado não deve compensar as pessoas com gostos caros ou
sem ambição, apenas porque estão pior do que os outros. Mas deve compensar especialmente
aqueles que foram afetados por elementos de pura má sorte, como a deficiência. - 63
Igualdade de capabilidades: - 63
Um outro liberal igualitário, Amartya Sen, não considera satisfatórias as abordagens da
igualdade sócio-económica baseadas na ideia de bens sociais primários, ou na ideia de
recursos materiais. O conceito preferido por Sen é o de capacidades. - 63
Pode existir uma igualdade de bens sociais primários ou de recursos materiais sem que exista
igual capacidade para os colocar ao serviço das liberdades, devido a diferenças no contexto
cultural e ambiental dos indivíduos, a diferenças de género, de exposição a doenças, etc.
Assim, a questão fundamental é a da capacidade para transformar os bens sociais primários ou
os recursos em efetiva liberdade de escolha.
O mais importante é igualizar o conjunto de capabilidades básicas dos indivíduos e não
simplesmente os instrumentos que podem estar ao serviço dessas capabilidades, como os
recursos ou os bens sociais primários. - 63
Igualdade local: - 64
Numa obra de final de carreira Rawls admite que nem todas as sociedades possam desejar
construir uma justiça tão igualitária como a que ele propõe na sua teoria. Há no mundo
sociedades com uma tradição hierárquica e sem tradição liberal. - 64
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Igualdade global: - 64
O local onde se nasce é tão moralmente arbitrário como o meio social ou os dotes naturais.
Por isso é injusto que alguns tenham tantos benefícios por terem nascido em países prósperos
e outros sejam penalizados por ter nascido no seio de povos particularmente desfavorecidos.
Para Beitz, portanto, a exigência de justiça social e económica tal como Rawls a concebe,
incluindo o princípio da diferença, aplica-se também ao sistema internacional.
Retomando a teoria do contrato social, Rawls tenta responder de que modo podemos avaliar
as instituições sociais: a virtude das instituições sociais consiste no fato de serem justas.
COM base nesta preocupação, Rawls formulou a teoria da justiça como equidade. Mas, como
podemos chegar a um entendimento comum sobre o que é justo?
Para chegar a tal resultado, ele imaginou uma situação hipotética e a histórica similar ao
estado de natureza (chamada de posição original) na qual certos indivíduos escolheriam
princípios de justiça.
Tais indivíduos, racionais e razoáveis, estariam submetidos a um "véu de ignorância", isto é,
desconheceriam todas as situações que lhe trariam vantagens ou desvantagens na vida social
(classe social e status, educação, características psicológicas, etc.).
Assim, na posição original todos compartilham de uma situação equitativa: são considerados
livres e iguais.
Rawls não deseja fundamentar a obediência ao Estado (como no contratualismo clássico de
Hobbes, Locke e Rousseau).
Dentre os autores que se situam na tradição de pensamento inaugurada por John Rawls
destaca-se, contemporaneamente, o filósofo norteamericano Ronald Dworkin. No entanto,
para ele, o princípio fundamental do liberalismo não é a liberdade, mas a igualdade.
Segundo ele “todos os cidadãos têm o mesmo direito a igual consideração e respeito.
Também o prêmio nobel de economia Amartya Sen desenvolve elementos do liberalismo
igualitário na sua teoria. Propõe uma visão “social” do liberalismo, incorporando o tema da
igualdade no coração das ideias liberais.
15
TEMA 3 – LIBERTARISMO
O libertarismo é uma ramificação do liberalismo que coloca no centro das suas preocupações
políticas o respeito pela liberdade de cada um para fazer o que bem entende com a sua pessoa
e com os seus bens. - 67
Esta preocupação política com a liberdade negativa está logicamente associada à recusa das
ingerências governamentais nos costumes e na economia.
Os libertaristas opõem-se ao controlo político dos estilos de vida dos indivíduos e às soluções
públicas para as externalidades do mercado. - 67
Contra o que classificam de “paternalismo estatal”, os libertaristas defendem a despenalização
de todos os crimes sem vítimas (prostituição, pornografia, consumo de drogas, alcoolismo, poligamia, homossexualidade) ea
privatização integral das atividades perseguidas pelo Estado-Providência. (saúde, educação, habitação,
16
1-LIBERTARISMO INSTRUMENTAL: 69
Os economistas libertaristas defendem que, sem intervenção pública na economia, o livre jogo
dos atores e das forças do mercado conduzirá à maior prosperidade do maior número. Neste
contexto, a melhor solução é dar primazia ao mercado, à livre iniciativa, com o mínimo possível
de interferência do Estado. - 69
17
A ambivalência do libertarismo instrumental: - 74
O que fazer se se verificar que o funcionamento do mercado livre não é eficiente?
É impossível melhorar a situação económica de um indivíduo sem degradar a situação de outro
indivíduo (óptimo de Pareto). Mas em termos lógicos, se se verificar que o funcionamento do
mercado livre não é eficiente, será necessária a intervenção governamental para fazer, os
ajustamentos necessários.
se a economia mista é criticável não é apenas porque os seus efeitos são contraproducentes
do ponto de vista da eficiência, mas também porque põe em causa a liberdade individual. - 74
2-LIBERTARISMO FUNDAMENTAL: 75
A elaboração mais sistemática do libertarismo fundamental deve-se a Robert Nozick, Murray
Rothbard, Eric Mack, Jan Narveson ou Tibor Machan.
Para estes autores, a justificação do libertarismo é uma tarefa puramente conceptual, não tem
de se preocupar com considerações factuais de ordem económica. Quando se trata de
estabelecer a estrutura básica da sociedade, pouco importam os objetivos macroeconômicos
fixados. - 75
Pouco importa se o mercado livre promove o crescimento económico ou contribui para a
quebra da taxa de desemprego. O importante é respeitar a liberdade individual. É neste
sentido que o libertarismo fundamental se diferencia do libertarismo instrumental. O respeito
pela liberdade individual constitui um imperativo moral e não um instrumento de promoção
da eficiência económica. - 75
As ingerências governamentais no mercado já não são censuráveis-pelos efeitos negativos que
produzem sobre a economia, mas porque constituem erros morais. - 75
Robert Nozick - 75
O filósofo norte-americano R. Nozick ocupa um lugar de destaque entre os principais
defensores do libertarismo fundamental, destacando a crítica às versões igualitárias da justiça
social. - 75
Nozick conclui que nenhum princípio de justiça de tipo igualitário «pode de maneira contínua
ser realizado sem interferência contínua na vida das pessoas».
Para salvaguardar a liberdade individual, Nozick propõe uma teoria da justiça alternativa, a que
dá o nome de teoria do justo título. - 76
Nesta teoria da justiça não existem exigências de tipo igualitário às quais uma dada
distribuição tem de se adaptar para ser considerada justa, mas apenas algumas regras
processuais referentes ao modo como a propriedade se pode constituir e transferir, regras que
uma vez respeitadas tornam o resultado final justo, qualquer que ele seja. - 76
18
Se um determinado bem foi adquirido sem prejudicar a situação das outras pessoas, então
toda a distribuição que resultar de troca voluntária desse bem é em si mesma justa. - 77
Consequentemente, toda a interferência posterior contra a livre vontade dos indivíduos é
injusta. - 77
As correções em nome de princípios de justiça igualitários não são mais do que um roubo
institucionalizado. - 77
20
RESUMO ADICIONAL - TEXTOS DE APOIO:
O libertarismo é uma ramificação do liberalismo que coloca no centro das suas preocupações
politicas o respeito pela liberdade de cada um para fazer o que bem entende com a sua pessoa
e com os seus bens. Os libertaristas opõem-se ao controlo político dos estilos de vida dos
indivíduos e às soluções publicas para as externalidades do mercado. Em oposição ao Estado-
providência é o Estado mínimo ou Guarda noturno.
Hayek foi um dos economistas que mais contribuiu para o desenvolvimento do libertarismo
instrumental. A defesa do mercado livre assenta na ideia de que este sistema de cooperação
social tem uma importante vantagem comparativa, que lhe permite ser mais eficiente do que
as economias dirigidas. A cooperação não coordenada que caracteriza o mercado livre gera
maior eficiência económica porque não existem barreiras burocráticas à descoberta e à
inovação. As ingerências governamentais na economia em nome da justiça social acabam por
ser contraproducentes.
Hayek conclui então que as sociedades onde o mercado funciona livremente permitem à
generalidade dos indivíduos usufruir de melhores condições de vida do que as sociedades com
uma economia mista.
Nozicque, filosofo norte americano é um dos grandes defensores do libertarismo fundamental.
Não se pode garantir a integridade dos indivíduos quando a estrutura básica da sociedade
revela preocupações de ordem igualitária. A conclusão fundamental de Nozicque é que apenas
um Estado mínimo limitado a funções muito especificas de proteção contra a força, o roubo, a
fraude, a aplicação dos contratos, é justificável, qualquer outro Estado mais extenso violará os
direitos das pessoas a não serem forçadas a certas coisas e é injustificável.
21
TEMA 4 – COMUNITARISMO
2. Para outros, no entanto, a comunidade não dispensa a justiça. Daí uma segunda
grande vertente comunitarista argumentar precisamente que os princípios de justiça
em vigor numa comunidade devem ser aqueles que dela brotam de forma mais ou
menos espontânea, ou que são adotados pela maioria dos seus membros. Nestes
termos, a justiça deve basear-se nos “entendimentos partilhados de uma sociedade,
em vez de em princípios universais e anistóricos”.
3. Por último, uma terceira vertente defende que a comunidade deve estar presente na
identificação do conteúdo dos princípios de justiça por que se deverá nortear.
O diálogo com o liberalismo é por vezes de tal modo intenso, que o rótulo de comunitarista
nem sempre é aplicável ou aceite, a não ser apenas por falta de outro melhor. - 98
O comunitarismo é, acima de tudo, uma crítica do liberalismo moderno, da sua visão do eu, da
sociedade, da política e da própria filosofia política. - 99
Representa, antes do mais, um apelo à renovação democrática das sociedades através de uma
redistribuição do poder político por entre a panóplia de entidades no quadro das quais nos
transformamos nas pessoas concretas que somos e elaboramos os nossos projetos de vida.
Em vez de encarar o eu como um dado detentor à partida apenas de direitos, adota uma
perspetiva histórica, vendo-o como uma construção e procurando situá-lo nas unidades sociais
em que se forja. - 99
23
Para o paradigma liberal, a única identidade que interessa, a única a merecer projeção política, é
aquela que decorre do contrato social. É pelo contrato social que as partes, sujeitos até então
radicalmente destituídos de conteúdo, se constituem em comunidade política, isto é, em Estado
soberano, que por esta via, transforma-os em seus cidadãos. - 99
O Estado-nação exige a lealdade integral dos seus cidadãos na medida em que é ele que
imprime forma ao seu próprio ser. - 99
Nestes termos, a liberdade deixa de se situar no isolamento face ao exterior, que permite a
cada um deliberar como entender sobre si próprio e sobre a sua vida, sem interferências.
Invocando John Dewey, Sandel situa-a, antes, na abertura aos outros com os quais nos
constituímos e na partilha com eles, em autogoverno. - 104
Uma vez que os destinos de uma pessoa se encontram indelevelmente associados a uma
panóplia de comunidades em que se situa, ela será livre, não na medida em que deliberar e
eleger sem interferências dos outros, mas na medida em que participar na vida comum que
permite a cada um realizar-se e ser a pessoa concreta que é. - 104
Aquela que se desenvolve entre comunitarismo e liberalismo não é, assim, uma relação
adversativa radical; em vez de se oporem um ao outro, o comunitarismo e o liberalismo
apoiam-se mutuamente. - 104
25
RESUMO ADICIONAL - TEXTOS DE APOIO
Enquanto o liberalismo político sobrepõe o justo sobre o bem, sendo "justo" o mecanismo da
exaltação da moral abstrata, e o "bem" uma ideia de construção da lei, não se importando
assim comos fins, mas sim com os meios (o ponto de sua criação), o comunitarismo sobrepõe o
bem sobre o justo, onde o "bem" é a justiça.
Liberdade negativa é "estar livre de", enquanto que liberdade positiva é "estar livre para".
A liberdade tem duas lados: o conceito negativo que está associado aos direitos civis e ao
liberalismo, e o conceito positivo que está associado à democracia no caso dos direitos
políticos, ao socialismo no caso dos direitos sociais, e à cidadania plena no caso dos direitos
republicanos.
26
TEMA 5 – REPUBLICANISMO
Pettit deu uma nova visibilidade ao Republicanismo, uma antiga corrente filosófica.
Republicanismo envolve dois significados: - 111
1. Corrente em teoria política, consiste em ver no republicanismo a teoria de um regime
político oposto à monarquia e descreve o modo das relações que os indivíduos devem
estabelecer uns com os outros numa sociedade. É concebida como um sistema no qual
os governos são eleitos pelos cidadãos. O poder não se herda, recebe-se por mérito e é
colocado sob a vigilância permanente dos cidadãos com o fim se evitarem despesas
militares ou o aumento da divida publica.
2. Mas o termo “republicanismo” não designa apenas um sistema político; ele permite
também descrever o modo das relações que os indivíduos deveriam poder
estabelecer uns com os outros numa sociedade. Sob este aspeto, o republicanismo
coloca a ênfase sobre a igualdade dos indivíduos e sobre a necessária participação
destes nos assuntos públicos. A este republicanismo chama-se político na medida em
que não põe em jogo valores humanistas associados à cidadania ou à atividade cívica.
Nos dois casos o republicanismo valoriza a participação política dos indivíduos nas decisões
que dizem respeito ao futuro da comunidade e ao seu futuro pessoal no interior daquela. - 112
O republicanismo, porque valoriza a autonomia dos indivíduos, porque não é uma teoria
dirigida contra a propriedade privada, e porque pensa apesar de tudo no laço social e no papel
das instituições públicas, pôde aparecer com uma nova atualidade num contexto de perda de
confiança em relação às duas grandes orientações políticas que são o liberalismo e o
socialismo. - 113
Esta renovação do republicanismo tomou três formas: 113
1. Uma forma comunitarista;
2. Uma forma liberal;
3. Mais recentemente uma forma crítica que procura evitar os obstáculos encontrados
em cada uma das duas primeiras variantes mencionadas.
A liberdade republicana coloca ênfase sobre o facto de não sermos dominados, enquanto que
a liberdade “liberal” acentua o facto de não sermos incomodados nas nossas ações ou
impedidos fisicamente de agir. - 116
Como diz Ph. Pettit, não nos podemos “subtrair à dominação sem a ajuda de instituições de
proteção que garantam” a não dominação. A liberdade republicana é tanto de natureza social
como individual. - 117
A definição de liberdade não pode ser separada de uma teoria do governo republicano, pois
aloja-se não nos silêncios da lei e dos poderes, mas no controle e contestação destes últimos.
28
2.3-Republicanismo crítico - 117
Um terceiro tipo de teoria republicana, por vezes chamada “republicanismo crítico” é
claramente distinta do liberalismo, sem por isso cair na versão comunitarista do
republicanismo cívico. - 117
O Estado republicano, por seu lado, intervém promovendo os valores que constituem o ideal
da reciprocidade e regulando as escolhas de vida através do poder constitucional. - 119
29
3-AS CRÍTICAS DIRIGIDAS AO REPUBLICANISMO - 119
Admitindo que o paternalismo não implica limitação da liberdade, teríamos uma escolha entre
considerar o perfeccionismo político (sempre então necessariamente paternalista) como inaceitável, ou
aceitar que o paternalismo político pode ser legítimo, por exemplo, desde que não implique
um limite coercivo da liberdade dos indivíduos. - 120
É o caso das variantes liberal e crítica do republicanismo, que permitem justificar políticas
estatais com carácter paternalista sem, no entanto, serem coercivas. - 120
Uma outra crítica dirigida à teoria republicana foi formulada por Christopher McMahon e diz
respeito à definição de liberdade como não dominação. Esta crítica considera que o
republicanismo é incapaz de orientar as decisões de um governo: promover a liberdade como
não dominação numa sociedade é um objetivo mal definido, demasiado amplo e, em resumo,
“indeterminado”. - 121
Nesta perspetiva, as intervenções do Estado poderão ser consideradas, aos olhos de certos
cidadãos, como necessárias para impedir as interferências arbitrárias que alguns indivíduos
fazem sofrer a outros, enquanto que outros cidadãos julgarão essas intervenções arbitrárias.
Estas intervenções visam o bem comum, mas o problema parece ser eliminado mais do que
resolvido com uma tal resposta, na medida em que é ainda necessário designar este bem
comum. - 122
É preciso determinar e revelar o bem comum, em definitivo, o que é e o que não é arbitrário,
o que é e o que não é dominação. É neste ponto que o republicanismo parece ser uma teoria
indeterminada. - 122
30
4-UM EXEMPLO DE REPUBLICANISMO APLICADO: O RENDIMENTO DE CIDADANIA - 123
Esta abordagem considera que a propriedade privada não deve ser condenada, mas, pelo
contrário, que ela deve ser objeto de uma melhor repartição na sociedade. - 124
Acontece que o acesso à propriedade privada não passa de boas intenções se os indivíduos
entram no mercado completamente desprovidos de capital. - 124
Todas estas fórmulas são as dignas herdeiras dos mecanismos imaginados pelos republicanos
de finais do século XVIII, convencidos da utilidade da redução dos fossos de riqueza para criar
uma sociedade de iguais e permitir aos indivíduos ter os meios necessários para as suas livres
iniciativas. - 124
Arendt (comunitarista) sugere uma nova ligação com a tradição aristotélica, como forma de
salvar a liberdade reencontrando as formas originais da política. A tese de Arendt acentua a
identidade entre a vida cívica e liberdade.
31
Pettit (liberal) defende que o 1º dos valores é a liberdade como não dominação e não
participação política. Nesta abordagem a definição de liberdade diz-nos qual o estatuto social
que devem ter para que a sua existência não seja controlada pelos outros. A liberdade não
define um modo de vida. O republicanismo cívico define liberdade política garante ao
individuo que as suas escolhas futuras serão feitas num contexto de não dominação. Pettit
utiliza frequentemente o ex: do sr. e do escravo para definir as duas formas de liberdade.
A definição de liberdade como forma de não dominação não pode ser separada de uma teoria
do poder político e da sua distribuição na sociedade A participação política toma assim a forma
das possibilidades dadas aos cidadãos para contestar uma decisão ou fazer intervir as suas
vozes num ponto de decisão que lhes diz respeito.
O republicanismo critico (Maynor) pretende representar um 3ª via, diferenciado do
republicanismo defendido por Pettit e claramente distinto do liberalismo, sem cair na versão
comunitarista do republicanismo cívico. Maynor diz que os valores e virtudes dos republicanos
devem ser considerados intrínsecos à liberdade republicana. A reciprocidade manifesta-se
através de certos valores e ideias como a cidadania e a virtude cívica e é sustentada pelo poder
constitucional. Tal como o liberalismo favorece um contexto para a liberdade de escolha.
Uma outra critica dirigida à teoria republicana por McMahon diz respeito à definição de
liberdade como não dominação, considerando que o republicanismo é incapaz de orientar as
decisões do governo. A critica deste filosofo dirige-se em particular a Pettit, que diz que o
carácter arbitrário de uma interferência decorre de uma interpretação normativa. McMahon
não mede a que ponto o republicanismo de Pettit pode ser acolhedor em relação aos
interesses dos indivíduos e a que ponto o seu republicanismo liberal consegue protege-los.
32
A resposta a esta critica consiste em dizer que estas intervenções visam o bem comum.
A resposta de Pettit a esta critica resume-se em 3 pontos:
1. Uma interferência não arbitraria é uma interferência no decurso da qual aquele que
interfere é levado a ter em conta os interesses dos particulares;
2. A ação do governo não pode legitimar uma interferência pelo simples fato de que esta é
validada por um procedimento formal e;
3. É necessário distinguir duas tipos de interferência dos indivíduos privados e as do Estado
não da mesma natureza.
Pode-se atribuir o eclipse do republicanismo à sua falta de interesse para questões
económicas, em particular à sua indiferença face à sorte dos mais carenciados ou excluídos. No
plano económico e social seria uma doutrina ultrapassada, por herdar um ideal arcaico, o do
cidadão proprietário gozando de lazer, seria necessário que passasse a ocupar de assuntos
públicos e defender a sua cidade quando solicitado.
A abordagem em termos económicos concentra-se na possibilidade de um rendimento de
cidadania aberto a todos, que permita a cada um gozar uma liberdade real. Esta abordagem
considera que a propriedade privada não deve ser condenada, deve sim ser objeto de uma
melhor repartição na sociedade, por reforçar o controlo que os indivíduos podem ter sobre a
sua capacidade de se governarem a si mesmos.
Os argumentos republicanos que se apoiam sobre a definição da liberdade como não
dominação são sem dúvida os mais adequados para justificar uma tal reformulação da
solidariedade social nas nossas sociedades democráticas onde se misturam autonomia
individual e garantias sociais dessa autonomia.
33
TEMA 6 - DEMOCRACIA DELIBERATIVA
O modelo deliberativo surge a partir da crítica dos modelos tradicionais de democracia. - 131
Com efeito, é num contexto onde proliferam opiniões, que o modo de proceder ante várias e
diversificadas crenças, interesses e valores, deve ter em conta que a sociedade hodierna se
caracteriza por uma pluralidade de formas de vida preferenciais. Ora, neste contexto, a
perspetiva dominante tem ditado o modo de conciliação e o processo de decisão, fazendo
prevalecer o interesse maioritário e a negociação pertinente para chegar a um acordo entre os
sectores sociais com interesses em conflito. - 131
O facto de as decisões favorecerem o bem comum, cria um âmbito muito mais alargado de
informação, maior disponibilidade para a cooperação, melhor qualidade das decisões e,
portanto, uma maior legitimidade democrática. - 131
Esta força do vínculo entre deliberação e legitimidade das decisões políticas tem sido um dos
principais argumentos em favor da democracia deliberativa: - 132 (Vantagens)
34
Nesta perspetiva, a ideia de uma democracia deliberativa surge no pensamento filosófico e
político, muito impulsionado por Jürgen Habermas. - 132
1. Acão teleológica-estratégica;
2. Acão regulada por normas;
3. Acão dramatúrgica;
4. Acão comunicativa.
A ação Comunicativa, “refere-se à interação de pelo menos dois sujeitos capazes de linguagem
e de ação que (seja por meios verbais ou extra-verbais) entabulam uma relação interpessoal. Os atores
buscam entender-se sobre uma situação de ação para assim poderem coordenar de comum
acordo os seus planos de ação e com isso as suas ações. O conceito aqui central, o de
interpretação, refere-se primordialmente à negociação de definições da situação suscetíveis de
consenso. - 145
Na ação estratégica, pressupõe-se pelo menos dois sujeitos, que atuam com vista a alcançar
um fim, no intuito de influenciar as decisões dos outros atores, cada um dos quais se orienta
também para a consecução do seu próprio êxito; - 146
Sintetizando o que foi dito, pode afirmar-se, que, para Habermas, a utilização da linguagem
orientada ao entendimento constitui o modo original de utilização da linguagem; - 147
1. A Ação Estratégica, tem por mero objetivo o próprio êxito na consecução dos
interesses em causa, gizando os meios mais eficazes (racionalidade de meios-fins) para
satisfazer as suas preferências;
Assim, para Habermas, o critério para saber se uma norma é correta há-de fundar-se em dois
princípios:
1. O princípio de universalização;
2. O princípio discursivo;
O agir comunicativo é uma forma de cooperação social particular, em que “os planos de ação
dos atores implicados não se coordenam através de um cálculo egocêntrico de resultados, mas
mediante atos de entendimento.
Como sabemos, o modelo liberal de democracia parte da separação entre Estado e Sociedade,
em que a função daquele é garantir que os cidadãos possam prosseguir nesta os seus
interesses privados. - 155
Decorre destas premissas que o processo político é uma luta por posições de poder entre
atores que se comportam estrategicamente; - 155
36
Ao invés, o modelo republicano de democracia assenta numa conceção de sociedade
entendida como comunidade política de cidadãos livres e iguais. A cidadania coexiste com o
ideal de pertença a essa comunidade, donde decorrem os direitos de participação política, e
não apenas, como no modelo liberal, de proteção perante ingerências alheias; - 155
Neste sentido, são os próprios cidadãos quem exerce o poder (auto-governo), num processo que
tem por finalidade um acordo com vista a desenvolver formas de “vida boa”. - 155
No que concerne ao alcance da deliberação, Habermas sustém que deve estender-se a todos
os assuntos que possam regular-se no sentido de um igual interesse de todos. - 159
As teorias liberais desconfiam deste tipo de posições, pois temem que se debilite a proteção
jurídica da esfera privada; quer dizer, consideram que, podendo ser debatidas politicamente
todas as questões, haverá uma invasão da esfera de liberdade individual que constitui um dos
seus princípios básicos. - 159
Habermas replica a isto que a separação entre a esfera do privado e do público não está
estabelecida per se, mas é sempre construída, e nessa medida, é suscetível de ser tratada
publicamente; portanto, o que é público e o que é privado pode também ser objeto de debate.
Assim, qualquer decisão política deve vir precedida pela discussão pública; mas falar sobre algo
não significa necessariamente a sua regulação. O importante é que no debate não existam
restrições temáticas estabelecidas a priori que minem a autonomia pública. - 159
Habermas pretende a condição de universalidade para este sistema de direitos, sem, contudo,
afirmar um conjunto pré-estabelecido de direitos naturais. O sistema de direitos deve ser
desenvolvido de forma politicamente autónoma pelos cidadãos no contexto de suas próprias e
particulares tradições e história; - 160
37
2.5-Do mercado ao fórum - 160
2. A dimensão ética, que tem a ver com a ideia de bem e da correspondente “vida boa”
que a comunidade prossegue; o objeto em análise é acerca da adequação de
determinada medida política com o bem comum.
Rawls, que também elabora um modelo deliberativo, considera que, na deliberação, as únicas
razões aceitáveis são as que se referem aos princípios da justiça, devendo ficar de fora do
debate qualquer consideração relativa à ideia do bem; deste modo, as questões éticas não
fazem parte de uma deliberação circunscrita à dimensão moral. - 163
Habermas conjuga ambos os princípios estabelecendo uma dupla via para a formação
democrática da opinião e da vontade política:
1. Uma via formal, que se corresponde com o sistema político - a esfera institucional;
2. Uma via informal que se cultiva na sociedade, na vida quaotidiana - a esfera pública.
38
No que se refere à esfera institucional, o acordo a que se chega com a deliberação é um
consenso construído durante o processo em que se debatem razões e argumentos; e o
resultado dessa deliberação é o bem comum, isto é, representa aquilo que coletivamente é
considerado bom para todos. - 164
Uma justificação deliberativa nem sequer se inicia se aqueles a quem se dirige não estiverem
em condições de entender o seu conteúdo essencial. - 164
A dialética entre periferia externa e periferia interna permite ilustrar a ideia de uma
circulação de poder, vital e móvel, a qual possibilita um fluxo e refluxo permanente entre
sociedade civil e Estado e uma reconversão por uma dupla via entre o poder comunicativo e o
poder administrativo da sociedade. - 166
A esfera pública habermasiana, diferente da esfera institucional, não está regulada por
procedimentos mas configura-se como uma rede com limites flexíveis, abetos, e porosos, onde
se comunicam e formam ideias, opiniões atitudes e discursos, sobre diferentes temas que
preocupam os indivíduos e que os afetam na sua vida privada. - 167
A Opinião pública elaborada de forma discursiva não toma decisões, mas influi no poder e
controla o seu exercício: esse é o âmbito da esfera pública, gerando então influência na esfera
institucional. - 168
Então as funções da esfera pública são: influir no poder e controlar o seu exercício.
O seu núcleo institucional não é estatal nem económico, mas é formado “por esse enredo de
associações não-estatais e não-económicas, de base voluntária, que fundeia as estruturas
comunicativas da opinião pública na componente do mundo da vida, que é a sociedade. - 169
39
A existência Institucional da sociedade civil, fica garantida quando coexiste esse conjunto de
características que a tornam autónoma do Estado, da economia, etc…: - 169
1. A pluralidade;
2. A publicidade;
3. Ã privacidade;
4. A legalidade;
Todas juntas, estas estruturas asseguram a existência institucional de uma sociedade civil
moderna e diferenciada. - 170
Outrossim, a presença dos meios de comunicação social pode ocasionar distorções no espaço
da opinião pública, apropriando-se das funções da sociedade civil. - 170
A grande contribuição desse modelo para o ponto democrático contemporâneo é trazer à luz
um fenómeno em curso há tempos e que interfere de modo peculiar na atuação e nas decisões
governamentais nas diversas instâncias e poderes, não podendo, pois, ser negligenciado pelos
estudiosos da política - a participação dos cidadãos por meio do debate, da opinião, da
expressão de ideias, seja em seus microcosmos sociais ou em arenas mais amplas como os
meios de comunicação de massa. E, por fim, a necessidade de tornar esse ponto de
contribuição argumentativa mais regular e efetivo por meio de arranjos institucionais dentro e
fora das instituições do Estado.
41
TEMA 7 - POBREZA ABSOLUTA
Milhares de seres humanos vivem, hoje, em situação de pobreza absoluta. Por pobreza
absoluta podemos entender a situação de todos aqueles que possuem menos do que
quaisquer outros, seja qual for o referencial com que os comparemos, vendo-se assim
privados dos mínimos imprescindíveis para garantir a sobrevivência. Esta situação traduz-se
em realidades crónicas de subnutrição, analfabetismo, doença, elevada mortalidade infantil e
baixa esperança de vida. - 179
Sabendo que muitos seres humanos vivem em situação de abundância absoluta algumas
questões se levantam. Quais as implicações morais desta situação? Podemos ficar
indiferentes perante este tipo de sofrimento? Esta situação é evitável? Como? Temos alguma
obrigação moral de contribuir para minorar este sofrimento? - 179
A pobreza absoluta existe e é um mal. Temos ou não a obrigação moral de contribuir para a
eliminar? O filósofo australiano Peter Singer diz-nos que essa obrigação existe. Como
fundamenta a sua posição? Singer é um utilitarista e é sob esta perspetiva que responde ao
problema. Para Singer, uma decisão moral é boa quando as suas consequências o são e as
consequências são boas quando maximizam o bem-estar de todos os afetados por essa
mesma decisão. - 180
As condições materiais para acabar com esta situação existem. A abundância em que vivem os
cidadãos dos países ricos é suficiente, desde que convenientemente distribuída, para eliminar
substancialmente esse sofrimento. Todos nós podemos ajudar e, se podemos, devemos. Se
não o fizermos somos responsáveis pelas mortes que não evitámos. Mas, como podemos ser
responsáveis pela morte daqueles que não matamos nem desejamos que morressem? Não
salvar alguém é moralmente equivalente a matar? Para Peter Singer é. - 180
42
No entanto, normalmente, não pensamos assim. Consideramos que matar é pior do que evitar
uma morte. Podemos defender que existem diferenças entre envenenar crianças na Somália e
não contribuir com alguma ajuda para a UNICEF. A motivação do agente é muito diferente. O
envenenador quer matar, o que não contribui para a ajuda internacional não. - 181
Peter Singer não nega que matar seja diferente de deixar morrer tal, contudo, considera que
“são diferenças extrínsecas, moralmente irrelevantes, isto é, diferenças normalmente
associadas, mas não necessariamente, à diferença entre matar e deixar morrer”. - 181
1. Se pudermos impedir que algum mal aconteça sem sacrificar nada de importância
moral comparável, devemos fazê-lo;
2. A pobreza absoluta é um mal;
3. Há alguma pobreza absoluta que podemos impedir que aconteça sem ter que
sacrificar nada de importância moral comparável;
Conclusão: Temos o dever de impedir alguma pobreza absoluta.
O argumento não é excessivamente exigente uma vez que não nos obriga a eliminar toda a
pobreza absoluta, mas apenas aquela que podermos combater sem que tenhamos que
sacrificar algo de importância moral comparável. Cabe a cada um de nós justificar o que
considera ser de valor moral comparável ao sofrimento causado pela pobreza absoluta. - 182
Para levarmos até às últimas consequências a primeira premissa teríamos, não só, que abdicar
das idas ao cinema, mas de quase tudo o resto que faz com que a nossa vida seja mais do que
a mera sobrevivência. - 182
Se eu prescindir de um café por ano para contribuir para uma ONG, fiz algo para diminuir
alguma pobreza, mas, posso considerar que cumpri o meu dever moral? - 182
Alguns podem considerar que o argumento de Singer implica que a minha vida, ou pelo menos
uma parte dela se deve transformar num instrumento ao serviço do bem-estar dos outros-183
Para Colin McGínn não devo ver a minha vida apenas como um meio para as outras pessoas
aumentarem o seu bem-estar” - 183
43
Este princípio levaria a “uma renúncia à autonomia pessoal, ao direito de viver a nossa vidas
como nossa, fazendo com que, em nome da obrigação moral de maximizar o bem-estar, eu
tivesse que desistir de fazer filosofia, ou ler, ou gastar dinheiro em férias, ou de colocar os
meus filhos na universidade para lhes garantir uma boa educação, aumentando o meu
sofrimento para diminuir o dos outros. - 183
Contudo, Singer não pretende com o seu argumento sacrificar até ao limite o bem-estar de
cada um para maximizar o bem-estar geral da humanidade, chamando a atenção para a
existência de um “sistema de responsabilidades especiais” no que diz respeito, por exemplo,
às relações de parentesco, daí que seja absurdo propor que daqui para a frente nos
consideremos igualmente responsáveis pelo bem-estar de toda a gente do mundo. - 184
O argumento de Singer não nos diz que devemos abandonar os nossos filhos para nos
dedicarmos a erradicar a fome no mundo, mas sim, como nos propõe Dower “devemos
assistir os outros o mais que pudermos e que seja compatível com uma preocupação razoável
com a nossa qualidade de vida.”. - 184
Porque é que nos devemos importar com o sofrimento de pessoas que não conhecemos, que
vivem em sociedades, culturas e países tão distantes?
A universalidade dos juízos éticos exige que não pensemos apenas nos nossos interesses ou
naqueles com os quais partilhamos uma cultura, uma religião ou uma nacionalidade. - 185
Uma perspetiva utilitarista como a de Peter Singer colide com uma teoria dos direitos,
nomeadamente com o direito de propriedade individual tal como é defendido por autores
como Robert Nozick. Para este, desde que alguém tenha adquirido uma propriedade em
conformidade com o princípio de justiça pode fazer deles o que quiser. - 185
Qualquer interferência externa neste cesso viola os direitos naturais dos indivíduos e como tal
é imoral. Nem os ricos têm o dever de ajudar, nem os pobres o direito à ajuda, uma vez que
não possuem qualquer direito sobre a propriedade dos outros. Qualquer obrigação
redistributiva violaria os direitos do indivíduo, nomeadamente a sua liberdade. - 186
Podemos também considerar que satisfazer os interesses dos mais pobres pode conduzir, não
à maximização do bem-estar, mas ao aumento do sofrimento geral. - 186
44
Defendendo uma perspetiva consequencialista Singer não pode deixar de aceitar que, se a
ajuda aos pobres conduzir ao aumento e não à diminuição da pobreza, não o devemos fazer.
Tal argumento é defendido por Garrett Hardin através da sua metáfora do “bote salva-vidas”.
Para este autor “os ricos devem deixar os pobres morrer de fome, porque, de outro modo, os
pobres arrastarão os ricos com eles para a miséria”. O seu pensamento neomalthusiano
considera a pobreza como algo de natural e inevitável. A fome é uma consequência
incontornável do aumento populacional e esta constitui uma estratégia do processo de
seleção natural. - 186
Singer não encontra factos que corroborem a relação ente diminuição da pobreza, aumento
populacional e escassez alimentar. - 186
É muito comum justificar a nossa recusa em ajudar alegando que essa responsabilidade é dos
governos, mas Singer considera que a responsabilidade coletiva não pode fazer desaparecer a
responsabilidade individual. - 187
Para Dower a justiça é entendida como justiça social global não se limitando às interações
entre pessoas da mesma comunidade; mas como é que tal situação de justiça social se pode
alcançar? Através da distribuição equitativa dos recursos mundiais. - 188
Assim, a exigência de justiça que é concretizada pela assistência propõe não só a satisfação
das necessidades elementares da humanidade, mas também o fim da injustiça ativa
compensando os povos injustiçados pela exploração a que foram sujeitos pelos países mais
ricos e que constitui uma das causas do seu persistente estado de pobreza. A assistência é um
dever porque todos nós somos, de alguma forma, beneficiários deste estado de coisas. - 188
45
3-A ÉTICA COSMOPOLITA - 189
A ética cosmopolita é uma resposta à globalização. Um cosmopolita vê o mundo, no seu todo,
como uma comunidade moral. Diz que nos devemos preocupar fundamentalmente com os
indivíduos e com o seu bem-estar e que é irrelevante a parte do mundo em que esses
indivíduos se encontram, pois, todos os indivíduos devem ser considerados de modo
igualitário em termos morais. - 188
As “razões do mundo” terão que se sobrepor às “razões de estado”. A face mais visível deste
mundo global é a interdependência económica. - 190
Ora, tal interdependência, ao invés de promover a igualdade, promove uma cada vez maior
desigualdade distributiva, ainda que os seus benefícios sejam consideráveis. O que promove a
desigualdade? O investimento estrangeiro em países pobres sob a forma de multinacionais, ao
invés de beneficiar o país de acolhimento, explora a mão-de-obra barata ou os seus recursos
naturais, transferindo os lucros da sua atividade para outros locais. - 190
Charles Beitz propõe a criação de um conjunto de instituições que funcionassem como uma
estrutura constitucional da economia mundial. Algumas destas instituições já existem e
influenciam, ainda que de modo insuficiente, a distribuição da riqueza mundial; a cooperação
social é, para Beitz, o fundamento da justiça distributiva, pois a interdependência mundial
exige princípios globais. - 191
A ser assim, o que é que impede a aplicação global de um princípio de justiça distributiva?
Beitz refere dois dos principais obstáculos:
1. A inexistência de instituições globais que permitam obrigar e aplicar esse princípio;
2. A inexistência de um sentido de pertença a uma comunidade global e, como tal, as
pessoas não se sentirem comprometidas com um sentido global de justiça.
46
4-THOMAS POGGE - 192
Para Thomas Pogge o nosso dever de aliviar a pobreza no mundo fundamenta-se no facto de,
até certo ponto, a pobreza extrema em que muitos vivem ser uma consequência da ordem
mundial que o ocidente impõe ao mundo. - 192
Atualmente, não só não estamos a ajudar os pobres como devíamos, como estamos a mantê-
los na pobreza através da imposição de uma ordem mundial à qual os mais fracos não se
podem Opor, da qual somos beneficiários e que é responsável pelas maiores injustiças. - 192
Existem duas razões para nos sentirmos responsáveis pela erradicação da pobreza: - 193
2. Ou por termos falhado o nosso dever negativo de não compactuar com a injustiça,
não contribuir ou não tirar proveito das injustiças que conduzem os outros à pobreza.
Pogge chama a esta partilha dividendo pois supõe que todos os pobres do mundo têm direito
a uma parte dos recursos naturais limitados. Esse dividendo deve ser usado para assegurar
que todos os seres humanos possam ver satisfeitas as suas necessidades básicas e viver com
dignidade. - 194
Pogge não é irrealista. Qualquer alteração às circunstâncias que mantêm a pobreza não pode
acarretar o empobrecimento dos cidadãos dos países ricos. - 194
Esta ideia não propõe uma mundialização dos recursos, nem a sua partilha igualitária. Cada
governo continuaria a ter o controlo dos recursos existentes no seu território. Teria apenas
que compensar os países pobres pelo uso e lucros obtidos com o usufruto, isto é, teria que
distribuir uma parte dos dividendos. Do ponto de vista de Pogge, podemos erradicar a
pobreza com um pequeno contributo, desde que cumprido por todos. - 195
47
RESUMO ADICIONAL - TEXTOS DE APOIO
Para Thomas Pogge o nosso dever de aliviar a pobreza no mundo fundamenta-se no facto da
pobreza extrema em que muitos vivem ser uma consequência da ordem mundial que o
ocidente impõe ao mundo. Os direitos humanos implicam a proteção contra certas instituições
sociais coercivas e conta os indivíduos que sustentam e beneficiam dessas instituições.
Podemos considerar duas razões para nos sentirmos responsáveis pela erradicação da
pobreza, ou por falha do dever positivo ou do dever negativo.
No dever positivo, a pobreza é um mal, nós vivemos melhor, logo temos obrigação de ajudar.
Dever negativo na medida que a pobreza absoluta é produto de uma injustiça que nós
ajudamos a manter. Não podemos ignorar as causas locais da pobreza, mas muitos dessas
causas são fruto de ações internacionais. Os cidadãos dos países ricos usufruem da maior parte
dos recursos mundiais retirando daí inúmeros benefícios sem que exista qualquer
contrapartida dos países pobres que são sistematicamente excluídos dessa partilha.
48
TEMA 8 - AS MIGRAÇÕES INTERNACIONAIS
O tema das migrações converteu-se em Política de Estado e em objeto de analise para a
filosofia política. Nas duas últimas décadas deu-se um espetacular aumento do volume e do
grau de mundialização dos sistemas migratório. Em consequência, os migrantes apresentam
uma variedade demográfica, social, cultural e económica cada vez maior. - 197
Não se estranha, portanto, que a maioria dos governos tenha tomado consciência da
necessidade de dar resposta política e jurídica a este fenómeno que é permanente e que pode
vir a alterar a estrutura demográfica, social, cultural, económica e laboral de um país. - 197
Nas duas últimas décadas, deu-se um espetacular aumento não só do volume, mas também do
grau de mundialização do sistema migratório, no seu duplo sentido:
Mesmo que se aceite a decisão de migrar é fruto de uma decisão racional tomada em ultima
instancia para minimizar as suas oportunidades vitais, existem outros fatores que não são
desprezíveis, nomeadamente, as politicas de admissão desenvolvidas por vários países a partir
do séc. XIX e cuja importância para o encaminhamento das correntes migratórias nunca se
pode negligenciar. - 200
Os Estados são responsáveis pelo ponto migratórios e a forma como atuam configuram um
corpus normativo e político que afeta a maneira como decorrem as deslocações das pessoas
entre fronteiras, e isto implica ainda uma mudança transitória ou, em muitos casos, definitiva,
«de pertença a uma comunidade social e política nacional». - 200
Se a soberania nacional já sofreu a profunda erosão provocada pelos processos de globalização
a impossibilidade de manter a integridade das fronteiras face à pressão migratória nada mais
fez do que ampliar este processo. - 200
49
2-IMIGRAÇÃO E CIDADANIA - 201
Os pontos de migração não podem ser pensados sem a analise das mutações e das tensões
que marcam atualmente o conceito e a pratica institucional da cidadania. - 201
Entre o conjunto de medidas que tem que ser incluídas em qualquer política coerente para as
migrações nunca poderá faltar a regulamentação da aquisição da cidadania, sendo um
dispositivo fundamental que a comunidade política tem para definir os seus próprios limites
internos, sendo que para o imigrante marcam o horizonte de expectativas e como planear a
sua vida. - 201
Uma pessoa pode gozar de todos os direitos inerentes à cidadania e inclusive pode ser
formalmente membro de uma comunidade e, mesmo assim, sentir-se um estrangeiro incapaz
de se ajustar bem a um ethos cultural que parte de uma autodefinição na qual não há lugar
para a sua comunidade de origem. - 203
Entre outros fatores a não participação na vida política e a não integração na função publica
não ajudam em nada a sua integração. Ao atribuir-se um certo estatuto de direitos e deveres
evitam-se formas flagrantes de marginalização. Pelo que o acesso dos imigrantes à cidadania é
uma condição necessária à constituição de uma sociedade integrada.
50
As fronteiras territoriais possuem uma enorme relevância jurídico política, pois é com elas que
se assinala o direito a que está submetida uma população, indicam que pessoas e instituições
exercem a autoridade sobre um certo território e definem o corpo de cidadãos que integram a
comunidade política. - 207
1. Económicos: evitar correr ris- cos que ponham em perigo o bem-estar económico da
sociedade de acolhimento;
2. Culturais: assegurar a identidade e a integridade da cultura da sociedade em questão.
3. Políticos: salvaguardar os processos políticos internos de intromissões que possam
afetar o seu desenvolvimento.
Walzer é um acérrimo defensor do controlo das fronteiras, argumentado que para manter a
cultura política, que é uma coisa que à qual todos os povos organizados têm direito, as
sociedades devem ter o poder de limitar a imigração. Para este autor, uma política de receção
de imigrantes deve corresponder aos interesses da sociedade em questão. - 208
Ao contrario dos que defendem a manutenção das limitações à imigração pelos governos
baseiam-se principalmente numa contração comunitarista/nacionalista de cidadania. - 209
51
4-A GESTÃO POLÍTICA DA IMIGRAÇÃO E DO PLURALISMO EMERGENTE - 210
Giovanni Sartori e Samuel Huntington, bradam aos céus perante os problemas de integração
gerados pelas recentes vagas de imigrantes, sobretudo devido à facilidade com que estes
vizinhos mantêm vínculos afetivos com a sua cultura de origem. - 210
Estes autores dão como exemplos concretos o dos hispânicos nos Estados Unidos e o dos
muçulmanos na Europa e consideram que em alguns casos eles podem constituir um risco para
a identidade nacional e para as sociedades de acolhimento. - 211
Uma politica migratória coerente e digna deveria apoiar-se em pelo menos 3 eixos:
52
5-AS MIGRAÇÕES INTERNACIONAIS E A DIMENSÃO GLOBAL DA JUSTIÇA - 213
Tal como Saskia Sassen advertiu, por vezes a gestão política da imigração tem o estranho
efeito de renacionalizar a política quotidiana: «quando se trata de imigrantes e de refugiados o
Estado readquire todo o seu antigo esplendor e declara o seu direito soberano de controlar as
suas fronteiras». - 213
Num mundo cada vez mais globalizado, esta tendência renacionalizadora só pode ser
entendida como paradoxal, principalmente se se tiver em conta que o sistema migratório
internacional está cada vez mais mundializado e os seus efeitos fazem-se sentir em qualquer
região do planeta. Perante a dimensão mundial alcançada pelos fluxos migratórios, torna-se
premente a necessidade de recuperar uma perspetiva global e complexa dos pontos
desencadeados. - 213
No que diz respeito às migrações, é cada vez mais urgente a necessidade de dispor de um
quadro normativo adaptado a um mundo globalizado. - 213
A teoria da justiça que hoje em dia goza de maior prestígio e que foi oportunamente proposta
por John Rawls contém enormes lacunas que se tomam evidentes quando se tenta aplicá-la
fora dos limites dos Estados constituídos. - 213
É por isso que a cidadania e as fronteiras também têm de ser reformuladas de acordo com a
perspetiva de uma noção global de justiça. - 213
Se cada Estado procurar individualmente soluções para os conflitos e problemas gerados para
imigração, acabarão por não se conseguir resolver corretamente.
53
TEMA 10 - GUERRA JUSTA E TERRORISMO
A guerra consiste num conflito armado e violento entre duas ou mais comunidades políticas.
Mas a guerra também pode ser um recurso de comunidades políticas que aspiram à
independência e ao exercício livre da soberania, assim como de grupos organizados, partidos ou
facões de um Estado que pretendem influenciar decisivamente a sua orientação política. No
primeiro caso estamos perante guerras pela autonomia ou pela secessão, no segundo, perante
guerras civis. - 241
A guerra pressupõe sempre o recurso à violência com fins políticos, o que, aliás, levou
Clausewitz a considerá-la como a continuação da política por outros meios. - 241
O terrorismo é uma estratégia profusamente utilizada pelos Estados, quer contra os inimigos, na
guerra, quer contra a sua própria população civil. - 242
54
Embora seja verdade que o realismo sustenta uma posição genericamente pró-guerra,
favorecendo por exemplo as guerras preventivas, não se deve confundir realismo com
militarismo. - 244
Algumas correntes possuem inspiração religiosa, em que a defesa das comunidades políticas e
dos valores do Estado não se pode sobrepor à lei divina. - 245
55
1.3-O UTILITARISMO
Ao contrário das correntes anteriores, tal como a teoria da Guerra justa, admite que a Guerra
tem uma natureza moral e que as ações que ai decorrem podem ser sujeitas à normatividade
ética. Institui como critério de moralidade na Guerra o principio da utilidade. - 247
Admite que a Guerra pode ter um carácter moral que contribua para a maximização da
felicidade para o maior número de pessoas. - 247
Assim, matar, segundo a moralidade utilitarista, não é um mal em si, mas um mal na medida
em que provoca sofrimento àquele que morre, aos seus familiares e amigos, além de o privar
de toda a sua felicidade futura. - 248
Desta forma, o utilitarismo tenta superar aquela que é uma das objeções que mais
insistentemente lhe é levantada, a de que obrigaria o agente a cálculos, muitas vezes
complexos, nada condicentes com a urgência das situações. - 249
Existe o risco de legitimar o sacrifício das vidas dos inocentes, desde que esse sacrifício pareça
propiciar mais felicidade para o maior número. - 249
Segundo Walzer, porque na guerra existe um conflito insanável entre a utilidade e os direitos,
estes devem prevalecer sempre, à exceção, das situações de emergência suprema. - 249
Acreditam que a guerra é um recurso legítimo das comunidades políticas, embora extremo,
para forçar o respeito pelos seus direitos políticos na esfera internacional. Assim, a guerra não
só pode ser moralmente legítima, como ser um imperativo moral. - 250
A guerra só pode ser travada por razões morais e como via necessária para a paz. - 250
56
Os teóricos da guerra justa consideram que a guerra nunca pode ser um prolongamento
natural dos interesses políticos, económicos ou religiosos, nem ser travada em nome da
expansão do império ou da fé. Na realidade, as guerras justas são essencialmente defensivas, e
limitadas nos seus objetivos e na força empregue. - 250
Por outro lado, a incapacidade para discriminar a justiça da injustiça, leva-nos a atribuir igual
valor tanto a um ato de legítima defesa como ao massacre de inocentes. - 251
A teoria da guerra justa é uma corrente deontologista e por isso rejeita os cálculos de
utilidade, uma vez que podem conduzir, em nome da grandeza dos fins, à violação dos direitos
e à permissão de meios considerados mala in se. - 251
Esta teoria opera algumas distinções fundamentais, dando origem a três outras teorias:
1. A boa intenção;
2. A autoridade competente;
3. A causa justa;
4. O último recurso;
5. A probabilidade de sucesso;
6. A justa proporcionalidade.
Uma guerra não pode ser justa se não for comandada por boas intenções, ou seja, só é justa se
visar a defesa de direitos, essencialmente, os direitos à vida, à liberdade individual e à
liberdade política das comunidades. - 251
O princípio da autoridade competente assenta num outro princípio, o de que o Estado detém
o monopólio do uso legítimo da força para imposição da legalidade. - 252
A guerra deverá obedecer também a uma causa justa. «Apenas a agressão pode justificar a
guerra», seja ela uma guerra de legítima defesa, seja ela uma intervenção estrangeira. - 252
57
O critério do último recurso sublinha a primazia da paz sobre a guerra no pensamento da
guerra justa». Os conflitos devem ser resolvidos de forma pacífica, recorrendo por exemplo à
diplomacia e a sanções, e só depois de esgotados todos os recursos, e em casos extremos, se
pode dar início às hostilidades. - 254
Uma guerra para ser justa tem também de respeitar o critério da probabilidade de sucesso.
Este critério visa prevenir desastres anunciados, o recurso à guerra quando a desproporção de
forças é tão elevada que não faz sentido ter esperança na vitória. - 255
Chama-se jus in bello à teoria que se ocupa da justiça do combate e dos meios nele
empregues, pelo que está menos orientada para questões políticas e mais para questões
estratégicas e táticas, assim como para os limites morais do ato de matar, em que o aspeto
central, é o da igualdade moral de todos os combatentes. - 255
O soldado tem o direito de matar, “privilégio” que não lhe é concedido na vida civil, mas não o
faz a título pessoal, mas sim enquanto instrumento político da sua comunidade. - 256
A igualdade moral dos combatentes, parece pôr em causa o princípio de que a violência só é
justa como resposta a uma agressão. No entanto deve-se notar que só o soldado que combate
por uma causa justa tem legitimidade para matar. Os restantes apenas podem recorrer à
violência em legítima defesa. - 256
No entanto, nem todos os civis possuem imunidade. Ex: Os que trabalham em fábricas de
armamento. - 257
Walzer apenas admite a subordinação do jus in bello ao jus ad bellum nas situações de
emergência suprema em que por exemplo uma comunidade se vê ameaçada de extinção e os
seus membros condenados ao genocídio ou à escravidão, dá-se um conflito insanável entre os
direitos humanos e os direitos das comunidades. - 259
A terceira teoria, o jus post bellum, trata «da restauração da paz, da ocupação militar e da
reconstrução política, e é talvez, de todas, a teoria mais ignorada. No entanto, a reconstrução
política a que foram submetidas as potências do Eixo na II Guerra Mundial e as mais recentes
crises que conduziram a intervenções humanitárias deram-lhe um forte alento. Antes de mais,
o jus post bellum reflete sobre o momento adequado para dar por terminado um conflito
armado. - 259
Para que tal seja possível, um Estado vítima de agressão pode exigir compensação financeira
pelos danos sofri- dos, o desarmamento total ou parcial do Estado agressor, como prevenção
contra futuras agressões. Pode ainda exigir a condenação dos criminosos de guerra. - 259
Walzer pretende evitar a predominância do jus ad bellum, ou seja, pretende evitar que um
Estado vítima de agressão, aproveitando uma vantagem militar, se possa sentir no direito de
promover ocupações injustas e de privar os agressores dos seus direitos individuais e coletivos.
As ocupações justas devem ser temporárias, não podem ocultar um programa de anexação
territorial ou de delapidação de recursos, pois os agressores mantêm o direito «a continuarem
a existir enquanto nações e, exceto em circunstâncias extremas, mantêm as prerrogativas
políticas da nacionalidade. - 260
Muitas organizações terroristas lutam pela secessão e pela autonomia política de uma
determinada comunidade, ou ainda pela transformação da sociedade, tentando promover
ideais políticos ou religiosos. Neste sentido, e porque os membros das organizações terroristas
podem ser representantes das suas comunidades políticas, recorrendo à violência em nome
delas, é possível enquadrar o terrorismo nos princípios do jus ad bellum. - 261
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Segundo Walzer, o terrorismo viola também o princípio da boa intenção, do último recurso, e
o da probabilidade de sucesso. Pela mesma razão, dificilmente se ajusta ao critério da justa
proporcionalidade. - 261
Para Walzer, o terrorismo é, pois, uma «estratégia civil» violenta que visa «aterrorizar
sistematicamente populações inteiras; o seu propósito é a destruição do moral de uma nação
ou de uma classe, o de minar a sua solidariedade». - 261
O terrorismo trata as suas vítimas como um meio e não como um fim em si mesmo. - 262
Walzer faz questão de distinguir o terrorismo dos assassinatos políticos, que embora possam
ser questionáveis, têm o mérito de discriminar os alvos, de distinguir entre os agentes
políticos, os militares, os apoiantes de regimes opressores e os cidadãos comuns. - 263
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