Você está na página 1de 26

Ad fontes: a reforma luterana como resgate da teologia patrística

Djesniel Stheieny Krause1

Resumo: Martinho Lutero e os demais Reformadores do século XVI tiveram algumas ênfases
teológicas, em especial pode-se mencionar os termos latinos Sola Fide, Sola Gratia, Solus Christus e
Sola Scriptura como fundamentais em sua teologia. Por vezes, os Reformadores são acusados de
inserir inovações teológicas no seio da Igreja e assim causar alvoroço e cismas desnecessários ao
questionar a autoridade papal. Cada um dos princípios teológicos mencionados está longe de ser uma
inovação teológica, antes, podem ser encontrados já entre os autores patrísticos. Lutero e os demais
reformadores empenham-se em um retorno às origens, à teologia patrística, à Igreja Apostólica, às
Escrituras, ad fontes2.

Palavras chave: Lutero. Agostinho. Luteranismo. Patrística.

Abstract: Martin Luther and the other Reformers of the 16th century had some theological emphases,
in particular the Latin terms Sola Fide, Sola Gratia, Solus Christus and Sola Scriptura can be
mentioned as fundamental in their theology. Sometimes, the Reformers are accused of introducing
theological innovations within the Church and thus causing unnecessary uproar and schisms by
questioning papal authority. Each of the theological principles mentioned is far from being a
theological innovation, rather, they can already be found among patristic authors. Luther and the other
Reformers committed themselves to a return to the origins, to patristic theology, to the Apostolic
Church, to the Scriptures, ad fontes.

Keywords: Luther. Augustine. Lutheranism. Patristic.

1
Djesniel Stheieny Krause é bacharel em Administração pela Universidade da região de Joinville – UNIVILLE,
bacharel em Teologia pelo Centro Universitário Internacional – UNINTER, possui MBA em gestão de pessoas
pela Anhanguera Educacional, pós-graduação em Teologia, Bíblia e Missão e em Revitalização de Comunidades
pela Faculdade Luterana de Teologia – FLT e pós-graduação em Cristianismo e Política pelo Seminário
Teológico Jonathan Edwards. É membro do conselho sinodal do Sínodo Norte Catarinense da Igreja Evangélica
de Confissão Luterana no Brasil - IECLB, bem como conselheiro distrital da Missão Evangélica União Cristã -
MEUC. Email: djesniel@yahoo.com.br
2
Ad fontes é um termo latino que serviu de lema para os humanistas europeus da Baixa Idade Média tem por
significado “voltar às fontes”.
1. Introdução
O presente trabalho visa analisar alguns dos principais temas da teologia luterana,
avaliar em que sentido as ideias do reformador alemão são inovadoras, são uma continuidade
e desenvolvimento do pensamento medieval ou são uma redescoberta da teologia patrística e
demonstrar que os temas centrais da teologia luterana não significam de modo algum uma
revolução teológica mas sim a redescoberta de certos temas bem como a continuidade e
desenvolvimento de outros temas teológicos.
Para este fim, o artigo está dividido em duas partes, onde a primeira parte abordará
brevemente a biografia de Martinho Lutero e seu contexto histórico. Descrevendo os
principais acontecimentos da vida do reformador, bem como os motivos que o levaram a
pregar suas 95 teses na porta da igreja do castelo de Wittenberg, “dando início a uma
conflagração que veio a ser o maior levante intelectual e espiritual jamais ocorrido na Europa”
(MCGRATH, 2014, p. 33).
Já a segunda parte será subdividida em outras quatro partes, onde se irá expor os
quatro princípios teológicos centrais para a reforma luterana, que ficaram conhecidos pelos
termos latinos Sola Gratia, Sola Fide, Solus Christus e Sola Scriptura, significando
respectivamente: Somente a Graça, Somente a Fé, Somente Cristo e Somente a Escritura. O
trabalho propõe-se a demonstrar que tais princípios já estão presentes nos escritos de vários
dos principais autores cristãos dos primeiros séculos da história do cristianismo, denominados
autores patrísticos, tais como Irineu de Lyon, Policarpo de Esmirna, Ambrósio de Cesaréia,
Agostinho de Hipona, João Crisóstomo entre tantos outros, e defender assim que Lutero não
rompe com séculos de tradição cristã e nem traz inovações teológicas nunca antes defendidas,
antes, Lutero e a tradição luterana lutam contra as inovações, exageros e erros teológicos da
Baixa Idade Média.
Permeando os quatro Solas, também serão avaliados alguns temas centrais da teologia
luterana, tais como a justificação forense, a distinção feita entre a justificação e a santificação
e a imputação da justiça de Cristo ao pecador.

2. Martinho Lutero em seu contexto histórico


Martin Luder nasceu em 10 de novembro de 1483 na pequena cidade Eisleben,
Saxônica, no Sacro Império Romano Germânico. Filho de um casal de empreendedores que
possuíam uma mineração de cobre, Hans e Margarethe Luder. Martinho, que era o mais filho
mais velho, deveria “avançar a posição de sua família. Martinho teria de continuar a fazer a
família subir na escala social e econômica. Seus pais trabalhavam arduamente para que o filho
tivesse o estudo e as oportunidades que eles jamais tiveram” (NICHOLS. In: SPROUL;
NICHOLS, 2017, p. 35).
Para este fim, Margarethe e Hans enviaram seu filho Martinho para estudar em outras
cidades tais como Mansfeld, Magdeburgo e Eisenach. “Durante seus primeiros estudos, o
jovem Martinho se superava, distinguindo-se entre todos os seus colegas” (NICHOLS. In:
SPROUL; NICHOLS, 2017, p. 36). Tal distinção intelectual lhe foi fundamental para mais
tarde ingressar na universidade de Erfurt, onde pôde estudar as artes liberais e iniciar seus
estudos para tornar-se doutor em direito.
Em 1505 Martinho foi para Eisleben afim de visitar seus pais, no retorno para Erfurt
ele enfrentou uma terrível tempestade que alteraria para sempre o rumo da sua vida intelectual
e espiritual. Uma das mais vívidas descrições do acontecimento é encontrada na obra de
Roland Bainton:

Ao voltar aos estudos, após visitar seus pais, um relâmpago repentino derrubou-o ao chão.
Naquele único relance, ele viu o desenlace do drama da existência. Havia Deus,
absolutamente terrível; Cristo, o inexorável, e todos os demônios maldosos que saltariam de
seus esconderijos na floresta, com gargalhadas sardônicas, e o agarrariam pelos cabelos
para trancafiá-lo no inferno. Não é de surpreender que ele tenha clamado à santa de seu pai,
padroeira dos mineiros: “Santa Ana, ajuda-me! Eu me tornarei monge” (BAINTON, 2017,
p. 42-3).

Dada a sobrevivência de Martinho à tempestade, ele se apresentou ao mosteiro dos


agostinianos de Erfurt a fim de ingressar na vida monástica, algo que causou o total desgosto
de seu pai, que nutria tantas esperanças relacionadas a vida econômica da família no jovem
estudante. A vida monástica assumida por Lutero foi marcada pela excelência intelectual e
por uma religiosidade meticulosamente exagerada onde ele buscava conquistar o favor de
Deus.
A espiritualidade e as convicções soteriológicas na Baixa Idade Média, especialmente
a escola teológica denominada Via Moderna associada a Guilherme de Ockham, a qual era
ensinada em Erfurt, eram dominadas pelo conceito de mérito de côngruo, que afirmava que
Deus estava obrigado, dada Suas promessas, a recompensar as boas obras dos fiéis, obras
estas que de outra forma não seriam consideradas meritórias de forma alguma. McGrath
explica da seguinte forma:

Os teólogos da via moderna desenvolveram o conceito da confiabilidade da potentia


ordinata com referência à idéia de uma ‘aliança’ ou um ‘contrato’ (pactum) entre Deus e a
humanidade. É esse pactum, firmado de modo unilateral por Deus, que constitui o ponto
crítico das doutrinas da justificação associadas à via moderna. Considera-se que Deus
resolveu recompensar aqueles que fazem quod in se est (que pode ser traduzido livremente
como ‘fazem o seu melhor’) com a dádiva da graça justificadora. Aqueles que preenchem
esse pré-requisito mínimo para a justificação (em outras palavras, aqueles que fazem quod
in se est), serão justificados em função da fidelidade de Deus ao pactum. Esse processo não
pode ser considerado equivalente a Deus ter uma obrigação externa para com alguém ou
para com algum princípio abstrato autônomo independente de Deus. Antes, o pactum
articula a idéia crítica de autolimitação divina, que se concentra, em particular, no
conceito de fidelidade a uma promessa declarada publicamente (MCGRATH, 2007, p. 85,
grifos do autor).

Ainda assim, por mais que Lutero se esforçasse em viver retamente e fizesse de tudo
para evitar a ira de um Deus justo, nada parecia dirimir seu sentimento de culpa por seus
pecados. Sempre permanecia a dúvida se ele de fato havia feito tudo o que estava a seu
alcance. R.C. Sproul comenta:

Nada que ele fazia lhe dava paz à mente ou aquietava sua consciência. Ele poderia passar
longos períodos no confessionário. Com frequência, depois de gastar horas confessando
seus pecados ao padre confessor e recebendo a absolvição, ele voltava à sua cela e de
repente se lembrava de um pecado que havia esquecido de confessar. Ele também estava
envolvido em autoflagelação e as rigorosas formas de asceticismo que monges usavam para
purgar-se de quaisquer maus pensamentos. (SPROUL, 2021, p. 12, tradução nossa).3

Sobre tais sentimentos de culpa e tentativas de apaziguar a ira de Deus, Lutero, anos
mais tarde, refletindo sobre a sua conversão, escreverá em seu comentário à carta aos
Romanos:

Eu fora tomado por uma extraordinária paixão em conhecer a Paulo na Epístola aos
Romanos. Fazia-me tropeçar não a firmeza de coração, mas uma única palavra no primeiro
capítulo: “A justiça de Deus é nele [no Evangelho] revelada” (Rm 1.17). Isso porque eu
odiava esta expressão “justiça de Deus”, pois o uso e o costume de todos os professores me
havia ensinado a entendê-la filosoficamente como justiça formal ou ativa (como a
chamam), segundo a qual Deus é justo e castiga os pecadores e injustos. Eu não amava o
Deus justo, que pune os pecadores; ao contrário, eu o odiava (LUTERO. In: LUTERO,
2003, p. 242).

Já em 1515, quando Lutero se preparava para lecionar sobre a epístola de Romanos em


Wittenberg, Lutero se deparou com o termo que era para ele motivo de temor: a justiça de
Deus. O termo é para ele sinônimo de condenação, uma vez que um Deus justo há de
condenar os pecadores, e Lutero se entende um pecador. Causa-lhe confusão a justiça de Deus
ser chamada de evangelho, uma boa nova, pois não há boa notícia na sua condenação. A
grande mudança para Lutero foi quando compreendeu as palavras finais do versículo 17 do
primeiro capítulo da carta, onde encontra-se a afirmação de que o justo viverá pela fé, uma
citação que Paulo faz do livro de Habacuque, 2:4. Lutero escreve sobre a experiência: “Então
me senti como que renascido, e entrei pelos portões abertos do próprio paraíso” (LUTERO.

3
“Nothing he did gave him Peace of mind or quieted his conscience. He would spend long periods of time in the
confessional. Often spending hours confessing his sins to the father confessor and receiving the absolution, he’d
go back to his cell and suddenly remember a sin that he had forgotten to confess. He was also involved in self-
flagellation and the rigorous forms of asceticism that monks used to purge themselves of any evil thoughts”.
In: LUTERO, 2003, p. 242). Diversos estudiosos afirmam ser este o momento de conversão
do reformador.
É digno de nota o fato de que em 1516 o humanista holandês Erasmo de Roterdã publicou seu
Novo Testamento em grego, escrito a partir da compilação de manuscritos antigos. Tal
esforço se deu por conta da insistência do humanismo europeu no retorno às fontes literárias,
de preferência em sua língua original, lema que ficou conhecido pelos termos latinos Ad
Fontes, McGrath explica que “o lema ad fontes era mais do que, simplesmente, um chamado
para uma volta às fontes antigas – era um chamado para uma volta às realidades essenciais da
existência humana conforme estas se encontravam registradas nas fontes literárias”
(MCGRATH, 2007, p. 50) e ainda “comentários e glosas deviam ser colocados de lado a fim
de haver um envolvimento direto com o texto em si – quer o texto em questão fosse o
Pandects de Justiniano ou o Novo Testamento” (MCGRATH, 2007, p. 50)
Tal publicação será avidamente estudada por Lutero e servirá de base para o seu
trabalho de tradução do Novo Testamento do grego para o alemão em 1521, no seu exílio
forçado em Wartburg. Algumas palavras da Vulgata Latina de Jerônimo não expressavam
com exatidão o sentido das palavras em grego, alterando assim alguns aspectos essenciais da
teologia da Idade Média. R.C. Sproul dá um exemplo:

A palavra latina para “justificação” que era usada nessa época na história da Igreja é
justificare. Isto vem do sistema judicial romano, e era composta pela palavra justus, a qual
é “justiça” ou “retidão”, e ficare, a qual significa “fazer”. Os pais latinos entenderam a
doutrina da justificação como o que acontece quando Deus, através dos sacramentos da
Igreja, transforma pessoas depravadas em retas. Mas Lutero estava agora olhando a palavra
grega que está no Novo Testamento, dikaiosyne – não a palavra latina. A palavra grega não
significa fazer justo mas ao invés disso considerar como justo, contar como justo,
declarar justo. (SPROUL, 2021, p. 31, grifos do autor, tradução nossa).4

Outro importante exemplo de uma alteração na compreensão do texto bíblico é


descrito pelo estudioso britânico Alister McGrath e diz respeito “[...] a atitude mental do
arrependimento e o sacramento da penitência, que de um modo geral havia sido aceito em
grande parte, devido à tradução Vulgata de Mateus 4.17” 5 (MCGRATH, 2007, p. 134) e em
seguida segue explicando: “Essa passagem havia sido compreendida como uma declaração da
necessidade de ‘fazer penitência’ como preparação para a vinda do Reino de Deus”
(MCGRATH, 2007, p. 134).
4
“The Latin word for ‘justification’ that was used at this time in church history was justificare. It came from the
Roman judicial system, and it was made up of the word justus, which is ‘justice’ or ‘righteousness’, and ficare,
which means ‘to make’. The Latin fathers understood the doctrine of justification as what happens when God,
through the sacraments of the church, makes unrighteous people righteous. But Luther was looking now at the
Greek word that is in the New Testament, dikaiosyne-not the Latin word.The Greek word didn’t mean to make
righteous but rather to regard as righteous, to count as righteous, to declare righteous”.
5
“Daí por diante, passou Jesus a pregar e a dizer: Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus”.
Tais equívocos no entendimento da Igreja Católica referente a prática da penitência
evoluiu ao longo dos séculos e deu origem à ideia das indulgências, um documento com
validade papal que poderia ser adquirido mediante a peregrinação a locais sagrados, a
contemplação de relíquias, a realização de determinadas obras e, em todos os casos, o
pagamento das taxas estipuladas. As redescobertas do Evangelho feitas por Lutero estavam
cada vez mais destoantes em relação as práticas da Igreja medieval. De fato, como bem
destaca Alister McGrath, “ao final da Idade Média, a necessidade de reforma e renovação
dentro da Igreja cristã na Alemanha e em outros lugares se tornara tão óbvia que já não podia
mais ser ignorada” (MCGRATH, 2014, p. 22).
Em 1514 o Papa Leão X, que havia herdado as dívidas do papa anterior, se viu em
dificuldades financeiras que lhe impossibilitava de dar continuidade a construção da basílica
de São Pedro. Stephen Nichols destaca que “com o tesouro exaurido, Leão precisava de um
meio para levantar fundos. A solução foi um acordo com Alberto, arcebispo de Magdeburgo.
Alberto queria o arcebispado de Mainz. Mas, pela lei canônica, era ilegal ter dois bispados
simultaneamente; assim, Alberto precisava de uma dispensa papal” (NICHOLS. In: SPROUL;
NICHOLS, 2017, p. 46). Entretanto, o valor que Alberto possuía não era o suficiente para
pagar o valor acordado entre ele e o papa, assim “para pagar as despesas relacionadas à sua
elevação em Mainz, Alberto teve de tomar um empréstimo” (NICHOLS. In: SPROUL;
NICHOLS, 2017, p. 46) com uma poderosa família de banqueiros alemães denominados
Függer. Roland Bainton também comenta sobre o ocorrido:

Então o papa, para possibilitar que Alberto se ressarcisse, concedeu-lhe o privilégio de


distribuir uma indulgência em seus territórios pelo período de oito anos. Metade do lucro,
[...], deveria ir para o papa, para a construção da nova Basílica de São Pedro; a outra
metade serviria para pagar os Fuggers (BAINTON, 2017, p. 82).

A pessoa contratada por Alberto para a realização das vendas foi John Tetzel, um
frade dominicano. Frederico, O Sábio, que era o príncipe eleitor da Saxônica não permitiu as
vendas em Wittenberg, não por que não acreditasse nas indulgências, mas por que ele possuía
suas próprias relíquias que seriam expostas no primeiro dia de novembro, dia de todos os
santos, e não queria concorrência em seus domínios territoriais. Ainda assim, os moradores de
Wittenberg facilmente podiam viajar para as cidades vizinhas e adquirir as indulgências de
Alberto, vendidas por Tetzel.
É contra tais indulgências que Martinho Lutero fixará suas famosas 95 teses na porta
da igreja do castelo de Wittenberg em 31 de outubro de 1517. Martin Dreher comenta que as
teses “representavam uma comunicação que era afixada no quadro mural da universidade, a
porta da igreja. Ali, outros já haviam afixado teses” (DREHER, 2014, p. 85). Outro
historiador, Geoffrey Blainey, comenta que “aquele gesto representou mais uma convocação
para o debate do que um ato de rebeldia” (BLAINEY, 2012, p. 174).
Embora Lutero não esperasse mais do que um debate acadêmico sobre o tema, suas
teses tiveram tanta repercussão que serviram “como faísca, dando início a uma conflagração
que veio a ser o maior levante intelectual e espiritual jamais ocorrido na Europa”
(MCGRATH, 2014, p. 33). A partir deste evento e seus desdobramentos, “Lutero foi e
continua a ser uma figura polarizadora. Alguns o amam, e outros o odeiam.
Independentemente de qualquer coisa, muitos críticos concordam que Lutero pode ter sido a
figura mais influente do segundo milênio da era cristã” (MANGALWADI, 2012, p. 35).

3. O pensamento teológico de Martinho Lutero e sua relação com a teologia patrística


O reformador alemão Martinho Lutero foi algumas vezes ao longo da história
apresentado como um revolucionário teológico, alguém que rompeu com séculos de tradição
religiosa e trouxe à tona diversas inovações teológicas nunca antes afirmadas ou mesmo já
condenadas como heresias. Joel Peters, por exemplo, afirma que Lutero “rejeitou a Tradição
assim como a autoridade do ensino da Igreja Católica (com o Papa como sua cabeça) como
tendo legítima autoridade religiosa” (PETERS, 2009, p. 9)
Afirma-se ainda que os chamados quatro solas, nomeadamente Sola Gratia, Sola Fide,
Solus Christus e Sola Scriptura, significando respectivamente: Somente a Graça, Somente a
Fé, Somente Cristo e Somente a Escritura, não encontram lugar no ensino bíblico e ainda
menos na longa linha da Tradição da Cristandade, tratando-se, portanto, de uma invenção ou
inovação teológica protestante. Novamente Joel Peters, referindo-se ao princípio do Sola
Scriptura, afirma que “[...] esta doutrina não surgiu antes do século XIV e não se difundiu
antes do século XVI - um tempo longo, muito longo, desde a era dos apóstolos e da fundação
da Igreja de Cristo” (PETERS, 2009, p. 49), e pouco mais à frente escreve que o princípio do
Sola Fide é uma “[...] doutrina recém-criada por Lutero de que somos salvos somente pela
fé, sem participação das obras” (PETERS, 2009, p. 57, grifo nosso). Como o trabalho buscará
demonstrar, tais afirmações estão longe de serem verdadeiras e todos os mencionados
princípios defendidos por Lutero e pela tradição luterana podem ser encontrados já na
literatura patrística, ainda que não de forma tão sistematizada quanto na encontrada entre os
reformadores. Tal qual R.C. Sproul afirma:

Os próprios reformadores consideravam o seu trabalho como reforma, e não revolução.


Eles não viam suas atividades como uma revolta organizada contra a Igreja ou contra o
cristianismo histórico. [...]. Eles queriam que a Igreja retornasse à sua forma original e à
original teologia da Igreja apostólica. Isto é, os reformadores não estavam tentando criar
algo novo6 (SPROUL, 2021, p. 2-3, tradução nossa, grifo nosso).

Longe de trazer à tona inovações teológicas, Lutero defendeu que uma reforma
deveria ocorrer justamente por que ao longo dos séculos, novidades teológicas foram
acrescidas à teologia cristã “[...] a ponto de já não se poder mais reconhecer a Igreja Cristã;
como os jardineiros descuidosos que deixam crescer os brotos supérfluos a tal ponto que a boa
árvore original sofre prejuízo ou acaba morrendo” (LUTERO. In: LUTERO, 2007, p. 391) e
se queixa, “[...] se não podem [os católicos romanos] tolerar a situação eclesiástica de
cinquënta anos atrás, quando eu e tu éramos crianças, [...], como quereriam ou poderiam
tolerar que nós os queiramos reformar de acordo com o estado da Igreja de seiscentos, mil ou
mil e quatrocentos anos atrás?” (LUTERO. In: LUTERO, 2007, p. 309). Em seus estudos,
Lutero empenhou-se em conhecer não apenas a Bíblia, mas também toda a Teologia
Escolástica e em especial a Teologia Patrística. Ele se recorda, e assim defende-se:

Pois eu também li os pais, ainda antes de me opor com tanta dureza ao papa, e também os li
com maior afinco do que eles que agora, baseados nos pais, se me opõem com tenacidade e
soberba. Pois sei que nenhum deles tentou ler um livro da Sagrada Escritura nas escolas e
compará-lo com os escritos dos pais, como eu fiz. E quando ainda tomam um livro da
Sagrada Escritura e procuram as glosas dos pais, acontecerá com eles o mesmo que se deu
comigo, quando estudei a Epístola aos Hebreus com as glosas de São Crisóstomo, Tito e
Glálatas com a ajuda de São Jerônimo, Gênese com o auxílio de Santo Ambrósio e
Agostinho, o Saltério com todos os escritores a que se tem acesso, etc. (LUTERO. In:
LUTERO, 2007, p. 312).

Assim, como conclui Nathan Busenitz, “[...] os reformadores estavam refinando a


doutrina, não inventando nova teologia”7 (BUSENITZ, 2017, p. 148, tradução nossa, grifos
do autor).

3.1 SOLA FIDE

O primeiro dos Solas a ser trabalhado será o Sola Fide, termo latino para designar
Somente a Fé. Como já afirmado anteriormente, os primeiros anos de Lutero no mosteiro de
Erfurt foi marcado pelo zelo intelectual e espiritual, em uma tentativa desesperada de aplacar
a ira de um Deus santo, sempre pronto para condenar um pecador como Lutero ao castigo
eterno. O sentimento de preocupação de Lutero assemelhava-se ao encontrado na obra
patrística O pastor de Hermas: “Dizia a mim mesmo: ‘Se o pecado está escrito contra mim,
6
“the Reformers themselves considered their work to be that of reformation, not revolution. They did not see
their activities as an organized revolt against the church or against historic Christianity. […]. They wanted the
church to return to its original forms and to the original theology of the Apostolic church. That is, the Reformers
were not trying to create something new”.
7
“[...] the Reformers were refining sound doctrine, not inventing new theology”.
como poderei alcançar a salvação? Como aplacarei a Deus pelos meus pecados realmente
cometidos? Com que palavras pedirei ao Senhor que me seja favorável?’” (O PASTOR DE
HERMAS, In: PADRES APOSTÓLICOS, 1995, p. 172). De fundamental importância para o
movimento da Reforma Protestante foi responder à questão sobre como poderia um pecador
ser poupado da condenação e receber de Deus a salvação eterna. A resposta, desde tempos
imemoriais é a mesma: pela fé. Para Lutero, até mesmo o patriarca Abraão, antes da Lei, é
justificado pela justiça da fé. Nas palavras do reformador:

Queremos trazer o exemplo de Abraão que Paulo cita com frequência. [...] 8. Por favor,
observa também aqui a divisão que Paulo faz, referindo-se a uma dupla justiça de Abraão.
Uma é a justiça das obras, ou seja, a justiça moral ou civil; nega, porém, que esta o justifica
perante Deus, embora por meio dela seja considerado justo perante os homens. Além disso
tem glória entre as pessoas; no entanto, carece da glória de Deus por meio dessa justiça.
[...]. Logo, se Abraão não é justo por nenhuma obra, ele próprio permanece sob a
impiedade com todas as suas obras, caso não for revestido de outra justiça, ou seja, da
justiça da fé. Está pois, evidente que nenhuma pessoa contribui qualquer coisa para a
justiça por meio de suas obras e, além disso, que nenhuma obra, nenhum empenho, nenhum
esforço do livre-arbítrio vale qualquer coisa perante Deus. (LUTERO. In: LUTERO, 1993,
p. 198, grifo nosso).

Aqui, Lutero é precedido em muito por Clemente Romano que retoricamente


questiona, “Por qual motivo nosso pai Abraão foi abençoado, senão por ter praticado a justiça
e a verdade pela fé?” (CLEMENTE ROMANO, In: PADRES APOSTÓLICOS, 1995, p. 45,
grifo nosso). Pode-se enfatizar os termos “praticado a justiça e a verdade” em uma tentativa
de reafirmar a importância das obras para a salvação, mas pouco adiante Clemente Romano
elimina qualquer margem para tal entendimento ao afirmar:

Portanto, todos foram glorificados e engrandecidos, não por eles mesmos, nem por suas
obras, nem pela justiça dos atos que praticaram, e sim por vontade dele. Por conseguinte,
nós, que por sua vontade fomos chamados em Jesus Cristo, são somos justificados por nós
mesmos, nem pela nossa sabedoria, piedade ou inteligência, nem pelas obras que
realizamos com pureza de coração, e sim pela fé; é por ela que Deus Todo-poderoso
justificou todos os homens desde as origens. (CLEMENTE ROMANO, In: PADRES
APOSTÓLICOS, 1995, p. 46, grifo nosso)

De forma semelhante, também Irineu de Lyon afirma que “Cristo cumpriu a promessa,
nascendo da Virgem, da estirpe de Abraão, e convertendo em luminárias do mundo os que
nele acreditam, e justificando os gentios com Abraão por meio da mesma fé” (IRINEU DE
LYON, 2014, p. 96) e mais uma vez, para não permitir margem para má compreensão, ele
completa, “da mesma forma, nós não somos justificados pela Lei, mas pela fé, que recebeu o
testemunho da Lei e dos profetas, e que nos apresenta o Verbo de Deus” (IRINEU DE LYON,
2014, p. 97).
8
Aqui Lutero cita o texto de Romanos 4:3. “Pois que diz a Escritura? Abraão creu em Deus, e isso lhe foi
imputado para justiça”.
E ainda João Crisóstomo em seu comentário sobre a carta de Paulo aos Gálatas, afirma
sobre a menção de Paulo a Abraão em Gálatas 3:

Foi porque observaste a Lei, ou por causa da fé? Não há dúvida de que foi pela fé. De fato,
eles [os judeus] revolviam a questão de cima para baixo e sempre se bagavam, dizendo que
a fé só vale em conjunto com a Lei. Paulo, ao invés, demonstra que a fé para nada servirá se
foram acrescentadas as observâncias. A fé vigora quando nada da Lei se acrescenta
(CRISÓSTOMO. In: CRISÓSTOMO, 2010, p. 601).

É difícil pensar em como João Crisóstomo poderia ser ainda mais claro dentro do
princípio Sola Fide. A salvação por meio da fé é reafirmava por diversos outros autores
patrísticos. Entre os Padres Apostólicos, Inácio de Antioquia escreve aos Efésios afirmando
que “Vossa fé é o vosso guindaste, a fé é o caminho que eleva até Deus” (INÁCIO DE
ANTIOQUIA, In: PADRES APOSTÓLICOS, 1995, p. 85). Também João Crisóstomo, em
suas homilias sobre a epístola aos Romanos, exorta seus leitores, “Não duvides, portanto. A
justificação não é oriunda das obras, mas da fé” (CRISÓSTOMO. In: CRISÓSTOMO, 2010,
p. 126). Crisóstomo reafirma esta verdade ao comentar a carta aos Gálatas:

Com efeito, todos pecaram, e “estão debaixo de maldição”. Ele, porém, não se exprime
desta forma a fim de não parecer que fala por si mesmo, mas novamente o comprova com o
testemunho que resume ambos os casos, um que ninguém cumpriu a Lei (de sorte que eram
execráveis), e outro que a fé justifica. Qual é, portanto, o testemunho? É do profeta
Habacuc, que assim se expressa: “O justo viverá pela fé” (Hb 2,4). Com isso ele mostra não
só que a justificação vem da fé, mas também que é impossível que pela Lei venha a
salvação. Ademais, como ninguém observou a Lei, mas todos devido à transgressão
estavam sujeitos à maldição, foi excogitado um caminho mais fácil pela fé, o que constitui
o máximo sinal de que ninguém pode obter a justiça pela Lei. O profeta não disse: O justo
viverá pela Lei, e sim: “Pela fé”. (JOÃO CRISÓSTOMO, 2010, p. 604)

Até mesmo na obra O pastor de Hermas, que em tantas ocasiões parece defender a
necessidade da realização de boas obras para a salvação, confessa, na descrição de uma de
suas visões, “Ela me olhou sorridente e perguntou: ‘Vês sete mulheres ao redor da
construção?’ [...]. ‘A torre é sustentada por elas, por ordem do Senhor. Ouve agora as funções
que elas desempenham. A primeira, de mãos fortes, se chama Fé. É por meio dela que os
eleitos do Senhor são salvos’” (O PASTOR DE HERMAS, In: PADRES APOSTÓLICOS,
1995, p. 184, grifo nosso), todas as demais mulheres mencionadas na visão são filhas da
primeira: a Fé.
Por vezes, a contra posição entre fé e obras pode suscitar a acusação de que a defesa
do princípio Sola Fide implica a ociosidade da vida de fé, abrindo mão, assim, do crescimento
em santidade e ao invés disso, rendendo-se ao pecado “para que abunde a graça” 9. Contra tal
tese, Lutero responde que “esta é a liberdade cristã, nossa fé, que não faz que sejamos ociosos

9
Rm 6.1.
ou vivamos mal, mas que ninguém necessite da lei ou de obras para a justiça e a salvação”
(LUTERO. In: LUTERO, 2000, p. 441). Trata-se, portanto, de definir a correta ordem dos
fatores, “a fé não cria salvação, mas reage à salvação” (MORGNER, 2017, p. 39). O mesmo
foi dito por Leão Magno, bispo de Roma no século V, “[...] da mesma forma que as obras
encontram sua razão de ser na fé, a fé demonstra sua força através das obras”.
(LEÃO MAGNO, 1996, p. 31)
Ocorre ainda que nem mesmo a fé provém do próprio ser humano em sua condição
natural. Conforme McGrath, “A disposição humana para a aceitação da graça é, em si, uma
obra da graça” (MCGRATH, 2014, p. 172), também isto já foi afirmado muito antes de
Lutero; nas palavras de João Crisóstomo, “nem a fé vem de nós, pois se Cristo não viesse, se
não nos chamasse, como teríamos podido crer? ‘E como poderiam crer naquele que não
ouviram?’. (Rm 10,14). Por conseguinte, nem a fé é nossa” (JOÃO CRISÓSTOMO, 2010, p.
701). Tal fato remete ao segundo princípio teológico: Sola Gratia.

3.2 SOLA GRATIA


Nem mesmo a fé é própria do ser humano em seu estado natural, mas é um presente
imerecido dado gratuitamente por Deus ao pecador, por meio do qual ele é salvo. O princípio
do Sola Gratia é de fundamental importância para todo o movimento da Reforma Protestante.
Lutero, escrevendo sobre a epístola de Paulo aos Romanos, reflete sobre a graça divina,
fazendo a distinção entre Lei e Evangelho:

[...] nos três primeiros capítulos não faz outra coisa do que inculcar que todos os seres
humanos são ímpios e injustos, que não somente os gentios, mas também os judeus estão
sob o pecado, porque está escrito: “Não há justo, não há quem entenda, não há quem
busque a Deus, não há quem faça o bem, não há um sequer” (Rm 3.10). [...]. Depois de
inculcar isso com muitas e certamente gravíssimas e significativas palavras, apresenta a
outra parte da doutrina cristã: que somos justificados gratuitamente pela graça de Deus, por
meio da redenção que há em Cristo Jesus, ao qual Deus ofereceu como propiciação por
meio da fé, em seu sangue. (LUTERO. In: LUTERO, 1993, p. 395-96).

Também neste assunto Lutero é precedido em muito por diversos autores patrísticos.
Policarpo, bispo da Igreja de Esmirna, ao escrever para os Filipenses afirma, “e vós sabeis que
é pela graça que fostes salvos, não pelas obras, mas pela vontade de Deus, por meio de Jesus
Cristo” (POLICARPO DE ESMIRNA, In: PADRES APOSTÓLICOS, 1995, p. 139), de igual
modo, também Ireneu de Lião afirma a iniciativa da vontade divina na salvação do ser
humano. Segundo ele, “ninguém pode conhecer o pai sem o Verbo de Deus, isto é, sem o
Filho que o revela. Também não se conhece o Filho sem a vontade do Pai” (IRENEU DE
LIÃO, 1995, p. 380).
Basílio de Cesareia, ao escrever sobre o batismo e fazer uma relação do mesmo com a
travessia do Mar Vermelho pelo povo de Israel quando de sua fuga do Egito, escreve, “o povo
saiu do mar indene; quanto a nós, subimos da água, quais vivos dentre os mortos, salvos pela
graça daquele que nos chamou” (BASÍLIO DE CESAREIA, 1998, p. 125). E Ambrósio de
Milão convida seu leitor à humildade do reconhecimento da graça de Deus: “Homem, tu não
ousavas levantar o teu rosto para o céu, mas baixavas os teus olhos para a terra, e de repente
recebeste a graça de Cristo e todos os teus pecados foram perdoados. De mau servidor, tu
foste feito um bom filho. Portanto, não confies em tua ação, mas na graça de Cristo”.
(AMBRÓSIO DE MILÃO, 1996, p. 65).
Agostinho de Hipona, em seus debates contra o monge britânico Pelágio, afirma sobre
a gratuidade da graça de Deus, “mas esta graça, sem a qual nem as crianças nem os adultos
podem ser salvos, não é dada em consideração aos merecimentos, mas gratuitamente, o que
caracteriza a concessão como graça. Justificados gratuitamente pelo seu sangue”
(AGOSTINHO, 1998, p. 115, grifo do autor)
Também João Crisóstomo questiona aos seus leitores de Éfeso, levando-os a refletir
sobre a gratuidade da salvação. Em suas palavras, “ainda te falta alguma coisa? Tu te tornaste
imortal, livre, filho, justo, irmão, coerdeiro. Simultaneamente reinas, conjuntamente serás
glorificado. Deu-te tudo grátis”. (JOÃO CRISÓSTOMO, 2010, p. 665) Ainda Leão Magno
escreve sobre o assunto:

Ora, se o Deus onipotente não se tivesse dignado fazer isso, nenhuma espécie de
justiça e nenhuma forma de sabedoria teriam podido arrancar o homem do
cativeiro do diabo e do abismo da morte eterna. Porque a condenação
permaneceria, passando de um para todos com o pecado, e a natureza,
corrompida por causa da ferida mortal, não teria encontrado o remédio, incapaz
que era de mudar sua condição por suas próprias forças (LEÃO MAGNO, 1996, p.
52).

As citações de tantos autores patrísticos sobre a graça divina e a incapacidade humana


para alcançar a salvação pelas obras da lei encontram eco no artigo 18 da Confissão de
Ausburgo, apresentada pelos luteranos ao imperador Carlos V do Sacro Império Romano-
Germânico em 1530. Lá encontra-se o seguinte conteúdo no artigo XVIII:

Quanto ao livre-arbítrio se ensina que o homem tem, até certo ponto, livre-arbítrio para
viver exteriormente de maneira honesta e escolher entre aquelas coisas que a razão
compreende. Todavia, sem a graça, o auxílio e a operação do Espírito Santo, o homem é
incapaz de ser agradável a Deus, temê-lo de coração, ou crer, ou expulsar do coração as
más concupiscências inatas. Isso, ao contrário, é feito pelo Espírito Santo, que é dado pela
Palavra de Deus. (CONFISSÃO DE AUSBURGO, 2005, p. 18).
A exemplo do princípio Sola Fide, também o Sola Gratia pode suscitar críticas quanto
a possibilidade de o cristão abandonar as boas obras por conta de sua convicção de salvação
gratuita. Como resposta a tais possíveis objeções, Lutero escreve:

Para que ninguém torne a me acusar de estar proibindo boas obras, digo que
devemos, com toda a seriedade, sentir contrição e pesar, fazer confissão e boas
obras. Porém insisto tanto quanto posso em que deixemos que a fé no sacramento
seja a coisa principal e a herança pela qual alcançamos a graça de Deus. Depois
então façamos muitas coisas boas, tão-somente para a honra de Deus e para o
bem do próximo, e não para que confiemos nelas como suficientes para pagar
pelo pecado. Pois Deus dá sua graça gratuita e livremente; assim, de nossa parte,
devemos servi-lo também gratuita e livremente. (LUTERO. In: LUTERO, 2004, p.
408-09)

Quanto a este ponto, também Crisóstomo adverte, “[...] uma vez que, além da graça,
pela qual somos justificados, é preciso levar vida honesta, mostremos zelo digno de tamanho
dom; nós o manifestaremos se com grande diligência conservamos a caridade, mãe de todos
os bens” (JOÃO CRISÓSTOMO, 2010, p. 131). A necessidade mencionada por Crisóstomo
não se entende como obra para salvação, mas como deve cristão, realizado por gratidão pela
graça divina e como fruto da nova vida do cristão.
Também a Carta de Barnabé apresenta esta mesma ordem de fatores, “Depois de nos
ter renovado com o perdão dos pecados, ele fez de nós um novo ser, de modo que tenhamos
alma de criança, como se ele nos tivesse plasmado novamente” (CARTA DE BARNABÉ, In:
PADRES APOSTÓLICOS, 1995, p. 294). Tais afirmações podem ser compreendidas como
uma antecipação da distinção luterana entre a justificação e a santificação. Nathan Busenitz
explica:

Os reformadores ensinaram que a justificação ocorre no momento da salvação, o que


significa que o crente é imediatamente declarado justo e é restaurado ao favor de Deus.
Santificação, por contraste, ocorre progressivamente durante toda a vida do crente, e resulta
no seu crescimento pessoal em santidade pelo poder do Espírito Santo (BUSENITZ, 2017,
p. 46, tradução nossa)10.

Assim, ao longo do tempo, o cristão vai sendo moldado pelo poder do Espírito Santo à
semelhança de Jesus Cristo, processo este que só alcançará sua realização na eternidade.
Tendo dito isto, passa-se agora para o terceiro princípio teológico enfatizado por Lutero,
Solus Christus.

3.3 SOLUS CHRISTUS

10
“The Reformers taught that justification occurs at the moment of salvation, which means the believer is
immediately declared righteous and restored to God’s favor. Sanctification, by contrast, takes place
progressively over a believer’s entire life, and results in his or her growth in personal holiness through the power
of the Holy Spirit”.
De acordo com o princípio Solus Christus, Jesus Cristo é o único caminho que leva até
Deus, bem como o único intermediário entre Deus e o ser humano, excluindo-se assim a
intercessão a santos, bem como, mais uma vez, a salvação por obras. Na Confissão de
Ausburgo, que expõe sucintamente o corpo doutrinário luterano, encontra-se o seguinte
conteúdo no seu artigo IV, denominado Da justificação:

Ensina-se também que não podemos alcançar remissão do pecado e justiça diante de Deus
por mérito, obra e satisfação nossos, porém, que recebemos remissão do pecado e nos
tornamos justos diante de Deus pela graça, por causa de Cristo, mediante a fé, quando
cremos que Cristo padeceu por nós e que, por sua causa, os pecados nos são perdoados e
nos são dadas justiça e vida eterna. Pois Deus quer considerar e atribuir essa fé como
justiça diante de si (CONFISSÃO DE AUSBURGO, 2005, p. 12, grifo nosso).

Sobre a intercessão aos santos, encontra-se no artigo XXI, denominado Do culto aos
santos, a seguinte afirmação:

Do culto aos santos, os nossos ensinam que devemos lembrar-nos deles, para fortalecer a
nossa fé ao vermos como receberam graça e foram ajudados pela fé; e, além disso, a fim de
que tomemos exemplo de suas boas obras, cada qual de acordo com sua vocação, [...].
Entretanto, não se pode provar pela Escritura que se devem invocar os santos ou procurar
auxílio junto a eles. “Porquanto há um só reconciliador e mediador entre Deus e os homens,
Jesus Cristo”, 1 Tm 2(.5) (CONFISSÃO DE AUSBURGO, 2005, p. 22-3).

Também nestes aspectos teológicos os autores patrísticos anteciparam os


reformadores. Clemente de Roma, por um exemplo, em sua epístola aos Coríntios, escreve:

Caríssimos, este é o caminho no qual encontramos a nossa salvação: Jesus Cristo, o sumo
sacerdote de nossas ofertas, o protetor e o auxílio da nossa fraqueza. Por meio dele,
fixamos nosso olhar nas alturas dos céus; por meio dele, contemplamos, como em espelho,
sua face imaculada e incomparável; por meio dele, abriram-se os olhos do nosso coração;
mediante ele, nossa mente obtusa e obscura refloresce para a luz; mediante ele, o Senhor
quis fazer-nos experimentar o conhecimento imortal. (CLEMENTE ROMANO, In:
PADRES APOSTÓLICOS, 1995, p. 49, grifo nosso)

Enfatiza-se a menção de Clemente sobre ser Cristo, e não homens piedosos já


falecidos, o protetor e auxílio da fraqueza dos cristãos. É a ele que as intercessões devem ser
dirigidas.
Também no texto que relata o martírio de Policarpo de Esmirna, menciona-se o desejo
por parte das autoridades em não entregarem os restos mortais de Policarpo, na ânsia de evitar
que os cristãos passassem a adorar o bispo de Esmirna. Evaristo então escreve sobre o
episódio:

Ele disse: “Não aconteça que eles, abandonando o crucificado, passem a cultuar esse aí.”
Dizia essas coisas por sugestão insistente dos judeus, que nos tinham vigiado quando
queríamos retirar o corpo do fogo. Ignoravam eles que não poderíamos jamais
abandonar Cristo, que sofreu pela salvação de todos aqueles que são salvos no mundo,
como inocente em favor dos pecadores, nem prestarmos culto a outro. Nós o adoramos,
porque é o Filho de Deus. Quanto aos mártires, nós os amamos justamente como
discípulos e imitadores do Senhor, por causa da incomparável devoção que tinham para
com seu rei e mestre. Pudéssemos nós também ser seus companheiros e condiscípulos!
(MARTÍRIO DE SÃO POLICARPO, In: PADRES APOSTÓLICOS, 1995, p. 154, grifo
nosso).

Chama a atenção a similaridade entre a compreensão de Evaristo no relato do martírio


de Policarpo com a compreensão apresentada no artigo XXI da Confissão de Ausburgo. O
próprio Policarpo de Esmirna também escreve sobre Jesus como único caminho que leva à
Deus, exortando seus leitores filipenses:

Portanto, sem cessar, estejamos agarrados à nossa esperança e ao penhor de nossa justiça,
isto é, Cristo Jesus, que carregou nossos pecados em seu próprio corpo sobre o madeiro, ele
que não cometeu pecado e em cuja boca não foi encontrada nenhuma falsidade, mas que
tudo suportou por nós, a fim de que vivêssemos nele (POLICARPO DE ESMIRNA, In:
PADRES APOSTÓLICOS, 1995, p. 143-44).

Ainda entre os Padres Apostólicos, Inácio de Antioquia também escreve sobre a


centralidade de Jesus Cristo, para ele “só uma coisa importa: que nos encontremos em Jesus
Cristo para entrar na vida verdadeira. Fora dele, nada tenha valor para vós” (INÁCIO DE
ANTIOQUIA, In: PADRES APOSTÓLICOS, 1995, p. 86, grifo nosso). Enfatiza-se a
exclusão de todas as outras coisas, tidas por Inácio como sem valor, eis o princípio Solus
Christus em sua melhor forma. O amor de Inácio por Cristo leva-o a desprezar até mesmo o
horror do martírio. Aos romanos, ele escreve, “que nada de visível e invisível, por inveja, me
impeça de alcançar Jesus Cristo. Fogo e cruz, manadas de feras, lacerações,
desmembramentos, deslocamento de ossos, mutilações de membros, trituração de todo o
corpo, que os piores flagelos do diabo caiam sobre mim, com a única condição de que eu
alcance Jesus Cristo”. (INÁCIO DE ANTIOQUIA, In: PADRES APOSTÓLICOS, 1995, p.
106)
Não apenas os Padres Apostólicos escreveram sobre a centralidade de Cristo na
salvação e a falsidade das intercessões dirigidas aos mortos, mas também autores posteriores.
Agostinho de Hipona escreve sobre a verdadeira religião, e expõe o seguinte desejo aos seus
leitores, “que nossa religião não seja culto aos mortos. Se eles viveram na piedade não se
comprazem com tais honras, antes querem que adoremos Aquele em cuja luz eles mesmos se
alegram ao ver-nos associados a seus méritos [de Cristo]. Honremo-los, pois, imitando-os e
não os adorando” (AGOSTINHO, 2002, p. 133). Se está ciente da distinção feita por vezes
entre adoração e veneração, mas as instruções dos Pais, mencionadas acima, afirmam a
imitação dos mesmos, e não a realização de orações direcionadas a eles. Para tornar esta
verdade ainda mais clara, Agostinho escreve em outro lugar, “as almas dos mortos estão, pois,
em lugar de onde nada vêem do que se passa ou do que acontece aos homens aqui na terra.
Como, portanto, poderiam partilhar das misérias dos vivos, já que ou bem estão a suportar as
suas próprias penas, caso as tenham merecido, ou bem estão a repousar [...] em lugar de paz?”
(AGOSTINHO, 2002, p. 181).
Também Novaciano, ao questionar os hereges que negavam a divindade de Jesus,
escreve sobre a ineficácia da invocação dos mortos, segundo ele, “se Cristo é apenas um
homem, por que é invocado um homem como mediador nas orações? Quando se julga
ineficaz a invocação de um homem para conceder-se a salvação? Se Cristo é apenas um
homem, por que se deposita esperança nele, quando se afirma que a esperança posta num
homem é maldita?” (NOVACIANO, 2017, p. 63).
Outro autor patrístico a escrever sobre a centralidade de Cristo na salvação do ser
humano foi Leão Magno, em suas palavras:

Sendo assim, ninguém escaparia à horrorosa dominação do diabo, ninguém se libertaria das
cadeias de duro cativeiro; a ninguém se abririam, seja o perdão para a reconciliação, seja o
retorno à vida, a menos que o Filho, Deus co-eterno e igual a Deus Pai, se dignasse ser
também filho do homem, vindo ‘procurar e salvar o que estava perdido’. Assim, como tinha
havido morte por Adão, haveria ressurreição dos mortos pelo Senhor Jesus Cristo (LEÃO
MAGNO, 1996, p. 136-37)

Em seguida, Leão acrescenta que mesmo para os santos do Antigo Testamento, a


salvação só se deu por que a justiça de Cristo lhes foi imputada, de acordo com ele “[...] e
nem para os patriarcas, nem para os profetas, nem para qualquer outro santo houve salvação e
justificação, a não ser pela redenção do nosso Senhor Jesus Cristo” (LEÃO MAGNO, 1996,
p. 137). Não há outro meio de encontrar a salvação eterna a não ser pela graça de Deus,
mediante a fé em seu Filho Jesus Cristo, as boas obras do ser humano jamais alcançam tal
objetivo. Sobre tal ponto, escreve Lutero.

[...] pois Deus não nos quer imputar o restante do pecado, não o quer punir ou nos condenar
por causa dele, mas quer encobri-lo e perdoar como se ele nada fosse. E isso não por causa
de nós, da nossa dignidade ou das nossas obras, mas por causa do próprio Cristo em
quem cremos. [...]. É bom que sintas e reconheças teu pecado; dá graças a Deus e não
desesperes. É um passo para a saúde, quando o doente reconhece e confessa a sua doença.
[...] Corre para Cristo, o Médico, que sara os contritos de coração e salva os pecadores. Crê
nele. Se crês, és justo, porque atribuis a Deus a glória de que ele é onipotente,
misericordioso, verdadeiro, etc. Então tu justificas e louvas a Deus. Em suma, atribuis a ele
a divindade e todas as coisas. E o que ainda resta de pecado em ti não é imputado, mas é
perdoado por causa de Cristo em quem crês, que é perfeitamente justo num sentido
formal, cuja justiça é tua e teu pecado é dele. (LUTERO. In: LUTERO, 2008, p. 226-27,
grifo nosso).

Neste mesmo sentido do texto, Ambrósio de Milão escreve que “Isto [as Escrituras]
foi escrito para que creiamos que ele próprio é crucificado em nós, a fim de que por ele sejam
purificados os nossos pecados, e que ele próprio pregue na cruz o título de nossa dívida, pois
ele é o único que pode perdoar os delitos” (AMBRÓSIO DE MILÃO, 1996, p. 144).
Por fim, menciona-se ainda mais uma vez Clemente de Roma que, confessando ser
apenas Deus quem concede graciosamente a fé ao ser humano por meio de Jesus Cristo,
deseja a seus leitores coríntios:

Quanto ao resto, que o Deus que tudo vê e é Senhor dos espíritos e de todos os seres vivos
– que elegeu o Senhor Jesus Cristo e, por meio dele, nos elegeu para sermos o seu povo
particular – conceda a toda pessoa que invoca o seu nome magnífico e santo, a fé, o temor,
a paz, a perseverança, a paciência, a continência, a pureza e a moderação. Dessa forma, a
pessoa será agradável ao seu Nome, por meio de nosso sumo sacerdote e protetor Jesus
Cristo, pelo qual sejam dadas a Deus a glória, a grandeza, o poder e a honra, agora e pelos
séculos dos séculos. Amém”. (CLEMENTE ROMANO, In: PADRES APOSTÓLICOS,
1995, p. 70, grifo nosso)

Passa-se agora para a último princípio a ser estudado no presente trabalho, o Sola
Scriptura.

4.4 SOLA SCRIPTURA

De acordo com o princípio do Sola Scriptura defendido pelos reformadores, a Bíblia, e


não o papa, os concílios ou a tradição deve ser a autoridade máxima sobre a fé e a vida dos
crentes. Este princípio teológico se exemplifica pela resposta dada por Lutero na Dieta de
Worms, em 1531:

A não ser que seja convencido por testemunhos das Escrituras ou por argumento evidente
(pois não acredito nem no papa nem nos concílios exclusivamente, visto que é certo que os
mesmos erraram muitas vezes e se contradisseram a si mesmos) – estou vencido pelas
Escrituras por mim aduzidas e minha consciência está presa nas palavras de Deus – não
posso nem quero retratar-me de nada, porque agir contra a consciência não é prudente nem
íntegro (LUTERO. In: LUTERO, 1996, p. 126).

De forma surpreendente, também neste princípio os reformadores foram precedidos


em muito pelos autores patrísticos. Observa-se em especial a similaridade do pensamento de
Lutero com o de Agostinho de Hipona neste quesito. Nas palavras de Agostinho, “Faço este
pacto piedoso e seguro na presença do Senhor nosso Deus, com todos aqueles que lerem não
somente este tratado, mas todas as minhas outras obras”. (AGOSTINHO, 1995, p. 28, grifo
nosso) Mais a diante, na mesma obra, Agostinho detalha de forma mais completa o referido
pacto. Aos crentes e piedosos, Agostinho diz, “não te entregues aos meus escritos como se
fossem as Escrituras canônicas; crê nestas [nas Escrituras] sem hesitação mesmo quando não
chegares a compreender o que acreditas; com respeito a meus escritos digo: não deposites
toda a fé quando não tens certeza, a não ser que passes a ter essa certeza” (AGOSTINHO,
1995, p. 112-13) e aos mais críticos Agostinho desafia:

Não te ponhas a corrigir meus escritos levado pela tua opinião ou por preconceitos, mas
apoiado na leitura das Sagradas Escrituras ou em razões bem fundadas. Se neles
encontrares algo de verdade, essa verdade não é minha, mas compreendendo-a e amando-a
é tua e minha; e se alguma falsidade encontrares, o erro é meu, mas evitando-o fazer que
ele não seja nem teu nem meu. (AGOSTINHO, 1995, p. 113, grifo nosso)

A isto, Lutero comenta, “por essa razão ele [Agostinho] não quer confiar em seus
predecessores, santos, eruditos pais, nem em si próprio, e, sem dúvida, muito menos em seus
sucessores, que, sem dúvida, seriam inferiores, mas quer por mestre e árbitro a Escritura”.
(LUTERO, In: LUTERO, 2007, p. 317)
Assim, se mesmo a obra de Agostinho de Hipona, o principal dos autores patrísticos,
deve ser avaliada tendo por base as Sagradas Escrituras a pedido do próprio autor, o mesmo
não se dá em relação aos demais autores, bem como aos concílios e papas? Como será
demonstrado, outros autores patrísticos pensaram desta forma e agiram assim em seu tempo.
Logo nos primeiros séculos da história do cristianismo, algumas desavenças entre bispos de
diferentes regiões se evidenciaram. Lutero escreve sobre uma delas.

Vítor, o bispo de Roma, que também se tornou mártir, excomungou a todos os bispos e
igrejas da Ásia porque não celebravam a Páscoa na mesma data que ele. [...] De maneira tão
terrena os bispos de Roma buscavam a majestade e o poder. No entanto, Irineu, bispo de
Lião, na França, que conhecera a Policarpo, um dos discípulo[s] do evangelista S. João,
repreendeu-o e acalmou as coisas, de sorte que Vítor teve que deixar as igrejas em paz.
(LUTERO, In: LUTERO, 2007, p. 343)

Ora, percebe-se aí que Ireneu de Lião, longe de aceitar a suposta supremacia do bispo
de Roma e condenar os bispos asiáticos que não lhe acataram a ordem, intervém para a
manutenção da paz e da concórdia, fazendo com que Vítor, o bispo de Roma, desistisse de sua
pretensa autoridade sobre os demais bispos. Sobre este incidente, Eusébio de Cesareia escreve
que Ireneu escreveu a Vítor, lembrando-lhe de um incidente semelhante ocorrido
anteriormente com Policarpo de Esmirna, relacionado a data de celebração da Páscoa. Nas
palavras de Ireneu, citadas pelo historiador:

E o bem-aventurado Policarpo, tendo feito uma viagem a Roma, sob Aniceto, os dois
tiveram entre si pequenas divergências, mas logo fizeram as pazes; sobre este capítulo não
discutiram. Efetivamente, Ancieto não podia convencer Policarpo a não observar aquilo
que sempre praticara, com João, o discípulo de nosso Senhor, e os outros apóstolos com os
quais tinha convivido. Por sua vez, nem Policarpo persuadiu Aniceto a observar o mesmo
que ele, pois este dizia que devia conservar o costume dos presbíteros precedentes. Assim
estando a questão, entraram em comunhão mutuamente, e na igreja Aniceto cedeu,
certamente por deferência, a celebração da eucaristia a Policarpo. Separaram-se em paz
entre si, e em toda a Igreja mantinha-se a paz, quer se observasse ou não o décimo quarto
dia (IRENEU DE LIÃO. Apud EUSÉBIO DE CESAREIA, 2000, p. 272).
Mais uma vez não se observa os outros bispos reconhecendo a pretensa supremacia do
bispado de Roma, mas este, ao tentar se lhe impor aos demais, sendo persuadido a deixar a
empreitada.
Em grande medida, a ideia do primado da Igreja de Roma sobre sobre as demais
encontra sua base sobre uma interpretação do texto de Mateus 16:15-19 11. Onde Pedro, que
teria sido o primeiro pontífice da Igreja de Roma, é entendido como a pedra sob a qual a
Igreja é construída. Como será demonstrado, embora tal entendimento possa encontrar aval
em alguns escritos patrísticos, este entendimento está longe de ser universalmente aceito na
Igreja dos primeiros séculos.
Entre os Padres Apostólicos, a Carta de Barbané, repleta de citações bíblicas [observa-
se com isso a autoridade das Escrituras] já identifica a pedra de Mateus 16 como sendo o
próprio Senhor, mas palavras do autor:

E o profeta continua, uma vez que ele foi colocado como sólida pedra para esmagar: “eis
que colocarei nos alicerces de Sião uma pedra de grande valor, escolhida, angular e
preciosa.” O que diz em seguida? “Aquele que nela crer, viverá para sempre.” Será que a
nossa esperança está numa pedra? De modo nenhum. Mas foi o Senhor que tornou forte a
sua carne. Com efeito, ele diz: “ele me tornou como pedra dura”. O profeta continua: “A
pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a cabeça de ângulo.” E diz ainda: “Este
é o dia grande e maravilhoso que o Senhor fez.”. (CARTA DE BARNABÉ, In: PADRES
APOSTÓLICOS, 1995, p. 293, grifo nosso)

Também Agostinho escreve sobre o tema:

[...] expliquei depois muitas vezes que o dito pelo Senhor: “Tu és Pedro, e sobre esta pedra
edificarei minha Igreja”, se entendesse sobre aquele que Pedro confessou, ao dizer: “Tu és
o Messias, o Filho de Deus vivo”, e assim Pedro, denominado “pedra”, significaria a pessoa
da Igreja que é edificada sobre esta pedra, e recebeu as chaves do Reino dos Céus. Pois não
lhe foi dito: “Tu és pedra”; mas: “Tu és Pedro”. “E essa rocha era Cristo”, a quem Pedro
confessou, como é a fé de toda a Igreja, e foi chamado Pedro”. (AGOSTINHO, 2019, p. 91-
2)

E ainda Leão Magno, ele próprio bispo de Roma, também escreve atribuindo a Jesus a
referência do texto:

São Pedro, divinamente inspirado, numa confissão benéfica para todos os povos, disse: ‘Tu
és o Messias, o Filho de Deus vivo’ (Mt 16,16). Foi digno, então, de ser chamado bem-
aventurado pelo Senhor. Recebeu da pedra principal a virtude e o nome aquele que por
revelação do Pai confessou identificar-se o Filho de Deus e Cristo (LEÃO MAGNO, 1996,
p. 209).

11
“Mas vós, continuou ele, quem dizeis que eu sou? Respondendo Simão Pedro, disse: Tu és o Cristo, o Filho do
Deus vivo. Então, Jesus lhe afirmou: Bem-aventurado és, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue que to
revelaram, mas meu Pai, que está nos céus. Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a
minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. Dar-te-ei as chaves do reino dos céus; o que
ligares na terra terá sido ligado nos céus; o que desligares na terra terá sido desligado nos céus”.
Assim, tal qual Lutero, pode-se afirmar que “concluo, portanto, contra ti,
demonstrativamente convencido, que a palavra de Cristo em Mt 16.18 se refere
exclusivamente à Igreja edificada no Espírito sobre a pedra Cristo, e não sobre o Papa ou
sobre a Igreja Romana” (LUTERO, In: LUTERO, 2007, p. 19).
Não apenas isto, mas também a prática que pode ser observada nos autores patrísticos
atesta a sua consideração das Sagradas Escrituras como regra de fé e vida. Clemente de Roma,
bispo da Igreja Romana, ao escrever para os coríntios acerca de algumas dificuldades na
comunidade, os convida: “Retomai a carta do bem-aventurado apóstolo Paulo. O que vos
escreveu ele por primeiro, no início da evangelização? Na verdade, divinamente inspirado, ele
enviou a carta para vós a respeito dele mesmo, de Céfas e de Apolo, porque já se formavam
divisões entre vós” (CLEMENTE ROMANO, In: FRANGIOTTI, p. 57). Por que convidar os
coríntios a se voltarem às Escrituras, quando se poderia, dada sua autoridade papal, impor-
lhes algum comando? R.C. Sproul comenta sobre a epístola de Clemente, afirmando que
“Clemente não parece um papa do século 20 que esteja lançando uma encíclica na qual ordena
aos coríntios que se arrependam por força de seu ofício. Pelo contrário, ele justifica sua
preocupação pastoral com a situação de Corinto como preocupação de pastor” (SPROUL,
2023, p. 120).
Fica evidente que a verdadeira regra de fé e vida pela qual o comportamento da Igreja
de Corinto deveria ser julgado era, para Clemente e para os próprios coríntios, a Palavra de
Deus. Também Policarpo de Esmirna, ao alertar os filipenses contra falsos ensinamentos,
apela para a autoridade das Sagradas Escrituras, exortando-os: “por isso, abandonando os
discursos vazios de muitos e falsos ensinamentos, retornemos à palavra que nos foi
transmitida desde o começo” (POLICARPO DE ESMIRNA. In: PADRES APOSTÓLICOS,
1995, p. 143).
Também Orígines apelava para a autoridade das Escrituras em suas argumentações.
Ao tratar sobre a co-eternidade de Jesus com Deus Pai e o Espírito Santo, ele afirma,
“vejamos, porém, como o que dizemos também se apoia na autoridade das Escrituras divinas”
(ORÍGENES, 2012, p. 73) e igualmente desafia os hereges a fazerem o mesmo, “Digam
então, examinando as divinas Escrituras [...]” (ORÍGENES, 2012, p. 156). Orígines expõe
assim a mesma posição de Lutero: “a não ser que seja convencido por testemunhos das
Escrituras [...]” (LUTERO. In: LUTERO, 1996, p. 126)
Agostinho de Hipona defende também que as Escrituras devem ser interpretadas a luz
da própria Escritura, segundo ele “nas passagens mais claras se há de aprender o modo de
entender as obscuras” (AGOSTINHO, 2002, p. 183) e mesmo em situações onde o texto é de
difícil compreensão, Agostinho não menciona a ideia de que “[...] a ninguém cabe interpretar
a Escritura senão ao papa” (LUTERO. In: LUTERO, 2000, p. 281). Ao invés disto, Agostinho
instrui:

Quando se chega a um sentido, cuja certeza não pode ser apoiada por outras passagens
seguras das santas Escrituras, resta-nos esclarecê-la por provas racionais, ainda que o autor,
cujas palavras procuramos compreender, talvez não tivera essa intenção em seu
pensamento. Mas essa prática é perigosa. Com efeito, caminha-se com muito mais
segurança ao seguir as divinas Escrituras (AGOSTINHO, 2002, p. 185).

E neste sentido é seguido por Leão Magno, “por isso, gozando a narração sagrada de
uma indubitável autoridade, devemos esforçar-nos, com a ajuda do Senhor, para que a
inteligência tenha uma visão clara do que a história nos dá a conhecer” (LEÃO MAGNO,
1996, p. 136). Fica assim demonstrado que o princípio do Sola Scriptura já se encontrava
presente na teologia patrística, e que a ênfase dos reformadores na autoridade bíblica em
detrimento da autoridade dos concílios, dos papas ou mesmo da tradição é na verdade um
retorno à prática dos pais, e não uma inovação teológica. Como Lutero afirma acerca dos
Concílios,

[...] um concílio não tem poder de estabelecer novos artigos de fé, [...] um concílio tem o
poder e também o dever de reprimir novos artigos de fé e condená-los de acordo com a
Sagrada Escritura e a fé antiga, como o Concílio de Nicéia condenou o novo artigo de Ário,
o de Constantinopla o novo artigo de Macedônio, o de Éfeso o novo artigo de Nestório, o
de Calcedônia o novo artigo de Eutiques. (LUTERO In: LUTERO, 2007, p. 389).

É contra esses novos artigos de fé, desenvolvidos ao longo dos séculos, que Lutero e
os demais reformadores protestaram e empreenderam seus esforços na batalha “pela fé que foi
uma vez entregue aos santos”12. Para a Igreja contemporânea, tal como para os Pais e para os
Reformadores, “não seja que, corrompendo a autoridade das Escrituras, venhamos a ser
culpados de ter corrompido a integridade da santa fé” (NOVACIANO, 2017, p. 131).

Considerações finais
Ao longo do presente trabalho, buscou-se demonstrar como os princípios teológicos
comumente defendidos por Martinho Lutero e pelos demais reformadores, a saber, Sola Fide,
Sola Gratia, Solus Christus e Sola Scriptura, já estavam presentes, ainda que de forma não
tão sistematizada, na teologia patrística. Como afirma Nathan Busenitz, “[...] os reformadores
estavam refinando a doutrina, não inventando nova teologia”13 (BUSENITZ, 2017, p. 148,
tradução nossa, grifos do autor).

12
Jd. 1.3
13
“[...] the Reformers were refining sound doctrine, not inventing new theology”.
Para este fim, apresentou-se brevemente a biografia do reformador alemão, bem como
os principais acontecimentos que o levaram transformar-se em uma das principais figuras do
cristianismo do segundo milênio da era cristã. Apresentou-se também o pensamento teológico
do reformador conforme verificado em diversos de seus escritos, sobretudo suas ideias
relacionadas aos princípios teológicos supramencionados.
Analisou-se também os escritos de diversos autores do período patrístico, tais como
Clemente de Roma, Policarpo de Esmirna, Irineu de Lyon, Agostinho de Hipona, João
Crisóstomo e Leão Magno, entre tantos outros, no intuito de demonstrar como a teologia
luterana não apresenta inovações teológicas que não possam ser encontradas, ao menos de
modo incipiente, entre os Pais da Igreja. Portanto, defende-se a necessidade de a Igreja Cristã,
tal qual o reformador, com a consciência cativa à palavra de Deus, fazer uso da

[...] riqueza da tradição cristã. Argumentos e insights teológicos não são como carros ou
computadores que se tornam obsoletos. Eles podem cair em desuso, mas isso não afeta a
validade, a solidez ou a veracidade deles. Sejamos sábios para beber sofregamente das
fontes escavadas por nossos antepassados na fé. Os pais da Igreja, como Ireneu e Atanásio,
ainda têm muito a oferecer nas discussões contemporâneas. O mesmo pode ser dito de
muitos outros integrantes da tradição cristã, como Agostinho, Anselmo, Tomás de Aquino e
Calvino [e Lutero] (MOSER; OWEN. In: BECKWITH; CRAIG; MORELAND, 2006, p.
412).

REFERÊNCIAS

AGOSTINHO, Santo. A doutrina cristã: manual de exegese e formação cristã. Tradução


Nair de Assis Oliveira. São Paulo: Paulus, Coleção Patrística, Vol.17, 2002.
_____. A natureza e a graça. In: AGOSTINHO, Santo. A Graça (I). Tradução Agustinho
Belmonte. São Paulo: Paulus, Coleção Patrística, Vol.12, 1998.
_____. A Trindade. Tradução Agustinho Belmonte. São Paulo: Paulus, Coleção Patrística,
Vol.7, 1995.
_____. A verdadeira religião. In: Santo Agostinho. Tradução Nair de Assis Oliveira. São
Paulo: Paulus, Coleção Patrística, Vol.19, 2002.
_____. Retratações. Tradução Agustinho Belmonte. São Paulo: Paulus, Coleção Patrística,
Vol.43, 2019.
_____. O cuidado devido aos mortos. In: Santo Agostinho. Tradução Nair de Assis Oliveira.
São Paulo: Paulus, Coleção Patrística, Vol.19, 2002.
AMBRÓSIO DE MILÃO. Sobre a penitência. In: Ambrósio de Milão. Tradução Célia
Mariana Franchi Fernandes da Silva. São Paulo: Paulus, Coleção Patrística, Vol.5, 1996.
_____. Sobre os sacramentos. In: Ambrósio de Milão. Tradução Célia Mariana Franchi
Fernandes da Silva. São Paulo: Paulus, Coleção Patrística, Vol.5, 1996.
BAINTON, Roland H. Cativo à Palavra: a vida de Martinho Lutero. Tradução James Reis.
São Paulo: Vida Nova, 2017.
BASÍLIO DE CESAREIA. Tratado sobre o Espírito Santo. In: Basílio de Cesareia. Tradução
Monjas Beneditinas do Mosteiro Maria Mãe de Cristo, Caxambu. São Paulo: Paulus, Coleção
Patrística, Vol.14, 1998.
BECKWITH, Francis J; CRAIG, William Lane; MORELAND, J.P. Ensaios Apologéticos:
um estudo para uma cosmovisão cristã, São Paulo: Hagnos, 2006.
BÍBLIA. Português. Bíblia sagrada com reflexões de Lutero. Versão Almeida revista e
atualizada, 2. ed. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 2012.
BLAINEY, Geoffrey. Uma breve história do cristianismo. Tradução Neuza Capelo. São
Paulo: Editora Fundamento Ecudacional, 2012.
BUSENITZ, Nathan. Long before Luther: tracing the heart of the gospel from Christ to the
reformation. Chicago: Moody Publishers; Los Angeles: The Master’s Seminary Press, 2017.
CARTA DE BARNABÉ. In: Padres apostólicos. Tradução Ivo Storniolo. São Paulo: Paulus,
Coleção Patrística, Vol.1, 1995.
CLEMENTE ROMANO. Clemente aos coríntios. In: Padres apostólicos. Tradução Ivo
Storniolo. São Paulo: Paulus, Coleção Patrística, Vol.1, 1995.
CRISÓSTOMO, São João. Comentários sobre a carta aos Gálatas. In: CRISÓSTOMO, São
João. Comentário às cartas de São Paulo/1. Tradução Mosteiro de Maria Mãe do Cristo.
São Paulo: Paulus, Coleção Patrística, Vol.27/1, 2010.
_____. Homilias sobre a carta aos Efésios. In: CRISÓSTOMO, São João. Comentário às
cartas de São Paulo/1. Tradução Mosteiro de Maria Mãe do Cristo. São Paulo: Paulus,
Coleção Patrística, Vol.27/1, 2010.
_____. Homilias sobre a carta aos Romanos. In: CRISÓSTOMO, São João. Comentário às
cartas de São Paulo/1. Tradução Mosteiro de Maria Mãe do Cristo. São Paulo: Paulus,
Coleção Patrística, Vol.27/1, 2010.
DREHER, Martin N. De Luder a Lutero: uma biografia. São Leopoldo: Sinodal, 2014.
EUSÉBIO DE CESAREIA. História eclesiástia. Tradução Monjas Beneditinas do Mosteiro
de Maria de Cristo. São Paulo: Paulus, Coleção Patrística, Vol.15, 2000.
INÁCIO DE ANTIOQUIA. Inácio aos Efésios. In: Padres apostólicos. Tradução Ivo
Storniolo. São Paulo: Paulus, Coleção Patrística, Vol.1, 1995.
_____. Inácio aos Romanos. In: Padres apostólicos. Tradução Ivo Storniolo. São Paulo:
Paulus, Coleção Patrística, Vol.1, 1995.
IRENEU DE LIÃO. Contra as heresias. Tradução Lourenço Costa. São Paulo: Paulus,
Coleção Patrística, Vol.4, 1995.
IRINEU DE LYON. Demonstração da pregação apostólica. Tradução Ari Luis do Vale
Ribeiro. São Paulo: Paulus, Coleção Patrística Vol.33, 2014.
LEÃO MAGNO. Sermões. Tradução Sérgio José Schirato e outros. São Paulo: Paulus,
Coleção Patrística, Vol.6, 1996.
LUTERO, Martinho. A Epístola do Bem-aventurado Apóstolo Paulo aos Romanos. In:
LUTERO, Martinho. Obras selecionadas: interpretação bíblica, princípios. Vol.8. Tradução
Luís H. Dreher. São Leopoldo: Sinodal; Porto Alegre: Concórdia, 2003.
_____. À nobreza cristã da nação alemã, acerca da melhoria do estamento cristão. In:
LUTERO, Martinho. Obras selecionadas: o programa da Reforma, escritos de 1520. Vol.2.
Tradução Martin Dreher; Ilson Kayser; Claudio Molz; Luis Sander; Walter Schlupp. São
Leopoldo: Sinodal; Porto Alegre: Concórdia, 2000.
_____. Comentário à Epístola aos Gálatas. In: LUTERO, Martinho. Obras selecionadas:
interpretação do Novo Testamento, Gálatas – Tito. Vol.10. Tradução Paulo Flor. São
Leopoldo: Sinodal; Porto Alegre: Concórdia, 2008.
_____. Da vontade cativa. In: LUTERO, Martinho. Obras selecionadas: debates e
controvérsias, II. Vol.4. Tradução Luís Dreher; Luís Sander; Ilson Kayser. São Leopoldo:
Sinodal; Porto Alegre: Concórdia, 1993.
_____. Discurso do Dr. Martinho Lutero perante o Imperador Carlos e os Príncipes na
Assembléia de Worms. In: LUTERO, Martinho. Obras selecionadas: fundamentação da ética
política, governo, guerra dos camponeses, guerra contra os turcos, paz social. Vol.6. Tradução
Ilson Kayser. São Leopoldo: Sinodal; Porto Alegre: Concórdia, 1996.
_____. Dos concílios e da Igreja. In: LUTERO, Martinho. Obras selecionadas: debates e
controvérsias, I. Vol.3. Tradução Ilson Kayser. 2. ed. São Leopoldo: Sinodal; Porto Alegre:
Concórdia, 2007.
_____. Lutero e os antinomistas. In: LUTERO, Martinho. Obras selecionadas: debates e
controvérsias, II. Vol.4. Tradução Ilson Kayser. São Leopoldo: Sinodal; Porto Alegre:
Concórdia, 1993.
_____. Resposta a Ambrósio Catarino. In: LUTERO, Martinho. Obras selecionadas: debates e
controvérsias, I. Vol.3. Tradução Ilson Kayser. 2. ed. São Leopoldo: Sinodal; Porto Alegre:
Concórdia, 2007.
_____. Tratado de Martinho Lutero sobre a Liberdade Cristã. In: LUTERO, Martinho. Obras
selecionadas: o programa da Reforma, escritos de 1520. Vol.2. Tradução Martin Dreher;
Ilson Kayser; Claudio Molz; Luis Sander; Walter Schlupp. São Leopoldo: Sinodal; Porto
Alegre: Concórdia, 2000.
_____. Um sermão sobre o Sacramento da Penitência. In: LUTERO, Martinho. Obras
selecionadas: os princípios, escritos de 1517 a 1519. Vol.1. Tradução Annemarie Höhn et al.
2. ed. São Leopoldo: Sinodal; Porto Alegre: Concórdia, 2004.
MANGALWADI, Vishal. O livro que fez o seu mundo: como a Bíblia criou a alma da
civilização ocidental. Tradução Carlos Caldas. São Paulo: Editora Vida, 2012.
MARTÍRIO DE SÃO POLICARPO. In: Padres apostólicos. Tradução Ivo Storniolo. São
Paulo: Paulus, Coleção Patrística, Vol.1, 1995.
MCGRATH, Alister. Lutero e a teologia da cruz: a ruptura teológica de Martinho Lutero.
Tradução Markus Hediger. São Paulo: Cultura Cristã, 2014.
_____. Origens intelectuais da Reforma. Tradução Susana Klassen. São Paulo: Cultura
Cristã, 2007.
MORGNER, Christoph (Ed.). Tinta, teses, temperamentos: seguindo os passos de Martinho
Lutero. Curitiba: Editora Esperança, 2017.
NOVACIANO. A Trindade. In: Novaciano. São Paulo: Paulus, Coleção Patrística, Vol.37,
2017.
O PASTOR DE HERMAS. In: Padres apostólicos. Tradução Ivo Storniolo. São Paulo:
Paulus, Coleção Patrística, Vol.1, 1995.
ORÍGENES. Tratado sobre os princípios. Tradução João Eduardo Pinto Basto Lupi. São
Paulo: Paulus, Coleção Patrística Vol.30, 2012.
PETERS, Joel. Somente a Escritura? 21 Razões para rejeitar a Sola Scriptura. Tradução
Rondinelly Ribeiro. Brasília: Veritatis Splendor, 2009.
POLICARPO DE ESMIRNA. Segunda carta aos Filipenses. In: Padres apostólicos.
Tradução Ivo Storniolo. São Paulo: Paulus, Coleção Patrística, Vol.1, 1995.
SPROUL, R.C. Estamos juntos? um protestante analisa do catolicismo romano. Tradução
A.G. Mendes. São Paulo: Vida Nova, 2023.
_____. Luther and the Reformation: how a monk discovered the gospel. Sanford: Ligonier
Ministries, 2021.
SPROUL, R.C. NICHOLS, Stephen J. (Orgs.). O legado de Lutero. Tradução Elizabeth
Gomes. São José dos Campos: Fiel, 2017.
WACHHOLZ, Wilhelm; DREHMER, Darci. (Coords.) Confissão de Augsburgo. São
Leopoldo: Comissão Interluterana de Literatura; São Leopoldo: Editora Sinodal; Porto
Alegre: Editora Concórdia; Curitiba: Encontro Publicações, 2005.

Você também pode gostar