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REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

Profa. Ágatha Aila A. de M. Gomes


Doutora em Psicologia
Vamos
relembrar um
pouco...
Crise da Psicologia Social

Psicologia Psicologia
Social Social
Psicológica Sociológica
Psicologia Social

• Essa divisão leva à falsa impressão de que apenas a psicologia social sociológica ou
crítica seria capaz de produzir conhecimento socialmente relevante e comprometido
com a mudança social;

• As críticas não foram formuladas para rejeitar explicações individuais e


interindividuais. Em vez disso, elas questionavam a tendência de reduzir as
explicações sobre o comportamento social a princípios meramente psicológicos.
Isso mostra a necessidade de integração entre dimensões pessoais,
interpessoais, intergrupais e ideológicas na explicação dos fenômenos
analisados e reafirma a indissociabilidade entre indivíduo e sociedade.

Teoria das Representações Sociais (TRS)


Representações Sociais

• Publicação, em 1961, da obra A psicanálise, sua imagem e seu


público – Serge Moscovici.
• Esta obra apresenta o processo de apropriação da psicanálise
pela população parisiense na década de 50.

Como os conceitos produzidos pela teoria psicanalítica foram


apropriados e transmitidos, no dia-a-dia, por indivíduos de
diferentes grupos sociais?
Representações Sociais
As representações
construídas não se
derivaram apenas
Os conceitos
da teoria, mas
psicanalíticos,
As ideias da Os conceitos também de
reformulados à luz
psicanálise se psicanalíticos foram concepções
de teorias do senso
difundiram modificados no ideológicas e
comum, passaram a
rapidamente processo de culturais dos
ser utilizados na
através dos meios apropriação pelos diferentes grupos
análise e
de comunicação. indivíduos. sociais, bem como
compreensão da
das experiências e
conduta psicológica.
comunicações
cotidianas por eles
estabelecidas.
Explicações nas
mídias e outros
recursos
(jornalistas, RS sobre a
Descoberta
Senso comum comentaristas, descoberta
científica
econômicos, científica
políticos,
professores,
propagandistas)
RS e o Senso Comum

• O campo teórico das representações sociais se desenvolve como uma psicologia


“preocupada em compreender como pessoas comuns, comunidades e
instituições produzem saberes sobre si mesmas, sobre outros e sobre a
multidão de objetos sociais que lhes são relevantes”
• O estudo do senso comum na perspectiva da TRS não pretende avaliar a
veracidade dos saberes produzidos, mas, de outro modo, busca analisá-los a
partir da racionalidade coletiva que institui o próprio real (Moscovici, 2012).
Conceituação de RS

• As representações sociais são uma forma de conhecimento socialmente


elaborado e compartilhado, com um objetivo prático, e que contribui
para a construção de uma realidade comum a um conjunto social
(Jodelet, 1983)
Conceituação de RS

• Um sistema de valores, ideias e práticas, com uma dupla função: primeiro


estabelecer uma ordem que possibilitará às pessoas orientar-se em seu
mundo material e social e controlá-lo; e, em segundo lugar, possibilitar
que a comunicação seja possível entre os membros de uma comunidade,
fornecendo-lhes um código para nomear e classificar, os vários aspectos
de seu mundo e da sua história individual e social (Moscovici, 2005).
• Analisar as representações sociais de crianças cariocas sobre a
pandemia de covid-19.
• As crianças demonstram tanto cautela
com a pandemia, indicando ter
consciência da importância do
distanciamento social, do uso de
máscara e da higiene pessoal para o
enfrentamento da covid-19, quanto
preocupação, medo e até raiva do vírus.
(Álvaro et al., 2021)
(Álvaro et al., 2021)
Conceituação de RS

• “Teorias” sobre saberes populares do senso comum, elaboradas e


partilhadas coletivamente com a finalidade de construir e interpretar o
real.
Todo saber socialmente
compartilhado pode ser uma RS?

• Não.
• Não podem ser confundidas com meras opiniões, crenças ou informações
desconexas sobre um objeto.
• Marková (2003) diz que qualquer objeto ou fenômeno pode se tornar um
objeto de uma representação social desde que o assunto em questão se
torne interesse de preocupação pública.
Todo saber socialmente
compartilhado pode ser uma RS?

✓Saliência do objeto na sociedade e na vida dos grupos;


✓Apropriação por meios de comunicação de massa;
✓Dispersão de informações existentes sobre o objeto na cultura e em diferentes
sistemas de saber e a consequente defasagem de conhecimentos;
✓A pressão à inferência, que ocorre pela necessidade que os indivíduos têm de reagir e
se posicionar diante do objeto em comunicações e práticas cotidianas.
Conhecer as representações sociais da violência contra mulher a partir de
jornais policiais televisivos no Ceará
Funções da RS

• De acordo com Moscovici (2009), “a finalidade de todas as


representações sociais é tornar familiar algo não-familiar”.
Funções da RS

1. Função de saber
• Permite que os indivíduos compreendam e expliquem a realidade de
maneira coerente com seu sistema cognitivo;
• A existência de RS é entendida como condição necessária para a
comunicação social.
Funções da RS
2. Função identitária

• Contribuem para definir identidades pessoais e sociais por meio de processos de


comparação social que ocorrem nas relações interpessoais e intergrupais;
• Indivíduos constroem e compartilham representações sociais sobre os seus próprios
grupos e sobre os grupos dos quais não fazem parte → exogrupo é frequentemente
representado de maneira mais estereotipada e menos positiva em relação ao
endogrupo.
Funções da RS
3. Função prática

• Orientação na elaboração de condutas e práticas sociais;


• Produzem um sistema de antecipação e de expectativas, o que antecede e
determina as maneiras possíveis de se relacionar com o outro e com o objeto;
• São prescritivas, pois definem os comportamentos aceitáveis e inaceitáveis em
função das regras e normas sociais características de determinado contexto ou
situação social.
Funções da RS
4. Função de justificar os comportamentos e práticas

• Atuam não apenas na justificação dos comportamentos em um nível


situacional de análise, mas também estão presentes em condutas
intergrupais, servindo à diferenciação social e à criação ou manutenção
de relações assimétricas de poder.
RS e Linguagem

• Não há representações sociais sem linguagem, do mesmo modo que sem


elas não há sociedade.

Exemplo: companheiro
Como construímos RS?

• Representações não são criadas por um indivíduo isoladamente.


• Uma vez criadas, as representações adquirem vida própria, circulam, se
encontram, se atraem e se repelem e dão oportunidade aos nascimento
de novas representações, enquanto velhas representações morrem.
• A representação pode ser compartilhada por todos e reforçada pela
tradição.
Como construímos RS?
• São formadas pelo próprio processo de construção social da realidade,
ainda que isso não ocorra de maneira consciente, deliberada ou
intencional.

“A comunicação social, sob seus aspectos interindividuais, institucionais e


midiáticos, aparece como condição de possibilidade e de determinação
das representações e do pensamento sociais”
Como construímos RS?
• Moscovici (1978) afirma que é importante analisar um fenômeno no
momento em que há um conflito.
• Dentro de qualquer cultura há pontos de tensão e são a partir deles que
novas representações irão surgir dentro do sistema.
• A questão é que existe uma falta de sentido, são aspectos não
familiarizados pela sociedade, e por isso, torna-se necessária a existência
de uma ação que restabeleça a estabilidade.
Como construímos RS?
• As convenções sociais, a tradição, impõem-se às pessoas, determinando suas
formas de pensamento.
• Isso não quer dizer, no entanto, que as RS sejam estáticas e imutáveis; ao contrário,
é preciso compreendê-las historicamente, como um processo dinâmico.
• As RS se estabelecem a partir de “uma sequência completa de elaborações e
mudanças que ocorrem no decurso do tempo e são o resultado de sucessivas
gerações; as experiências e ideias passadas não são experiências ou ideias mortas,
mas continuam a ser ativas, a mudar e a infiltrar experiências e ideias atuais”.
Ancoragem

Objetivação
Ancoragem
• Processo pelo qual algo estranho é classificado numa categoria já
existente, categoria já familiar ao sujeito.
• É o processo de integração de algo novo a um sistema de informações, a
esquemas de pensamento que servem como pontos de referência para a
nova representação;
• À medida que o novo é comparado a uma categoria já existente, adquire
as características dessa categoria, ajustando-se a ela de modo a garantir
conformidade entre o novo e o familiar.
Ancoragem

• Ocorre pela necessidade que têm as pessoas de dar significados,


classificar, rotular, nomear algo desconhecido, tornando-o familiar.
• A ancoragem implica limitar algo – objeto, pessoa, grupo, acontecimento
– dentro de um conjunto de ações e regras pré-estabelecidas, que
prescrevem o que é ou não permitido a todos os membros da categoria.
Ancoragem

• A ancoragem reúne as principais funções das representações sociais:

1. integração de algo novo a categorias já familiares - um protótipo;


2. interpretação da realidade – há sempre uma ancoragem, um viés;
3. orientação dos comportamentos e práticas sociais - as RS formam
opiniões.
Ancoragem

Exemplo:

AIDS = “peste” ou “câncer gay”


COVID = “É só uma gripe”
Objetivação
• No processo de objetivação, um conceito, uma palavra, é transformado
numa imagem.
• Descreve a forma como uma representação torna-se real, é materializada
e naturalizada.

“Temos apenas que comparar Deus com um pai e o que era invisível,
instantaneamente se torna visível em nossas mentes”
Objetivação

• COVID = “Gripe chinesa”


Ancoragem e Objetivação

• Os mecanismos de ancoragem e de objetivação consistem num processo


de integração cognitiva de novos elementos ao sistema de
representações, que é alterado/atualizado diante de novos fenômenos
que lhe são estranhos.
• São, portanto, processos interdependentes: a ancoragem integra um
novo conteúdo à estrutura pré-existente e a objetivação materializa e
naturaliza esse conteúdo numa imagem.
Estudos sobre RS no Brasil

O movimento brasileiro na TRS pode ser caracterizado pela tentativa de


responder aos problemas que derivam da realidade social, contribuindo
diretamente para os domínios de aplicação do conhecimento em áreas
como saúde, educação, política, justiça, direitos humanos, movimentos
sociais, entre outras.
Como investigamos RS?

Não existe uma metodologia exclusiva para a investigação de RS:

• Formas de investigação quali e quanti:


- Grupos Focais
- Entrevistas
- Questionários
Os resultados indicaram que a RS do autismo foi ancorada na doença mental e
objetivada na descrição de autismo infantil contida na CID-10. Tais achados
evidenciam, especialmente, que a representação ancorada na doença mental
implica em atribuir ao autismo e às pessoas autistas o arcabouço de crenças e
cognições que refletem uma atmosfera de muitos desafios para a superação de
fenômenos como o preconceito e a discriminação.
Verificou-se que os idosos de grupos de
convivência representaram o
envelhecimento, sobretudo, com
aspectos positivos, associando-o à saúde
e à atividades físicas, enquanto os que não
participam associaram-no a conteúdos
negativos, relacionados à doença, perdas
e declínio.
As representações sociais sobre a Covid-19 enfatizam o isolamento
social como a principal estratégia para lidar com o risco de morte e
com o medo da doença causada pelo novo coronavírus. Também
fazem parte do campo representacional, elementos que se associam
às repercussões psicossociais causadas pela pandemia, como a
ansiedade, a solidão e a incerteza.
Os resultados demonstraram que os motoristas, em sua
maior parte, representam o trânsito brasileiro de modo
pessimista e negativo. A palavra “estresse” foi a mais
utilizada para representar o “engarrafamento”.
Referências

CAMINO, L. et al. Psicologia Social: Temas e Teorias. Brasília: Technopolitik, 2013.

TORRES, C. V.; NEIVA, E. R. Psicologia social: principais temas e vertentes. 2. ed. Porto
Alegre Artmed, 2023.

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