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JUR0292_v1.

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Tributação Internacional e Aduaneira
Disciplina: Tributação Internacional e Aduaneira
Autoria do Estudo de Caso: Mauricio Pichiliani

Estudo de Caso
1. Caso
A empresa SOFS TEC LTDA., nacional e com sede apenas no Brasil, possui aplicações
financeiras em outros países e recebe mensalmente dividendos e rendimentos monetários.
Tais valores são inclusive repartidos entre os sócios na forma de participação nos lucros
(PLR).

A Receita Federal do Brasil exige, em relação a tais rendimentos, o recolhimento de IR, e os


sócios indagam o departamento jurídico da empresa sobre a carga tributária incidente
diante da existência de normas internacionais sobre o caso.

O departamento jurídico, por meio de sua gerência, encaminha a seu escritório o pedido de
elaboração de um parecer técnico que contenha diversos aspectos envolvidos no caso,
como a existência de norma(s) vigente(s), a compatibilidade entre tratados internacionais e
normas internas, a fiscalização tributária, entre outras.

Assim, em relação à situação-problema apresentada, as seguintes indagações devem ser


abordadas e respondidas (obrigatoriamente) para compor o parecer técnico

Há alguma norma sobre o assunto? Caso positiva a resposta, indique-a e explique


como é realizada a exação e a fiscalização, explicitando as intenções governamentais
para sua positivação.

Exponha, detalhadamente, quais são os critérios que podem orientar a tributação


interna e internacional de um país em relação ao comércio exterior.

Na hipótese de existência de tratados internacionais sobre o tema (especificamente


sobre a vedação à bitributação internacional), explique fundamentadamente quais
são os efeitos de mencionada norma sobre o regime jurídico interno, bem como suas
consequências, abordando inclusive o atual posicionamento do Supremo Tribunal
Federal sobre o assunto.
Caso editada norma interna posterior ao tratado internacional que contenha
disposição divergente, quais as consequências para a empresa e quais as medidas
cabíveis para sua defesa? Explique e fundamente sua resposta.

2. Papel do aluno e sua participação na resolução do problema


Você foi o advogado contratado pelo departamento jurídico da empresa para analisar o
caso e elaborar um parecer sobre alguns aspectos relevantes da tributação internacional e
aduaneira. Exponha e explique, fundamentadamente, cada uma das respostas às
indagações formuladas, com o objetivo final de orientar a própria pessoa jurídica e seus
sócios sobre a exação, a política econômico-tributária adotada pelo governo brasileiro, a
eventual incompatibilidade entre normas internas e internacionais e, em último caso,
acerca de eventuais medidas administrativas ou judiciais cabíveis.

3. Objetivos
Gerais
• Desenvolver a prática do autoaprendizado e do trabalho em equipe.

• Planejar as atividades no tempo disponível.

• Desenvolver a autonomia na realização de pesquisas.

• Ser criativo na solução do desafio.

Específicos
• Retratar determinada situação jurídica hipotética capaz de instigar a reflexão do
tema de forma ampla e profunda.

• Promover a interpretação contextual para que melhor se possa compreender a


manifestação geral de um dado problema.

• Estimular o desenvolvimento de raciocínio crítico e argumentativo.

• Desafiar o aluno a identificar e avaliar a problematização e a propor solução.


• Identificar as normas legais e infralegais relacionadas à exigência de tributos sobre
rendimentos auferidos no exterior por pessoa jurídica ou física estabelecida no
Brasil.

• Conhecer os principais critérios de aplicação de carga tributária sobre o comércio


internacional ou elementos de conexão da incidência e sua aplicabilidade.

• Compreender as consequências da adoção de um ou outro modelo de tributação


internacional, isto é, compreender os efeitos e impactos da implementação de um ou
outro elemento de conexão da incidência.

• Pesquisar e explicar quais os objetivos traçados pelo governo brasileiro, em especial


pelo governo federal, que justificariam a escolha pelo modelo identificado.

• Pesquisar e expor as diferentes correntes que versam sobre a compatibilidade e


convivência entre os tratados internacionais e as normas internas, inclusive
abordando a teoria da norma supralegal aparentemente adotada pelo STF.

• Verificar e expor as possíveis consequências para sua cliente em caso de norma


interna divergente de tratado internacional, bem como apresentar possíveis medidas
para defesa dos interesses da empresa e de seus sócios.

4. Atividades
Considerando as informações contidas no enunciado, este Estudo de Caso deve ser
desenvolvido seguindo a etapa a seguir:

Apoiar-se nas leituras complementares:

• ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. 11ª ed. Salvador: JUSPODIVM, 2017.


AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

BRASIL. Código Tributário Nacional (1966). Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966.


Diário Oficial da União, Brasília, 27 out. 1966. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172Compilado.htm>. Acesso em:
17 set. 2018.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da
União, Brasília, 5 out. 1988. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>.
Acesso em 17 set. 2018.

CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 26ª ed., rev.,
amp., e atual. São Paulo: Malheiros, 2010.

MOREIRA FILHO, Aristóteles. Os critérios de conexão na estrutura da norma


tributária. In: TORRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito tributário internacional
aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2003.

MOREIRA JR., Gilberto de Castro. Bitributação internacional e elementos de


conexão. São Paulo: Aduaneiras, 2003.

PICHILIANI, Mauricio Carlos. A eficácia normativa dos tratados internacionais em


matéria tributária. In: XXII Encontro Nacional do CONPEDI, 2013, São Paulo. Direito
Tributário. Florianópolis. FUNJAB - Fundação José Arthur Boiteux. v. único. p. 55-68.

PICHILIANI, Mauricio Carlos. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Rideel, 2018.

SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

TORRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito tributário internacional aplicado. São


Paulo: Quartier Latin, 2003.

5. Resolução
Para a exata resolução do caso, faz-se necessária a análise e resposta detalhada de cada um
dos questionamentos apresentados, o que será feito a seguir:

a) Há alguma norma sobre o assunto (sobre a tributação de rendimentos advindos do


exterior)? Caso positiva a resposta, indique-a e explique como é realizada a exação e a
fiscalização, explicitando as intenções governamentais para sua positivação.
Há diversas normas legais e infralegais pátrias que dispõem sobre a aquisição de
disponibilidade econômica ou jurídica de rendas obtidas no exterior, especificamente
relativas ao imposto de renda.

O fato gerador do Imposto de Renda (IR) consiste na aquisição (econômica ou jurídica) de


rendas ou proventos de qualquer natureza, independentemente do local de sua
procedência. Importa, de fato e de direito, o fenômeno “auferir renda”, e não o ato,
operação ou local de origem desta renda.

Essa afirmação encontra fundamento nos princípios da universalidade e da generalidade do


Imposto de Renda, previstos no artigo153, §2º, inciso I, da Constituição, e nos princípios
gerais (de direito tributário) da igualdade – previsto no artigo 150, inciso II, da CF – e da não
discriminação tributária – previsto no artigo 152, da CF.

A Lei do Imposto de Renda (Lei 7713/88), bem como o Regulamento do IR (Decreto nº


3000/99 – RIR) contêm previsão expressa acerca da incidência do imposto sobre
rendimentos provenientes do exterior auferidos por pessoa física ou jurídica:

LEI 7713/88

Art. 3º. O imposto incidirá sobre o rendimento bruto, sem qualquer dedução,
ressalvado o disposto nos arts. 9º a 14 desta Lei.

(...)

§ 4º A tributação independe da denominação dos rendimentos, títulos ou direitos,


da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem dos bens
produtores da renda, e da forma de percepção das rendas ou proventos, bastando,
para a incidência do imposto, o benefício do contribuinte por qualquer forma e a
qualquer título.

[...]

Art. 8º Fica sujeito ao pagamento do imposto de renda, calculado de acordo com o


disposto no art. 25 desta Lei, a pessoa física que receber de outra pessoa física, ou
de fontes situadas no exterior, rendimentos e ganhos de capital que não tenham
sido tributados na fonte, no País.
DECRETO 3000/99:

Art. 55. São também tributáveis:

(...)

VII - os rendimentos recebidos no exterior, transferidos ou não para o Brasil,


decorrentes de atividade desenvolvida ou de capital situado no exterior;

E a Lei 9613/98 (Lei da Lavagem de Dinheiro) prevê os crimes de lavagem de dinheiro na


hipótese de ocultação ou omissão do recebimento de valores provenientes de infração
penal:

Art. 1o. Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição,


movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou
indiretamente, de infração penal.

A exigência do imposto de renda sobre rendimentos provenientes do exterior se dá de


forma idêntica àquela adotada para os demais rendimentos: incumbe ao sujeito passivo,
nos termos do artigo 150 do CTN c/c o disposto no Regulamento do Imposto de Renda
(Decreto 3000/99), a declaração da renda ou provento em formulário próprio.

b) Exponha, detalhadamente, quais são os critérios que podem orientar a tributação


interna e internacional de um país em relação ao comércio exterior.

De acordo com Heleno Taveira Torres, há diversos critérios para estabelecimento de carga
tributária envolvendo as relações internacionais, especialmente o comércio de bens e
serviços, a aquisição e disponibilidade de renda e a transmissão de patrimônio
internacionais.

Dentre os principais critérios, também denominados elementos de conexão de incidência,


estão o critério da origem, o critério do destino, o critério da renda, o critério da situação do
bem (também denominado critério real) e a nacionalidade.
Especificamente quanto à aquisição de renda, o Brasil adota o critério da renda, isto é,
independentemente de sua origem ou destino, a aquisição de renda (ou rendimento, ou
proventos) será tributada pelo governo brasileiro.

Há a ressalva à vedação à bitributação, prevista no artigo 8º, da Lei nº 7713/88, que impede
a incidência do IR sobre rendimentos percebidos no exterior que já tenham sido objeto de
tributação na fonte.

c) Na hipótese de existência de tratados internacionais sobre o tema (especificamente


sobre a vedação à bitributação internacional), explique fundamentadamente quais são os
efeitos de mencionada norma sobre o regime jurídico interno, bem como suas
consequências, abordando inclusive o atual posicionamento do Supremo Tribunal Federal
sobre o assunto.

Há diversas normas internacionais sobre o direito tributário. Essas normas dispõem sobre
arrecadação, vedação à bitributação, relações internacionais e comércio exterior.

Segundo Mauricio Carlos Pichiliani, os tratados internacionais de direito tributário versam,


em regra, sobre a vedação à bitributação:

“Dada a influência sobre as receitas, a economia e o mercado de um Estado, os


tratados internacionais de direito tributário, ainda que contenham dispositivos que
possam restringir o trânsito internacional de pessoas (liberdade de ir e vir), dispõem
sobretudo sobre a arrecadação tributária e as relações comerciais entre os países
signatários.1”

Os tratados internacionais em matéria tributária não dispõem sobre direitos humanos e


ingressam no sistema jurídico com força de lei, por meio de Decretos Legislativos. De fato,
os tratados internacionais em matéria tributária são incorporados ao sistema jurídico pátrio
por meio de decretos legislativos, nos termos do artigo 49, inciso I, da Constituição.

1 PICHILIANI, Mauricio Carlos. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Ed. Rideel, 2018, p.70.
Esses Decretos podem alterar a legislação interna e dependem não apenas da concordância
do Chefe de Estado com os termos do acordo ou tratado, mas também da validação dessa
anuência pelo legislativo.

Há dois entendimentos principais em direito internacional sobre a relação entre as normas


internacionais e internas: a existência de um único regime jurídico (teoria unitária, ou
monista) e a existência de dois sistemas jurídicos (teoria dualista). (O tema merece estudo
aprofundado pelos alunos, que deve ser realizado independentemente da presente
atividade).

Os principais autores de direito tributário sobre o tema, Heleno Taveira Torres e Luís
Eduardo Schoueri, entendem que a adequada solução sobre os efeitos dos tratados
internacionais sobre as normas pátrias possui relação com a jurisdição, isto é:

“os tratados em matéria tributária visam a delimitar os contornos nos quais se


admitirá que o legislador tributário doméstico atue.

(...)

Assim, somente após a referida determinação de jurisdição é que os Estados podem


definir o âmbito de incidência de suas leis. Por consequência, a efetiva jurisdição
deve ser vista como pressuposto inafastável para a aplicação da lei.2”

O autor sustenta ainda a aplicação da teoria denominada “Máscara de Vogel”, em que as


normas internas somente poderiam dispor sobre temas “abertos” pelas normas
internacionais, como os “buracos” ou “vãos” de uma máscara.

A problemática envolvendo os efeitos dos tratados internacionais foi abordada pelo artigo
98 do CTN, que determina que os tratados internacionais possuem eficácia modificativa e
extintiva:

Art. 98. Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a


legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha.

2 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 3.ed São Paulo:. Saraiva2013, p. 98-99.
De acordo com o dispositivo legal, os tratados internacionais em matéria tributária não
podem instituir novos tributos, apenas modificar ou extinguir aqueles já existentes.

A parte final do dispositivo contém regra que levanta inúmeras controvérsias: as


disposições dos tratados internacionais devem ser observadas pela legislação interna
posterior.

Em relação a essa afirmação, é possível indagar: as disposições dos tratados internacionais


são hierarquicamente superiores às disposições legais?

Há diversos entendimentos sobre o tema, destacando-se o princípio da especialidade e a


teoria da eficácia supralegal (vide o artigo A eficácia normativa dos tratados internacionais
em matéria tributária, de autoria de Mauricio Pichiliani. In: XXII Encontro Nacional do
CONPEDI, 2013, São Paulo. Direito Tributário. Florianópolis: FUNJAB - Fundação José Arthur
Boiteux. v. único. p. 55-68).

Segundo o primeiro critério, (especialidade) a prevalência do tratado internacional a que se


refere o artigo 98 do CTN decorre não de hierarquia normativa, mas do princípio da
especialidade, segundo o qual norma específica se sobrepõe a norma geral.

Já segundo a teoria da eficácia supralegal (aplicável a tratados de direitos humanos que não
foram aprovados com força de emenda constitucional, com é o caso do “Pacto de San José”,
da Costa Rica), as normas interna e internacional são ambas específicas, e a internacional se
sobrepõe em razão de sua eficácia hierarquicamente superior.

Este, aliás, parece ser o entendimento adotado pelo STF atualmente, consoante pode ser
verificado pelo julgado contido no RE 460.320, que aponta a necessidade de nova
interpretação dos tratados internacionais no âmbito da globalização e da convergência
internacional.
Cidades, o pleito reivindicatório do Grupo Hoteleiro deverá ser julgado improcedente.

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