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Sumário

Ficha Técnica
Aviso Aos Leitores
Todos Os Direitos Reservados
Sinopse
Prefácio
Prólogo
Capítulo 1 Brina
Capítulo 2 Brina
Capítulo 3 Brina
Capítulo 4 Will
Capítulo 5 Brina
Capítulo 6 Will
Capítulo 7 Will
Capítulo 8 Brina
Capítulo 9 Brina
Capítulo 10 Will
Capítulo 11 Will
Capítulo 12 Brina
Capítulo 13 Brina
Capítulo 14 Brina
Capítulo 15 Will
Capítulo 16 Brina
Capítulo 17 Will
Capítulo 18 Brina
Capítulo 19 Will
Capítulo 20 Brina
Capítulo 21 Brina
Capítulo 22 Brina
Capítulo 23 Will
Capítulo 24 Brina
Epílogo Brina
Agradecimento
Sobre A Autora
Outros Livros Da Autora
SILVIE BASSET - Copyright
© 2022 — 1ª Edição

Capa e Edição: Cahenna Sales


REVISÃO: Narjara Pedroso
A história contém consumo de álcool, drogas, nudez, cenas de sexo
e linguagem imprópria para menores de 18 anos.

As informações aqui constantes são absolutamente fictícias,


fruto da imaginação da autora, qualquer semelhança com o mundo
real é mera coincidência.

Falling Angels é uma série ambientada em uma região


inexistente no mundo real, porém com menção ao norte da
Pensilvânia.

Este livro possui gatilhos para abuso psicológico parental e


aborto.

Se este tipo de leitura lhe incomoda, melhor parar por aqui.

A autora também enfatiza que não é a favor de nenhuma


forma de violência, uso de drogas ou qualquer ato ilícito.

Espero que desfrutem da leitura.


Obra protegida pela Lei n. 9.610/98 (Lei de Direitos
Autorais).

Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida, transmitida


ou gravada, por qualquer meio eletrônico, mecânico, por fotocópia e
outros, sem a prévia autorização por escrito da autora.

‘ENGANO’ é uma obra de ficção, qualquer semelhança com


pessoas ou fatos reais é mera coincidência.

ALERTA: CONVERTER EM PDF E DISTRIBUIR CÓPIA


LITERÁRIA É CRIME!
Vamos prestigiar a literatura nacional e combater a
pirataria. O valor do e-book dá menos de 0,06/dia num mês.
Pense nisso!
Um cara popular e que, inevitavelmente, faz parte da elite na
Universidade de Braveton. O último Falling Angel, o mais fechado, o
cara calado, que ostenta a pose e um sobrenome muito desejado,
não só pelas garotas.
Willian King se esconde nos cantos da velha biblioteca,
intrigando o corpo estudantil por não ser do tipo que se rende e
aceita apenas uma noite de prazer.
Ele guarda sua virgindade para uma garota digna de suas
virtudes.
Brina Heinz é a rainha e não apenas nos corredores da
faculdade. Dentro de campo, ela é titular do time feminino de
futebol.
Ele sonha em se entregar à sua princesa eleita, e tem uma
rainha inversa disposta à sua frente.
Will deseja um relacionamento duradouro.
Brina é inconstante.
Quando duas coroas ocupam seus lugares de ordem, um
engano colocará tudo à prova.
Há mais de oito décadas, quatro famílias comandam a
Universidade de Braveton, localizada no Norte da Pensilvânia, EUA.
São elas Winston, Henderson, Raymond e King.
Reza a lenda que a família mais antiga é Winston, sendo as
demais derivadas de casamentos entre membros que o patriarca da
época entendia conveniente para seus negócios.
Ninguém sabe relatar a origem da fortuna em si, já que o
primeiro Winston foi um dos pioneiros em manusear o mercado
entre empresas no modo factoring, ou seja, agiotagem legalizada.
Entretanto, para emprestar valores e cobrar os juros que se
entende por bem, tem por pressuposto a existência de dinheiro,
correto?
Então… esse valor aí é que ninguém sabe dizer de onde
surgiu.
Mas, o fomento e a idealização de capitalizar
empreendimentos a princípio falidos, forjando-se no conceito de
instituição financeira sem sê-lo, isto, vieram do tataravô Winston, ou
algo do tipo. Depois o investimento em empresas que seus filhos, e
os filhos dos seus filhos, se interessavam já existia na gama de
ações do grupo empresarial controlado pela família.
O negócio não murchou com os descendentes, e sim,
aumentou.
Pessoas inteligentes se interligaram e construíram os degraus
de uma escada sólida rumo ao sucesso.
Enfim.
Esta introdução é só para matar a curiosidade sobre as
famílias por ora, mais para frente fará realmente sentido acerca dos
valores arcaicos que ainda prevalecem no meio de nossos Falling
Angels.
Continuando nossa história, cada herdeiro de suas fortunas é
encaminhado para estudar cursos específicos e manter a ordem do
império empresarial, voltado para construção, tecnologia e junção, e
fragmentação de pequenas empresas.
Outro mistério que ronda essas famílias é quando o apelido
Falling Angels foi lhes conferido. Talvez a beleza genética passada
por gerações fizesse jus aos anjos, no entanto a índole ateada pelo
poder não escondia a fachada angelical.
Muitos preferiam chamá-los de demônios, isso sim.
Anjos não seriam adeptos a orgias, dentre outras facetas
mundanas que apenas as paredes da universidade de Braveton
eram testemunhas… ou não, já que o trote tradicional ocorria
sempre em uma floresta na mansão destinada à moradia desses
herdeiros.
O lugar situa-se nos arredores de Braveton, e todos os alunos
são praticamente convocados a participar da festa de Halloween.
À meia noite do dia 31 de outubro, as garotas percorrem um
trajeto dentro da mata como as caças, enquanto a ala masculina
são seus caçadores, dando prioridade aos Falling Angels que
entram primeiro para escolher suas presas.
A “Caçada” tornou-se tradição para os alunos de Braveton.
Quem não participa é considerado um apátrida e excluído
socialmente por todo período universitário.
Trata-se apenas de uma brincadeira, onde tudo ocorre de
forma consensual. Mesmo que a adrenalina da perseguição mostre-
se o contrário.

Quatro herdeiros, quatro histórias.


A amizade entre os Falling Angels é praticamente forçada pela
convivência familiar. Todavia, entre escolher e aceitar, quatro amigos
optaram pela escolha.
Alec Winston destaca-se pelo seu humor negro, seriedade e
racionalidade nas decisões do grupo. Por isso, foi alocado como
líder do bando. Sua única fraqueza é certa gazela, de nome Elisa
Vough, que o tirou dos eixos à primeira vista.
Gabriel Henderson é o segundo em comando. Um sujeito de
temperamento forte, que preferiu colocar toda sua mágoa pela
ausência de seus pais na única pessoa que ama, Aline Cooper. Ele
é simpático e gentil com todos, menos com sua ex-melhor-amiga.
Até porque ela permite que ele a use como escape.
Um dia isso pode mudar.
Já Henry Raymond, nosso Falling Angel exibicionista,
apaixonou-se quando foi beijado e abandonado em uma das
Caçadas, sem saber quem era a garota. Descobriu depois de um
ano e hoje não desgruda de sua fadinha-nerd, Debby.
Agora, iremos conhecer a história de Willian King.
O anjo-demônio calado.
Ele possui valores bem diferentes de sua estirpe. Algo que
para alguns é intrigante, e para outros só o deixa mais atrativo.
O que será que Will irá causar em você, hum?
Em mim, foi uma vontade imensa de ser por meio segundo
Brina Heinz (risos).
Preparadas?
A fumaça branca dança ao redor do meu rosto, fazendo uma
penumbra que embaça minha visão por um breve momento até se
dissipar. Levo novamente o vape em meus lábios e puxo o vapor
temperado com o haxixe que comprei especialmente para esta
noite.
Os desenhos e linhas finas esbranquiçadas da nuvem
entorpecente que passam a ficar translucidas parecem acompanhar
as batidas da música ao longe.
Acredito que o DJ deva estar tocando para os garçons e
garçonetes no momento, já que todos os convidados estão correndo
como loucos pelos trajetos que eu e meus amigos fizemos dentro da
floresta.
Preciso aguardar por mais alguns minutos ainda, penso.
Participar da Caçada não é opcional para um Falling Angel.
Por isso, cá estou. Mas, efetivamente caçar uma garota que eu mal
conheço, e deixá-la me tocar intimamente pelo simples fato de
saciar a lascívia não condiz com o que acredito. Não que meu pau
muitas vezes não peça ou até implore pelo toque feminino.
Ah… isso ele faz. Eu que não deixo meus hormônios
comandarem meu cérebro.
Henry pode tirar sarro o quanto quiser ao debochar que sou
uma versão de princesa invertida.
Foda-se.
Eu já me cansei em tentar conduzir amassos de uma noite
só. Antes era mais fácil. Mas na faculdade, quando digo que não
quero ir além é levar um soco no estômago. Todas se sentem
rejeitadas pelo anjo-demônio calado. Elas não respeitam meu limite.
Saio do devaneio e inspiro pela boca o cheiro terroso com
um leve toque de banana para dentro dos meus pulmões. Era o
último que meu fornecedor tinha. Haxixe sabor banana.
Tive que escolher entre um hash sabor banana ou LSD.
Como o último quase me fez ir contra o que acredito e participar da
brincadeira dos meus amigos preenchendo todos os buracos de
certa garota, preferi ter o sabor terroso e adocicado em formato de
névoa em meu vape hoje.
Escorrego as costas pelo tronco da árvore na clareira que
descobri ano passado na primeira caçada, e depois, tornou-se uma
passagem obrigatória quando sigo para minha cabana.
Miro o céu estrelado, admirando as luzes que aumentam e
diminuem como rajadas de laser ao se expandir e contrair ao centro.
Estou entrando na primeira viagem de êxtase do mix da erva
que assopro vez e outra quando risadas chamam minha atenção.
— Tá bem, tá bem, Andrew… agora, me solte e vá atrás da
sua namorada que você ganha mais, vai — uma voz feminina
aveludada e agradável soa firme, mesmo com um tom brincalhão.
— Ela deve estar com um dos caras, Bri… Eu quero você,
gata. Vai… — O casal surge com mais nitidez ocupando o centro da
clareira.
Reviro os olhos ao identificar a encrenca em minha frente.
Andrew Foster é um dos jogadores de basquete, que vive
corneando a namorada, e a voz feminina pertence à perdição dos
meus sentidos em forma de gente… Brina, a morena linda e
petulante, que se acha a rainha do mundo. Ela é.
— Cara… é sério, não tô afim. Se eu soubesse que tinha
namorada antes, nem tinha te beijado. Não sou puritana, mas não
pego macho alheio. Me erra, garoto. — Seu tom aparenta não estar
mais tão divertido quanto antes.
— Ah… Bri… não se faça de rogada, vai. Você gostou e
muito da minha boca em você semana passada.
— Até uma garota louca aparecer, dizendo que era sua
dona, mané… Qual o problema de vocês, hum? — Ela empertiga,
virando o corpo para ele com uma mão na cintura e a outra com um
dedo em riste.
Cara… Ela dá conta do sujeito, né? Não vou precisar me
manifestar, vou?
Porra! Juro que acabei de ver uma estrelinha piscando pra
mim…
— Me solta! — Brina resmunga, parecendo fazer força e
sim… Ela está tentando sair do agarre do infeliz que não entende
um ‘não’ como resposta.
Merda. Já era a vibe boa.
— Foster, a gata não tá afim — digo, revelando-me ao
levantar do solo. Não sei se dou risada ou se tenho pena do sujeito
que fica pálido no mesmo instante.
Reflito por um momento sobre a imagem que ele deve estar
enxergando e a aflição escancarada em seus olhos diz tudo.
Às vezes me esqueço que estamos em uma festa à fantasia
e principalmente que este ano nossas asas são demoníacas pra
cacete.
Não fiz questão como os outros em me desfazer do
sobretudo que acopla o par de asas com chifres em minhas costas.
Ademais, meus cabelos quase brancos contrastando com o marrom
café e detalhes em dourado se prontificam em aprimorar o look
diabólico.
Para o idiota do Foster, devo parecer o próprio Lúcifer.
Solto o riso sem humor com uma lufada de ar ao perceber
que ele passou a andar para trás instintivamente conforme eu
avanço.
A ideia deste tipo de caçada a imbecis com uma
consequente surra me agrada mais que a caça às garotas.
— Bú! — falo quando aciono o aparato eletrônico que abre
as asas rapidamente. Andrew cai de bunda no chão e solta um grito
de pavor tão estridente que se eu não estivesse vendo, juraria que
era de uma menina.
Ele levanta-se assustado e corre em direção à floresta
escura.
— O que será que ele usou pra ficar tão cagão? — comento
mais para mim.
— Não precisaria ter usado nada. Cara, você saiu do meio
de uma neblina do além… e esses chifres… — ela assobia,
apontando o topo das asas. — Nossa!
— E por que você não fugiu? — Inclino a cabeça analisando
as feições da morena.
— Porque não negaria ficar perto de um anjo-demônio
gostoso pra caralho. — Ela pisca. Direta. Admiro isso, sem rodeios.
Ela é linda e está também gostosa pra caralho com este
macacão vermelho apertado nas coxas revelando suas curvas
torneadas e a bunda.
Cara! Que bunda…
Eu fiquei a noite toda imaginando como seria apertar na
junção entre a coxa e o quadril, afundando meus dedos na carne
macia.
Ela é linda… e sabe disso.
O lance de ter meus valores quanto à virgindade não
significa castidade absoluta.
Sim. Sou o último cara popular virgem da espécie, ou único.
Acredite! Ou não… pois nem minha mãe acredita.
Foda-se.
Posso chegar até a segunda base hoje com a morena, só
preciso mantê-la com as mãos para si. Se a química for boa, o que
não duvido, quem sabe outro dia não avançamos um pouco mais?
Sorrio torto e retiro minha meia máscara que ainda estava
em meu rosto sobre os olhos.
— Anjinho… — ela lambe os lábios, — eu já sabia que você
era um espetáculo, mas assim… assim é irresistível — diz,
enquanto caminha para mim e enlaça meu pescoço com ambas as
mãos.
Desço meu rosto e roço o nariz em sua bochecha, exalando
seu perfume adocicado. Deslizo até seus lábios carnudos e seguro
sua nuca, posicionando sua cabeça para conduzi-la num beijo
suave. Ela avança já querendo tocar minha língua e eu a paro,
saboreando as fibras de sua boca, sugando vagarosamente.
Brina se contorce em meus braços querendo aumentar o
contato. Eu a seguro, e ela rosna. Sinto-me domando uma fera.
Pressiono-a junto do meu peito, mantendo-a imóvel e, antes
de invadir sua boca, vou até a curva de seu pescoço, depositando
beijos molhados, arrastando a língua e assoprando a pele quente.
Novamente, ela tenta se libertar e quando percebe ser em
vão, aproveita a pressão que faço entre nossos corpos e aninha sua
boceta em uma das minhas coxas, friccionando seu centro para
cima e para baixo. Porra de mulher! Se não dou o que quer, ela
toma.
Volto para sua boca mantendo a pequena tortura e puxo seu
lábio inferior entre os dentes. A morena arfa, não sei se derrotada
ou por tesão mesmo. Encaro seus olhos escuros como a noite e me
perco na devassidão que transborda deles. Ela é puro desejo e seu
corpo o paraíso da luxúria.
Fecho seus olhos com as pontas dos dedos e finalmente
invado sua boca com minha língua. Ela geme e me recebe com
lambidas e chupões em meus lábios. Deixo-a conduzir o beijo que
tanto quer para conhecer seus movimentos e estudar mais quem é
Brina Heinz, a garota petulante e sem medo.
Sua boca assume um frenesi e o vulcão que existe dentro
dessa mulher parece entrar em erupção conforme ela chupa e roça
sua língua na minha, mantendo um ritmo ensandecido do quadril
que sobe e desce em minha coxa. Sinto o calor de sua boceta
mesmo entre os tecidos de nossas roupas.
Levo minhas mãos ao seu quadril e afundando meus dedos
na carne de sua bunda deliciosa, ajudo-a no movimento, esfregando
sua feminilidade apenas em uma das minhas pernas. Meu pau
esperneia em minha cueca com a cabeça melada que raspa em
meu abdômen enquanto conduzo Brina até sua liberação.
Ela se perde em minha boca, então retomo o controle que
havia lhe dado, beijando-a de volta com a mesma voracidade que se
esfrega em mim.
— Me leve para algum lugar… — ela diz em meus lábios.
Tento retomá-los, mas ela insiste e fala arfante: — Me leve para
algum lugar e me fode, Wil. Eu quero você dentro de mim.
É o estopim para meu senso retornar ao meu cérebro,
ausente de sangue. Não… não queria que acabasse.
Reduzo o ritmo dos nossos corpos e cedo o aperto que
meus dedos estavam em sua bunda, olho para seus lábios inchados
e molhados.
Por que ela foi pedir isso? E justo agora que estava tão
bom.
Ela é tempestuosa e interessante. Eu queria mais de Brina.
Contudo, ela quer algo que não é dela.
Poderia ser…
Poderia?
Pelo que ouço a seu respeito, ela não quer um
relacionamento sério.
A morena é uma mulher linda e gostosa que qualquer
homem gostaria de foder.
Mas, eu… eu não.
Eu quero… eu quero alguém para dividir mais que apenas
fluidos por uma noite. Eu quero alguém que me queira por quem eu
sou e não por aquilo que eu tenho por fora, como seria, agora, o
caso de Brina, muito menos por quem só me olha pelo sobrenome
que carrego.
Meu corpo berra procurando seu contato. Porém, minha
mente me empurra para longe. Ela não quer o que posso dar e não
posso entregar o que guardo para mim. Só um oral é pouco para
ela.
Eu não estou guardando minha virgindade para alguém. Eu
estou guardando minha primeira vez para acontecer quando eu
quiser e estiver com a pessoa certa. Não para ser um rompante de
uma noite.
Não.
— Não… — sussurro e balanço a cabeça negativamente
num movimento sutil.
Brina se retesa em meus braços.
— Não, você não quer ir para algum lugar? É isso? — Ela
tenta sorrir.
— Não… eu não vou foder você — respondo, liberando-a de
vez de mim.
— Ma-mas você tá de pau duro, Wil. Você me quer. Eu
senti. — ela justifica apontando para minha virilha, com uma
expressão incrédula.
— Eu não disse que não te desejo, Brina. Eu disse que não
vou te foder. São coisas diferentes. — Agacho para pegar minha
máscara.
— Você me deseja, mas não quer me foder? Isso não tem
lógica — ela soa indignada.
Merda. Agora vem a parte que ficará ofendida, me xinga e
provavelmente espalhará boatos que sou gay.
Pressiono minhas têmporas com um amargor novo para
mim. Eu não quero que isso aconteça entre nós.
Não com ela.
Volto-me para a morena, e observo o rosto lindo, desenhado
como uma pintura. Brina possui luz própria e eu gostaria de
conhecê-la mais. Sua impetuosidade e seu toque voraz ocasionou
uma emoção diferente em meu peito. Ela não… penso.
Porém, sua atitude demonstra o mesmo estado de espírito
de todas as outras.
Droga.
Elas não entendem. Ninguém entende.
Brina empurra meu peito e deixo o impulso fazer meu corpo
cambalear para trás. É sempre assim. Eu não me oponho, pois,
assim sinto que as ajudo a controlar um pouco a raiva que sentem
de mim.
Não rejeito as garotas. Pelo contrário, eu as beijo e gosto do
toque até certo limite. O que nunca é suficiente.
Brina rodopia e caminha alguns passos para longe, mas
para. Ela vira o corpo para mim e me fita com um olhar ávido.
— Por que você não quer me foder, Will?
— Você não entenderia — devolvo, mirando o chão.
— Tente.
Bufo resignado e chuto uma pedra invisível, colocando as
mãos nos bolsos das calças.
— Eu não quero alguém só por uma noite. Eu quero mais.
— Ergo a cabeça para encará-la. — Não me vejo fodendo alguém
pra depois não ser mais nada para a pessoa.
Ela leva uma mão ao queixo em posição de pensadora,
enquanto que a outra circula sua cintura. Brina me estuda como se
eu fosse um animal raro.
Em dois passos já está próxima a mim como um felino
espreitando sua caça. O lance aqui era para ela ser a caça, lembra?
Afasto-me um pouco, mas ela me surpreende levando uma
mão ao meu rosto e acariciando com as pontas dos dedos.
— Isso é lindo, Will. E eu respeito. — Sua voz não é mais
agressiva.
— Obrigado. — Sai fácil.
Será que teríamos uma chance de nos conhecer?
— Só que neste exato momento estou puta da vida com
você porque essa sua ideia é um empata foda do caralho. Cara, eu
quase gozei! — reclama.
— Podemos continuar de onde paramos, só não até o fim.
— pontuo, enlaçando sua cintura.
— Melhor não anjinho, se continuar não vou parar. — baixo
meu olhar e ela segura meu rosto. — Ei… tá tudo bem. Vou levar
esta bocetinha aqui para o vibra dela. Só me ajuda a encontrar o
melhor caminho para voltar. — Brina sorri.
Um sorriso verdadeiro sem raiva, sem rancor, sem sentir-se
rejeitada.
Acabei sendo ingênuo demais nesta interação. Claro que a
rainha da petulância jamais se sentiria rejeitada. Uma sensação
estranha de ter meu estômago subindo e descendo em meu torso
somatiza com a euforia por ainda tê-la em meus braços.
Assinto com a cabeça e pego sua mão, entrelaçando nossos
dedos, conduzindo-a para fora da floresta.
Essa morena acabou de ficar ainda mais interessante. A
vontade de experimentar mais do seu corpo me entorpece, fazendo-
me querer pela primeira vez seguir adiante.
O problema será descobrir se Brina terá paciência e se
contentará com aquilo que posso dar.
Dou dois passos para o centro do corredor, tentando lembrar o
que estou esquecendo. Estou com aquela sensação que deixei algo
para trás, e que quase peguei, mas não… a sensação de que algo
está faltando permanece.
Droga!
Nessas horas, não estar no mesmo quarto que Elisa me faz
falta. Ela conhece meu complexo de Dory e por isso vive atenta aos
meus assuntos para que esta maldita sensação não me persiga por
toda a manhã.
Odeio o sentimento de perda que me invade sempre que isso
acontece. Tenho a necessidade de levar a mão ao peito e controlar
minha ansiedade. Não gosto de perder qualquer coisa… Inspiro e
expiro mantendo a racionalidade dos meus pensamentos.
Faço um recapitulado de tudo o que coloquei na mochila,
depois penso nas aulas que terei no decorrer do dia, e…
— Isso! — murmuro só para mim. O livro de anatomia humana
ficou embaixo da cama. Hoje tenho aula e fiquei estudando ontem
todos os ossos que temos na mão até pegar no sono. Recordo-me
da infinidade de nomes e como memorizar me deu um sono do
caralho.
Corro para a porta e abro sem jeito, indo direto para minha
cama e agachando, encontrando a obra de literatura super-
romantizada de como as falanges dos dedos se encontram. Aff!
— Esqueceu de novo alguma merda, cabeça de vento? — a
voz irritante da minha colega de quarto parece sonolenta. Não sei
por que essa imbecil continua na faculdade se nem sequer estuda.
Ela só vai a festas todo santo dia e perde mais aulas do que assiste.
Ultimamente, tenho ignorado seus comentários maldosos que
nunca me afetaram. Ela é uma patricinha que busca apenas um
belo casamento frequentando Braveton. Por isso, não perde as
gandaias que ocorrem nas fraternidades. Seu sonho de consumo é
traçar algum dos Falling Angels.
— Se parasse de cabecear tanto a bola, talvez conseguiria ter
mais memória. — reclama, e vira para o lado, puxando as cobertas
e me dando as costas.
Bufo em desaprovação e saio batendo a porta de propósito.
Suas palavras não me afetam, mas incomodam, então,
respondo à altura com barulho.
Acelero o passo já que meu atraso implicará mais um sermão
de Lisa sobre mudar meu despertador para mais cedo. E isso,
torcida, é uma questão vencida. Ela sabe. Recuso-me a despertar
antes das seis da manhã.
Não rola.
Ontem ela ficou puta por ter que correr entre os jardins,
pulando os canteiros para chegar a tempo em seu primeiro período.
Vejo-a um pouco à frente.
Merda. A cara dela não é boa.
Elisa está de braços cruzados, encostada na parede
encarando de onde venho, com um pé escorado na altura do joelho.
Prevejo o estufar do seu peito e a fala de sempre começar. Sou
mais rápida, e antes que comece, já ergo a palma da mão em sua
direção.
— Nem comece. Estou atrasada. Já sei.
— De novo — ela acusa, descruzando os braços e se
empurrando da parede para caminhar em minha direção.
— De novo… porém, a culpa é sua por não estar dividindo o
quarto comigo e sim com aquela nojenta da Eloana. Você teve que
pegar um quarto na outra ponta do prédio, porra.
— A culpa é minha, Bri? — diz, indignada. — Foi você quem
verificou a lista para os quartos e disse que havia ticado nossos
nomes. Você parou na letra ‘L’ do primeiro nome que avistou com ‘E’
ao invés de ler a palavra até o final. No caso, meu nome!
Reviro os olhos, pois sei que ela tem razão. Mas não foi por ler
o nome Eloana como sendo Elisa que fodeu. O problema foi que um
estava embaixo do outro, e as linhas da planilha eram muito juntas,
acabei ticando o número corresponde à garota dorminhoca em meu
quarto e não à minha melhor amiga.
— Eu já te expliquei sobre as letras minúsculas e a quantidade
de linhas daquela porra — praguejo, incomodada com o peso da
mochila. Resolvo colocar as alças em cada ombro para facilitar
minha locomoção, e após dou o braço para que ela enrosque o seu
e possamos ir para nossas aulas.
Não consigo imaginar caminhar ao lado de Lisa se não for
assim: de braços dados. É um hábito nosso que já rendeu boas
risadas. O que para nós é algo comum, para os outros possui uma
conotação diferenciada. Como se eu e minha melhor amiga nos
importássemos…
Estamos cagando para o mundo.
— Não importa agora, não é? Precisamos resolver isso. —
Lisa pressiona os lábios como costuma fazer quando está
elaborando um plano. — Nós podemos ver outro lugar. Não
precisamos necessariamente morar dentro do campus para estudar
aqui. Vários alunos dividem apartamentos por perto. Podemos dar
uma olhadinha no mural de avisos e ver se tem algo por lá.
Um sorriso cresce em meus lábios com a ideia fenomenal de
Elisa. Adeus memória da Dory! Hello, melhor amiga organizando
minha mochila!
— Vamos agora! — Puxo seu braço e só consigo arrastá-la
meio metro, antes que ela puxe de volta, empacando no lugar.
— Endoidou, é? Semana passada cheguei atrasada nesta aula
e foi um inferno aguentar os burburinhos dos outros alunos quando
a Sra. Hankins chamou minha atenção quanto ao horário. — Lisa
pega o celular do bolso para conferir as horas. — E hoje, prefiro
entrar de novo na prova de corrida com obstáculos do que sentir
meu rosto ferver de vergonha.
— Você ficou com vergonha foi por conta do comentário do
anjo-demônio n.° 1, vai. Admita — desafio minha amiga, que faz um
barulho engraçado de desdém com a boca. Mas depois sobe o olhar
para mim com aquele meio-sorriso.
— Você acha que ele falou sério? — pergunta, ansiosa.
— Qual parte? Aquela que passaria a te pegar todos os dias
se quisesse — levanto um dedo contando —, ou aquela de te
chamar pra sair?
— Ele fez uma brincadeira… acho. — Lisa chuta uma pedra
que estava na calçada em que caminhávamos. — Desde quando é
legal dizer que irá me castigar se eu também me atrasar em nosso
primeiro encontro? Isso lá é jeito de chamar uma garota pra sair?
— Se ele curtir BDSM, talvez… — Vejo minha amiga virar
rapidamente o pescoço para mim com uma expressão
amedrontada. Não aguento e solto uma gargalhada. — Ai, Lisa, sua
cara não tem preço. — Rio mais alto e chego até a enxugar uma
lágrima.
Minha amiga me empurra rindo também.
— Preciso correr, Bri. — Ela sorri e se solta de mim. — Se ele
me pedir direito, posso pensar. — Lisa aponta um dedo com uma
piscadela em seguida.
— Se joga, amiga. O cara é gato e pela fama que ouvimos
apenas esta semana de aula, parece que vale à pena o risco de ser
amarrada. — Elisa arremessa um galho em mim, errando a pontaria,
já que está do outro lado da calçada.
Eu continuo rindo.
— Te amo, amiga!
— Também te amo, Lisa. — respondo.

— Puta merda! Essa bagaça tinha que ser tão grande? —


exclamo, mirando o quadro de avisos gigantesco que fica próximo
ao refeitório. O negócio é uma lousa gigante de cortiça que ocupa
praticamente a lateral inteira do prédio.
— Eles quiseram ocupar bem o espaço — Lisa zomba.
— Porra! — reclamo, indicando com um gesto de mão. —
Metade já era suficiente. E com certeza algum doido coloca o
mesmo aviso mais de uma vez. — Pego um dos panfletos que
indicam o evento de uma instituição beneficente.
— Vamos fazer assim, você começa daquele lado e eu deste,
se encontrar alguma coisa, grita que vou até você e vice-versa —
Elisa articula o plano.
— Por que mesmo eu tenho que caminhar tudo isso até lá
enquanto você começa daqui? — Ergo uma sobrancelha em
questionamento.
— Porque você é a atleta com pernas de atacante e corre
melhor do que eu — ela responde, subindo e descendo os cílios
com a cara de boneca. — Anda logo, vai. — Me empurra
gesticulando para eu continuar até o outro lado.
Ela não está mentindo que sou melhor na corrida. Hoje é o
primeiro dia de treino com a equipe e estou ansiosa para voltar a
jogar. Sentir a adrenalina da corrida, cumulada com as artimanhas
dos dribles e capturas da bola até o gol adversário, proporcionam a
melhor forma de ganhar doses de serotonina para mim.
É algo que completa e preenche minha vida com um propósito.
Ter o desafio diário, em cada chute, em cada jogo. Nossa! Sinto
uma comichão percorrer meu corpo, pressionando cada músculo
pela ansiedade.
Sou completamente viciada em futebol, e mesmo sendo um
esporte e não uma droga ilícita, meu pai faz questão em desaprovar
o escape que tenho de toda merda que ele me fez viver.
Balanço a cabeça alinhando meus pensamentos para encarar
o quadro à minha frente. Agora não é o momento para lembrar-me
do meu pai e minhas inseguranças.
— Vamos ver… vamos ver — cochicho, observando os avisos
rabiscados em folhas de caderno, outros mais elaborados em
cartolinas, diversos panfletos que misturam as cores e dão um
impacto de poluição visual aos meus olhos. Aff…
Olho Elisa e percebo que está fazendo os mesmo movimentos
do outro lado, direcionando-se ao centro. Ouço burburinhos de
outros alunos se aproximando, e passo a ir mais rápido, com medo
que o lugar especial que nos aguarda fora do campus possa ser
alcançado por outras garotas.
— O que tanto procura, linda? — a voz máscula e aveluda soa
um pouco distante, mas com nitidez em cada palavra. Viro a cabeça
para Lisa e vejo seu crush muito próximo a ela.
Minha amiga que estava curvada vendo um dos panfletos
endireita-se num pulo.
— Caralho! Que susto! — Ela eleva uma mão ao peito.
A cena parece aquelas de cinema, então paro no automático
minha procura, encosto o ombro no quadro, cruzando os braços e
assisto de camarote o flerte entre o anjo-demônio líder e sua presa,
no caso, Elisa Vough, vulgo minha melhor amiga.
Eu sei que não há qualquer mecha de cabelo solta caindo no
rosto de Lisa, já que hoje ela fez um rabicó no topo da cabeça,
dando um ar até infantil para seu corte Chanel de franjinha, mesmo
assim, Alec leva sua mão e faz o caminho perfeito como se
colocasse alguns fios atrás de sua orelha.
Até eu suspiro.
Cara! Preciso transar com urgência.
O homem espetacular com o corpo desenhado na camiseta
preta concentra toda sua atenção no rosto de minha amiga. Percebo
seu leve gingado de quadril, trocando o peso de uma perna para a
outra, e sei que está nervosa. Eu poderia ir até lá para tirá-la da
saia-justa, mas estou me divertindo muito para me dar ao trabalho.
— E-estou procurando um quarto para alugar e sair do
alojamento — Lisa responde com a voz trêmula.
Amiga, você é mais confiante do que isso. O que esse sujeito
faz contigo?
— Hum… — Ele volta sua atenção para frente e passa a
analisar os panfletos, numa demonstração de auxílio a ela.
Que bonitinho! O demônio sabe ser fofo.
— Aqui. — Alec puxa um folheto e entrega para Lisa que
assume uma postura diferente agora. Ela está analisando o que
contém com um franzir de sobrancelhas. — Uma das garotas é
conhecida de infância. Sei que alugaram um lugar legal perto do
campus.
Como que sentindo meu olhar, Lisa faz um aceno de mão para
eu ir até lá, com os olhos fixos no anúncio.
Solto uma respiração pesada e sigo para me juntar a eles.
Assim que os alcanço, minha amiga estende o panfleto para
que eu também analise. O conteúdo é simples apenas com a frase
“aluga-se quartos para garotas”, o endereço e telefone para contato.
— Essas meninas se parecem com aquelas que vivem coladas
em você, Demônio? — questiono e percebo sua surpresa com o
apelido que saiu facilmente. Passado a primeira impressão, o
bonitão não se intimida e apenas sorri enviesado.
— Anda me observando, Brina Heinz? — devolve irônico.
Então, ele já sabe meu nome… Droga. Por consequência, já sabe
de quem sou filha.
— Impossível não ver tantos urubus em volta da carniça,
Winston — replico no mesmo tom, jogando o quadril para o lado e
colocando a mão na cintura assumindo minha posição de ataque a
babacas.
Ele desvia o olhar para o lado, seguido de um balançar de
cabeça e um riso sem graça. O anjo-demônio parece que não quer
comprar briga com a filhinha do advogado filha da puta do seu pai.
Poucas pessoas sabem que meu queridíssimo ente paterno
trabalha para os Winston, mas com esta provocação vejo que não é
o caso do primogênito.
— Não. Elas não são como os urubus. São garotas… legais.
— Demora um pouco para encontrar o elogio adequado. Ele parece
sincero, por isso volto a dar uma segunda olhada no endereço do
ap.
— É perto, Lisa. E se for o prédio que estou pensando, o Apê
deve ser habitável. — dirijo-me à minha amiga. Ela já pega o celular
e antes que comece a digitar o telefone do panfleto, Alec retira o
aparelho de sua mão. Lisa solta um grunhido e avança contra ele,
agarrando seu braço.
— Calma, baby. Eu sei o telefone da baixinha, já vou digitar
pra você. — ele justifica o furto do telefone, e ouço sua risada pela
brincadeira. Lisa continua tentando pegar, dando pulos em suas
costas. A situação é tão hilária que não consigo me mover.
Já disse o quanto é divertido assisti-los? Não? Então…
— Pronto! — Ele se esquiva de um tapa no ombro, pegando a
mão de Lisa no ar e levando à sua boca. Escuto o som estrangulado
que minha amiga tenta prender na garganta. Ela só tenta. Foi pega
de surpresa com o ato.
Eu também fui. Se eu poderia defender Elisa e ajudá-la na
busca do celular? Óbvio que sim. Mas pra que eu iria atrapalhar o
flerte de minha amiga. Tenho certeza que está afim do cara.
— Não faça mais isso. — Ela puxa o celular, emburrada.
— Você é ainda mais linda bravinha. — ele segura o queixo de
minha amiga e seu corpo estremece.
É… ela realmente está afim dele.
— Não gosto que mexam nas minhas coisas — Lisa diz
baixinho, já que o anjo-demônio aproximou o rosto bem ao lado do
seu, dizendo algo ao pé do seu ouvido.
Já percebeu que estou de coadjuvante aqui, né?
Eu sei que estou. Mas se as cenas se desenrolarem e eu
puder assistir um belo pornô, pego até os óculos 3D.
— Aproveitei e mandei uma mensagem do seu pra mim. Assim
fica mais fácil pra marcar nosso encontro. — E é isso, galera! Alec
Winston chegou à grande área, driblou o artilheiro, e o goleiro nem
viu a bola passar abaixo do travessão.
Ele beija sua bochecha com aquele sorriso cheio de má
intenção, acena para mim e se afasta, deixando minha amiga sem
reação.
— Hum… que tal ligar para essa baixinha, hein? — digo,
seguindo o olhar de Lisa que ainda perfura as costas do Falling
Angel n.° 1.
— Acho uma ótima ideia — responde, sem nem sequer olhar
para o celular.
— Vocês são calouras? — A garota, cujo apelido ‘baixinha’ faz
jus, nos encara de uma poltrona com uma caneta e um bloco de
notas, e sua outra colega de quarto, tão pequena quanto ela,
sentada ao lado em um banco de madeira. Eu e Lisa estamos
sentadas no sofá da sala logo à frente. Estou me sentindo em uma
entrevista de emprego.
— Somos. Meu nome é Elisa Vough e esta é Brina Heinz.
Estamos nos dormitórios, mas pensávamos que ficaríamos juntas
no quarto. Só que minha amiga, errou o formulário e acabamos
separadas. Por isso começamos a procurar um lugar para alugar.
Elas emitem um sonoro “hum” em compreensão.
— E o que pretendem estudar? — agora a pergunta vem do
outro ser miniatura. Ela é tão fofa naquele agasalho imenso, que dá
vontade de apertar. Parece um bichinho delicado com olhar
amedrontado.
— Eu pretendo estudar Educação Física, então minhas aulas
são mais na área de ciências biológicas, já Lisa está em dúvida. Eu
sei que ela seguirá algo voltado mais à humanas. Ela ama uma aula
de filosofia. — Elisa aperta meu joelho e sussurra um “para”
entredentes. Não contive o grau da piada, oras.
Depois que Alec deu aquele bote e conseguiu pegar seu
número, de ontem pra hoje, minha amiga só digita mensagens
naquela porra. Eu tenho me divertido horrores com alguns dos
sexting que consigo ler sobre seu ombro.
O cara além de habilidoso é criativo.
Agora estamos aqui numa entrevista com a colega de infância
do cara que quer comer minha amiga para alugar não um, mais dois
quartos neste Apê. O fato de cada uma ter um quarto para si, nos
deixou ainda mais interessadas. Eu moraria aqui fácil.
— Vocês gostam de festas? — Aline indaga animada. Acho
que temos uma festeira por aqui.
— Eu vou quando Bri me arrasta. Mas ela curte muito — Lisa
responde. O duro é que é verdade. Vira e mexe tenho que fazer
chantagens para Lisa sair comigo. O bom é que sou a rainha do
drama.
A loirinha parece animada. Já a bonequinha de moletom revira
os olhos. Ela tem uma carinha de nerd numa versão em miniatura.
Debby! Minha consciência me recrimina para chamá-la pelo nome.
— Suas aulas são mais de manhã ou à tarde? — Debby
pergunta. — Eu gosto de silêncio pra estudar.
— Tanto faz. Não somos de fazer barulho, se seu medo é
alguém te atrapalhar a estudar.
— E quanto à limpeza? Aqui temos uma rotina, vocês
entrariam no nosso esquema? — Aline parece ansiosa.
— Isso é com Lisa. Ela é a louca da faxina. Se depender dela,
este Apê será limpo todo dia. — Minha amiga me olha agora com
aprovação.
É… mandei bem agora, né?
— Tudo bem… nós vamos entrevistar só mais algumas
meninas que também querem rachar o apartamento, e daremos a
resposta até amanhã, ok? — a baixinha informa e anota algo em
seu caderninho.
Levantamo-nos num impulso juntas do sofá, e respondemos
com outro ok em conjunto, indo embora esperançosas para que
nossa primeira entrevista dê certo. Não é nenhum estágio nem
nada… porém, foi a primeira vez que tanto eu quanto Lisa
passamos por algo assim.
Caminhamos pela calçada, de volta ao campus já que
resolvemos fazer o percurso a pé para ver a distância do
apartamento até Braveton.
— Este Apê é perfeito, Bri. Teríamos um quarto pra cada e o
valor não é um absurdo.
Eu cansei de falar para Lisa não se preocupar com isso. Por
mais que meu pai não tem me ajudado, eu consegui uma bolsa
integral e meus avós me deixaram um fundo para ser usado
justamente em casos de emergência.
O bom é que a emergência da família Heinz pode me deixar
tranquila por alguns anos durante o período de faculdade, após e
acho que até na minha velhice. Contudo, o fato do meu pai ser o
oposto do seu a faz pensar que estou desamparada.
Estou. Não como ela pensa, mas estou.
Meu desamparo é emocional. Mesmo papai sendo sempre frio,
nunca me acostumei com sua indiferença. Afinal, ele é meu pai.
Minha mãe e minha irmã ficam apenas vagando em meus sonhos.
Muitas vezes sonhei com a família perfeita, minha irmã,
mamãe, papai e eu fazendo piquenique em nosso jardim como
vemos nos filmes.
Minha carência é tão latente que meu subconsciente chegou a
montar imagens e situações que nunca vivi. Só para me sentir
amada, mesmo que fosse na dimensão dos sonhos.
— Você sabe que meu pai não me mandar dinheiro e ameaçar
me deserdar não faz diferença pra mim, né? — friso. — Ele não faz
ideia do fundo, Lisa. E acha que seu dinheiro me faz falta. Não faz.
— Certeza que o que tem é suficiente? — Ela me olha com
cuidado. — Bri, você sabe que…
Interrompo-a levantando uma mão.
— Amiga, meus avós conheciam o próprio filho. — Respiro
fundo e puxo seu braço para que possamos continuar a caminhada.
— Eles deixaram uma boa grana para a sobrevivência da única
neta. Não esquenta.
Acredito que o valor em si equivale a um terço da herança que
deixaram para papai. Eles sabiam da indiferença com a qual eu era
tratada e provavelmente ficaram com medo que Dr. Heinz me
deixasse desamparada no futuro.
Obrigada, avós! Vocês acertaram!
Tudo bem que houve uma condição para que eu recebesse a
ajuda do meu pai em seguir seus passos buscando o curso de
Direito e não Educação Física. Contudo, eu sabia que mesmo sendo
a melhor advogada do planeta, jamais seria suficiente para meu pai.
Então, pra que tentar ser algo que não sou, ao invés de lutar
para a minha melhor versão, hum?
Brina Heinz sendo a titular do time de futebol e futura
treinadora é a imagem do meu futuro feliz, onde meu pai poderia
sentar-se na primeira fila caso me aceitasse como sou.
— Se você diz que está tudo bem, então ok. — Lisa agora sorri
e aperta meu braço. — Vamos torcer para sermos as escolhidas! —
ela diz a última palavra cantarolando.
— Nós seremos, amiga! — Estufo o peito como costumo fazer,
expondo minha autoconfiança. Algo que aprendi a duras penas,
posto que o fato de papai me ignorar e diminuir fez com que minhas
batalhas fossem árduas.
Aprendi a vencer e colher a aprovação dos rostos que
realmente me importavam. Infelizmente, o do meu pai saiu da
fotografia há tempos.
Você consegue Brina. É só manter a voz baixa e fazer o
pedido. Preciso aproveitar o pequeno momento do café da manhã,
pois sei que não o verei mais durante o dia.
Encaro minha omelete posicionando os talhares e costas
eretas como ele sempre exigiu, tentando não fazer qualquer ruído
com minha respiração. Papai virou a última página do jornal, logo irá
levantar-se e pronunciar um “tchau” seco antes de sair para o
trabalho.
É agora ou nunca. Limpo a garganta, para chamar sua
atenção.
— Papai, posso dormir na casa de Elisa hoje?
Meu pai demora mais que o normal para dobrar o caderno de
notícias. Ele, primeiro, come uma fatia de seu mamão para
finalmente me responder. Prendo o ar na última lufada apreensiva.
— Os pais de sua amiga autorizaram?
Balanço a cabeça em afirmativo.
— Então pode ir e não crie problemas.
Solto o ar e procuro conter a vibração das minhas cordas
vocais que querem liberar um gritinho de alegria.
Não demora para que Sr. Heinz se levante e desta vez nem a
despedida costumeira ele pronuncia, apenas me deixa sozinha
terminando o desjejum.
A data de hoje não é nada comemorativa para ele. Na
verdade, é o ápice do mau humor de meu pai no ano inteiro. Há
exatamente 14 anos minha mãe e irmã morreram em um acidente
de carro, ocasionado por um caminhoneiro bêbado.
E hoje, por uma nada coincidência trágica também é meu
aniversário.
Dá pra imaginar quantas vezes meu pai comemorou comigo,
não?
Pois é…
Se não fosse pelos pais de Elisa, minha melhor amiga, eu nem
saberia o que isso significa. Sr. e Sra. Vough quando souberam que
meu aniversário costumava ser uma data como outra qualquer,
passaram a me presentear sempre com um bolo e a presença de
alguns amigos em sua casa.
Soprei minha primeira velinha com oito anos, no ano em que
conheci Elisa.
Não julgo meu pai. Este dia para ele é doloroso demais.
Perdeu sua esposa, que todos diziam ser apaixonado e sua melhor
versão de filha.
Minha irmã Cristine tinha nove anos e não sobreviveu ao
impacto. Uma tragédia. E por algum milagre, os paramédicos
conseguiram me salvar. Mamãe estava grávida de sete meses, ela
permaneceu neste mundo para que eu nascesse com vida.
Fiquei em uma incubadora por dois meses até que nossa
governanta, Sra. Cassandra, recebesse a autorização de meu pai
para me levar para casa. Ele nem sequer foi me buscar.
Por consequência, minha presença para papai era a imagem
viva que mamãe e Cristine estavam mortas.
Quando chegou a época de ir à escola, meu pai passou a ser
mais assíduo em meu cotidiano. Seu interesse consistia em
questionar sobre meu aprendizado.
Tenho a lembrança perfeita do dia em que fiz um desenho
lindo de nossa família, ele, mamãe, Cristine mais alta de mãos
dadas comigo.
Desenhei os cabelos ondulados de mamãe, e pintei os olhos
verdes de Cristine que via nas fotos. Sra. Heinz era uma morena
linda, afrodescendente, com a pele de um tom mais escuro que a
minha e de minha irmã, já que papai mantém os traços de sua
descendência alemã, com cabelos loiros e olhos azuis
acinzentados.
Cristine possuía cabelos ondulados e olhos verdes, diferentes
dos meus cachos perfeitos e olhos cor de mel. Todos diziam o
quanto a mistura de meus pais resultou em duas belezas exóticas.
Papai sorria com o elogio até o momento que a pessoa virasse
as costas, para se fechar em seu próprio mundo.
Tentei transmitir naquele desenho o meu desejo em ter uma
família normal. Uma família com amor. Queria que meu pai
soubesse que compartilhava do seu sofrimento. Queria deixá-lo
feliz.
Dr. Heinz mirou o papel com desdém, chacoalhou-o no ar e
disse que o desenho era grosseiro, que Cristine desenhava melhor
e pintava melhor. A seguir rasgou em quatro partes e jogou no lixo
ao lado de sua mesa do escritório.
Esperei que ele saísse para resgatar meu desenho. Cassandra
me ajudou a emendá-lo com fita adesiva, enquanto enxugava
minhas lágrimas.
Sentia-me culpada por ter sobrevivido e o restante de minha
família não. Eu queria compensar meu pai de alguma forma. Então,
passei a batalhar para sempre ser a melhor da classe e em tudo que
pudesse chamar sua atenção.
Se ouvisse qualquer detalhe que minha irmã fazia, eu buscava
ser igual. Ela fez aulas de piano. Então, pedi para ser matriculada
em uma escola de música, e aos sete anos tocava a sinfonia de
Beethoven decorada.
Ela dançava ballet como uma pluma. Por mais que eu
detestasse os movimentos delicados passei a ser uma das mais
requisitadas bailarinas para as apresentações da escola de dança.
Quando meu pai me levava em algum evento do seu trabalho,
eu permanecia sentada como uma boneca à mesa, mesmo tendo
uma vontade imensa de brincar com as outras crianças que corriam
pelos jardins. Eu queria ser perfeita.
Porém, Dr. Heinz nunca dirigiu um elogio a mim. Se alguém
dizia como meu cabelo era bonito, meu pai afirmava em seguida
que não diria isso se conhecesse Cristine.
Eu ficava ansiosa quando ele ia verificar minhas notas na
escola, querendo sentir o mínimo de aprovação por tirar notas
máximas em todas as matérias, inclusive quando estava no 6º ano.
Cristine não poderia ter tirado notas melhores, primeiro porque
eu consegui pontuação máxima em todas as disciplinas, e segundo
porque sua morte prematura não deixou que ela estudasse esse
ano.
Papai apenas verificou o pedaço de papel que lhe exibi,
assinou e me devolveu, sem dar uma palavra.
Eu poderia ser a melhor em tudo. Para Dr. Heinz, eu nunca
seria suficiente. Minha vida sempre seria a memória viva de que sua
esposa e filha amada não estavam mais aqui.
Naquela semana fomos convidados para o aniversário de meu
primo Mike, filho da tia Aurora, irmã de mamãe. Ele é um ano mais
velho, mas sempre me tratou muito bem. A festa aconteceu na parte
externa da casa, junto aos jardins. Meus tios viviam muito bem, em
uma das casas grandes próximas à nossa.
Como Mike e seus dois irmãos mais velhos gostavam de
esportes, meu tio montou uma área com diversos tipos de quadra,
incluindo um campo gramado muito bonito.
Durante essas festas, meus primos me arrastavam para junto
deles e eu me permitia ser um pouco criança, participando como
uma boa torcedora nas arquibancadas improvisadas que eles
faziam colocando algumas cadeiras para outros assistirem aos
jogos. Eu gostava… e gostava mais quando as partidas eram de
futebol.
Ficava imaginando como seria ter o controle da bola, e nas
passadas ágeis que poderia impor em uma jogada ou outra imitando
alguns passos de ballet para ultrapassar os adversários até a rede
do gol. Minhas mãos suavam todas as vezes com a ansiedade e
angústia por querer tanto dominar a bola, que muitas vezes eu me
levantava instintivamente.
E naquela semana, com o coração mais uma vez partido por
meu pai, deixei a euforia tomar conta. Em uma passada errada de
Klaus, irmão mais velho de Mike, a bola veio até a linha tão próxima
ao meu pé. Cheguei a salivar de emoção. Então, antes mesmo que
meu primo me alcançasse, chutei a bola para dentro do campo num
movimento de chapéu que vi tantas vezes na TV, rodopiei nas
costas de Klaus e segui com a bola no pé em direção ao gol.
Não demorou muito para meu rompante ser aceito por meus
familiares em campo com belos sorrisos para mim, e a equipe
adversária de Mike, já que claro eu fazia parte de seu time, vinha
atrás de mim, tentando roubar a bola. Percebi que as aulas de ballet
foram mais que perfeitos treinos e amaciaram meus pés para saber
articular os movimentos do peito e laterais para que conseguisse me
locomover em conduzir o objeto redondo ao seu destino.
Alcancei o gol sem sentir nenhum deles próximos a mim, e
chutei com o peito do pé formando o ângulo exato para cair na
lateral contrária que o goleiro havia se jogado.
Tudo parou.
As linhas da rede movimentaram-se em câmera lenta à minha
frente. A expressão incrédula do goleiro, olhando na direção que a
bola entrou, meu corpo começou a receber uma onda elétrica por
todas minhas terminações nervosas. Foi mágico.
Levei as mãos à boca quando me dei conta do que havia feito.
Não tive muito tempo de raciocinar, pois Mike me ergueu de súbito e
comemorou, entusiasmado demais, enquanto que seus outros
irmãos e amigos do time adversário diziam que meu gol não era
válido.
Mike gritou dizendo que era seu aniversário, e que se eu quis
lhe dar um gol de presente, eles teriam que conviver com isso.
Suas palavras seguintes foram gravadas como brasa em meu
coração, “você é a melhor atacante que já vi, prima”.
Finalmente, eu era a melhor em alguma coisa.
Assim que Mike me colocou no chão, olhei para trás e vi o
olhar de desaprovação estampado de meu pai. Como os demais
convidados que assistiram ao meu pequeno espetáculo passaram a
me elogiar, sua feição mudou rapidamente para o sorriso falso que
eu conhecia bem.
Meus primos ficaram tão empolgados que começaram a
discutir em que time eu jogaria as próximas partidas. Eu me sentia
aceita e feliz, de certa forma um pedaço de mim era preenchido.
Mike e alguns amigos jogavam toda semana e mais que depressa
meu primo me deu o compromisso de estar presente e naquela
semana iria falar com o treinador para mim.
Ele acabou traçando toda minha carreira de jogadora
profissional, sendo que eu havia acabado de jogar pela primeira vez.
Eu apenas ria de sua euforia.
Pensei que a ideia em participar de um time e conviver com
outras garotas seria interessante até mesmo para meu currículo
como atividade extra. Meu pai não poderia negar que isso me
ajudaria a longo prazo, não?
Eu não sabia, só quis ter argumentos para a conversa que viria
após a festa.
E sim, após a insistência de meus tios e primos, meu pai
aceitou que eu praticasse meu esporte favorito.
Hoje, aos 14 anos, sou atacante titular do colégio, mal entrei
no primeiro ano do ensino médio e a treinadora me colocou no time.
Além de treinar para os jogos da escola, ainda mantenho
minha rotina semanal com Mike às quartas-feiras, dando uma
lavada nos seus amigos que teimam em me desafiar todas as
vezes.
E hoje essa é a ideia.
Tenho o jogo que dá início ao campeonato regional e depois
vamos direto para a casa de Elisa, comemorar meu aniversário. Eu,
meus primos, minha melhor amiga e as pessoas que escolhi para
mim. A família que me felicita pelo meu nascimento com vida.

Se pudesse, teria desligado meu carro no portão de entrada de


casa e empurrado até a garagem para que meu pai não me ouvisse
chegar. Quando cogitei a ideia, minhas pernas que já sofreram todo
esforço físico possível durante o dia gritaram por “socorro”. Então,
desisti.
Estamos às vésperas das finais e a treinadora River entendeu
por bem triplicar a carga de exercícios… justo hoje.
Cassandra, a mulher mais fofa que pude ter dentro desta casa,
mandou uma mensagem de texto dizendo que meu pai me
aguardava em seu escritório e que sua expressão não era das
melhores.
Mas, quando é?
Elisa tinha dito que recebera algumas das cartas de aprovação
da faculdade no correr da semana. Eu também recebi.
Inscrevi-me em diversas universidades. Na maioria dos
cadastros destaquei minha vocação para oratória e disciplinas em
humanas, o que orientaria meu currículo para se enquadrar à
faculdade de Direito.
Eu só não mantive o mesmo cadastro para a faculdade onde
eu realmente quero ir. Essa eu fiz questão de colocar minhas reais
aptidões e vocação para o esporte.
Por mérito meu, sabia da possibilidade de uma eventual bolsa
de estudos. Como papai viu as informações que preenchi para as
faculdades por ele eleitas, não verificou o que realmente continha
em minha solicitação para Braveton.
Papai bobinho.
Por coincidência, ou não, o mau humor de meu pai aumentou
quando abriu a minha correspondência nesta tarde, o que tudo
indica ser a carta de aprovação de Braveton.
Elisa chegou a sua casa antes de mim e fez questão de me
ligar aos berros de alegria por sua aprovação na universidade que
nós duas sonhamos em estudar.
E cá estou eu, na frente do escritório de meu pai, invocando a
paz interior que não tenho para encarar Senhor Heinz em seu
esplendor.
Espero por este embate há muito tempo. Ensaiei todas as falas
para persuadir papai. Espero que o curso de oratória sirva para
alguma coisa afinal.
Respiro fundo e entro no covil da cobra.
Meu pai nem sequer levanta os olhos em minha direção.
Percebo que suas juntas estão tensas pressionando o papel em
suas mãos, amassando a lateral.
Aproximo-me lentamente, testando as águas. Ele está se
concentrando para dar a primeira palavra.
Aguardo. Sinto o cheiro de bebida, antes que fale.
— Poderia me dizer o que é isso? — sua voz sai em um tom
ameaçador. Dou um passo à frente e coloco as mãos no encosto da
cadeira.
— Daqui parece uma folha de papel. — respondo com
deboche. Ele rosna.
Mandou mal, Brina. Não era pra começar assim.
— Não brinque comigo, Brina. Isso aqui é uma carta de
aceitação para Braveton. — Ele chacoalha o papel. — E
curiosamente as disciplinas não correspondem a nenhuma que
combinamos. — Ele irá quebrar algum dente se continuar
pressionando a mandíbula daquele jeito.
Será que digo, ou passo?
Passe, Brina!
Fecho os olhos recapitulando as frases ensaiadas e que numa
versão mais otimista parecia finalizar no resultado mais próximo do
que eu gostaria.
— Isso — aponto para o papel —, papai, é minha aprovação
para cursar as disciplinas que mais se identificam com minha grade
curricular. Seria muito mais fácil minha entrada assim.
Sr. Heinz ergue uma sobrancelha, desmanchando de leve a
cara de desaprovação.
Dura pouco.
Já tentou tapear um advogado?
E um que tem pacto com o diabo, hum? Se estou fodida?
Preciso responder?
— E você quer me convencer que após estar lá dentro irá
seguir com o nosso plano?
Nosso… Ele realmente disse nosso?
Contenho a vontade de soltar uma risada com todo meu
sarcasmo. Só pode ser brincadeira ele pensar que toda aquela
baboseira que me obrigou a escrever nas aplicações para Princeton
e Harvard tinha alguma coisa minha, não é?
— Pai, o plano é minha entrada para Braveton — concluo e
faço um esforço tremendo para manter a boca fechada. Se disser
qualquer coisa agora, vou vacilar. Ele não parece muito convencido
das minhas boas intenções.
Sr. Heinz joga o documento sobre a mesa e recosta no
espaldar de sua cadeira, com um olhar crítico.
Por favor papai, deixa por isso mesmo e nossa discussão nem
precisa começar.
— Nós dois sabemos que sua entrada em Braveton já está
garantida pelo simples sobrenome que ostenta em sua certidão de
nascimento, Brina. Sua obrigação era preencher as lacunas para
cursar as disciplinas corretas, e não essas merdas. — Ele gesticula
para o documento mais uma vez.
As merdas de disciplinas são as minhas melhores notas no
colegial. São as disciplinas que estudei e me esforcei com gosto,
pois meu futuro e independência estavam ali.
Este era meu plano de fuga, entrar para a faculdade com uma
vaga garantida no time de futebol feminino, me formar e iniciar
minha carreira de treinadora começando em colégios de ensino
médio para depois me alavancar para algo maior. Uma faculdade,
talvez?
Eu só precisava estar lá, fora do perímetro da Mansão Heinz,
por tempo suficiente para que meu pai descobrisse quando meu
fundo deixado por meus avós estivesse liberado. Minha matrícula na
faculdade é a condição que deve ser preenchida.
Meu pai poderia descobrir sobre minha mudança de curso
comigo já há alguns quilômetros de distância, onde esta sensação
de nunca ser suficiente não me alcançasse, ou pelo menos doesse
menos.
Os olhos acusadores do Senhor Heinz neste exato momento
causando-me sentimentos controversos entre culpa e raiva são os
mesmos que busquei fugir a minha vida toda. Meu corpo se aperta
por dentro, pressionando minha faringe numa leve dor aguda
seguida do reboliço em meu estômago. A vontade de chorar e
querer ser aceita por quem deveria me amar como sou causa dor
física.
Não quero chorar.
Eu já entendi há muito tempo que posso tentar ser tudo o que
meu pai impõe, e nada, absolutamente nada será suficiente. Passei
por cima de mim tantas vezes para agradá-lo, pra quê?
Para depois ouvir que minha irmã seria mil vezes melhor, ou
mesmo que não fazia mais que a obrigação. Eu nunca seria bonita o
suficiente, nunca seria delicada o suficiente, muito menos teria a
inteligência de Cristine.
Cheguei a ter raiva da irmã que não conheci, até que percebi
que minha raiva estava direcionada à pessoa errada.
Inspiro fundo e solto o ar aos poucos. Na sequência, quando a
culpa inicia o processo de se dispersar em meu sistema, deixo a
quentura da cólera se apoderar de meu peito para assumir minhas
atitudes como uma verdadeira Heinz.
— Essas merdas são as disciplinas que irei cursar em
Braveton — digo entredentes.
Papai dá um tapa no tampão da mesa, assustando-me.
— Mas não vai mesmo! — Ele levanta-se e começa a andar
em círculos. — Você entrará em contato com o reitor e dirá que se
equivocou ao preencher as matérias, e…
— Não.
Papai para abruptamente e me olha.
— Claro que vai!
— Não. Não vou. — Levanto-me e pego minha aceitação da
mesa. — E já que o senhor tomou conhecimento antecipadamente
por abrir correspondência alheia, não preciso me preocupar em
avisá-lo mais que não precisa contar comigo como futura associada
em seu escritório.
— O quê? — Se eu achava os olhos azuis de papai
expressivos, imagina quando seu rosto está assumindo pela
primeira vez uma cor tão vermelha quanto um tomate.
Não puxei nada a ele.
Meus avós paternos amavam minha mãe, nunca senti
qualquer preconceito em razão da cor de nossa pele por parte deles
nas vezes que me comparavam à sua beleza. E mamãe, pelo que
ouvi, era uma excelente advogada, nunca dependeu de qualquer
herança, mesmo tendo uma tão grande quanto a de papai.
O fundo que irei receber é o conjunto da herança de mamãe e
dos meus avós, aliás. Porém, meus avós maternos ainda estão
vivos, e por isso terei acesso apenas à herança da parte paterna.
Eles me ajudariam, caso pedisse, mas infelizmente o que não herdei
de aparência, veio em orgulho. Não quero passar por essa
humilhação. Não preciso.
— Eu não irei pagar a esta porcaria de curso, Brina Heinz. Ou
você modifica as disciplinas e esquece esta asneira, ou ficará
totalmente sem ajuda financeira.
Faço de conta que suas palavras não são estacas afundando
em meu coração e leio a carta de aceitação, dando uma atenção
especial para o último parágrafo. Alívio em não precisar do dinheiro
para a matrícula me faz sorrir.
Então, faço questão de ler em voz alta, tentando não
demonstrar minhas emoções:
— “Parabenizamos à Srta. Heinz pelo campeonato regional de
futebol feminino e esclarecemos desde já sua aceitação como titular
no time de Braveton University. Para tanto, esclarecemos que foi
aceita sua adesão em nosso sistema de bolsistas de modo integral.”
— Dobro o papel e encaro papai, que parece soltar labaredas pelas
narinas. — Acho que não vou precisar, Sr. Heinz.
— Vo-você não terá dinheiro para manter-se naquela cidade,
Brina. Uma bolsa de estudos não é suficiente para sobreviver por
anos fora de casa. Sem o meu dinheiro, você não terá nada. —
Caralho! Eu consegui fazer Sr. Heinz gaguejar?
Cadê a dona da porra toda, hum? Cadê?
Estou aqui, minha gente!
Respiro fundo e elevo o olhar encarando o azul acinzentado do
de papai com firmeza.
— Então, eu ficarei com o nada. Prefiro isso a ser um nada
para sempre. — Dou-lhe as costas, caminhando a passos largos
para longe, e fecho a porta com um baque.
Meu Deus!
Eu realmente fiz isso?
Porra! Eu fiz!
EU-FIZ!
Acabei de enfrentar meu pai assumindo quem eu realmente
sou em sua cara!
Esfrego meu rosto algumas vezes, enquanto subo as escadas.
Assim que entro em meu quarto, encosto-me a parede e deslizo até
o chão ainda em êxtase pela conquista.
Meus lábios sobem em um sorriso que aos poucos vibram com
uma risada escancarada.
Estou rindo descaradamente por finalmente lutar minha
primeira batalha, que não foi a externa com palavras para meu pai,
mas sim interna.
Sinto-me liberta das amarras de culpa que deixei papai enlaçar
em minha alma desde criança. Os risos vão diminuindo e ostento
apenas um sorriso vitorioso. Enxugo uma lágrima que escorreu pela
bochecha involuntariamente por conta da miscelânea de emoções.
Eu sou foda! Repito em minha mente como um mantra. Eu sou
realmente foda.
Meu peito está subindo e descendo acelerado. Aos poucos a
euforia se mescla com a tristeza que tenho carregado desde sempre
pela rejeição. É difícil empurrar para longe a sensação de culpa por
não corresponder às expectativas de papai, mas me esforço para
superar o sentimento ruim.
Não, Brina! Hoje foi uma vitória.
A opinião que importa não é a dele. É a minha.
Para papai eu nunca serei suficiente, mas para mim EU SOU.
Enxugo a segunda lágrima que veio com a emoção errada. A seguir,
levanto-me e caminho para meu banheiro. Algumas horas na
hidromassagem faria bem para meu corpo cansado e para a mente
recém-desperta.
Vou aproveitar o pouco tempo que tenho neste quarto.
Amanhã posso ter que me mudar para a casa dos Vough até a
formatura, penso.
Não importa.
Esta é a minha vida e até que enfim tomei as rédeas dela.
O grito masculino coletivo indica que Andrew e sua trupe
estão chegando com o barril de chopp como prometido. Não
entendo porque esse idiota espera a casa estar lotada para
providenciar o restante da bebida.
— Quando vejo esses caras, me lembro por que não
entramos no time de futebol. Eu teria colocado arsênico no café da
manhã deles fácil. — Alec leva o pequeno cantil de prata à boca
dando uma golada do uísque que carrega em todas as festas.
— Eu tinha certeza da sua tendência homicida. Mas,
confesso que neste caso, eu ajudaria — emendo, encostando-me a
lateral da casa onde estamos mais afastados da multidão
observando a movimentação da primeira festa de fraternidade do
semestre.
Os quatro Falling Angels são requisitados em quase todas
as festas. Porém, selecionamos as que valem à pena. Estou
questionando até agora se a opinião de Henry, que nos arrastou
para cá, deve ser levada em consideração na próxima.
Ano passado, foram os Deltas que começaram a temporada
das noitadas regadas a ponches batizados e barris de chopp. Este
ano os Alfas tomaram a liderança.
A casa da fraternidade pelo menos é grande o suficiente
para comportar boa parte do corpo estudantil espalhado e não
aglomerado no mesmo local. O verão traz essa vantagem, bem
como a maioria das garotas usando apenas biquíni.
Como tantas outras das casas dispostas dentro do campus,
onde é o habitat natural da espécie humanoide que me intriga e irrita
na mesma proporção, esta possui três andares, um vasto quintal
gramado e uma piscina, na qual balões coloridos disputam espaço
com algumas garotas na parte mais rasa. Observo-as sem
demonstrar interesse.
Uma garota de cabelo azul, preso em um coque solto, e pele
levemente bronzeada destacada pelo tecido branco que mal
esconde seus mamilos, me encara maliciosamente enquanto chupa
o canudo da bebida que segura com uma das mãos.
Provavelmente, virá à caça do Falling Angel calado, vulgo
eu, em menos de dez minutos.
— Sabe… eu não entendo como você consegue ir só até a
terceira base, cara! Jura que não daria uma chance para Ava? —
Henry segue meu olhar que cai sobre a garota. — Ela libera a porta
dos fundos fácil.
E aí está o que me desestimula a chegar nem sequer à
primeira base.
Não tenho controle sobre a reação do meu corpo. É algo
que vai além da minha vontade que fica na superfície da
consciência. Trata-se de um sentimento mais profundo. Toda vez
que um de meus amigos diz que já saiu com a garota em questão, o
interesse desaparece na velocidade da luz.
Estranho?
Você nem imagina.
Eu mesmo acho estranha a sensação que me acomete tão
espontaneamente. Não sei se minha convicção de encontrar a
pessoa certa tenha a ver com o resultado de me repelir de qualquer
outra garota, que já tenha passado por um dos três.
Já me chamaram de cafona ou possessivo. É um conceito a
se levar em conta, não gosto de sair com segundos de ninguém
mesmo. Até porque para eles é apenas uma foda.
Meus amigos vivem o hoje como se não houvesse amanhã.
Garotas incluídas no pacote, pois orgias que duram a madrugada
adentro acontece com frequência em nossa casa.
Por que eu não participo?
Porque quando eu toco o corpo de uma mulher, eu a venero
e me dedico a descobrir o que lhe dá prazer. Já alcancei a terceira
base com algumas e elas desfrutaram da minha boca e dos meus
dedos presenteando-me, sim, com deliciosos boquetes.
O fato de ser seletivo não implica “gostar de sexo”. Por mais
que não tenha chegado ao Home run, eu tenho uma imaginação
extremamente fértil quando me masturbo. Entretanto, sempre estou
conectado e acolhido por alguém, não só por seu corpo, mas por
sua mente.
Algumas das garotas que passaram pelas camas dos
demais Falling Angels já passaram por mim primeiro. Tentei me
conectar com uma ou outra, mas nenhuma, até hoje, me estimulou
para seguir adiante.
E como sei que a garota do cabelo azul provavelmente quer
experimentar todos nós, pelo visto, meu interesse por ela sumiu.
— Você deveria estar mais preocupado se irá dar conta da
quantidade de loiras que tem nesta festa. — Aponto com o queixo,
enfiando as mãos nos bolsos. — A busca por sua fadinha já
acabou?
— Nunca. — Henry sorri e checa, correndo os olhos, para
encontrar alguma loira que lembre a garota que lhe lançou o desafio
no Halloween passado.
Se um dia conhecer essa menina, irei dar-lhe os parabéns.
Ela deixou meu amigo totalmente encantado e, de acordo com o
que contou, nem sequer à terceira base alcançou. Foi só um beijo e
a fuga para deixar o Falling Angel exibicionista obcecado.
— Bom… já que Will não tá afim, eu pego e aproveito pra
convidar a amiga ao lado. — Gabriel tira a camiseta e pendura no
pescoço, antes de ir até as garotas na piscina e se colocar entre
elas que sorriem em satisfação.
A atenção não era para mim afinal. Apenas para qualquer
um do quarteto. O que só deixou meu instinto muito mais assertivo.
Eu não quero ser só mais um na cama delas, eu quero ser o número
um.
Difícil de entender?
— Ela chegou. — Alec fita um ponto além da piscina e vejo
a garota pequena de cabelo estilo channel com franjinhas, short e
cropped pretos, apontar em um grupo. Os olhos do meu amigo a
seguem o tempo todo até que alcança uma mesa com vários copos
e um ponche de cor avermelhada. — Já batizaram o ponche? —
pergunta, sem desviar o olhar.
— Foi a primeira coisa que Eliel fez, mano — Henry
responde e Alec vai a passos largos até a garota, mas daqui, vejo
que chegou tarde e seus lábios já estão no copo de papel vermelho.
— Eu realmente estou vendo isso ou estou sonhando? — Henry
pergunta abismado com a atitude de Alec que tira o copo de Elisa e
a conduz pela mão para a lateral da casa.
Ela parece relutar um pouco, mas não rechaça o
movimento. Nosso amigo de humor negro dando uma de protetor é
inédito numa escala de um para um milhão.
— Nops! Se está sonhando, estamos no mesmo sonho,
cara. Ele realmente pagou de herói — devolvo.
— Parecia que ia arrancar a cabeça dela, mano. Será que é
bom intervir? — Henry me olha agora preocupado.
— Nah… Alec pode ser um neandertal, mas Elisa tá segura
enquanto ele tiver interesse nela. E aquilo ali — aponto na direção
do novo casal — é a prova viva disso.
O líder dos Falling Angels está segurando o rosto da garota
entre as mãos com delicadeza e até sorri para ela. É neste
momento que o furacão Brina Heinz aparece e puxa sua amiga.
A atitude de rainha da garota chama não apenas a minha
atenção, mas de toda ala masculina. Ela é linda, com traços
delicados, os cabelos volumosos que descem em ondas por suas
costas. Está com a parte de cima de um biquíni amarelo e short
jeans surrado, deixando à mostra as pernas torneadas pelo esporte
que pratica.
Ela é petulante, atrevida e gostosa pra caralho. Uma mistura
muito perigosa. Não consigo evitar e meus olhos sobem e descem
várias vezes admirando cada parte do seu corpo.
Henry, boa parte da festa e eu ficamos absortos com a
pequena confusão alarmada ao redor de Brina, Elisa e Alec. A
rainha morena gesticula para sua amiga, para o ponche e depois
para Alec, dizendo em alto e bom som que Elisa não pode chegar
numa festa e se afastar dela, muito menos beber algo que nem viu
ser preparado.
Pelo visto, Brina é a garota que defende a amiga inocente
do mundo. O quanto será que Elisa é inocente? Espero que não
seja muito, pois sei que irá cair nas garras de Alec… se não hoje,
logo.
Brina agradece Alec por salvar sua amiga e enlaça o braço
no seu como sempre as vejo caminhando pelo campus.
Coloco a mão no queixo, enquanto seguro o cotovelo com a
outra, analisando a cena. O que meu amigo irá fazer já que Brina
veio salvar a amiga não apenas do ponche, mas pelo visto dele
também?
Alec segura o outro braço da garota, e Elisa parece uma
corda em um cabo de guerra.
— Que porra é aquela? — a voz de Henry sai com uma
risada e eu também não me contenho e rio.
A morena parece olhar para a amiga para ter certeza do que
ela quer e Elisa segura sua mão, num gesto de agradecimento.
Porém, permanece ao lado de Alec.
Brina se dá por satisfeita e se afasta, meus olhos furando
suas costas e bunda quando retorna para dentro da casa.
— Bom… o show acabou — Henry conclui quando Alec e
Elisa desaparecem de nosso campo de visão, em seguida bebe no
gargalo da longneck. — Você vai ao evento semana que vem? —
Meu amigo volta-se para mim, lembrando que teremos um torneio
de golfe com a estirpe de nossas famílias.
— Acho que não tenho escolha — respondo e pego os
aparatos para montar meu beck. Hoje consegui um pouco de fumo
natural para misturar, não quero chapar rápido. — Minha mãe disse
que meu pai comprou até bonés combinando para nós, acredita?
O pai de Henry faleceu há alguns anos e nesses eventos o
meu meio que o adotou para nosso time.
— Se não for rosa como da última vez… — ele debocha das
escolhas de cores de minha mãe. Sra. King realmente se superou
no campeonato de paintball fazendo-nos usar camisetas rosa bebê.
Cara… era paintball!
O que minha mãe tinha na cabeça?
Somente depois da palhaçada soube que era um pequeno
castigo para meu pai que esqueceu a data do primeiro beijo deles.
Eu e Henry pagamos o pato junto.
E sim, até hoje meus pais comemoram datas como se
fossem namorados. Minha mãe é uma romântica e meu pai é seu
eterno príncipe encantado.
— Até onde chequei, meu pai não deu nenhuma mancada.
Então, relaxa. — Passo a língua no papel para fechar o cigarro. —
Mas você ficou bem de rosa, cara! Deveria usar mais — ironizo com
um sorriso brincalhão.
Henry mira as unhas num gesto delicado e entra no clima.
— Também achei, amiga, rosa é minha cor. — Ele joga a
cabeça como se tivesse cabelos longos e pisca.
Nós rimos da zoeira de amigos. Henry é assim, fácil. Ele
mantém o sorriso e tenta ver o lado bom de tudo. Aprendi a olhar as
situações por outro ângulo com ele e nos conectamos por gostar de
estudar.
Ninguém acredita que meu amigo é um nerd escondido na
casca do cara popular. Mas é exatamente isso que ele é.
Tudo bem que eu preciso me dedicar muito mais do que ele,
pois o sujeito teve a sorte de nascer com memória fotográfica.
Contudo, nunca se negou a me ajudar nas disciplinas que tinha
mais facilidade. Ele é o crânio dos cálculos e eu este semestre vou
precisar de uma ajuda extra para conseguir passar.
Mais algumas horas na biblioteca para mim.
Não me importo. Lá é o lugar da universidade que passo
maior parte do tempo, e não sei como, por mais que eu me
esconda, Henry sempre me acha. É incrível essa sua habilidade.
— Mano — ele pega meu beck dá uma tragada e me
devolve —, vou atrás da minha fadinha. Acho que aquela loira que
passou pela porta tem a mesma altura.
— Vai lá — incentivo-o.
— Não é hoje que vai procurar sua princesa encantada? —
brinca, me olhando por cima do ombro já se afastando.
— Acho que quero uma rainha — replico.
Henry inclina a cabeça e me analisa como sempre faz. Por
mais inteligente que meu amigo seja, não enxerga o que está à sua
frente.
Quando criamos uma ideia sobre algo ou alguém, nosso
cérebro seleciona as informações que queremos num mundo fictício
e não na realidade, por isso ele ainda não encontrou sua fadinha. O
mundo fictício da Sininho loira para Henry é a típica garota
universitária. Esta é uma cortina sobre seus olhos. O mesmo
acontece com a minha menção em querer uma rainha e não uma
princesa. Se não houvesse um preconceito formado, entenderia
quem eu quero.
Henry me vê com uma garota meiga e delicada, obediente
aos costumes de nossas famílias. Para ele, eu ainda me encaixo no
ideal que nossos pais esperam.
Meneio a cabeça em direção da loira que parece ir embora.
Henry me dispensa num aceno de mão e corre em seu encalço. Dou
mais algumas tragadas e vou até o barril de chopp conferir se
Andrew fez por merecer ser da fraternidade Alfa, e não da Delta.

— Por favor, fala pra mim que tem café — digo ao me


arrastar para a bancada da cozinha. Meu corpo está esgotado,
minha cabeça latejando e minhas pálpebras só irão abrir após meu
café forte e amargo.
Quando minha bunda alcança o banquinho, deixo meus
braços deslizarem na pedra e afundo minha cabeça no vão,
dramatizando ainda mais meu pedido por café.
— A festa foi tão boa assim? — Aline coloca uma caneca
gentilmente como todos os seus gestos em minhas mãos e levanta
uma mecha do meu cabelo, revelando meu rosto cansado.
— Deve ter sido melhor para Lisa — balbucio no meio de
um bocejo e começo a levantar meu corpo, segurando a caneca e
sentindo o aroma da bebida que a doçura em formato de gente fez
para mim. — Ela já acordou, Line?
— Ainda não, Bri.
Agora olho ao redor e também não vejo Debby. Aline
percebe minha intenção em perturbar nossa nerd e repreende de
plano:
— Debby tem um exame esta semana e só veio pegar um
brownie. Hoje ficará trancafiada no quarto e nada de ir lá, ok? —
alerta, mantendo um sorriso como se falando para uma criança
levada não ir provocar a coleguinha. — Quer um cup cake?
Ela me oferece uma cestinha forrada com uma toalha,
xadrez vermelho e branca, recheada dos bolinhos de chocolate. Se
eu e Lisa ganhamos na loteria ao sermos escolhidas como
sublocatárias?
Ah… com certeza.
Além dessas garotas serem gente boa, Aline é a melhor
cozinheira do mundo todo. Sem contar o coração imenso que
possui. Debby também não fica atrás. No começo era fechada, mas
eu e Lisa tínhamos uma tática infalível para sermos notadas.
E atrapalhar os estudos da nerd fazendo-a assustar quando
abríamos nossas portas, tornou-se uma competição entre nós.
Quem iria fazer Debby pular primeiro.
BAM!
— Ai caralho! Que susto! — Levo a mão ao coração com o
barulho e viro o pescoço na direção do quarto de Lisa.
— Viu como é bom — Aline aponta rindo, ela nem piscou.
Devia já estar vendo a porta de Elisa abrir e como eu estou de
costas não pude me preparar.
— Ué! Cadê a Debby? — Lisa pergunta, aproximando-se. —
Ela tá bem?
— Só tem um teste esta semana. Toma — Aline responde e
lhe dá outra caneca com o cappuccino que minha melhor amiga
adora. — Está no quarto estudando.
Eu já contei que somos sortudas, né?
E não, não emprestamos a fofinha pra ninguém! Ela é só
nossa!
— Hum… tá bom, então. — Lisa começa a tomar sua
bebida, depois deposita a caneca na bancada e pega um cup cake
passando a retirar pequenos pedaços e colocando-os na boca. Eu
sei o que ela está fazendo, está ganhando tempo para não me
contar o que aconteceu ontem. Mas eu sou uma pessoa que nasceu
de sete meses, literalmente.
— Eu vou ter que perguntar?
— O quê? — Ela se faz de inocente e continua olhando para
o bolinho.
— Lisa você sumiu com o anjo-demônio, amiga. Me diz que
não deu pra ele de cara, vai? Diz que vai dar trabalho pra ele. A
novela de vocês está boa demais — digo e vejo o sorriso surgir em
seu rosto.
— Você saiu com um dos Falling Angels? — Aline questiona
e vejo por uma fração de segundo apreensão em seu olhar.
— Alec. — Lisa responde. — Ontem nos encontramos na
festa.
E a tensão nos ombros de Aline desmancha. Curioso.
Coloco na lista de perguntas para outra hora e volto minha atenção
para Lisa.
— Você deu pra ele?
— Não! — ela replica rápido. — Não dei, Bri. — Agora me
olha daquele jeito mais sério para eu realmente acreditar. — Juro.
Se eu tivesse dado, contaria. Mas ainda não. Você sabe que não
sou assim. Gostaria de ser, mas não sou.
— Amiga, não me entenda mal. Você pode dar pra quem
quiser. Só que eu sei, e você também sabe o quanto isso te afeta.
Da última vez, você chorou uma semana. Eu avisei que o idiota só
queria te comer.
— É eu sei. Por que não sou igual a você? Eu deveria
aproveitar um cara bonito… não me apegar como um cachorrinho.
— Amiga, ninguém é igual a ninguém. Essa é a beleza do
mundo. Você pode ser um cachorrinho, Lisa, mas de quem quer
cuidar com amor e carinho. Não há nada de errado em ser assim. —
Acaricio seu ombro de leve. — Ontem o tal Alec ganhou pontos ao
tirar aquele copo da sua mão. Lisa, eu só fui ao banheiro e você
quase tomou ponche batizado!
— Você ia beber do ponche dos Alfas? OMG! — Aline
empertiga, sua voz sai uma oitava acima. — Lisa, o ponche deles é
famoso por conter de tudo e mais um pouco.
— Calma gente, eu mal dei um gole — ela diz com um
sorriso para desfazer a tensão do momento. — Alec tomou o copo
de mim rápido demais. — Volta a sorrir e agora ela dá uma mordida
no cup cake.
— Cuidado com Alec, Lisa — Aline alerta e começa a se
movimentar na cozinha para fazer alguma coisa gostosa para mais
tarde. — Os Falling Angels possuem a fama de não se apegarem a
ninguém.
— Ele tem sido atencioso — ela o defende.
— Isso é verdade — emendo.
— Mas pode ser apenas um meio para um fim — A fofinha
ainda insiste. — Ter um coração partido mais de uma vez pode
significar rachaduras para sempre. Acredite em mim. Eu sei…
Aline diz as últimas palavras com tanta tristeza que fico com
medo de perguntar quem quebrou seu coração e por que ela
permitiu que fosse mais de uma vez. Porém, ela se atrapalha toda e
várias assadeiras de alumínio caem em sua cabeça.
— Aline! — Corro dando a volta na bancada, alcançando a
baixinha. — Você está bem?
— Si-sim… — responde passando a mão na testa e
sorrindo. Se ela está sorrindo, está tudo bem. — Eu devo ter feito
uma armadilha para vocês não pegarem os brownies antes da hora
e acabei sendo a presa.
— Ah… Então semana passada não foi um acidente? —
Sorrio também.
Semana passada eu fui a vítima das assadeiras e estava
mesmo procurando os brownies.
A danada leva a mão à boca contendo o riso.
— Dona Aline, dona Aline… — faço o som de tsc-tsc, como
uma repreensão. — De boazinha só a cara, hein?
Ela deixa a gargalhada tomar conta, com certeza
recordando da minha cara quando derrubei as assadeiras.
— Foi engraçado, Bri. — Lisa participa das risadas e eu
também acompanho.
Realmente foi.
— Mas que porra, Maggie! Isso aqui é um treino! — reclamo
ainda com o corpo estirado ao solo, puxando o joelho esquerdo em
meu abdômen na tentativa de diminuir a dor na canela.
Essa vaca pela segunda vez hoje veio para cima de mim,
roubar a bola da pior forma possível, enfiando as merdas dos cravos
da chuteira. Se fosse um jogo normal, isso seria falta para cartão
vermelho e eu teria chance de estar cara a cara com a goleira do
time adversário, já que estava na grande área.
Mas aqui e agora, isso não era para acontecer. Eu sei que
Maggie Stwart tem todas as razões do mundo para me odiar, até
porque, para ela, minha vaga de titular é injusta, uma vez que seria
ela na fila. Caso eu não entrasse em Braveton.
O que não aconteceu e cá estou sofrendo uma tremenda
contusão na canela por conta da dor de cotovelo alheia. O sorriso
afetado de minha agressora condiz com a sua intenção.
Merda.
Ouço o apito estridente da treinadora Rivers antes mesmo
de vê-la. Assim que me alcança estica minha perna e tateia em
busca de alguma fratura, perguntando apressada se está tudo bem.
Está doendo pra cacete, mas não vou dar o gostinho para
Maggie. Levanto-me com o apoio da mulher robusta ao meu lado.
Apoio o pé no chão e percebo que foi só a pancada mesmo.
Nada para se preocupar.
— Você tá louca, menina?! — Sra. Rivers lhe dá um tapa de
leve com o dorso da mão em seu ombro a título de repreensão. —
Não pense que derrubando a melhor atacante você assumirá o lugar
dela, Srta. Stwart. Eu não vou esperar sua terceira tentativa. Já para
o banco!
— Brina que é mole demais. E ela não é a melhor atacante,
treinadora. Você está obcecada pelo sobrenome dela, isso sim! —
esbraveja, e sinto um pouco de pena ao ouvir o ranger dos dentes
da treinadora que pressiona o maxilar contendo a raiva. Ela irá
permanecer no banco mais do que imagina.
— Considere-se suspensa pela temporada toda, Maggie
Stwart. E nem seu pai intervindo com o reitor me fará mudar de ideia
agora. Ano passado sua inveja me custou o campeonato, porque
não me atentei a tempo das suas investidas contra Adelaide. Não
cometo o mesmo erro duas vezes — a treinadora argumenta,
relembrando a atitude desta vaca com a atacante anterior, que se
formou e por um milagre não foi prejudicada para ser titular no time
OL Reign, já que fraturou o menisco direito no último treino.
A ausência de Adelaide causou um baque tão grande no
time, que perderam de 3x1 no último jogo do campeonato regional.
Rose e Emy aproximam-se de mim para dar apoio. Ainda
não conquistei todas do grupo, mas percebi que quando Maggie
mostra as garras, elas avançam em defesa.
As garotas eram amigas da antiga atacante. Emy mais que
amiga, aliás. Elas ainda estão juntas, pelo que entendi nas
conversas do vestiário.
Rose é a atual capitã e artilheira do time. A garota é uma
máquina. Seu pai é fissurado em futebol e ensinou a filha desde
pequena. Ela possui o corpo feito para o esporte com músculos
definidos nos lugares certos, o que chama muito a atenção por seus
traços latinos.
— Você está bem, Bri? — questiona oferecendo o ombro de
apoio.
— Estou sim. Foi só uma pancada.
— O treino já está no fim mesmo. Se a vaca não te cortasse
por trás, teríamos aquele gol — Emy relata a jogada antes da falta.
Bufo uma risada sem humor, e concordo mentalmente com
sua constatação ao fitar o gol. Sim. Eu teria acertado o canto direito
fácil. Sophie, a goleira do time adversário reserva, já tinha dado a
entender que cairia pra esquerda. A treinadora gosta de colocá-la
sempre contra mim nos treinos para forçá-la mais.
Apoio as mãos em cada ombro das garotas e giro o pé
conferindo a mobilidade. É… Amanhã isso será só mais um roxo.
— BRIIIII!!! — Ouço Elisa gritar da arquibancada e lembro
que combinamos de nos encontrar aqui. — Bri, você tá legal?
Ela vem até mim com olhar preocupado, agacha-se um
pouco pra ver o calombo arroxeado que começou a surgir no local
dolorido.
— Aquela vaca! — grunhe, e depois, assume a postura de
corajosa estufando o peito e dando um passo em direção à Maggie.
Agarro seu braço rapidamente.
— Não vale à pena, Super girl. Ela já terá que remoer sua
estadia forçada no banco por toda a temporada.
— E dessa vez nem uma doação extra de seu pai fará
diferença. — Rose que caminha ao nosso lado com as demais
garotas emenda.
— Ela já deveria ser expulsa de uma vez! — Emy
acrescenta. — Se Adelaide já não tivesse assinado o contrato
poderia ter perdido tudo. Ela ficou seis meses sem treinar, cara! Seis
meses!
— Maggie tem motivos pra ser assim, gente — Rose afirma
e recebe o olhar acusatório de Emy. — É verdade, e você sabe.
— Os pais estarem separados pela morte prematura do
irmão não dá o direito pra ser uma vadia, Cap. Até porque ela nem
conhecia o irmão direito, já que ele morreu quando ainda era bebê.
— Sophie aparece atrás, fechando a porta de aço vermelha do
vestiário.
Vejam só… eu tenho algo em comum com a garota má.
Ironia do destino, não?
Na visão de Rose, isso significa que posso sair por aí
fodendo com todo mundo que seja obstáculo para meus objetivos?
Se for, o mundo está em débito comigo.
— Tá tudo bem, mesmo? — Lisa cochicha em meu ouvido e
depois se senta no banco de madeira entre os armários me
esperando pegar shampoo e sabonete para ir até as duchas.
— Tá sim. Só mais um roxo pra coleção — respondo no
mesmo tom baixo, fazendo um gracejo.
— Eu digo sobre o que Sophie disse, amiga. Percebi que
seus ombros ficaram tensos quando ela falou sobre a morte do
irmão da doida.
Sabe qual é o problema de sua melhor amiga ser sua amiga
de infância? Ela ter histórico suficiente para conhecer todos os seus
trejeitos.
Inspiro e solto o ar profundamente.
— Só… — Suspiro. — Só me fez pensar que estamos no
mesmo barco, mas conduzimos o timão em direções diferentes.
Nada mais.
— Eu confio mais em você como a capitã deste barco, Bri.
Você é muito melhor do que ela.
— Não sou, não, Lisa. Ninguém é melhor que ninguém.
Todos nós temos o mesmo valor aqui na Terra. Somos diferentes…
só isso. Com certeza Maggie acha que está no seu direito ao agir
assim.
— Mas não está. A sua liberdade só vai até onde atinge a
do outro, amiga. E essa garota ultrapassou o limite há tempos.
Olho por cima de Lisa e vejo de longe Maggie sair
cabisbaixa do vestiário. Neste momento, nem sei se sinto mais
raiva. Ela está lidando com as consequências de suas escolhas.
E, infelizmente, para Maggie, ela escolheu as erradas.

Mais uma vez, eu e Lisa decidimos voltar caminhando da


universidade para o apartamento. Ela precisa desabafar, eu sei…
Essa é uma das muitas funções de melhor amiga, emprestar seu
ombro para a outra chorar.
— Que horas você vai começar a falar, Lisa? — Ela está
praticamente escorada em meu braço enquanto andamos
lentamente pelo pequeno parque cheio de árvores.
— Eu pensei que… pensei que ele fosse diferente.
— Lisa, a fofinha disse que não aconteceu nada, que foi a
tal ruiva que estava em cima dele a noite toda.
— Ela tava no colo dele, Bri — ela fala me olhando com
aquela cara de cachorro que caiu da mudança.
Essa é a pior parte de ser como Elisa, criar expectativas no
outro. Ela não esperava ver o cara que estava saindo nem sequer
perto de outra garota, quanto mais ter uma em seu colo. Além de
carente, Lisa é muito possessiva. Eu sei, sou sua melhor amiga, e
você não tem ideia de como ela fica quando faço outras amizades,
salvo se estamos juntas e as amigas são em comum.
Ainda bem que foi o que aconteceu com Aline e Debby.
— Amiga linda, ele te pediu em namoro em algum
momento? — questiono.
— Não… mas…
— Então, ele não estava fazendo nada de errado. E se você
quiser continuar, siga em frente. Aline já disse que ele nem encostou
um dedo na garota e quando disseram que você havia aparecido na
festa, ele jogou a ruiva no chão e passou a te procurar como um
louco. — Tiro o celular de sua mão, que está agora vendo as
notificações do whatsapp. — E isso aqui — aponto as mensagens
—, são todos os indícios que ele está interessado em você.
Elisa dá alguns pulinhos e pega o aparelho telefônico de
minha mão.
— Isso não significa nada. Eu vou acabar me ferindo se
continuar. Você ouviu o que Aline disse sobre os Falling Angels —
diz as últimas palavras com uma careta. Solto um riso frouxo sem
querer. — A ruiva foi só um lembrete que Alec Winston não é para
mim. Sou só mais uma conquista na vasta lista do anjo-demônio
mais cobiçado do campus.
— Mais cobiçado não sei… acho que todos são, viu? —
brinco, querendo desfazer a cara tristinha da minha amiga.
Tenho quase certeza que essa história não acabou. Mas não
vou teimar agora, vou esperar calmamente o momento certo.
Eu adoro ouvi-la dizer o quanto estava certa. Aliás, estou o
tempo todo. Não sei como sendo minha amiga há tantos anos, ainda
não aprendeu isso.
— Enfim… Papai ligou antes do “desastre-Maggie”, pedindo
para irmos este fim de semana pra casa, o que acha? Seria uma
ótima oportunidade para encontrar seu pai. — E a cara de cachorro
pidão toma conta.
Faço um barulho estrangulado com a garganta para ganhar
tempo e os olhinhos diminuírem o tamanho. Ai, droga… em vão.
Eu sei que sou bem recebida na casa dos Vough. Na
verdade, sou recebida como uma filha. Até porque passei mais
horas no quarto de Lisa do que no meu próprio. Mas voltar para
casa não estava nos meus planos. Muito menos dar a trégua que
meu pai vem pleiteando arduamente nos últimos dias.
Vamos dizer que tomar conhecimento que eu realmente não
preciso do seu dinheiro e não correria para seus braços dizendo que
havia mudado de ideia e que havia aceitado nossos planos para
Braveton, o fez cair em si.
Pela primeira vez, Cassandra me ligou, dizendo que meu pai
chegou a dormir no escritório e, quando foi acordá-lo, percebeu que
havia bebido enquanto balbuciava meu nome e pedia perdão.
Não sei dizer se é tarde demais para isso. Talvez se o
perdão vier acompanhado de: eu te aceito como você é. Neste caso,
posso pensar no assunto. Após a noite da bebedeira, papai tem
tentado me contatar.
Eu atendi ao telefone algumas vezes e trocamos meia dúzia
de palavras, como: “Bom dia, você está bem?”; “Sim, estou e
obrigada”. Nada além.
Então, uma ida para casa seria enfrentar um dramalhão que
ainda fujo. Não está mesmo em meus planos para o fim de semana
encarar meu velho.
Já um moreno de olhos verdes, com 1,90 de altura, corpo
sarado e uma tatuagem de cobra nas costas inteira, isto está em
meus planos.
— Ai, Lisa… vou encontrar Logan no sábado. Ele me
chamou para assistir com ele uma corrida de Kart e não consegui
dizer não. — Eu não quis dizer não, porra. Depois do fiasco com
Andrew/idiota que beijei sem saber que tinha namorada, fiquei na
mão. Eu preciso transar.
Logan é perfeito em vários sentidos. Ele não quer
compromisso, eu também não. Nossos corpos se encaixam do jeito
certo, e na última vez, gozei mais de uma vez.
Lisa bufa vencida e resmunga um “tá bom” a contragosto.
Desta vez, não sou vencida pela carinha de piedade dela.
Caminhamos em um silêncio acolhedor por uma quadra.
Dura pouco.
— Como você consegue?
— Hum? — murmuro minha dúvida.
— Não se apegar assim. Você já saiu mais de uma vez com
o Logan e nem se incomoda quando o vê com outra garota.
— Ele não é meu namorado, Lisa. Não temos um
compromisso. Eu o uso, ele me usa e ficamos bem com isso. Fim.
— Eu não consigo ser assim… — murmura.
— Você é uma romântica por natureza. — Passo o braço
por seus ombros. — E eu te amo deste jeitinho. — Aperto-a junto ao
meu corpo. Elisa é um pouco mais baixa e quase tiro a boina que
está usando com meu abraço.
Ela se solta e se ajeita, pegando meu braço e escorando-se
novamente para continuarmos a caminhada.
— Acho que ainda não rolou o Tchan sabe? — digo,
pensativa.
— O Tchan? Tipo o Conde Drácula do Hotel Transilvânia?
Fala sério, Bri! — Encaro minha amiga.
— É verdade… — sorrio. — Ainda não aconteceu do meu
coração bater mais rápido e a sensação de borboletas no estômago.
Só vou querer algo sério quando isso acontecer. Aí você me verá
com um cara por mais tempo que apenas um fim de semana. —
Pisco para ela.
— Eu já senti… — sussurra tão baixinho que se eu não
estivesse prestando atenção passaria batido.
— Eu sei, minha amiga, eu sei…
Caralho de tênis. Eu sempre me esqueço de enfiar os
cadarços para dentro quando estou com pressa e por pouco não
dou um show em uma queda nas escadarias da Biblioteca, com o
tropeço que sofro ao pisar em um dos cordões brancos. Agacho-me
e enfio-os nos calçados desajeitadamente.
Após, verifico mais uma vez o relógio inteligente de pulso
que bipam informando minha taquicardia pelo tropeço e que estou 5
minutos atrasados.
Henry é um filho da puta safado e justo hoje quis me
acompanhar até à biblioteca da faculdade bem no meu horário de
estudos com Debby.
Mando-o me deixar na porta enquanto estaciona. Ela não
estará brava. Debby é sempre tranquila, mas sei que demorarei
mais que o de costume para ela se abrir com alguns dos seus
sorrisos. Não que eu tenha qualquer interesse nela. Não tenho.
A garota nerd é especial. Ela se esconde do mundo por
medo e insegurança, ela já deve ter alguma experiência traumática
para ser assim. Se um dia quiser se abrir, estarei disponível como
seu amigo.
Faz um mês que começamos nossas aulas de tutoria e
acredito ter entrado um pouco em sua carapaça. Quando ela sorri
de alguma piada boba que faço, o clima do estudo de cálculos fica
mais leve. Entende por que preciso do seu sorriso?
Cálculos avançados é uma merda.
Henry vive dizendo que estou gastando dinheiro à toa, já
que poderia me dar aulas de graça. Porém, se eu fosse esperar por
ele todas as vezes que uma loira passa, já teria bombado no
primeiro teste que aconteceu na semana passada, e, por incrível
que pareça, tirei 8,6. Não graças a ele.
— Desculpe o atraso. — Coloco minha mochila sobre a
mesa que Debby escolheu hoje. Ela geralmente está nas mesas
laterais e mais escondidas próximas das prateleiras.
— Tudo bem. — Ela olha o horário no visor do celular. —
Temos bastante tempo e pretendo ficar mais um pouco quando
terminarmos.
— Que bom! — Sento-me ao seu lado e começo a retirar
meu caderno, estojo e notebook. — Veja! — Jogo minha prova em
sua frente com a nota. — Se não fosse você, teria bombado fácil.
Ela pega a prova e observa a nota, depois analisa exercício
por exercício. Quando vira a página, percebo as sobrancelhas se
juntarem numa carranca um pouco escondida por seus imensos
óculos.
— Por que errou este, cara? Tínhamos feito um exercício
igual antes da prova — reclama e aponta o exercício que o
professor fez o favor em considerar meio certo.
Passo as mãos pelos cabelos lembrando o motivo pelo qual
me distrai durante a prova. Foi exatamente no momento em que
Debby entregava a sua e Brina a aguardava na porta.
A postura altiva da morena é como um ímã que atrai toda
minha atenção. Quando me voltei para o exercício, não calculei
alguns dos números, só dispus o resultado e segui adiante. O outro
que não acertei foi cagada mesmo.
A baixinha bufa frustrada como se esperasse que seu aluno
não pudesse tirar menos que dez. Rio internamente com a visão do
pequeno ser que parece um gnomo com o capuz sobre a cabeça.
Tenho quase certeza de que esta garota deve ser linda fora dessas
roupas desmedidas, mas não sou eu que irei mostrar isso a ela.
De Debby, eu só quero sua amizade. Sinto que é uma boa
menina e muito inteligente. A garota estuda física e pretende se
especializar em física quântica. Ela está inclusive fazendo aulas
avançadas por conta de sua capacidade.
— Vamos pegar os exercícios que você errou e refazê-los
pra começarmos hoje, ok? — Ela alisa o papel da avaliação, sendo
que nem está amassado. Concordo e logo começamos.
Depois de quase uma hora vendo só números e fórmulas
com Debby, decido dar nossa aula por encerrada e ir procurar
Henry. Ele está aqui na biblioteca em algum lugar. Despeço-me da
pequena nerd e vou à procura do meu amigo.
Encontro-o não tão distante, sentado em meio a livros em
uma das mesas de estudos. Henry não me nota, pois está secando
com os olhos uma loira acomodada duas mesas à frente.
Cara, essa obsessão por loiras está ficando insana.
— Ela pode ser morena — digo, sentando-me na cadeira
vaga ao seu lado.
— Morena? — Ele pergunta, enrugando a testa, como se a
alternativa fosse ridícula.
— É, cara. A Sininho pode ser morena. — Pego minha
caneta. — Ela usava uma fantasia, Henry.
— E?
Não é obvio?
Uma faísca em meus pensamentos cria uma fogueira
imensa e só consigo enxergar uma pessoa.
A Sininho pode estar mais perto do que ele pensa? Talvez
não seja uma garota como outra qualquer.
Sim, com certeza.
Se fosse morena e amiga de Aline, bem como não ter sido
até hoje descoberta, não dá muitas opções, não é mesmo?
Somente alguém que se esconde não apenas de Henry,
mas do mundo, poderia caber nessas características, hum? Quem
sabe? Eu não me recordo nenhum pouco da tal fadinha, somente
Henry mesmo poderia tirar a prova dos nove.
— Fantasias podem ter perucas.
— Será? — Vejo as engrenagens de seu cérebro
começarem a funcionar.
— Você já tinha bebido um bocado, mano. Tem certeza que
estava em condições de discernir o real do falso?
Eu sei o quanto ele havia bebido, pois meu nível de
alcoolismo estava tão parecido quanto.
— Isso é uma verdade. — Aponta o indicador para mim
como um revólver em punho. Em seguida, seu rosto mudo para uma
expressão preocupada. — Mas aí eu nem sei por onde começar…
— Ah, não? — digo com ironia. — Essa sua memória
fotográfica deveria aumentar seu Q.I., não diminuí-lo.
— Olha a ofensa — devolve em tom de alerta e recosta-se
na cadeira, abrindo um dos livros. Tenho certeza que para não me
encarar e deixar de lado a ideia que estou tentando colocar em sua
cabeça.
— Sua fadinha estava com quem na festa, sua anta?
— Vamos continuar com os elogios? — devolve indignado.
— Eu sei que era com a Fofinha, mas ela tem amigas.
Ele é um caso perdido.
Se não consegue ver a chance em descobrir o que está a
sua frente, não sou eu quem irá insistir. Ele poderia pelo menos
tentar olhar a garota mais de perto e… e não sei. Não faço ideia se
Henry olhou para algo além do corpo da garota para conseguir
identificá-la das demais.
Acho que não, tendo em vista que daqui a pouco faz um ano
que está nessa busca sem fim.
— É… pode ser. — Solto a caneta no meio do livro e
começo a pesquisa da próxima aula de História da Economia em
meu notebook. Melhor não insistir.
Passamos boa parte da tarde estudando. Estou terminando
de escrever o texto sobre a Grande Depressão de 1929, quando
ouço a respiração de Henry ficar sonora. Algo que sempre acontece
quando quer chamar minha atenção.
— Aline poderia ter ido com qualquer uma das novatas. Ela
demorou a fazer amizades, mas sei que se enturmou mais nos
últimos meses. — e retomamos o assunto fadinha, penso mantendo
o sarcasmo apenas em minha mente.
Por que isso não me surpreende?
— Ela sempre está com “aquela garota nerd” — falo
imitando suas palavras ao se referir à Debby. Tenho quase certeza
que ele nem sequer sabe seu nome.
— Você está insinuando que a minha fadinha é aquela
esquisita que usa moletom mesmo quando está mais de quarenta
graus? — diz subindo o tom da voz nas últimas palavras. — Você
está louco. Aquela garota… — hesita e balança a cabeça
negativamente. — Não é ela.
Tudo bem. Não digam que não tentei.
Henry retorna ao seu livro, dando-me a chance de pesquisar
sobre as indústrias que faliram naquela época e finalizar a
dissertação.
— Nah… Não é ela. — meu amigo solta do nada. Encaro-o por
alguns segundos esperando a sequência da fala. Nada. Como o
silêncio se faz presente, ignoro.
— Se você diz — retruco e volto para a digitação.
Depois de um tempo, Henry me cutuca indicando que está na
hora de irmos embora. Quando vejo as horas até assusto que ele
conseguiu ficar um período do dia sem falar sobre a garota que
mora em seus pensamentos.
Clico em salvar o documento word na nuvem, satisfeito com o
resultado. Depois verifico que estou com livros de tecnologia e só
terei essa aula na próxima semana. Ainda estou fechando o
navegador no notebook e Henry já está pronto para ir. Só
precisamos devolver os livros nas prateleiras.
— Devolve estes na seção de tecnologia pra mim? — estendo-
lhe dois livros, enquanto seguro outros três para guardar do outro
lado. Afastamo-nos indo para direções opostas.
Debby passa por mim e acena indicando que também
estaria indo devolver alguns livros às estantes. Por coincidência, na
mesma direção que Henry.
Ah… meu amigo. Não faço a mínima ideia se estou ou não
certo, mas não desperdiçaria a oportunidade se estivesse tão
obcecado quanto você.
De certa forma, tenho inveja por Henry estar tão fissurado
na ideia de uma garota. Eu quero um dia ficar tão obcecado quanto
ele por alguém.
Ter a oportunidade de dividir minha vida, cuidando e sendo
cuidado como vejo meus pais.
Quando a garota certa surgir, me entregarei por inteiro a
ela… pela primeira vez.
Ajeito as luvas de couro repuxando a esquerda mais uma
vez pela palma e fecho o botão no punho. Henry está em minha
frente fazendo o mesmo, para em seguida conferir as horas em seu
celular.
— Esta quase na hora — indica. Pega do chão o saco com
giz em pó, oferecendo-me para espalhar nas palmas enluvadas.
Bato uma mão na outra fazendo uma nuvem ao nosso redor.
Tudo isso por conta da ideia mirabolante do meu amigo para
inovar nossa entrada este ano. Se não fosse algo que realmente
valesse minha atenção, eu pularia fora, ou tentaria, já que no meu
caso dizer não para Henry é mais que uma missão impossível.
Ele sabe ser persuasivo quando quer e por este motivo
estamos no telhado de nossa casa, preparando-nos para descer até
à festa que rola no quintal por duas tirolesas uma em cada canto da
mansão.
Este ano resolvemos aprimorar a fantasia de Falling Angels
e, ao invés das famosas asas de anjo, decidimos dar um toque mais
demoníaco.
Cara! É Halloween afinal.
Por isso fiz questão em pesquisar um mecanismo parecido
com aquele usado nos filmes do Batman, quando suas asas abrem
de repente. É só acionar um controle remoto que carregamos no
bolso para as asas abrirem e fecharem num impulso.
Ano passado não tínhamos tanto tecido cobrindo nosso
torso, era só um sobretudo com as asas acopladas. Já esta noite,
somos todos uma versão do Conde Drácula em cores distintas. A
minha mantive o marrom café e sem a minha permissão, mamãe
mandou o estilista colocar adornos dourados nas extremidades das
asas.
Já Henry manteve o tom verde musgo, que no tecido de
veludo escolhido para o casaco parece contrastar com a floresta
escura ao fundo, onde ocorrerá a Caçada.
Alec e Gabriel são os antônimos que se atraem, posto que
enquanto o primeiro está todo de preto, o segundo veste tons prata.
Ele é o único que se aproximaria mais de um anjo hoje, se não
contar as asas com chifres nas pontas.
— Pronto? — questiono Henry que acena e caminha até a
outra ponta. Me direciono para o suporte colocado com as roldanas
e os apoios que iremos segurar para a descida. As cordas foram
dispostas em ângulos discretos para que os convidados não se
dessem conta da existência delas até o momento certo.
Meu telefone notifica com o som de alarme o horário que
combinamos. Então, subo no parapeito e vejo através da visão
periférica Henry fazer o mesmo. Viro o pescoço e nos encaramos,
meneando a cabeça positivamente.
A trombeta ensurdecedora vinda de Gabriel e Alec que
curtem o anúncio de nossa chegada ressoa por todo o ambiente. É
o sinal.
Aciono as asas abrindo-as através do controle.
Inconscientemente prendo a respiração como se fosse dar um
mergulho, e… pulo.
Expiro quando sinto o deslizar da tirolesa. A brisa da noite
acelera conforme tomo velocidade. Meu rosto, pálido e sensível
demais, sofre com o frio fazendo minhas bochechas arderem de
leve.
As asas funcionam como uma barreira contra o vento,
fazendo com que o caminho demore mais que o esperado. Assim
que meus pés tocam o solo, aperto o controle e as asas retornam
para o meio de minhas costas, sendo agora apenas duas pontas
nas laterais da cabeça.
Sorrio satisfeito.
Foi divertido pra cacete. Balanço a cabeça e me surpreendo
com o entretenimento em uma simples descida. Uau. Olho para o
ponto no telhado e penso em fazer o percurso novamente.
— Porra, véi! Vocês se superaram este ano! — Roger, um
dos alunos que faz medicina, se aproxima oferecendo a mão para
me cumprimentar. — Será que os pobres mortais aqui podem
descer uma vez também?
Encaro o sujeito e penso que, liberar para um, foderia com
nossa privacidade. Boa parte desses caras entrando na mansão não
é algo que permitimos, salvo quando convidados.
Nossos quartos podem ser muitos, mas fizemos um acordo
para que a casa fosse território apenas dos Falling Angels.
— Cara! Não. — sorrio e dou de ombros. — Foi mal, mas é
só para a nossa entrada mesmo.
Ele me olha torto, mas logo desmancha a cara tomando da
cerveja de graça. Não tem do que reclamar. As festas na mansão
Henderson, são regadas a bebida e boa comida, o que acontece
pouco nas outras. Então, este povo tem que se contentar com o que
oferecemos.
E sim. A propriedade que moramos é da família de Gabriel,
porém, sempre foi o destino de todo Falling Angel que estudasse em
Braveton. É como se fosse tradição. Mais uma, aliás.
Não demora muito e outros sujeitos que mal converso
aparecem para me cumprimentar com algumas garotas. Elas me
provocam, esfregando o máximo dos seus corpos em mim, e eu
permaneço com minhas mãos nos bolsos.
Será que eles ainda não entenderam o significado de anjo-
demônio calado?
Isso significa que não curto falar com quem não conheço.
Esquivo-me mais um pouco e finalmente alcanço os outros
três. Formamos nosso quarteto e assim, juntos, caminhamos para o
centro da festa. Ali, posso vasculhar o ambiente com mais cuidado
e, talvez, escolher alguém interessante para conhecer melhor, não
sei.
Quando somos os quatro, a atenção se divide e mesmo que
eu seja tão assediado quanto os outros, eu escolho e imponho
limites. Eles, não.
Todavia, Alec não tem se portado no seu normal depois que
Elisa se afastou. Ele tornou-se um expert em dizer não, mais vezes
do que eu, confesso.
Se minhas observações estão corretas, ele não saiu com
nenhuma outra garota e nunca o vi tão obstinado em caçar essa em
particular. Pobre Elisa. Se ela pensa que irá fugir por muito tempo,
está completamente enganada.
De acordo com os planos de Alec, sua gazela não terá
nenhuma chance hoje, a não ser ir direto para os braços do anjo-
demônio negro.
Passado alguns minutos, o impacto da entrada se suaviza
com as batidas da música eletrônica que não para. Henry caminha
até mim com duas longnecks, oferecendo uma. Abro e batemos os
gargalos antes de tomar o primeiro gole.
Já estávamos nos aquecendo na casa da piscina. Eu mais
do que ele que estava ocupado com algumas garotas. Ali eu fiz
questão apenas em assistir. Não sou o típico voyeur, mas, com
amigos como os meus, fica difícil não se tornar um.
Até mesmo Elisa apareceu na casa da piscina e acabou
presenciando algo que a assustou e Alec praticamente rugiu para
Gabriel ir atrás dela, quando viu que a garota adentrou na floresta
pelo lado errado.
Enfio a mão no bolso e sinto meu vape e o haxixe que
providenciei especialmente para esta noite.
— Já encontrou sua fadinha? — debocho do meu amigo que
não tira os olhos da pista de dança.
— Hoje só para variar vou evitar as loiras, tá bom? — Ele dá
mais um gole, antes de falar: — Aquela. — Aponta a garrafa em
direção a uma ruiva que está encarando-o e lambendo os lábios.
Henry apenas sorri e a garota se aproxima.
Balanço a cabeça em desaprovação e me afasto. Meu
amigo passa a dançar com a garota e deixa que ela se enrosque
nele como um urso panda no bambu.
Sigo para a lateral da casa e fico escorado na parede
observando a multidão dançando, bebendo e comendo os aperitivos
em formatos bem duvidosos que seguem o tema de Halloween.
Um grupo de garotas vestidas com macacões curtos e
vermelhos me chama a atenção. Elas dançam e riem umas para as
outras com tanta facilidade, que a alegria é contagiante. Acabo
sorrindo ao assisti-las interagir e então constato que estão vestidas
com o tema dos personagens de La Casa de Papel, e não são
quaisquer garotas, mas sim a gazela de Alec, a baixinha, Debby e
Brina.
Todas levantaram suas máscaras ao mesmo tempo numa
brincadeira para beberem os copos que Aline trouxe e distribuiu
entre elas. Não foi difícil identificá-las depois disso.
Fito a morena que aguça mais meu interesse. Me pego
olhando demoradamente por suas pernas torneadas e sigo para a
barra apertada do macacão em suas coxas que moldam a bunda
redonda. Gostosa recebeu um novo patamar em meu conceito, e
este é o conceito Brina Heinz.
Minha língua desliza instintivamente por meu lábio inferior
com a imagem de traçar um caminho profano da curvatura do seu
joelho pelo interior de sua perna até a virilha.
Qual será o cheiro da morena petulante do caralho?
Sei que não é tímida com os rapazes. A Universidade de
Braveton poderia se resumir em uma cidade pequena, uma vez que
que os boatos correm soltos a torto e a direito. Ouvi que Brina é o
tipo de garota que não se apega e não tem qualquer interesse em
compromisso.
Infelizmente, tomei conhecimento pela necessidade em
dividir o banheiro masculino para mijar. Depois daquele dia, pensei
sinceramente em ‘regar a plantinha dos jardins’ da universidade,
como minha mãe costumava dizer para mim quando era criança.
Algum idiota glorificava o amigo por ter fodido a morena a
noite toda em sua fraternidade. O cara que saiu com Brina mandou
o idiota calar a boca e ameaçou quebrar seus dentes se não calasse
a boca, o que o fez ganhar meu respeito. Pelo menos, a rainha
petulante não saía com idiotas.
Contudo, foi assim que descobri que a linda morena gosta
de caras de uma noite só. Mas, talvez, eu pudesse supri-la sem
ultrapassar meus limites, não?
Gostaria de conhecê-la melhor. Brina me intriga.
Será que conseguiria satisfazer a morena só com minha
boca?
Fico mais tempo observando-a do que geralmente costumo
gastar com uma mulher. Os lábios carnudos e beijáveis estão ainda
cobertos por um gloss que os destacam ainda mais. As
sobrancelhas finas e delineadas moldam olhos expressivos com
cílios longos.
Por um instante acho que nossos olhares se cruzam e ela
chupa o canudo, virando-se para sua amiga que a chama, puxando-
a pelo braço.
Franzo o cenho ao notar que fiquei incomodado pela
interrupção. Eu queria ver até onde a morena seguraria meu olhar.
Solto uma lufada de ar sonoro e saio do meu esconderijo,
caminhando para junto dos meus amigos. Pelo menos os que não
estão enroscados com alguma garota, e, por sorte, Alec mantém-se
na castidade pós-gazela.
Logo, começaria a Caçada e, provavelmente, Brina cederia
para outro cara, talvez o mesmo do banheiro, quem sabe?
Mais uma vez desisto das opções que me são dadas e
passo a vez para os rapazes dispostos a ir até o fim. Fiz a bobagem
de adentrar a floresta lado a lado com Henry.
Ele pegou uma fada.
Se era a fadinha do ano passado?
Acho que não. Mas ele pegou uma das amigas da Tinker
Bell. Isso eu sei que pegou. Acabei ficando com a amiga vestida de
capetinha. Eu já a conhecia da aula de Economia e dar uns beijos
não é algo que afeta meu estilo de vida. Porém, quando os amassos
passaram para algo mais, joguei a garota para Henry, dizendo que
meu amigo tinha uma tara por ménage com duas mulheres e que eu
tinha perdido uma aposta.
Mentir para garotas com mais copos de tequila na cabeça
que os dedos das minhas mãos é tão fácil.
Caminho tranquilamente entre os arbustos em direção à
clareira que descobri ano passado. Lá eu poderia esperar os casais
da caçada se formarem para depois voltar à festa.
Assim que avisto a iluminação da lua sobre as folhagens,
escolho uma das árvores com raízes espaçadas e mais convidativas
para minha bunda.
Sento-me e encosto-me ao tronco. Respirando o ar puro da
mata. Pego o haxixe sabor banana do bolso com o vape e começo a
preparar para inspirar a viagem que meu fornecedor prometeu.
Eu já me cansei em tentar conduzir amassos de uma noite só.
Antes era mais fácil. Mas na faculdade, quando digo que não quero
ir além é levar um soco no estômago. Todas se sentem rejeitadas
pelo anjo-demônio calado. Elas não respeitam meu limite.
Saio do devaneio e aspiro ao vape, sentindo na boca o sabor
terroso com um leve toque de banana, que ultrapassa minha
traqueia a caminho dos meus pulmões. Era o último que meu
fornecedor tinha. Haxixe sabor banana.
Tive que escolher entre um hash sabor banana ou LSD. Como
o último quase me fez ir contra o que acredito e participar da
brincadeira dos meus amigos preenchendo todos os buracos de
certa garota, preferi ter o sabor terroso e adocicado em formato de
névoa em meu vape hoje.
Escorrego as costas pelo tronco da árvore na clareira que
descobri ano passado na primeira caçada, e depois, tornou-se uma
passagem obrigatória quando sigo para minha cabana.
Miro o céu estrelado, admirando as luzes que aumentam e
diminuem como rajadas de laser ao se expandir e contrair ao centro.
Estou entrando na primeira viagem de êxtase do mix da erva
que assopro vez e outra quando risadas chamam minha atenção.
— Tá bem, tá bem, Andrew… agora, me solte e vá atrás da
sua namorada que você ganha mais, vai — uma voz feminina
aveludada e agradável soa firme, mesmo com um tom brincalhão.
— Ela deve estar com um dos caras, Bri… eu quero você,
gata. Vai… — O casal surge com mais nitidez ocupando o centro da
clareira.
Reviro os olhos ao identificar a encrenca em minha frente.
Andrew Foster é um dos jogadores de basquete, que vive
corneando a namorada, e a voz feminina pertence à perdição dos
meus sentidos em forma de gente… Brina, a morena linda e
petulante, que se acha a rainha do mundo. Ela é.
— Cara… é sério, não tô afim. Se eu soubesse que tinha
namorada antes, nem tinha te beijado. Não sou puritana, mas não
pego macho alheio. Me erra, garoto. — Seu tom aparenta não estar
mais tão divertido quanto antes.
— Ah… Bri… não se faça de rogada vai. Você gostou e muito
da minha boca em você semana passada.
— Até uma garota louca aparecer, dizendo que era sua dona,
mané… Qual o problema de vocês, hum? — Ela empertiga, virando
o corpo para ele com uma mão na cintura e a outra com um dedo
em riste.
Cara… Ela dá conta do sujeito, né? Não vou precisar me
manifestar, vou?
Porra! Juro que acabei de ver uma estrelinha piscando pra
mim…
— Me solta! — Brina resmunga, parecendo fazer força e sim…
Ela está tentando sair do agarre do infeliz que não entende um ‘não’
como resposta.
Merda. Já era a vibe boa.
— Foster, a gata não tá afim — digo, revelando-me ao levantar
do solo. Não sei se dou risada ou se tenho pena do sujeito que fica
pálido no mesmo instante.
Reflito por um momento sobre a imagem que ele deve estar
enxergando e a aflição escancarada em seus olhos diz tudo.
Às vezes me esqueço que estamos em uma festa à fantasia e
principalmente que este ano nossas asas são demoníacas pra
cacete.
Não fiz questão como os outros em me desfazer do sobretudo
que acopla o par de asas com chifres em minhas costas. Ademais,
meus cabelos quase brancos contrastando com o marrom café e
detalhes em dourado se prontificam em aprimorar o look diabólico.
Para o idiota do Foster, devo parecer o próprio Lúcifer.
Solto o riso sem humor com uma lufada de ar ao perceber que
ele passou a andar para trás instintivamente conforme eu avanço.
A ideia deste tipo de caçada a imbecis com uma consequente
surra me agrada mais que a caça às garotas.
— Bú! — falo quando aciono o aparato eletrônico que abre as
asas rapidamente. Andrew cai de bunda no chão e solta um grito de
pavor tão estridente que se eu não estivesse vendo, juraria que era
de uma menina.
Ele levanta-se assustado e corre em direção à floresta escura.
— O que será que ele usou pra ficar tão cagão? — comento
mais para mim.
— Não precisaria ter usado nada. Cara, você saiu do meio de
uma neblina do além… e esses chifres… — ela assobia, apontando
o topo das asas. — Nossa!
— E por que você não fugiu? — inclino a cabeça analisando as
feições da morena.
— Porque não negaria ficar perto de um anjo-demônio gostoso
pra caralho. — Ela pisca. Direta. Admiro isso, sem rodeios.
Ela é linda e está também gostosa pra caralho com este
macacão vermelho apertado nas coxas revelando suas curvas
torneadas e a bunda.
Cara! Que bunda…
Eu fiquei a noite toda imaginando como seria apertar na junção
entre a coxa e o quadril, afundando meus dedos na carne macia.
Ela é linda… e sabe disso.
O lance de ter meus valores quanto à virgindade não significa
castidade absoluta.
Sim. Sou o último cara popular virgem da espécie, ou único.
Acredite! Ou não… pois nem minha mãe acredita.
Foda-se.
Posso chegar até a segunda base hoje com a morena, só
preciso mantê-la com as mãos para si. Se a química for boa, o que
não duvido, quem sabe outro dia não avançamos um pouco mais?
Sorrio torto e retiro minha meia máscara que ainda estava em
meu rosto sobre os olhos.
— Anjinho… — ela lambe os lábios, — eu já sabia que você
era um espetáculo, mas assim… assim é irresistível. — diz
enquanto caminha para mim e enlaça meu pescoço com ambas as
mãos.
Desço meu rosto e roço o nariz em sua bochecha, exalando
seu perfume adocicado. Deslizo até seus lábios carnudos e seguro
sua nuca, posicionando sua cabeça para conduzi-la num beijo
suave. Ela avança já querendo tocar minha língua e eu a paro,
saboreando as fibras de sua boca, sugando vagarosamente.
Brina se contorce em meus braços querendo aumentar o
contato. Eu a seguro, e ela rosna. Sinto-me domando uma fera.
Pressiono-a junto do meu peito, mantendo-a imóvel e, antes de
invadir sua boca, vou até a curva de seu pescoço, depositando
beijos molhados, arrastando a língua e assoprando a pele quente.
Novamente ela tenta se libertar e quando percebe ser em vão,
aproveita a pressão que faço entre nossos corpos e aninha sua
boceta em uma das minhas coxas, friccionando seu centro para
cima e para baixo. Porra de mulher! Se não dou o que quer, ela
toma.
Volto para sua boca mantendo a pequena tortura e puxo seu
lábio inferior entre os dentes. A morena arfa, não sei se derrotada
ou por tesão mesmo. Encaro seus olhos escuros como a noite e me
perco na devassidão que transborda deles. Ela é puro desejo e seu
corpo o paraíso da luxúria.
Fecho seus olhos com as pontas dos dedos e finalmente
invado sua boca com minha língua. Ela geme e me recebe com
lambidas e chupões em meus lábios. Deixo-a conduzir o beijo que
tanto quer para conhecer seus movimentos e estudar mais quem é
Brina Heinz, a garota petulante e sem medo.
Sua boca assume um frenesi e o vulcão que existe dentro
dessa mulher parece entrar em erupção conforme ela chupa e roça
sua língua na minha, mantendo um ritmo ensandecido do quadril
que sobe e desce em minha coxa. Sinto o calor de sua boceta
mesmo entre os tecidos de nossas roupas.
Levo minhas mãos ao seu quadril e afundando meus dedos na
carne de sua bunda deliciosa, ajudo-a no movimento esfregando
sua feminilidade apenas em uma das minhas pernas. Meu pau
esperneia em minha cueca com a cabeça melada que raspa em
meu abdômen enquanto conduzo Brina até sua liberação.
Ela se perde em minha boca, então retomo o controle que
havia lhe dado, beijando-a de volta com a mesma voracidade que se
esfrega em mim.
— Me leve para algum lugar… — ela diz em meus lábios.
Tento retomá-los, mas ela insiste e fala, arfante: — Me leve para
algum lugar e me fode, Wil. Eu quero você dentro de mim.
É o estopim para meu senso retornar ao meu cérebro, ausente
de sangue. Não… não queria que acabasse.
Reduzo o ritmo dos nossos corpos e cedo o aperto que meus
dedos estavam em sua bunda, olho para seus lábios inchados e
molhados.
Por que ela foi pedir isso? E justo agora que estava tão bom.
Ela é tempestuosa e interessante. Eu queria mais de Brina.
Contudo, ela quer algo que não é dela.
Poderia ser…
Poderia?
Pelo que ouço a seu respeito, ela não quer um relacionamento
sério.
A morena é uma mulher linda e gostosa que qualquer homem
gostaria de foder.
Mas, eu… eu não.
Eu quero… eu quero alguém para dividir mais que apenas
fluidos por uma noite. Eu quero alguém que me queira por quem eu
sou e não por aquilo que eu tenho por fora, como seria, agora, o
caso de Brina, muito menos por quem só me olha pelo sobrenome
que carrego.
Meu corpo berra procurando seu contato. Porém, minha mente
me empurra para longe. Ela não quer o que posso dar e não posso
entregar o que guardo para mim. Só um oral é pouco para ela.
Eu não estou guardando minha virgindade para alguém. Eu
estou guardando minha primeira vez para acontecer quando eu
quiser e estiver com a pessoa certa. Não para ser um rompante de
uma noite.
Não.
— Não… — sussurro e balanço a cabeça negativamente num
movimento sutil.
Brina se retesa em meus braços.
— Não, você não quer ir para algum lugar? É isso? — Ela
tenta sorrir.
— Não… eu não vou foder você. — respondo, liberando-a de
vez de mim.
— Ma-mas você tá de pau duro, Wil. Você me quer. Eu senti.
— ela justifica apontando para minha virilha, com uma expressão
incrédula.
— Eu não disse que não te desejo, Brina. Eu disse que não
vou te foder. São coisas diferentes. — Agacho para pegar minha
máscara.
— Você me deseja, mas não quer me foder? Isso não tem
lógica — ela soa indignada.
Merda. Agora vem a parte que ficará ofendida, me xinga e
provavelmente espalhará boatos que sou gay.
Pressiono minhas têmporas com um amargor novo pra mim.
Eu não quero que isso aconteça entre nós.
Não com ela.
Volto-me para a morena, e observo o rosto lindo, desenhado
como uma pintura. Brina possui luz própria e eu gostaria de
conhecê-la mais. Sua impetuosidade e seu toque voraz ocasionou
uma emoção diferente em meu peito. Ela não… penso.
Porém, sua atitude demonstra o mesmo estado de espírito de
todas as outras.
Droga.
Elas não entendem. Ninguém entende.
Brina empurra meu peito e deixo o impulso fazer meu corpo
cambalear para trás. É sempre assim. Eu não me oponho, pois
assim sinto que as ajudo a controlar um pouco a raiva que sentem
de mim.
Não rejeito as garotas. Pelo contrário, eu as beijo e gosto do
toque até certo limite. O que nunca é suficiente.
Brina rodopia e caminha alguns passos para longe, mas para.
Ela vira o corpo para mim e me fita com um olhar ávido.
— Por que você não quer me foder, Will?
— Você não entenderia — devolvo, mirando o chão.
— Tente.
Bufo resignado e chuto uma pedra invisível, colocando as
mãos nos bolsos das calças.
— Eu não quero alguém só por uma noite. Eu quero mais. —
Ergo a cabeça para encará-la. — Não me vejo fodendo alguém, pra
depois não ser mais nada para a pessoa.
Ela leva uma mão ao queixo em posição de pensadora,
enquanto que a outra circula sua cintura. Brina me estuda como se
eu fosse um animal raro.
Em dois passos já está próxima a mim como um felino
espreitando sua caça. O lance aqui era para ela ser a caça, lembra?
Afasto-me um pouco, mas ela me surpreende levando uma
mão ao meu rosto e acariciando com as pontas dos dedos.
— Isso é lindo, Will. E eu respeito. — Sua voz não é mais
agressiva.
— Obrigado. — Sai fácil. Será que teríamos uma chance de
nos conhecer?
— Só que neste exato momento estou puta da vida com você
porque essa sua ideia é um empata foda do caralho. Cara, eu quase
gozei! — reclama.
— Podemos continuar de onde paramos, só não até o fim. —
pontuo, enlaçando sua cintura.
— Melhor não anjinho, se continuar não vou parar. — baixo
meu olhar e ela segura meu rosto. — Ei… tá tudo bem. Vou levar
esta bocetinha aqui para o vibra dela. Só me ajuda a encontrar o
melhor caminho para voltar. — Brina sorri.
Um sorriso verdadeiro sem raiva, sem rancor, sem sentir-se
rejeitada.
Acabei sendo ingênuo demais nesta interação. Claro que a
rainha da petulância jamais se sentiria rejeitada. Uma sensação
estranha de ter meu estômago subindo e descendo em meu torso
somatiza com a euforia por ainda tê-la em meus braços.
Assinto com a cabeça e pego sua mão, entrelaçando nossos
dedos, conduzindo-a para fora da floresta.
Essa morena acabou de ficar ainda mais interessante. A
vontade de experimentar mais do seu corpo me entorpece, fazendo-
me querer pela primeira vez seguir adiante.
O problema será descobrir se Brina terá paciência e se
contentará com aquilo que posso dar.
O treino hoje foi tranquilo e sem maiores turbulências, já que
Maggie passou boa parte no banco. Na verdade, o treino inteiro ela
passou no banco. Participou apenas dos exercícios de aquecimento.
A treinadora Rivers passou algumas jogadas ensaiadas que
vi um dos times da liga aplicar no jogo do final de semana passado.
Ela disse que se elas conseguem, nós também. E depois de uma
hora de tentativas do engana e pega a bola, conseguimos finalizar
com a bola no gol e um sorriso estampado no rosto da Sra. Rivers.
Assim que saio do banho, estranho que as garotas já estão
de partida. Nunca fui uma das últimas a sair do vestiário. Eu devo
ter demorado no banho sem perceber.
Alcanço o corredor onde fica meu armário com uma toalha
enrolada no cabelo e outra ao tronco, depositando o shampoo e
condicionador no banco de madeira comprido ao centro. Separo
minha calça jeans, top e camiseta branca sem gola, quando procuro
por uma calcinha limpa, adivinha?
Não encontro.
— Merda — resmungo entre os dentes e um som do
alumínio dos armários sendo comprimido chama minha atenção.
Olho por cima do ombro e os dentes brancos saltam no sorriso
presunçoso do Falling Angel calado me observando.
Se não fosse o fora que me deu durante a Caçada, poderia
jurar que o sorriso contém um nível hard de malícia. Contudo, após
sua confissão de viver a versão Cinderela inversa, contenho-me em
só imaginar o corpo esculpido em meus sonhos.
Esse cara deixou claro que não quer ir para minha cama.
Então…
— Já não te disseram que é feio cobiçar a mercadoria que
não quer levar? — provoco-o, imitando o sorriso.
— E quem disse que não quero levar?
Minha sobrancelha esquerda ergue-se em desafio. Ele me
encara e suas mãos que antes estavam em seus bolsos sobem e
cruzam sobre o peito.
Will vasculha meu corpo minuciosamente, deixando o calor
de seu desejo explicito a cada movimento de suas irises
fluorescentes na epiderme exposta.
A saliva engrossa em minha boca e mal consigo engolir até
que finalmente a varredura termina em meus olhos.
— Se bem me lembro, anjinho… foi você quem quis parar a
brincadeira na noite da Caçada. — Empertigo, dando um passo a
frente.
— Eu só disse para não irmos até o fim, Bri. Não que não
poderíamos nos divertir — responde, audacioso, descruzando os
braços e dando outro passo diminuindo mais a distância, onde
apenas o banco nos separa.
— E qual seria o significado de diversão para o Falling Angel
com voto de castidade? — inquiro-o com o queixo erguido. Ele solta
um riso sem humor, e percebo, tarde demais, sua mão
desmanchando o nó da toalha que cai ao solo, revelando minha
nudez.
A atitude é tão inesperada que não contenho a cara de
espanto, muito menos seu próximo movimento ao retirar a toalha
dos meus cabelos, dispensando-a ao lado da outra.
Seus olhos não deixam os meus por um segundo, enquanto
seus dedos traçam um caminho suave e lento do meu pescoço até
meu seio direito, arrepiando a pele conforme os bicos ficam
intumescidos pedindo por atenção.
Will roça o polegar ao redor da auréola, causando a ligação
direta do tesão do meu mamilo com a musculatura da minha vagina
que se contrai como o tic-tac do relógio.
— Respira… — Sinto o calor do seu hálito em minha boca.
— Eu posso ser anjo e casto, mas também tenho a outra parte de
um Falling Angel. Quer conhecer, Bri? — O ar retoma meus
pulmões rápido demais e acabo me apoiando em um joelho sobre o
banco, fazendo nossos corpos se unirem. Busco por apoio com
minhas mãos em seu peito, tocando os músculos esculpidos. Will
toma como um convite e enfia o rosto na dobra do meu pescoço,
empurrando para trás meus cabelos molhados. — Quer que eu te
toque como nunca foi tocada?
Estremeço a cada palavra que emana com a voz aveludada
e rouca ao pé do meu ouvido, meu corpo correspondendo ao
mínimo estímulo que este cara faz de um modo novo. Isso nunca
aconteceu com nenhum outro.
Will está segurando meu seio sentindo o peso na palma de
sua mão, deslizando delicadamente as pontas dos dedos e seus
lábios passeiam por meu maxilar até alcançar a minha boca.
Ele não me beija. Só espera.
Que caralho, o que ele está esperando?
— Peça! — Sua voz de rouca e sedutora transforma-se em
um comando certeiro e rude, o som reverbera direto para minha
boceta que fica mais melada. Sempre pensei que a história de ter a
excitação descer pelas pernas era mentira, mas agora… Cara! Se
estivesse de calcinha teria que ficar sem de qualquer jeito. — Se
não pedir, não vou te tocar.
— Me toque… — sussurro. Porra, mal me reconheço, de
quem é essa voz manhosa, galera? É minha? — Por favor…
anjinho. — Sorrio na última palavra, mantendo um pouco da Brina
sagaz. Me faça pedir, mas ainda assim, será um anjinho pra mim,
penso.
Ele ri antes de chocar nossas bocas com toda vontade
acumulada naquela noite. O vibrador não foi suficiente. Eu me
masturbei duas vezes pensando em como seria ter a boca de
Willian King em mim, e mesmo assim não foi satisfatório.
Eu queria a realidade, e esse beijo esfomeado me diz
exatamente o porquê.
— Eu vou te provar que o anjinho tem o lado demônio
intacto, gostosa. — Will ultrapassa o banco e me levanta do chão,
minhas pernas serpenteiam ao redor de seu quadril e sinto o baque
frio do armário em minhas costas. Nossos corpos se moldam em
perfeição, conforme ele sobe e desce meu corpo, sua ereção
destacada no jeans roçando em minhas dobras abertas.
— Se me deixar na mão de novo, eu te castro — murmuro
entre os beijos.
— Não vou, baby… não vou.
Will me segura com facilidade espalmando as mãos em
cada nádega, em seguida me deita sobre o banco. Suas mãos
exploram meu corpo apertando a cintura e subindo para meus seios.
Sinto nosso beijo diminuir a intensidade conforme ele vai
ganhando meus gemidos. O anjo-demônio beija meu queixo em
direção ao ventre, parando sobre um mamilo e acariciando-o com a
língua para depois chupar com força.
A boca de Will me consome e a devassidão invade meus
sentidos. Gemo, me contorço sem pudor, arqueando as costas
enquanto ele mama um seio e o outro, mordendo e lambendo
avidamente.
Minha boceta está em prantos contraindo-se
descompassadamente com a voracidade implantada nos beijos
lascivos que recebo em meu abdômen.
Will mordisca a região do meu umbigo até ir direto para
onde preciso. Primeiro seus dedos abrem meus grandes lábios e
vejo o sorriso de satisfação por constatar o quanto estou molhada.
Ele me fita com os lábios erguidos ao canto e assopra sem desviar o
olhar.
Mordo o lábio inferior contendo um gemido e a ânsia de ter
sua boca em minha boceta. Fecho os olhos, e a ardência de uma
mordida me faz abri-los na mesma hora.
— Fica de olhos abertos, gostosa. Quero que veja quem
está te chupando. — De novo o comando. Jurava que Willian King
seria obediente na cama, mas eu é que estou sendo, pois não tiro
meus olhos do rosto enfiado entre minhas pernas.
Meu anjinho arreganha ainda mais minhas dobras
encontrando meu clitóris inchado de tesão e abocanha sem medo
de ser feliz. Ele chupa com força, do mesmo modo que mamou
meus seios com intensidade.
A ponta de sua língua encontra o botão mais sensível
quando Will morde meu montinho de nervos e passa a vibrar e
chupar numa sequência que esvai qualquer sanidade do meu corpo,
já que grito sem vergonha de ser ouvida.
O formigamento subindo pelo interior de minhas coxas
indica o orgasmo preeminente.
— Will… eu vou…
E para perder completamente o juízo, Will me invade com
dois dedos de uma vez, curvando as pontas para cima até o fundo
alcançando com maestria meu ponto G, que precisei mapear tantas
vezes para todos os caras que transei.
Então, grito. Grito seu nome e Will segura meu corpo no
lugar, deliciando-se com minha excitação, lambendo e sugando o
prazer explosivo que está me proporcionando com o rosto sendo
apertado por minhas coxas.
Ele deposita pequenos beijos na lateral de minha virilha,
antes de subir por meu torso com o queixo lambuzado e me fazer
experimentar meu gosto em seus lábios.
O beijo agora é mais calmo, com leves chupadas de lábios e
o roçar tímido das línguas.
— Vou ter que subornar mais vezes o guarda do vestiário —
Will diz, sorrindo.
— Você fez o quê? — Ele continua rindo e beijando meu
pescoço. — Você deu dinheiro para o John?
— E vou ter que aumentar o cachê para ficar calado depois
dos seus gritos. — Will me dá um selinho e mira meus olhos. —
Valeu à pena esperar por uma hora até conseguir te ter sozinha.
— Você subornou as garotas do time também?
— Nah… Pedi ajuda do Henry nessa. A maioria vai embora
rápido de qualquer forma, e quem demorou um pouco mais, meu
amigo deu um jeito. — Ele dá de ombros.
— Os Falling Angels são muito persuasivos — concluo.
— Quando queremos muito algo, sim.
— E o que você quer, Will?
— Eu quero você, Brina Heinz. — Ele suga meu lábio
inferior e puxa entre os dentes. — Saia comigo?
— Tipo um encontro? — indago, estudando-o. O que esse
anjinho quer de mim?
— É… — Ele acena. — Tipo um encontro.
— Eu não sou boa em encontros.
— Então como amigos?
— Amigo que me deu o melhor oral de todos? — Sorrio para
ele, que devolve com outro convencido.
— Tipo um amigo que irá fazer mais coisas com seu corpo
melhor que os outros — Will afunda o nariz em meus cabelos e inala
profundamente.
— Mas sem o seu meninão conhecer a minha menininha?
Isso? — Não aguento e o provoco erguendo o quadril em sua
ereção dura. Ele solta um gemido. — Você terá um forte caso de
bolas azuis, Willian King.
— Você pode devolver o favor de hoje outro dia. Vou adorar
ter sua boca em volta do meu pau — ele cochicha em meu ouvido,
fazendo-me arrepiar com a ideia. Sentir o pau de Will durante o
amasso na clareira e aqui no vestiário, só me mostrou o quanto eu
quero prová-lo.
— Você faz tudo, mas só não penetra. Qual o propósito
disso?
— Não sei explicar… é como se fosse o limite que quero
dividir só com uma pessoa — diz e se levanta, puxando-me para
seu colo.
Penso na sua boca e no seu toque, mesmo leve, que causa
toda essa eletricidade em meu corpo. Will roça o polegar em minha
bochecha com carinho aguardando minha resposta.
— Eu posso conviver com isso. Mas, se começar algo, terá
que me fazer gozar — aponto, esclarecendo que não irei mais
reabastecer meu arsenal de pilhas para o vibrador lá de casa.
— Eu também posso conviver com isso — responde,
sorrindo e segura minha nuca guiando nossas bocas para outro
beijo delicioso.

Abro e fecho a gaveta do guarda-roupa, procuro o tecido


jeans desbotado mais uma vez e nada. Elisa deve ter pegado de
novo minha minissaia e não devolveu para o lugar.
Droga.
Não sei se fico feliz por minha melhor amiga finalmente
estar namorando, ou se fico puta da vida por perder minhas
melhores roupas de sair.
Lisa merece romance após o fiasco do seu primeiro
relacionamento. Vamos dizer que minha amiga ganhou todas as
primeiras vezes com um único cara, inclusive a parte desagradável
de ser traída. Pensei que nunca mais fosse sair com alguém, quanto
mais namorar.
Cá estamos nós, duas universitárias com seus respectivos
boys. Repito: estou feliz por minha amiga, mas gostaria que minhas
roupas permanecessem em minha gaveta.
Bufo frustrada, ainda na procura de uma peça de roupa que
aprove.
Hoje Will disse que eu teria uma surpresa, e como não sei
aonde iremos, eu queria sentir-me gata com a saia que mais gosto,
meia calça preta e as botas de cano alto.
Tudo ficaria perfeito e num estilo esportivo com a saia jeans
mais despojada, se não fosse Elisa sumir com minhas roupas. Arg!
Vou levar minha amiga às compras e com o cartão de
crédito do Falling Angels n.º 1, pode contar com isso. Parece que o
cara quer desfilar com Elisa para os quatro cantos e exibi-la como
sua namorada.
Se não deixasse minha amiga com aquele sorriso no rosto
toda vez, juraria que Alec está usando-a para provocar alguém.
Vou colocar o short jeans com o sobretudo e pronto. Caso o
lugar seja sofisticado, mantenho o casaco.
Fito o visor do celular para conferir o horário e me dou conta
de que tenho apenas três minutos antes de Will aparecer. Passo o
gloss apressada e saio como um tiro do quarto.
Ainda não tive coragem em assumir que estou saindo com
ele há mais de duas semanas. Um recorde desde a quinta série
para mim. Tudo bem que na época não podia nem chamar de
namoro, já que só segurava na mão de Tony. Mas escrevi seu nome
com o meu por um ano no caderno. Então, sim! Era um
relacionamento.
Pulo as escadas até a calçada num salto, agradecendo os
saltos baixos e entro no Jeep preto estacionado me aguardando. O
perfume de Will misturado com seu cheiro no interior do veículo me
acolhe em uma bolha confortável. Isso é estranho. Estranho demais.
— Oi. — ele segura meu rosto com a palma como sempre
faz e encosta nossos lábios pressionados, depois suga o inferior em
sua boca. Meu corpo estremece, já prevendo o que a noite promete.
— Oi. — Minha voz sai baixa. Solto um suspiro e ele volta
para seu lugar acionando a ignição e nos levando para fora do
Campus.
Sua mão esquerda ocupa o lugar habitual sobre minha coxa,
quando adentramos a avenida. O fato que eu aguardava este toque
de sua mão me faz mirar o dorso branco com as veias saltadas
sobre minha pele coberta pela meia calça escura. Um contraste que
pode ser notado mesmo se fosse pele sobre pele.
Café com leite.
Sorrio. Adoro café com leite.
— Por que está rindo?
— Hum? — murmuro a pergunta. Eu fui pega no
pensamento bobo. Não me contenho e deixo meu rosto
transparecer a sensação do meu interior. — Somos tão diferentes,
mas…
— Mas nos completamos… — ele me olha pelo canto do
olho para não tirar a atenção da estrada.
— Somos café com leite.
— Eu adoro café. — Will sorri e pressiona minha coxa.
Ajeito-me no banco do passageiro, sentindo-me mais quente com o
aperto de seus dedos em minha carne.
— Aonde vamos?
— Para casa. — Me olha apreensivo, espiando minhas
roupas. — Pode ser? Pensei em ficarmos no quarto, pedir um
lanche e assistir a um filme. Só… só ficar juntos.
Demoro um pouco para responder, pois quero deixá-lo na
saia justa. Eu não seria eu, se facilitasse tanto.
— Mas se quiser sair, mudo os planos. — ele diz rápido,
ocupando meu silêncio. Sorrio satisfeita.
— Ficar em casa está ótimo. — Enrosco-me no braço
estendido em minha perna e apoio a cabeça em seu ombro. —
Estou cansada por conta do treino. Não queria sair. Você sempre
adivinha o que quero.
Ele solta o ar que havia prendido com um riso frouxo.
— E mesmo assim continuo sendo seu segredo. Até quando
você irá me esconder de suas amigas?
A pergunta me deixa sem reação. Posso estar receosa em
assumir nosso “relacionamento”. Até por que Will é o tipo de cara
que eu sempre fugi pelo simples motivo de cumprir todas as
exigências do meu pai.
Passar uma noite é uma coisa, seguir adiante, é outra. Eu
criei uma aversão a tudo o que Sr. Heinz almejava para mim. O
namorado perfeito, com o sobrenome perfeito e a herança perfeita,
entrava no pacote.
Só que Will é diferente. Não quero desistir dele para fazer
pirraça ao meu pai. Não posso perder algo tão precioso. Meu
anjinho é luz, a minha luz.
Ele vale à pena.
Essa cobrança que veio inesperadamente. Eu não esperava
que ele me cobrasse revelar o que está acontecendo entre nós tão
cedo.
Tão cedo?
Significa que estou cogitando em continuar?
— Baby?
Acho que minhas dúvidas fizeram meu corpo retesar e
minha habilidade de falar ser jogada ao mar. O carro para e verifico
que já chegamos à Mansão Henderson.
Will segura meu rosto entre as mãos e solta um suspiro
quando mira meus olhos.
— Brina, o que está acontecendo entre a gente é novo para
mim também. Mas quero tentar seguir adiante. Eu acordo
imaginando o seu sorriso todas as manhãs. Me pego pensando em
você o tempo todo. Se acho algo engraçado, penso como seria ouvir
sua risada. Sinto sua falta no momento que você sai dos meus
braços. — Ele envolve meu corpo e o puxa para sentar em seu colo.
— Sei que é difícil lidar com meus limites, mas… ainda não estou
pronto para acabar.
— E-eu…
— Diga que não sente o mesmo — Will me inquire, roçando
a barba por fazer em meu pescoço. — Diga que não pensa em mim
quando vai dormir e como não sente a minha falta. Diga.
Ele segura meu rosto para que não desvie o olhar.
— Eu sinto. — Minha voz sai baixinho. — Eu sinto, anjinho.
Minha declaração é a permissão para Will me beijar, lenta e
minuciosamente, traçando a língua pelo contorno e cantos da boca,
numa dança lasciva que me faz ofegar com o desejo amontoado da
virilha até meu cerne.
O anjo-demônio conduz nossos lábios num caminho
tortuoso de luxúria, explorando e causando redemoinhos em meu
baixo ventre. Sua língua me invade e me consome ao mesmo
tempo. Nunca fui beijada como Will me beija. Nunca senti tanto
tesão só em beijar, e muito menos fiquei tão excitada apenas com o
entra e sai do músculo da fala roçando em meus lábios.
Willian King é perfeito em tudo. Ele praticamente estudou
cada detalhe dos meus gestos e hoje segue à risca tudo o que me
provoca e atiça. Sem erros, sem falhas… De anjo, só a cara.
— Vamos subir, baby. Quero beijar você inteira hoje. —
Minha boceta, como um alerta, se contrai sabendo o que Will pode
fazer com ela.
Só consigo menear a cabeça e segui-lo calada. Engraçado
como ficar com o anjo-demônio calado me fez parecida com ele,
não é mesmo?
Quando alcançamos o seu quarto, meu desejo vai além de
ser domada por seus toques e carícias. Mas entendo a reação de
Will todas as vezes que chegamos ao seu limite. Passei a respeitá-
lo. A mulher que receber a dádiva da sua primeira vez será a mais
sortuda deste mundo.
E então, minha boca fica amarga por pensar em Will com
outra pessoa. Balanço a cabeça para afastar a queimação no
estômago nada bem-vinda.
Hoje, ele é meu e irei aproveitar até onde ele quiser me dar.
Fecho a porta atrás de mim e me jogo nos braços do meu
anjinho que sorri de volta, não entendendo o que quero fazer.
— Quero sentir você. Não vou além do seu limite, prometo.
Mas quero sentir seu gosto — digo, e ele assente, permitindo-me
abrir seu zíper enquanto tira o suéter puxando por trás das costas
sobre a cabeça.
— Eu preciso te ver… — ele fala, jogando meu sobretudo e
tirando minha blusa, deixando-me apenas com o sutiã de renda
branco. Ele está nu, tirando minhas botas e puxando meu short com
a meia calça. Agradeço mentalmente a calefação da mansão ser
extraordinária para manter o frio lá fora.
Willian não me deixa conduzi-lo na cama. Mesmo não
consumindo o ato, ele é quem comanda e direciona cada
movimento. Ele é o único até nisso, pois até hoje não havia
permitido que homem algum me comandasse.
Nossas bocas se unem num beijo ardente, com lábios e
língua, sugando e dançando com voracidade. Temos fome um do
outro. Will nunca se sacia e eu muito menos. Eu quero ser a mulher
a senti-lo pela primeira vez. Eu quero ser a garota especial que ele
espera. O pensamento invade minha mente gritando como um alerta
vermelho.
Will me empurra para fora da cama morosamente.
— Eu quero você de joelhos, baby. Aqui. — Ele senta-se na
beirada da cama comigo entre suas pernas de joelhos e o rosto na
altura do seu pau. — Me chupa, Bri. Chupa meu pau com essa boca
gostosa.
Sorrio e seguro a base grossa com as veias saltadas e a
cabeça rosada, lustrada e pingando com o pré-gozo. Dou uma
lambida lânguida da base até a ponta, fazendo o movimento por
toda a circunferência. Will ofega e sua feição se contrai com o
prazer da antecipação.
Giro a língua ao redor da cabeça, babando, deixando o
líquido escorrer até minha mão que aperta mais e rodopia com
pressão, sentindo os pelos pubianos aparados. Depois que ouço um
gemido rouco, abocanho a ereção de uma vez até onde alcanço,
respirando pelo nariz para acomodá-lo em minha garganta.
Meu anjinho se remexe um pouco, então levo a outra mão
para suas bolas, massageando e espalhando minha saliva no
processo. Começo lentamente o movimento de vai e vem,
encarando o rosto de Will que está com as sobrancelhas
tensionadas e a boca semiaberta, puxando o ar em pequenas
lufadas entre os dentes.
Ele é lindo. Minha boceta pinga de desejo com a visão do
homem gostoso gemendo e deslizando o pau suculento em meus
lábios.
Apalpo mais os testículos, brincando e sentindo a textura da
pele fina e os grãos entre os dedos. Passo a ditar a sucção de modo
mais intenso, e acelero, indo e vindo até o fundo da garganta
conforme os sons emitidos por Will, afagando meu ego.
Meu anjo leva uma mão até meu seio e pressiona o bico
com o indicador e o polegar. Na sequência, Will eleva a canela entre
minhas pernas e passa a roçar minha intimidade. Encaro-o,
surpresa. Ele sorri.
— Esfrega essa boceta gostosa na minha perna, baby. Me
mostra o quanto está molhada chupando meu pau.
E eu faço. Sigo o movimento subindo e descendo a boca na
ereção e esfrego-me ensandecida, umedecendo os pelos da canela
de Will com minha excitação.
Ele aperta mais o bico do meu seio, até a dor misturar com o
prazer. Abocanho e chupo com mais força. Will geme meu nome e
esporra em minha boca. Sinto o líquido quente escorrer em meus
lábios, ele percebe que estagnei e então passa a roçar a canela em
minha intimidade para continuar até alcançar o meu ápice.
O anjo-demônio aperta agora meus dois mamilos, a onda de
prazer me atinge e ajoelhada aos pés do meu príncipe gozo em sua
perna, sem pudor, sem vergonha, sentindo o desejo sendo satisfeito
numa explosão de sensações novas.
Will me puxa para seus braços e, como de costume, após o
orgasmo, me beija devagar, com carinho, segurando meu rosto e no
silêncio mostra-me com o olhar o quanto sou importante para ele.
Mesmo não sendo ainda a garota especial.
É fato. Willian King me estragou para todos os outros
homens da face da Terra.
Consequência: ou eu me torno a sua princesa de uma vez,
ou vou começar a chupar boceta.
Hoje eu mereço um prêmio. Juro. Estou 20 minutos
adiantada e com folga para chegar à faculdade.
Não disse? Orgulho.
Ou talvez minha fuga de casa já que sou a única em um
relacionamento baunilha.
Baunilha igual sem sexo, ok?
Elisa e Alec seguem firmes e fortes como o casal mais
incerto que deu certo.
E, agora, temos a novidade do ano — ou do século —:
Debby e Henry estão juntos.
Eu sei… eu sei… loucura, não é mesmo?
Mas, se entendi direito, Henry procurou por Debby por um
ano, acreditando que a garota que havia beijado era loira e… não
me entendam mal…
O cara pensava que tinha beijado uma garota como outra
qualquer da faculdade na primeira Caçada de Debby. Então, ele
nem sequer imaginaria que poderia ser nossa pequena gênio que se
escondia no formato gnomo de jardim.
E não, não está errado o verbo no passado.
A nerd se escondia do mundo, pois bastou o fenômeno
Henry acontecer para a lagarta sair do casulo numa linda borboleta.
Tudo bem que ainda é difícil sofisticá-la. Porém, o fato de
não usar roupas maiores do que ela, já é um salto e tanto.
Agora, voltando à minha saída estratégica logo cedo, antes
que os pombinhos acordassem, era para não ver a cara de bem
fodidas das minhas amigas enquanto eu estou há mais de três
meses sem saber como é um pau enterrado em minha boceta.
Sim… isso mesmo… três longos meses de namoro baunilha
com Will.
Já senti a língua do Falling Angel calado, juntamente dos
seus dedos em todos os meus orifícios, mas ainda está difícil chegar
ao que quero.
Pensei em forçar um pouquinho mais este fim de semana.
Talvez um espartilho com cinta-liga lhe dê algum incentivo.
Arg!
Respiro fundo e pego minhas chaves da bolsa, ainda na
calçada do prédio. Meu carro passou a noite na rua, porque Alec e
Henry resolveram dormir em nosso apartamento.
Folgados?
Nem me diga.
Cheguei atrasada para pegar minha vaga na garagem do
prédio. Eles não entendem o conceito de que aqui é a minha casa,
minha garagem.
Nãaao… eu estava com Will e eles deduziram que eu
passaria a noite por lá, mas meu querido anjinho me deu todas as
dicas para que eu pegasse o caminho de casa.
Simplesmente por quê? Adivinha?
Não. Eu não forcei a barra. Bom… talvez um pouquinho.
O barulho do motor de outro veículo estacionando atrás do
meu, chama minha atenção. Um assobio de apreciação para mim
faz-me rir do idiota que provavelmente lançará uma cantada antes
que eu abra a porta do motorista.
Ignoro sem problemas. Posso não estar transando, e nem
ter um nome certo para o que tenho com Will, mas dar atenção para
outro cara parece errado.
— Atravessei o país e dirigi 200 km para uma recepção fria
dessas? — A voz conhecida acalenta meu peito no instante que
vibra em meus tímpanos. Meu olhar sobe com cautela para ter
certeza que não é uma brincadeira do meu cérebro.
Primeiro vejo os tênis All Star, a calça cargo de lavagem
clara, o casaco de couro se ajustando aos ombros largos, que
lembro onde e quando compramos juntos. Mais um pouco e busco
os olhos cor de mel, iguais aos meus, me encarando. Suspiro e
deixo um barulho esquisito de ansiedade sair da garganta, seguida
do meu sorriso.
Num rompante me atiro nos braços de Mike, que precisa dar
um passo para trás e se equilibrar para nós dois não nos
estatelarmos ao chão.
— Wow! É disso que estou falando!
— Mike! — berro. Seguro seu rosto e beijo meu primo num
selinho casto. Abraço-o apertado e volto a encará-lo ainda em seus
braços. — O que faz aqui?
Outro carro está parado no centro da rua e com a surpresa
da chegada de meu primo, não percebi sua aproximação.
— Mas que porra! — Miro a janela do passageiro aberta do
Jeep e os olhos cintilantes de Will observa a cena dos meus braços
ao redor do pescoço de Mike. Provavelmente, ele também
presenciou o beijo.
Ai, droga!
— Will? — sussurro, sem saber como agir. Olho para Mike e
de volta para ele, vejo-o torcer as mãos e apertar o volante até suas
juntas esbranquiçarem. — Não é o que você está pensando!
— Não? — questiona incrédulo.
Alguém resolve justamente nesta hora buzinar para que Will
saia do meio da rua. Ele puxa o ar e solta, exasperado. Balança a
cabeça com o maxilar tensionado e os lábios crispados.
Outra buzina. Recebo mais um olhar de desaprovação,
antes que ele arranque com o carro, esbravejando algum palavrão.
— Will! Will! — corro na mesma direção e chamo-o, vendo a
traseira do Jeep se afastar. — Droga!
Viro o corpo de volta para Mike que me fita com as mãos
espalmadas para cima, insinuando que não faz ideia do que
aconteceu.
Caminho até ele, arrastando um pé na frente do outro.
— Namorado?
Abraço meu corpo, escorando-me no capô do meu carro e
abaixo a cabeça derrotada. Will tomou suas conclusões sem nem
me ouvir. Que porra!
— Acho… acho que não mais.
— E ele não faz ideia da existência do primo gostoso aqui?
— encosta ao meu lado e me puxa pra ele, passando um braço
sobre meu ombro.
— Ainda não tive tempo de contar tudo sobre a família. —
rio sem humor.
— Então não é sério — conclui.
— Claro que é. — Não é?
— Se fosse sério, você deveria contar sobre o cara que te
ensinou a ser a melhor atacante do estado. — Aponta para o peito,
e eu empurro-o com o ombro.
— É novo… — Suspiro. — E sim. É sério. Eu gosto do Will.
— Então, você terá que conversar com o loirinho sobre mim,
Bri. E… deixar claro que sou gay. Talvez a última informação ajude
mais.
Viro o pescoço na direção em que Will seguiu acreditando
que eu estivesse com outra pessoa. Será que ele me conhece tão
pouco assim?
— Ele deveria ter ficado e conversado — retruco.
— Você disse que é novo, Bri. Sem contar que olhe pra
mim. — Estufa o peito. — Eu intimido qualquer um — brinca.
— Pare com isso… — Remexo-me no seu aperto de urso.
— O que faz aqui, Mike? E por que não me avisou que viria?
Agora é a vez do meu primo puxar o ar e soltar para
começar a falar.
— Eu não vim de Washington só pra te visitar, Bri. Tinha
negócios do escritório pra resolver na matriz. E aí… — Ele hesita. —
Seu pai me pediu para que viesse conversar com você.
Mike não é da família Heinz, porém meu pai o incumbiu de
ser o ‘cabeça’ no escritório da capital para atender diretamente
casos ligados a crimes do colarinho branco.
Sr. Heinz conseguiu arrastar o sangue de minha mãe para a
advocacia de qualquer forma. Não que a família Ibrahim estivesse
fora da profissão, até porque foi assim que meus pais se
conheceram. Mamãe era uma excelente advogada.
— E o que meu digníssimo pai teria de tão importante para
meu primo favorito me encontrar tão cedo? — ironizo.
Mike se afasta um pouco e parece procurar as palavras.
Isso não é bom.
Que merda está acontecendo?
Ele passa a mão pela nuca e finalmente me encara.
— Bri, eu sei que é repentino pra você. Mas tio Heinz está
saindo com Helena já há algum tempo e ele… bom… ele a pediu
em casamento — diz as últimas palavras rápido demais e tenho
certeza que meu cérebro registrou errado.
— Co-como? — Pisco algumas vezes. — Não! — nego. —
Não! Ele não… — nego mais para mim.
Helena… É a mulher que conheci mês passado como a
nova associada, quando finalmente aceitei o convite de papai para
passar um fim de semana em casa.
Estranhei seu pedido para buscá-lo no escritório no final do
expediente de sexta-feira. Fui até sua sala e lá conheci a noiva de
meu pai discutindo algum dos seus muitos casos com ele.
Não me atentei muito para analisá-la, pois nunca imaginei
que estava sendo apresentada à minha futura madrasta.
Ele fez de caso pensado.
Papai queria que eu a conhecesse. Percebi que ficou
ansioso com minha presença e tentou dizer algo, mas eu o cortei
pedindo para irmos logo, já que estava com muita fome. Helena
desculpou-se por atrapalhar e fez um gesto para ele, que agora
entendo como ‘está tudo bem’.
A mulher não queria impor sua presença para a filha
complicada do namorado. Sr. Heinz tentou por diversas vezes
conversar comigo naquele fim de semana. Mas, como sempre,
esquivei-me. Tinha medo de ser outra tentativa em me fazer desistir
dos meus sonhos.
Ele queria me contar…
Sinto-me tão pequena e imatura. O mundo não gira ao seu
redor, Brina Ibrahim Heinz.
É… a dura realidade bate em minha porta.
— Não é precipitado? — indago. — Eles mal se conhecem.
— Bri… Helena e seu pai já se conhecem há anos.
— Não. Eu a conheci no mês passado. Papai disse que ela
era a nova associada. E…
— Bri, ela e seu pai já trabalham juntos em alguns casos
que possuem os mesmos clientes. Helena costumava ser a maior
rival do escritório.
— E agora é associada? — pergunto em uma careta.
Mike ri e aperta meu queixo.
— Seu pai a conquistou. — Ele desencosta do veículo. —
Vem, te dou uma carona até a faculdade e depois almoçamos
juntos. Pode ser? Vou ficar na cidade até amanhã. Quero rever
alguns colegas.
— Ou você quer ter certeza que estou bem com a notícia?
— Isso também. Você está?
Reflito por alguns minutos na bagunça que meus
pensamentos ficaram depois de constatar a mudança completa no
status que terei na vida de meu pai.
Eu já não sou a única mulher em sua vida.
Antes, eu competia com um fantasma e a sombra da culpa
pela ausência de minha mãe. Agora… agora o que eu sou para o Sr.
Heinz?
Faz diferença? O que eu estou sentindo em dividir o coração
gelado do melhor advogado do estado?
De uma forma torta, eu sempre tive meu pai como um porto
seguro. Mesmo existindo a competição invisível para ocupar um
espaço que jamais seria meu, eu queria ser a pessoa merecedora
de seu amor. Será que ele a ama?
Chuto uma pequena pedra do asfalto e fito meu primo com
olhar preocupado.
— Não sei… — digo baixinho.
— Algo me diz que você precisa, primeiro, resolver o lance
com o loirinho. — Mike balança o queixo para o local em que Will
passou com o Jeep.
Respiro fundo e constato que hoje eu não deveria ter saído
da cama.
— Vamos! Já perdi o primeiro período e ainda dá tempo de
pegar a segunda aula. Depois me acerto com Will.
— Almoço está de pé?
Confirmo com um gesto de cabeça.
— Acho que será mais fácil se Will te conhecer.
Mike contorna seu carro e eu me dirijo ao banco do
passageiro.
— Ele tem algum amigo ou primo? — Ergue as
sobrancelhas sugestivamente.
Rio da brincadeira, mas o olhar insistente de Mike
demonstra que suas palavras não eram tão inocentes assim.
— Sério?
Ele lambe os lábios e assente com um sorriso malicioso. Eu
solto outra risada.
— Desculpe-me, primo. Mas chegou atrasado. Acho que os
outros Falling Angels já foram caçados. — Sento-me ao seu lado.
— Que pena…
— Ei… estamos em Braveton. Com certeza você fará
sucesso com alguém por aqui.
— Disso — ele levanta um dedo para mim —, eu não tenho
dúvidas.
Rimos. Nem eu…

Willian King é o rei quando se trata de se esconder e fugir


de mim. Procurei-o a cada intervalo entre uma aula e outra. Durante
o almoço, antes de me encontrar com Mike e agora estou na frente
da biblioteca após vasculhá-la de cabo a rabo sem sinal do meu
anjinho.
Merda.
Quando temos algum problema, resolvemos. Ele me viu
com uma pessoa e deduziu tudo errado. Agora some para que eu
não possa me explicar.
Meu pé está praticamente quicando o chão
incessantemente, enquanto encaro as portas automáticas da
biblioteca se abrir e fechar conforme um aluno passa após o outro, e
nenhum deles é Will.
— Ainda não o encontrou? — Debby surge atrás de mim de
mãos dadas com Henry, que me olha com cara de poucos amigos.
Will deve ter conversado com ele.
— Gata, ele não quer te ver — Henry solta e me seguro no
lugar para não descontar nele minha frustração.
— Ele entendeu tudo errado — justifico, sem necessidade.
Mas me vejo na obrigação em me defender.
— Eu já contei para Henry que era seu primo, Bri.
— E também que o cara é gay — ele emenda. — Mas, Will
não sabia. Ele está chateado.
— E não está me dando chance alguma de explicar.
Caralho. — Esfrego o rosto e pressiono minhas têmporas com os
indicadores. — Se ele só…
— Você sempre sabe onde ele está — Debby lança para o
namorado. — Will já me contou que não sabe como, mas você é o
único que o encontra na biblioteca.
Henry sorri de lado.
— Eu sou muito bom em encontrar pessoas — afirma.
— Só não foi bom pra encontrar a garota que beijou, durante
um ano — resmungo, indicando a falha por demorar tanto tempo
para saber quem era a fadinha que tanto buscava.
Ele bufa.
— Ande, Henry, diga como consegue e deixe eles se
acertarem — Debby insiste, e ele torce os lábios murmurando algo
em negação.
— Fale logo, antes que eu chute suas bolas — ameaço,
cansada em esperar pela bondade de alguém que tem como apelido
parte demônio.
— Acho melhor atender ao pedido, amor. Eu já medi a
média da velocidade do seu chute e varia de 150 a 180 km/h. Você
não vai querer ficar estéril antes do tempo — A nerd explica minha
atuação em campo para Henry, acrescentando dados técnicos à
ameaça.
Instintivamente o anjo-demônio exibicionista leva as mãos à
virilha.
— Fadinha, ainda nem fizemos o Peter, muito menos a
Wendy pra você brincar com isso — replica.
— Hum? — Inclino a cabeça analisando o casal. Debby
pressiona a testa com uma das mãos.
— Já falei que odeio esses nomes, e não quero engravidar
tão cedo. Agora, fale logo. Até eu quero saber como você consegue,
já que tem conseguido me encontrar mais rápido ultimamente
também.
Ah… é isso. Peter e Wendy? Sério?
Henry suspira derrotado e pega o aparelho celular.
— Não vá brigar comigo, ok? Coloquei no seu telefone
também, porque perdia muito tempo quando você decidia se
esconder de mim — explica, antes de mostrar a tela do aparelho. —
Aqui.
Ele clica em um aplicativo e na hora já identifico do que se
trata. É um mecanismo de busca.
— A sua habilidade é um aplicativo de localização? —
indaga surpresa. — Mas que porra, Henry!
— Eu disse pra você não brigar comigo. Era isso ou eu
passaria metade do dia procurando você e Will.
Ela bufa e retira o telefone de sua mão. Logo, aperta no
desenho destinado ao Will e mostra para mim.
— Aqui, Bri. — Visualizo e gravo o local aproximado que
devo procurar por meu anjinho.
— Valeu, Debby!
— Agora, quanto a você — ouço a voz carregada de
desaprovação da nerd. Observo por cima do olho, ela sacar seu
telefone do bolso. — Trate de baixar o mesmo aplicativo no meu e
configurar para que eu também possa te fiscalizar, senhor sabe-
tudo. Direitos iguais nesta relação — pontua com as mãos na
cintura. Henry pega o aparelho sorrindo.
Balanço a cabeça e pressiono os lábios. Será que eu faria o
mesmo ou apagaria o aplicativo do aparelho do meu namorado?
Namorado…
É isso que Will é meu?
Caminho a passos largos e depois de passar algumas
prateleiras que nem sabia existir na biblioteca, encontro as
madeixas quase brancas do meu anjinho. Ele está concentrado na
leitura de algum livro, nem sequer nota minha aproximação, acho.
Quando me sento ao seu lado, percebo que me enganei. Ele
respira fundo e me encara.
— Bri… — murmura e desvia o olhar, causando uma
reviravolta em meu interior, numa mistura de culpa por ser o motivo
da sua tristeza e raiva por ter fugido de mim. — Acho melhor…
— Não! — Aperto seu braço ao meu lado. — Olhe pra mim,
Will.
Ele demora um pouco, mas logo nossos olhares se
encontram.
— Você realmente pensou que eu te trairia?
— Bri, eu não pensei, eu vi.
— Você viu uma situação e fugiu, sem me dar tempo para
explicar.
— Explicar o quê? Que o cara que te vi enroscada mais
cedo é um affair antigo ou algo assim? Que você foi surpreendida?
Sinto meus dentes rangeram conforme pressiono
inconscientemente o maxilar, a cada questionamento de Will. A
injustiça é uma merda.
Tomo fôlego para engolir meu orgulho, posto que meu
anjinho merece uma chance. Ou melhor, eu quero dar esta chance a
ele. Meu peito se aperta e diminui meu coração com a imagem de
não poder estar mais com ele.
Eu quero Will pra mim.
— Que fui surpreendida? Sim. — ele tenta virar o rosto,
porém sou mais rápida e o seguro com uma das mãos. — Que o
cara é um affair antigo? Longe disso, anjinho.
Will enfim desmancha a carranca e aguarda as próximas
palavras com expectativa.
— Mike é meu primo, Will. Fomos criados juntos, como
irmãos e… e ele é gay.
O azul fluorescente reluz e me cega assim que seus olhos
aumentam de tamanho após minha declaração.
— Seu primo… — constata. Depois, olha para a mesa
absorvendo meu relato. — E ele é gay? — pergunta com uma
careta.
Meneio a cabeça, alívio enveredando minha mente
conforme a feição de Will passa de tristeza para algo mais leve. Ele
esfrega o rosto com a mão e suspira.
— Eu pensei que… merda. — Morde o lábio inferior e
chacoalha a cabeça para os lados. — Bri… — inspira e solta o ar,
compartilhando da mesma sensação que eu.
Alívio.
— Eu… eu gosto de você, Will. — Fecho os olhos,
assustada com a coragem que surge de assumir meus sentimentos.
— Eu gosto muito de você, e… tive medo.
— Medo do quê? — indaga. Desta vez, sua mão é que
busca meu braço, e aproveito para alcançá-la e enlaçar nossos
dedos.
— Medo de te perder — digo, baixinho, como um segredo.
— Ah… baby. — Ele me puxa pela nuca, colando nossas
testas. Nossas respirações se misturam. — Desculpe-me por não te
deixar explicar. — Encosta os lábios levemente nos meus. — Eu
deveria…
— Sshhhh… Não. Você não conhece muito da minha família
e nem eu da sua. É normal.
— Acho que está na hora de conhecermos mais um do
outro, não? — ele oferece.
— Acho que sim… — Meus olhos caem para a boca
naturalmente rosada de Will.
— Bri… — assopra meu nome como uma súplica. — Eu
também tive medo de perder você.
Não espero mais qualquer palavra que estrague o momento
e o beijo, enroscando nossos lábios num ímpeto de afugentar todos
os males que a manhã de merda causou em meu coração.
Nossas línguas dançam, buscando uma a outra na emoção
que só sinto quando estou nos braços do meu anjinho. Conforto e
aconchego, como se aqui fosse o meu lugar.
Eu quero que seja…
— Vamos sair daqui — digo, liberando Brina do meu agarre
e juntando minhas coisas sobre a mesa. Fecho o notebook sem
sequer desligá-lo e afundo-o na mochila.
Ela me olha divertida e recolhe alguns livros.
— Estes ficam ou vão? — questiona para saber se devolve
ou não as brochuras para as prateleiras.
— Ficam. Não terei tempo para estudar este fim de semana
— informo. — Pode deixar sobre a mesa, vou pedir para Henry
devolvê-los, ele disse que viria para cá depois da aula.
— Sim. Ele veio.
— Foi por causa dele que soube onde me encontrar?
Brina meneia a cabeça confirmando minhas suspeitas.
— Como ele consegue? — Ergo uma sobrancelha e
aguardo curioso.
— Ele instalou um aplicativo de localização em seu celular.
— Aponta para o aparelho. — É invasivo, mas foi bem útil hoje.
Analiso o aparelho, virando-o em minhas mãos como se
pudesse ter algo acoplado nele. Claro que sei não ser assim que
funciona, mas a atitude é meio que instintiva.
Mando uma mensagem via Whatsapp para ele guardar
meus livros e que iremos conversar sobre o aplicativo mais tarde.
Pego a mão de Brina e a arrasto comigo em direção à saída.
Essa manhã, fui até seu prédio para buscá-la, já que me
arrependi de praticamente enxotá-la de casa na noite anterior.
A morena me provocou além do limite e por muito pouco
não acabei enfiando a cabeça do meu pau em sua entrada melada.
A única barreira que me impedia era minha cueca, que mantive
como obstáculo.
Mas… o que eu estava esperando, afinal?
Ela é experiente e tem sido muito paciente. Já deixou claro o
que quer. Eu que ainda me seguro. E por quê?
Brina me enlouquece com seu jeito provocante e sua
sagacidade. Ela possui uma personalidade marcante e feroz, ao
mesmo tempo em que vejo fragilidade quando se derrete em meus
braços.
A atacante do time de futebol conquistou um espaço
precioso em minha vida. E hoje, quando a vi abraçada com outro
cara, e depois beijá-lo com tanta naturalidade, senti o chão se abrir
e me sugar para um buraco negro.
Eu não queria enfrentá-la e descobrir que tudo havia
acabado.
A possibilidade de não ter mais Brina Heinz no meu dia a dia
esmurrou meu peito. Quis fugir, não apenas dela, mas de mim. O
sentimento de angústia me consumiu ao extremo, esvaziando-me
por dentro. Fiquei absorto na escuridão melancólica da autopiedade.
Foquei em me esconder do mundo e de todos nos confins
da biblioteca, pegando um livro atrás do outro, na tentativa vã de
ocupar meus pensamentos com cálculos e teorias que me fizessem
esquecer… esquecer a ferida aberta em meu coração.
Quando ela se aproximou há pouco, sabia da sua presença
antes mesmo que sentasse ao meu lado. Seu perfume inebriante e
inconfundível chegou primeiro.
O simples fato de sua presença já acalmou o redemoinho de
ansiedade e tristeza em meu estômago. Ela veio atrás de mim…
não desistiu. Eu aceitaria qualquer verdade que dissesse para tê-la
ao meu lado.
Então, a revelação de que o intruso em nossa relação era
ninguém menos que seu primo, bem como sua opção sexual
demonstrar a ausência de competição entre nós, me fez sair das
trevas.
O conforto de tê-la em meus braços novamente após um dia
agoniante envolto em ciúmes, tristeza e incertezas deixou claro para
mim quem Brina Heinz significa em meu coração.
Ela é a dona dele.

A risada de Brina ecoando pela mansão enquanto subimos


as escadas até meu quarto é uma canção para meus ouvidos.
Sorrio involuntariamente.
— Por que está tão apressado? — pergunta, entre o riso. —
Não é como se eu fosse fugir de você — provoca, acusando minha
atitude de mais cedo.
Arrasto-a para dentro do cômodo e tranco a porta.
— Não quero perder mais tempo. — Avanço sobre ela.
— O que você quer dizer com isso? — indaga incerta. —
Não brinque comigo, Will.
— Eu não estou brincando, baby. — Fecho os olhos e
respiro fundo, antes de encará-la. — Estou pronto… pronto pra você
— informo e aguardo sua reação.
Ela pisca algumas vezes, confusa.
— Isso se você ainda me quiser — emendo.
— Eu quero… — sussurra e enlaça os braços em minha
nuca. — É o que mais quero.
Sorrio satisfeito e grudo nossas bocas num beijo ardente,
recheado de promessas do que virá a seguir.
— Você me deixa louco, Bri. Não faz ideia de quantos
banhos gelados tomei nesses últimos meses.
— Deve ter sido a mesma quantidade que eu, anjinho. E,
aliás, você me deve dez pilhas novas para meu vibrador.
— Eu compro um novo recarregável, baby. Adeus pilhas —
digo, enquanto deposito pequenos beijos descendo do meu maxilar
até o pescoço. — Agora quero desembrulhar você.
— Desembrulhar?
— Você é meu presente, baby.
— Hoje é seu aniversário?
— Semana que vem — respondo. — Você será meu
presente adiantado.
Brina segura meu rosto com as mãos e seus olhos,
dourados como ouro, brilham em minha alma.
— Vou fazer por merecer ser este presente. — A morena se
afasta e começa a desabotoar a camisa revelando aos poucos a
pele sedosa e os seios escondidos no sutiã de renda rosa.
Os sapatos já foram dispensados pelo caminho, e a calça
jeans sai do seu corpo em movimentos leves de quadril.
Brina tem o corpo moldado pelo esporte, mantendo seios
suculentos do tamanho perfeito para minhas mãos. Ela caminha de
costas até a cama e deita, mirando-me com o olhar carregado de
lascívia.
Não sou tão gracioso quanto ela, e me dispo o mais rápido
que posso, ficando apenas com a cueca boxer preta.
— Você realmente parece um anjo — ela diz.
— Um anjo não teria pensamentos tão pecaminosos quanto
os que estou tendo agora, baby — mordo o lábio inferior com a
imagem da morena gostosa em lingerie na minha cama.
— Eu quero saber cada um deles — me atiça.
— Vou te mostrar…
Ajoelho-me a sua frente e mordo a pele levemente de seu
tornozelo, beijando com a boca aberta na sequência. Subo devagar,
mordiscando e beijando cada pedacinho de pele até alcançar o
joelho. Estico minha mão, deslizando por seu ventre até o vale dos
seus seios e volto enveredando-me até o monte de Vênus.
Aperto a carne em meus dedos. Brina ofega, arqueando as
costas.
Antes que perceba, viro seu corpo de bruços e volto-me
para seu outro tornozelo, repetindo o processo de mordiscar e beijar
sem pressa, saboreando a epiderme aveludada de minha garota.
Quando alcanço a pequena dobra que une a coxa à bunda,
dedico certa atenção ao local, dando lambidas lânguidas e
assoprando em seguida. Vejo a pele arrepiar e sinto os músculos
daquela região se contraírem.
Enfio as mãos por baixo em seu quadril, fazendo-a arrebitar
a bunda, dando-me a visão da sua feminilidade em tons vermelhos,
totalmente molhada.
A boceta de Brina está pingando com sua excitação. Lambo
e sugo o suco agridoce, sabor de desejo da morena gostosa. Invado
seu núcleo o máximo que consigo. Ela geme e pressiona mais a
carne em meu rosto, rebolando vagarosamente, obedecendo ao
ritmo que imprimo ao entra-e-sai da língua no seu canal.
Deslizo para fora e raspo meu queixo com a barba rala em
seu clitóris, melando meu rosto inteiro, sentindo o cheiro de sua
excitação.
Repito a ação algumas vezes, voltando para sua vagina com
a língua e depois com o queixo em seu clitóris até ouvir os gemidos
ganharem força e a pélvis de Brina se contrair com o orgasmo. Ela
escorre em meus lábios.
— Você é o melhor e mais criativo cara que chupou minha
boceta, Willian King. — Sorri sobre o ombro. Limpo o gozo do rosto
com o dorso da mão e a viro para mim. Sobrepondo meu corpo ao
seu.
— Vamos ver se serei o melhor em outra coisa também. —
Estico o braço alcançando o preservativo deixado estrategicamente
sobre a mesinha de cabeceira. Puxo o lacre com os dentes.
Afasto-me, ficando de joelhos entre suas pernas e me
recordo quantas vezes treinei essa porra de enfiar camisinha no pau
para agora não vacilar.
Brina me observar encapar o membro com o látex e quase
dispenso esta porcaria ao vê-la lamber o lábio inferior e me fitar com
safadeza.
Rosno ao sentir a borracha apertar meu pau até a base.
Porra. Quero durar até fazê-la gozar de novo. Suspiro, e Brina
percebe.
— Ei… o que foi?
Encaro os olhos de mel, com as sobrancelhas arqueadas
num desenho perfeito. Ela é perfeita.
— Não vou durar nem 5 segundos, baby. — A visão do seu
corpo é um deleite ao pecado. Deveria ter batido uma antes.
— A primeira pode ser… mas ainda temos a noite toda,
anjinho. Aí vamos para a segunda rodada, talvez terceira. Fique
tranquilo. Se sua boca em mim é uma delícia, esse pau — ela
segura minha base — não me decepcionará. Sonho com ele todos
os dias, anjinho.
— Sonha?
— Uh-hum… Está mais que na hora de ele conhecer sua
morada. — Sorri com malícia e circula minha cintura com as coxas
musculosas, conduzindo-me para seu interior. Gemo seu nome em
súplica. — Vem anjinho… Se entregue pra mim… — sussurra.
E eu vou, sentindo meu pau ser espremido aos poucos pela
musculatura de sua boceta. Brina contrai e se solta, em repetições
insanas ao redor da minha circunferência. Ela sabe usar o corpo
todo para o prazer.
— Baby… — gemo em sua boca.
— Vem, Will… até o fundo, anjinho. — Empurro-me mais até
minhas bolas encostarem-se na sua bunda. Beijo seus lábios,
acostumando-me com a pressão. — Mexa, Will. Preciso de você.
As palavras são o combustível para meu quadril se
movimentar. Inicio o vai-e-vem, na dança mais antiga do mundo,
encontrando Brina a cada estocada.
Começamos lento, minhas bolas se contraem indicando o
início do meu fim. Fecho os olhos, me concentrando para controlar
um pouco mais.
Só mais um pouco, Will.
— Espere — peço. Brina acata em silêncio. Reinicio o vai-e-
vem mais devagar, contido. Ela desliza os dedos por minhas costas,
acariciando levemente.
Intensifico o movimento, e sinto as pernas de Brina
circularem meu quadril ditando a velocidade. Geralmente, gosto de
manter o domínio na cama. Mas, sinto-me um pouco inseguro por
ser minha primeira vez, e, por isso, deixo-a me guiar.
Beijo-a pressionando sua nuca, levo uma mão na tentativa
de manter um pouco do controle que ela me toma. Murmuro seu
nome, procurando retardar a sensação de êxtase.
— Forte, anjinho — assopra em meu ouvido. — Se for
gozar, faz forte e duro.
Obedeço, não aguentando mais segurar. Minhas bolas
doloridas se apertam, e parece que irão se fundir ao meu corpo com
a pressão, abandonando de vez o saco escrotal quando a onda de
prazer se esvai da minha virilha, conquista a cabeça do meu pau e
envolve minhas coxas, abdômen, expandindo para cada terminação
nervosa.
Ouço um som animalesco e percebo que sou eu rugindo,
enquanto esporro dentro de Brina, enchendo a camisinha e dando a
ela minha virgindade.
Deixo a cabeça tombar para frente, escondendo-me no
emaranhado dos seus cachos, sentindo o cheiro adocicado de
shampoo misturado com sexo. Nosso sexo.
Beijo seu ombro e subo para encontrar seu olhar. Brina sorri.
— Como foi? — Sorri.
— Sabe que essa pergunta quem faz é o cara, não é?
— Aqui no caso, eu assumo. Eu sou o cara. — Sinto uma
pontada de orgulho em sua voz. Sorrio. Se tirar minha virgindade é
sinal de orgulho para minha garota, fico feliz em lhe proporcionar.
Rio para ela, e antes de responder, tento parecer mais sério.
Ela precisa saber que minha resposta é verdadeira.
— Foi maravilhoso, baby. — Chupo seus lábios. —
Maravilhoso.
— Está arrependido? — pergunta preocupada, traçando
círculos com o polegar em minha bochecha.
— Esperei tanto para ter certeza, Bri. Eu tinha… — hesito e
retomo a fala: — Eu tenho certeza que esperei por você. Você…
Nossas bocas se unem novamente em um beijo carinhoso e
acolhedor, apenas com os lábios.
— Só pra constar, eu gozei quando você gritou meu nome
— revela.
— Hum? — Procuro pela mentira em seu rosto. Não
encontro. Inclino a cabeça. — Tenho que me preocupar com
ejaculação precoce inversa aqui? — brinco.
Ela ri.
— Acho que esperei tanto pra ter seu pau, que minha
vontade em senti-lo ajudou. — Morde o canto da boca.
— Talvez eu consiga melhorar nosso tempo daqui a cinco
minutos.
— É mesmo? — Ela ergue os quadris comigo ainda em seu
interior. Confirmo com a cabeça. — Graças a Deus! Minha seca
acabou! — exclama e eu mordo seu ombro em reprimenda. Brina ri.
— Valeu à pena a espera? — indago ao pé do seu ouvido.
— Cada segundo — responde. — Cada segundo…
— Como estou? — Brina alisa novamente o vestido amarelo
de alças grossas, com saia rodada até a altura do joelho. Ela está
deslumbrante. Quase a arrestei para meu quarto na casa dos meus
pais, assim que tirou o casaco e cachecol do pescoço.
— Linda… — digo ao pé de seu ouvido, roçando o nariz na
curvatura do pescoço. — Como sempre.
A morena me presenteia com um sorriso tímido. É… não
estou mentindo não. Brina está tímida e insegura, caminhando a
passos lentos. Tenho que puxá-la em direção aos burburinhos
vindos de uma das salas maiores da casa.
— Todos estarão aqui, baby. Não fique nervosa — tento
acalmá-la.
— Não estou nervosa — fala, apressada. Ergo uma
sobrancelha com um sorriso, indicando que não caí nessa. — Tudo
bem… posso estar um pouquinho. É a primeira vez que serei
apresentada como a namorada de alguém — cochicha. — Toda
primeira vez causa incertezas, não é?
E agora é ela quem me provoca. Mas a minha incerteza
estava em gozar rápido demais e não permitir que o momento
durasse tempo suficiente para ser memorável, penso. Não por conta
de conhecer pessoas importantes para ela.
Aliás, quero muito conhecer mais profundamente o Sr.
Heinz. Acredito que nosso encontro já está predestinado para o
próximo final de semana em seu noivado.
— Você está tão cheiroso — Bri diz, enroscada em meu
braço, mirando-me de baixo pra cima enquanto caminhamos.
— Minha namorada me presenteou com um perfume novo
— devolvo e beijo sua testa. — Não conte pra ela, mas prefiro
quando meu cheiro está misturado com o dela.
— Ela compartilha do seu gosto — confessa e baixa as
pálpebras suavemente, lembrando-me aquelas bonecas de cílios
grossos.
Sorrimos.
Não sei descrever a emoção que alojou-se em meu interior
no momento que atravessei as portas da Mansão King. Na verdade,
no momento em que decidi que Brina é por quem esperei todo esse
tempo.
Quero carregá-la comigo por todos os cantos. O sentimento
novo de estar com alguém por completo é diferente. Tenho a
sensação que Brina sempre esteve presente em minha vida.
Não vejo a hora de apresentá-la aos meus pais. Quero que
eles se deem bem. Também tenho certa insegurança quanto a isso.
Anseio que as pessoas importantes para mim tenham uma boa
convivência. Para isso, aposto na simpatia da morena ao meu lado.
Minha mãe não é uma pessoa difícil, e meu pai já se deu por
satisfeito quando mencionei apenas o sobrenome de Brina. Algo
que me incomodou um pouco, pois sua origem não significa nada
pra mim.
A pessoa em si é quem faz toda a diferença.
— Filho! — A voz melodiosa de mamãe impera no ambiente
com a nossa chegada. — Finalmente você chegou.
— Mãe — aceno, e Brina se afasta para Sra. King me
receber em um abraço. Mamãe me beija em cada bochecha e
depois se afasta.
— E você deve ser Brina, correto? — questiona com um
sorriso. Brina assente. — Will contou como você é linda, mas não
pensei que fosse tanto assim.
— O-obrigada — Bri responde, tímida.
Eu disse… nova face de Brina sendo descoberta.
— Mãe! — alerto-a — Você está deixando minha namorada
encabulada.
— Bobagem. Ela deve receber elogios o tempo todo. Olha
só esta pele e este cabelo. Eu já tinha visto a sua mãe em alguns
eventos anos atrás, você lembra muito a sua beleza, querida. — E
minha mãe consegue outra proeza, além de tímida, percebo Brina
ficar emocionada.
Com os olhos cheios d’água, minha garota meneia a cabeça
com o elogio.
— Agora chega, Sra. King. Acho que os outros convidados
também querem me dar os parabéns pelo meu dia. — Corto a
tagarelice, para manter as versões de Brina que consigo lidar.
— Ah, sim, venham. Eu usei a sala verde para uma
recepção mais íntima. — Mamãe nos conduz e avisto o ambiente
com algumas mesas dispostas separadamente, cada uma com um
grupo de pessoas conhecidas e que possuem afinidades em
comum.
Claro que o Sr. King não deixaria passar meu aniversário em
branco e não fazer valer a oportunidade de manter os laços do
nosso círculo de “amigos” unidos.
A casa dos meus pais possui algumas salas temáticas para
eventos. E como uma imitação dos palácios europeus, dar nomes
com cores faz minha mãe sentir-se ainda mais rainha.
Meu pai aderiu à ideia de bom grado.
A sala verde possui espaço suficiente para acomodar pelo
menos 100 convidados. As paredes são em tom verde-claro e três
lustres de cristal que fariam inveja a qualquer castelo adornam o
teto.
As mesas decoradas com pequenos candelabros em
dourado indicam ser uma data festiva. É assim que os Kings
demonstram tratar-se de uma data importante. No caso, meu
aniversário. Poderia até ser uma festa de debutante, penso.
Coço a testa para conter a leve tensão formada pela minha
falta de habilidade em dizer não para minha mãe e aceitar este tipo
de festa.
— Você parece incomodado — Brina sussurra só para meus
ouvidos.
— Eu detesto isso — replico.
— Eu também odiaria se fosse comigo.
Subo um canto da boca com a empatia.
— Will! — Meu pai se aproxima. — Como se sente com 21
anos meu filho?
— Muito velho para uma festa assim — contesto.
— Ah, filho. Será apenas um jantar entre velhos amigos e
família — ele justifica.
E pessoas que não tenho qualquer contato.
Mantenho a ironia para mim, não quero estragar a noite.
Meus pais podem fazer parte de uma elite onde as aparências se
sobressaem à realidade. Contudo, eles conseguiram no meio da
falsidade construir um casamento com amor. Isso eu admiro.
Por este motivo, engulo meu orgulho e sorrio.
— Feliz aniversário, filho. — Meu pai me abraça, em
seguida, segura meu rosto, dando um leve tapinha na lateral. Não
demora para sua atenção cair direto na garota ao meu lado. — Brina
Heinz! — Suas mãos saem do meu rosto e vão direto para o dela.
— Como você está, querida?
— Olá, Sr. King — ela responde, educada, eu diria até
robotizada. — Estou bem. Obrigada.
E como se a voz sem qualquer emoção de Brina fizesse
minhas lembranças rodarem diretamente para uma garota calada e
muda que eu via em alguns dos eventos organizados em nosso
meio. Ela nunca se misturava e sempre se mantinha à distância das
outras crianças.
Enquanto eu e meus amigos corríamos de um lado para o
outro, deixando nossas mães e as outras matriarcas horrorizadas, a
garota com o penteado impecável, vestido rosa de princesa
permanecia como uma boneca na prateleira de uma vitrine.
Imóvel e intocável.
Até que após alguns anos, não a vi mais. Provavelmente em
sua adolescência.
Era Brina.
— Pai, vou dizer oi para meu amigos — aponto a direção da
mesa reservada para os Falling Angels e conduzo minha garota com
a mão repousada em sua lombar.
Assim que estamos a uma distância segura, volto-me para
ela.
— Por que você deixou de comparecer aos eventos? —
questiono. Brina me olha ainda absorta em seu mundo. Ela pisca
algumas vezes e sai do transe, retornando ao presente.
— Porque escolhi a mim mesma. — Respiro aliviado ao
receber o sorriso confiante que estou acostumado. — Eu poderia
ser a boneca perfeita, mas nunca seria a réplica de quem meu pai
queria. Então… desisti. — Ela dá de ombro.
— Eu me lembro de você — informo.
Brina solta o ar e vira a cabeça pra mim.
— Eu sei que se lembra… eu conhecia todos vocês… só
que… que não me viam. — Pressiona os lábios numa linha fina.
Pego seu queixo, guiando seus olhos para os meus.
— Não era você naquela pele. Mas, ainda assim, era a
garota mais linda, ou eu não lembraria e nem sequer notaria sua
ausência. — relato, deixando um beijo em seus lábios. Ela sabe que
para ter minha percepção, ainda mais de um garoto como eu,
significava que sim, ela era notada.
— Você queria dar uns pegas em mim, hein? Nem peitos eu
tinha — brinca e me empurra com o corpo.
Sorrio por ter conseguido de volta sua descontração.
— Mas já tinha uma bunda incrível — aperto sua cintura. Ela
ri.
— Safado.
— Só com você. — Beijo sua têmpora.
— Só comigo… — suspira.
Alcançamos a mesa e nossos amigos riem de algo. Henry é
o primeiro a se levantar vindo até mim.
— Parabéns, cara! Sabe que não vivo sem você, irmão? —
diz com os braços ao redor dos meus ombros.
— Valeu, cara — respondo. Em seguida, Debby, Gabriel,
Alec, Elisa e Aline me cumprimentam pelo aniversário.
Sentamo-nos todos e passamos a conversar ao redor da
mesa. Garçons passam com canapés e bebidas. As garotas
servem-se do frisante que minha mãe não dispensa para ocasiões
como essa. Para ela, tudo se resume a champanhe.
Todos os quatro casais pareceriam apaixonados nesta mesa
se não fosse pela estranha relação de Gabriel e Aline. Este cara
sabe ser o maior idiota quando quer. E quando o assunto é a
baixinha, ele consegue tirar a nota máxima em cretinice.
Orgulho é um sentimento doentio. Ainda mais quando a
parte passiva admite cada investida para permanecer inerte,
aceitando todos os desaforos do seu algoz.
Como todos os eventos, temos o jantar, com música
ambiente no volume certo para mantermos a conversa em volume
agradável.
Após a sobremesa, garçons adentram o salão com um bolo
de aniversário e velas em minha direção. Seguro a mão de Brina e,
antes de assoprá-las, sorrio para minha rainha.
Meu pedido deste ano é para que o que temos nunca
termine.

— Pensei que não sobreviveria. — Brina diz, tirando os


sapatos de salto. Sento-me ao seu lado na cama e coloco seus pés
em meu colo, massageando-os.
— Você é uma rainha, baby. Eu tinha certeza que meus pais
iriam gostar de você.
— Tinha mesmo? — me desafia.
— Não — admito e solto um riso frouxo. — Mas, não faria
diferença, já que o que importa é a minha opinião.
Ela continua com a feição em desafio.
— Tudo bem — assumo. — Confesso que eu queria que
meus pais também gostassem de você. É muito mais fácil ter as
pessoas que amamos se dando bem, não acha?
Aperto o centro do seu pé com o polegar e vejo suas órbitas
aumentarem, chego a olhar para a sola do pé em minhas mãos,
pensando tê-la machucado. Será?
— Vo-você me ama? — indaga baixinho. Então, percebo o
motivo que levou seus olhos dilatarem para fora das órbitas. Sorrio.
Não percebi a frase que pronunciei com tanta facilidade ser a minha
primeira declaração para ela.
Não imaginei como este momento seria. Mas, a naturalidade
pareceu-me o melhor caminho.
— Eu amo cada pedacinho seu, Brina Heinz. — Beijo seu
dedo mindinho do pé e faço o mesmo nos outros até o dedão. Este
último abocanho e sugo em minha boca, segurando sua panturrilha.
Minha garota arfa e solta um gemido.
Não sou o típico cara tarado por pés.
Porém, os pés de Brina me encantam. Os dedos pequenos
com as unhas desenhadas e pintadas num tom rosa-claro
contrastam com a pele morena, o que a deixa ainda mais sexy.
Deposito pequenos beijos na curvatura interna do seu pé e
subo vagarosamente até o joelho, e dali até sua virilha passo a
desenhar círculos com a minha língua.
Brina geme e arqueia as costas do colchão.
— Ah… Will… que delícia.
Puxo a calcinha para o lado com os dentes e seguro com o
indicador. Escovo a ponta da língua com rigidez, abrindo a vulva da
entrada até o clitóris, que mordisco, tirando sons ininteligíveis da
linda mulher em minha cama. Rodopio e chupo uma, duas e três
vezes, até sentir o monte de nervos duro em meus lábios.
Brina ofega, rosna e resmunga meu nome, incentivando-me
a continuar o estímulo em sua sexualidade.
Mordo sem aviso, fazendo-a gritar, e sorrio.
— Will! — A voz de alerta mal sai.
Retomo as chupadas, mamando a pele delicada e passo a
acariciar sua entrada com a ponta dos dedos. Ela mela meu
indicador e dedo médio com facilidade. Não a penetro, descendo em
busca do outro buraco.
— Quando vou comer seu cu, baby? — Ela geme no
momento que introduzo um dedo.
— Se me convencer, ainda hoje.
As palavras ecoam diretamente no meu pau dolorido e
apertado na calça jeans. Saio do meu lugar favorito que é entre as
pernas de Brina e me desfaço das roupas rapidamente. Avanço
para seu corpo e puxo as laterais da lingerie, encharcada de
excitação.
A morena aproveita para baixar o zíper do vestido por trás,
tirando-o sobre a cabeça. Ela está tão desesperada quanto eu.
Sorrio ao perceber que seus seios estão expostos sem sutiã
nenhum. Brina morde o lábio e enlaça meu pescoço com as mãos,
levando-me consigo quando joga as costas para trás.
Ela me beija com lábios famintos, envolvendo-me num
emaranhado de braços e pernas ao redor do meu torso e quadril.
— Baby… — desta vez sou eu quem gemo quando nossos
sexos se encontram e Brina rebola fazendo-me sentir a umidade da
sua boceta suculenta.
— Eu também te amo, Will — sussurra em meus lábios.
Recuo para mirar o dourado do seu olhar que transmite mais que
tesão e lascívia. Brina me admira com carinho e atenção. Amor. —
E quero que me possua por inteira.
Fecho meus olhos, inalando seu cheiro e saboreando ainda
seu gosto. Antes que consiga me recompor, minha garota puxa
minha nuca e cola nossas bocas, invadindo a minha com a língua
ousada e dominante.
Deixo-a me conduzir pelo caminho de seu desejo. A loucura
do seu beijo abrasador faz nossos dentes baterem vez ou outra,
então percebo que preciso retomar as rédeas. Chupo os lábios
carnudos e me enveredo pelo maxilar, descendo até seus seios
intumescidos.
Prenso um dos bicos entre meus lábios e ouço um grunhido
de prazer. Começo a mamar o seio dando atenção para a pele
enrijecida do mamilo, em seguida alterno de um para o outro e noto
a morena guiar uma mão para sua intimidade. Retiro-a e ela
esbraveja com pequenos lamentos que dura pouco, já que conduzo
meus dedos para sua boceta e penetro-a enquanto sugo com força
seus seios.
Brina ofega quando introduzo o terceiro dedo, depois o
quarto. Tenho vontade de enfiar a mão inteira, mas me controlo.
Sinto a musculatura interna se contrair em pequenos espasmos
seguidos dos gritos de Brina quando atinge o primeiro orgasmo da
noite, lambuzando minha mão.
Vejo que os seios de Brina apresentam chupões variados e
um orgulho possessivo me invade, sabendo que fui eu quem os
deixou ali, mesmo na pele oliva. Eu marquei-a como minha, por
dentro e por fora.
Meu desejo de sentir esta ligação com outrem era uma
imagem platônica em meu cérebro desde a infância, quando tomei a
decisão que mantive ao me guardar.
Jamais pensei que pudesse ser tão avassalador este
sentimento. Brina Heinz é intensa, feroz e sua impetuosidade foi o
que me reteve a princípio. Contudo, seu poderio sobre meu corpo e
minha mente era inevitável. Ela já me tinha, mesmo antes de
conceder-lhe minha virgindade. Era dela. Eu sou dela.
Busco seu olhar, quando pareio minha ereção em sua
vagina e começo a investir lentamente, indo e vindo raso para
depois aprofundar e roubar com beijos seus gemidos. Afundo meu
rosto em seu pescoço, mordiscando a pele sensível abaixo da
orelha e passo a estocar mais rápido.
Brina ordenha meu pau e acompanha o ritmo das
estocadas, vindo de encontro. Desacelero, lembrando-me de que
hoje quero gozar no outro orifício que ofereceu. Eu a faria minha por
inteiro, como disse.
Deslizo meu pau melado com sua lubrificação natural para
fora e guio-o para baixo, encarando-a e aguardando que peça para
eu parar. Ela não pede. Encaixo-me no buraco apertado e Brina
ofega. Estaco no lugar.
— Continua, Will… — a voz sai manhosa. Seguro a base do
meu pau e afundo ultrapassando o anel enrugado que esmaga a
cabeça rosada e inchada. — Vai devagar, mas não para. Fode meu
cu, Will. Ele é seu. Eu… eu sou sua.
O incentivo me faz empurrar a ereção dura mais e mais até
minhas bolas baterem na sua bunda. Fico imóvel e me apoio em um
braço, deixando a outra mão livre para massagear seu clitóris.
Estimulo o botão brioso e percebo quando Brina relaxa, momento
que retomo a invasão do seu corpo por trás.
— Mais… Will… mais forte — Ela implora, segurando meus
ombros, cravando as unhas a cada arremetida. Acelero o
movimento do polegar acompanhando o vai-e-vem.
Brina grita, geme e rebola, aceitando meu pau entrando e
saindo do cu apertado. Seu rosto se fecha e a boca vermelha dos
meus beijos faz um ‘o’ perfeito quando goza, grunhindo meu nome.
É a visão que me incita mais, fazendo minhas bolas
comprimirem e a ejaculação preencher o corpo de Brina sem
qualquer barreira.
Camisinha… Não usamos proteção!
Momentaneamente sinto alívio por ter esporrado no orifício
que não nos conduziria para uma gestação indesejada, mas me
preocupo com o que Brina poderia pensar da minha
irresponsabilidade.
Fui impulsivo, dando vasão aos sentimentos que
extravasamos um para o outro. Isso não é desculpa para agir assim.
— Baby… — Retiro-me devagar e deixo minha cabeça
tombar em seu ombro. — Me perdoe… — peço.
— Por quê? — sussurra a pergunta, ainda sem forças e
ofegante.
— Não peguei a camisinha — informo. Sinto seu peito
vibrar.
Ela ri.
— Will… Meu amor, não vou engravidar pelo cu.
— Mas entrei antes na frente. Não posso ser irresponsável
assim. Fomos inconsequentes.
Brina segura meu rosto e me dá um beijo rápido nos lábios.
— Não somos tão azarados assim, Will. — diz confiante. —
Nem estou no período fértil do mês. Relaxa.
Jogo meu corpo para o lado, a fim de não a esmagar.
— Como você sabe?
— Tenho um aplicativo. Hoje em dia, existe aplicativo pra
tudo. — Sorri e estica o braço, pegando o telefone na mesinha de
cabeceira. Ela me estende com a tela desbloqueada e aponta o
desenho de um símbolo que seria uma mulher grávida. Algo que
não me deixa mais tranquilo.
Viro o aparelho para ela com o rosto estampando minha
reação ao desenho, e fico feliz por conta da proximidade fazê-la me
ler tão bem sem palavras.
— Só o símbolo é de grávida, anjinho. Este é mais fácil. Ele
indica com mais precisão os dias do ciclo que eu estou fértil.
Repuxo o lábio para o lado, mas sentindo um pequeno
alívio.
— Mesmo assim, Bri. Precisamos tomar cuidado.
— Eu não tenho nada, Will. — Sua expressão agora é séria
como se minha reação fosse por isso. — Faço exames a cada seis
meses por conta do time. Não precisa se preocupar. — Começa a
se levantar. Puxo-a para meus braços rapidamente.
— Ei, ei… Não é nada disso, Bri. Confio em você, baby.
Juro. Só me preocupo com o que você pensaria de um ex-virgem
inconsequente. — Dou pequenos beijos em seu pescoço, fazendo
cócegas em suas costelas.
Ela ri e desmancha a carranca.
— Tudo bem… tudo bem. Pare, Will… — Afrouxo o abraço,
mas mantenho-a colada em meu corpo, deitada comigo na cama. —
Eu te amo, meu ex-virgem.
— Eu te amo, Bri.
Mais uma vez a claridade castiga meus olhos assim que
acordo. Cansei de pedir para Will parar com essa mania de deixar
as cortinas abertas, mas como se fosse para me irritar, ele insiste.
— Vamos, baby. Chegaremos atrasados de novo por sua
culpa. — Will sai do banheiro com uma toalha preta enrolada no
quadril. O próprio contraste do preto no branco. Sua pele é tão alva
que tenho a impressão do sol refletir toda vez que caminhamos
juntos em uma manhã como essa.
— Já estou indo… — Espreguiço-me na cama enorme do
meu namorado, esticando o máximo que posso cada músculo do
meu corpo. Sinto uma dor deliciosa nas pernas e não é pelo treino
da semana, mas sim por ontem à noite. Vamos dizer que cavalgar
meu anjinho mais de uma vez é um ótimo agachamento.
Acho que tenho treinado pernas em dobro ultimamente, ou
melhor, nos últimos meses que eu e Will começamos a revezar
entre dormir em meu quarto no Apê com as meninas e aqui na
Mansão.
O bom é que minha carona para a faculdade fica garantida.
O ruim é perder o café da manhã que Aline prepara. A baixinha
arrasa na cozinha. Hoje seria tão bom comer um dos seus
cupcakes. Será que tem no esconderijo?
— Bri! — A voz de Will me tira do torpor por alguns
segundos, e meu estômago ronca alto. Ele ouve. — Vá logo se
arrumar que já desço e preparo seu café da manhã. — Meu anjinho
já aparece saindo do closet, vestindo uma camiseta preta. Ele pega
nossas mochilas e caminha para a porta.
— Ei! — grito. Ele vira o pescoço para mim. — Não vou
ganhar um beijo de bom dia?
Ele volta, inclina-se sutilmente. Deposita um beijo leve em
meus lábios. Tento segurar sua nuca, mas Will é mais rápido,
segurando minha mão.
— Vamos, Bri! Depois você reclama que perdeu a primeira
aula de novo por dormir aqui — ressalta.
— Tenho culpa da sua cama me abraçar todas as manhãs?
— Jogo-me para trás. — Ela não me larga, vê?
Ele ri e balança a cabeça em negativa.
— Te espero lá embaixo. — Retoma o caminho com ambas
as mochilas em cada ombro. — Não demore.
— Tá… — choramingo, e reviro os olhos, saltando em
seguida. Will fecha a porta e eu vou para o banheiro obedecer meu
querido namorado.
Saio do banho secando meus cabelos e vou até minha
gaveta de calcinhas. Will abriu um espaço em seu closet para eu
deixar aqui algumas peças de roupa.
Fiz o mesmo por ele lá em casa. Nunca fomos do tipo de
carregar peças de roupas quando ficávamos juntos e passar a
acordar e vestir a camiseta do dia anterior estava pegando mal.
Vasculho procurando meu top branco e me vejo empurrando
para o lado minhas lingeries mais escuras, dentre vermelho, preto e
roxo. Sempre as deixo para usar naqueles dias. Seguro uma em
minha mão e recordo-me que não a uso há algum tempo.
Will gosta das minhas calcinhas brancas e, por isso,
aumentei consideravelmente as lingeries nesta cor, porém… quando
estou menstruada, ele sabe assim que me vê com as outras cores
e…
Porra.
Não uso há mais de um mês.
Corro até meu celular apertando com força desnecessária o
ícone do aplicativo. Fecho os olhos quando o calendário do mês
atual está escancarado na tela.
Não!
Só pode ser mentira!
Eu só atraso dois dias, no máximo, e de acordo com as
datas que piscam um alerta invisível em minha mente, estou há oito
dias sem sinal vermelho. Melhor dizendo, com um sinal vermelho
gigantesco gritando a possibilidade errada pra mim.
Estou fodida!
Entenda, eu gosto de ser fodida… mas não assim!
Tenho um plano de vida, estamos no meio da temporada do
campeonato e nossas chances de chegar a final são grandes. O
time espera isso de mim.
Eu espero isso de mim. Além da minha carreira…
Ser mãe hoje estragaria tudo. Sim. Quero ser mãe. Mas não
agora. Depois dos trinta, talvez. Bom… se o Will quiser antes, pode
ser…
Meu Deus! Will!
Will ficará desnorteado. Eu não posso fazer isso com ele.
Como irá reagir? Ele irá me culpar.
Espera. Quando foi a última vez que não usamos camisinha.
Ai, caralho! Teve mais de uma vez e essa porra de
aplicativo…
Merda!
Will nunca confiou nesta merda. E eu? Eu deveria saber que
ele é mais inteligente, não é mesmo?
Calma, Brina. Ainda preciso fazer o exame pra ter certeza.
Pode ser apenas um atraso normal.
Quando foi que atrasei oito dias antes?
Busco em minha memória por qualquer episódio
semelhante. Imploro para ter esquecido de já ter sentido a mesma
insegurança que se aflora em meu peito.
Nada.
É a primeira vez.
Porra!
Ninguém pode saber. Não ainda. Mas preciso comprar
testes para ter certeza.
Se estiver grávida mesmo, vou poder jogar?
Acho que no comecinho, posso. Eu vou. Minha barriga vai
demorar a aparecer.
Caralho! Já estou considerando ser verdade.
Respiro fundo e solto o ar lentamente.
Ninguém vai saber. Vou comprar dez testes de farmácia pra
suprimir qualquer suspeita. Isso.
Vou ter certeza e aí… aí conto para meu namorado. Pronto.
Então, resolveremos o que fazer.
Abro de novo a gaveta, e visto uma lingerie preta. Meu
humor não está nada branco hoje.

Se não soubesse que era urina, poderia jurar que os 5


copinhos emparelhados na pia do meu banheiro eram doses de
tequila. E com um filete de papel pra mexer, decorando os drinks, de
variados formatos.
Os outros 5 exames parecem canetas achatadas que variam
da cor rosa e azul. Esses também estão dispostos lado a lado.
Encaro os dez exames atentamente, sem piscar.
— E aí? — Elisa aponta na porta, só com a cabeça para
dentro do banheiro. Espalmo uma mão elevada para que ela
aguarde e fique ali.
Não quero ninguém comigo, ou tudo parecerá mais real.
Felizmente, Elisa entende como eu funciono e sai, fechando a porta
de forma suave.
Pego o aparelho celular para verificar o final da contagem
dos minutos, e o aplicativo com a imagem delineando o perfil de
uma grávida é a primeira coisa que meus olhos captam.
Rosno baixinho.
Prendo a respiração aguardando os números do cronômetro
descenderem e… zero. Fecho os olhos numa prece silenciosa, após
tateio e pego o primeiro bastão.
Inspiro e expiro morosamente para acalmar as batidas no
meu peito.
Minhas pálpebras brigam comigo para subir, então abro
primeiro um olho. Quem sabe desfocando minha visão fica tudo
mais fácil?
Não…
Não fica.
Positivo. O sinal de mais está em negrito azul. Se pudesse,
estaria até sublinhado, acho.
Pego o seguinte com menos drama, já que o primeiro
deixou-me momentaneamente anestesiada.
Outro positivo, só que agora em rosa.
Bufo e apanho todas as canetas formando um leque nas
mãos. Pressiono meu maxilar, sentindo a musculatura da têmpora
responder imediatamente com a pontada de dor de cabeça. Droga.
Todos positivos. Não…
Os copinhos… Isso, tem mais xixi ali que nessas merdas de
canetas. Puxo os filetes de todos e deslizo o dedão com o indicador
em outro leque, mas em um tamanho menor.
Esfrego a testa com a outra mão, desfazendo as rugas que
tendem a se formar com meu cenho franzido.
Seria melhor se não franzisse o cenho, não é?
É! Mas a situação aqui é brava! Muito…
Duas riscas vermelhas aparecem em todos os papeizinhos.
Empurro os copinhos todos para dentro da pia. Nojento? Pode ser…
Abro a torneira e despejo um pouco do sabonete líquido do
lavatório. Depois jogo os vestígios no lixo, incluindo as canetas.
Sento-me no vaso sanitário e puxo os cabelos da nuca em
desespero. Resmungo alguns xingamentos, a começar por burra
para mim mesma. Inclino meu corpo para frente e apoio os
cotovelos sobre os joelhos, escondendo meu rosto nas mãos.
Estou grávida.
É isso. Grávida.
— Bri? Estou preocupada — Lisa insiste, dando leves
toques na porta.
Não posso me abater. Levanto-me e vou até minha amiga.
Assim que abro a porta, seus olhos me encaram sob a cortina da
franjinha. Apenas aceno com a cabeça em positivo. Ela corre até
mim, entendendo o significado, e circula minha cintura num abraço.
— Estou aqui, Bri. Vai dar tudo certo — me consola. Enlaço-
a pelos ombros e ficamos assim, abraçadas por um tempo. — O que
você vai fazer? — indaga baixinho.
Expiro, fazendo um barulho quando o ar sai dos meus
pulmões.
— Preciso contar para Will. Ele precisa saber. — Ela
assente. — Eu só preciso… preciso digerir mais um pouco.
Ainda parece que acabei de acordar de um sonho em que a
vida resolveu virar tudo de cabeça pra baixo. Depois de anos
construindo planos para fugir do futuro planejado por meu pai, vejo-
me com uma folha em branco nas mãos.
Antes existiam dois caminhos para mim. Eu estava atenta e
sabia qual escolher. Mas agora? Agora tudo é incerto.
Lisa e eu decidimos nos refugiar em meu quarto, comendo
pipoca e assistindo Prision Brake de novo.
Will passaria a tarde estudando na biblioteca com Debby e
viria para cá com ela. Hoje costuma ser o dia que todos aparecem
para comer algum prato que Aline quer experimentar para depois
ficarmos distribuídos pela sala, ocupando sofá, tapete e poltronas,
assistindo a um novo episódio de Master Chef. O único que não
participa desta rotina é Gabriel.
Não mandei qualquer mensagem para Will. Preferi aguardá-
lo chegar para conversar pessoalmente. Quem conta para o
namorado que está grávida pelo WhatsApp, afinal?
O barulho de conversa pelo apartamento chama a atenção.
Elisa levanta do encaixe em meu peito onde estava deitada e me
olha.
— Eles chegaram. — Ela me analisa, investigando minha
reação. Enfio um pouco de pipoca na boca e pauso o episódio em
que Michael é transferido para a ala psiquiátrica. Penso que agora
seria o momento para algum ansiolítico na veia, se possível. Será
que psiquiatras receitam para grávidas?
Jogo as pernas para a lateral e sigo atrás de Lisa até a sala.
Will já estava a meio caminho do meu quarto. Acredito que já iria me
buscar.
— Baby. — Me beija com um selinho e cumprimenta Lisa
com um aceno.
Como quando a porta do carro de palhaço é aberta, outros
corpos adentram em nosso apartamento. Debby seguida de Henry e
Alec que já caminha para Lisa. Pressiono a mão de Will na intenção
de levá-lo para o quarto e terminar logo com a agonia.
A expectativa de aguardar sua reação tem sido a inimiga
dos meus batimentos cardíacos desde que decidi esperar para ele
findar seu momento de estudos.
Mas agora, com ele aqui, não dá.
— Preciso falar com você. — digo finalmente só para ele
ouvir. Minha voz entonando meu estado emocional mais que
gostaria.
— Está tudo bem?
— Não sei… — sussurro.
— Vem — ele me guia até o quarto. — Vou trocar de roupa
e já venho. — diz por cima do ombro para os outros, o que ninguém
se incomoda, já que ele sempre troca a calça jeans por uma de
moletom que fica em meu guarda-roupa.
Tranco a porta do quarto e Will estranha a atitude, vincando
a testa. Seguro sua mão e o puxo até sentarmos na beirada de
minha cama.
— Will… eu… — Respiro profundamente e fecho os olhos,
ele aguarda. — Eu estou grávida.
Permaneço com os olhos fechados, como se assim pudesse
evitar o escrutínio do seu olhar. Ele me condenaria?
— Bri? — Ele toca meu ombro e mantém uma mão
enlaçada em meus dedos. — Abra os olhos, baby.
Balanço a cabeça para os lados. Ouço-o soltar uma lufada
de ar. Ele está bravo. Ai Deus!
— Baby… é verdade?
Agora minha cabeça sobe e desce para confirmar. Sinto Will
escorregar do colchão e parar entre minhas pernas. Ele segura meu
rosto e acaricia as bochechas com os polegares.
— Meu amor… eu estou aqui. Abra os olhos. — E do
mesmo jeito que fiz para enfrentar os testes de farmácia, começo
por um olho só numa careta, espiando-o. Ele ri sem humor. — Meu
amor, eu vou te apoiar naquilo que você decidir, mas… tem certeza?
— Eu fiz dez exames de farmácia — respondo.
— Vamos fazer o de sangue amanhã, tudo bem? —
pergunta, mais sendo uma afirmação. Assinto.
— E se for verdade? — Minha voz sai esganiçada.
— Então, seremos pais meu amor. Vamos dar um jeito. —
Ele sorri, e pela primeira vez no dia sinto calmaria. Will me acalma.
Ele é a brisa que afasta a tempestade, abrindo o céu para o sol raiar
no meu mundo. — Quem sabe?
— Apenas Elisa.
— Quer manter assim?
Dou de ombros. Não é como se nossos amigos fossem
espalhar por aí este segredo, que, aliás, tem período de validade até
minha barriga apontar.
— Eles não contarão a ninguém.
— Eu sei… — murmuro. Will se levanta e me dá um beijo na
testa. Vai até minha cômoda, pega a calça de moletom e se troca
rapidamente. Depois retornamos para nossos amigos de mãos
dadas.
Ele senta-se na ponta do sofá dando espaço para mim ao
seu lado. Quando me posiciono, ele pega minhas pernas e joga em
seu colo. Elisa está sentada na outra extremidade com Alec ao chão
entre suas pernas. Aline está numa poltrona e Henry com Debby em
seu colo na outra.
O silêncio é estranho.
— Fiz lasanha — Aline informa tímida, quebrando o gelo.
Tímida demais.
Henry olha para o teto como se buscasse algo para fitar que
não fosse em nossa direção. Debby nos olha de esguelha. Então…
miro minha amiga de franjinhas, que está com uma feição culpada.
— Me lembre de nunca dividir com você quando precisar
esconder um corpo! — acuso-a, ela murmura uma desculpa.
— Não foi culpa dela — Alec defende a namorada. —
Percebi que algo estava errado assim que vocês saíram do quarto.
Depois fui até o banheiro e vi testes de gravidez na lixeira, corri pra
ver se o bebê não era meu, porra. Se não queria contar pra
ninguém, que tampasse o lixo.
Pisco algumas vezes e avanço com um rosnado para o
anjo-demônio n.º 1 e filho da puta.
— Calma, Bri — Will me segura.
— Droga… — resmungo.
— Vo-você não ia contar? — Elisa engasga e coloca uma
mão sobre a perna de Alec, que segura seu rosto.
— Gazela, não se sinta mal. Você não fez nada.
Agora não sei se fico com raiva por ele nem sequer deixar
eu discutir com minha amiga, ou satisfeita por saber que cuida dela.
Bufo frustrada.
— Eu ia… quer dizer, nós íamos contar. Não tem porque
esconder de vocês. Mas, isso não sai daqui, ok?
Fito todos e Henry encena passar um zíper sobre a boca e
jogar a chave pelas costas.
— Ninguém falará nada — Aline promete. — Mas… Você
está bem?
Suspiro com sua preocupação. Não esperava menos de
nossa fofinha.
— Acho que falar a respeito, mesmo que seja assim, aliviou
o estresse. — Will circula os braços em minha cintura e me puxa
para mais perto. — Sim. Estou bem. — Beijo seu rosto.
— Amanhã faremos o exame de sangue — Will dá a notícia.
— Ótimo. Vou começar a pesquisar receitas para grávidas
— Aline diz empolgada demais. Acabo rindo. Elisa aperta meu braço
enfatizando o pedido de desculpas, e Alec solta um som
exasperado.
Controlo-me mentalmente para não soltar um foda-se para o
namorado da minha melhor amiga.
De certa forma, eles não me julgaram em momento algum,
apenas apoiaram e se preocuparam, como amigos fazem.
Como amigos devem fazer.
— Aqui! — berro para Sophie que ergue o olhar encharcado
pela chuva. Ela me visualiza e chuta. Pulo alto e recepciono a bola
com o peito, direcionando-a ao solo e domando para conduzir à
direita.
É o jogo da quarta de final do Campeonato Regional e nosso
time chegou até aqui depois de quatro jogos ganhados com mérito.
A maioria com gols de minha autoria.
Não tenho tido problemas com meu físico ainda. Os dois
últimos jogos foram depois da descoberta de ter um bebê crescendo
dentro de mim, mas… a médica que verificou o exame de sangue
disse que por eu já ser atleta, o bebê não correria risco se
mantivesse os treinos.
Ela só não falou sobre os jogos reais onde possíveis
esbarrões e contusões pudessem acontecer. Tenho tomado
cuidado, entretanto, foi a primeira vez que eu e Will discutimos.
Ele relutou em entender e aceitar, ainda mais quando leu os
cuidados necessários no primeiro trimestre de gestação. Fui teimosa
e consegui domar meu anjinho.
Will cedeu quando disse que só entraria em campo no
segundo tempo. Algo que não foi difícil de convencer minha
treinadora. A estratégia em me manter apta para correr mais e com
mais garra para finalizar os jogos era uma boa desculpa.
Contudo, as nuvens e a cronologia informando sobre a chuva
incessante que nos atinge quase fizeram os cabelos de Will que já
são descoloridos por natureza, ficarem totalmente brancos.
Meu namorado precisa entender que nada vale à pena se eu
não puder encaixar o futebol em minha vida. Mesmo que outra vida
esteja sendo gerada. Sei que soa egoísta. Mas… eu já aceitei toda
a mudança que iremos fazer. Eu só queria mais este campeonato.
Só mais este.
Depois eu demoraria pelo menos um ano e meio para voltar
em campo. É muito tempo.
Então, mesmo sob os protestos da versão Will papai, estou
em campo, correndo embaixo de chuva, com o uniforme colado ao
corpo, as chuteiras mais pesadas pela água, mirando o gol
adversário e raciocinando a melhor estratégia para ultrapassar não
apenas minha marcação, mas as artilheiras que correm para formar
outros obstáculos à minha frente.
A primeira garota é menor que eu e já consegui uma
distância considerável da outra que me marca. O problema é a
número 8 que tem a fama de ser uma rocha. Posso enganá-la com
um drible fácil.
Sigo com o estratagema. Sinto minha marcação puxar minha
camiseta que desliza em seus dedos por estar molhada. Consigo
passar com um leve esbarrão a garota pequena e agora só falta a
rocha. Dou um toquinho para a bola ir de um lado para o outro, viro
o corpo e…
Merda!
Uma dor excruciante me atinge na lateral da costela. A
número 8 não apenas me empurrou para pegar a bola, ela acertou
uma cotovelada proposital. O ar foge dos meus pulmões e caio no
chão, puxando os joelhos para o peito.
O apito ardido ressoa e o jogo para. Aperto minhas pálpebras
com a mão pressionando o local da pancada. Por muito pouco não
foi em meu abdômen.
Deus! Will estava certo.
Ele sempre está.
Droga.
Sua voz é a primeira que alcança meus ouvidos. Ele está no
campo?
— Will? — resmungo ainda me contorcendo.
— Bri… Bri, estou aqui meu amor. Estou aqui. — Apitos são
dados para tentar conter a comoção ao meu redor. A número 8
reclama e, pelo que entendo, é expulsa do jogo.
A garota estava em desespero, pois seu time já estava
perdendo de 2x1. Se levasse mais um gol, o que seria inevitável
caso eu alcançasse a distância que pretendia, seria impossível
reverter.
Mas, eu nunca imaginei que ela iria apelar para isso. Eu
deveria saber… Na verdade, fui imprudente. Fui imprudente na
estratégia da jogada da mesma forma que fui ao confiar minha
fertilidade a um aplicativo de celular.
Parabéns, Brina Heinz!
— Baby, respira! Respira! — Will me apalpa onde dói. Os
paramédicos se aproximam com a maca, seguro a mão do meu
namorado e o encaro em desespero para não falar nada sobre a
gravidez. Ele devolve com um olhar severo e tento o encanto do
gatinho do Shrek, numa feição de piedade pura.
Vejo-o assentir sutilmente, mas não deixa meu lado, correndo
com os assistentes ao lado da maca.
— Está sentindo alguma coisa? — questiona num cochicho
se referindo ao bebê.
— Só a dor na lateral. Nada ali embaixo. — Ele suspira,
porém, continua apreensivo.
Um dos paramédicos me apalpa e diz não parecer ter
fraturado.
— Não quebrei nada — resmungo e tento me levantar.
Retornando ao lugar com a mão de Will me empurrando.
— É… parece apenas uma contusão. — O sujeito pega um
spray para pancadas do tipo, levanta minha camisa e espirra no
local, sinto o leve ardor, queimando e gelando ao mesmo tempo. —
Se quiser tem Advil para dor.
— Estou bem… — Desta vez consigo me sentar pelo menos.
— São ócios de jogo.
— E aí, garota? Está bem para voltar? — A treinadora Rivers
aponta ao nosso lado e Will rosna. Acho bonitinho, por isso rio.
Meu cão de guarda.
Melhor não provocar a fera se quero manter minha gravidez
por baixo do pano, ainda.
— As meninas dão conta, treinadora. Acho que preciso ficar
de fora nesta.
— Tudo bem, garota! Vou voltar a Rox — informa e retorna
para auxiliar minhas colegas no jogo.
— Podemos ir embora, por favor? — Will quase soletra o por
favor. Acho melhor não abusar de sua braveza.
Quando já estamos distantes, Will posiciona a mão em meu
baixo ventre como se para ter certeza que está tudo bem.
— Papai coruja. Ainda é um feijão e você todo protetor, já
pensou se for uma menina, quando começar a namorar? — brinco e
caminho, tendo o outro braço de Will como apoio.
— Ela só sairá de casa depois dos 30 — responde sem me
encarar.
— Will! — Empertigo, querendo que ele desmanche o bico.
Sei que está bravo comigo.
Suspira.
— Bri… — hesita. — Baby, você precisa parar. É só agora.
Você terá a vida inteira para jogar futebol. Nosso bebê só precisa de
9 meses. Dê isso a ele.
Evito seu olhar. A voz de súplica já causa o feito desejado ao
fazer me sentir culpada o suficiente. Eu realmente poderia ter
perdido meu feijãozinho hoje. E… e ele ou ela já tomam conta do
meu coração junto do seu pai.
Não quero perdê-lo.
Nenhum dos dois.

Estou escorada na cabeceira da cama de Will, observando os


traços perfeitos do rosto do meu namorado enquanto dorme. Ele é
lindo. Um verdadeiro anjo caído em meus braços.
Deslizo os dedos pelos fios loiros prateados, as sobrancelhas
mais escuras, lábios desenhados que estão mais rosados por
minhas mordidas. Vejo as costas musculosas subirem e descerem
conforme respira de bruços, com a cabeça virada pra mim, apoiada
num braço.
Vagarosamente seus olhos se abrem presenteando-me com
o azul mais límpido que já vi. Will possui olhos de uma cor única.
— Você é lindo, anjinho — sussurro e continuo acariciando
seu rosto com as pontas dos dedos. Ele sorri. Depois ergue o tronco
e vira-se para mim, apoiando-se num cotovelo.
— Como você está?
— Estamos bem, papai — respondo, num tom de deboche.
— Apenas com fome.
— Café da manhã na cama ou no pandemônio lá embaixo?
— indaga, espreguiçando-se.
— Opções… opções… — cantarolo, com um ar de
brincadeira. Endireito-me numa posição mais sentada e a pontada
na costela me faz soltar um gemido. Will logo está em cima de mim
com a mão sobre a minha, onde levei a cotovelada.
— Baby? — Me olha preocupado. Meneio a cabeça indicando
que está tudo bem. — Cama. Você não sairá da cama hoje.
— Will! — exalto-me. — Não posso continuar dormindo aqui,
já se passaram 3 dias.
Ele hesita e depois senta-se para me analisar assumindo o
modo que faz quando quer me dizer algo. Geralmente, o ‘algo’
nunca me agrada, por se referir às minhas abstenções nos jogos.
Respiro fundo e aguardo pacientemente.
É… tive que aprender a ter paciência para esperar por Will.
Este sentimento não é mais tão desconhecido assim.
— Precisamos conversar sobre o depois…
— Depois o quê? — Faço-me de desentendida.
Ele suspira.
— Depois do nascimento do bebê, Bri — conclui. Will passa
uma mão pela nuca, nitidamente nervoso. — Eu pensei… pensei se
você pudesse ficar na mansão comigo até minha formatura. São só
mais dois anos em Braveton. Depois pensei em terminar os estudos
mais perto do escritório, onde vou trabalhar — adianta-se, fazendo-
me fechar a boca antes de retrucar.
Entrelaço os dedos da mão em meu colo e reflito sobre sua
proposta, o que lhe dá tempo para continuar a narrar a possibilidade
que encontrou em sua cabeça.
— Então, alugo um apartamento para nós. Posso ver com
papai para ficar no escritório em Stamford, dá duas horas de
viagem. Não ficará difícil para vir todo final de semana. — Leva uma
mão e segura as minhas. Os dedos gelados indicam o quanto está
apreensivo.
— Eu… — suspiro. — Confesso que não pensei nisso.
Preciso pensar, Will.
— Bri, eu quero ficar perto e te ajudar quando a bebê nascer.
— A bebê?
Will morde o lábio como se percebesse que deixou escapar a
informação.
— E-eu… — engasga, em seguida me fita encabulado. —
Toda vez que imagino nossa família, vejo eu, você e uma
menininha.
Sorrio com a descrição.
— Pode ser um menino — aponto.
— Eu sei… eu sei. Vou adorar também se for um moleque. É
que… eu tive um sonho e a fotografia nunca mais saiu da minha
cabeça. — Sorri e dá de ombros. — Quero cuidar de você, baby, e
dela — eleva a mão em meu ventre —, ou dele.
— De virgem para papai, e morar junto em menos de 2 anos.
Uau! — brinco. — Seus pais irão surtar.
— Eu encontrei minha rainha, e de brinde posso ganhar uma
princesa.
— Ou príncipe.
— Ou príncipe — concorda. — Meu conto de fadas só
antecipou as coisas um pouquinho. Mas garanto que tem valido à
pena. — Will sobe a mão até meu seio e o envolve em taça na
palma. Observo seus dedos brincarem sobre o tecido com meu
mamilo.
— Que papai safado — murmuro, e ele espreme o bico em
seus dedos, causando uma onda elétrica que percorre o caminho
direto para minha boceta. Gemo enquanto Will manuseia meus
seios, ora apertando os bicos, ora o apertando como um todo.
Will aproxima o rosto e morde deixando a marca molhada em
meu pijama. Em seguida, tira-o do meu corpo com um puxão. Ele
admira meu corpo com tamanha devoção que acredito ser digna do
título de rainha. Sua rainha.
Seguro seu pescoço, trazendo-o para meus lábios que o
recebem em um beijo abrasador. Será que já posso culpar os
hormônios por estar pronta e desejosa assim?
Meu anjinho se afasta só para arrumar meu corpo embaixo
do dele. Will me beija saboreando minha boca, buscando minha
língua ávida por seu toque.
— Eu te amo tanto, baby. Tanto que chega a doer o peito. —
declara entre os beijos. — Não sei se consigo mais viver sem você.
— Ah, anjinho… te amo, te amo, te amo — repito as palavras
que saem tão fáceis quando direcionadas para ele. — Não posso te
perder.
— Nunca…
— Jamais…
O beijo seguinte finaliza a competição, onde a cada lambida e
sensação dos nossos corpos tão próximos parecem intensificar a
emoção.
Willian King é o rei do meu coração.
O jardim de minha casa está completamente diferente da
última vez que estive aqui. Talvez seja por conta dos pergolados
colocados pela decoração, envolto em trepadeiras cheias de rosas
cor-de-rosa minúsculas.
Mesas dispostas de oito a dez lugares cada, com toalhas
acetinadas num tom perolado, com arranjos montados de flores-do-
campo estão distribuídas pelo ambiente em quantidade para uma
pequena recepção. Não tão pequena assim.
Era para ser, de acordo com meu primo Mike, o noivado de
papai seria algo mais intimista. Mas, acho que a futura senhora
Heinz não entende certos conceitos.
Minha antiga casa, por assim dizer, possui uma área externa
grande com um gramado extenso aos fundos, o que permitiu a
presença de aproximadamente 150 pessoas, acho.
— Como você está? — É a pergunta constante de Will nos
últimos dias, que implicitamente está no plural, pois quer saber de
nosso bebê também. Ele acaricia minha barriga, enquanto me
abraça por trás.
— Estamos bem — respondo, deslizando uma mão em seu
rosto. Afundo-me no azul fluorescente de seus olhos, procurando o
abrigo que firmei ao confessar meu amor. Will me presenteia com
um dos seus sorrisos lindos, que ficam ainda mais perfeitos na
caracterização de príncipe. É assim que ele está hoje, um príncipe.
Se nu Willian é magnífico, em um terno cinza com corte sob medida,
é perfeito.
Não estou tão distante da versão princesa, ou como Will
prefere, rainha. Por conta do evento acontecer ao meio-dia, escolhi
usar um vestido tubinho de renda branca, na altura dos joelhos, gola
canoa e sem mangas.
Avisto meu pai e sua noiva a poucos metros de distância
cumprimentando alguns dos convidados. Não me atento a descobrir
quem é. No momento, estou lidando com a ardência no estômago
ocasionada pela caneca de café puro que tomei no café da manhã,
ou pode ser a sensação estranha de ver meu pai sorridente demais
ao lado de outra mulher.
Nunca vi papai sorrir assim. Ele nunca sorriu assim para
mim. Eu só conheci esse sorriso nas fotografias dos álbuns, onde
ele está com mamãe e minha irmã. Na última foto, eu também estou
presente, porém no ventre da Sra. Heinz.
Por instinto, levo a mão ao meu abdômen. Will percebe.
Meneio a cabeça para que não se preocupe.
— Ei! Will! — Ouvimos a voz de Alec chamando-nos para
sentar à mesa na lateral oposta. Ele e Elisa já haviam chegado. Ao
lado, os pais de Elisa sorriem em nossa direção.
Estudo atentamente a expressão do anjo-demônio líder que
permanece um enigma para mim. O humor ácido nunca foi meu
forte, o que parece entreter e muito Lisa. Eles combinam, de certa
forma.
Sr. Vough, no entanto, pai de Lisa, está prestando atenção
nos mínimos detalhes. Ele questionou várias vezes se sua filha tinha
certeza sobre esse relacionamento. Era como uma intuição paterna
de que Alec alguma hora iria fazer merda.
Até agora não aconteceu.
Lisa disse que o pai de Alec foi grosseiro com ela no Baile
de Valentine’s Day, mas depois não teve qualquer contato. Ela não
acha estranho, então… por que eu vou achar? Eu acho.
— Vocês demoraram — Lisa reclama. — Estava prestes a te
ligar.
Sento-me ao seu lado e Will se acomoda ao meu. Por que
demorei? Porque passei um tempo maior que o necessário
passando máscara de cílios, fazendo questão de errar até o
desenho de gatinho com o delineador que tenho prática do mesmo
jeito que chuto ao gol.
Essas respostas irão satisfazer minha amiga?
Não. Não vão. Até porque Will quase escondeu minha
maquiagem para parar de enrolar. Enfrentar meu pai pedindo em
casamento alguém que vi poucas vezes na vida, bem como
testemunhar a alegria que nunca fui suficiente para lhe dar, doem.
Doem muito. Esses são os reais motivos.
Will pressiona meus dedos sobre minha coxa, dando-me
apoio.
— Não sabia o que vestir — devolvo por fim.
— Ah, querida, então está perdoada, pois está linda — a
Sra. Vough elogia com doçura. A mãe de Lisa foi o mais próximo de
figura materna que tive na vida. Ela sempre me deu carinho de
graça. Eu não precisava ser outra pessoa, ou fazer qualquer coisa
para agradá-la. Eu era simplesmente Brina. Somente Brina.
Sorrio ao receber suas palavras.
— Soube que tem investido na bolsa em empresas de
transporte, garoto. Tem visto resultado? — Sr. Vough questiona Will
para conduzir uma conversa com os rapazes.
Will sempre gostou de logística, e sei que sua formação
provavelmente será voltada para as finanças. Ele pode ter a
dificuldade com cálculos, por isso precisa das aulas de reforço com
a Debby. Entretanto, o sobe e desce dos valores de ações
corresponde mais à lógica.
Os meninos sempre o questionam sobre seus investimentos
e eu fico orgulhosa do meu anjinho não ser mais tão dependente
dos seus pais. Ele poderia, sim, bancar nossa pequena família por
um tempo. Até que eu também consiga trabalhar.
— É um ramo promissor do comércio. Apesar dos autos e
baixos. Quando uma empresa perde uma frota, as ações
despencam imediatamente. Aconteceu algo parecido com a Vough
Transportes, não? — ele responde e contesta com outra pergunta.
Senhor Vough coça a testa com as pontas dos dedos,
deixando claro sua chateação.
— Elisa contou que houve uma explosão em um dos
galpões que serviam como garagem para mais de 60 caminhões. O
que houve? — Agora e Alec que se interessa.
Nós da ala feminina poderíamos estar alheias à conversa,
contudo, Sr. Vough estava a caminho do escritório que virou cinzas.
Minha amiga e sua mãe quase o perderam.
— Existe um abastecimento interno de combustível. A
perícia informou que uma das sucatas indicava ausência da tampa e
meus funcionários fumam. O erro de um foi o inferno de outros.
Muitos aliás. Perdemos pessoas. Essas vidas são mais preciosas
que qualquer frota — responde, com uma pontada de culpa.
— Quase te perdemos, meu amor. — Sra. Vough enlaça os
dedos na mão do marido sobre a mesa. — Eu não sei o que faria
sem você.
— Nem eu, papai. — Lisa estende a mão, envolvendo o
aperto de seus pais.
— Nossa! Que tragédia… — Will comenta.
— Sim… o seguro já cobriu boa parte do prejuízo, bem
como as indenizações às famílias. Mas… muitos estavam comigo
há anos. — Sr. Vough desvia o olhar, segurando as lágrimas. —
Tem sido difícil.
— Porém, hoje é dia de festa e estamos todos aqui. Vivos.
— Sra. Vough tenta inverter o ânimo que afligiu seu esposo. —
Conte-nos, Brina, querida, como você está em ter um novo ente na
família Heinz?
Voltar o foco para outro assunto tão incomodo quanto a
morte de pessoas, por mais que o parâmetro seja diminuto em
relação ao outro, não me deixa mais confortável. Sra. Vough não faz
de propósito, pois nunca entendeu muito bem a dinâmica que
ocorria dentro de minha casa. Ela vive a versão família feliz, o que
coloca um bloqueio para enxergar além. Para ela, meu pai me dava
tudo.
Sorrio sem conter qualquer alegria, beberico do suco que foi
colocado em minha frente por um dos garçons e, a seguir, respondo:
— Muito bem. Espero que ela consiga fazê-lo feliz.
— Ah… ela faz, minha filha — a voz rouca e grossa de meu
pai reverbera acima de minha cabeça. Uma bola se forma em minha
garganta, travando a traqueia por alguns instantes.
— Respira, Baby. Respira… — Will sussurra baixinho, só
para eu ouvir. Sigo seu comando e inspiro o ar, soltando lentamente.
A situação ocorre muito rápido, mas para mim parece que o tempo
está em câmera lenta.
Enquanto meus olhos percorrem o chão, alcançando os
sapatos sociais lustrosos, com um par de sandálias douradas ao
lado, e sobe por seus corpos dando mais ênfase à calça de
alfaiataria, camisa, gravata e blazer do que ao vestido coral, as
batidas do meu peito retumbam como uma orquestra sinfônica.
Fito os olhos azuis de papai, não como os de Will, mas
ainda assim, azuis. O cabelo ralo ao topo, num corte baixo nas
laterais, deixam o Sr. Heinz como um perfeito Sugar Daddy dos
livros de romances, e não os reais, baixinhos e barrigudos. Não…
Papai gosta de se exercitar, e agora vejo que sua postura é melhor
do que antes.
Ele tem treinado mais para sua noiva?
A noiva.
Atento-me agora ao seu rosto, que contém uma expressão
acolhedora. Ela sorri com cada pedaço da face, mais com os olhos.
A pele oliva, mais escura que a minha. Helena é como eu me
lembrava, uma cópia falsificada de mamãe.
Seguro um grunhido involuntário, fechando os olhos para
me recompor.
— Olá, Sr. Heinz, sou Willian King, o namorado de Brina. —
Will me salva, levantando-se apressadamente e estendo a mão para
papai.
Eles se cumprimentam. É o tempo necessário para espelhar
meu sorriso falso.
— Como vai, papai? — Ele meneia a cabeça, ainda com a
mão estendida no aperto com Will. Encaro sua noiva. — Parabéns,
Helena. A festa está linda.
A mulher sem apreço à vida me envolve num abraço
cômico, já que mantenho os braços retos nas laterais do corpo.
— Obrigada, Brina. Espero que possamos nos conhecer
melhor, seu pai fala muito de você e do seu talento.
— Me-meu talento? — gaguejo sim. Não tem como não
gaguejar com a cena toda.
— Claro, filha. — Agora é papai que me dá o mesmo
abraço. Eles ensaiaram? — Você é a melhor jogadora de futebol de
Braveton. Todas as vezes que converso com o reitor, ele não para
de te elogiar. Tenho orgulho de você, Brina.
— Hum? — Meus olhos esbugalham na órbita como
desenho animado, tenho certeza. — É pegadinha?
— Por que seria, Brina? — Abduzido. Só pode. Sr. Heinz foi
abduzido ou está possuído por alguma entidade. Chacoalho a
cabeça para retomar os sentidos.
— Porque… porque o senhor nunca aprovou minha escolha,
papai? Porque pensou que ficar sem minha mesada me faria desistir
e ficou irado quando soube que meus avós me deixaram com
reserva financeira? — sibilo, com minha voz elevada sem intenção.
— Sim, Brina. E tenho orgulho por ter criado uma filha tão
persistente. Isso só indica que você é uma Heinz — exalta
orgulhoso, como se seu sangue em minhas veias é o responsável
por minhas conquistas.
Ah, não… Não mesmo. Meu humor transmuta drasticamente
de apreensivo para animosidade. Meus nervos salpicam em minha
pele, ensandecidos com a euforia inversa da raiva. Sinto a quentura
subir pelo meu colo até minha face. Ele só pode estar de
brincadeira.
— Uma Heinz que teve um pai ausente por toda sua
infância. Uma Heinz que buscou ser a melhor em tudo para sentir
menos culpa pelas mortes da mãe e da irmã. — Estufo o peito,
dando um passo à frente, fazendo-o recuar. — Uma Heinz que foi a
melhor em tudo para que seu pai lhe desse um pingo de carinho,
que jamais foi dado. Ah… papai. Sou, sim, uma Heinz. E fui ainda
mais quando desisti de tentar provar pra você que sou suficiente. Eu
sou… — Sinto a primeira pontada. Mas não paro. — Eu sou
suficiente para quem me ama de verdade.
— Filha… — sua voz quebra. E a dor refletida nela me
despedaça por dentro, literalmente. Outra dor aguda em meu baixo
ventre dá indícios que fui longe demais.
A bagunça em meu interior aumentou drasticamente minha
pressão sanguínea, sinto meu peito se fechar e o estômago contrair.
Outra pontada, como se uma agulha gigante estivesse me
perfurando por baixo.
— Bri! — Will grita e me segura. Estou me contorcendo de
dor. Ele me pega no colo. Meu vestido branco está vermelho em
minha virilha.
Nãoooo…
— Will… — sussurro, na esperança de me agarrar à sua
imagem, já que minha voz não sai.
— Eu vou cuidar de você, meu amor. — Seus olhos estão
marejados e vejo as primeiras lágrimas escorrerem antes de abraçar
a escuridão.
Estamos na sala de espera há uma hora, ainda sem notícias
da minha garota. Brina não devia ter se exaltado daquela forma.
Quando suas pálpebras se fecharam não pensei em mais ninguém,
peguei-a nos braços e dirigi como um louco para o hospital.
Estacionei como um maluco na entrada e berrei por socorro,
afirmando que minha mulher estava perdendo nosso bebê.
Não me importei quem iria ou não ouvir.
Eu precisava de ajuda para salvá-la. O medo agonizante
está consumindo meu peito e sinto a bile subir à boca cada vez que
as portas para a sala de cirurgia se abrem.
A médica só informou que a hemorragia estava avançada e
a intervenção cirúrgica seria a única saída. Ela não falou do bebê.
Ainda tenho esperanças.
Alec e Elisa estão sentados à minha frente, enquanto o pai
de Brina com sua noiva, ao meu lado. Ele parece culpado. A mesma
culpa que vi estampada em seu rosto com as afirmações dolorosas
de sua filha.
Será que ele não fazia ideia do quanto machucava uma
garotinha ao assumir o luto sozinho? Esse cara deveria ter feito
terapia e dado amor à Brina. Não rejeitá-la e diminuí-la a todo o
momento.
Ele perdeu pessoas que amava, mas poderia ter como
compensação o amor de sua garotinha.
Ele preferiu sofrer e se fechar após perder algo precioso. E
agora, eu posso também perder algo assim…
Finalmente as portas se abrem e a médica que estava com
Brina aponta e caminha em nossa direção. Apresso-me para
alcançá-lo antes.
— Como ela está, doutora?
— Estável. — Por que merda todo médico fala isso, porra?
Permanecemos em silêncio para a médica nos informar sobre o
procedimento aplicado durante a cirurgia de Brina, bem como o
diagnóstico que só poderia ser passado agora, posto que seu caso
era urgente. — Tivemos que remover um ovário, pois a
endometriose já havia alcançado parte do intestino. Conseguimos
extrair os cistos e cauterizamos a região. Agora é observar e
aguardar.
— Ela é forte. Minha filha é forte, doutora — Sr. Heinz diz,
mais parecendo tentar convencer a si mesmo.
— E o bebê, doutora? Ela perdeu? — questiono ansioso.
— Bebê? — A médica me olha em dúvida. — Essa paciente
não estava grávida, meu jovem.
Demoro alguns segundos para processar sua fala. Ela está
errada. Brina estava, sim, grávida. Ela fez vários testes e depois o
exame de sangue confirmou.
— Você está equivocada. Fizemos exame de sangue, deu
positivo. Nossa consulta ao obstetra está marcada para próxima
semana. — falo sem intervalo, e continuaria com justificativas sobre
o erro cometido pela doutora, caso Alec não colocasse a mão em
meu ombro.
— Não, rapaz. Não havia indícios de gravidez no útero que
acabei de suturar. A garota possuía cistos, cistos grandes inclusive,
e uma endometriose grave. Alguns cistos raros produzem o HCG,
provavelmente foi o que aconteceu — emenda, analisando uma
prancheta que a enfermeira acabou de lhe entregar. — Por isso, os
exames atestaram positivo para gravidez, e vocês só descobririam
com o exame de ultrassom.
— Mas… ela estava sem menstruar — Elisa aponta.
— Porque o sangue estava fazendo o caminho inverso. — A
médica agora parece com raiva.
— Doutora, minha filha está bem?
— Como disse: estável. Ela passará a noite na UTI em
observação e amanhã será transferida para o quarto. O horário de
visitas começa às 11 horas. Agora, preciso atender outros
pacientes. Com licença. — Afasta-se apressada, antes que
possamos questionar novamente.
— Eu não vou embora — murmuro.
— Will… Você pode descansar e voltar amanhã. Ainda está
de terno — Elisa fala, segurando meu braço.
— Isso cara. Você não precisa dormir numa dessas
cadeiras. Ela está bem. Amanhã voltamos — Alec remenda a
namorada. Solto um suspiro que arde o nariz por conta do cheiro
hospitalar.
— Bom… nos vemos amanhã — Sr. Heinz se despede,
ainda atordoado, e Helena nos dá um sorriso contido, seguindo-o.
— Não será bom para Brina ver o pai amanhã. — constato.
— Ele não irá entrar se ela não permitir. Só quer ter notícias
da filha. — Lisa tenta amenizar a culpa do pai de Bri. — Sr. Heinz
não é um homem ruim, Will. Ele só não soube sofrer a perda da
esposa e filha. Acabou se fechando e prejudicando o único elo de
amor que ficou, que é a Bri.
— Estou com raiva daquele homem. É difícil não ter alguém
para culpar. Sei que tudo isso foi uma fatalidade, que pelo visto
aconteceria mais cedo ou mais tarde. — Indico em direção à médica
que nos atendeu ainda no balcão, conversando com outros
funcionários. — Mas, não me pede para ser racional. Não agora.
Ela assente.
Acabei de quase perder a mulher da minha vida e perder
nosso bebê que nem sequer existiu. Foi apenas um engano.
Um engano que modificou todo meu plano de futuro. Eu já
havia desenhado em minha mente nossa família. Como seria sentir
a primeira vez que o bebê começasse a se mexer dentro dela.
Mas… mas foi um engano. Só um engano.
Então, por que sinto esta dor crescente em meu peito a
cada segundo que noto que não terei mais um filho com Brina?
Por que a ausência do bebê que nunca existiu dói tanto?

Minhas narinas ardem com o odor característico de éter


misturado com algum desinfetante com cloro. Puxo o ar devagar,
acostumando-me aos poucos. O dorso da minha mão está
queimando, e sinto uma corrente fina espalhar a sensação para o
pulso.
Abro e fecho os dedos. Um repuxão demonstra a existência
de algo preso à minha pele. Estou com um acesso intravenoso.
Meus olhos tendem a não me obedecer quando quero abri-
los. Pisco e imagens embaçadas surgem numa mescla de tons
verdes claros e branco.
Estou em um hospital. Will me trouxe para um hospital.
Não me recordo de como cheguei aqui depois da dor aguda
no abdômen. A sensação foi tão intensa que apaguei. De uma hora
para outra, a agulha gigante transformou-se em uma espada e me
atravessou ao meio. Foi exatamente o que senti. Não resisti.
Inspiro, tentando tomar mais o ar em meus pulmões e forço
minhas pálpebras a subirem. Preciso saber sobre meu estado.
Preciso…
Meu bebê…
Será que perdi meu bebê?
— Ela está acordando. — alguém diz ao meu lado. — Olá,
querida. Meu nome é Beth e sou sua enfermeira. Como se sente?
Está com dor? — Beth confere o medidor do soro que cai gota a
gota no saquinho acima de minha cabeça, pendurado ao suporte de
ferro. Uma cânula fina sai e vai até o dorso de minha mão, onde
percebo o curativo do acesso.
— Minhas pernas estão dormentes. — informo, sentindo a
boca seca como se tivessem colocado um punhado de algodão.
— É normal. Você passou por uma cirurgia, menina. Estava
com vários cistos e a endometriose era gravíssima. A doutora
Monica retornará no turno da manhã. Foi ela quem fez sua cirurgia
com o doutor Rafael. Mas posso pedir para o plantonista vir aqui e
te dar mais detalhes, se quiser.
— E-eu aguardo a doutora que me operou. Apenas… —
Minha garganta arranha quando falo. — Estou com sede.
— Ah, sim. Aqui. — Beth despeja água em um copo plástico
que estava numa mesinha ao lado da cama e me dá. A água desce
com um gosto amargado.
— Além das pernas dormentes, está com dor, querida? —
Ela me inspeciona.
— Não. E-estou bem, acho — respondo.
— Então, vou ficar no corredor. É só apertar o botão se
precisar de algo.
Meneio a cabeça e quando Beth ainda está a poucos metros
de distância consigo chamá-la.
— Beth, — ela retorna e solta um murmúrio para que eu
faça minha pergunta. — E o meu bebê? E-eu… eu perdi meu bebê.
A enfermeira me olha com doçura e retoma seu lugar ao
meu lado. Passa as mãos por meus cabelos em um consolo
silencioso, já aguardo a confirmação.
— Ah querida… Não havia bebê — diz e segura meu braço,
que levanto instantaneamente em reação.
— Co-como? — Minha voz ainda falha, por minha língua
estar sob os efeitos dos medicamentos. — Eu estava grávida. Eu…
— Não, querida. Fique tranquila. É um erro que acontece
em determinados cistos raros. O corpo feminino produz o hormônio
da gravidez, mas não há bebê algum. Não precisa se preocupar.
Você não perdeu uma vida, menina — Beth afirma a ausência de
bebê como se isso fosse me consolar. O fato de não estar grávida e
sofrer uma hemorragia não foi sinônimo de aborto.
Não havia bebê.
Meus sentidos estacionam na última frase da enfermeira e
permaneço estática, tentando absorver a miscelânea de emoções
que nocauteiam meu coração. Meu peito se comprime e fica
pequenininho.
Eu não me sinto consolada pelas palavras de Beth. Eu me
sinto uma fraude. Um engano completo para o mundo. A sensação
de não ser suficiente nem para carregar um bebê esmaga meu
âmago já fragilizado.
O que Will está pensando?
Deus!
Meu pai estava certo. Eu não fui suficiente para suprimir a
saudade que sentia de minha mãe e irmã, e agora não fui suficiente
para carregar o filho de Will.
Uma lágrima silenciosa percorre minha bochecha, dando
início às outras que se formam e caem sem cessar.
Eu não estava grávida.
Era tudo mentira. Um engano do destino para chutar minha
bunda e mostrar o quanto sou insignificante.
Tudo aquilo que fiz para me reafirmar como a Brina forte e
destemida era só fachada. A Brina com medo de errar para ser a
melhor na escola e ser digna do amor do pai retorna, ocupando
cada célula do meu corpo.
Beth enxuga minhas lágrimas e continua sussurrando
palavras de apoio que não identifico mais na penumbra em que me
encontro.
Coloco a mão livre na barriga, deixando a tristeza me
consumir. Fungo e soluço um choro sôfrego.
Eu não tinha um bebê dentro de mim.
Meu bebê jamais existiu.
Mesmo assim, está doendo tanto.
A perda daquilo que nunca tive dói, porque era esperado e
desejado. Amado.
O bebê seria a concretização do amor entre mim e Will. E
agora… Agora o que irá sobrar da gente?
Um cansaço descomunal me atinge e percebo que a
enfermeira modificou o soro no meio do meu rompante.
— Durma, querida. Durma. Você precisa descansar.
Amanhã seus familiares e amigos estarão aqui. Só descanse. — Ela
deve ter me sedado. Fecho os olhos ainda com soluços pequenos
me escapando.
Então, apago, esperando que o engano seja a versão de
Beth e que amanhã irei acordar nos braços de Will, sendo tudo isso
apenas um pesadelo.

Assim que a cama hospitalar com rodinhas adentra o quarto,


sendo empurrada por dois enfermeiros, a primeira pessoa que
avisto é Will, sentado na poltrona, derrotado, com os cotovelos
apoiados sobre os joelhos e o rosto abatido.
Ele praticamente salta ao me ver e não espera nem sequer
o meu soro ser posicionado no suporte ao lado do leito para se
aproximar. Os dedos gelados que conheço como sendo a indicação
do seu nervosismo são os primeiros a tocar meu braço.
— Baby… — sussurra como uma prece dolorida aos meus
ouvidos. — Eu estou aqui…
Sim. Ele está.
Aquiesço com um leve gesto de cabeça, evitando pronunciar
palavras que indiquem quão quebrada me encontro.
Ele também está.
Nós dois estamos.
A dor dilacerante que senti ao receber a notícia que nosso
bebê não existia não chega perto do que sinto ao ver a aflição no
azul que geralmente está fluorescente adornando a face do meu
anjinho, e não opaco como neste momento.
Will puxa a cadeira e senta-se ao meu lado, envolvendo a
mão livre estendida ao lado do meu corpo.
— Ficará tudo bem, meu amor. Tudo bem… — Ele beija os
nós dos meus dedos. — Seu pai também está aqui. Foi conversar
com a equipe médica que te operou para saber dos cuidados pós-
operatórios. Disse que quer cuidar de você em casa. Mas, eu posso
cuidar de você, baby. Se quiser…
— Não — corto-o. — Não, Will. Eu vou com meu pai. Você
não precisa perder aula para cuidar de mim.
— Mas eu…
— Will, ele é meu pai, afinal. Nada mais justo cuidar da filha.
— replico e ele se dá por vencido. Acredito que se colocou em meu
lugar e pensou que preferiria os cuidados de um dos meus pais ao
dele.
Não é isso.
Eu não quero e não vou prejudicar meu anjinho. Ele não
precisa perder suas aulas, e até mesmo seu tempo, quando pode
agora ter seu futuro livre da responsabilidade de uma criança.
Nosso bebê.
Uma lágrima grossa me surpreende e escorre sem aviso por
minha bochecha. Will a pega no meio do caminho, antes de chegar
ao meu queixo.
— Ah, Bri… eu sinto muito — diz baixinho.
— Eu não sei por que dói tanto se ele nem existiu… —
confesso. — Por que sinto este vazio esmagador em meu peito?
A agonia cumulada com o estresse aperta os músculos do
meu ventre e solto um grunhido de dor. Não sei se física ou
emocional. A pressão aumenta, bem como o choro incontrolável que
deixo fluir.
Will me abraça de modo esquisito, colocando a cabeça em
meu peito e percebo que soluça juntamente comigo, unidos em
nosso sofrimento.
— Também sinto, baby. Isso é estranho. Mas, também sinto
como se algo estivesse sangrando dentro de mim. Meu coração já
dividia morada entre você e nosso filho. Agora… agora apenas dói.
Pressiono os lábios em uma linha fina contendo os soluços
que saem sem permissão. Will continua emvolto em meu torso
quando papai abre a porta e presencia a cena chocante de dois
jovens aflitos e em prantos. Ele fica estático, segurando a porta e
então percebo que outrem a força para ter passagem.
Meu pai estaria segurando alguém para não entrar?
Inclino a cabeça e vejo uma mulher de jaleco branco,
cabelos grisalhos, não tão baixa, com os óculos na ponta do nariz,
que encara meu pai e depois nós, demonstrando compreensão por
ser mantida fora.
— Tudo bem… pode entrar — digo, por fim, aceitando a
presença da médica.
Will enxuga o rosto com as mãos e volta a segurar a minha.
— Filha, esta é a Dra. Roosevelt, foi ela quem fez sua
cirurgia — Papai informa e a doutora aproxima-se da cama.
— Olá, Brina, como se sente?
Uma merda, penso.
— Com dor — É o que digo.
— Vou aumentar o analgésico. O pós-operatório não será
tão simples por conta da retirada do ovário esquerdo. Você
precisará ficar de repouso por uns dois meses, no mínimo — relata
mecanicamente.
Retirada de ovário? Ela disse que além de tirar meu bebê,
também tirou meu ovário?
Brina, o bebê não existia.
Não importa.
Engulo em seco, percebendo o desconforto de papai. Ele
com certeza está se questionando sobre os herdeiros que
provavelmente não lhe darei. Então, indago para confirmar:
— Vo-você retirou um dos meus ovários?
— Foi preciso. A endometriose estava em estágio avançado,
e por sorte conseguimos manter o outro, que você deverá fazer
exames para saber se é sadio. — responde com frieza. Essa mulher
é médica mesmo? Quem dá uma notícia assim para um paciente?
Além de lidar com toda emoção causada pela perda do bebê
inexistente, ainda preciso aguentar a sensação de me sentir
mutilada.
— Você não pode falar assim quando minha filha mal saiu
da UTI. — Papai me surpreende ao me defender.
— Eu ainda preciso ver os pontos e… — ela pragueja.
— Não me toque — consigo ao menos soar um pouco
agressiva.
— Saia. — Papai mostra-lhe a porta.
A médica insensível empina o nariz e segue para a porta
com uma postura altiva.
— Irei solicitar outro profissional para nos atender. — Meu
pai diz, segurando o encosto aos pés da cama. — Você ficará bem
por alguns instantes? Disse que sentia dor e ela saiu sem deixar a
medicação.
— Eu sobrevivo — respondo.
Ele assente.
— Cuide de minha filha, Sr. King. Volto logo — direciona-se
para Will, que meneia a cabeça.
Quando a porta se fecha nos encaramos novamente.
Suspiro cansada. Will retoma a posição ao meu lado e tenta pegar
minha mão que puxo para mim.
— Bri…
— Não, Will. Não quero conversar.
— Baby, você ainda tem um ovário, amor. Isso não é o fim
do mundo — murmura, tentando soar encorajador.
Ele realmente pensa isso? Minha cabeça está girando, meu
corpo está dolorido como se um caminhão tivesse me atropelado, e
me sinto tão fragilizada a ponto de não controlar a cachoeira que se
alojou em meus olhos.
— Will, eu preciso que você vá embora — digo, passando a
mão em meu rosto molhado.
— Por quê, baby? Eu quero ficar com você — retruca.
Não consigo apertar o pause do choro, muito menos nas
emoções que se contorcem entre aceitar minha dor e querer
consolar o meu amor. Não dá.
Will está tão quebrado quanto eu, e agora… agora eu
preciso me ater a uma coisa de cada vez. Não consigo ser forte
para ele. Não quero vê-lo sofrendo por minha causa.
Ele não merece isso… Will não merece alguém insuficiente.
Meu rei merece uma rainha, e eu… eu perdi meu trono.
— Porque preciso descansar e com você aqui, não vou
conseguir.
— Eu vou ficar quietinho — replica.
— Will… — suspiro. — Eu preciso ficar sozinha pra aceitar
tudo. Com você aqui, não vou pensar em mim, entende? Só consigo
pensar em você…
Percebo seus lábios tremerem juntamente à relutância em
sair do meu quarto.
— Por favor, Will… eu preciso focar no que estou sentindo.
Não consigo, vendo você assim…
— Desculpe… — sussurra tão baixo, que precisei ler seus
lábios. Ele fecha os olhos, e lágrimas taciturnas caem, molhando o
lençol hospitalar. Will as enxuga, beija minha testa e sai.
Quando vejo a maçaneta retomar a posição horizontal ao
fechar a porta, deixo a agonia e aflição que lutavam em meu peito
saírem com meu pranto sofrido, carregado de dúvidas sobre um
futuro onde Will não estaria ao meu lado.
Eu seria capaz de deixar meu anjinho seguir sem mim?
Não sei…
Mas, é o certo a fazer.
Empurro a bandeja para frente, afastando do meu colo.
Cassandra passou a trazer todas as manhãs um desjejum
caprichado na cama, com salada de frutas, waffles com mel, suco
de laranja e iogurte. Tudo o que ela acostumava fazer para me
agradar quando ficava doente.
Estou há uma semana de volta à casa de papai, e já sinto
falta do meu quarto no apartamento das meninas.
Meu apartamento também. Minha casa.
Coloco meu café da manhã na lateral e pego o aparelho
celular para verificar minhas mensagens. Elisa tem mandado a cada
hora algo para me entreter, seja algum comentário bobo de suas
aulas de filosofia, seja uma selfie com o campus de plano de fundo.
Deus! Como eu sinto falta daquele lugar!
Os professores estão encaminhando atividades e trabalhos
para que eu possa fazer em casa e não perder conteúdo, nem os
créditos. 2 meses de repouso pode me custar um semestre na vida
universitária.
Como eu gostaria de estar de volta. O novo médico que me
atendeu no hospital San Paolo informou que se fizesse o repouso
corretamente, poderia retomar minhas atividades diárias após 40
dias da cirurgia.
Nada de 2 meses como o abutre daquela médica falou.
Só papai para me arrumar uma médica destruidora de
emocional como aquela vaca. Será que ninguém fez uma
reclamação junto ao Conselho de Medicina? Aquilo foi antiético e
uma agressão escancarada ao paciente.
Não sei se o Sr. Heinz ficou sensibilizado por nossa
discussão ter sido o estopim para tudo, mas parece que já se
prontificou a punir a Dra. Louca.
Outra mensagem pisca e essa causa um calafrio na boca do
meu estômago.
Will.

“Como você está, baby? Estou com saudades.”

Visualizo e fico feliz por ter desabilitado a opção que


identifica a leitura das mensagens, assim ele sabe que recebi,
porém, não sabe o momento que irei ler.
Covarde?
Sim. Uma franguinha é o que tenho sido durante esses sete
dias. Ainda remoendo minha auto piedade, sentindo-me pequena e
injustiçada pelo universo.
Primeiro, tive que aceitar ser mãe aos 20 anos. Um susto.
Porém, aceitar a existência de uma vida é muito melhor que sua
perda.
E é exatamente isso que senti quando soube que meu bebê
não passava de um engano.
Por que justo comigo os cistos raros que induzem ao falso
positivo tinham que se multiplicar?
Para piorar, além de tirar a fantasia que criei de um futuro
com meu namorado, tive arrancado de mim a possibilidade real de
uma futura gravidez.
Essa maldita endometriose levou um dos meus ovários,
porra!
Dr. Louis disse que estou sendo pessimista ao pensar dessa
forma, posto que o outro ovário ainda tenha a possibilidade de
funcionar corretamente.
Mas sejamos realistas… o universo deixou claro que estou
fodida. Pra que criar esperanças?
O que aprendi de lição com essa experiencia é que não
devo criar expectativas de um futuro feliz para mim.
Estou condenada a ter o amor roubado.
Já deveria ter esta consciência, posto que o meu
nascimento usurpou a felicidade de meu pai, ao levar minha mãe.
Eu nasci em meio ao caos. A verdade dura e crua que tentei
lutar arduamente contra foi escancarada em minha cara. Estou em
debito com o mundo e por isso não posso sentir o amor, quando
nasci na dor de outro ser humano.
E fui a réplica desse sentimento por todos os dias que papai
me olhava.
Eu fui o que sobrou para ele…
E… não era boa o bastante para suprimir a ausência de sua
amada esposa e filha querida.
Will merece mais… não a sobra de alguém.
Ele merece uma pessoa por inteiro. A Brina Heinz que Will
conheceu era uma fraude. Uma garota que tentou ser alguém digna
e suficiente de amar.
Como ser aquilo que nem mesmo eu acredito agora?
Não dá…
Não poderia exigir que Will continuasse comigo quando sua
vida ficaria comprometida à meia felicidade… ou nem isso.
Eu o amo muito para permitir que ele tenha menos… Will
merece uma pessoa por inteiro.
Batidas na porta me acordam do sofrimento.
— Posso entrar? — Papai aparece com meio corpo no
batente da porta.
Aceno com a cabeça e ele toma como permissão.
Meu pai tem feito isso todos os dias, antes de ir trabalhar.
Ele aparece em meu quarto, às vezes apenas beija minha testa e
deseja um “bom dia”; outras, senta-se na beirada da cama e
comenta sobre algo aleatório como a meteorologia.
Percebi que esta é sua forma de averiguar minha
recuperação.
Estranho que sua preocupação cause uma sensação bem-
vinda em meu peito dolorido e machucado pela minha decisão em
afastar Will. Eu sei que devo afastá-lo, mas, ao mesmo tempo,
quero estar em seus braços.
É tudo tão confuso. Preciso de tempo.
— Como está hoje?
— Igual… — bufo. — Nada para reportar ao doutor Louis —
falo aborrecida.
— Não é sobre isso que estou perguntando, filha. — Sua
respiração falseia. — Quero saber como você está aqui — toca
minha têmpora.
Respiro fundo e hesito com as palavras. Não sei se estou
pronta para aceitar a alteração brusca de atitudes de papai. Devo
agradecer à Helena que parece ser uma mãe solteira muito melhor
que meu pai?
Com certeza.
Somente quando vim para casa me recuperar, descobri que
Helena possui um filho já formado e engenheiro. Ele não estava
presente no dia do noivado, pois sua esposa está grávida de nove
meses e não poderiam viajar da Califórnia para cá sem riscos.
A noiva de meu pai sempre deu atenção para seu filho. O
pai sumiu no mundo e ela cuidou dele sozinha, dando amor e
atenção. Esses valores foram embutidos no sistema neural do Sr.
Heinz, pois são visíveis nos atuais atos praticados por ele.
Dizem que o homem se faz de acordo com a mulher que
tem. Pensei que era apenas lenda urbana…
Segundo o que tenho vivido, é a mais pura verdade.
A própria Helena veio até meu quarto e acabamos
conversando de forma agradável. Ela é uma pessoa boa.
— Eu estou bem, pai — respondo.
— Willian me ligou, perguntando sobre sua recuperação, já
que você não o responde. — Papai me analisa. — Não acho que
tenha perdido seu contato — Sr. Heinz tenta, pela primeira vez, não
ser irônico, esboçando um sorriso leve.
— Eu… eu não perdi. — Desvio o olhar. — Eu só não estou
pronta.
— Ele quer vir te ver — diz, ainda estudando minha
expressão. — Eu posso dizer que você tem dormido o dia todo, se
for isso que quer.
Solto uma lufada de ar cansada. Não sei mais o que quero.
— Filha, eu errei… errei muito com você — Papai afirma,
colocando uma mão em minha perna. — Eu me fechei no meu
sofrimento e te culpei.
Retomo seus olhos nos meus, ansiosa pelas próximas
palavras, como se aguardasse por este momento minha vida toda.
— Você era apenas um bebê, uma criança, que nem sequer
teve sua mãe para abraçar, enquanto eu fui privilegiado ao viver
momentos incríveis com ela e com sua irmã. Ah, filha… sua mãe era
o amor da minha vida, e sua irmã foi embora tão jovem… — Vejo
uma lágrima escorrer. — Mas… eu… Ela me deixou você…
— Pai…
— Eu deveria ter agradecido por pelo menos ter alguém
para amar após a fatalidade que levou sua mãe e sua irmã de mim,
mas… mas eu só soube me lamentar… — ele passa uma mão pelo
rosto e vira o pescoço para mim. — Você me lembra tanto ela…
Acho que isso me fez criar um muro ainda mais alto entre nós. Você
era uma criança, Brina. Eu deveria…
— Pai… já foi…
— Você tem o espírito de sua mãe, filha. Ela sempre foi
audaciosa e tão petulante quanto. — Papai mira o vazio, e solta um
riso frouxo, lembrando-se dela. — Eu pensei que, obrigando você a
seguir os passos de sua mãe como advogada, poderia ter um
pedaço dela de volta. Mas… isso é errado. Você já é parte dela, e
tem todo direito de escolher sua vida, Brina. Eu… me perdoe por
não ter sido o pai que você merecia.
Não consigo pronunciar palavras, já que perdi a voz com
sua declaração. Ele finalmente me enxergou.
— Helena… Helena é uma pessoa maravilhosa, e jamais
ocupará o lugar de sua mãe. Quero que saiba disso. Ela me fez ver
o quanto errei com você, minha menina. Eu sabia… porém, o
orgulho me deixou cego para aceitar. E… e quase te perdi… quase
perdi o presente que sua mãe me deixou, que foi poder ser seu
pai… Ah filha, se me deixar, irei valorizar desta vez. — Papai pega
minhas mãos que inconscientemente entrelacei sobre o peito. — Eu
prometo.
Sorrio, sentindo o gosto salgado das lágrimas que desceram
e alcançaram minha boca. Meneio a cabeça afirmativamente,
devolvendo e acolhendo as mãos de papai nas minhas.
Demorou… mas ele veio para mim.
— Vamos fazer dar certo — sussurro.
Meu pai assente e ficamos assim por um tempo. Ele
pigarreia e limpa o rosto com um lenço de pano que retirou do bolso.
— Você quer ver seu namorado, filha? — Tenta parecer
mais casual, após nossa reconciliação.
— Não… ainda não — respondo, com a voz trêmula. Não
estou preparada para enfrentar as emoções que Willian King causa
em mim. Ainda preciso de espaço para colocar os meus
sentimentos no lugar.
Papai se levanta em silêncio, compreendendo que agora
preciso ficar sozinha. Acho que ele também precisa. Temos isso em
comum.
Um pai e uma filha se redescobrindo no amor que sempre
existiu.
Só estava escondido e agora seria cuidado e regado a cada
dia para nunca mais deixar de existir.
A água quente cai sobre meus ombros, enquanto espalmo a
superfície do azulejo em minha frente com ambas as mãos e braços
estirados. Deixo o ardor corromper a epiderme o máximo que posso,
sabendo que ficarei com a região vermelha por conta da minha pele
branca demais. Oposta à sua cor em tom bronze. Tão linda…
Sinto falta de percorrer com os dedos a superfície de suas
coxas musculosas que tendiam a se arrepiar todas as vezes que me
aproximava da região interna próxima a sua virilha.
Brina não é uma garota inexperiente e fazê-la suspirar me
dava a falsa impressão de empoderamento e orgulho por ser eu a
fazê-la gemer.
Como se seu corpo desejasse apenas o meu toque e de mais
ninguém neste mundo… sentia-me um rei.
Agora… agora só tenho a lembrança dos momentos que
passamos juntos. Às vezes, acordo com a impressão de que tudo
não passou de um sonho.
Se não fosse seu shampoo e condicionador dispostos ao lado
dos meus produtos de higiene dentro do box, poderia jurar que tudo
o que vivemos foi irreal, fruto da minha imaginação.
Só que não…
Minha imaginação não seria capaz de detalhar momentos tão
íntimos como os que tivemos. Não conseguiria ser tão criativo ao
ponto de saborear seu gosto e sentir saudade da textura de seus
lábios.
Não…
Pego a embalagem e despejo um pouco do líquido cremoso na
palma para lavar meus cabelos com algo dela. O cheiro de jasmim
se espalha com as gotículas nebulosas do ar quente formado como
uma sauna ao meu redor.
Inspiro, inalando o máximo de ar que consigo. Talvez, assim,
possa me conectar a mais uma lembrança do seu corpo.
A quem estou enganando?
Ela está por todos os cantos deste banheiro e do quarto como
uma luz que tende a permanecer acesa por mais que a noite caia,
não consigo encontrar o interruptor e parar de pensar em minha
garota.
Eu não quero parar…
Eu a quero de volta.
Já faz um mês que me pediu para me afastar. E eu o fiz.
Todavia, não consegui deixar de enviar mensagens. Precisava
saber se estava bem. Quando suas respostas não vieram, me
recorri ao seu pai.
Nunca pensei que pediria um favor ao Sr. Heinz, que não fosse
para verificar o setor jurídico de uma de nossas empresas junto ao
seu escritório de advocacia, que atende ao nosso Grupo
empresarial.
Eu não tinha intenção de me envolver com a Truthfalling tão
cedo, como Alec, que já assume atividades no meio dos negócios
de nossas famílias. Mas foi o meio que encontrei para estar próximo
a ela. Através de seu pai. Irônico, não?
Só assim, pude ter mais notícias dela.
Elisa e as garotas mantêm a discrição, já que Brina pediu para
elas não intervirem por mim.
Porra.
Eu ainda sou seu namorado.
Ela poderia me responder um simples “estou bem, Will”. Mas
não… nem isso.
E a cada dia longe da minha rainha, meu mundo desaba mais
um pouco, bem como os destroços do meu coração. Se ainda tenho
um… Brina é o meu coração, sem ela…
Respiro fundo novamente, aplacando a saudade que invade
meus poros com seu perfume no momento que saio do banheiro. Eu
sou um filho da puta masoquista, sei bem disso.
Faço questão de manter o cheiro do meu amor em cada
pedaço do cômodo que mantenho na mansão, o que inclui apenas
meu quarto e banheiro. Se despejasse a fragrância de Brina por
outros lugares, as meninas iriam brigar com os rapazes pensando
que pudessem estar trazendo outras garotas para dentro de casa.
Ou até mesmo deixando que as companhias de Gabriel
estivessem se locomovendo pelos ambientes da mansão, o que eu
e os demais impusemos como um limite extremo para aceitar as
visitas esporádicas dos seus casos em nossa casa.
Salvo, quando ele se rende e permite-se passar a noite com
Aline. Às vezes acredito que fazemos isso por respeito à baixinha.
Sabemos que ela, sim, é a dona do coração de Gabriel, só que ele
faz de conta não perceber, ou mente para si mesmo.
Deixo meu corpo cair no centro da cama e fito o teto, com a
toalha ainda enrolada em minha cintura. Meus cabelos molhados
estão mais compridos, então, jogo para trás, sentindo os fios lisos
entre os dedos.
Os cabelos de Brina são mais grossos e, quando molhados,
faziam cócegas em minha mão ao sentir as ondulações dos seus
cachos. Ela praticamente inundava os lençóis por deixá-los
extremamente molhados após o banho.
Lembro-me de sua explicação sobre como a água e o creme
capilar ajuda a domar suas madeixas crespas e, por isso, foge do
secador e, consequentemente, transformava minha cama em uma
piscina.
Eu não me importo. Ela pode jogar um balde d’água em meu
colchão se isso significar tê-la de volta.
Não suporto mais caminhar pela faculdade à sua procura. Elisa
disse que ela poderia retornar a qualquer momento agora, já que
sua recuperação foi mais rápida que Dr. Louis previu. O corpo
atlético de Brina ajudou.
Porém, ela não retornou… ainda.
E só por isso mantenho minha presença em dia na
universidade. Caso contrário, não sairia deste quarto.
— Cara, se não tivesse acabado de ver uma mensagem no
telefone da fadinha, jurava que Bri estava aqui — Henry surge na
porta e caminha em minha direção, sentando-se ao meu lado. —
Você está péssimo.
Viro a cabeça preguiçosamente para ele.
— Ela mandou mensagem para Debby? — pergunto
esperançoso. — Vai voltar hoje?
Henry balança a cabeça negativamente.
— Já estamos na última semana do semestre, cara. Parece
que sua gata fechou as matérias com trabalhos — responde, com
uma pontada de culpa.
Viro o rosto para o outro lado.
Quando você vai voltar, Bri?
Quando irá parar de se esconder, meu amor?
— Eu vou até ela — digo e levanto-me de súbito. Henry até se
assusta. — Já esperei demais e respeitei o máximo que consegui do
seu tempo. Não dá mais…
— Will, cara… — Ele passa a mão pela nuca sem jeito. — Não
acho que é uma boa ideia. Debby comentou que a morena tá
estranha.
— Estranha como? — indago, indo para meu closet e pegando
a primeira camiseta que aparece.
— Estranha do tipo que só a Elisa consegue conversar com
ela, e mesmo assim, poucas palavras. Sua garota entrou na
caverna, mano. Ela sempre foi o lado másculo da relação de vocês
mesmo. — Henry coça o queixo. — Li isso naquele livro do John
Gray[1], que o homem entra na caverna quando se sente
pressionado e precisa de tempo para pensar. É exatamente isso que
tá rolando com a Brina.
— Que mané caverna, Henry?! — Volto-me com uma careta,
demonstrando minha rejeição quanto ao raciocínio do meu amigo.
— E ainda você vem dizer que não sou o lado másculo da relação?
Você fica lendo esses livros de relacionamento para lidar com a
Debby, o que isso diz sobre você?
— Que sou um cara atencioso e quero o melhor para minha
fadinha? — retruca de pronto. — Veja bem, cara, sua garota passou
por um baque emocional gigantesco. Primeiro teve que lidar com a
gravidez — ele passa a listar contando nos dedos —, segundo, que
não era gravidez. Por fim, e mais tenso, ela perdeu um dos seus
órgãos de procriação, Mano! Ir de ter um bebê para a possibilidade
de não ter nenhum deixaria qualquer um doido!
Henry na sua versão namorado dedicado é mais irritante do
que sua versão exibicionista. Solto uma lufada de ar sonora,
esboçando minha frustração.
— E você acha que eu não sei? Caso se esqueça, eu vivi todo
este tumulto aí contado nos seus dedos! Eu também tive que aceitar
um futuro com nosso filho, depois a angústia de vê-la sangrando e
perder não apenas nosso bebê. Mas sim, ela… — passo as mãos
pelo rosto, sentando-me de volta na cama.
— Não disse que você não sofreu, ou não está sofrendo, Will
— ele fala com preocupação. — Só estou tentando fazer você
entender o lado dela. Sua garota precisa se desligar do mundo para
superar, acho.
— Isso é errado. Eu estou aqui por ela e para ela. Podemos
passar por tudo juntos. — Pareço um garoto mimado agora. — Só
quero… só quero minha garota de volta.
— Eu sei… eu sei. — Henry coloca a mão em meu ombro a
título de consolo. — Ela vai voltar no tempo dela, mano.
— Não quero esperar mais, Henry. Pode ser precipitado e
posso levar uma porta na cara. Mas preciso tentar.
Meu amigo assente em derrota, após sua argumentação árdua
em me convencer do contrário.
Apoio as mãos nos joelhos e ergo-me para ir embora. Assim
que pego o celular e as chaves sobre a mesa de estudos, uma
ligação pisca na tela.
— Oi, mãe — atendo, enfadonho. Minha mãe tem me ligado
praticamente todos os dias perguntando como estou me sentindo. E
minha resposta sempre é a mesma, um tudo bem vazio e
impessoal, que Sra. King não aceita, para depois me dar palavras
de apoio.
— Filho, como você está? — Não disse?
— Estou bem, mãe. E de saída, se não se importa.
— Aonde você vai a essa hora da noite, Will? — questiona
interessada.
— Vou até a casa de Brina.
— Mas é uma hora de viagem, filho. Chegará tarde lá.
— Eu preciso vê-la, mãe. Preciso olhar em seus olhos e ter
certeza de que ainda existe algo entre nós.
— Eu te entendo, Will. Entendo de verdade. Mas, já que estará
na cidade, venha antes ver sua mãe. Eu não te eduquei para chegar
na hora de dormir na casa das pessoas. E Brina ainda está
convalescendo.
Penso por alguns instantes no que minha mãe falou. Ela tem
razão em certo ponto.
— Venha para casa, durma aqui em seu quarto e amanhã pela
manhã, vá atrás de sua namorada — Mamãe determina meu roteiro
com tamanha precisão que meneio a cabeça como se fosse
possível ela ver. — Estou te esperando, Will. Te amo.
— Ok, mãe. Também te amo.
Ao desligar o telefone, enxergo pelo canto do olho a satisfação
de Henry. Ele ouviu a conversa e, de certo modo, irei esperar mais
um dia para Brina ficar em sua caverna.
Antes que seus lábios desgrudem pra começar a ladainha já o
interrompo.
— Cale a boca. — Aponto o dedo pra ele. — Eu vou vê-la
amanhã.
Ele tenta murmurar algo e eu encaro-o com uma carranca,
fazendo-o calar-se. Deslizo o aparelho celular pelo bolso e sigo pelo
corredor em direção à garagem.
O caminho de Braveton para a cidade dos nossos pais nunca
foi tão doloroso para mim. Na última vez que dirigi até aqui, Brina
estava ao meu lado, com seu sorriso esplendoroso para mim. Os
olhos de águia que me consumiam a cada roçar de dedos em sua
epiderme macia.
Sinto falta de tocá-la e beijá-la inteira.
Ah, Brina… te quero tanto, baby. Por que está fazendo isso
com a gente?
Desço do carro e vou direto para a sala de descanso, onde
minha mãe e meu pai gostam de ficar após o jantar. É um ambiente
com uma lareira, prateleiras de livros, a maioria dos gêneros que
minha mãe gosta e outros que meu pai escolheu. Posso dizer que
há de romances tórridos ao terror, bem como alguns mais
direcionados para o comportamento humano.
O local, mesmo possuindo um carpete, possui dois tapetes
felpudos, para os momentos que o sofá e as poltronas não parecem
tão confortáveis quanto o chão mais próximo ao calor do fogo.
Momentos da infância correm em minha mente quando adentro e
vejo mamãe sentada na poltrona de frente para meu pai, que está
no canto do sofá fumando um charuto.
— Filho! — Mamãe se levanta e vem até mim, abraçando-me.
Aceito o afago de bom grado. Estou precisando de carinho, em
especial da primeira mulher que amei na vida, já que a segunda tem
me ignorado. — Que bom que veio para cá. Fiquei receosa que me
desobedecesse.
Ergo uma sobrancelha, estranhando o som que as palavras
ressoam de forma a me remeter às broncas que levava quando era
um moleque.
Este é o poder da Sra. King: fazer com que um cara de 23
anos sinta-se um garotinho de oito.
— Eu disse que viria para cá, não disse? — Minha voz sai
mais dura que o normal.
— Não fique bravo com sua mãe, meu filho. Ela só ficou
preocupada com você — papai a defende.
Tradução: sua mãe não quis retardar seu sofrimento por mais
um dia. Já que minha ida à casa dos Heinz provavelmente era tão
temida por meus pais, quanto por Henry. Até ele acredita que o
melhor a fazer é aguardar o tempo de Brina.
Talvez seja…
O problema é que não suporto mais a distância do meu amor.
Não é nem física. Sinto que algo está se quebrando, apartando-nos
mais e mais a cada dia. Não quero que nossa conexão se rompa.
Por isso meu desespero.
Mamãe me conduz até o sofá e senta-se ao meu lado.
— Bom… — Meu pai se levanta, e percebo que ele quer nos
deixar a sós. — Irei aguardá-la no quarto, querida. — Beija a testa
de minha mãe e me dá um sorriso polido antes de ir.
Após a saída de meu pai, a Sra. King segura minhas mãos em
seu colo e busca meu olhar.
— Filho, não sei se saber agora irá mudar algo. Mas quero que
saiba que entendo pelo que Brina tem passado. Ou talvez
entenda… não sei.
— O que a senhora quer dizer, mamãe?
— Eu… eu… — Ela desvia o olhar por um breve momento e,
após puxar o ar, retoma sua fala: — Antes de você nascer, Will,tive
duas gestações interrompidas.
— Co-como? — Eu nunca soube nada a respeito.
— Sim. Eu sofri dois abortos, meu querido. O primeiro estava
no comecinho, mesmo assim, a dor não é menor do que a segunda,
quando eu estava já completando 23 semanas. Minha barriga já
apontava e seu pai conversava com meu ventre todos os dias. —
Mamãe passa a mão sobre a barriga, recordando-se.
— Por que eu nunca soube?
— Porque eu e seu pai decidimos não colocar em você a carga
emocional do bebê que nasceu com vida, entende? Você veio como
uma luz, Will. Depois que você nasceu, precisei retirar o útero por
conta do mesmo problema que Brina tem enfrentado.
— Você também teve endometriose e cistos?
— Sim — ela assente. — E como minhas primeiras gestações
não se tornaram de conhecimento público, eu e seu pai decidimos
manter assim. Você era nosso bebê tão amado e esperado, querido.
Eu amei cada ser que carreguei em meu útero, Will. Não entenda
errado. Porém, reviver a lembrança que a perda me causou é
doloroso demais.
Ficamos calados, mirando o chão e ouvindo os estalos vindos
da madeira que queima na lareira por um breve momento. Então,
minha mãe suspira e continua:
— E depois, com a retirada do útero, senti um vazio enorme
dentro de mim, querido. Você já existia e estava em meus braços,
mas minha escolha de ter ou não outros filhos foi usurpada de mim.
A expectativa que criei em cada gravidez, e depois o futuro que criei
em minha mente que jamais alcançaria a realidade doíam, doíam
demais. — Minha mãe entrelaça seus dedos nos meus. — Você foi
quem me deu forças para olhar para frente, Will. Porque eu já tinha
meu bebê nos braços, entende?
Tento visualizar a angustia de minha mãe em perder não uma
vez, mas duas vezes seus bebês. Eu mal suportava a possibilidade
em ter perdido um, que nem existia afinal. Imagine ela. E depois, o
sentimento de ser mutilada somado a tudo.
Foi isso que Brina sentiu?
Minha rainha sente-se mutilada por ter perdido um ovário?
Meu peito se contrai com a sensação de impotência por estar
afastado forçosamente dela. Eu queria estar ao seu lado.
Eu poderia estar com ela, e passaríamos por toda a
tempestade juntos.
— Naquela época, Will, nos primeiros abortos, eu… eu me
afastei de seu pai. Acabei empurrando-o para longe, pois ficar ao
seu lado me fazia sentir-me pior. Era ver em seu rosto a piedade
que batalhava todos os dias para me reerguer. Ele não entendia,
como você agora, que eu precisava passar por aquele momento,
sozinha. O olhar do seu pai era a realidade escancarada da minha
tristeza e do meu fracasso.
— Por que mamãe? Ele só queria te confortar. — agora o
argumento que uso é o mesmo que grita em minha mente pelas
atitudes de Brina.
— Porque eu precisava me curar. Ao lado do seu pai, meu
amor por ele seria um entrave para a atenção ficar apenas em
minhas feridas. Eu ia querer curar as dele e não as minhas.
Consegue entender isso?
— Eu consigo, mas…
— Eu sei que seu coração está pequeno e dolorido, mas foi ela
que perdeu um pedaço do corpo. Ela está cicatrizando, filho. Eu a
entendo. — Sra. King dá dois tapinhas em minha mão e se levanta.
— A atitude de Brina não é a melhor, mas eu a entendo. Talvez, se
eu tivesse deixado seu pai entrar para me ajudar a curar minhas
feridas, elas poderiam ter fechado mais rápido? Sim, talvez. Porém,
cada pessoa é de um jeito, Will.
Balanço a cabeça negativamente assimilando o que devo ou
não fazer. Posso esperar por ela… posso.
— Quero ajudar, mãe. Eu preciso saber se ela está bem.
Minha mãe assente.
— Espero que a possível rejeição não te machuque mais, meu
filho. Ela pode ainda estar no momento de afastamento.
— Eu vou arriscar… — Minha mãe segue seu caminho e eu
fico sozinho.
Puta merda! Como essa porra dói! Quem disse que amor é
algo que sentimos na carne tem completa razão. O amor nos leva
ao auge da felicidade e também da depressão quando somos
deixados de lado. Estou sendo egoísta, talvez?
Minha mãe pode ter esclarecido sobre as atitudes que Brina
tem tomado ao me afastar.
Dói pra cacete essa forma de pensar e viver.
Não quero que minha garota me console. Sei que está
sofrendo, eu também estou. Nosso sentimento se divide, e é isso
que quero que entenda. Que eu posso dividir o fardo com ela, para
o peso ser mais leve. Para nosso amor superar todas as batalhas.
Se Brina deixar, estou com minha infantaria a postos.

Aguardo ansioso, com as mãos geladas dentro dos bolsos, a


porta de entrada da casa do Sr. Heinz se abrir, após tocar duas
vezes a campainha.
Se tocasse uma terceira seria muita indelicadeza?
Minha mãe diria que sim. Foda-se.
Quando estou a um passo do interruptor dourado a porta se
abre e a mulher baixinha que lembro ser a governanta surge.
Cassandra… é esse seu nome, não é?
— Sr. King, como vai? — cumprimenta educadamente. Aceno
e ela questiona: — Em que posso ajudá-lo, senhor?
— Eu gostaria de ver a Srta. Heinz, Cassandra, por favor? —
Percebo que lembrar o seu nome me deu alguns pontos com a
velha senhora que abre a porta para que eu entre.
Permaneço no hall de entrada aguardando as instruções para
seguir até o quarto de Brina.
— Sinto muito, Sr. King, mas acredito que perdeu sua viagem.
— replica com rubor na face. Não sei se envergonhada ou
reproduzindo a mentira que Brina deve ter pedido para me dar.
Mas ela não sabia que eu vinha, sabia?
— Desculpe-me. Acho que não entendi — digo, analisando
cada traço de seu rosto.
— Pois sim, Sr. King, a Srta. King não está em casa.
Será que hoje ela teria consulta médica? Se sim, eu esperarei
até que retorne. Não me importo. Começo a olhar ao redor,
buscando alguma saleta em que possa aguardar.
— Onde ela foi?
— Minha menina viajou de férias para os Hamptons, na casa
de veraneio da família.
Volto-me de imediato, achando que entendi errado novamente.
— Brina viajou?
A senhora meneia a cabeça em afirmativo.
— Sim. Minha menina precisava descansar e sair desta casa
um pouco. Sr. Heinz ofereceu levá-la anteontem.
Então, nem ontem ela estava aqui. Tomei minha decisão tarde
demais? Será que Henry sabia?
Não… Se soubesse teria me contado e impedido que viesse
até aqui.
— Ela retorna quando? — pergunto, deixando transparecer
minha ansiedade e chateação. Não me importo.
— Parece que irá passar as férias por lá, senhor. Ou talvez
viajará para outro lugar. Não disse ao certo.
— Eu gostaria de saber o endereço dessa casa — digo,
pegando meu celular do bolso para anotar.
— Ah, senhor, peço desculpas, mas minha menina pediu para
não lhe informar.
— Brina pediu para não me contar onde está? É isso?
A senhora ruboriza ainda mais, e percebo que sua reação é
mais pelo incômodo em ser a mensageira da notícia.
Aperto meu maxilar tão forte que meus dentes rangem,
causando um estremecimento no corpo roliço da governanta. Volto
meu olhar para a parede e busco controlar a raiva que se aflora,
misturada com a decepção em não poder vê-la, ainda pior, ela
nitidamente não querer tanto me ver que fugiu.
Brina fugiu em suas férias para não me ver.
Eu poderia descobrir facilmente seu endereço. Contudo, meu
consciente me diz que irei aumentar o buraco que cresce ainda mais
onde habitava nosso amor.
Merda.
— Obrigado, Cassandra. Quando a Srta. Heinz ligar, informe
que estive aqui para vê-la, por favor — peço e me afasto, indo
embora com o mínimo de orgulho que ainda me resta.
Não irei para os Hamptons atrás de Brina. Meu limite era vir
até aqui. Infelizmente, não adianta eu dar um passo em sua direção
quando ela dá dois passos para o outro lado.
Se Brina ainda me quiser, agora é ela quem terá que vir me
procurar.
Ela pode sentir-se mutilada, mas eu também estou, já que ela
arrancou com as unhas o meu coração.
A sensação da areia fina e quente massageando meus pés
enquanto caminho à beira mar traz uma falsa impressão de paz.
Digo falsa, posto que minha mente ainda fervilha incessantemente
indo e vindo do momento em que vi o teste positivo de gravidez às
palavras da doutora-monstro dizendo que havia perdido um ovário.
Quando supero esse looping, outro começa com a notícia da
inexistência de bebê e o olhar angustiado de Will.
Não sei o que é mais impactante, o vazio instalado em meu
peito ou a dor escancarada na expressão do meu namorado.
Meu namorado?
Será que ainda posso dizer que tenho um?
Depois de todo este tempo dando-lhe um perdido, não seria
estranho ele ter passado meu título adiante…
Não… Will não é assim.
Porém, estou sendo ingênua por pensar que nosso
relacionamento ainda exista. Fui eu quem colocou uma pausa sem
data preestabelecida para terminar.
E ele… ele acatou. Por mais que suas mensagens não
deixassem de chegar todos os dias perguntando se estava bem, Will
aceitou meu pedido e manteve-se distante.
Eu não conseguiria lidar com ele enquanto meus pensamentos
estão tão confusos.
Nada mais faz sentido.
Sinto que fui nocauteada pelo destino e todo meu plano de
futuro tornou-se um borrão. Não consigo enxergar mais o que quero
e o que preciso.
Tudo está tão errado.
Will poderia estar aqui comigo…
Mas fui eu quem o afastou.
E agora… Agora é tarde demais para retroceder.
Cassandra me ligou nos primeiros dias do início de minha
viagem dizendo que Sr. King tinha me procurado. Manteve a voz
cautelosa ao informar o quanto meu anjinho estava abatido e como
ficou desnorteado ao constatar que eu havia partido.
Ele foi me procurar. Will tentou me ver de todas as formas. Até
quando deixei claro não respondendo suas mensagens diárias.
Meu peito se comprimia a cada texto recebido.
As mensagens de texto reduziram drasticamente.
Será que agora desistiu?
Ele ainda as manda. Muitas vezes contando sobre algo
aleatório que fez com os rapazes. E no final, diz que ainda sente a
minha falta.
Não… não desistiu.
Já escrevi e apaguei várias respostas, sem enviá-las. E me
culpei a cada letra apagada por minha covardia.
Droga.
Subo o olhar e vejo o muro de pedras com as escadas que
levam para minha atual residência.
A casa de praia nos Hamptons tem sido meu refúgio nas
últimas semanas. Aqui tenho apenas a minha companhia e da
família do caseiro. O lugar é grande e possui um pequeno
apartamento no porão, onde Sr. Jones e sua esposa, já de idade,
vivem e mantém o lugar para nós.
Não é como ter a Cassandra que cuidou de mim a vida toda,
mas a Sra. Jones me conhece desde criança, e quando vínhamos
aqui passar alguns dias das férias de verão, ela me contava
histórias sobre minha mãe e irmã. Eu tinha um pedacinho das duas
nesta casa.
Engraçado constatar que uma vida nasceu no dia em que duas
outras partiram, não?
Não… Isso não é engraçado, mas sim, triste. Muito triste.
Posso confirmar para vocês. Ainda mais quando convivi boa
parte da minha infância e começo de adolescência insistindo em
fazer a pessoa mais quebrada por essa perda ser feliz.
Hoje, entendo um pouco do que meu pai passou.
Suspiro e agacho pegando uma pedra rosada que brilhava
mais que a claridade da areia com o reflexo do sol. Ainda tenho no
meu quarto um pote de vidro cheio delas, uma vez que era meu
passatempo favorito quando vinha à praia, coletar uma pedra mais
bonita que a outra, ou diferente.
Não importava. Não importa…
Era a forma que conseguia ocupar meu tempo, já que meu pai
estava presente só de corpo nos momentos em que viemos para cá.
Cheguei a me perguntar se era possível viver sem alma, pois os
olhos do Sr. Heinz ficavam ainda mais opacos quando me trazia
algumas vezes para caminhar a seu lado.
Ele mudou.
Sim…
Demorou muito, mas depois da nossa conversa em que pediu
meu perdão, papai tem estado mais presente. E principalmente,
sendo de fato um pai.
Ele veio me visitar no final de semana passado, com Helena. A
minha futura madrasta é uma mulher encantadora. Procurou me
consolar mais com gestos do que palavras, o que agradeci
mentalmente.
Ela cozinhou para nós no jantar de sábado e depois sugeriu
um filme de comédia romântica para assistirmos juntos na sala de
estar. Parecíamos uma família como outra qualquer em dias de
folga.
No domingo, eles se despediram e prometeram voltar em
breve, bem como afirmaram que eu poderia voltar para casa quando
me sentisse melhor. Papai, inclusive, sugeriu uma viagem para a
África que sempre pedi e ele recusava com medo de que fosse
atacada por algum leão no safári.
Eu costumava rir até que vi um documentário no qual
realmente isso aconteceu com um turista, então passei a me
questionar se gostaria ou não de vivenciar a aventura.
Até o começo deste ano, eu diria que sim. Ainda tinha coragem
para enfrentar inclusive um leão. Mas não posso afirmar que
continuo a mesma pessoa. Antes, a fatalidade que levou minha mãe
e irmã não foi presenciada por mim de verdade, uma vez que eu era
um bebê em uma incubadora durante o luto do meu pai.
E hoje? Bom… posso dizer que viver o luto de uma possível
vida dói o suficiente para fraquejar a minha bravura.
Não sou tão corajosa assim.
Não… não sou. Empurrar o amor da minha vida para longe é a
maior constatação disso.
A sessão mártir da manhã se acaba e após atravessar as
portas de vidro da varanda, vou até a cozinha montar um lanche.
— Eu posso fazer isso pra você, querida. — A Sra. Jones
aparece e se posiciona à minha frente, na geladeira, pegando os
ingredientes para montar meu almoço. — O que vai querer? Peito
de peru ou atum? — mostra dois potes e aponto o de atum.
— Obrigada — Sento-me na banqueta do balcão. — Eu posso
fazer, Sra. Jones. Não precisa se preocupar — digo, mas querendo
ser mimada de fato. Até porque os lanches desta senhora são de
dar água na boca. Não sei a mistura que costuma fazer com a
maionese e alguns dos seus temperos. Só sei que fica delicioso.
— Não é trabalho algum. Aproveito e faço para mim e para
meu velho. Ele está podando as roseiras do jardim. Sua mãe amava
quando florescia da forma que está nesta estação. Não é algo que
acontece sempre, sabe — ela conta como se mamãe fosse uma
presença não tão distante. Esta atitude é que me faz sentir mais
próxima da mulher que só vi em fotografias.
— A senhora sempre disse isso. Ainda existem algumas das
que ela plantou? — indago esperançosa pela afirmação.
— Sim, querida. As brancas são da época em que você estava
em sua barriga. Cristine, sua irmãzinha, quem as escolheu. — Sra.
Jones sorri saudosa. — Disse que era o presente para a irmãzinha.
Ela já te amava, sem te conhecer. — Suspira. — Era lindo de se ver.
Sorrio e sinto meu coração acalentar com a revelação do amor
de Cristine por mim. Muitas vezes, tive tanta raiva da minha irmã,
por competir com seu fantasma pela atenção de papai. Ela nunca
teve culpa de nada. A memória de minha irmã não merecia um
sentimento tão sujo, ela só merecia ternura e amor.
Papai trouxe para cá todos os pertences de minha mãe e irmã.
Tudo ficava isolado em um dos quartos, bem como as fotografias
escondidas no sótão.
Quando conseguia me esgueirar sem a supervisão de papai,
eu ficava horas e horas vendo fotos, brinquedos, as roupas e até
mesmo objetos de decoração do escritório de mamãe.
Ela tinha algumas estatuetas de gatos. Um dia, papai soltou
sem querer que minha mãe tinha um gato quando se conheceram.
Não soube o nome e nem o que aconteceu com o bichano, pois
assim que notou meu interesse e sobre o que falava, cortou o
assunto.
Mas era nesta casa de praia que eu podia perceber um pouco
da personalidade da pessoa que me deu a vida. Sra. Jones contava
algumas das suas lembranças com detalhes, o que me remetia à
mulher grandiosa que minha mãe foi.
Aqui eu não sentia raiva por ser inferior ou insuficiente. Nesta
pequena casa, eu sentia um pouco do amor de mamãe e de uma
irmã mais velha.
— Será que dá para ter um arranjo na mesa? — indago,
pensando que seria bom um pouco de flores no ambiente.
— Claro, sua mãe costumava montar ela mesma. Vou pedir
para Willian. — A menção do primeiro nome de Sr. Jones causa
certo desconforto em mim, que provavelmente é visível. — Está
tudo bem querida? Está sentindo alguma dor? Seu pai deixou os
remédios aqui e…
— Nã-não, Sra. Jones. Está tudo bem, é só… — suspiro,
exausta. Por ironia do destino, o nosso caseiro é xará de Will. O
universo armou um complô para me foder. — Estou cansada pela
caminhada.
— Ah, sim. Vá descansar então. Seu pai não irá gostar nada
de saber que não tem feito o repouso corretamente. — Me
repreende.
Assinto num pequeno gesto de cabeça e quando termino o
sanduíche, agradeço à senhorinha, deixando-a na cozinha, e sigo
pelo corredor dos quartos.
Antes de chegar a minha porta, passo pelo quarto proibido.
Paro em frente e seguro a maçaneta por um instante, refletindo
sobre minhas emoções e o quanto retornar a este cômodo
acarretaria alguma crise de estresse indesejado.
Não… Não sinto angústia ou temor, mas sim, calmaria e a
sensação de acolhida. Sra. Jones já perguntou várias vezes para
papai se poderia doar as roupas femininas e de criança que
permanecem no closet. Ele sempre nega.
Vou até lá e abro o armário, deslizando os dedos pelos tecidos
finos dos vestidos de verão. Minha mãe era uma pessoa clássica,
bem diferente de mim. As estampas suaves mesclavam dos tons
pastéis para poucos coloridos no tom coral.
Já minha irmã gostava muito de rosa e branco. Quase nada é
verde. Minha cor favorita. Acho que nunca brigaríamos por roupa
afinal.
Rio com a fantasia que muitas vezes fiz em minha mente de
como seria ter minha família completa. Como Cristine seria hoje em
dia se tivesse tido tempo em transformar-se em uma mulher? Será
que seríamos amigas?
Nunca vou saber.
Aspiro o ar, inalando o resquício de perfume do amaciante que
Sra. Jones utiliza quando lava as roupas de tempos em tempos.
Fecho os olhos e busco criar imagens das pessoas que eu amaria
vestindo as peças de pano se tivesse oportunidade. Mamãe com o
conjunto de short saia lilás e blusa creme como vi em algumas fotos,
e Cristine em um dos vestidos rodados com pequenas flores cor-de-
rosa.
Elas sorriem para mim.
E como um borrão, as figuras se desmancham em uma nuvem
de fumaça.
Abro meus olhos, mantendo a emoção causada pelo vislumbre
dos seus sorrisos.
Quando vou fechar a porta, esta fica presa em uma das caixas
dispostas na lateral abaixo do móvel. Empurro e a tampa desliza,
revelando seu conteúdo, a princípio vejo apenas livros de direito.
Resolvo puxar a caixa e me distrair, absorvendo um pouco
mais de mamãe. Retiro da caixa os livros, seguidos de alguns
cadernos da época de faculdade.
O canto de minha boca sobe em um sorriso, quando vejo uma
foto sua com algumas amigas em uma festa. Talvez de fraternidade,
já que outras pessoas com a mesma idade sorriem para a foto com
os copos vermelhos de papel tradicionais ao lado do ponche
batizado.
Minha mãe tem o braço enroscado no pescoço de outra
garota. Ela está feliz. Passo a foto para trás e logo aparece outra,
agora em sua formatura ao lado de papai. Ele está de terno, pois já
era formado. Mamãe fazia estágio em seu escritório quando
começaram a namorar.
Essa é a história que me contaram.
Papai parece um homem apaixonado olhando para a mulher
usando uma beca preta e chapéu de formatura, que é a única a
olhar para o fotógrafo.
Eles se amavam. Disso eu nunca tive dúvidas.
Suspiro e deixo a nostalgia do momento me abater, não de um
modo ruim, mas apenas com a saudade de um tempo bom que
alguém viveu. A empatia de ter ao seu lado uma pessoa com quem
contar e dividir os momentos de felicidade.
Devolvo as fotos à caixa e pego um dos cadernos para ver a
caligrafia de minha mãe, como costumava fazer quando criança.
Observar a forma como anotava os conteúdos das aulas é algo que
me fazia ter um pedacinho dela para mim.
Percebo que algumas vezes ela escrevia a letra “a” em formato
bastão minúscula, e outras palavras têm uma bolinha pequena
sobre o “i”. Eu mesma cheguei a copiar esta mania, já que não
saberia dizer se tinha ou não algum dos seus trejeitos. Então, imitar
sua caligrafia supria um pouco minha necessidade de estar próxima
à fantasia de laço materno.
A emoção me remete ao momento em que imaginei como
seria minha relação com meu bebê. Se quando crescesse iria se
parecer mais comigo ou com Will. Até sonhei com o dia que poderia
lhe ensinar a jogar bola, se quisesse.
Respiro profundamente e folheio mais algumas páginas. A
disciplina ainda é uma das primeiras e apontam teorias da
sociologia, nada comparadas às decisões dos tribunais dos outros
cadernos.
Eu lia tanto o conteúdo desta caixa, que cheguei a opinar
algumas vezes, sem jeito, nos assuntos que papai discutia com
seus amigos quando precisava acompanhá-lo em alguns eventos.
Seu olhar para mim era uma mistura de curiosidade e uma
pequena fagulha de admiração. Por isso, aceitei por um tempo o
nosso plano.
Eu gostava de ler sobre a história da humanidade e como a
construção e criação de leis foram necessárias para o convívio dos
homens. Claro que as batalhas chamavam-me mais a atenção.
Contudo, o resultado era o mesmo em quase todas as conquistas. A
imposição das normas, intituladas de crenças, para os povos
subjugados.
A estrutura de batalha e estratégias para a aquisição dos
territórios até hoje é fascinante. Não deixa de ser o mesmo instinto
que me guia no campo de futebol, para ultrapassar os adversários,
analisando suas fraquezas e alcançar meu objetivo, ou seja, o gol.
Dentro da mecânica dos conflitos de interesses que meu pai
possui em seu escritório, a finalidade é utilizar das leis e
julgamentos similares para atingir a sentença favorável ao seu
cliente.
Não deixa de ser a busca para um fim.
Talvez eu tenha feito tudo errado até agora, e foi por isso que o
universo resolveu me dar uma rasteira dessas.
Desviar do caminho traçado por meu pai, sendo que foi o
mesmo caminho percorrido por minha mãe, tenha sido meu maior
engano.
Encaro novamente as anotações, desta vez estudando com
mais afinco os assuntos ali contidos.
Ainda tenho tempo para alterar as disciplinas e assim me
formar na faculdade de Direito?
O pensamento surge como alento para minha vida, hoje tão
confusa.
Acho que teria que voltar um semestre e entregar mais
trabalhos.
Mas… e o time? Meu time?
Eu ainda poderia jogar nos próximos anos até me formar e
manter a bolsa de estudos, o que não vem ao caso agora que meu
pai voltou a depositar minha mesada.
Será que precisei passar por toda dor para aceitar meu
verdadeiro caminho? Me tornar a advogada que meu pai almeja?
Não sei…
Parece errado desistir de tudo o que consegui até hoje. Nunca
me vi como advogada em minha vida adulta. A imagem sempre foi
um campo de futebol ao fundo.
Esfrego meu rosto com uma sensação estranha na boca do
estômago. Mudar minha vida completamente numa virada de 180.º
me dá um nó na garganta.
Tudo o que é novo dá medo, Brina.
Minha vida já está de pernas para o ar.
Estou confusa.
Jogar futebol sempre fará parte de mim. Isso não vai mudar.
Entretanto, eu posso alterar apenas a forma de encarar minha
paixão, não como um trabalho profissional e fonte de renda, mas
sim, como um hobby.
Desta forma, eu não decepcionaria meu pai e continuaria o
legado da família Heinz.
Inspiro e solto o ar vagarosamente. Estou fora de campo há
mais de dois meses e não tive a ansiedade que geralmente me
consumia todas as vezes que precisava ficar sem jogar.
Claro que receber a notícia que nosso time de Braveton
perdeu a final e trouxe para casa apenas as medalhas de vice doeu
em meu ego. Nós batalhamos muito para conquistar o campeonato.
Mas, após meu afastamento nos últimos jogos, as meninas ficaram
baqueadas e não conseguiram manter o ritmo dentro de campo.
Nossa treinadora pontuou a minha ausência como fator ímpar
para a derrota. Neste caso, em si, não me senti pressionada. Ser a
jogadora que eleva o time para a vitória é algo grande, eu sei.
Contudo, eu queria que elas tivessem conseguido… mesmo sem
mim.
E agora, fazendo uma retrospectiva acerca das minhas
emoções, percebo que tudo se tornou cinza após a cirurgia.
Perdeu a cor.
Não tenho mais o verde vibrante como plano de fundo, que
mantinha meus sonhos guiados para o jogo.
O jogo mudou.
Acho que está na hora de trocar de time e calçar outro tipo de
chuteira… Aquelas de salto alto, contra um time muito mais
agressivo, com juízes que darão o veredicto para situações da vida
e não apitar e expulsar jogadores de campo.
Fecho o caderno e guardo a caixa de recordações de minha
mãe de volta ao armário. Ainda tenho tempo para pensar e tomar a
decisão definitiva.
Meu telefone apita com o som de uma mensagem recebida,
quando abro o aplicativo vejo que é Elisa. Ela diz que está a
caminho e pede novamente se pode dar o endereço da casa para
Will.
Minha resposta não mudou e não vai mudar.
Não agora.
O que realmente preciso é de minha amiga. Acho que o
momento é oportuno para conversar com outrem sobre o que está
acontecendo em minha cabeça.
Possuir um novo objetivo parece ter mexido com alguma coisa
aqui dentro.
Eu preciso desse tempo para analisar minhas decisões do
passado e traçar metas novas para o futuro.
É isso.
Logo, logo eu voltarei a ser algo parecido com a Brina de
antes. Jamais serei a mesma, mas pelo menos vou tentar. Se não
para mim, que seja para meu legado de família.
Meu ombro é empurrado para trás com o leve impacto do
cano de minha balestra[2] de 80 libras no momento que aciono o
gatilho e disparo a flecha direcionada ao alvo disposto na bancada
improvisada feita com dois cavaletes e uma tábua de madeira.
O avocado é atirado para trás e pequenos pedaços verdes
salpicam a superfície rústica. Repuxo abruptamente a parte inferior
da arma, que produz um barulho estridente de aço batendo o som
característico do engatilhamento da próxima flecha.
Rosana, nossa governanta, perguntou se eu iria fazer um
piquenique, já que solicitei uma cesta com frutas variadas. Mal sabe
ela que meu intuito com as frutas era apenas evitar mirar em algum
animal.
Não que já não tenha caçado nesta mesma floreta antes, e
para minha defesa, a lebre morta serviu de jantar.
Henry, geralmente, está comigo durante o entretenimento,
mas foge na hora do jantar. Seu coração é mais puro que o meu.
A caça é um esporte permitido no estado, e meu avô
sempre foi um apreciador. Acabei aprendendo para suportar os
longos feriados que eu era obrigado a passar em uma de suas
cabanas no meio do nada.
Após seu falecimento, mantive o conhecimento adquirido no
manuseio do arco e flecha returvo praticando os disparos em frutas,
e poucas vezes me permiti caçar efetivamente algum ser vivo, de
preferência as lebres que procriavam pela região a ponto de se
tornarem uma peste. Por isso, as leis permitiam a caça desses
animais, mais para um controle no ecossistema.
Entretanto, hoje eu só queria extravasar a energia cumulada
pela angústia dos últimos meses e o retorno à Braveton.
Em uma última tentativa, enviei uma mensagem
questionando sobre o começo das aulas para Brina e quando ela
voltaria. Eu estava no piloto automático em enviar e não ter
resposta. Qual foi minha surpresa em ouvir o som de notificação
após dois minutos pelo recebimento de mensagem?
Precisei aguardar meus batimentos cardíacos
desacelerarem para conseguir desbloquear o aparelho telefônico.
Minhas mãos tremiam com o misto de ansiedade, euforia e
principalmente… medo.
Medo por não saber o que esperar mais de Brina.
E isso tem me destroçado aos poucos por dentro. Ela é
minha garota. A mulher da minha vida, com quem pretendo construir
uma família.
É ela… Não quero outra pessoa. Quero a minha Brina,
minha rainha. E ela… ela tem me afastado.
A mensagem de texto era vaga como se direcionada a
qualquer amigo. Apenas que viria para a primeira semana de aula e
desejava um bom regresso.
Bom regresso?
Quem é você?
Cadê a minha mulher?
Como já estou na cidade há uma semana, foquei em me
reunir com o orientador para organizar as disciplinas que iria cursar
neste semestre, bem como a distribuição de carga horária.
Esse é o último final de semana antes do início das aulas.
Resolvi dormir em minha cabana no meio da floresta onde ocorre a
Caçada. Todos nós temos uma do lado oposto em que acontece a
festa de Halloween.
Acredito que os Falling Angels do passado gostavam de
privacidade, incluindo um lugar separado para cada um. Quando
nos mudamos para cá, não foi difícil estabelecer quem ficaria com
qual, já que não tínhamos interesse em disputar território.
Fomos nos apossando à medida que as encontrávamos.
Esta aqui, mais próxima ao riacho, é a minha. Por conta do declive,
montar armadilhas nos galhos e frestas dos troncos das árvores é
mais fácil.
Meu pai, certa vez, mencionou que possíveis engraçadinhos
poderiam tomar o caminho inverso da trilha costumeira do trote
tradicional e acabar usando nossos lugares privados como quartos
de motel. Por isso acatamos a sugestão.
Alec foi quem implantou uma mais agressiva, que por pouco
não nos causou prejuízo na Justiça, já que o infeliz saiu da floresta
mancando com uma farpa de 30 centímetros enfiada na panturrilha.
O fato de estar em uma propriedade privada e ser avisado
sobre os perigos foram o que nos eximiu da culpa. Posteriormente,
o pai de Brina, advogado da família de Alec, acabou invertendo os
papéis, fazendo com que a família da suposta vítima pagasse uma
pequena indenização pela invasão à propriedade privada.
Cara! Era uma festa aberta. Como ele conseguiu isso?
Não faço a mínima ideia.
E quando a família Winston está envolvida, os fins justificam
os meios. Simples assim.
Respiro fundo e posiciono a balestra novamente, apontando
agora para a maçã, tão vermelha quanto aquela dada pela rainha
má à Branca de Neve. Eu, sinceramente, sempre gostei mais da
rainha.
Atiro. A flecha atravessa com facilidade e…
— Caralho! — Henry desvia, mas ainda assim sofre um
rasgo em sua camiseta preta de manga até o punho. — Tá
brincando de matar coelhinho de novo, é? Eu sou um gato, a
propósito, e estou em extinção — esbraveja, mantendo um tom de
diversão em sua voz.
Retiro o arco do ombro e aponto para baixo, antes que
minha vontade impere e a próxima flecha acerte de verdade algum
órgão do meu amigo.
— O que faz aqui, Henry?
Ele encosta-se à bancada, sentando com uma das pernas
sobre o cavalete.
— Não é óbvio? Cheguei e vim matar a saudade —
debocha, depois pega a próxima maçã e dá uma mordida.
— Se quiser, eu acerto a próxima flecha no bíceps, pelo
menos. — Alec aparece pela lateral, saindo detrás de uma árvore.
Ele vem até mim e num gesto pede a balestra. Cedo e ele aponta
para o avocado perto da bunda de Henry.
Atira a flecha com o arco ainda no ar, sem nem sequer
apoiar no ombro e acerta a fruta, espalhando a gosma verde na
calça jeans do meu outro amigo.
— Porra! — Henry salta com o susto. — Você poderia ter
acertado minha bunda, cara! — brada, desta vez estarrecido. — Eu
sou inofensivo, mas a fadinha não é. — Aponta para Alec. — Ela
ficaria muito brava se eu voltasse pra ela faltando um pedaço, ainda
mais da minha bunda.
— Não sabia que você dava a bunda pra sua namorada —
Alec zomba.
— Está com inveja? Desculpa, mas tudo isso aqui tem dona
— Henry aproxima-se do anjo-demônio sarcástico e, com
desenvoltura, pega para si o arco. Ele xavecou Alec só para distraí-
lo. — Minha vez! Quero brincar também. — Mira o mamão, que é a
maior fruta no tablado, mas erra. — Caralho! Como vocês
conseguem?
— Eu tive que treinar bastante, já Alec… — justifico minha
parte, e deixo que nosso líder se manifeste quanto à sua resposta.
— Eu nasci com mira boa. É um dom. — Dá de ombros,
como se fosse nada demais. Esta é uma aptidão que não questiono,
ainda mais depois que vi várias vezes o cara acertar alvos não
apenas com meu arco. Fica a dica.
Pego minha balestra de volta e desarmo, retirando as
flechas que ainda estavam no pente. Pego a mochila onde a guardo,
agacho e insiro as peças nas cavidades respectivas.
— Vocês não vieram até aqui para comer frutas — constato.
— Vieram tirar o meu sossego.
— Viemos saber como você está — Henry me corrige.
— Elisa disse que chegará amanhã e Brina estará com ela
— Alec fala, de braços cruzados, me estudando.
Jogo a mochila nas costas e caminho para a cabana
seguido dos dois, agora, tentando controlar novamente meu
coração, que teima em mover fora do tempo na cavidade do tórax.
Será que ainda tenho um ou uma britadeira? Está difícil de
definir.
Assim que entro no ambiente aberto de sala e cozinha,
separadas por um balcão, coloco a mochila num gancho na parede
lateral e jogo meu corpo no sofá, estendo os braços abertos no
encosto.
Respiro fundo, e acalmo minha mente. Ela estará aqui. Não
terá como fugir de mim.
— Não é uma boa ideia encurralar um gato, Will — Alec lê
minha mente, escorando-se pelo ombro na coluna central da
cabana. — Eles tendem a escapar.
Ele está certo. Comparou Brina a um gato, e a versão
animal de minha rainha nunca foi tão subestimada.
Brina é uma felina? Sim, mas está mais para leoa do que
gatinha.
— Espere o momento certo. Provoque-a sem pressioná-la
— aconselha.
— Foi isso que fez com sua Gazela? — Henry indaga,
sentando-se ao meu lado, olhando para Alec. Parecemos dois
pupilos em frente ao professor.
— Algo assim… — ele desencosta da parede e vai até a
porta, abrindo-a em seguida. Gabriel entra resmungando palavrões
enquanto segura uma perna pelo joelho com ambas as mãos.
— Mas como? — Henry mira de Alec para a porta aberta
com um Gabriel não muito amigável no batente. Seu joelho está
sangrando e vejo os espinhos cravados em sua pele, bem onde
segura. — Como você sabia que o Gabriel estava chegando? —
Fita Alec abismado. Eu também ouvi algo, mas confesso que o
timing do sujeito de humor ácido é bem melhor que o meu.
— Ele disse que viria e ouvi o gritinho que deu há pouco —
responde. — Não desviou da armadilha de Will, não foi?
— Filho da puta! Não estamos no Halloween pra deixar
essas porras funcionando. — Gabriel reclama, e começa a puxar os
espinhos cravados superficialmente. Eu sei porque deixei a
armadilha com pouca pressão e os espinhos são pequenos,
doloridos, mas não causam estragos permanentes. — E eu não dei
gritinho! — protesta para Alec, que ri.
Levo a mão à boca, tentando conter a gargalhada que
escapa quando meu amigo vitimado solta, sim, um grito estridente
ao puxar um dos espinhos.
— Não vou me manifestar… — Alec emenda.
Gabriel caminha mancando até a cozinha e pega o kit de
primeiros socorros que deixo no armário da pia. Ele começa a fazer
o curativo, blasfemando menos.
Quando nossa gargalhada diminui para risos, percebo que
todos os meus amigos estão em minha cabana pelo mesmo motivo.
— Isso é uma intervenção, por acaso? — pergunto para
todos. — Eu não vou pular em cima dela. O que vocês pensam?
Que posso atrapalhar a relação de vocês com suas garotas?
Tudo bem que assumido aqui temos apenas Alec e Henry, já
que Gabriel é um caso a parte com Aline. Às vezes creio que a
baixinha deveria ter um pouco mais de amor-próprio e impor limites
para este idiota. Contudo, quem sou eu para opinar, não é mesmo?
Se o que mais tenho feito é passar por cima do meu
orgulho, querendo minha namorada de volta.
— Claro que não, mano — Henry é o primeiro a se
manifestar. — Estamos aqui por você. — Aperta meu joelho em
apoio.
— E não teria como você prejudicar nenhum de nós, cara.
As meninas não são idiotas — Alec acrescenta. — Elas também não
entendem o que acontece com a atacante. Elisa disse que ela está
diferente. — Ele caminha até a bancada e pega a pera que sobrou
na cesta de frutas.
— Você deveria aparecer com outra, isso sim. — Gabriel
abre a boca pra sair merda, e dirige-se até a poltrona no canto,
deixando o corpo cair, com o joelho estendido e um imenso curativo
rodeando o joelho esquerdo. — A morena vai dar valor quando
souber que perdeu.
— Vou avisar à Aline pra aceitar as investidas de Richard
então. Quem sabe assim, você deixa de ser idiota? — Henry pontua
e Gabriel rosna sem notar.
— Ela não é assunto seu. Nem de ninguém. Já disse para
não se meter — retruca, rangendo os dentes.
Seria cômico se não fosse trágico, e todos nós abominamos
a forma que ele trata a garota que ama.
Eu jamais agiria como ele. Os conselhos de Gabriel são
cortados do meu caderno de anotações desde sempre.
Ele é um idiota.
— Não vou sair com outra garota. Não preciso disso —
replico.
— E o que vai fazer? — Alec pergunta, jogando o resto da
pera pelo ombro, acertando a pia. Cara! Como ele consegue?
— Ainda não sei… Só preciso… só preciso vê-la. — Minha
voz sai um pouco embargada, o que não queria. Ter meus amigos
preocupados comigo já é um pé no saco. Mas ver o olhar de
piedade até em Gabriel é humilhação demais.
Brina… Minha rainha, até quando você irá me afastar?
Será que a resposta da mensagem significa alguma coisa?
Ela não respondia antes… e agora foi tão impessoal.
Porém, foi uma resposta. É alguma coisa.
Tem que ser…
O prédio destinado à diretoria das faculdades de Humanas é
completamente diferente dos demais.
Acredito que nunca parei para admirar com precisão os
detalhes de onde estudo.
A Universidade de Braveton está sediada em uma
propriedade que poderia acoplar uma cidade de dez mil habitantes
fácil. Chutaria em torno de 50 mil metros quadrados. Como sua
estrutura observou a proteção e inserção dos alunos, as curadorias
de cada curso foram edificadas ao redor do campus.
Imagine construções com escadarias, colunas adornadas
nas extremidades com detalhes barrocos e imensas portas de
madeiras, tudo em tons terrosos. E, entre eles jardins com gramas
verdes e bem aparadas, dando destaque para as calçadas em
pedras claras. Esta é a fotografia do lugar.
As ruelas asfaltadas dão um ar de um condomínio luxuoso
ao direcionar nossa atenção para o centro, com pequenos bosques
separando os outros prédios destinados às salas de aulas, cada
qual acoplando os ramos de disciplinas dentre humanas, exatas e
biológicas.
Os dormitórios mantêm-se na ala sul da propriedade, onde
os calouros são recepcionados, já que lá o jardim de frente é maior.
Ao lado, seguem pequenas mansões designadas às fraternidades,
já não mais no círculo destinado à Universidade, porém ainda sob
sua propriedade.
A região como um todo é tão arborizada, com jardins tão
bem cuidados que faz jus a ser um ponto turístico da região.
Se bem que ninguém costuma vir para este canto do estado
a passeio.
E meu intuito frente ao prédio em questão não é analisar a
beleza da Universidade onde passarei mais alguns anos de minha
vida, mas sim, o que farei com ela.
Respiro fundo e empurro com uma força desnecessária a
porta em formato de arco. Coloco o primeiro pé no chão polido e
tenho a nítida impressão de estar entrando em uma igreja quando
avisto a abóboda no teto alto, transpassando os raios solares da
manhã através dos mosaicos coloridos.
Eu sabia que Braveton era uma faculdade tradicional,
porém, este prédio em si berra Idade Média. As paredes são
decoradas com mognos escuros e prateleiras que ora possuem
livros, ora troféus e fotos, provavelmente das faculdades regidas por
esta diretoria.
— Posso ajudá-la, criança? — A voz fraca e rouca de uma
mulher idosa sobressai à minha contemplação. Viro-me para a
esquerda e então vejo uma saleta separada com um vidro e um
balcão de madeira.
A senhora possui um sorriso acolhedor e está com parte do
corpo para fora do arco feito no vidro, acredito que para facilitar o
atendimento e recebimento de documentos.
— Si-sim. — Caminho em sua direção, colocando um pé na
frente do outro, diminuindo a distância vagarosamente, como se
estivesse tentando postergar um pouco mais a concretização da
minha decisão.
Por que isso? Por que parece tão difícil?
— Eu estou aqui para uma reunião com Sr. Watson. Ele me
aguarda para-
— Ah, sim — a senhora me interrompe. — Srta. Ibraim
Heinz, correto?
Assinto.
— Por aqui, criança. Irei mostrar-lhe o caminho — diz
levantando-se e aprumando a roupa, composta por uma saia com o
comprimento abaixo dos joelhos e um suéter azul-claro aberto,
revelando uma camisa branca social fechada até a gola.
Os olhos azuis curiosos me estudam através dos óculos
antes de prosseguir, e fazem um conjunto e tanto com os cabelos
totalmente brancos elevados em um coque perfeito.
Sinto um arrepio percorrer minha espinha, pois assisti
semana passada um filme de terror justamente com uma velhota
que aparentava inocência, mas no final era a serial killer.
Apresso-me em seguir a serial killer, digo senhora, e escuto
barulhos de digitação vindos da saleta. Ali parece uma secretaria.
Verifico por cima do ombro, já seguindo a velhinha. Outras
mulheres, não tão velhas como a que-sabe-meu-nome e pode me
matar, trabalham compenetradas.
Devem fazer uma lista de possíveis vítimas, penso.
Brincadeira.
As demais secretárias nem sequer notam minha presença e
continuam digitando em computadores modernos com telas planas
em mesas menos antiquadas.
Os passos da atendente ecoam o toque-toque do sapato
social no chão de ardósia, acelerando de forma que me faz duvidar
se estou seguindo uma idosa ou maratonista. Apresso-me ao seu
encalço, antes que me perca nesses corredores e aí sim seja a
vítima perfeita de um homicídio, acho.
Paramos em frente a outra porta de madeira trabalhada e
uma fechadura de bronze. A mulher dá leves batidas com os nós
dos dedos e tenho vontade de bater eu mesma já que seria
impossível alguém ouvir e-
— Entre. — Caralho! Passo pelo batente da porta aberta
para mim e sou impactada com uma sala elegante, e um senhor
aparentando a mesma idade que meu pai atrás de uma mesa de
mogno, e uma janela gigante que dá vista aos bosques e demais
prédios que compõem a universidade.
Cortinas de veludo bordô estão dispostas nas laterais da
janela, seguidas de prateleiras em ambos os lados da sala,
combinando com o estilo do prédio, livros, troféus e fotografias
dispostos na mesma ordem.
Quem decorou este prédio devia ser metódico.
— Bom dia, Srta. Heinz — o diretor fala educadamente.
— Bom dia — respondo apática e ele assente. Ele aponta a
cadeira à frente da mesa. Sento-me, aguardando que faça o
mesmo.
— Já pode ir, Isabel — diz, antes de se sentar e então
percebo que a senhorinha ainda estava ali.
Não disse? serial Killer total.
— Bom… Em que posso ajudá-la, senhorita?
— Acredito que meu pai já deva ter adiantado o assunto —
devolvo precisa. Antes de retornar, pedi para que papai interviesse
por mim, entrando em contato com o reitor e solicitando o auxílio
necessário para minha transferência de disciplinas, sem tanto
prejuízo no ano que já cursei.
O Reitor é o chefe hierárquico master, enquanto cada diretor
possui autonomia sobre as faculdades conforme as disciplinas
separadas por área.
Sr. Watson comanda as graduações voltadas para humanas.
Consequentemente, será meu novo diretor.
O Sr. Heinz conteve sua alegria quando lhe dei a notícia
acerca da minha decisão em alterar meu curso para aquele que ele
tanto queria. Vi seus olhos brilharem de satisfação. Por mais que
sua resposta tenha sido outra pergunta, “tem certeza?”.
Quando respondi positivo, papai não deu tempo para
qualquer reflexão. Acho que correu com medo que mudasse de
ideia. Isso não iria acontecer.
Demorei para tomar a decisão que irá mudar todo projeto
que persegui até agora. Eu sei disso. Mas é o que devo fazer. É o
que tem sido empurrado para mim todos os dias que decidi ir contra
o meu legado, por assim dizer.
Após o dia em que passei a tarde toda lendo e relendo os
cadernos de mamãe, percebi o quanto aquilo era familiar para mim.
Claro que o futebol me trouxe determinação e alegrias que jamais
alcançaria se não me tornasse uma jogadora.
Mas… o mundo tem berrado que estou fazendo tudo errado.
Eu preciso mudar. A mudança será para sentir o encaixe
que perdi quando disseram que minha gravidez era um falso
positivo.
O engano em criar expectativas no nascimento de uma
criança transformou completamente meu interior. Algo está faltando
dentro de mim. Por isso, entendi que esbarrar naquela caixa de
recordações de mamãe não foi por acaso, foi um sinal.
Um sinal para encontrar o que está faltando.
Durante aquela semana em que fiquei martelando a ideia
sobre a alteração do meu curso, retirei o foco do que aconteceu
comigo.
Tudo bem que só me ative à estratégia que deveria colocar
em prática para alcançar meu objetivo.
Novamente, vi-me traçando o percurso como faço com a
bola no pé, driblando os adversários. No caso, tentar enquadrar
algumas das disciplinas que fiz voltadas exclusivamente para a área
de biológicas nas que satisfariam o currículo para cursar
futuramente Direito.
Como foi o primeiro ano, muitas teorias do início do mundo é
presente na maioria das disciplinas, não importa a área.
Confesso que não analisei o dia a dia em alterar meu
cronograma e estudar, de fato, aulas voltadas exclusivamente para
humanas, não mais biológicas.
Agora, aqui, sentada com o diretor que porá o fim em
definitivo em toda rivalidade que tive até hoje com meu pai sobre
meu futuro, deixa-me apreensiva.
— Sim. Ele ligou e solicitou que lhe déssemos toda
assessoria necessária para cambiar suas notas e aderir à carga
horária necessária em mais 4 semestres. Dali provavelmente você
estará apta a cursar Direito — o homem me encara unindo as
sobrancelhas, curioso, — como você quer?
— Eu quero. — afirmo.
— Tem certeza? Suas notas nas únicas disciplinas que
serão aproveitadas no total não são tão boas quanto as que
estudam o corpo humano, Srta. Heinz. Aliás, foi uma pena sua
ausência no campeonato. A Sra. Rivers garantiu a vitória no
próximo, já que a senhorita estará presente. — Fita-me novamente,
aguardando minha reação. — Ainda irá jogar, não?
— Isso não está em questionamento, Sr. Watson. Sim, vou
manter meu lugar no time, se a Sra. Rivers me aceitar.
— Ela está ansiosa. Todos nós. Sou um fã, inclusive. —
Estala a língua. — E por isso, estranho sua opção nessa altura do
campeonato.
— Não vejo o porquê, já que ambos os meus pais são
advogados, Sr. Watson. É mais do que óbvio. — Cruzo as pernas e
coloco as mãos sobre os joelhos como a boa menina que meu pai
sempre exigiu.
— Muito bem… — Ele pega o documento que já estava
disposto à sua frente. — Aqui está todo o cronograma para sua
mudança. E os horários das aulas que irá cursar este ano. Espero
que não se arrependa, Srta. Heinz.
Levanto-me num pulo e pego o papel aceitando o envelope
pardo que oferece com a outra mão. Passo os olhos rapidamente e
vejo meu nome no topo e o brasão da Universidade de Braveton.
— Eu não vou. Obrigada por sua atenção. Tenha um ótimo
dia — digo e saio da sala, orando para não me perder no caminho
até a saída.
Ao atingir a calçada elevo o olhar e o vejo.
Lindo.
Willian está encostado no capô de seu Jeep com um pé
escorado no pneu, vestindo uma calça jeans, camiseta vermelha e
tênis escuro. Seu cabelo platinado parece mais comprido e está
penteado para trás. Ele me observa com as mãos dentro dos bolsos
da frente.
Meu corpo, como ímã, é atraído por ele e, quando noto,
estou a um passo de distância.
— Oi — cumprimento-o e aperto o envelope pardo em meu
peito.
Ele acena.
— Oi. — Me analisa de cima a baixo e suspira. Faço o
mesmo. A saudade pinicando pelos poros de minha pele. Quero
abraçá-lo, senti-lo…
Will pressiona os lábios em uma linha fina, e solta o ar,
parecendo exausto. Seu olhar fita o envelope que seguro. Ele não
perde tempo para perguntar:
— O que é isso?
— Meus horários de aula e algumas orientações para
transferência de curso — respondo sem alarde.
— Mudar de curso? — Will questiona com o cenho franzido.
— Eu vou transferir minhas disciplinas para estudar Direito
— replico, insegura de sua reação e já aguardando o embate.
— Você não quer estudar Direito, Brina — afirma com
convicção em sua voz. Willian não tem que opinar no que quero.
— Talvez eu queira — retruco petulante. Will solta o ar e
balança a cabeça negativamente, desviando o olhar para o chão.
Ele empurra os punhos ainda mais dentro dos bolsos.
— Você não nasceu para ser advogada, Bri. — Olha-me
sem levantar a cabeça, enrugando a testa.
— Por que não? Minha mãe era advogada, meu pai é
advogado. Eu tenho um legado para seguir e construir uma carreira
— continuo, com a voz rígida, ergo o peito, impositiva.
— Baby, você sempre fugiu dessa vida — lamenta, e
fraquejo um pouco, diminuindo a postura com o descer dos ombros.
Eu não sou fujona ou covarde, sempre enfrentei meus desafios, mas
Will… Will tem razão ao afirmar isso. Eu sempre fugi.
Não posso mais teimar com o universo que tende a me
mostrar o quanto estou errando em meus projetos.
— E olha o resultado! Tudo o que aconteceu comigo por
negar o destino que meu pai planejou pra mim.
— Você está se ouvindo? — indaga-me, incrédulo. — Você
mesma está dizendo, Bri. O seu pai planejou, não você.
— Eu também quis isso um dia — murmuro mais para mim.
— Eu também quis este plano… — diminuo a voz nas últimas
palavras.
Quando era para agradar meu pai, não por mim.
Não importa. Will quer me confundir.
Não. Eu já decidi.
— Você era criança, meu amor. Sua vontade podia ser
influenciada — constata, carinhoso, e eleva a mão tentando tocar
meu rosto.
Eu me afasto. Ele suspira e abaixa o braço derrotado.
— Você não é assim, Bri — constata e se afasta, saindo do
meu espaço pessoal.
O vazio me assusta e me remete ao dia que tudo aconteceu,
que meu mundo desabou e senti uma escavadeira retirar parte dos
meus sonhos de uma vez.
Medo, solidão e a raiva se mesclam em meu interior
transformando meu humor frágil em algo escuro.
Não quero sentir isso de novo. Não sei se sobreviverei a
lidar com o vazio mais uma vez. Will não pode me desestabilizar
assim.
— Não sou assim como? — sibilo com a voz um tom acima.
— Quem é você pra dizer como sou ou deixo de ser?
Will estira os braços em suas laterais e me fulmina com o
olhar.
— Sou o homem que te ama. — Percebo que as palavras
saem sofridas de seus lábios. Ele ainda me ama.
— Talvez eu não precise mais deste amor. Talvez este amor
só tenha me dado dor. — É nítido o momento que uma chave vira
dentro de Will e sua feição que relutava em manter-se serena, torna-
se pura decepção.
Meu anjinho, que sempre manteve seus sentimentos
guardados para alguém que merecesse, volta a se fechar em
concha. Percebo agora que um mar de pessoas assistia nossa
discussão trazida em um palco por estarmos em uma das ruelas do
campus.
Porra.
Você ainda o ama. Que merda você está fazenda, Brina?
Você já mereceu seu amor.
— E-eu não quis dizer isso — gaguejo baixinho,
envergonhada.
— Sim… você quis. — Meu anjinho que não parecia tão
alheio à multidão, abre a porta do motorista, colocando-a entre nós.
— Quando a minha rainha voltar — ele hesita —, e se voltar, diga
que a espero. Não quero esta versão.
— Então, você não me quer — sussurro. Will fecha os olhos
novamente e suspira. Quando me encara, a luminosidade
fluorescente de seu olhar é puro gelo.
— Não, não quero. — Após, entra no carro e dá partida
como qualquer estudante, dirigindo com calma para o lado oposto
que vou.
Enlaço meus braços em minha cintura, fechando-me em um
abraço individual. O vazio que evitei mergulhar nos últimos meses
criou uma cratera imensa em meu peito.
Antes era só a expectativa de perder o amor de Will.
Agora é a certeza.
Dói.
Dói demais.
Minha caneta não para de bater no caderno aberto ao lado
do notebook, que reproduz em sua tela o livro no aplicativo que eu
necessariamente deveria ler em um dia.
Quem consegue ler 392 páginas em um dia?
Tudo bem que, se eu não tivesse deixado parte das
orientações do Sr. Watson de lado, jogadas dentre alguns livros de
biologia, ainda remanescentes do semestre passado em cima de
minha escrivaninha, eu teria dois dias, e não um.
Mesmo assim… porra!
Ter leituras obrigatórias para assistir às aulas não é algo que
faço com frequência.
Na verdade, eu nunca fiz.
A mudança de cenário já é gritante entre os blocos
destinados aos prédios de biológicas e humanas. Será que essa
mudança já não é suficiente?
Não… não é.
Pensei que minha adaptação aconteceria naturalmente.
Ledo engano.
Senti algo muito esquisito na boca do meu estômago assim
que contornei o primeiro canteiro e vi a postura dos estudantes. Até
isso é diferente. Não que o pessoal de humanas seja metido ou
coisa do tipo, até porque Lisa cursa disciplinas só neste prédio, e é
minha melhor amiga.
Não é isso, mas a atitude delas mais compenetradas é que
me chama a atenção. Aqui vejo um número maior de pessoas
caminharem sozinhas do que em grupo.
Uma coisa boa é poder compensar o perdido que dei em
Lisa quase que as férias inteiras. Passamos juntas apenas a última
semana quando ela foi para os Hamptons ficar comigo.
Agora que estudaremos no mesmo prédio, poderemos nos
trombar pelos corredores. Sorrio. E depois, faço um recapitulado da
minha primeira aula em comparação com esta.
O primeiro período não foi tão difícil assim. Não que História
fosse meu forte. Mas é uma matéria que já estou acostumada, pois
não foge muito do que aprendi no ensino médio.
Agora, esta aqui será foda. Ciências Políticas com a Sra.
Mackenzie sempre foi um assunto temido por alguns alunos. Não
era difícil ouvir os burburinhos no refeitório, que é o mesmo para
todos.
E cá estou, prestes a enfrentar o diabo, com a certeza de
que não vesti a roupa para a festa.
A ponta esferográfica da caneta tendo um ataque epiléptico
em meus dedos é a prova viva do meu nervosismo.
O livro solicitado é “O Segundo Tratado de Governo”, de
John Locke. Foi um esforço tremendo me concentrar até o capítulo
VII de um livro escrito no século passado.
A imagem de um homem carrancudo e careca falando
meticulosamente de modo formal foi o máximo que pude fazer para
tentar absorver o conteúdo tão chato.
Correção: chato para mim em particular. Tenho certeza de
que para muitas pessoas esses pensamentos são esclarecedores e
fascinantes. E o tal John tinha muito cabelo, mas seu cenho era
carrancudo, sim.
Cheguei até a ler em voz alta para não desfocar, aumentei
as letras em meu Kindle, porém minha cabeça tendia a viajar para
longe, necessariamente para a última conversa que tive com Will.
Que merda.
Como estou adiantada, acabei escolhendo meu lugar e
observando a entrada dos demais alunos. Detalhe: muitos entrando
sozinhos. Ou o povo não sabia interagir, ou existia realmente uma
competição acirrada dentre eles.
Enfim.
Respiro fundo e miro as letrinhas no aplicativo de leitura do
PC. O capítulo VII não foge muito do que eu estou vivendo, e, por
isso, foi o único que entendi. Se a aula girar em torno dele, estou
salva.
Alguém pigarreia na carteira atrás de mim, demonstrando
sua intenção em ser notado. Olho por cima do ombro e não sou
surpreendida com o anjo-demônio n.º 1 me encarando, sentado de
forma desleixada, e uma feição de poucos amigos.
É… eu sei. Provavelmente, Willian contou o que aconteceu.
Encaro-o de volta com a feição no mesmo nível.
Parti o coração do seu amigo?
Tenho uma notícia pra você: ele também partiu o meu.
— Pelo visto, iremos nos ver com frequência este semestre,
atacante — diz, com ironia, acertando a postura na cadeira.
Claro que ele faria Ciências Políticas. Lisa contou que ele
está se preparando para a faculdade de Direito e esta disciplina é o
cartão de visitas do seu currículo. Por este motivo, também estou
matriculada.
— Pelo visto, sim — replico, mantendo o olhar. Alec nunca
me fez mal. Ele tem até umas tiradas legais às vezes. Tudo bem
que seu humor é bem pitoresco. Mas… Elisa ama esse cara. E ele
batalhou para tê-la sem rodeios. Admiro isso.
O som de batidas secas logo à frente nos tira da disputa de
quem desviaria o olhar primeiro. O burburinho existente desaparece.
— Vamos começar? — A Sra. Mackenzie devolve para o
apoio da lousa a régua de madeira que usou para causar o barulho
estridente.
E dizem que foram abolidas as palmatórias na sala de aula?
Acho que essa mulher pediria para cada um estender a mão e
aguentar a dor sem dar um pio.
Eu preferiria a palmatória a ter que participar de qualquer
discussão hoje.
— Muito bem. O livro solicitado para iniciarmos o protocolo
de nosso cronograma foi escrito pelo filósofo inglês John Locke,
chamado por muitos como o pai do liberalismo. Suas ideias giravam
em torno da liberdade intelectual e da tolerância. — A professora
passa a caminhar no espaço destinado a ela. — Espero que todos
tenham feito o dever de casa e fichado um dos capítulos da obra.
Fichado? Que porra é essa? Não era só ler?
— Agora vamos à tortura costumeira. — ela sobe as
escadas no centro da sala em formato de auditório, onde existe uma
fileira de carteiras em cada degrau.
— Sr. Winston, o que pode nos dizer sobre as formas de
comunidade apresentadas por Locke? — questiona com as mãos
nas costas e o queixo erguido.
Curvo o corpo para lateral, assim consigo ter uma visão
melhor de Alec, que apoia um tornozelo no joelho e recosta no
espaldar da cadeira, demonstrando satisfação por ser o primeiro
escolhido a falar.
A vaidade deu as mãos para a arrogância, convidando-a
para um passeio no parque. Essa é a fotografia que enxergo ao
notar o canto de sua boca se levantar em um sorriso presunçoso.
— Ele apontou o espectro do que temos hoje, Sra.
Mackenzie. A democracia, a oligarquia e a monarquia. Seus
conceitos não apresentam nenhuma variante do que conhecemos.
— Ele rodopia a lapiseira entre os dedos.
A senhora tão altiva quanto o anjo-demônio se vê por
satisfeita e acena, virando para o outro lado questionando um aluno
que pareceu se encolher na cadeira.
Ele pelo visto não responde à altura da professora e, por
isso, ela faz um barulho de desdém, e depois questiona a garota
loira ao lado.
A aula segue e sinto um alívio quando a sessão de
perguntas acaba e eu sou uma das agraciadas a ficar de fora da
brincadeira do pergunta-humilha.
— Agora façam grupos de quatro pessoas e discutam as
questões que serão enviadas por e-mail — a professora anuncia e
segue para sua mesa, gesticulando para seu assistente encaminhar
o questionário. — São quatro tipos de questionário abordando
capítulos diferentes. Escolham e após faremos um debate sobre as
respostas.
O barulho de cadeira arrastando ressoa pela sala de aula e
antes que eu dê conta, a minha é uma das que são movidas
automaticamente. Cheguei até a olhar para o solo e verificar se
existia algum mecanismo para isso, já que não movi um dedo
sequer.
O rodopio foi fruto do movimento rápido de Alec, que
aproveitou da minha distração na busca de algum grupo já formado
para virar meu assento para ele.
Eu deveria saber que não poderia fugir do líder do bando
com tanta facilidade.
— Você e Arthur, aqui. — Ele aponta para duas cadeiras
desocupadas já que os alunos seguiram outros colegas para a
interação em grupo. Em seguida, senta-se e volta a me olhar. — É
bom discutirmos alguns assuntos, não é mesmo, atacante?
— Se for sobre o tal John Locke… — pontuo, estendo o
sobrenome do filósofo mais do que devia. Os outros caras olham de
mim para ele, mas rapidamente se dispersam e passam a digitar no
notebook em busca do e-mail em questão.
A primeira questão é porque John Locke era considerado o
pai do liberalismo. Assim que Arthur apresenta em voz alta, Alec
passa a responder no automático, e o outro estudante que descobri
chamar-se Davi passa a digitar suas palavras como um especialista,
que já fazia isso num costume entre eles.
Claro que sim.
Alec teria seus escudeiros em qualquer lugar que
frequentasse. Ainda mais em uma aula como essa.
— Sua comparação sobre a criação de leis com a família
corresponde ao arcaísmo da época, já que a convivência entre as
pessoas era restrita ao núcleo familiar. Contudo, a obediência cega
à figura paterna hoje em dia demonstra ser idiotice declarada — ele
recita ao responder sobre sua opinião acerca do surgimento da
sociedade política na visão do pensador de nosso estudo.
Percebo a indireta, inclusive com sua ênfase em me ofender
pelo fato das minhas escolhas serem diferentes agora.
— Manter as tradições não é idiotice. E muitas vezes os pais
sabem o que é melhor para seus filhos — devolvo, fulminando-o
com o olhar.
— As tradições arcaicas não trazem felicidade — replica em
tom ríspido, apoiando um cotovelo sobre a mesa enquanto a mão
segura seu queixo.
— Algumas pessoas preferem a segurança à felicidade —
contradigo, determinada.
— Se a preferência dessas pessoas não interferir na
felicidade alheia, elas podem se foder — diz com desdém. — Agora,
será que vale à pena seguir a tradição quando sua alma está
desconectada de suas escolhas?
Recolho-me no assento surpresa com a volta de sua fala.
— O medo nunca foi um bom companheiro para a vida,
atacante. Pensei que fosse mais inteligente que isso — constata e
retoma a postura de antes, para trás e de braços cruzados na
cadeira.
— Escrevo isso, Winston? — Davi indaga sem saber direito
como proceder.
— Nah… A comparação de Locke era o suficiente para o
seu tempo. Vamos manter a opinião da similaridade entre o respeito
aos pais e a hierarquia do homem que convive em sociedade —
Alec conclui. — Naquela época, 1600 e alguma coisa, a
comparação era válida.
— Tudo bem — concorda e volta a digitar.
— Sua família também segue tradições, Winston. É irônico
você querer assumir uma versão que não corresponde à sua
realidade — Arthur comenta, instigando minha curiosidade. Qual
será a tradição que ele está falando?
— E você manterá seus dentes na boca se ficar calado pelo
restante da aula — pontua.
— Eu preciso apresentar minha opinião sobre um dos
capítulos — informa, entre os dentes, não sendo tão obediente
como o outro. Parece que Alec não tem tanto controle sobre seus
soldadinhos de chumbo, afinal. — Se o herdeiro se rebelar às
tradições, muitas famílias podem se prejudicar.
— Se um herdeiro mostrar que seguir tradições não interfere
em coisa alguma, outros serão libertos e irão seguir suas vidas
satisfatoriamente — esbraveja, demonstrando certa ira, que na
sequência é voltada para mim. — Enquanto uns se escondem como
covardes nas ordens arcaicas dos pais, outros pretendem quebrar
as regras para serem libertos e terem a vontade respeitada.
Meu coração fica pequeno a cada palavra, como se Alec
estivesse me chacoalhando pelos ombros e gritando “acorda” em
meu ouvido. Por isso, fecho-os com ambas as mãos e me levanto
no meio da aula, direcionando-me para a porta.
Ouço a voz rouca da professora Mackenzie ao longe, porém
meu emocional não me permite continuar a enfrentar o anjo-
demônio.
Agora, entendo o motivo pelo qual ele é o líder e número um
dos Falling Angels. Suas palavras e forma de colocação são
facadas perfurando minha alma. A persuasão embutida no tom
grave de sua voz propaga em meus pensamentos, relutando entre o
medo de seguir e a frustração por desistir.
Não… não…
Ele não sabe o que diz.
Arthur parecia tão raivoso quanto ele. Alec não se referia
apenas a mim. Parecia que… parecia falar sobre a própria vida.
Entro no banheiro cabisbaixa e me fecho em uma das
cabines. Deixo as lágrimas caírem sem me preocupar com os sons
emitidos a cada soluçar.
O que está acontecendo comigo?
Eu não sou assim…
Nunca chorei tanto quanto nos últimos tempos. Sinto-me tão
fora de quem realmente sou.
Eu preciso me reerguer. Isso não está certo.
Não posso deixar Alec me diminuir dessa forma. Ele pode
pensar o que quiser de mim. Estou fazendo isso não apenas por
meu pai, mas também por mim.
Preciso de um recomeço para superar o que passou.
Consigo me controlar depois de um tempo. Saio da cabine e
vou até a pia, lavando meu rosto.
Eu sou Brina Ibrahim Heinz. Nenhum anjo-demônio irá
passar por cima de mim.
Abro a porta do banheiro e caminho de volta para a sala de
aula. Percebo que já terminou e avisto Alec direcionando-se para a
esquerda, ele acena e quando vejo para quem, meu coração para
de bater… de novo.
Will… meu anjinho…
Ele está tão lindo. Empaco no meio do corredor e não
consigo sair do lugar. Fico observando a interação dos dois Falling
Angels ao se aproximarem. Will atende uma ligação e sorri.
Ele possui o sorriso mais lindo do mundo.
Sinto tanto a sua falta.
Alec caminha ao seu lado e então eles dobram a esquina do
corredor. Will olha sobre o ombro e finalmente me vê. Seguro o seu
olhar o máximo que posso. Seus lábios se contorcem no canto,
demonstrando desagrado ao perceber minha presença.
Mas ele sabia que eu estava ali, observando-o. Meu anjinho
me sente em qualquer lugar.
E eu… eu também.
Suspiro. Ele me dá as costas.
As facadas de Alec doeram menos.
Eu pedi por isso, não foi?
Sim… Nosso tempo era limitado. Eu deveria saber disso.
John Locke sabia das coisas. Para viver em sociedade é
preciso obedecer à hierarquia dos pais, caso contrário, a
consequência é perder parte do seu corpo.
Todavia, perder algo físico dói menos que perder parte de
sua alma.
Meu corpo estremece assim que a primeira rajada de água
quente atinge meus ombros. Deixei para tomar banho em casa após
o treino. Sra. Rivers queria conversar e eu queria fugir da conversa.
Ficar no vestiário lhe daria tempo para me encontrar e tentar
me fazer tomar juízo como tem feito desde que voltei para Braveton
das férias.
Ela e as meninas não entendem a mudança de cenário em
meu currículo acadêmico.
Ninguém entende.
Por isso, Sra. Rivers encasquetou que precisaria intervir
com a conversa sobre meu futuro após a graduação em toda
oportunidade. Ela já estava me indicando para outros colegas de
trabalho e auxiliando minha futura carreira dentro do esporte.
A mudança de planos repentina descendeu a credibilidade
de sua palavra, bem como a intuição com os demais profissionais
da área.
Para uma treinadora com um vasto histórico de indicações
de jogadoras bem sucedidas, o câmbio das minhas disciplinas para
o ramo de humanas acarretou abalo não apenas em seu ego, mas
também no trabalho, e talvez emocional.
Sra. Rivers não comenta, mas é nítido suas mudanças de
humor e crises de ansiedade quando estamos em época de
campeonato. Também sou ansiosa, mas não tanto para modificar
meu temperamento como o da mulher que treina o time de futebol
feminino como se todos os dias fosse o último.
Por este motivo, não fiquei para tomar banho com as minhas
colegas de time. Fugi.
Covarde?
É… nunca esta palavra foi usada com tanta frequência para
identificar os meus atos. Em tudo, aliás.
Deus!
Que porra estou fazendo com a minha vida?
Ergo a cabeça sentindo as gotículas grossas atacarem a
pele do meu rosto, esticando com a ardência da temperatura.
Castigar meu corpo com excesso de exercícios e a calorimetria pós-
treino foi a forma que encontrei para diminuir a dor incessante que
esmaga e dilacera meu ser.
Não surtiu efeito ontem, e sei que fará menos ainda hoje.
A angústia excruciante em meu interior não diminui, só
aumenta a cada dia.
Tudo por escolhas minhas.
Ver Will de longe e evitar me aproximar para que seu cheiro
não reviva as memórias do seu corpo no meu é a tortura rotineira
que inflijo a mim mesma todos os dias.
Ele foi só meu e de mais ninguém.
Somente eu tive tudo de Willian King, seu corpo por inteiro e
seu coração.
Até o momento, meu anjinho não apareceu ao lado de outra
garota. Quando o observo na biblioteca, ele está sozinho, ou com
Debby e Henry. Se uma menina se aproxima, Will não dá espaço
nem sequer para se sentar ao seu lado.
Henry me contou que ele anda mais calado que o de
costume, e que não me acusaria de nada. O anjo exibicionista tem
me olhado com pena, bem como minhas amigas.
E eles têm razão. Eu sou digna de pena.
O fantasma da mulher determinada que fui um dia. Foi nisso
que me tornei. Nada mais.
Pelo menos, um dos Falling Angels não me acusa de fazer
seu amigo sofrer. Parece que Henry enxerga através de mim, ele
tem mais sensibilidade para notar que também estou sofrendo. O
que não acontece com Alec.
O anjo-demônio n.º 1 faz questão de me cutucar todas as
vezes que pode nas aulas que temos em comum, pois descobri
durante a primeira semana que teria um tormento praticamente que
diário em mais de uma matéria.
É o preço a se pagar por ferir seu amigo. Suas palavras.
Ainda estou com a conversa do primeiro dia de aula da Sra.
Mackenzie entalado na garganta. Sempre que penso em questioná-
lo, Alec consegue esquivar-se do assunto. O jeito seria pressionar
Arthur, porém o sujeito, como bom soldado, também tem me
evitado.
Algo não está certo e vou descobrir.
Desligo o chuveiro e pego duas toalhas, uma para meus
cabelos e a outra para me secar. Enrolo-me como um taco
mexicano no tecido felpudo e sigo para meu quarto.
Abro o guarda-roupa, e puxo a gaveta com meus pijamas e
lingeries. Visto a camiseta branca que meu anjinho esqueceu
comigo. Algumas das suas coisas ainda estão no meu quarto. Não
consegui encaixotar para devolver. Não quero.
Este é o outro momento de tortura, sentir o tecido de
algodão que tantas vezes vi deslizar pelo torso perfeito do meu ex-
namorado.
Ex…
Que bosta!
Em seguida, jogo-me no centro da cama e repasso a merda
do meu dia, com as aulas insuportáveis e provocações de Alec.
Fora o treino de futebol, o período da tarde se iluminou quando vi
meu anjinho acompanhando Debby após sua sessão de curadoria.
Will pelo menos tem se dedicado aos estudos, e Debby vira
e mexe deixa escapar de como ele aprimorou suas notas em todas
as disciplinas.
Ele sempre foi bom aluno. Porém agora, tem ido melhor até
que Henry. O que é um feito, já que o anjo-demônio número 3
possui memória fotográfica. Fiquei orgulhosa dele, em silêncio, mas
fiquei.
Leves batidas acordam-me para a vida. Viro morosamente a
cabeça em direção à porta.
— Posso entrar? — Lisa enfia a cabeça na fresta
entreaberta.
Até nossa amizade fiz questão de estragar.
Quando que Elisa pediria para entrar em meu quarto? Ela
tem pisado em ovos comigo, pois não consigo me abrir para
ninguém. Nem mesmo pra ela.
Esfrego o rosto e rosno pelas porcarias que tenho feito com
minha vida.
— Eu posso vir depois, tudo bem… — murmura chateada,
após ouvir o barulho que fiz.
— Não! — Interrompo-a antes que saia. — Pode entrar Lisa.
Não estou assim por você, amiga.
Percebo sua hesitação, o que me machuca um pouco mais.
Droga!
Sento-me e recosto-me na cabeceira da cama.
— Venha aqui. — Dou tapinhas ao meu lado para que ela
também se sente. — Acho que preciso de uma amiga.
— Eu estou aqui, Bri. Sempre estive — afirma, com uma
pontada de recriminação. Eu mereço isso.
— Eu sei… — Seguro sua mão, entrelaçando nossos dedos.
— Me desculpe… — digo, com a voz embargada. — Eu não tenho
sido eu mesma.
— Bri, eu sei que o que aconteceu com você foi um abalo
emocional gigante, amiga. — Lisa vira o corpo para mim. — Mas
você não precisa carregar esse fardo sozinha. — Inalo e solto o ar,
cansada. — Você se fechou pra todo mundo… até para mim. —
Além da advertência, sinto a mágoa tomar conta do seu olhar.
Ela tem toda razão em estar magoada comigo. Eu estou
magoada comigo.
— Não sei lidar com o que está aqui. — Elevo uma mão
para o local onde fica meu coração. — Tudo está tão confuso…
— Ah, amiga… — Ela me abraça de um jeito desajeitado, de
lado. — Acho que admitir para si mesma que não está bem já é um
começo.
Viro-me para Lisa e a abraço de volta. Ficamos assim por
alguns minutos. Deixo as lágrimas deslizarem pelo caminho que se
acostumaram a descer sem minha permissão.
— Pra quem raramente chorava, eu me tornei uma torneira
aberta — comento, soltando Elisa e voltando a posição inicial.
— Bri… você parece lutar uma batalha por dia pra ser quem
não é, amiga. Até quando vai insistir nisso? — E aí está a pergunta
de um milhão de dólares.
Até quando, Brina?
Esfrego meu rosto com as mãos, espalhando o líquido
salgado que brotou dos meus olhos.
— O que você quer de mim, Lisa? Todo mundo parece criar
expectativas a meu respeito e eu não consigo mais… —
choramingo, fungando e passando o braço embaixo do nariz que
agora acompanha os olhos numa coriza.
— Não é o que o mundo quer, Brina. Mas sim, o que você
quer. O que você sempre quis — responde, determinada. — Você
sempre refutou a ideia em se tornar advogada e seguir os passos
dos seus pais. E depois de um evento traumático em sua vida, volta
para a faculdade como um cachorrinho adestrado.
Bufo em desaprovação, com um sorriso irônico. Desvio o
olhar para o lado, pois é difícil manter a postura e encarar minha
amiga.
— Brina, olhe pra mim — ela pede, eu balanço a cabeça. —
Brina, por favor, olhe pra mim — insiste e puxa meu queixo,
fazendo-me encarar as duas amêndoas em suas órbitas. — Você
passou por um sofrimento terrível, amiga. Qualquer pessoa ficaria
abalada. Primeiro, você recebeu a notícia que não teria o bebê que
esperava com tanto amor; segundo, que perdeu um ovário, o que
agravou ainda mais…
Abaixo meu olhar, absorvendo as palavras que tento abolir
da minha mente constantemente. Relembrar o vazio que senti ao
ser arremessada num buraco escuro pela perda de uma vida que eu
não mais viveria, doeu. Doeu pra caralho.
Senti como se estivesse recebendo a punição por
desobedecer meu pai quanto à minha indicação para Braveton.
Há tempos não sentia a culpa por não cumprir uma ordem
sua, pois já tinha reprogramado meu cérebro para não se importar
com a opinião dele.
Porém, ao perder tudo, a sensação de culpa foi a primeira
que surgiu. Então, fiz o que era mais fácil. Me escondi do mundo, e
decidi me comportar no modus operandi que aprendi quando
criança. Uma obediência cega para agradar meu pai.
Quando soube que estava grávida, senti o preenchimento
de uma parte minha que ia muito além do amor que sinto por Will.
Era uma emoção de plenitude divina. Eu teria alguém para amar
incondicionalmente, que iria me amar de volta e me daria o que
sempre quis: uma família.
E, ao ver que perdi sem nem ao menos conquistar, me fez
voltar à estaca zero, que seria mendigar o amor de meu pai e a ideia
de agradar o fantasma de minha mãe.
Mesmo que significasse passar por cima de mim.
É o que eu tenho feito.
O efeito colateral de tudo isso foi perder a pessoa que me
amou por quem realmente sou desde o início.
Will me quis não por ser Brina Heinz, mas por ser
simplesmente a Brina.
Uma garota petulante e atrevida, que estufava o peito e
enfrentava os problemas de frente, sem se esconder atrás de um
muro construído com inseguranças e medo.
— Só que… eu não esperava que você fosse fugir, Bri.
Muito menos de mim. — Aponta para o peito e noto suas lágrimas.
Ela também está chorando. — Sou eu aqui, amiga. A garota que
morria de medo da bola, mas se colocava na frente do gol pra você
treinar, lembra? Eu sempre estive bem aqui… e não apenas eu…
— Estou fazendo tudo errado, não é? — Tento dar um meio
sorriso, que não combina em nada com o rosto molhado de
lágrimas. Lisa percebe a mudança e me encara para ter certeza de
que estou cedendo antes de sorrir de volta.
— Está… — conclui. — Tuuudo errado, Bri. — cantarola o
“tudo”.
— E o que sugere? — indago, com um leve tom brincalhão,
e Lisa hesita para falar. Ela está apreensiva por temer que eu erga o
muro novamente.
— Em primeiro lugar, que nunca, em hipótese alguma, irá
me afastar de novo — diz, elevando o indicador, contando. — Em
segundo lugar, que pare de ser quem não é. — O dedo médio
acompanha. — E terceiro, que volte para o Will. Ele é sua alma
gêmea, amiga — sibila, inclinando a cabeça para o lado.
A terceira condição doeu ouvir. Por isso, recebi com um
grunhido baixo, deslizando da cabeceira para o centro da cama.
Deito de lado em minha cama e Lisa se aconchega por trás de
conchinha.
— E então? — cochicha a pergunta em meu ouvido.
Afasto-me dela e deito de barriga pra cima, contemplando o
teto para ganhar tempo ao formular o que irei dizer em voz alta.
— Você está certa.
Elisa ergue o tronco de súbito e vira pra mim.
— Eu adoro ouvir isso — exalta-se com um gritinho, seguido
de uma dancinha que faz com as mãos unidas como se mexesse
algum caldeirão. Um riso me escapa. Elisa para e me fita,
aguardando a sequência da minha fala, e ergue ambas as
sobrancelhas duas vezes para me incentivar. — E como estou certa,
esta semana vamos procurar uma psicóloga, tudo bem?
Ela lança o comando e aguarda para ver se irei acatar ou
não. Minha amiga tem muito a aprender para mandar em alguém.
Elisa está sempre em dúvida. Eu não vou arredar agora. Sem contar
que a garota de franjinha está certa. Preciso realmente de uma
especialista para superar o que passei.
Por este motivo, assinto, pressionando os lábios para evitar
meu retrocesso na decisão. Respiro fundo e aceito para mim
mesma.
— Vou perder um ano para readequar meu currículo
novamente — gemo, levando um braço, escondendo meus olhos.
Todavia, recordo-me que isso significa não mais assistir aulas com
Alec.
Porra! Graças a Deus!
— E só pra constar, seu namorado é um pé no saco.
Elisa sorri e se apoia em um cotovelo com o corpo voltado
para mim.
— Ele só estava tentando te acordar.
— Me enchendo o saco em todas as aulas! — reclamo.
— É… ele tem um jeitinho peculiar em seus métodos. Mas,
são eficazes! — pontua.
— Peculiar é o sinônimo de irritante agora? — pergunto,
mantendo uma falsa indignação. Alec tem sido difícil durante todo
período que estudamos juntos. Mas, suas agressões verbais tinham
um cunho diferenciado, confesso.
Ele cutucava onde doía. E eu mantinha a versão não-Brina
ligada, ou seja, fugia.
O anjo-demônio n.º 1 de sua forma peculiar, também tentou
me fazer acordar.
— Pronta para retomar a sua vida, rainha Brina? — brinca.
— Primeiro preciso reconquistar meu rei — afirmo mais
confiante.
— Eu tenho a ideia perfeita de como você fará isso — diz,
empolgada. Sorrio contagiada pela alegria de minha melhor amiga.
Finalmente, sinto a rachadura em meu peito começar a se
fechar. Já consegui colar um pedaço com Elisa, agora falta passar a
cola por toda a extensão.
Pensei que este ano, depois de tudo que aconteceu em
minha vida, estaria livre desta festa idiota.
Merda.
Henry deve ter decorado algum livro com frases de
persuasão para eu estar agora vestido com um terno todo em preto
e uma meia máscara cobrindo os olhos, no modelo da versão lúcifer
com chifres.
Nada de asas ou roupas do século passado. Apenas ternos
feitos sob medida, como sempre, e as máscaras. Poderíamos até
comparecer em um dos bailes de gala do grupo Truthfallings.
Caminho entre os estudantes fantasiados como todos os
anos, e entre as garotas que sorriem para mim. Algumas, inclusive,
lambem os lábios sem pudor.
O fato de namorar Brina me acarretou uma fila de garotas
para receberem um não sonoro e muitas vezes grosseiro pela
insistência delas.
Eu não entendo essa competitividade feminina em tentar
conquistar alguém só porque outra conseguiu.
Isso não existe.
Ninguém conseguiu nada. Apenas duas pessoas decidiram
passar um tempo juntas por ter química e depois se apaixonaram.
Bom… eu me apaixonei.
O relacionamento não é um jogo onde existe a vitória de um
dos participantes. As pessoas se envolvem pela afinidade, simples
assim.
E eu sou o tipo de pessoa difícil de ter afinidade com
alguém. Ainda mais quando as mãos do ser humano costumam
deslizar por minha virilha e apertar meu pau sem nem sequer dizer
um oi.
Qual a parte de que não sou sociável essas garotas
perderam, hum?
Foda-se.
Acho que nunca irei superar o furacão Brina Heinz, de
qualquer maneira. Felizmente, tenho as lembranças do que vivemos
e da mulher que ela foi.
As garotas tinham razão ao me alertar e dizer para não ir ao
seu encontro no primeiro dia de aula. Mas, não pude evitar. Saber
que estava tão perto e não ir em sua direção era o mesmo de dizer
para alguém sedento não caminhar para o oásis no deserto.
Entretanto, o que encontrei foi uma pessoa completamente
diferente daquela por quem me apaixonei. Enxerguei na carapaça
de Brina uma pessoa covarde. Eu sabia que minha rainha estava lá
dentro em algum lugar, mas não era eu quem deveria tirá-la da
prisão que essa nova versão havia a colocado.
A própria Brina deveria se encontrar.
Revê-la não foi nada do que eu esperava. Muito menos nas
vezes em que nos esbarramos pela universidade.
A rainha perdeu seu trono e deu lugar a uma pessoa sem
graça, sem luz, opaca.
Sinto falta da minha garota. Sinto falta da mulher que me
conquistou e que mereceu meu presente, em especial, o meu amor.
Afasto-me da multidão, procurando um local com menos
pessoas para montar meu beck. Henry não demoraria a me
encontrar e agora eu sei como ele consegue ser tão eficaz nisso.
Foi uma surpresa saber que meu amigo havia conseguido
instalar o aplicativo de modo oculto em meu aparelho celular sem
que eu notasse. Eu poderia ter deletado? Sim. Mas nunca me
incomodou ser encontrado por ele antes. Por isso, não me
preocupei. Brina possuía o mesmo aplicativo, inclusive com a
identificação do meu.
Será que ela excluiu os dados?
Se não o fez, de que importa? Ela não é mais minha Brina.
Porra.
Como eu a quero de volta… eu quero a rainha da
petulância. A mulher confiante e cheia de atitude que virou meu
mundo de cabeça para baixo.
Solto uma lufada de ar, antes de passar a língua sobre o
papel manteiga para fechar o cigarro com a mistura de ervas dentro.
Vejo a pequena neblina se formar com a minha respiração em
contato com o ar da noite. A brisa noturna está mais gélida do que
de costume.
Caminho na lateral da casa, mais afastado da festa e
encontro um banco de pedra acoplado na parede, onde me sento,
inclinando as costas para apoiarem-se e jogo as pernas sem me
preocupar com a postura.
Ascendo o papelote, tragando a fumaça espessa que
deveria causar leveza aos meus pensamentos. Assopro para o alto
em formato de círculo e admiro a dança formada pelos desenhos
esbranquiçados da pequena nuvem que sobe acompanhando o
movimento do vento.
Na segunda rajada de fumaça percebo que não estou mais
sozinho.
— Está fugindo, cara? — Henry se aproxima e senta-se ao
meu lado. Ele pega meu beck e dá um trago. Tenho que pegá-lo de
volta num rompante, já que ele faz a brincadeira idiota em não me
devolver de plano.
— Esta festa nunca foi interessante pra mim — comento. —
E agora… é menos ainda. — Expiro novamente outra neblina com
cheiro de mato.
— Cara, nós estamos aqui. Somos seus amigos — Henry
argumenta, querendo me animar. — O mundo é maior lá fora, mano.
Você só está passando por uma dor de cotovelo. Logo, isso acaba.
— Não sei se é tão fácil — resmungo e volto-me a apreciar
o movimento delicado da fumaça quando solto outra lufada.
— Acredite em mim, Will. Eu sei que vai — ele pressiona
meu ombro.
— Como tem tanta certeza? Você nunca viveu algo
parecido, cara. — O otimismo de Henry nunca me irritou. Mas sua
insistência em me fazer sair do quarto e comparecer a uma festa
onde eu poderia rever a versão Brina Heinz que não curto passou
dos limites.
Ela se transformou em uma covarde para a vida, não em
comparecer nas festas da universidade. Soube que já participou de
várias desde que voltou.
Será que saiu com alguém? Talvez o cara que ouvi uma vez
no banheiro?
Ninguém comenta sobre minha ex perto de mim. Então, não
sei o que tem passado em sua vida amorosa, ou melhor, sexual.
Brina não é o tipo de garota que se envolve sentimentalmente com
tanta facilidade.
Nem eu.
Mas ela não possui as mesmas limitações que possuo para
me relacionar com alguém intimamente, digo na questão física.
Enquanto eu preciso me sentir conectado pelo menos um pouco,
Brina não se importa.
Para ela, sexo é apenas satisfazer uma necessidade do
corpo humano.
Será que, por isso, para ela, foi tão fácil terminar tudo o que
vivemos?
Passo a mão livre pelo rosto e ergo a máscara de demônio
que estava me incomodando.
— Não, mano. Não vivi. E já tive minha cota de ficar perdido
sem minha fadinha. Foi um ano, véi! — Ele levanta o dedo indicador
para sua exaltação ficar mais emotiva. Em seguida, apoia as mãos
nos joelhos e se impulsiona para se levantar. — Agora venha e pare
de se esconder.
— Não faço questão de voltar. — Indico a direção da festa
com o queixo. — Não há nada lá pra mim.
Henry bufa e pega meu beck jogando-o no chão e
apagando-o com o pé.
— Caralho, Henry! — esbravejo, ficando em pé e o
empurrando para verificar o que sobrou do cigarro. — Fala sério!
— Confie em mim e volta pra festa, mano! — ele insiste. —
Você pode ter uma surpresa.
Ergo uma sobrancelha em desafio e aguardo mais
informações, que não vêm. Merda.
Meu amigo simplesmente indica com a mão estendida o
caminho para retornarmos.
Eu sei que vou me arrepender em seguir suas instruções.
Contudo, me vejo caminhando de volta para a festa ao seu lado.
— Você é um pé no saco — digo por fim.
— Você me ama e não vive sem mim. — Sorri, piscando
devagar os cílios, fazendo graça.
Não respondo.
Até porque pensei que não conseguiria viver sem Brina.
Ainda estou numa sobrevida como o Voldemort até o livro O Cálice
de Fogo. Talvez o sangue no unicórnio para mim seja a presença de
Henry, afinal. Sem ele, eu, realmente, estaria perdido.

Não sei se foi o beck ou a quantidade de álcool, que ingeri


desde que retornei à festa, que me cegaram. Mas até o momento,
não vi minha garot-, quero dizer, minha ex e suas amigas.
O estranho disso tudo é a tranquilidade de Alec, Henry e até
Gabriel. Este último pode até pretender não ser afetado pela
presença da fofinha, mas é nítida para nós a mudança quando ela
está por perto.
Entretanto, mesmo ele está de boa.
O antagonismo do humor dos meus amigos se contrapõe à
minha inquietação. Eu estou a todo momento, vasculhando o
ambiente como um radar na via pública que detecta cada
movimento diferenciado. Qualquer coisa que demonstre a presença
dela…
Nada.
— Onde estão as garotas? — Não aguento mais me fingir
de indiferente.
— Se atrasaram — Alec constata o óbvio, sem desviar o
olhar do grande arco da entrada. Por mais que a informação saia
facilmente, e ele pareça ter noção do que está acontecendo, seus
olhos não saem por um segundo do dito arco.
Respiro fundo, formulando uma resposta sarcástica à altura
do anjo-demônio soberbo. Mas, antes que consiga abrir a boca,
ouço as cornetas que já berraram mais cedo quando nós quatro
tivemos nossa aparição na festa vindos da floresta.
Hoje éramos os demônios emergindo da escuridão, como
Henry proclamou mais cedo. E agora, essas cornetas em um horário
aleatório?
Algumas pessoas se entreolham e depois nos fitam sem
entender o motivo do barulho.
Cara… nem eu sei.
Um grupo fantasiado de zumbis aponta para cima com
feições de surpresa e admiração. Olho em direção ao que indicam e
fico absorto nas duas imagens aladas prostradas em cada canto do
telhado da mansão.
Isso lembra alguma coisa?
Em uma ponta vejo asas escuras que abrem de repente,
adornando o corpo miúdo e curvilíneo, vestido com uma túnica
grega preta com a barra no meio das coxas, e sandálias de tiras na
mesma cor, que sobem trançando um desenho até o joelho.
Do outro lado, pressiono os olhos para minha visão ser mais
precisa e ter a certeza que não estou enxergando uma miragem. Os
cabelos em cachos perfeitos estão presos no topo da cabeça, e
caem por seus ombros, abraçados pelas asas douradas,
provavelmente acopladas em algum colete transparente, já que o
que vejo também são a túnica curta e as sandálias de tiras em tons
de ouro.
O ressoar da corneta é o sinal para elas pularem com os
braços estirados sobre a cabeça, segurando o apoio da tirolesa, e
descer em um rasante sobre os demais convidados. Ao mesmo
tempo, sinto um calor emanado à minha direita e um arco de
arbustos secos é incendiado, dando destaque a outras duas
personificações divinas com asas.
Essas caminham lentamente através da abertura em
chamas, vestidas da mesma forma que os anjos do telhado, porém
a garota loira está com asas e vestimenta brancas, enquanto a
outra, morena quase que da mesma estatura, escolheu a cor verde-
escura.
Por instinto, levo a mão sobre a máscara em meu rosto e
recordo-me que sua cor em tons café possui detalhes dourados,
bem como as máscaras dos meus amigos também acompanham de
certo modo as cores respectivas de cada anjo.
Até mesmo Gabriel.
Ele está hipnotizado em um de seus momentos únicos
quando parece mergulhar em uma bolha onde seu mundo é apenas
uma garota, que sorri para ele com sinceridade. Este deve ser um
dos finais de semana que ele irá permitir-se viver sem machucar
quem ama, esquecendo-se do passado e vivendo o presente.
As garotas se aproximam do nosso círculo e é quando
identifico o motivo de nossas fantasias serem simples máscaras
com chifres.
Nós somos os demônios vindos da escuridão, e elas, são os
anjos. Juntos somos as partes que formam um falling angel.
— Por que caralho você veio de lá — Alec rosna na cara de
Elisa e aponta o telhado —, e não de lá? — agora, o arco em
chamas.
— Porque eu pedi — Brina se posta entre a amiga e a fera.
Alec tenta desviar o corpo e ir até sua garota, mas a morena estufa
o peito, aumentando não sei como seu tamanho. — Não vá brigar
com ela — determina.
Alec bufa e tenciona o maxilar com tanta força que ouço
daqui o ranger dos dentes.
— O que vou ou não fazer com sua amiga, não é da sua
conta, atacante — grunhe. — Gazela, venha aqui.
— Eu disse que ele ficaria bravo — Elisa comenta atrás de
Brina. — Só saio se prometer que irá ficar bonzinho.
— Eu não sou bonzinho, Gazela. Você sabe disso — fala,
fulminando-a pelo vão entre o ombro e a asa da morena.
— Não estou falando em ser bonzinho, mas ficar bonzinho
— ela diferencia. Inclino a cabeça analisando a situação e percebo o
sorriso malicioso de Alec assumir seu rosto, já sabendo que nada de
bom viria dali.
Será que Elisa não vê também?
— Eu serei bom em algo pra você — Alec insinua e os olhos
de Lisa brilham. Não faço a mínima ideia do porquê. Uma garota
com juízo correria para o outro lado, mas estamos falando de
alguém que aceitou namorar o herdeiro Winston.
Elisa ultrapassou meu conceito de sanidade há muito tempo.
Ela pisca algumas vezes, e como já a vi fazer várias vezes,
circula o corpo da amiga que a protege e pega a mão estendida de
Alec.
— Você tem certeza? — Brina confirma a decisão da amiga.
Lisa pisca para ela, com um sorriso cúmplice. Eu já disse que a
garota é louca, não?
Brina solta um riso frouxo e desfaz os braços que até então
estavam cruzados sobre o peito. Alec puxa sua gazela e choca seus
lábios nos dela em um beijo raivoso e escandaloso. Henry assobia e
quando encaro meu amigo, este já está abraçado a sua fadinha por
trás.
Aline está ao lado de Gabriel, e vejo que seus dedos se
encontram disfarçadamente entre eles. Pra que esconder?
Pressiono os lábios e volto minha atenção para a deusa em
dourado, que me lembra da mulher altiva por quem me apaixonei.
Será que…
Não sei.
Ela me olha com a mesma fome de antes, e sinto um arrepio
percorrer minha espinha. Do mesmo modo que ela me estuda, não
deixando de captar cada detalhe do meu corpo, faço o mesmo com
ela. Subindo e descendo o olhar, demorando estrategicamente no
vale dos seios e nos músculos das coxas expostas.
Passo a língua pelo lábio e a fito, percebendo a luxúria
estampada em seu rosto, provavelmente refletindo o meu.
— Só pra constar, precisamos dar início à caçada — falo
sem pensar.
Alec esbraveja algum palavrão e Elisa ri.
De repente, sinto um corpo quente muito próximo ao meu.
Mãos delicadas com dedos longos deslizam em meu peitoral.
Contenho a respiração para não demonstrar o quanto estou
ansioso.
— Você irá à caça, anjinho? — a voz melodiosa e sensual
que senti tanta falta assopra em meu pescoço. Circulo sua cintura
com um braço, e meu corpo ascende com as lembranças do seu
cheiro.
— Esta noite eu sou o demônio… — Roço o queixo por seu
maxilar. Brina amolece e eu a seguro firme. — Mas sou metade
anjo, e pretendo buscar o que me falta. — Deslizo meu nariz por seu
rosto até mirar seus olhos. Quero muito acreditar que minha rainha
voltou ao seu trono. — Acha que irei encontrar?
Brina meneia a cabeça e avança buscando meus lábios, eu
me afasto, mas sorrio em desafio. Ela franze o cenho com minha
atitude, mas depois se coloca firme ao solo, apertando meus
ombros quando pressiona o quadril em minha ereção.
Cara! Eu sou muito fácil para essa mulher!
— Eu tenho certeza. — Desta vez sou eu quem avança e
ela recua, repetindo meu sorriso e aceitando o desafio. Em seguida,
se desenrosca dos meus braços e consegue convencer as meninas
a se afastarem de nós até a caçada.
Os rapazes reclamam, mas não discutem, pois algumas
tradições não podem ser quebradas.
A caçada dos Falling Angels é uma delas.
— Você tem certeza que isso é seguro? — Elisa me
pergunta pela milionésima vez.
— Claro que é, Lisa. Will e Henry usaram ano passado e
deu tudo certo — digo ajeitando o colete de PVC transparente que
serve de suporte para nossas asas.
— Eles têm mais forças nos braços, Bri. Aiii… o Alec vai me
matar quando descobrir que troquei de lugar com a Debby. —
menciona apreensiva.
— Então vou preparar o caixão, porque será daqui a pouco,
amiga — devolvo rindo. Ela me encara assustada. — O anjo-
demônio n.º 1 não fará nada, Lisa. Relaxa. No máximo, vai te foder
mais gostoso. Você irá me agradecer amanhã quando não
conseguir andar.
Elisa morde os lábios e desvia o olhar com a timidez que sei
não existir nela. Muito provável estar recordando de alguma
safadeza que já fez com o seu demônio, isso sim. O que me faz
pensar em Will, meu anjinho.
Será que hoje ainda consigo arrastá-lo comigo para algum
canto? Nem me importo se precisar esperar tudo de novo, quero só
sentir seu toque. Se ele me aceitar de volta, vou esperar o tempo
dele para tudo.
Já estou com as pilhas abastecidas para o vibra. Eu só
quero meu namorado de volta.
E seu perdão…
Bato uma mão na outra espalhando o pó de giz entre as
juntas para dar mais firmeza ao segurar as argolas dispostas sobre
nossas cabeças.
— Pronta? — fito Lisa que estava me imitando com o pó de
giz. Ela me olha e acena.
Caminhamos para as direções opostas do telhado. Era para
Debby me acompanhar, mas a fadinha estava com mais medo que
Elisa. Por isso, trocaram de lugar.
Henry veio com essa ideia maluca de imitarmos sua entrada
do ano anterior, bem como das fantasias que se completam no
conceito de anjo-demônio.
O falling angel exibicionista tem seu lado criativo. Como ele
ensinou, apertamos o mecanismo que abre nossas asas e sinto-me
como uma águia dourada. Grito um “agora” e Elisa me acompanha
saltando da outra ponta.
Descemos juntas. O ar frio percorre as partes expostas do
meu corpo, o que deveria fazer-me congelar. Contudo, a adrenalina
da velocidade e a euforia pela precipitação em reaver o que perdi é
tanta que só sinto um calor inundar meu cerne.
Quando alcanço o solo, mantendo a velocidade com um
trote para não me estatelar e ser o comentário pelo resto do ano
como a franguinha que rolou na festa de Halloween.
Uma coisa é chegar em grande estilo, pois aí serei
comparada a um anjo banhado em ouro. Agora se acontecer uma
queda embaraçosa, serei a franguinha de Braveton. O Bully
persiste até o término dos estudos, não tem como.
Mal alcanço o chão e Elisa corre em minha direção atirando-
se em meus braços.
— Aaaaaah! Amigaaaa! — grita. — Adorei! — Ela dá
pulinhos de alegria me levando junto, já que está abraçada comigo.
Rimos.
A emoção da queda livre é sensacional. Agora entendo
porque os pássaros geralmente são comparados à liberdade.
— Como você atravessou a festa e seu demônio não te
pegou? — indago, ainda rindo.
— Eu dei a volta por dentro. A Rosana me deixou passar. —
ela coloca a mão na boca, como uma criança arteira.
Dois pares de asas praticamente de cores opostas, como eu
e Lisa, caminham em nossa direção.
Aline e Debby em suas fantasias de anjos, uma toda de
branco e a outra num verde-escuro, sorriem entre elas e para nós,
num misto de empolgação e ansiedade.
Como combinado, eu e Lisa descemos pela tirolesa, Debby
e Aline passaram pelo arco em chamas. Nenhuma das duas
entradas era menos arriscada.
Acho que todas nós estávamos eufóricas por desafiar de
alguma forma um medo comum a todos, fosse a altura, ou o fogo.
Estamos ainda sob o efeito da adrenalina, sorrindo sem parar
quando sinto alguém se aproximar.
— Por que caralho você veio de lá — o namorado da minha
melhor amiga indica o telhado, parecendo soltar labaredas pelas
narinas —, e não de lá? — Agora gesticula para o arco em chamas.
Ah, não… qual é? Só por que Elisa mudou sua entrada e
não se prontificou a informá-lo, tem que dar um show? Acho que ser
controlador tem limite.
— Porque eu pedi. — Empertigo, dando um passo à frente e
colocando Lisa às minhas costas. Cruzo os braços sobre o peito,
estufando-o em seguida. — Não vá brigar com ela.
Alec pressiona a mandíbula com tanta força que fico na
torcida para quebrar um dente. Quem sabe assim o sorriso que
tende a dar de forma tão sarcástica não perde o brilho.
— O que vou ou não fazer com sua amiga, não é da sua
conta, atacante — diz, entre dentes. — Gazela, venha aqui. —
ordena, e sinto minha amiga obedecer de plano, mas dou um passo
para o lado na tentativa de evitar sua submissão tão fácil.
— Eu disse que ele ficaria bravo — Lisa comenta, quando a
olho sobre o ombro. — Só saio se prometer que irá ficar bonzinho.
— profere, a título de ameaça, que tanto eu quanto ele sabemos ser
em vão.
Ela irá para seus braços de qualquer forma.
— Eu não sou bonzinho, Gazela. Você sabe disso —
retruca, fitando-a intensamente.
— Não estou falando em ser bonzinho, mas ficar bonzinho
— ela diferencia.
— Eu serei bom em alguma coisa pra você — Alec insinua e
os olhos de Lisa brilham.
Sério, amiga?
— Você tem certeza? — confirmo, mirando seus olhos. Mas
a franjinha subindo e descendo é um sinal que ela aprova e muito a
tal bondade do namorado.
Minha atenção volta-se totalmente para o anjo-demônio,
vestido em um terno preto com uma máscara na cor café e
desenhos dourados.
Henry disse que minha fantasia iria fazer par. Claro que
imaginei o que ele quis dizer. Não era óbvio?
— Só pra constar, precisamos dar início à caçada — A voz
rouca e grave arrepia todos os pelos do meu corpo. Capto alguma
reclamação no ar, mas não identifico de onde.
Não espero outra oportunidade e num passo estou em
frente ao meu objetivo, apreensiva, deslizo as pontas dos dedos
sentindo o corpo do meu homem. Meu…
— Você irá à caça, anjinho? — Minha voz treme, e tento
manter a confiança, sussurrando em seu pescoço.
Não me afaste, penso.
Ele me surpreende agarrando-me pela cintura e afundando
o rosto em meu ombro.
— Esta noite eu sou o demônio… — a aspereza de sua
barba rala percorrendo meu maxilar é o estímulo para minhas
pernas fraquejarem. Ele me segura. — Mas sou metade anjo, e
pretendo buscar o que me falta. — Will me fita, buscando encontrar
a Brina que perdeu. Estou aqui. — Acha que irei encontrar?
Assinto em silêncio e tento beijá-lo. Ele recua. A decepção
dura pouco, pois minha coragem de lutar por meu anjo é maior.
Pressiono seu corpo ao meu e sinto o membro rijo que conheço tão
bem apertado pelo tecido da calça.
Só eu conheço esta parte de seu corpo por completo. E
somente eu o senti dentro de mim. Vaidade e possessividade
imperam em meu interior, fazendo-me sorrir.
— Eu tenho certeza — devolvo. Ele avança e eu afasto.
Se Will quer brincar de caça, serei facilmente sua presa.

Após as calouras, nós entramos e corremos na trilha que


hoje sei desenhada pela floresta de modo que os quatro Falling
Angels saibam percorrer sem maiores dificuldades para
encontrarem quem quer que seja.
Com certeza, este ano, sabemos que eles já possuem suas
caças certas.
Ai deles se não pensarem assim. Somente meu anjinho
poderia ter dúvidas, afinal. Tudo bem que temos o caso mal
resolvido de Gabriel e Aline, mas aqui a história é diferente.
— Eu vou por ali, Bri. Alec está impaciente e pediu para
seguir a trilha da cabana — Elisa fala, caminhando entre os
arbustos.
— Não é perigoso? Ele é o que mais coloca armadilhas —
Aline se preocupa.
— Nah… Ele me mostrou. Eu sei o que esperar.
— Então, tá — diz, com um biquinho e eu dou de ombros.
Debby havia ficado numa árvore há alguns metros atrás dizendo
que ali era um local especial para ela e Henry. Vai entender.
Vejo uma cabeleira loira e Aline arqueja.
— Vo-vou por ali, tá bom? — gagueja sem jeito. Tadinha da
fofinha. Já cansei de passar o sermão de que ela precisa parar de
aceitar as babaquices do seu tormento. Mas, tudo parece ser em
vão.
— Tudo bem, fofinha. Só cuidado — digo, querendo alertá-la
por suas escolhas e não pela trilha. Ela meneia a cabeça e segue o
destino que escolheu. Suspiro, e sigo caminhando em direção ao
riacho.
Sei que os quatro anjos-demônios já adentraram na floresta
e começaram a Caçada.
Estou na expectativa de ver Will logo. Recordo-me da
clareira que o vi na minha primeira festa de Halloween.
Qual será a direção mesmo?
Caminho devagar, desviando dos galhos tortuosos das
árvores com copas elevadas. Daqui, mal dá para enxergar o céu
estrelado.
Não posso pensar em torcer o tornozelo. Ainda mais quando
a Sra. Rivers marcou um jogo amistoso para comemorar a volta da
minha sanidade.
Pasmem! Para minha treinadora, eu estava passando por
algum tipo de surto psicótico. O que não deixa de ser verdade…
E sim, ela quer comemorar meu retorno às aulas voltadas
para as áreas biológicas e meu futuro seguindo a carreira que já
organizou com detalhes. Até meu pai invejaria.
Isso tudo aconteceu esta semana, após minha melhor amiga
me ajudar a enxergar o quanto estava equivocada. Eu precisei de
um chacoalhão para acordar.
No dia seguinte, me direcionei ao prédio da diretoria das
disciplinas de Humanas. Pensei que teria problemas com Sr.
Watson. Porém, tanto ele quanto a senhorinha serial Killer pareciam
aguardar minha mudança de comportamento. Disseram inclusive
que esperavam que eu os procuraria na segunda semana do
semestre e não no final de outubro.
Ninguém botava fé na Brina advogada, afinal.
Nem meu pai. Que, aliás, me surpreendeu com seu apoio.
Disse que percebeu o quanto estava triste e que não tinha dito
nada, pois ele já havia interferido demais de forma negativa em
minha vida.
Minhas escolhas deveriam partir de mim.
Eu não disse?
Ninguém botava fé, cara!
Apoio a palma da mão num tronco para atravessar o vão
apertado entre duas árvores de troncos espessos. Agradeço por ter
me desfeito das asas, pois não conseguiria atravessar a floresta que
parecia mais densa que da última vez.
A parte desagradável é suportar a temperatura baixa com
tão pouca roupa. O casaco transparente que vesti com minhas
amigas para participar da caçada no intuito de me proteger
minimamente é, de fato, o mínimo.
Expiro e vejo a pequena neblina formada pela minha
respiração.
Algo brilha no meio das folhas secas mais adiante.
Aproximo-me curiosa e agacho, retirando pequenos galhos e
encontrando uma… uma pena dourada?
Viro em minhas mãos de um lado para o outro.
É a pena da minha fantasia.
Mas o quê?
Avisto outra um pouco mais distante. Sigo até lá e percebo
serem pistas deixadas para eu seguir este caminho. Será?
Não contenho o sorriso.
Continuo na vereda, pegando uma pena atrás da outra até
que o barulho do riacho fica mais próximo.
Olho para os lados e vejo uma cabana. Eu conheço essa
cabana. Vejo uma luz fraca acesa em seu interior. Um frisson
espalha-se por minhas costas da base até a nuca, eriçando meus
cabelos em antecipação.
Sinto um pouco de medo, contudo, a Brina covarde deixou o
meu corpo e a minha real personalidade retomou seu lugar.
É o que tento me convencer quando meus pés não se
movem e procuro a bravura para continuar.
Eu vou.
Assim que estou de frente para o casebre de madeira
rústica, cercado por uma varanda, subo os três degraus da entrada
e empurro a porta já entreaberta.
— Will? — chamo, receosa. — Will, você está aí?
De subido a porta se abre e sou prensada em seu interior,
ao lado do batente. A respiração quente assopra em meu rosto e
sinto outro coração bater tão rápido quanto o meu.
— Fiquei me questionando quem iria entrar na floresta hoje.
— Suas mãos encontram as minhas e as conduzem para cima da
minha cabeça, pressionando meu corpo com o seu. — Seria a Brina
covarde que me afastou, ou a Brina corajosa por quem me
apaixonei?
— E o que descobriu? — provoco-o, mexendo o quadril de
encontro a ele.
Will sorri.
— Por um momento, tive medo de ser a Brina covarde,
quando você demorou a entrar aqui. — Roça a barba rala em meu
rosto, até acariciar meu nariz com o seu. — Quase fui te buscar —
cola nossas testas.
— Não vou mais fugir, anjinho — murmuro em seus lábios.
— Promete? — pede, sugando meu lábio inferior para
dentro de sua boca. — Promete que me deixará entrar na sua
caverna, ao invés de colocar uma pedra na entrada?
Sorrio com a comparação inusitada e inclino a cabeça,
encontrando o neon dos seus olhos piscando para mim. Ele
continua sério, aguardando minha resposta.
— Prometo, Will. Minha caverna estará aberta para você de
agora em diante. — Dou um salto, enlaçando minhas pernas em sua
cintura. — E essa caverna aqui está louca para que você a invada
— digo, roçando nossas intimidades. Ele grunhe, carregando-me
pela sala e caminhando até o quarto, o único ambiente separado por
uma parede na cabana.
Will já havia me trazido aqui quando quis me mostrar suas
habilidades de caçador. Por sorte, não encontramos um ser vivo
naquele dia. Mas, a estadia na cabana valeu à pena.
Quando alcançamos a cama, desenrolo-me de Will e passo
a desmontá-lo. A máscara já não existia em seu rosto. Retiro peça
por peça do terno preto, desabotoando a camisa bem devagar,
percorrendo com as pontas dos dedos à medida que o peito e
abdômen perfeito do meu anjinho aparecem.
Ele retira os sapatos com facilidade e eu logo desço seu
zíper, baixando a calça e a cueca, sentindo seus pelos se
arrepiarem conforme deslizo por sua bunda e coxas, fazendo um
amontoado de pano no chão.
Seu pau está rijo e lustroso na ponta, em frente ao meu
rosto. Fito-o de baixo para cima com volúpia e abocanho a cabeça
rosada, traçando a língua por todo o perímetro.
Will enterra os dedos entre meus cabelos pela nuca, e se
empurra até bater em minha garganta. Não me faço de rogada, e
mantenho a respiração pelo nariz, aceitando suas investidas lentas.
Faço um movimento de sucção mais intenso e sou
presenteada com meu anjinho gemendo meu nome.
Acompanho o vai-e-vem espalhando a saliva com os lábios.
Elevo uma mão até sentir suas bolas, e massageio sentindo os
grãos entre os dedos. Will rosna e aperta ainda mais o punho em
meus cabelos. Ele acelera o movimento, e goza, retirando o
membro de minha boca apenas para espalhar a porra em minha
face e colo.
— Você fica linda besuntada com a minha porra, baby —
ofega, sorrindo e acariciando minha bochecha com o polegar.
Ele me levanta na cama, içando-me pelas axilas, joga-me no
centro e me puxa pelos tornozelos até a beirada. Will começa a
desamarrar as tiras das sandálias douradas. Passo a limpar com a
mão, os resquícios do líquido leitoso do meu rosto.
— Espere! Vou pegar uma toalha. — Will joga minhas
sandálias ao lado de suas roupas e segue nu até o banheiro. Apoio-
me nas mãos com o torso erguido e admiro as costas e bunda firme
do meu… será que voltamos?
Não importa.
Vou aceitar o que Will quiser me dar.
Aproveito para descer o zíper do vestido e juntá-lo às peças
de tecido, empurrando-o com o restante para o lado. Fico apenas
com a calcinha fio dental de renda branca.
Meu anjinho reaparece com uma toalha úmida e passa a me
limpar delicadamente.
— Você não precisa fazer isso, anjinho. — Sorrio com o
gesto.
— Preciso, se quero chupar esses peitos empinados, baby.
Quero sentir o seu gosto. Não o meu. — Dispensa a toalha e
avança sobre mim, voltando a me beijar de modo avassalador.
A boca de Will me reivindica com tamanha fúria, que a
delicadeza de antes não parece ter saído da mesma pessoa. Ele
desce por meu pescoço, sugando e mordendo a pele como se
quisesse me marcar.
Eu aceitaria até ferro em brasa se isso significasse tê-lo de
volta para mim.
Suas mãos enveredam por meu corpo, apalpando e
reconhecendo o lugar que elas deveriam tocar todos os dias.
Eu não permiti isso. Como fui idiota.
Como pude ficar tanto tempo sem Will em minha vida?
Que essa porra de caverna sofra um desmoronamento,
porque eu nunca mais vou entrar, se isso significa me afastar do
meu anjo.
Não demora para que Will comece a atormentar meus seios
com os dentes, chupando-os com ferocidade, molhando-os com a
saliva. A pele se arrepia quando ele, após deixá-los sensíveis,
assopra.
Eu arfo com o calafrio que se mistura com o calor que
cresce, subindo e descendo por meu abdômen e direcionando-se de
modo certeiro entre minhas pernas. Sinto a musculatura da minha
boceta se comprimir com pequenos espasmos cada vez que a boca
de Will volta a me atacar com beijos famintos.
Na coreografia ensaiada, sua língua desliza brincando em
círculos sobre a epiderme, na sequência do morde e assopra que
me eleva a patamares da mais pura luxúria.
Quando alcança meu púbis, Will se afasta e admira minha
boceta, arreganhando meus grandes lábios e me consumindo com o
olhar. Se eu fosse tímida, estaria mortificada agora.
Ele cheira, antes de lamber avidamente. Contorço-me com a
sensação da língua tomando minha boceta por inteiro.
Will retoma sua posição, apoiado em um dos cotovelos, e
me olha com um meio sorriso. Mordo meus lábios, com a
expectativa da sua próxima ação.
Ele estapeia minha boceta, surpreendendo-me e acertando
em cheio meu clitóris que vibra de prazer pela ardência causada.
Grito e murmuro palavras incoerentes. Sou surrada com pequenos
tapas que seguem ritmicamente, enquanto a boca do meu anjinho
mordisca minha coxa. Seus olhos não saem do meu rosto.
Estou prestes a gozar com a sequência cadenciada dos
dedos de Will batendo de modo certeiro em meu ponto inchado, só
mais um pouco. Entrego-me à queda livre no precipício, balbuciando
o nome do meu anjinho, quando ele suspende as palmadas e chupa
o montinho de nervos na intensidade que está aplicando a cada
toque.
Ele é forte, bruto e deliciosamente prazeroso. Seguro a
respiração, Will percebe e leva a mão em meu pescoço, suprimindo
minha fonte de ar para prolongar o prazer. Em uma ginástica de
alongamento, consegue presentear-me com três dedos invadindo
meu canal no momento que meu grito sai estrangulado, literalmente.
Sofro o melhor orgasmo da minha vida, prolongado pelo vai-
e-vem e a sucção enlouquecedora de Will. Meu cerne queima e as
ondas de prazer assumem o controle de cada terminação nervosa
do meu corpo.
Ele solta meu pescoço e desacelera o movimento,
depositando beijos suaves. Sempre tenho a impressão de que Will
usa este carinho pós-brutalidade como forma de pedir desculpas.
Não há necessidade. Eu quis cada ato que só teve a
finalidade de me dar prazer.
Seus beijos sobem pelo meu torso até alcançar a minha
boca, deslizando a língua com meu gosto carinhosamente. Will é um
contraste na cama. Ele muda do bruto para o suave, e depois volta
para o bruto. Sorrio. Nossas fodas representam o que somos para o
mundo, verdadeiros opostos.
— Por que está sorrindo?
— Porque acabei de levar uma surra na boceta? —
respondo com uma pergunta, brincalhona.
— Está pronta pra mais uma? — indaga com más intenções
reveladas na voz.
— Uh-hum… — murmuro, e empurro seu ombro para ele
cair de costas no colchão.
Posiciono-me sobre ele, sentindo-o ereto e grosso para
mim. Ergo o quadril, e encaro-o antes de começar a descer.
— Estou tomando pílula e não saí com ninguém, anjinho.
Quero sentir você — peço, receosa.
— Nada de aplicativos agora — ele brinca. Belisco seu
mamilo, e ele resmunga um ‘ai’. Depois me encara, com um olhar
acolhedor. — Mesmo que tudo seja contra, baby, eu jamais vou
deixar de confiar em você. Agora, cavalga o meu pau, vai? — Will
segura meu quadril e empurra-se para dentro de uma vez. Arqueio
as costas com a sensação dos músculos abrindo-se para o receber
em minha entrada.
— Ah… — gemo, ofegante. Espero minha boceta se moldar
à circunferência de Will para então subir e descer, aceitando-o em
meu interior.
— Você é tão gostosa, baby. — Will senta-se, apoiando os
braços estirados para trás, observando-me com lascívia. Continuo
cavalgando-o e aumento a velocidade. Ele volta a se deitar e segura
minha cintura numa posição que possa vir de encontro, elevando-se
e encontrando-me no caminho.
Em certo momento, fico estática, e apenas Will se
movimenta elevando o quadril do colchão, conduzindo a cavalgada
que seria minha.
Entretanto, a intensidade de cada estocada é tão forte e
profunda que me deixo conduzir novamente para o abismo, sentindo
meu corpo em chamas. Rebolo unindo meus movimentos à dança
que aumenta os estímulos no local exato do meu prazer.
E como um gatilho, Will aperta meu clitóris com o dedão,
levando-me para outro frenesi ensandecido, voando de braços
abertos para as sensações fornecidas diretamente do paraíso por
um anjo-caído.
Grito seu nome, gemo e me desmancho por inteira com o
formigamento de êxtase conforme as ondas se expandem, saindo
da minha boceta, e peregrinam rumo às minhas coxas, abdômen,
braços e pernas.
Acredito que até os pelinhos da minha nuca sentiram prazer.
Um rugido grotesco indica que Will alcançou o mesmo
abismo e pulou comigo, quando vejo seu rosto contorcido e sua
boca formando um ‘o’ perfeito, com os olhos fechados e a testa
enrugada.
Seus dedos afundam em minha pele, segurando-me no
lugar por um minuto. As estocadas diminuem o ritmo devagar.
Espero, debruçada sobre ele.
Deito em seu peito e permaneço ali, ouvindo as batidas do
seu coração se acalmarem com as minhas.
Will desliza os dedos por minhas costas com carinho.
— Você voltou pra mim, Bri? — A insegurança em sua voz é
uma facada em meu peito. Apoio meu queixo sobre as mãos que
estão posicionadas em seu peitoral.
— Você ainda me quer? — Agora sou eu que pareço
incerta.
Will beija minha testa e segura meu rosto com a mão livre,
posto que a outra está me prendendo ao seu corpo.
— Eu só estava esperando por você, minha rainha — diz,
com tanto amor no olhar que tenho vontade de trancafiá-lo num
cofre, comigo dentro, claro.
— Eu quero meu trono junto a você, meu rei. — Ele sorri.
— Então, sente-se, baby, pois este trono foi feito
exclusivamente pra você.
— Pra sempre?
— Eternamente, baby… eternamente…
Minhas coxas ardem conforme sinto o lactato ser produzido
após a explosão de corrida que dei assim que Maggie chutou a bola
em minha direção.
É interessante como as pessoas evoluem para melhor após
sofrerem queda livre por suas escolhas erradas, não é mesmo?
Foi exatamente isso que aconteceu com Maggie. Após
passar uma temporada inteira no banco, no ano que fiz minha
cirurgia e fiquei afastada. Ela acabou se dando conta de que
prejudicar suas colegas de time não a faria melhor jogadora.
Um time de futebol se define por time por uma razão.
Ninguém joga futebol sozinho. Somos 11 jogadoras em campo, mais
outras 11 para substituição.
Então, hoje, não somos amigas, mas posso dizer que somos
colegas de time. Ela me defende quando a marcação está pesada e
também monta as jogadas no meio de campo para que, como
agora, eu possa dar uma explosão e me direcionar ao gol sem
qualquer encosto atrás.
Mais duas passadas, e a bola estará no local do campo que
gosto de dar o impacto no couro e arremessar para o gol. Gingo
para o lado e a goleira se perde, indicando aonde iria, então…
Chuto com força, sabendo que a velocidade aplicada irá vibrar a
rede.
A cena ocorre em câmera lenta. Vejo os gomos de couro
rolarem. Preto, branco e amarelo neon se misturam num borrão e…
— GOOOOLLLL! — A torcida grita juntamente do locutor
que narra nossa partida pelos alto-falantes do estádio. — Brina
Heinz conquista mais um troféu de artilheira do campeonato! — a
voz canta ao pronunciar meu nome.
Sou alavancada do chão por dois ombros que depois
percebo ser de Sophie e Maggie. Elas também parecem ter se
acertado. Seguro-me como posso na posição mais alta e levanto
uma mão para comemorar não apenas o meu título, mas a vitória do
campeonato.
O jogo já estava 3x1, fiz o quarto gol, faltando três minutos
para o juiz apitar. As garotas do outro time, já tinham jogado a
camisa.
Estamos todas eufóricas, gritando e rindo, nós
conseguimos.
Este é o nosso último jogo em Braveton. Nosso último
campeonato juntas, antes da formatura que acontecerá daqui a 15
dias. E sim! Somos CAMPEÃS!
Não identifico quando minhas amigas, me descem no centro
do campo. Ainda estamos abraçadas, todas as jogadoras correm
para o centro e formamos um círculo único de garotas enroladas
com os braços nos ombros uma da outra. Eu estou alocada bem no
meio.
— Braveton! Braveton! Braveton! Braveton! Braveton!
Braveton! Braveton! Braveton! Braaaaaaaavetooon! — Erguemos
nossas mãos para o alto ressaltando o ton no final.
As garotas começam a evacuar deixando-me no centro,
fazendo uma roda em torno de mim. Apenas sorrio pela atitude,
aguardando a aclamação pelo título de artilheira.
Mechas prateadas surgem, passando pela roda. Fico sem
entender porque as meninas deixaram Will entrar em campo. Ele
tinha sido proibido nos últimos jogos que acabou invadindo quando
sofri algumas faltas de outras jogadoras.
A Sra. Rivers praticamente o proibiu de sair da
arquibancada se quisesse continuar frequentando meus jogos. Ele
vinha acatando, e toda vez que sofria uma falta, Elisa segurava meu
anjinho no lugar.
Eu gostava de tê-lo por perto. Então, ele precisava acatar a
determinação da minha treinadora.
Mas… ele está aqui.
Seu sorriso brilha com os fios platinados e os olhos
fluorescentes. Will se aproxima de mim, e sinto meu coração perder
uma batida, no momento em que ele se prostra de joelhos.
Um “Oh” coletivo ecoa pelo estádio, acompanhando a minha
emoção. Elevo as mãos a minha boca, numa surpresa bem-vinda.
— Brina Ibrahim Heinz, a melhor artilheira dos últimos
tempos que Braveton já teve, e que driblou e impactou meu coração
como a explosão de cada gol nas redes do amor. — Will ergue a
caixinha de veludo vermelha e abre, revelando um anel com um
diamante solitário no meio, cravejado de esmeraldas ao redor. —
Você é a mulher que escolhi dar o meu maior presente. Sempre foi
você. — Ele enxuga uma lágrima rapidamente como dorso da mão e
se posiciona como o príncipe que é. Príncipe não, rei. Will é meu rei.
— Você aceita se casar comigo e ser a minha rainha?
Coloco uma mão na cintura e jogo o quadril para o lado.
— Eu pensei que já era sua rainha? — solto um deboche,
sorrindo.
Ele levanta-se do solo e circula minha cintura com um braço.
— Você é minha rainha desde o primeiro dia que te beijei,
agora eu só quero colocar um King em seu sobrenome. Aceita,
minha rainha petulante?
Solto um riso frouxo e enlaço seu pescoço, dando-lhe um
beijo apenas com a pressão dos nossos lábios.
— Aceito, meu King! Aceito ser sua rainha pra sempre.
— Para todo o sempre…
Nossas bocas se envolvem novamente num beijo acolhedor,
repleto de esperanças e expectativas.
O futuro é feito de escolhas. E eu escolhi ser rainha… ao
lado do meu rei.

Os dedos gelados de Will apertam os meus em nossas


mãos entrelaçadas. A sala está com o ar condicionado ligado na
mínima temperatura possível, mesmo assim, sinto minhas axilas
úmidas de suor.
Sempre foi assim. Enquanto Will esfria suas extremidades
quando está nervoso, eu superaqueço.
— E então, doutora? — Meu anjinho está cada vez mais
ansioso.
— Só um minuto, Sr. King e… — O gel desliza em meu
abdômen conforme a médica conduz o aparelho de um lado para o
outro. — Aqui! — Ela para em certo ponto.
Batidas descontroladas e rápidas repercutem dos pequenos
alto-falantes de seu visor, resplandecendo pelo ambiente.
A primeira lágrima desliza em meu rosto, seguida de outras.
Miro meu marido que segura minha mão entre as suas. Ele também
está emocionado, e percebo o fungar de seu nariz que precipita a
gota salgada, manchando seu rosto angelical.
— Parabéns, papais! Acho que agora vocês já podem
acreditar que estão grávidos — Dra. Beth, minha antiga enfermeira,
que depois se formou em medicina, afirma risonha.
Rimos feito bobos a cada batida acelerada do pequeno
coração que vive em meu ventre.
— Mais duas semanas e poderemos saber o sexo. O que
acham?
— Si-sim… vamos marcar assim que sairmos — Will
responde.
Nos primeiros anos de casados, nós procuramos evitar uma
gravidez. Por mais que eu tivesse apenas um ovário, este
funcionava a pleno vapor. Deixei de tomar contraceptivo há seis
meses. Não esperava que fossemos conseguir no primeiro ano.
Mas, após ficar atrasada por 20 dias, resolvemos fazer o exame de
sangue e não esperar muito para o primeiro ultrassom.
Já tínhamos uma experiência vívida na qual apenas um
papel afirmando positivo não nos serviria como garantia de nada.
Então… quando fomos marcar o ultrassom, descobri que
Beth agora é médica obstetra. Não houve dúvidas quando
resolvemos marcar minha consulta e agora o exame.
— Ela está aí… — Will sussurra.
— Ou ele — devolvo.
— Ou ele — Meu anjinho sorri. — Mas… é ela. — Ele pisca.
Sorrio. Espero que este bebê seja menina, ou Will irá tentar
outro até que consiga ter a imagem que ainda habita seus sonhos.
Eu não me importo. Apenas que ele, ou ela, exista.
Nosso bebê agora existe e está aqui, com o coraçãozinho
forte batendo e vibrando as paredes do consultório.
Acaricio o dorso da mão alva de Will sobre a minha pele
escura. Café com leite. Nosso bebê será nossa mistura. Fecho os
olhos e procuro imaginar a mistura que poderia configurar o rostinho
de uma criança.
Será lindo.
E…

Não é um engano.
É uma certeza.

Como nosso amor sempre foi.


O ÚLTIMOOOOOO!!
É mesmo?
Não, minhas lindas! Atendendo aos pedidos, teremos “Caçada 1.5” contando
a história de Alec e Elisa.
Então, Will e Brina só fecharam a sequência numérica e não a série.

Mas aqui é para agradecer e não para especular (risos).

Estou tão feliz com nossos meninos, e tão feliz de como vocês,
maravilhosas, curtiram e se empolgaram no universo dos Falling Angels.
Obrigada por todas vocês, amigas leitoras que pediram por este casal!
Torceram por eles!
Espero que a história conquiste vocês, como me conquistou.

Obrigada a todas as minhas parceiras que estão sempre comigo. Ajudando-


me a divulgar cada história.
Vocês são sensacionais!
Gratidão por cada palavra de apoio em nosso perfil @silviebasset.
Vocês colocam um imenso sorriso em meu rosto. Minha maior satisfação é
saber que viajaram comigo e se apaixonaram por cada personagem. Amooooo
quando dizem que um dos meninos tornou-se seu crush literário. Eu vibro de
alegria.
Não tenho palavras por dedicarem um tempinho do seu dia para deixar um
recadinho de apoio no ig. Gratidão!
Cahenna, minha amiga, eu poderia escrever mil agradecimentos e todos
seriam poucos pelo tanto que você faz por mim. Você é especial demaisssssss!
Obrigada às leitoras beta Juliana Castiglioni e Michely do ig
@aventurasliterarias_da_myss. Apaixonaram-se pelo Will e admiraram a Brina na
mesma proporção. Obrigada pelo carinho em me ajudar a deixar o texto melhor.

Obrigada às minhas parceiras lindas! Que estão nos ajudando na


divulgação. Vocês são MARAVILHOSAS. Não apenas pela publicidade, mas pela
cumplicidade e empolgação em cada livro.

Agradeço também à minha revisora Narjara, que fez a correção do texto, me


ajudando com dicas e me ensinando cada vez mais a melhorar na escrita. Sem
contar que mando em cima da hora e nunca fico na mão.
Gratidão.

E por favor, não se esqueçam de avaliar no site da Amazon. Cada avaliação


é importante, especialmente para nós que estamos começando.

Por favor! Por favor! Avaliem.


Isso ajuda muito todos nós autores.

Um super beijo e até breve,


Silvie é recém-escritora independente, casada, tem dois filhos pequenos, e
vive com sua família no interior de São Paulo.
Leitora obstinada, Silvie sempre foi apaixonada por romances — dos mais
doces aos mais calientes — trazendo em seus enredos histórias cheias de
aventuras e adrenalina, além de toques apimentados por seu gênero literário
favorito.
Entusiasta literária e romântica nata decidiu colocar no papel o eco sutil das
narrativas que ecoavam em sua mente. Sutil nada, as histórias berravam.
E assim, a história de Vivian e Eric ganhou vida no livro Tudo em Preto, o
primeiro da trilogia: Minha Escolha. A série, que tem uma pegada dark, repleta de
mistérios, aventuras e muitas emoções.

Pois então, queridos leitores, sejam muito bem-vindos!


UNIVERSIDADE DE BRAVETON

Ainda não acabou!

Teremos CAÇADA .1.5 — ELISA E ALEC

Todos os livros podem ser lidos separadamente, mas se recomenda


a leitura na sequência.
Amazon e Kindleunlimited

CAÇADA é o 1.º Conto da Série Falling Angels.

Sinopse:
O que poderia dar errado em uma simples festa de faculdade?

Sou uma caloura prestes a enfrentar um dos mais conhecidos trotes


de Braveton University. Algo que começou com os pais dos
malfadados Falling Angels, ou melhor, os quatro cavaleiros do
Apocalipse, como carinhosamente eu os chamo.

É assim que se intitulam, quatro riquinhos que se acham donos do


mundo, herdeiros de fortunas imensuráveis e idolatrados por todo o
corpo estudantil.

Clichê, não é mesmo?

E agora teria que participar do “trote” ou eu e minhas amigas


estaríamos excluídas da vida social durante toda a faculdade.

A Caçada começa à meia noite do dia trinta e um.

Qual a graça em ser perseguida no meio de uma floresta por


rapazes lindos e maravilhosos?

Enfim…

Para as garotas deste lugar ser uma das escolhidas dos quatro era
um troféu, enquanto que para mim, parecia mais um castigo.
Amazon e Kindleunlimited

ENCANTO é o 2º Conto da Série Falling Angels que conta a história


de Aline e Gabriel.

Sinopse:
Eu não me lembro dos meus pais. Eles morreram antes que eu
aprendesse a falar. Mesmo assim, a falta deles sempre foi um vazio
em meu peito, especialmente na noite de Natal.

Minha avó um dia me contou que coisas mágicas acontecem no


Natal. Eu poderia pedir um Encanto para o Papai Noel, que se
realizaria no dia seguinte. Quando eu pedi por meus pais, ela os
trouxe em formato de álbum cheio de fotografias deles.

Ainda criança pedi um melhor amigo. Então conheci Gabriel, que se


tornou muito mais do que isso. Ele é um dos Falling Angels… O
segundo em comando, se é que existe hierarquia naquele círculo de
amizade. Acho que não…

Hoje, ele não é mais meu amigo.

Eu cometi um erro imperdoável… que Gabriel fez questão de


devolver com toda sua ira de anjo caído no decorrer dos anos. Eu
permiti que ele me tirasse tudo… Tudo.

Só que agora… agora eu não sou mais sozinha. Por isso não posso
deixar que se aproxime de novo. Seu ódio não irá alcançar alguém
inocente… alguém que amo mais que a mim mesma, mais que
ele…

Gabriel pode ter me destruído e humilhado um milhão de vezes,


mas jamais saberá que me deu o maior Encanto de todos…

Meu filho.

Amazon e Kindleunlimited

NAMORADA é o 3.º Conto da Série Falling Angels que conta a


história de Henry e Debby.

Sinopse:
Descobri que existem sentimentos inexplicáveis e que o amor da
sua vida pode surgir de forma inesperada. A verdade é que eu me
apaixonei naquela floresta.

Ela usava asas de fada, me mandou fechar os olhos e a última coisa


que vi foram os sapatos de pompom. Depois disso, eu me perdi em
sua boca macia e no desejo ardente em meu peito.

E ela desapareceu como mágica.

Eu sou Henry Raymond, o terceiro dos Falling Angels, também


conhecido como "O Exibicionista". E fui enfeitiçado na última festa
de Halloween.
Agora, eu acredito em fadas e vou descobrir quem ela é.
Disponível na Amazon

Conhece o ditado:
“Onde se ganha o pão, não se come a carne”?
Pois é…
Tentei arduamente cumpri-lo e falhei miseravelmente.

Meu nome é Daniela Vegaz, sou secretária do CEO do Grupo


Empresarial Rodrigues. Amo meu trabalho e estava muito feliz com
ele, até meu chefe se aposentar e seu filho assumir sua posição. Foi
quando o conheci…

Já ouviu falar que o diabo é lindo?

Isso eu posso confirmar para vocês, com provas verídicas: ele


geralmente usa ternos finos, tem um belo sorriso sarcástico, exibe
um corpo que mais parece um playground para as mulheres deste
universo e, passa o dia na sala ao lado.
Nesta vida, a personificação de Satã resolveu se chamar Carlos
Eduardo Rodrigues.
Ele é meu atual chefe.
Para completar o ciclo, Satã me fez uma proposta contratual. No
papel, ele diz querer apenas meu corpo, mas estamos falando de
Satã, não é mesmo?
Bem…
Eu assinei.

E adivinha?

Vendi a minha alma.

Disponível na Amazon

Valentina estava se adaptando a uma rotina que


basicamente envolvia: reaprender a viver sozinha.
Tudo aconteceu de uma vez.
Lidar com a repercussão da traição do marido, um divórcio
turbulento e um trabalho completamente alheio a sua formação
consumia toda sua energia. Cansada, frustrada e mãe solo de
gêmeos pré-adolescentes, desabafou para um desconhecido
qualquer na fila do supermercado.
Um desconhecido muito peculiar…
O homem ouviu tudo com muita atenção, foi gentil e lhe
entregou um cartão bastante misterioso, apenas com dois números
de telefone, recomendando uma Consulta Médica num Consultório
Especial.
“Envie uma mensagem para o segundo número. Prometo
que vai mudar sua vida”.
Então… que tal marcar uma consulta?
● Livro I: Tudo em Preto
● Livro II: Branca como a Neve
● Livro III: Eu sou Vermelho

Três amigas de infância, Vivian Delacour, Raquel Cannavale e


Lizzie Romanets. Cada uma com sua personalidade forte, unidas
pelo destino e uma paixão: Motos.
TUDO EM PRETO apresenta Vivian Delacour, nossa Black,
líder dessa gangue feminina que sofreu traumas na infância e
adolescência tornando-a quase indestrutível. Seu medo de infância
acabou sendo seu escudo e a cor preta sua armadura. A história
relata as idas e vindas de Vivian e Eric, com muita emoção,
envolvendo desde tratativas de um contrato entre empresas a
aventuras com suas amigas, com rachas ilegais, sequestros e
inimigos mortais que incrementam toda a trama. Sem se esquecer
do conteúdo adulto que torna o romance muito mais picante.
Em ‘BRANCA COMO A NEVE’ — Livro II, conheceremos Lizie
Romanets, nossa White. Ela é uma garota meiga e delicada, mas
com um lado obscuro. Filha do chefe da máfia Russa nos EUA, Lizie
foio sequestrada aos sete anos, perdendo sua mãe no processo. Ali,
no meio do caos, um garoto a ajudou, seu Anjo, e após ser resgata,
ela nunca mais o viu, até o ensino médio. Mesmo com seus
traumas, Lizie torna-se amiga de Raquel e Vivian, e o trio Black,
Red e White estava formado, cada uma com sua personalidade
marcante. A história de Lizie retrata seu relacionamento conturbado
com Dylan, e sua tentativa de reconquistá-lo após ter errado feio
com a ajuda de suas amigas. E como não pode faltar nesta série, a
aventura está garantida com a volta do passado de Lizie querendo
vingança. E aí? Vamos conhecer nossa White?
EU SOU VERMELHO traz a história de Raquel Cannavale, nossa
Red, que nos leva para um mundo country, cheio de emoções e
claro que não poderia faltar uma dose de aventura. Ruiva por opção,
e com seu temperamento explosivo, Raquel traz um tempero
especial para o grupo de garotas. Ela é paixão no limite. Uma garota
que nos surpreendeu com a magia em lidar com cavalos
indomáveis. E na busca de recuperar um de seus animais, Raquel
precisa mergulhar nos campeonatos de Provas de Três Tambores.
Aqui, ela se vê cara a cara com o Campeão Mundial Bryan San
Valentines e sua arrogância. Raquel precisará de todas as forças
para não ceder ao charme deste cowboy. Para melhorar ainda mais,
acontecimentos colocam a vida de Raquel em perigo, fazendo com
que suas amigas, Vivian e Lizie, marquem presença em sua história.
Vamos nos apaixonar por esta cowgirl em ‘EU SOU VERMELHO’ —
Livro III.

[1]
Gray, John. Homens são de Marte e mulheres são de Vênus. Ed. Bicicleta
Amarela. Ed. 1.
[2]
Arco de aço ou de madeira, usado na posição horizontal, preso a uma corda
que se retesa ao ser puxada, e dispara flechas.

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