Você está na página 1de 200

ABORDAGEM ODONTOLÓGICA DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA:

uma visão clínica e humanizada


UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
REITOR
RICARDO MARCELO FONSECA

VICE-REITOR
GRACIELA INÊS BOLZÓN DE MUNIZ

DIRETOR DO SETOR DE CIÊNCIAS DA SAÚDE


NELSON LUIS BARBOSA REBELLATO

VICE-DIRETOR DO SETOR DE CIÊNCIAS DA SAÚDE


EDISON LUIZ ALMEIDA TIZZOT

COORDENADORA
YASMINE MENDES PUPO

AUTORES
AMANDA KERIN ALVES CAVALHEIRO
ANA BEATRIZ PINHEIRO E SILVA
CAROLINA DUARTE DE MACEDO
GABRIELLE ZIRONDI NUNES
GISELLE EMILÃINE DA SILVA REIS
INGRID BURKOTH SANCHEZ
ISABELA SALGADO DE QUEIROZ
IZABELLEN TAYNARA ARTIGAS KOZOWSKI
JÚLIA FABRIS
JULIA DO CARMO MACHADO KNEIPP LOPES
MARIA FERNANDA GBUR BARBOSA
MARIA FERNANDA PIVETTA PETINATI
LAÍS BONATTO ZAWADNIAK
LARISSA MANUELA OLKUSZEWSKI DE CARVALHO
LUÍSA BRONDANI TOMAZIN
LUIZA IAIZZO MAGALHÃES

MARINA ELISA DA C. FERRONATO


PÂMELA OLIVIA DE MOURA
RAFAEL AUGUSTO CARDOSO

DIAGRAMAÇÃO
LUIZA IAIZZO MAGALHÃES
AMANDA KERIN ALVES CAVALHEIRO

ARTE
LUIZA IAIZZO MAGALHÃES
MARIA FERNANDA PIVETTA PETINATI

REVISÃO ORTOGRÁFICA
YASMINE MENDES PUPO
JAQUELINE DO CARMO MACHADO LOPES

COMO CITAR ESSE MATERIAL


Abordagem odontológica da pessoa com deficiência...
MATERIAL DESENVOLVIDO EM PROJETO DE EXTENSÃO

PROEC-UFPR: "SAÚDE BUCAL INCLUSIVA" DO CURSO DE ODONTOLOGIA DA UFPR


ORGANIZADORES
Yasmine Mendes Pupo
Professora Adjunto do Curso de Odontologia da UFP R – Disciplinas: Pacientes com
Necessidades Especiai s em Odontologia, Prótese Parcial Removível e Clínica Integrada |
Professora do Programa de Pós -Graduação Stricto Sensu em Odontologia da UFPR |
Doutorado e Mestrado em Odontologia (Lin ha de Pesquisa: Pro priedades Físico -Químicas
e Biológicas dos Materiais) - UEPG | Pós -Do utorado no Programa de Pós -Grad uação Strict o
Sensu em Odontologia – UEPG | Especialista em Dentística, Prótese Dentária e Disfunção
Temporomandibular e Dor orofacial.

Ana Claudia Rodrigues Chibinski


Professora Adjunta do curso de Odontolog ia da UEPG – Disciplinas: Odontopediatria |
Professora efetiva do programa de pós-graduação em Odontologia, nos níveis de Mestra do
e Doutorado da UEPG | Doutorado e Mestrado em Odontologia pela UEPG | Esp ecialização
em Odontopediatria pela UFPR.

Heliton Gustavo de Lima


Professor Adjunto do Curso de Odontologia da UFPR - Discip linas: Patologia Bucal,
Estágio Supervisionado e Clínica Integrada | Doutorado e Mestrado em Ciênci as
Odontológicas Aplicadas com área d e con centração em Patologia Bucal - FOB-USP |
Especialista em Patologia Oral e Maxilofacial - CFO.

Jaqueline do Carmo Machado Lopes


Professora da Faculdade Herrero – Disciplinas: Urgência e Emergência e Unidade de
Terapia Intensiva | Professora responsável pelo Ambulatório de Enfermagem da
Faculdade Herrero | Professora da disciplina de Emergências Médicas e
Odontológicas do curso de Especialização em Prótese Dentária- UFPR) | Técnica
administrativa - UFPR | Mestrado em Tecnologia em Saúde – PUC/PR |
Especialização em Assistência de Enfermagem ao Paciente em Estado Crítico –
Faculdade Evangélica do Paraná | Habilitada em Suporte Básico de Vida (BLS)
Profissional - American Heart Association | Graduação em Enfermagem -
Universidade Tuiuti do Paraná.
Jayme Bordini Júnior
Professor Adjunto do Curso de Odontologi a da UFPR - Discipli nas: Patologia Bucal,
Implantodontia, Clínica Integrada I e Clínica Integrada II | Aperfeiçoamento em
Implantodontia – UFPR | Especialização em Implantodontia - UFPR | Doutorado em
Clínica Cirúrgica | Mestrado em Biologia Molecular.

João Rodrigo Sarot


Professor Adjunto do Curso de Odontologia da UFPR – Disciplinas: Pacientes com
Necessidades Especiais em Odontologia e Clínica Integrada | Coordenador do Curso
de Especialização em Implantodontia da Prime Educação Continuada | Doutor em
Implantodontia - UFSC | Mestre em Cirurgia de Cabeça e Pescoço - Hospital
Heliópolis São Paulo | Especialização em Periodontia - UNISA-SP.

Mariana Dalledone

Professora titular da Faculdade Herrero – Disciplinas: Odontopediatria I e II e Saúd e


Coletiva I e II | Doutorado em Odontologia Clínica – Universidade Positivo | Mestrado em
Odontologia Clínica – Universidade Positivo | Es pecialização em Odontopediatria –
PUC/PR | Es pecialização em Saúde Coleti va-Gestão de Saúde Pública – Universidade
positivo | Poss ui curso de Analgesia Relativa com Oxido Nitroso – PUC/PR e Habilitação
em Óxido Nitroso - Universidade Positivo | Graduação em Odontol ogia – PUC/PR.

Luiza Iaizzo Magalhães

Discente do curso de Odontologia da Universidade Federal do Paraná.

Rafaela Scariot

Professora Adjunta do Curso de Odontologia da UFPR – Disciplinas: Biossegurança


e Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial II | Professora do Programa de Pós
Graduação Stricto Sensu em Odontologia da UFPR | Professora da Residência em
Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial da UFPR | Cirurgiã buco-maxilo-facial
na Novaface e no Centro de Atendimento Integral ao Fissurado |Pós doutorado e
Doutorado em Odontologia – PUC/PR | Mestrado em Odontologia – PUC/PR |
Especialização em Cirurgia Buco-maxilo-facial – UFPR. | Graduação em Odontologia
– UFPR.

Thays Regina Ferreira da Costa

Professora Adjunta do C urso de Odont ologia da UFPR - Disciplinas: Radiolog ia


Odontológica e Imaginologia 1 e Clínica Integrada 1 | Dout orado e Mestrado em
Odontologia (Linha de Pesquisa: Propriedade Físico-Químicas e Bi ológicas dos Materiais)
- UEPG | Es pecialista em Radiologia Od onto lógica e Imaginolo gia.
PREFÁCIO
A Organização Mundial da Saúde, no Relatório Mundial sobre Deficiência, de 2012, apontou que a
maioria das pessoas tem ou terá uma deficiência temporária ou permanente, em algum momento da vida. Pessoas
com deficiência correspondem a todas aquelas que apresentam condições debilitantes, ou seja, que possuem algum
impedimento de natureza física, mental, intelectual ou sensorial. Esse grupo representa 15% da população mundial
(OMS, 2012) e 24% da população brasileira (IBGE, 2010). Diante disso, os profissionais da saúde precisam estar
preparados para oferecer um atendimento adequado, de qualidade e individualizado.

Na odontologia, o número de profissionais habilitados especificamente para o atendimento de pessoas


com necessidades especiais é pequeno. De acordo com Conselho Federal de Odontologia, dos quase 336 mil
dentistas registrados (CFO, 06/2021), apenas 759 são inscritos como especialistas nessa área (CFO, 06/2021).
Nesse contexto, o Projeto de Extensão “Saúde Bucal Inclusiva”, do curso de Odontologia da Universidade Federal
do Paraná, foi concebido buscando associar o ensino, a pesquisa e a extensão. Assim, promove o contato de alunos
da graduação com pacientes com deficiências de diferentes níveis, proporcionando experiências que possibilitam
uma visão inclusiva, levando ao maior domínio de técnicas e capacitação para o atendimento.

A elaboração do livro “Abordagem odontológica da pessoa com deficiência: uma visão clínica e
humanizada” foi uma iniciativa da coordenadora do projeto, Profª Drª Yasmine Mendes Pupo, e dos alunos
participantes, que contaram com a colaboração e orientação de profissionais da odontologia de diferentes
especialidades para confecção dos capítulos.

O livro abrange pacientes com diferentes deficiências, relacionando-as com a saúde bucal e enfatizando o
manejo odontológico, desde a abordagem, planejamento, diagnóstico, prognóstico e tratamento, que devem ser
adaptados de acordo com o tipo de deficiência, questões emocionais, físicas e fisiológicas, idade e a necessidade
odontológica. Os capítulos iniciais orientam sobre o atendimento com sedação com óxido nitroso; o atendimento
odontológico no âmbito hospitalar; e a odontologia minimamente invasiva para o controle da cárie. Os demais
capítulos abordam a atenção e o manejo de pacientes idosos; oncológicos; com fissuras labiopalatinas; com
alterações neurológicas e/ou neurodegenerativas; com alterações sensoriais; e com alterações endócrino-
metabólicas e imunológicas.

Com está obra, o projeto Saúde Bucal Inclusiva busca disseminar a prática do atendimento de pacientes
com necessidades especiais de forma sistematizada, com embasamento científico e humanizado. Ao mesmo
tempo, pretende oferecer informações essenciais para que acadêmicos e profissionais possam estender os
benefícios das práticas apresentadas aos seus pacientes contribuindo para que mais pessoas em situação de
vulnerabilidade tenham acesso a tratamentos e orientações que possibilitem melhorar sua qualidade de vida.

LUIZA IAIZZO MAGALHÃES E RAFAEL AUGUSTO CARDOSO


SUMÁRIO

1. Contextualização, terminologia e humanização do atendimento


da pessoa com deficiência. 10
Yasmine Mendes Pupo | João Rodrigo Sarot | Jaqueline do Carmo Machado Lopes | Isabela Salgado
de Queiroz | Luisa Brondani Tomazin | Luiza Iaizzo Magalhães

2. A sedação com óxido nitroso e oxigênio em pacientes com


necessidades especiais. 18
Mariana Dalledone | Ingrid Burkoth Sanchez | Izabellen Taynara Artigas Kozowski

3. Condutas no atendimento odontológico de pessoas com


deficiência em âmbito hospitalar com anestesia geral. 30
João Rodrigo Sarot | Ana Beatriz Pinheiro e Silva | Maria Fernanda Gbur Barbosa | Pâmela Olivia de
Moura

4. A importância da odontologia minimamente invasiva para o


controle da doença cárie em pessoas com deficiência com ênfase
no tratamento restaurador atraumático. 49
Ana Cláudia Rodrigues Chibinski | Denise Stadler Wambier | Márcia Baldani | Mayara Vitorino Gevert
| Yasmine Mendes Pupo | Carolina Duarte de Macedo | Izabellen T.A. kozowski | Larissa M.
Olkuszewski de Carvalho

5. Atenção odontológica ao idoso. 71


Heliton Gustavo de Lima | Luiza Iaizzo Magalhães | Marina Elisa da C. Ferronato | Rafael Augusto
Cardoso
SUMÁRIO

6. Tratamento odontológico do paciente com fissura lábio-


palatina. 102
Rafaela Scariot | Carolina Duarte de Macedo | Ingrid Burkoth Sanchez | Júlia do Carmo Machado
Kneipp Lopes | Maria Fernanda Pivetta Petinati

7. Atenção odontológica em pacientes com alterações


neurológicas e/ou degenerativas. 121
Yasmine Mendes Pupo | Jaqueline do Carmo Machado Lopes | Júlia Fabris | Laís Bonatto Zawadniak
| Amanda Kerin Alves Cavalheiro

8. Condutas no atendimento odontológico de pacientes com alterações


cognitivas-comportamentais. 145
Yasmine Mendes Pupo | Jaqueline do Carmo Machado Lopes | Júlia Fabris | Laís Bonatto Zawadniak
| Giselle Emilãine da Silva Reis

9. Alterações endócrino-metabólicas e imunológicas. 152


João Rodrigo Sarot | Isabela Salgado de Queiroz | Luísa Brondani Tomazin
1
CONTEXTUALIZAÇÃO, TERMINOLOGIA E HUMANIZAÇÃO NO ATENDIMENTO DA
PESSOA COM DEFICIÊNCIA
Yasmine Mendes Pupo | João Rodrigo Sarot | Jaqueline do Carmo Machado Lopes | Isabela Salgado
de Queiroz | Luisa Brondani Tomazin | Luiza Iaizzo Magalhães

Introdução
A Organização Mundial da Saúde, no população saúde, educação, emprego, renda,
Relatório Mundial sobre Deficiência, de 2012, seguridade social e legislação, responsabilizando os
apontou que a maioria das pessoas tem ou terá uma países membros pelo cuidado das pessoas com
deficiência temporária ou permanente, em algum deficiência. 2
momento da vida. Pessoas com deficiência
correspondem a todas aquelas que apresentam Diante desse cenário, a Constituição

condições debilitantes, ou seja, que possuem algum Brasileira de 1988 garante o direito das pessoas

impedimento de natureza física, mental, intelectual portadoras de deficiência por meio de instrumentos

ou sensorial. Esse grupo representa 15% da legais como as Leis n.º 7.853/89 e a Lei Orgânica

população mundial segundo a OMS e 24% da da Saúde (n.º 8.080/90). A primeira, dispõe sobre o

população brasileira, de acordo com o Instituto apoio às pessoas portadoras de deficiências e à sua

Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Diante integração social, no que se refere à saúde, atribui

disso, os profissionais da saúde precisam estar ao setor a promoção de ações preventivas; a criação

preparados para oferecer um atendimento de uma rede de serviços especializados em

adequado, de qualidade e individualizado. 1 reabilitação e habilitação; a garantia de acesso aos


estabelecimentos de saúde e do adequado
Em 1981 foi declarado o “Ano Internacional tratamento no seu interior, segundo normas técnicas
da Pessoa Deficiente” pela Organização das Nações e padrões apropriados; a garantia de atendimento
Unidas (ONU), colocando a temática em discussão. domiciliar de saúde ao deficiente grave não
A partir disso, foi aprovada, no ano seguinte, na internado; e o desenvolvimento de programas de
assembleia geral da ONU, o Programa de Ação saúde voltados para as pessoas portadoras de
Mundial para Pessoas com Deficiências, deficiências, desenvolvidos com a participação da
ressaltando os direitos das pessoas a oportunidades sociedade (art. 2.º, Inciso II). Já a Lei Orgânica da
idênticas às dos demais cidadãos. Nesse programa Saúde garante a universalidade de acesso e a
foram estabelecidas diretrizes para garantir a essa
12

integralidade da assistência por meio do Sistema deficiência, além disso, afasta termos
Único de Saúde (SUS). 2, 3 pejorativos que possam ser utilizados para
inferiorizar a pessoa com deficiência.
A Convenção dos Direitos da Pessoa com
Afirmando a decisão das Nações Unidas, em
Deficiência, proclamada pela ONU em
2019 foi aprovada a PEC 25/2017 que substitui
2006, dispõe em seu primeiro artigo que
em dez artigos da Constituição expressões
“Pessoas com deficiência são aquelas que têm
como “pessoas portadoras de deficiência” por
impedimentos de natureza física, mental,
“pessoas com deficiência”. 4
intelectual ou sensorial, os quais, em interações
com diversas barreiras, podem obstruir sua Classificação das Deficiências
participação plena e efetiva na sociedade com
Durante muito tempo tentou-se conceituar e
as demais pessoas”. Ao longo do tempo, não só
classificar as deficiências de forma mais
o conceito, mas os termos utilizados para se abrangente. No livro “Pacientes Portadores de
referir a pessoas com deficiência foram Necessidades Especiais: Manual de Odontologia e
alterados. A Constituição de 1988 adotou a Saúde Oral” de Mugayar LRF, as deficiências são
expressão “pessoa portadora de deficiência”, classificadas em dez tipos de acordo com as áreas
no entanto, observa-se que atualmente esse comprometidas pela patologia: desvios de

termo não é mais utilizado, pois a expressão inteligência, defeitos físicos, defeitos congênitos,

pode se tornar um estigma por meio do qual a desvios comportamentais, desvios psíquicos,
deficiências sensoriais e de audiocomunicação,
deficiência passa a ser a característica principal
doenças sistêmicas crônicas, doenças endócrino-
da pessoa em detrimento de sua condição
metabólicas, desvios sociais e estados fisiológicos
humana, o que não é compatível com um 5
especiais. A Tabela 1.1 exemplifica cada
modelo inclusivo, que visa a promoção da
categoria.
igualdade e não discriminação. O termo Outra forma de subdividir as deficiências é a
“deficiente” isolado não deve ser utilizado, uma Classificação Internacional de Funcionalidade,
vez que ressalta apenas uma das características Incapacidade e Saúde (CIF), utilizada como
que compõem o indivíduo. O termo “pessoas referência pela Organização Mundial da Saúde
com necessidades especiais”, apesar de ser desde 2001, na qual estão os domínios referentes ao

bastante utilizado, é equivocado, porque corpo (estrutura e função) e aos aspectos

desqualifica as habilidades desenvolvidas por contextuais. A CIF é baseada na integração nos


modelos médico e social. Para o modelo médico a
elas. Dessa maneira, em uma Convenção das
deficiência é um problema causado diretamente por
Nações Unidas, foi definido que o termo correto
uma doença, trauma ou outra condição de saúde que
é “pessoa com deficiência" (PcD), que é mais
necessita de tratamento específico. Já no modelo
humanizada e ressalta a pessoa à frente de sua
social a deficiência é vista como uma integração
13

total dos indivíduos na sociedade, sendo uma foram definidos os conceitos de incapacidade,
condição complexa criada pelo ambiente social e limitação e deficiência. 6
não apenas individual. 6 Deficiência
É fundamental levar em consideração que a Qualquer perda ou anormalidade,
CIF classifica a saúde e os estados relacionados a transitória ou definitiva, da função e da estrutura
ela, ou seja, não classifica as pessoas, mas descreve corporal, incluindo a ocorrência de uma
a situação de saúde de cada uma. Diante disso, anomalia, defeito ou perda de um órgão, de um
tecido ou de qualquer estrutura corporal,
inclusive das funções mentais; 6
Tabela 1.1 Classificação das deficiências segundo Mugayar LRF.

Incapacidade
entendendo a incapacidade como uma
Toda restrição ou perda (causada por uma
6
dificuldade no desempenho pessoal;
deficiência) da habilidade para realizar uma
atividade considerada normal para uma pessoa,
14

Limitação forma, essas deficiências são problemas na função


ou estrutura do corpo e contemplam as estruturas
É a consequência de uma deficiência que
relacionadas ao sistema nervoso, à visão e audição,
impede a participação em atividades sociais e/ou
à voz e fala, aos sistemas cardiovascular,
culturais, bem como em atividades próprias da
imunológico, respiratório, digestivo, metabólico,
faixa etária ou do gênero. 6
endócrino, geniturinário e reprodutivo, ao
A deficiência, por sua vez, é dividida em
movimento, e à pele. 6
quatro categorias: funções corporais, estruturas
corporais, atividades e participação, e fatores Atividades e participação
ambientais. 6 As atividades têm relação com a execução

Funções corporais de tarefas ou ação de um indivíduo e a participação


é o envolvimento em uma situação da vida. Nesse
Está relacionada à fisiologia, assim, as
contexto, o indivíduo pode apresentar limitações na
deficiências são problemas na função ou estrutura
execução dessas atividades e restrições de
do corpo e abrangem funções mentais, sensoriais e
participação envolvendo o aprendizado e aplicação
dor, voz e fala, sistema cardiovascular,
de conhecimentos, tarefas, comunicação,
hematológico, imunológico e respiratório, sistemas
mobilidade, autocuidado e vida doméstica,
digestivo, metabólico e endócrino, geniturinário e
interações e relacionamentos interpessoais, vida
reprodutivo, neuromusculoesquelético e funções
comunitária, social e cívica. 6
relacionadas ao movimento, além de funções da
pele. 6 Fatores ambientais

Estruturas corporais Constituem o ambiente físico e social em que


os indivíduos conduzem suas vidas, relacionando-
Diz respeito às partes anatômicas do corpo,
se com produtos e tecnologias, ambiente natural e
como órgãos, membros e seus componentes. Dessa
Tabela 1.2 Classificação das deficiências segundo a CFI.
15

1, 7, 8
mudanças feitas pelo homem, suporte e prática humanizada.
relacionamentos, atitudes, serviços, sistemas e Uma equipe multiprofissional possui um
políticas. 6 papel fundamental tanto na prevenção como no
tratamento dos pacientes com deficiência, somando
A Pessoa com Deficiência na recursos e esforços para o seu bem-estar. O olhar
humanizado e a necessidade do atendimento
Odontologia
integral impactaram na maneira como os
profissionais (dentistas, fisioterapeutas,
A pessoa com deficiência na odontologia
psicólogos,fonoaudiólogos, médicos, enfermeiros,
compreende todo usuário que apresente uma ou
entre outros) serelacionam formando uma equipe
mais limitações, temporárias ou permanentes, de
que assiste os pacientes, realizando um
ordem mental, física, sensorial, emocional, de
atendimento abrangente e seguro. Além disso, a
crescimento ou médica, que o impeça de ser
equipe multiprofissional devetrabalhar em conjunto
submetido a uma situação odontológica
com a família e/ou responsáveis para desenvolver
convencional e que geralmente necessita de
e darcontinuidade ao tratamento no dia a dia. Ao
atendimento diferenciado durante parte de sua vida
assistir os pacientes, esses devem ser vistos
ou por toda sua vida. No Brasil, 45,6 milhões de
primeiramente como indivíduos que merecem
pessoas declararam ter alguma deficiência auditiva,
respeito e atenção, e depois como pessoas que
física, visual e/ou intelectual no censo de 2010 do
possuem alguma deficiência. 1, 7
IBGE. Na odontologia, o número de profissionais
A inclusão social desses pacientes é
habilitados especificamente para o atendimento de
responsabilidade dos profissionais de saúde
pessoas com necessidades especiais é pequeno. De
envolvidos em seu atendimento, sendo de grande
acordo com o Conselho Federal de Odontologia, em
valor os programas de prevenção e de
2021 dos quase 336 mil dentistas registrados,
inclusão social estabelecidos por várias
apenas 759 são inscritos como especialistas nessa
instituições de ensino que estimulam o paciente
área. Esses dados demonstram a necessidade de
deficiente, a família, a sociedade e, principalmente
profissionais que pratiquem atendimento
o aluno de graduação, estabelecendo uma política
preventivo e que possuam um treinamento
de humanização, minimizando os problemas
adequado. Como muitos cirurgiões-dentistas não se
enfrentados por esses pacientes e contribuindo
sentem aptos para tratar esses pacientes, programas
para o condicionamento e desenvolvimento dos
e disciplinas sobre esse tema nas faculdades são de
pacientes e facilitando os cuidados odontológicos
extrema importância visto que auxiliam no preparo
sejam estes restauradores ou preventivos. O
do aluno da graduação tornando-o qualificado para
preparo dos profissionais envolvidos é um dos
esse atendimento, reconhecendo as limitações e
fatores determinantes para o sucesso do
contribuindo para inclusão social. O presente
tratamento, por isso, devem cultivar valores
material busca unir conhecimentos científicos que,
humanos e estaremaptos a lidar com os pacientes
aliado ao ensino e a extensão contribuem para essa
e seus responsáveis.
16

como insegurança em relação à competência da


Humanização
equipe e ao tratamento que será realizado. É
importante que durante o atendimento, o paciente e
O termo humanizar pode ser interpretado
a família se sintam acolhidos, amparados e não
de várias maneiras como tornar humano, dar
responsabilizados pela situação em que se
condição humana ou ainda buscar oferecer ao
encontram, além de ter um canal aberto de
paciente um tratamento que leva em conta a
comunicação a fim de esclarecer eventuais dúvidas.
totalidade do indivíduo. O vínculo entre o
profissional, paciente/família é fundamental,
Considerações Finais
dessa forma, a atenção humanizada com
Segundo a seção II da saúde, o Art. 196 da
empatia e compreensão torna o atendimento
Constituição Brasileira de 1988 “A saúde é direito
mais personalizado uma vez que o profissional de todos e dever do Estado, garantido mediante
está aberto para explorar os relacionamentos políticas sociais e econômicas que visem à redução
humanos e não somente os conhecimentos do risco de doença e de outros agravos e ao acesso
científicos. Para isso, é necessário levar em universal e igualitário às ações e serviços para sua
3
conta as circunstâncias sociais, éticas, promoção, proteção e recuperação”. Dessa

educacionais e psíquicas, dando atenção tanto maneira, é um dever da sociedade formar


profissionais capacitados para o atendimento de
para os aspectos emocionais quanto físicos que
9 pacientes com deficiência da mesma forma que
estão diretamente ligados.
qualquer outro paciente merece ser atendido. O
Nesse contexto, em 2001 foi elaborado o
livro “Abordagem Odontológica da Pessoa com
Programa Nacional de Humanização da Assistência
Deficiência: uma visão clínica e humanizada”, visa
Hospitalar do Ministério da Saúde, buscando
o embasamento científico e estabelece protocolos
disseminar o respeito, a solidariedade, a cidadania e
de atendimento inclusivo para esse grupo,
a autonomia dos profissionais e dos pacientes.
destacando a importância do cirurgião-dentista
Assim, os serviços devem ter como eixo central a
como parte da equipe multiprofissional e tornando-
humanização para uma maior eficácia do
se uma referência para acadêmicos e profissionais
tratamento. 9
da odontologia.
Além dos pacientes, os profissionais e os
familiares enfrentam desafios ao lidar com as
situações decorrentes do diagnóstico. A relação dos
pais com a equipe de saúde responsável,
geralmente, é permeada por diversos sentimentos,

bucal da pessoa com deficiência. 2019.


Referências
2. Brasil. Departamento de Ações Programáticas
Estratégicas. Manual de legislação em saúde da pessoa com
1. Brasil. Ministério da Saúde. Guia de atenção à saúde
deficiência [Internet]. Brasília; 2006. Disponível em:
17

http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/legislacao_deficien https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/42407/92415
cia.pdf 45429.pdf

3. Brasil. Ministério da Saúde. Atenção à Saúde da 7. Moretto MJ, Maria S, Cristina M. Reflexões sobre a
Pessoa com Deficiência no Sistema Único de Saúde – SUS. importância da assistência odontológica preventiva e do
Brasília; 2009. adequado treinamento dos Cirurgiões-Dentistas para o
atendimento de pessoas com deficiência. Archives of Health
4. Brasil. Constituição (1988). Constituição da Investigation. 2014 Aug 22;3(3):58–64.
Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal;
1988. 8. Conselho Federal de Odontologia. Quantidade Geral
de Cirurgiões-Dentistas Especialistas - CFO [Internet].
5. Mugayar L. Pacientes portadores de necessidades Conselho Federal de Odontologia. 2021. Disponível
especiais: manual de odontologia e saúde oral. São Paulo: em: https://website.cfo.org.br/estatisticas/quantidade-geral-de-
Pancast; 2000. cirurgioes-dentistas-especialistas
6. World Health Organization. International 9. Brasil. Ministério da Saúde. Programa nacional de
Classification of Functioning, Disability and Health- ICF humanização da assistência hospitalar. Brasília; 2000.
[Internet]. World Report on Child Injury Prevention. 2001.
Disponível em:
2
A SEDAÇÃO INALATÓRIA COM ÓXIDO NITROSO E OXIGÊNIO EM PACIENTES
COM NECESSIDADES ESPECIAIS
Mariana Dalledone | Ingrid Burkoth Sanchez | Izabellen Artigas Taynara Kozowski

Introdução
Alguns procedimentos odontológicos podem deficiência (PDs) exemplificam parte desse
ser desconfortáveis e incômodos para a população conjunto de pacientes que não se apresentam
geral, e em especial, para os que possuem algum confortáveis ou tem alguma aversão ao atendimento
tipo de aversão ao ambiente odontológico, seja por odontológico, requerendo um tratamento
estresse, trauma, medos ou até mesmo devido ao diferenciado.
som dos equipamentos odontológicos e a O medo de ir ao dentista muitas vezes está
paramentação do profissional. As pessoas com associado a procedimentos dolorosos, uso de
19

agulhas ou a relatos de experiências negativas atendimento odontológico. Outra indicação serefere

contadas pelos pais e avós. Tais fatos contribuem a pacientes com dificuldade de cooperação,

para aumentar ainda mais essa ansiedade principalmente pacientes com Transtorno do

odontológica generalizada. Por isso o uso de Espectro Autista, de grau moderado a severo, que

técnicas como “dizer-mostrar-fazer” e momentos geralmente não toleram o uso da máscara adaptada

de distração com uso de músicas e fantoches, antes ao nariz durante todo o procedimento e não

e durante a realização dos procedimentos, tem se conseguem usá-la pelo tempo necessário para a

mostrado bastante vantajoso,uma vez que diminui realização da sedação. Nestes casos o uso de

o nervosismo frente ao desconhecido e tende a métodos farmacológicos como adjuvantes para

deixar o paciente mais confortável, desmistificando realização da sedação mostra-se bastante eficiente,

portando a figura do Cirurgião-Dentista (CD) e do já que proporciona uma melhora na qualidade e

ambiente odontológico como algo ruim que causa segurança do atendimento e facilita a execução dos

dor e medo.1,2 procedimentos odontológicos devido ao melhor

Essa ansiedade provocada por procedimentos controle comportamental e redução do nível de

odontológicos pode ser facilmente controlada pelo estresse desses pacientes.

declínio do nível de consciência do paciente, que A sedação com N2O pode ser utilizada em

pode ser obtido por meio de sedação (inalatória ou portadores de doenças sistêmicas que não suportam

medicamentosa) ou anestesia geral. A sedação os efeitos da ansiedade, como o aumento da pressão

intravenosa (uma das vias de administração do arterial e do batimento cardíaco, uma vez que a

medicamento) e a anestesia geral são comumente utilização da mistura gasosa promove um

usadas, mas baixam o nível de consciência do relaxamento e possivelmente uma redução dessas

paciente a ponto de aumentar os riscos e taxas.

complicações sistêmicas, havendo a necessidade de O CD que atenderá os PDs, pode usufruir

treinamento prévio pelo dentista e ambiente/ equipe dessa técnica com o intuito de melhorar o

hospitalar, respectivamente. Uma ótima opção é a comportamento do paciente durante o atendimento,

sedação consciente com óxido nitroso e oxigênio seja essa alteração causada pela dificuldade ou

(N2O), tema abordado nesse capítulo, já que é mais incapacidade do paciente manter-se parado para o

segura, pois há um controle efetivo do nível de tratamento, devido a problemas de comunicação

sedação. O uso desse método mostra-se bastante decorrentes de alguma doença ou por limitações de

eficaz nestes casos, e vem se tornando um grande ordem física, sensorial ou emocional. Pacientes

aliado dos CD’s. com problemas médicos complexos, respiradores

As indicações mais comuns para sedação bucais ou que não tolerem o uso da máscara nasal,

com N2O em procedimentos odontológicos em PDs mesmo utilizando métodos farmacológicos, quando

são comorbidades, deficiência cognitiva, disfunção necessário, previamente a sedação com N2O,
necessitam de atendimento em ambiente hospitalar,
motora e, de um modo geral, para pacientes que não
uma vez que se faz indispensável o uso de anestesia
são capazes de tolerar o estresse durante o
geral e acompanhamento de uma equipe
20

multidisciplinar. ou acompanhados de estímulos físicos leves.3,4


Entretanto, o profissional precisa estar atento em
Níveis de sedação e Classificação
casos de possíveis obstruções respiratórias, já que
ASA essa sedação pode ser feita combinando um

O termo sedação é descrito pela American medicamento oral e a sedação inalatória (N2O).3,4

Dental Association (ADA) como um alívio


momentâneo da ansiedade ou agitação, com
Nível 3 - sedação profunda
redução ou abolição total das respostas fisiológicas É um nível controlado de sedação, onde
3
e psicológicas e perda temporária de memória. É apesar do paciente perder parcialmente seus
representado em 4 níveis: mínimo, moderado, reflexos e não responder a estímulos verbais, ele
3,4
profundo e anestesia geral. É importante conhecer consegue responder a repetição de estímulos
os níveis de sedação em odontologia e a dolorosos.4 O paciente necessita de monitoramento
classificação da American Society Anesthesiology e é incapaz de manter sua respiração de forma
(ASA), pois pacientes com necessidades especiais independente.4 Nesses casos, o médico
possuem um enquadramento diferenciado. Além anestesiologista deve se fazer presente no
disso, os níveis de sedação podem sofrer alterações procedimento,4 já que o CD não está habilitado para
rapidamente.3,5 realizar algumas intervenções como a intubação do
paciente.
Nível 1 - sedação mínima
O paciente encontra-se em uma depressão
Nível 4 - anestesia geral
mínima de consciência, consegue responder a O paciente é submetido a uma perda total de
3,4
comandos verbais e a estímulos físicos. O consciência, induzida por uma combinação de
paciente respira normalmente, já que as funções drogas e gases.4 Não há resposta a estímulos
cardiopulmonares e ventilatórias não são dolorosos, verbais ou físicos, portanto deve ser
3,4
afetadas. Exemplos desse tipo de sedação são a realizado em ambiente hospitalar, com supervisão
utilização de medicamentos, como de um médico anestesiologista e monitoramento
benzodiazepínicos em quantidade reduzida, e a constante.4
sedação inalatória com óxido nitroso e oxigênio
(N2O).3,4 Classificação American Society
Nível 2 - sedação moderada Anesthesiology (ASA)
Estado de depressão consciente induzida por
Proposta em 1941, por um comitê composto
medicamentos (benzodiazepínicos, como
por três médicos, sugere um sistema de tabulação
Midazolam e Diazepam, hipnóticos, propofol e
para registrar e classificar, por meio de um escore
opioides, como Fentanil e Alfentanil).3,4,6 Os
subjetivo, o estado geral do paciente quando
pacientes respondem a comandos verbais isolados
21

submetido a procedimentos cirúrgicos com alívio da dor por intervenções no sistema nervoso
anestesia.7 central e/ou periférico.5 Ou seja, a sedação não
Tabela 2.1 Classificação do estado físico dos pacientes. elimina completamente o estímulo doloroso, apenas
faz uma redução do limiar de dor do paciente,
havendo necessidade de anestesia local para
tratamentos odontológicos.

Sedação inalatória consciente com


Óxido Nitroso e Oxigênio
O Óxido Nitroso e Oxigênio (N2O)
conhecido como gás do riso ou gás hilariante, é um
gás inorgânico, incolor, não irritante, de baixa
solubilidade, com sabor levemente adocicado.8 Foi
descoberto e isolado em 1772, pelo químico inglês
Joseph Priestley (1733-1804), que desconhecia seus
efeitos analgésicos. Somente no ano de 1844, o
Tipos de sedação
dentista americano Horace Wells (1815-1848)
descobriu suas propriedades redutoras do limiar da
Na odontologia existem alguns tipos de
sedação, além da anestesia geral, que podem ser dor, ao extrair seus própriosdentes, utilizando N2O

utilizados em PDs. Antes de abordar o tema deste puro (100%). Desde então,ele vem sendo utilizado,

capítulo, é necessário apontar outros exemplos de com um excelente histórico de segurança, com uma

sedação utilizados, pois como já mencionado trava que impede tal liberação de 100% de N2O,

anteriormente o N2O pode ser frequentemente quantidade que causa efeitos danosos ao paciente,

combinado com outros métodos sedativos. para o controleda ansiedade e da dor em diversas
áreas, sendo uma delas a Odontologia.9
 Sedação medicamentosa: via oral, inalatória,
Efeito analgésico/ansiolítico
intranasal, intravenosa;
 Sedação inalatória com óxido nitroso e A mistura gasosa de N2O com oxigênio é
oxigênio; caracterizada por possuir propriedadesanalgésicas/
 Anestesia geral. ansiolíticas eficazes que causam alterações no
É essencial ressaltar que a sedação, diferente sistema nervoso central (SNC), com efeitos
da analgesia, tem o propósito de manter o paciente desprezíveis no sistema respiratório e
5
relaxado, em alguns casos com uma perda cardiovascular. É utilizado para sedação mínima ou
momentânea de memória, que torna o atendimento moderada, em ambiente odontológico. Seu efeito se
mais seguro e rápido. Já a analgesia proporciona um dá devido a liberação de peptídeos opioides
22

endógenos e a consequente ativação de receptores técnica deve ser feita para o paciente e responsáveis,
opioides e receptores descendentes do ácido gama- com linguagem apropriada,4 ressaltando as
aminobutírico tipo A (GABA-A) e da sequência vantagens e indicações da utilização da técnica de
metabólica noradrenérgica que modifica o processo sedação. Nesse planejamento a avaliação prévia do
nociceptivo espinhal.5,10 O efeito ansiolítico paciente por meio da anamnese é essencial, bem
envolve a ativação dosreceptores GABA dos locais como o monitoramento dos sinais vitais.4 O
de ligação dos benzodiazepínicos.10 Quando em consentimento para a realização dessa técnica de
contato com o sangue é mais solúvel que o sedação deverá ser protocolado, assinado e
nitrogênio e rapidamente eliminados pelos pulmões, consentido pelo responsável e/ou paciente.4
o que demonstra sua segurança.5,10 Avaliação
Qualquer cirurgião dentista pode realizar a Todo paciente com necessidades especiais

sedação com N2O? submetido a sedação em nível mínimo ou moderado

A sedação com óxido nitroso e oxigênio é um com óxido nitroso e oxigênio deve passar por uma
anamnese detalhada pelo CD para a segurança e
procedimento autorizado, desde 2004, pelo
Conselho Federal de Odontologia (CFO). Apesar da eficácia do tratamento proposto.3

simplicidade do processo, é necessário que o CD Para avaliar o paciente e verificar se ele pode

esteja capacitado e habilitado para administrá-lo. A se submeter ao procedimento sedativo, a história

certificação pode ser obtida por cursos médica do paciente deve ser requerida.3 Nela, as

teóricos/práticos, com 96 horas de duração, seguintes informações têm que estar inclusas:

realizados por Instituições de Ensino Superior e alergias, medicamentos em uso, doenças e/ou

Entidades de Classe, registradas no CFO.11 A lei anomalias, desenvolvimento cognitivo e

nº5.081, de 24 de agosto de 1996, artigo VI, que psicológico, revisão de sistemas corporais, idade,

regulamenta o exercício da odontologia, diz que o peso, histórico familiar de complicações

CD pode empregar a anestesia e a hipnose, desde relacionadas à sedação e anestesia e histórico de

que comprovadamente habilitado para esses hospitalização prévia, anestesia geral ou sedação

serviços e se eles forem meios eficazes para o medicamentosa.3 O paciente também deve ser

tratamento odontológico.11 incluído dentro da classificação da American


Society of Anesthesiologists (ASA), pois de modo
Planejamento geral os pacientes que se enquadram em ASA III e
IV precisam de uma modificação no procedimento
Quando a sedação inalatória consciente com
óxido nitroso e oxigênio é considerada para um
procedimento, uma consulta prévia deve ser
agendada. Nela, o CD deve explicar aos N2O

responsáveis a necessidade do procedimento e o


plano de tratamento. Uma breve explicação da 11
23

de sedação, seja mínimo ou moderado.3,12 Por isso durante o procedimento. Esse aparelho mede o
o paciente necessita passar por avaliação médica nível de saturação de oxigênio no sangue. O
com clínico geral para atestar o seu quadro de saúde profissional, juntamente com a equipe habilitada
3,13
geral. para realizar a sedação com N2O precisa manter
Pessoas com necessidades especiais, uma postura de vigília e observar a cor da pele e das
incluindo idosos, que não forem capazes de mucosas do paciente.3 Os sinais vitais, que incluem
fornecer seu próprio histórico médico, frequência cardíaca, frequência respiratória e
farmacológico ou informações que o pressão arterial sistólica, também devem ser
médico/dentista julga serem importantes para o avaliados na consulta inicial e durante o processo de
planejamento da sedação no momento da consulta, sedação, já que os valores obtidos podem ajudar a
precisam ser acompanhados de um tutor ou diagnosticar um quadro iminente de emergência,
responsável, para que todas as informações sejam quando não se encontram em normalidade.
repassadas e esclarecidas.3
Preparo do ambiente e do paciente
Monitoramento dos pacientes
Os equipamentos modernos são compostos
De acordo com diretrizes de sedação da ADA
das seguintes partes: cilindro com os gases
de 2007, pacientes com necessidades especiais
comprimidos (uma unidade para cada gás: oxigênio
classificados em ASA III e IV, pela American
e óxido nitroso), válvulas redutoras reguladoras,
Society of Anesthesiology, necessitam de um
manômetros, fluxômetros, balões reservatórios,
monitoramento realizado com oxímetro.3
tubos e traqueias condutores e a máscara nasal com
Entretanto é preconizado o uso do oxímetro em
dispositivo de exaustão.11
todos os pacientes submetidos a sedação, para um
melhor acompanhamento do estado de saúde
Tabela 2. 2 Sinais vitais referentes a frequência cardíaca, frequência respiratória e pressão arterial sistólica, em situação de
normalidade, de acordo com diferentes faixas etárias.

(> 18 anos)
24

Deve-se medir a saturação periférica de O2 e


a frequência cardíaca continuamente. Por isso é
usado um oxímetro, que é colocado na parte ventral
de qualquer dedo, com o paciente deitado e
estabilizado na cadeira. O oxímetro pode ser portátil
ou de mesa.11

Figura 1.2 Cilindros de óxido nitroso (azul) e oxigênio (verde),


respeitando o código de cores de identificação.

diâmetros diferentes, impossibilitando a troca e a


conexão inadequada. Além disso, elas têm a cor
correspondente ao cilindro conectado.11
Figura 2.2 Oxímetros portáteis (A: dedo; B: mesa),
apresentando os valores de saturação se oxigênio e frequência
cardíaca. Dispositivo misturador

O ambiente deve ser calmo e confortável, A máquina não permite a liberação de óxido
com espaço necessário para os equipamentos e nitroso, sem antes o fluxo de oxigênio ser liberado
profissionais, iluminação adequada e temperatura pelo profissional.11 Esse fluxo deve ser de
agradável que permita o repouso e relaxamento do aproximadamente 5L/min, já que a média de
paciente.14 É importante verificar se o braço do respiração de um adulto é de 5 a 7 L/min. Nesse
paciente está posicionado em uma superfície momento, deve-se verificar se o paciente precisa de
próxima, no nível do coração e com a palma da mão mais volume de gás para respirar. Se não houver

em posição supina, caso seja necessário necessidade, se inicia a sedação em 10% de N2O.

aferir apressão arterial.11

Recomendações de segurança

Código de cores
O armazenamento de gases comprimidos e
liquefeitos devem ser feitos em cilindros que devem
respeitar as cores e normas padrão. O cilindro de
oxigênio deve ser verde e o de óxido nitroso, azul.11
Sistema de engates específicos
Figura 2.3 Equipamento misturador: dispositivo que permite
As mangueiras conectoras são responsáveis oscilar o fluxo (volume/L) de oxigênio, bem como óxido
nitroso, conforme o padrão respiratório e nível de sedação,
por levar os gases da fonte ao aparelho onde eles são respectivamente, desejado.
misturados. Elas apresentam conexões com
25

Dispositivo Fail-safe Técnica de administração


Só permite o fornecimento de N2O se ao
mesmo tempo estiver sendo fornecido pelo menos O processo consiste na administração de

30% de oxigênio, limite mínimo permitido pelo concentrações sub anestésicas de óxido nitroso

aparelho. Uma concentração inferior não é juntamente com oxigênio que vem de uma máquina

recomendada devido à possibilidade de específica e que adentra ao corpo humano através

hipoxemia.11 da inalação, por meio de uma máscara nasal.

No início da técnica deve ser feito o Teste de


Sistema de exaustão acoplado à máscara nasal
Dispositivo conectado ao sistema ejetor do Trieger (Figura 2.4). Nele, o paciente deve juntar
equipamento odontológico (sugador) para não os pontos de uma figura pré-estabelecida. O teste
permitir a reinalação do paciente e nenhum nível da também é aplicado ao final do procedimento e serve
mistura gasosa no ambiente, assegurando os para avaliar a eliminação do gás do organismo
profissionais presentes na hora do atendimento.11 baseado na coordenação motora do paciente
(número de pontos perdidos nos desenhos e tempo
Verificação de vazamento de gás pelas válvulas de execução do teste).11
As válvulas que se ligam ao cilindro de
oxigênio e nitrogênio necessitam ser verificadas
para se evitar possíveis ocorrência de vazamentos.
Por serem gases oxidantes, não deve ser usada
nenhuma substância à base de hidrocarbonetos,
como lubrificantes, graxas e óleos. Se houver
contato dessas substâncias com o cilindro de N2O e Figura 2.4 Exemplos de figuras utilizadas para realização do
Teste de Trieger.
ocorrer uma rápida abertura de válvula, causando
um aumento de temperatura. Pode ocorrer uma Após a colocação da cadeira odontológica

reação química capaz de provocar um acidente com em posição supina e a colocação da máscara nasal

fogo e explosão. É indicado que seja realizado um que melhor se adapta ao paciente (Figura 2.5 e 2.6),

teste completo de todos os equipamentos e fármacos o fluxo de O2 é colocado a 100%. Esse fluxo é então

disponíveis antes da primeira utilização do dia.11 ajustado de acordo com a necessidade de cada
paciente e tem como parâmetro o balão
reservatório. Se as paredes do balão colapsarem, o
fluxo de oxigênio está baixo e se as paredes ficarem
muito distendidas, o fluxo está muito alto (Figura
2.7).11 Determinado o fluxo de oxigênio, o N2O
deve ser liberado incrementalmente, de 10% a cada
minuto, até que o paciente esteja confortável e
relaxado. A determinação de sedação ideal varia
para cada paciente, mas nunca é permitido
26

ultrapassar 70% de N2O, devido a válvula de


segurança contida em todos os equipamentos. A
concentração de gás que sai da máquina não é
idêntica à concentração inspirada que chega aos
alvéolos do paciente devido a vazamentos
(máscaras nasais frouxas, espaço morto, respiração
bucal e o status de ventilação do paciente). Se a
máquina marca 70% de N2O, o provável é que a
porcentagem que está sendo entregue até os
Figura 2.6 Demonstra a adaptação e bom vedamento da
alvéolos seja menor do que a indicada.11 Isso pode máscara nasal com o nariz da paciente.
ocorrer por falhas na técnica empregada ou pelo
paciente não ser respirador nasal exclusivo.

O uso da sedação consciente geralmente tem


seu maior índice no começo do procedimento,
quando a anestesia local é aplicada. Ela também
deve ser explorada em partes complexas do
procedimento odontológico. Ao término do
atendimento, o dentista pode reverter diretamente a
inalação em 100% de oxigênio, mantendo-a por 5
minutos e, assim, diminuir o risco de náusea, que é Figura 2.7 Em verde, balão reservatório distendido, mostrando
11 a reserva da mistura gasosa durante a exalação do paciente
relacionado ao tempo de exposição ao agente. (uma vez que o fluxo é contínuo).

Tabela 2.3 Sinais e sintomas da sedação ideal e sobre


sedação.

Figura 2.5 Diferentes tamanhos de máscaras nasais para


melhor adaptação a cada paciente.

Durante a sedação inalatória com N2O, o


paciente percebe e sente algumas alterações em seu
corpo. Elas podem ser habituais, condizentes a uma
inalação dos gases em quantidade adequada, ou
anormais, quando o nível da sedação ultrapassa o
ideal suportado por cada indivíduo.
27

O óxido nitroso possui ação e eliminação Recomendações pré e pós-sedação:


rápida, fazendo com que o paciente retome a
normalidade em poucos minutos. Além disso, o Pré-sedação
aprofundamento da sedação pode ser controlado É instruído que os pacientes venham
pela quantidade de cada gás inalado pelo paciente, alimentados, mas alimentos como carnes, gordura,
durante a sedação. Quando o gás é eliminado do leites e seus derivados devem ser evitados, para
corpo, pode ocorrer a desnaturação de oxigênio, por diminuir as chances de ocorrência de náusea e
isso deve ser ministrado oxigênio 100% por 3 a 5 vômito, já que eles têm ação retardadora de
11
minutos antes que o paciente se levante da cadeira. esvaziamento gástrico. A literatura traz bastante
controvérsias em relação ao tempo estimado que a
A observação contínua do paciente é
pessoa deve permanecer em jejum antes de ser
importante para avaliar sinais de sobre sedação
submetida à sedação.15 No momento, o mais
(náusea, desconforto, aumento da pressão arterial e
recomendado é que na necessidade de se alimentar
vômitos).11 Todas as informações obtidas durante o
antes do procedimento, que sejam ingeridos
procedimento devem ser anexadas no prontuário do
alimentos leves, com intervalo de pelo menos uma
paciente.
hora.15 O jejum é exigido apenas para sedações
medicamentosas.
Efeitos colaterais
 Ocorrência de vômitos e náuseas são relatados Pós-sedação
como efeito colateral.15,16
Pacientes com deficiência mental e
 O Laringoespasmo é um efeito colateral mais
transtornos de comportamento, ao recobrar o nível
raro e sua ocorrência foi relatada apenas em
total de consciência, podem apresentar crises, por se
casos em que a sedação moderada evoluiu para
sentirem desconfortáveis com o ambiente
uma sedação profunda.15
odontológico, ansiosos ou com dor.3,17 O
 Dor torácica central e convulsão tônico-clônica
recomendado, portanto, é que o dentista, antes de
são relatadas em casos de uso superior de 50% a
efetuar a alta, esteja satisfeito com o nível de
70% de N2O.15
recuperação pós sedação e prescreva todos os
 Na literatura, há relatos demonstrando a possível
cuidados pós-operatórios com antecedência.3
inativação da vitamina B12 como um dos
Pacientes idosos necessitam de atenção especial,
possíveis efeitos colaterais do uso prolongado de
pois ao permanecerem muito tempo deitados na
N2O. Isso pode ocorrer em casos de pacientes
cadeira odontológica quando sedados, ao
submetidos a sedação, de forma contínua, por
levantarem rapidamente podem sentir uma leve
vários dias e com duração de procedimento
tontura.3 Por isso, o recomendo é que o dentista
superior a 2 a 3 horas, com o equipamento
incline a cadeira e oriente que o mesmo permaneça
liberando uma quantidade em torno de 30/70%
sentado por no mínimo 5 minutos, a fim de diminuir
de oxigênio e óxido nitroso respectivamente.15
a chances de quedas.3 Em ambos os casos um
28

acompanhante é imprescindível. técnica da sedação inalatória com óxido nitroso e


oxigênio com o objetivo de tornar o procedimento
Contraindicações mais confortável para o referido paciente. Em todo

Não existem contraindicações absolutas para o momento o paciente foi monitorado conforme as

o uso da sedação consciente inalatória com óxido especificações para o uso da técnica conforme

nitroso e oxigênio desde que se utilize a descrito anteriormente neste capítulo. Após a

concentração de no máximo 70% N2O e no mínimo extrações dentárias manteve-se contato por telefone

30% de O2. As contraindicações relativas estão com os pais para saber se o paciente não

relacionadas com a obstrução das vias aéreas apresentava nenhum sinal adverso ou qualquer tipo

superiores, infecções respiratórias, desvio de septo de efeito colateral devido a utilização do gás. Sem

nasal, aumento das amígdalas e/ou adenoides, nenhuma ocorrência relatada, pode-se concluir que

fissura palatal, gestantes, cardiopatas, anemia grave o uso desse meio sedativo no paciente com

(taxa de hemoglobina baixa), doenças pulmonares deficiência foi um sucesso.

crônicas, pacientes com severos problemas


comportamentais que não cooperam com a
utilização da máscara nasal e na respiração dos
gases, pacientes psiquiátricos, paranoicos,
esquizofrênicos e psicóticos.8

Relato de caso

As Figuras 2.8 e 2.9 mostram o atendimento


de um paciente com paralisia cerebral, atendido na
Clínica de Odontologia da Universidade Federal do
Paraná, pela equipe de professores da
Odontopediatria e de Pacientes com Necessidades
Especiais. O paciente apresentava dentes decíduos
retidos e palato profundo e atrésico. A presença de
dentes decíduos impedia a erupção do germe
dentário permanente, dificultando uma higiene
Figura 2.8 e 2.9 Atendimento de PD com auxílio da Sedação
bucal adequada por parte dos pais, o que resultava Inalatória com Óxido Nitroso e Oxigênio realizado na
no acúmulo de biofilme dental. A ortodontia foi Universidade Federal do Paraná em março de 2019.

considerada inviável pelos pais devido ao baixo


Considerações finais
grau de cooperação cognitivo do paciente. A
alternativa encontrada pelos CD foi a extração Os PDs podem apresentar rejeição de
desses dentes decíduos. Para isso utilizou-se a tratamentos e um manejo comportamental
29

ineficiente e por isso necessitam de uma abordagem regional. É fundamental que antes de sugerir essa
diferenciada para seu tratamento e para sua sedação, que atua como coadjuvante ao tratamento
segurança. A sedação inalatória com óxido nitroso odontológico, o CD, junto com sua equipe, conheça
é uma ótima opção e vem ganhando cada vez mais bem seu paciente por meio de uma anamnese
adeptos. Fato é que, ao inalar esse gás o paciente detalhada. Por fim, o conhecimento sobre a técnica,
apresenta diferentes níveis de depressão de instrumentos necessários, monitoramento do
consciência, tornando-o relaxado para tal paciente, indicações e contraindicações, além das
procedimento e proporcionando um ambiente leis que regulam sua utilização no país, são
tranquilo e confortável. imprescindíveis para não colocar em risco a vida do
paciente que opta por essa técnica e trazer um
O uso dessa técnica farmacológica é uma
procedimento efetivo e seguro, assim facilitando a
alternativa bastante segura, desde que sua dosagem
relação paciente-profissional durante os
seja administrada corretamente, por um profissional
procedimentos.
habilitado e registrado no conselho de classe

Referências
1. Matos L, Ferreira R, Diniz L. Manejo de 9. Becker DE, Rosenberg M. Nitrous oxide and the
comportamento em crianças com ansiedade e estresse em inhalation anesthetics. Anesth Prog. 2008 Dez; 55(4):124-30.
clínica de Odontopediatria. R Odontol Planal Cent 2018 Jun-
10. Deepika K, Bhuvaneswarri J. Conscious sedation in
Nov; 4(1):18-24.
dentistry. Eur J Mol Clin Med. 2020 Dez; 7(2):6618–24.
2. Gama TS, Oliveira CA, Cabral EL, et al. Perfil do
11. Ladewig VM, Ladewig SF, Silva MG, Bosco G.
medo apresentado por crianças frente ao tratamento
Sedação consciente com óxido nitroso na clínica
odontológico. Revista UNINGÁReview 2017 Jan-Mar;
odontopediátrica. Odontol. Clín.-Cient. 2016 Abr-Jun; 15(2).
29(3):23-27.
12. Jackson DL, Johnson BS. Conscious sedation for
3. Coke JM, Edwards MD. Minimal and moderate oral
dentistry: risk management and patient selection. Dent Clin
sedation in the adult special needs patient. Dent Clin North Am
North Am. 2002 Out; 46(4):767-80.
2009 Abr; 53(2):221-30.
13. Barbosa ACBM, Mourão J, Milagre V, Andrade DC,
4. Pérez P. Sedación en Odontología: Sedación
Areias C. Inhalation conscious sedation with nitrous
inhalatoria con Óxido Nitroso. Gac Dent 2017 Out;
oxide/oxygen in pediatric dentistry. Med Express. 2014
295(295):154–60.
Jun;1(3):102–4.
5. Fiorillo L. Conscious Sedation in Dentistry.
14. Wang YC, Lin IH, Huang CH, Fan SZ. Dental
Medicina (Kaunas). 2019 Dez; 55(12):778.
anesthesia for patients with special needs. Acta Anaesthesiol
6. Cogo K, Bergamaschi CC, Yatsuda R, Volpato MC, Taiwan. 2012 Set; 50(3):122-5.
Andrade ED. Sedação consciente com benzodiazepínicos em
15. Chi SI. Complications caused by nitrous oxide in
odontologia. Revista de Odontologia da Universidade Cidade
dental sedation. J Dent Anesth Pain Med. 2018 Abr; 18(2):71-
de São Paulo. 2006 Mai-Ago; 18(2):181-8.
78.
7. Daabiss, M. Classificação do estado físico da
16. Hallonsten AL, Koch G, Schröder U. Nitrous oxide-
American Society of Anesthesiologists. Jornal indiano de
oxygen sedation in dental care. Community Dent Oral
Anestesia. 2011 Mar; 55(2):111-5.
Epidemiol. 1983 Dez; 11(6):347-55.
8. Oliveira BF. Sedação na odontologia em pacientes
17. Slovin M, Falagario-Wasserman J. Special Needs of
com necessidades especiais: revisão de literatura. Uberaba.
Anxious and Phobic Dental Patients. Dent Clin North Am.
Monografia [Graduação em Odontologia] - Universidade de
2009 Abr; 53(2):207–19.
Uberaba-Minas Gerais; 2018.
3
CONDUTAS NO ATENDIMENTO ODONTOLÓGICO DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
EM ÂMBITO HOSPITALAR COM ANESTESIA GERAL
João Rodrigo Sarot | Ana Beatriz Pinheiro e Silva | Maria Fernanda Gbur Barbosa | Pâmela Olivia de Moura

Introdução
diagnósticas e terapêuticas em saúde bucal, que por
Em 2004 foi legitimada a Odontologia
meio de recursos como anestesia geral, pode
Hospitalar (OH) no Brasil, com a criação da
viabilizar procedimentos sendo realizada através de
Associação Brasileira de Odontologia Hospitalar
uma equipe multiprofissional, expandindo as
(ABRAOH), visando a necessidade da equipe
especializações profissionais, atingindo áreas da
multiprofissional em âmbito hospitalar para
estomatologia e cirurgia bucal, resultando na
garantir o bem-estar do paciente. Assim, foi
interação entre a odontologia e a medicina.
comprovada a importante presença de um cirurgião-
Pesquisas relatam que entre crianças e adolescentes,
dentista, ao passo que microrganismos presentes na
no mundo, cerca de 5 a 24% apresentam ansiedade
cavidade bucal podem agravar quadros clínicos. 1
aos tratamentos odontológicos.2 Esta é uma
A Odontologia Hospitalar abrange um
barreira limitadora da realização de procedimentos
conjunto de ações preventivas, paliativas,
porém, com o uso de anestesia geral, é possível
31

realizá-los. Cada paciente será tratado conforme a


uma vez que com o paciente em estado de
patologia, dependendo também da colaboração,
tranquilidade é possível realizar os protocolos
estado geral de saúde, idade e medicações. De
necessários para o tratamento. Entre as indicações
3
acordo com essa situação, pode-se optar por:
para o uso de anestesia geral, pode-se citar pacientes
com deficiência, doenças sistêmicas que
impossibilitem o uso de técnicas alternativas, como
sedação, realização de procedimento invasivos que
requerem monitoramento intensivo, pacientes não
cooperativos ou que se encontram em tratamento
hospitalar.
Uma Odontologia mais inclusiva vem
sendo praticada por um número cada vez maior de
profissionais, impactando diretamente na qualidade
de vida de pacientes mais vulneráveis como os
portadores de necessidades especiais. O
Figura 3.1 Diagrama do uso de anestesia geral. atendimento odontológico desses pacientes

A anestesia geral é comumente utilizada representa um desafio para o cirurgião-dentista e

para pacientes não cooperativos que precisam de equipe odontológica, devido à cooperação limitada,

reabilitação dentária, por exemplo pacientes com ou inexistente, e associada à falta de competência

deficiência intelectual e/ou física, como retardo em saúde. Desse modo, para proporcionar um

mental, autismo, epilepsia, espasmos, hidrocefalia, tratamento odontológico seguro, aceitável e de

Doença de Alzheimer, Meningoencefalite (doenças qualidade, sem estresse psicológico ou físico, é

infecciosas), esclerose múltipla, ou pacientes que necessário em alguns casos recorrer à sedação ou

apresentam transtornos psiquiátricos, tais como anestesia geral (AG) sob supervisão médica.

fobia, depressão, esquizofrenia, transtorno de Por meio de uma análise criteriosa de


comportamento agressivo, e problemas médicos artigos e periódicos publicados, até o ano de 2021
complexos. Muitos desses pacientes estão em bases de dados de ciências da saúde, como
propensos a desenvolver cárie e periodontite, o que PUBMED, SCOPUS, SCIELO e SCIENCE
associado a um cuidado bucal ineficiente, pode-se DIRECT, esse capítulo tem como objetivo
agravar. Além disso, frequentemente apresentam compilar informações eorientar o cirurgião dentista
ansiedade e não cooperação, tornando o exame de acerca dos diferentes usos da anestesia geral em
rotina ou tratamento odontológico árduo ou procedimentosodontológicos. Assim, acadêmicos e
impossível. 4 profissionais da odontologia encontrarão
informações para o atendimento de pacientes,
Desse modo, o cirurgião-dentista pode
principalmente aqueles com deficiência, que
fazer o uso de anestésico geral para tornar os
necessitem de anestesia geral ou outros tipos de
procedimentos menos traumáticos e mais eficientes,
32

comportamental, físico e social, sedações


sedação que demandam uso do ambiente hospitalar.
aceitáveis, apoio psicológico, estratégias de
Ademais, procurou-se reforçar a importância do
prevenção, devem ser consideradas antes de tomar
acompanhamento multidisciplinar do paciente,
a decisão de utilizar o anestésico geral. 7
além de comentar sobre os exames e cuidados pré e
pós operatórios demandados por portadores de Casos em que a anestesia geral é recomendada
diversas enfermidades. Esse capítulo pauta-se na
cooperação multiprofissional, garantindo que o
maior número de informações e atendimentos de
sucesso se estabeleçam.
Procedimentos odontológicos
realizados no ambiente hospitalar
O uso da anestesia geral tem o intuito de
otimizar as condições tanto para realização de
procedimentos clínicos, como extração dentária e
terapia restauradora nos casos em que os pacientes
não são receptivos aos tratamentos convencionais, 4
quanto para intervenções cirúrgicas, como Cirurgia
Ortognática ou reconstrução dento-alveolar com
enxerto autógeno para posterior reabilitação
5,6
protética. Porém, esta modalidade é mais
complexa de organizar em comparação com outros
métodos alternativos, sendo a mais cara, em
algumas circunstâncias, por requerer grande esforço
em termos de equipe e despesas dentro de uma
internação hospitalar. Além disso, tem o maior risco Figura 3.2 Casos em que a anestesia geral é indicada. (WDDWLL,
2011; HUTCHINSON, 2020)
de efeitos colaterais. 4,5
Casos em que a anestesia geral é contraindicada
A segurança do paciente e do médico, bem
como a necessidade de diagnosticar e tratar, deve A anestesia geral é contra indicada no
justificar o uso de anestesia geral. Entretanto, paciente que, no dia da realização da mesma,
Crespi e Friedman citam vários autores que apresentar resfriado, febre, bronquite, crise
concordam em recomendar que pelo menos uma ou asmática ou insuficiência cardíaca descompensada
duas tentativas utilizando as outras formas de e desta forma verifica-se que o profissional deve
8
gerenciamento antes de considerar anestesia geral. estar atento às alterações que o paciente venha a ter,
Desse modo, todas as técnicas de administração para saber diagnosticar e realizar ou não a anestesia
disponíveis, incluindo contenções, suporte geral. 10
33

microrganismos patogênicos. Com isso o paciente


pode ser acometido por doenças cárie e periodontal,
além de lesões na mucosa, que podem implicar na
condição sistêmica. 12

A pneumonia nosocomial pode ser


decorrente desses fatores, e é a segunda causa de
infecção hospitalar mais recorrente, podendo levar
ao óbito. Indivíduos submetidos a transplante de
órgão necessitam de um cuidado odontológico, pois
Figura 3.3 Atendimento odontológico em âmbito hospitalar em
paciente de 9 anos com Transtorno do Espectro Autista
infecções orais que desencadeiam em infecções
submetido a anestesia geral no Comprexo Hospital de sistêmicas aumentam o risco da perda de enxerto,
Clínicas-HC, em Curitiba. Imagem cedida gentilmente pela
Profa. Dra. Yasmine Mendes Pupo e pelo Prof. Dr. João podendo levar à morte. Sendo assim, mesmo que
Rodrigo Sarot.
ainda não muito reconhecida no Brasil, a presença
Atuação odontológica para do cirurgião-dentista na equipe multiprofissional do

pacientes em terapia intensiva hospital é de extrema importância para garantir


melhor recuperação do paciente e não agravamento
De acordo com a Organização Mundial da do quadro.12
Saúde (OMS), 11 a saúde bucal está dentro da saúde
A cooperação, troca e interação entre as
geral do organismo. Portanto, pacientes em UTIs
diversas especialidades presentes no âmbito
necessitam de manutenção da saúde bucal para
hospitalar transcende os alcances da ciência, e
conter a proliferação de fungos e bactérias, que
possibilita um olhar muito mais ampliado para a
podem ser muito prejudiciais aos pacientes ao
saúde do paciente.1 A responsabilidade destes
agravar o quadro sistêmico, podendo aumentar suas
procedimentos é compartilhada entre médicos,
estadias em uma UTI. Os cuidados da prática
cirurgiões-dentistas, enfermeiros, fisioterapeuta,
odontológica que apenas o cirurgião-dentista
nutricionista, anestesiologista e toda a equipe
domina tal conhecimento, pode conter infecções
13
assistente. Com uma infraestrutura adequada e
respiratórias, diminuir a necessidade do uso de
equipe auxiliar treinada o sucesso do tratamento e
medicamentos, como antibiótico e
melhora do quadro clínico do é alavancada. 13
consequentemente reduz taxa de mortalidade, essas
medidas paliativas, fornecidas pela equipe Cuidados pré-anestésicos
odontológica, diminuem gastos com a internação.
Devido ao grande uso de medicamentos, podendo
Anamnese e exames pré-operatórios
causar redução salivar, diminuição da limpeza O planejamento odontológico é
natural da boca e uso do tubo traqueal, em alguns fundamental para garantir o sucesso do
casos, nos pacientes na UTI ocorre acúmulo do procedimento sob anestesia geral, minimizando os
biofilme dental, favorecendo a colonização de riscos de complicações e efeitos colaterais. Assim,
34

possibilitando avaliar se o paciente está apto para Informações que a avaliação física deve incluir:
tal intervenção e se será realizado no âmbito
 Sinais vitais, incluindo coração, frequência
hospitalar a nível ambulatorial ou em regime de
respiratória, sangue pressão e temperatura. Se
internação. Desse modo, o cirurgião-dentista deve
determinação da linha de base dos sinais vitais
realizar uma avaliação pré-operatória completa,
são impedidos com resistência física ou
incluindo um histórico médico abrangente, exame
condições emocionais do paciente, os motivos
físico, avaliação anestésica e exame hematológico.8
devem ser documentados; 15
Sugere-se testes laboratoriais de rotina, tais como
 Avaliação da permeabilidade das vias aéreas
análise de urina e hemograma completo com índices
para incluir o tamanho da tonsila e qualquer
e níveis de eletrólitos, porém estes não são
anormalidade anatômica (por exemplo,
necessários para pacientes que apresentam histórico
hipoplasia mandibular) que pode aumentar o
médico e exames anteriores normais. 14
risco de obstrução de vias aéreas; 15
Informações que o histórico médico deve incluir:  Classificação ASA (Americano Society of
Anesthesiologists); 15
 Alergia, incluindo reações alérgicas anteriores  Nome, endereço e número de telefone do
ou adversas a fármacos; 15 paciente ou responsável. 15
 Medicamentos atuais, incluindo dosagem,
Além disso, o dentista deve fazer uma
tempo, via, e local de administração, sobre uso
avaliação intraoral completa antes da
de drogas ilícitas ou fitoterápicas (por exemplo,
hospitalização, realizando exame físico de cabeça e
erva de São João, Echinacea, Kava, Valeriana),
pescoço, analisando também lábios, língua,
os quais podem alterar a farmacocinética da
assoalho da boca, mucosa bucal, palatoduro e mole,
droga, prolongar o efeito deagentes sedativos; 15
a região orofaringe, periodonto, se há presença de
 Doenças ou anormalidades no paciente,
dente cariados, verificando as cúspides dos
incluindo estado de gravidez e imagens
molares, linha mediana e oclusão do paciente, se
neurológicas para pacientes que apresentam
apresenta sobremordida ou sobressaliência, além
potencial de obstrução das vias aéreas, como
de examinar os hábitos orais e comportamentos. Os
história de ronco ou apneia obstrutiva do sono
resultados da avaliação intraoral juntamente com o
(AAPD); 15
histórico dentário do paciente e motivo para
 Internações anteriores, incluindo a data,
admissão do procedimento sob anestesia geral,
propósito, e decurso hospitalar; 15
 História de anestesia geral ou sedação e devem constar no prontuário do paciente e ser
qualquer complicação associada; 15 enviadoao hospital. 8

 Histórico familiar de doenças ou complicações Pacientes com distúrbios psíquicos, tais


15
decorrentes do uso de sedação ou anestésico; como transtorno de ansiedade ou fobia
15
 Revisão dos sistemas corporais; odontológica entre outros, precisam
 Idade em anos e meses, e peso em
obrigatoriamente providenciar um certificado
15
quilogramas.
psiquiátrico atestando sua inaptidão para receber
35

tratamento odontológico sem anestesia geral. 4 orientar condutas que devem ser adotadaspré e pós
procedimento, mostrando-se solicito em esclarecer
Deve-se escolher o agente e a técnica que
eventuais dúvidas e questionamentos. A Figura 3. 4
melhor se adapta ao tipo de paciente, bem como à
é um exemplo de orientações pré- procedimento.
natureza do que precisa ser realizado. Por isso, o
dentista deve avaliar o histórico médico da criança
e o estado médico atual, analisando se há
possibilidades de complicações decorrentes do
procedimento. Uma vez que o planejamento difere
de um indivíduo anatomicamente normal e saudável
16
de um paciente com quadro clínico asmático ou
com necessidades especiais, os quais podem
apresentar anormalidades anatômicas das vias
aéreas ou hipertrofia das tonsilas, por exemplo. O Termo de consentimento
paciente e/ou responsáveis devem ser informados
Todos os procedimentos necessários devem
de quaisquer potenciais complicações, e obtido seu
ser realizados de forma adequada para promover a
consentimento esclarecido. 15
saúde bucal desses pacientes, guiado pelo conceito
Há algumas contraindicações para a de igualdade para todos, realizando em todos os
administração da anestesia geral em âmbito pacientes uma anamnese detalhada e no caso de PE
hospitalar, dentre eles estão: falta de treinamento a primeira necessidade básica a realizar é o termo
adequado do dentista e da equipe, falta de de consentimento autorizando o tratamento pelos
equipamento ou de instalações adequadas, pais ou responsáveis. 10 A Figura 3.5 é um exemplo
pacientes comprometidos sistemicamente. Visto de termo de consentimento.
que tem alguns relatos na literatura que por falta de
competência profissional, pacientes com
Anestesia geral
necessidades especiais são automaticamente
É comum que pais e responsáveis se sintam
direcionados aos hospitais, para o procedimento ser
mais confortáveis com procedimentos que
realizado com anestesia geral, porém quando há
envolvam anestesia ou sedação. Muitos pacientes
chances de ser realizado no consultório, não é o
com doenças sistêmicas acabam tendo a saúde bucal
ideal expor o paciente à sedação.16
negligenciada quando comparada com a saúde

Orientações ao paciente corporal, por isso, os responsáveis se sentem


ansiosos com a intervenção do Cirurgião-dentista.
Após a equipe odontológica dialogar e
Porém é preciso uma atenção redobrada, do
planejar a intervenção mais adequada, em conjunto
cirurgião-dentista, para este tipo de intervenção. 17
com a equipe médica se necessário, deve-se
comunicar ao paciente e responsáveis como, quando
e porquê tal procedimento será realizado. Além de
36

Figura 3.4 Documento com orientações pré procedimento em centro cirúrgico do Complexo Hospitalar de Clínicas/ Curitiba-PR.
37

Figura 3.5 Termo de consentimento livre e esclarecido para realização de atendimento e procedimentos odontológicos para pacientes
internados do Complexo Hospitalar de Clínicas/ Curitiba-PR..
38

Anestesia geral é o nível mais complexo de odontológico sob anestesia geral, em sua maioria
sedação, onde ocorre analgesia total com depressão sendo a melhor opção para o tratamento eficiente de
do sistema nervoso central (SNC), perda de determinados pacientes.
consciência, reflexos e qualquer controle da
musculatura do paciente, inclusive do controle da
respiração mecânica. A depressão respiratória pode
ocorrer de maneira espontânea ou fármaco induzida
durante o procedimento, portanto para redução de
riscos, aconselha-se que o anestesista responsável
pela indução do paciente mantenha ventilação
pulmonar com pressão positiva ou que mantenha o
paciente entubado. As vias mais comuns de
administração anestésica são a parenteral e a Figura 3.6 Paciente submetido a anestesia geral e intubação
18 para realização de múltiplas exodontias. Imagem cedida
inalatória. gentilmente pela Prof. Dra. Yasmine Mendes Pupo e Prof. Dr.
João Rodrigo Sarot.

Assim como qualquer anestesia, os


anestésicos gerais bloqueiam as vias de dor,
possibilitando a realização de um vasto número de
18
procedimentos odontológicos em âmbito hospitalar.
A maioria dos anestésicos utilizados para analgesia
inalatória são compostos voláteis e apolares, sendo
Não existe um fármaco único que atenda
assim, não possuem um sítio específico de atuação,
toda a demanda de efeitos desejados para a
o que justifica a gama de efeitos depressores no
anestesia geral, portanto, é comum que se faça a
corpo humano. Por serem apolares, os anestésicos
associação de medicamentos para analgesia e
se acumulam no tecido adiposo e podem ter efeito
sedação plena. As associações mais comuns são
prolongado em pacientes com alto índice de
feitas por medicamentos pré-anestésicos (classes
gordura corpórea. 19
dos antieméticos, benzodiazepinicos, opióides,
Em alguns casos é necessária a associação
anti-histamínicos ou anticolinérgicos), anestésicos
com a anestesia local, para garantir que o local a ser
inalatórios ou intravenosos, bloqueadores das
realizado o procedimento esteja anestesiado o
funções neuromusculares e anestésicos locais. A
suficiente. 19
medicação pré anestésica é fundamental para
diminuir os efeitos da anestesia geral, bem como
Caso clínico
facilitar na diminuição da dose dos medicamentos
Condição inicial
sedativos. 19
Paciente do sexo masculino, 13 anos de
Como previamente citado, diversas são as
idade, obeso, com transtorno do espectro autista e
indicações para realização de tratamento
deficiência intelectual, apresentava necessidade de
39

extração dos elementos 15 e 25 que se encontravam que fazia a escovação, e que relatou dificuldade em
apinhados com 14/16 e 24/26 respectivamente e realizá-la pela presença de elementos fora de
para palatal por ausência de espaço na arcada posição. Devido à complexidade do manejo
dentária. Além desses dentes não apresentarem clínico, força excessiva por parte do paciente e
efetividade na mastigação, aumentavam a insucesso na realização de um exame clínico e
probabilidade de problemas periodontais e lesões radiográfico criterioso, o mesmo foi encaminhado
cariosas. Verificou-se na anamnese que o paciente para realização do procedimento odontológico sob
não apresentava dieta cariogênica e a higiene bucal anestesia geral no Complexo Hospital de Clínicas
era mantida com considerável efetividade pelo pai em Curitiba – PR.

Figura 3.7 A. Intubação nasotraqueal e sedação. B. Monitor de sinais vitais. C. Procedimento odontológico em andamento realizados
pelos professores do Projeto Saúde Bucal Inclusiva.. D. Elemento 25 em palato. E. Exodontia do elemento 25. F. Cavidade bucal apóx
exodontia. Imagens cedidas gentilmente pela Prof. Dra. Yasmine Mendes Pupo e Prof. Dr. João Rodrigo Sarot.

Anestesia e procedimento cirúrgico médico anestesista, aumentando a segurança e


qualidade da cirurgia. Houve a complementação
O procedimento foi feito com o paciente
com anestesia infiltrativa local favorecendo a
entubado e sob anestesia geral realizada por um
hemostasia e garantindo que a região de trabalho
40

estivesse suficientemente anestesiada. Após a mg/Kg, o tempo de ½ vida do fármaco corresponde


extração dos dentes 15 e 25 foi realizada raspagem a 286-36 minutos e com eliminação de 1803-125
supragengival dos demais elementos e aplicação minutos. 16
tópica de flúor. O paciente não apresentava Quentamina
qualquer lesão de cárie e sem presença de
Produz uma analgesia dissociativa, e é
restaurações, reforçando-se com o pai as técnicasde
utilizada como agente isolado em procedimentos
escovação realizadas pelo mesmo. Com o
curtos, que não exijam relaxamento
procedimento finalizado, o paciente foi dirigido a
musculoesquelético, costuma ser usada em crianças
sala de recuperação anestésica e posteriormente a
e em procedimentos cirúrgicos nos quais a
leito para ser acompanhado até o final do dia em que
manutenção do controle das vias aéreas é difícil. 16
recebeu alta após apresentar-se bem e ter se
Produz analgesia em 30 segundos de administração
alimentado (Figura 3.7).
e sua dose corresponde de 1 a 2mg/kg, injetados a
Dose e frequência de anestésico para evitar
uma velocidade de 0,5 mg/Kg/min. A amnésia
efeitos colaterais físicos ou sistêmicos produzida por ela costuma ser inferior aos
benzodiazepínicos, porém uma grande
Há diversos fármacos, com diferentes
desvantagem deste fármaco é a suacapacidade de
doses, que podem ser administrados para a obtenção
gerar alucinações e sonhosdesagradáveis no período
de uma sedação, em que cada um deles apresenta
de recuperação, principalmente quando
um resultado diferente, portanto são indicados
administrado em adultos. 16
individualmente para cada quadro clínico do
20
Oxido nitroso (N2O)
paciente. Dentre eles podemos citar os
benzodiazepínicos, que são agentes de indução da É um dos anestésicos inalatórios, que dentro
anestesia geral, os mais utilizados atualmente na dos existentes é o mais utilizado. Seu uso
odontologia hospitalar são: 16 proporciona além de uma boa capacidade de
Diazepam e midazolan controle, a potencialização de outros anestésicos,
mais fortes e capazes de produzir o estado de
Estes proporcionam perda gradual de
inconsciência, sendo assim possibilita um uso em
consciência, em que inicialmente entram em um
menor dose dos fármacos. 16
nível confortável de sedação, e então são
administrados novamente. 16 Porém em pacientes com deficiência

Propofol intelectual, a sedação com óxido nitroso é mais


complicada pois eles dificilmente toleram a
É um agente anestésico não barbitúrico,que
máscara. 21
atinge a anestesia geral de modo rápido e apresenta
Interação medicamentosa
curta duração, a dose indicada de acordo com
McCulloch e Lees é de 2,25 mg/Kg, em pacientes Assim como a maioria dos fármacos, os
mais jovens, já nos mais velhos é recomendada 1,5 anestésicos podem sofrer interação medicamentosa.
41

Os pacientes com deficiência são osprincipais alvos SNC. A sedação consciente com Óxido Nitroso é
da sedação profunda e. Anestésicos inalatórios largamente utilizada no tratamento de pacientes
como o Halotano, sensibilizam os receptores do pediátricos e apresenta poucos efeitos colaterais.
sistema cardiovascular a ação dos medicamentos Todavia, a sedação consciente somente funciona
simpatomiméticos e das catecolaminas. Além disso, bem naqueles pacientes que toleram procedimentos
os depressores do sistema respiratório causam mais longos e respiramtranquilamente pela máscara
broncodilatação, mas aumentam a vasoconstrição, administradora do anestésico. 2,3, 23
podendo causar hipóxia tecidual e crises
Cuidados pós-anestésicos/pós-
vasoclusivas em pacientes com hemoglobinopatias,
como a Anemia Falciforme. 22
Essas interações operatórios
medicamentosas ocorrem de forma branda e
Após a realização do procedimento os
normalmente podem ser revertidas com
pacientes passam por algumas etapas antes de terem
medicamentos antagonistas, como vasoconstritores
alta, para a segurança e garantia de bem-estar do
locais, por exemplo Fenilefrina e Adrenalina. 19 Por
mesmo. Com o fim do tratamento, quando os seus
fim, a associação entre os próprios medicamentos
movimentos respiratórios são considerados
utilizados durante os procedimentos ambulatoriais,
adequados, o anestesista succiona a faringe para
como os bloqueadores neuromusculares e
remover resíduos e o paciente é extubado. É então
medicação pré anestésica com os sedativos, deve
transferido para a ala da recuperação, onde sua
ser considerada. 19
pressão arterial, pulso, respiração e ECG
Sedação consciente em alternativa (eletrocardiograma) são monitorados, e recebe O2
(oxigênio) por vias nasais, até que seus sinais vitais
a anestesia geral
estejam estáveis (Figura 3.8). 16
A sedação consciente é uma alternativa
buscada por ter menor risco de mortalidade quando
comparada com a anestesia geral. Esse tipo de
sedação consiste no mecanismo de depressão do
Sistema Nervoso Central sem perda de consciência.
Normalmente, é melhor para procedimentos
odontológicos rápidos, como restaurações,
reabilitações protéticas e tratamentos periodontais.
2, 3, 23

O uso de Midazolan intranasal 0,1 mg/kg/h Figura 3.8 Paciente pós-procedimento no centro cirurgico sob
monitoramento. Imagem cedida gentilmente pela Prof. Dra.
se mostra bastante eficiente, porém é necessário um Yasmine Mendes Pupo e Prof. Dr. João Rodrigo Sarot.

tempo elevado de administração do medicamento Em alguns casos, de procedimentos mais


para efeito terapêutico. Sendo assim, omedicamento extensos, são utilizadas máscaras faciais de
pode se acumular por um tempo maior do que o borracha ou silicone, que cobrem a boca e o nariz
necessário e prolongar os efeitos depressores do do paciente, e são fornecidos O2, N2O e outros
42

anestésicos. São utilizados dispositivos para protetores serem reduzidos, ao deprimir


deslocar a língua da faringe, permitindo a progressivamente o SNC, e as vias aéreas podem ser
respiração, e são as vias orofaríngeas e obstruídas ou ocorrer um laringoespasmo se saliva,
nasofaríngeas, antes, durante e após o sangue ou fragmentos entrarem por al. Portanto é
procedimento. Há alguns fármacos utilizados que preciso mais atenção e cuidado dos profissionais, ao
necessitam de maior atenção após, como opióides passo que complicações podem ser evitadas
(morfina, meperidina por exemplo) que apresentam utilizando uma abordagem apropriada. 24

ação mais longa e pode desencadear uma Em pacientes vulneráveis e de maior risco
16
depressãorespiratória. algumas complicações podem ser geradas, como
aumento da pressão arterial e da frequência
cardíaca, devido ao aumento dos níveis de cortisol e
prolactina. Além disso pode ocorrer umadepressão
respiratória. 16
Os problemas decorrentes da anestesia
geral, como: hipotensão, taquicardia, bradicardia,
arritmias e depressão respiratória, são mais
frequentes do que os da sedação, dado que a
fisiologia do paciente é alterada mais
profundamente. E estes pacientes não podem
ingerir nada durante as 6h que antecedem o
Figura 3.9 Monitoramento dos sinais vitais durante o período
pós-anestésico e operatório. Imagem cedida gentilmente pela procedimento ou então pode levar a vômitos
Prof. Dra. Yasmine Mendes Pupo e Prof. Dr. João Rodrigo
Sarot. durante a indução anestésica ou à regurgitação
durante o procedimento, com a possibilidade de
Assim que o paciente estiver recuperado e
obstrução das vias aéreas ou de aspiração de vômito
seus níveis vitais adequados, ele é transferido para a
causando queimação traqueal e/ou infecção
ala cirúrgica, onde permanecerá até que o
pulmonar, e essa atenção é mais facilmente
profissional permita alta. 16
controlada quando o paciente está hospitalizado, já
Complicações e possíveis efeitos em ambiente ambulatorial, é mais complicado.

colaterais Portanto, a anestesia geral demonstra mais casos de


problemas pós-cirúrgicos do que a sedação. 16
Uma intervenção com sedação gera um
grande risco, pois a perda da consciência pode levar Atuação multiprofissional para
a mudanças na fisiologia do paciente, sendo
acompanhamento das condições
prejudiciais ao bem-estar do mesmo. Também
apresenta um maior risco, quando comparado aos sistêmicas
procedimentos comuns, pelo fato de seus reflexos
Assim como qualquer procedimento
43

cirúrgico, os procedimentos odontológicos sob houve colaboração prévia, cabe ao médico e ao


sedação necessitam de monitoramento. A equipe cirurgião-dentista a resolução de eventuais
operante na sala de cirurgia deve estar atenta aos ocorrências. 26 O monitoramento e estabilização
seguintes sinais:18 da pressão arterial com fármacos
vasoconstritores ou vasodilatadores é
 É necessário controle da dose total de sedativo
fundamental para garantir a segurança da saúde
administrado e do tempo, tanto de
do paciente e obter sucesso no procedimento
administração quanto de sedação. 18
realizado. 26
 Quanto a oxigenação dos tecidos, deve-se
sempre observar as cores da mucosa, da pele edo Acesso do cirurgião-dentista ao
sangue, garantindo que não haja isquemia ou ambiente hospitalar
hipóxia tecidual. 18 Em pacientes com Síndrome
de Down, a intubação traqueal édificultada pelo Nos casos em que o paciente necessita de
pescoço curto e anomalias músculo-dentárias. 10 atendimento de urgência/emergência ou
Portanto, deve-se prestaratenção especial a esse atendimento no consultório odontológico fica
paciente. O paciente com Angina de Ludwig impraticável pelo paciente não apresentar
possui maior risco de ocorrer obstrução das vias comportamento corroborativo, fica recomendado o
aéreas durante o procedimento, com risco de atendimento a nível hospitalar, com o paciente
morte iminente, exigindo monitoramento sedado sob anestesia geral para realização de todos
constante. Por fim, deve-se sempre observar a os procedimentos odontológicos. 27
ventilação do paciente e garantir que o mesmo
O Ministério da Saúde, por meio da Portaria
esteja respirando. 25
Nº 1.032 de 05/05/2010 incluiu procedimentos
18
 Quanto a circulação sanguínea, deve-se odontológicos para os pacientes com necessidades
observar se a pressão arterial e os batimentos especiais em ambiente hospitalar, sob sedação e/ou
cardíacos estão dentro dos padrões considerados anestesia geral, na Tabela de Procedimentos,
normais para aquele paciente. O médico Medicamentos, Órteses e Próteses e Materiais
cardiologista deve aferir a pressão arterial antes Especiais do SUS. Esse procedimento principal,
da indução, durante o procedimento e após 04.14.02.041-3, gera a emissão de Autorização de
finalização. É comum que haja redução da Internação Hospitalar (AIH) pelo Código Brasileiro
pressão arterial com eventual hipotensão após de Ocupação (CBO) do cirurgião- dentista, no qual
sedação com anestésicos gerais, fator que pode estão inseridos os materiais que devem ser
trazer preocupação quando se trata de um utilizados, os procedimentos que sãorealizados, os
paciente com problemas cardíacos. Claro, a profissionais de saúde envolvidos e a estrutura
colaboração do paciente para tomar as hospitalar. Por meio desta portaria, os hospitais e
medicações de forma consistente faz toda a profissionais que prestam serviço para o SUS
diferença nos potenciais sintomas durante a passam a receber repasse financeiro para realizar
cirurgia, mas já que não há como garantir que procedimentos odontológicos de atenção
44

Figura 3. 10 Formulário de Autorização de Internação Hospitalar (AIH) utilizado pelo SUS.


45

primária e atenção secundária em ambiente possam ser registrados e informados no SIH,


hospitalar, que inclui valor da anestesia. Torna-se independente do motivo que gerou a internação e
necessário registrar os procedimentos nos Sistemas mesmo que a AIH tenha sido preenchido por um
de Informações de Serviços de Saúde do Ministério médico. 28
da Saúde. 27

Assim, primeiramente irá ocorrer o


atendimento em uma Unidade Básica de Saúde
(UBS) ou Centro de Especialidades Odontológicas
(CEO), onde o profissional irá avaliar a necessidade
de indicação a Sedação ou Anestesia Geral. Então o
cirurgião-dentista encaminha via regulação do
município, emitindo o Laudo para Solicitação de
AIH, para a regulação do Hospital de Referência. 28
O formulário de AIH (Autorização de Internação Considerações finais
Dado o exposto, conclui-se que a inclusão
Hospitalar) utilizado no SUS está representado na
Figura 3.10. Entretanto, outros documentos oficiais de cirurgiões-dentistas no âmbito hospitalar é de
extrema importância para garantir a eficiência e
podem ser utilizados para encaminhamento de
acordo com cada município, como exemplificado humanização dos procedimentos odontológicos em

na imagem (Figura 3. 11). indivíduos não colaborativos, pacientes com


necessidades especiais ou que necessitam de
A Equipe de Odontologia para Pessoas com
atendimento de emergência ou de alta
Necessidades Especiais (OPNE) realiza a consulta
complexidade. Portanto, a multidisciplinaridade é
e solicita os exames pré-operatórios. Se necessário imprescindível na dinâmica hospitalar. Assim,
encaminha a outras especialidades médicas para profissionais de diversas áreas da saúde proporciona
realização de consulta. A equipe de OPNE agenda uma melhor qualidade de vida ao paciente, além de
a cirurgia e comunica à família do paciente. Por fim, diminuir o risco de infecções e outras complicações.
o paciente é internado, submetido à cirurgia, passa
Entretanto, para isso o cirurgião-dentista deve
pela recuperação, recebe alta hospitalar, é
apresentar conhecimento sobre os protocolos de
encaminhado para a UBS, CEO de origem ou ao
atuação com embasamento científico, realizando
ambulatório. 28
um diagnóstico e tratamento adequado,
No dia 26 de dezembro de 2013 o identificando a necessidade de anestesiageral não
Ministério da Saúde publicou uma Nota Técnica por facilidade, mas sim por eficiência e segurança,
(01/2014) possibilitando que todos os evitando expor os pacientes a riscos e
procedimentos odontológicos, não mais apenas os procedimentos invasivos ou traumáticos
realizados em Pacientes com Necessidades desnecessários.
Especiais, realizados em ambiente hospitalar
46

Figura 3.11 Formulário de uma Unidade Básica de Saúde em Curitiba/PR (UMS São Domingos PSF) solicitando atendimento
hospitalar em centro cirúrgico do Complexo Hospitalar de Clínicas.
47

Referências
1. Cavazana T, Wayama M, Aranega A, Ponzoni D, 12. Silva OI, Amaral RF, Cruz MP. A importância do
Garcia- Júnior I, Bassi A. Qual a importância da Odontologia Cirurgião-Dentista em ambiente hospialar. Rev Med de Minas
Hospitalar? Rev Odontol da UNESP. 2013 Jul; 41(Especial):23 Gerais. 2017 Nov; 27.

2. Galeotti A, Garret Bernardin A, D’Antò V, 13. Mattevi GS, Figueiredo D de R, Patrício ZM, Rath IB
Ferrazzano GF, Gentile T, Viarani V, et al. Inhalation da S. A participação do cirurgião-dentista em equipe de saúde
Conscious Sedation with Nitrous Oxide and Oxygen as multidisciplinar na atenção à saúde da criança no contexto
Alternative to General Anesthesia in Precooperative, Fearful, hospitalar. Ciência e Saúde Coletiva. 2011 Out; 16(10):4229–
and Disabled Pediatric Dental Patients: A Large Survey on 688 36.
Working Sessions. BioMed Research International. 2016 Set;
2016:1–6. 14. Ka B, Shamaskin R, Campbell Rl. Analysis of
preoperative laboratory values prior to outpatient dental
3. Corcuera-Flores JR, Delgado-Muñoz JM, Ruiz- anesthesia. 1987 Mar; 34(2):58–60.
Villandiego JC, Maura-Solivellas I, Machuca-Portillo G.
Dental treatment for handicapped patients; sedation vs general 15. Dock M. Pharmacologic Management of Patient
anesthesia and update of dental treatment in patients with Behavior. In: McDonald and Avery’s Dentistry for the Child
different diseases. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2014 Mar; and Adolescent. 9th ed. Philadelphia, PA: Mosby; 2011. 253–
19 (2):170-6. 276.

4. Chnabl D, Guarda A, Guarda M, von Spreckelsen 16. Malamed S. Sedação na Odontologia. 5ª ed; 2012
LMI, Riedmann M, Steiner R, et al. Dental treatment under [acesso em 30 abr 2021]. Disponível em:
general anesthesia in adults with special needs at the University https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788595156
Hospital of Dental Prosthetics and Restorative Dentistry of 562
Innsbruck, Austria: a retrospective study of 12 years. Clinical
17. Lima AR de A, Medeiros M, Costa LR. Mothers’
Oral Investigations. 2019 Mar 4;23(11):4157–62.
perceptions about pediatric dental sedation as an alternative to
5. Nascimento L, Galina F, Kluppel L, Scariot R, dental general anesthesia. RGO - Revista Gaúcha de
Rebellato N. Cirurgia ortognática para correção de Odontologia [Internet]. 2015 [cited 2021 Oct 29]; 63:153–60.
deformidade em maxila edêntula. Dens. 2011 Dez; 19(2). Available from:
https://www.scielo.br/j/rgo/a/mrw8BGBzCKwbMfXRwx9pn
6. Hiroyasu K, Nogami S, Daigo Y, Miyamoto I, SP/?lang=en
Hisashi I, Tanaka K, et al. Dento-alveolar reconstruction using
titanium mesh and bone grafting followed by dental implants 18. Guidelines for the use of sedation and general
placement for malunion and malocclusion after a maxillo- anesthesia by dentists. American Dental Association [Internet].
mandibular fracture. Journal of Oral and Maxillofacial Surgery, 2016 Out. Disponível em:
Medicine, and Pathology. 2020 Set 1; 32(5):370–6. https://www.ada.org/~/media/ADA/Education%20and%20Car
eers/Files/anesthesia_use_guidelines.pdf
7. Glassman P, Caputo A, Dougherty N, Lyons R,
Messieha Z, Miller C, et al. Special Care Dentistry Association 19. Howland, R. D.; Mycek, M. J. Farmacologia
consensus statement on sedation, anesthesia, and alternative Ilustrada. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2008.
techniques for people with special needs. Special Care in
20. Wiemer SJ, Nathan J, Heggestad BT, W. Jonathan
Dentistry. 2009 Jan; 29(1):2–8.
Fillmore, Viozzi CF, Van JM, et al. Safety of Outpatient
8. Weddell JA, Jones JE. Hospital dental services for Procedural Sedation Administered by Oral and Maxillofacial
children and the use of general anesthesia. In: Mc Donald and Surgeons: The Mayo Clinic Experience in 17,634 Sedations
Avery’s Dentistry for the Child and Adolescent. 9th ed. (2004 to 2019). Journal of Oral and Maxillofacial Surgery.
Philadelphia, PA: Mosby; 2011. 277-295. 2021 Mai 1; 79(5):990–9.

9. Hutchinson S. General anaesthesia for dentistry. 21. Silva CC, Lavado C, Areias C, Mourão J, Andrade D
Anaesthesia and Intensive Care Medicine. 2020 Set; 21: 467– de. Conscious sedation vs general anesthesia in pediatric
70. dentistry - a review. Medical Express. 2015 Fev; 2(1).

10. Andrade APP de, Eleutéio AS de LE. Pacientes 22. Lobo C, Marra VN, Silva RMG. Crises dolorosas na
portadores de necessidades especiais: abordagem odontológica doença falciforme. Revista Brasileira de Hematologia e
e anestesia geral. Revista Brasileira de Odontologia [Internet]. Hemoterapia. 2007 Set; 29(3).
2016 Jan 4 [cited 2022 Jan 9]; 72(1/2):66.
23. Lim GXD, Boyle CA. Conscious sedation service for
11. Pinto VG. Saúde bucal coletiva. São Paulo: Santos geriatric and special-care dentistry: A health policy brief.
editora; 2011. Proceedings of Singapore Healthcare [Internet]. 2020 Fev 14;
29(2):126–38. Disponível em:
https://journals.sagepub.com/doi/full/10.1177/2010105820903
762
48

24. Akpinar H. Evaluation of general anesthesia and 27. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria Nº 1.032/GM de
sedation during dental treatment in patients with special needs: 05 de maio de 2010 - Tratamento Odontológico para Pacientes
A retrospective study. J Dent Anesth Pain Med. 2019 Ago; com Necessidades Especiais. Acesso em 02 de maio de 2021.
19(4):191. Disponível em:
http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/notas_tecnicas/nt_p
25. El-Mowafy A, Yarascavitch C, Haji H, Quiñonez C, ortaria_tratamento_pne.pdf
Haas DA. Mortality and Morbidity in Office-Based General
Anesthesia for Dentistry in Ontario. Anesthesia Progress 28- Comissão de Odontologia Hospitalar CRO-TO. Manual de
[Internet]. 2019 [citado 2021 Set 20]; 66(3):141–50. Disponível Odontologia Hospitalar-Ebook. 1.ed, Tocantins, 2020. Acesso
em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31545669/ em 02 de maio de 2021.
Disponível em: https://website.cfo.org.br/wp-
26. van Klei WA, van Waes JAR, Pasma W, Kappen TH, content/uploads/2020/11/MANUAL-DE-ODONOLOGIA-
van Wolfswinkel L, Peelen LM, et al. Relationship Between HOSPITALAR-CRO-TO-70p.pdf
Preoperative Evaluation Blood Pressure and Preinduction
Blood Pressure. Anesthesia & Analgesia. 2017 Fev;
124(2):431–7.
4
A IMPORTÂNCIA DA ODONTOLOGIA MINIMAMENTE INVASIVA PARA O
CONTROLE DA DOENÇA CÁRIE EM PESSOAS COM DEFICIÊNCIA COM ÊNFASE
NO TRATAMENTO RESTAURADOR ATRAUMÁTICO
Ana Cláudia Rodrigues Chibinski | Denise Stadler Wambier | Márcia Baldani | Mayara Vitorino Gevert |
Yasmine Mendes Pupo | Carolina Duarte de Macedo | Izabellen T.A. kozowski | Larissa M. Olkuszewski de
Carvalho

Introdução
A cárie dentária é considerada atualmente perdidos e obturados >10). PDs encontram
uma disbiose, mediada por biofilme, modulada pela dificuldades no acesso a uma saúde pública de
dieta e de natureza multifatorial.1 É a doença mais qualidade voltada a tratamento e prevenção de
prevalente no mundo, sendo considerada um doenças bucais, devido à escassez de profissionais
problema de saúde pública. 2,3
Nas Pessoas com capacitados ao atendimento dessa parcela da
Deficiência (PDs) foi verificado uma prevalência de população, além da infraestrutura inadequada.4,5
68,1% de acometimento pela cárie em um grupo de Com a maior aceitação do Tratamento Restaurador
1 a 70 anos (81 prontuários avaliados) e em outro Atraumático, popularmente conhecido pela sigla

estudo na faixa etária de 12 a 25 anos, (44,7%) ART, surgiu uma possibilidade de, gradativamente,
apresentaram alto índice de cárie dentária (cariados, se reverter esse quadro. Reconhecido pela
50

abordagem simples e minimamente invasiva, o longo dos anos e, hoje em dia, é uma prática comum
ART apresenta uma aceitação notável entre os no atendimento odontológico público e privado em
pacientes pediátricos com necessidades especiais. A diversos países ao redor do mundo.
técnica simples, sem uso de anestesia e alta rotação A adesão dos profissionais ao ART cresceu
é considerada menos agressiva e contribui para uma juntamente com o melhor entendimento da
adaptação comportamental do paciente. 32, 42, 43 Odontologia Minimamente Invasiva, valorizando
procedimentos que privilegiam a remineralização
O ART faz parte dos protocolos da
da estrutura dentária, manutenção da vitalidade
Odontologia Minimamente Invasiva e possui um
pulpar, adequado selamento da restauração,
enfoque preventivo e terapêutico em relação à
evitando dor, medo e ansiedade do paciente.10
5,6
doença cárie. Foi desenvolvido há quase 30 anos,
Sendo assim, o ART é considerado um
quando um grupo de pesquisadores buscou uma
procedimento “amigo” do paciente, sendo uma
estratégia capaz de oferecer atendimento
técnica bem aceita por pacientes não cooperativos,
odontológico a comunidades carentes numa região
crianças, idosos e pessoas com necessidades
africana. Sem poder contar com consultórios
especiais. A viabilidade do método, que possibilita
odontológicos, em função da ausência de luz
a execução do ART em diversos ambientes,também
elétrica e água encanada, os pesquisadores
o torna ideal para o tratamento de pacientesque não
desenvolveram uma modalidade de tratamento que
se habituam facilmente ao consultório
associa a remoção seletiva de tecido cariado com 22,44
odontológico. Assim, quando o procedimento é
instrumentos cortantes manuais ao selamento
realizado em um ambiente conhecido ou
cavitário com cimento de ionômero de vidro de alta
regularmente frequentado pelo PDs as sensações de
viscosidade.6,7 Associado às restaurações
medo e ansiedade, potencialmente desencadeadas
atraumáticas, o protocolo ART também propõe o
pelo tratamento, diminuem. O reconhecimento do
uso dos selantes ART e procedimentos preventivos
espaço oferece conforto ao paciente pediátrico, o
e educativos, como fluorterapia e educação em
tranquilizando e melhorando significativamente a
saúde bucal. Desta forma, o controle da doença
experiência do tratamento odontológico. 22
6,7
cárie é obtido.
Considerando que a abertura da cavidade e a
Ao longo do tempo, diferentes estudos
remoção seletiva do tecido cariado é feita somente
clínicos se preocuparam em verificar a efetividade
com instrumentos manuais, o ART é um
das restaurações e selantes ART. Revisões
procedimento silencioso. Desse modo, previne-se o
sistemáticas recentes sobre o assunto relataram
estímulo negativo pelo uso de instrumentos
efeito preventivo significativo do selante ART e
rotatórios que produzem ruídos sonoros e vibrações
excelente longevidade das restaurações ART tanto
desagradáveis às crianças com algum tipo de
em dentes decíduos como em permanentes. 8,9 Desta
deficiência.5,42,45 Em muitos casos, como em
forma, a estratégia ART, que inicialmente foi
alterações neurológicas que propiciam reações de
concebida para o uso em comunidades carentes,
espasmos ou dificuldades no controle da
ultrapassou as barreiras geográficas e sociais ao
musculatura oral, a poluição sonora do ambiente
51

clínico apresenta-se como fator de ansiedade a esses


pacientes, que carecem de um atendimento mais
calmo e sem ruídos excessivos, proporcionando
mais segurança e uma experiência tranquila tanto
para o PDs quanto para o profissional cirurgião-
dentista.5,31 Portanto, este capítulo tem como
objetivo apresentar o ART como uma estratégia
para o tratamento da doença cárie em pessoas com
deficiência.

Remoção seletiva de dentina


cariada: a base das restaurações
atraumáticas

A introdução da Odontologia Minimamente


Invasiva e, particularmente da técnica de
restaurações atraumáticas, modificou alguns
conceitos da cariologia, deixando de lado a
necessidade de remoção completa da dentina
cariada.11 Desta forma, preconiza-se a remoção da
dentina mais externa da lesão, que apresenta-se
desorganizada e com alta carga bacteriana,
mantendo-se na cavidade a dentina mais interna,
que tem capacidade de remineralização por meio da
Figura 4.1 Características da dentina afetada e da dentina
capacidade reacional do complexo dentino-pulpar infectada. Imagem cedida gentilmente pela Profa. Dra. Ana
Cláudia Rodrigues Chibinski (Universidade Estadual de
(Figura 4.1). Ao longo do tempo, a dentina afetada Ponta Grossa).
mantida na cavidade abaixo da restauração se
reorganiza, com ausência de contaminação (ICCC), a remoção seletiva até dentina firme deve
bacteriana, aumento do conteúdo mineral, aumento ser feita em cavidades de profundidade média,
de dureza e redução de diâmetro de túbulos enquanto a remoção em dentina amolecida deve ser
dentinários, ou seja, com características preconizada em cavidades muito profundas.13 Em
compatíveis com uma dentina saudável. 12 ambas as situações, as paredes circundantes e bordo
A quantidade de tecido cariado que deve ser cavo-superficial da cavidade preparada devem estar
removido depende da profundidade da lesão e do livres de tecido cariado para garantirem o selamento
risco de exposição pulpar. De acordo com o adequado da restauração. 14
International Caries Consensus Collaboration
52

Portanto, a adoção da remoção seletiva


além de favorecer o reparo fisiológico do dente,
diminui possíveis exposições pulpares
15
principalmente em cavidades profundas. A
restauração atraumática, neste contexto, é
considerada um tratamento definitivo, sem
necessidade de reabertura da restauração, como
preconizado anteriormente no protocolo de
proteção pulpar indireta.

Figura 4.2 Indicações e contra-indicações das restaurações atraumáticas (RAs). Imagens cedidas gentilmente pela Profa. Dra. Ana
Cláudia Rodrigues Chibinski (Universidade Estadual de Ponta Grossa).
53

Baseado em estudos de longevidade de RAs, cavidades de uma Restaurações ocluso-proximais tem menores taxas de
face podem ser restauradas com segurança, tanto em dentes longevidade, particularmente em dentes permanentes. A
decíduos quanto permanentes, com longevidade similar a longevidade das restaurações está inversamente relacionada com
restaurações convencionais. o tamanho da cavidade, ou seja, restaurações amplas tendem a
ter menor longevidade.
Figura 4.3 Longevidade das restaurações.

2 dentina, seja por cultura microbiológica, seja por


O que acontece com a dentina
microfotografias. Portanto, o processo carioso é
cariada mantida na cavidade do paralisado, permitindo a ação de defesa do
complexo dentino-pulpar.
ponto biológico?
A dentina
Os microrganismos
Inicial 60 dias
Ao isolarmos o tecido cariado do meio
bucal, eliminamos o contato entre microorganismos
e biofilme dental.

A consequência é a falta de nutrientes para


os microrganismos, que perdem sua capacidade de
produzir polissacarídeos extracelulares e ácidos. Ao
longo do tempo, também não terão mais energia
suficiente para se multiplicarem.
Evidências científicas têm demonstrado
Figura 4.4 Em A e C, observamos grande quantidade de
que, alguns meses após a restauração atraumática, bactérias Gram positivas (marcadas em roxo) nos túbulos
não são mais detectados microrganismos na dentinários. Sessenta dia após a restauração atraumática, já
é possível detectar uma redução significativa no número de
microrganismos, com grande número de túbulos livres de
bactérias.
54

Após restauração atraumática, a dentina estudo europeu comprovou que o medo de ir ao


desmineralizada e desorganizada inicia seu dentista é o quarto medo mais comum na população,
processo de reorganização graças ao complexo perdendo apenas para o medo de cobras, altura e
16
dentino-pulpar. lesões físicas. A apreensão diante do
procedimento odontológico, porém, também pode
O conteúdo de cálcio, fósforo e flúor
estar associado à dor e ao desconforto, provocados
aumenta, resultando em uma dentina intertubular
pela excitação das terminações nervosas sensíveis
mais compacta e rede de fibras colágenas mais
durante a realização de procedimentos mais
densas. O diâmetro dos túbulos dentinários é
invasivos, com uso de agulhas em anestesias locais
reduzido, confirmando o processo de
e de brocas de alta rotação para aberturas
remineralização.
coronárias, por exemplo. 16,17 O ART, neste quesito,
Ao longo do tempo, todo processo, até mostra-se mais vantajoso para os pacientes, visto
agora só observado em microscopia, torna-se que a técnica utiliza apenas instrumentos manuais,
evidente pelo aumento de radiopacidade ou seja, não há ruídos advindos de turbinas de alta
radiográfica identificada na parede pulpar. rotação e raramente faz-se uso de anestésicos locais
A
A B
durante a abertura e preparo das cavidades.5 A
possibilidade de tratamento sem o uso de
anestésicos é benéfica também para pacientes com
distúrbios sistêmicos.17 Isso reduz de forma
significativa o risco de intercorrências relacionadas
Figura 4.5 Em A, dentina cariada antes da restauração
atraumática. Em B, redução de microorganismos, melhor
às complicações secundárias a nível local e/ou
organização tecidual, remineralização. sistêmico.17 A técnica tem ainda a vantagem de
utilizar o cimento de ionômero de vidro (CIV), que
A B
é um material bioativo, capaz de realizar trocas
iônicas com o substrato, contribuindo para o
controle de lesões de cárie secundárias e com o meio

Figura 4.6 A. radiografia imediatamente após realização de bucal, participando no processo DES-RE. Tais
restauração atraumática; B. imagem radiopaca na parede
pulpar após 9 meses.
características são muito importantes,
considerando-se que a doença cárie apresenta
ART e pessoas com deficiência
elevada prevalência nesses pacientes.17
Pessoas com deficiência, em sua grande Outro problema enfrentado por este grupo
maioria, têm algum grau de medo e ansiedade é a dificuldade de cooperação frente ao tratamento
relacionados aos procedimentos odontológicos.Este odontológico.4 A falta de cooperação impõe
receio é uma reação emocional provocada pelo barreiras extras a serem vencidas pelo profissional
consciente diante de um estímulo de ameaça ou de durante a realização de qualquer procedimento,
perigo e não está restrito apenas aos (PDs).16 Um particularmente procedimentos restauradores.
55

Devido à percepção de estímulos dolorosos, convencionais, o que facilita o acesso ao tratamento


luminosos, ruídos e/ou vibração dos instrumentos, odontológico e o torna ideal para o tratamento de
entretanto, algumas pessoas, incluindo os com pacientes com fobias ao ambiente odontológico. 22,44
deficiência, apresentam resistência ao Assim, quando o procedimento é realizado em um
atendimento.4 Também podem ser causas da local conhecido ou regularmente frequentado pelo
resistência as experiências negativas anteriores, PDs, as sensações de medo e ansiedade,
que acabam por desencadear crises de ansiedade potencialmente desencadeadas pelo tratamento,
durante o atendimento odontológico, podendo diminuem. O reconhecimento do espaço oferece
colocar em risco a segurança do paciente, bem conforto ao paciente pediátrico, o tranquilizando e
como dos demais profissionais envolvidos.4,18 melhorando significativamente a experiência do
Além disso, PDs podem apresentar coordenação tratamento odontológico.22
motora prejudicada, hipotonia muscular e
Diante do exposto, quando comparada à
sialorréia.4,18 Todos esses fatores podem afetar o
técnica restauradora convencional, o ART
sucesso do tratamento restaurador convencional,
configura-se como uma técnica adequada para
que envolve anestesia local, uso de alta e baixa
realização de procedimentos odontológicos em
rotação, isolamento absoluto e requer um período
PDs, devido a suas inúmeras vantagens e
relativamente longo de tempo clínico de cadeira.19
possibilidades de adaptação às necessidades de cada
Além disso, esses procedimentos normalmente são 5
indivíduo. A técnica é realizada com isolamento
realizados com resinas fotopolimerizáveis, o que
relativo, o que, além de diminuir o tempo clínico,
dificulta o atendimento de pessoas com Transtorno
otimizando a consulta, é uma alternativa aos
do Espectro Autista (TEA), que são sensíveis à luz
pacientes alérgicos ao látex, necessário no
azul, com potencial para desencadeamento da 5,17
isolamento absoluto. Além disso, devido à
ansiedade.4,18
utilização de instrumentos manuais, é possível que
Em algumas situações, o controle de todos o cirurgião-dentista realize o atendimento fora do
os fatores envolvidos para a realização do ambiente odontológico.5,17 Por isso, pacientes
tratamento odontológico só pode ser alcançado com acamados, com dificuldade ou incapacidade de
o uso de sedação medicamentosa, sedação inalatória locomoção têm acesso ao atendimento sem
com óxido nitroso e oxigênio ou até mesmo prejuízos.17
anestesia geral (temas abordados em outros
O ART é indicado ainda para pacientes com
capítulos deste livro). Tais opções, entretanto,
problemas de hemostasia, visto que dificilmente vai
apresentam um custo relativamente alto, poucos
desencadear sangramento. Quando, entretanto, há
profissionais habilitados e risco de morbidade, o
necessidade de utilização de cunhas e matrizes
que dificulta o acesso dos pacientes a esta
metálicas, é importante um cuidado maior nos
modalidade de tratamento. 4
pacientes com esses problemas e ainda, indicado
Outra vantagem é que o ART pode ser que seja feita a profilaxia antibiótica previamente à
realizado fora dos consultórios odontológicos realização do procedimento no caso de pacientes
56

com risco potencial de desenvolvimento de deficiência e, por isso, o conhecimento técnico-


bacteremias. 17 científico é importante para prever possíveis
ocorrências durante a execução do tratamento
Pacientes com Epidermólise Bolhosa são
proposto.6 A avaliação clínica do paciente consiste
grandes beneficiados do ART, também devido à
basicamente em uma entrevista recordatória a
não utilização de anestésicos locais. A condição
respeito de doenças, alergias, uso de medicação
consiste em uma doença genética, caracterizada
contínua, hábitos nutricionais e de higiene bucal.
pela formação de bolhas ou vesículas na pele ou em
Com a coleta dessas informações o cirurgião-
mucosas. As agulhas, utilizadas nas técnicas de
dentista é capaz de elaborar um plano de tratamento
anestesias locais podem causar injúrias aos tecidos
que não interfira nas condições sistêmicas do
bucais, levando à formação dessas bolhas e
paciente, diminuindo as chances de agravo de
provocando o agravamento das lesões. 17
doenças pré existentes.20 Da mesma forma, é
Pacientes insulino dependentes, como os necessário identificar a capacidade de cooperação
portadores de Diabetes Mellitus tipo 1, têm do paciente, uma vez que ainda que a ART seja uma
indicação ao uso do ART. Devido à diminuição do técnica simples, ela necessidade um certo grau de
fluxo salivar causada pela doença, o sistema tampão cooperação por um determinado espaço de tempo a
é afetado, dificultando o processo de fim de que todas as etapas do protocolo restaurador
remineralização dental e aumentando a sejam executadas adequadamente e o resultado final
suscetibilidade à cárie. Dessa forma, a presença de alcance o êxito esperado.2,6,20
um material bioativo na cavidade bucal,
Outra questão importante é deixar claro
possibilitada por meio do tratamento com CIV, é
para o paciente e seu núcleo familiar/cuidadores que
benéfica a estes pacientes. 17
o procedimento restaurador ou selante ART é
Importância da anamnese e apenas uma etapa de um tratamento mais

orientação abrangente, que envolve reeducação e readequação


de hábitos de higiene bucal e dieta. É fundamental
O tratamento restaurador atraumático esclarecer que eles serão co-responsáveis para se
(ART) é uma técnica simples e de baixo custo atingir o objetivo final de um tratamento efetivo e
operacional, mas requer conhecimentos específicos, duradouro. 21
particularmente no que diz respeito às condições
É preciso que os familiares incluam as
sistêmicas do paciente, ao diagnóstico do dente e
instruções dadas pelo CD nas atividades de rotina
remoção seletiva de tecido cariado.2
diária de todos, uma vez que as crianças se inspiram
Inicialmente, o cirurgião-dentista precisa e se espelham nos indivíduos que convivem. Além
realizar uma anamnese detalhada a fim de avaliar a do mais, isso contribui para a independência do PDs
possibilidade ou não de utilização da técnica no no processo de educação à saúde bucal e inserção
paciente em questão.2 Pessoas com deficiências de hábitos adequados em seu dia a dia.22 Por isso, é
podem apresentar comorbidades associadas à sua essencial que se tenha o envolvimento familiar no
57

planejamento e na execução das atividades higiene bucal dos PDs.


educacionais, evitando, assim, a possibilidade de
Já em relação ao dente, é fundamental o
intervenções futuras, e até mais invasivas, devido a
diagnóstico da condição pulpar. Se houver qualquer
recidivas ou novas lesões de cárie.22
sinal de alterações inflamatórias irreversíveis ou
A escovação dental com dentifrícios
necrose pulpar, as restaurações atraumáticas não
fluoretados (com concentração de pelo menos 1000
podem ser realizadas. Esta etapa envolve algum
ppm de flúor) é parte integrante do tratamento,
grau de dificuldade quando se trata de PDs, uma vez
mantendo o flúor no meio bucal constantemente em
que nem sempre estes serão capazes de se
baixas concentrações, o que auxilia no controle da
comunicar com o cirurgião-dentista com clareza e
desmineralização dentária em conjunto com a
oferecer todas as informações necessárias para o
remoção mecânica e sistemática do biofilme por
diagnóstico pulpar. Portanto, deve-se associar as
meio da escova dental.21 Hábitos adequados de
informações oferecidas pelos pacientes e seus
higiene bucal vão contribuir não apenas para o
responsáveis/cuidadores aos dados clínicos e
controle da doença cárie como também para o
radiográficos observados durante o exame bucal.
controle de doenças periodontais.21,22
Havendo dúvidas sobre o diagnóstico pulpar, a
Ainda que haja orientação suficiente, sabe- restauração atraumática não deve ser realizada, da
se que a higiene bucal dos PDs se apresenta, de mesma forma como não seria realizada uma
forma geral, bastante deficiente, principalmente restauração convencional. 21,22
devido ao fato de que essas pessoas tendem a
Indicações do ART em pacientes com
apresentar uma abertura bucal reduzida,
comprometimento na coordenação motora, deficiência
alterações psicológicas, além de, muitas vezes,
A técnica ART é formada por dois
fazerem uso crônico de medicação com influência
componentes: a restauração atraumática e o selante
na redução do fluxo salivar.23 Essas dificuldades
ART. Portanto, a restauração previne a progressão
resultam na alta prevalência de cárie, gengivite e
das lesões cariosas quando há cavidades com
periodontite nessas pessoas. E, diante das barreiras
envolvimento em dentina e o selante ART previne o
impostas, é de suma importância que o dentista,
desenvolvimento ou progressão de lesões em
juntamente com os responsáveis e o paciente,
fóssulas e fissuras.
encontre dispositivos que auxiliem no processo de
A restauração atraumática está indicada
cuidado bucal diário, visando a diminuição da
para dentes decíduos ou permanentes com
ocorrência de futuras intervenções, além de
cavidades oclusais ou oclusoproximais 30,31 e dentes
prevenção da cárie dentária e/ou outras doenças
anteriores com cavidades de classe III não
bucais e possibilidade de maior longevidade nos
transfixantes (se destacam por serem cavidades
tratamentos realizados.23Por isso, ao final deste
retentivas e, assim, apresentarem ótimos índices de
capítulo dedicaremos uma parte para falar sobre
longevidade)30-32 e classe V em dentes anteriores e
algumas dicas clínicas que facilitam a correta
58

posteriores.30 A abordagem terá longevidade 1. Instrumentais/materiais necessários


reduzida em cavidades oclusoproximais tanto de
dentes decíduos como permanentes. 33
e não está Os instrumentais utilizados nesta técnica são:

indicada para restaurações de classe IV. Recentemente, foi lançado no mercado


odontológico um outro instrumental que faz parte
Já os selantes, são associados às
do kit ART (Figura 4.7) denominado Opener.
restaurações atraumáticas quando há fissuras
Trata-se de um instrumento desenhado
adjacentes às cavidades restauradas ou em
especificamente para ampliação das cavidades,
cicatrículas e fissuras profundas em dentes decíduos
quando a abertura existente impossibilita o acesso
e permanentes. Uma das situações clínicas com a
das colheres de dentina para remoção seletiva do
indicação mais precisa dos selantes ART são dentes
tecido cariado. Tem um formato de pirâmide,
recém-irrompidos devido à maior suscetibilidade à
diamantado em todas as faces e deve ser usado
cárie, principalmente primeiros molares
fazendo-se movimentos circulares para ampliação
5
permanentes , mas podem ser utilizados em
da abertura da cavidade em esmalte. Todavia, este
segundos e terceiros molares permanentes em
instrumental pode ser substituído por machados ou
erupção.
enxadas para esmalte.
Os selantes ART, desde que sejam
Placas de vidro ou blocos de espatulação
realizados com CIV de alta viscosidade, possuem
são utilizados para depósito e manipulação do CIV.
efeito preventivo similar aos selantes resinosos, mas
com uma técnica menos sensível à umidade.29
Espelho bucal Nº5
Protocolo técnica restauração
Sonda exploradora padrão OMS
atraumática
Pinça clínica
Abordaremos o passo a passo do protocolo
da técnica restauradora atraumática, essetratamento Machado de esmalte ou enxada

tem como ênfase a mínima intervenção e máxima Colheres de dentina


preservação dos tecidos dentais. Antes de iniciar a (tamanhos variados)
técnica do ART, é importante que o CD realize a
Espátula para manipulação CIV
separação e esterilização de alguns os
instrumentais. No quadro abaixo encontram-se os Espátula de inserção
principais materiais clínicos que serão utilizados.
Figura 4.7 Instrumentais utilizados na técnica restauradora
atraumática. Imagens cedidas gentilmente pela Profa. Dra.
Ana Cláudia Rodrigues Chibinski (Universidade Estadual de
Ponta Grossa).
59

Escavador ART Duflex 1 Escavador ART Duflax 2 e 3

Indicado para criar retenção mecânica, principalmente para Indicado para remoção de tecido cariado amolecido.
cavidades expulsivas.

Alargador ART Duflex Opner ART Duflex

Indicado para remover esmalte desapoiado. Indicado para abrir e aumentar as cavidades para penetração
dos escavadores.

Esculpidor removedor ART Duflex Disponível em cabo azul

Indicado para levar o CIV até a cavidade e para esculpir a


restauração. Cabo de alumínio anodizado com 9,52mm de espessura.
Figura 4.8 Kit de instrumentos indicado para técnica de Tratamento Restaurador Atraumatico (ART) desenvolvido e fabricado
exclusivamente pela SSWhite Duflex.

necessários potes dappen, cunhas, tiras de matriz


metálica, gaze, vaselina, papel articulador.5

O material restaurador deve ser o cimento


de ionômero de vidro de alta viscosidade, o qual
apresenta maior proporção pó-líquido, tempo de
presa reduzido e maior resistência ao desgaste. Este
pode ser precedido por um agente condicionador
dentinário (ácido poliacrílico).5

O material restaurador deve ser o cimento


de ionômero de vidro de alta viscosidade, o qual
apresenta maior proporção pó-líquido, tempo de
presa reduzido e maior resistência ao desgaste. Este
Figura 4.9 Rolos de algodão, bolinhas de algodão, tiras de pode ser precedido por um agente condicionador
matriz, cunhas, potes dappen, bloco para espatulação,
microbrush e vaselina. Imagem cedida gentilmente pela Profa. dentinário (ácido poliacrílico).5
Dra. Ana Cláudia Rodrigues Chibinski (Universidade Estadual
de Ponta Grossa).
2. Limpeza do dente

Além disso, roletes e bolinhas de algodão Antes de iniciar o preparo da cavidade, a


são indicados para fazer a secagem da cavidade superfície do dente que receberá a restauração deve
durante o isolamento relativo.5 Além disso, são ser limpa com bolinhas de algodão umedecidas em
60

Figura 4.10 Exemplos de marcas comerciais de cimentos de ionômero de vidro de alta viscosidade.

água filtrada ou fervida, por meio de escovação A fim de evitar possíveis exposições
dentária ou profilaxia dentária em consultório, pulpares em cavidades mais profundas, a remoção
sendo essa realizada com escova de Robinson e seletiva do tecido cariado deve priorizar as paredes
Pedra-pomes. O objetivo é a remoção do biofilme circundantes da cavidade, seguida pela remoção
ali depositado completa do tecido cariado na junção amelo-
dentinária e no bordo cavo superficial da cavidade.
3. Preparo cavitário
Em situações onde a dentina cariada não
O preparo cavitário fundamenta-se na está acessível, remove-se o esmalte com
remoçãoda dentina cariada com colheres de dentina instrumentos cortantes manuais como machados ou
de tamanho compatível com a lesão de cárie como o opener. Apesar de não fazer parte do protocolo
observado na (Figura 4.11), seguindo os princípios ART, se o procedimento é realizado em consultório
descritos no tópico sobre a remoção seletiva de odontológico, a abertura da cavidade pode ser
tecido cariado deste capítulo. realizada com brocas carbide em alta rotação.
Quanto de tecido cariado deve ser removido durante o preparo Independente da forma como a abertura é realizada,
cavitário? a remoção da dentina cariada é feita com colheres

No ART, há a remoção parcial do tecido de dentina.

cariado, aquele que não é mais passível de 4. A inserção do material restaurador


remineralização: a dentina infectada. “Dentina com
Após a finalização do preparo cavitário e
consistência coureácea, removida em lascas e que
posterior remoção da lama dentinária, a cavidade
oferece maior resistência ao instrumento é um
deve ser condicionada com condicionador
dentinário (ácido poliacrílico) por 10 a 15 segundos,
seguida pela lavagem e secagem da cavidade. Esta
etapa visa melhorar a interação química do CIV
com a estrutura dentária.

Figura 4.11 Remoção seletiva da dentina cariada com


critério clínico
colheres de confiável para limitar a remoção da
dentina.
Em caso de restauração de cavidades de
dentina cariada”.
múltiplas superfícies, é necessário a adaptação de
61

matriz metálica e cunha. ponto de fio; a inserção na cavidade deve ser feita

A manipulação do cimento de ionômero de enquanto há brilho na superfície do material

vidro deve obedecer às instruções do fabricante, restaurador com uma espátula para inserção.

mantendo a proporção pó-líquida definida na bula Alternativamente, pode-se utilizar CIVs

do produto. O pó deve ser aglutinado ao líquido em encapsulados e inserir o material na cavidade com

etapas até obtenção de uma massa homogênea em seringa.

Manipulação do cimento de ionômero de vidro

Figura 4.12 Manipulação do CIV. Imagens cedida gentilmente pela Profa. Dra. Ana Cláudia Rodrigues Chibinski (Universidade
Estadual de Ponta Grossa).

Para facilitar a adaptação do CIV ao dente e ocorra contaminação do material com a saliva,
reduzir a incorporação de bolhas de ar, em aproveitando esse momento para levar o CIV para
cavidades posteriores é realizado um procedimento as fóssulas e fissuras adjacentes. Desta forma, o
denominado “pressão digital” após inserção do dente receberá a associação restauração e selante
material, que consiste em fazer uma pressão na ART.
restauração com o dedo indicador enluvado e
vaselinado por 10 a 30 segundos ou até que o CIV
sofra processo de gelificação evitando assim que
62

Sequência restauradora

Figura 4.13 Sequência restauradora. Imagens cedida gentilmente pela Profa. Dra. Ana Cláudia Rodrigues Chibinski (Universidade
Estadual de Ponta Grossa).

5. Remoção dos excessos ajuste seja feito com tiras de polimento e fio
dental.24
Para remover os excessos de CIV, pode-se
24 Orientações
utilizar hollemback ou uma cureta afiada. Vale
lembrar que todo procedimento deve ser realizado Não mastigar por 1 hora. Alimentação
sob isolamento relativo. pastosa por 24 horas. 24
6. Proteção do cimento de ionômero de vidro
Cimento de ionômero de vidro: o que
Finalizada a restauração, o CIV deve ser saber sobre o material de eleição
protegido contra sinérese e embebição até que o
para técnica do art ?
processo de gelificação se processe. Para este
procedimento, utiliza-se a vaselina, que é o material O Cimento de Ionômero de Vidro (CIV) de

originalmente indicado no protocolo das alta viscosidade é o material preconizado pelos

restaurações atraumáticas. pesquisadores e profissionais para realização de


restaurações atraumáticas.5 Todavia, qualquer
7. Checagem da oclusão
material adesivo pode ser utilizado para realização
Quando necessário pode se utilizar de papel das restaurações, que serão consideradas
carbono, para fazer a checagem da oclusão. Já nas atraumáticas sempre que se utilizarem de remoção
regiões interproximais recomenda-se que esse seletiva de tecido cariado com instrumentos
63

manuais, seguindo o protocolo já descrito neste diferenciar entre os GICs anteriormente produzidos
capítulo.5 e uma nova geração de GICs que tenham
demonstrado bom desempenhoclínico. No entanto,
Uma revisão sistemática das propriedades
não existe uma definição precisa de um GIC de alta
mecânicas e ópticas de GICs convencionais de
viscosidade, tornando a tarefa de selecionar um
estudos laboratoriais não foi capaz de comparar os
material específico muito difícil. O os chamados
resultados devido à falta de métodos padronizados
GIC de "alta viscosidade" são geralmente aqueles
entre eles. Estes resultados confirmaram
com uma relação P:L >3.6:1 mas não há consenso
observações anteriores e suscitaram uma equipa de
sobre a proporção mínima P:Lpara GICs capazes de
investigadores do Brasil e Inglaterra, a realizarem
proporcionar um melhor desempenho a longo prazo.
testes de propriedades mecânicas e ópticas de 18
E que alguns GICsembora tendo uma relação P: L
marcas diferentes de GICs restauradores
<3,6:1, mostraram excelentes resultados em testes
convencionais, com o objetivo de eliminar variáveis
de laboratório, confirmando que outras melhorias
de teste e conseguir comparações significativas. Os
tanto no pó comono líquido e não apenas a elevada
resultados foram apresentados e discutidos numa
relação P: L influencia o desempenho dos materiais.
reunião de consenso sobre os GICs restauradores
Assim, o consenso afirma que a nomenclatura de
convencionais, realizados na Faculdade de
"alta viscosidade" deve ser reavaliada.
Odontologia de Bauru (FOB-USP) em 2018.Assim,
A apresentação comercial do CIV:
de Lima Navarro et al. (2021) publicaram aanálise
realizada em frascos, os quais o pó e o líquido são
realizada pela equipe de investigadores e asnormas
embalados separadamente e a proporção
mínimas recomendadas acordados para a seleção de
(pó/líquido) varia conforme as marcas comerciais,
GICs restauradores convencionais para utilização
ou em cápsulas, com tamanhos variados e feitas
como restaurações de longo prazo. Aunanimidade
propriamente para a inserção do material na
foi alcançada para todos os itens selecionados no
cavidade e, ainda, manipuladas em dispositivos
final do consenso: a) propriedadesprimárias: força
mecânicos.25 Um cimento que alcançou resultados
compressiva, microdureza, erosão ácida e libertação
preponderantes no estudo do consenso de Lima
de flúor; e propriedades secundárias: razão de
Navarro et al. (2021) e apresenta-se encapsulado é
contraste e parâmetro de translucidez; b) limiares
o Equia Forte (GC Corporation, Tokyo, Japan), o
para: a resistência compressiva com a especificação
qual de acordo com o seu fabricante, é um material
ISO 9917-1:2016 de 100 MPa; a microdureza: 70
restaurador com aumento das propriedades físicas
KHN que está ligeiramente acima da média da
conseguido por meio da introdução de nova
dureza da dentina e microdureza média dos
tecnologia híbrida de vidro. Esta nova tecnologia
compósitos de resina; aerosão ácida: a norma ISO,
envolve um vidro ultrafino, e altamente reativo,
de 0,17 mm no máximo;e para a libertação de flúor
disperso no interior do ionômero de vidro, como
o valor mais alto possível. Lima Navarro et al.
carga para acelerar e melhorar a formação da matriz
(2021) afirmaram que até à data, o termo "alta
após a mistura. Este sistema de vidro aumenta a
viscosidade" tem sidoextensivamente utilizado para
64

disponibilidade de íons e constrói um sistema muito são menores que as alterações dos cimentos
mais forte da estrutura matricial com maiores fornecidos em frascos. A disponibilização do
propriedades físicas, resistência ao desgaste e cimento de ionômero de vidro em cápsulas permite
liberação de flúor. que a manipulação seja realizada de uma maneira
Diante de observações de resultados na reprodutível, que é normalmente mais rápida e
literatura, os cimentos disponíveis em frascos e limpa do que a manipulação manual. Além disso, as
manipulados manualmente devem ser cápsulas disponíveis comercialmente apresentam
criteriosamente proporcionados e manipulados ponta para inserção do material na cavidade. De
evitando o comprometimento de suas propriedades uma maneira em geral, tem-se atribuído uma
físicas e, consequentemente, seu desempenho melhora nas propriedades dos cimentos de
clínico. Por sua vez, os cimentos de ionômero de ionômero de vidro encapsulados quando
vidro encapsulados têm a vantagem de manter comparados aos cimentos disponíveis em frascos,
constante a proporção pó/líquido recomendada pelo com relação a propriedades como liberação de
fabricante para otimizar as propriedades do fluoretos, tempo de presa, microinfiltração,
material. As alterações dimensionais durante a presa presença de porosidades, resistência compressiva e
dos cimentos de ionômero de vidro encapsulados resistência à tração.

Figura 4.14 Cimentos de Ionômero de vidro Equia Forte (GC Corporation, Tokyo, Japan) e Riva Light Cure® (SDI, Australia)

desencadear o desequilíbrio bucal que leva a


A importância do tratamento
doença. Há um impacto negativo na qualidade de
restaurador atraumático na cárie da
vida das crianças portadoras, uma vez que as lesões
primeira infância
cariosas consequência da CPI podem evoluir para
A doença cárie quando acomete crianças infecções, abscessos, pulpites e desencadear dor e
menores de 6 anos é denominada de cárie da desconforto. O conjunto de sinais e sintomas acaba
primeira infância (CPI). Clinicamente, configura-se por interferir no seu estado nutricional, dificultando
como um processo agudo, de evolução rápida e que a correta alimentação, com agravos consequentes
pode significar uma perda grande de estrutura que podem levar a possíveis quadros de desnutrição
34,35
dentária em curto espaço de tempo. e até mesmo atrasos de desenvolvimento cognitivo,
psicológico e de autoestima. 35,36
Uma dieta rica em açúcares livres, aliada à
higiene bucal inadequada é responsável por A literatura odontológica mostra que o ART
65

é uma alternativa para o tratamento de crianças isolamento absoluto do campo operatório.31,44,45 O


especiais com CPI. Por se tratar de um protocolo da uso de grampos, matrizes metálicas e cunhas de
Odontologia Minimamente Invasiva, o ART é madeira, para a execução de restaurações
superior às restaurações convencionais para convencionais, podem significar um risco a
controlar o medo e a ansiedade em ambientes complicações secundárias, como a limitação da
37
odontológicos. Isto ocorre porque o medo de respiração ou feridas, levando ao desconforto e falta
dentista se inicia ainda na infância, devido a de aceitação por parte do paciente.44 No entanto,
experiências desagradáveis de dor ou a sensações matrizes e cunhas são usadas no ART em cavidades
oriundas de procedimentos invasivos e com o uso oclusoproximais. Além disso, há pacientes alérgicos
do ART essas situações são grandemente ao látex e o fato de dispensar isolamento absoluto
37
amenizadas. Além disso, as restaurações beneficia este grupo, evitando o desenvolvimento
atraumáticas realizadas com CIV de alta de possíveis urticárias ou, ainda, graves quadros
viscosidade apresentaram taxa de sucesso superior alérgicos. No caso de crianças com necessidades
a 80% no controle da progressão de lesõesem bebês especiais, esta alternativa terapêutica proposta pelo
com CPI. 36 ART é ideal frente a episódios que podem
Ainda assim, quando se trata de aceitação comprometer o seguimento de um minucioso
dos pais ao uso de técnicas, muitas vezes protocolo clínico, como a falta de coordenação
desconhecida por eles, é imprescindível que os motora da musculatura orofacial e a força lingual e
cirurgiões-dentistas expliquem com clareza sobre os salivação excessivas.5 Ademais, essa característica
benefícios desses métodos e sua perspectiva futura contribui para a diminuição do tempo do tratamento,
no controle da doença cárie. Independentemente do permitindo que a equipe odontológica consiga
protocolo de tratamento escolhido, medidas de realizar, de forma eficaz, vários procedimentos.30,45
higiene bucal adequada, com escovação regular, uso
de fio dental e dentifrícios fluoretados são Dicas clínicas para melhorar a
fundamentais o para sucesso desses
higiene bucal de pessoas pessoas
procedimentos.38,40 É importante ressaltar que o uso
de técnicas restauradoras menos invasivascomo as com deficiência
restaurações atraumáticas ajudam a preservar os
tecidos dentais, estimulando a respostabiológica do Atualmente existem, mercados, diversos

dente e a manutenção de dentes decíduos na dispositivos que facilitam a realização da higiene

cavidade bucal até sua esfoliação.38 Todos esses bucal de PDs, muitos, entretanto podem ser

aspectos têm por objetivos melhorar a qualidade de confeccionados pelos próprios cuidadores e assim

vida das crianças com CPI, minimizando de forma indireta prolongar a vida útil dos

experiências negativas relacionadas àdor e ao medo tratamentos restauradores, ao passo que uma boa

do dentista. higiene bucal previne possíveis recidivas de cárie

Por fim, o Tratamento Restaurador dentária. 23,46,47

Atraumático é qualificado por não necessitar do


66

Abridores bucais

Os abridores bucais facilitam a técnica da


escovação mantendo uma abertura bucal adequada
em pacientes que apresentam maior dificuldade
nesse quesito. Dessa forma, diminui-se o risco de
mordidas involuntárias e obtém-se acesso suficiente
aos dentes posteriores, onde se tem relatos de maior
dificuldade na realização da escovação. 23,47 Figura 4.15 A. Abridor confeccionado com fita crepe,
palitos de madeira e gazes. A sua extremidade mais
Abridor Bucal feito de palitos de sorvete, fita adesiva e gaze volumosa com gaze serve de apoio para o paciente morder
e manter sua boca aberta. B. Profilaxia em paciente com
Para confeccionar esse abridor basta Síndrome de Down realizada na Clínica Integrada da
Universidade Federal do Paraná com o auxílio do abridor
empilhar os palitos de dentes uns sobre os outros e
feito de palitos de madeira, gaze e fita crepe. Imagens
envolvê-los em fita adesiva para fixá-los (Figura obtidas pelos alunos participantes do Projeto de Extensão
Saúde Bucal Inclusiva - UFPR.
4.15). Em uma das extremidades utiliza-se as gazes
para envolver esses palitos e novamente fixá-los
com a fita. A extremidade envolta em gaze serve
para que o paciente possa morder, permitindo que
sua boca fique entreaberta.47 A gaze pode ser
substituída por EVA.23

Este abridor é muito utilizado pelos


cirurgiões-dentistas durante realização de consultas
Figura 4.16 Abridor bucal de gargalo de garrafa pet. Imagens
odontológicas em PDs, pois facilita que a boca do obtidas pelos alunos participantes do Projeto de Extensão
paciente esteja aberta e a língua abaixada. O Saúde Bucal Inclusiva - UFPR.

cirurgião pode dessa forma realizar a restauração Abridor bucal com luva de cano de PVC
(ART ou convencional) sem correr o risco de
mordidas acidentais ou de fechamento bucal
durante a inserção do material restaurador.47

Abridor bucal feito com o gargalo da garrafa pet

Nesta adaptação é utilizado o gargalo de uma


garrafa pet (Figura 4.16). É de fácil confecção e baixo
custo, mas pode ser desconfortável para alguns pacientes,
devido à rigidez do material. O cuidador deve segurar o
Figura 4.17 A. Abridor de luva de cano de PVC.B. B.
gargalo com uma das mãos apoiando o dedo em seu
Profilaxia em paciente com Síndrome de Down realizada na
interior. 21,47 Clínica Integrada da Universidade Federal do Paraná com
o auxílio do abridor de luva de cano de PVC. Imagens
obtidas pelos alunos participantes do Projeto de Extensão
Saúde Bucal Inclusiva - UFPR.
67

A luva de cano de PVC é encontrada em


lojas de materiais de construções. O baixo custo
torna-se um atrativo para utilização da técnica
(Figura 4.17). Este material possui dois orifícios e
o cuidador deve colocar o dedo que melhor se
adapte à luva, levando-o à boca do paciente para que
este possa mordê-lo, mantendo a boca semi-
aberta.47
Figura 4.19 A. Abridor bucal ABRITEC utilizado em
Abridor bucal feito de resina acrílica paciente com Síndrome de Prader-Willi na Clínica
Este abridor consiste basicamente na Integrada da Universidade Federal do Paraná. Imagem
obtida pelos alunos participantes do Projeto de Extensão
confecção de um molde, com resina acrílica, do Saúde Bucal Inclusiva - UFPR.
dedo do cirurgião-dentista ou do cuidador (Figura
4.18). O dispositivo é útil tanto nos consultórios
odontológicos quanto no auxílio da higiene bucal
diária. Pode substituir também por dedeiras de
silicone. 23

Figura 4.20 A. Abridor bucal ABRITEC PcD da Indusbello


Indicado para uso em pessoas com deficiência, possui dois
lados, um menor e outro maior se adequando para cada
paciente. B. Abridor bucal ABRITEC PcD utilizado em
paciente com Síndrome de Prader-Willi na Clínica
Figura 4.18 Abridor de resina acrílica. Imagem obtida Integrada da Universidade Federal do Paraná. Imagem
pelos alunos participantes do Projeto de Extensão Saúde obtida pelos alunos participantes do Projeto de Extensão
Bucal Inclusiva - UFPR. Saúde Bucal Inclusiva - UFPR.

Abridor Bucal ABRITEC

momento da realização da higiene oral. Os pacientes que


Muito utilizado na odontologia e facilmente
possuem problemas de coordenação motora são os
encontrado em lojas revendedores de materiais
grandes beneficiados por essas modificações.20 Para isso,
odontológicos. Trata-se de um dispositivo de
pode-se utilizar:
silicone, encontrado na versão adulto ou infantil,
que serve para facilitar o campo operacional do  Manoplas de bicicleta, acoplada ao cabo da
dentista mantendo a boca do paciente semi-aberta.21 escova de dente;
 Moldagem dos dedos do paciente com silicona
Adaptações em escovas dentais de condensação, resina acrílica ou massa epóxi.

As escovas dentais também podem ser


modificadas para facilitar a empunhadura do paciente no
68

Técnica Loop para o uso do fio dental dentista a cada 6 meses, para realizar o
acompanhamento das restaurações e a manutenção
O uso do fio dental é um grande aliado para de uma boa saúde bucal.
que se mantenha uma higiene bucaladequada, e seu
uso é complementar à escavação, pois o fio dental Considerações finais
consegue acesso às regiões interproximais dos
dentes, onde a escova não alcança, removendo O Tratamento Restaurador Atraumático

assim todos os restos de alimentos e o biofilme (ART) apresenta-se como um tratamento

dental que pode estar acumulado nestas regiões. Os preventivo, terapêutico e restaurador frente àdoença

cuidadores, porém, relatam dificuldade cárie e tem como fundamento a remoção seletiva do

significativa durante as tentativas de utilização do tecido dentinário comprometido, de modo a manter

dispositivo convencional,devido, principalmente à a dentina mais interna, permitindo sua

falta de colaboração, dificuldades no mantimento reorganização e remineralização. O material de

da boca aberta ou coordenação motora prejudicada. eleição para realização do selamento da cavidade é

Uma alternativa então é a utilização da técnica o Cimento de Ionômero de Vidro, em especial o de

Loop ou também conhecida como a técnica de alta viscosidade que, por sua vez, apresenta

círculo, que consiste basicamente em cortar um vantagens preventivas devido à sua bioatividade.

pedaço de fio de aproximadamente 30 cm de


A implementação do ART pode ajudar a
comprimento e seguida amarrar as duas
superar essas barreiras relacionadas ao tratamento
extremidades, formando um círculo. O cuidador
dentário, ampliando o acesso da população,
deve segurar o círculo à mão nasduas extremidades,
racionalizando o uso de recursos humanos e
e utilizar o polegar paracontrolar o fio à medida que
materiais e contribuindo para a redução do medo e
este desliza dos espaçosinterproximais até o sulco
ansiedade. Assim, apresenta-se como uma
gengival. 47
alternativa viável ao tratamento da doença cárie não
Todos esses dispositivos servem de só para pessoas com deficiência, mas para outros
orientação aos responsáveis e cuidadores de pessoas grupos, como o de pacientes não cooperativos,
com deficiência, a fim de facilitar o momento da crianças e idosos. Medidas como fluorterapia,
higiene bucal, além disso alguns exemplos citados educação e motivação em saúde bucal e utilização
acima podem ser usados como coadjuvantes para de selantes de fóssulas e fissuras devem estar
estabilizar o paciente com a boca aberta no associadas às restaurações atraumáticas para
momento da realização dos procedimentos controle da doença cárie.
restauradores. Entretanto é indispensável a visita ao

Referências

1. Machiulskiene V, Campus G, Carvalho JC, Dige I, Group of IADR. Caries research [Internet]. 2019 Out; 54(1):7-
Ekstrand KR, Jablonski-Momeni A, et al. Terminology of 14. Disponível em:
dental caries and dental caries management: consensus report https://www.karger.com/Article/FullText/503309
of a workshop organized by ORCA and Cariology Research
69

2. Berkowitz RJ. Causes, treatment and prevention of 15. Schwendicke F, Dörfer CE, Paris S. Incomplete
early childhood caries: a microbiologic perspective. J Can Caries Removal. Journal of Dental Research. 2013 Fev 8;
Dent. Assoc. 2003 Mai; 69(5):304-7. 92(4):306–14.

3. Global Burden of Disease Study 2013 Collaborators. 16. Ogle OE, Hertz MB. Anxiety Control in the Dental
Global, regional, and national incidence, prevalence, and years Patient. Dent Clin North Am. 2012 Jan; 56(1):1–16.
lived with disability for 301 acute and chronic diseases and
injuries in 188 countries, 1990-2013: a systematic analysis for 17. Raggio DP, Bonifácio CC, Imparo JSP. Tratamento
the Global Burden of Disease Study 2013. Lancet. 2015 Ago; Restaurador Atraumático (ART) - Realidade e Perspectivas.
386(9995):743- 800. São Paulo: Editora Santos; 2011.

4. Molina GF, Faulks D, Frencken J. Acceptability, 18. Curado M de M, Vieira LDS, Leite R de O.
feasibility and perceived satisfaction of the use of the Abordagem do paciente TEA na clínica odontológica.
Atraumatic Restorative Treatment approach for people with Monografia (Bacharel em Odontologia) - Centro Universitário
disability. Braz Oral Res. 2015 Ago; 29(1):1–9. do Planalto Central Apparecido dos Santos, 2018.

5. Fidela M, Leal SC, Molina GF, Villena RS. 19. Campos JADB, Giro EMA, Orrico SRP, Oliveira
Tratamento Restaurador Atraumático: atualidades e APC, Lorena SM. Correlação entre a prevalência de cárie e a
perspectivas. Revista da Associação Paulista de Cirurgiões utilização de medicamentos em pacientes com necessidades
Dentistas. 2015 Set; 69(3):289–301. especiais institucionalizados e não institucionalizados.
Salusvita. 2006; 25 (1):35-42.
6. Frencken JE, Leal SC, Navarro MF. Twenty-five-
year atraumatic restorative treatment (ART) approach: a 20. Filho RG, Chistina A, Maria, Bianchi M, Silva.
comprehensive overview. Clinical Oral Investigations Importância da anamnese para o manejo das possibilidades
[Internet]. 2012 Jul; 16(5):1337–46. Disponível em: emergenciais em. Revista Biociências. 2005 Jan; 12 (3): 170-
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3443346/ 173.

7. Frencken JE, Pilot T, Songpaisan Y, Phantumvanit P: 21. Monnerat AF. Tratamento Restaurador Atraumático.
Atraumatic restorative treatment (ART): rationale, technique, Abordagem Clínica em Saúde Pública. Rio de Janeiro: Elsevier,
and development. J Publ Health Dent 1996 Set; 56:135–140. 2015.

8. De Amorim RG, Frencken JE, Raggio DP, Chen X, 22. Lopes J. Atendimento Odontológico dos Indivíduos
Hu X, Lean SC. Survival percentages of atraumatic restorative com Necessidades Especiais na Atenção Primária. Minas
treatment (ART) restorations and sealants in posterior teeth: an Gerais. Monografia [Especialização em Atenção Básica em
updated systematic review and meta-analysis. Clin Oral Saúde fa Família] – Universidade Federal de Minas Gerais;
Investig. 2018 Nov; 22(8):2703-25. 2013.

9. Frenken JE, Liang S, Zhang Q. Survival estimates of 23. Alves Peixoto IT, Tomaz Rocha C, Motta Fernandes
atraumatic restorative treatment versus traditional restorative P, Paulo Nelson-Filho AM de Q. Auxiliary devices for
treatment: a systematic review with meta-analyses. Br Dent J management of special needs patients during in-office dental
2021 Abr. 21:1-11. treatment or at-home oral care. Int J Dent. 2010 Abr-Jun;
9(2):68–70.
10. Schwendicke F, Frencken JE, Bjorndal L, Maltz M,
Manton DJ, Ricketts D, et al. Managing carious lesions: 24. Bussadori SK. et al. Odontologia de Mínima
consensus recommendations on carious tissue removal. Adv Intervenção: um novo olhar sobre a odontologia. Cartilha ART
Dent Res 2016 Abr; 28(2):58-67. Nova DFL; 2013 [acesso em: 25 ago 2021]. Disponível em:
https://www.agoped.org.br/CartilhadeMinimaIntervencao.pdf
11. Frencken JE. Atraumatic restorative treatment and
minimal intervention dentistry. Br Dent J. 2017 Ago; 25. Mandarino F. Cimento de Ionômero de Vidro. Forp-
223(3):183-9. Us; 2003 [acesso em: 23 ago 2021]. Disponível em:
http://www.forp.usp.br/restauradora/dentistica/temas/cim_ion
12. Chibinski ACR, Reis A, Kreich EM, Tanaka JLO, _vid/cim_ion_vid.pdf
Wambier DS. Evaluation of primary carious dentin after cavity
sealing in deep lesion: a 10-to 13-month follow-up. Pediatr 26. Fook ACBM, Azevedo VVC, Barbosa WPF, Fidéles
Dent 2013 Jun; 35(3):E107-12. TB, Fook MVL. Materiais odontológicos: Cimentos de
ionômero de vidro. Revista Eletrônica de Materiais e Processos.
13. Innes NPT, Frencken JE, Bjorndal L, et al. Managing 2008; 3(1):40-5
carious lesions: consensus recommendations on terminology.
Adv Dent Res. 2016 Mai; 28(2):49-57. 27. Silva DOC, Silva IM, Rocha AO, Anjos LM, Lima
TO, Santos RMA, Cruz BP. Cimento de ionômero de vidro e
14. Chibinski ACR, Wambier L, Reis A, Wambier DS. sua aplicabilidade na Odontologia: Uma revisão narrativa com
Clinical, mineral and ultrastructural changes in carious dentin ênfase em suas propriedades. Research, Society and
of primary molars after restoration. Int Dent J 2016 Jun; Development. 2021 Abr; 10(5):1-8.
66(3):150-7.
28. Muniz AB, Bessa ERL, Holanda MAR, et al.
Cimento de ionômero de vidro em odontopediatria: revisão
70

narrativa. Electronic Journal Collection Health. 2020 Out; 41. Nelson T, Scott JM, Crystal YO, Berg JH, Milgrom
12(10):1-8. P. Fluoreto de diamina de prata em programas de treinamento
em odontopediatria: pesquisa com diretores de programas de
29. Mickenautsch S, Yengopal V. Caries-Preventive pós- graduação. Pediatr Dent. 2016 Jan; 38(3):212–217.
Effect of High-Viscosity Glass Ionomer and Resin-Based
Fissure Sealants on Permanent Teeth: A Systematic Review of 42. Fonseca LMP, Oliveira ALBM, Domingos PAS.
Clinical Trials. Gándara E, editor. PLOS ONE. 2016 Jan; Tratamento Restaurador Atraumático: Alternativa Viável para
11(1):e0146512. a Promoção de Saúde Bucal. UNINGÁ Review. 2010 Abr;
3(1):39-49.
30. Monnerat AF, Souza MIC, Monnerat ABL.
Tratamento Restaurador Atraumático. Uma Técnica que 43. Franca C, Góes MPS, Domingues MC, Colares V. A
Podemos Confiar? Revista Brasileira de Odontologia. 2013; 70 utilização do tratamento restaurador atraumático por
(1):33-6. odontopediatras. Arquivos em Odontologia. 2008 Jan; 44
(1):30-4.
31. Santana VKR, Pereira EF, Botelho KVG. Tratamento
restaurador atraumático – tra, o que é, indicações, contra 44. Molina GF, Faulks D, Frencken J. Acceptability,
indicações, protocolo clínico do tra, e como implantar esta feasibility and perceived satisfaction of the use of the
técnica na rotina do cirurgião dentista. Caderno de Graduação Atraumatic Restorative Treatment approach for people with
– Ciências Biológicas e da Saúde – UNIT. 2018 Jul; 3(3):33- disability. Braz Oral Res. 2015 Ago; 29(1):1–9.
42.
45. Santos VM, Labuto MM. Tratamento Restaurador
32. Figueiredo CH, Lima FA, Moura KS. Tratamento Atraumático: Exercendo a Humanização e Melhorando a
Restaurador Atraumático: Avaliação de sua viabilidade como Qualidade de Vida. Cadernos de Odontologia do UNIFESO.
estratégia de controle de cárie dentária na Saúde Pública. RBPS 2020 Dez; 2(1):97-105.
2004; 17 (3):109-18.
46. Costa RM, Figueiredo FMP, Mariano LC,
33. de Amorim RG, Frencken JE, Raggio DP, Chen X, Marchionni AM, Tunes RS, Oliveira VMB de. Adaptações em
Hu X, Lean SC. Survival percentages of atraumatic restorative escovas dentais para pacientes com distúrbios motores: relato
treatment (ART) restorations and sealants in posterior teeth: an de caso. Revista Odontológica do Brasil Central [Internet].
updated systematic review and meta analysis. Clin Oral 2017 Ago; 26(77). Disponível em:
Investig 2018 Set; 22(8):2703-25. https://www.robrac.org.br/seer/index.php/ROBRAC/article/vi
ew/1140
34. Americana de Odontologia Pediátrica (AAPD)
(2003) Política sobre cárie na primeira infância (ECC): desafios 47. Hartwig AD, Junior IF da S, Stüermer VM,
únicos e opções de tratamento. Pediatr Dent 24 (Supl): 24-25. Schardosim LR, Azevedo MS. Recursos e técnicas para a
higiene bucal de pacientes com necessidades especiais. Rev da
35. Graves CE, Berkowitz RJ, Proskin HM, Chase I, ACBO. 2015 Out; 4(3):1–10.
Weinstein P, Billings R Resultados clínicos para cárie na
primeira infância: influência da cirurgia dentária agressiva. J
Dent Child 2004 Dez; 71(2): 114-117.

36. Faustino-Silva DD, Figueiredo MC. Atraumatic


restorative treatment-ART in early childhood caries in babies:
4 years of randomized clinical trial. Clin Oral Investig. 2019
Jan; 23(10):3721-3729.

37. Arrow P, Klobas E. Minimal intervention dentistry


for early childhood caries and child dental anxiety: a
randomized controlled trial. Aust Dent J. 2017 Jan; 62(2):200-
207.

38. Duangthip D, Chen KJ, Gao SS, Lo ECM, Chu CH.


Gerenciando cáries na primeira infância com tratamento
restaurador atraumático e agentes tópicos de prata e flúor. Int J
Environ Res Saúde Pública. 2017; 14 (10): 1204.

39. Dos Santos AP, Nadanovsky P, De Oliveira BH. Uma


revisão sistemática e meta-análise dos efeitos dos dentifrícios
fluoretados na prevenção da cárie dentária na dentição decídua
de crianças pré-escolares. Community Dent. Oral Epidemiol.
2013 Fev; 41(1):1-12.

40. Crystal YO, Janal MN, Hamilton DS, Niederman R.


Parental perceptions and acceptance of silver diamine fluoride
staining. J Am Dent Assoc. 2017 Jul; 148(7):510- 518.
5
ATENÇÃO ODONTOLÓGICA E CUIDADOS AO IDOSO
Heliton Gustavo de Lima | Luiza Iaizzo Magalhães | Marina Elisa da Costa Ferronato | Rafael
Augusto Cardoso

Introdução
O processo de envelhecimento está aleatórias estão relacionadas à existência de
relacionado a alterações progressivas que ocorrem “relógios biológicos” que regulam o tempo de vida
nas células, tecidos e órgãos sendo um fenômeno segundo estágios de crescimento, desenvolvimento,
natural, irreversível e individual. 1 As alterações que maturidade, senescência e morte, por meio de genes
cada indivíduo desenvolve durante a vida estão que pré-determinam o tempo de vida celular. Já nas
associadas a características sociais, econômicas e estocásticas, há a identificação de agravos que
culturais. 2 induzem danos e erros em vários níveis

Várias teorias buscam identificar uma causa (moleculares e celulares), que são aleatórios e

ou um processo para explicar o envelhecimento. progressivos. A partir das interações genéticas,

Frequentemente as teorias biológicas do ambientais e estocásticas, é possível desenvolver

envelhecimento são apresentadas em dois grupos: uma compreensão mais abrangente e realista sobre

as teorias não aleatórias e as estocásticas. As não o processo de envelhecimento, auxiliando na


análise das alterações que ocorrem no organismo de
72

que os idosos sejam beneficiados e tenham pleno


pacientes idosos e das eventuais doenças que
acesso à saúde, especialmente a programas
podem surgir. 1, 3
de saúde bucal. 7
O acesso e a qualidade dos serviços de saúde
Entre os idosos é comum a perda de dentes
e a melhoria das condições nutricionais e dos
naturais, a presença de doenças orais crônicas, como
hábitos são fatores que têm refletido na redução das
cárie dentária e doenças periodontais,
taxas de mortalidade e no aumento da expectativa
desenvolvimento de infecções orais, lesões na
de vida. 4 Segundo a Organização Mundial da Saúde
7
mucosa e disfunções temporomandibulares.
(OMS), o idoso é o indivíduo cuja idade é superior
Quando presentes e não são tratados, esses
a 60 anos em países em desenvolvimento e a 65
problemas podem causar dor, infecção local e
anos em países desenvolvidos. Atualmente, os
sistêmica, e dificuldade para mastigar, falar e
idosos representam 13% da população brasileira e
engolir, o que provavelmente afeta as escolhas
conforme as projeções do Instituto Brasileiro de
alimentares, levando à perda de peso e deficiências
Geografia e Estatística (IBGE), 5 em 20 anos, essa
nutricionais, além de trazer sofrimento
parcela representará mais de 20% do total. Os
psicossocial, prejudicando o bem-estar e a
relatórios ainda apontam que a partir de 2047 a
qualidade de vida, razões pelas quais a prevenção e
população deverá parar de crescer, contribuindo
a promoção em saúde tornam-se fatores essenciais
ainda mais para o processo de envelhecimento da
para uma boa saúde bucal e sistêmica. 7, 8
população, que ocorre quando o número de pessoas
mais velhas é maior se comparado com o número de Alterações Sistêmicas do
jovens. 6 Esses dados revelam um grande desafio a
toda a sociedade, com destaque aos profissionais da
Envelhecimento
saúde, que devem se adaptar à nova realidade
A senescência pode ser compreendida como
demográfica.
um processo natural do envelhecimento em que
A apresentação, instalação e desfecho de ocorre uma diminuição progressiva da reserva
agravos em saúde na população idosa possui funcional dos indivíduos, que em condições
particularidades que tornam esses indivíduos mais normais não costuma provocar qualquer problema.
vulneráveis a eventos adversos. Além disso, a Entretanto, a senilidade aparece quando há
maioria das doenças que afetam os idosos são condições que sobrecarregam o organismo do idoso,
crônicas, múltiplas e necessitam de como doenças, acidentes e estresse emocional,
acompanhamento contínuo e intervenções com foco podendo então ocasionar uma condição patológica
no cuidado, o que resulta em uma crescente que demanda assistência. 9
demanda por serviços de saúde no país. 6 Atenção Ainda não é possível determinar onde o
integral à saúde do idoso é assegurada por lei, razão envelhecimento termina e uma doença começa.
pela qual políticas públicas já vêm sendo Apesar disso, observa-se que o envelhecimento
implementadas. Porém ainda é preciso muito para apenas já afeta vários processos biológicos e
73

10
fisiológicos do corpo humano. Ainda que as a elevar-se, devido ao aumento contínuo da pressão
mudanças sejam variáveis para cada pessoa, é sistólica, enquanto a pressão diastólica flutua.
possível identificar transformações nos principais Nesse cenário, a hipotensão ortostática é
sistemas do corpo, comuns a vários indivíduos, comumente encontrada, quando mudanças agudas
como: 11 da pressão arterial não são reguladas. No

Sistema neuroendócrino consultório odontológico é necessária atenção


devido a possível hipotensão postural, que pode
Com o envelhecimento ocorre a diminuição ocorrer quando os pacientes se levantam de uma
da secreção de alguns hormônios e o aumento de posição sentada ou deitada na cadeira. 13
outros, sendo os hormônios femininos os mais
Sistema esquelético
afetados. Um exemplo é o hormônio da
paratireoide, cuja secreção aumenta, provocando Com o envelhecimento, os níveis de cálcio e
maior liberação de cálcio no sangue e, proteína nos ossos diminuem, reduzindo assim a
consequentemente, acelerando o processo de densidade óssea. Podem ocorrer degenerações nos
osteoporose. 10 Essa condição pode afetar a maxila osteoblastos, redução do número de osteócitos e da
e a mandíbula, influenciando em diversos camada osteogênica, expondo as superfícies ósseas
procedimentos odontológicos, principalmente os e fazendo com que a deposição e reabsorçãoóssea
10
relacionados a implantodontia e periodontia. 12 sejam irregulares. Dessa forma, sucede um

Sistema cardiovascular declínio na mineralização e na resistência das


matrizes ósseas. Com a diminuição da porção de
Ocorrem alterações estruturais e funcionais água nos tendões, ligamentos, cartilagens e
neste sistema. As principais mudanças acontecem compartimentos sinoviais, as articulações também
nas artérias, que se tornam mais rígidas e espessas. ficam enrijecidas. Mudanças funcionais normaisque
Essa rigidez influencia no aumento da resistência ocorrem com a idade, como a redução da forçade
sistólica, prejudicando o fluxo sanguíneo e preensão manual, podem afetar e eficiência da
aumentando a demanda de oxigênio, o que, por escovação e do uso do fio dental, sendo necessárias
consequência, intensifica o trabalho cardíaco. adaptações para uma melhor higienização. 13
Além disso, ocorre a diminuição da capacidade de
Sistema digestório
resposta do coração ao estresse, resultando no
aumento do risco de insuficiência cardíaca ou de Todas as funções do trato gastrointestinal,
bloqueio cardíaco quando se tem uma doença como motilidade, secreção de enzimas e hormônios,
14
crônica, como diabetes ou hipertensão. O sistema digestão e absorção, são afetadas. Destaque-se
cardiovascular procura compensar essas mudanças que ocorre uma expressiva diminuição da atividade
para manter sua função. No entanto, encontra metabólica hepática, afetando o metabolismo, a
13
dificuldades de adaptação quando sofre estresse ou absorção e a depuração de medicamentos. Por
intervenção médica. Com o envelhecimento, a isso, a prescrição de medicamentos deve ser
pressão arterial do coração (pressão de pulso) tende realizada com atenção, levando em consideração o
74

órgão que vai metabolizar o medicamento e se o corretamente prescrita para prevenir efeitos
paciente possui alguma condição médica que colaterais. 13
dificulte ainda mais a sua metabolização. 14 Sistema respiratório
Sistema urinário
A quantidade de fibras elásticas e colágenas
Nos rins a taxa de filtração glomerular é diminui e, por consequência, os pulmões ficam
reduzida devido à diminuição das células renais e menos elásticos e expansíveis (enrijecimento da
ao endurecimento dos vasos, aumentando o risco de caixa torácica). Os músculos diafragmáticos e
insuficiência renal pelo acúmulo de substâncias intercostais ficam enfraquecidos e a capacidade de
10
tóxicas. Ocorrem ainda mudanças no sistema difusão é reduzida. Essas alterações são
urinário na porção terminal da bexiga, causando consideradas normais com o envelhecimento.
10
diurese, polaciúria e incontinência urinária. Contudo, reduzem a capacidade adaptativa e
Mesmo com essas mudanças, o rim saudável aumentam o risco de doenças. A saúde bucal é
mantém a homeostase dos fluidos corporais. Em diretamente afetada nesse cenário, já que o reflexo
adultos mais velhos, com e sem doença renal da tosse diminui, elevando o risco de aspiração na
crônica, a excreção renal de medicamentos leva cadeira odontológica durante o tratamento, bem
mais tempo do que em adultos mais jovens. A como de aspiração de biofilmes oriundos da
importância clínica dessas mudanças na cavidade oral e de próteses dentárias mal
odontologia está ligada à prescrição de higienizadas. Além disso, a diminuição do reflexo
medicamentos. Posto que classes de medicamentos genioglosso e um palato mole alongado aumentam
comumente prescritos por dentistas podem causar a possibilidade de ocorrência de apneia obstrutiva
reações adversas sobre os rins e alterações do sono e hipertensão secundária. 13
significativas nos idosos, a medicação deve ser

Figura 5.1 Esquema das alterações sistêmicas causadas com o envelhecimento.


75

medicamentos são prescritos simultaneamente.


Doenças Sistêmicas e Saúde Bucal
Essa é uma prática clínica comum para as pessoas
As doenças que acometem os idosos são idosas, devido ao número de doenças crônicas que
9, 11
predominantemente condições crônicas e agudas as acometem. Sendo assim, é importante que
decorrentes de causas externas. A maioria dos antes de prescrever um medicamento o profissional
indivíduos desse grupo é portadora de doenças ou avalie uma série de fatores:
disfunções orgânicas e é comum a existência de
mais de uma enfermidade, o que não implica,
necessariamente, na limitação de suas atividades.
As doenças crônicas não transmissíveis mais
prevalentes são: hipertensão, artrite, cardiopatias,
diabetes e depressão. Os idosos representam uma
grande parcela das pessoas com deficiência –
visual, motora, auditiva, mental ou intelectual.
Entre as possíveis causas de mortes, as mais
predominantes são doenças do sistema circulatório,
neoplasias e doenças do aparelho respirátorio. 2

O comprometimento físico e cognitivo tem


um impacto negativo na saúde bucal dos idosos, que
acabam apresentando redução na destreza manual e
consequentes dificuldades no autocuidado e na
manutenção de hábitos de higiene bucal adequados.
15
Outro aspecto importante é que doenças
sistêmicas aumentam o risco de doenças bucais e
vice-versa, isto é, condições bucais insatisfatórias
9
podem levar a doenças sistêmicas graves, o que
reforça a importância do cuidado com a saúde
bucal. 8, 16
Figura 5.2 Check list dos fatores que o profissional deve
Polimedicação e o Impacto na Saúde avaliar antes da prescrição de medicamentos.

As alterações sistêmicas causadas pelo


Bucal
envelhecimento são passíveis de alterar a
Com o diagnóstico precoce de doenças e o farmacocinética e a farmacodinâmica dos
tratamento envolvendo agentes farmacológicos, a medicamentos. Assim, os idosos tornam-se mais
expectativa de vida tem aumentado cada vez mais, suscetíveis a efeitos adversos. O uso de ao menos
bem como a ocorrência da polimedicação, termo um medicamento prescrito é uma tendência nesta
utilizado para descrever a situação em que vários parcela da população. No entanto, os dados são
76

diferentes para homens e mulheres, uma vez que as ansiedade e estresse. 18


mulheres utilizam mais medicamentos prescritos
que os homens. Outro ponto é que a maioria dos
idosos utilizam de 2 a 4 medicamentos não
prescritos por dia, buscando tratar resfriado, dor de
cabeça, dor muscular, constipação, diarreia e
11
indigestão. Com frequência, essas pessoas
consomem muitos medicamentos para aliviar
sintomas. 17
18

Os medicamentos mais utilizados pelos


idosos são os que atuam no sistema cardiovascular
A redução do fluxo salivar acontece com o
(anti-hipertensivos, diuréticos, digitálicos e
envelhecimento devido à diminuição da produção
anticoagulantes), os de ação no trato gastrointestinal
pelas glândulas salivares e à substituição das células
(antiácidos, laxativos) e os ansiolíticos. Cabe
secretoras por tecido fibroso e gorduroso. Nesse
ressaltar que os idosos são grandesconsumidores de
quadro, o paciente pode apresentar sintomas como
analgésicos pertencentes à classe dos anti-
queimação na boca, sede, fala alterada, lábios secos
9
inflamatórios não-esteroidais. Das classes de
e mucosa ulcerada. A hipossalivação pode levar ao
fármacos, os que têm propriedades anticolinérgicas
aumento na incidência de cárie coronária e
como os anti-histamínicos, antidepressivos,
radicular, alteração no paladar, dor na mucosa oral,
relaxantes musculares e antipsicóticos, possuem
infecções orais, afetar o processo de mastigação e
efeitos adversos que afetama qualidade de vida do
deglutição, causar halitose e presença de úlceras,
idoso, pois causam alterações qualitativas e
além de maior dificuldade na utilização da prótese
quantitativas na produção de saliva. Além disso, o
dentária. 18- 19
uso de muitos medicamentos potencializa as
O diagnóstico depende de anamnese
propriedades anticolinérgicas, que intensificam os
cuidadosa e detalhada e de exame físico intraoral
efeitoscolaterais. 11
completo, que deve incluir a medição das taxas de
Xerostomia e Hipossalivação 20
fluxo salivar. Para auxiliar na análise, existem
A prevalência da sensação de boca seca é diversas maneiras de coletar a saliva, entre elas o
maior em idosos pois o uso de vários medicamentos método de drenagem, que consiste em o paciente
é mais comum nessa fase da vida, podendo interferir drenar constantemente a saliva para um recipiente
na secreção e composição salivar, seja intervindo no graduado por cinco minutos, para avaliar a taxa de
sistema nervoso autônomo, ou pela ação direta em fluxo salivar total não estimulado. Para verificar a
células produtoras de saliva. Além do uso de vários taxa de fluxo salivar estimulado, o paciente precisa
medicamentos, a xerostomia pode ocorrer por mascar uma goma sem sabor ou cera de parafina (1–
influência do estado psicológico em situaçõesde 2 g) por um minuto, e então é coletada a saliva
produzida por cinco minutos. Nas duas medições,
77

antes de coletar a saliva que será mensurada, é erosão do esmalte. Os sprays contendo tri-éster de
recomendado realizar uma coleta teste de um glicerol oxigenado têm se mostrado mais eficazes
minuto para a não estimulada e dois minutos para a quando comparados a outros substitutos de saliva
21
estimulada, e descartá-las. disponíveis no mercado. Outros agentes tópicos
(pasta de dente, enxaguante bucal, spray bucal e gel)
Diversas estratégias de tratamento para o
contendo azeite de oliva, betaína e xilitol podem ser
manejo da xerostomia têm sido propostas nos
eficazes para melhorar a xerostomia secundária ao
últimos anos, visando reduzir os sintomas dos
uso de medicamentos. Vale ressaltar que o uso de
pacientes ou aumentar o fluxo salivar. A redução da
spray substituto de saliva contendo
dosagem ou substituição dos fármacos que induzem
carboximetilcelulose, mucina ou goma de xantana,
a hipofunção da glândula salivar pode ser discutida
bem como o consumo de pastilhas de limão e gel de
com o médico do paciente que sofre de
profilina tamponado não melhoraram os sintomas
hipossalivação. 20
de boca seca, e também não provocam aumento no
Quando os sintomas de boca seca são mais fluxo salivar. 20
leves, os pacientes costumam aliviar seu incomodo
O uso sistêmico da pilocarpina e cevimelina,
bebendo água, no entanto, quando os sintomas são
mesmo com mecanismos diferentes para
mais severos recomenda-se o uso de salivas
estimulação da produção salivar, são alternativas
artificiais, pois a água em si não é capaz de fornecer
para o tratamento, uma vez que proporcionam
hidratação e lubrificação adequadas e não fornece
benefícios semelhantes. Porém, dependem da
propriedades antimicrobianas presentes na saliva.
22
presença de tecido glandular funcional. São

Entre os tratamentos para xerostomia, os contraindicados para pacientes com asma não

agentes tópicos intraorais são os mais comuns e controlada ou doença pulmonar crônica e em

estão disponíveis no mercado com diversas usuários de bloqueadores β-adrenérgicos, e devem

apresentações e formulações. As gomas de mascar ser usados com cautela em pacientes com úlceras

e balas sem açúcar estimulam a produção de saliva gástricas ativas ou hipertensão não controlada. A

e diminuem a fricção da mucosa oral. As pastilhas pilocarpina é contraindicada em indivíduos com

contendo mucina e as que contêm maltose cristalina glaucoma e irite. 20

anidra também proporcionam benefícios no Outras opções de tratamentos incluem a


tratamento da xerostomia. Os substitutos da saliva eletroestimulação intraoral e aparelhos intraorais,
contêm minerais, hidroxietilcelulose, aromatizantes como o dispositivo de estimulação de saliva
e conservantes e visam aumentar a viscosidade e Saliwell Crown ou o dispositivo de
imitar a saliva natural, sem alterar o fluxo salivar. 20
eletroestimulação GenNarino. A acupuntura pode

O uso de spray tópico contendo ácido málico ser um complemento útil para a estimulação do

a 1% demonstrou eficácia no controle dos sintomas fluxo salivar em alguns pacientes com xerostomia e

quando eles são induzidos por antidepressivos ou em pacientes com xerostomia induzida por

anti-hipertensivos. Porém, é possível ocorrer leve irradiação. 20


78

cor e textura, quanto molecular sofrem


Alterações bucais nos pacientes
modificações, sendo provável que os dentes se
idosos tornem mais quebradiços, frágeis e menos
permeáveis, contribuindo para que ocorram
É importante que profissionais da microfraturas e rachaduras. Problemas orais como o
odontologia saibam identificar as alterações bucais bruxismo podem agravar o desgaste oclusal
próprias do envelhecimento assim, como aquelas normal.13
que se manifestam devido à presença de doenças
Dentina
sistêmicas e ao uso de medicamentos, para
proporcionar um atendimento qualificado aos Ao longo da vida ocorre a formação contínua
pacientes geriátricos. Dessa maneira, é possível de dentina e com o avançar da idade o diâmetro dos
identificar mudanças decorrentes do túbulos dentinários na região mais externa diminui
envelhecimento nas seguintes áreas e funções ou eles são obliterados pela sua gradual deposição
bucais: que nesse caso é chamada de dentina esclerótica. 25

Dentição A esclerose dentária pode ocorrer em casos de cárie


crônica, sendo um processo natural que busca
Difere entre os indivíduos e envolve proteger a polpa, tornando a dentina mais escura e
mudanças acumuladas ao longo do tempo, sendo endurecida. 26 Essa deposição tem como resultado a
influenciadas pelo desgaste mecânico e químico da diminuição da sensação de frio, calor, doce e dor. 13
mastigação, além de fatores como cultura, dieta,
Polpa
ocupação, composição e resistência dos dentes,
força, uso de aparelhos e próteses. 13
A perda Com o envelhecimento, a resposta a
dentária não pode ser considerada parte do processo estímulos no tecido pulpar diminui sendo comum
de envelhecimento. No entanto, o número de que os idosos não relatem dor de dente por desgaste
pessoas desdentadas aumenta em paralelo à idade, oclusal e cáriedentária. Essa redução da resposta é
como resultado de uma saúde bucal inadequada. 23 causada pelo aumento das fibras colágenas e
Observa-se que a presença de dentes naturais está calcificação pulpar, além da diminuição do
relacionada a maior eficiência na mastigação, e que suprimento sanguíneo e degeneração das fibras
13
indivíduos desdentados que fazem o uso de próteses nervosas. As calcificações pulpares contribuem
totais têm a eficiência mastigatória diminuída em 50 para mudanças no volume da câmara pulpar e
a 85%. Em relação a próteses suportadas por podem ocorrer devido a irritação dapolpa causada
implantes, avaliações demonstraram desempenho pela cárie, restaurações profundas, ou hábitos orais
próximo aos pacientes dentados. 24 deletérios. 26

Esmalte Cemento e ligamento periodontal

No idoso, frequentemente encontra-se Ao longo da vida e com o envelhecimento, a


danificado e com o tempo tanto a aparência física, espessura do cemento aumenta, de forma lenta e
79

irregular, principalmente no terço apical da raiz, músculos, a força de mordida e a atividade da


formando uma camada mais densa, em decorrência língua. Indivíduos saudáveis são capazes de se
de demandas funcionais como o decréscimo das adaptar para reduzir os efeitos causados pelo
forças mastigatórias. A largura do ligamento envelhecimento. O aumento do número de ciclos
periodontal pode diminuir ou aumentar. A mastigatórios e um maior recrutamento de fibras
diminuição ocorre devido ao decréscimo das forças musculares representam as principais adaptações.
mastigatórias e à constante deposição de cemento e No entanto, idosos com doenças locais ou
osso. Já o aumento é resultado da presença de sistêmicas têm capacidade de adaptação diminuída,
poucos dentes que suportam as cargas funcionais o que resulta no aumento do risco de aspiração e
completas. Ocorre ainda um aumento da fibrose e engasgo. 24
uma diminuição celular do ligamento periodontal. A deglutição envolve a coordenação de
13, 28
múltiplas estruturas orofaríngeas. Já a disfagia
Tecidos periodontais reflete um distúrbio funcional dos mecanismos de
alimentação, tornando-se uma preocupação
A recessão gengival é muito prevalente entre
crescente, especialmente nos idosos. Disfunções das
os idosos. No entanto, mudanças periodontais
habilidades motoras da língua e falta de tonicidade
atribuídas unicamente ao envelhecimento não são
dos músculos envolvidos nos movimentos
suficientes para causar a perda de um dente de um
mastigatórios reduzem a eficiência mastigatória e
28
idoso saudável. Acredita-se que os efeitos no
prejudicam o processo de autolimpeza da cavidade
periodonto estão relacionados à presença de
bucal. 10, 30, 28
13
doenças e não ao envelhecimento.
Função sensorial
Mucosa oral
O envelhecimento traz uma deterioração
Com o envelhecimento, a mucosa oral pode
das sensações táteis. A língua exerce a função de
se tornar mais fina e perder elasticidade. A
identificar a textura do bolo alimentar. Para uma
integridade dessa mucosa é importante para garantir
deglutição perfeita, é necessário que ele tenha um
que a mastigação e a deglutição ocorram
tamanho, viscosidade e plasticidade adequados.
corretamente, sem desconforto ou dores. O uso de
Nesse contexto, é possível justificar que algumas
medicamentos, quimioterapia e radioterapia
mudanças observadas na função de deglutição em
provocam alterações na mucosa oral, como
13 pessoas idosas podem ser influenciadas por essas
mucosite, dores e infecções oportunistas.
deteriorações nas percepções táteis da língua. A
Também pode promover xerostomia, que pode
redução da massa muscular e força de pressão da
levar a maiores lesões na mucosa por trauma e
língua são associadas ao declínio do processo de
diminuir a sua capacidade de regeneração.29
deglutição, que pode ser agravado com a existência
Função motora
de doenças relacionadas à idade, colocando os
Com o envelhecimento, alguns parâmetros da pacientes geriátricos em maior risco de disfagia. 24
mastigação são alterados, como a diminuição dos
80

Figura 5.3 Esquema das alterações sistêmicas causadas com o envelhecimento.

homens e que a disparidade socioeconômica parece


Lesões bucais em idosos
estar relacionada a uma maior destruição dos
tecidos periodontais. 31 No entanto, a idade, isolada,
Ao longo do tempo diversos hábitos, como
não é diretamente um fator de risco para as doenças
dieta inadequada, uso de álcool, drogas, tabagismo,
periodontais, mesmo que a probabilidade do
sedentarismo, sono de má qualidade e higiene oral
surgimento aumente com o envelhecimento, por ser
precária acabam afetando a saúde e a qualidade de
uma fase em que vários fatores, como autocuidado,
vida do idoso, que pode desenvolver diabetes,
imunidade e nutrição, podem ser prejudicados. 27, 32
doenças cardiovasculares, obesidade, doenças
degenerativas, câncer, insuficiência renal, entre Embora historicamente a incidência de
outros. Em decorrência desses hábitos, lesões doença periodontal é atribuída à exposição
bucais também podem surgir, entre elas as acumulada durante a vida aos fatores de risco, tem
periodontopatias, cárie radicular, doenças sido observado que a suscetibilidade à doença
relacionadas ao uso de próteses e lesões periodontal pode mudar com o envelhecimento.
potencialmente malignas.

Periodontopatias

Estudos epidemiológicos têm mostrado um


aumento na prevalência, extensão e severidade das
periodontopatias com o avanço da idade. Além 33

disso, apontam que a prevalência é maior em


81

Destruição do tecido periodontal com o avanço da As ocorrências mais comuns em idosos são
as gengivites e as periodontites. Nas gengivites a
idade
inflamação restringe-se aos tecidos gengivais

Várias hipóteses vêm tentando explicar a adjacentes aos dentes e uma vez removido o

relação entre a destruição do tecido periodontal e o biofilme, os sinais clínicos de inflamação

avanço da idade: 33 desaparecem e a gengiva retorna ao seu aspecto


32, 34
saudável original. Já as periodontites ocorrem
Hipótese cumulativa com a persistência do processo inflamatório, que se

O aumento da destruição do tecido estende profundamente nos tecidos de suporte

periodontal pode ser explicado pela exposição dental, os quais podem ser progressivamente

crônica aos efeitos da periodontite. 33 perdidos. 34

Hipótese da imunosenescência Fatores de risco

Com o avanço da idade ocorre desregulação Para compreender melhor a periodontite em


do sistema imunológico, alterando os mecanismos uma população idosa, é importante identificar os
de defesa contra patógenos, tanto em nível celular fatores de risco e as eventuais consequências, tais
como molecular, prejudicando a resposta como: 33
imunológica inata e adquirida, e aumentando a
Nutrição
probabilidade do desenvolvimento de doenças
periodontais. 33 Os processos fisiológicos que ocorrem no
organismo e nos tecidos periodontais dependem do
Hipótese da senescência celular
suprimento adequado de vários nutrientes, cuja
Devido a vários estímulos, ocorre a principal fonte é a dieta. 27 Com o envelhecimento,
interrupção do ciclo celular de forma irreversível, ocorrem alterações fisiológicas, processos
ou seja, a proliferação das células presentes no patológicos crônicos e situações individuais que
periodonto, como fibroblastos e queratinócitos, é geralmente interferem sobre o estado nutricional,
alterada. Essas células adquirem um fenótipo refletindo assim a saúde dos tecidos desses idosos.
secretor associado à senescência (SASP), que causa 27, 35

a reprogramação de genes codificadores de


Diabetes tipo II
citocinas, fatores de crescimento e enzimas que
degradam matriz, prejudicando a estrutura e a Atualmente, principalmente entre os idosos,
função dos tecidos envelhecidos. Nesse contexto, o há um predomínio de doenças crônicas não
indivíduo se encontra em um estado inflamatório transmissíveis, entre as quais se destaca o diabetes,
(estado de inflammaging). Nota-se que para esse que constitui um fator de risco adquirido que
processo ocorrer não é necessária a presença de um favorece a suscetibilidade, a ocorrência e a
33
patógeno invasor. progressão das doenças periodontais 36. Mesmo os
82

patógenos periodontais dominantes sendo os um longo período ao fumo, a cigarros sem filtro e
mesmos para pessoas com e sem diabetes, estudos com elevados teores de nicotina, possuem alto risco
demostram que indivíduos metabolicamente de apresentar doenças relacionadas ao cigarro,
descompensados apresentam doença periodontal sendo esse hábito uma das principais causas de
37, 33
em maior extensão e severidade quando periodontite. Indivíduos fumantes apresentam
comparados a pacientes com bom controle maior prevalência, extensão e severidade de doença
32, 36
metabólico ou sistematicamente sadios. Isso periodontal, aumentando a chance de
porque o estado hiperglicêmico crônico de desenvolverem periodontite generalizada grave. O
diabéticos, por meio do acúmulo de produtos da tabagismo propicia um desequilíbrio no meio oral,
glicosilação, provoca danos que levam o paciente a favorecendo o desenvolvimento de bactérias mais
um estado hiperinflamatório, aumentando o risco de agressivas causadoras da doença. Além disso, causa
infecções. Outras pesquisas mostram também que o alterações na microcirculação periférica e na
31
resultado do tratamento periodontal em pacientes resposta imune imediata. Substâncias químicas
controlados é semelhante ao observado em fazem o organismo do fumante reagir
pacientes não diabéticos. 31 vagarosamente à agressão, diminuindo
consideravelmente sua imunidade. Fumantes
Resposta imunológica
apresentam maior velocidade de progressão da
Mesmo pessoas idosas saudáveis doença periodontal e maior risco de perda dentária,
apresentam, geralmente, uma diminuição da função sendo necessário enfatizar a importância da redução
neutrofílica, incluindo redução na quimiotaxia, do fumo para a manutenção da saúde geral e bucal.
fagocitose, citotoxicidade e atividade de enzimas 36

lisossomais. Essa disfunção nas células de defesa


Osteoporose e menopausa
pode conduzir a uma predisposição a infecções
crônicas, como a periodontite, ou ao Tanto a doença periodontal como a
desenvolvimento de gengivite mais severa em seus osteoporose são doenças relacionadas a alterações
estágios iniciais, quando comparada com no metabolismo ósseo. Alguns estudos têm
indivíduos jovens. A resposta das células T também demonstrado maior incidência de doença
diminui com a idade, comprometendo a imunidade periodontal em mulheres com osteoporose durante
celular e interferindo negativamente na saúde oral, a menopausa (período em que o estrógeno diminui
já que esse tipo de defesa age na prevenção de e a suscetibilidade à perda óssea aumenta). Foi
27
infecções. observado ainda que mulheres que realizaram
terapia de reposição hormonal na menopausa,
Tabagismo
indicada frequentemente para prevenção e
Representa um importante acelerador do tratamento da osteoporose, demonstraram
processo de envelhecimento, comprometendo a condições periodontais semelhantes às das
expectativa e a qualidade de vida. Além disso, mulheres que ainda não estavam na menopausa,
idosos tabagistas, por terem sofrido exposições por mostrando que a terapia de reposição hormonal
83

pode ter um possível efeito protetor contra a bactérias periodontais induzem mediadores
deterioração periodontal. 31 inflamatórios, como citocinas pró-inflamatórias, a
ativarem vias que causam neurodegeneração e
A doença periodontal também pode ser um
ativam uma cascata neuropatológica. 38
possível fator de risco para outras doenças: 31
Quando se trata de pacientes idosos, é
Pneumonia por aspiração
necessária atenção especial no tratamento, uma vez
É a principal causa de morte entre pacientes que a inflamação desaparece mais lentamente
em lares de idosos e a segunda causa mais comum quando a placa é removida, em comparação com
de hospitalização desta população. Diferente da pacientes mais jovens. 32
Para determinar um
pneumonia adquirida na comunidade, que é causada prognóstico e um plano de tratamento, é necessário
por patógenos virais e pneumocócicos, a pneumonia analisar o perfil psicológico, médico e físico do
por aspiração é majoritariamente causada por paciente, além da sua capacidade de higienização,
bactérias gram-negativas anaeróbias. Vários visto que o controle diário do biofilme microbiano
patógenos periodontais se encaixam nessa categoria é um fator crítico para o sucesso do tratamento.
de bactérias e são associados à causa dessa doença. Também é necessário passar instruções de higiene
A presença de bolsas periodontais, higiene oral oral de acordo com a realidade de cada indivíduo,
deficiente e uso de dentadura durante o sono enfatizando a importância do estabelecimento de
também foram associados a esse tipo de pneumonia. uma rotina diária de higiene, do uso de dentifrício
32
com flúor, além de mostrar adaptações e
instrumentos alternativos quando necessário, como
Diabetes
escovas interproximais e cabos adaptados ou com
Observa-se que a doença periodontal pode borracha para pacientes com artrite. 27
influenciar no tratamento do diabetes, pois dificulta
A idade não é uma contraindicação para
o controle da glicemia, podendo predispor à
cirurgia periodontal, mas é importante analisar os
resistência à insulina e desencadear um estado de
medicamentos utilizados pelo paciente, realizar as
hiperglicemia crônica. 36
consultas no período da manhã e causar o mínimo
Doença de Alzheimer trauma tecidual possível. Pacientes fragilizados,
dependentes funcionais, emocional ou
É uma das causas mais comuns de demência
psicologicamente incapazes de receber tratamento
em idosos. Até o momento não há nenhuma
cirúrgico poderão ter a raspagem e o alisamento
evidência direta relacionando a doença periodontal
radicular como uma forma de tratamento. Para
na patogênese do Alzheimer. Entretanto estudos
pacientes que não alcançam um nível aceitável de
tem tentado associar essas duas condições,
higiene, uma alternativa são bochechos com
sugerindo que processos periféricos como a doença
clorexidina 0.12% duas vezes ao dia. 27, 32
periodontal podem acelerar o início da progressão
da Doença de Alzheimer. Nessa hipótese, as
84

Além das gengivites e periodontites, a cumulativa aos fatores de risco leva à maior
recessão gengival é frequentemente associada à prevalência de recessão gengival e cárie radicular
idade, sendo possível identificar na maioria dos com o aumento da idade. 39
adultos com mais de 50 anos (95%) evidências
claras dessa condição. Entretanto, apenas 20% deles
apresentará sinais consistentes de destruição
32
periodontal ativa. A recessão gengival no
paciente idoso provoca um risco maior de abrasão
cervical, sensibilidade dentinária e cárie radicular.
No idoso, por causa da formação de dentina 39

secundária, a sensibilidade cervical é menor,


podendo ser tratada de forma conservadora, com As lesões de cárie radicular podem ocorrer

pastas, géis e vernizes de flúor. Nos casos de em todas as superfícies radiculares expostas, mas

sensibilidade severa, provavelmente faz-se são encontradas principalmente em locais de

necessária a cobertura da raiz exposta ao meio bucal retenção de biofilme, como ao longo da junção

com enxertos, ionômeros ou resinas. É importante cemento-esmalte, nas concavidades mesial e distal

reeducar o paciente e reforçar as técnicas de e ao longo das margens das restaurações. A

higiene, recomendando escovas macias e classificação das lesões é realizada a partir da

dentifrícios não abrasivos para aqueles com abrasão atividade da doença cárie, sendo as lesões ativas as

cervical ou recessão significativa. Para o tratamento moles à sondagem, com coloração amarelada ou

da recessão gengival, é necessário, inicialmente, marrom claro, sem cavitação. As lesões inativas

controlar os fatores, como a inflamação gengival e apresentam superfície dura e escurecida, mesmo

escovação traumática, bem como as áreas com que tenham atingido estágio de cavitação. 39

mínima recessão, que podem permanecer estáveis Geralmente as superfícies radiculares


por algum tempo. O aumento gengival por meio de expostas apresentam uma zona superficial
procedimentos cirúrgicos pode estabilizar a hipermineralizada, devido aos cristais de apatita
recessão, tornando a higiene oral mais confortável e dessa região serem mais susceptíveis à absorção de
32
diminuindo o acúmulo de placa e gengivite. minerais do meio bucal. A cirurgia periodontal e o
desbridamento mecânico agressivo podem quebrar
Cárie Radicular ou remover essa camada superficial, expondo os
túbulos dentinários e levando à hipersensibilidade,
Como mencionado no tópico anterior, com o
e possivelmente a um acúmulo de biofilme. Apesar
aumento da idade, a prevalência de recessão
disso, com uma higiene adequada e uso de creme
gengival aumenta e todas as superfícies radiculares
dental fluoretado, uma nova camada
expostas correm risco de desenvolver cáries
hipermineralizada pode se desenvolver alguns
radiculares. Apesar de não serem alterações
meses após a raspagem e alisamento radicular. 39
propriamente do envelhecimento, a exposição
85

Por ser uma condição multifatorial, o intervenções terapêuticas – 1. dentifrício fluoretado,


tratamento da cárie radicular deve começar pela 2. aplicação anual de Ag2F a 38%, higienização e 3.
identificação de fatores de risco do indivíduo, que aplicação quadrimestral de verniz de NaF a 5% e
devem ser modificados de acordo com suas somente a higiene oral individualizada – observa-se
necessidades. É importante salientar que o efeito que todas foram mais eficazes na prevenção de
dos fluoretos em relação ao desenvolvimento de novas lesões de cárie radicular do que apenas
cárie limita-se à quantidade de ácidos produzidos instruções de higiene oral, e que nenhuma delas foi
pelo biofilme, razão pela qual é necessário superior à outra. 39
equilibrar o controle da placa com a exposição ao
O tratamento invasivo das lesões radiculares
açúcar e flúor. 39
só é indicado quando há presença de lesão ativa em
O tratamento não invasivo das lesões de cárie uma cavidade que impossibilita a higienização,
radicular envolve a utilização de fluoretos em dando preferência a técnicas minimamente
diferentes formulações. Os cremes dentais, quando invasivas. Os cimentos de ionômero de vidro de alta
em concentração de 5000 ppm de flúor, parecem viscosidade têm sido materiais preferenciais para
reduzir a progressão da cárie de maneira mais restauração de cáries radiculares porque se ligam
efetiva do que os em concentrações convencionais quimicamente à superfície da raiz e podem ser
– 1000 ppm. Já a aplicação profissional de gel de utilizados em abordagens minimamente invasivas,
fluoreto de sódio (NaF), com 12.000 ppm, a cada como o tratamento restaurador atraumático.
quatro meses, nas lesões ativas não cavitadas foi Contudo, tanto restauração em ionômero de vidro
bem-sucedida na prevenção de cárie radicular. Há como em resina composta apresentam falhas devido
também a possibilidade de aplicação de verniz à à dificuldade no controle de umidade durante o
base de NaF a 5% nas lesões não cavitadas. 39 procedimento restaurador nos idosos. 39

O uso de fluoreto de diamina de prata (Ag2F)


Doenças relacionadas ao uso de
é um tratamento alternativo para interromper e
prevenir o desenvolvimento de novas cáries, pois prótese
tem efeito antimicrobiano e forma um revestimento
esclerótico na superfície da dentina cariada. Porém, Úlceras traumáticas
causa o seu escurecimento, e o contato com mucosa
oral provoca queimaduras químicas levemente A ulceração traumática ocorre quando uma

dolorosas. O uso de uma combinação de fluoreto de lesão da mucosa oral resulta em perda completa do

prata aquoso 40% e flúor de estanho 10% é uma epitélio superficial. As lesões ulceradas da cavidade

alternativa para evitar queimaduras e irritação oral podem ser causadas por vários fatores

gengival. 39 etiológicos. Entre eles, os mais comuns são


infecção, imunidade, neoplasia e trauma (químico,
Ao comparar o efeito da higiene oral
térmico, elétrico ou mecânico, agudo ou crônico). 40
individualizada somada a diferentes métodos de
86

O traumatismo mecânico é resultado de trauma, embora cuidados para aliviar os sintomas


mordida acidental da mucosa, má oclusão, dentes possam ser necessários. Um anestésico tópico ou
com cúspides ou bordas incisais pontiagudas, películas protetoras com cloridrato de diclonina ou
próteses mal adaptadas e restaurações defeituosas. hidroxipropil celulose podem ser aplicados para
41
A úlcera traumática está entre as doenças bucais alívio da dor. Além disso, caso as próteses estejam
mais comuns encontradas em idosos, mal adaptadas, elas devem ser substituídas ou
principalmente os usuários de próteses mal ajustadas. 40, 43
ajustadas e mal higienizadas. 42
Hiperplasias
Quando a origem do trauma é mecânica, as
lesões podem ser de natureza aguda ou crônica, e Hiperplasia fibrosa induzida por prótese dentária (epulis
ocorrer na língua, lábios, mucosa jugal, gengiva, fissuratum)
40
palato e fundo de vestíbulo. Geralmente são
lesões individuais com área eritematosa que
circunda uma membrana removível, central,
amarela e fibrinopurulenta. A lesão também pode
desenvolver um halo endurecido, esbranquiçado e
hiperqueratótico, adjacente à área de ulceração
43
(Figura 5.4). O diagnóstico é geralmente com
base na história e no exame clínico. Se a úlcera
persistir após duas semanas ou possuir
manifestação suspeita de malignidade, uma biópsia
deve ser realizada. 44 Figura 5.5 Hiperplasia fibrosa inflamatória induzida por
prótese dentária. Pregas de tecido hiperplásico no fundo de
vestíbulo maxilar anterior esquerdo. Imagem do acervo do
O tratamento de ulcerações traumáticas Ambulatório de Estomatologia da Universidade Estadual de
concentra-se na remoção da fonte etiológica do Londrina, cedida gentilmente pelo professor Dr. Fábio
Augusto Ito.

Figura 5.4 Úlcera traumática na região central com halo Figura 5.6 Hiperplasia fibrosa inflamatória induzida por
hiperqueratótico em rebordo alveolar inferior, associado ao prótese dentária. Pregas de tecido hiperplásico no rebordo
uso de prótese total. Imagem do acervo do Ambulatório de alveolar inferior. Imagem do acervo do Ambulatório de
Estomatologia da Universidade Estadual de Londrina, Estomatologia da Universidade Estadual de Londrina,
cedida gentilmente pelo professor Dr. Fábio Augusto Ito. cedida gentilmente pelo professor Dr. Fábio Augusto Ito.
87

É uma lesão adaptativa em resposta a um de um exame histopatológico do tecido removido e


trauma crônico de baixo grau, devido ao uso de readaptação ou substituição da prótese. 43
próteses mal adaptadas. Sua maior ocorrência é na
parte anterior da mandíbula e da maxila e afeta mais
o sexo feminino. As principais queixas são a
existência de uma massa fibrosa, dor e desuso ou
45
necessidade da confecção de uma nova prótese.
Pode apresentar dobras simples ou múltiplas de
tecido hiperplásico, que são firmes à palpação, e se
houver uma infecção associada, áreas eritematosas
e ulcerações podem estar presentes (Figura 5.5 e
5.6). 46 Figura 5.7 Pólipo Fibroepitelial em palato duro com
inserção pediculada, margens recortadas e ulceradas, com
centro avermelhado e consistência firme. Imagem do acervo
A remoção da lesão e a adaptação protética do Ambulatório de Estomatologia da Universidade Estadual
de Londrina, cedida gentilmente pelo professor Dr. Fábio
são os tratamentos para a epulis fissuratum.
Augusto Ito.
Geralmente é realizada uma cirurgia com bisturi,
Hiperplasia por câmara de sucção
sendo possível também utilizar um eletro cautério.
Novos estudos sugerem que o uso de laser de A câmara de sucção é uma depressão na
dióxido de carbono em pacientes que utilizam porção central interna da prótese total superior. Era
medicamentos antitrombóticos pode trazer realizada com o objetivo de promover um vácuo
benefícios, devido a precisão do corte, menor risco que aumentaria a retenção e estabilidade da prótese.
de infecção da ferida, além de uma boa Porém, seu uso não é mais indicado porque a
homeostasia, minimizando a ocorrência de uma retenção não é duradoura e a presença da cavidade
possível hemorragia pós-operatória. 45
Outra promove a formação de uma lesão reacional
sugestão para esses pacientes é a criocirurgia, hiperplásica. Em geral, a lesão é assintomática, de
técnica indolor, que gera homeostase por necrose e consistência firme e de superfície lisa. Pode
que, em comparação a outras, é mais barata e, aparecer em associação com a hiperplasia papilar
portanto, adequada para pacientes geriátricos. 46 inflamatória, apresentando, neste caso, superfície
papilomatosa.47
Pólipo Fibroepitelial
É uma lesão que ocorre no palato duro, Para regressão das lesões lisas é
abaixo de uma prótese superior, apresentando-se recomendado reembasar a prótese em seções, até o
como uma massa plana, de coloração rosa, aderida total preenchimento da região de depressão,
ao palato por um estreito pedículo, que se assenta deixando a superfície uniforme. Caso a lesão não
no palato, podendo formar uma depressão, cujos regrida, uma remoção cirúrgica pode ser
bordos se assemelham a uma folha (Figura 5.7). O recomendada. São opções de tratamento:
tratamento consiste na remoção cirúrgica, seguida crioterapia, cirurgia com bisturi elétrico e uso de
88

lasers, técnicas consideradas menos traumáticas, comensal, e normalmente não apresenta evidência
pois proporcionam rápido reparo tecidual.47 clínica de infecção. No entanto, se ocorre uma
modificação do microambiente da cavidade oral, o
Hiperplasia Papilar Inflamatória
aparecimento de infecções oportunistas é
É um crescimento de tecido reacional que se
favorecido e a Candida se torna um patógeno. 43, 48,
desenvolve abaixo da dentadura. Embora a 49
Sua ocorrência é frequente em idosos que
patogênese exata seja desconhecida, a condição
apresentam alterações sistêmicas e têm mecanismos
frequentemente parece estar relacionada a
de defesa senescentes, favorecendo essa variação no
candidose, prótese removível mal adaptada, uso
microambiente. O uso de medicamentos,
contínuo de prótese e higienização inadequada.
xerostomia, próteses mal ajustadas, perda da
Inicialmente, as lesões podem envolver somente a
dimensão vertical, higiene bucal precária,
abóbada palatina, embora casos avançados
tabagismo e etilismo são fatores que também estão
acometam toda a superfície do palato (Figura 5.8).
associados ao desenvolvimento de candidose em
Frequentemente é assintomática, apresenta áreas
idosos. 49, 50 As manifestações clínicas são variadas
eritematosas na mucosa e possui superfície
e dependem do estado imunológico do hospedeiro e
50
da extensão da doença. Entre os idosos as
manifestações de maior relevância são:

Candidose eritematosa

Manchas vermelhas lisas no palato duro ou


mole, dorso da língua ou mucosa bucal. Embora
seja clinicamente negligenciada, é muito prevalente
nos pacientes com xerostomia. É possível observar
Figura 5.8 Hiperplasia papilar inflamatória. Múltiplas várias apresentações clínicas, como a candidose
pápulas em palato duro com áreas eritematosas em usuário
de prótese total superior. Imagem do acervo do Ambulatório atrófica aguda, que geralmente surgem após um
de Estomatologia da Universidade Estadual de Londrina,
cedida gentilmente pelo professor Dr. Fábio Augusto Ito.
curso prolongado de antibioticoterapia de amplo
espectro. A sintomatologia é relatada como boca
“pedregosa” ou papilar. O tratamento dessa lesão é
queimada por bebida quente e geralmente está
semelhante ao da candidose, com exceção de alguns
acompanhada pela perda difusa das papilas do dorso
casos persistentes e exuberantes, nos quais é
e aparência avermelhada. As outras apresentações
necessário fazer a remoção cirúrgica da lesão. 43
geralmente são assintomáticas e crônicas, como a
Candidose
atrofia papilar central da língua, que aparece como
uma zona eritematosa bem demarcada que afeta a
A candidose é causada por leveduras do
linha média, no dorso posterior da língua. Quando
gênero Candida, principalmente da espécie
atinge mais sítios, passa a ser chamada de candidose
Candida albicans. Esse fungo está presente na
multifocal crônica, envolvendo o limite palato
microbiota oral normal como um organismo
duro/mole e a comissura bucal. 43
89

Estomatite protética Tabela 5.1 Classificação da estomatite protética segundo


os critérios de Newton.
É a lesão mais comum associada ao uso de
próteses removíveis, sendo ainda mais prevalente
em idosos. Consiste em um processo inflamatório
na mucosa que suporta a prótese, geralmente
assintomático, caracterizado por áreas eritematosas
difusas ou pontilhadas, hiperemia, edema e, em
alguns casos, pode apresentar petéquias
hemorrágicas. É considerada multifatorial, e além
da candida estão envolvidos na sua etiopatogenia a
saúde geral e a rugosidade, material, forma e ajuste
da prótese.51 Normalmente, o paciente relata
remover a prótese apenas para higienização. Desta
forma, o desenvolvimento da infecção pode ser
associado ao uso contínuo da prótese, como
resposta tecidual do hospedeiro aos vários
microrganismos que colonizam a prótese.43 O uso
da prótese por longos períodos seguidos também
provoca degeneração das glândulas salivares caracteriza como uma mancha branca que não pode
palatinas, diminuindo assim a secreção salivar, o ser removida por raspagem. Essa condição é
que diminui o pH da cavidade oral, favorecendo a descrita por alguns pesquisadores como uma
proliferação fúngica, além de prolongar a irritação candidose superposta a uma leucoplasia
51
local. preexistente. No entanto, em alguns casos a

A estomatite protética pode ser classificada Candida sozinha é capaz de induzir uma lesão

em três grupos, utilizando os critérios de Newton hiperqueratótica. Quando há leucoplasia associada,

(Tabela 5.1).51

O diagnóstico costuma ser estabelecido pelos


sinais clínicos e pode ser confirmado por
microscopia ou isolamento da cultura. As técnicas
microbiológicas são utilizadas quando é necessário
fazer o diagnóstico diferencial de outras doenças ou
em casos caracterizados por resistência aos
49
antifúngicos. Já as biópsias são indicadas em Figura 5.9 Estomatite Protética do Tipo I (Hiperemia
Puntiforme). Aspecto eritematoso puntiforme, em no palato.
49
pacientes com candidose crônica hiperplásica, Imagem do acervo do Ambulatório de Estomatologia da
Universidade Estadual de Londrina, cedida gentilmente pelo
uma forma de candidose menos comum que se professor Dr. Fábio Augusto Ito.
90

as lesão podem conter áreas vermelhas e brancas,


que podem apresentar frequência de maior
displasias. O diagnóstico é confirmado pela
presença de hifas de Candida associadas à lesão e,
ainda mais importante, pela resolução completa da
lesão após a terapia antifúngica. 43

Figura 5.11 Glossite romboidal mediana. Áreas


eritematosas bem demarcadas de atrofia papilar central no
dorso da língua. Imagem do acervo do Ambulatório de
Estomatologia da Universidade Estadual de Londrina,
cedida gentilmente pelo professor Dr. Fábio Augusto Ito.

Figura 5.10 Estomatite Protética do Tipo II (Hiperemia Com a idade, o estado nutricional dos
Difusa). Áreas eritematosas difusas com exsudato branco indivíduos pode ser afetado por diversos fatores,
em palato. Imagem do acervo do Ambulatório de
Estomatologia da Universidade Estadual de Londrina, como dificuldade na utilização de próteses e
cedida gentilmente pelo professor Dr. Fábio Augusto Ito.
hipossalivação. Assim sendo, é possível que a
Glossite romboidal mediana ou atrofia papilar central deficiência de alguns nutrientes, como riboflavina,
niacina, piridoxina, vitamina B12, ácido fólico,
Atualmente reconhecida como uma
ferro, zinco e vitamina E cause a atrofia papilar
candidose eritematosa, geralmente é assintomática
central. Nesse caso, uma dieta balanceada e
e crônica, e provoca a atrofia das papilas centrais do
suplementação nutricional se fazem necessárias,
43, 52
dorso lingual (papilas filiformes).
podendo resultar na remissão parcial ou completa
Clinicamente, aparece como uma área eritematosa
da doença. 53
bem demarcada na linha média do dorso posterior
Queilite angular
da língua, onde geralmente a lesão é simétrica e sua
superfície varia de lisa a lobulada. 43 Lesão eritematosa com fissuras e
Alguns pacientes com essa condição também descamação na região das comissuras labiais.
podem apresentar sinais de infecção por cândida em Ocorre com grande frequência em idosos que
outros sítios como no limite entre o palato possuem perda da dimensão vertical e pregas
duro/mole e na comissura bucal, desenvolvendo um acentuadas na comissura bucal, fazendo com que a
quadro denominado de candidose multifocal saliva se acumule nessas áreas, mantendo-as úmidas
crônica. A lesão no palato pode ser resultado do que e favorecendo infecção por levedura. Além disso, a
se chama lesão “kissing”, em que a língua queilite angular pode ser um componente da
lesionada, em repouso, encosta no palato (Figura candidose multifocal crônica (Figura 5.12). 43
5.11). 43
91

Figura 5.12 Queilite angular. Áreas eritematosas Figura 5.13 Candidose pseudomembranosa. Placas
fissuradas nas comissuras labiais, marcadas por brancas removíveis no palato, sobrejacentes à alteração
ressecamento e descamação. Imagem do acervo do mucosa eritematosa. Imagem do acervo do Ambulatório
Ambulatório de Estomatologia da Universidade Estadual de Estomatologia da Universidade Estadual de
de Londrina, cedida gentilmente pelo professor Dr. Fábio Londrina, cedida gentilmente pelo professor Dr. Fábio
Augusto Ito. Augusto Ito.

Candidose pseudomembranosa (sapinho) próteses. É importante que o paciente não faça uso
contínuo da prótese, removendo-a
Placas brancas aderentes semelhantes a preferencialmente na hora de dormir. 55
Outro
coalhada, em um fundo normal ou eritematoso, que aspecto a considerar é a possível substituição da
é exposto após a remoção da placa com uma prótese por uma com melhor adaptação. 56
espátula ou esfregando gaze seca. É encontrada
normalmente na mucosa jugal, palato e dorso da Recomenda-se a terapia com antifúngico
tópico, geralmente é realizada com Nistatina
língua. Os sintomas não costumam ser frequentes,
100.000 UI/ml, administrada três a quatro vezes ao
mas quando presentes, são brandos, consistindo em
dia durante 7 dias. A eficácia do tratamento depende
uma sensação de queimação da mucosa oral ou em
do tempo de contato com a mucosa oral, que deve
um gosto desagradável na boca, descrito como
ser de ao menos dois minutos. 50 Vale ressaltar que
salgado ou amargo (Figura 5.13). 43
essa droga deve ser usada com cautela em pacientes
O objetivo do tratamento das candidoses é diabéticos, pois tem baixa tolerância e alto teor de
extinguir os sinais e sintomas e prevenir a açúcar, além de apresentar potencial cariogênico. É
recorrência. Tendo em vista que essas doenças estão importante alertar também o paciente que utiliza
relacionadas ao desequilíbrio entre o agente prótese que ela deve ser removida para permitir o
colonizador e os mecanismos de defesa locais ou contato de toda a mucosa com o antifúngico.
sistêmicos, deve-se buscar atuar no controle da Ademais, a superfície da mucosa deve ser
doença de base e / ou na remoção das condições higienizada com uma escova de cerdas macias. 54
50
predisponentes. A higiene bucal e os antifúngicos Para o manejo da estomatite protética, alguns
tópicos são geralmente indicados para o tratamento estudos recomendam o uso de lazer de baixa
54
da candidose oral. potência e de diodo. 56
A higiene deve ser realizada diariamente e
incluir tanto a limpeza da cavidade bucal, como das
92

Caso seja necessária a terapia sistêmica (em associados à forma secundária o diabetes mellitus,
caso de pacientes diabéticos ou o hipotireoidismo, a síndrome de Sjogren, o lúpus
imunocomprometidos) a melhor opção é o eritematoso, assim como alergias a metais (zinco,
fluconazol uma vez por dia. O cetoconazol é tão cobalto, mercúrio, ouro e paládio), ácidos (sórbico,
eficaz quanto o fluconazol, mas seu uso em nicotínico e benzóico), canela, propilenoglicol e
pacientes idosos não é recomendado, devido a lauril sulfato de sódio. Evidências apontam que o
interações medicamentosas e efeitos colaterais, que desenvolvimento da SAB também pode estar
50, 54
incluem hepatotoxicidade. relacionado à presença de deficiências nutricionais
(B1, B2, B6, B12 e ácido fólico) e ao uso de
Por fim, no tratamento da quilite angular são
medicamentos inibidores da enzima conversora de
utilizados cremes e pomadas que contêm
angiotensina, bloqueadores do receptor da
corticoides e antifúngicos, salientando que se
57
angiotensina e levodopa.
houver lesões intraorais causadas por cândida elas
devem ser tratadas. 54 O diagnóstico da SAB é desafiador, pois o
quadro clínico costuma ser variável e os critérios de
Síndrome da ardência bucal (SAB)
diagnóstico não são universais, exigindo do
profissional uma extensa investigação de fatores
A Síndrome da ardência bucal é um distúrbio
locais e sistêmicos e um exame físico minucioso. Os
crônico e doloroso, que possui como principal
critérios utilizados para diagnóstico são a presença
característica a queimação, ardência e/ou coceira na
de: 57
língua ou em outras regiões da mucosa oral e lábios,
sem que exista qualquer doença orgânica que  Sensação de queimação diária e bilateral
justifique tal condição. É acompanhada por profunda da mucosa oral;
disgeusia e xerostomia. A etiologia não é exata.  Sensação de queimação por pelo menos 4 a 6
Provavelmente é uma síndrome de origem meses;
multifatorial, que inclui causas neuropsiquiátricas,  Intensidade constante, ou crescente durante o
endócrinas, imunológicas, nutricionais, infecciosas dia;
e iatrogênicas. Mulheres na peri e pós-menopausa  Possível melhora ao comer ou beber;
possuem predisposição para desenvolverem a SAB,  Nenhuma interferência com o sono;
devido a alterações dos níveis de estrogênio e  Disgeusia e / ou xerostomia;
progesterona, que causam secura das mucosas e  Alterações sensoriais ou quimiossensoriais;
aumento da frequência de distúrbios psicológicos.  Mudanças de humor ou alterações
57
psicopatológicas.

A SAB pode ser primária – para a qual as Exames laboratoriais devem incluir
causas orgânicas não podem ser identificadas –, avaliação hematológica, de deficiências
idiopática, ou secundária – quando resulta de nutricionais, de níveis de glicose, de marcadores
condições patológicas locais ou sistêmicas. Estão autoimunes, de concentrações de estrogênio e
93

progesterona, além de teste de contato para alergias jugal, lábios, gengiva, assoalho bucal e língua.
específicas. Deve ser realizada a medição da taxa de Além disso, geralmente são reconhecidas como
fluxo salivar, e, se necessário, culturas orais e homogêneas – quando a lesão é predominantemente
raspagem para avaliação de infecções bacterianas e branca, com superfície plana e uniforme, aparência
fúngicas. A biópsia da língua não é necessária se a delgada e consistência normal –, ou não
sua aparência for normal, sendo indicada apenas homogêneas – quando a lesão é predominantemente
quando houver uma lesão que a justifique. 57 branca, com superfície irregular, nodular ou
exofítica (Figura 5.14 e 5.15). 43, 52
Por ser uma condição multifatorial, o
tratamento é complexo. Dessa maneira, um
diagnóstico preciso desempenha um papel
importante no alívio da ansiedade e medo do
paciente. Alguns dos medicamentos utilizados para
o controle da síndrome da ardência bucal são os
neuromoduladores centrais como os
antidepressivos tricíclicos, inibidores de recaptação
de serotonina e norepinefrina. Devido ao risco de
quedas e distúrbios cognitivos, os Figura 5.14 Leucoplasia. Placa branca em borda
esquerda de língua, não removível a raspagem, com
benzodiazepínicos e gabapentinoides devem ser
limites bem definidos, apresentando pequenas fissuras.
prescritos com cautela aos pacientes geriátricos. Imagem do acervo do Ambulatório de Estomatologia da
Universidade Estadual de Londrina, cedida gentilmente
Outra possibilidade de tratamento é a terapia pelo professor Dr. Fábio Augusto Ito.
cognitivo-comportamental, que pode ser feita de
maneira individual ou em grupo. 58

Lesões potencialmente malignas

Leucoplasia

A leucoplasia, entre as lesões potencialmente


malignas é a mais comum. A predisposição é maior
Figura 5.15 Leucoplasia. Mancha branca em borda
entre os homens e com a idade sua prevalência
direita de língua e assoalho bucal, com limites difusos e
aumenta, atingindo 8% dos indivíduos com mais de forma irregular, exibindo aspecto homogêneo. Imagem do
acervo do Ambulatório de Estomatologia da Universidade
43
70 anos. A causa dessa condição ainda não é Estadual de Londrina, cedida gentilmente pelo Prof. Dr.
Fábio Augusto Ito.
conhecida embora hipóteses apontem o tabagismo
como possível fator etiológico. 43
Clinicamente, as Para definir o diagnóstico, primeiramente o
leucoplasias podem ser isoladas e localizadas ou profissional deve procurar excluir outras possíveis
múltiplas e difusas, podendo ocorrer na mucosa lesões com aspecto semelhante e, em seguida, é
94

importante realizar uma biópsia para obter o principal objetivo do tratamento é a prevenção da
diagnóstico histopatológico e desenvolver o transformação maligna. Normalmente realiza-se a
tratamento apropriado. 52 Cessar o hábito de fumar resseção cirúrgica, seguida de avaliação
faz parte do tratamento uma vez que, em casos de histopatológica. Quando é identificada a presença
leucoplasias associadas ao tabaco, sem e com de carcinoma espinocelular, o paciente deve ser
displasia, a lesão pode desaparecer ou diminuir de encaminhado e tratado por um cirurgião de cabeça
tamanho com o tempo. No entanto, a remoção pode e pescoço. Além disso, devido à possível
ser necessária, e as alternativas são excisão recorrência de eritroplasia, é sugerido longo período
cirúrgica, eletrocauterização, criocirurgia ou de acompanhamento. 43, 52
ablação a laser. Mesmo após a remoção, é
Queilite actínica
importante realizar consultas periódicas, pois é
possível que haja recorrência. Muitas vezes, a
A queilite actínica é uma condição
leucoplasia sem displasia não é removida, sendo
potencialmente maligna do vermelhão do lábio
necessária uma avaliação clínica a cada seis meses,
inferior, causada pela exposição excessiva a
pois há possibilidade de progressão da doença. 43
radiação ultravioleta (UV). Essa é uma doença cuja
incidência aumenta em regiões próximas à Linha do
Eritroplasia
Equador e geralmente ocorre em idosos de pele
clara sendo mais prevalente em homens. Além da
A eritroplasia é definida como uma mancha
radiação UV, fatores como imunossupressão e
ou placa vermelha bem delimitada, eritematosa, de
tabagismo podem aumentar as chances de evolução
superfície brilhante ou aveludada, sendo mais
da queilite actínica para um carcinoma
prevalente no assoalho bucal, língua e palato mole.
43
epidermoide. Clinicamente, ocorre um
Essa condição é mais prevalente em idosos, e possui
espessamento da semimucosa labial, o vermelhão
forte associação com hábitos de tabagismo e
do lábio fica esbranquiçado e muitas vezes a linha
etilismo, apresentando alto risco de malignização.
Como a maioria das eritoplasias verdadeiras
apresentam displasia epitelial, carcinoma in situ, ou
carcinoma epidermoide, o diagnóstico precoce é
muito importante. Entretanto, por ser
frequentemente assintomática, esta conduta é
43
prejudicada. Da mesma maneira que na
leucoplasia, o profissional deve inicialmente excluir
a possibilidade de ser outra lesão com aspecto
similar à eritoplasia, como mucosite não específica,
Figura 5.16 Queilite actínica. Placa esbranquiçada,
candidose, psoríase ou lesões vasculares. Nos casos irregular e difusa no vermelhão do lábio inferior. Há
perda da linha mucocutânea. Imagem do acervo do
em que outra condição não é diagnosticada, é Ambulatório de Estomatologia da Universidade Estadual
52 de Londrina, cedida gentilmente pelo professor Dr. Fábio
importante que uma biópsia seja realizada. O Augusto Ito.
95

que separa a pele e a semimucosa perde a definição. encontram-se o consumo de tabaco e álcool, a
O lábio também pode apresentar descamação, exposição crônica à radiação solar nos lábios,
fissuras transversais, ressecamento, edema, placas infecções por HPV e deficiências nutricionais. 60 - 61
brancas, eritemas, erosões hiperpigmentação,
Os idosos representam 10 a 11% da
hipopigmentação, crostas, sangramento, 62
população geral de fumantes no Brasil.
52
endurecimentos, nódulos e úlceras (Figura 5.16).
Tabagistas têm um aumento dose-dependente no
Como muitas vezes a queilite actínica é risco de desenvolver câncer, visto que o contato do
assintomática e demora muitos anos para se tornar fumo com a mucosa bucal causa agressão térmica,
maligna, é muito difícil detectá-la e intervir provocando uma inflamação crônica que favorece o
precocemente, o que seria ideal para prevenir a aparecimento de lesões predisponentes e que o
progressão para um câncer de lábio. As alterações tabaco contém mais de 70 agentes cancerizáveis. 63-
64
relacionadas a essa condição frequentemente são O consumo de álcool age de maneira sinérgica
irreversíveis. Mesmo assim, é importante que o com o tabagismo, uma vez que aumenta a
paciente reduza exposição ao sol, utilize protetor permeabilidade da mucosa, facilitando a absorção
63
solar e chapéu com aba para evitar mais danos. das substâncias presentes no cigarro. Muitas
Também é essencial realizar biópsia das áreas vezes a condição nutricional do idoso não é
afetadas para descartar um carcinoma. 43 A principal satisfatória. Quando deficiências nutricionais como
forma de tratamento é a excisão cirúrgica. No de vitamina C, niacina, riboflavina e ferro são
entanto, muitas vezes o lábio todo é afetado, o que combinadas com o consumo de álcool, a função
dificulta a realização do procedimento, sendo celular na região da mucosa é prejudicada podendo
mesmo assim indicado em casos de queilite actínica promover o câncer. 74
com displasia epitelial é comprovada por biópsia
A intensidade e o tempo de exposição solar
prévia. 52
parecem ser preponderantes para o

Câncer de boca desenvolvimento do câncer bucal, tratando-se de


um fator importante para a sua ocorrência em idosos
O Câncer Bucal é um termo utilizado para as que habitam zonas rurais e que se expõem com
diversas neoplasias malignas localizadas na frequência a radiações UV. O conhecimento desses
cavidade bucal e lábios, sendo a língua – geralmente fatores possibilita identificar os pacientes com
na região lateral posterior e nas superfícies ventrais maiores probabilidades de desenvolver o câncer e
43
– e o assoalho de boca, os locais mais afetados. É agir precocemente. 60
A detecção precoce de uma
mais comum entre homens caucasianos a partir dos lesão maligna traz melhores prognósticos.
59
50 anos. À medida que a idade avança, os Entretanto, a maior parte dos cânceres de boca
indivíduos tornam-se mais suscetíveis ao diagnosticados, especialmente no Brasil, já se
desenvolvimento dessa doença, conforme são encontra em estágios mais avançados. 65
expostos a fatores de risco, cuja somatória pode
levar ao seu aparecimento, entre os quais
96

O câncer bucal intraoral apresenta-se Buscando motivar o paciente a reduzir o uso


clinicamente como lesões vermelhas, brancas ou de tabaco e álcool, o profissional pode lançar mão
mistas. Pode ter aspecto aveludado, ser uma úlcera da utilização de terapia cognitivo-comportamental
com margens elevadas e endurecidas e/ou onde o usuário e o seu médico discutem e analisam
exofíticas, bem como apresentar um crescimento cada situação dita gatilho e como contorná-las.
verrucoso. Essas lesões normalmente são Além disso, caso haja necessidade, medicações para
assintomáticas até se tornarem invasivas. 66 Quando aliviar as crises de abstinência podem ser utilizadas.
68, 69
a lesão é no lábio, geralmente está associada à No que tange à exposição solar, a orientação
queilite actínica, e se manifesta como uma deve abordar métodos preventivos adicionais, como
ulceração endurecida, indolor, crostosa e exsudativa uso de chapéus ou bonés, uso de protetores solares
(Figura 5.17). 43 corporais e labiais e conscientização sobre os
efeitos da exposição solar entre as 10 e as 16 horas.
60

O tratamento do câncer de boca envolve


cirurgia, radioterapia e/ou quimioterapia. É
importante que o cirurgião-dentista conte com uma
equipe multidisciplinar, composta por cirurgiões de
cabeça e pescoço, radioterapeutas e oncologistas
clínicos, que determinará qual a melhor combinação
Figura 5.17 Carcinoma espinocelular. Úlcera neoplásica
em borda esquerda e ventre de língua, com forma e de procedimentos, levando em consideração o local
superfície irregular, bordas elevadas, endurecidas e
limites pouco definidos. Imagem do acervo do
e o tamanho da lesão. Antes de iniciar o tratamento
Ambulatório de Estomatologia da Universidade Estadual é necessário eliminar os focos de infecção da boca
de Londrina, cedida gentilmente pelo professor Dr. Fábio
Augusto Ito. que possam causar a interrupção do tratamento
O exame preventivo é de simples execução. oncológico ou complicações após o tratamento,
Requer um profissional vigilante em relação aos como a osteorradionecrose. 66
sinais e sintomas da mucosa que desviem dos
padrões e que se assemelhem a lesões com potencial Manejo odontológico ao idoso
de malignização, principalmente as encontradas em
pacientes com exposição importante aos fatores de O tratamento do paciente idoso difere do

risco. A realização da biopsia é fundamental e tratamento da população em geral, pois deve levar

sempre obrigatória para o diagnóstico definitivo da em conta as mudanças fisiológicas durante o

lesão. Outra estratégia de prevenção é educar o processo de envelhecimento natural, a presença de

paciente. Dentre as informações a serem doenças sistêmicas crônicas e a alta incidência de

repassadas, destacam-se os esforços para diminuir deficiências físicas e mentais. Além desses fatores,

os fatores de risco e orientações sobre como realizar o prognóstico e o atendimento são influenciados

o autoexame. 67
97

pelo caráter psicológico, motivacional e emocional enxergam sua saúde bucal de forma favorável,
do paciente. 70 apesar de apresentarem condições clínicas
insatisfatórias. Dessa maneira, não priorizam a
A condição psicológica do idoso precisa ser
visita ao cirurgião-dentista e acabam ignorando
levada em consideração pelo cirurgião dentista,
alterações bucais, o que dificulta o diagnóstico
reconhecendo que cada tratamento é único e que
precoce de condições como o câncer bucal. Sendo
cada indivíduo possui características, experiências,
27
assim, é essencial que os profissionais incentivem a
expectativas e necessidades próprias. O
autopercepção de seus pacientes, explicando que a
atendimento deve ser acolhedor e personalizado,
saúde bucal nessa faixa etária possui características
chamando o idoso pelo nome, dirigindo-se a ele e
particulares, e que mesmo com perdas dentárias, a
não ao acompanhante, com exceção dos casos em
visita regular ao dentista se faz necessária para a
que o paciente possui alguma dificuldade que não
avaliação clínica dos tecido moles bucais e para a
lhe permita prestar as informações adequadamente.
manutenção das próteses. 64
Também é importante procurar falar face a face,
para facilitar a leitura labial, esclarecendo as etapas As medidas de higiene oral devem ser
do procedimento, buscando reduzir o risco de que o explicadas de forma clara e simples ao paciente ou
paciente se sinta inseguro sobre seu tratamento. 70 a seu cuidador, estabelecendo contado visual e sem
elevar a voz. Deve-se recomendar o
Atrelada a uma boa comunicação, a
estabelecimento uma rotina diária, incluindo o uso
realização de uma cuidadosa anamnese é muito
de dentifrícios fluoretados, e mostrar instrumentos
importante, uma vez que a história médica do
adaptados às necessidades individuais como uso de
paciente guiará o tratamento odontológico, sendo
escovas elétricas, escovas interproximais e cabos
necessário conhecer as alterações fisiológicas e
adaptados ou com borracha. 27
patológicas que acometem o organismo do paciente.
71
Para tanto, é necessário tempo, clareza, contato Cuidado e manutenção das próteses removíveis
próximo e paciência, já que idosos podem acabar
esquecendo ou omitindo detalhes médicos. 27 Outro Assim como a cavidade bucal, as próteses
aspecto que deve ser considerado é que esse grupo devem ser higienizadas diariamente, a fim de
geralmente utiliza drogas, tanto prescritas como remover o biofilme, contribuindo para uma boa
não-prescritas, e que as interações farmacológicas saúde bucal e geral, além de minimizar o
tendem a ocorrer nessa situação, sendo necessário aparecimento de estomatites protéticas. As próteses
propor fármacos adequados à condição de cada um devem ser imersas em solução com hipoclorito de
e que não possuam tantos efeitos colaterais. 70 sódio a 0.5% por até 10 minutos e escovadas fora da
boca com produto não abrasivo, salientando que
A autoestima e a percepção de saúde bucal
água fervente não deve ser utilizada no processo de
estão relacionadas e são muito importantes no
limpeza, e que antes de serem recolocadas na
atendimento do paciente idoso, pois interferem no
27
cavidade oral, as próteses devem ser bem
seu comportamento. Muitas vezes os idosos
enxaguadas. 72
98

A fim de reduzir as lesões da mucosa oral, o implante. Nas áreas onde o acesso da escova
paciente deve ser orientado a não dormir com a convencional é mais difícil, como entre os pônticos
prótese. Enquanto estiver fora da boca, ela deve e o tecido de suporte, o uso das escovas interdentais
permanecer imersa em água, para evitar pode ser mais efetivo. 73
ressecamento da base e, consequentemente, sua Para a remoção do biofilme na região peri-
deformação. 72 implantar usam-se ferramentas como o fio dental
com passa fio ou superfloss, que devem ser
Os adesivos para próteses dentárias, quando
inseridos de vestibular para lingual, retornando pela
usados corretamente, podem melhorar a retenção e
vestibular, formando um “U”, otimizando a limpeza
estabilidade das dentaduras. No entanto, o estado da
da região do implante. Os aparelhos de irrigação
mucosa de suporte e a qualidade da prótese devem
oral podem auxiliar na remoção de detritos e da
passar por avaliação profissional frequente. A
placa supragengival ao redor do implante. Contudo,
quantidade suficiente de adesivo em creme equivale
se utilizados com pressão excessiva ou de maneira
ao tamanho de 3 a 4 ervilhas pequenas na
incorreta, podem trazer danos ao epitélio juncional.
concavidade para a prótese total superior e de 3 para 73

a prótese total inferior. Quando o produto for em pó,


a quantidade a ser utilizada é uma leve camada Considerações finais
sobre toda a superfície da prótese. Em ambos os
casos, deve ser totalmente removido durante a Com o envelhecimento ocorrem alterações

higienização da prótese e da cavidade oral. É fisiológicas no corpo e na cavidade bucal tornando

importante que o dentista avalie o uso desses os pacientes idosos mais vulneráveis a

produtos, pois podem ser irritantes para a mucosa. complicações, exigindo assim um atendimento
72 personalizado e humanizado. Por consequência das
inúmeras doenças sistêmicas, crônicas e
Cuidado e manutenção das próteses sob infecciosas, esses indivíduos utilizam múltiplos

implantes medicamentos e a interação entre eles, desencadeia


efeitos que interferem na saúde bucal.
A prótese dentária implanto-suportada é A higiene bucal, o uso de próteses, os hábitos
uma das opções de tratamento reabilitador e um dos e os fatores de risco que as pessoas acumulam ao
fatores ligados ao seu sucesso e longevidade é uma longo da vida, influenciam no desenvolvimento de
73
boa higienização oral. Neste caso é importante doenças bucais. Dessa forma, tornam-se prevalentes
remover o biofilme formado na prótese, nos sulcos periodontopatias, cárie radicular, doenças
gengivais e nas regiões peri-implantares. Para a relacionadas ao uso de próteses e doenças
realização da escovação, é recomendado o uso de potencialmente malignas. Para evitar o agravo
escovas com cerdas macias, utilizando a técnica de dessas condições, é necessário que o profissional
Bass e um creme dental não abrasivo e não ácido, domine as condutas terapêuticas e possua
pois causam corrosão e desgastes na superfície do habilidades que permitam uma boa comunicação
99

com o paciente e o cuidador, uma vez que, o autoestima, e interações sociais, o que reforça a
tratamento exige manutenção diária e eventuais importância do cirurgião-dentista na equipe
mudanças de hábitos. multidisciplinar de atendimento ao idoso.
A saúde bucal reflete na qualidade de vida,
pois têm influência na saúde geral, nutrição,
15. Kossioni A. E. et al. Practical Guidelines for
Referências Physicians in Promoting Oral Health in Frail Older Adults. J.
Am. Med. Dir. Assoc. 2018 Dez; 19(12):1039-1046.
1. Weinert BT, Timiras PS. Invited review: Theories of 16. Tavares M., Lindefjeld Calabi, K. A. & San Martin, L.
aging. J. Appl. Physiol. 2003; 95(4):1706–1716. Systemic diseases and oral health. Dental Clinics of North
America. 2014 Out; 58(4):797-814.
2. Brasil. Ministério da Saúde. Diretrizes para o cuidado
das pessoas idosas no sus: proposta de modelo de atenção 17. Ástvaldsdóttir Á et al. Oral health and dental care of
integral. 2014. older persons—A systematic map of systematic reviews.
Gerodontology. 2018 Dez; 35(4):290-304.
3. Teixeira INDAO, Guariento M. E. Biology of aging:
Theories, mechanisms, and perspectives. Cienc. e Saude 18. Leal SC et al. Medication in elderly people: its
Coletiva. 2010 Set; 15(6)2845–2857. influence on salivary pattern, signs and symptoms of dry mouth.
Gerodontology. 2010 Mar 11; 27(2):129-33.
4. Fonseca MH. Envelhecimento da população,
reconfigurações do trabalho e qualificação profissional no 19. Gil-Montoya, J. A., Silvestre F. J., Barrios R,
Brasil. Revista direitos, trabalho e política social. 2020 Fev; Silvestre- Rangil J. Treatment of xerostomia and hyposalivation
6(10):49–67. in the elderly: A systematic review. Medicina Oral Patologia
Oral y Cirugia Bucal. 2016 Mai; 21(3):e355-66.
5. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E
ESTATÍSTICA (IBGE). Censo Brasileiro de 2010. Rio de 20. Villa A, Connell CL, Abati S. Diagnosis and
Janeiro: IBGE, 2012. management of xerostomia and hyposalivation. Therapeutics
and Clinical Risk Management. 2014 Dez; 11:45–51.
6. Perissé C, Marli M. Caminhos para uma melhor idade.
Relatos - A Rev. do IBGE. 2019; (16):19–25. 21. Navazesh M, Kumar SK. Measuring salivary flow:
challenges and opportunities. J. Am. Dent. Assoc. 2008 Mai; 139
7. Wong FMF, Ng YTY, Leung WK. Oral Health and Its Suppl:35S-40S.
Associated Factors Among Older Institutionalized Residents—
A Systematic Review. International Journal of Environmental 22. Łysik D, Niemirowicz-Laskowska K, Bucki R,
Research and Public Health. 2019 Out; 16(21):4132. Tokajuk G, Mystkowska J. Artificial Saliva: Challenges and
Future Perspectives for the Treatment of Xerostomia. Int. J. Mol.
8. Kossioni AE et al. An Expert Opinion from the Sci. 2019 Jun; 20(13):3199.
European College of Gerodontology and the European Geriatric
Medicine Society: European Policy Recommendations on Oral 23. Rivaldo, G et al. Envelhecimento e saúde bucal.
Health in Older Adults. J. Am. Geriatr. Soc. 2018 Mar; Stomatos. 2008 Jan-Jun; 14(26):39-45.
66(3):609–613.
24. Peyron, MA, Woda A, Bourdiol P, Hennequin M.
9. Brasil. Ministério da Saúde. Cadernos de atenção Age-related changes in mastication. Journal of Oral
básica envelhecimento e saúde da pessoa idosa. 2006. Rehabilitation. 2017 Abr; 44(4):299-312.
10. Park DC, Yeo, SG. Aging. Korean J. Audiol. 2013 Set; 25. Arana V, Katchburian E. Histologia e Embriologia
17(2):39-44. Oral. 2023.
11. Singh ML, Papas A. Oral Implications of 26. Guiglia R et al. Aging and Oral Health: Effects in Hard
Polypharmacy in the Elderly. Dental Clinics of North America. and Soft Tissues. Curr. Pharm. Des. 2010 Out; 16(6):619-630.
2014 Out; 58(4):783-96.
27. Acevedo RA, Batista LHC, Trentin MS, Shibli JA.
12. Spezzia S. O papel da osteoporose na Odontologia. Tratamento periodontal no paciente idoso. Rev Faculdade de
Rev. Assoc. Paul. Cir. Dent. 2014 Dez; 68(4):366-367. Odontologia. 2001 Mar; 6(2):57-62.
13. Abrams A. P, Thompson L. A. Physiology of aging of 28. De Rossi SS, Slaughter YA. Oral changes in older
older adults: Systemic and oral health considerations. Dent. Clin. patients: a clinician’s guide. Quintessence Int. 2007 Out;
North Am. 2014 Out; 58(4):729–738. 38(9):773-80.
14. Dumic I. et al. Gastrointestinal Tract Disorders in 29. Epstein JB et al. Oral complications of cancer and
Older Age. Can. J. Gastroenterol. Hepatol. 2019 Jan; (2019). cancer therapy. CA. Cancer J. Clin. 2012 Nov-Dec; 62(6):400-
22.
100

30. Liu YCG et al. Update and review of the 47. De Carli JP, Bernabé DG, Kawata L, Moraes NP, Silva
gerodontology prospective for 2020’s: Linking the interactions SO. da. Hiperplasia palatina por câmara de sucção tratada por
of oral (hypo)- functions to health vs. systemic diseases. Journal meio da eletrocirurgia: relato de dois casos clínicos. Revista da
of Dental Sciences. 2021 Out; 16(2):757–773. Faculdade de Odontologia - UPF. 2010 Ago; 11(2).

31. Oppermann RV, Rösing CK. Periodontia Laboratorial 48. Pankhurst CL. Candidiasis (oropharyngeal). BMJ
e Clínica. São Paulo: Artes Médicas Editora; 2013. Clinical Evidence. 2013 Nov; 8:2013:1304.

32. Shay K. Infectious complications of dental and 49. Coronado-Castellote L, Jiménez-Soriano Y. Clinical
periodontal diseases in the elderly population. Clin. Infect. Dis. and microbiological diagnosis of oral candidiasis. J. Clin. Exp.
2002 Mai; 34(9):1215-1223. Dent. 2013 Dez; 5(5):279–286.

33. López R, Smith PC, Göstemeyer G, Schwendicke F. 50. Colombo AL, Guimarães T, Camargo LFA,
Ageing, dental caries and periodontal diseases. J. Clin. Richtmann R, de Queiroz-Telles F, Salles MJC, et al. Brazilian
Periodontol. 2017 Mar; 44:S145–S152. guidelines for the management of candidiasis – a joint meeting
report of three medical societies: Sociedade Brasileira de
34. Morais AA. Microbiologia Bucal e Aplicada. São Infectologia, Sociedade Paulista de Infectologia and Sociedade
Paulo: Santos Editora; 2018. Brasileira de Medicina Tropical. The Brazilian Journal of
Infectious Diseases. 2013 Mai; 17(3):283–312.
35. Tramontino V, Nunez JM, Takahashi JM, Daroz C,
Barbosa CM. Nutrição para idosos. Rev. Odontol. da Univ. São 51. Neves IMSM. Abordagem do paciente com estomatite
Paulo. 2009 Dez; 21(3):258-267. protética. Porto. Dissertação [Mestrado em Medicina Dentária]
– Universidade Fernando Pessoa; 2015.
36. Pereira, AC. Saúde Coletiva: Métodos Preventivos
para Doenças Bucais - Série Abeno: Odontologia Essencial - 52. Almeida OP. Patologia Oral. São Paulo: Artes
Temas Interdisciplinares. São Paulo: Artes Médicas Editora; Médicas Editora; 2016. [acesso em 17 jul 2022]. Disponível em:
2013. https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978853670
2612/
37. Zaitune MP do A, Barros MB de A, Lima MG, César
CLG, Carandina L, Goldbaum M, et al. Fatores associados ao 53. Chiang CP et al. Atrophic glossitis: Etiology, serum
tabagismo em idosos: Inquérito de Saúde no Estado de São Paulo autoantibodies, anemia, hematinic deficiencies,
(ISA-SP). Cadernos de Saúde Pública. 2012 Mar; 28(3):583–96. hyperhomocysteinemia, and management. J. Formos. Med.
Assoc. 2020 Abr; 119(4):774–80.
38. Kamer AR et al. Alzheimer’s Disease and Peripheral
Infections: The Possible Contribution from Periodontal 54. Millsop JW, Fazel N. Oral candidiasis. Clin. Dermatol.
Infections, Model and Hypothesis. Adv. Alzheimer’s Dis. 2008 2016 Jul-Aug; 34(4):487-94.
Mai; 13(4):437-49.
55. Neppelenbroek KH et al. Effectiveness of microwave
39. Heasman PA et al. Gingival recession and root caries disinfection of complete dentures on the treatment of Candida-
in the ageing population: a critical evaluation of treatments. J. related denture stomatitis. J. Oral Rehabil. 2008 Nov;
Clin. Periodontol. 2017 Mar; 44:S178–S193. 35(11):836–46.
40. Fitzpatrick SG, Cohen DM, Clark AN. Ulcerated 56. Yarborough A et al. Evidence Regarding the
Lesions of the Oral Mucosa: Clinical and Histologic Review. Treatment of Denture Stomatitis. Journal of prosthodontics :
Head Neck Pathol. 2019 Mar; 13(1):91–102. official journal of the American College of Prosthodontists. 2016
Jun; 25(4):288-301.
41. Neville BW. Atlas de Patologia Oral e Maxilofacial.
São Paulo: Editora Guanabara Koogan; 2021. 57. Gurvits GE, Tan A. Burning mouth syndrome. World
Journal of Gastroenterology. 2013 Fev; 19(5):665-72.
42. Jainkittivong A, Aneksuk V, Langlais RP. Oral
mucosal conditions in elderly dental patients. Oral Dis. 2002 Jul; 58. Tu TTH et al. Current management strategies for the
8(4):218-223. pain of elderly patients with burning mouth syndrome: A critical
review. BioPsychoSocial Medicine. 2019 Jan 31;13(1).
43. Neville BW. Patologia Oral e Maxilofacial. São Paulo:
Editora Guanabara Koogan; 2016. 59. TORRES S, SBEGUE A, COSTA S. A importância do
diagnóstico precoce de câncer bucal em idosos. Rev Soc Bras
44. Apriasari ML. The management of chronic traumatic
Clin Med. 2016 Jan; 1;57–62.
ulcer in oral cavity. Dent. J. (Majalah Kedokt. Gigi) 2012 Jun;
45(2):68. 60. Souza LR de B, Ferraz KD, Pereira NS, Martins MV.
Conhecimento acerca do Câncer Bucal e Atitudes frente à sua
45. Monteiro LS et al. Treatment of epulis fissuratum with
Etiologia e Prevenção em um Grupo de Horticultores de
carbon dioxide laser. Rev. Port. Estomatol. Med. Dent. e Cir.
Teresina (PI). Rev. Bras. Cancerol. 2012 Mar; 58(1):31–9.
Maxilofac. 2011 Set; 52(3):165-169.
61. Silva MM, Silva VH. Envelhecimento: importante
46. Basavaraju SM, Nair BM, Pachipulusu B. Reactive
fator de risco para o câncer. Arq. Médicos do ABC. 2005 Jul;
Hyperplastic Lesions of Oral Cavity: A Review of Literature. J.
30(1):11–8.
Heal. Sci. Res. 2019; 10(2):42–6.
101

62. Silva NBNC et al. Tabagismo como fator de risco para


o desenvolvimento de câncer de pulmão. Rev. Eletrônica Acervo
Saúde. 2019 Jan; (19):e313.

63. Leite RB et al. The influence of tobacco and alcohol in


oral cancer: Literature review. Jornal Brasileiro de Patologia e
Medicina Laboratorial. 2021; 57.

64. Moscardini AC et al. Campanha de prevenção e


diagnóstico precoce do câncer bucal: perfil dos idosos
participantes. Revista brasileira de odontologia. 2014 May
28;70(2):130–5.

65. Junior CAL et al. Câncer de boca baseado em


evidências científicas. Rev. Assoc. Paul. Cirur. Dent. 2013 Jan
1;67(3):178–86.

66. Martins AME de BL et al. Maior acesso à informação


sobre como prevenir o câncer bucal entre idosos assistidos na
atenção primária à saúde. Ciência & Saúde Coletiva. 2015 Jul;
20:2239–53.

67. Neliana Buzi Figlie, Lívia Pires Guimarães. A


Entrevista Motivacional: conversas sobre mudança. Boletim -
Academia Paulista de Psicologia. 2014 Dez; 34(87):472–89.

68. Goulart, D. et al. Tabagismo em idosos. Rev. Bras.


Geriatr. e Gerontol. 2010 Ago; 13:313–320.

69. Sesc. Departamento Nacional. Manual técnico de


educação em saúde bucal. 2007 Jan 1;132–2.

70. Geniole LAI et al. Saúde Bucal por Ciclos de Vida.


Campo Grande: Editora UFMS; 2011.

71. Felton D et al. Evidence-Based Guidelines for the Care


and Maintenance of Complete Dentures: A Publication of the
American College of Prosthodontists. J. Prosthodont. 2011 Fev;
20:S1-S12.

72. Livio EM de, Silva R dos S, Poluha RL. Higienização


e manutenção de prótese total fixa sobre implante. Arch. Health
Invest. 2019 Out; 8(7).

73. Leite ACE, Silva EM, Melo NS. Fatores de risco


relacionados com o desenvolvimento do câncer bucal: revisão.
Rev Clin Pesq Odontol. 2005; 3:31-6.
6
TRATAMENTO ODONTOLÓGICO DO PACIENTE COM FISSURA LABIOPALATINA
Rafaela Scariot | Carolina Duarte de Macedo | Ingrid Burkoth Sanchez | Julia do Carmo Machado
Kneipp Lopes | Maria Fernanda Pivetta Petinati

Introdução
O que são as fissuras labiopalatinas? faciais e/ou atingem os dois lados da face, são mais
graves e apresentam um pior prognóstico. x
As fissuras labiopalatinas (FL/P) são más-
formações congênitas craniofaciais frequentes, que
ocorrem no período embrionário devido a falhas no
Embriogênese do lábio e do
processo de desenvolvimento do lábio e/ou do
palato
palato e podem acarretar importantes problemas
Para compreender as causas das FL/P é
funcionais e estéticos para os indivíduos
necessário rever aspectos de desenvolvimento do
acometidos por essa condição.
lábio e do palato. A embriogênese do lábio e do
A classificação e extensão das FL/P são
palato ocorre em períodos distintos e envolve uma
importantes, pois determinam os diferentes graus de
série de eventos de migração celular, crescimento,
severidade. Assim, FL/P que levam a um
diferenciação e apoptose.
comprometimento mais extenso das estruturas
103

Com o crescimento dos processos


Ao final da 4ª semana de vida intrauterina,
maxilares, forma-se a maxila e ocorre a fusão dos
forma-se o centro da face, composto pelo
processos nasais mediais, formando o segmento
estomodeu e pelo primeiro par de arcos faríngeos,
intermaxilar, que é composto por 3 componentes.
que são formados pela migração do mesênquima e
Um componente labial, que forma o filtro do lábio
de células da crista neural. No final da 5ª e início da
superior, um segundo componente da mandíbula
6ª semana, existem cinco proeminências
superior que carrega os quatro dentes incisivos, e
mesenquimais, sendo dois processos mandibulares,
um terceiro componente palatino, que forma o
dois processos maxilares e a proeminência frontal.
palato primário. O palato definitivo, por sua vez,
Com a formação dos processos nasais
tem origem nos processos maxilares, formados a
complementa-se o desenvolvimento da face. 1–3
partir dos processos maxilares. 1–3
Nas 6ª e 7ª semanas, os processos maxilares
Entre a 8ª e a 12a semanas ocorre a
aumentam de tamanho e crescem medialmente,
formação do palato secundário, que se inicia com a
comprimindo aos processos nasais, assim, ocorre a
subida e a fusão das proeminências maxilares. Elas
fusão do processo nasal medial e do processo
se unem ao palato primário na porção anterior,
maxilar, bilateralmente. Com esse processo, forma-
assim, o forame incisivo se torna a referência na
se o lábio superior. Já o lábio inferior e a mandíbula
definição do palato primário e secundário. Ao
se formam pela fusão dos processos mandibulares.
mesmo tempo em que ocorre a fusãodos processos
1–3
maxilares, o septo nasal cresce e se une ao palato.
1-3

Figura 6.1 Embriogênese da face. A) Vista frontal. B) Vista Axial. Referência: autores.
104

Todo esse processo pode servisualizado na Figura pacientes com parentes fissurados. Somado a isso,
6.1. há uma taxa de concordância de 40-60% em gêmeos
Sendo assim, as fissuras labiais ocorrem monozigóticos e de 3-5% em gêmeos dizigóticos, o
devido à fusão incompleta ou a não fusão da que pode sugerir fortemente o papel da genética na
proeminência maxilar com a proeminência nasal fisiopatologia desta doença. Os principais genes e
medial. Isso pode ocorrer de apenas um lado, dando loci propostos na ocorrência de FL/P não
origem as fissuras unilaterais, ou dos dois lados, sindrômicas são IRF6, MAFB, ARHGAP29, 8q24,
originando as fissuras bilaterais. Já as fissuras VAX1 e PAX7. Já as FL/P sindrômicas podem
palatinas ocorrem por um erro na fusão dos eventualmente ser explicadas pela etiologia da
processos maxilares. E por fim, as fissuras síndrome a qual acompanha e pelos genes e loci nela
medianas ocorrem pela fusão incompleta das envolvidos. 3
proeminências nasais mediais. 1–3 Quanto aos fatores ambientais, a

Etiologia exposição ao tabaco e ao álcool durante a


gestação, a má nutrição e a deficiência de ácido
A etiologia das FL/P é complexa, pois trata-
fólico, tanto pela falta de ingesta e
se de uma doença multifatorial, com interação entre
fatores genéticos e ambientais. 1,3,4
suplementação, quanto pelo uso de medicações
antagonistas de folato, assim como fármacos
Contudo, a existência de um componente
com o princípio ativo ondansetrona, têm sido
genético na etiologia se evidencia com o fato de que
há um risco aumentado da ocorrência de FL/P em sugeridas como fatores de risco para ocorrência

Tabela 6.1 Formas de classificar as FL/P.


105

de FL/P, porém a associação entre causa e efeito tratamento dos pacientes. Existem diversas
nãoé totalmente conclusiva. 3,5,6 formas de classificar asFL/P (Tabela 6.1).5
No Brasil, a classificação proposta
Classificação
por Spina é a mais utilizada e tem como
A classificação das FL/P é referência, o forame incisivo (Tabela 6.2 e
extremamenteimportante, pois ajuda a definir o Figura 6.2).7

Tabela 6.2 Classificação faz FL/P. Referência: Spina, 1979.

Figura 6.2 Classificação das FL/P, segundo Spina. Referência: autores.


106

como o tratamento é previsto durante toda a fase de


Epidemiologia
desenvolvimento da criança, faz-se necessário o

A incidência da FL/P varia na literatura, envolvimento de uma equipe multidisciplinar,

podendo acometer de 1:600 a 1:1010 nascidos formada por geneticistas, cirurgiões plásticos,

vivos, de acordo com a população estudada.8, 9 otorrinolaringologistas, cirurgiões-dentistas,

Observa-se maior prevalência em indivíduos de fonoaudiólogos, psicólogos, nutricionistas,

ascendência asiática, caucasiana e negra, nutrólogos, enfermeiros, assistentes sociais,

respectivamente.1, 9 terapeutas ocupacionais, pedagogos e outros

Em geral, as FL/P são as mais comuns, serviços para suprir as necessidades de cada

seguidas pelas labiais e depois, pelas palatinas. paciente.

Observa-se que a maioria dos pacientes fissurados Importância do cirurgião-dentista no


pertencem ao sexo masculino. Além disso, o sexo
do paciente ainda mostra interferir no tipo de tratamento
fissura, sendo que as fissuras labiais e labiopalatinas O papel do cirurgião-dentista é fundamental
são mais comuns no sexo masculino e as FL/P, no na abordagem do paciente com FL/P, já que a
sexo feminino. Quanto à topografia da fissura, as deformidade se manifesta em sua área de atuação. A
unilaterais são mais comuns, especialmente a odontologia tem um papel de grande importância
1, 10
lateralidade esquerda. visto que a saúde bucal é um fator decisivo no
As fissuras labiais são menos evidenciadas resultado do tratamento desses pacientes.
em associação a outras anomalias congênitas. A fissura no processo alveolar pode afetar
Nesses casos, as FL/P e palatinas são mais comuns. o desenvolvimento de dentes decíduos e
Entretanto, as fissuras não sindrômicas são as mais permanentes, causando anomalias dentárias de
comuns, correspondendo a 60-70% dos casos, estrutura, forma, número e posição. De acordo com
enquanto as formas sindrômicas correspondem a estudos, a severidade de anomalias é proporcional a
1, 10
aproximadamente 30% dos casos. severidade da fissura.11 Os problemas mais comuns

Implicações das FL/P são a ausência de dentes ou presença de


supranumerários, que contribuem para a má-
As FL/P são um problema importante de
oclusão. A fissura normalmente se localiza na área
saúde pública tanto pela prevalência, quanto pelas
de incisivo lateral e canino, o que faz com que esses
implicações negativas psicossociais, estéticas e de
dentes estejam ausentes ou deslocados e
funcionalidade que elas trazem aos indivíduos
consequentemente, no último caso, erupcionem na
acometidos e às famílias. São responsáveis por
margem da fissura.12
dificuldades para amamentação, fonação, audição,
Os pacientes afetados geralmente
deglutição e respiração, e podem causar restrições
demonstram discrepância de tamanho, forma
de crescimento maxilofacial e alterações
posição dos maxilares. A Classe III, presente na
odontológicas importantes. Sendo assim, para o
maioria dos casos, é causada por diversos fatores. O
manejo adequado dessa condição tão complexa e
107

fator de maior responsabilidade pela má oclusão é o Odontopediatra


retardo do crescimento maxilar, que ocorre muitas
O odontopediatra deve acompanhar a
vezes pelo traumatismo operatório do fechamento
criança desde os primeiros meses de vida
da fissura e pela fibrose resultante do procedimento,
(Figura 6.3) até o desenvolvimento dentário e
que limita o crescimento e desenvolvimento da
craniofacial, dando orientações gerais e
maxila.12
O cirurgião-dentista atua em diversos mostrando a importância da saúde bucal e da
momentos terapêuticos durante toda a fase de higienização correta para esses pacientes. A
desenvolvimento até a vida adulta, acompanhando saúde bucal é essencial para que esses pacientes
e orientando o paciente e os responsáveis. Para que possam realizar as cirurgias necessárias, que
haja êxito na reabilitação odontológica do paciente requerem um ambiente sem infecções para um
a equipe de cirurgiões-dentistas, em especial, resultado satisfatório.
odontopediatra ou clínico geral, ortodontista,
protesista e cirurgião bucomaxilofacial, necessitam
de planejamento em conjunto. O plano de
tratamento desses pacientes envolve não apenas
cirurgias para correção da fissura, como vários
procedimentos até o final da reabilitação. Tudo isso
permite que o paciente obtenha qualidade de vida
nos aspectos relacionados a aparência, fala,
mastigação e deglutição.
A seguir será descrito o tratamento
odontológico do paciente FL/P. O tratamento foi
dividido de acordo com a faixa etária do paciente.

Recém-nascido aos 06 anos

O diagnóstico do paciente com FL/P é feito,


FL/P. Imagem cedida gentilmente pelo Professor Dr. Renato da
muitas vezes, na fase pré-natal, por meio de exames
Silva Freitas, Cirurgião Plástico e Craniofacial do Centro de
de ultrassonografia, que conseguem identificar a Atendimento Integral ao Fissurado Labiopalatal (CAIF/HT,
Curitiba - PR).
alteração fissura de lábio e palato a partir da 13ª
semana de gestação.13 O diagnóstico precoce O tratamento odontopediátrico gira em
favorece o acompanhamento e adesão dos pais ou torno de prevenção de cárie e doença periodontal. A
responsáveis ao longo do tratamento, além de diferença está nos fatores de risco aumentados para
prepará-los para necessidades específicas destes suscetibilidade ao desenvolvimento de cárie,
14
pacientes, como a alimentação e amamentação. hipoplasia dentária, anomalias estruturais e
dificuldade de higienização nos períodos pós-
cirúrgicos ou em dispositivos bucais eventualmente
108

usados (aparelhos ortodônticos, contenções, placa principalmente próximos a FL/P, que podem ser

obturadora de palato).14 Além disso, o profissional incisivos laterais da série normal ou dentes

deve realizar intervenções pré-cirúrgicas e supranumerários;14

curativas, quando necessário.  Alterações de forma, estrutura, número e


posição dos dentes, que favorecem acúmulo de
Na fase de erupção dos primeiros dentes
biofilme e por consequência maior
decíduos, o odontopediatra deve estabelecer um
predisposição a cárie.
plano de tratamento adequado em conjunto com os
Prevenção
profissionais das demais áreas. Alguns fatores
requerem atenção, especial do odontopediatra: Existem alguns fatores que favorecem a
História médica do paciente adição precoce de açúcar na dieta destas crianças.

Observar se a FL/P está associada a Um deles está relacionado a dificuldade que estes

algumasíndrome e se há presença de algum tipo pacientes apresentam para extrair o leite da mãe
devido a fissura e a falta de selamento labial. A
de distúrbio auditivo, comum nestes pacientes.
amamentação no peito torna-se difícil, sendo
Deve ainda, estar atento a outros problemas de
utilizada a mamadeira, copo ou colher. Outro fator
saúde em geral.
está relacionado a exigência de alguns pré-
requisitos para a criança dar início às cirurgias
reparadoras, entre eles um peso mínimo, sendo
motivo para a adição do açúcar pelos pais ou
responsáveis. Além disso, ainda existem as questões
culturais relacionadas ao açúcar. Por isso, é
importante instruir os pais ou responsáveis sobre
prevenção, causas e consequências da cárie precoce,
reforçando a higiene bucal e o uso deflúor.14
A higiene bucal nessa fase é igual a de
umacriança sem fissura. Antes do aparecimento
14 dos dentes decíduos, a limpeza dos tecidos
moles deve ser realizada com gaze ou pano
umedecido com água filtrada ou fervida ao
Exame clínico
redor do dedo indicador do cuidador, pelo
O recém-nascido com FL/P pode apresentar
menos uma vez ao dia, para criar um ambiente
vários distúrbios dentários:
bucal saudável e contribuir para a aquisição
 Atraso na cronologia de erupção dos dentes
precoce de hábitos de higiene bucal.14 Já
decíduos em até dois anos;
 Presença de cistos gengivais e palatinos do
quando há presença de dentes, a American

recém-nascido, dentes natais e neonatais Academy of Pediatrics recomenda que a


109

escovação seja realizada duas vezes ao dia, pode ser observada com a erupção do primeiro
usando uma quantidade de pasta de dente molar decíduo, uma das alterações mais comuns.

fluoretada equivalente ao tamanho de um grão de Quando o paciente alcança os 5 anos de


arroz. Aos 3 anos de idade, a quantidade deve ser idade, devem ser feitas radiografias panorâmicas
equivalente a um grão de ervilha. Além disso, elas regularmente para o acompanhamento da formação
devem consumir água fluoretada regularmente e radicular do canino superior permanente. O
receber aplicação de verniz fluoretado no desenvolvimento do canino é de grande
consultório odontológico pelo menos duas vezes ao importância, pois a formação da raiz desse dente é
ano a partir da primeira erupção.14 usada como um guia para o período adequado da

Ortodontia cirurgia de enxertia óssea alveolar secundária (7-12


anos).16
A partir dos 5 anos de idade é possível
observar a presença da dentição mista, sendo que,
Cirurgia Plástica/Buco-Maxilo-
tanto os dentes decíduos como os permanentes
Facial
podem apresentar alterações de cronologia de
A reabilitação morfológica dos FL/P
erupção e de desenvolvimento. O paciente com
envolve a cirurgia de reparo labial, chamada de
fissura transforame incisivo bilateral geralmente
queiloplastia, geralmente realizada aos 3 meses de
apresenta mordida cruzada bilateral e maiores
idade, e a cirurgia de palato, chamada de
overjet e overbite. Nesta fase, já se iniciam as
palatoplastia, geralmente realizada assim que o
consultas com o ortodontista.15
paciente completa 1 ano de idade (Figura 6.4). O
O prognatismo, a má-oclusão severa e a momento apropriado para realizar essas
discrepância de tamanho, forma e posição dos intervenções cirúrgicas é muito debatido. A maioria
maxilares são, geralmente, o que diferem dos dos cirurgiões aplica a “Regra dos 10” para
pacientes sem fissura, sendo a atresia da maxila, que determinar a aptidão do bebê a cirurgia (10 semanas
de idade, 10 libras de peso [aproximadamente 5kg]
e 10g/dL de hemoglobina no sangue). Se houver
outros fatores, a cirurgia é adiada até os riscos serem
considerados mínimos. Isso traz segurança para a
utilização de anestesia geral.17
As vantagens do fechamento precoce dos
defeitos são o melhor desenvolvimento da
musculatura faríngea e do palato, facilidade de
alimentação e higiene, melhor funcionamento da

Figura 6.4 Palatoplastia em paciente com 1 ano de idade.


tuba auditiva, melhor capacidade de fonação e
Imagem cedida gentilmente pelo Professor Dr. Renato da Silva melhora do estado psicológico dos pais e do bebê.
Freitas, Cirurgião Plástico e Craniofacial do Centro de
Atendimento Integral ao Fissurado Labiopalatal (CAIF/HT, Dentre as desvantagens, as mais importantes são a
Curitiba - PR).
110

restrição do crescimento maxilar devido a formação produzir uma fonação normal. Um deslocamento
de cicatriz após a cirurgia e a dificuldade para o extensivo dos tecidos moles do osso provocaria
cirurgião lidar com as estruturas pequenas nessa maior formação de cicatriz, que afetaria de forma
12
faixa etária. adversa o crescimento maxilar.12
A realização da queiloplastia, palatoplastia Após a palatoplastia, o profissional deve
ou ambas, dependerá das estruturas anatômicas verificar se há formação de fístula buco nasal, uma
comprometidas pela FL/P. Quando o paciente complicação comum desse procedimento. Alguns
apresenta a fissura restrita ao lábio realiza-se a relatos de incidência de fístula após palatoplastia
cirurgia de queiloplastia. Caso a fissura seja chegam a 50%.18 A reparação dessas fístulas
limitada ao palato será feita a palatoplastia. Já os costuma ser tardia e associada a cirurgia realizada
pacientes com FL/P necessitam da queiloplastia pelo otorrinolaringologista para corrigir a
associada a palatoplastia. insuficiência velofaríngea (fechamento incompleto
O indivíduo com fissura de lábio apresenta do esfíncter entre a orofaringe e a nasofaringe). x
o músculo orbicular rompido, que favorece um Com 5 anos de idade a criança começa uma
crescimento desordenado da maxila, acentuando jornada social importante e assim como a fala, a
ainda mais a fissura no alvéolo. Portanto, a aparência pode virar um ponto negativo em
restauração do esfíncter muscular com o reparo dos interações psicossociais. Muitas vezes são
lábios tem um efeito favorável no desenvolvimento necessários dois tempos cirúrgicos para uma
12
do segmento alveolar. correção completa e por isso cirurgias secundárias

A palatoplastia é geralmente realizada em de reparo devem ser realizadas nessa fase, se a

um tempo cirúrgico, mas pode ser realizada em dois, equipe achar necessário, como uma tentativa de

principalmente se a FL/P for ampla. Quando se trata melhorar a fonação e corrigir defeitos residuais.12

de um único tempo cirúrgico há o fechamento do As indicações incluem fatores cosméticos e

palato duro e palato mole. Já quandoé realizada em funcionais. Dentre as fissuras, a fissura transforame

dois tempos cirúrgicos é possível que este incisivo bilateral é a mais severa e geralmente

fechamento ocorra em dois momentos distintos, necessita de um maior número de cirurgias

sendo que no primeiro momento fecha-se o palato secundárias.

duro e num segundo momento o palato mole. O É comum que pacientes operados,

objetivo primário do reparo da FL/P é criar um principalmente se a FL/P corrigida foi bilateral

mecanismo capaz de permitir a fala e a deglutição completa, apresentem deformidades no nariz depois

sem interferir no crescimento maxilar subsequente. da queiloplastia. São elas: columela curta, ponta do

Para alcançar estes objetivos são essenciais alguns nariz e narinas achatadas e expansão da base alar. A

pré-requisitos como a separação das cavidades nasal cirurgia de alongamento de columela pode ser

e oral e a criação de um mecanismo velofaríngeo necessária para corrigir essas deformidades e

competente para melhora da fala. O propósito é almejar a melhor respiração do paciente. Nela, a

obter um palato mole longo e móvel, capaz de columela é alongada e a ponta do nariz é
reconstruída, promovendo a projeção anterior e
111

devolvendo a forma do nariz.19 paciente com os padrões normais e esperados em

Durante o estágio de dentição mista, o pacientes comparáveis.20

paciente com FL/P deve ser monitorado de perto Nessa idade, a cavidade oral é caracterizada
pelo cirurgião dentista e pelo ortodontista para que por dentes supranumerários, ausentes, com
a erupção e esfoliação ocorram de forma impactação, apinhamento e com erupção retardada.
21,22
apropriada, assim como o crescimento maxilar. O Essas anomalias, além de exigirem
cirurgião bucomaxilofacial ainda deve avaliar os planejamento e tratamento multidisciplinar,
dentes decíduos e supranumerários inclusos ou em predispõem o paciente às lesões de cárie e, por isso,
região de FL/P, e caso necessário, realizar a durante o estágio de dentição mista até a
remoção desses elementos dentários por meio de permanente, início da adolescência e a idade adulta
procedimentos cirúrgicos, geralmente sob anestesia jovem deve haver o aconselhamento dietético,
geral, acompanhando o caso até a cicatrização. visando a diminuição na incidência de cárie no
tratamento e prevenção do recém-nascido aos 06
7-12 anos
anos.22
Odontopediatria Lesões de cárie exigem tratamento
restaurador ou, em caso de inviabilidade, exodontia.
Nessa faixa etária, o tratamento
Em lesões cariosas iniciais e sem risco de
odontopediátrico em crianças com FL/P não difere,
contaminação pulpar, o tratamento de escolha deve
em geral, do tratamento convencional, quando se
ser o restaurador atraumático (ART), enquanto nos
fala da prevenção da cárie e da doença periodontal.
casos com risco de contaminação deve-se optar pela
As técnicas de manejo são as mesmas utilizadas
técnica convencional de restauração.20
rotineiramente para o controle do comportamento
A anestesia dentária nos pacientes com
infantil. O exame clínico e o plano de tratamento
FL/P não é diferente na maior parte das regiões da
restaurador ou preventivo adequados, além do
cavidade oral, exceto para a área da FL/P. Nesta
aconselhamento aos pais ou responsáveis e da
região, a maxila é dividida em diferentes segmentos
promoção do autocuidado, por meio da introdução
devido ao defeito ósseo com inervação e, ainda que
das técnicas de escovação, é fundamental para a
o aspecto clínico seja melhorado após o reparo
futura reabilitação dos indivíduos acometidos com
cirúrgico, a separação alveolar é mantida.16
a FL/P. Existem, entretanto, alterações anatômicas
A odontopediatria desempenha, portanto,
ocasionadas pela anomalia, que podem causar
um papel fundamental na construção do plano de
diferenças que influenciam diretamente no
tratamento do paciente com FL/P, juntamente com
tratamento odontológico.16
o ortodontista e o cirurgião bucomaxilofacial. O
O odontopediatra, em conjunto com o odontopediatra fornece assistência de modo a
ortodontista, monitora o crescimento e o buscar uma condição bucal saudável, além de
desenvolvimento do rosto, das arcadas dentárias e monitorar o crescimento e desenvolvimento
dos dentes, comparando a condição individual do craniofacial e a oclusão dentária.22
112

Ortodontia Simultaneamente ao tratamento de enxerto


ósseo alveolar, na faixa etária de 9 a 11 anos, e em
O ortodontista desempenha um papel torno de 6 meses antes da cirurgia, o aparelho fixo é
significativo no tratamento da criança com FL/P. O instalado no arco superior. Pesquisadores explicam
ortodontista deve consultar o odontopediatra e o que isso elimina a mordida cruzada e outras
cirurgião plástico que fazem o acompanhamento da consequências desfavoráveis que decorrem do mau
criança para que possam, em conjunto, determinar posicionamento dos incisivos, além de ajudar na
o momento adequado para a implementação do estética dentária.26
tratamento ortodôntico, que se inicia, geralmente, O diagnóstico de maloclusões em indivíduos
quando o paciente encontra-se com idade entre 8 e com FL/P utiliza os mesmos recursos empregados
10 anos, por meio da correção de atresia de maxila, nos protocolos ortodônticos convencionais, sendo
mordida cruzada e preparação para a cirurgia de eles as fotografias faciais e odontológicas, os
enxerto ósseo alveolar secundário. Ainda, de 2 a 3 modelos de gessos e as radiografias intra e
meses após a intervenção cirúrgica, dá-se início à extraorais. Os registros ortodônticos são obtidos,
ortodontia corretiva.23 em geral, aos 9, 12 e 18 anos de idade. A radiografia
A primeira intervenção para correção da panorâmica é utilizada para que seja possível uma
deficiência de arco transversal e mordida cruzada visão global da dentição, além do diagnóstico de
posterior acontece em torno dos 8 anos de idade, anomalias dentárias (Figura 6.5). Ainda, a
preparando o arco superior para receber o enxerto radiografia oclusal padronizada da área da FL/P,
ósseo alveolar secundário. A expansão rápida da bem como a radiografia periapical da região, são
maxila com aparelhos disjuntores, geralmente, do frequentementeusadas para a avaliação da largura e
tipo Hyrax (dentosuportado) ou Haas extensão do defeito ósseo alveolar e para
(dentomucosuportado) é iniciada quando os caninos acompanhamento dos enxertos ósseos alveolares.24
superiores apresentam formação de metade a dois
terços da raiz. A deficiência transversa do arco
superior nem sempre está associada à mordida
cruzada ou à atresia combinada da arcada dentária
inferior e, mesmo nesses casos, há necessidade de
expansão ortopédica da maxila, visando o preparo
para recepção do enxerto ósseo secundário.24
Em crianças com FL/P que apresentam Figura 6.5 Radiografia Panorâmica de paciente com FL/P aos
11 anos e 3 meses de idade, mostrando cronologia de erupção
retrusão média ou moderada, pode ser indicada a alterada e agenesia. Imagem do Acervo do Centro de
Atendimento Integral ao Fissurado Labiopalatal (CAIF/HT,
protração ortopédica da maxila. A cicatriz palatina Curitiba - PR).
e a rigidez dos lábios, porém, são suscetíveis a
reduzir a quantidade do avanço maxilar esquelético O tratamento ortodôntico em pacientes com
alcançado em comparação com o tratamento em FL/P deve compensar três problemas comumente
crianças sem FL/P.25 encontrados: agenesia dos incisivos laterais, a
113

fissura alveolar residual e a deficiência transversal canino superior como referência para a realização
e antero-posterior da maxila. do procedimento cirúrgico, ou seja, quando há um

Cirurgia Plástica/Buco-Maxilo-Facial: terço da raiz do canino superior formada. Isso pode


levar à erupção canina espontânea através do
Nesta fase, o cirurgião é responsável pela enxerto e gengiva saudável ao redor do mesmo,
cirurgia de enxerto ósseo alveolar secundário, que é além da altura óssea normal. O enxerto ósseo
geralmente necessária, pois o defeito alveolar tende possui algumas vantagens, como apoiar a expansão
a não ser corrigido nas cirurgias primárias. Após a da arcada dentária a longo prazo, mantendo a
conclusão do tratamento ortodôntico pré-enxerto, o continuidade e a forma do arco, ao mesmo tempo
cirurgião realiza a intervenção para proporcionar que fornece osso para a passagem do canino em
continuidade aos alvéolos maxilares e para fechar erupção por meio do enxerto. 23
27
possíveis fístulas buco nasais. Outro procedimento que poderá ser
O enxerto tende a ser colocado de 6 a 18
realizado conforme necessidade do paciente ao
meses antes da utilização do novo osso, quando o
final da dentição mista é o reposicionamento de
paciente tem idade entre 6 e 10 anos, e pode ser
pré- maxila. A pré-maxila (Figura 6.6) é
utilizado para um dente em erupção ou para um
frequentemente projetada nos pacientes com
elemento adjacente que será movimentado
ortodonticamente por meio do osso. A hora exata e fissura labiopalatina bilateral desde o
a quantidade de carga necessária, entretanto, são nascimento, isto ocorre devido a
desconhecidas.20,27 descontinuidade do esfíncter do músculo
Solis e colaboradores afirmaram que os orbicular da boca, causando descompasso do
dentes adjacentes às FL/P tenham maturação posicionamento da pré-maxila e palato
atrasada em relação aos seus antímeros e em secundário ao longo do desenvolvimento da
comparação com valores de controle. Esta face.29 Nos casos em que a reparação do
informação é importante para a determinação do
esfíncter do músculo orbicular durante a
momento ideal da realização de enxertos ósseos
queiloplastia não foi suficiente para a retomada
secundários.28
da função das estruturas envolvidas, é
Diante da inexatidão dessas informações, o
necessário o reposicionamento cirúrgico da
cirurgião deve determinar a existência de incisivos
viáveis e verificar se há espaço suficiente para a
futura acomodação dos elementos. Caso haja, há
indicação de enxerto ósseo em dentição mista
precoce. Do contrário, o enxerto deve ser planejado
de acordo com a erupção do canino.27 Utiliza-se o
estágio de formação da raiz do canino superior
Figura 6.6 Paciente com excesso vertical de pré-maxila.
como referência para a realização do procedimento
Imagem do Acervo do Centro de Atendimento Integral ao
cirúrgico, ou seja, quando há um terço da raiz do Fissurado Labiopalatal (CAIF/HT, Curitiba - PR).
114

pré-maxila. Este procedimento proporcionará O objetivo do preparo ortodôntico pré-


ao paciente a volta da unidade maxilar não cirúrgico (Figura 6.8) é alinhar a dentição e

desenvolvida durante a fase embrionária e remover quaisquer compensações dentárias,


visando atingir a máxima intercuspidação das
gestacional, restabelecendo a morfologia da
arcadas dentárias após a cirurgia ortognática,
face e oclusal. A cirurgia de reposicionamento
proporcionando suporte à estabilidade.20
da pré-maxila se dá por meio da osteotomia
corretiva da maxila e, idealmente, deve ser
realizada no mesmo tempo cirúrgico do enxerto

ósseo alveolar secundário, dessa forma trará como


benefício a possibilidade da erupção do canino na
posição correta garantindo que a reabilitação
protética seja mínima. 29–31

13-18 anos
Nesta fase, o paciente já realizou a
queiloplastia, palatoplastia e enxerto ósseo alveolar
secundário (Figura 6.7). Direcionando para a
finalização do caso dentro de cada especialidade.

Figura 6.8 Fotos intrabucais frontal, lateral direita e lateral


Figura 6.7 Paciente na faixa etária dos 13 aos 18 anos para esquerda de tratamento ortodôntico pré cirurgia ortognática.
finalização dos tratamentos dentro das especialidades. Imagem Imagem do Acervo do Centro de Atendimento Integral ao
cedida gentilmente pelo Professor Dr. Renato da Silva Freitas, Fissurado Labiopalatal (CAIF/HT, Curitiba - PR).
Cirurgião Plástico e Craniofacial do Centro de Atendimento
Integral ao Fissurado Labiopalatal (CAIF/HT, Curitiba - PR).
O tratamento ortodôntico corretivo pode
Ortodontia iniciar de 3 a 6 meses após a cirurgia de enxerto
Neste período, a partir dos 14 anos, a ósseo alveolar ou ser planejado para ter sua
ortodontia corretiva deve ser finalizada, preparando conclusão com a maturidade esquelética, a tempo da
o paciente, em caso de necessidade, para a cirurgia cirurgia ortognática. Quando o início se dá após a
ortognática. cirurgia de enxerto ósseo alveolar, uma radiografia
115

pós-operatória deve ser realizada para avaliar a período de 6 a 12 meses. Arcadas dentárias
qualidade do remanescente ósseo ao redor dos coordenadas, boa intercuspidação e oclusão
dentes adjacentes à FL/P. equilibradas são de fundamental importância para o

Deve-se ainda ser levada em consideração fornecimento da estabilidade estética aumentando a

a dimensão sagital e transversal de cada paciente, estabilidade oclusal (Figura 6.9).

além da medida vertical. O tratamento visa o Cirurgia Bucomaxilofacial


alinhamento e nivelamento bem como a Neste momento, pode haver a
coordenação dos arcos. Também consiste em necessidade de alguns procedimentos
descompensações dentárias.
cirúrgicos no auxílio na finalização
ortodôntica, correção de ausências dentárias e
de eventual comunicação buco sinusal ou oro
nasal, além de reajuste na posição dos
maxilares. Esses tópicos serão comentados
abaixo:
Tracionamento de caninos
Entre as alterações dentárias em pacientes
com FL/P está a impactação do canino. São
discutidos vários fatores que podem interferir na
erupção dos caninos, como a idade em que foi
realizado o enxerto ósseo alveolar secundário,
largura inicial da fissura, agenesia do incisivo
lateral ou malformação, bem como dentes
supranumerários.32 Os caninos impactados
aumentam o risco de reabsorção radicular dos
dentes adjacentes. O tratamento de um canino
impactado envolve exposição cirúrgica com a
fixação de um braquete ou botão sobre o canino
juntamente com um fio para auxiliar no
tracionamento ortodôntico.33 A ancoragem pode
ocorrer no próprio arco ortodôntico ou aparelhos
Figura 6.9 Fotos intrabucais frontal, lateral direita e lateral removíveis.
esquerda de tratamento ortodôntico pós cirurgia ortognática.
Imagem do Acervo do Centro de Atendimento Integral ao
Fissurado Labiopalatal (CAIF/HT, Curitiba - PR).
Remoção de terceiros molares
O ortodontista faz-se presente durante o
pós-operatório da cirurgia ortognática. Aortodontia A presença dos terceiros molares pode
pós-operatória geralmente é mantida por um comprometer outras fases do tratamento do paciente
116

com FL/P, como a ortodontia pré- e pós-cirúrgica e próximo ao implante. Outro fator a ser levado em
os procedimentos cirúrgicos planejados. Durante a consideração, é que por se tratar de umaárea com
cirurgia ortognática, que tem como objetivo o enxerto ósseo alveolar secundário partes do osso
reposicionamento dos maxilares, existem cortes podem reabsorver novamente após o implante,
ósseos frequentemente utilizados que atravessam a nesse caso pode ser feito enxerto adicional
região anatômica dos terceiros molares. Manter os simultaneamente ao implante a fim de evitar atrasos
terceiros molares no local dos cortes ósseos na osteointegração e perda doimplante. Atualmente,
complicaria o reposicionamento planejado dos em nosso Serviço (CAIF/HT), tem-se optado por
maxilares e a aplicação de dispositivos de fixação tratar as fissuras bilaterais com implantes
interna estável.34 osseointegrados a fim de diminuir a constrição do
Implantes osseointegrados arco.35
Fechamento de fistula
Dentes ausentes em pacientes com FL/P
podem ser restaurados por meio de correções A fístula buco nasal (Figura 6.10) é uma
ortodônticas, próteses convencionais ou por meio de comunicação anormal entre as cavidades bucal e
implantes dentários. Para ausências dentárias nasal. Por consequência, essas fístulas levam a
bilaterais o tratamento ortodôntico é considerado problemas funcionais, como a fala hipernasal,
uma opção, entretanto, para ausências unilaterais impacção de alimentos, mau cheiro, dificuldade em
não faria parte do planejamento de escolha. As manter uma boa higiene, regurgitação de alimentos
próteses convencionais apresentam como pelo nariz, entre outros. O reparo da fissura sob
desvantagens a perda do estímulo fisiológico para tensão muscular excessiva sobre a sutura é
manutenção do rebordo alveolar aumentado, além considerado a principal causa de fístula buco nasal,
da possibilidade de sobrecarga aos dentesadjacentes embora a idade do paciente durante o procedimento,
nos casos de próteses fixas. Os implantes são a o tipo e a extensão da fissura, a existência de
principal opção de escolha para dentes ausentes, síndromes associadas, e fatores como a experiência
principalmente quando unilaterais. Além da do cirurgião, a deficiência de irrigação sanguínea e
vantagem funcional, existe a função osteoprotetora infecção pós-operatória possam estar associadas ao
em relação a manutenção do rebordo alveolar. desenvolvimento dessa complicação.36 A fístula
Entretanto, alguns fatores devem ser levados em buco nasal, de forma simplificada, pode ser descrita
consideração no tratamento com implante dentário por meio do tamanho,localização de ocorrência e
para pacientes com FL/P. Um deles é a grande sintomatologia clínica. A partir desses achados
expectativa ao resultado estético da região anterior clínicos, os profissionais envolvidos definem a
da maxila, outro ponto seria que, geralmente, já melhor conduta para o caso. As fístulas que
foram realizadas pelo menos duas intervenções apresentam sintomas clínicos, comodificuldade de
cirúrgicas antes do implante com o fechamento alimentação e hipernasalidade, o tratamento
primário da fissura e o enxerto ósseo, oque poderá proposto poderá ser cirurgia para fechamento da
interferir no processo de cicatrização dotecido mole fístula ou prótese obturadora. A idade ideal para ser
117

feita a correção da fístula dependerá da locais são os mais utilizados, sendo eles, o retalho
sintomatologia, em casos em que estiver afetando a bucal, o corpo adiposo bucal e o retalho palatino
fonação, alimentação (regurgitação de fluidos e rodado. Os procedimentos de retalho à distância
alimentos) e audição. Entretanto, há outros fatores abrangem o retalho de língua, a cartilagem auricular
que o cirurgião deve levar em consideração para e retalho do músculo temporal.42
tomada de decisão, como a localização e tamanho Cirurgia Ortognática
da fístula, relação com os dentes adjacentes, altura
No estágio de dentição permanente,
do rebordo alveolar, persistência da inflamação
geralmente a partir dos 14 anos, é determinado se a
sinusal, saúde geral do paciente, dificuldade técnica
cirurgia ortognática será necessária. Pesquisadores
para o fechamento da fístula, cronologia de erupção
afirmam a existência de uma alta porcentagem de
dos dentes e se já foi realizada ou não a expansão
pacientes que requerem esta cirurgia quando
maxilar.37 Esta cirurgia para o fechamento da fístula
comparados à população em geral.43
buco nasal está associada a alta taxa de recidiva
devido a tensão local, ao tecido cicatricial e a Nesta etapa, portanto, no caso da não
quantidade de tecido disponível para a correção. 38, obtenção de expansão adequada após o tratamento
40
Ainda não há na literatura consenso sobre o ortodôntico realizado durante a fase de
tratamento ideal para o fechamento de fístula buco desenvolvimento e crescimento, faz-se necessária a
nasal. As modalidades de tratamento cirúrgico cirurgia de expansão de maxila, visando a obtenção
podem ser categorizadas como autógenos, além de um novo posicionamento ósseo dos maxilares.
de aloenxertos, xenoenxertos, materiais sintéticos e Os princípios norteadores da cirurgia ortognática
outras técnicas.37,41 O tratamento por tecidos em tratamentos de FL/P são muito semelhantes
autógenos é o mais usado, nesse caso há a opção de àqueles utilizados em pacientes nãofissurados. No
enxerto ósseo e retalhos de tecidos moles. O retalho paciente com FL/P, a cirurgiaortognática busca
de tecido mole pode ser dividido em locais e principalmente o avanço damaxila (Le Fort I) com
distantes da fístula. Os procedimentos de retalhos um possível recuomandibular. A necessidade do
avanço é devido àdeficiência na parte mediana da
face, que está associada à FL/P em pacientes
adultos. O movimento mandibular, por sua vez, é
planejado em diversas situações, como quando a
discrepância sagital é muito acentuada, quando há
inclinação no plano de oclusão mandibular ou
quando háassimetrias mandibulares significativas.43
A Figura 6.11 mostra o planejamento virtual pré e
pós- operatório para cirurgia ortognática.

Um avanço maxilar segmentado pode ser


Figura 6.10 Fístula buco nasal em região anterior de rebordo planejado durante a cirurgia Le Fort I para fazer o
alveolar. Imagem do Acervo do Centro de Atendimento
Integral ao Fissurado Labiopalatal (CAIF/HT, Curitiba - PR).
118

fechamento da FL/P. Além disso, pode ser usado nasal (Figuras 6.12, 6.13 e 6.14). O dispositivo
para expandir o arco superior, posteriormente, aprimora a fala e a respiração nasal, facilita a
permitindo a coordenação do arco transversal, amamentação, reduz a regurgitação nasal e os
maximizando a intercuspidação e melhorando a episódios de asfixia, além de prevenir a invasão da
estabilidade pós-operatória. Esta abordagem língua no interior do defeito palatino e interferir no
permite também o fechamento do tecido mole de crescimento espontâneo de partes do palato em
qualquer fístula buco nasal.20 direção a linha média.44 Os cuidados dos pacientes
que utilizam essa prótese devem ser redobrados. A
higiene bucal e da prótese devem ser feitas da
maneira correta, visto que as infecções por fungo
são frequentes se essa higienização não for
eficiente.

A.

Figura 6.12 Fissura palatina sem a placa obturadora de


palato. Imagem cedida gentilmente pelo Dr. Vinícius Petroni
do Centro de Atendimento Integral ao Fissurado Labiopalatal
(CAIF/HT, Curitiba - PR).

B.

Figura 6.11 Planejamento virtual para cirurgia ortognática.


Imagem A pré-operatória. Imagem B pós-operatória,
mostrando avanço de maxila e mento. Imagens obtidas a partir
de software NemoFAB (Nemotec, Madri, Espanha).

Prótese buco-maxilo-facial
Caso não haja a cirurgia secundária de Figura 6.13 Placa obturadora de palato. Imagem cedida
gentilmente pelo Dr. Vinícius Petroni do Centro de
palato, há possibilidade do tratamento com placa Atendimento Integral ao Fissurado Labiopalatal (CAIF/HT,
Curitiba - PR).
obturadora de palato. A placa obturadora de palato
é um dispositivo, geralmente feito de acrílico, que é
colocado dentro da boca com a finalidade de
preencher a FL/P, separando a cavidade oral da
119

destacam pelo comprometimento estético-


funcional.
A reabilitação completa do paciente com
FL/P envolve uma atuação multidisciplinar. O
cirurgião-dentista é uma parte essencial desse
cuidado, já que estes pacientes podem apresentar
muitas anomalias dentárias além de um maior risco
de desenvolvimento de doenças, como a cárie. O
Figura 6.14 Placa obturadora de palato em posição sobre a tratamento odontológico para a reabilitação do
fissura palatina. Imagem cedida gentilmente pelo Dr. Vinícius
Petroni do Centro de Atendimento Integral ao Fissurado paciente com FL/P compreende etapas terapêuticas
Labiopalatal (CAIF/HT, Curitiba - PR).
distintas de acordo com o crescimento facial do
Considerações Finais indivíduo. Isso gera maior eficiência e menor dano
As FL/P são as má-formações congênitas ao paciente, garantindo uma boa saúde bucal e
craniofaciais mais frequentes entre a população e se sistêmica.

10. Paranaíba LMR, Miranda RT de, Ribeiro LA, Barros


Referências: LM de, Martelli-Júnior H. Frequency of congenital craniofacial
malformations in a Brazilian Reference Center. Rev Bras
1. Mossey PA, Little J, Munger RG, Dixon MJ, Shaw Epidemiol. 2011; 14(1):151–60.
WC. Cleft lip and palate. Lancet. 2009;374(9703):1773–85.
11. Qureshi WA, Beiraghi S, Leon-Salazar V. Dental
2. Sadler T. Langman’s Medical Embriology. 13th ed. anomalies associated with unilateral and bilateral cleft lip and
Wolters Kluwer Health; 2015. palate. J Dent Child. 2012; 79(2):69–73.
3. Dixon MJ, Marazita ML, Beaty TH, Murray JC. Cleft 12. Hupp JR, Ellis E, Tucker MR. Management of
lip and palate: understanding genetic and environmental Patients with Orofacial Clefts. In: Contemporary Oral and
influences. Nat Rev Genet. 2011; 12(3):167–78. Maxillofacial Surgery. 5th ed. Elsevier; 2008. p. 575–94.
4. Murray JC. Gene/environment causes of cleft lip 13. Syngelaki A, Hammami A, Bower S, Zidere V,
and/or palate. Clin Genet. 2002; 61(4):248–56. Akolekar R, Nicolaides KH. Diagnosis of fetal non‐
chromosomal abnormalities on routine ultrasound examination
5. Johnson CY, Little J. Folate intake, markers of folate at 11–13 weeks’ gestation. Ultrasound Obstet Gynecol. 2019;
status and oral clefts: is the evidence converging? Int J 54(4):468– 76.
Epidemiol. 2008; 37(5):1041–58.
14. Lewis CW, Jacob LS, Lehmann CU. The primary
6. Picot C, Berard A, Grenet G, Ripoche E, Cucherat M, care pediatrician and the care of children with cleft lip and/or
Cottin J. Risk of malformation after ondansetron in pregnancy: cleft palate. Pediatrics. 2017; 139(5).
An updated systematic review and meta‐analysis. Birth defects
Res. 2020; 112(13):996–1013. 15. ROSENSTEIN SW. Orthodontic treatment for the
cleft palate patient. J Am Dent Assoc. 1960; 60(6):711–4.
7. Spina V. A proposed modification for the
classification of cleft lip and palate. Cleft Palate J. 1973; 16. Abu-Hussein M, Watted N, Emodi O, Zere E. Role
(10):251–2. of Pediatric Dentist -Orthodontic In Cleft Lip and Cleft Palate
Patients. IOSR J Dent Med Sci. 2015; 14(11):2279–861.
8. Shaw W. Global strategies to reduce the health care
burden of craniofacial anomalies: Report of WHO meetings on 17. Shaye D, Liu CC, Tollefson TT. Cleft Lip and Palate.
International Collaborative Research on Craniofacial An Evidence-Based Review. Facial Plast Surg Clin North Am.
Anomalies. Cleft Palate-Craniofacial J. 2004; 41(3):238–43. 2015; 23(3):357–72.
9. Souza J, Raskin S. Clinical and epidemiological 18. James JN, Costello BJ, Ruiz RL. Management of
study of orofacial clefts. J Pediatr (Versão em Port. 2013; cleft lip and palate and cleft orthognathic considerations. Oral
89(2):137–44. Maxillofac Surg Clin North Am. 2014; 26(4):565–72.
120

19. Broll D, De Souza T V., Nobrega E, Luz CL, Repeke 34. Parker DW, Proffit WR, White Jr RP, Turvey TA.
CE, Da Silva LC, et al. Columella Elongation Surgery Outcome Retained third molars with orthodontics and orthognathic
in Complete Bilateral Cleft Lip and Palate. Plast Reconstr Surg surgery. J oral Maxillofac Surg. 2008; 66(9):1864–8.
- Glob Open. 2019; 7(3):1–7.
35. Wermker K, Jung S, Joos U, Kleinheinz J. Dental
20. Evans CA. Orthodontic treatment for patients with implants in cleft lip, alveolus, and palate patients: a systematic
clefts. Clin Plast Surg. 2004; 31(2):271–90. review. Int J Oral Maxillofac Implants. 2014; 29(2).

21. Isono H, Kaida K, Hamada Y, Kokubo Y, Ishihara M, 36. Miranda BL, de Araújo Júnior JL, de Paiva MAF,
Hirashita A, et al. The reconstruction of bilateral clefts using Lacerda RHW, Vieira AR. Management of oronasal fistulas in
endosseous implants after bone grafting. Am J Orthod Dentofac patients with cleft lip and palate. J Craniofac Surg.
Orthop. 2002; 121(4):403–10. 2020;31(6):1526–8. 37- Parvini P, Obreja K, Sader R, Becker
J, Schwarz F, Salti L. Surgical options in oroantral fistula
22. Jaju R, Tate A. The role of pediatric dentistry in management: a narrative review. Int J Implant Dent. 2018;
multidisciplinary cleft palate teams at advanced pediatric dental 4(1):1–13.
residency programs. Pediatr Dent Dent. 2009; 31:188–92.
38. Abdel-Aziz M, Hegazi M, Ghandour H.
23. Kobayashi TY, Gomide MR, Carrara CF de C. Velopharyngeal dysfunction. Handb Pharyngeal Dis New
Timing and sequence of primary tooth eruption in children with York, NY Nov Sci. 2010; 109–35.
cleft lip and palate. J Appl Oral Sci. 2010; 18(3):220–4.
39. Diah E, Lo L, Yun C, Wang R, Wahyuni LK, Chen
24. Bartzela TN, Carels CEL, Bronkhorst EM, Jagtman Y. Cleft oronasal fistula: a review of treatment results and a
AMK. Tooth agenesis patterns in unilateral cleft lip and palate surgical management algorithm proposal. Chang Gung Med J.
in humans. Arch Oral Biol. 2013; 58(6):596–602. 2007; 30(6):529.
25. Kawakami M, Yagi T, Takada K. Maxillary 40. Sadhu P. Oronasal fistula in cleft palate surgery.
Expansion and Protraction in Correction of Midface Retrusion Indian J Plast Surg. 2009; 42(S 01):S123-8.
in a Complete Unilateral Cleft Lip and Palate Patient. Angle
Orthod. 2002; 72(4):355–61. 41. Visscher SH, van Minnen B, Bos RRM. Closure of
oroantral communications: a review of the literature. J oral
26. Graber L, Vanarsdall R, Vig K. Orthodontics Current Maxillofac Surg. 2010; 68(6):1384–91.
Principles and Techniques. 5th ed. Elsevier; 2011. 965–89 p.
42. Kwon M-S, Lee B-S, Choi B-J, Lee J-W, Ohe J-Y,
27. Roy AA, Rtshiladze MA, Stevens K, Phillips J. Jung J- H, et al. Closure of oroantral fistula: a review of local
Orthognathic Surgery for Patients with Cleft Lip and Palate. flap techniques. J Korean Assoc Oral Maxillofac Surg. 2020;
Clin Plast Surg. 2019; 46(2):157–71. 46(1):58–65.
28. Solis A, Figueroa AA, Cohen M, Polley JW, Evans 43. Strong S. Adolescent dentistry: mutidisciplinary
CA. Maxillary dental development in complete unilateral treatment for the cleft lip/palate patient. Pr Proced Aesthet
alveolar clefts. Cleft Palate-Craniofacial J. 1998; 35(4):320–8. Dent. 2002; 14(4):333–8.
29. Ribeiro A de A, Suedam IKT, Faco RA de S, Holz 44. Goyal M, Chopra R, Bansal K, Marwaha M. Role of
IS, Scarelli JF, Bertier CE. Tratamento ortodôntico-cirúrgico obturators and other feeding interventions in patients with cleft
para o prognatismo pré-maxilar em fissura pré-forame bilateral lip and palate: A review. Eur Arch Paediatr Dent. 2014;
completa. Ortho Sci, Orthod sci Pr. 2016; 56–65. 15(1):1–9.
30. Bittermann GKP, de Ruiter AP, Janssen NG,
Bittermann AJN, van der Molen AM, van Es RJJ, et al.
Management of the premaxilla in the treatment of bilateral cleft
of lip and palate: what can the literature tell us? Clin Oral
Investig. 2016; 20(2):207–17.

31. Aburezq H, Daskalogiannakis J, Forrest C.


Management of the prominent premaxilla in bilateral cleft lip
and palate. Cleft palate-craniofacial J. 2006; 43(1):92–5.

32. Rizell S, Alhakim Z, Mark H, Naoumova J.


Predictive factors for canine position in patients with unilateral
cleft lip and palate. Eur J Orthod. 2021; 43(4):367–73.

33. Westerlund A, Sjöström M, Björnström L, Ransjö M.


What factors are associated with impacted canines in cleft
patients? J Oral Maxillofac Surg. 2014; 72(11):2109–14.
7
ATENÇÃO ODONTOLÓGICA EM PACIENTES COM ALTERAÇÕES NEUROLÓGICAS
E/OU DEGENERATIVAS
Yasmine Mendes Pupo | Jaqueline do Carmo Machado Lopes | Júlia Fabris | Laís Bonatto Zawadniak
| Amanda Kerin Alves Cavalheiro

Introdução
As doenças neurodegenerativas são sendo essas: Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA),
caracterizadas pela morte progressiva de uma ou Alzheimer, Parkinson e Doença de Huntington.
mais populações de células nervosas. 1-3 Isso resulta Todas essas são consideradas proteinopatias, ou
na deficiência de funções cerebrais específicas, seja, a agregação patológica das proteínas faz parte
como a memória, movimento e cognição, realizadas do processo fisiopatológico dessas doenças. 3
4
pela região afetada do sistema nervoso central.
Já a paralisia cerebral, não se inclui como
Nesse contexto, há evidências de que a apoptose
doença neurodegenerativa, uma vez que não há
neuronal relacionada ao estresse oxidativo e
progressão da doença. Ela é caracterizada por um
2
disfunção mitocondrial, faz-se presente nas
quadro permanente de lesão estável no sistema
disfunções que serão apresentadas neste capítulo,
nervoso central. 5
122

O Alzheimer e demais demências, ocupam a cuidado. Embora existam as técnicas para auxílio no

quinta posição dentre as principais causas de morte tratamento desses pacientes, ainda há escassez de

no mundo, afetando cerca de 50 milhões de profissionais capacitados para realizar o

pessoas. À medida que a população envelhece, atendimento, além da falta de comprometimento e

estima-se que esse valor triplique até 2050. 6 Quanto informação dos responsáveis por eles. 9,10

à paralisia cerebral, essa, acomete mais de 17 Sendo assim, este capítulo tem

milhões de pessoas no mundo, sendo a deficiência comoobjetivo difundir informações sobre a atuação

física mais comum na infância. 7 Muitos grupos de do Cirurgião-dentista em relação aos pacientes com

pacientes com deficiência têm um risco aumentado paralisia cerebral e algumas das mais prevalentes

para comprometimentos bucais devido a uma doenças neurodegenerativas. Dessa forma, espera-

higiene pouco eficiente, manifestações orais de sua se que o profissional se atente às particularidades de

condição particular, efeitos de medicamentos, entre cada paciente, respeitando e atendendo às

outros. A higiene bucal é, muitas vezes, prejudicada respectivas necessidades.

pela falta de cognição do indivíduo, que em certas Paralisia cerebral


alterações há distorção na compreensão, memória,
falta de destreza manual, e tem a coordenação A Paralisia Cerebral (PC) descreve um
afetada para efetuar as funções precisas. A partir grupo de desordens neuromotoras permanentes e
disso, a presença de um cuidador que o auxilie, não progressivas que afetam funções motoras e de
geralmente se faz necessário. 8
Essa dependência postura do indivíduo. As desordens neuromotoras
por alguém acaba deixando o cuidado bucal desses são causadas por danos ao cérebro imaturo ou em
pacientes em segundo plano, já que o foco maior é desenvolvimento, que acontecem em eventos pré-
sua condição geral de saúde, portanto, é natais, perinatais ou pós-natais. Os distúrbios
fundamental uma mudança dos motores são frequentemente acompanhados de
responsáveis/cuidadores para incluir a saúde bucal defeitos na sensação, percepção, cognição,
em seu cotidiano. comunicação e comportamento, há casos em que a
epilepsia e problemas musculoesqueléticos estão
Quando esses pacientes buscam por auxílio
presentes. 11,12
de um cirurgião dentista, técnicas de manejo de
Em 1843, o médico ortopedista William
comportamento podem ajudar no atendimento,
John Little estudou 47 casos de crianças que
essas que tem como foco a facilitação na
apresentavam sintomas de espasticidade, todas
comunicação, cooperação e efetivação de um
teriam tido algum comprometimento ao nascer,
cuidado bucal com qualidade. Para isso, é de grande
sendo entre eles apresentação pélvica,
importância a capacitação e um olhar humanizado
prematuridade, dificuldades no parto e outros.
dos profissionais de saúde, considerando a
Apenas em 1893, por Sigmund Freud, essa
prevenção, diagnóstico, tratamento e reavaliação,
desordem que acometia várias crianças foi chamada
buscando sempre a participação da pessoa com
de Paralisia Cerebral. 5
deficiência e de seu cuidador ou responsável neste
123

Os registros de Paralisia Cerebral nos


países desenvolvidos ficam em torno de 2 a 3 casos
em 1000 nascidos vivos, e essa prevalência é
significativamente maior em nascimentos
13
prematuros. Sobre a expectativa de vida desses
16
pacientes, é geralmente normal, com 5 a 10%
morrendo durante a infância. Aqueles que sofrem
com outros fatores associados à deficiência motora,
como a epilepsia e a doença intelectual, têm maiores A PC pode ser dividida de acordo com suas

riscos. 14 principais características: 5,15

Tabela 7.1 Tipos de Paralisia Cerebral 5, 15

Patogenia Alguns dos fatores de risco levados em


consideração são prematuridade, encefalopatia,
A causa para a PC pode incluir a convulsões neonatais, AVC neonatal ou pós natal,
interação de diversos fatores de risco, e muitas nascimentos múltiplos, infecção pós natal e cirurgia
12
vezes não é identificada. Os distúrbios de pós natal. 14
movimento ou postura são de origem central, e
Distúrbios gestacionais podem contribuir
mais de 80% dascrianças apresentam exames de
na má formação do cérebro da criança, e acontecem
neuroimagem alterados, apesar destes não serem
muitas vezes nas primeiras 20 semanas de gravidez.
necessários paraconfirmar o diagnóstico, já que a
É o caso de infecções que podem passar para o feto
Paralisia Cerebral é definida mais pela avaliação
via placenta, mutações genéticas como é o caso dos
clínica e relatos dos pais sobre dificuldades nas
cistos porencefálicos e lisencefalia, hipovitaminose
atividades motoras do filho(a), como andar, sentar,
da mãe que pode interferir no crescimento e
ficar em pé, posturaalterada, entre outros. 16,17
124

desenvolvimento de funções nervosas, fatores Sedação, redução do tônus nos músculos


teratogênicos, entre outros. Após o nascimento, a axiais, retenção urinária, constipação, sedação e
criança ainda tem chances de desenvolver a PC, por sonolência são alguns de seus efeitos adversos. 18,19
fatores como a meningite, trauma, hipóxia, As principais interações medicamentosas
problemas cardiovasculares como embolias, entre envolvem anti-hipertensivos que podem ser
outros. 13,15 potencializados, e antidepressivos tricíclicos, o uso
Desta forma, o diagnóstico precoce é de álcool e drogas também contribuem para o
fundamental para que as medidas de intervenção declínio de funções do SNC. 18,19
sejam oportunas, estas são únicas para cada criança, Tizanidina
assim como seus resultados. Não há cura para esses
Tem ação nos receptores α-2-adrenérgicos e
indivíduos, mas existem maneiras de explorar a
imidazólicos da medula. Há uma diminuição na
função motora e melhorar a qualidade de vida.
liberação de neurotransmissores excitatórios, o que
Algumas formas de trabalhar isso são
contribui para a redução de reflexos polissinápticos.
recomendadas, como aquelas baseadas no
Efeitos adversos como sedação excessiva,
desenvolvimento de habilidades motoras e
alucinações, boca seca, sonolência e tontura podem
funcionais, intervenções farmacológicas,
acontecer. 18,19
ortopédicas e terapêuticas para saúde e prevenção
Clonidina
secundária (Bifosfonatos, toxina botulínica, gesso,
treinamento físico, entre outros). 14 Atua essencialmente no sistema nervoso
18
Fármacos utilizados central, sendo agonista α ‐adrenérgico.

Benzodiazepínicos (Clonazepam, Diazepam, Lorazepam) Prescritos principalmente para transtornos


de déficit de atenção, hiperatividade e distúrbios de
Atuam potencializando a ação do GABA
sono,têm sido usados em indivíduos com distúrbios
(neurotransmissor inibitório do sistema nervoso
motores, especificamente para tiques. 18
central). 18
Como efeitos adversos comuns podem ser
Usados em casos de espasticidade, encontrados tontura, sedação, hipotensão ortostática
convulsões e ansiedade. Como principais efeitos e boca seca. 18
adversos são incluídos sedação, diminuição no Toxina botulínica
18
impulso respiratório, prejuízo na memória.
Seu uso reflete na redução do tônus
O Diazepam é muito usado nos tratamentos
muscular e alívio da dor, contribuindo para os
de espasticidade de origem medular e cerebral. 18,19
cuidados do indivíduo, 19 já que impede de maneira
Baclofeno oral
reversível a liberação de acetilcolina na junção
Agonista dos receptores de GABAb, que
neuromuscular, contribuindo para o relaxamento da
leva à inibição dos reflexos medulares. Bastante
musculatura, além de impedir a passagem de
usado em casos de espasticidade medular e distonia 18
neurotransmissores envolvidos na dor. A
18,19
primária.
aplicação pode contribuir no tratamento de
125

sialorreia, a injeção intraglandular inibe a liberação Maloclusões


de acetilcolina dos terminais nervosos colinérgicos, Fatores como a hipotonia da musculatura
reduzindo a secreção salivar. 20 Os efeitos adversos orofacial, reflexo de deglutição anormal, respiração
da toxina botulínica em pacientes com paralisia bucal frequente, improficiência bucal e rosto mais
cerebral não são muito constatados, mas inclui comprido, podem refletir em problemas de
fraqueza local ou sistêmica, e pode ser maloclusão como a mordida aberta anterior e
acompanhada de dor, hematoma e dificuldade de maloclusão de Classe II pela classificação de Angle.
engolir nos casos em que for aplicado próximo a Além disso, a maloclusão e respiração frequente
18,21
glândulas salivares. Mais estudos são pela boca são fatores de risco para o
necessários a respeito do uso da toxina nesses desenvolvimento de distúrbios na ATM. 22,23

Tabela 7.2 Fármacos utilizados na paralisia cerebral. Traumatismo dentário


É comum encontrar nesses
pacientes a classe II de maloclusão com os dentes
incisivos superiores proeminentes, dificuldades
para andar e ocorrências de convulsões, o que pode
contribuir para maior prevalência de lesões
traumáticas. 15, 23, 24
Bruxismo

O número aumentado de bruxismo nesses


pacientes ainda não tem uma explicação
comprovada, há hipóteses levantadas sobre arelação
desse hábito com problemas de função da
18
indivíduos. Dopamina, hábitos bucais anormais como chupar o
dedo, distúrbio do sono, entre outros. Mas ao

Manifestações orais de interesse contrário do que muitos pensam, a maloclusão não


deve ser um fator predisponente para o ranger de
Os problemas neuromuscularesprovenientes dentes. 22,23
Uma conduta válida nesses casos é a
da paralisia podem afetar diretamentea saúde bucal prescrição de medicamentos para melhorar a
desses indivíduos, em muitos casos apresentam condição do sono, que podem ajudar na diminuição
alterações na estrutura orofacial, desenvolvimento de comportamentos bucais anormais durante esse
de hábitos parafuncionais, problemas na período. 23
alimentação, em manter uma higienebucal eficaz, Sialorreia
22
entre outras barreiras enfrentadas. O cirurgião
A impressão de que esses pacientes produzem
dentista deve estar atento às alterações que podem
maior quantidade de saliva na maioria das vezes
ter forte relação com a Paralisia Cerebral para que
não é correta, na verdade eles têm dificuldade em
o tratamento seja mais eficaz.
126

engolir, pelo fechamento labial incorreto, das vezes uma respiração bucal, há risco
disfunção oromotora e podem apresentardistúrbios aumentado para colonização de patógenos
da sensibilidade intraoral, o que contribui para respiratórios, portanto, a manutenção da higiene
21, 22, 24
movimentos descontrolados da língua. oral deve ter uma atenção especial para minimizar
Além disso, fatores como rachaduras na boca, os níveis de bactéria e inflamação da gengiva. 23
infecções, desidratação, alguns medicamentos Na infância, os pais podem segurar a
antiepilépticos (como o Clonazepam), posição de criança no colo dando apoio a cabeça com uma mão,
boca aberta, distúrbios de postura e grau de enquanto usa a outra para escovação. Para os
concentração podem contribuir e agravar o caso. indivíduos mais velhos, inclinar-se em uma cadeira
20,22,23
com o cuidador apoiando a cabeça com sua mão, e
Para melhorar a qualidade de vida dos usando a outra para fazer a limpeza dos dentes é
pacientes em relação a isso, medicamentos uma forma otimizada para realizar a higiene bucal.
anticolinérgicos, terapia de fala, procedimentos Aqueles pacientes com deficiências motoras mais
cirúrgicos como o redirecionamento dos ductos leves, que têm capacidade de realizar uma limpeza
salivares, são algumas das maneiras terapêuticas eficaz, podem usar escovas de dente elétricas. 23

20,22,23
para o tratamento de sialorreia. O tratamento Doença periodontal
cirúrgico tem por objetivo reduzir ou eliminar a
A hiperplasia gengival e sangramento
estimulação neural para as glândulas salivares, e é
associado são mais frequentes nesses pacientes
indicado apenas para quadros graves, já que pode
devido principalmente às dificuldades para higiene,
ter consequências como a xerostomia. 20,21
sensibilidade intraoral e disfunção oromotora. Além
Higiene oral comprometida disso, alguns pacientes fazem uso de
Alteração nos movimentos, involuntarismo, antiepilépticos, como a Fenitoína, que podem

reflexos orais como mordidas evômitos e a falta de contribuir para o aumento gengival. 15,23

coordenação, são alguns dos fatores que explicam Erosão dentária


a dificuldade na hora de escovar os dentes. A
A erosão é o processo referente a perda de
presença de alguém que auxilieo indivíduo nesses
tecido dentário duro por um processo químico não
momentos é de extrema importância, além da
bacteriano. Pacientes com PC são propensos a
necessidade de orientações dadas por um
desenvolver essa alteração devido à distúrbios
profissional de como realizar a higiene bucal.
gastroesofágicos, disfagia e infecções torácicas
Técnicas alternativas foram criadas para que os 23
presentes em muitos casos.
cuidados bucais desses pacientes sejam mais
O diagnóstico precoce dos problemas
eficazes e menos desafiadores, utensílios de
citados anteriormente é fundamental para
higiene como porta-fios, escovas de dente com
evitar danos irreversíveis e conseguir tratar o
hastes maiores e escovas de dente elétricas são
paciente o mais breve possível.
algumas das opções. 23

Como esses pacientes apresentam na maioria


127

Condutas odontológicas boca com a ajuda de protetores bucais, além de


em muitos casos precisar de um acompanhante
 O cirurgião dentista deve ter conhecimento
devidamente protegido para segurar o indivíduo
sobre o histórico médico e dos medicamentos
na tomada de imagem; 15,23
usados, além das características
 Às vezes é preciso utilizar meios de sedação e
socioeconômicas e culturais do paciente, para
anestesia para que o procedimento seja eficiente,
escolher a melhor forma de tratamento para este;
15,20 pois muitas vezes o paciente não é colaborativo
e acaba prejudicando o atendimento,
 Reservar um tempo da consulta para
principalmente em procedimentos invasivos.
desenvolver uma interação
Medicamentos como benzodiazepínicos, óxido
profissional/paciente, a presença dos pais ou
nitroso e propofol podem ser usados para induzir
responsáveis também se faz necessária, para que
sedação; 15,23
haja confiança de ambas as partes e tenha
 É importante o envolvimento de uma equipe
sucesso no atendimento e tratamento; 15,23
multiprofissional, pois muitos tratamentos
 É fundamental trabalhar reforçando a
precisam trabalhar a causa do problema, por
importância de uma dieta não cariogênica e da
exemplo na sialorreia, se faz necessário o
higiene bucal feita em casa, auxiliando tanto o
treinamento sensorial e de habilidades motoras
paciente quanto seus responsáveis a respeito de
orais com supervisão do fonoaudiólogo. 20
como deve ser realizada a escovação; 23
 Adaptação dos assentos para o paciente com Doença de Parkinson
alteração de postura, com regulagem apropriada
para que forneça o devido suporte, almofadas e A doença de Parkinson (DP) afeta 1 a cada

rolos de toalha na cadeira também podem ser 5000 indivíduos com mais de 50 anos. É

úteis 15,23
. Ao início do procedimento, o caracterizada pela perda de 50 a 60% dos neurônios

profissional deve apresentar os instrumentos a da substância negra. 2

serem usados, visando amenizar o medo e Clinicamente a doença é marcada pela

ansiedade nesses indivíduos; 23 tríade: tremor, rigor e acinesia. Esses sintomas

 Para a abertura da boca, é aconselhado o uso de podem ser acompanhados por comprometimento

abridores ou dedeiras 15. Protetores de garganta cognitivo, o qual, geralmente, ocorre apenas nofinal

são recomendados para que o paciente não corra da doença. 2,3

o risco de engolir algum material que esteja Aém disso, são citadas as seguintes

sendo manuseado pelo profissional, o uso do manifestações clínicas: bradicinesia, alterações de

lençol ajuda nesses momentos, além de manter reflexos posturais, alteração no equilíbrio, alteração

o campo operatório seco; 15,23 na voz (fala baixa e monótona), caligrafia alterada

 No procedimento radiográfico, a cabeça do (a letra torna-se menor e tremida), artralgia,

paciente pode ser mantida na posição correta problemas com a deglutição e mastigação,

com o auxílio de tiras de velcro, e a abertura da distúrbios de fala, entre outros. 15,24
128

O característico tremor parkinsoniano causal, ou seja, que desencadeia a degeneração, ou


geralmente inicia nas mãos, progredindo para a se representam a fisiopatologia responsiva, na qual
perna, rosto, língua e mandíbula. São considerados o evento de união e nucleação proteica representa
tremores de repouso, uma vez que são observados uma tentativa fisiológica de atenuar a toxicidade das
3
no estado de relaxamento. A amplitude dos proteínas mal dobradas pré-existentes. Sabe-se
movimentos também é alterada no decorrer da ainda que mutações no gene que codificam alfa-
doença, sendo reduzida durante os movimentos sinucleína, contribuem na formação dos agregados
24
intencionais. proteicos, uma vez que codificam proteínas

Em relação aos sintomas não motores, têm- alteradas 2. Porém, a DP familiar representa menos
3
se: variações na pressão arterial (particularmente, a de 10% dos casos existentes. A presença dos

hipotensão ortostática), disritmias cardíacas, suor corpos de Lewis e da alfa-sinucleina dentro do

excessivo, disfunções na bexiga e intestino, citoplasma celular, bem como o estresse oxidativo

disfunção sexual, distúrbios relacionados ao sono (ocasionado pelo déficit de glutationa antioxidante)

(sendo os mais comuns: insônia, apneia do sono, e, por consequência, disfunção mitocondrial, levam

fragmentação do sono) e distúrbios os pesquisadores a considerarem a morte celular

comportamentais (tais como: demência e apoptótica. 2,3 A dificuldade em se encontrar a causa

depressão). 24 primária da DP é explicada pela série de eventos


que ocorrem na célula não serem passiveis de
Patogenia
análise em cérebros humanos pós morte, uma vez
Existem lacunas no que se refere ao início que esses eventos são concomitantes e crônicos,
dos eventos que acarretam a morte do neurônio na enquanto a morte programada de uma única célula
DP. Porém, no intermédio das ocorrências ocorre dentro de algumas horas. 2,3
patológicas, têm-se: agregados proteicos Medicamentos utilizados
intracelulares (Corpos de Lewis), fatores familiares,
estresse oxidativo, disfunção das mitocôndrias e Após o diagnóstico conclusivo da DP e com

apoptose. 2,3 interferência da sintomatologia na qualidade de vida


do paciente, geralmente, é iniciado o tratamento
A morte de neurônios dopaminérgicos (que
com medicamentos dopaminérgicos, a fim de
produzem dopamina) da substância negra, faz com
compensar o déficit de dopamina temporariamente.
que a quantidade de dopamina liberada seja
Assim, é importante salientar que a terapia
reduzida progressivamente, o que reduz a
medicamentosa tende a aliviar os sintomas por um
estimulação do córtex motor da base. Isso resultada
certo período, mas a evolução da doença não é
nos sintomas clínicos supracitados. 3 Os corpos de
pausada. 2,24
Lewis são agregados de proteínas mal dobradas
Dentre os fármacos utilizados, serão citados
características da DP, presentes no citoplasma das
alguns (nomes genéricos) juntamente com
células neuronais. No entanto, não se sabe ao certo
informações de grande relevância para o Cirurgião-
se a formação dos corpos Lewis é a fisiopatologia
dentista:
129

Levodopa Quando o paciente faz uso do entocapone,


deve-se considerar que o composto é excretado pela
A Levodopa é um dos medicamentos mais
bile. Sendo assim, o Cirurgião-dentista deve ter
comuns indicados para a DP. Seu mecanismo faz
cautela ao prescrever eritromicina e ampicilina, pois
com que ela ultrapasse a barreira hematoencefálica 24
ambos interferem na excreção biliar.
e seja absorvida pelos neurônios remanescentes,
Selegilina
sendo transformada em dopamina. Pode ser
recomendada administração em combinação com Geralmente é utilizada em combinação com
outros fármacos para que não seja convertida em Levodopa, pois prolonga seu efeito. É metabolizada
24,25
dopamina na circulação sistêmica. no fígado em I-metanfetamina e I-anfetamina,

A longo prazo os pacientes podem podendo causar arritmias cardíacas e sensibilidade

apresentar-se indiferentes à medicação, resultando aos simpaticomiméticos, ou seja, interage com

em flutuações nos sintomas: em alguns momentos o levonordefrina e epinefrina, causando hipertensão

fármaco apresenta resultado, outros não. Pode grave; a interação da Selegilina com meperidina

ocorrer ainda a discinesia e a distonia, ou seja, possui efeito tóxico, resultando em hipertermia

movimentos involuntários e contrações anormais grave, hipertensão e taquicardia; o fármaco ainda

nos músculos dos pés e da mastigação. Como potencializa o efeito de analgésicos narcóticos,

resultado desses sintomas, o paciente pode perder dessa forma, sugere-se que, quando necessário, o

grande quantidade de peso (devido à dificuldade de Cirurgião-dentista prescreva apenas metade da

mastigação e deglutição, além do excessivo gasto dosagem normal desses compostos ao paciente. 24

energético). 24,25 As reações adversas ao uso da Selegilina

A náusea e hipotensão ortostática foram comtemplam: Ulcerações orais sublinguais,

relatadas como sintomas adversos. Na combinação queimação nos lábios, queimação na boca, dor
24,25
Levedopa + Carbidopa (Sinemet) e na combinação supraorbital, disgeusia e bruxismo.

de Levodopa + Carbidopa +Entacapone (Stalevo), Rosagalina


as reações adversas incluem:xerostomia, disgeusia, Efeito semelhante à Selegilina, porém não
glossite, trismo, sialorreia, saliva “escura”, gera subprodutos relacionados ao metabolismo da
pigmentação dos dentes, disfagia ebruxismo. 24 anfetamina; pacientes que fazem o uso da
Em relação às interações medicamentosas, Rosagalina, podem receber anestésicos locais
é importante ressaltar que, em pacientes que fazem contendo levonoderdefrina e epinefrina. Quanto a
uso de medicamentos contendo Levodopa e/ou interação com meperidina, há ocorrência de um
entacapone, é preciso tomar precauções ao efeito tóxico, causando hipertermia grave,
administrar anestésicos locais. Não se deve hipertensão e taquicardia. 24
administrar mais de 0,05 mg de epinefrina, pois As reações adversas relacionadas ao uso da
dosagens maiores podem resultar num efeito Rosagalina, são: xerostomia, dor no pescoço,
exagerado na pressão arterial e na frequência vertigem, rinite e conjuntivite. Cerca de menos de
24
cardíaca do paciente. 10% dos usuários desenvolvem discinesia e dor de
130

24
cabeça. apresenta ações agonistas à dopamina. Possui
eficácia no tratamento do tremor parksoniano,
Pramipexol
hipocinesia e instabilidade postural. As reações
Com a perda sucessiva de neurônios, adversas, são: confusão, alucinações e um
faz-senecessário a utilização de agonistas da agravamento do glaucoma e insuficiência cardíaca
dopamina, como o Pramipexol, que age congestiva, sendo os pacientes idosos os mais
24
diretamente nos receptores. suscetíveis a esses efeitos colaterais; pode ocorrer:

Os efeitos adversos à essa medicação, xerostomia e secura nasal. 24,25

são: Hipotensão ortostática, náuseas, vômitos, Agentes anticolinérgicos à Tri-hexifenidil e beztropina


confusão, alucinações; idosos e pacientes com São recomendados para tratar tremores,
deficiência cognitiva são os mais suscetíveis porém não possuem eficácia na rigidez e
a efeitos adversos. 24 bradicinesia. Pacientes idosos podem ser

Ropinerole intolerantes e os efeitos adversos à essa medicação,

Possui efeito semelhante ao Pramipexol. Os limitam a sua eficácia. 24

efeitos adversos se repetem, e somam-se: Os efeitos colaterais relacionados a esses

xerostomia, gengivite, glossite, edema lingual, dor fármacos, são: Confusão, visão turva, agravamento

de dente, dor de cabeça, faringite e zumbido. 24,25 do glaucoma, retenção urinária, disritmia cardíaca,
sendo os idosos os mais suscetíveis aos efeitos
Cabergolina
adversos; relata-se também a xerostomia nesses
Como o Ropinerole, é de efeito semelhante
pacientes. 24,25
ao Pramipexol. A cabergolina é associada, em
Tabela 7.4 Fármacos utilizados na Doença de Parkinson.
alguns estudos, com o desenvolvimento de folheto
fibrosos rígidos da valva cardíaca que não podem se
fechar completamente, possivelmente, aumentando
o risco de endocardite. Deve-se recordar que
pacientes com endocardite necessitam de profilaxia
antibiótica a determinados tratamentos
odontológicos. 24
Como efeitos colaterais ao uso da cabergolina,
tem-se: hipotensão ortostática, náuseas, vômitos,
confusão e alucinações; os pacientes idosos e com
comprometimento cognitivosão os mais suscetíveis
a essas reações. Pode ocorrer ainda: xerostomia,
dor de dente, rinite,irritação da garganta e edema
periorbital. 24,25
Amantadina
É um fármaco de ação antiviral que
131

A Benzotropina, em particular, pode na saúde bucal, devido às suas funções protetoras e


provocar a secura na garganta e no nariz. Já o Tri- o aumento da vontade de doces.24,28 A literatura
exifenidil, pode ocasionar parotidite supurativa apresenta ainda a hipótese de que inflamações
24,25
secundária a secura excessiva da boca. periféricas, como a gengivite, podem contribuir

Manifestações orais de interesse para a progressão da DP. Porém, são necessárias


mais evidências para que isso possa ser afirmado. 26
Apesar de conhecida pelos danos motores,
Nesse contexto, sugere-se que haja o
a DP causa danos na qualidade de vida dos
acompanhamento odontológico adequado,
portadores até por meio de sintomas não motores
juntamente com o médico do paciente para que as
associados. 24–26 Dessa forma, a fim de proporcionar
indicações e complicações sejam repassadas para o
ao paciente o melhor atendimento e tratamento,
indivíduo e para os responsáveis e/ou cuidadores,
adequado às suas condições, serão apresentadas
bem como a educação em saúde bucal para a
algumas manifestações bucais relacionadas a DP, as
adequada e eficaz higiene bucal. 24,25,28
quais não devem ser negligenciadas pelo Cirurgião-
Dentista. Dor orofacial, desconforto na ATM, atrito dental, mordidas

Cárie dentária e doença periodontal na língua e/ou bochecha e bruxismo


Esses são os sintomas com maior riqueza
Apesar das controvérsias no que diz
dentro da literatura, sendo a dor orofacial a mais
respeito à relação entre cárie e DP, 24 é consenso na
comum. 26 O tremor parkinsoniano característico, as
literatura que higiene bucal dos portadores de DP é,
reações adversas a medicamentos, a bradicinesia e
por vezes, prejudicada, seja por falta da destreza nos
discinesia, são os principais responsáveis por essas
movimentos de maior precisão ou pela falta de
ocorrências. Há ainda o acréscimo de distúrbios
conhecimento, por parte de responsáveis e
cognitivos, que podem intensificar esses sintomas.
cuidadores, da higienização bucal adequada. 24–26
3,10,24,26,27
Essas condições, como consequência, Nesses casos, deve-se recomendar ao
fazem comque os pacientes com DP sejam mais paciente o uso de protetores bucais, a fim de evitar
vulneráveis a cárie dentária, periodontite e a quebra de elementos dentários e o atrito. Neste
edentulismo. De acordo com os estudos de contexto, em alguns casos, sugere-se a aplicação de
28 29
Hanaoka et al. (2009) eMuller et al. (2011), é toxina botulínica. 24,26
mais recorrente recessãogengival e mobilidade Queimação na boca
dentária em pacientes com DP. Cerca de ¼ dos portadores de DP relatam a
A cárie radicular é a de maior prevalência, sensação de desconforto doloroso na língua,
uma vez que o número de superfícies radiculares assoalho da boca, lábios e bochecha. Ainda não se
expostas pode ser relacionado com o sabe a fisiopatologia completa desse sintoma,
25
envelhecimento. todavia, em pacientes com DP, a sensação parece
Outros fatores de relevância são a ser um efeito adverso à medicação Levodopa e a
xerostomia (comum em indivíduos com DP), uma questões cognitivas como a depressão. Devido a
vez que a saliva desempenha um papel primordial isso, o tratamento é muito variável. De acordo com
132

ensaios clínicos a administração de capsaicina, sendo expressos na língua (tremor, dificuldade para
ácido alfalipóico, clonazepam e antidepressivos iniciar o movimento, bombeamento e elevação
pode proporcionar alívio da queimação oral ou prolongada), mandíbula (rigidez), extravasamento
sintoma de dor. A terapia cognitivo- labial do bolo alimentar, refluxo, redução do
comportamental possui grande relevância 24–26 peristaltismo e risco aumentado de aspiração. 29
Distúrbios na Mastigação, perda de paladar Nesse contexto, por conta do refluxo ácido,
e/ou olfato e baixo peso pode ocorrer erosão dentária por pirimólise,
Devido aos movimentos característicos da acarretando a hipersensibilidade. Nesses casos,
DP que ocasionam excedente gasto energético e a deve-se aconselhar o paciente a apenas enxaguar a
dificuldade para mastigar e engolir os alimentos, faz boca, e só após cerca de 30 minutos depois do
com que o paciente perca peso. 24,25,29 episódio de refluxo, escovar os dentes. O uso de
Além disso, a mobilidade da mandíbula e a tecnologias que empregam fosfato de cálcio e
velocidade reduzida dos movimentos, a mobilidade fluoreto podem auxiliar, com o objetivo de
diminuída da língua, os tremores e demais sintomas, compensar os danos erosivos. 25 Quanto a sialorreia,
acentuam esse quadro. 24–26 quantidade excessiva de saliva na boca, essa, de
A perda do olfato é possivelmente acordo com a literatura, não está relacionada com a
ocasionada pela perda de neurônios no núcleo produção excessiva de saliva, mas sim com a
olfatório. Já a redução do paladar, é associada às deglutição prejudicada e disfunções musculares
medicações prescritas a pacientes com DP e outras características da DP. Esse excesso de saliva, além
condições mentais e físicas, tais como xerostomia e de incomodo ao paciente até mesmo numa
depressão. Esses sintomas devem ser bem perspectiva social, relacionada a vergonha, pode
analisados, uma vez que podem existir diversas causar a chamada queilosite angular, uma
causas para sua ocorrência. 24–26 inflamação no “canto” da boca, que ocasionada pelo
Dessa forma, é preciso realizar atividades movimento repetido de limpeza no local e pela
3,25,26
de promoção à saúde para pacientes e cuidadores, a saliva que fica acumulada na região. Para
fim de manter a maior quantidade possível de o tratamento desse sintoma é direcionado para a
elementos dentários saudáveis, fornecendo a maior redução do fluxo salivar, tendo abordagens
eficiência mastigatória. 24–26 farmacológicas e não farmacológicas. Para a
Disfagia e sialorreia farmacológica, são indicados alguns agentes
anticolinérgicos, como o glicopirrolato e a
Outro problema muito relatado em
benztropina. Uma alternativa é o uso de toxina
pacientes com DP é a dificuldade de deglutição.
botulínica A e B nas glândulas salivares, com
Nesses pacientes, a disfagia está relacionada a
intervalos de 5 meses, sempre sendo realizado o
movimentos anormais nas 3 fases: oral, faríngea e
monitoramento e estando atento aos sintomas de
esofágica. Esses movimentos são prejudicados
disfagia. 3,26
pelos sintomas característicos da DP, como a
bradicinesia. Pode-se perceber esses sintomas
133

Xerostomia  A inclinação da cadeira deve ser cerca de 45°;


24
É um dos sintomas mais comuns da DP, que
 Atentar-se às medicações utilizadas pelo
está relacionado à ocorrência de Cárie e Doença
paciente, bem como as interações com outros
Periodontal. A causa da sensação de boca seca, pode
medicamentos e reações com anestésicos
ocorrer devido ao uso de drogas relacionadas ao
locais; 24
tratamento da DP. De acordo com ZLOTNIK et al.
 Incentivar a promoção da saúde para paciente
(2015), a xerostomia é um sintoma autônomo
e/ou cuidador; 28
precoce da DP, uma vez que pode aparecer antes
 Sugerir o acompanhamento de fonoaudiólogo,
mesmo do início do tratamento farmacológico. 26
a depender do caso; 24
Algumas intervenções não farmacológicas  Incentivar a visita com frequência ao dentista
podem ser indicadas ao paciente com xerostomia, para evitar agravos. 24,25,28
como por exemplo, beber água com frequência e
utilizar goma de mascar sem açúcar. 25,26 Doença de Alzheimer
Por outro lado, intervenções
A doença de Alzheimer (DA), é o tipo de
farmacológicas podem ser necessárias, como a
demência mais comum, afetando 10% dos
utilização de agonistas colinérgicos e ubiquinol. 3,26
indivíduos acima de 65 anos e até 50% dos
Condutas odontológicas
indivíduos acima de 85 anos. Dado esse demonstra
 Ter contato com o médico do paciente e
a importância do conhecimento acerca da doença e
conhecer o tratamento que está sendo
suas consequências. 2
24,28
realizado;
O início da doença é marcado pela perda da
 Preferir a realização de consultas de curta
memória recente, e progride para desorientações e
duração (cerca de 45 min); 24,25
problemas comportamentais, afetando acapacidade
 Agendar o horário da consulta sendo cerca de 2,30
de linguagem e a função motora.
90 min após a administração da medicação da
A degeneração de neurônios na base do
DP; 24–26
prosencéfalo, hipocampo e córtex são uma marca
 Solicitar que o paciente esvazie a bexiga antes
registrada da doença de Alzheimer, assim como a
do atendimento, para que não sinta nenhum
diminuição da densidade sináptica e perda de
constrangimento durante a consulta; 24
neurônios. Pode ocorrer ainda a atrofia física do
 Utilizar o suporte de mordida para manter a
cérebro. A DA pode ter origem esporádica ou
boca do paciente aberta; 24,25 2,3,31
genética. Algumas características do
 Preferir pela utilização do isolamento com
Alzheimer, são: múltiplos déficits cognitivos, afasia
lençol de borracha durante o atendimento, a
(distúrbio de linguagem), deficiência paraxial
24
fim de proteger a língua do paciente;
(dificuldade em realizar atividades motoras),
 Utilizar o sugador cirúrgico, para evitar o risco
agnosia (falha em reconhecer e identificar objetos),
de aspiração; 24,25
dentre outras. 31
134

Patogenia restabelecer a cognição, o comportamento e as


habilidades funcionais do paciente. 33
Uma característica marcante da DA, é a
presença da placa Senis no corpo celular de Inibidores das colinesterases
neurônios afetados e dendritos. Essas placas são São os primeiros escolhidos para o

agregadas da proteína beta-amilóide e emaranhados tratamento desses pacientes, contribuem para o

de uma proteína que é associada aos microtúbulos, retardo do comprometimento cognitivo. Atuam

a Tau. 2, 31 minimizando a hidrólise de acetilcolina, visando o

Em relação a origem genética da doença, aumento de sua disponibilidade por meio da

essa está relacionada a mutações no gene da inibição de enzimas catalíticas como a

proteína codificante da proteína precursora acetilcolinesterase e butirilcolinesterase.


32,33
amiloide (PPA) ou nos genes da presenilina 1 e 2. Donepezil, Rivastigmina, Galantamina

Essas mutações levam a exposição ao beta- e Tacrina são alguns fármacos aprovados para o

amilóide, acarretando peroxidação dos lipídios da tratamento. A Tacrina não é muito utilizada devido
32
membrana, estresse oxidativo induzido pelo influxo a sua hepatoxicidade, além disso, assim como a

de cálcio e disfunção mitocondrial. Essa Rivastigmina, são capazes de inibir tanto a

somatização de fatores leva a apoptose neuronal. 2, acetilcolinesterase quanto a butirilcolinesterase, o


31 que pode resultar em maior incidência de efeitos
33
Sabe-se que o cérebro de indivíduos colaterais periféricos. O Donepezil tem efeitos

portadores da DA possui expressão reduzida de adversos como náuseas, vômitos e desconforto

fatores neurotróficos NGF e BDNF. O nível inferior gastrointestinal que podem ser diminuídos

desses fatos, traz maior suscetibilidade a apoptose conforme o tempo de uso e se administrados com

neuronal, uma vez que aumentam o estresse ingestão de alimentos. 32

oxidativo. 2 É provável encontrar sialorreia nos


Apesar das informações supracitadas, os pacientes que fazem uso desses medicamentos, já
dados sobre DA apresentam-se de forma que os inibidores de acetilcolina não são específicos
contraditória. Não existe clareza em relação a para o cérebro, pode aumentar a atividade
apoptose neuronal, por exemplo. Sabe-se que ela colinérgica em vários locais, resultando em
ocorre, mas não se há consenso se essa é a causa salivação, peristalse e relaxamento dos músculos
primária da doença, ou consequências dos fatores vasculares. 32–34
que a envolvem. Devido a isso, o tratamento para os Memantina
2,3
sintomas ainda é insuficiente.
Antagonista não competitivo do receptor N-
Fármacos utilizados
metil-D-aspartato (NMDA), tem efeitos sobre a
A Doença de Alzheimer ainda não tem neurotransmissão glutamatérgica e permite ativação
cura, o tratamento é baseado em formas de retardar fisiológica dos receptores durante os processos de
os sintomas que prejudicam a qualidade de vida do formação de memória, mas bloqueia a abertura dos
indivíduo, 32
propostas para preservar ou canais e sua ativação patológica, como uma ação
135

32,34
neuroprotetora, visa melhoras funcionais e reter próteses removíveis. Os
comportamentais ao paciente. Os efeitos adversos Benzodiazepínicos costumam apresentar efeitos
comuns são diarreia, vertigens, cefaleia, insônia, anticolinérgicos e de comprometimento da
32,33
inquietação e cansaço. memória, não sendo aconselhados na Doença de
Medicamentos adjuvantes Alzheimer. 32
Sintomas como agitação, depressão, Gingko biloba
transtornos de humor são encontrados nesses Apresenta propriedades antioxidantes e
pacientes conforme a progressão da doença. O uso antiperoxidantes, além do efeito anti-inflamatório
32,33
de antipsicóticos atípicos são recomendados por proveniente de seu componente terpenóide.
não terem tantos efeitos adversos. O uso de Promove aumento do suprimento sanguíneo
antidepressivos tricíclicos e inibidores seletivos da cerebral por vasodilatação e redução da viscosidade
recaptação de serotonina também são usados, do sangue. 33
apesar de existir relatos de declínio cognitivo com Comumente não há efeitos adversos, mas já
32
o uso. foram relatados aumento do tempo de sangramento
Como efeito adverso dos medicamentos e hemorragia espontânea, o que pode influenciar o
adjuvantes é comum observar a xerostomia nos sangramento no intra e pós-operatório em um
pacientes, principalmente pela ação anticolinérgica, procedimento odontológico. 32
o que pode afetar a saúde bucal aumentando os Manifestações orais de interesse
riscos para abrasões, ulcerações e dificuldades em
A saúde bucal desses pacientes apresenta-
Tabela 7.5 Fármacos utilizados na Doença de Alzheimer.
se bem comprometida, uma vez que há perda da
coordenação motora e/ou rigidez muscular em
pacientes com DA. 31,34,35
Xerostomia
A perda da capacidade de expansão torácica
ocasionada pela progressão da doença, pode
ocasionar dispneia (dificuldade para respirar). Por
essa razão, o paciente tende a realizar respiração
bucal, o que pode ocasionar a sensação de boca
15
seca. Além disso, idosos com DA demonstram
menor fluxo salivar estimulado e não estimulado. 35
A xerostomia pode também ser resultante das
drogas administradas decorrentes da doença. 35
Doença periodontal, cáries rampantes e radiculares,
halitose e cálculo
Tendo em vista a dificuldade do paciente
em manter os cuidados de saúde bucal, uma vez que
136

a cognição e destreza reduzem, associados a outros Ainda assim, o cirurgião-dentista deve estar
sintomas da DA como a xerostomia, a doença consciente que a presença de patógenos na cavidade
periodontal e cáries podem ser comuns, assim como oral, entram na corrente sanguínea e cruzam a
a queixa de halitose. Deve-se salientar que a barreira hematoencefálica com maior facilidade nas
40
halitose ocorre nos casos de inflamação periodontal. pessoas idosas . Dessa forma, a consequente
15,35
inflamação aumenta a formação de Placas Senis.
Próteses Pode haver ainda uma associação bidirecional entre
Primeiramente, a estabilidade da dentadura DA e periodontite, tendo em vista que a inflamação
pode ser prejudicada, uma vez que há disfunções crônica opera de forma semelhante ao ciclo vicioso
orais significativas, como reflexo de sucção e envolvido na neurodegeneração. Sendo assim, a
movimentos involuntários. Esses sintomas limitam ocorrência de uma potencializa a outra. 34–39
a função dentária, o que desestabilizam a dentadura Condutas odontológicas
durante o uso. Dessa forma, o uso da prótese pode  É indispensável conhecer o histórico médico
se tornar desconfortável para o paciente. 31,35 do paciente e estar ciente dos medicamentos
Candidíase e Estomatite usados, principalmente aqueles administrados
Apresentam-se como comuns em pacientes antes de procedimentos cirúrgicos, para evitar
com DA, uma vez que ocorre um ciclo vicioso de a interação medicamentosa com o anestésico.
saúde bucal envolvendo a higienização precária, Há casos em que o médico deve ser contatado
xerostomia e problemas com o uso de próteses. 31,35 para fazer modificações antes do tratamento
Perda dentária e dificuldade mastigatória dentário, para evitar complicações como
Há uma grande relação entre perda de hipotensão postural, sedação excessiva e
elementos dentários, demência e saúde bucal disfunção da glândula salivar induzida por
prejudicada, uma vez que uma característica se medicamentos; 34
relaciona a outra. Uma vez perdido o/os elementos  Em casos de uso de ansiolíticos, é preferível
dentários, a função mastigatória é dificultada, marcar a consulta no horário em que o fármaco
podendo acarretar problemas para a nutrição e atinja seu potencial máximo terapêutico; 15
saúde sistêmica do paciente. 35  As informações sobre cuidados com a higiene

Associação entre periodontite e o agravamento da bucal diária devem ser fortemente enfatizadas,
se necessário pode-se aconselhar o uso de
Demência
suportes para fio-dental, escovas elétricas,
Dentro do contexto da DA e demais
jatos intermitentes de água, escovas
demências, há pesquisas que sugerem a relação
interdentais e gazes umedecidas com
entre doença periodontal e o agravamento da
clorexidina, além da recomendação de visitas
demência. Todavia, os danos ainda são
frequentes ao dentista; 15,34
inconclusivos sugerindo a necessidade de mais
34–39  O planejamento do tratamento deve ter
estudos na área.
envolvimento dos familiares e cuidadores,
137

considerando a gravidade da doença, muitos paralisias progressivas de todas as extremidades e


pacientes em estágios mais avançados não da musculatura respiratória. 2, 3
conseguem comunicar sobre os sintomas Nesse contexto, 2 tipos de neurônios são
dentários, é preciso que o cirurgião dentista afetados pelo processo da ELA: os neurônios
fique atento aos sinais e sintomas bucais do motores superiores (NMS), conhecidos como
paciente; 15,34 primeiros neurônios e localizados na área motora do
 Deve-se ter cuidado com procedimentos que cérebro, e os neurônios motores inferiores (NMI),
apresentam riscos de aspiração, principalmente conhecidos como segundos neurônios e localizados
nos pacientes em estágios moderados e graves, no tronco cerebral e na porção anterior da medula
já que muitos apresentam movimentos espinhal. Vale ressaltar que os NMI são
orofaciais alterados, como o de mandíbula; 32 responsáveis pela ativação dos músculos da face,
 Deve ser evitado o tratamento dentário boca, garganta e língua. 42
complexo e demorado em pacientes em Patogenia
estágios avançados da doença, o foco é manter
Como característica das doenças
os pacientes sem dor e capazes de manter a
neurodegenerativas citadas nesse capítulo, a ELA é
ingestão nutricional adequada; 34
patologicamente definida por: corpos de inclusões
 Deixar o ambiente mais familiar e reduzir tanto
proteicos ubiquitinados, estresse oxidativo,
os ruídos quanto o nível de movimentação no
sobrecarga de cálcio, forte resposta inflamatória dos
consultório, são formas de diminuir a irritação
tecidos lesados e indícios de apoptose intrínseca. O
desses pacientes. 15,34
diferencial dessa patologia é a superativação de
Esclerose Lateral Amiotrófica receptores de glutamato, que podem estar
relacionados a causa da doença. 2,3,41
A Esclerose Lateral Amiotrófica, A ELA esporádica é a mais comum, ainda
conhecida como ELA, é uma doença não tendo estabelecida sua causa e patogenia de
neurodegenerativa que afeta principalmente os forma completa e esclarecedora dentro da literatura.
neurônios do córtex motor e a medula espinhal. Já a ELA familiar, responsável por 5 a 10% dos
Geralmente, após 5 a 8 anos do início dos sintomas, casos, possui relação com mutações no gene da
2,3
o paciente diagnosticado com ELA vem a óbito. superóxido desmutase, uma enzima importante no
A idade mais recorrente para o aparecimento dos controle e eliminação de radicais livres. Nesse caso,
sintomas da ELA esporádica, é de 58 a 63 anos. Já a herança é mendeliana, autossômica dominante.
a ELA familiar, possui como pico de início dos 2,3,41,42

sintomas entre 47 e 52 anos. A esclerose familiar


Fármacos utilizados
apresenta de 5 a 10% dos casos de ELA. 41
As características marcantes da doença, Riluzol
são: rigidez muscular, espasmos, fraqueza e Pertencente à classe dos benzotiazóis, é um
eventual perda de massa muscular. Ocorrem antagonista do glutamato e parece bloquear a
138

liberação excessiva deste. 43 Seu efeito anestésico se salivares e mucosa bucal, consequentemente supõe-
dá pelo bloqueio de canais de sódio. 44 se que há um estímulo maior para produção de
A administração é feita geralmente em saliva. 48 Há quem explique a hipersalivação nesses
forma de comprimidos revestidos para evitar a pacientes pelo distúrbio das vias regulatórias
parestesia oral. 44 autonômicas, que consequentemente afeta as
Parece aumentar a expectativa de vida glândulas salivares. 48 Mais estudos são necessários
nesses pacientes em torno de dois ou três meses. 45 para avaliar concentração de glutamato na saliva,
Toxina botulínica para entender melhor os mecanismos que levam
Neurotoxina que pode ser usada com estes indivíduos a terem hiperfluxo salivar. 48
finalidade de relaxar os músculos distônicos, pelo Para o controle da salivação são usados
efeito bloqueador da liberação de acetilcolina, não medicamentos anticolinérgicos, injeções de toxina
terá contração muscular. Entretanto, pode ser usado botulínica e até cirurgia. 46
para bloquear a secreção de saliva quando injetado Xerostomia
próximo a glândulas salivares, já que a acetilcolina Relacionada com o uso de fármacos que
não irá ativar os receptores muscarínicos presentes podem causar a sensação de boca seca, incluindo
nas glândulas. 46 anti-hipertensivos, diuréticos, antidepressivos. 48

Manifestações orais de interesse Pode aumentar as dificuldades motoras,


como no caso de formar um bolo ao engolir, além
Os indivíduos acometidos pela Esclerose
de contribuir para problemas de fala. 47
Lateral Amiotrófica têm maiores chances de
desenvolverem problemas bucais e dificuldades de Disfagia
manter uma boa higiene oral, já que podem Comum em pacientes com problemas
48
apresentar função orofacial prejudicada e neuromusculares que afetam a região bulbar,

dificuldade motora das mãos. Portanto, apresentam acometem mais de 80% dos pacientes com ELA em

maiores índices de placa bacteriana, a imobilidade estágios mais avançados. 44

da língua ainda pode favorecer o acúmulo de Tem relação com atrofia da língua,

detritos na sua região dorsal, o que pode causar mau comprometimento no fechamento do palato mole e

hálito. 47 da laringe, que é causada por lesão nuclear ou

Os músculos bulbares são responsáveis pelo supranuclear dos nervos cranianos IX, X e XII, e

controle da fala, deglutição e mastigação, e é disfunção do diafragma. 44

relatado o envolvimento nas disfunções orofaciais O paciente com disfagia tem maiores

da ELA. 45 chances de contrair pneumonia por aspiração, ainda

Hiperssalivação mais quando a higiene bucal não é satisfatória. O


tratamento é por meio de técnicas de deglutição
A patogenia da ELA está relacionada com
visando minimizar o risco de aspiração, e realizar
defeitos no transporte de glutamato, o que leva a um
uma adequação na dieta, para que se adapte ao
acúmulo do neurotransmissor em locais com
comprometimento do paciente. 44
receptores glutamatérgicos, como nas glândulas
139

Comprometimento dos músculos mastigatórios também com sintomas motores. É, na maioria das
Pacientes com ELA podem desenvolver vezes, fatal após 15-20 anos após o início. 2, 3
espasticidade e dores nos músculos mastigatórios, A epidemiologia da doença é variável, uma
além de reflexo exagerado no movimento da vez que depende de fatores genéticos. A doença é
mandíbula, estes sintomas podem ser indicativos de mais prevalente em brancos do que em negros, e a
envolvimento dos neurônios superiores. A fraqueza incidência em europeus é maior que em asiáticos. 49
dos músculos mastigatórios pode ser reflexo do Na Europa ocidental, a prevalência é de 5/100000.
45 2
envolvimento do neurônio motor inferior.

Condutas odontológicas Patogenia


 Recomenda-se o uso de protetores dentais, Diferentemente das outras doenças
para estabilizar a mandíbula e aliviar a fadiga neurodegenerativas, a Doença de Huntington é
dos músculos, além de proteger os dedos do autossômica, monogênica de penetrância completa
cuidador; 47 e dominante, sendo que o gene em questão é
 Para auxiliar na higiene oral e aumentar a visão codificante da huntigtina, no cromossomo 4. A
dos dentes, o uso de afastadores de bochecha alteração característica é a repetição do códon
se fazem úteis 47. Com o auxílio da gaze para CAG, referente ao aminoácido glutamina.
puxar e manter a língua firme, raspadores de Indivíduos com mais de 39 repetições, certamente
língua são recomendados para realizar a desenvolverão a doença. Dessa forma, quando
limpeza do dorso; 47 expressa de maneira precoce, é muito provável que
 Uso de almofadas para minimizar a pressão e exista correlação com o aumento no número de
contribuir para que o paciente fique em posição repetições de CAG. 2,3
confortável na cadeira odontológica. O Ainda assim, por mais que se conheça o
paciente pode se manter em sua cadeira de gene relacionado, ainda não se sabe o mecanismo
rodas caso a consulta seja apenas para exames completo da Doença de Huntington, existindo
e instruções. 47 muitas lacunas no entendimento do processo
patológico. Como as demais doenças
Doença de Huntington neurodegenerativas citadas nesse livro, há
A doença de Huntington (DH), é uma ocorrência de agregados proteicos,
doença neurodegenerativa, que compromete neuroinflamação e indícios de apoptose neuronal. É
funções motoras e cognitivas de seus pacientes. As característico da DH a degeneração,
disfunções motoras comprometem principalmente, dos neurônios GABAérgicos no
progressivamente os movimentos voluntários corpo estriado. 2,3

coordenados. Já os problemas cognitivos


Fármacos utilizados
progressivos, geralmente levam a demência. 2,49
A doença de Huntington ainda não tem
Os sintomas iniciais da DH, geralmente são
cura, o tratamento é baseado em medicamentos que
mudanças sutis de humor, que progridem e iniciam
melhoram a qualidade de vida do indivíduo, como
140

aqueles para alívio de movimentos musculares, acontece como efeito da disfagia e/ou atividade
controle de delírios e surtos violentos, ansiolíticos e deficiente da língua. 53
50–52
antidepressivos. A terapia de fala pode A disfagia é um sintoma comum e pode
contribuir para melhorar a deglutição desses apresentar riscos maiores se o alimento for aspirado
pacientes. A maioria dos fármacos usados têm e resultar em abscesso pulmonar, o risco de
efeitos adversos como xerostomia, excitação e aspiração pós operatória é aumentado com essa
fadiga. 50 alteração na deglutição, 52,53 esse problema pode ter
Alguns fármacos utilizados: 52,53 consequências nutricionais. Em estágios mais
 Citalopram; avançados da doença, pela disfagia, é frequente a
 Tetrabenazina; ingestão de alimentos pastosos e espessos, que
 Olanzapina; tornam a limpeza bucal mais difícil. 50
 Clonazepan; Pessoas com distúrbios motores, como é o
 Haloperidol; caso dos acometidos por essa doença, podem perder
 Flufenazina; o equilíbrio e serem mais suscetíveis a quedas, a
marcha característica e dificuldade de andar em
Manifestações orais
linha reta aumentam os riscos para traumas e que
Não há manifestações bucais inatas da
50,53
consequentemente podem envolver a região bucal.
Doença de Huntington, a maioria dos
50,53
problemas orais desses pacientes se relacionam com
a falta de coordenação motora e destreza manual Condutas odontológicas
prejudicada que os impedem de realizar uma A odontologia preventiva é o ponto mais
higiene bucal efetiva independentemente, e a saúde importante a ser abordado em uma consulta, muitos
bucal do paciente perde sua prioridade conforme a já chegam no consultório com doença oral
doença vai se agravando, 50,52–54 além disso, muitos avançada. É indicado que esses pacientes
médicos não tem a consciência das consequências frequentem um consultório odontológico a cada
54
que os medicamentos usados têm no meio bucal, quatro meses para passar por uma avaliação.
como a xerostomia, gengivite, entre outros, 54
eo Famílias de risco para a doença devem ter atenção
indivíduo não fica ciente dessas possibilidades de odontológica antecipada, se informar sobre as
efeitos adversos. possíveis consequências da doença na cavidade
Esses pacientes normalmente recebem uma bucal e serem orientados a realizarem atendimento
dieta hipercalórica e com substâncias açucaradas odontológico regularmente. 50
como para evitar a perda excessiva de peso, já que Conduta primária
gastam muita energia com os movimentos  Uso de almofadas para minimizar a pressão e
50,53
involuntários. . As pessoas que sofrem desta contribuir para que o paciente fique em posição
doença geralmente retêm alimentos na boca após confortável na cadeira odontológica. O
engolir, o que torna um sítio propício para a cárie e paciente pode se manter em sua cadeira de
outros problemas bucais, supõe-se que isso
141

rodas caso a consulta seja apenas para exames para obstrução de vias aéreas, o que nesses
e instruções. 47 pacientes já é prejudicado. 53
 É necessário conhecer o histórico do paciente, Conduta anestésica
sobre terapia medicamentosa, aspectos A sedação consciente e a anestesia geral são
50
comportamentais e familiares; consideráveis quando o paciente apresenta
 O cirurgião dentista tem o papel de instruir transtorno de ansiedade, doença oral avançada e
seus pacientes e cuidadores sobre a higiene movimentos involuntários que prejudicam o
oral e utensílios auxiliares que facilitam o procedimento odontológico. 50,52 Deve-se
53
processo, quando for necessário; dar atenção especial ao efeito relaxante muscular da
 Deve-se avaliar a necessidade do uso do flúor sedação, esses pacientes têm menor proteção de
para cada paciente, como enxaguantes bucais suas vias respiratórias e pode ser perigoso, a sucção
com flúor, dentifrícios com alto teor de flúor, de alta velocidade e tamponamento local são
clorexidina com uso de dentifrício com flúor; recomendados. 50,52
No pós-anestésico, esses
53
pacientes têm maiores riscos de aspiração, a
 Planejar a forma de atendimento e tratamento disfagia presente em muitos casos aumenta a chance
bucal adequada para cada paciente, visando de ocorrências, portanto é preciso garantir que os
53
suas limitações causadas pela doença. reflexos das vias aéreas estão funcionando bem. 50
Interdisciplinaridade Os medicamentos anticolinérgicos são
É importante a interdisciplinaridade entre evitados, pois podem aumentar os movimentos
cirurgião dentista, médico e nutricionista para coreiformes. 50,53
inserirem na dieta hipercalórica do paciente
Considerações finais
alimentos não cariogênicos, visando a redução de
chances para a cárie dentária e outras consequências Tendo em vista as informações supracitadas

bucais. 50,53 sobre doenças neurológicas, é evidente a


necessidade do conhecimento dos cirurgiões-
Uso de próteses
dentistas acerca das possíveis condições de seus
O uso de aparelhos que precisam de
pacientes. A literatura evidencia a falta de
retenção na boca, como a prótese removível, não é
profissionais qualificados para realizar o
aconselhada, já que esses pacientes possuem
atendimento de PCDs, demonstrando a necessidade
movimentos coreiformes, redução do controle
das informações trazidas neste livro.
muscular e xerostomia, que são fatores prejudiciais
É notório ainda a importância da
para a retenção. 52,53 A substituição pelos implantes
comunicação entre o cirurgião-dentista e o paciente
é interessante para os pacientes que têm condições
e/ou cuidador, a fim de promover a saúde,
socioeconômicas para o tratamento. 52 Em estágio
demonstrando a higienização bucal e demais
inicial da doença, as próteses removíveis podem ser
cuidados de forma responsável e compreensível,
apropriadas, contanto que haja uma avaliação
uma vez que algumas manifestações, como a cárie,
odontológica regularmente, já que apresenta riscos
podem ser prevenidas. Deve-se recordar que o
142

trabalho multiprofissional é um grande diferencial


para o bem-estar do paciente, tanto na saúde bucal
quanto sistêmica.

Referências
1. Luchesi KF, Campos BM, Mituuti CT. Identification 12. Rosenbaum P, Paneth N, Leviton A, Goldstein M,
of swallowing disorders: the perception of patients with Bax M, Damiano D, et al. A report: the definition and
neurodegenerative diseases. CODAS. 2018;30(6):1–10. classification of cerebral palsy April 2006. Dev Med Child
Neurol. 2007 Fev; 109:8–14.
2. Kermer P, Liman J, Weishaupt JH, Bähr M. Neuronal
apoptosis in neurodegenerative diseases: From basic research 13. Wimalasundera N, Stevenson VL. Cerebral palsy.
to clinical application. Neurodegenerative Diseases. Pract Neurol. 2016;16(3):184–94.
2004;1(1):9–19.
14. Novak I. Evidence-based diagnosis, health care, and
3. Wood LB, Winslow AR, Strasser SD. Systems rehabilitation for children with cerebral palsy. J Child Neurol.
biology of neurodegenerative diseases. Vol. 7, Integrative 2014;29(8):1141–56.
Biology (United Kingdom). Royal Society of Chemistry. 2015
Jul; 7(7): 758–775. 15. Varellis MLZ. O paciente com necessidades
especiais na Odontologia: manual prático. 2017. 484 p.
4. Gao HM, Hong JS. Why neurodegenerative diseases
are progressive: uncontrolled inflammation drives disease 16. Marsura, A; Santos, M. P.; Sena, R. O.; Mendes, T.
progression. Trends Immunol. 2008; 29(8):357–65. C. A.; Leite, A.; Silva AM. A interferência da alteração de
tônus sobre a reabilitação fisioterapêutica após lesões
5. Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à neurológicas. Saúde em foco. 2013;1–6.
Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas.
Diretrizes de Atenção à Pessoa com Paralisia Cerebral 17. Smithers-Sheedy H, Badawi N, Blair E, Cans C,
[Internet]. Brasília: MS; 2013 [cited 2021 Jul 24]; 80 p. Himmelmann K, Krägeloh-Mann I, et al. What constitutes
Disponível em: www.saude.gov.br cerebral palsy in the twenty-first century? Dev Med Child
Neurol. 2014;56(4):323–8.
6. Organização Mundial da Saúde. OMS revela
principais causas de morte e incapacidade em todo o mundo 18. Shea TMO. Diagnosis, treatment, and prevention of
entre 2000 e 2019 [Internet]. 2020 [citado 29 jul 2021]. cerebral palsy. Clin Obstet Gynecol. 2008;51(4):816–28.
Disponível em: https://www.paho.org/pt/noticias/9-12-2020-
19. Fehlings D, Brown L, Harvey A, Himmelmann K,
oms-revela-principais-causas-morte-e-incapacidade-em-todo-
Lin JP, Macintosh A, et al. Pharmacological and neurosurgical
mundo- entre-2000-e-2019
interventions for managing dystonia in cerebral palsy: a
7. Associação Brasileira de Paralisia Cerebral, systematic review. Dev Med Child Neurol. 2018;60(4):356–66.
Arquivos Brasileiros de Paralisia. São Paulo. 2018. Disponível
20. Sposito MM de M, Albertini SB. Tratamento
em: https://paralisiacerebral.org.br/
farmacológico da espasticidade na paralisia cerebral. Acta
8. Dougall A, Fiske J. Access to special care dentistry, fisiátrica. 2010;17(2):62–7.
part 4. Education. Br Dent J. 2008; 205(3):119–30.
21. Dias BLS, Fernandes AR, Maia Filho H de S.
9. Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção Sialorrhea in children with cerebral palsy. J Pediatr (Versão em
Primária à Saúde. Guia de atenção à saúde bucal da pessoa com Port.) 2016;92(6):549–58.
deficiência [Internet]. Brasilia: MS; 2019. [cited 2021 Jul 30].
22. Walshe M, Smith M, Pennington L. Interventions for
120 p. Disponível em:
drooling in children with cerebral palsy. Cochrane Database
https//bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_atencao_saud
Syst Rev. 2012.
e_bucal_pessoa_deficiencia.pdf
23. Dougherty NJ. A Review of Cerebral Palsy for the
10. Pini D de M, Fröhlich PCGR, Rigo L. Oral health
Oral Health Professional. Dent Clin North Am.
evaluation in special needs individuals. Einstein (Sao Paulo).
2009;53(2):329–38.
2016 Out 1;14(4):501–7.
24. Jan BM, Jan MM. Dental health of children with
11. Gutierrez GM, Siqueira VL, Loyola-Rodriguez JP,
cerebral palsy. Neurosciences. 2016;21(4):314–8.
Diniz MB, Guaré RO, Ferreira ACFM, et al. Effects of
treatments for drooling on caries risk in children and 25. Friedlander AH, et al. Parkinson disease - Systemic
adolescents with cerebral palsy. Med Oral Patol Oral y Cir and orofacial manifestations, medical and dental management.
Bucal. 2019; 24(2):e217–e210.
143

J Am Dent Assoc - JADA [Internet]. 2009 [cited 2021 May 40. Cerajewska TL, Davies M, West NX. Periodontitis:
8];140:658–69. Available from: http://jada.ada.org A potential risk factor for Alzheimer’s disease. Br Dent J. 2015;
218(1):29–34.
26. Debowes SL, et al. Parkinson’s disease:
considerationsfor dental hygienists. Int J Dent Hyg. 41. Roberto De Souza Fonseca R, Fernando L, Machado
2013;11:15–21. A, Fernandes De Menezes SA. Alzheimer’s disease as a risk
factor to periodontal disease: a literature review. Brazilian J
27. Zlotnik Y, Balash Y, Korczyn AD, Giladi N, Periodontol. 2019; 30(03):121–6.
Gurevich T. Disorders of the oral cavity in parkinson’s disease
and parkinsonian syndromes. Vol. 2015, Parkinson’s Disease. 42. Wales S, C Kiernan DSc AM, Cheah MBiostat BC,
Hindawi Publishing Corporation; 2015. Burrell MBBS J, Zoing BNurs MC, Kiernan MC, et al. Seminar
Amyotrophic lateral sclerosis. Lancet [Internet]. 2011;
28. Hanaoka A, Kashihara K. Increased frequencies of 377:942–55. Available from: www.thelancet.com
caries, periodontal disease and tooth loss in patients with
Parkinson’s disease. J Clin Neurosci. 2009 Out;16(10):1279– 43. Oliveira Filho AF de, Silva GA de M, Almeida DMX.
82. Application of botulinum toxin to treat sialorrhea in
amyotrophic lateral sclerosis patients: a literature review.
29. Müller T, Palluch R, Ackowski JJ. Caries and Einstein (São Paulo). 2016 Set; 14(3):431–4.
periodontal disease in patients with Parkinson’s disease. Spec
Care Dent. 2011 Set;31(5):178–81. 44. Jaiswal MK. Riluzole and edaravone: A tale of two
amyotrophic lateral sclerosis drugs. Med Res Rev. 2019;
30. Umemoto G, Furuya H. Management of dysphagia in 39(2):733–48.
patients with Parkinson’s disease and related disorders. Vol. 59,
Internal Medicine. Japanese Society of Internal Medicine; 45. Onesti E, Schettino I, Gori MC, Frasca V, Ceccanti
2020. p. 7–14. M, Cambieri C, et al. Dysphagia in amyotrophic lateral
sclerosis: Impact on patient behavior, diet adaptation, and
31. Gonçalves S, Outeiro TF. A disfunção cognitiva nas riluzole management. Front Neurol. 2017 Mar; 21(8):1–8.
doenças neurodegenerativas. Rev Bras Ciências do Envelhec
Hum. 2015 Dez 15;12(3). 46. Hwang WJ, Huang K, Huang JS. Amyotrophic lateral
sclerosis presenting as the temporomandibular disorder: A case
32. Kocaelli H, Yaltirik M, Yargic LI, Özbas H. report and literature review. Cranio - J Craniomandib Pract.
Alzheimer’s disease and dental management. Oral Surg Oral 2019; 37(3):196–200.
Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. 2002;93(5):521–4.
47. Squires N, Humberstone M, Wills A, Arthur A. The
33. Turner LN, Balasubramaniam R, Hersh E V., use of botulinum toxin injections to manage drooling in
Stoopler ET. Drug therapy in Alzheimer disease: an update for amyotrophic lateral sclerosis/motor neurone disease: A
the oral health care provider. Oral Surgery, Oral Med Oral systematic review. Dysphagia. 2014; 29(4):500–8.
Pathol Oral Radiol Endodontology. 2008;106(4):467–76.
48. Bergendal B, McAllister A. Orofacial function and
34. Forlenza O V. Tratamento farmacológico da doença monitoring of oral care in amyotrophic lateral sclerosis. Acta
de Alzheimer. Arch Clin Psychiatry (São Paulo). Odontol Scand. 2017; 75(3):179–85.
2005;32(3):137– 48.
49. Ferreira AKA, de Argôlo IFT, Soares MSM, de Melo
35. Mancini M, Grappasonni I, Scuri S, Amenta F. Oral ÂBP. Salivary changes, oral symptoms, and oral health-related
Health in Alzheimer’s Disease: A Review. Current Alzheimer quality of life in patients with neuromuscular diseases. Rev
Research. 2010 Jun; 7(4):368-73. Ciencias la Salud. 2020; 18(1):82–95.
36. Gao SS, Chu CH, Young FYF. Oral health and care 50. McColgan P, Tabrizi SJ. Huntington’s disease: a
for elderly people with alzheimer’s disease. Int J Environ Res clinical review. Vol. 25, European Journal of Neurology. 2018
Public Health. 2020 Ago 2; 17(16):1–8. Jan; 25(1):24-34.
37. Ide M, Harris M, Stevens A, Sussams R, Hopkins V, 51. Boyle CA, Frölander C, Manley G. Providing dental
Culliford D, et al. Periodontitis and cognitive decline in care for patients with Huntington’s disease. Dent Update. 2008;
Alzheimer’s disease. PLoS One. 2016 Mar 1; 11(3). 35(5):333–6.
38. Gao SS, Chen KJ, Duangthip D, Lo ECM, Chu CH. 52. Coppen EM, Roos RAC. Current Pharmacological
The oral health status of Chinese elderly people with and Approaches to Reduce Chorea in Huntington’s Disease. Drugs.
without dementia: A cross-sectional study. Int J Environ Res 2017; 77(1):29–46.
Public Health. 2020 Mar 2; 17(6).
53. Rada RE. Comprehensive dental treatment of a
39. Pazos P, Leira Y, Domínguez C, Pías-Peleteiro JM, patient with huntington’s disease: literature review and case
Blanco J, Aldrey JM. Association between periodontal disease report. Spec Care Dent. 2008; 28(4):131–5.
and dementia: A literature review. Neurologia. 2018;
33(9):602–13. 54. Manley G, Lane H, Carlsson A, Ahlborg B,
Mårtensson Å, Nilsson MB et al. Guideline for oral healthcare
144

of adults with Huntington’s disease. Neurodegener Dis Manag.


2012; 2(1):55–65.

55. Saft C, Andrich JE, Müller T, Becker J, Jackowski J.


Oral and dental health in Huntington’s disease - an
observational study. BMC Neurol. 2013;13.
8
CONDUTAS NO ATENDIMENTO ODONTOLÓGICO DE PACIENTES COM
ALTERAÇÕES COGNITIVAS-COMPORTAMENTAIS
Yasmine Mendes Pupo | Jaqueline do Carmo Machado Lopes | Júlia Fabris | Laís Bonatto Zawadniak
| Giselle Emilãine da Silva Reis

Introdução Estudos apontam que indivíduos com TMs,


assim como as demais pessoas com deficiência
De acordo com a OMS, os transtornos (PCD), costumam deixar a saúde bucal como uma
mentais (TMs) são caracterizados por uma preocupação secundária, demorando para procurar
combinação de pensamentos, percepções, emoções, atendimento odontológico. Todavia, esses pacientes
comportamentos e relacionamentos anormais com são mais propensos ao desenvolvimento de
outras pessoas.1 Dentro dessa temática, esse problemas de saúde bucal, devido a fatores como:
capítulo irá abordar sobre o Transtorno do Espectro higienização bucal precária, má nutrição, alto
Autista (TEA), esquizofrenia, transtornos consumo de alimentos açucarados, consumo de
alimentares e os Transtornos Mentais Comuns tabaco, álcool, ou psicoestimulantes e demais
(transtornos depressivos, transtornos ansiosos, barreiras que podem impedir ou atrasar o
Transtorno obsessivo compulsivo (TOC) e atendimento odontológico.2,3 Além disso, muitos
transtornos relacionados a traumas e estressores). pacientes apresentam como sintoma do transtorno,
146

a falta de motivação para a prática de hábitos e a recompensas sociais, afeto negativo e dificuldade
cuidados com a saúde, por exemplo para a higiene no controle da atenção,9 o diagnóstico é feito
dentária, o que pode resultar na carência de geralmente por volta dos três anos de idade, quando
4
autocuidado bucal. Sabe-se que a incidência dos os sintomas são mais perceptíveis, já que tem como
transtornos mentais está em crescimento e que os base o histórico clínico do paciente que pode incluir
sistemas de saúde ainda não respondem de forma distúrbios de linguagem, comportamentosrestritivos
adequada à demanda.1 Dessa forma, é importante e repetitivos e déficits de reciprocidade social.10,11
que os profissionais saibam reconhecer e trabalhar Além dos sintomas característicos, o TEA pode vir
com essas questões, de forma que o paciente seja acompanhado de outros problemas, como por
acolhido e respeitado em sua individualidade, exemplo o transtorno de déficit de atenção e
prezando sempre a saúde e o bem-estar. A hiperatividade (TDAH),6,7,12 ansiedade, depressão,
responsabilidade, compaixão e empatia do distúrbios do sono e da alimentação,raiva e agressão
profissional, são de extrema relevância para a ou automutilação.10,11
adesão e continuidade dos tratamentos desses
A edição mais atual do Manual Diagnóstico
pacientes.3
e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V)
A partir disso, o capítulo apresentará as
classifica a Síndrome de Asperger dentro do TEA,
particularidades dos transtornos mentais citados 9,11
estes pacientes apresentam diagnóstico mais
anteriormente e seus reflexos na cavidade bucal,
tardio, geralmente exibem uma linguagem
além da importância do cuidado odontológico
relativamente normal e a cognição se mantém,
especial nesses casos.
apesar de serem notados empobrecimento na
linguagem não verbal e no entendimento da
Transtorno do espectro autista linguagem de sentido figurado, também é
característico desses pacientes desviar o olhar com
Conceito frequência, apresentar a face pouco expressiva, ter
interesses restritos, pouca socialização, dentre
O transtorno do espectro autista (TEA) se
outros.9,13 O diagnóstico precoce, por meio da
caracteriza por uma alteração no
avaliação de uma equipe multiprofissional, é muito
neurodesenvolvimento que se apresenta por meio
importante para que as intervenções sejam feitas o
de comportamentos característicos centrais,
mais rápido possível e com maiores chances de
dificuldades de interação e comunicação social, e
resultados positivos, contribuindo para melhor
comportamentos sensoriais-motores repetitivos e
capacidade de aprendizado da criança e maior
restritos, que surgem normalmente por volta dos 2
compreensão dos pais.5,7
5–8
anos de idade, e pode variar de muito leve a
6
grave. Nos primeiros anos de vida é possível
Patogenia
observar anormalidades no controle motor, atraso A causa para o autismo não é bem
no desenvolvimento motor, sensibilidade diminuída esclarecida,13 acredita-se que é um distúrbio de
147

grande influência genética envolvida no Tratamentos não farmacológicos


desenvolvimento cerebral, afetando a
 Musicoterapia tem mostrado resultados
reorganização neural,6,11,14 sendo de 3 a 5 vezes
positivos, promove integração multissensorial
mais comum em homens.9,10,14 Há evidências de que
entre os domínios corticais e subcorticais,
o transtorno abrange centenas ou milhares de genes,
favorecendo a interação social e comunicação
com variantes que compreendem múltiplos
9
verbal da criança; 12
modelos de herança, além da influência por fatores
 Psicoterapia cognitivo-comportamental
de risco ambiental, como idade avançada dos pais,
realizada por um Psicólogo tem mostrado
exposição fetal a certas medicações no período pré
resultados em sintomas como ansiedade,
natal, nascimento prematuro, entre outros, não
depressão e comportamentos perturbadores
sendo causais para o problema, mas sim
comórbidos; 12
contributivos.6,7,9,12 Em exames de
neuroimagem de indivíduos autistas, foram Intervenções voltadas para a comunicação
encontradas diferenças na amígdala e tamanho total funcional, reconhecimento de emoções, habilidades
do cérebro, este que parece aumentar entre 2 e 4 sociais e cognitivas são benéficas para o paciente
anos de idade, sendo que até o fim da adolescência com TEA.12
mostra-se apenas um pouco maior.5,6,13,14 Estudos Tratamentos farmacológicos
ainda são feitos a respeito dessa diferença, acredita-
Antipsicó tico s atí picos (Ri speri dona, Olanzapi na,
se que tenha envolvimento da conectividade
Clozapina)
cerebral anormal, com mais conexões próximas e
menos conexões distantes.12,14 Pela ação no bloqueio de receptores
dopaminérgicos, serotonérgicos e outros subtipos
Como já citado, a genética é um fator
de receptores, são utilizados para tratar sintomas de
importante, irmãos de crianças com o transtorno
raiva, agressão ou comportamento autolesivo.12,14
têm de 2 a 8% de risco de desenvolverem, e é ainda
Deve-se dar atenção a condição hematológica do
maior se a criança apresenta mais domínios
paciente usuário de Clozapina, pois pode contribuir
prejudicados pelo autismo.12 Em indivíduos
para a redução na contagem de leucócitos.14 A
acometidos por doenças genéticas e
Risperidona geralmente é bem tolerada, podendo
cromossômicas, como a Síndrome de Down e
apresentar sedação leve, aumento do apetite, fadiga,
Síndrome do X frágil, os sintomas do autismo
sialorreia, tontura e sonolência.11,14
podem ser mais evidentes.12

Tratamento Esses fármacos antipsicóticos podem


induzir distúrbios motores que interferem na fala,
O Autismo ainda não tem cura, o
deglutição e uso de próteses removíveis.13
tratamento visa amenizar os comportamentos
característicos que prejudicam a qualidade de vida
desses indivíduos.11
148

Inibi dores seletivos da receptação de sero tonina


usados para baixar a pressão arterial. Podem
(Sertrali na, Citalopram, Fl uoxetina) contribuir para sintomas de agressividade,

Usados para sintomas de ansiedade e distúrbios do sono e ansiedade, bastante comuns em

comportamentos repetitivos (KUMAR et al, 2012). pacientes com TEA.12

Como efeitos adversos é possível encontrar diarreia, Esses fármacos podem causar hipotensão
náuseas e tontura, além de que a Fluoxetina e ortostática e sedação, mas costumam ser resolvidos
Sertralina podem causar xerostomia, disgeusia com ajuste de dose.14
(sensação de paladar alterada), estomatite e
Antidepressivos e ISRSs
glossite.13
Cloni dina Utilizados no tratamento da depressão e

Utilizado para hiperatividade, instabilidade transtorno obsessivo-compulsivo (TOC).14

de humor, agressividade e agitação.11


Manifestações bucais
Naltrexo na
Os indivíduos com TEA apresentam
Antagonista opioide capaz de tratar as problemas bucais comuns a qualquer pessoa, mas
anormalidades comportamentais induzidas pelo seus comportamentos característicos como
sistema opioide, além de obter resultados positivos problemas na comunicação, negligência pessoal,
para o comportamento autolesivo, hiperatividade, auto-mutilação, medicações, hiposensibilidade à
isolamento social, agitação e irritabilidade em dor dentária e hipersensibilidade a estímulos
transtornos do espectro do autismo.11 externos, podem induzir a maior probabilidade de
acometimentos bucais.8,15
Medicações estimulantes (Metilfenidato)
Cárie dental
Utilizadas para tratamento do transtorno de
déficit de atenção/hiperatividade (TDAH), já que Dados sobre índices de cárie mais elevados

atuam aumentando os níveis de dopamina no nesses indivíduos ainda é controverso na literatura,

cérebro, auxilia o indivíduo a prestar mais atenção apesar da presença de fatores predisponentes para o

e ser menos inquieto. Como efeitos adversos pode- problema.8,16 O cuidado com a higiene bucal em

se encontrar irritabilidade, possível piora na segundo plano e preferência desses pacientes por

hiperatividade, distúrbios do sono e redução do alimentos macios e adoçados podem contribuir para

apetite.12,14 a formação da cárie.16,17 Há uma tendência em


armazenar alimentos dentro da boca devido aos
Agonistas alfa-adrenérgicos movimentos desordenados da língua que acomete
muitos autistas,17 o que aumenta a disponibilidade
Agem inibindo a neurotransmissão de
de açúcar por mais tempo na cavidade bucal e
norepinefrina no tronco cerebral, diminuindo o
prejudique os dentes.16
fluxo simpático e interferindo nos estados de
ansiedade e espasmos motores, além de serem
149

Além dos comportamentos contribuintes já apresentam distúrbios de sono, o que pode


citados, o déficit na higiene bucal, influenciar o ranger de dentes. O cirurgião dentista
hipersensibilidade, alterações comportamentais e pode recomendar o uso de protetores bucais visando
dificuldades nos atendimentos odontológicos amenizar o problema.17
também devem ser considerados.8

Problemas periodontais

Os acometimentos periodontais nesses


pacientes podem estar associados a problemas de
interação, comportamento e atitude indiferente a
higiene oral, muitas vezes dependentes de
cuidadores.18

A gengivite pode ser influenciada por


efeitos adversos dos medicamentos usados no
tratamento do TEA, como os fármacos
anticonvulsivantes, por exemplo a Fenitoína,
relacionada com um aumento da gengivite
hipertrófica-hiperplásica e retardo na erupção.17
Figura 8.1 Fratura de dente anterior, comum em crianças
Também são encontradas recessões gengivais e autistas. Imagem cedida gentilmente pela professora Dra
Yasmine Mendes Pupo.
cálculo dentário mais comumente.15
Lesões dentárias
Condutas odontológicas
Muitos dos pacientes apresentam
comportamentos autolesivos, como bater com a A consulta odontológica se torna muitas
cabeça, bater no rosto e cutucar a gengiva, além de vezes difícil pela falta de colaboração, agitação e
quedas envolvendo problemas de locomoção e falta hipersensibilidade à entrada sensorial apresentados
de cuidado em situações de risco as quais ficam por muitos pacientes com esse transtorno. Tendo
propensos a acidentes, podendo explicar a taxa isso em vista, estratégias adaptadas são necessárias
aumentada de traumas dentários nesses indivíduos, para que o cirurgião dentista consiga trabalhar
sendo mais comum nos dentes incisivos centrais nesses casos, além de que em muitas vezes o uso de
14–17
superiores permanentes. anestesia geral ou sedação são utilizados.17 Assim,
Bruxismo é fundamental a organização para um atendimento
eficaz, seguindo alguns passos, como:
As características comportamentais dos
 Consultas curtas e organizadas; 17
autistas podem contribuir para um aumento no risco
 A presença dos pais ou responsáveis durante a
de hábitos prejudiciais na boca, como o
consulta é importante para que o paciente se
bruxismo.15,17 Muitos indivíduos com TEA
150

sinta mais confortável e colabore com o Metilfenidato, Risperidona, Valproato) é


atendimento;13 recomendada a realização de um hemograma
10-15
 Tempo de espera não deve passar de completo, incluindo plaquetas;13
minutos;17  O CD pode aconselhar aos pais de tornarem a
 O Cirurgião dentista (CD) pode ter auxílio de escovação um momento agradável, como uma
abordagens comportamentais, pedagogia visual atividade realizada em família ou realizar uma
e dispositivos eletrônicos;17 atividade especial para estimular o paciente; (14)
 Para pacientes com autismo mais grave,
A pedagogia visual pode utilizar uma série
recomenda-se realizar procedimentos longos em
de imagens ou tutoriais em vídeo visando a
centro cirúrgico ou hospital sob anestesia geral;
aprendizagem de uma atividade ou habilidade social,
13
como por exemplo a higiene bucal dos pacientes. O
 É fundamental frisar o cuidado preventivo,
indivíduo assiste ao vídeo e depois imita o
aumentar a frequência e eficiência da higiene
comportamento passado;15,17
bucal, uso de gel tópico fluoretado ou enxágue
Técnicas cognitivos-comportamentais, apropriado e realização de consultas preventivas
como o método de dizer/mostrar/fazer e o reforço frequentes. 13,17
positivo também tendem a melhorar a cooperação
desses pacientes.15 Esquizofrenia
Recomenda-se a redução na frequência de
alimentos e bebidas açucaradas, 15,17 neste caso, se Conceito
possível, o acompanhamento multidisciplinar com
A Esquizofrenia é um transtorno mentalque
nutricionista se faz interessante para avaliar uma
afeta em média 1% da população mundial, 19,20pode
dieta menos cariogênica, a terapia ocupacional
se manifestar por uma série de sintomas como
também pode ajudar trabalhando nas recusas do
alucinações, delírios, pensamentos desorganizados,
paciente, muitas vezes por distúrbios sensoriais que
expressão emocional diminuída, falta de motivação,
interferem na quantidade de alimentos aceitos;15
comportamentos catatônicos ou desorganizados que
 O cirurgião dentista deve ficar atento aos sinais acabam afetando a qualidade de vida pessoal esocial
de erosão e bruxismo, já que muitos autistas do indivíduo. 20–22
Além dos tópicos citados
regurgitam seus alimentos e conteúdo estomacal anteriormente, hostilidade e agressão podem estar
ácido mais de uma vez na semana e apresentam presentes, sendo mais frequentes em homens jovens
o costume de ranger os dentes durante o sono, com histórico anterior de violência,não adesão ao
13
respectivamente; tratamento, abuso de substâncias e impulsividade, é
 Se for necessário algum procedimento cirúrgico, importante ressaltar que a grande maioria dos
para os pacientes que fazem uso de indivíduos com esquizofrenia não são agressivos. 22
medicamentos que influenciam adversamente o As características psicóticas costumam
sistema hematopoiético (Carbamazepina, aparecer entre o fim da adolescência e meados dos
151

30 anos, com o decorrer dos anos tendem a genéticas, como é o caso da síndrome DiGeorge,
diminuir, acredita-se que seja pelo declínio normal além de defeitos cardíacos, fenda palatina e
da função dopaminérgica. 22 dificuldades cognitivas, a esquizofrenia pode
aparecer em cerca de 30% dos acometidos. 21
Para o diagnóstico ser confirmado, os
sintomas característicos que interferem no âmbito Há uma diferença em múltiplas regiões do
profissional ou social do indivíduo, devem estar cérebro entre o grupo de pessoas com esquizofrenia
presentes por no mínimo 6 meses e quando não há e o de pessoas saudáveis, contando com alterações
21,22
outra explicação para eles, é feito geralmente na arquitetura celular, na conectividade da
por meio de avaliação psiquiátrica a partir dos substância branca e no volume da substância
critérios do Manual de Doenças Psiquiátricas da cinzenta em áreas como córtices pré frontais e
22,24
American Psychiatric Association (DSM-V) ou na temporal, além disso, há teorias a respeito da
Classificação Estatística Internacional de Doenças e associação dessa condição mental com alterações
Problemas Relacionados à Saúde da OMS. 21,23 nos níveis de neurotransmissores como a dopamina,
serotonina e acetilcolina; 21,25,26 outras teorias ainda
Esses pacientes possuem maior risco de
estudam que o desequilíbrio neuroquímico tem
desenvolver doenças crônicas como diabetes,
influência do aspartato, glicina e ácido gama-
síndrome metabólica, doença cardiovascular e
aminobutírico (GABA). 26
pulmonar, justificado pela falta de comportamentos
voltados para o cuidado em saúde, uso de Tratamento
medicamentos, hábito de fumar e dieta
insatisfatória, comum em indivíduos O tratamento é voltado para a melhora dos

esquizofrênicos. 22 sintomas, prevenção de recaídas e aumento no


funcionamento adaptativo, para que o indivíduo
Patogenia
tenha uma boa qualidade de vida integrado à
Acredita-se que essa desordem neurológica sociedade. 26
é resultado da interação de fatores genéticos e
Terapia farmacológica
ambientais, como complicações durante a gestação
e parto, idade avançada dos pais, infecção, doença Os antipsicóticos são os fármacos mais
autoimune, entre outros. 21,22,24
Apesar da maioria utilizados, e parecem ter ação no bloqueio pós
das pessoas com esquizofrenia não terem histórico sináptico dos receptores de dopamina D2 no
21,26
de psicose na família, existe forte influência de cérebro, com o objetivo de melhorar alguns
fatores genéticos no transtorno, associada a alelos sintomas da esquizofrenia e agitação relacionada.
19–21
de risco comuns e raros, alguns relacionados com a
bipolaridade, depressão e transtorno do espectro
Antipsicó tico s de segunda geração (Clozapina,
autista. 22
Olanzapina, Aripiprazol, Q uetiapina, Risper ido na,
Mutações genéticas raras também podem
25
entre outro s).
estar envolvidas. Em algumas síndromes
152

Os antipsicóticos atípicos em geral podem Como reações adversas é possível encontrar


ter efeitos como aumento de peso, hiperlipidemia e xerostomia e distúrbios de memória que podem
diabetes mellitus, contribuindo para o maior risco comprometer a higiene oral. 27
de mortalidade cardiovascular em pacientes com
Terapia não farmacológica
esquizofrenia. 26–28
Psico terapia
A Clozapina apesar de ajudar o paciente
com os sintomas, não é muito recomendada devido É caracterizada como uma
ao risco de agranulocitose, hipotensão ortostática e complementação a farmacoterapia, além de
em altas doses pode provocar efeitos graves como cooperarem com os resultados farmacológicos, a
convulsão. 26 Pacientes que fazem uso de Clozapina maioria tem envolvimento familiar e pode ajudar o
e Olanzapina podem desenvolver hipersalivação, paciente a persistir no seu tratamento, pois é muito
devido a inibição periférica da acetilcolinesterase. comum a desistência. 26
27,28

Manifestações orais
Antipsicó tico s de primeira geração (Haloperidol,
Clorpromazina, Tioridazina, Trifluoperazina) A saúde bucal desses pacientes pode ser
mais afetada devido a reações adversas de fármacos
Esses fármacos podem apresentar efeitos
administrados e comportamentos contribuintes para
adversos neurológicos que contribuem para o
problemas bucais, como o tabagismo presente em
declínio motor, como a distonia e discinesia, capaz
muitos casos de esquizofrenia e a má higiene oral.
de interferir na escovação eficaz dos dentes, 25,27
Muitas vezes a procura por ajuda é adiada, pela
podendo aumentar o risco para doenças orais e
dificuldade de acesso a cuidados especiais e falta de
afetar a capacidade de mastigação e deglutição. 21,27–
cooperação do paciente, o que pode atrasar o
29
diagnóstico bucal. 27,29
Outro efeito importante é a hipossalivação,
Higiene oral comprometida
comum entre os pacientes que fazem uso desse
grupo de fármacos, eles têm a capacidade de Devido aos sintomas da esquizofrenia, o
bloquear a estimulação parassimpática das autocuidado bucal pode ser afetado com a falta de
glândulas salivares. 25 preocupação com a saúde pessoal e falta de
motivação, além de percepção prejudicada das
Antico li nérgicos
necessidades de tratamento odontológico. 28
Usados para melhorar as condições de
Em casos mais graves de esquizofrenia, os
síndrome extrapiramidal que pode ser induzida por
sintomas podem influenciar no cuidado com a saúde
antipsicóticos, a qual pode causar reações distônicas
bucal, além da baixa frequência de escovação,
agudas, Parkinsonismo, Discinesia tardia. 27
menos visitas ao dentista, tabagismo e dieta
cariogênica. 29
153

Doenças periodontais A hipossalivação causada por muitos


antipsicóticos pode aumentar os riscos de cárie. 25,28
Pacientes esquizofrênicos apresentam
fatores de risco maiores para outras doenças Desgaste dentário
sistêmicas, como a diabetes tipo II, a qual pode
A ansiedade e receio dos pacientes podem
apresentar como consequência problemas
levar ao desgaste dental prematuro. É frequente
periodontais. 27,29
encontrar hábitos parafuncionais nesses casos,
O uso frequente do tabaco por muitos como roer unha, morder o lábio, ranger os dentes,
25,27
indivíduos esquizofrênicos pode interferir na entre outros. Além de alguns comportamentos
ação de diversos fármacos utilizados, além de autolesivos como autoextrações, glossectomia e
propiciar doenças periodontais como aumento de escoriação de tecidos gengivais com uso das unhas.
25
profundidade da bolsa periodontal e perda de
inserção periodontal que leva a maior risco de
perdas dentárias. 25,27

Figura 8.3 Desgaste dentário na face incisal. Imagem


cedida gentilmente pela professora Letícia Dias Ferri.

Figura 8.2 Perda de inserção periodontal e aumento de Figura 8.4 Hábitos parafuncionais propiciam o desgaste
profundidade da bolsa periodontal. Imagem cedida dentário. Imagem cedida gentilmente pelo professoror
gentilmente pela professora Letícia Dias Ferri. Fabiano de Oliveira Araújo .
Xerostomia
Discinesia e Distonia
Como um dos efeitos adversos dos
As alterações motoras que podem acometer
fármacos antipsicóticos, é comum encontrar a
pacientes com esquizofrenia têm riscos de afetar a
sensação de boca seca. 27–29
região oral, movimentos anormais da mandíbula
Cárie dentária que dão origem a protrusão de língua, retração e
caretas faciais. 25
154

Distúrbios hematológicos  O aconselhamento aos cuidadores, profilaxia


oral, restaurações, reabilitação oral de pacientes
Os antipsicóticos podem induzir problemas
edêntulos e outros tratamentos de emergência
hematológicos como a leucopenia, agranulocitose e
devem ser priorizados; 25
trombocitopenia. Quando essas anormalidades
 Procedimentos cirúrgicos são realizados com
estão presentes, podem interferir na cavidade oral
cautela em pacientes estáveis e sob medicação;
por meio de um aumento na fragilidade da mucosa, 25

sangramento, mobilidade ou perda de dentes. 23,27


 Os cirurgiões dentistas podem aconselhar os
Procedimentos odontológicos só devem ser pacientes fumantes a parar com o hábito,
iniciados quando os níveis da célula sanguínea em apresentando-lhes as consequências que podem
(23)
questão estiverem adequados. trazer à saúde bucal; 25
 Nos casos em que o paciente pode apresentar
Condutas odontológicas
comportamentos agressivos, tendência suicida
 O profissional de saúde bucal deve estar ciente ou transtorno de ansiedade, a forma de
do histórico médico completo do paciente, tratamento deve visar a eliminação de gatilhos
incluindo medicamentos usados, contra- potenciais, redução da ansiedade e cuidado com
indicações, condições médicas de importância, os instrumentos utilizados que podem machucar;
23
deficiências comportamentais, emocionais e
cognitivas; 23,30  É necessária atenção durante todo o
 É necessário orientar os pacientes e familiares procedimento para perceber qualquer indício de
sobre a importância da higiene bucal e de como respostas fisiológicas, como um reflexo de
realizá-la; 29 vômito, e evitar que cause danos ao paciente. 23
 Os cirurgiões dentistas devem estar atentos e
atualizados a respeito das doenças bucais, Transtornos alimentares
efeitos adversos dos medicamentos que estão
sendo utilizados e possibilidade de tratamento Conceito
odontológico para cada paciente; 25
 Observar fatores de risco que possam induzir a A preocupação e perturbação persistente

piora na saúde bucal, como consumo de tabaco, relacionada com o peso e com a alimentação, assim

hábitos parafuncionais, habilidades físicas como os comportamentos desencadeados por esses

prejudicadas e outros, para implementar fatos, são chamados de Transtornos Alimentares

medidas preventivas; 23,25 (TA). 22,31

 Uma boa comunicação e relacionamento entre Existem 3 diagnósticos principais para


cirurgião dentista e paciente é essencial para esses transtornos:
25
evitar desconfortos;
1. Anorexia nervosa;
2. Bulimia;
155

3. Transtorno não especificado. 32 forma, seus sinais não devem ser ignorados pelos
Cirurgiões-dentistas. 34
A anorexia nervosa, com incidência de
7/100 000 indivíduos, tendo 4000 novos casos por Patogenia
ano (de acordo com pesquisas realizadas no Reino
Unido), é caracterizada pela aversão e restrição A causa aparenta ser uma associação muito

alimentar, acarretando numa grande perda de peso. complexa entre fatores associados: sociais,

A distorção da imagem corporal é muito comum. Já genéticos, biológicos, individuais, familiares,


35
a bulimia, possui incidência de 8,6 a 14/100 000 demográfico, ocupacional, dentre outros.

indivíduos da população mundial, sendo mais Portanto, é difícil utilizar uma via de regra única

comum que a anorexia. Ela é caracterizada por para a ocorrência desses transtornos.

episódios de compulsão alimentar, que são Alterações na regulação de certos


“compensados” de diferentes formas pelo paciente, neurotransmissores (serotonina) e hormônios
como por exemplo, por meio do vômito (leptina) também foram especulados como
autoprovocado e do uso de laxantes. Quanto ao possíveis contribuintes para o aparecimento dessas
transtorno não especificado, esse reúne sintomas de doenças, particularmente a anorexia. 34
ambas as doenças citadas. 32,33
O gênero feminino e a faixa etária de 16
A anorexia é, geralmente, observada na anos aparenta ser a mais comum para a ocorrência
aparência física do paciente, uma vez que a perda desses transtornos. 33
significativa de peso é relatada. Já com o bulêmico,
isso pode não ocorrer, já que muitos pacientes não Manifestações clínicas e bucais
apresentam fisicamente o baixo peso. 33,34
Sinal de Russel
Algumas complicações médicas associadas
Calos presentes no dorso das mãos e dos
aos Transtornos Alimentares são: anemia,
dedos podem ser visualizados, devido ao hábito de
bradicardia, hipotensão, alterações ovarianas,
colocar a mão na boca e autoprovocar vômitos. O
aumento do cortisol, osteoporose, fraturas
atrito nas juntas das mãos em contato com os
patológicas, perda de cabelo, dor óssea com
incisivos no momento da ação, aparenta ser a causa
osteopenia de exercício, atraso no crescimento,
das calosidades. 33,34
intolerância ao frio, dor abdominal, desidratação,
desnutrição, gastrite, leucopenia, depressão, entre Erosão e dentes “lascados”
outros. 33,34
Pacientes com transtornos alimentares
Os transtornos alimentares podem levar o possuem até 5 vezes mais chances de desenvolver a
22
paciente à morte. As estimativas indicam que erosão, quando comparados com indivíduos não
cerca de 10% dos pacientes com anorexia morrem portadores desses transtornos. Apesar do índice ser
dentro de dez anos após o início da doença. Dessa mais significativo em pacientes que autoprovocam
156

vômitos, indivíduos sem esse sintoma também pacientes acometidos por TA apresentem porções
possuem um índice maior de erosão dentária. 36 das bordas incisais “lascadas”. Da mesma forma, o
aumento da sensibilidade térmica desses indivíduos
A erosão secundária ao vômito, refluxo e
aparenta ser maior, devido à exposição de dentina.
regurgitação nas superfícies palatinas, é
Vale ressaltar que a hipossalivação é um fator
denominada “perimólise”. A gravidade e a
importante nesse processo de erosão. 34
distribuição da erosão dentária diferem entre os
indivíduos que autoprovocam vômitos e os que não.
Além disso, há diferença entre pacientes que
enxaguam a boca logo após a ação e os procuram
por bebidas neutralizantes, como o leite. 33,35,37–39

Outro problema relacionado a erosão, é a


ingestão de grandes quantidades de bebidas com
baixo pH e frutas cítricas, presente na dieta desses
pacientes. Esse fato pode estar relacionado à
procura do efeito “laxante”. 34

Os principais locais de erosão


demonstraram ser a superfície palatina e vestibular
dos dentes anterossuperiores, em pacientes que
33
realizam o vômito autoprovocado. Essas lesões Figura 8.5 Lesões de erosão dentária nas faces vestibular
apresentam aspecto brilhante e liso. 37,40 e lingual dos dentes, comum em pacientes com bulimia.
Imagem cedida gentilmente pelo professoror Dr. Fabiano
de Oliveira Araújo .
Outras razões para ocorrência da erosão
relacionadas aos TA, são: o uso crescente de
bebidas esportivas altamente ácidas durante Cárie, saliva e função das glândulas salivares
períodos de alta atividade de exercício e a ingestão
O sintoma de “boca seca” é comum em
mais frequente de bebidas com cafeína para
pacientes com TA. As causas podem estar
aumentar não apenas a energia, mas até para
relacionadas às medicações, desidratação e
diminuir o estímulo reflexo da fome por meio do 36
alterações nas glândulas salivares. Estudos
34
aumento da dilatação do estômago.
apontam que nesses pacientes a quantidade de
Em pacientes com a presença de saliva não estimulada é menor. 37,40,41
restaurações de amálgama, podem aparecer as
O risco à Cárie é aumentado devido à
chamadas “ilhas elevadas” ocasionadas pela erosão
xerostomia e a ingestão de alimentos com altos
que afeta a estrutura dentária circundante. 34
índices calóricos, uma vez que pode ocorrer
Em vista disso, como a erosão provoca a episódios de compulsão alimentar e/ou a ingestão
perda progressiva do esmalte, é comum que os de açúcares com grande frequência durante o dia.
157

34,36
A má higiene bucal também se apresenta como comprometimento na reparação tecidual. A
um importante fator. 37 candidíase oral, a glossite e ulcerações na mucosa
também podem se apresentar como sequelas da
Em relação às glândulas salivares, o
deficiência nutricional. 33
aumento benigno da glândula Parótida de pacientes
bulêmicos é bastante descrito na literatura. Esse Dependendo do modo de indução ao
sintoma, denominado sialadenose, é resultado das vômito, podem ocorrer lesões erosivas ou
mudanças estruturais que ocorrem dentro da eritematosas secundárias a traumas friccionais
33,36
glândula. A etiologia desse sintoma ainda não é repetidos e por contato direto com ácidos gástricos
34,42
bem conhecida, aparentando estar relacionada aos na mucosa palatina.
episódios repetidos de vômito, ocasionando o
Perda de massa óssea
desenvolvimento progressivo de uma função
metabólica e secretora prejudicada das glândulas O comprometimento nutricional de
salivares. Esse problema metabólico pode estar indivíduos portadores de anorexia nervosa pode
relacionado com a provável alteração na inervação acarretar diversas consequências fisiológicas.
do nervo periférico para as glândulas salivares Enquanto grande parte dessas perturbações
afetadas, o que leva a um aumento anormal de associadas à desnutrição é reversível com
ácinos (células presentes nas glândulas salivares) e, reabilitação nutricional, algumas, incluindo a perda
por consequência, a função prejudicada dessas de densidade óssea mineral, com frequência não são
unidades secretoras. Esse aumento não é completamente reversíveis. Sendo assim, é comum
inflamatório e pode se apresentar uni ou que esses pacientes apresentem densidade mineral
bilateralmente. 34,37,42 óssea baixa, com áreas específicas de osteopenia ou
osteoporose. Devido a isso, o risco de fratura é
Sendo assim, é comum que os pacientes
significativamente maior nesses pacientes. 22
com TA apresente outros sintomas, como: lábios
secos ou rachados, sensação de queimação na boca Condutas Odontológicas
ou principalmente na língua, e efeitos sobre
glândulas salivares e secreção salivar. 37,39 A partir dos dados citados no capítulo e das
manifestações clínicas, é evidente a importância do
Lesões mucosas conhecimento do Cirurgião-dentista sobre os

Por conta da deficiência nutricional transtornos alimentares. O trabalho

ocasionada pelos transtornos alimentares, algumas multiprofissional é fundamental nesses casos.

infecções oportunistas podem ocorrer. 32  Demonstrar conhecimento sobre o assunto

Deficiência no índice de vitaminas B6, pode encorajar o paciente a buscar ajuda,

B12 e deficiência de ferro podem ocasionar danos à sendo o diálogo entre profissional e paciente

mucosa oral, tais como: atrofia, alterações um importante aliado nos diagnósticos

gustativas e/ou sensoriais, queilite angular e clínicos. Vale ressaltar que o profissional não
158

deve realizar julgamentos a esses indivíduos. Fármacos associados


33,37,43
Antipsicó tico s atípicos:
 Os processos erosivos devem ser
 Olanzapina;
acompanhados (com moldes e/ou fotografias),
 Rispiridona;
porém o dentista deve respeitar o limite de fala
 Quetiapina;
do paciente, uma vez que ele pode não se sentir
 Aripiprazol; 44
à vontade para falar sobre o assunto. 33
 O alívio da dor e da sensibilidade são Inibi dores seletivos de rec eptação de serotoni na:
importantes fatores a serem revisados pelo
 Fluoxitina;
profissional, que deve sempre procurar a
 Sertralina;
33
confiança do paciente.
 Antidepressivos tricíclicos; 44
 Deve-se realizar o aconselhamento sobre
erosão dentária, de forma empática. Enfatizar Outros:

que escovar os dentes logo após o processo  Mirtazapina;


erosivo pode piorar a condição e trazer as  Aprazolan;
informações sobre alimentos e ações  Tioridazina;
prejudiciais. 33,34  Ciproheptadina;
 O dentista deve encaminhar o paciente para os  Lorazepan;
demais profissionais da rede multiprofissional,  Escitalopram;
tais como: médico, psicólogo e nutricionista.  Paroxitina;
37,43  Aripiprazol;
 Trazer orientações sobre higiene bucal, para  Buspiridona; 44
que a prevenção seja priorizada, além do
aconselhamento dietético relacionado à Transtornos mentais comuns
redução do consumo de açúcar. 33,34
Conceito
Exames regulares, profilaxias, e aplicações
de flúor servirão para prevenir o aumento da Os transtornos mentais comuns (TMCs) são

deterioração dos dentes durante o período de descritos como estados de sofrimento psíquico de

atividade da doença ou quando o paciente responde ansiedade, depressão e sintomas somatoformes, que

lentamente ao tratamento médico. 34 poderão ser manifestos em conjunto ou não. De


acordo com estudos realizados no Brasil, a taxa de
Dessa forma, enfatiza-se que o Cirurgião-
prevalência dos TMCs tende a cerca de 50% dos
dentista tenha conhecimento da prevenção e
indivíduos que procuram atendimento primário,
reconhecimentos das manifestações orais e
sendo especialmente mulheres, desempregados,
sistêmicas relacionas aos TA, a fim de colaborar no
pessoas de baixa escolaridade e baixa renda.45–47
desempenho multiprofissional.
159

São exemplos de TMCs: Hábitos

 Transtornos depressivos: As doenças psiquiátricas, como os TMCs,


 Transtorno de ansiedade generalizada (TAG); podem levar a doenças bucais em decorrência do
 Transtorno do pânico; estilo de vida dos pacientes. Os hábitos de higiene
 Transtorno obsessivo compulsivo (TOC); precária e acesso dificultado ao atendimento
 Transtorno de estresse pós-traumático; odontológico (podendo também ser atenuado pela
fobia), são fatores que devem ser considerados. As
Deve-se ressaltar que a consulta
doenças odontológicas que mais afetam esses
odontológica pode ser causadora de fobia, sendo
indivíduos são: cárie dentária, erosão dentária e
que cerca de 50% dos pacientes relatam algum tipo
doença periodontal, podendo ocasionar, inclusive, a
de ansiedade nesses momentos. 2,48
perda do elemento dentário (edentulismo). 36,48
Patogenia
Erosão dentária
De acordo com a OMS, determinantes da
Em pacientes com depressão e ansiedade, o
saúde mental e dos transtornos mentais incluem não
uso de tabaco e álcool são mais comuns. Dessa
apenas atributos individuais, mas também os
forma, uma reação gastroesofágica pode acontecer
sociais. Sendo assim, a ocorrência desses
e, como consequência, a erosão. 48
transtornos tem uma causa complexa, não sendo
definida apenas pelos comportamentos, mas ainda Cárie dentária e doença periodontal
pelo contexto em que o indivíduo está inserido.
A ocorrência de cárie dentária, de acordo
Fatores sociais, culturais, econômicos e políticos
com a literatura, aparece em maiores taxas em
tem grande relevância nesse processo. Estresse,
indivíduos portadores de TMCs do que em
genética, nutrição, infecções perinatais e exposição
indivíduos sem transtornos psíquicos. As causas
a riscos ambientais também são fatores que
aparentam se relacionar aos cuidados de higiene
contribuem para a manifestação de transtornos
bucal precários, uma vez que a motivação é
mentais. 1
reduzida nesses pacientes. Fatores de proteção,
Manifestações Clínicas como a saliva, podem sofrer alterações devido às
medicações, contribuindo para a ocorrência da
A literatura é escassa quando se trata das cárie. 36,48
relações entre a condição de saúde bucal e os
transtornos mentais comuns. 2,48
Dessa forma, o Deve-se salientar que o consumo de

capítulo irá abordar a relação de forma direta e bebidas açucaradas tende a ser maior nos indivíduos

indireta, uma vez que poucos estudos abordaram de com TMCs. 48

forma explícita essa temática. Quanto a doença periodontal, não há


consenso na literatura sobre suas taxas em pacientes
160

com transtornos em comparação aos sem odontológicas. Esse contexto gera um problema
transtornos. 48 cíclico, que será explicado a seguir. 51

Bruxismo do sono A fobia odontológica gera o medo e a


sensação de alerta do paciente, que pode
Dentre os fatores relacionados ao bruxismo
desenvolver ansiedade devido ao grande temor ao
do sono, (49) tem-se os distúrbios do sono e fatores
atendimento. 51 Esse medo excessivo pode aparecer
psicológicos, sendo esse último ainda muito
de diferentes formas, como por exemplo: fobia de
discutido na literatura, não sendo comprovada essa
agulha, medo de brocas e injeções; fobia da cirurgia
associação. Todavia, é possível relacionar alguns
dentária, equipe ou cheiros e sons associados; e/ou
sintomas ansiosos (sensibilidade ao estresse,
ansiedade sobre reações somáticas durante o
sensibilidade a reafirmação, expectativa ansiosa e 48
tratamento, particularmente engasgo. Sendo
sintomas de pânico) com o bruxismo do sono. 50
assim, o paciente opta pela “fuga” do agente
Os sintomas comuns associados ao causador, que no caso, é a consulta odontológica. A
bruxismo, são: desgaste dentário, dor e/ou procrastinação do acompanhamento faz com que o
hipertrofia dos músculos mastigatórios, cefaleias indivíduo apenas procure o dentista em situações
matinais (especialmente nas áreas frontal e curativas e de emergência, quando, geralmente, a
temporal), recuos na língua e bochecha e necessidade de uma intervenção invasiva é maior,
travamento da mandíbula. 49,50 como tratamentos endodônticos e exodontia. Dessa
forma, isso gera o aumento da fobia, trazendo mais
trauma ao paciente, que retoma o ciclo. 51,52

Percebe-se que, devido a ansiedade


odontológica, o motivo da efetivação de consultas
odontológicas desses pacientes, tende ao tratamento
Figura 8.6 Desgate dentário. Imagem cedida gentilmente curativo e/ou emergencial. Por outro lado,
pelo professoror Dr. Fabiano de Oliveira Araújo .
indivíduos sem ansiedade odontológica, procuram

Síndrome da queimação na boca

É considerada um distúrbio sintomático


somático em indivíduos com mucosa oral
clinicamente saudável, que pode estar associado à
depressão e ansiedade. 48
Ansiedade Odontológica

A literatura apresenta uma forte relação


entre medo/ansiedade odontológica e saúde bucal
precária, assim como fuga às consultas

Figura 8.8 Ciclo das consequências de experiências


negativas no tratamento odontológico.
161

51
atendimento para acompanhamento preventivo. ocorrer a disgeusia (alteração no paladar). Outros
Além disso, a literatura evidencia que o tipo de sintomas também são relatados na literatura, porém
tratamento realizado influencia na fobia, assim em frequência menor, tais como (em ordem de
como experiências negativas, o que evidencia o frequência, do maior para o menor): aumento da
ciclo abaixo: 51 salivação, estomatite, disfagia, bruxismo, glossite,
discinesia tardia, língua pilosa, aumento das
Medicações e efeitos
glândulas salivares, edema de língua, doença

Em casos de transtornos depressivos, os dentária, gengivite, halitose, úlceras, doença

antidepressivos, incluindo inibidores seletivos de periodontal, eritema multiforme, sinusite, rigidez

receptação de serotonina (SSRIs) e inibidores mandibular, candidíase oral, síndrome de Steven-

seletivos de serotonina e noradrenalina (SNRIs), Johnson e erosão da linha gengival. 53

são considerados opções de tratamento de primeira Exemplos:


linha. Como opções de segunda linha, existem os  SSRI: Citalopram, escitalopram, fluoxetina,
antidepressivos tricíclicos e inibidores de fluvoxamina, paroxitina, sertralina,
monoamina oxidase (IMAO). 53 clomipramina, alprazolam;
 SNRI: Desvenlafaxina, duloxetina, venlafaxina;
Quanto a pacientes com transtornos
 Tricíclicos: Amitriptilina, clomipramina;
ansiosos, são utilizados antidepressivos,
Antipsicóticos e anticonvulsivantes
antipsicóticos e benzodiazepínicos. Em outras
O efeito mais comumente relatado é a
condições mais raras, como esquizofrenia ou
xerostomia. A discinesia tardia também é muito
transtornos bipolares, a terapia medicamentosa
citada na literatura. Outros sintomas, são (em ordem
pode ser única ou combinada de antidepressivos,
de frequência, do maior para o menor): aumento da
antipsicóticos e anticonvulsivantes como
salivação, disfagia, edema de língua, sinusite,
estabilizadores de humor. 53
doença dentária, disgeusia, eritema multiforme, dor
Um efeito muito comum dos psicotrópicos facial, espasmo e inchaço, estomatite, úlceras
é a xerostomia. A redução do fluxo salivar acarreta bucais, Síndrome de Steven-Johnson, glossite,
a maior vulnerabilidade na saúde bucal dos hipertrofia gengival, reação gastresofágica,
indivíduos em questão, considerando o importante espasmo da língua, aumento das glândulas
2,36,48,53
papel da saliva aos tecidos moles e dentes. salivares, papila hipertrófica da língua, pênfigo,
Em relação a xerostomia, os sintomas mais comuns infecção oral por cândida, dor orofaríngea,
são a sialorreia (paradoxalmente), disgeusia bruxismo, parestesia oral e abscesso periodontal. 53
(alterações no paladar) e discinesia tardia Os anticonvulsivantes apresentam efeitos orais
53
(movimentos involuntários da mandíbula). semelhantes aos dos antipsicóticos.
Exemplos de antipsicóticos: 53
Antidepressivos
 Haloperidol;
Grande parte dos antidepressivos causam
 Olanzapina, risperidona;
xerostomia, podendo ainda, em alguns casos,
162

 Quetiapina, Aripiprazol, Asenapina, ansiosos que possam interferir no momento da


paliperidona;
consulta
 Carbonato de Lítio;
53  Compreender a natureza da ansiedade antes de
Exemplos de anticonvulsiv antes:
decidir uma abordagem específica;
 Valproato de sódio;
Exemplos:
 Carbamazepina;
Ansiedade odontológica, fobia social
Drogas ansiolíticas e sedativas
(medo da avaliação social), transtorno obsessivo
A xerostomia é o sintoma mais relatado,
compulsivo (medo de germes), transtorno do pânico
seguido por aumento da salivação. Entre os mais
com ou sem agorafobia (medo de ficar longe da
comuns, estão: disgeusia, síndrome de Stevens
segurança de casa), depressão, entre outras. 52
Johnson, halitose, sinusite, língua cabeluda, reação
 Estabelecer uma boa comunicação com o
gastroesofágica, úlceras, discinesia tardia, disfagia,
paciente; 52
edema de língua e cárie dentária. 53
 Em alguns casos, pode existir a necessidade de
Exemplos de ans iol íticos:
suporte farmacológico específico, como óxido
 Diazepan, Buspirona, Flunitrazepam
nitroso, sedação oral, sedação intravenosa,
Lorazepam, Nitrazepam, Oxazepam;
sedação consciente ou anestesia geral (AG),
Exemplos de sedativos:
sendo a AG indicada apenas em último caso; 52
 Zolpidem, zopiclone, melatonina;
 Altos níveis de ansiedade podem exigir o
acompanhamento de um psicólogo, e caso o
Condutas odontológicas paciente já realize acompanhamento
 Acompanhamento junto ao médico e psicoterapêutico, sugere-se contato com o
48
conhecimentos das medicações; profissional; 52
 Aconselhamento dietético, uma vez que uma  O comportamento do dentista com estímulos
dieta pobre em nutrientes, rica em açúcar, positivos é essencial; 52
ocorrência de xerostomia e associação a hábitos  Deve-se perguntar ao paciente que tipo de
deletérios como tabagismo e alcoolismo, pode informação eles preferem e quando, para que a
trazer consequências para a saúde bucal e quantidade correta seja repassada no momento
48
sistêmica; apropriado; 52
 Educação e aconselhamento sobre prevenção; 48  A técnica “fale-mostre-faça” apesar de muito
 Em caso de xerostomia e vômitos, tratamentos aplicada na odontopediatria, pode também ser
com flúor e saliva artificial são recomendados; utilizada com adultos ansiosos; 52
48
 Alguns pacientes podem necessitar de pausas
O tratamento de pacientes com ansiedade durante os procedimentos. Dessa forma, no
início, o dentista deve comunicar que caso o
odontológica ou outros tipos de transtornos
paciente precise de um descanso, poderá
solicitar. Caso o dentista perceba que o paciente
163

está cada vez mais ansioso, é indicado que pensamentos catastróficos que geralmente
ofereça a pausa e não espere a situação piorar, acompanham esses pacientes; 52
uma vez que, a pausa permite que o paciente se  É indicado que os tratamentos a esses pacientes
acalme para prosseguir, sem que o procedimento sejam realizados em fases, para que não
seja finalizado prematuramente com perda de sobrecarreguem. Dessa forma, o paciente pode
qualidade; 52 ter tempo para treinar as técnicas de
 O cirurgião dentista deve ensinar ao paciente relaxamento. Porém, o dentista deve usar essa
uma forma fácil de sinalização quando esse abordagem com cuidado, para que o paciente
precisar de uma pausa ou sentir qualquer consiga completar todo o tratamento. 52
desconforto. Isso aumenta a confiança e
Diferentes pacientes e condutas
segurança do indivíduo. Exemplo: mão
levantada significa parar, dedo indicador
Paciente com medo de estímulos específicos,
levantado significa necessidade do dispositivo
de sucção, entre outros. 52
como: injeções, som, visão, cheiro, dor associada
 Utilizar de distrações visuais e sonoras no ao tratamento
momento da consulta, pode ser benéfico para
Os indivíduos com essa fobia conseguem
pacientes com ansiedade; 52
identificar o que gera esse sintoma. 52
 O reforço positivo pode ser utilizado para
encorajar e receber a cooperação dos pacientes; Método de dessensibilização sistemática: o
52 tratamento envolve a exposição gradual do
 A respiração diafragmática ou de relaxamento é indivíduo, os estímulos que geram o medo,
uma técnica muito útil para os pacientes encorajando o paciente a usar estratégias de
ansiosos, tendo grande eficácia. Acredita-se relaxamento durante a consulta para controlar os
ainda que esse exercício pode auxiliar na níveis de ansiedade. 52
redução da dor percebida pelo paciente. 52 Pacientes com medo de catástrofes médicas
 O relaxamento muscular progressivo pode ser
durante o tratamento, como um ataque cardíaco
uma técnica eficaz para o relaxamento; 52
 Tanto a técnica da respiração diafragmática Esses indivíduos frequentemente relatam
quanto a do relaxamento muscular progressivo, ser alérgicos ou que tiveram uma “reação” a
devem ser treinadas pelos pacientes em casa; 52 anestésicos locais – particularmente os que contêm
 A imaginação guiada e técnicas de mindfulness vasoconstritor. Esses indivíduos podem ter receio
pode auxiliar esses pacientes, uma vez que os de não conseguirem respirar com determinados
sentidos são estimulados, o paciente desfoca do instrumentos na boca ou se engasgar. 52
procedimento odontológico que gera o medo; 52
No caso de uma “reação” ao anestésico
 A reestruturação cognitiva é uma técnica oposta
O paciente pode ter sentido sintomas de
à de imaginação guiada. Ela busca trazer o
excitação autonômica, decorrente aos níveis
paciente para a realidade, dissolvendo ideias e
164

elevados de epinefrina. Dentre esses sintomas, Pacientes com ansiedade dental generalizada
estão: palpitações cardíacas e falta de ar. Os
São aqueles que não são capazes de
pacientes e alguns dentistas podem interpretar essa
identificar os aspectos geradores de fobia. As
condição como “alergia ao anestésico”. Na consulta
preocupações relacionadas, geralmente são:
seguinte, é muito provável que o paciente sinta mais
preocupação com o procedimento em si, com seu
ansiedade, acreditando na possibilidade da reação já
próprio comportamento durante o tratamento, se
sentida. Somada a ansiedade mencionada, é comum
serão capazes de controlar sua própria ansiedade, de
que as reações provocadas pela epinefrina sejam
que tratamento dentário futuro eles podem ou não
sentidas de forma mais intensa, como se estivesse
precisar, se o dentista e a equipe odontológica os
piorando ao longo do tempo. 52
estão percebendo de forma negativa por causa de
Sendo assim, o tratamento desses pacientes seu medo e saúde bucal. Esses pacientes geralmente
requer histórico médico completo e, para descartar têm confiança no que é dito pelo dentista, isso ajuda
a possibilidade de alergias verdadeiras aos antes, durante e após os procedimentos. Como são
anestésicos contendo epinefrina, deve-se pacientes muito focados nas preocupações futuras,
encaminhar ao alergologista. Isso pode oferecer é importante que o dentista o traga para o presente,
mais segurança ao paciente. Depois de descartada a de forma compreensiva. Por exemplo: “vamos
possibilidade de alergia, é importante que o dentista conversar sobre o procedimento de hoje, nos
inicie um processo de educação sobre a natureza concentrar no que estamos realizando agora. É um
desse hormônio e das sensações normais processo simples e tenho certeza de que você se
ocasionadas por ele, sendo que algumas pessoas são sairá muito bem e ficará feliz com o resultado”. 52 A
mais sensíveis aos efeitos estimulantes. Após a exposição gradual é muito importante para esses
explicação, o dentista pode se oferecer para injetar pacientes. Sendo assim, caso seja necessário
uma pequena quantidade de anestésico com tratamento mais invasivo, é interessante que o
epinefrina, para o paciente perceber como se sente. dentista faça com que o paciente treine técnicas de
Dessa forma, deve-se encorajar o paciente a utilizar relaxamento e realize a exposição a procedimentos
técnicas de relaxamento para controlar a excitação cada vez mais invasivos. Isso dará ao paciente a
autônima. Gradualmente, o medo tende a se sensação de domínio sobre a ansiedade. 52
extinguir. 52
Pacientes que são desconfiados (que suspeitam
Para os pacientes que temem o engasgo,
deve-se introduzir gradualmente os estímulos, ao
das atitudes do cirurgião-dentista)
passo que técnicas de relaxamento são realizadas. É
Eles se sentem apreensivos por não
importante fazer com que o paciente pratique a
estarem no controle do tratamento, geralmente
respiração e a deglutição no contexto em que a fobia
trazendo críticas a dentistas anteriores. Esses
geralmente ocorre. 52
pacientes podem usar sarcasmo ou insultos
velados, por exemplo: após a sugestão de uma
165

linha de tratamento de alto custo, eles o Cirurgião-dentista tenha amplo diálogo com os
“brincam” que pagarão o carro novo do dentista demais profissionais, visando a qualidade e

ou a viagem de férias. Nesses casos, o medo colaboração no atendimento multiprofissional.


Portanto, a formação continuada e a
não se apresenta como nas formas anteriores,
atualização em temas relacionados à psicologia
mas sim como um confronto, devido ao medo
aplicada à Odontologia, são indispensáveis para que
do paciente de perder o controle ou a
o profissional tenha os recursos necessários para
autoestima nas mãos do dentista. 52
executar um bom atendimento ao paciente.

Nesses casos, os pacientes respondem As alterações cognitivas, cada uma com sua

melhor aos pedidos de permissão, como: perguntar particularidade, merecem atenção especial no

se pode iniciar o tratamento, se pode inclinar a consultório odontológico, já que indivíduos

cadeira, se pode utilizar determinado instrumento acometidos apresentam fatores de risco aumentados

para realização de um exame. Todas as etapas do para doenças bucais. É fundamental que o cirurgião

tratamento devem ser explicadas, e um espelho dentista conheça as barreiras que seu paciente

pode ser oferecido para que o paciente acompanhe enfrenta pela sua condição mental e esteja ciente

os procedimentos. Caso possível, o plano de das possibilidades de refletirem na cavidade bucal,

tratamento deve ser entregue de forma escrita, pois seja por algum hábito induzido pelo próprio

geralmente procuram uma segunda opinião. Isso transtorno, reações adversas de medicamentos,

garantirá a ele que o dentista não está apenas o entre outros.

empurrando para o tratamento mais caro. 52 Uma Conseguir a confiança desses pacientes por

vez estabelecida a confiança no cirurgião dentista, meio da empatia e do acolhimento, facilita a adesão

esses pacientes são relativamente tranquilos de e continuidade do tratamento. O reforço positivo

tratar.52 pode ser uma forma de trazer a motivação a esses


pacientes no que tange a prevenção, uma vez que a
falta de motivação é um sintoma presente na
Conclusão
intersecção dos distúrbios citados. Deve-se salientar

Tendo em vista o que foi apresentado nesse que o diagnóstico e tratamento dos distúrbios

capítulo, é notório que o conhecimento do abordados nesse capítulo, não são da competência

profissional acerca do assunto é fundamental para o do Cirurgião-dentista. Esse deve, em caso de

manejo e tratamento de indivíduos acometidos por suspeita, encaminhar o paciente aos profissionais

transtornos cognitivos. Sendo assim, é preciso que especialistas.

Referências
1. World Health Organization. Mental disorders 2. Kisely S. No mental health without oral health.
[Internet]. 2019 [acesso em 22 Ago 2021]. Disponível em: Canadian Journal of Psychiatry. 2016 Fev; 61(5):277–82.
https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/mental-
disorders 3. Da Rosa SV., Moysés SJ, Theis LC, Soares RC,
Moysés ST, Werneck RI et al. Barriers in Access to Dental
150

Services Hindering the Treatment of People with Disabilities: oral health status: Review of the literature. Eur J Paediatr Dent.
A Systematic Review. Int J Dent. 2020 Jul 23; 2020:1–17. 2020; 21(1):9–12.

4. Slack-Smith L, Hearn L, Scrine C, Durey A. Barriers 18. Silva AH, Keller AO, Pauli J De, Bervian J, Carli JP
and enablers for oral health care for people affected by mental De, Salete M, et al. Avaliação Periodontal pelo Índice de
health disorders. Aust Dent J. 2017; 62(1):6–13. CPITN de Indivíduos com Transtorno do Espectro Autista –
Revisão Integrativa de Literatura. Braz J Periodontol. 2020;
5. Shen MD, Piven J. Brain and behavior development 29(03).
in autism from birth through infancy. Dialogues Clin Neurosci.
2017; 3367:325–34. 19. Stępnicki P, Kondej M, Kaczor AA. Current concepts
and treatments of schizophrenia. Molecules. 2018; 23(8).
6. Lord C, Elsabbagh M, Baird G, Veenstra-
Vanderweele J. Autism spectrum disorder. Lancet. 2018; 20. Köster LS, Carbon M, Correll CU. Emerging drugs
392(10146):508–20. for schizophrenia: An update. Expert Opin Emerg Drugs. 2014;
19(4):511–31.
7. Lord C, Brugha TS, Charman T, Cusack J, Dumas G,
Frazier T, et al. Autism spectrum disorder. Nat Rev Dis Prim. 21. Dean L. Schizophrenia. Med Genet Summ. 2017 Fev;
2020 Jan; 6(5). (Md):8–11.

8. Xavier H da S, Cavalcanti ACS, Gomes ACP, Neto 22. American Psychiatric Association. Manual de
RG da L, De Almeida HCR, Heimer MV, et al. Experiência de diagnóstico e estatistico de transtornos mentais: DSM-V. 5ª ed.
cárie em crianças e adolescentes com transtorno do espectro Porto Alegre: Artmed; 2014. 848 p.
autista e fatores associados / Caries experience in children and
adolescents with autistic spectrum disorder and associated 23. Purkayastha S, Gurenlian J. Oral Healthcare for
factors. Brazilian J Heal Rev. 2021; 4(2):7817–29. Patients With Schizophrenia. Decis Dent. 2020; 6(5):40–4.

9. Sociedade Brasileira de Pediatria, Departamento 24. Vereczkei A, Mirnics K. Genetic predisposition to


Científico de Pediatria do Desenvolvimento e Comportamento. schizophrenia: What did we learn and what does the future
Manual de Orientação: Transtorno do Espectro do Autismo hold? Neuropsychopharmacol Hungarica. 2011; 13(4):205– 10.
[Internet]. 2019. 24 p. Disponível em:
25. Gupta S, Gupta R. Nepal Journal of Epidemiology
https://www.sbp.com.br/imprensa/detalhe/nid/transtorno-do-
Necessity of oral health intervention in schizophrenic patients-
espectro-do-autismo/
A review. 2016; 6(4):605–12. Available from:
10. American Psychiatric Association. What Is Autism www.nepjol.info/index.php/NJE
Spectrum Disorder? [Internet]. 2018 [acesso em 21 ago 2021].
26. Patel KR, Cherian J, Gohil K, Atkinson D.
Disponível em: https://www.psychiatry.org/patients-
Schizophrenia: Overview and treatment options. P T. 2014;
families/autism/what-is-autism-spectrum-disorder
39(9):638–45.
11. Kumar B, Prakash A, Sewal RK, Medhi B, Modi M.
27. Moullan M, Denis F. Schizophrénie et santé orale. J
Drug therapy in autism: A present and future perspective.
Stomatol Oral Maxillofac Surg. 2017; 118(2):115–8.
Pharmacol Reports. 2012; 64(6):1291–304.
28. Frederic D, Corinne R, Matthieu R, Francesca SP,
12. Sharma SR, Gonda X, Tarazi FI. Autism Spectrum
Stephanie TJ, Nathalie R. The schizophrenia oral health profile:
Disorder: Classification, diagnosis and therapy. Pharmacol
Development and feasibility. Transl Neurosci. 2018; 9(1):123–
Ther. 2018; 190:91–104.
31
13. Friedlander AH, Yagiela JA, Paterno VI, Mahler ME.
29. Torales J, Barrios I, González I. Oral and dental
The neuropathology, medical management and dental
health issues in people with mental disorders. Medwave. 2017;
implications of autism. J Am Dent Assoc. 2006; 137(11):1517–
17(8):e7045.
27.
30. Spezzia S. Implicações Odontológicas do
14. Volkmar F, Wiesner L. Autismo: Guia Essencial para
Acometimento pela Esquizofrenia. Braz J Periodontol. 2020;
Compreensão e Tratamento. Porto Alegre: Artmed; 2019. 349
30(03):173–9.
p.
31. Panico R, Piemonte E, Lazos J, Gilligan G, Zampini
15. Rouches A, Lefer G, Dajean-Trutaud S, Lopez-
A, Lanfranchi H. Oral mucosal lesions in Anorexia Nervosa,
Cazaux S. Tools and techniques to improve the oral health of
Bulimia Nervosa and EDNOS. J Psychiatr Res. 2018 Jan 1;
children with autism. Arch Pediatr. 2018; 25(2):145–9.
96:178–82.
16. Orellana LM, Silvestre FJ, Martínez-Sanchis S,
32. Kisely S, Baghaie H, Lalloo R, Johnson NW.
Martínez- Mihi V, Bautista D. Oral manifestations in a group
Association between poor oral health and eating disorders:
of adults with autism spectrum disorder. Med Oral Patol Oral
Systematic review and meta-analysis. British Journal of
Cir Bucal. 2012; 17(3):1–5.
Psychiatry. Royal College of Psychiatrists; 2015 Out;
17. Ferrazzano GF, Salerno C, Bravaccio C, Ingenito A, 207(4):299–305.
Sangianantoni G, Cantile T. Autism spectrum disorders and
151

33. Milosevic A. Eating disorders and the dentist. British 44. Couturier J, Isserlin L, Spettigue W, Norris M.
Dental Journal. 1999 Fev 13; 186(3):109–13. Psychotropic Medication for Children and Adolescents with
Eating Disorders. Child and Adolescent Psychiatric Clinics of
34. Clark DB et al. Patients with eating disorders: North America. W.B. Saunders. 2019 Out; 28(4):583–92.
Challenges for the oral health professional. 2010; 163–70.
45. Ludermir AB, Melo Filho DA de. Condições de vida
35. Johansson AK, Johansson A, Nohlert E, Norring C, e estrutura ocupacional associadas a transtornos mentais
Åstrøm AN, Tegelberg Å. Eating disorders - knowledge, comuns. Rev Saúde Públic. 2002 Abr; 36(2):213–21.
attitudes, management and clinical experience of Norwegian
dentists. BMC Oral Health. 2015 Out 14; 15(1). 46. Kenny A, Dickson-Swift V, Gussy M, Kidd S, Cox
D, Masood M, et al. Oral health interventions for people living
36. Kisely S, Baghaie H, Lalloo R, Siskind D, Johnson with mental disorders: Protocol for a realist systematic review.
NW. A systematic review and meta-analysis of the association Int J Ment Health Syst. 2020 Mar 24; 14(1).
between poor oral health and severe mental illness.
Psychosomatic Medicine. Lippincott Williams and Wilkins. 47. Quadros L de CM de, Quevedo L de A, Gonçalves
2015 Jan; 77(1):83-92. HD, Horta BL, Motta JVDS, Gigante DP. Common Mental
Disorders and Contemporary Factors: 1982 Birth Cohort. Rev
37. Gomes ATA, Matos K de F, Lavor LQ de, Pereira Bras Enferm. 2020; 73(1):e20180162.
LFS, Macedo YVG de, Cavalcante JL de S et al. Importância
do cirurgião-dentista no diagnóstico da bulimia: Revisão de 48. Kisely S, Sawyer E, Siskind D, Lalloo R. The oral
literatura. Rev Eletrônica Acervo Saúde. 2019 Jul 8; (26):e730. health of people with anxiety and depressive disorders - A
systematic review and meta-analysis. Journal of Affective
38. Pallier A, Karimova A, Boillot A, Colon P, Ringuenet Disorders. 2016 Ago; 200:119–32.
D, Bouchard P, et al. Dental and periodontal health in adults
with eating disorders: A case-control study. J Dent. 2019 Mai 49. de Oliveira MT, Bittencourt ST, Marcon K, Destro S,
1; 84:55–9. Pereira JR. Sleep bruxism and anxiety level in children. Braz
Oral Res. 2015; 29(1):1–5.
39. Romanos GE, Javed F, Romanos EB, Williams RC.
Oro-facial manifestations in patients with eating disorders. 50. Polmann H, Domingos FL, Melo G, Stuginski-
Appetite. 2012 Out; 59(2):499–504. Barbosa J, Guerra EN da S, Porporatti AL, et al. Association
between sleep bruxism and anxiety symptoms in adults: A
40. Aranha ACC, Eduardo CDP, Cordás TA. Eating systematic review. Journal of Oral Rehabilitation. 2019 Mar 12;
disorders part I: Psychiatric diagnosis and dental implications. 46(5):482–91.
J Contemp Dent Pract. 2008 Set 1; 9(6):073– 81.
51. Bottan ER, et al. Relationship between dental
41. Dynesen AW, Bardow A, Petersson B, Nielsen LR, appointment anddental anxiety: study with a group of
Nauntofte B. Salivary changes and dental erosion in bulimia adolescents. RSBO Rev Sul-Brasileira Odontol. 2008; 5(3):27–
nervosa. Oral Surgery, Oral Med Oral Pathol Oral Radiol 32.
Endodontology. 2008 Nov; 106(5):696–707.
52. Armfield JM, Heaton LJ. Management of fear and
42. Bern EM, Woods ER, Rodriguez L. Gastrointestinal anxiety in the dental clinic: A review. Australian Dental
manifestations of eating disorders. Journal of Pediatric Journal. 2013 Dez; 58(4):531–1.
Gastroenterology and Nutrition. Lippincott Williams and
Wilkins. 2016 Nov; 63(5):e77–85. 53. Cockburn N, Pradhan A, Taing MW, Kisely S, Ford
PJ. Oral health impacts of medications used to treat mental
43. Conviser JH, Fisher SD, Mitchell KB. Oral care illness. J Affect Disord. 2017 Dez 1; 223:184–93.
behavior after purging in a sample of women with bulimia
nervosa. J Am Dent Assoc. 2014; 145(4):352–4.
9
ALTERAÇÕES ENDÓCRINO-METABÓLICAS E IMUNOLÓGICAS
João Rodrigo Sarot | Isabela Salgado de Queiroz | Luísa Brondani Tomazin

Introdução
Os distúrbios endócrino-metabólicos são autoimunes representam uma família de pelo menos
alterações hormonais que influenciam os processos 80 doenças que compartilham uma patogênese
essenciais para o funcionamento do corpo. Entre comum: respostas imunes contra órgãos, tecidos e
eles está o Diabetes Mellitus, caracterizado pela células próprias, resultando em danos a um ou mais
3, 4
presença de hiperglicemia devido ao órgãos. O problema está relacionado a uma
comprometimento da secreção de insulina, ação característica comum à maioria das doenças, ou
defeituosa desse hormônio ou ambos. A seja, elas progridem gradualmente e, portanto,
hiperglicemia crônica do diabetes está associada a podem ocorrer graves danos aos tecidos antes do
complicações microvasculares de longo prazo, diagnóstico clínico. Além de fatores de risco
relativamente específicas, que afetam os olhos, rins genéticos, outras variáveis podem moldar a resposta
e nervos, bem como há um risco aumentado de autoimune aumentando ou diminuindo a
1, 2
doença cardiovascular (DCV). probabilidade de desenvolver alguma patologia.
Em contrapartida, as alterações Essas variáveis incluem fatores como sexo, idade,
153

gravidez e até mesmo sinais neurológicos e população diabética no Brasil será de 21.5 milhões.
emocionais. 5, 6 Entre algumas doenças autoimunes 7, 8

estão a Esclerose Múltipla, Síndrome de Sjögren, Diabetes Mellitus é uma doença crônica
Doença celíaca, e inclui-se também a Diabetes. caracterizada por deficiência parcial ou total na
As alterações endócrino-metabólicas, bem produção de insulina ou por resistência à sua ação.
como as imunológicas, estão relacionadas Isso resulta no metabolismo anormal da glicose,
intimamente à alterações bucais, aumentando a proteínas e lipídios e por consequência, na
predisposição para algumas doenças e hiperglicemia. 9
complicações odontológicas. Diante disso, o O pâncreas mantém os níveis de glicose
capítulo evidenciará a relação entre estas alterações sanguínea por meio da ação do hormônio insulina,
e a odontologia, mostrando a relevância deste que é secretado pelas células beta das ilhotas de
assunto a fim de melhorar a abordagem clínica e Langerhans por estímulo dos elevados níveis de
amenizar as consequências dessas doenças. glicose no sangue que ocorrem após as refeições.
Esse hormônio permite a captação de glicose pelas
Diabetes
células, reduzindo seus níveis na corrente
De acordo com a 9ª edição do Atlas de
sanguínea. 10
Diabetes da Federação Internacional de Diabetes,
No caso da Diabetes, essa glicose que não
cerca de meio bilhão de pessoas possuem diabetes
foi utilizada pelas células e acumulou no sangue, é
em todo o mundo (a prevalência global em 2019 era
eliminada pela urina, juntamente com grande
estimada em 463 milhões de pessoas), e o número
quantidade de água. Dessa forma o volume aumenta
deve aumentar em 25% (578 milhões) em 2030 e
(poliúria) e, por consequência, ocorre a
51% (700 milhões) em 2045. O Brasil é o quinto
desidratação, seguida do aumento da ingestão de
país com maior número de casos de diabetes no
água (polidipsia). Além disso, outros sintomas são
mundo (16.8 milhões), prevendo que em 2030 a
1, 12, 14-18
Tabela 9.1 Diferenças e etiologia: diabetes tipo I e tipo II.
154

polifagia, que é a fome excessiva devido à quebra


Complicações e sintomas do Diabetes
de gorduras e proteínas na falta da ação da insulina
e também a perda de peso. Mellitus
Na Tabela 9.1, são citadas as principais Certos sintomas de hiperglicemia acentuada incluem
diferenças entre diabetes tipo 1 e 2 bem como sua  Poliúria, polidipsia, polifagia;
etiologia.  Perda de peso involuntária;
Outros tipos de diabetes  Visão turva;
 Fadiga;
Diabetes Mellitus Gestacional (GDM)
 Fraqueza;
É definido como intolerância a carboidratos
 Letargia;
de gravidade variável com início ou primeira
 Prurido cutâneo e vulvar;
detecção durante a gravidez. Geralmente se resolve
 Balanopostite;
após o parto, mas em grande parte dos casos, retorna
 Infecções de repetição (pele, gengiva, couro
anos depois. Os filhos nascidos de mães com GDM
cabeludo). 20
estão sob risco aumentado de complicações
Complicações agudas do diabetes não controlado
imediatas e os riscos de complicações perinatais
Cetoacidose diabética:
graves são aumentados em mulheres com diabetes
A cetoacidose diabética é um caso de
gestacional. 11
hiperglicemia grave, sendo mais comum em jovens
Se tem aumento (poliúria) e, por
com Diabetes Mellitus tipo 1 (DM1). Nesta situação
consequência, ocorre a desidratação, seguida do
o corpo libera grande quantidade de hormônio
aumento da ingestão de água (polidipsia). Além
hiperglicemiante (glucagon) e os ácidos graxos
disso, outros sintomas são a polifagia, que é a fome
livres são oxidados a corpos cetônicos, estimulados
excessiva devido à quebra de gorduras e proteínas
por esse hormônio. O aumento da produção de
na falta da ação da insulina e também a perda de
corpos cetônicos leva à redução de bicarbonato e
peso. 12, 13
por consequência, à acidose metabólica. 21
Outros tipos de diabetes são conhecidos, como:
 Defeitos genéticos da função da célula β; Os principais sintomas dessa complicação
 Defeitos genéticos da ação da insulina; são: fadiga, poliúria, polidipsia, perda de peso, dor
 Doenças do pâncreas exócrino; abdominal, náuseas, vômitos, letargia, estupor,
 Endocrinopatias; perda de consciência, sinais de desidratação
 Diabetes induzido por drogas ou produtos (mucosa oral seca, saliva espessa), taquicardia,
químicos; hipotensão, respiração de Kussmaul (rápida e
 Infecções; profunda), odor clássico de hálito frutado (acetona),
 Formas incomuns de diabetes imuno- choque e coma. 21, 22
mediado. 13, 19
155

Síndrome hiperosmolar nã o cetótica (coma hiper Em 15 minutos, 15 g de carboidrato elevarão a


osmolar): glicose plasmática em cerca de 75 mg / dL. A
glicose pura é o método de tratamento preferido,
A síndrome hiperosmolar não cetótica é um
mas pode ser ingerido suco de fruta, colher de mel,
caso de hiperglicemia grave, que ocorre em pessoas
leite desnatado, refrigerante ou balas e bombons.
com Diabetes Mellitus tipo 2 (DM2). Os pacientes
Nos casos de hipoglicemia grave em que a pessoa
frequentemente apresentam sinais claros de
não consegue engolir ou se ajudar de outra forma
desidratação e estado mental alterado. Os níveis
(inconsciência, por exemplo), é necessária a
mínimos de insulina no DM2 ajudam a evitar a
procura por um pronto-socorro, para receber por via
Cetose. 20, 21
endovenosa o glucagon e glicose se necessário. 24
Hipoglicemia:
Complicações crônicas do diabetes
A hipoglicemia ocorre quando a Além das complicações agudas apresentadas,
concentração de glicose plasmática encontra-se no caso do diabetes não tratado, os pacientes podem
23
anormalmente baixa. O glucagon e a insulina apresentar também complicações crônicas:
mantêm a glicose normalmente entre 70 e 100 mg /  Retinopatia com potencial perda de visão;
dL. Devido ao diabetes, a interação entre esses  Nefropatia levando a insuficiência renal;
hormônios torna-se disfuncional e aumenta o risco  Neuropatia periférica com risco de úlceras nos
de hipoglicemia. A American Diabetes Association pés, amputações e articulações de Charcot;
(ADA) define a hipoglicemia como uma glicose  Neuropatia autonômica causando sintomas
sanguínea plasmática ≤70 mg / Dl. Alguns fatores gastrointestinais, geniturinários,
de risco para essa complicação são a ingestão e cardiovasculares e disfunção sexual;
horários irregulares das refeições, excesso de  Pacientes com diabetes têm uma incidência
bebida alcoólica, doses excessivas de insulina e aumentada de doença aterosclerótica
medicamentos para baixar a glicose (gliburida e cardiovascular, arterial periférica
24
glipizida) ou exercícios extenuantes. cerebrovascular. 15

Os principais sintomas de uma crise hipoglicêmica


Exames
são adrenérgicos (tremor, sudorese, palidez, Os principais exames utilizados no
taquicardia, palpitação, fome) e neuroglicopênicos diagnóstico de Diabetes, bem como os números de
(cefaléia, tontura, sonolência, irritabilidade, referência, estão listados na Tabela 9.2. 14, 25

fraqueza, confusão mental, visão turva,


incoordenação motora, diplopia, paralisia, Alterações bucais
distúrbios da memória, confusão mental, disfunção Xerostomia
Pessoas diabéticas apresentam disfunção
sensorial, desmaio, convulsão e coma). 24
salivar, podendo resultar na diminuição do fluxo
O tratamento consiste na “regra dos 15” que salivar e mudança na composição da saliva (glicose
é muitas vezes utilizada nos casos de hipoglicemia. aumentada). Isso promove o aumento de cárie
156

dental, cálculo e a proliferação e colonização de composição salivar e tabagismo são mencionados.


26
bactérias na cavidade oral (a glicose é a base para o
desenvolvimento de Candida albicans). Além disso,
Cicatrização de lesões bucais deficiente
a disfunção salivar pode causar alterações de sabor
Em diabéticos, a progressão normal através
ou aumento dos limiares de detecção. 26
Tabela 9.2 Exames para o diagnósticos de diabetes 14, 25 das fases de reparo do tecido é prejudicada,
promovendo um estado inflamatório sustentado e
epitelização disfuncional de feridas, o que implica
em uma cicatrização tardia de tecidos moles e duros
durante e após cirurgias orais. 27

Isso ocorre devido à combinação de fatores


que promovem a inflamação e interrompem a
epitelização e o fechamento da ferida. Durante a
cicatrização normal, os macrófagos são
inicialmente pró-inflamatórios e, em seguida,
passam a ser anti-inflamatórios, onde promovem a
reparação do tecido e a transição para a próxima
Cáries dentárias
fase de cicatrização. Porém, em feridas diabéticas,
Pacientes diabéticos são suscetíveis ao
essa transição de macrófagos é alterada,
desenvolvimento de cárie, pela capacidade reduzida
permanecendo em um estado pró-inflamatório e
de limpeza e tamponamento da saliva, aumento de
evitando a resolução da ferida (evidências recentes
carboidratos na saliva, e aumento do nível de
sugerem que a epigenética possui um papel
leveduras orais. Além disso, a hiperglicemia
importante na regulação da função dos macrófagos
crônica pode causar pulpite irreversível levando à
na cicatrização de feridas normais e diabéticas). 27
26
necrose pulpar.
Além disso, a epitelização é retardada em
Alteração da mucosa oral feridas diabéticas por conta da função prejudicada

Algumas alterações como língua revestida de queratinócitos e fibroblastos provocada pela

e fissurada, língua geográfica, estomatite aftosa hiperglicemia e acúmulo de produtos finais de

recorrente e algumas lesões pré-malignas, incluindo glicação avançada (AGEs). Também podemos

líquen plano, podem estar associadas ao diabetes. A destacar a produção excessiva de Espécies Reativas

suscetibilidade desses pacientes a essas alterações de Oxigênio (ROS), diminuição do Óxido Nítrico

ainda é controversa, mas o controle insuficiente do (NO), diminuição da reposta aos Fatores de

diabetes, alteração imunológica, alterações da Crescimento (GFs) e das proteínas da via de

microcirculação com diminuição do suprimento sinalização da insulina. 28

sanguíneo, xerostomia, alteração no fluxo, Nestes indivíduos ocorre uma disfunção


epitelial em que as artérias e arteríolas são
157

incapazes de regular o tônus muscular, isto acarreta incluem estomatite dentária, queilite angular e
um ambiente isquêmico associado a diminuição de glossite romboide mediana. 26
NO (as ROS inativam ou diminuem a produção de
Aumento da parótida
NO pelo endotélio). A produção exacerbada de
A hipertrofia benigna da parótida é
ROS é considerado o fator primário da deficiência
observada em pacientes mais velhos que
de cicatrização em pacientes diabéticos. 26, 28
apresentam diabetes, mas sua prevalência é
Alteração do paladar desconhecida. Isso ocorre devido ao aumento das
A disfunção salivar pode vir a causar células acinares como resultado de uma interrupção
alterações na sensação de sabor ou aumento dos na síntese e liberação de proteínas. 29
limiares de detecção. A neuropatia também
Doença periodontal
aumenta o limiar de gosto. Esta disfunção sensorial
A doença periodontal envolve um ou mais
pode atrapalhar a capacidade de manter uma dieta e
dos tecidos como osso alveolar, ligamento
pode levar à regulação deficiente da glicose. 26
29
periodontal, cemento ou gengiva. A associação
Boca ardente entre diabetes e doenças periodontais, como
Sensação de queimação em diabéticos é gengivite (inflamação da gengiva) e periodontite
atribuída a um mau controle glicêmico, alterações (inflamação com destruição de tecidos
metabólicas na mucosa oral, angiopatia, infecção periodontais) é bem conhecida e pode ser
por candida e neuropatia. A dor neuropática nesses relacionada a numerosos fenômenos fisiológicos
pacientes pode se manifestar como ardor, encontrados na DM, tais como a resistência
formigamento ou mesmo como choque elétrico ou diminuída, alterações vasculares, alteração da
26
sensação de pontada. microbiota oral e metabolismo anormal do
22
colágeno. Além disso, quando somado a fatores
Infecções orais
de risco, os pacientes diabéticos se tornam mais
Pacientes diabéticos ficam mais suscetíveis
suscetíveis ao desenvolvimento de doença
ao desenvolvimento de infecções, tanto fúngicas
periodontal. Entre estes fatores estão: higiene bucal
quanto bacterianas, devido à taxa de fluxo salivar
deficiente, controle metabólico deficiente, maior
diminuída e a ausência dos seus efeitos
duração do diabetes e tabagismo. 26
antimicrobianos. Além disso, um mecanismo de
defesa prejudicado e um controle metabólico O diabetes afeta negativamente a saúde
deficiente podem desempenhar um papel periodontal, diminuindo a renovação de tecidos
importante no desenvolvimento de infecções. A periodontais e defesa imunológica local. Isso ocorre
candidose oral é uma infecção fúngica oportunista devido ao aumento na produção de citocinas pró-
e pode se desenvolver por vários fatores inflamatórias que promovem a destruição de tecidos
predisponentes, incluindo xerostomia. Isso porque a periodontais e diminuição da eliminação de
disfunção salivar pode contribuir para um maior patógenos periodontais devido à função celular
transporte de fungos. Lesões relacionadas à candida imune alterada em pacientes diabéticos. 29
158

Além disso, esses pacientes apresentam com diagnóstico prévio de diabetes, o dentista deve
níveis elevados deAGEs no periodonto, que se informar sobre o tipo e duração da doença,
interagem com o colágeno para produzir terapia, horário da última refeição, nível de controle
macromoléculas de colágeno que são altamente metabólico, complicações secundárias, sintomas de
estáveis e resistentes à degradação por enzimas, e hipoglicemia, história de hospitalização e
assim é reduzida a renovação dos tecidos cetoacidose, infecções sistêmicas, medicamentos
periodontais em diabéticos com pobre controle para complicações, hipertensão e uso de
29
glicêmico. álcool/tabagismo.

Em contrapartida, a periodontite também Após a anamnese, realiza-se o exame físico


pode ter um impacto negativo sobre o diabetes, extra e intraoral do paciente. É importante notar as
contribuindo para a resistência à insulina e piorando alterações bucais observadas no paciente diabético,
o controle glicêmico. Isso porque a mastigação já que elas têm sua incidência ou progressão
pode resultar na disseminação sistêmica de favorecida pelo descontrole glicêmico. Também é
patógenos periodontais e seus metabólitos em necessário que seja aferida a pressão dos pacientes
pacientes com periodontite, causando bacteremia, (identificando quadros de hipo ou hipertensão) e
que resulta em um aumento nos níveis séricos de conferir a taxa glicêmica para evitar possíveis
mediadores inflamatórios. A inflamação sistêmica é complicações. 22, 30
bem conhecida por piorar a resistência à insulina e Na Tabela 9.3 estão descritos os graus de
o controle do diabetes. Nestes casos, o início da risco dos pacientes diabéticos, sinais clínicos e suas
terapia periodontal pode resultar na diminuição dos características, bem como a melhor forma de
mediadores pró-inflamatórios, contribuindo para proceder diante de cada situação. 22, 31
um melhor controle do estado glicêmico. 29 Possíveis complicações no atendimento odontológico
O profissional deve estar atento às possíveis
Tratamento odontológico complicações que podem surgir durante o
Avaliação
atendimento dos pacientes diabéticos, como:
Na anamnese é importante verificar se o
paciente possui os sinais e sintomas do diabetes, Cri se Hi poglicêmica

como poliúria, polidipsia, polifagia, perda de peso, Em caso de suspeita de crise hipoglicêmica
fadiga, fraqueza, letargia, prurido cutâneo e vulvar, é importante atentar-se aos sinais e sintomas já
balanopostite, infecções de repetição, visão turva, citados e medir a glicemia capilar para confirmar o
obesidade, dislipidemia, hipertensão. diagnóstico. Em casos em que não é possível essa
confirmação, o paciente deverá ser tratado como se
Caso haja suspeita da doença, o dentista
apresentasse uma verdadeira hipoglicemia e o
deve encaminhar esse paciente para o médico, já
tratamento deve ser imediato. No caso de pacientes
que 3 a 4% dos pacientes adultos que procuram
conscientes é indicado a administração de 15 a 20
tratamento odontológico são diabéticos, e a sua
gramas de glicose. Pacientes inconscientes não
maioria desconhece ter a doença. Nos pacientes
devem receber nada por via oral, com a exceção de
159

um pouco de açúcar aplicado na bochecha, sendo administração de glicose a 10% por via endovenosa
portanto, o tratamento ideal para esses casos, a (em média 30-50 mL). 22
Tabela 9.2 Riscos para o paciente diabético: pequeno, médio, grande

Hiperglic emia:
de hiperglicemia grave, o paciente deverá ser
Caracterizada como um aumento da
encaminhado para uma Unidade de Emergência. 22
concentração sanguínea de glicose que pode ser
Cuidados do cirurgião dentista no
causada pela omissão ou subdose de insulina ou de
hipoglicemiantes orais, excessos alimentares, atendimento ao diabético
medicamentos que aumentam a glicemia, infecções, Os Pacientes diabéticos deverão ter sua

cirurgia, estresse físico, traumático, metabólico ou glicemia avaliada antes do início do atendimento,

emocional. Seus sinais e sintomas são poliúria, para identificar e tratar uma possível hipoglicemia

polidipsia, polifagia, perda de peso e hálito cetônico ou hiperglicemia (caso esteja alterada, o paciente

e se não controlada, pode evoluir para cetoacidose deve ser encaminhado para avaliação médica).

diabética. A suspeita de hiperglicemia deve ser É importante orientar o paciente a alimentar-se


confirmada pela medida da glicemia capilar e o normalmente antes do atendimento e, se necessário,
tratamento, nos casos leves, relaciona-se à interromper consulta demorada para refeição leve.
alteração, sob orientação médica, das doses dos
O cirurgião-dentista deve evitar atendimento
medicamentos utilizados pelo paciente. Já nos casos
prolongado e para reduzir a ansiedade destes
160

pacientes, dar preferência a consultas curtas no Tabela 9.3 Medicamentos

meio da manhã.

Em caso de necessidade de jejum longo, ou


redução na ingestão alimentar após o procedimento,
poderá ser necessária a redução ou a omissão de
doses dos hipoglicemiantes orais ou da insulina
(consultar o médico para verificar a necessidade de
alterações na medicação habitual do paciente).

Diabéticos mal controlados possuem maior


risco de desenvolver infecções, sendo necessária a
prescrição de profilaxia antibiótica no pré e no pós- Relato de caso
operatório. Além disso, é necessário estar atento,
pois a hiperglicemia tende a produzir um aumento Paciente do sexo feminino, 64 anos,

no sangramento pós-operatório, devido a uma diabética, compareceu ao consultório com queixas

dissolução excessiva do coágulo. de dificuldade na mastigação. Diante da


necessidade da realização de implantes, foram
A pressão arterial deve ser monitorada,
solicitados exames para checagem dos níveis de
visto que pacientes diabéticos possuem um maior
glicose sanguínea. O histórico do exame sanguíneo
risco de desenvolver hipertensão. 22, 31
revelava níveis anteriores elevados de glicose que
É indispensável estar atento aos foram controlados para a realização do
medicamentos que podem ser prescritos a estes procedimento.
pacientes, como os listados na Tabela 9.4. 32
161

Após 8 meses do levantamento de seio denominadas de axônios) assim como as próprias


bilateral da maxila, foram instalados implantes para fibras nervosas e as células especializadas que
protocolo superior e inferior. produzem a mielina. Os axônios são responsáveis
por conduzir os impulsos elétricos do sistema
nervoso central para o corpo e vice-versa. Dessa
forma, no caso da EM, as mensagens dentro do SNC
são alteradas ou interrompidas.

A remielinização é um processo de reparo


que ocorre nas fases iniciais da doença. Vários
Figura 9. 3 A imagem mostra uma radiografia panorâmica ataques repetidos desencadeiam episódios de
da paciente após a realização dos implantes.
remielinização menos eficazes, já que os
Esclerose Múltipla oligodendrócitos são incapazes de reconstruir
completamente a bainha de mielina da célula. Esse
O número estimado de pessoas com
processo resulta em uma placa semelhante a uma
Esclerose Múltipla (EM) em todo o mundo
cicatriz que se forma ao redor dos axônios
aumentou para 2,8 milhões em 2020, em
danificados. Essas áreas com tecido cicatricial
comparação com a estimativa 30% menor de 2013,
explicam o nome da doença (áreas múltiplas de
segundo o Atlas da Federação Internacional de
33
cicatrizes ou esclerose múltipla). 36, 37
Esclerose Múltipla. Em relação ao Brasil, os
dados epidemiológicos mostram uma prevalência
em torno de 15 casos por cada um milhão de
34
habitantes. Além disso, as mulheres têm duas
vezes mais probabilidade de ter EM do que os
homens e a maioria dos pacientes apresentam a
33
Figura 9.4 A esquerda temos um neurônio com mielina íntegra
doença no início da vida adulta. Porém, nos e a direita um neurônio desmielinizado, processo
característico de um paciente com EM. Imagem obtida através
últimos anos, houve um aumento da apresentação da plataforma de desing gráfico - Canva.
na infância. 35
Etiologia
A EM é uma doença inflamatória crônica
As causas da doença ainda não estão
que envolve um processo imunomediado, onde uma
completamente definidas. Porém alguns fatores
resposta anormal do sistema imunológico acaba
contribuem para o seu desenvolvimento:
sendo direcionada contra o sistema nervoso central
que é composto pelo cérebro, medula espinhal, além  Fatores genéticos (predisposição) com genes já
de nervos ópticos. Dentro do SNC, o sistema identificados;
imunológico causa inflamação, danificando a  Fatores ambientais: infecção pelo vírus Epstein
mielina (que é a substância gordurosa que envolve Barr, luz solar (baixos níveis de vitamina D),
e isola as fibras nervosas dos neurônios, obesidade no início da vida e tabagismo. 35
162

Sintomas, possíveis complicações e Espasticidade


formas clínicas É a rigidez de um membro ao movimentar-
Com a mielina e os axônios lesionados se (principalmente dos inferiores), devido ao
pelas inflamações, as funções coordenadas pelo comprometimento do sistema nervoso, que afeta os
cérebro, cerebelo, tronco encefálico e medula movimentos musculares. 39
espinhal ficam comprometidas, fazendo com que
Parestesia
surjam os sintomas típicos da doença, que podem se
É uma sensação de queimação ou
apresentar como mudanças na sensação,
formigamento em partes do corpo. 39
mobilidade, equilíbrio, função esfincteriana, visão e
cognição. 38 Transtornos Cognitivos
As funções cognitivas comprometidas mais
Sintomas e complicações mais comuns
frequentemente são o processamento da memória e
Fadiga a execução de tarefas. Desse modo, os indivíduos
A fadiga é um sintoma muito comum da levam mais tempo para memorizar as tarefas e
esclerose múltipla e se apresenta como uma possuem uma maior dificuldade para executá-las. 39
sensação de cansaço intenso e momentaneamente
Transtornos Emocionais
incapacitante. Geralmente ocorre após exposição ao
calor ou realização de um esforço físico que seja Podem ocorrer sintomas de depressão,

intenso. 39 ansiedade, humor, irritação, bem como transtorno


bipolar. 39
Alterações fonoaudiológicas
Sexualidade
São alterações em relação à fala e
deglutição, provocando sintomas como fala Disfunção erétil nos homens, diminuição de

lentificada, palavras arrastadas, voz trêmula, lubrificação vaginal nas mulheres, e

disartrias, pronúncia hesitante das palavras, além de comprometimento da sensibilidade do períneo

certa dificuldade para engolir. 39 (região da genitália). 39

Transtornos Visuais Função esfincteriana

Neurite óptica, escotoma, visão embaçada e Dificuldade de controle da bexiga (como

visão dupla (diplopia). 39 retenção ou perda de urina) e também do intestino;

Problemas de Equilíbrio e Coordenação Sintoma de Lhermitte

Pode ocorrer perda de equilíbrio, tremores, É uma sensação elétrica descendo pela

instabilidade ao caminhar (ataxia), vertigens e coluna ou membros na flexão do pescoço e o

náuseas, falta de coordenação, debilidade (nas fenômeno Uhthoff, que é a piora transitória dos

pernas e ao caminhar), além de fraqueza. 39 sintomas e sinais quando a temperatura corporal


central aumenta, como após o exercício ou um
163

banho quente, são características clínicas típicas da


Exames para diagnóstico
35
doença.
Para que seja acelerado o diagnóstico da

Formas clínicas da EM relacionadas ao doença e diminuída a chance de erros, podem ser


utilizados os critérios de McDonald de 2017. Não
curso da doença
existe um teste único que determine se o indivíduo
Síndrome clinicamente isolada (CIS)
Definida como o primeiro episódio de possui Esclerose Múltipla, dessa forma, o processo
sintomas neurológicos (um episódio agudo) que de diagnóstico envolve: evidências por meio de
uma pessoa sente, com duração de pelo menos 24 exame clínico, histórico médico, testes de
horas. Um paciente é classificado assim, quando há laboratório, imagens de ressonância magnética do
evidência clínica de uma única exacerbação e a cérebro e por vezes, da medula espinhal (quando
ressonância magnética não atende totalmente aos dados adicionais são necessários para confirmar o
critérios de EMRR. 40, 41 diagnóstico).

Remitente-recorrente (EMRR) Esses testes têm como objetivo descartar

A grande maioria dos pacientes com EM outras possíveis causas de sintomas neurológicos e

segue esse curso inicialmente, definido por coletar dados consistentes com EM. Um princípio

exacerbações agudas (recaída/ataque) das quais eles fundamental para o diagnóstico é descobrir

se recuperam completamente ou incompletamente, evidências que demonstrem lesões no sistema

com períodos de relativa estabilidade clínica entre


eles (a doença pode ficar inativa por meses ou anos).
40, 41

Secundária progressiva (EMSP)


Fase secundária da EM recorrente, que
pode se desenvolver anos ou décadas após o
diagnóstico de EM recorrente. A maioria das
pessoas com EM recorrente fará a transição para
EMSP, ocorrendo, nessa fase, piora progressiva dos Figura 9.5 A figura mostra lesões típicas (apontadas com
setas) de esclerose múltipla no cérebro e medula espinhal.
sintomas ao longo do tempo, sem períodos
As varreduras axiais de ressonância magnética do cérebro
definidos de remissão (controle). 40, 41
mostram múltiplas lesões periventriculares (A) com
aumento de contraste de uma lesão (B), lesões
Primária progressiva (EMPP)
justacorticais (C), e lesões infratentorial (D). Varredura
10 a 15% das pessoas com EM apresentam sagital (E, F) e axial (G, H) com lesão da medula espinhal
essa forma clínica. Elas apresentam declínio cervical mostrando realce pelo contraste em F e H.
progressivo à função neurológica desde o início da Brownlee WJ, Hardy TA, Fazekas F, Miller DH. Diagnosis
of multiple sclerosis: progress and challenges.
doença, em vez de ataques repentinos ou recaídas
2017;389(10076):1336–46. Available from:
seguidas de recuperação. 40, 41
http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(16)30959-X.
164

nervoso central (composto por cérebro e medula Em relação à cárie dentária, estudos
espinhal) mostrando "disseminação no espaço" identificaram uma maior prevalência nestes
(DIS - sugestões de danos em mais de um ponto no indivíduos, bem como um aumento de disfunções
sistema nervoso) e “disseminação no tempo” (DIT temporomandibulares e de patologias orofaciais,
– sugestões que o dano ocorreu mais de uma vez). como neuralgia do trigêmeo, dormência facial e
Além disso, o exame de coleta de líquor - paralisia facial. 43
LCR (líquido cefalorraquidiano) pode ser utilizado
como parte do processo de diagnóstico. A pesquisa Tratamento odontológico
das bandas oligoclonais (BOC) no líquor e sua
A atenção especial e a cooperação
interpretação é uma etapa importante na
interdisciplinar são fundamentais nos tratamentos
42
investigação das doenças desmielinizantes.
odontológicos, com o intuito de melhorar o estado
de saúde geral e dental dos pacientes com esclerose
Alterações e complicações bucais
múltipla. 45
Pacientes com EM possuem maior
Recomendações e considerações quanto ao atendimento
propensão em desenvolver problemas de saúde oral
odontológico
em decorrência da medicação utilizada,
Pacientes com EM apresentam algumas
dificuldades motoras e a progressão da doença em
limitações, portanto não só o espaço do consultório,
si. Diante disso, executar cuidados eficazes como a
mas também o atendimento devem ser adaptados.
escovação torna-se mais desafiador, visto que a
As clínicas odontológicas devem ser projetadas
redução da força muscular/manual, destreza e
para acomodar cadeiras de rodas, já que essa e
anormalidades motoras são sintomas comuns da
muitas outras doenças afetam os movimentos
doença. Também, há dificuldade de acesso à
musculares.
cuidados bucais de rotina devido à fadiga e
43 É importante o cirurgião-dentista conhecer
limitações de mobilidade. Além disso, a
os sinais e sintomas da doença e em caso de
depressão, que é um dos sintomas da EM, diminui
suspeita, encaminhar ao neurologista. Se o paciente
a motivação para o autocuidado. 44
já tiver diagnóstico, é fundamental o diálogo com o
Uma das alterações conhecidas é a doença médico assistente sobre considerações do
periodontal, que possui uma origem inflamatória tratamento.
assim como a esclerose múltipla, o que pode
Deve-se considerar o uso de sedação /
explicar a ligação entre elas. Somado a isso, a perda
anestesia geral em pacientes com sintomas
de coordenação muscular resulta em maior
neurológicos significativos ou ansiedade. Além
dificuldade em manter uma higiene bucal adequada,
disso, o momento ideal para tratar esses pacientes é
e assim, pacientes comprometidos fisicamente
durante o período de remissão, pois os sintomas
podem ser suscetíveis ao acúmulo de placa.
neurológicos são mínimos e os pacientes podem
estar em sua melhor saúde física e psicológica.
165

Em relação às consultas, a duração deve escova de dente, podem ser utilizados dispositivos
ser menor e de preferência pelo período da manhã, confeccionados pelo próprio dentista, que facilitem
já que é o horário em que os pacientes se encontram a escovação. 45
mais relaxados. 45
Dispositivos que podem auxiliar na higiene bucal
Para um melhor atendimento, são listadas
 Empunhadura com adaptador feito de manopla
algumas estratégias que visam aliviar o desconforto,
de bicicleta e silicona de condensação;
como:
 Escovas modificadas com o uso de silicona de
 O uso apoios de boca para minimizar a tensão condensação, resina acrílica ativada
nos músculos mastigatórios; quimicamente e massa époxi;
 Evitar a posição supina (decúbito dorsal), pois  Alça na escova de dentes para facilitar a pegada;
há risco de aspiração pulmonar de materiais /  Uma bola de tênis;
instrumentos;  Escova envolta com sugadores ou abaixadores
 Manter a temperatura do ambiente confortável de língua seguido de fita isolante;
para minimizar a intolerância ao calor;  Escova de cabo adaptado com EVA;
 Fornecer instruções escritas e orais para o  Ainda, pode ser útil a utilização de escovas de
paciente e seu acompanhante; dente elétricas. Em indivíduos com níveis
 Permitir pausas durante a consulta para ajudar a elevados de deficiência, o cuidador ou
relaxar os músculos faciais do paciente e responsável pode manter a higiene bucal (o
permitir a micção frequente e necessária; dentista deve repassar instruções). 47
 A clorexidina pode ser usada antes do tratamento
O hábito de usar fio dental à noite deve ser
para reduzir a microbiota bacteriana na cavidade
reforçado, pois elimina a chance de multiplicação
oral;
bacteriana durante o sono do paciente. Se
 Na presença de xerostomia, o aconselhamento
necessário, pode ser realizado com suportes
dietético pode ser feito para aumentar o fluxo
vendidos separadamente ou com fios que vêm com
salivar;
seus próprios suportes descartáveis para facilitar o
 O profissional deve estar ciente da interação
processo. É importante a motivação, garantia verbal
potencial de medicamentos usados na EM e os
e apoio durante toda a fase de tratamento do
comumente prescritos em tratamentos
paciente. 45
odontológicos. 46, 45

Instruções de higiene bucal Medicamentos


Os cuidados diários podem ser Não há cura para a esclerose múltipla.
modificados de acordo com o estado físico do Diante disso, o tratamento tem como foco reduzir as
paciente. Pode ser recomendado que a pessoa taxas de recidiva, prevenir ou reduzir a
escove os dentes sentada, a fim de prevenir o incapacidade, fornecer tratamento sintomático de
cansaço. Em caso de dificuldade em segurar a déficits neurológicos fixos, além de manter a
166

qualidade de vida. É importante notar que muitos lesões, principalmente quando utilizadas no início
dos medicamentos causam efeitos colaterais, da doença. 44
inclusive relacionados à cavidade oral. 46, 44
Terapia sintomática destinada a reduzir os
Medicamentos utilizados na EM sintomas da Esclero se múltipla:
Medicamen tos para o controle Tabela 9.4Medicamentos e os possíveis efeitos colaterais

dos sintomas em cri ses agudas ou recidivas:

Tabela 9.5 Em casos em que a doença apresenta fases


agudas e mais frequentes.

Terapias Modi ficadoras da Doença (DMTs):

São empregados agentes


imunomoduladores direcionados contra o
componente inflamatório do processo da doença Síndrome de Sjögren
para prevenir ou reduzir a atividade biológica da
A síndrome de Sjögren (SS) é uma doença
esclerose múltipla. Eles estão sendo desenvolvidos
que acomete, principalmente, as glândulas lacrimais
para prevenir a formação e progressão de novas
e salivares. Estas glândulas sofrem uma infiltração
de linfócitos de modo crônico, desencadeando um
Tabela 9.6 DTMs e possíveis efeitos colaterais.
processo inflamatório que reduz a função destas
células secretoras presentes na glândula podendo
48
até destruí-las. Esta destruição leva à atrofia do
tecido glandular, refletindo nos principais sintomas,
que são característicos desta doença, como o
ressecamento das superfícies mucosas do olho e da
boca. Isso ocorre pois o muco não é produzido, e
dessa forma, impede a lubrificação destas regiões.
Outras regiões podem ser acometidas como: pele,
49,
nariz e vagina, causando também ressecamento.
50

No Brasil não se sabe quantos indivíduos


são portadores desta comorbidade, entretanto
estima-se que no mundo há 3.1 milhões de adultos
167

que apresentam a Síndrome de Sjögren, tornando-a


Sintomas característicos
uma doença autoimune de caráter prevalente na
 Ressecamento excessivo dos olhos,
população. A SS pode ser caracterizada como uma
frequentemente acompanhado de irritação
doença autoimune reumática de caráter crônico e
48
ocular, ardor, dor, ulceração da córnea,
sistêmico. Ela apresenta maior prevalência em
infecções e sensação de corpo estranho; 48
mulheres do que homens, atingindo a proporção de
 Ressecamento excessivo da boca, conhecido
9:1, e seus sintomas surgem geralmente, aos 50
clinicamente como xerostomia, associado à
anos de idade, podendo ocorrer em todas as faixas
50
queimação, lábios secos, alteração no paladar,
etárias. Ela é classificada em primária e
podendo também apresentar dificuldade na fala,
secundária, apresentando outros sintomas comuns,
deglutição e o uso de dentaduras; 48, 55
como o aumento das glândulas presentes na face,
 Língua fissurada; 48
mandíbula e pescoço, refluxo ácido, fadiga,
 Halitose; 48
artralgias e artrites.
 Ressecamento, podendo também ocorrer em

Etiologia outras regiões como: vagina, pele e nariz; 48


 Fadiga;
A etiologia ainda é desconhecida, mas sabe-
 Problemas neurológicos, como perda de
se que portadores de SS apresentam níveis anormais
memória, dificuldade de concentração, dores de
de proteínas no sangue (protenúria).
cabeça, disautonomia; 56
Fatores imunológicos, inflamatórios,  Vasculite e linfomas. 51, 57, 58
genéticos, epigenéticos, ambientais, hormonais e
Exames para diagnóstico
infecciosos podem estar correlacionados a esta
Os sintomas de ressecamento podem ser
patogênese. 49-52
sinais oriundos de medicamentos, condições
Classificação temporais e/ou outros problemas. Portanto, é
A Síndrome de Sjögren é subdividida em: necessária uma avaliação criteriosa e comprovação
por meio de exames, diagnosticando corretamente o
Primária
quadro de SS e buscando evidências de inflamação
Quando não há doença pré-extistente
induzida por doença autoimune direcionada às
reumetológica. 53, 54
glândulas salivares ou lacrimais. A principal
Secundária referência nos critérios de classificação é a ACR/
Doença autoimune sistêmica pré- EULAR (arquivo 2012 ACR Sjogren). 48, 51, 53, 59
existente ao diagnóstico como artrite reumatóide,
Testes mais recomendados
lúpus eritematoso sistêmico, cirrose biliar primária,
esclerodermia entre outras. Essa forma acomete Teste de Sc himmer:

50% dos sindrômicos. 53, 54 Neste teste, tiras padronizadas são


posicionadas na mucosa conjuntival das pálpebras
inferiores, realizando a medição de secreção
168

lacrimal produzida em cinco minutos de olhos se o uso da triagem e perguntas incluídas nos
fechados. O teste possui medição padrão, portanto, critérios de classificação ACR/EULAR.
se houver indicação de 5mm ou menos, isto
significa secura ocular significativa. Este exame é Complicações da Síndrome
realizado por médicos oftalmologistas ou A síndrome de Sjögren apresenta inúmeras
reumatologistas e não é indicado para idosos, complicações no âmbito clínico podendo ser de
porque os níveis de secreção da mucosa orbicular caráter mais severo como danos na córnea, extensa
são reduzidos normalmente com a idade. lesão cariosa nos dentes, secura da pele e na região
vaginal excessiva. 57, 60
Teste sa livar:
Complicações orais mais comuns entre pacientes com SS
É realizado um teste de saliva não  Fissuras dolorosas na língua;
estimulada, onde o paciente necessita realizar a  Úlceras da mucosa;
transferência da saliva produzida em meio bucal  Dor quando houver ingestão de alimentos ácidos
para um recipiente com medição durante 15 e picantes;
minutos. Os valores de referência para números  Candidose.
característicos de SS são 1,5ml ou menos.

Biópsia da glâ ndula sal ivar menor: Alterações e complicações bucais


Com esta biopsia pode-se verificar a Os pacientes com SS apresentam nítidas

invasão dos linfócitos nas glândulas. mudanças na cavidade oral. A língua destes
pacientes é caracteristicamente fissurada, por
Exames de imagem:
consequência da deficiência na produção salivar
Observa-se o infiltrado das células linfocíticas nas que causa a alteração de pH e capacidade de
glândulas. São utilizados os exames de tamponamento. Isso prejudica estruturas que
ultrassonografia, ressonância magnética ou necessitam frequentemente de lubrificação, como
tomografia computadorizada. por exemplo, a língua. A mucosa em torno da
cavidade oral também sofre com esse ambiente
Exame de sangue:
escasso, em alguns casos os pacientes apresentam
Anticorpos anti-SSA e anti-SSB (sendo úlceras na mucosa bucal.
este não recomendado isolado para o diagnóstico, Nestas condições, a cavidade oral, aliada a
pois outras patologias podem apresentar este uma dieta cariogênica e pobre em higiene, resulta
anticorpo). em um ambiente propício ao desenvolvimento de
cárie. Sabe-se que indivíduos com SS apresentam
É importante destacar que o diagnóstico da
maior número de microorganismos cariogênicos e
SS deve ser realizado com a somatória de
que quando desenvolvem a cárie, ela surge em
sintomatologia aliada a exames, sendo necessário
lugares menos propensos como superfície
geralmente o mínimo de dois exames. Recomenda-
vestibular e dentes anteriores. Sua maior
169

susceptibilidade à doença cárie tem correlação Tratamento da Candidose


direta com os índices de CPOD, isto pode causar um O tratamento tópico é o mais indicado
aumento nos casos de edentulismo parcial ou total, porque permite que a droga utilizada entre em
levando a necessidade de reabilitações protéticas, contato com a superfície em um período suficiente
incluindo próteses moveis. Porém, indivíduos com para controlar e eliminar a Candida Albicans. 56 O
SS apresentam rejeição maior ao uso delas devido à medicamento pode ser em gel, creme, pomada ou
xerostomia, que atrapalha a sua retenção, e o seu via oral contendo nistatina, clotrimazol e miconazol
uso pode acarretar lesões traumáticas. com indicação de uso por períodos de semanas ou
Pacientes com SS apresentam quadros meses, além disso, o bochecho com clorexidina
mais comuns de inflamação gengival (gengivite) e pode auxiliar. Em pacientes com xerostomia
edemas, podendo inclusive desenvolver excessiva é recomendada a prescrição de
periodontite. A perda salivar implica em um maior medicamentos mais líquidos (pomadas, gel ou
acúmulo de placa e, como consequência, no creme). 56
O cirurgião dentista deve alertar para o
desenvolvimento de cálculo dental. Aftas também possível retorno da candidose, sendo nesses casos,
são bem comuns nesses indivíduos, podendo gerar sugerido a terapia de manutenção com uma dose
um quadro de ardência e queimação. Com a diária de antifúngico, já que a reincidência da
cavidade bucal desprotegida, sem mecanismos de candidose é maior em pacientes com uso de prótese
defesa contidos na saliva, o meio bucal torna-se e dentadura.
favorável à proliferação da Candida Albicans, Tratamento da cárie
causadora da Candidose. 49, 54, 56, 61 A lesão de cárie ativa deve ser removida e
Tratamento odontológico restaurada temporariamente utilizando ionômero de

O tratamento odontológico consiste no vidro. Além disso, o tratamento da lesão cariosa

reparo dos danos causados pela SS e no alívio dos deve ser associado a instruções de higiene bucal

sintomas ocasionados pela patologia autoimune, visando o combate e prevenção em relação ao

auxiliando na fala e paladar, defesa da cavidade surgimento de novas lesões.

oral, lubrificação, entre outros. 48-51, 55-57 Uso de Dentaduras


Orientações gerais O uso de próteses totais não é

É importante orientar que o paciente recomendado nestes pacientes. A prótese pode se

realize a escovação de 2 a 3 vezes ao dia com deslocar na cavidade oral, resultando em

dentifrício fluoretado, que mantenha hábitos escoriações, úlceras e regiões com irritações,

dietéticos menos cariogênicos e ricos em líquidos. causando experiências desagradáveis e dolorosas

Além disso, o acompanhamento mais frequente ao para o paciente.

dentista se faz necessário (com intervalo de 2 a 3 Tratamento da xerostomia


meses). Para o tratamento da xerostomia é
importante realizar o consumo adequado de água e
evitar contato com substâncias irritantes contidas no
170

álcool, café e cigarro. 62 O tratamento mais sugerido devido ao quadro sintomatológico, não são
é o de estimulação ácida, porém pode ser dolorosa recomendados no tratamento o uso de drogas
e desconfortável ao paciente, podendo aumentar a xerogênicas. 48-51, 56

desmineralização do dente. Em pacientes que ainda


Tabela 9.5 Medicamentos e recomendações
apresentam tecido salivar remanescente,
recomenda-se o uso da goma de mascar sem açúcar.
49
Outros tipos de estimulação são o cloridrato de
pilocarpina e/ou cevimelina e pastilhas de maltose.
48, 50

Em pacientes dentados podem ser


utilizados os substitutos da saliva com pH 6,0
contendo flúor. Para os edêntulos, recomenda-se
substitutos salivares com pH 5,5 e sem flúor.
Outros métodos têm sido testados como
pastilhas de mucina, enxaguatórios orais e cremes
dentais que contêm proteínas salivares, acupuntura Relato de Caso
e eletroestimulação, entretanto possuem um custo Paciente do sexo feminino, 51 anos,
elevado. 54 diagnosticada com Síndrome de Sjögren devido à
presença de múltiplas mineralizações focais em
Exame oral e anamnese
Na avaliação oral, é importante atentar-se ao
seguintes sintomas: 48, 63
 Sinais de aumento glandular;
 Presença de nódulos ou massas discretas;
 Notar se a saliva se acumula sob a língua em um
período de 1 minuto;
 Atentar-se se a língua apresenta fissuras
profundas, aspecto hiperlobulado ou ausência de
papilas filiformes em sua superfície;
 Utilizar a escala de Challacombe usada para
identificar e classificar a gravidade da
xerostomia.

Medicamentos
Figura 9.6 Cortes axiais de TC multidetector, janela de
Atualmente, o tratamento da SS é partes moles, de cranial para caudal, mostrando múltiplas
calcificações puntiformes na parótida do lado direito e
realizado para amenizar os sintomas decorrentes da esquerdo (setas), que se apresentam hipotróficas, de uma
paciente com tireoidite de Hashimoto (condição autoimune).
patologia, entretanto, nenhum demonstra redução Imagens cedidas gentilmente pelo Prof. Fernando Henrique
na infiltração dos tecidos por linfócitos. Além disso, Westphalen e Prof. Paulo Sergio Flores Campos.
171

ambas as parótidas e por ser portadora de outra Foi durante o período da Segunda Guerra
doença autoimune (Tireoidite de Hashimoto). Mundial que se associou os efeitos negativos de
certos tipos de cereais à doença celíaca. Neste
Doença Celíaca período, Dicke, um pediatra holandês, observou que
durante período de racionamento de trigo na
Caracterizada como uma doença segunda Guerra Mundial, a incidência da doença
inflamatória imunomediada crônica, a Doença havia diminuído muito. Posteriormente, quando os
Celíaca é uma intolerância permanente ao glúten, aviões suecos trouxeram pão para a Holanda, as
com atrofia total ou subtotal das vilosidades da crianças com doença celíaca voltaram rapidamente
mucosa do intestino delgado proximal e a apresentar sintomas, confirmando a influência do
consequente, má absorção de alimentos, em trigo na gênese da doença. 64
64, 65
indivíduos geneticamente suscetíveis. Segundo a Federação Nacional das
O glúten, que é o principal fator ambiental Associações de Celíacos do Brasil
responsável pelo desenvolvimento da doença, é (FENACELBRA), a doença celíaca tem uma
uma proteína que está presente no trigo, centeio, prevalência de aproximadamente 1% na população
cevada e aveia. Os fragmentos polipeptídicos do mundial, sendo que no Brasil, afeta em torno de 2
glúten são denominados de prolaminas, que milhões de pessoas (a maioria delas ainda estão sem
representam 50% da quantidade total do glúten e diagnostico). Além disso, a frequência maior é em
diferem de acordo com o tipo de cereal: gliadina no pacientes do sexo feminino. 68, 69
trigo, secalina no centeio, hordeína na cevada e
Etiologia
avenina na aveia. Enquanto a avenina raramente
desencadeia a doença, gliadinas, hordeína e Acredita-se que a doença surja da interação de:
Fatores genéticos
secalinas contêm alto conteúdo de prolinas e
glutaminas, o que as torna resistentes à degradação A doença celíaca tem um forte
por ácido gástrico, enzimas pancreáticas e de borda componente hereditário. Os fatores de

em escova, porque falta atividade da enzima prolil suscetibilidade genética mais fortes e mais bem

endopeptidase. caracterizados na doença são os genes do antígeno

Dessa forma, apesar de o glúten ser leucocitário humano (HLA) de classe II, que estão

preferido na panificação por sua elasticidade, é localizados no cromossomo 6 e são conhecidos

digerido de forma incompleta, e os grandes como HLA-DQ2 e HLA-DQ8, moléculas

peptídeos que não foram digeridos entram na responsáveis pela apresentação de antígenos às

lâmina própria do intestino delgado onde, em células do sistema imunológico. 67

indivíduos afetados, uma reação imune adaptativa Fatores ambientais


ocorre. Ou seja, o sistema imunológico destrói a Entre eles, o principal gatilho da doença é
mucosa intestinal após o contato com o glúten. 64, 66- a ingestão de glúten. Mas existem outros fatores que
68 são estudados, como a influência da microbiota
(tanto comensal quanto patogênica) na doença, bem
172

como infecções infantis (especialmente rotavirus), diarreia com desidratação hipotônica grave,
introdução de glúten em bebês, amamentação e distensão abdominal por hipopotassemia e
modo de parto (cesariana), embora precise de desnutrição grave, além de outras manifestações,
67
maiores evidências. como hemorragia e tetania. 69, 72
Fatores imuno lógicos
Forma não clássica
A desregulação imunológica é uma
Caracterizada por quadro mono ou
característica central da patogênese da doença.
oligossintomático, em que as manifestações
Tanto a resposta imune inata (efeito tóxico direto do
digestivas estão ausentes ou, caso estejam
glúten no epitélio) quanto as respostas imunes
presentes, ocupam um segundo plano. Os pacientes
adaptativas (envolvendo células T CD4 + na lâmina
podem apresentar manifestações isoladas, como
própria ou tecido subjacente) parecem ser
baixa estatura, anemia por deficiência de ferro
responsáveis pelo dano histológico que ocorre na
refratária à reposição de ferro por via oral, anemia
mucosa do intestino. 67, 70
por deficiência de folato e vitamina B12,
Formas clínicas e sintomas osteoporose, hipoplasia do esmalte dentário,
Existem três formas de apresentação artralgias ou artrites, constipação intestinal
clínica da doença celíaca: clássica, não clássica (que refratária ao tratamento, atraso puberal,
são formas sintomáticas) ou assintomática. O início irregularidade do ciclo menstrual, esterilidade,
da doença ocorre em qualquer idade em que haja abortos de repetição, ataxia, epilepsia (isolada ou
exposição ao glúten, e a apresentação pode variar associada à calcificação cerebral), neuropatia
dependendo da idade. 71 periférica, miopatia, manifestações psiquiátricas

Forma clássica (depressão, autismo, esquizofrenia), úlcera aftosa

É resultante da atrofia das vilosidades no recorrente, elevação das enzimas hepáticas sem

intestino delgado, levando à má absorção. Essa causa aparente, adinamia, perda de peso sem causa

forma clínica é caracterizada pela presença de aparente, edema de surgimento abrupto após

diarreia crônica, geralmente acompanhada de infecção ou cirurgia e dispepsia não ulcerosa. 69, 72

distensão abdominal e perda de peso. Também pode Forma assintomática ou silenciosa


ocorrer diminuição do tecido celular subcutâneo, Caracteriza-se por alterações sorológicas e
atrofia da musculatura glútea, falta de apetite, histológicas da mucosa do intestino delgado
alteração de humor (irritabilidade ou apatia), compatíveis com a doença, mas com ausência de
vômitos e anemia. Esta forma clínica pode ter manifestações clínicas. Isso pode ser comprovado
evolução grave, conhecida como crise celíaca, que especialmente entre grupos de risco para a DC,
ocorre quando há retardo no diagnóstico e no como, por exemplo, parentes em primeiro grau de
tratamento adequado, particularmente entre o pacientes celíacos, e tem sido mais reconhecida
primeiro e o segundo ano de vida, sendo muitas após o desenvolvimento dos marcadores
vezes desencadeada por infecção. Nesta sorológicos para a doença.
complicação (que pode ser fatal) pode ocorrer
173

É importante notar que dermatite  Síndrome de Turner. 66


herpetiforme, considerada uma doença celíaca da Para o diagnóstico de Doença celíaca em
pele, que se apresenta com lesões cutâneas do tipo adultos, é necessário um teste de sorologia e
bolhoso e intensamente pruriginoso, também é amostra de biópsia duodenal, idealmente com o
relacionada com intolerância permanente ao glúten. paciente em uma dieta normal, ou seja, contendo
69 73,
glúten (mínimo de 10g por dia por 6 semanas).
66
As exceções são pacientes com distúrbios de
Exames para diagnóstico
Casos em que o teste celíaco é recomendado coagulação e mulheres grávidas, nas quais biópsia
O teste celíaco é recomendado quando o pode não ser viável ou deve ser adiado até o pós-
paciente apresenta a soma de um ou mais dos parto. 73
sintomas listados abaixo: Testes sorológicos
 Sintomas abdominais ou gastrointestinais Estes testes representam os marcadores
inexplicáveis e persistentes; imunológicos de atividade da doença. A solorologia
 Crescimento vacilante; positiva indica que o paciente possui doença
 Fadiga prolongada; celíaca. 64
 Perda de peso inesperada; Levando em conta precisão, confiabilidade
 Úlceras bucais graves ou persistentes; e custo, o anticorpo IgA para tecido humano
 Deficiência inexplicável de ferro, vitamina B12 recombinante transglutaminase (TTG) é
ou folato; recomendada para o teste inicial para doença celíaca
 Diabetes tipo 1; (IgA-TTG). Já a medição de anticorpo IgA para
 Doença autoimune da tireoide; endomísio (EMA), apesar de ser tão preciso quanto
 Síndrome do intestino irritável; IgA-TTG, é mais sujeito a erro de interpretação e
 Parentes de primeiro grau de pessoas com possui custo adicional. Por causa da precisão
66
doença celíaca. inferior do testes de anticorpos antigliadina (AGA),
Casos em que o teste celíaco é considerado o uso de AGA IgA e os testes AGA IgG não são
Algumas condições podem ter correlação com a mais recomendados. 74
doença celíaca. Nestes casos, o teste celíaco pode Contudo, se IgA-TTG para fracamente
ser considerado: positivo (em comparação com o limiar laboratorial
 Doenças ósseas metabólicas (densidade óssea normal), a concentração de EMA, que tem uma alta
reduzida mineral ou osteomalacia); especificidade (95%), também deve ser testado
 Sintomas neurológicos inexplicáveis (apesar do teste ser caro e trabalhoso).
(neuropatia periférica ou ataxia); Ao testar para doença celíaca em crianças
 Subfertilidade inexplicada ou aborto recorrente; com sintomas suspeitos, medir IgA sérica
 Concentrações persistentemente aumentadas de quantitativa pode facilitar a interpretação quando o
enzimas hepáticas com causa desconhecida; TTG IgA está baixo.
 Defeitos do esmalte dentário;
 Síndrome de Down;
174

Em indivíduos com conhecida deficiência dobras ou recorte das dobras no duodeno


seletiva de IgA e sintomas sugestivos da doença, o descendente podem ser observadas. 66
teste com TTG IgG é recomendado. No entanto, no exame, o duodeno pode
Achados sorológicos negativos não parecer normal e, além disso, uma resposta clínica
excluem a doença celíaca com 100% de precisão, positiva a uma dieta sem glúten por si só não
devido à possibilidade de doença celíaca confere um diagnóstico de doença celíaca. Isso
soronegativa. 66 porque esta resposta clínica também pode ser
Biópsia intestinal observada em pacientes com sensibilidade ao glúten
Recomenda-se a confirmação do não celíaco, que é caracterizada por melhora dos
diagnóstico de DC com biópsia intestinal quando os sintomas quando retirado o glúten da dieta (com
testes sorológicos não são suficientes para descartar sorologia celíaca negativa e ausência de atrofia das
uma doença celíaca com alta segurança. Assim, vilosidades, ou seja, sem doença celíaca). Por isso
uma amostra de biópsia duodenal deve ser feita pelo uma amostra de biópsia duodenal confirmatória é
menos 14 dias após o início do desafio de glúten. necessária para que os pacientes sejam
Amostras de biópsia duodenal mostrando aumento corretamente diagnosticados com doença celíaca. 66
intraepitelial de linfócitos, hiperplasia de cripta e Quanto às crianças, a prática pediátrica
atrofia de vilosidades com sorologia celíaca mudou para uma estratégia chamada de prevenção
positiva confirmam o diagnóstico de doença celíaca de biópsia, que recomenda que os pacientes
em adultos. A biópsia é realizada durante a pediátricos sintomáticos não necessitem de
gastroscopia, e anormalidades como perda de amostras de biópsia para confirmar o diagnóstico de

Figura 9.7 Endoscopia de paciente de 61 anos, do sexo masculino, que apresentava dor de estômago e perda de peso. Aos 60 anos, consultou com
gastroenterologista suspeitando de gastrite. Na endoscopia digestiva alta evidenciou, além da gastrite, uma inflamação no duodeno. Foi coletado
material histológico para biópsia e evidenciou-se a doença celíaca. Imagem cedida gentilmente por Renato Antônio Teixeira Lopes.

Figura 9.8 Foi identificada a doença celíaca no paciente devido à atrofia vilosa acentuada, hiperplasia críptica e aumento do infiltrado
linfocítico intraepitelial na porção duodenal. Imagem cedida gentilmente por Renato Antônio Teixeira Lopes.
175

doença celíaca se tiverem concentrações de TTG 10 silenciosa e, se não tratada, mais tarde pode levar a
vezes maiores do que o limite superior normal e complicações, tais como deficiências nutricionais e,
positivo de EMA e a presença do genótipo HLA- até mesmo, malignidade. Por isso é fundamental a
66
DQ2 ou HLA-DQ8. atenção e o conhecimento do cirurgião dentista
sobre os possíveis sintomas e complicações gerais
Complicações gerais da doença celíaca
os relacionados à cavidade oral, por meio da
A doença celíaca pode resultar em
anamnese e do exame intra e extraoral. 77, 78
numerosas complicações, como as nutricionais,
Lesões de tecido mole oral
hematológicas, ósseas, hepáticas, digestivas,
Estomatite Aftosa Recorrente (EAR):
cardiovasculares, complicações relacionadas à
É a condição ulcerativa inflamatória mais
fertilidade, além de algumas neuropatias, doenças
comum da cavidade oral, tornando seu diagnóstico
autoimunes e câncer, como listado na Tabela 9.9. 75,
76 e tratamento um problema comum na prática geral
Tabela 9. 9 Complicações da Doença Celíaca e odontológica. É mais prevalente em crianças com
deficiências nutricionais, imunodeficiências, má
absorção e doença celíaca. Caracteriza-se por
múltiplas úlceras pequenas, redondas ou ovóides
recorrentes com margens circunscritas, halos
eritematosos e pisos amarelos ou cinza, geralmente
apresentando-se pela primeira vez na infância ou
adolescência. Embora não totalmente
compreendidos, existem muitos fatores associados
à sua etiologia, incluindo história familiar positiva,
trauma local, estresse, alterações imunológicas,
desequilíbrio hormonal, hipersensibilidade
alimentar e deficiências nutricionais. Este distúrbio
(que é multifatorial) geralmente se manifesta na
Alterações e complicações bucais mucosa oral não queratinizada e pode causar dor

Alguns estudos mostram uma grande considerável. Alguns autores sugerem que a

prevalência de manifestações orais em pacientes estomatite aftosa recorrente pode ser considerada

com doença celíaca, sendo que as principais são a um sinal das formas atípicas ou silenciosas da DC.

estomatite aftosa recorrente e os defeitos no esmalte Esta patologia oral afeta a alimentação, a fala e a

dentário. Outras alterações também foram deglutição, bem como a escovação dos dentes. 78

identificadas nos pacientes, apesar de algumas Língua Geográfica:


ainda serem controvérsias. Língua geográfica é uma lesão oral
No geral, essas alterações podem auxiliar crônica, inflamatória e imunomediada com
no diagnóstico da doença, que muitas vezes é etiologia desconhecida. A atrofia das papilas
176

filiformes deixa uma área eritematosa com uma várias doenças sistêmicas, os defeitos encontrados
zona periférica elevada branca, amarela ou cinza e em pacientes celíacos são altamente específicos.
padrão irregular da língua. Essa manifestação pode Defeitos específicos do esmalte dentário são
ocorrer secundariamente a uma deficiência de ferro, caracterizados principalmente por corrosão, sulcos
ácido fólico ou vitamina B12, resultante da má e às vezes perda completa de esmalte, e devem ser
absorção intestinal. Estudos mostram que a lesão foi simétricos e cronologicamente detectáveis em todas
encontrada em pacientes celíacos. 78 as quatro seções da dentição.
Glossite atrófica: Os defeitos inespecíficos do esmalte
É um distúrbio inflamatório da mucosa da (descolorações, hipoplasia ou opacidades) não são
língua, que em alguns estudos, foi identificado nos simétricos nem cronológicos e não estão presentes
pacientes com doença celíaca. A língua torna-se lisa nos mesmos dentes de ambas as hemiarcadas. Já os
e com aspecto brilhante com fundo vermelho ou defeitos estruturais do esmalte dentário podem ser
rosa. Essa aparência está ligada à atrofia das papilas diversos e conter hipoplasia (distúrbios funcionais),
filiformes que causa o desenvolvimento de lesões bem como hipomineralização (distúrbios
circinadas do tipo úlcera eritematosa no dorso e na qualitativos). Quanto à etiologia desses defeitos em
borda lateral da língua. Os pacientes podem ter pacientes celíacos, ainda não está claro se as lesões
dificuldades de mastigação, deglutição e ou /fala. 78 orais representam uma manifestação direta de DC

Queilite Angular: ou se ocorrem como resultado dos efeitos indiretos

É uma condição comum que se caracteriza de má absorção. Para uma melhor avaliação, foram

por eritema, ulceração, vermelhidão difusa com classificados os defeitos específicos do esmalte nos

área erodida e crostas nos cantos da boca. Essa graus I-IV de acordo com a gravidade de seu

condição extraoral foi registrada também em aspecto clínico. Estes foram denominados como

pacientes celíacos. 78 defeitos no esmalte “tipo-celíaco”, com a seguinte


classificação: grau 1, defeito na cor do esmalte; grau
Língua ardente:
2, discreto defeito estrutural com sulcos horizontais
A queimação na língua é caracterizada por
típicos; grau 3, defeitos estruturais maiores, com
sensações orais de formigamento, dormência e
sulcos horizontais profundos e grandes fossas
sensação de queimação e dor intensa, associadas a
verticais; grau 4, defeito estrutural severo, no qual a
sinais objetivos de eritema e edema de papilas na
forma do dente pode ser modificada. 78, 77
ponta da língua (não ligados a nenhum tipo de
trauma físico). Essa condição também foi verificada Cárie dentária:
nos pacientes com doença celíaca, segundo alguns Ainda há controvérsia, visto que alguns
78
estudos. estudos relataram que a prevalência de cárie na
Lesões de tecido duro oral doença celíaca foi menor em comparação com
Defeitos do esmalte dentário : indivíduos saudáveis (isso pode ser favorecido por
Apesar do comprometimento da uma dieta rígida sem glúten, que é uma proteína que
mineralização das coroas dentárias ocorrer em pode ser encontrada em diversos alimentos
177

cariogênicos), enquanto outros relataram maior medicamentos e suplementos é outra preocupação.


66
prevalência de cárie nesses pacientes (esmalte
hipoplásico, mudanças na composição salivar e uma Portanto, é necessário que pacientes com
baixa taxa de fluxo salivar devido à dieta sem glúten doença celíaca recém-diagnosticada sejam
são possíveis e podem constituir fatores de risco encaminhados a nutricionistas, visto que a dieta sem
para cárie dentária). 78 glúten requer conhecimento não apenas de fontes
Erupção dentária retardada: ocultas de glúten, mas também de grãos substitutos
Apesar de também ter controvérsias, a saudáveis que fornecem fibras e nutrientes
desnutrição prolongada pode ter efeitos adequados. Ademais, devem ser testados para a
irreversíveis na erupção dos dentes. Uma vez que as deficiência de vitaminas. Com o passar dos anos,
crianças com a DC estão recorrentes a perda de peso esses pacientes devem regularmente fazer o
e menor crescimento somático em comparação com acompanhamento dos sintomas e sorologia. 66
crianças saudáveis. 78 Atualmente, há estudos sobre
desenvolvimento de drogas, seja como um
Tratamento da doença celíaca
complemento à dieta sem glúten ou como um
A base do tratamento da doença celíaca
substituto. Drogas em vários estágios de
continua a ser a adesão a uma dieta sem glúten. Com
desenvolvimento e testes usam mecanismos como a
esse tratamento, a melhora e a resolução dos
inativação de peptídeos tóxicos no lúmen intestinal,
sintomas geralmente ocorrem em dias ou semanas e
prevenção da passagem de gliadina para a mucosa,
muitas vezes precede a normalização dos
indução de tolerância imunológica e inativação do
marcadores sorológicos e da atrofia das vilosidades
processo imunológico na lâmina própria. 66
duodenais. No entanto, apesar de ser uma forma
eficaz de tratar os sintomas da doença, aderir a uma Considerações finais
dieta sem glúten apresenta muitas dificuldades. 66 No presente capítulo foram ressaltadas as
Os alimentos sem glúten possuem um principais alterações endócrino-metabólicas e
valor muito mais elevado do que os que contêm, imunológicas, bem como as consequências dessas
dessa forma, pacientes com baixa renda podem doenças na cavidade bucal, com o intuito de
estar em risco particularmente alto de não adesão a capacitar o cirurgião-dentista para tratar estes
esta dieta. Além disso, a exposição potencial ao pacientes. Em vista disso, foram apresentados os
glúten em estabelecimentos como restaurantes e conceitos, etiologia, sintomatologia geral e bucal,
padarias torna-se um perigo, e a incerteza quanto à exames de diagnóstico, complicações, conduta
presença de glúten em pequenas quantidades em odontológica, bem como os medicamentos
utilizados para cada doença.

Referências
1. Goldenberg R, Punthakee Z. Definition, 2. Latti BR, Kalburge J V., Birajdar SB, Latti RG.
Classification and Diagnosis of Diabetes, Prediabetes and Evaluation of relationship between dental caries, diabetes
Metabolic Syndrome. Canadian Journal of Diabetes. 2013 Abr mellitus and oral microbiota in diabetics. J Oral Maxillofac
;37:S8–11. Pathol. 2018; 22(2):282–3.
178

3. Stojanovich L, Marisavljevich D. Stress as a trigger patients with Diabetes Mellitus: a systematic review. Rev
of autoimmune disease. Autoimmun Rev. 2008; 7(3):209–13. Odontol UNESP. 2013; 42(3):211–20.

4. Kapsogeorgou EK, Tzioufas AG. Autoantibodies in 18. Wu Y, Ding Y, Tanaka Y, Zhang W. Risk factors
autoimmune diseases: Clinical and critical evaluation. Isr Med contributing to type 2 diabetes and recent advances in the
Assoc J. 2016; 18(9):519–23. treatment and prevention. Int J Med Sci. 2014; 11(11):1185–
200.
5. Rose NR. Prediction and prevention of autoimmune
disease in the 21st Century: A review and preview. Am J 19. Diabetes DOF. Diagnosis and classification of
Epidemiol. 2016; 183(5):403–6. diabetes mellitus. Diabetes Care. 2010; 33(SUPPL. 1).

6. Mauri-Obradors E, Estrugo-Devesa A, Jané- Salas E, 20. Brasil. Ministério da Saúde. Cadernos de. Vol. 2.
Viñas M, López-López J. Oral manifestations of diabetes 2006. 187 p.
mellitus. A systematic review. Med Oral Patol Oral Cir Bucal.
2017; 22(5):e586–94. 21. Fayfman M, Pasquel FJ, Umpierrez GE.
Management of Hyperglycemic Crises: Diabetic Ketoacidosis
7. Saeedi P, Petersohn I, Salpea P, Malanda B, and Hyperglycemic Hyperosmolar State. Med Clin North Am.
Karuranga S, Unwin N, et al. Global and Regional Diabetes 2017; 101(3):587–606.
Prevalence Estimates for 2019 and Projections for 2030 and
2045: Results from the International Diabetes Federation 22. Terra BG, Goulart RR, Bavaresco CS. O cuidado
Diabetes Atlas, 9th Edition. Diabetes Research and Clinical odontológico do paciente portador de diabetes mellitus tipo 1 e
Practice. 2019 Set; 157(157):107843. 2 na Atenção Primária à Saúde. Rev APS. 2011; 14(2):149–61.

8. Atlas IDFD. International Diabetes Federation. Vol. 23. Seaquist ER, Anderson J, Childs B, Cryer P, Dagogo-
266, The Lancet. 1955. 134–137 p. Jack S, Fish L, et al. Hypoglycemia and diabetes: A report of
aworkgroup of the American diabetes association and the
9. Alves C, Andion J, Brandão M, Menezes R. endocrine society. Diabetes Care. 2013; 36(5):1384–95.
Mecanismos patogênicos da doença periodontal associada ao
diabetes melito. Arq Bras Endocrinol Metabol. 2007; 24. Study C. in Diabetes Mellitus. 2017; 35(8):414– 9.
51(7):1050–7.
25. Sumita NM, Bezerra MGT, Chacra AR, Netto AP,
10. Röder P V., Wu B, Liu Y, Han W. Pancreatic Zajdenverg L, Andriolo A et al. Posicionamento oficial sbd, do
regulation of glucose homeostasis. Exp Mol Med. 2016 Mar; controle glicêmico e para o diagnóstico do diabetes : aspectos
48(3):e219. clinicos e laboratoriais. 2018; 1–36.

11. Johns EC, Denison FC, Norman JE, Reynolds RM. 26. Diabetes WJ. Contents. 2019; 9358(9).
Gestational Diabetes Mellitus: Mechanisms, Treatment, and
27. den Dekker A, Davis FM, Kunkel SL, Gallagher KA.
Complications. Trends Endocrinol Metab [Internet]. 2018;
Targeting epigenetic mechanisms in diabetic wound healing.
29(11):743–54. Available from:
Transl Res. 2019; 204(1):39–50.
http://dx.doi.org/10.1016/j.tem.2018.09.004
28. Lima MH de M, Araujo EP. Diabetes Mellitus E O
12. Cervino G, Terranova A, Briguglio F, De Stefano R,
Processo De Cicatrização Cutânea. Cogitare Enferm. 2013;
Famà F, D’Amico C et al. Diabetes: Oral health related quality
18(1):2012–4.
of life and oral alterations. Biomed Res Int. 2019 Mar 18;
2019:1–14. 29. Kudiyirickal MG, Pappachan JM. Diabetes mellitus
and oral health. Endocrine. 2015;49 (1):27– 34.
13. Gross JL, Silveiro SP, Camargo JL, Reichelt AJ,
Azevedo MJ de. Diabetes Melito: Diagnóstico, Classificação e 30. Fernandes T, Mafra RP, Vasconcelos MG,
Avaliação do Controle Glicêmico. Arq Bras Endocrinol Vasconcelos RG. CONDUTA ODONTOLÓGICA EM
Metabol. 2002; 46(1):16–26. PACIENTES DIABÉTICOS: CONSIDERAÇÕES
CLÍNICAS. 2016 Mar 1; 15(1):1–5.
14. Skamagas M, Breen TL, LeRoith D. Update on
diabetes mellitus: Prevention, treatment, and association with 31. Yarid SD, Garbin CAS, Garbin AJÍ, Francisco KMS.,
oral diseases. Oral Dis. 2008; 14(2):105–14. Sumida DH. Conduta odontológica no atendimento a
portadores de Diabetes Mellitus. Endocrinol Metab. 2010;
15. Diabetes DOF. Diagnosis and classification of
6(1):74–85.
diabetes mellitus. Diabetes Care. 2011; 34(SUPPL.1).
32. Varellis MLZ. O paciente com necessidades
16. Maraschin J de F, Murussi N, Witter V, Silveiro SP.
especiais na odontologia: manual prático. 3rd ed. São Paulo:
Classificação do diabetes mellitos. Arq Bras Cardiol. 2010;
Santos: GUANABARA KOOGAN LTDA; 2017. 281–290 p.
95(2):40–6.
33. Walton C, King R, Rechtman L, Kaye W, Leray E,
17. Viellas EFV, Domingues RMSM, Dias ABD, Costa
Marrie RA, et al. Rising prevalence of multiple sclerosis
JV. Manifestações bucais em pacientes portadores de Diabetes
worldwide: Insights from the Atlas of MS, third edition. Mult
Mellitus: uma revisão sistemática Oral manifestations in
Scler J. 2020; 26(14):1816–21.
179

34. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência de caso. Revista Odontológica do Brasil Central [Internet].
Tecnologia e Insumos Estratégicos. Comissão Nacional de 2017 Ago 25 [cited 2023 Apr 9]; 26(77). Disponível em:
Incorporação de Tecnologias no SUS (CONITEC). Protocolo https://www.robrac.org.br/seer/index.php/ROBRAC/article/vi
clínico e diretrizes terapêuticas Esclerose Múltipla. Relatório ew/1140
de recomendação. 2018; (357):50.
48. Baer AN, Walitt B, Lord MD. Sjögren Syndrome and
35. Thompson AJ, Baranzini SE, Geurts J, Hemmer B, Other Causes of Sicca in Older Adults. Rheumatic Disease
Ciccarelli O. Multiple sclerosis. Lancet [Internet]. 2018; Clinics of North America. 2018 Ago; 44(3):419–36.
391(10130):1622–36. Disponível em:
http://dx.doi.org/10.1016/S0140- 6736(18)30481-1 49. López-pintor RM, Castro F, Hernández G. Oral
Involvement in Patients With Primary Sjögren’s Syndrome.
36. Rick. Definition of MS: National Multiple Sclerosis Multidisciplinary Care by Dentists and Rheumatologists. 2015;
Society [Internet]. National Multiple Sclerosis Society. 1991. 11(6):387–94.
Disponível em:
https://www.nationalmssociety.org/What-is- MS/Definition- 50. Saccucci M, Carlo G Di, Bossù M, Giovarruscio F,
of-MS Salucci A, Polimeni A. Autoimmune Diseases and Their
Manifestations on Oral Cavity : Diagnosis and Clinical
37. A Esclerose Múltipla (EM) em detalhes – ABEM _ Management. Journal of Immunology Research. 2018 May 27;
Associação Brasileira de Esclerose Múltipla [Internet]. 2018:1–6.
Disponível em: https://www.abem.org.br/esclerose-multipla/a-
esclerose-multipla-em-em-detalhes/ 51. Ambrósio LMB et al. Aspectos relevantes da
síndrome de Sjögren para o Cirurgião-Dentista. Ver. Assoc.
38. Brownlee WJ, Hardy TA, Fazekas F, Miller DH. Paul. Cir. Dent. 2016 Set 1; 70(3):285–9.
Diagnosis of multiple sclerosis: progress and challenges.
Lancet. 2017; 389(10076):1336–46. 52. Soto-Rojas AE, Kraus A. The Oral Side of Sjögren
Syndrome. Diagnosis and Treatment. A Review. Archives of
39. O que é Esclerose Múltipla (EM) – ABEM _ Medical Research. 2002 Mar; 33(2):95–106.
Associação Brasileira de Esclerose Múltipla [Internet].
Disponível em: https://www.abem.org.br/esclerose- 53. Trust F, Oak S. Sjögren’s syndrome. 2007;7(1).
multipla/o-que-e-esclerose-multipla/
54. Cartee, Deborah. Maker, Shannon. Dalonges, Debra.
40. Types of MS | Multiple Sclerosis [Internet]. Manski M. “Sjogren’s syndrome: oral manifestations and
International Federation MS. 2016. p. 1. Disponível em: treatment, a dental perspective.” J Dent Hiygiene. 2015;
https://www.msif.org/about-ms/types-of-ms/ 89(6):365–71.

41. Sand IK. Classification, diagnosis, and 55. Jensen SB, Vissink A. Salivary Gland Dysfunction
differential diagnosis of multiple sclerosis. Curr Opin Neurol. and Xerostomia in Sjogren’s Syndrome. Oral Maxillofac Surg
2015; 28(3):193–205. Clin NA. 2014; 26(1):35–53.

42. National Multiple Sclerosis Society. Updated 56. Napeñas JJ, Rcs FDS, Rouleau TS, Rcs FDS. Oral
McDonald Criteria Expected to Speed the Diagnosis Complications of Sjogren’s Syndrome. 2014; 26:55–62.
of MS and Reduce Misdiagnosis. 2017;1–4. Disponível em:
57. Carr AJ, Ng W, Figueiredo F, Macleod RI,
https://www.nationalmssociety.org/NationalMSSociety/media
Greenwood M. Sjögren’s syndrome – an update for dental
/MSNationalFiles/Research/Updated_
practitioners. Br Dent J. 2012 Out; 213(7):353-7.
McDonald_Criteria_Likely_To_Speed_MS_Diagn
osis_And_Reduce_Misdiagnosis.pdf 58. Sjögren’s Foundation. Symptoms. Disponível em:
https://sjogrens.org/understanding-sjogrens/symptoms
43. Manchery N, Henry JD, Nangle MR. A systematic
review of oral health in people with multiple sclerosis. 59. Shiboski CH, Shiboski SC, Seror R, Criswell LA,
Community Dent Oral Epidemiol. 2020; 48(2):89–100. Labetoulle M, Lietman TM et al. 2016 American College of
Rheumatology/European League Against Rheumatism
44. Eser E, Almas K. Multiple sclerosis and oral health:
Classification Criteria for Primary Sjögren’s Syndrome: A
an update. New York State Dent. 2013 Apr 1; 79(3):16–21.
Consensus and Data-Driven Methodology Involving Three
45. Hatipoğlu H, Kabay SC, Güngör Hatipoğlu M. International Patient Cohorts. Arthritis Rheumatol. 2017;
Multiple Sclerosis and Dentistry: A Contemporary Evaluation. 69(1):35–45.
Türk Nöroloi Dergisi. 2015 Mar 5; 21(1):1–6.
60. Hochberg M, Silman A, Smolen J, Weinblatt M,
46. Zhang GQ, Meng Y. Oral and craniofacial Weisman M. Reumatologia. 6th ed. 2016 Elsevier Editora Ltda;
manifestations of multiple sclerosis: Implications for the oral 2016. 920 p.
health care provider. Eur Rev Med Pharmacol Sci. 2015;
61. Escobar DC, Valdés LG, Hurtado OF. Xerostomía en
19(23):4610–20.
pacientes con síndrome de Sjögren. 2017; 42(1).
47. Costa RM, Figueiredo FMP, Mariano LC,
Marchionni AM, Tunes RS, Oliveira VMB de. Adaptações em
escovas dentais para pacientes com distúrbios motores: relato
180

62. Hamburger J. Sjogren’s syndrome – managing oral 72. Sdepanian VL, Fagundes-Neto U, Morais MB. Celiac
and systemic symptoms via a multi-disciplinary approach*. disease: clinical characteristics and methods used in the
2004; 10:306–9. diagnosis of patients registered at the Brazilian Celiac
Association. J Pediatr (Rio J). 2001; 77(2):131–8.
63. The Challacombe Scale. 2011;17(1):332172.
73. Ludvigsson JF, Bai JC, Biagi F, Card TR, Ciacci C,
64. Sdepanian VL, Morais MB de, Fagundes-Neto U. Ciclitira PJ, et al. Diagnosis and management of adult coeliac
Doença celíaca: a evolução dos conhecimentos desde sua disease: Guidelines from the British society of
centenária descrição original até os dias atuais. Arquivos de gastroenterology. Gut. 2014; 63(8):1210– 28.
Gastroenterologia. 1999 Dez; 36(4):244–57.
74. Hill ID, Dirks MH, Liptak GS, Colletti RB, Fasano
65. Cenit MC, Olivares M, Codoñer-Franch P, Sanz Y. A, Guandalini S, et al. Guideline for the diagnosis and
Intestinal microbiota and celiac disease: Cause, consequence or treatment of celiac disease in children: Recommendations of
co-evolution? Nutrients. 2015; 7(8):6900–23. the North American Society for Pediatric Gastroenterology,
Hepatology and Nutrition. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2005;
66. Lebwohl B, Sanders DS, Green PHR. Coeliac
40(1):1–19.
disease. Lancet [Internet]. 2018; 391(10115):70–81.
Disponível em: http://dx.doi.org/10.1016/S0140- 75. Fried M, Corazza GR, Schuppan D, Catassi C, Greco
6736(17)31796-8 L, Cohen H, et al. Doença Celíaca. 2005; 10:1-8.
67. Kupfer SS, Jabri B. Pathophysiology of Celiac 76. Cosnes J, Nion-Larmurier I. Les complications de la
Disease. Gastrointest Endosc Clin N Am. 2012; 22(4):639–60. maladie cœliaque. Pathol Biol. 2013; 61(2):e21–6.
68. Doença Celíaca | Fenacelbra [Internet]. 2020. 77. Rauen MS, Back JC de V, Moreira EAM. Doença
Disponível em: celíaca: sua relação com a saúde bucal. Rev Nutr. 2005;
http://www.fenacelbra.com.br/fenacelbra/doenca- celiaca/ 18(2):271–6.
69. Brasil. Ministério da Saúde. Protocolo Clínico e 78. Macho VMP, Coelho AS, Veloso e Silva DM,
Diretrizes Terapêuticas - Doeça Celíaca. Portaria SAS/MS no Andrade DJC de. Oral Manifestations in Pediatric Patients with
1149. 2015; 1–8. Coeliac Disease – A Review Article. Open Dent J. 2017;
11(1):539–45.
70. Vaquero L, Rodríguez-Martín L, León F, Jorquera F,
Vivas S. New coeliac disease treatments and their 79. Pizzatto, E. & Gabardo, M. Saúde Bucal Coletiva:
complications. Gastroenterología y Hepatología (English uma visão ampliada. Ponta Grossa: Atena editora; 2021.
Edition). 2018 Mar; 41(3):191–204. Disponível em: https://www.atenaeditora
71. Shannahan S, Leffler DA. Diagnosis and Updates in
Celiac Disease. Gastrointest Endosc Clin N Am. 2017;
27(1):79–92.

.com.br/catalogo/ebook/saude-bucal-coletiva-uma-abordagem-ampliada

Você também pode gostar