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Literatura Africana de Língua Portuguesa
Literatura Africana de Língua Portuguesa
LETRAS 1
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Núcleo de Educação a Distância
Créditos e Copyright
CDD 800
PLANO DE ENSINO
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SEMESTRE: 6º
EMENTA
OBJETIVO GERAL
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
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UNIDADE IV- Outras literaturas: Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Guiné
Bissau.
Bibliografia Básica
Bibliografia Complementar
CANIALDO, B. J. Percursos pela África e por Macau. São Paulo: Ateliê Ed., 2005.
GOMES, S. C. Cabo Verde: literatura em chão de cultura. São Paulo: Ateliê. Ed.,
2008.
SANTOS, B. de S. Pela mão de Alice. 13ª ed. São Paulo: Cortez Ed, 2010.
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Webgrafia:
METODOLOGIA
AVALIAÇÃO
Sumário
Unidade_I: Contextualização..................................................................................................................8
Aula 01_Literaturas africanas e relações literárias...............................................................................10
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Unidade_I: Contextualização
Objetivos:
Plano de Estudos
Aula 05: Literatura e sociedade nas letras resistentes: Antonio Candido e Rita
Chaves
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Não é possível dizer que há uma identidade comum a todos os países de língua
portuguesa, mas, dada a sua formação, é possível aproximá-los. As nações
africanas foram criadas na célebre “Conferência de Berlim”, realizada entre 19 de
novembro de 1884 e 26 de fevereiro de 1885. Nessa Conferência, houve a criação
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É dentro dessas fraturas sociais que se deve olhar, caso se queira adentrar
as literaturas africanas de língua portuguesa. As relações entre as literaturas e a
história são definidas dentro dos contornos da resistência à violência. Esta a
moldura para a formação das literaturas africanas de língua portuguesa, muito bem
construída por Agostinho Neto em “Medo no ar!”:
Em cada esquina
em cada casa
das portas
e em cada consciência
de novo
Acontece que eu
homem humilde
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me regresso África
para mim
Este poema de Jorge Barbosa (Cabo Verde, 1902-1971) faz ressoar alguma
produção poética brasileira? Leia-o em voz alta e confira a musicalidade do texto:
PRELÚDIO
espreitando
inocentes e medrosos
detrás da vegetação.
Havia somente
as aves de rapina
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de garras afiadas
as aves marítimas
de voo largo
as aves canoras
E a vegetação
enterrando
e se persignou
pensa n´El-Rei
começou a cumprir-se
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É baça e proeminente,
O desejo de a abraçar:
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(...)”
O poema africano é escrito logo que José Maia regressa do Rio de Janeiro.
Chegando às terras brasileiras, o poeta não se cansa de ler e procurar entender a
literatura nacional, a fim de produzir a sua própria obra, com características
africanas. Para realizar seu intento, estabelece os diálogos intertextuais e, olhando
para o continente latino-americano, trata de negar Portugal. O nacionalismo, a busca
da identidade, a história do povo emergem:
“É em José da Silva Maia Ferreira que se indica uma certa consciência regional,
condição primeira para uma consciência nacional” (FERREIRA, 1977, p.9)
Deste momento em diante, o Brasil se consolida como nação especular no que diz
respeito à vida literária das últimas colônias portuguesas a conquistarem a
independência. Os escritores de Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Guiné-
Bissau e Cabo Verde reconhecem a profunda influência dos escritores brasileiros,
que vão desde o romântico Gonçalves Dias até os modernistas. Carlos Ervedosa,
em Roteiro da Literatura Angolana, analisa esse fenômeno:
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Espelhados pelos mundos, os negros foram tratados como “raça inferior”, o que
arrasou gerações e gerações das populações africanas. Como se não bastasse,
pensando no continente africano, as fronteiras entre os territórios foram impostas
segundo interesses econômicos das potências e não segundo a identidade entre as
diversas comunidades ali existentes.
Nesse contexto, Rita Chaves (1999) observa que a perda da “harmonia” então
existente nas comunidades traz problemas que vão do relacionamento entre as
pessoas até os modos de expressão. O silêncio imposto pela colonização, pela
violência cotidiana, será substituído pelas palavras, mas que terão de ser
reinventadas. Em sociedades ágrafas, em que o registro escrito não se fazia
necessário, é urgente forjar novas formas de narrar. Mais do que isso, é preciso
descobrir quais “estórias” serão narradas em um mundo em que a ‘árvore’ perde seu
valor simbólico:
“Que tipo de palavra ganhará a atenção daqueles que já não se sentam à volta da
fogueira, mas guardam do gesto uma funda saudade? Que elementos substituiriam
a árvore, a comida, a música? Que sinais terá deixado nas ‘estórias’ de hoje a
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tradição tão fortemente evocada? Ou seja como, por que e por quem se dá o ato de
narrar?” (CHAVES, 1999, p. 19)
Para refletir, vale ler o poema de Agostinho Neto (1922-1979), eleito o primeiro
presidente negro de Angola livre:
Voz do sangue
Palpitam-me
os sons do batuque
ó dançarino de Chicago
Ó negro de África
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Eu vos acompanho
do nosso Rumo
Eu vos sinto
meus irmãos.
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A luta pela independência nos dois lados do Atlântico traz um problema crucial para
as nações. Trata-se da íntima relação entre a modernização do Estado e a liberdade
das pátrias. Conquistar a independência do colonizador implicava em assumir um
posicionamento crítico diante das problemáticas internas e da própria noção de
pátria. Como não ver corrompida a perspectiva nacionalista-ufanista de terras que
maltratavam seus povos? Entretanto, ao não idealizar a pátria e vê-la dentro de uma
perspectiva crítica, como construir uma identidade entre as várias comunidades que
habitavam os países africanos de língua portuguesa e então forjar instrumentos de
luta contra a colonização?
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Quem somos? O que temos em comum? Qual a pátria que deve ser liberta? Qual o
inimigo comum?
Esse é o quadro de boa parte dos países ora estudados, o que se pode confirmar
por uma estratégia muito usada por diversas editoras, que acrescentam no final do
livro glossários explicativos. Como quer Maria Aparecida Santilli, a língua é uma
“categoria identitária”, porque veicula valores e culturas.
Clamando justiça
É a chama da humanidade
Cantando a esperança
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É exatamente ao longo das lutas pela libertação dos países africanos de língua
portuguesa que se consolidam as literaturas desses países, cujos olhos se voltaram
para o Brasil, na procura de modelos literários. Os problemas do Romantismo
brasileiro, reconhecidos no embate entre o nacionalismo-ufanista e a libertação da
pátria, contribuíram para os africanos pensarem sobre as questões vividas no século
vinte. Para além dos anos de 1976, com o último país africano de língua portuguesa
tendo conquistado sua independência, os diálogos literários entre Brasil e África só
se aprofundaram.
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A consolidação dos “sistemas literários” das cinco nações se firma ao longo das
lutas pela independência, imprimindo as várias vozes nacionais. As literaturas
africanas de língua portuguesa seguem percursos próprios depois da
independência, apesar de também guardarem inúmeras similaridades. Como
também as guardam na sua origem e mesmo contemporaneamente com a formação
da literatura brasileira, conforme nos ensina Rita Chaves, ao analisar a literatura
angolana (1999). A formação dasliteraturas africanas de língua
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Benjamin Abdala, por sua vez, propõe um novo modo de abordar a história da
literatura, o qual tem como força propulsora romper com a maneira canônica de
tratar as obras literárias. Como? A partir da leitura de textos literários significativos
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para o público alvo. Encontrar tais letras é, pois, segundo Benjamin, o desafio do
professor.
A professora Rita Chaves deu sua contribuição ao publicar textos sobre as obras de
Angola e de Moçambique. Sua palavra significou uma seleção dentre tanto material
publicado e uma orientação segura para os que se interessavam pelas literaturas de
língua portuguesa. Além disso, a crítica publicou A formação do romance angolano,
livro que consolidou o Brasil entre os países que melhor interpretavam os percursos
literários africanos.
Longe de conhecer esses estudos, o docente, até meados dos anos de 1990, via as
literaturas africanas como algo exótico e distante da cultura brasileira. Foram
necessários congressos, encontros, publicações, aulas para que se pudesse
conceber a formação inicial do professor dentro de uma perspectiva mais ampla.
Afinal, pensar nas literaturas de Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau e
São Tomé e Príncipe significa mudar a noção de cânone, de estudos literários e da
própria história da literatura.
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Nesse mesmo contexto, em 2009, foi aprovado o Plano Nacional das Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o
Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana (BRASIL, 2009).
Não se trata, pois, de disseminar planos de aulas, mas de construir uma perspectiva
que rompa com as anteriores, porque incorpora novos parâmetros
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Em poucas palavras, a Lei 11.645/08, se levada a sério, como deve ser levada,
instaura uma nova concepção de ensino de literatura.
O professor em formação precisa estar preparado para romper e propor. Para tanto,
é necessário ler os textos africanos e afrodescendentes. Somente depois, sim, ler o
que se tem publicado em termos de planos de aula, propostas pedagógicas,
sequências didáticas.
A Lei não deve, nesse sentido, levar o docente a repetir os modos antigos de
ensinar literatura. Mas deve levá-lo a defender o ensino da literatura a partir da
leitura dos textos africanos. Somente assim os alunos poderão dialogar
genuinamente com os valores, a ética, a estética africana e afrodescendente.
Benjamin Abdala Júnior (2002) em seu “História Literária e o Ensino das Literaturas
de Língua Portuguesa” afirma:
“A história literária faz-se de impactos sobre o leitor, de forma análoga aos motivos
de sedução do canto épico. Sensibilizam aqueles que têm ouvidos e que aceitam o
desafio. Nessa viagem, estão organicamente ligados o herói e seus marinheiros
(...)”. (2002, p. 37)
Você, Brasil
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Com um i no si
— “mi dá um cigarro!”.
Impossíveis”.
Ao fim da leitura, fica a pergunta: o que este poema comunica hoje? Aliás, ele
comunica algo?
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Dentro desse contexto, é inevitável procurar compor uma perspectiva crítica que
abarque os países de língua portuguesa desde a consolidação dos sistemas
literários mais jovens, a saber, os africanos. Pode-se refletir sobre possibilidades de
trabalho com as literaturas de língua portuguesa a partir da colonização. Do período
colonial, pode-se pensar na produção feita nas primeiras décadas do século XX na
África, quando as literaturas de língua portuguesa começaram a ser produzidas de
modo mais sistematizado.
O poeta Rui Noronha (de Moçambique) foi, ao lado de Costa Alegre (de São Tomé e
Príncipe), um dos fundadores da poesia africana de língua portuguesa. Expressando
de um modo ainda bastante “colonizado” e “assimilado” a sua dor diante do
espetáculo da opressão, o poeta vive suas contradições:
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Para aguçar os sentidos, fica a proposta de leitura e análise dos textos publicados
por dois autores cabo-verdianos lidos, em sua nação, como antagonistas no que diz
respeito ao lugar que ocuparam nas lutas pela independência e pela construção de
Cabo Verde:
“Pedirei
Suplicarei
Chorarei
Atirar-me-ei ao chão
Gritarei
Berrarei
Matarei
(Ovídio Martins)
Itinerário de Pasárgada
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Em Pasárgada eu saberia
o meu destino...
a caminho de Viseu...)
(Baltasar Lopes)
A leitura dos poemas é incompleta sem uma cuidadosa análise de “Vou-me embora
pra Pasárgada”, de Manuel Bandeira. O curioso é que, uma vez que se tem contato
com os textos poéticos cabo-verdianos, a interpretação do poema brasileiro ganha
novos contornos e formas. Sem dúvida, a grandeza do trabalho comparado se
evidencia ao leitor que não perde a prática de investir na sua própria educação
literária.
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Resumo_Unidade I
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Unidade I: referências
Referências bibliográficas
CHAVES, Rita. Formação do romance angolano. São Paulo, Via Atlântica, 1999.
Webgrafia
http://www.portaldaliteratura.com/livros.php?livro=3591#ixzz1XxHpunIo
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UNIDADE II
Objetivos:
Plano de estudos:
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A formação dos países africanos de língua portuguesa foi pautada por conflitos
intensos, vividos desde a escravidão, passando pelos os processos de colonização
de exploração, até a profunda guerra civil que se seguiu às independências e que
alguns países conheceram. Angola foi um deles. A luta armada, estimulada pelas
duas potências da época, Estados Unidos e antiga União Soviética, penetrou no
tecido social, gerando inúmeras consequências.
Medo no ar!
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Em cada esquina
em cada casa
das portas
e em cada consciência
de novo
Acontece que eu
homem humilde
me regresso África
para mim
Nascido em Catete, Angola, em 1922, Agostinho Neto faleceu em 1979. Fez seus
estudos em Angola, vindo a se licenciar em Medicina pela Universidade de Lisboa.
Vinculado às atividades políticas em Portugal, fundou a revista Momento. Como
outros escritores africanos, foi preso e desterrado para Cabo Verde, Tarrafal. Sua
biografia de vida, seu envolvimento político e literário, evidenciam as inextrincáveis
ligações entre literatura e resistência, arte e poder.
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O Ngunga não ia ser livro. Eu estava no Leste e estava a fazer um levantamento das
bases do MPLA, pela primeira vez ia-se saber quantas bases havia, quantos
homens havia, quantas armas...eu ia de base em base e ao mesmo tempo
acompanhava o ensino, dava uma ajuda aos professores com os manuais de
matemática que eram da Ex RDA, demasiado modernos, e os professores tinham
dificuldades com eles, comecei também a aperceber-me que os miúdos só tinham
os livros da escola para ler o português, conclui que era preciso fazer textos de
apoio, é aí que começa o Ngunga. Eram textos muito simples que pouco a pouco se
iam tornando mais complexos. Como ainda assim não era suficiente os textos eram
traduzidos para Mbunda e depois eu tentava dar-lhes regras gramaticais
reescrevendo o Mbunda, assim os miúdos podiam aprender a ler na sua língua e
recorrer a ela sempre que tivessem dificuldade nalguma palavra em português.
Quando acabei cheguei à conclusão que aquilo era uma estória, dei-lhe um fio
condutor e mais tarde decidimos publicá-lo.
O livro, construído para divulgar a cultura nacional, cumpre com o que Pepetela julga
ser fundamental:
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Ao fim, a pergunta a ser formulada é como a literatura pode resistir? Aliás, resistir a
quê? Para cada contexto histórico, uma resposta.
Mas o ponto de partida para a reflexão pode estar em António Gramsci, no seu
célebre livro Os intelectuais e a organização da cultura (1982). Segundo o crítico
italiano, o intelectual deve procurar ser um elo de comunicação entre o povo e as
elites, por isso, ele deve estar atento às necessidades e às vozes populares.
Aproximar esta perspectiva dos países africanos de língua portuguesa contribui para
que o leitor compreenda ainda melhor as intenções que percorrem o texto de
Gramsci. Isso, porque a totalidade dos intelectuais nos movimentos pró-
independência tiveram que se posicionar de um ou outro lado, entre os
colonizadores e os colonizados, entre os portugueses e as comunidades. Diante da
tensão do momento histórico, não era possível àquele que sabia ler e escrever, que
conseguia interpretar as relações sociais e a história, calar-se. Como mostra Rita
Chaves em Formação do romance angolano, a literatura era meio de divulgar a
tradição e os valores da raçã, mas não só, porque acaba por ser um permanente
meio de instigar a organização social e as lutas contra o colonizador.
A relação dos escritores com a história dos seus países não é, entretanto, livre de
tensões. Esse percurso se deu grandemente pelo impulso vigoroso dado pela
imprensa, que rompe com o silêncio imposto pela colonização. É comum na
literatura da área se referir a dois grupos de escritores, um que defendia Portugal (e,
portanto, atacava os colonizados) e outro que defendia os africanos (e, portanto,
atacava os colonizadores). Entre esses dois grupos, entende-se que houve quatro
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Tais fases são também vistas em duas frentes, uma que se identifica com a
literatura europeia, em que os europeus são vistos de modo mítico, como se
tivessem chegado às terras selvagens e ajudado o povo local a se civilizar; e outra,
com a construção das literaturas nacionais, em que o europeu é visto como vil e
violento e o povo passa a ser o herói nacional.
Não à toa, os termos regionais eram incorporados ao plano literário, esses também
significando resistência e possibilidade de romper com os códigos do invasor, antes,
entretanto, visto pelos intelectuais, como salvadores
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nem tristeza
o canto do lavrador
e do estudante
do poeta
do operário
e do guerrilheiro
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O poema de Jofre Rocha como um canto único para todos os povos colonizados e
explorados expõe a necessidade de construir uma identidade comum. Sem dúvida, é
possível aproximar tal história da palavra resistente com a história do Brasil, quando
no Romantismo a nação se torna um valor maior.
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Essa maneira de estar no mundo a que se refere um dos grandes poetas angolanos,
Ruy Duarte de Carvalho, deriva também da importância da oralidade para os vários
gêneros literários, como veremos na aula 17.
A poesia de Angola passa por duas fases, a primeira, conhecida como “escrita
colonial”, e a segunda, como a “escrita moderna e nacional”. A revista Mensagem
marca essa poesia tida como moderna, porque há um distanciamento das formas e
dos modelos de Portugal. O poeta que melhor representa esta ruptura com o
colonizador é Arlindo Barbeitos, cujas experiências formais renovam as vozes
poéticas:
na
sobe
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a ilusão da felicidade
que
me dá
como se
na brisa
fossem
na
O conto seguiu caminhos semelhantes aos da poesia, adquirindo nos anos de 1970
inflexões nacionais. Muitos são os escritores que alcançaram êxito em suas
produções como Arnaldo Santos, nascido em Luanda a 14 de março de 1935. Após
a independência de Angola, foi diretor do INALD (Instituto Nacional do Livro e do
Disco) e do IAC (Instituto Angolano do Cinema) e um dos fundadores da União dos
Escritores Angolanos (1975). Dentre sua produção, o conto “A Menina Vitória”
aponta para os problemas da formação da identidade angolana, vindo a explorar as
contradições experimentadas pelos naturais da terra.
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Luandino Vieira, cujo nome evidencia sua proximidade com a terra de Angola,
nasceu em Lisboa e, como ele mesmo afirma, foi “criado à vontade nos velhos
musseques da Luanda antiga”, onde construiu sua identidade de escritor africano.
Participou da geração de Cultura e comprometeu-se ativamente com a luta de
libertação nacional. É preso em 1959 e, depois, novamente em 1961, quando
condenado a 14 anos de prisão. Em 1964, é transferido para o Campo de
Concentração do Tarrafal, onde passou, junto a tantos outros presos políticos, oito
anos e onde diz ter escrito mais da metade da sua obra. Depois, em 1972, é
mandado a Lisboa, onde reside desde então, vindo a publicar sua primeira obra,
Luuanda, no qual evidenciará tantos dos aspectos recorrentes da sua obra, como a
denúncia social, a construção da ordem do dever-ser e a negação da ordem
estabelecida, tecidos segundo uma nova língua literária e a ética de vocação
coletiva, da liberdade, justiça e igualdades sociais
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“Mas vavó não sente esse barulho da vida à volta dela. Tem o soprar
do vento, o bater dos zincos; nalguns sítios, o cantar da água a
correr ainda e, em cima de tudo, misturando com todos os ruídos, o
zumbir das vozes das pessoas do musseque, falando, rindo, essa
música boa dos barulhos dos pássaros e dos paus, das águas,
parece sem esse viver da gente, o resto não podia se ouvir mesmo,
não era nada. Tudo isso é para vavó muito velho, muito antigo,
sempre a vida dela lhe conheceu todos os anos, todos os cacimbos,
todas as chuvas; e agora, nessa hora, a barriga estava lhe doer, a
cabeça cada vez mais pesada, o corpo com frio. Vontade para ir
dentro da cubata também já não tem; deixa-se ficar assim mesmo,
sentada, as moscas pousadas nos panos pretos, a boca respirando
com força o ar novo que está soprar, os olhos quase fechados…”
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Dina estava lá, nessa hora do fim da tarde, quase sem sol já, sentada na porta da
cubata, coçando as pernas. As moscas não lhe largavam na ferida, e nas mãos já
sabiam mesmo o jeito de lhes enxotar. Pelas areias fora, como ainda a luz do dia, as
pessoas voltado no serviço iam-se escondendo, guardar sua tristeza ou alegria nas
cubatas pequenas e escuras, e nas portas e quintais os monas brincavam só (...)
Mas também alegrar como então nesses dias assim, nessas horas de confusão das
pessoas e das coisas, tiros dentro das noites, muitas vezes gritos de cubatas
invadidas, choros e asneiras e mais tiros e depois ainda o fugir de passos, o correr
de jipes com soldados de metralhadora disparando à toa, nas sombras e nas luzes,
nos gatos e nas pessoas?”. (VIEIRA, “Dina”, Vidas novas, p. 13)
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A luta de classes invade, assim, os musseques e daí surge para povoar a Baixa,
como no conto “Muadiê Gil, o Sobral e o barril” (In: Velhas estórias), em que os
pedreiros da Construção Gilafo exige que se cumpra a tradição da ‘bandeira’, ou
seja, o patrão deveria entregar-lhes um barril de bebida para que eles
comemorassem o término do trabalho em mais um prédio construído. O conflito
gerado é, também, o conflito entre dois espaços culturais, os vindos do musseque e
os assimilados, portugueses, vindos da cidade Baixa. Entre os dois discursos, a
exploração do dono do capital expressa a conhecida imagem de que os colonizados
são preguiçosos, razão pela qual a civilização não evolui. Os trabalhadores ganham
a disputa, não pela argumentação, mas porque Gil fica com medo, quando ouve
uma lata de café cair. Amedrontado, cede.
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“(...) a história de Dina não é uma história qualquer. Ela pode ser a
história de todas as pessoas que, indignadas com a sua realidade,
podem ser sujeitos de uma história transformadora. O saber
apresentado pelo narrador encontra eco, assim, no saber
demonstrado pela jovem protagonista. Ela é portadora de um senso
moral que, por se referir a valores e a decisões, pressupõe
autodeterminação, liberdade e responsabilidade.” (ROSSI, Cadernos
CESPUC de Pesquisa PUC Minas, 203).
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Ganhador de prêmios como o Camões (1997) pelo conjunto de sua obra, entre os
romances de Pepetela estão As aventuras de Ngunga (1973), Muana Puó (1978),
Mayombe (1980), Yaka (1988), A geração da utopia (1992), O desejo de Kianda
(1995), Parábola do cágado velho (1996), Jaime Bunda, agente secreto (2001). Seu
tom cada vez mais crítico à realidade nacional evidenciou-se a partir dos anos de
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1990, quando já forjava o olhar atento e vigilante dos que ocuparam o poder no pós-
independência. O último romance publicado, Predadores (2005), em tom de farsa,
debocha da elite política, econômica e intelectual angolana, e aponta para a
continuidade dos mecanismos de opressão no país.
“Se Ngunga está em nós, que esperamos então para fazer crescer?
Como as árvores, como o massango e o milho, ele crescerá em nós
se o regarmos. Não com água do rio, mas com ações. Não com água
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A criança torna-se um herói nacional e preconiza o que deveria ser o novo homem
angolano, comprometido com a construção de relações sociais justas, pautadas na
transformação dos vínculos opressores, do preconceito racial e de quaisquer formas
de violência, inclusive as herdadas da própria tradição nacional. Ngunga é, assim,
uma espécie de ícone dos anseios revolucionários. Construir a identidade nacional
exige esforços, dos quais derivam os textos iniciais de Pepetela, que buscam
recompor a memória do povo ora contando a história contemporânea ao próprio
momento da escrita ora resgatando o passado como o faz Yaka. Nesse romance, o
autor percorre os conflitos vividos por várias gerações de colonos portugueses, que
tentam, entre 1890 e 1975, a ascensão econômica enquanto assistem à gradativa
desagregação do núcleo familiar. Para tanto, muitos símbolos são construídos e
retomados como a imagem já tradicional na literatura angolana do idoso que se
encontra à margem da família, sendo completamente alijado do contexto do qual
participa (também a literatura moçambicana com autores como Mia Couto faz
inúmeras referências ao abandono do idoso, que vem a representar a rejeição dos
aspectos da cultura tradicional pelas novas gerações).
Mas é no início dos anos de 1990 que Pepetela, com A geração da utopia, inicia um
balanço crítico do movimento revolucionário e da condução política do país,
apontando para os impasses dos que fizeram a independência sem, entretanto,
mudar significativamente as relações de poder existentes antes de 1975:
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Mais uma vez, o crime maior não é contra uma pessoa, mas contra a nação: o povo
é a vítima das várias formas de opressão que as elites locais exercem junto a
aqueles que elas cooptam dentre a população ávida por poder. Os homens
incriminados não são dois inocentes, mas não são os verdadeiros assassinos; e o
detetive que conduz as investigações é o criminoso, o Estado constituído. O jogo de
peças trocadas denuncia, seguindo a tradição dos romances de Pepetela, a
completa ausência de ética nas relações, determinadas por disputas por poder e
dinheiro: “Jaime Bunda, o verdadeiro herói da noite, encheu o peito. Cada vez se
sentia mais perto do Poder, aquele que cria e espezinha tudo à sua volta.”
(PEPETELA, 2003,p. 296).
“O pai de Jaime (...) repetia sempre tenho vergonha de dizer que sou
primo deste ou daquele para conseguir qualquer coisa, obtendo
porque valho, senão recuso, era um intelectual, no fundo o teu pai
era um intelectual embora sem tantos estudos assim, gostava de ler
e de saber coisas, se contentava com o emprego sem futuro onde foi
cair no tempo colonial (...) ficou conformado, chupando o cachimbo e
lendo os seus livros, será que ele escrevia? Jaime Bunda não sabia,
nunca tinha visto o pai com algum caderno onde apontasse poemas
ou outra coisa, gostava era mesmo de ler e lhe passou o hábito, mas
Bunda foi ficando pelos policiais. Tinha no quarto alguns livros do pai,
enciclopédias e romances, no entanto tinha desistido deles, muito
cansativos, melhor eram mesmo os policiais americanos, os seus
grandes mestres.” (PEPETELA, 2003, p. 61).
LETRAS 69
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Desse estado letárgico, ainda assim, surge o esforço do escritor na sua intensa
busca de captar pela linguagem os desvios que nos conduzem a repetir as práticas
criminosas em nosso cotidiano. É urgente conhecer os intrincados aspectos
históricos e os jogos de interesses de um país que caiu no esquecimento das
grandes mídias exatamente por expor de modo brutal o estado de barbárie
contemporâneo.
Pepetela continua publicando e se fazendo ouvir. Isso, por si só, evidencia que as
letras empenhadas do escritor ainda têm muito a comunicar para o público.
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Como vimos nas aulas anteriores, a literatura angolana pode ser compreendida em
três fases: até a independência (1975), o pós-independência e a
contemporaneidade. Essa divisão é para efeitos didáticos, para introduzir o leitor no
universo literário e artístico de Angola. De certo modo, essa periodização é afirmada
pelos próprios escritores, como se pode testemunhar, quando ouvimos ou lemos as
reflexões que os autores fazem sobre suas obras. É comum eles se referirem à
geração das lutas revolucionárias, a geração atual e a intermediária.
O que caracteriza cada um dos períodos literários pode ser interpretado da própria
trajetória de Pepetela, que vai de uma produção empenhada em divulgar o
imaginário revolucionário, passa pelo questionamento da consolidação de Angola
livre e chega à desilusão com a realidade vivida. Esse movimento se revela também
na palavra artística.
LETRAS 71
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Ondjaki é outro dentre os escritores angolanos muito lidos no Brasil. Não é exagero
dizer que ele chega a ser “festejado” entre nós, sendo figura marcada nas festas
literárias que acontecem nos diversos cantos do Brasil. Nascido em 1977, em
Luanda, é talvez o representante de maior alcance da atual literatura de Angola no
Brasil. Poeta e prosador, publicou diversos livros e recebeu outros tantos prêmios.
Como Agualusa, o escritor também firmou residência no Brasil, desde 2007, vindo a
publicar ora por editoras angolanas (ainda é membro da União dos Escritores
Angolanos), ora por editoras brasileiras.
São contos em que desfilam personagens com lastro na vida real, que, entretanto,
ganham outras vidas na cifra da imaginação com que o narrador, sempre em
primeira pessoa, busca recordar os velhos tempos, o antigamente. Entre a poesia e
a prosa, os textos de Ondjaki são plenos de lirismo:
“Trouxeram sal nas mãos bonitas em concha com cheiro assim duma
praia secreta. O Paulinho tinha um canivete e cortou as mangas aos
bocadinhos. Cada um pegava um pedacito de manga verde,
misturava com o sal e comia devagar. Entre gargalhadas
pequeninas, íamos dividindo o momento e a tarde, os olhares e os
LETRAS 72
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Essa confluência de gêneros, que anuncia novas passagens, marca a perda de uma
Angola que viveu o sonho revolucionário e anuncia um novo país, ainda a se
construir, das misturas possíveis a se fazerem. A literatura angolana, como anuncia
Ondjaki, é ainda jovem, como o é o país, mas já tão promissora pelos frutos
colhidos.
É difícil pensar em uma única tendência dessa literatura que emerge com força e
com vigor. Os autores são diversos, os da ‘velha’ geração, como Pepetela,
continuam a produzir e a publicar obras surpreendentes, os da geração
‘intermediária’, como Ana Paula Tavares, não se eximem de compor as mais
perfeitas imagens poéticas, e os mais novos escrevem a nova literatura,
reconhecendo a profunda influência da tradição literária.
Não à toa, como afirma Eduardo Assis, os estudos acadêmicos sobre as literaturas
africanas têm superado inclusive os estudos sobre a literatura portuguesa. Também
o mercado editorial parece ter descoberto este filão. Para nós, leitores, os ganhos
são enormes, porque se desdobram as possibilidades de novas viagens literárias em
letras tão comuns quanto estranhas:
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Falemos de Jorge Amado, para dizer com Mia Couto, quando aponta para a sua
influência em todas as literaturas de África de língua portuguesa. Mas também de
Manoel de Barros, reconhecidamente um poeta muito lido por Ondjaki, que a ele se
aproxima pelo lirismo prosaico, nos seus textos, feito às avessas, por seu prosaísmo
lírico, como vimos nas aulas anteriores.
Apesar de muito diferentes e até contrastantes, Saramago, como se sabe, não fez
diferente. Seus romances nunca deixaram para trás a fina ironia contra a nação
colonizadora. E, para dizer pouco, renovando a sua prosa, reinventava a palavra
literária. Em Angola, tantos foram os escritores que se aproximaram dessa ironia e
desse olhar de profunda renovação estética, Luandino Vieira foi um deles.
Apesar disso, não é possível dizer que há uma literatura lusófona, como alguns
parecem propor. Ao contrário, cada país tem particularidades demarcadas, que se
LETRAS 76
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dirigem para dentro do ser regional e para o universal mais do que para uma
possível lusofonia.
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Resumo_Unidade II
Na unidade II, vimos a formação da literatura de Angola e como ela acabou por
influenciar a formação das outras literaturas de língua portuguesa do continente
africano. Também procuramos mostrar que cada uma das literaturas tem a sua
especificidade e que não é possível falar da África em sentido genérico, já que cada
país tem a sua formação, as suas etnias, os seus falares regionais, costumes,
culturas...
LETRAS 78
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O enfeixar das discussões se deu nos “caminhos cruzados” das literaturas de língua
portuguesa, a fim de motivar os alunos-leitores a buscarem seus próprios caminhos
literários.
UNIDADE III
Objetivos:
Plano de estudos:
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A africanidade dos seus textos é reconhecida não só na sua defesa pela libertação
dos povos, pela reconquista da dignidade e pelo espaço dos negros espalhados em
todas as partes do mundo, mas também na tentativa de construir uma poesia que
saltasse do mundo letrado para alcançar os africanos em sua maior parte
analfabetos. Essa busca da palavra oralizada, da poesia em ritmo e melodia,
estrutura a produção de Craveirinha, libertando a palavra do texto impresso. É o que
se lê em um dos poemas mais conhecidos de moçambicano:
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Nem nada!
Eu!
e nem rio
e nem flor
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só tambor!
Ao lado de Noémia de Sousa, Jorge Viegas, Sebastião Alba, Luís Carlos Patraquim
e Mia Couto, Craveirinha migra por diversas paisagens, indo do realismo
nacionalista até a negritude, passando por temáticas sociais, culturais, políticas e até
intimista. Seus livros têm perfis bastante particulares como Cela 1 (1980), em que há
a predominância das experiências subjetivas, e Xigubo (1980) em que o poeta narra
aspectos exteriores à sua intimidade em tom épico.
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A ‘africanidade’ não se limita, pois, à África. Nas palavras de Chabal, ela atravessa
as fronteiras modernas para recompor a unidade perdida. Entre o real e o mítico,
surge a possibilidade da construção de uma identidade que se oponha à do branco
colonizador
Movido também pelo forte empenho político, Craveirinha foi o primeiro jornalista
oficialmente sindicalizado em Moçambique. Em 1963, com Ricardo Rangel, Ilídio
Rocha, depois Rui Knopfli, Eugénio Lisboa entra no jornal A tribuna, periódico
considerado de esquerda e que passa a ser alvo especial de censura.
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Se me quiseres conhecer,
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Torturada e magnífica,
altiva e mística
se quiseres compreender-me
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Nascido em Beira, em 5 de julho de 1955, Mia Couto não esconde o incômodo de ter
crescido em meio ao preconceito racial e a toda sorte de violência do colonizador
contra o colonizado:
LETRAS 92
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É esse ponto de conflito que reverbera nos textos de Mia Couto e de outros
ficcionistas, que fundaram a tradição narrativa em Moçambique, país que
desenvolveu larga literatura antes da independência através da poesia, fenômeno
que se repetiu em outros países africanos de expressão portuguesa.
Mia Couto publicou, entre outros títulos, os livros de contos Vozes Anoitecidas em
1986, Cada Homem é uma Raça em 1990, Estórias Abensonhadas em 1994,
Contos do Nascer da Terra em 1997, Na Berma de Nenhuma Estrada em 1999, O
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Em entrevista ao poeta moçambicano Nelson Saúte, Mia Couto admite que “nem
sequer acredito na fronteira entre poesia e prosa (SAÚTE, 1998, p.228). Como não é
novidade, essa mescla pontua todas as obras do autor, divididas em romance,
conto, poesia, crônica e até reportagem apenas para efeitos didáticos. Desse lirismo
prosaico, ou do prosaísmo da lira, o efeito “escatológico” da obra transborda a
referencialidade imediata, que é identificada na degradação das relações humanas e
da ordem social, para conquistar significados junto à própria natureza violenta do ser
humano, provocadora dos atritos entre raças, etnias e até gerações.
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A leitura do fragmento acima nos faz passear entre novas sintaxes, palavras,
imagens. Assim posto, sem autor, pode-se pensar na tradição fundada por
Guimarães Rosa? Luandino Vieira? Sim, mas não, porque é de Mia Couto, e
algumas marcas são evidentes da sua escrita, como o pairar entre a realidade e o
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mundo mágico. Imaginem, um homem que se joga do prédio e que “está caindo”
desde a noite anterior é algo, no mínimo, in-crível. Essa, que é uma de suas marcas
– vista também, apenas para dar um exemplo, em O último voo do flamingo,
publicado em 2000 – é mais acentuada do que o ambiência igualmente mítica de
Rosa.
Rosa foi muito lido entre os intelectuais africanos de língua portuguesa, assim, como
muitos dos modernistas brasileiros. Se pensamos na construção desse trecho e a
colocarmos ao lado de um pequeno fragmento do conto “Famigerado”, de
Guimarães Rosa, é possível compreender por qual motivo se reconhece a tradição
roseana nas letras africanas:
“Foi de incerta feita — o evento. Quem pode esperar coisa tão sem
pés nem cabeça? Eu estava em casa, o arraial sendo de todo
tranqüilo. Parou-me à porta o tropel. Cheguei à janela. Um grupo de
cavaleiros. Isto é, vendo melhor: um cavaleiro rente, frente à minha
porta, equiparado, exato; e, embolados, de banda, três homens a
cavalo. Tudo, num relance, insolitíssimo. Tomei-me nos nervos. O
cavaleiro esse — o oh-homem-oh — com cara de nenhum amigo.
Sei o que é influência de fisionomia. Saíra e viera, aquele homem,
para morrer em guerra. Saudou-me seco, curto pesadamente. Seu
cavalo era alto, um alazão; bem arreado, ferrado, suado. E concebi
grande dúvida.” (In: Primeiras estórias, 1988)
Sobre Luandino Vieira, sua busca era compor uma língua portuguesa que não fosse
portuguesa. Como? Recriando-a. Ele mesmo admite que sua literatura deveria ser
revolucionária, para combater a exploração e a violência, para se opor à dicção do
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LETRAS 99
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Para além dos temas complexos que Paulina explora, há ainda um cuidadoso
trabalho com a linguagem, cujo resultado é uma prosa permeada por momentos de
intenso lirismo:
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Gabriela Antunes, como Pepetala, diz que escolheu escrever literatura infantil,
porque não havia livros para as crianças, que falasse do seu universo, das gentes,
das belezas. Em 1990, este ainda é o seu diagnóstico, quando, no Seminário sobre
literatura angolana, apresenta o que pensa ser escrever para crianças:
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Entretanto, a pesquisa das literaturas africanas de língua portuguesa não deve parar
aí. Escritores como Gabriela Antunes (Estórias velhas, roupa nova, 1988), Dario de
Melo (Queres ouvir, 1988) formaram a primeira geração de escritores para o público
jovem, em histórias que mesclam as tradições das estórias africanas com as
histórias infantis ocidentais. Essa mistura, para o público brasileiro, é muito sedutora,
uma vez que recria o olhar sobre as histórias entre nós já tão difundidas, mas com
conflitos históricos muito próximos aos vividos em países que ainda sofrem as
consequências das profundas desigualdades sociais.
Há, hoje, escritores por toda a África lusófona, que se dedicam à construção de
histórias para o público infanto-juvenil: Luandino Vieira, Mia Couto, Ondjaki,
Albertino Bragança, Boaventura Cardoso, Luís Bernardo Honwana, Odete Costa
Semedo são apenas alguns dos mais representativos autores contemporâneos da
África de língua portuguesa e que têm seus textos amplamente divulgados (a
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bibliografia da unidade III traz algumas referências), o que mostra o vigor desta
literatura que avança e, agora, também nos influencia.
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Resumo_Unidade III
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Objetivos:
Plano de estudos:
31. Por uma renovação do olhar: a questão do cânone e das histórias literárias.
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Organizada por Nuno Miranda e Arnaldo França, Certeza, como aponta Manuel
Ferreira, continua Claridade sob o ponto de vista da busca da caboverdianidade,
mas a ultrapassa sob o ponto de vista de que os aspectos regionais apontados eram
fruto da pressão ideológica. Alinhada ao neorrelaismo português, Certeza é uma
espécie de duplo complementar de Claridade, porque o que falta a uma, a outra
contempla. Não conseguindo ombrear com as conquistas estéticas da revista que a
precedeu, afirma o caráter revolucionário do grupo. Os jovens intelectuais
confrontam-se com a necessidade de intervir na história, escrevendo como Teixeira
de Sousa, em Da Claridade à Certeza, que explora a condição do estudante cabo-
verdiano, e Orlanda Amariles, que discute o papel da mulher no arquipélago.
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Cada país africano é uma nação, para parodiar as palavras escritas por Mia Couto.
As especificidades de Cabo Verde derivam da sua condição insular, dos
permanentes fluxos migratórios (dados seja pelas condições agrestes do
arquipélago, falta de emprego, dificuldade de produção de alimentos...) que
caracterizaram a sua formação.
com a indomável ânsia dum cavalo preso à beira do caminho, todo o dia,
da paisagem..."
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Nos anos 1930, para usar uma expressão de Benjamin Abdala em Utopia e
dualidade no contado de culturas. O nascimento da literatura cabo-verdiana (2003),
a “consciência possível” dos intelectuais de Cabo Verde desenvolve-se em torno do
mote da busca da nacionalidade, centrada nas carências da população.
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revista que edita, ilustra o projeto de encontrar no chão infértil os caminhos da gente
resistente.
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Jorge Amado foi e ainda é muito lido nos países africanos de língua portuguesa.
Seus personagens negros, mulatos, crianças miseráveis se aproximam das histórias
dentro da perspectiva de uma realidade cuja luta pela sobrevivência se sobrepõe
aos prazeres possíveis de uma vida tranquila. De certo modo, os africanos
entendem que fazem parte da formação da nação brasileira, o que se lê em
clássicos como Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freire.
“Eu nunca tinha visto aquilo. Era novo para mim esse espetáculo da vida que foge
imperceptivelmente dos homens e das coisas. Os lunaristas explicavam a fatalidade
cíclica da seca. De vinte em vinte anos era aquela falsia completa da chuva,
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São Tomé e Príncipe são duas ilhas no noroeste da costa africana. O tamanho das
ilhas é pequeno, mas há seus frutos literários, reconhecidos em Francisco José
Tenreiro, nascido em São Tomé, em 1921, em Francisco da Costa Alegre, nascido
em 1864, e em Alda do Espírito Santo, que está em todas as referências
às literaturas africanas de língua portuguesa. Os poemas dessa poetisa vão do tom
mais combativo ao mais lírico, guardando em comum o profundo sentimento da
nação emergente, que carece ainda de uma identidade que abrigue as diferenças.
Para além delas, Alda espalha as imagens da natureza nacional, recuperando as
imagens dos melhores românticos:
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Na floresta virgem
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Quando te propus
um amanhecer diferente
Quando te propus
a conquista do futuro
Quando te propus
o acumular de forças
em toda a terra
e em todos os homens
Quando te propus
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era igual a «Deus Pai todo poderoso criador dos céus e da terra»
Quando te propus
Quando te propus
insondável a fé forjada
Para ser pesquisada, lida e usufruída, há a obra de Odete Semedo, escritora que
estudou em Portugal, teve importantes funções políticas, ocupando o cargo de
Ministra da Educação, e publicou textos cuja marca é a recolha das histórias
tradicionais de Guiné-Bissau. Esse não é um feito simples em um país onde se fala
mais de 20 idiomas, além do guineense e do português (em 2010, estimava-se que
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Pensar nos modos de expressão literária e escrita dos países africanos de língua
portuguesa aponta para algo mais genérico, que aqui estamos chamando de
“poéticas das literaturas africanas”. Maria Nazareth Soares Fonseca, pesquisadora e
professora da PUC Minas, releva tal problemática ao discutir as expressões
“literatura negra” e “literatura afro-brasileira” para designar tipos de produções
artístico-literárias. Segundo a professora, elas podem estar relacionadas tanto com a
cor da pele dos autores como com a intenção das obras, dada por questões
específicas. Maria Nazareth aponta ainda para uma divisão – didática - em dois
grandes grupos: um primeiro caracterizado pelo forte enfrentamento social, contra o
preconceito e que procura interferir na história; outro grupo de escritores mais
voltados para a veiculação dos valores negros, procurando dar voz à tradição do
povo, cuja origem mestiça não pode apagar seus traços afrodescendentes. Entre as
duas tendências, continua a crítica, há muitas diferenças que devem ser valorizadas
sob pena de tornar homogêneas vozes em essência dissonantes
(http://www.letras.ufmg.br/literafro/data1/artigos/poesiaafrobrasileira.pdf). Entre os
dois olhares, há muitos tons e inúmeras outras formas literárias. Há até os que
negam a qualificação de literatura afrodescendente ou negra, afirmando que as
expressões artísticas não se prendem a etnia, opção sexual, grupos sociais...
Entrar nessa discussão pode interessar, mas é preciso que o estudioso e leitor
pesquisem para não incorrer em erros conceituas. A proposta das aulas, entretanto,
não é tomar partido de uma ou outra vertente, mas de ampliar o olhar para a
tradição que as literaturas africanas, produzidas em Angola, Moçambique, Cabo
Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, formaram no Brasil. Isso, porque, no
âmbito da crítica literária, estudou-se muito a influência dos escritores brasileiros na
África, agora, há uma tendência de percorrer as influências dos escritores africanos
no Brasil.
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Para além, há os escritores brasileiros negros e mestiços que remexem nas histórias
africanas, nas suas tradições e experiências, para dizerem em narrativas e poesias
sua força literária. Muitas são as antologias e os livros publicados e, apenas para
citar dois marcos importantes, ressalto a antologia de Zilá Bernd, do Rio Grande do
Sul, que procurou mapear, desde o século XIX, a produção negra no Brasil. Começa
com o abolicionista Luiz Gama, passa por Cruz e Sousa e chega ao período
contemporâneo, em que aponta para tendências da chamada “literatura e
resistência”, tomando escritores como Eduardo Oliveira, Abdias do Nascimento e
Solano Trindade, de quem traz os versos:
E de Camões
Por fim, a crítica ainda traz a produção de alguns grupos como o Quilombo hoje, de
São Paulo, Negrícia, do Rio de Janeiro. Uma pesquisa rápida mostra na
contemporaneidade que os grupos se multiplicaram e que o movimento negro
avançou muito nas suas conquistas. Publicações importantes na área não deixam
margem para duvidar da qualidade dos textos literários em questão.
Com muita dificuldade, porque selecionar é sempre excluir (por isso, a insistência
para que esse material seja apenas um incentivo para as pesquisas dos estudantes
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Os traços das literaturas de origem negra são variados – poderíamos até mesmo
pensar no mulato Machado de Assis – mas confluem para um olhar crítico sobre a
realidade, que permeia os textos mesmo quando a distância entre literatura e
história parece ser larga. Os estudos literários alargaram os horizontes
substancialmente com a consolidação das vozes antes postas em segundo plano,
vindo a disputar o gosto de muitos leitores.
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A Lei 11.645/08 (antes Lei 10.639) se aprofunda nos impasses em torno do ensino
da literatura, também abre outras perspectivas para se pensar na formação do leitor
de textos literários. Isso, porque obriga o professor a repensar a seleção
tradicionalmente dada à escola, mas não só, valida, oficialmente, outras escolhas.
Para tanto, basta pensar em algumas defesas de mestrado em universidades tidas
como conservadoras como a USP. Por que tal “oficialização” de levar para a
academia textos e autores que nunca foram tratados dentro da academia dá força à
multiplicação de vozes literárias e de possibilidades de práticas pedagógicas?
Porque efetivamente aponta para o fato de que o cânone, como querem os que o
afirmam dentro do território do sagrado, é tão flexível e móvel como o é a própria
literatura.
LETRAS 129
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que isso ocorra, é fundamental que o professor tenha uma formação inicial capaz de
manter o espírito de curiosidade do docente, ampliar sua autonomia, suas
habilidades e competências de leitura e de escrita. É aqui que entra a necessária
discussão em torno do cânone junto aos alunos, futuros professores. São eles que
devem se apropriar desse problema e procurar sugerir soluções para a sua própria
formação. Entre os exames de avaliação de cursos, exames vestibulares, pais,
alunos, MEC, é necessário que a discussão em torno do cânone encontre a
discussão, essa sim, que vale a pena: a formação do leitor literário.
Quando a lei entrou em vigor, ela deveria ter trazido uma mudança de olhar para o
Ensino da Literatura. Se se diz que é preciso incorporar tal literatura, está se dizendo
que as obras precisam ser mais diversas.
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Esse impacto a que se refere Benjamin é o necessário para provocar o leitor a entrar
em um texto literário. Para tanto, adverte o crítico e professor, o movimento não
pode ser exterior ao universo do aluno, pois que deve ter sentido para ele, para sua
história, para o contexto em que vive. Daí, a urgência de nós nos dedicarmos a
pensar em outras veredas para a formação de leitores literários. As literaturas
africanas, sem dúvida, mostram-se como terreno fértil para a superação deste
desafio.
LETRAS 131
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É dentro dessas fraturas sociais que temos de lançar nossos olhares, se quisermos
adentrar as literaturas africanas de língua portuguesa.
LETRAS 132
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Uma proposta das mais tradicionais seria retomar os primeiros encontros entre
Brasil e a África lusófona, como os que vimos na aula 02, quando o poeta José da
Silva Maia Ferreira, autor do primeiro livro africano de que se tem conhecimento -
Espontaneidades da minha alma: Às senhoras africanas, publicado em 1850 -
esteve no Rio de Janeiro.
Uma proposta das mais originais seria a de colocar em diálogo um rap brasileiro e
um poema de Noémia de Souza ou mesmo de José Craveirinha, cujo confronto
explícito contra os opressores se desdobra em forma e conteúdo.
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Virtual de Aprendizagem) e participe!
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Resumo_Unidade IV
Outro aspecto que mereceu nossa atenção foram os traços das poéticas
das literaturas africanas de língua portuguesa de modo geral. Buscamos refletir de
modo mais amplo sobre as diferentes literaturas dentro de um viés crítico que
permitisse encontrar divergências e convergências entre os sistemas literários em
questão.
Também nos preocupamos em discutir os cânones literários, uma vez que é urgente
os professores alargarem os horizontes literários, a fim de que seja possível
trabalhar de modo instigante em sala de aula as literaturas em questão. Muitas são
as aproximações entre as literaturas do continente africano e o Brasil a começar
pela própria formação de nosso país. Como se não bastasse, a Lei 11.645 (antiga
10.639) não deixa margem para o desafio de que se reveja e se transforme o ensino
da literatura seja nos cursos superiores, médio ou fundamental. Por isso,
propusemos um momento dedicado ao que chamamos de “práxis literária”, ou seja,
ao que vemos como práticas pedagógicas viáveis para os alunos do ciclo básico.
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