Livro - Biotecnologia Ética e Saúde PDF

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Biotecnologia, ética e saúde

Marcelo Fernandes da Silva

Aldo Matos

Isabel Cristina Rezende Lopes

Lilian Margareth Biagioni de Lima

Mariana Beatriz Guimarães de Ávila

Karine Rezende de Oliveira

Tiago Zanquêta de Souza


© 2012 by Universidade de Uberaba

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser


reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio,
eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de
sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização,
por escrito, da Universidade de Uberaba.

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Assessoria Técnica:
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Produção de Material Didático:


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Editoração:
Supervisão de Editoração
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Capa:
Toninho Cartoon

Edição:
Universidade de Uberaba
Av. Nenê Sabino, 1801 – Bairro Universitário

Catalogação elaborada pelo Setor de Referência da Biblioteca Central UNIUBE

B52 Biotecnologia, ética e saúde / Marcelo Fernandes da Silva ... [et al.]. –
Uberaba : Universidade de Uberaba, 2012.
272 p. : il.

ISBN 978-85-7777-470-8

1. Biotecnologia. 2. Bioética. 3. Ética. I. Silva, Marcelo Fernandes da. II. Matos,


Aldo. III. Lopes, Isabel Cristina Rezende. IV. Lima, Lilian Margareth Biagioni de. V.
Ávila, Mariana Beatriz Guimarães de. VI. Oliveira, Karine Rezende de. VII. Souza,
Tiago Zanquêta de. VII. Universidade de Uberaba.

CDD: 660.6
Sobre os autores
Marcelo Fernandes da Silva

Doutor em Imunologia Básica e Aplicada e mestre em Imunologia


Básica e Aplicada pela Universidade de São Paulo (USP). Bacharel
em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual Paulista Júlio
de Mesquita Filho (Unesp).

Aldo Matos

Mestre em Imunologia e Parasitologia Aplicadas pela Universidade


Federal de Uberlândia (UFU). Possui graduação em Farmácia e
Bioquímica pela Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), gradu-
ação em Licenciatura em Ciências Biológicas pela Universidade de
Uberaba (Uniube), graduação em Programa Especial de Formação
Pedagógica R2-Biologia pelo Centro Universitário Claretiano de Ba-
tatais. É professor de ensino superior da Universidade de Uberaba
(Uniube). Tem experiência na área de Parasitologia, com ênfase
em Protozoologia Parasitária Humana, atuando principalmente nos
seguintes temas: epidemiologia, Trypanosoma cruzi, assistência
de enfermagem, calazar humano e chagas disease.

Isabel Cristina Rezende Lopes

Mestrado em Patologia Clínica pela Universidade Federal do Tri-


ângulo Mineiro (UFTM). Graduação em Ciências Biológicas pela
Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Professora da Univer-
sidade de Uberaba (Uniube), dos componentes curriculares: Ca-
sos Clínicos, Bioquímica Clínica do curso de Biomedicina, Exames
Complementares para o curso de Enfermagem e Ciências Morfo-
lógicas para o curso de Medicina. Professora orientadora do nú-
cleo de professores do PIAC (Programa Institucional de Atividades
Complementares).

Lílian Margareth Biagioni de Lima

Mestre em Ciências-Patologia Geral e especialista em Metodolo-


gia do Ensino de Ciências pela Universidade Federal do Triângulo
Mineiro (UFTM). Possui graduação em Ciências Biológicas (Licen-
ciatura e Bacharelado), pela Universidade Estadual Paulista Julio
de Mesquita Filho (Unesp) e aperfeiçoamento em Patologia (So-
rodiagnóstico) pelo Departamento de Patologia (Unesp-Botucatu).
Professora da Universidade de Uberaba (Uniube). Membro da Pró-
-Reitoria de Ensino Superior desta IES. Professora nos cursos da
área da educação e da saúde nos conteúdos de Fisiologia Humana
e Patologia Geral, atuando principalmente nos seguintes temas:
Patologia Geral e Orientação de TCC. Coordenadora Pedagógica
do Pró-Saúde II (Uniube).

Mariana Beatriz Guimarães de Ávila

Mestre em Medicina Tropical e Infectologia pela Universidade Fe-


deral do Triângulo Mineiro (UFTM). Especialista em Biologia Mole-
cular e Biotecnologia pela Universidade de Franca (Unifran). Gra-
duada em Ciências Biológicas pela PUC, de Campinas. Docente
da Universidade de Uberaba (Uniube). Coordenadora do Curso de
Pós-graduação em Biologia Celular e Molecular, do curso de Ex-
tensão Ciência, Saúde e Inovação, do curso de Extensão Saúde
em Foco e da Liga Acadêmica de Biologia Molecular desta univer-
sidade.
Karine Rezende de Oliveira

Pós-Doutorado em Medicina Tropical e Infectologia, ênfase em


Imunologia e Parasitologia. Doutora em Medicina Tropical e Infec-
tologia pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM).
Mestre em Biologia Celular pela Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG) e graduada em Ciências Biológicas (Licenciatu-
ra plena e Bacharelado) pela Universidade Federal de Uberlân-
dia (UFU). Professora adjunta II, responsável pelas disciplinas de
Imunologia e Parasitologia na Universidade Federal de Uberlândia
(UFU) e na Faculdade de Ciências Integradas do Pontal (FACIP).
Coordena projetos envolvendo parasitoses intestinais e sua identi-
ficação biológica.

Tiago Zanquêta de Souza

Especialista em Docência do Ensino Superior pelas Faculdades In-


tegradas de Jacarepaguá (FIJ). Especialista em Gestão Ambiental
também pelas FIJ. Graduado em Licenciatura em Ciências Biológi-
cas pela Universidade de Uberaba (Uniube). Professor dos cursos
de Engenharia Ambiental (presencial/EAD), Engenharia Civil, En-
genharia de Produção e Engenharia Elétrica (EAD). Professor-tutor
do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas. Professor-tutor
na Formação Comum, nos cursos de Licenciatura em Ciências Bio-
lógicas, Geografia, História, Letras, Matemática e Química (EAD),
desta universidade. Professor de Biologia no Ensino Médio e de
Curso Preparatório para Vestibular, da rede particular de ensino.
Sumário
Apresentação................................................................................................... XI

Capítulo 1 Alterações celulares e doenças causadas


por protozoários......................................................... 1
1.1 Protozoários intestinais..................................................................................3
1.1.1 Protozoários com habitat no intestino delgado.....................................4
1.1.2 Protozoários com habitat no intestino grosso.......................................9
1.2 Protozoários sanguíneos e tissulares..........................................................15
1.3 Distúrbios locais da circulação.....................................................................32
1.3.1 Hiperemia............................................................................................32
1.3.2 Hemorragia..........................................................................................37
1.3.3 Edema.................................................................................................44
1.3.4 Trombose............................................................................................46
1.3.5 Embolia...............................................................................................52
1.3.6 Infarto..................................................................................................55
1.3.7 Choque................................................................................................59
1.4 Resposta imunológica aos parasitos............................................................61
1.4.1 Resposta imune adaptativa aos parasitos..........................................61
1.4.2 Imunoematologia.................................................................................62

Capítulo 2 Alterações celulares e doenças causadas por


metazoários, imunologia dos tumores e doença
autoimune................................................................. 67
2.1 Doenças causadas por nematelmintos........................................................69
2.1.1 Nematelmintos intestinais que realizam o Ciclo de Loss....................71
2.1.2 Nematelmintos intestinais que não passam pelos pulmões................77
2.1.3 Nematelmintos sanguíneos e teciduais...............................................80
2.2 Doenças causadas por platelmintos ...........................................................81
2.2.1 Taenia solium e Taenia saginata.........................................................82
2.2.2 Hymenolepis nana...............................................................................85
2.2.3 Echinococcus granulosus....................................................................86
2.2.4 Schistosoma mansoni.........................................................................88
2.3 Profilaxia e controle das verminoses intestinais...........................................93
2.4 Crescimento e diferenciação celular............................................................95
2.4.1 Regulação do crescimento celular......................................................96
2.4.2 Distúrbios do crescimento celular.......................................................98
2.4.3 Alterações da diferenciação celular...................................................106
2.4.4 Alterações do crescimento e da diferenciação celular......................109
2.4.5 Doenças autoimunes.........................................................................123
VIII UNIUBE

Capítulo 3 Biotecnologia clássica.......................................... 127


3.1 Conceitos em Biotecnologia.......................................................................128
3.2 Implicações éticas da Biotecnologia..........................................................132
3.3 História da Biotecnologia............................................................................133
3.4 Fundamentos das técnicas de Biotecnologia clássica...............................135
3.4.1 Fermentação.....................................................................................136
3.4.2 Antibióticos........................................................................................140
3.4.3 Fixação biológica de nitrogênio.........................................................142
3.4.4 Cultura de tecidos.............................................................................143
3.4.5 Vacinas..............................................................................................145
3.5 Melhoramento genético vegetal.................................................................149
3.6 Melhoramento genético animal..................................................................153
3.7 Produção de biodiesel................................................................................155

Capítulo 4 Biotecnologia moderna: técnicas......................... 163


4.1 Considerações gerais sobre a Biotecnologia.............................................164
4.2 Técnicas de análise molecular...................................................................167
4.2.1 Sequenciamento de DNA..................................................................167
4.2.2 Fragmentação do DNA por enzimas de restrição.............................169
4.2.3 Clonagem de DNA com a utilização de plasmídeos.........................170
4.2.4 Construção de “biblioteca de genes” de células eucariontes............171
4.2.5 Separação de fragmentos de restrição por eletroforese e
“Southern Blotting”............................................................................172
4.2.6 Reação em Cadeia da Polimerase (PCR).........................................173
4.2.7 Técnica de hibridização in situ de ácidos nucleicos..........................175
4.3 Estudo de células vivas..............................................................................176
4.3.1 Cultivo celular....................................................................................176
4.4 Recuperação de espécies em extinção.....................................................178
4.5 Influência das técnicas de Biotecnologia na formação do professor de
Ciências Biológicas....................................................................................179
4.5.1 Craig Venter – a história do homem que está mudando o mundo....179
4.5.2 Criando a vida artificialmente............................................................181
4.6 A vida artificial e seus novos desafios........................................................184

Capítulo 5 Aplicações da Biotecnologia moderna................ 191


5.1 Aplicações da Biotecnologia moderna.......................................................194
5.1.1 Vacinas gênicas.................................................................................194
5.1.2 Aplicações na medicina humana.......................................................197
5.2 Reprodução assistida.................................................................................199
5.2.1 Inseminação Artificial ou IUI (Intra-Uterine Insemination).................201
5.2.2 Fertilização in vitro ou IVF (In Vitro Fertilization)...............................202
5.2.3 Injeção intracitoplasmática de espermatozoides, microinjeção
ou ICSI (Intracytoplasmatic Sperm Injection)....................................202
5.2.4 Transferência intratubária de gametas ou GIFT (Gamete
Intrafallopian Transfer)......................................................................203
5.3 RNA de interferência..................................................................................204
5.3.1 Aplicações do RNAi...........................................................................208
5.4 Clonagem...................................................................................................209
UNIUBE IX

5.4.1 Clonagem natural..............................................................................211


5.4.2 Clonagem induzida............................................................................211
5.4.3 Clonagem terapêutica.......................................................................211
5.4.4 Benefícios da clonagem....................................................................212
5.4.5 Riscos da clonagem..........................................................................212
5.5 Células-tronco............................................................................................212

Capítulo 6 Ética e bioética: uma questão de conduta e


responsabilidade................................................... 223
6.1 Construindo a definição de valor, moral, eticidade, ética e direito.............226
6.1.1 Valor..................................................................................................227
6.1.2 Moral.................................................................................................228
6.1.3 Ética..................................................................................................229
6.1.4 Direito................................................................................................232
6.2 Bioética: origens e definições.....................................................................233
6.2.1 O Código de Nuremberg...................................................................234
6.2.2 Nascimento da Bioética – passo a passo.........................................237
6.3 Modelos bioéticos diversos........................................................................239
6.3.1 Ética descritiva e modelo sociobiológico...........................................239
6.3.2 Subjetivista ou liberal-radical.............................................................240
6.3.3 Pragmático-utilitarista........................................................................240
6.3.4 Modelo personalista..........................................................................241
6.4 Bioética como componente curricular........................................................242
6.4.1 O código de ética do biólogo.............................................................243
6.5 Temas relevantes em Bioética....................................................................244
6.5.1 Eutanásia..........................................................................................244
6.5.2 Aborto................................................................................................247
6.5.3 Pena de morte...................................................................................248
6.5.4 Células-tronco...................................................................................250
6.5.5 Reprodução humana assistida..........................................................251
6.5.6 Intervenções terapêuticas na gestação.............................................252
6.5.7 Clonagem..........................................................................................253
6.5.8 Doação e transplante de órgãos.......................................................253
Apresentação
Caro(a) aluno(a).

Este é o livro Biotecnologia, Ética e Saúde. Com ele, encerramos


a série de livros que compõem o nosso curso. Foram seis etapas
nas quais você teve a oportunidade de conviver com uma gama de
conhecimentos que constituem o elenco das disciplinas necessárias
à sua formação docente. A trajetória foi longa e, possivelmente, você
enfrentou inúmeros obstáculos até chegar aqui. Mas, estamos certos
de que valeu a pena todo o esforço!

Neste livro, nos dois primeiros capítulos, você entrará em contato,


inicialmente, com algumas doenças parasitárias. As parasitoses
assumem grande importância nos países subdesenvolvidos e
naqueles em desenvolvimento, porque sua ocorrência e suas
consequências estão diretamente relacionadas às condições de vida
da população: condições sanitárias, hábitos alimentares, cultura e
acesso a serviços, entre outros. Para tanto, não podemos perder de
vista tudo o que já foi estudado sobre agressão, defesa, adaptação e
doença. É o momento de articular todos esses conhecimentos!

Em seguida, no terceiro capítulo, você conhecerá a fundamentação


e aplicação das técnicas de biotecnologia clássica nas diferentes
áreas do conhecimento biológico, tendo a oportunidade de, ao final
dos estudos, saber explicá-las, interpretá-las, aplicá-las e posicionar-
se, criticamente, em relação aos princípios da ética na pesquisa
científica.

Os capítulos 4 e 5 abordam aspectos da biotecnologia moderna.


No capítulo 4, após uma visão geral sobre a biotecnologia, serão
descritas algumas técnicas de análise, bem como será vista a
importância dessas técnicas na formação do professor de Ciências
XII UNIUBE

Biológicas. O capítulo 5 volta-se principalmente para as aplicações da


biotecnologia moderna. Com essas aplicações, você compreenderá
os avanços da biotecnologia, bem como terá oportunidade de refletir
sobre a importância dessas aplicações, visando assim, a formação
de um crivo científico em cada aluno; reconhecer a importância
e o impacto da reprodução assistida, tanto da ciência, quanto na
sociedade; compreender a importância sociocultural da inovação
da clonagem e transgênicos, bem como avaliar o impacto de novas
tecnologias.

O capítulo 6, que encerra o livro, ocupa-se da ética e da bioética.


Neste capítulo, você irá reconhecer a importância dessa ciência nos
diferentes contextos da atualidade. Além disso, irá ter acesso às
diretrizes e declarações envolvidas na compilação dos documentos
da bioética e, também, conhecer o código de ética do biólogo.

Agora é com você! Esperamos que os estudos feitos por você ao


longo dessa trajetória tenham sido proveitosos e que você se sinta
preparado para enfrentar com mais desenvoltura e autoconfiança
os desafios do mercado de trabalho. Nossa expectativa é que
tenhamos contribuído positivamente para a sua formação pessoal e
profissional.

Bons estudos!
Capítulo
Alterações celulares e
doenças causadas
1
por protozoários
Aldo Matos
Isabel Cristina Rezende Lopes
Lilian Margareth Biagioni de Lima

Introdução
As parasitoses assumem grande importância nos países sub-
desenvolvidos e naqueles em desenvolvimento, porque sua
ocorrência e suas consequências estão diretamente relacio-
nadas às condições de vida da população: condições sanitá-
rias, hábitos alimentares, cultura e acesso a serviços, entre
outros. Para facilitar nosso estudo, deixaremos a abordagem
dos fatores sociais envolvidos na ocorrência das doenças para
outro momento. Agora, nossa atenção será voltada para os
fatores biológicos que condicionam a ocorrência e a gravida-
de das doenças parasitárias. Para tanto, não podemos perder
de vista tudo o que já foi estudado sobre agressão, defesa,
adaptação e doença. É o momento de articular esses conhe-
cimentos!

Começaremos estudando as doenças causadas por proto-


zoários parasitas, que são objeto de estudo desse capítulo.
As doenças causadas por helmintos são estudadas em ou-
tro capítulo. Você já teve oportunidade de estudar sobre os
vermes, aprendendo sua morfologia e classificação. Agora,
nosso enfoque será outro. Estudaremos como esses vermes
invadem e agridem nosso organismo, como se desenvolvem
as alterações celulares e doenças causadas por eles e, tam-
bém, como nosso organismo reage à presença desses agen-
tes estranhos e às agressões que eles promovem. Em alguns
aspectos, aparentemente não haverá muitas novidades. Mas,
não se engane! É preciso atenção a algumas particularidades
de cada agente e doença.
2 UNIUBE

Objetivos
Ao final do estudo desse capítulo, esperamos que você seja
capaz de:

• citar os mecanismos de infecção dos metazoários


abordados;
• descrever o ciclo evolutivo dos metazoários estudados;
• citar os quadros clínicos causados pelos metazoários
estudados;
• citar as medidas de prevenção e controle das parasito-
ses estudadas;
• explicar os distúrbios locais da circulação;
• descrever os fatores responsáveis pelo surgimento de
cada distúrbio;
• explicar o mecanismo de ação dos fatores na gênese de
cada distúrbio;
• explicar as alterações morfológicas macro e microscó-
picas dos tecidos/órgãos com cada um dos distúrbios;
• explicar as consequências de cada distúrbio ao orga-
nismo;
• demonstrar as evoluções apresentadas por cada um dos
distúrbios.

Esquema
1.1 Protozoários intestinais
1.1.1 Protozoários com habitat no intestino delgado
1.1.2 Protozoários com habitat no intestino grosso
1.2 Protozoários sanguíneos e tissulares
1.3 Distúrbios locais da circulação
1.3.1 Hiperemia
1.3.2 Hemorragia
1.3.3 Edema
1.3.4 Trombose
UNIUBE 3

1.3.5 Embolia
1.3.6 Infarto
1.3.7 Choque
1.4 Resposta imunológica aos parasitos
1.4.1 Resposta imune adaptativa aos parasitos
1.4.2 Imunoematologia

1.1 Protozoários intestinais

Diferente dos helmintos, entre os quais apenas o Strongyloides


stercoralis e o Trichuris trichiura causam diarreia, todos os proto-
zoários parasitos intestinais podem causar diarreia. Portanto, sob os
aspectos clínicos e de saúde coletiva, esse é um grupo de parasitos
que chama a atenção.

As formas evolutivas presentes na maioria dos protozoários intesti-


nais são duas: os cistos e os trofozoítos.

Os cistos são as formas infectantes, que saem nas fezes da pessoa


infectada e devem ser ingeridas para iniciar a infecção. Essas
formas contêm um ou mais trofozoítos jovens e têm uma parede
espessa, que lhe confere resistência às variações do meio ambiente,
semelhante ao que se observa nos ovos dos vermes.

Já os trofozoítos são as formas vegetativas, encontradas parasitando


o intestino do hospedeiro. Sua multiplicação ocorre, na maioria dos
protozoários, por divisão binária, aumentando a carga parasitária.

PARADA OBRIGATÓRIA

Nas verminoses, só é possível aumentar a carga parasitária por meio


das reinfecções, porque os vermes não se multiplicam no organismo
do hospedeiro. Nas protozooses, apesar de também acontecerem as
reinfecções, o fato dos protozoários multiplicarem-se no hospedeiro já
é suficiente para aumentar a carga parasitária.
4 UNIUBE

Ao estudar metazoários, você terá a oportunidade de verificar que


diarreia não significa “fezes aquosas”, mas, sim, um aumento na
frequência de evacuações. As características das diarreias que se
originam no intestino delgado são diferentes daquelas das diarreias
que se originam no intestino grosso. Considerando essas distinções,
vamos agrupar os protozoários intestinais em protozoários com
habitat no intestino delgado e protozoários com habitat no intestino
grosso.

Então, vamos aos nossos estudos!

1.1.1 Protozoários com habitat no intestino delgado

A Giardia lamblia e os coccídeos intestinais, tais como o Cryp-


tosporidium sp e a Cystoispora belli podem causar, por meio de
mecanismos diferentes, quadros de diarreia muito semelhantes. De
fato, toda diarreia que tenha origem no intestino delgado apresenta
as seguintes características gerais:

• aquosa;
Lienteria
• volumosa;
Presença de
pedaços de • há lienteria;
alimentos não
digeridos nas • há flatulência;
fezes.
• há odor fétido;
• há cólicas periumbilicais.

A fisiopatologia para essa diarreia consiste nas alterações da digestão


dos alimentos e na absorção dos nutrientes. É no intestino delgado
que acontece a maior parte da digestão e a absorção dos nutrientes.
Portanto, as agressões nessa região do tubo digestivo interferem na
digestão e, consequentemente, na absorção.

Dois nutrientes, em especial, estão envolvidos nesse processo: os


açúcares e as proteínas. Os excedentes desses nutrientes, que
não foram adequadamente digeridos e absorvidos, permanecem
na luz do intestino, retendo água. O maior volume na luz intestinal,
somado à ação de mediadores químicos da inflamação, acelera
o movimento peristáltico. A maior quantidade de água retida na
UNIUBE 5

luz do intestino proporciona as características de fezes aquosas e


volumosas. Já a deficiência da digestão, ocasionada pela agressão
feita pelo parasito e pela inflamação, é responsável pela lienteria. A dor
característica de processos inflamatórios é responsável pelas cólicas
periumbilicais. A flatulência deve-se à fermentação, por bactérias do
intestino grosso, do excesso de açúcares e proteínas oriundos do
intestino delgado. As bactérias do intestino grosso produzem CO2 a
partir dos açúcares e H2S, quando utilizam as proteínas como fonte
de energia. O H2S, especificamente, é responsável pelo odor fétido,
lembrando enxofre, ou na linguagem popular, parecendo cheiro de
“ovo podre”.

Agora, que já conhecemos a fisiopatologia das diarreias de intestino


delgado, vamos conhecer um pouco sobre os protozoários que
podem causá-las.

Giardia lamblia

No gênero Giardia, são encontrados protozoários flagelados que pa-


rasitam o intestino de diferentes animais. As dificuldades para deter-
minar precisamente as espécies isoladas de diferentes hospedeiros,
têm dificultado o esclarecimento de seu po-
tencial zoonótico. Então, as denominações
Giardia lamblia, Giardia duodenalis e Giar- Potencial
zoonótico
dia intestinalis, têm sido utilizadas como si-
nônimos, representando esses parasitos de Potencial para
a doença ser
humanos. Em nosso estudo, utilizaremos o transmitida entre
nome de Giardia lamblia. No que diz respei- animais e humanos.
to à epidemiologia da infecção, a giardíase é
apontada como a protozoose intestinal mais
prevalente.

O ciclo biológico desse parasito (Figura 1) tem a particularidade de


que a Giardia lamblia não forma cistos continuamente. Sendo assim,
intercala períodos com eliminação de cistos nas fezes, e períodos
em que, apesar da presença dos trofozoítos (Figura 2) nas fezes,
não ocorre formação de cistos, que, portanto, não serão ali encontra-
dos. Essa característica propicia um alto índice de resultados falso-
-negativos para giardíase, nos exames parasitológicos de fezes.
6 UNIUBE

Figura 1: Ciclo evolutivo da Giardia lamblia.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Na Figura 1, vemos o ciclo evolutivo da Giardia lamblia. 1) Cistos


e trofozoítos são eliminados nas fezes e ficam no ambiente,
contaminando alimentos, água, utensílios. 2) O homem ingere
cistos da Giardia lamblia presentes em alimentos, água e objetos
contaminados. 3) Formas de vida da Giardia lamblia (cisto e
trofozoítos) se reproduzem no intestino do hospedeiro.

Figura 2: Trofozoítos de Giardia sp corados pelo Giemsa.


Foto: Aldo Matos.
UNIUBE 7

IMPORTANTE!

Qualquer exame laboratorial tem sua margem de erro, que, em parte,


depende da técnica de execução.

Entre seus quadros clínicos mais marcantes, encontramos a


diarreia típica de intestino delgado e a síndrome dispéptica, também
conhecida como síndrome pseudoulcerosa. Essa síndrome, que
também ocorre na estrongiloidíase, simula os sinais e sintomas de
uma gastrite ou uma úlcera duodenal.

Além das características próprias das diarreias iniciadas no intestino


delgado, na giardíase também pode ser encontrada esteatorreia,
que significa presença de gordura nas fezes. Isso ocorre porque os
trofozoítos desse parasito ficam aderidos sobre a mucosa duodenal,
um ao lado do outro, formando uma barreira mecânica, como um
tapete, que impede a absorção dos lipídeos. Assim, também é
explicada baixa absorção de vitaminas lipossolúveis (A, D, E, K) nos
portadores de giardíase.

Cryptosporidium sp e Cystoisospora belli

Esses protozoários pertencem à classe Coccidia, do filo Apicom-


plexa. Portanto, têm algumas particularidades em sua biologia
quando comparados aos outros protozoários intestinais. O seu
ciclo biológico (Figura 3), na verdade, é mais semelhante aos ciclos
evolutivos do Plasmodium sp e do Toxoplasma gondii, ambos
protozoários sanguíneos e tissulares, que estão no mesmo filo do
Cryptosporidium sp e a Cystoisospora belli, também relatada como
Isospora belli. Entre as características marcantes do ciclo biológi-co
desses parasitos, estão:

• a alternância de gerações, o que significa que o parasito pre-


cisa realizar uma fase de reprodução assexuada e outra de
reprodução sexuada para completar seu ciclo evolutivo;
• a infecção acontece pela ingestão do oocisto esporulado,
que é uma forma evolutiva produzida na fase de reprodução
assexuada.
8 UNIUBE

Figura 3: Ciclo evolutivo do Criptosporidium sp.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Na Figura 3, vemos o ciclo evolutivo do Criptosporidium sp.:1)


Eliminação dos oocistos com as fezes; 2) Contaminação da água e
de alimentos; 3) Ingestão de alimentos e água contaminados com
oocistos; 4) Ciclo do Criptosporidium sp no interior do intestino do
hospedeiro.

No caso da infecção por C. belli, os oocistos (Figuras 4 e 5) não


são eliminados continuamente nas fezes – um padrão semelhante
ao observado na eliminação de cistos na giardíase.

Figura 4: Oocisto de Cystoisospora belli, corado pela carbol-fucsina.


Figura 5: Oocistos de Criptosporidium sp, corados pela carbol-fucsina.
Foto: Aldo Matos.
UNIUBE 9

Do ponto de vista clínico, a diarreia causada por esses dois coccídeos


intestinais é semelhante àquela causada pela Giardia lamblia.
Porém, essa diarreia é mais comum nas crianças e com evolução
autolimitada. Isto é, a criança tem a infecção por esses parasitos,
apresenta diarreia, mas, cura-se sozinha. Cada episódio de infecção
por esses coccídeos leva à produção de resposta imunológica de
defesa. Portanto, entre adultos, a diarreia causada por coccidios
intestinais é uma doença oportunista que acomete os pacientes
imunodeprimidos.

CURIOSIDADE

Apesar de serem infecções relativamente comuns entre crianças,


as coccidioses intestinais só ganharam importância na área clínica
com o advento da AIDS. Isso porque essas infecções podem evoluir
tão gravemente no paciente imunodeprimido, que chegam a fazê-lo
perder até 20 litros de líquido por dia na diarreia, quando não tratados
adequadamente. Em quadros tão graves, essas infecções podem
matar o paciente imunodeprimido.

1.1.2 Protozoários com habitat no intestino grosso

A Entamoeba histolytica e o Balantidium coli são protozoários que


habitam o intestino grosso e podem causar uma diarreia mucos-
sanguinolenta. O excesso de produção de muco parece ser uma
resposta inespecífica contra agentes agressores na mucosa. Já o
sangue, que nesse caso é encontrado vivo, ou seja, vermelho, nas
fezes, é resultado da hemorragia decorrente das lesões provocadas
pelos protozoários parasitos, na mucosa do intestino grosso. Como
no intestino grosso não há digestão, o sangue sai com a cor ver-
melha normal. As lesões, ulcerações mesmo, causadas por esses
parasitos, concentram-se na região cecal e no retossigmoide. Isso
explica as cólicas nas fossas ilíacas, que acompanham a diarreia
mucossanguinolenta.

Agora, vamos conhecer um pouco sobre esses parasitos.


10 UNIUBE

Entamoeba histolytica

Ameba é um termo geral que engloba diferentes gêneros e espécies


de protozoários, sejam parasitos ou de vida livre, a maioria são
sarcodinas e outros sarcomatigóforas. Entre as amebas intestinais,
ou seja, aquelas que podem ser encontradas no intestino grosso
estão: Entamoeba coli, Entamoeba histolytica, Entamoeba dispar,
Entamoeba hartmanni, Endolimax nana e Idamoeba butschlii, todas
sarcodinas. Destas, apenas a Entamoeba histolytica é considerada
parasito e pode causar diarreia mucossaguinolenta. As demais são
consideradas comensais e sua presença no intestino, diagnosticada
pelo encontro dos seus cistos nas fezes do hospedeiro, denuncia
que essa pessoa está ingerindo água e alimentos contaminados
com matéria fecal. Essa condição coloca o indivíduo sob o risco de
adquirir qualquer infecção com mecanismo de infecção fecal-oral.

As duas amebas comensais cuja morfologia mais se confunde com


a Entamoeba histolytica, são a E. coli e a E. dispar. No Quadro 1, a
seguir, está a comparação entre a E. histolytica e a E. coli, segundo
alguns critérios morfológicos.

Quadro 1: Comparação entre a morfologia da Entamoeba histolytica e da Entamoeba coli

Características Entamoeba histolytica Entamoeba coli


Hemácias no citoplasma Às vezes presentes Ausentes
Cariossoma Central Excêntrico
Número de núcleos no cisto Até quatro Até oito
Formato do corpo cromatoide Bastonete Feixes ou agulhas
Fonte: Aldo Matos.

SAIBA MAIS

No quadro anterior, há duas palavras que precisam ser esclarecidas:

Cariossoma
Região de grande concentração de cromatina condensada no núcleo.
Corpo cromatoide
Corpo encontrado no citoplasma que, na verdade, é uma reserva de
nutrientes.
UNIUBE 11

A Entamoeba dispar tem a morfologia idêntica à Entamoeba


histolytica.

IMPORTANTE!

Sabemos que apenas a E. histolytica pode invadir a mucosa intestinal.


Porém, 90% dos casos de infecção por essa espécie são assintomáticos.
Então, uma vez que as espécies E. histolytica e E. dispar são idênticas,
temos o seguinte questionamento: como saber qual das duas amebas é
o agente de uma infecção assintomática, em que são encontrados cistos
com quatro núcleos nas fezes do paciente? Essa é uma questão que os
pesquisadores tentam resolver, com o apoio financeiro da Organização
Mundial da Saúde.

Com relação à E. histolytica, especificamente, é preciso considerar


que uma chegando à luz do intestino grosso, os trofozoítos que
desencistaram no intestino delgado podem seguir dois caminhos
que determinam se o ciclo será patogênico ou não patogênico.

No ciclo não patogênico, os trofozoítos permanecem na luz do intestino


grosso, alimentando-se de bactérias da flora e resíduos de nutrientes
presentes no bolo fecal e multiplicando-se por divisão binária. Existe
um limite para a população de trofozoítos na luz intestinal e, por
isso, diariamente alguns trofozoítos encistam, originando os cistos
encontrados nas fezes do hospedeiro assintomático.

No ciclo patogênico (Figura 6), os trofozoítos invadem a luz do


intestino, gerando as úlceras em forma de botão de camisa (com
a entrada estreita e base larga). Nesse ciclo, não há formação de
cistos. Portanto, encontram-se apenas os trofozoítos nas fezes. Em
menos de 1% dos casos, os trofozoítos podem chegar à circulação
sanguínea a partir das ulcerações e assim, alcançar o fígado, os
pulmões e cérebro. Também é possível que os trofozoítos promovam
lesões na pele da região perianal.
12 UNIUBE

Figura 6: Ciclo evolutivo da Entamoeba histolytica.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Veja, na Figura 6, o ciclo evolutivo da Entamoeba histolytica. Note as


duas possibilidades: formar trofozoíto invasor ou formar cistos.

A determinação de invadir ou não a mucosa intestinal depende tanto


das características bioquímicas e genéticas do parasito, quanto
de fatores do hospedeiro, tais como dieta, estado da resposta
imunológica, composição da flora intestinal, entre outros.

O que pode confundir os que têm pouca intimidade com a biologia


da E. histolytica é a interpretação dos exames parasitológicos de
fezes. Podemos dizer que, nos casos assintomáticos, encontramos
os cistos do parasito nas fezes. Já, nos casos sintomáticos, com
diarreia mucossanguinolenta, encontramos os trofozoítos do
protozoário nas fezes. Acontece que os trofozoítos de parasitos
intestinais resistem pouco tempo (menos de uma hora) no ambiente.
Então, para encontrá-los, é preciso examinar as fezes diarreicas
recém-eliminadas, o que não condiz com prática rotineira nos
laboratórios de análises clínicas. Assim, está explicado porque
alguns dizem ser difícil diagnosticar a amebíase sintomática.

Os mecanismos de lesão na amebíase têm relação com a resposta


imunológica. Uma explicação para estas lesões é que, enquanto
nosso organismo monta a resposta imunológica adaptativa contra
UNIUBE 13

a ameba, o parasito lança alguns de seus antígenos de superfície


para o meio externo. Esses antígenos aderem-se à superfície das
células do hospedeiro. Quando os anticorpos formados chegam ao
local da agressão, ou seja, na mucosa, encontram os antígenos na
superfície das células do hospedeiro. Ocorre a ligação antígeno-
anticorpo e as células citotóxicas, que reconhecem a fração Fc
das imunoglobulinas, ligam-se nesse imunocomplexo e acabam
por fazer a lise das células do hospedeiro. Esse mecanismo é uma
citotoxidade mediada por anticorpos, em que o anticorpo marca o
alvo para a célula citotóxica matar. Na amebíase, o parasito desvia a
citotoxidade para destruir as células do hospedeiro e, depois, fagocita
tudo que lhe interessar dentre os resíduos das células lisadas. Como
você pode perceber, a Entamoeba histolytica é um parasito bastante
interessante e com estratégias muito bem elaboradas para escapar
da resposta imunológica.

Balantidium coli

Esse é um protozoário ciliado que possui um macronúcleo rinifor-me e


um micronúcleo. Duas espécies podem ser encontradas parasitando
suínos: B. coli e B. suis. O parasito Balantidium coli (Figura 7) já foi
isolado dos seguintes hospedeiros: suínos, humanos, chimpanzés,
várias espécies de macacos e, com menor frequência, em ratos,
cães e cobaias.

Figura 7: Trofozoíto de Balantidium coli.


Foto: Acervo EAD-Uniube.
14 UNIUBE

O ciclo evolutivo (Figura 8) é semelhante ao da Entamoeba histolytica.


Mas, o B. coli pode fazer alternância de gerações, reproduzindo-
se por divisão binária ou por conjugação, que é uma forma de
reprodução sexuada.

Figura 8: Ciclo evolutivo do Balantidium coli.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

O fato de esse parasito ter como principal hospedeiro os suínos, leva


alguns autores a considerar a balantidíase uma doença ocupacional,
com maior prevalência entre criadores de suínos. Para que o parasito
invada a mucosa, parece ser necessária alguma doença de base
(doença crônica) debilitante, ou uma lesão preexistente na mucosa do
colo ou do ceco, ou, ainda, a associação com outros parasitos. Essa
característica levou a doença a ser classificada como oportunista.

As infecções geralmente são assintomáticas. Porém, em pacientes


debilitados pode ser grave e com risco de morte. Também, é possível
que o parasito atinja a corrente sanguínea, a partir das lesões no
intestino grosso, e se instale em outros órgãos promovendo lesões
ao associar-se a outros patógenos. Essas lesões extraintestinais são
classificadas como metástases, e talvez as mais frequentes sejam
as lesões pulmonares, onde o Balantidium coli pode ser encontrado
associado a fungos, como os do gênero Aspergillus.
UNIUBE 15

1.2 Protozoários sanguíneos e tissulares

Nesse grupo, encontram-se os protozoários que têm como habitat o


sangue ou os tecidos. Esses microorganismos são bastante estuda-
dos por pesquisadores e clínicos, devido à gravidade dos quadros
que podem causar. Entre os parasitos desse grupo, estudaremos o
Trypanosoma cruzi, o Toxoplasma gondii e os gêneros Leishmania
e o Plasmodium.

O Toxoplasma gondii e o Plasmodium sp são esporozoários (não


possuem estrutura para locomoção), e pertencem ao filo Apicomplexa.
Por isso, têm ciclos evolutivos com alternância de gerações, como
visto nos Cryptosporidium sp e na Cystoisospora belli.

O Trypanosoma cruzi e a Leishmania sp são flagelados, com pre-


sença de cinetoplasto, que pertencem à família Trypanossomatidae,
e que necessitam de um hospedeiro vertebrado e outro invertebrado
para concluir seu ciclo evolutivo.

Passaremos, agora, a conhecer um pouco sobre cada um desses


parasitos e as doenças causadas por eles.

Trypanosoma cruzi

Entre 1907 e 1909, o cientista brasileiro Carlos Ribeiro Justiniano das


Chagas, membro da equipe do sanitarista Oswaldo Cruz, morou em
Lassance, no estado de Minas Gerais, para cumprir a tarefa de chefiar
os trabalhos de controle da malária na região, durante a construção
da ferrovia Central do Brasil. Nesse período, Carlos Chagas, curioso
em descobrir as doenças que ocorriam na região, examinou pessoas
e animais da localidade. Assim, descobriu o Trypanosoma cruzi,
primeiramente em insetos hemípteros hematófagos - conhecidos
como “barbeiros ou chupanças”- e, posteriormente, no sangue de uma
criança. A partir de então, Carlos Chagas descreveu em seus estudos
uma doença e um parasito até então desconhecidos. Em uma trajetória
rara na história das ciências da saúde, esse pesquisador descreveu
o agente etiológico, o vetor, os ciclos biológicos, as principais formas
clínicas da doença, bem como indicou meios para o seu diagnóstico
e tratamento.
16 UNIUBE

A doença de Chagas era inicialmente uma infecção que circulava


entre os animais silvestres. Com a ocupação do meio natural, os
humanos passaram também a ser infectados. O ciclo biológico
completo requer a multiplicação do parasito em dois hospedeiros:
um mamífero e o vetor. Os vetores do T. cruzi são uma diversidade
de gêneros e espécies de hemípteros hematófagos, entre eles o
Triatoma infestans.

Durante o ciclo evolutivo, o parasito assume três formas evolutivas


principais, com as características apresentadas no Quadro 2, a
seguir:

Quadro 2: Características das principais forma evolutivas do T. Cruzi

Forma Capacidade de
Descrição Localização Observações
evolutiva multiplicação
Forma bastante
alongada, com Extracelular.
membrana Encontrada
É a forma
ondulante e no sangue do
infectante para
Tripomas- apresentando Não se hospedeiro
o vetor e para
tigota o cinetoplasto multiplica mamífero, na
o hospedeiro
do lado oposto ampola fecal e
mamífero
ao flagelo livre nas fezes do
e distante do vetor
núcleo
Forma menos
Extracelular.
alongada que a
Encontrada
tripomastigota,
Multiplica-se entre intestino
Epimas- com o Não é capaz de
por divisão médio e o
tigota cinetoplasto do infectar
binária intestino
mesmo lado que
posterior do
o flagelo, livre e
hospedeiro
perto do núcleo

É imóvel porque
Forma esférica, seu flagelo é
Intracelular.
com flagelo interno.
Multiplica-se Encontrada
interno e É a principal
Amastigota por divisão nas células
cinetoplasto forma
binária do hospedeiro
próximo ao relacionada
mamífero
núcleo à destruição
tecidual

Fonte: Aldo Matos.


UNIUBE 17

Essas formas organizam-se no ciclo evolutivo (Figura 9). O parasito


penetra no mamífero como tripomastigota, multiplicando-se
primeiramente nos macrófagos, na forma de amastigotas. Ao fim
de, aproximadamente, 72h, o parasito transforma-se novamente
em tripomastigota, rompe a célula hospedeira e ganha a circula-ção
alcançando outras células em diferentes tecidos. A partir de então, o
parasito passará a repetir continuamente esse ciclo de multiplicação
intracelular na forma de amastigota, e disseminação por meio do
sangue na forma tripomastigota (Figura 10).

Figura 9: Ciclo evolutivo do T. cruzi.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Figura 10: Forma tripomastigota do Trypanosoma cruzi


no sangue circulante, corada pelo Giemsa.
Foto: Aldo Matos.
18 UNIUBE

O estudo do ciclo evolutivo permite identificar os seguintes mecanis-


mos de transmissão da infecção chagásica para mamíferos:

• vetorial – por meio da penetração das formas tripomastigotas,


presentes nas fezes do vetor, na pele lesada ou mucosa íntegra
do hospedeiro mamífero;

• transfusional – por meio das formas tripomastigotas presentes


no sangue transfundido;

• vertical ou congênita – quando formas tripomastigotas, presen-


tes na circulação da gestante chagásica, invadem a circulação
fetal;

• transplante de órgãos – por meio das formas amastigotas pre-


sentes nas células do órgão removido de um doador chagásico.

Também existe possibilidade da transmissão por meio do aleita-


mento materno. Mas, como o risco desse mecanismo ocorrer é muito
baixo, não existe a proibição da mãe chagásica amamentar seu filho.
A repetição de casos de infecção por ingestão de caldo de cana e
de açaí, contendo fezes de barbeiros ou os vetores triturados, tem
alertado para uma possível transmissão por via oral.

Nos primeiros 60 dias de infecção, a quantidade de tripomastigotas


no sangue circulante é alta e o ritmo dos amastigotas é acelerado,
caracterizando a fase aguda da infecção. Após esse período, a
resposta imunológica, que já atua desde o início da infecção, matando
o tripomastigota circulante e destruindo as células parasitadas com
amastigotas, já conseguiu reduzir quantidade de parasitos e seu
ritmo de multiplicação, iniciando a fase crônica.

O principal mecanismo de destruição das formas tripomastigo-


tas é lise mediada pelo complemento com participação do anti-
corpo lítico (uma IgG2a). Já a destruição das formas amastigo-
tas intracelulares, conta com a participação das células NK que
produzem IFN-γ que juntamente com a IL-12 e o TNF-α, produ-
zidos pelos macrófagos, ativam os mecanismos de destruição
UNIUBE 19

de patógenos intracelulares, por meio do NO (óxido nítrico). A


existência de lesões progressivas e fenômenos degenerativos,
mesmo em pacientes na fase crônica da doença, sugerem um me-
canismo autoimune, como se a resposta imune, ao tentar destruir
o parasito, destrua também células não parasitadas do hospedeiro.
Os tecidos em que os parasitos permanecem na fase crônica, ou
seja, aqueles pelos quais o T. cruzi tem tropismo, são o tecido mus-
cular estriado cardíaco (Figura 11), o tecido muscular liso e o tecido
nervoso. Isso explica porque os órgãos que mais apresentam alte-
rações na doença de Chagas crônica são o coração, o esôfago e o
intestino grosso.

Figura 11: Ninho de amastigotas do Trypanosoma


cruzi no miocárdio.
Foto: Aldo Matos.

Considerando a evolução da infecção e as apresentações clínicas,


podemos classificar a doença de Chagas como mostrado no Quadro
3, a seguir:
20 UNIUBE

Quadro 3: Classificação da Doença de Chagas

Fase da
Forma clínica Achados clínicos
infecção
Benigna,
Nenhuma sintomatologia ou sintomatologia
oligossintomática
inexpressiva
ou assintomática

Febre, ascite, hepatomegalia, esplenome-


galia, arritmias cardíacas, miocardite agu-
Grave
da, confusão mental e outros sinais de
lesão no sistema nervoso central
AGUDA
Encontrada na maioria dos pacientes
crônicos. O exame de sangue (sorologia)
Forma detecta a presença de anticorpos contra o
indeterminada T. cruzi. Mas, como o paciente é assintomá-
tico, não é possível determinar qual órgão
está sendo lesado pelo parasito
Arritmias cardíacas, perda de força de
Forma cardíaca contração do miocárdio e aumento da área
cardíaca (cardiomegalia)
Perda de tônus e motilidade e aumento
do calibre do esôfago (megaesôfago) ou
do cólon (megacólon). No primeiro caso, o
paciente tem dificuldade progressiva para
Forma digestiva
engolir (mal do engasgo) e, no segundo,
tende a desenvolver dificuldade para eva-
cuar e obstispação intestinal, podendo
ocorrer formação de fecaloma
CRÔNICA O paciente apresenta, concomitantemente,
Forma mista cardiomegalia e megaesôfago ou megacó-
lon
Ocorre em pacientes com doença de
Chagas crônica, que ficam imunodeprimi-
Exacerbações dos. A imunodepressão permite que o
agudas parasito volte a se multiplicar rapidamente
e que ocorra um quadro semelhante à
forma aguda grave
Fonte: Aldo Matos.
UNIUBE 21

Leishmanias e leishmanioses

As leishmanioses são um conjunto de quadros clínicos causados por


protozoários do gênero Leishmania, e que incluem manifestações
com lesões na pele, nas mucosas e acometimento das vísceras do
Sistema Fagocítico Mononuclear (fígado, baço e medula óssea).
Existe uma diversidade de quadros causados por diferentes
espécies do mesmo gênero, com distribuição geográfica particular.
No Brasil, um dos nomes populares da apresentação tegumentar da
leishmaniose é “úlcera de Bauru”.

Na Figura 12, vemos a úlcera de leishmaniose tegumentar. Note os


bordos levantados, lembrando uma cratera da lua.

Figura 12: Úlcera de leishmaniose tegumentar.


Foto: Acervo EAD-Uniube.

Assim como o Trypanosoma cruzi, as leishmanias necessitam de


um hospedeiro invertebrado para completar seu ciclo evolutivo. Os
diferentes quadros de leishmaniose são causados por diferentes
espécies do gênero Leishmania transmitidas por diferentes espécies
de flebotomíneos, pequenos insetos, semelhantes a mosquitos, com
bastante tríquias (pelos) que picam bastante doído, como a picada
das “mutucas” ou “borrachudos”.
22 UNIUBE

CURIOSIDADE

Apesar de terem a morfologia de mosquitos, os flebotomíneos não são


considerados mosquitos verdadeiros, porque não se multiplicam na
água. Eles se multiplicam em ambientes úmidos como grutas, frestas
de rochas, ocos de troncos de árvores, nos montes de folhas caídas
das árvores etc. Assim como nos mosquitos verdadeiros, apenas as
fêmeas dos flebotomíneos são hematófagas.

Nesse estudo, vamos abordar apenas as leishmanias que ocorrem


no Brasil. Para facilitar seu estudo, preste atenção ao Quadro 4, a
seguir:

Quadro 4: Comparação entre as apresentações clínicas das leishmanioses

Agente
Tipo de Formas Descrição do etiológico mais
Vetores
Leishmaniose clínicas quadro provável no
Brasil
Lesão ulcerada
única, ou poucas
Lu. intermedia
lesões, bordos
Leishmaniose L. brasiliensis Lu. pessoai
levantados e
cutânea L. guyanensis Lu. wellcomei
indolor. Restrita
Lu. whitmani
à derme com
epiderme ulcerada
Leishmaniose Invasão da L. brasiliensis Lu. intermedia
cutaneomucosa mucosa com lesão L. guyanensis Lu. pessoai
na mucosa nasal Lu. wellcomei
Leishmaniose ou oral, podendo Lu. whitmani
tegumentar ocorrer destruição
americana de cartilagem.
História anterior
de ulceração típica
da forma cutânea

Leishmaniose L. amazonensis Lu.


cutânea difusa Paciente com flaviscutellata
lesões múltiplas, Lu. olmeca
nodulares ou nociva
ulceradas

Leishmaniose _________ Paciente com L. chagasi Lu. longipalpis


visceral hepatomegalia e
esplenomegalia,
ascite, febre,
anemia.

Fonte: Aldo Matos


UNIUBE 23

No ciclo evolutivo das leishmanias, o parasito apresenta apenas


duas formas evolutivas principais:

a) promastigota - uma forma flagelada alongada, com o cine-


toplasto do mesmo lado, em relação ao núcleo, o flagelo livre
e distante do núcleo do parasito. Esta é a forma infectante
encontrada na saliva do vetor;

b) amastigota - com morfologia semelhante aos amastigotas do


T. cruzi, é encontrada nas áreas lesadas: bordos das úlceras
na forma cutânea e cutâneo difusa, na mucosa acometida na
forma cutaneomucosa e no fígado, medula óssea e baço na
leishmaniose visceral.

O vetor da leishmaniose é conhecido popularmente como “mosquito


cangalhinha”, representado na Figura 13. No entanto, apenas a
fêmea (Figura 14a) transmite o parasito para vertebrados. O macho
desse mosquito pode ser visualizado na Figura 14b).

Figura 13: Vetor de Leishmaniose, conhecido


popularmente como “mosquito cangalhinha”.
Fonte: Acervo EAD-Uniube.
24 UNIUBE

A B
Figura 14: (A) Fêmea da Lutzomyia sp; (B) Macho da Lutzomyia sp. Note os ganchos
copuladores na porção terminal do abdome.
Fotos: Aldo Matos.

O ciclo evolutivo da leishmaniose (Figura 15) se inicia com a picada


da fêmea do mosquito. As formas promastigotas são inoculadas no
hospedeiro mamífero por meio da picada do vetor. Decorridas 4 a
8 horas, essas formas já são encontradas den-tro dos macrófagos
da pele, transformam-se em amastigotas no vacúolo formado no
citoplasma do macrófago e multiplicam-se. Ao final do ciclo intracelular,
a célula hospedeira é rompida, liberando os amastigostas, que
serão fagocitados por outros macrófagos e provocando uma reação
inflamatória local. Os parasitos podem utilizar tanto a corrente
sanguínea, quanto os vasos linfáticos, para se disseminarem no
hospedeiro mamífero.

Ao raspar a pele durante a picada, a fêmea do flebotomínio


desprende macrófagos da pele que se misturam ao sangue que
ela ingere. Caso esses macrófagos contenham amastigotas do
parasita, o vetor será infectado. No tubo digestivo do vetor, os
macrófagos rompem-se, liberando os amastigotas, que sofrem uma
divisão binária e transformam-se em promastigotas, multiplicando-
-se, em seguida. Também, ocorre a transformação de promastigotas
em paramastigotas, que também são capazes de se multiplicar.
Ao final do período de multiplicação, as formas paramastigotas
transformam-se novamente em promastigotas e migram para a
faringe do inseto. Estas formas promastigotas são eliminadas na
saliva do vetor durante a picada, infectando um novo mamífero.
UNIUBE 25

Figura 15: Ciclo evolutivo das Leishmanias.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Os mecanismos de proteção controladores da infecção são aqueles


envolvidos na via de Ta1. Porém, nem sempre essa é via mais ativa.
Veja o Quadro 5, a seguir:

Quadro 5: Perfil da resposta imunológica nas diferentes formas clínicas das leishmanioses

Perfil da resposta
Protozooses Formas clínicas
imunológica
Leishmaniose Leishmaniose cutânea Ta1
tegumentar Leishmaniose cutaneomucosa Ta1
americana Leishmaniose cutânea difusa Ta2
Leishmaniose
- Ta2
visceral
Fonte: Aldo Matos.

Do ponto de vista epidemiológico, existem algumas diferenças entre


a leishmaniose visceral e as formas da leishmaniose tegumentar. Os
vetores são diferentes, conforme apresentados no Quadro 4. Para a
leishmaniose visceral, está estabelecido que o cão é um reservatório
do parasito. Mas, nas leishmanioses tegumentares não há consenso
sobre o real papel do cão na cadeia epidemiológica da doença.
Assim, o sacrifício dos cães infectados e dos cães errantes deve
contribuir para controlar a doença na população humana.
26 UNIUBE

As medidas aplicáveis ao controle de qualquer das leishmanioses


incluem o diagnóstico e tratamento precoce das pessoas infectadas
e o controle dos vetores com aplicação de inseticidas.

Plasmodium sp

A maleita, paludismo, impaludismo, febre palustre, sezão ou malária,


é uma doença conhecida desde a antiguidade, que atualmente
assola a África, ocorrendo também na Ásia e na América Latina.
Aqui, no Brasil, a ocupação desordenada da região amazônica na
década de 1980, fez o número de casos notificados de malária saltar
de 50.000/ano para 500.000/ano no período.

A característica principal dessa doença são os ataques de febre alta,


seguidos de calafrios, que ocorrem em intervalos regulares. Existem
quatro espécies do gênero Plasmodium que parasitam humanos,
P. falciparum, P. vivax, P. ovale e P. malariae. O intervalo entre os
ataques febris é de 48 horas para as três primeiras espécies e de 72
horas para o P. malariae. O parasito utiliza as fêmeas de mosquitos
do gênero Anopheles (Figura 16). No Brasil, temos estabelecidos
como vetores: A. darlingi, A. cruzi, A. bellator e A. aquasalis.

Esses mosquitos encontram condições muito favoráveis em áreas


de clima quente e úmido. Mas, cada uma das espécies é adaptada a
uma determinada faixa de temperatura, umidade e altitude. Por isso,
é possível encontrar malária nas regiões mais centrais do continente
até o litoral, onde encontramos o A. aquasalis, reprodu-zindo-se em
águas salobras (Figura 16).

Figura 16: Anopheles gambiae, vetor da malária na África.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.
UNIUBE 27

O ciclo evolutivo do Plasmodium sp é do tipo heteroxeno e esses


esporozoários fazem alternância de gerações. Ao penetrarem
nos mamíferos por meio da picada do vetor, os esporozoítos dos
parasitos dirigem-se ao fígado, onde penetram nos hepatócitos e
se reproduzem por esquizogonia. Posteriormente, abandonam os
hepatócitos na forma de merozoítos e penetram nos eritrócitos,
a principal célula parasitada, reproduzindo-se novamente por
esquizogonia. Ao final de cada ciclo eritrocítico, a hemácia
parasitada é lisada, liberando novos merozoítos, que penetrarão
em outras hemácias. Dentro dos eritrócitos, o parasito alimenta-
-se da hemoglobina, produzindo um resíduo chamado hemozoína,
que chega ao plasma com o rompimento das hemácias; é levado
pela corrente sanguínea ao hipotálamo, provocando a febre. O
intervalo entre as febres é, portanto, determinado pela duração do
ciclo eritrocítico, o que é característico de cada espécie do parasito,
como mostrado no Quadro 6, a seguir:

Quadro 6: Relação entre as espécies de Plasmodium sp e a classificação clínica da


malária.

Espécie de Intervalo entre


Quadro clínico
Plasmodium os picos febris
P. vivax 48h Terçã benigna
P. ovale 48h Terçã benigna
P. falciparum 48h Terçã maligna
P. malariae 72h Quartã
Fonte: Aldo Matos.

A terçã causada pelo Plasmodium falciparum é classificada como


maligna, devido ao risco de morte.

Vamos dar continuidade ao ciclo evolutivo?

Em algumas hemácias parasitadas, em cada ciclo eritrocítico,


o Plasmodium não faz a esquizogonia, mas transforma-se em
gametócito masculino ou em gametócito feminino. Esses gametócitos
(Figura 18) apenas amadurecerão no intestino da fêmea do vetor,
passando a ocorrer a fecundação com formação de oocistos, dentro
dos quais serão formados os esporozoítos - a forma evolutiva que
28 UNIUBE

infectará outros mamíferos. Veja então que, na malária, o vetor


é o hospedeiro definitivo e os mamíferos são os hospedeiros
intermediários.

Figura 17: Gametócito do Plasmodium falciparum.


Foto: Acervo EAD-Uniube.

Algumas observações sobre as manifestações da malária em


áreas endêmicas são bastante interessantes. É comum encontrar
moradores de áreas endêmicas que contraíram malária diversas
vezes. Isso nos faz questionar se o nosso sistema imunológico não
nos defende contra o parasito. A resposta de defesa é montada e
podemos mesmo encontrar moradores de área endêmica que, apesar
de infectados, não apresentam sintomas. Isso porque sua resposta
imunológica mantém os parasitos em quantidade tão pequena em
seu organismo, que são incapazes de provocar sintomas. Mas, o
parasito muda frequentemente os seus antígenos expostos na
superfície das hemácias parasitadas, gerando grande diversidade
antigênica. Então, a imunidade protetora é adquirida lentamente,
após anos de exposição a infecções sucessivas em áreas de intensa
transmissão. Da resposta imunológica, sabe-se também que altas
concentrações de TNF-α estão relacionadas às manifestações
mais graves da doença, que, na terçã maligna, estão relacionadas
ao sistema nervoso central, à insuficiência renal aguda, ao edema
pulmonar agudo e à hipoglicemia grave.

As medidas de controle e profilaxia incluem o desenvolvimento


sustentável das regiões endêmicas, o diagnóstico e o tratamento
precoce das pessoas infectadas. Além disso, é necessário proteger-se
UNIUBE 29

contra a picada dos vetores, utilizando-se telas nas janelas e


mosquiteiros em casa. Também é importante usar repelentes de
mosquitos e roupas compridas ao entrar em área silvestre de regiões
em que ocorra a transmissão da malária.

Toxoplasma gondii

O Toxoplasma gondii é um esporozoário ubiquitário, pertencente ao


filo Apicomplexa, que realiza o ciclo evolutivo completo nos felinos.
Nos demais mamíferos, esse protozoário realiza apenas a reprodução
assexuada. Portanto, a única fonte de oocistos desse parasito são
as fezes dos felinos infectados. Mas, apesar de ser conhecida
popularmente como uma doença transmitida por gatos, outras formas
evolutivas do parasito, os taquizoítos (Figura 18) e os bradizoítos,
encontradas em outras fontes, são infectantes. Os taquizoítos (taqui
= rápido) são formas de reprodução rápida, característica da fase
aguda da infecção e podem ser encontrados nos tecidos e nos
líquidos corporais dos mamíferos. Já os bradizoítos (bradi = lenta)
são formas de reprodução assexuada lenta, características da fase
crônica, encontradas nos ninhos dos parasitos, também chamados
cistos ou pseudocistos (Figura 19), encontrados nos tecidos dos
hospedeiros mamíferos. A reprodução assexuada acontece pelo
mecanismo de endodiogenia (divisão em dois, de dentro para fora).
A reprodução sexuada ocorre por esporogonia, assim como nos
coccídeos intestinais e no Plasmodium sp.

Figura 18: Taquizoítos de Toxoplasma gondii.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.
30 UNIUBE

Figura 19: Pseudocistos ou ninhos de taquizoítos


do Toxoplasma gondii no sistema nervoso central.
Foto: Aldo Matos.

O estudo do ciclo evolutivo (Figura 20) mostra que o T. gondii pode


parasitar qualquer célula nucleada. É possível a infecção acontecer
por quatro mecanismos:

• ingestão de água ou verduras cruas contaminadas com oocistos


esporulados;
• ingestão de taquizoítos no leite cru, ou nas carnes cruas ou mal
passadas;
• ingestão de bradizoítos nas carnes cruas ou mal passadas;
• transmissão congênita devido à invasão do líquido amniótico por
taquizoítos. Esse mecanismo também é conhecido como trans-
missão vertical, transplacentária ou materno-fetal.

Figura 20: Cadeia de transmissão do Toxoplama gondii.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.
UNIUBE 31

Estima-se que, aproximadamente, 70% da população humana te-


nham toxoplasmose assintomática. A fase aguda geralmente é be-
nigna e assintomática. Caso ocorram sintomas nessa fase, espera-
-se que seja febre, podendo estar associada a ínguas, geralmente
na região cervical.

O nosso organismo reage de forma complexa na tentativa de des-


truir os parasitos. Apesar de não conseguir eliminar os toxoplasmas,
nosso sistema imunológico, em geral, consegue controlar a infecção
que permanece crônica e assintomática. Em linhas gerais, encon-
tramos anticorpos específicos contra o parasito na circulação - IgM
na fase aguda e IgG na fase crônica. Os taquizoítos estimulam os
macrófagos a produzirem IL-12, que ativam as células NK e os linfó-
citos T para produzirem IFN-γ e TNF-α, que, conjuntamente, ativam
os mecanismos de destruição dos parasitos intracelulares pelos ma-
crófagos.

A toxoplasmose é preocupante em duas condições: na gestante que


apresente fase aguda da infecção e nos pacientes imunodeprimidos.

A gestante que tem toxoplasmose aguda possui em seu organismo


os taquizoítos, que são capazes de atravessar a placenta e assim
alcançar o líquido amniótico e infectar o feto. Caso aconteça a infec-
ção congênita, podem ocorrer malformações fetais, como hidroce-
falia com microcefalia e fenda palatina aberta – condição conhecida
como tríade de Sabin. Também, pode acontecer o parto pré-maturo
ou o aborto. Por isso, faz parte do pré-natal, realizar o exame de san-
gue (sorologia) para detectar a toxoplasmose. Se for diagnosticada
a fase crônica, não existe risco de transmissão materno-fetal. Se for
detectada a fase aguda, é possível diminuir os riscos de infecção
congênita, tratando a gestante e, algumas vezes, também o feto.

Os pacientes imunodeprimidos são preocupantes no contexto da to-


xoplasmose, porque a imunodepressão permite a reagudização das
infecções crônicas. A reagudização é sempre grave com riscos de
invasão do sistema nervoso central e de morte.

Devido à existência de quatro mecanismos de infecção, as medidas


profiláticas não são efetivas, realmente efetivas, mas deve-se evitar
o consumo de: carnes cruas ou mal passadas, água sem filtrar, ou
verduras cruas sem a prévia higienização.
32 UNIUBE

Passaremos a estudar os distúrbios da circulação, que podem ser


decorrentes, de agressões causadas pelos helmintos, estuda-do an-
teriormente, pois se faz necessário conhecer, além dos protozoários
parasitos, também os processos patológicos que ocorrem em nosso
organismo que explicam os sinais e sintomas observados nas pes-
soas infectadas.

1.3 Distúrbios locais da circulação

O sistema circulatório deve se encontrar em perfeitas condições


para a oferta contínua de oxigênio, nutrientes, hormônios, eletrólitos
e água e, para a retirada de metabólitos e do dióxido de carbono.

Para melhor compreensão sobre os distúrbios da circulação,


devemos recordar que o sistema cardiovascular (vasos e coração)
é o responsável pela circulação do sangue e distribuição de líquidos
no organismo. Os vasos arteriais conduzem o sangue aos tecidos
para as trocas metabólicas; os vasos venosos retornam o sangue
resultante das trocas ao coração e os vasos linfáticos reabsorvem o
excesso de líquido filtrado na microcirculação.

Qualquer fator que altere esta dinâmica, e entre eles estão os


parasitos, acarretará nos distúrbios da circulação. Os distúrbios da
circulação que estudaremos, a seguir, serão os locais.

Prezado(a) aluno(a), para iniciarmos o estudo do primeiro


distúrbio local da circulação, gostaria de saber se você já
sentiu alguma vez as faces quentes e vermelhas?

Pois bem, o calor e o rubor já estudados na inflamação são


decorrentes do aumento do volume de sangue na área afetada, não
é mesmo? A este aumento do volume de sangue local chamamos de
hiperemia, do grego (hyper = aumento, excesso; haima = sangue).

1.3.1 Hiperemia

Corresponde ao aumento da quantidade de sangue em um


determinado território orgânico. Pode ser ativa (arterial) ou passiva
(venosa).
UNIUBE 33

1.3.1.1 Etiopatogênese

Hiperemia ativa

É processo que resulta de aumento do influxo tecidual, devido à


dilatação arteriolar decorrente do aumento da demanda funcional
dos tecidos ou órgãos.

A vasodilatação é de origem simpática ou humoral. O tecido afetado


é mais vermelho e quente em virtude do ingurgitamento com sangue
oxigenado.

A hiperemia ativa (Figura 21) pode ser fisiológica ou patológica.

• Fisiológica: é a que ocorre, por exem-


Inflamação
-plo, no músculo esquelético durante
o exercício físico ou no tubo digestó- É uma resposta dos
tecidos vascularizados
rio du-rante o processo de digestão. dos organismos vivos
homeotérmicos a uma
• Patológica: é a que ocorre em inú- agressão sofrida.
me-ros processos patológicos, prin- Caracterizada por
lesão ou destruição de
cipalmente nas inflamações agudas, tecidos, causado por uma
decorrentes, por exemplo, de infec- variedade de reações
químicas e citológicas.
ções, parasitoses, acarretando os si- Normalmente, manifesta-
nais cardinais da inflamação, rubor, -se por sinais típicos de
calor e tumor. dor, calor, rubor, tumor e
perda da função.

Figura 21: Hiperemia pulmonar.


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.
34 UNIUBE

Hiperemia passiva ou congestão

Efluxo sanguíneo É processo passivo que resulta da redução


da drenagem venosa, ou seja, da redução do
Saída de sangue
dos tecidos.
efluxo sanguíneo de um tecido, acarre-tando
Exemplo: no ingurgitamento de um órgão/tecido com
drenagem venosa. sangue venoso.

Tipos de Congestão:

• sistêmica: decorrente da insuficiência


Trombo
cardíaca, que ocorre, por exemplo, na
Massa sólida de Doença de Chagas;
sangue, aderente
à parede do tubo
cardiovascular, • local: em consequência de obstrução/
formada pelos compressão venosa por trombo, êm-
próprios componentes
do sangue. bolo, edema, tumor, ovos de parasitos
intestinais, entre outros fatores.

Consequências e evolução da hiperemia passiva:


• cianose: o tecido apresenta uma cor vermelho-azulada, devido
ao acúmulo de hemoglobina desoxigenada, o que gera a hipóxia
crônica;
• degeneração ou morte das células parenquimatosas: decorrente
da redução ou falta de oxigenação dos tecidos (hipóxia ou
anóxia);
• hemorragia: devido à ruptura de vasos nos locais de congestão
crônica;
• edema: saída de plasma, resultante do aumento da pressão
hidrostática nos capilares, decorrente da redução do efluxo de
sangue;
• as congestões mais importantes são as dos pulmões, baço,
e fígado (Figura 22), causadas por insuficiência cardíaca e
por verminoses, por exemplo, a Schistossomose, estudada
anteriormente.
UNIUBE 35

Figura 22: Fígado com Hiperemia (fígado


cardíaco ou em noz moscada).
Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

IMPORTANTE!

O fígado denominado “cardíaco” ou em “noz moscada” (Figura 22)


é o que apresenta hiperemia passiva sistêmica crônica devido à
insuficiência cardíaca direita.

Antes de iniciarmos o estudo do próximo distúrbio local da circulação


- a hemorragia, faremos uma breve recordação sobre a hemostasia.
Você se lembra desse estudo?

Quando nos machucamos, muitas vezes sai sangue, não é mesmo?


Mas, o sangramento cessa rápido quando o machucado não é
profundo, concorda?

Pois bem, este mecanismo de interrupção da saída do sangue de


um vaso lesado é denominado hemostasia.

A hemostasia é um complexo mecanismo, desencadeado pelo


organismo, para cessar uma hemorragia que culmina com a gênese
de um trombo hemostático, no local da lesão vascular. Ela se passa
nos vasos de pequeno calibre (arteríola, vênula pós-capilar e capilar).
Participam deste processo as plaquetas, inúmeras substâncias do
sangue circulante e a própria parede vascular no local da lesão.
36 UNIUBE

No início, tem-se a vasoconstrição local, seguida da adesão e


agregação plaquetária, com consequente formação de um trombo
plaquetário inicial (Figura 23).

Figura 23: Adesão e agregação plaquetária.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Pela Figura 23, vemos o processo da adesão e agregação plaque-


tária: 1) tecido lesionado; 2) agregação plaquetária; 3) tecido recu-
perado.

A hemostasia secundária compreende uma série de reações em


cascata, a partir de duas vias, a intrínseca e a extrínseca, cujo re-
sultado final é a formação de fibrina insolúvel a partir do fibrinogênio
(Figura 24).
UNIUBE 37

Figura 24: Mecanismo da coagulação do sangue.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

E agora? Lembrou-se do mecanismo que cessa a hemorragia?

1.3.2 Hemorragia

Você estudou que muitos parasitas


Hemorragia
intestinais causam hemorragia (Fi-
gura 25), não é mesmo? Lembra-se Palavra derivada do
grego que significa:
de quais são eles? “Haimorrhagia” ou
“Haima”+”Rhegnymi”
“Haemorrhagia” =
E você, prezado(a) aluno(a), já teve escorrer sanguíneo.
hemorragia? Já sangrou alguma vez?

Figura 25: Hemorragia externa.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.
38 UNIUBE

Segundo Brasileiro (2004, p.101), hemorragia ou sangramento


(Figura 26) é a saída do sangue do espaço vascular (vasos ou
coração) para o compartimento extravascular (cavidades ou inters-
tício), ou para fora do organismo.

Figura 26: Hemorragia na luz alveolar pulmonar (setas).


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

Assim sendo, as hemorragias podem ser internas ou se exteriorizar,


e segundo a sua localização temos, por exemplo: hematúria: sangue
na urina; hemotórax: sangue na cavidade pleural; enterorragia:
hemorragia intestinal; epistaxe: hemorragia nas fossas nasais;
hematoma: hemorragia no tecido mole; equimose: hemorragia
superficial maior; petéquia: hemorragia puntiforme na pele ou
mucosa, entre outras.

1.3.2.1 Etiopatogênese

A Hemorragia pode ser consequente de rupturas vasculares ou do


coração ou ocorrer sem solução de continuidade do vaso, sendo
denominada hemorragia por rexe ou por diapedese, respectivamente
(BRASILEIRO, 2004).

Hemorragia por rexe é a que ocorre em consequência à ruptura


da parede do vaso ou do coração. Tem como fatores: traumas
(acidentais ou programados, como cirurgias), alterações da parede
vascular (vasculites, por exemplo) e em crises hipertensivas.
UNIUBE 39

Hemorragia por diapedese é aquela em que as hemácias saem de


pequenos vasos (capilares ou vênulas) individualmente, ou seja,
uma a uma, entre as células endoteliais decorrentes de alteração
nestas células e/ou na membrana basal (aumento da permeabilidade
vascular), sem ocorrer lesões vasculares. Os fatores deste tipo de
hemorragia são inúmeros, um exemplo é a inflamação, ou seja, uma
resposta à agressão.

1.3.2.2 Diátese hemorrágica



Você já apresentou um sangramento ou mancha escura na pele sem
causa aparente?

Pois bem, diátese é uma tendência para sangramento sem causa


aparente (hemorragias espontâneas) ou mais intensa e prolongada
após traumatismos. É decorrente de anormalidades na (o):

• composição da parede vascular;


• número ou função das plaquetas;
• coagulação sanguínea (hemostasia);
• fibrinólise.

Alterações na composição da parede vascular podem ser devido a:

• anormalidades das fibras elásticas e colágenas e persistência


de anastomoses arteriovenosas (telangiectasia hemorrágica
hereditária - doença de Osler);
• avitaminose C que leva à fragilidade das veias devido ao
colágeno defeituoso nas membranas basais (escorbuto), uma
vez que a vitamina C é uma coenzima importante na sua
síntese;
• senilidade com alterações na síntese da elastina e de colágeno
na pele (elastose senil) e nos vasos;
40 UNIUBE

• reação alérgica tipo III, devido à forma-


Púrpura de
Schönlein-Henoch -ção de imunocomplexos circulantes que
se depositam na parede de pequenos
É uma inflamação
dos pequenos vasos vasos, provocando necrose de arteríolas,
do sangue causada desencadeada por antígenos de bacté-
em geral por reações
imunitárias anormais rias, toxinas ou medicamentos (púrpura
(autoimunes). de Schönlein-Henoch).

Alterações do número ou da função das plaquetas:

• trombocitopenia ou plaquetopenia (até 30.000 plaquetas/mm3)


pode ser devido a:

- produção diminuída: doenças da medula óssea (infecções,


toxinas, medicamentos, neoplasias);
- aumento da destruição: doença autoimune (púrpura trom-
-bocitopênica idiopática);
- hiperesplenismo e esplenomegalia: onde há retenção e
destruição das plaquetas no baço;
- aumento do consumo: nos casos de coagulação intra-vas-
cular disseminada.

SAIBA MAIS

O ácido acetil salicílico (AAS), a popular aspirina, é muito utilizado


para manter a fluidez do sangue em indivíduos propensos a formar
trombos, pois provoca redução da agregação plaquetária.

1.3.2.3 Alterações na coagulação sanguínea


Decorrentes de defeitos congênitos ou adquiridos:

• hemofilia A: resultante da redução da atividade ou alteração


molecular do fator VIII da coagulação;
• doença de von Willebrand: decorrente de defeito na síntese do
fator von Willebrand da coagulação;
UNIUBE 41

• avitaminose K: uma vez que a vitamina K tem papel importante


na síntese dos fatores da coagulação II, VII, IX e X pelo fígado;
• doença hepática grave: na cirrose e hepatite, por exemplo,
uma vez que os hepatócitos (células do parênquima hepático)
são responsáveis pela síntese dos fatores da coagulação (II,
VII, IX e X).

1.3.2.4 Aumento da fibrinólise

Decorrente de defeitos congênitos: por exemplo, diminuição da


síntese dos inibidores da α-plasmina ou aumento do ativador tecidual
do plasminogênio (Tpa), produzidos pelas células endoteliais.

1.3.2.5 Lesões hemorrágicas superficiais

Dependendo de seu aspecto morfológico macroscópico, as hemor-


ragias superficiais podem ser denominadas:
• petéquias: hemorragias puntiformes (Figura 27);

Figura 27: Petéquias múltiplas.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.
42 UNIUBE

• púrpuras: com cerca de 1cm e de bordas irregulares (Figura 28);

Figura 28: Púrpura.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

• hematoma: coleção de sangue com aspecto de tumor (Figura 29).

Figura 29: Hematoma.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Você conheceu nas Figuras 27 a 29, as lesões hemorrágicas


superficiais. Nesse momento, iremos conhecer como ocorre a
evolução e as consequências da hemorragia.
UNIUBE 43

1.3.2.6 Evolução e consequências da hemorragia

As hemácias, ao saírem do vaso, podem sofrer lise ou serem


fagocitadas por macrófagos, liberando a hemoglobina que forma
pigmentos, tais como:

• biliverdina;
• bilirrubina;
• hematina.

IMPORTANTE!

Na hemorragia não recente, ocorrendo a lise das hemácias em pH


básico, o ferro da hemoglobina transforma-se em hemossiderina, um
pigmento de cor marrom dourado (Figura 30).

Figura 30: Pigmentos de hemossiderina (marrom-


dourado) na luz alveolar pulmonar (seta).
Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

As consequências de uma hemorragia são variadas e dependem


dos seguintes fatores:
44 UNIUBE

• quantidade de sangue perdido: choque


Choque hipovolêmico quando há perda rápida
hipovolêmico
de cerca de 20% do volume de sangue
Uma forma de corporal;
choque; uma
condição em que o
coração é incapaz
de fornecer sangue • velocidade da perda de sangue: se a
suficiente para o perda é rápida, aguda, leva ao choque
corpo devido à perda
de sangue, distúrbio hipovolêmico; perda lenta, por exemplo
circulatório ou em sangramento crônico, repetido como
volume sanguíneo
inadequado.
ocorre na ancilostomíase, úlcera gástri-
ca, há perda crônica de ferro provocando
a anemia ferropriva;

• local afetado: asfixia na hemorragia pulmonar acentuada; efeitos


compressivos dos hematomas cerebrais ou tamponamento
cardíaco no infarto agudo do miocárdio, entre outros.

1.3.3 Edema

O edema (do grego, oídema= inchaço ou tumefação) é resultante


do aumento de líquido no interstício ou em cavidades do organismo.
Veja a Figura 32:

Figura 31: Exsudato (seta) na luz alveolar pulmonar.


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.
UNIUBE 45

Dependendo do fator, o edema pode ser localizado ou sistêmico


(anasarca), ser um transudato (edema não inflamatório) ou esxu-
dato (edema inflamatório, rico em proteínas) conforme vimos na
Figura 32.

1.3.3.1 Etiopatogênese

O mecanismo de transporte de líquidos na microcirculação ocorre


graças às diferenças entre a pressão hidrostática e coloidosmótica
(pressão oncótica), existente entre os vasos e o interstício (forças de
Starling).

Segundo Brasileiro ( 2004), os mecanismos de formação do edema, são:

• aumento da pressão hidrostática intravascular em situações,


tais como: vasodilatação, hiperemia passiva, hipertensão
arterial, entre outras;
• alterações da pressão oncótica:
- redução da pressão oncótica intravascular, como a que
ocorre na desnutrição, em que há hipoproteínemia
plasmática e consequente saída de líquido do vaso para
o interstício;
- aumento da pressão oncótica intersticial decorrente do
aumento da permeabilidade vascular, com a saída de
proteínas do vaso para o interstício (inflamação e reações
alérgicas agudas); o que permite a saída de líquidos e
proteínas para o interstício.
• redução da drenagem linfática: ocorre na obstrução dos vasos
linfáticos como na filariose, por exemplo, podendo originar a
elefantíase devido ao desenvolvimento do edema crônico, já
visto, por você, no estudo sobre Wuchereria bancrofti.
As denominações do edema presente nas cavidades do organismo são:

• hidrotórax: cavidade pleural;


• hipericárdio: cavidade pericárdica;
• ascite: cavidade peritoneal (Figura 32).
46 UNIUBE

Figura 32: Ascite.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

1.3.4 Trombose

A seguir, estudaremos o distúrbio local da


Trombose
circulação, denominado trombose.
Formação,
desenvolvimento
ou presença de um
Trombose é um termo muito co-
trombo, uma forma nhecido, não é mesmo? Antes de
de combinação que iniciarmos este estudo, gostaria de
denota relação a um
coágulo. saber se vo-cê ou algum conhecido
seu já teve ou tem trombose? Você
sabe o que é trombose? Sabe por
que ela ocorre?

Pois bem, vamos conferir o que você já conhece acerca deste


processo patológico.

Segundo Brasileiro (2004, p. 104), “trombose é o processo patológico


caracterizado pela solidificação do sangue dentro dos vasos ou
coração, no indivíduo vivo”.

Assim sendo, trombo é a massa sólida do sangue contendo pla-


quetas, fibrina e elementos celulares dentro dos vasos ou coração,
o que o difere do coágulo que é a massa coagulada de sangue não
estruturada, fora dos vasos ou coração.
UNIUBE 47

IMPORTANTE!

Após a morte do indivíduo, com a parada da circulação, o sangue se


coagula no interior dos vasos e do coração.

1.3.4.1 Etiopatogênese

A trombose pode ocorrer nos vasos venosos, arteriais ou nas


cavidades cardíacas.

1.3.4.2 Trombose venosa

Segundo Rubin (2006, p. 296), a trombose era antigamente


denominada de tromboflebite (inflamação venosa), hoje o termo
flebontrombose é o mais correto, pois na maioria dos casos não há
inflamação associada. Veja a Figura 33:

Figura 33: Trombose venosa (seta).


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

A trombose venosa ocorre em mais de 90% nas veias profundas dos


membros inferiores (panturrilha), decorrente da estase (insuficiên-
-cia cardíaca), lesão endotelial, varizes, hipercoagulabilidade (anti-
concepcionais orais), entre outras condições.
48 UNIUBE

1.3.4.3 Trombose arterial

A trombose arterial é um processo extremamente perigoso. Ela


ocorre mais frequentemente nas artérias coronárias, cerebrais,
mesentéricas e renais decorrente de lesão do endotélio (por exemplo,
na aterosclerose), alterações no fluxo sanguíneo (turbulência) ou do
aumento da coagulabilidade do sangue. Na artéria aorta é comum,
nos aneurismas (dilatações localizadas da luz do vaso), com
alteração do fluxo sanguíneo simultaneamente.

1.3.4.4 Trombose cardíaca

Origina-se de lesões no endocárdio ou alterações no fluxo sanguíneo


(infarto do miocárdio, fibrilação atrial, cardiomiopatia, endocardite
bacteriana, entre outras) e resulta na formação de um trombo aderido
à parede das cavidades cardíacas (trombose mural).

Rudolf Virchow, patologista polonês (1821-1902), propôs que a


trombose pode ocorrer por três tipos de alterações no sistema
circulatório (tríade de Virchow), sendo elas:

• Alterações na anatomia da parede do vaso


- lesões ou perda endotelial com a exposição do colágeno e/
ou fibras elásticas, como ocorre, por exemplo, na ateros-
clerose, traumatismos, agressão direta por agentes lesivos,
inflamações agudas, neoplasias malignas, entre outras le-
sões;

- disfunção endotelial com redução da síntese de substâncias


anticoagulantes e alteração da superfície celular, como ocor-
re, por exemplo, no tabagismo, hiperco-lesterolemia, diabe-
tes melito, entre outras causas.

• Alterações do fluxo sanguíneo


- redução do fluxo sanguíneo que ocorre mais comumente nas
veias e devido à insuficiência cardíaca, dilatação vascular
ou aumento da viscosidade do sangue, por exemplo;
UNIUBE 49

- aceleração ou turbulência, encontrada em locais, tais como,


aurículas, átrios, aneurismas e em bifurcações de ramos
arteriais, entre outros.

• Alterações nos constituintes do sangue


- aumento do número de plaquetas (trombocitose) e na polici-
temia vera, em que há o aumento de glóbulos vermelhos com
concomitante aumento de plaquetas;

- aumento da coagulabilidade do sangue que pode ter causas


congênitas ou adquiridas.

Adquiridas: destruição dos glóbulos verme-


lhos, como ocorre na malária, anemia he- Anemia hemolítica
molítica microangiopática, transfusão de microangiopática
sangue incompatível, situações onde há li- Anemia hemolítica
beração de fosfolipídeos que aceleram a co- adquirida pela
ação de agentes
agulação sanguínea e em situações como físicos, químicos ou
politraumatismos, queimaduras, neoplasias biológicos.
malignas em que há liberação de trombo-
plastina (fator tecidual) pelas células endo-
-teliais, entre outros.

Congênitas: dentre elas, a mais importante é a mutação pontual que


ocorre no fator V, denominado fator V Leiden, que é resistente à
inativação pela proteína C, e a menos comum são as deficiências
de anticoagulantes naturais, tais como a proteína C, proteína S,
antitrombina III (BRASILEIRO, 2004, p.105).

1.3.4.5 Classificação dos trombos

De acordo com a sua composição e aparência macroscópica, os


trombos podem ser:

• brancos: massas cinza-avermelhadas, secas e friáveis, cons-


tituídos principalmente de plaquetas e fibrinas, dispostos em
camadas alternadas contendo hemácias entremeadas, formando
50 UNIUBE

as “linhas de Zahn”, pela alternância


Linhas ou estrias de de cor que apresentam, pálida (fibrina)
Zahn e escura (hemácias). São encontrados
São laminações visíveis e nas artérias e no coração.
microscópicas produzidas
pelas camadas alternadas • vermelhos: são vermelho-azulados,
de plaquetas, fibrina
(pálidas) e de hemácias úmidos, se assemelham ao coágulo
(escuras) na formação de sanguíneo, são constituídos predo-
trombos brancos.
minantemente de hemácias e fibrina
e se formam geralmente por estase
nas veias.

• mistos: são os mais comuns e contêm uma associação de


compo-nentes brancos e vermelhos.

• hialinos: são constituídos essencialmente por fibrina e encon-


trados em pequenos vasos, como arteríolas e vênulas.

De acordo com a sua capacidade de obstruir a luz do vaso, os


trombos são denominados:

• trombo mural ou parietal: encontrado geralmente nas cavidades


cardíacas e na aorta, não são oclusivos, ou seja, não ocluem
completamente a luz.

PESQUISANDO NA WEB

Veja uma imagem de trombo mural em organização, aderido ao


endocárdio em: <http://www.virtual.epm.br/cursos/patologia/histopato/
trombm1.htm>.

Na Figura 34, vemos as evoluções da trombose: 1) veia normal; 2)


início da formação do trombo; 3) trombo obstruindo a veia.
UNIUBE 51

Figura 34: Evoluções da trombose.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

IMPORTANTE!

Os trombos são sempre aderidos à parede do vaso onde se formam,


são secos, opacos e friáveis e adquirem a anatomia do vaso onde
se formam. Os coágulos não são aderidos à parede do vaso e são
brilhantes, úmidos e elásticos.

1.3.4.6 Evolução e consequências

Após a formação do trombo, há ativação do sistema fibrinolítico


que determina a evolução e consequências da trombose. Sendo as
principais evoluções:

• lise: o trombo é dissolvido logo após a sua formação pela


ação do sistema fibrinolítico (plasminogênio ativado passa a
plasmina);

• crescimento: quando o processo de formação do trombo


predomina sobre a fibrinólise, podendo o trombo chegar a
obstruir o vaso onde se encontra;
52 UNIUBE

• organização: quando há um equilíbrio entre a neoformação


e fibrinólise com a transformação do trombo em tecido con-
juntivo bem vascularizado pela ação das células de defesa;

Flebólito • calcificação: quando o trombo apre-


sen-ta depósitos de sais de cálcio,
Concreção calcária em
uma veia. formando um cálculo venoso (flebó-
lito);
Vasculite (ou angiite)

É o nome dado a • infecção: o trombo ser colonizado por


uma inflamação em bactérias ou outros agentes biológi-
vaso sanguíneo.
Geralmente provoca cos quando há septicemia ou vascu-
danos ao revestimento lite infec-ciosa;
do vaso, causando
seu estreitamento
ou obstrução, e • embolização: o trombo pode se frag-
assim limitando ou
interrompendo o fluxo mentar ou se destacar formando êm-
sanguíneo. bolos (tromboembolia), ficando livre
na circulação.

CURIOSIDADE

A Coagulação Intravascular Disseminada (CIVD) ocorre nas lesões


endoteliais extensas (queimaduras, grandes traumatismos, malária,
neoplasias malignas, entre outras) devido à liberação na circulação
de tromboplastina (fator tecidual) pelas células endoteliais lesadas
originando a formação de microtrombos na microcirculação. Veja
uma imagem de coagulação intravascular disseminada no site:<http://
www.agrolink.com.br/upload/saudeanimal/aranha_picada001.jpg>.

1.3.5 Embolia

Consiste na existência de um corpo


Êmbolo
estranho na circulação (êmbolo), po-
Toda estrutura de natureza dendo ser de natureza sólida, líquida,
estranha à composição gasosa ou gordurosa, e que pode obs-
normal do sangue ou da linfa,
circulando, respectivamente, truir um vaso.
nas vias sanguíneas ou
linfáticas, enquanto o calibre
do vaso o permitir.
UNIUBE 53

Segundo Brasileiro (2004, p. 109), “em mais de 90% dos casos, os


êmbolos correspondem a deslocamento de trombos (tromboembolia)”.

A tromboembolia venosa é mais comumente originada de trombos


presentes nas veias dos membros inferiores (veias profundas da
panturrilha), onde os êmbolos são levados aos pulmões.

A tromboembolia arterial é originada de trombos presentes nas


cavidades esquerdas do coração (no infarto do miocárdio, doença
de Chagas, insuficiência cardíaca esquerda, entre outros) ou da
aorta e grandes artérias (nos aneurismas e placas ateromatosas).
Os êmbolos, geralmente, são observados nas artérias do cérebro,
rins, baço, intestinos e membros inferiores.

1.3.5.1 Embolia gasosa

Consiste na presença de ar na circulação sanguínea arterial ou


venosa.

A embolia gasosa venosa corresponde à entrada de ar durante a


inspiração que pode ocorrer em situações de alto risco, tais como:

• punções, traumatismos e cirurgias na região da cabeça,


pescoço e tórax;
• pneumotórax;
• parto ou aborto com entrada de ar em veias do útero;
• sistemas de infusão.

EXPLICANDO MELHOR

Quando o ar atinge as câmaras cardíacas direitas e os ramos da


artéria pulmonar, ao se misturar com o sangue, forma uma espuma,
comprometendo o funcionamento do ventrículo direito; ao mesmo
tempo, o contato do ar com o sangue ativa a coagulação sanguínea.
54 UNIUBE

A embolia gasosa arterial, acontece nos seguintes casos:

• defeitos cardíacos congênitos ou do forame oval aberto


propiciam a passagem do ar para a circulação arterial sistêmica
pelos capilares nas embolias gasosas venosas;
• cateterismo arterial, oxigenadores em circulação extracorpórea
ou cirurgias no coração ou aorta;
• submissão do organismo a mudanças
Despressurização bruscas de pressão atmosférica (mergulha-
Perda de pressão
dores com retorno rápido à superfície e na
de ar no ambiente. despressurização em cabine de avião)
Ex.: interior das devido à expansão dos gases dissolvidos
aeronaves.
no sangue e tecido adiposo.

CURIOSIDADE

Após a morte, há formação de gases pela putrefação, que não devem


ser confundidos com êmbolos gasosos.

1.3.5.2 Embolia gordurosa


Caracteriza-se pela presença de glóbulos de gordura na circulação
sanguínea decorrente de:

• fraturas extensas de ossos longos;


• traumatismo extenso ou queimadura do tecido adiposo;
• doenças: tais como diabete melito, anemia falciforme, pancrea-
tite, necrose hepática aguda, intoxicações, entre outras, onde
supõe-se que haja distúrbios na emulsificação das gorduras
para a formação de glóbulos (BRASILEIRO, 2004);
• placas ateromatosas (ateroembolia).

1.3.5.3 Embolia de líquido amniótico

O líquido amniótico é rico em tromboplastina que induz à CIVD,


durante o trabalho de parto; dependendo das condições, pode haver
a penetração deste líquido em seios venosos uterinos lesados e
sofrer embolização.
UNIUBE 55

1.3.5.4 Tromboembolia
Processo patológico decorrente da formação de êmbolos originados
de trombos. Pode ter sua origem em trombos venosos ou arteriais,
ocorrendo, portanto, na circulação pulmonar ou sistêmica.

A embolia pode ser denominada tumoral ou metastática, quando há


células malignas na circulação.

Antes de iniciarmos o estudo do infarto, que é outro distúrbio


local da circulação, pense:
• você sabe o que é o infarto?
• já viu alguém infartar?
• já infartou?
• sabe o que leva ao infarto?

Pois bem, a partir de agora, você conhecerá ou aprofundará seus


conhecimentos sobre o Infarto.

1.3.6 Infarto

Infarto é uma área localizada de necrose


isquêmica (estudada anteriormente), ou seja,
uma área do organismo de tecido morto por Isquemia
isquemia (do grego ischio = reter; haima = Deficiência na
sangue) por redução ou parada do suprimento irrigação de sangue
em um órgão ou
sanguíneo devido a distúrbio da circulação tecido, devido
arterial ou venosa. à constrição ou
obstrução de seus
vasos sanguíneos.
Segundo Brasileiro (2004, p.118), “a isquemia
se instala toda vez que a oferta do sangue é
menor do que as necessidades básicas do
órgão em determinado momento”.

Sendo assim, a isquemia pode ser resultante da diminuição da oferta


de sangue por compressão ou obstrução vascular, pelo aumento
do metabolismo celular ou pela ocorrência das duas condições
simultaneamente. Dependendo da presença ou não de sangue na
área, os infartos podem ser denominados brancos ou anêmicos, e
vermelhos ou hemorrágicos.
56 UNIUBE

1.3.6.1 Infarto branco

Os infartos brancos (Figura 35), ou anêmicos, resultam da obstrução


ou da compressão arterial (trombo, êmbolo, tumor, edema, espasmo
vascular, entre outros) em órgãos compactos ou sólidos com
circulação única ou terminal (rins, baço, coração). Nesse tipo de
infarto, os vasos que o percorrem não contêm sangue.

Figura 35: Baço com área de infarto branco (seta).


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

1.3.6.2 Infarto vermelho

Os infartos hemorrágicos (Figura 36) apresentam coloração vermelha


devido à hemorragia maciça que se forma na área. Ocorre em órgãos
frouxos e com irrigação dupla ou colateral (pulmão, intestinos, fígado,
cérebro, entre outros). São decorrentes da obstrução dos vasos
venosos ou arteriais resultando na necrose isquêmica e inundação
da área necrosada de sangue.

Figura 36: Intestino com infarto hemorrágico.


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.
UNIUBE 57

1.3.6.3 Aspectos morfológicos


Infarto branco:
• macroscópicos: em geral adquirem a forma de cunha, com o
ápice voltado para o vaso comprometido que lhe deu origem, a
área infartada adquire coloração pálida, bem delimitada, firme,
tumefeita e circundada por um halo avermelhado de hiperemia;
• microscópicos (Figura 37): o tecido adquire aspecto róseo,
amorfo (autólise) contendo restos celulares (necrose coagula-
tiva) e presença de células de defesa (neutrófilos e macrófagos)
para a fagocitose dos restos celulares presentes na área.

Figura 37: Infarto branco (em destaque).


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

Infarto vermelho
• macroscópicos: adquirem a mesma forma do branco, a área
adquire uma cor vermelho-escuro, mais consistente e com
aumento de seu volume (Figura 38);

Figura 38: Infarto vermelho (área em destaque).


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.
58 UNIUBE

• microscópicos: o tecido apresenta as mesmas características


do infarto branco com hemorragia na área (Figura 39).

Figura 39: Infarto hemorrágico (Intestinal).


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

1.3.6.4 Consequências
Segundo Brasileiro (2004), as consequências do infarto, podem ser:

• manifestações gerais: febre, leucocitose, aumento no plasma


de enzimas (transaminases, desidrogenases, entre outras)
liberadas pelas células destruídas;
• manifestações locais: dor precordial (infarto do miocárdio) e dor
abdominal (infarto de órgãos abdominais como os intestinos, por
exemplo);
• sinais e sintomas dependentes do órgão atingido;
• morbidade e mortalidade (infartos do miocárdio, cérebro,
intestinal, pulmonar, entre outros).

1.3.6.5 Evoluções
O tecido que sofreu infarto, ou seja, o que sofreu necrose isquêmica,
pode ser substituído por outro, morfológica e funcionalmente idêntico
(regeneração) ou ser substituído pelo tecido conjuntivo cicatricial
(Figura 40).
UNIUBE 59

Figura 40: Cicatrização.


Foto: Acervo EAD-Uniube.

1.3.7 Choque

Também denominado, segundo Montenegro e Franco (1999, p. 32),


“de colapso circulatório, ou seja, falência circulatória com redução
generalizada da perfusão dos tecidos”.

1.3.7.1 Tipos de choque


Os tipos de choque são:

• hipovolêmico: decorrente da diminuição do volume sanguíneo


em situações que levam ao sangramento intenso, perda de
plasma ou desidratação (hemorragia intensa, queimaduras,
diarreias, vômitos, entre outras), ou na obstrução aguda do fluxo
sanguíneo (por ex.: embolia na artéria pulmonar);

• anafilático: decorrente de uma reação de hipersensibilidade


tipo I (ver Imunologia), mediada por IgE na superfície de
mastócitos e basófilos, levando à liberação de vasodilatadores
potentes (histamina, por exemplo), resultando na vasodilatação
generalizada de pequenos vasos com redução da pressão
arterial e do retorno venoso;

• séptico: decorrente principalmente de infecções por bactérias


Gram-negativas produtoras de endotoxinas e, menos comu-
mente, pelos fungos e bactérias Gram-positivas. As endotoxinas
60 UNIUBE

bacterianas (lipopolissacarídeos) atuam sobre receptores


de leucócitos e células endoteliais, promovendo a liberação,
pelos leucócitos, por mediadores químicos, vasodilatadores
potentes;

• neurogênico: resultante da diminuição do tônus vascular por


distúrbio neurogênico, com consequente queda na resistência
vascular periférica e diminuição do retorno venoso ao coração;

• cardiogênico: ocorre em situações nas quais o coração perde


a capacidade de bombear adequadamente o sangue (infarto
agudo do miocárdio, arritmias cardíacas, miocardite aguda,
entre outras), com diminuição acentuada do débito cardíaco.

Os órgãos mais comprometidos pelo choque são: cérebro, coração,


pulmões, rins, fígado, hipófise, suprarrenais, pâncreas e tubo diges-
tório, podendo apresentar, dependendo da sensibilidade do tecido, a
hipóxia: hemorragia, edema, degeneração ou infarto.

Veja a etiopatogênese do choque, na Figura 41.

Figura 41: Etiopatogênese do choque.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.
UNIUBE 61

1.4 Resposta imunológica aos parasitos


O estudo dos parasitos e das agressões causadas por eles podem
nos assustar devido à relativa facilidade de sermos infectados e à
gravidade de algumas lesões provocadas por esses agentes. Mas,
nem sempre essas agressões acontecem. Isso porque, na maior
parte, ocorre certo equilíbrio na relação parasito-hospedeiro. Às ve-
zes, ingerimos ovos de parasitos e não somos sequer infectados,
porque é necessário um inóculo mínimo para que ocorra a infecção.
Se ingerirmos poucos ovos, nossas defesas podem realmente impe-
dir a infecção. Também, mesmo que a infecção ocorra, não é sempre
que as lesões são desenvolvidas. Então, a infecção e a doença de-
pendem da resposta do hospedeiro e da capacidade de adaptação
mútua entre o parasito e o hospedeiro.

Os parasitos são, muitas vezes, adaptados para sobreviver à ação


da resposta imune inata do organismo (fagocitose, por exemplo).

Parasitos intracelulares, como a Leishmania sp e Trypanosoma cruzi,


por exemplo, resistem à ação dos fagócitos e se multiplicam neles.

Parasitos extracelulares, como os vermes, são atacados pelo sis-


tema imunológico com substâncias microbicidas, porém possuem
estratégias adaptativas de sobrevivência, como a presença de
tegumento espesso, a capacidade de incorporar antígenos do próprio
hospedeiro mascarando a sua presença no organismo, entre outros.

1.4.1 Resposta imune adaptativa aos parasitos

Parasitos intracelulares: a principal via se


faz por meio da ativação do Th1 (linfócito MHC-I (complexo
T auxiliar 1), com a produção da citoci- principal de
histocompatibilidade do
na INF γ (interferon γ), que tem a capa- tipo I)
cidade de aumentar o poder microbicida
dos macrófagos, fazendo com que eles É a região mais densa
de genes do genoma
consigam então fagocitar e destruir o dos mamíferos e possui
micro-organismo e a ativação do TCD8, importante papel no
sistema imune e na
ou linfócito T citotóxico, que pelo MHC-I autoimunidade.
(complexo maior de histocompatibili-
dade do tipo I), checa todas as células
do organismo e reconhece e destrói as células parasitadas.
62 UNIUBE

Parasitos extracelulares: a principal via é por meio da ativação do


Th2 (Linfócito T auxiliar 2), com produção de citocinas, como a IL-4
(interleucina 4), relacionada com o aumento da produção de IgE
(imunoglobulina E) e IL-5 (interleucina 5), associada com aumento
dos eosinófilos.

No Quadro 7, a seguir, estão mencionadas as respostas imunes


desencadeadas contra protozoários causadores de certas doenças.

Quadro 7: Respostas imunes desencadeadas contra protozoários causadores de


doenças

Parasita Doença causada Resposta imune


Presença de anticorpos e
Plasmodium Malária
linfócitos T citolíticos CD8+
Ativação de macrófagos,
Leishmania Leishmaniose Participação de células TH1.
CD4+
Tripanossomíase Resposta mediada por
Trypanosoma
africana anticorpos
Entamoeba Resposta mediada por anti-
Amebíase
histolytica corpos e fagocitose
Fonte: Acervo dos autores.

1.4.2 Imunoematologia

Um dos principais sistemas de aloantígenos identificados em


mamíferos faz parte dos sistemas ABO, importante em reações
transfusionais. Trata-se de glicoesfingolipídeos encontrados na
membrana celular. São descritos mais de 400 antígenos eritrocitários;
estes são herdados obedecendo a um padrão de herança mendeliano
simples. As pessoas que não apresentam um determinado antígeno,
se expostos, têm maior chance de desenvolver anticorpos.

1.4.2.1 Sistema ABO


Os antígenos A, B e O (Quadro 8) ocorrem na maioria das células
do organismo e também nos fluidos corporais como saliva, lágrima,
sêmen e suor.
UNIUBE 63

Quadro 8: Grupo sanguíneo

Grupo sanguíneo
Tipo O Tipo A Tipo B Tipo AB
Antígenos eritrocitários e
Nenhum A B AeB
demais células
Anti-A
Anticorpos no soro Anti-B Anti-A Nenhum
Anti-B
Fonte: Acervo dos autores.

1.4.2.2 Sistema Rh
Mais complexo que o sistema ABO, compreende 3 locos ligados a
antígenos, alternativos, Cc, D ou não D (quando não há um antígeno
denominamos “d”). A maioria dos anticorpos produzidos contra estes
antígenos é do tipo imune e podem, por isso, provocar lise das
hemácias (Quadro 9).

Quadro 9: Sistema Rh

Sistema Rh
Antígenos Símbolo Tipo RhD
cde/cde RR negativo
CDe/cde R 1r positivo
CDe/CDe R1 R1 positivo
cDE/cde R2 r positivo
CDe/cDE R1 R2 positivo
cDE/cDE R2 R2 positivo
Outros genótipos Quase sempre positivos

Fonte: Acervo dos autores.

Você sabia que os anticorpos de anti-D ou anti-Rh eram a


principal causa de doença hemolítica do recém-nascido ou
“eritroblastose fetal”?
64 UNIUBE

Resumo

Estudamos, neste capítulo, os agentes lesivos, protozoários intes-


tinais e tissulares, de interesse médico; as medidas de profilaxia e
o controle das protozooses, a resposta de defesa a eles. Também
foram estudados os distúrbios da circulação de importância médica,
originados da agressão sofrida por esses agentes, bem como por
outros agentes lesivos e a Imunoematologia.

Atividades

Atividade 1

Marque, nos parênteses, a seguir:


D: se o protozoário causar diarreia de intestino delgado – aquosa e
volumosa;
G: se o protozoário causar diarreia de intestino grosso – mucos-
sanguinolenta;
N: se o parasito não causar diarreia.

( ) Cryptosporidium sp
( ) Entamoeba coli
( ) Trypanosoma cruzi
( ) Giardia lamblia
( ) Entamoeba dispar
( ) Entamoeba histolytica
( ) Cystoisospora belli
( ) Balantidium coli
( ) Leishmania braziliensis
UNIUBE 65

Atividade 2

Cite os mecanismos de transmissão para as parasitoses, a seguir:

• giardíase;
• amebíase;
• leishmaniose;
• criptosporidiose.

Atividade 3

Sabendo que êmbolo é um corpo estranho na circulação, explique a


patogenia da:

a) tromboembolia;
b) embolia gasosa;
c) embolia gordurosa.

Atividade 4

Descreva o mecanismo de defesa do sistema imune contra


protozoários.

Atividade 5

Quais as características genotípicas de um indivíduo do grupo


sanguíneo A fator Rh negativo?
66 UNIUBE

Referências

BRASILEIRO FILHO, Geraldo. Distúrbios Locais da Circulação.


In:______ Bogliolo. Patologia Geral. 3. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2004.

BRASILEIRO FILHO, Geraldo. Bogliolo. Patologia. 7. ed.


Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006.

COURA, José Rodrigues. Síntese das doenças infecciosas e


parasitárias. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.

MONTENEGRO, Mário Rubens; Franco, Marcello. Patologia.


Processos Gerais. 4. ed. São Paulo: Atheneu, 1999.

NEVES, David Pereira; MELO, Alan Lane de, LINARDI, Pedro Marcos,
VITOR, Ricardo Wagner de Almeida. Parasitologia humana. 11. ed.
São Paulo. Atheneu, 2005.

PETTIT, John E. Hematologia Clínica. 3. ed. São Paulo. Editora Manole, 2001.

RUBIN, Emanuel et al. Distúrbios Hemodinâmicos.


In:______Patologia: bases citopatológicas da medicina.
4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006.
Alterações celulares
Capítulo e doenças causadas
2 por metazoários,
imunologia dos tumores
e doença autoimune
Aldo Matos
Isabel Cristina Rezende Lopes
Lilian Margareth Biagioni de Lima

Introdução
Caro aluno, dando continuidade aos estudos, neste capítulo
abordaremos as alterações celulares e as doenças causadas
por metazoários.

Assim sendo, chegamos ao momento de estudar as agres-


sões causadas pelos metazoários. A maioria desses seres
unicelulares e eucariotos são de vida livre.

Entre os metazoários parasitos de humanos, existe uma


diversidade de habitat e de mecanismos de agressão. Isso
determina uma diversidade na resposta imunológica e nas
apresentações clínicas. Nesse capítulo, não temos a pretensão
de esgotar um tema verdadeiramente extenso. Mas, aqui você
encontrará orientações para seu estudo e informações que lhe
ajudarão em seus estudos. Com os objetivos de organizar as
informações e facilitar sua aprendizagem, apresentaremos,
na primeira parte desse capítulo, os protozoários intestinais,
seguidos dos protozoários sanguíneos e tissulares. A segunda
parte será constituída pelos temas Distúrbios do Crescimento
e da Diferenciação Celular decorrentes de alterações nos
mecanismos que regulam estes processos, além da imunologia
dos tumores e doenças autoimunes.
68 UNIUBE

Objetivos
Prezado aluno, ao final desse capítulo, esperamos que você
seja capaz de:

• descrever os ciclos biológicos dos metazoários


estudados;
• identificar os metazoários que habitam o intestino
delgado;
• identificar os metazoários que habitam o intestino grosso;
• enumerar as alterações causadas pelos metazoários
estudados;
• explicar os distúrbios do crescimento e da diferenciação
celular;
• explicar a imunologia dos tumores;
• identificar os fatores responsáveis pelo surgimento de
cada distúrbio;
• demonstrar o mecanismo de ação dos fatores na gênese
de cada distúrbio;
• descrever as alterações morfológicas macro e
microscópicas dos tecidos/órgãos, associando-as com
cada um dos distúrbios;
• demonstrar as consequências de cada distúrbio ao
organismo;
• descrever as doenças autoimunes;
• explicar as evoluções apresentadas por cada um dos
distúrbios.

Esquema
2.1 Doenças causadas por nematelmintos
2.1.1 Nematelmintos intestinais que realizam o Ciclo de
Loss
2.1.2 Nematelmintos intestinais que não passam pelos
pulmões
UNIUBE 69

2.1.3 Nematelmintos sanguíneos e teciduais


2.2 Doenças causadas por platelmintos
2.2.1 Taenia solium e Taenia saginata
2.2.2 Hymenolepis nana
2.2.3 Echinococcus granulosus
2.2.4 Schistosoma mansoni
2.3 Profilaxia e controle das verminoses intestinais
2.4 Crescimento e diferenciação celular
2.4.1 Regulação do crescimento celular
2.4.2 Distúrbios do crescimento celular
2.4.3 Alterações da diferenciação celular
2.4.4 Alterações do crescimento e da diferenciação
celular
2.4.5 Doenças autoimunes

2.1 Doenças causadas por nematelmintos

No filo dos nematelmintos (vermes cilíndricos), encontramos uma


grande diversidade biológica. Em relação ao quesito morfologia, o
seu comprimento pode variar de milímetros a centímetros; algumas
espécies habitam o intestino delgado, e
outras o intestino grosso; a infecção pode Infecção

ocorrer passivamente, pela ingestão dos Invasão e multiplicação


ovos larvados na maioria das espécies, de microorganismos
nos tecidos do
ou, ativamente, pela penetração cutânea organismo, que pode ser
das larvas. Talvez a característica mais clinicamente inaparente
ou resultar em lesão
comum nesse filo, além, claro, da forma celular local, devido a
cilíndrica, seja o dimorfismo sexual: metabolismo competitivo,
toxinas, replicação
intracelular, ou resposta
• a fêmea é maior que o macho; antígeno-anticorpo.

• o macho possui a extremidade pos-


terior recurvada ventralmente.

No Quadro 1, a seguir, encontramos um resumo das características


biológicas dos principais nematelmintos que parasitam humanos:
70 UNIUBE

Quadro 1: Características gerais dos principais nematelmintos parasitos de


humanos
MECANISMO
PARASITO TAMANHO HABITAT
DE INFECÇÃO

Ascaris Machos: 20-30 cm Ingestão de ovos Intestino


lumbricoides Fêmeas: 30-40 cm larvados delgado

Enterobius Machos: 5 mm Ingestão de ovos Intestino grosso


vermicularis Fêmeas: 1 cm larvados (região cecal)

Ingestão de ovos
Trichuris trichiura 3-5 cm Intestino grosso
larvados
Penetração
Machos: 5-9 mm Intestino
Necator americanus cutânea da larva
Fêmeas 9-11 mm delgado
filarioide
Penetração
Ancylostoma Machos: 8-11 mm Intestino
cutânea da larva
duodenale Fêmeas: 10-18 mm delgado
filarioide
Penetração
Strongyloides Intestino
0,8-1,2 mm cutânea da larva
stercoralis delgado
filarioide
Transmissão
de microfilárias
Wuchereria Machos: 3,5-4 cm por meio da Vasos do
bancrofti Fêmeas: 7-10 cm picada do sistema linfático
mosquito Culex
quinquefasciatus
Transmissão de Tecido
Onchocerca Machos: 2-4 cm microfilárias por subcutâneo,
volvulus Fêmeas: 40-50 cm meio da picada vasos linfáticos
do Simulium sp e cristalino
Fonte: Aldo Matos.

Observando o quadro, percebemos que a maioria dos nematelmintos


são parasitos intestinais, exceto a Wuchereria bancrofti, que pode
causar um quadro conhecido como elefantíase e o Onchocerca
volvulus, que pode causar cegueira irreversível.

Agora, estudaremos algumas especificidades das doenças causa-


das por cada parasito apresentado. Para facilitar nosso estudo,
vamos agrupar os nematelmintos da seguinte forma:
UNIUBE 71

• nematelmintos intestinais que realizam o Ciclo de Loss;


• nematelmintos intestinais que não realizam o Ciclo de Loss;
• nematelmintos sanguíneos e teciduais.

2.1.1 Nematelmintos intestinais que realizam o Ciclo de Loss

O termo Ciclo de Loss, significa que, durante o ciclo evolutivo, as


larvas do verme passam pelos pulmões, onde realizam uma muda.
Na prática, ao passar pelos pulmões, as larvas de nematelmintos
podem causar sintomas semelhantes a uma pneumonia (tosse, febre,
secreção pulmonar). Essa falsa pneumonia, causada por larvas de
vermes, recebe o nome de Síndrome de Löffler (pronuncia-se
“lófler”). Mas, ao contrário do que pode parecer ao se ler nos livros,
isso só ocorre em situações de infecção muito intensa, com um
número muito grande de larvas passando ao mesmo tempo pelos
pulmões. Por isso, a Síndrome de Löffler não é muito comum entre
os vermes Ascaris lumbricoides, Necator americanus, Ancylostoma
duodenale e Strongyloides stercoralis.

Além da Síndrome de Löffler, esses vermes, como todo parasito


presente no intestino delgado, provocam espoliação alimentar.
Espoliar, aqui, significa “roubar”.

EXPLICANDO MELHOR

Veja só: gastamos energia para fazer a digestão dos alimentos e, depois
de tudo digerido, parte do alimento é absorvida pelos nossos “hós-
pedes”, que nos parasitam. Mas, não podemos afirmar que os parasitos
intestinais causam subnutrição. Pense bem: se dividirmos nosso
alimento com os parasitos do nosso intestino, sentiremos mais fome.
Comeremos muito, “como adolescentes”... Bem, se tivermos condições
financeiras para comprar todo alimento que quisermos, comeremos
mais, isto é, comeremos o suficiente para nós e para nossos parasitos, e
não ficaremos subnutridos. Então, segundo esse raciocínio, os vermes
contribuem para a subnutrição, mas não podem causá-la sozinhos. A
subnutrição da pessoa parasitada é, portanto, resultado da parasitose
juntamente com a fome, que é uma “doença social”.
72 UNIUBE

Agora, vejamos alguns quadros clínicos, ou seja, sintomas que cada


um desses vermes pode causar:

2.1.1.1 Ascaris lumbricoides

O A. lumbricoides (Figura 1), popularmente conhecido como lombriga,


é um parasito grande, que precisa absorver uma grande quantidade
de nutrientes, especialmente a vitamina A e, portanto, pode provocar
uma hipovitaminose A.

Figura 1: Vermes adultos de Ascaris sp.


Foto: Aldo Matos.

Na Figura 1, vemos os vermes adultos de Ascaris sp. À esquerda, a


fêmea e, à direita, o macho. Note a extremidade posterior recurvada
ventralmente nos machos.

IMPORTANTE!

Possivelmente você já ouviu falar que uma pessoa que está com
manchas claras na pele pode estar com verminose. Isso pode ser
verdade, sim! Se a pessoa tiver uma grande carga parasitária de
A. lumbricoides e se alimentar mal, pode ter hipovitaminose A. Um
dos sintomas da carência de vitamina A, é justamente a formação de
manchas claras na pele, uma condição conhecida como “pano”.

Outro quadro que esse parasito pode causar é a obstrução intestinal.


Se você perguntar em sua família ou entre amigos, talvez encontre
uma história de alguém que morreu ou quase morreu porque teve
UNIUBE 73

um “nó nas tripas”, devido a lombrigas. Esse é o quadro que ocorre


quando há uma grande quantidade de A. lumbricoides no intestino
do hospedeiro, e esses vermes embolam-se e se enroscam como
um novelo, obstruindo a luz do intestino delgado. Esse quadro,
geralmente, só é corrigido por meio de uma cirurgia para remover o
bolo de parasitos.

Veja, na Figura 2, o ciclo evolutivo do Ascaris lumbricoides.

Figura 2: Ciclo evolutivo do Ascaris lumbricoides.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Esse parasito também pode causar o ataque de vermes ou fuga de


vermes. Essa condição ocorre quando um episódio de febre alta
ou uma medicação inadequada tornam o intestino do hospedeiro
um ambiente inóspito para o verme. Então, esse verme, que tem
a musculatura muito forte, movimenta-se contra o movimento
peristáltico, saindo pela boca, narina, orelha etc. Em um ataque
como esse, a pessoa infectada pode morrer.

2.1.1.2 Necator americanus e Ancylostoma duodenale


Esses dois nematelmintos são bastante semelhantes. Ambos
possuem um aparelho bucal que os torna capazes de morder
a mucosa intestinal. O Ancylostoma duodenale (Figuras 3, 4 e 5)
possui dois pares de dentes no aparelho bucal (Figura 3), e o Necator
americanus possui duas placas cortantes.
74 UNIUBE

Ao morder a mucosa intestinal, esses parasitos provocam sangra-


mento para se alimentarem, pois são hematófagos. Essa é a fisiopa-
tologia da anemia que está relacionada a essa parasitose, também
conhecida como “Amarelão” ou “Doença do Jeca Tatu”.

CURIOSIDADE

Lembra-se do Jeca Tatu? Ele é um personagem criado pelo escritor


brasileiro Monteiro Lobato. O Jeca Tatu é um trabalhador do campo,
magro e sem ânimo, devido à anemia e à subnutrição relacionadas
aos parasitos que alberga em seu intestino.

Figura 3: Aparelho bucal de um Ancilostomídeo.


Foto: Aldo Matos.

Na Figura 3, correspondente ao aparelho bucal de um ancilos-


tomídeo, note um dos dentes apontados pela seta.

Figura 4: Extremidade posterior de uma fêmea de Ancilostomídeo.


Figura 5: Extremidade posterior de um macho de Ancilostomídeo.
Foto: Aldo Matos.
UNIUBE 75

Na Figura 5, note a morfologia característica da bolsa copuladora, na


extremidade posterior do macho Ancilostomídeo.

Veja a Figura 6, ela corresponde ao ciclo evolutivo dos Ancilosto-


mídeos:

Figura 6: Ciclo evolutivo dos Ancilostomídeos.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Na Figura 6, observe que há dois tipos de larvas: rabditoide e


filarioide. Você deverá pesquisar as diferenças entre essas larvas e,
em seguida, registre suas observações no seu caderno de anotações.

2.1.1.3 Strongyloides stercoralis

Esse é um verme que apresenta algumas características biológicas


interessantes em seu ciclo evolutivo. O S. stercoralis (Figura 7) pode
multiplicar-se, durante algumas gerações, em vida livre.
76 UNIUBE

Figura 7: Ciclo evolutivo do Strongyloides stercoralis.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Diferente dos outros nematelmintos apresentados nesse capítulo,


seus ovos eclodem ainda nas vizinhanças da mucosa intestinal e,
assim, a forma evolutiva eliminada nas fezes dos humanos são as
larvas rabditoides (Figura 8).

Figura 8: Larva filarioide de Strongyloides


stercoralis, corada pelo carmim.
Foto: Aldo Matos.

Só existem machos na fase de vida livre no solo. Quanto às fêmeas,


estas são de duas categorias:

• as fêmeas de vida livre, encontradas no ambiente;


UNIUBE 77

• as fêmeas partenogênicas, que parasitam o intestino delgado


de humanos. Essas possuem o genoma 3n e, portanto, não
precisam de um macho para se reproduzirem.

Do ponto de vista clínico, esse é um dos poucos vermes que podem


causar diarreia. Como seu habitat é o intestino delgado, ele pode
causar uma diarreia com cólicas periumbilicais (em torno do umbigo),
fezes aquosas, com grande volume, odor muito forte, podendo conter
pedaços de alimentos não digeridos (lienteria) e flatulência (gases).
As fezes podem mesmo ser expulsas juntamente com os gases – o
que denominamos “diarreia explosiva”. Esse parasito também pode
causar um quadro de síndrome dispéptica, simulando os sinais e
sintomas de uma gastrite ou uma úlcera duodenal.

2.1.2 Nematelmintos intestinais que não passam pelos pulmões

Alguns nematelmintos realizam um ciclo evolutivo mais simples,


sem que necessitem invadir a corrente sanguínea para completar
sua evolução. É o caso do Enterobius vermicularis e do Trichuris
trichuris. Esses vermes encontram, na luz intestinal, as condições
necessárias para realizarem todas as mudas e tornarem-se vermes
adultos.

2.1.2.1 Enterobius vermicularis

Esse pequeno verme, conhecido também como Oxiúro (Figura 9),


habita a região cecal, onde realiza a cópula. A fêmea grávida migra em
direção ao reto e procura atravessar o ânus para fazer a ovoposição
na região perianal. É bem verdade que, ao tentar atravessar o ânus,
muitas delas arrebentam liberando os ovos. A movimentação das
fêmeas grávidas na região perianal é responsável pela manifestação
clínica mais frequente nessa parasitose: o prurido (coceira) perianal
que piora à noite.

A enterobiose é uma doença muito comum entre crianças na idade


escolar, e os professores, muitas vezes, já fazem o diagnóstico pela
observação das crianças coçando a região perianal. Em infecções
com grande quantidade desses parasitos, eles podem sair vivos,
movimentando-se, nas fezes. Ao coçar a região perianal, a pessoa
infectada contamina as mãos com ovos presentes nessa região;
ao levar a mão à boca, ou pegar um alimento, ingere novos ovos,
reinfectando-se ─ a isso chamamos autoinfecção externa.
78 UNIUBE

Os ovos também podem eclodir na luz do reto e as larvas migrarem


em direção à região cecal, onde se tornam vermes adultos, num
processo denominado autoinfecção interna. Somado a isso, os ovos
presentes na região perianal podem eclodir, as larvas penetram por
meio do ânus e migram pela luz do intestino grosso para se tornarem
adultas no ceco – esse processo é denominado retroinfecção.

Essas formas de reinfecção podem acontecer porque os ovos que


saem nas fezes ou ficam aderidos na região perianal, tornam-se
infectantes em poucas horas. Essa característica, somada ao fato
dos ovos serem pouco densos, ou seja, muito “leves”, favorecem a
dispersão dos ovos infectantes em todo o ambiente em que a pessoa
com enterobiose convive. Justamente por isso, todas as pessoas
que convivem com o indivíduo diagnosticado com essa parasitose
devem ser tratadas, pois estão potencialmente infectadas.

Figura 9: Verme adulto de oxiurídio.


Foto: Aldo Matos.

Na Figura 9, observamos o verme adulto de oxiurídio.

2.1.2.2 Trichuris trichiura

O T. trichiura é um parasito pouco comentado, mas que tem uma


prevalência considerável, e pode causar quadros clínicos importantes.
UNIUBE 79

Com formato de um chicote, esse pequeno verme tem o ciclo


evolutivo semelhante ao do E. vermicularis, porém até mais simples.
Assim como o E. vermicularis, o Trichuris trichiura (Figura 10) habita
o ceco, mas, é, nessa região, que acontece a postura de ovos que
precisam de alguns dias no ambiente para tornarem-se infectantes.
Portanto, na tricuríase não existe autoinfecção.

Figura 10: Ovo de Trichuris trichiura.


Foto: Aldo Matos.

Veja, na Figura 11, o ciclo evolutivo do Trichuris trichiura:

Figura 11: Ciclo evolutivo do Trichuris trichiura.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.
80 UNIUBE

No ceco (Figura 11), os vermes adultos inserem na mucosa, a parte


mais fina de seu corpo (“a corda do chicote”), na qual se encontra
o aparelho bucal. Assim, o parasito prende-se à mucosa intestinal e
provoca uma reação inflamatória, com intensa hiperemia e edema
acentuado. Em infecções leves (com poucos parasitos), o quadro
é assintomático; nas infecções de intensidade média, pode ocorrer
diarreia pastosa com muco e sangue (diarreia mucossanguinolenta)
e, nas infecções muito intensas, o parasito é encontrado em toda
a extensão do intestino grosso até o reto, causando edema nessa
região que, se muito intenso, pode provocar a projeção da mucosa
por meio do ânus, um quadro chamado prolapso retal.

2.1.3 Nematelmintos sanguíneos e teciduais

2.1.3.1 Wuchereria bancrofti

Esse é um verme bastante interessante. A infecção ocorre por meio


da picada de um mosquito, o Culex quinquefasciatus. O verme aloja-
se nos vasos linfáticos, causando sua obstrução com derrame de
linfa para os tecidos e cavidades (linforragia) que promove edema,
com aumento do tamanho da área afetada, principalmente membros
inferiores e superiores. A distensão da pele, provocada pelo edema,
favorece a penetração de bactérias do gênero Staphylococcus,
levando a um aspecto de membros com formato e pele semelhantes
aos de paquiderme (elefante). Esse é o quadro conhecido como
elefantíase. No Brasil, a infecção por esse parasito, ou seja, a filariose
bancroftiana, ocorre em algumas áreas litorâneas do nordeste e do
sul do país.

2.1.3.2 Onchocerca volvulus

De ocorrência mais comum na região amazônica e no continente


africano, esse verme (Figura 12) é uma filária transmitida por meio
da picada do Simulium sp.
UNIUBE 81

Figura 12: Ciclo evolutivo do Onchocerca volvulus.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Seu habitat mais frequente é no tecido subcutâneo, onde forma


nódulos conhecidos como oncocercomas. Mas, ainda pode invadir o
globo ocular, causando cegueira, ou mesmo, obstruir vasos linfáticos
promovendo um quadro de elefantíase.

2.2 Doenças causadas por platelmintos

No filo dos platelmintos (Quadro 2), encontram-se os vermes


achatados, habitantes do intestino delgado de seus hospedeiros
definitivos. Esses vermes, em sua maioria, realizam ciclo evolutivo
heteroxeno, ou seja, necessitam de dois hospedeiros para completar
o ciclo de vida. Nesse filo, existem duas classes de grande interesse:

• classe Cestoda, na qual encontramos os parasitos com o


corpo segmentado, dos gêneros Taenia, Hymenolepis e
Echinococcus;
• classe Trematoda, na qual encontramos o gênero Schistosoma.
82 UNIUBE

Quadro 2: Características gerais dos principais platelmintos parasitos de humanos

Mecanismo de
Hospedeiro Hospedeiro Habitat em
Parasito Tamanho infecção para
definitivo intermediário humanos
humanos
Ingestão da larva
Intestino
Taenia solium Até 5 m (cisticerco) em Humanos Suínos
delgado
carnes de suínos
Ingestão da
larva (cisticerco) Intestino
Taenia saginata Até 10 m Humanos Bovinos
em carnes de delgado
bovinos

Ingestão da larva
(cisticercoide)
e pulgas ou
coleópteros (o
Hymenolepis caruncho de Pulgas e Intestino
3-5 cm Humanos
nana cereais). coleópteros delgado
Ingestão de ovos
embrionados na
água ou verduras
contaminadas

Vísceras
Ovinos
Ingestão de ovos como fígado,
(ovelhas),
Echinococcus embrionados na Cães e pulmões, rins
4-6 mm caprinos
granulosus água ou verduras raposas e o sistema
(cabras) e
contaminadas nervoso
humanos
central
Penetração Moluscos
Machos cutânea da (caramujos)
1 cm larva cercária do gênero
Schistosoma Veias do
liberada na água Humanos Biomphalaria
mansoni sistema porta
Fêmeas pelos moluscos (B. glabrata,
1,5 cm do gênero B.tenagophyla,
Biomphalaria B. straminae)

Fonte: Aldo Matos.

Vamos, agora, estudar um pouco sobre os platelmintos apresentados


no Quadro 2, para compreender sua importância no cenário das
parasitoses.

2.2.1 Taenia solium e Taenia saginata

Esses platelmintos são bastante conhecidos pela população em


geral, que os chamam de “solitária”. Esse nome faz sentido porque
esse parasita é hermafrodita e, portanto, não precisa de parceiro
para se reproduzir.
UNIUBE 83

Apesar da grande semelhança entre esses dois parasitos (Taenia


solium e Taenia saginata) tratam-se de duas espécies diferentes.
Além de utilizarem hospedeiros intermediários distintos (suínos para
T. solium e bovinos para T. saginata), existem algumas diferenças
morfológicas entre essas duas espécies que merecem atenção
(Figuras 13, 14 e 15). As principais diferenças estão resumidas no
Quadro 3 a seguir:

Quadro 3: Quadro comparativo da morfologia da Taenia solium e da Taenia


saginata
Característica Taenia solium Taenia saginata
Tamanho do verme até 5m até 10m
adulto
Formato do escólex globoso quadrangular
(cabeça)
Coroa de acúleos presente ausente
(espinhos) nos escólex
Ramificações uterinas pouco numerosas e do muito numerosas e do
tipo dendríticas tipo dicotômicas
Eliminação das proglotes saem passivamente nas saem ativamente nas
fezes fezes
Fonte: Aldo Matos

Figura 13: Escólex da Taenia saginata contendo as quatro ventosas.


Figura 14: Escólex da Taenia solium.
Note os acúleos escuros, no ápice do escólex e as quatro ventosas.
Foto: Aldo Matos.
84 UNIUBE

Figura 15: Ciclo evolutivo das Taenia sp.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

A compreensão das doenças causadas por platelmintos do gênero


Taenia requer a distinção entre os quadros causados por diferentes
formas evolutivas desse parasito, que são: teníase e cisticercose.

Teníase: significa a presença dos vermes adultos da T. solium ou a T.


saginata no intestino delgado de humanos. A infecção, nesse caso,
ocorre pela ingestão da larva nas carnes cruas ou mal passadas.

Cisticercose: significa a presença da larva, ou seja, o cisticerco,


nos tecidos ou órgãos do hospedeiro. A infecção, nesse caso, ocorre
pela ingestão dos ovos embrionados do parasito.

IMPORTANTE!

Apenas os humanos têm teníase por T. solium ou T. saginata. O que o


bovino ou o suíno tem é cisticercose.
Somente a Taenia solium pode causar cisticercose no homem.
A cisticercose pode acometer diferentes tecidos ou órgãos e não
apenas o sistema nervoso central.
Ao contrário do que se fala corriqueiramente, a pessoa que tem
neurocisticercose, não possui “ovo de solitária” na cabeça, mas sim, a
larva do parasito instalada no Sistema Nervoso Central.
UNIUBE 85

Por serem causadas pelo mesmo parasito, a teníase e a cisticercose


são doenças correlacionadas, ocorrendo conjuntamente na mesma
população, o que nos faz analisá-las como um complexo teníase-
cisticercose. A aplicação de medidas de prevenção e controle para
uma dessas doenças, também previne e controla a outra. Então,
combater o abate clandestino de suínos e bovinos e fiscalizar a
higidez das carnes comercializadas são medidas de prevenção e
controle direto da teníase. Garantir o destino correto para as fezes,
o tratamento de esgoto, a filtração da água para beber e a higiene
pessoal e dos vegetais ingeridos crus, previne e controla diretamente
a cisticercose. Mas, todas essas medidas servem para prevenir e
controlar tanto a teníase quanto a cisticercose.

2.2.2 Hymenolepis nana

Esse pequeno cestoda não tem recebido a devida atenção. Veja a


Figura 16:

Figura 16: Ovo de Hymenolepis nana.


Foto: Aldo Matos.

Do ponto de vista biológico, ele é interessante porque utiliza pulgas


e coleópteros como hospedeiros intermediários e também porque,
diferente dos outros platelmintos apresentados aqui, podem realizar
os dois tipos de ciclo: monoxeno ou heteroxeno. No ciclo monoxeno,
o único hospedeiro é o ser humano (Figura 17).
86 UNIUBE

Figura 17: Ciclo evolutivo do Hymenolepis nana.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Do ponto de vista clínico, ele chama atenção porque produz uma


toxina que é absorvida pela mucosa intestinal, alcançando o sistema
nervoso central, levada pela circulação sanguínea. Em casos de alta
carga parasitária, a concentração dessa toxina pode ser tão elevada
que estimula o córtex motor, provocando crises convulsivas.

As crises convulsivas, por vezes observadas na neurocisticercose,


são decorrentes da lesão produzida no encéfalo pelas larvas da T.
solium. Na infecção pelo H. nana, não existe lesão alguma, mas a
estimulação excessiva do córtex motor.

2.2.3 Echinococcus granulosus

Esse é o menor cestoda apresentado nesse capítulo. Ele tem os


cães e raposas como hospedeiros definitivos, e os ovinos e caprinos
como hospedeiros intermediários (Figura 18).
UNIUBE 87

Figura 18: Ciclo evolutivo do Echinococcus granulosus.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

As pessoas que criam cabras e ovelhas, geralmente têm cães que


os auxiliam nesse trabalho e, portanto, estão sujeitas a ingerir os
ovos do parasito.

Em humanos, esse verme causa a hidatidose, uma doença


caracterizada pela presença da larva hidátide nas vísceras,
principalmente no fígado ou nos pulmões, e mais raramente, no
sistema nervoso central. Essa forma larvária tem a particularidade
de atingir grandes dimensões, apresentando-se como uma grande
vesícula cheia de um líquido rico em proteína e açúcar, no qual
encontramos dispersos, os escólex do E. granulosus (Figura 19).

Figura 19: Escólex de Echinococcus granulosus na areia hidática.


Foto: Aldo Matos.
88 UNIUBE

Esses escólex têm as dimensões aproximadas de um grão de areia,


o que justifica chamar o conteúdo do interior da hidátide de areia
hidática e tem a particularidade de só existir, em humanos, na forma
de uma larva chamada hidátide.

A sintomatologia da hidatidose é semelhante àquela apresentada por


um tumor benigno e resulta da compressão dos órgãos, devido ao
tamanho da hidátide. A larva cresce lentamente, durante anos, e assim
os sintomas demoram a chamar a atenção da pessoa, que, portanto,
demora a procurar auxílio médico. Como a hidatidose em humanos
está relacionada à criação de ovinos e caprinos, sua ocorrência, no
Brasil, está mais localizada nas regiões de criação desses rebanhos,
ou seja, no sul e nordeste do país, respectivamente.

2.2.4 Schistosoma mansoni

Esse verme é mais comentado no Brasil e está relacionado a um


quadro clínico de ascite, conhecido popularmente como “barriga
d’água” ou xistose (existem machos e fêmeas; Figuras 20, 21 e 22).

Figura 20: Macho do Schistosoma mansoni corado pelo carmim.


Figura 21: Fêmea de Schistosoma mansoni corada pelo carmim.
Foto: Aldo Matos.
UNIUBE 89

Figura 22: Casal de Schistosoma mansoni,


vistos a olho nu.
Foto: Aldo Matos.

Esse platelminto pertencente à classe Trematoda é dioico e necessita


de um hospedeiro intermediário, um molusco do gênero Biomphalaria
(Figura 23).

Figura 23: Conchas de Biomphalaria sp.


Foto: Aldo Matos.

O estudo da distribuição da doença no Brasil, ao longo dos tempos,


mostra que esse parasito é originário da África, tendo chegado ao
nosso país com o tráfico negreiro. Isso explica porque as áreas mais
antigas de prevalência da esquistossomose mansônica em nosso
país coincidem com as áreas de maior utilização de mão de obra
escrava no período colonial.
90 UNIUBE

A infecção do hospedeiro definitivo, como os humanos, ocorre pela


penetração cutânea da larva cercária, liberada do molusco infectado
(Figura 24).

Figura 24: Ciclo evolutivo do Schistosoma mansoni. A área sombreada corresponde


à parte do ciclo que ocorre na água.
Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Os estímulos para a cercária sair do molusco e nadar na água à


procura do hospedeiro definitivo, são a luz e calor. Portanto, nos
períodos mais quentes e iluminados do dia, por volta da hora do
almoço, o risco de contrair xistose é maior, porque haverá mais
cercárias na água. Coincidentemente, esse é o horário em que as
pessoas mais frequentam os mananciais de águas para praticar
esportes aquáticos, refrescarem-se ou para atividades de trabalho,
como lavar roupas.

Os parasitos adultos vivem nos vasos do sistema porta, consumindo


ferro e grande quantidade de glicose. As fêmeas fazem a ovoposição
dentro de vaso de pequeno calibre, geralmente na região do reto.
Esses ovos precisam sair da luz dos vasos sanguíneos e atravessar
a mucosa intestinal, em direção à luz do intestino grosso. Nesse
caminho, provocam hemorragia e inflamação. Em consequência,
as agressões geram um quadro de diarreia com muco e sangue,
conhecido como diarreia mucossanguinolenta. Porém, nem todos os
ovos conseguem chegar à luz do intestino.
UNIUBE 91

Alguns ficam presos na mucosa intestinal, estimulando uma infla-


mação crônica granulomatosa, formando os granulomas. A reação
granulomatosa também acontece no fígado (Figura 25), devido aos
ovos que sequer conseguiram sair dos vasos sanguíneos e foram
arrastados para esse órgão pela circulação venosa.

Figura 25: Granulomas no fígado, provocados


pelos ovos de Schistosoma mansoni.
Foto: Aldo Matos.

Na reação granulomatosa, ocorre a destruição do tecido normal,


que é substituído por tecido conjuntivo fibroso. No fígado, esse
processo, conhecido como fibrose, promove a compressão dos
vasos sanguíneos, gerando hipertensão portal (elevação da pressão
no sistema porta), que é responsável pela ascite (acúmulo de líquido
na cavidade peritoneal). Assim, podemos dizer que o ovo (Figura
26) é a forma evolutiva do S. mansoni, responsável pela formação
dos granulomas da ascite. Felizmente, esses quadros mais graves
não são muito frequentes na população infectada. É mais frequente
encontrar a infecção assintomática ou com poucos sintomas.

Figura 26: Ovo de Schistosoma mansoni em


amostras de fezes. Note a espícula lateral.
Foto: Aldo Matos.
92 UNIUBE

Quando analisamos a epidemiologia da doença, encontramos


alguns equívocos. Apesar de muitas pessoas falarem que a xistose
é a doença das “lagoas da coceira”, fazendo alusão à ocorrência de
moluscos em águas paradas e ao prurido (coceira) provocado pela
penetração da cercária na pele, essa expressão é equivocada. Os
moluscos aderem-se à vegetação da margem dos cursos d’água.
Então, basta que a velocidade da correnteza na margem seja baixa
o suficiente para não desprendê-los da vegetação, para que a área
seja colonizada por moluscos. Portanto, não é necessário que a
água esteja parada. Na verdade, existem rios caudalosos em cujos
remansos, ou “prainhas”, existe a transmissão da xistose. Também,
há cachoeiras, na base das quais, formam-se piscinas naturais, em
cujas margens encontram-se os moluscos. Quanto à coceira, essa
só deve ocorrer em infecções por grande quantidade de cercárias,
levando a um quadro de dermatite cercariana, o que não é muito
comum.

Veja na Figura 27, detalhes das ventosas oral (acima) e ventral


(abaixo) do verme adulto de Schistosoma mansoni.

Figura 27: Verme adulto de Schistosoma mansoni.


Foto: Aldo Matos.

A infecção pelo S. mansoni tem se estabelecido em novas regiões


e, diferente do que muitos pensam, não está restrita à zona rural ou
a municípios pouco desenvolvidos. Na periferia de algumas grandes
cidades, também é possível encontrar focos de transmissão da
doença.
UNIUBE 93

IMPORTANTE!

O caramujo, conhecido como “caramujo africano”, que atualmente é


uma praga no Brasil, chama-se Achatina fulica e não tem nenhuma
relação com a esquistossomose.

2.3 Profilaxia e controle das verminoses intestinais

Ao ler os capítulos sobre verminoses, nos livros de Parasitologia


Humana, você perceberá que as medidas de profilaxia e controle
são bastante repetitivas entre os parasitos. E, por isso, pode ser que
você não dê a devida atenção a esse tema. Então, vamos apresentar
algumas observações importantes nessa temática.

Primeiramente, é necessário diferenciar profilaxia e controle:

• profilaxia é a estratégia destinada a impedir que as pessoas


contraiam a infecção. Engloba medidas de proteção individual
e medidas de proteção da coletividade;

• controle é a estratégia destinada a abaixar a prevalência da


doença na população.

Na prática, muitas medidas são comuns à profilaxia e ao controle.


Por isso mesmo, é costume trabalhar profilaxia e controle juntos.
Mas, seja pensando em profilaxia ou controle, existe a necessidade
de conhecer os fatores de risco para a ocorrência das doenças. No
caso de verminose, os fatores de risco comuns a qualquer parasitose
intestinal são:

• ausência de rede de esgoto ou fossa, porque permite a


contaminação do ambiente (solo e água), com ovos e larvas
evacuadas juntamente com as fezes;
• consumo de água sem filtrar, porque a filtração elimina as
formas infectantes dos parasitos, que porventura estejam
na água. Considera-se que mesmo a água tratada deve ser
filtrada para consumo;
94 UNIUBE

• hábitos de higiene pessoal precários, porque as mãos contami-


nadas são veículos que carregam patógenos. Na sujeira que se
acumula embaixo da parte solta da unha (conteúdo subungue-
al), é possível encontrar os patógenos presentes em tudo o que
já tocamos. Assim, transferimos essa contaminação para tudo
que tocarmos posteriormente;
• precária higienização das hortaliças consumidas cruas, porque,
se o solo ou a água usada para aguá-las estiverem contaminados,
contaminarão também as hortaliças.

Para controlar esses fatores de risco, precisamos garantir:

• destino correto para fezes, garantindo a existência de rede de


esgoto ou fossas construídas longe de mananciais de água;
• filtrar a água para beber, mesmo que exista tratamento de água
no município;
• educação sanitária, no sentido de desenvolver com a comuni-
dade, conhecimentos sobre parasitoses e hábitos de higiene
individual e coletiva;
• higienizar as hortaliças que serão consumidas cruas.

SAIBA MAIS

A higienização das folhas (alface etc.), que serão consumidas cruas,


pode ser realizada lavando-as em água corrente e deixando de molho,
por 30 minutos, em uma solução preparada com uma colher de sopa
de hipoclorito (água sanitária) para cada litro de água. Devido ao
sabor desagradável da água sanitária, você pode optar por deixá-las
de molho, também por trinta minutos, em uma solução preparada com
duas colheres de vinagre para cada litro de água. O tomate, a cenoura,
etc, devem ser lavados com água e sabão, esfregando com bucha.

Também, pensando em controlar as parasitoses, é necessário


diagnosticar as pessoas infectadas, por meio de exames parasito-
lógicos de fezes, e tratá-los com o medicamento adequado. Embora
essa medida seja bastante valorizada nos planos de controle
de parasitoses, ela não surte o efeito desejado sem a melhora
UNIUBE 95

nas condições de vida das pessoas. Isso porque, se tratarmos a


população sem controlarmos adequadamente os fatores de risco,
logo após o tratamento essas pessoas serão reinfectadas.

Para alguns parasitos, existem medidas profiláticas específicas,


além das medidas gerais já apresentadas. Por exemplo, no caso da
enterobiose, os ovos do E. vermicularis tornam-se infectantes em
pouco tempo e acumulam-se na região perianal. O prurido perianal,
característico dessa parasitose, faz com que a pessoa infectada
contamine as mãos e as unhas ao coçar a região. Então, para
controlar essa parasitose, é bom tomar banhos matinais, lavando
bem a região perianal com água e sabão, para remover os ovos que
se acumularam no período noturno.

Também é importante manter as unhas curtas. No caso de parasi-


tos com ciclo heteroxeno, existem medidas destinadas a eliminar os
hospedeiros intermediários, pois sem eles o ciclo não se completa
e a doença não se perpetuará na população humana. Assim, para
controlar a xistose, por exemplo, existem medidas destinadas à
eliminação do Biomphalaria sp, com o uso de vene-nos molusquicidas
e o controle biológico, por meio de competidores que se alimentam
desses moluscos.

Como você está vendo, a profilaxia e, especialmente, o controle


das parasitoses intestinais, é algo bastante complexo, que exige
conhecimento técnico, tempo, investimento e vontade política.

2.4 Crescimento e diferenciação celular

O crescimento e a diferenciação celular são necessários para o


desenvolvimento do organismo pois permitem a manutenção da
morfologia, da função celular e a reposição de células que morrem
durante a nossa vida.

As células estão constantemente sujeitas a estímulos internos e


externos ao organismo. Como exemplo, citamos as parasitoses
estudadas neste capítulo. Sendo assim, é frequente surgirem
alterações nos mecanismos de controle destes processos, originando
os distúrbios do crescimento e da diferenciação celular.
96 UNIUBE

Caro aluno, antes de darmos início ao estudo de cada distúrbio,


iremos rever a capacidade de replicação das células normais,
ou seja, a capacidade que as células possuem de se dividir.
Você se lembra?

Vejamos...

Quanto a esta característica, as células são denominadas:

• lábeis: são as células que se encontram em constante atividade


mitótica substituindo as células que morrem. Representadas
pelas células dos epitélios de revestimento e pelas células
hematopoéticas;
• estáveis: são as células que apresentam baixo índice de
divisão, mas apresentam a capacidade de se replicar median-
te estímulos. Representadas pelas células parenquimatosas
de órgãos glandulares como, por exemplo, fígado, células
musculares lisas, astrócitos e células endoteliais;
• perenes: são células maduras e que perderam a capacidade
de se dividirem. Representadas pelos neurônios, embora
atualmente existam questionamentos a estes conceitos frente
às pesquisas que vêm sendo realizadas na área com células-
tronco.

Você se lembra dos estudos sobre o ciclo celular (Figura 28)?

Procure relembrar essas informações, a partir de nossos materiais


das etapas iniciais de nosso curso. Em seguida, diferencie cada uma
das fases encontradas na mitose e na meiose I e II: prófase, anáfase,
metáfase e telófase.

2.4.1 Regulação do crescimento celular

Os organismos multicelulares adultos conservam constante o


tamanho e o número de suas células, após a sua diferenciação. Os
agentes responsáveis pela manutenção da população celular normal
são os chamados estimuladores e inibidores da divisão celular. São
eles:
UNIUBE 97

Figura 28: Ciclo celular.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

2.4.1.1 Fatores de crescimento (FC)


São polipeptídeos produzidos por diferentes células do organismo
que são capazes de estimular ou inibir a divisão celular. São exemplos
de FC: PDGF (fator de crescimento derivado das plaquetas), EGF
(fator de crescimento epidérmico), FGF (fator de crescimento de
fibroblasto), entre outros.

Os FCs atuam por diferentes mecanismos:

• autócrino (quando atuam na mesma célula que o produziu);


• parácrino (quando atuam na célula vizinha à de sua produção);
• endócrino (quando atuam em células distantes da de sua
produção).

2.4.1.2 Adesão celular


A célula cessa a sua divisão e deslocamento ao entrar em contato
com as moléculas de adesão (Figura 29) (caderinas, integrinas e a
superfamília das imunoglobulinas) de outras células ou com a matriz
extracelular (fenômeno da inibição pelo contato).
98 UNIUBE

Figura 29: Caderina: molécula de adesão celular.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

SAIBA MAIS

Células-tronco e renovação dos tecidos

Você sabe o que são as células-tronco? Qual a sua importância?


Onde são encontradas?

Pois bem, as células-tronco são células indiferenciadas com capaci-


dade de intensa proliferação e, que, após inúmeras divisões se
diferenciam e regeneram ou renovam células de diferentes tecidos
(BRASILEIRO, 2004, p.179).

Quando ocorrem alterações no sistema que regula a taxa de


divisão e diferenciação celular, os Distúrbios do Crescimento e da
Diferenciação Celular são originados.

2.4.2 Distúrbios do crescimento celular

Alterações do volume celular: resultante do aumento ou da redução


da síntese dos constituintes celulares, o que acarretará no aumento
ou redução de seu volume:

• hipotrofia (Figura 30) é a diminuição do volume e da função


celular (do gr. hypo = pouco, redução; trophos = nutrição, meta-
bolismo);
UNIUBE 99

• hipertrofia (Figura 30) é o aumento do volume e da função


celular (do gr. hyper = excesso, além).

Figura 30: Células normais e apresentando hipotrofia


e hipertrofia.
Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Alterações da Taxa de Divisão Celular: decorrente do aumento ou da


diminuição da taxa de divisão celular: hiperplasia ou hipoplasia (gr.
plasis = formação), respectivamente.

AMPLIANDO O CONHECIMENTO

O termo aplasia (do grego, a = ausência) é utilizado erroneamente


como sinônimo de hipoplasia.
Por exemplo: anemia aplásica no lugar de anemia hipoplásica.

2.4.2.1 Hipotrofia

É um processo reversível caracterizado pela redução do volume


da célula e do órgão (Figura 31), em consequência da redução
quantitativa dos componentes estruturais e das funções celulares,
podendo ser acompanhado da diminuição do número de células
(apoptose) (BRASILEIRO, 2004, p. 182).
100 UNIUBE

Figura 31: Hipotrofia renal.


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

Etiopatogênese
Veja a hipotrofia, na Figura 32:

Figura 32: Hipotrofia glandular – Antro. HE, 100x.


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

A Hipotrofia (Figura 32) pode ser fisiológica ou patológica.

• hipotrofia fisiológica: é decorrente do envelhecimento


(senilidade) devido à diminuição do metabolismo celular;

• hipotrofia patológica: decorrente de diversos fatores:


UNIUBE 101

- isquemia parcial: redução da oferta de sangue a um tecido


por obstrução arterial parcial (aterosclerose, trombose,
embolia);
- inanição: decorrente da nutrição inadequada e/ou doen-
ças crônicas como na gastrite ou câncer;
- desuso: quando há imobilização de um membro devido a
fratura óssea ou paralisia;
- compressão das células parenquimatosas: por líquidos
(edema, hemorragia) ou por lesões expansivas, tais como,
tumores;
- interrupção de estímulos neurais e/ou hormonais: como a
que ocorre na poliomielite ou na lesão medular e hipotrofia
do endométrio uterino na menopausa, devido à redução
dos níveis de estrógeno.

Consequências

• Hipotrofia fisiológica: como há diminuição do metabolismo


celular no organismo como um todo, há o estabelecimento de
um novo estado de equilíbrio;

• Hipotrofia patológica: é dependente do órgão acometido.

2.4.2.2 Hipertrofia

A hipertrofia é um processo reversível, caracterizado pelo aumen-


to do volume da célula e do órgão, em consequência do aumento
quantitativo dos componentes estruturais e das funções celulares.
Pode ser acompanhado do aumento do número de células
(hiperplasia), ficando a região afetada mais volumosa e mais pesada,
assim como o órgão acometido (Figura 33).
102 UNIUBE

Figura 33: Coração normal e com hipertrofia ventricular


à direita.
Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

Etiopatogênese

A Hipertrofia se origina quando há uma maior exigência de trabalho


celular e pode ser fisiológica ou patológica.

• Hipertrofia fisiológica:

- musculatura do útero (miométrio), na gestação, decorrente


de estímulos hormonais (Figura 34);

Figura 34: Hipertrofia uterina.


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.
UNIUBE 103

- hipertrofia da musculatura esquelética (atletas, trabalha-


dor braçal), devido a grandes esforços físicos.

• Hipertrofia patológica:

É decorrente de vários fatores, sendo os mais comuns:

- Sobrecarga de trabalho;
- hipertrofia do miocárdio nas estenoses e insuficiências
valvares;
- hipertrofia da musculatura lisa da bexiga (Figura 35) na
hiperplasia nodular da próstata, devido ao estreitamento
da uretra prostática e a retenção da urina na bexiga;

Figura 35: Hipertrofia da musculatura lisa da bexiga.


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

- hipertrofia da musculatura lisa do esôfago e do cólon


na Doença de Chagas;
- ação hormonal - hipertrofia das células foliculares da
tireoide, no hipertiroidismo.

Consequências

Sendo um processo reversível, uma vez cessado o estímulo, a célula


hipertrófica volta ao seu volume normal.
104 UNIUBE

Se o estímulo persistir, as células hipertrofiadas entram em apoptose,


acarretando redução da função do órgão acometido. Por exemplo,
a insuficiência cardíaca na sobrecarga prolongada do miocárdio na
doença de Chagas.

2.4.2.3 Hipoplasia

Anomalias congênitas
É a redução da população celular de um
órgão ou de parte dele, com diminuição
Também chamadas do volume e do peso da região afetada e
defeitos do nascimento,
são anormalidades do órgão acometido.
físicas presentes no
momento do nascimento,
devido a alterações É um processo reversível, exceto os
cromossômicas herdadas decor-rentes de anomalias congênitas.
de um dos pais ou de
ambos.

Etiopatogênese

- defeitos na formação de um órgão ou parte dele durante


a embriogênese;
- redução da renovação celular e/ou aumento da taxa de
destruição celular.

A hipoplasia pode também ser de origem fisiológica ou patológica.

• hipoplasia fisiológica:
- timo, a partir da puberdade;
- gônadas, no climatério.

• hipoplasia patológica:
- medula óssea (anemia hipoplásica) - nas intoxicações
ou infecções;
- órgãos linfoides - na AIDS/SIDA;
- linfócitos - na corticoidoterapia.
UNIUBE 105

• Consequências

Dependem da sua localização e intensidade, é grave em órgãos


vitais: coração, pulmão, cérebro, rins.

2.4.2.4 Hiperplasia

A hiperplasia é o aumento do número de células (lábeis ou estáveis)


em um órgão ou parte dele, em consequência ao aumento da taxa
de divisão celular, com o aumento do peso e do volume do órgão
acometido.

Como na hipertrofia, na hiperplasia, há maior síntese de proteínas.


Portanto, para que ocorra a hiperplasia é necessário haver integridade
morfofuncional da célula, circulação adequada e inervação íntegra.

• Etiopatogênese

A hiperplasia também é um processo reversível e os estímulos que


levam a sua ocorrência geralmente são os mesmos da hipertrofia,
por exemplo, a sobrecarga de trabalho.

A hiperplasia pode ser fisiológica ou patológica:

• hiperplasia fisiológica:
- estimulação hormonal: útero na gravidez e mama na
puberdade ou lactação, entre outras;
- compensatória ou vicariante: rim, após nefrectomia
unilateral; fígado após hepatectomia parcial, entre
outras.

• hiperplasia patológica: geralmente ocorre na hiperprodução


hormonal, como:
- hiperfunção da hipófise: glândulas-alvo dos hormônios
produzidos em excesso apresentam hiperplasia. Por
exemplo: Síndrome de Cushing (hiperplasia e hiperfunção
da cortical da suprarrenal); gigantismo (hiperprodução
de hormônio de crescimento), entre outras;
106 UNIUBE

- aumento do nível de estrógeno: hiperplasia do endométrio;


- redução dos níveis de testosterona e aumento relativo de
estrógeno: hiperplasia nodular prostática (figuras 36 e 37).

Figura 36: Próstata normal (destaque).


Figura 37: Hiperplasia da próstata (destaque) e hipertrofia da musculatura lisa da bexiga.
Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

O risco de surgir um tumor nas hiperplasias


Metaplasia patológicas ser maior do que em tecidos
normais é devido ao aumento da taxa
(do grego, meta =
variação, mudança) é a de divisão celular sendo consideradas
substituição de um tecido lesões potencialmente neoplásicas.
adulto normal por outro
adulto normal de mesma
origem. Por exemplo,
substituição do epitélio 2.4.3 Alterações da diferenciação
estratificado escamoso celular
pelo glandular.

Tecido mesenquinal ou Metaplasia


mesênquima
Metaplasia é a transformação de um
É um tecido embrionário
derivado da mesoderme. tecido adulto (epitelial ou mesenquimal)
Durante suas fases em outro da mesma linhagem, porém
de transformação, o
mesoderma origina mais resistente, em resposta a irritações
uma espécie de tecido persistentes.
conjuntivo primitivo
chamado mesênquima.
A partir do mesênquima, A metaplasia pode ser do tipo epitelial ou
passam a se formar mesenquimal:
todos os tecidos
conjuntivos (conectivo,
adiposo, cartilaginoso, • Tipos de metaplasia epitelial
ósseo e hematopoiético),
bem como os tecidos - epitélio estratificado pavimentoso não
musculares.
ceratinizado em epitélio ceratinizado
(epitélio da boca ou esôfago);
UNIUBE 107

- epitélio pseudoestratificado ciliado em epitélio estratificado


pavimentoso ceratinizado ou não (metaplasia brônquica);
- epitélio mucossecretor em epitélio estratificado pavimentoso,
com ou sem ceratinização: epitélio endocervical em epitélio
escamoso tipo ectocervical (colo do útero) (Figura 38);

Figura 38: Metaplasia da mucosa


uterina (endocérvix).
Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Na Figura 38, vemos a metaplasia da mucosa uterina (endocérvix):


A) Epitélio cilíndrico normal, B) Hiperplasia de células subcilíndricas,
C) Metaplasia escamosa imatura, D) Metaplasia escamosa madura.

- epitélio glandular seroso em epitélio mucíparo: metaplasia


intestinal da mucosa gástrica (estômago, esôfago, vesícula
biliar) (Figura 39).

Figura 39: Metaplasia intestinal – Mucosa gástrica. HE, 200x.


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.
108 UNIUBE

Observe na figura 39, Metaplasia intestinal – Mucosa gástrica, como


a metaplasia provoca alteração de um tipo de célula ou tecido adulto
em outro tipo de célula ou tecido adulto.

• Tipos de metaplasia mesenquimal

- metaplasia cartilaginosa: transformação do tecido conjuntivo


em tecido cartilaginoso ou ósseo (cicatrizes e cápsula
sinovial);
- metaplasia óssea: transformação do tecido cartilaginoso em
ósseo ─ lesões cicatriciais (tuberculose, pancreatite, tecidos
moles).

Etiopatogênese

A metaplasia é um processo de adaptação celular, com a substitui-ção


de células mais sensíveis ao estresse, por células mais resistentes.

• Origem das metaplasias

- tecidos em intensa atividade mitótica (células germinativas);


- células adultas diferenciadas.

Fatores

- agressões mecânicas: próteses dentárias (epitélio da


gengiva ou da bochecha);
- calor: alimentos quentes (chimarrão, chás) sobre o epitélio
oral e do esôfago ou o uso de cachimbo (lábios);
- irritação química: ação do fumo sobre a mucosa brônquica;
- inflamações crônicas: gastrites, do colo uterino, entre outras.

Consequências

• volta do tecido à sua normalidade (se cessado o estímulo),


por se tratar de um processo reversível;
UNIUBE 109

• displasias, se o estímulo persistir, apesar de não serem


consideradas lesões pré-malignas;
• carcinoma gástrico, maior risco nos indivíduos que apresen-
tam metaplasia intestinal.

Veja a Figura 40:

Figura 40: Leucoplasia na mucosa oral


(seta).
Fonte: Acervo EAD-Uniube.

A leucoplasia (do grego, leukos = branco) é um termo clínico utilizado


para lesões brancacentas em mucosas (colo uterino, oral, esofágica,
entre outras), correspondendo à transformação de um epitélio
escamoso não ceratinizado em ceratinizado (Figura 40).

2.4.4 Alterações do crescimento e da diferenciação celular

2.4.4.1 Displasia

Displasia (do grego, dis = irregularidade, im- Indiferenciação


perfeição; plasis = formação) é a de-sorgani- celular
zação da proliferação celular acompanhada Sinônimo de
da diminuição ou indiferenciação celular. imaturidade celular,
Neste contexto, displasia é compreendida células com aspecto
embrionário, primitivo.
como uma alteração do crescimento e da di-
ferenciação celular.
110 UNIUBE

Na definição da Organização Mundial da Saúde (OMS), displasia


é uma lesão na qual parte do epitélio é substituída por células com
variados graus de atipia.

As displasias epiteliais são as mais conhecidas, e as mais frequentes


do colo uterino; apresentam aumento da proliferação e diminuição
da diferenciação celular.

Etiopatogênese

As displasias têm sua origem nos tecidos que apresentam altera-


ções na expressão dos genes que regulam a taxa de divisão celular
e a sua diferenciação, de modo mais intenso do que a que ocorre
nas metaplasias, sendo, por isso, denominadas de lesões pré-
cancerosas.

REGISTRANDO

As displasias de mucosas (colo uterino, brônquios e a gástrica), muitas


vezes precedem os cânceres que aí se desenvolvem.

Segundo a OMS, as displasias nos epi-télios


Atipia
são denominadas de neoplasias intra-epiteliais
Desvio da e são classificadas conforme o grau de atipia
morfologia normal.
celular em: leve, moderada ou acentuada.

Tipos de Neoplasia Intraepitelial Cervical (segundo a O.M.S.)

Leve (NIC I): quando ocorre discreta alteração da arquitetura no


terço inferior do epitélio pavimentoso estratificado (Figura 41).
UNIUBE 111

Figura 41: Displasia leve – fragmento de


antro – estômago. HE, 200x.
Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

Moderada (NIC II): geralmente quando dois terços inferiores


do epitélio são constituídos de células atípicas e o terço superior
apresenta células de aspecto normal (Figura 42).

Figura 42: Displasia moderada – lesão polipoide


do cólon. HE, 200x.
Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

Acentuada ou Carcinoma in situ (NIC III): quando há alteração das


três camadas do epitélio, ou seja, todo o epitélio é constituído por
células imaturas ou atípicas (Figura 43).
112 UNIUBE

Figura 43: Displasia de alto grau – cólon descendente.


HE, 200x.
Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

Você pode perceber que na displasia de alto grau (Figura 43) as


alterações são mais intensas, e são constituídas de células imaturas
ou atípicas, que frequentemente se estendem além da porção basal
do epitélio.

Classificação de Bethesda:

• lesão de baixo grau (NIC I);


• lesão de alto grau (NIC II e NIC III).

Segundo Franco e Montenegro (1999, p.221), nos países ocidentais,


devido à liberação sexual, e ao início precoce da atividade sexual,
houve o aumento da frequência de câncer de colo uterino (Figura 44)
em pacientes jovens, e apresentando a seguinte evolução:

• 30% dos casos, as lesões regrediram (NIC I);


• 49% persistiram (NIC II);
• 20% evoluíram para carcinoma in situ (NIC III);
• 1,3% progrediram para carcinoma invasor (NIC III).
UNIUBE 113

Figura 44: Lesões precursoras de carcinoma invasor no colo uterino.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

AMPLIANDO O CONHECIMENTO

Outros distúrbios:

• agenesia (do grego, gênesis = formação): é uma anomalia


congênita com a ausência de um órgão ou parte dele ou, ainda,
de um tecido ou células em um órgão ( agenesia renal, agenesia
do corpo caloso do cérebro, ausência de células germinativas
testiculares na síndrome de “somente células de Sertoli”) (RUBIN,
2006, p.227);
• distrofia: é o termo utilizado para as doenças degenerativas
sistêmicas. Por exemplo: distrofias musculares;
• ectopia ou heterotopia (do grego, ektos = fora; hetero =
diferente): é a existência de um tecido fora de sua localização
anatômica normal. Por exemplo, glândulas paratireoides no
mediastino anterior (timo);
• hamartias: crescimento desorganizado localizado em um deter-
minado tecido de um órgão; se formar tumor = hamartoma;
• coristia: crescimento de um tecido normal em locais onde
normalmente não é encontrado; se formar tumor = coristoma.
114 UNIUBE

2.4.4.2 Neoplasias
Prezado aluno, como foi estudado, existem fatores que regulam a
divisão celular, o que permite a manutenção da população celular e
a homeostase do organismo;

sendo que, em condições normais, são inversamente proporcionais,


o grau de diferenciação e a capacidade de multiplicação celular.

Tumor X Neoplasia

Tumor é um termo genérico dado a uma lesão expansiva, localizada,


decorrente de processos patológicos, tais como: inflamação, hema-
tomas, edemas, entre outros.

Neoplasia (do grego, Neo = novo; plasis = formação) se origina quando


há alteração nos genes que regulam o crescimento e a diferenciação
celular, e, nesta condição, a célula passa a se replicar autonomamente,
independente de estímulos internos e externos, de forma descontro-
lada, ou seja, é uma lesão expansiva decorrente da proliferação celular.

Nesse contexto, toda neoplasia é um tumor que resulta da muta-


ção dos genes que controlam o crescimento e a diferenciação
celular, tornando a célula neoplásica (Figura 45), morfológica e
funcionalmente, diferente da célula que lhe deu origem.

Figura 45: Carcinoma invasor cribriforme (células


neoplásicas malignas). HE, 400x.
Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.
UNIUBE 115

Genes que controlam o crescimento e a diferenciação celular

• protooncogenes (proto-onc): sis, ras, myc, erbB, src, abl, entre


outros;
• genes supressores de tumor: p53, p27, Rb, entre outros.

Genes de reparo do DNA

• família MMR (Mismatch Repair Genes): constituída de genes


responsáveis pelo reparo do pareamento errado do DNA. São
eles: hMSH2, hMSH6, hMLH1, hPMS2. Mutações dos genes
hMSH2 e hMLH1 levam ao surgimento de um tumor de cólon
denominado Câncer Colônico Hereditário não Associado a
Polipose (HNPCC);
• família UVDR (UV Damage Repair) ou ERC (Excision-Repair
Complement defective in Hamsters): constituída de genes
que atuam no reparo do DNA após sofrer ação da radiação
ultravioleta. Mutações nestes genes levam ao desenvolvimento
de tumores. Exemplo: Xeroderma pigmentoso;
• genes que atuam no reparo do DNA após sofrerem radiação
ionizante por meio da codificação de proteínas de reconhe-
cimento (proteínas cinases), proteínas de associação (da
família RAD) para a formação do
complexo reparador e que regulam Apoptose
proteínas reparadoras (genes BRCA-
1 e BRCA-2); Morte celular devido
à expressão de
• genes antiapoptóticos (Bcl-2, Bcl- genes (gene p53, por
exemplo),relacionada
-XL, entre outros), se sofrerem alte- com a manutenção da
rações, aumentam a sua expressão homeostase e com a
regulação fisiológica do
reduzindo a apoptose e originando tamanho dos tecidos,
os tumores (linfomas foliculares de mas pode também ser
causada por um estímulo
células B). patológico (como a lesão
ao DNA celular).

Imunologia a tumores

A ideia de que os tumores pudessem ser destruídos pelo sistema


imunológico estimulou a realização de grandes estudos para análise
da resposta imunológica para tumores. O conceito de vigilância
imunológica por Macfarlane Burnet (na década de 1950) afirma que
116 UNIUBE

existe fisiologicamente, por parte do sistema imune, a função de


reconhecer e destruir clones de células transformadas antes que
elas se tornem neoplásicas e destruir tumores já formados.

É bastante claro que o sistema imune age contra os tumores. Outra


observação importante é que o sistema de defesa deve estar vigilante
para impedir a proliferação celular descontrolada.

Precisamos, neste momento, compreender as características


dos antígenos tumorais e das respostas imunes para a completa
compreensão da imunidade tumoral.

A maioria das células tumorais expressa antígenos que são reco-


nhecidos como estranhos pelo sistema imunológico do hospedeiro.

Alguns estudos histopatológicos experimentais mostram que alguns


tipos de tumores possuem ao seu redor células mononucleares. A
presença de linfócitos normalmente indica melhor prognóstico.

A defesa contra tumores é mediada principalmente por linfócitos T.


As respostas imunes capazes de induzir a destruição das células
tumorais têm predomínio de Linfócitos T citolíticos, células NK e
macrófagos ativados.

Mas, infelizmente, as respostas imunes quase sempre são dribladas


pelas células tumorais e aí ocorre o desenvolvimento do tumor.
Embora os tumores sejam capazes de expressar antígenos que
são reconhecidos pelo sistema imunológico, a maioria dos tumores
é fracamente imunogênica. A imunoterapia visa ampliar a resposta
imunológica.

Etiopatogênese

Os agentes carcinogênicos, sejam químicos, físicos ou biológicos


têm a molécula de DNA como alvo, ou seja, os genes (BRASILEIRO,
2004, p.203).

Portanto, as neoplasias decorrem de um processo complexo,


dependente de modificações no genoma celular (inativação, deleção
ou expressão aumentada dos oncogenes e de genes supressores de
tumor) de forma evolutiva que culminam com o surgimento de clones
UNIUBE 117

de células mutantes, com capacidade de se dividirem autonoma-


mente, destruir e invadir os tecidos vizinhos, dar metástases e
formar os tumores. Os tumores assim formados são monoclonais
(BRASILEIRO, 2004, p. 201).

Classificação das neoplasias

As neoplasias são classificadas em benignas ou malignas,


dependendo de suas características morfológicas macro e
microscópicas e de seus efeitos sobre o organismo do hospedeiro
(efeitos biológicos).

As benignas geralmente não colocam em risco a vida de seu


hospedeiro. As malignas, em geral, são letais.

O Quadro 4, a seguir, apresenta as diferenças entre as neoplasias


benignas e malignas.

Quadro 4: Características das neoplasias

Características Benignas Malignas


Índice mitótico baixo alto
Tipo de crescimento expansivo invasivo/infiltrativo
Grau de diferenciação celular diferenciada de diferenciada até
anaplásica
Figuras de mitose raras, típicas frequentes, típicas e
atípicas
Atipias (celular e arquitetural) raras frequentes
Processos patológicos raros frequentes
(degeneração, necrose, hemorragia)
Delimitação da lesão definida imprecisa
Efeitos (locais e sistêmicos) geralmente às vezes, letais
inexpressivos
Adesividade celular alta baixa
Motilidade celular baixa alta

Recidiva geralmente presente


ausente
Metástases ausentes presentes
Fonte: Adaptado de Brasileiro (2004, p. 193).
118 UNIUBE

Características morfológicas das neoplasias

Neoplasias benignas

Características morfológicas macroscópicas:

• massa geralmente esférica, tipo nodular, decorrente de


seu crescimento expansivo, com compressão de estruturas
adjacentes, o que pode causar isquemia do tecido acometido
com transtornos ao paciente;
• não apresentam degenerações, necrose ou hemorragia na
área do tumor, devido ao crescimento lento, o que permite o
desenvolvimento de vasos sanguíneos e a nutrição das células.
O leiomioma (Figura 46) é uma neoplasia benigna que ocorre mais
frequentemente no sistema genital feminino.

Figura 46: Útero apresentando Leiomioma


(seta) na superfície de corte.
Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

Características morfológicas microscópicas:

• células bem diferenciadas, unidas entre si, com atipias discretas;


• frequentemente há a presença de cápsula fibrosa ao redor da
massa tumoral.
UNIUBE 119

Neoplasias malignas

Características morfológicas macroscópicas:

• órgão acometido mais espessado, com a presença de


degenerações, necrose ou hemorragia na área do tumor
(devido ao seu crescimento muito rápido não acompanhado
pelo desenvolvimento de vasos na área);
• massa tumoral apresenta limites pouco definidos (devido ao
crescimento invasivo) podendo apresentar-se ulcerada, ou
seja, com necrose no centro, de bordas elevadas, endurecidas
e irregulares.

Veja a Figura 47:

Figura 47: Adenocarcinoma de intestino.


Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

Características morfológicas microscópicas (Figura 48):

• aumento do número de células por unidade de área (hipercelu-


laridade);
• variações no volume celular (pleomorfismo celular);
• aumento da relação núcleo/citoplasma;
• cromatina irregular e compacta;
120 UNIUBE

• presença de figuras de mitose;


• graus de atipias variadas chegando a anaplasia (atipia acen-
tuada);
• atipias arquiteturais ou histológicas;
• menor aderência entre as células.

Figura 48: Carcinoma de células pequenas


(células neoplásicas malignas). HE, 400x.
Foto: Lilian Margareth Biagioni de Lima.

Observe, na Figura 48, as células neoplásicas malignas, com graus


de atipias arquiteturais ou histológicas.

Nomenclatura das neoplasias

Carcinoma (do grego, karkinos= caranguejo, crustáceo) termo usado


pela primeira vez por Galeno (138-201 d.C.) para identificar um tumor
maligno de mama que lembrava as patas de um caranguejo. Câncer
é a tradução latina de carcinoma.

A nomenclatura mais utilizada para os tumores foi a elaborada pela


OMS.

Os indicadores utilizados para dar nomes aos


Histomorfológico
tumores são: comportamento clínico (benigno
Morfologia do ou maligno), origem (histogené-tico), aspecto
tecido. mofológico (macro e microscó-pico). Dentre
estes, o mais utilizado é o histomorfológico.
UNIUBE 121

2.4.4.3 Regras importantes para a terminologia dos tumores


a) sufixo oma: utilizado na nomenclatura de neoplasias tanto
benignas quanto malignas;
b) carcinoma: utilizado para neoplasia maligna de epitélio de
revestimento; ou como sufixo, indicando malignidade. Por
exemplo, adenocarcinoma, neoplasia maligna de epitélio
glandular;
c) sarcoma: utilizado para neoplasia maligna mesenquimal; ou
como sufixo, indicando tumor maligno de um tecido específico.
Por exemplo: lipossarcoma, osteossarcoma, entre outros;
d) blastoma: sinônimo de neoplasia, se usado como sufixo,
indica tumor com características embrionárias. Por exemplo:
neuroblastoma (Quadro 5).

Quadro 5: Nomenclatura das Neoplasias

Origem do tumor/tecidos Benigno Maligno


Tecido Epitelial de Pólipo, Papiloma, Carcinoma
revestimento Epitelioma
glandular Adenoma Adenocarcinoma
Tecido Conjuntivo fibroso Fibroma Fibrossarcoma
adiposo Lipoma Lipossarcoma
cartilaginoso Condroma Condrossarcoma
ósseo Osteoma Osteossarcoma
Origem do tumor/tecidos Benigno Maligno
Tecido Muscular Liso Leiomioma Leiomiossarcoma
Estriado Rabdomioma Rabdomiossarcoma

Tecido nervoso neuroblasto Ganglioneuroma Ganglioneuroblastoma


neuroepitélio Ependimoma Ependimoma maligno
células da Astrocitoma Gliobastoma multiforme
glia
nervos Neurinoma Neurinoma
periféricos (schwannoma) (schwannoma maligno)
Meninges Meningioma Meningioma maligno
Vasos sanguíneos Hemangioma Angiossarcoma
linfáticos Linfangioma Linfangiossarcoma

Fonte: Adaptado de (BRASILEIRO 2004, p. 188).


122 UNIUBE

Nem todos os tumores recebem denominação segundo as regras


anteriormente descritas. A seguir, alguns exemplos que fogem às
regras:

• linfoma (tumor maligno de órgãos


linfoides);
• leucemias (tumor maligno de células do
sangue - leucócitos);
Epônimos • melanoma (tumor maligno de células
produtoras de melanina - melanócitos).
É uma personalidade
histórica ou lendária
que dá, ou empresta,
o seu nome a alguma Outros são epônimos: tumor de Wilms,
coisa, um lugar, linfoma de Hodgkin, tumor de Burkitt, entre
época, tribo, dinastia,
entre outras. outros.

IMPORTANTE!

Teratomas: termo utilizado para tumores benignos ou malignos


originados de células multipotentes, embrionárias ou germinativas,
constituídos por tecidos derivados de mais de um folheto embrionário
(endoderma, mesoderma ou ectoderma) (Figura 49). Ocorre nas
gônadas (masculinas e femininas) ou em outros locais na linha
mediana do corpo.

Figura 49: Teratoma sacrococcígeno.


Figura 50: Fibroadenoma.
Fonte: Acervo EAD-Uniube.
UNIUBE 123

Tumores mistos: são os que apresentam proliferação de mais de um


tecido simultaneamente (Figura 50). Por exemplo: fibroadenoma,
entre outros.

2.4.5 Doenças autoimunes

Nestes casos, ocorre falha na autotolerância e respostas imunológi-


cas subsequentes levam a produção de anticorpos contra antígenos
próprios.

Anticorpos produzidos contra antígenos teciduais podem opsonizar


células ou ativar o sistema complemento, resultando na produção
de proteínas indutoras de opsonização. Estas células podem ser
fagocitadas e posteriormente destruídas. Este mecanismo pode
explicar a origem da destruição celular na anemia hemolítica
autoimune e na púrpura trombocitopênica autoimune. Outro
mecanismo pelo qual estes anticorpos atuam é por meio da deposição
tecidual com consequente migração de neutrófilos e macrófagos que
se ligando aos anticorpos são ativados produzindo lesão tecidual.
Ainda pode ocorrer a ligação destes anticorpos a receptores de
células normais ou não interferindo na função destas, ocasionando
disfunção do órgão envolvido. Estes depósitos de anticorpos podem
ser detectados por meio de exames morfológicos.

Exemplos de algumas patologias causadas por anticorpos celulares


ou teciduais:

• Anemia hemolítica autoimune


Mecanismo de doença: opsonização e fagocitose das hemácias.

• Púrpura trombocitopênica autoimune


Mecanismo de doença: opsonização e fagocitose das plaquetas.

• Pênfigo vulgar
Mecanismo de doença: ativação de proteases e ruptura de
adesões intercelulares.

• Vasculite causada por anticorpos anticitoplasmáticos


Mecanismo de doença: desgranulação e inflamação de neu-
trófilos.
124 UNIUBE

• Febre reumática
Mecanismo de doença: inflamação e ativação de macrófagos.
Doença de Graves
Mecanismo de doença: estimulação de receptores de TSH
mediada por anticorpos.

• Diabetes mellitus tipo 1


Mecanismo de doença: destruição das células produtoras de
insulina.

Você sabia que as respostas autoimunes são frequentes, portanto,


são transitórias e reguladas?

Pois bem, para responder a esse questionamento e para ampliar seus


conhecimentos sobre essa temática, não deixe de ler novamente
esse capítulo e, em seguida, pesquise nos livros didáticos e na
internet todas as informações que achar pertinentes, em relação
às alterações celulares e doenças causadas por metazoários, a
imunologia dos tumores e a doença autoimune.

Resumo
Neste capítulo, estudamos os metazoários que habitam o intestino
delgado e o intestino grosso, seus ciclos biológicos e as alterações
orgânicas que causam.

Estudamos ainda, os distúrbios do crescimento e da diferenciação


celular (hipo/hipertrofia, hipo/hiperplasia, metaplasia, displasia; neo-
plasias); os fatores responsáveis pelo surgimento de cada distúrbio;
o mecanismo de ação dos fatores na gênese de cada distúrbio; as
alterações morfológicas macro e microscópicas dos tecidos/órgãos
apresentando esses distúrbios; as consequências de cada distúrbio
ao organismo e as evoluções apresentadas por cada, além da
imunologia aos tumores e doenças autoimunes.
UNIUBE 125

Atividades
Atividade 1

Você estudou, nesse capítulo, que as neoplasias são classificadas


em benignas e malignas, dependendo de suas características
morfológicas macro e microscópicas e de seus efeitos sobre o
organismo do hospedeiro (efeitos biológicos).

Nesse contexto, quais as características morfológicas microscópicas


que são identificadas em uma neoplasia maligna?

Atividade 2

Sendo a trombose a solidificação do sangue no sistema cardiovascular,


no organismo vivo, descreva a tríade de Virchow, como fatores da
trombose.

Atividade 3

Complete o quadro, a seguir:

Mecanismo de Tipo de ciclo


Verme infecção (monóxeno e/ou
heteróxeno)
Ascaris lumbricoides
Enterobius vermicularis
Trichuris trichiura
Ancylostoma duodenale
Necator americanus
Strongyloides stercoralis
Wuchereria bancrofti
Onchocerca volvulus
Schistosoma mansoni
Taenia solium
Taenia saginata
Hymenolepis nana
Echinococcus granulosus
126 UNIUBE

Atividade 4

A Taenia solium tem particularidade de poder causar duas doenças


diferentes em humanos: a teníase e a cisticercose. Explique o que é
cada uma dessas doenças e como elas são contraídas.

Atividade 5

Justifique a seguinte afirmação: toda neoplasia é um tumor, mas


nem todo tumor é uma neoplasia.

Referências

ABBAS, A. K.; LICHTMAN, A. H.; POBER, J. S. Imunologia celular e


molecular. 5. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.

BARNES, Robert D; RUPPERT, Edward E. Zoologia dos


invertebrados. 6. ed. São Paulo: Roca, 1996.

BRASILEIRO FILHO, Geraldo. Bogliolo. Patologia Geral. 3. ed.


Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004.

COURA, José Rodrigues. Síntese das doenças infecciosas e


parasitárias. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.

MONTENEGRO, Mário Rubens; Franco, Marcello. Patologia.


Processos Gerais. 4. ed. São Paulo: Atheneu, 1999.

NEVES, David Pereira; MELO, Alan Lane de, LINARDI, Pedro Marcos;
VITOR, Ricardo Wagner de Almeida. Parasitologia
humana. 11. ed. São Paulo. Atheneu, 2005.

RUBIN, Emanuel et al. Rubin, patologia: bases citopatológicas da


Medicina. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006.
Capítulo Biotecnologia clássica
3

Mariana Beatriz Guimarães de Ávila


Marcelo Fernandes da Silva

Introdução
Prezado (a) aluno (a), este capítulo de estudo apresenta os
aspectos éticos, legais e sociais da aplicação da Biotecnologia
em seus diversos segmentos. É importante que você, aluno
do curso de Ciências Biológicas, domine os conceitos e os
aspectos fundamentais das técnicas de Biotecnologia clássica
e moderna para que possa dimensionar seus impactos éticos
e sociais. Então, vamos iniciar este estudo conhecendo um
pouco mais sobre a Biotecnologia clássica.

A pesquisa e a tecnologia nas áreas biológicas visam buscar,


desde sua origem, alívio para o sofrimento humano, além de
proporcionar bem-estar e vantagens adaptativas ao Homem
em relação ao meio ambiente hostil. No último século, dilemas
morais e éticos têm acompanhado os grandes avanços
que modificaram a relação do homem com a natureza. No
mundo moderno, há uma necessidade de que a reflexão ética
acompanhe a pesquisa biotecnológica e discuta sua aplicação.
A ética é necessária, não para limitar ou cercear a pesquisa,
mas para evitar que a aplicação da Biotecnologia não se torne
prejudicial para a natureza, dignidade humana, e para o futuro
da humanidade. Portanto, os valores humanos universais
estão permeados na trama da história da Biotecnologia.

A bioética é um ramo da ética que se aplica às Ciências


Biológicas e Médicas, e expressa criticamente os limites de
nosso interesse na ciência e do uso racional e conveniente da
Biotecnologia.
128 UNIUBE

No Brasil, além do Conselho Nacional de Ética na Pes-quisa


com Seres Humanos e Animais (CONEP), há órgãos colegiados
que discutem as questões éticas e de biossegurança na área
de Biotecnologia como, por exemplo, a Comissão Técnica
Nacional – CTNBio e a recente Lei de Biossegurança.

Objetivos
Ao final do estudo deste capítulo, você deverá ser capaz de:

• definir e conceituar os fundamentos das técnicas de Bio-


tecnologia clássica e sua aplicação nas diferentes áreas
do conhecimento biológico;
• analisar criticamente os impactos das técnicas de Bio-
tecnologia na sociedade, nos valores humanos e no
meio ambiente.

Esquema
3.1 Conceitos em Biotecnologia
3.2 Implicações éticas da Biotecnologia
3.3 História da Biotecnologia
3.4 Fundamentos das técnicas de Biotecnologia clássica
3.4.1 Fermentação
3.4.2 Antibióticos
3.4.3 Fixação biológica de nitrogênio
3.4.4 Cultura de tecidos
3.4.5 Vacinas
3.5 Melhoramento genético vegetal
3.6 Melhoramento genético animal
3.7 Produção de Biodiesel

3.1 Conceitos em Biotecnologia


A Biotecnologia tem como principal objetivo a aplicação de processos
biológicos, por meio do uso de micro-organismos e/ou outros agentes
biológicos, no desenvolvimento de novos produtos e serviços.
UNIUBE 129

Esses produtos e serviços são revertidos em benefícios para a


sociedade, a partir dos avanços gerados em áreas como saúde
humana e animal, agricultura e manejo do meio-ambiente. É por este
motivo que a Biotecnologia apresenta um caráter multidisciplinar,
integrando diversas áreas do conhecimento, tais como:

• Ciências Biológicas nos campos da Bioquímica, Biofísica,


Fisiologia, Genética, Microbiologia, Virologia, Parasitologia,
Farmacologia, e Imunologia; além da Ecologia, Botânica e
Zoologia, relacionadas com a seleção de seres vivos naturais
que sejam ou diretamente úteis ou bons candidatos para
manipulação genética;
• Engenharias, ligadas ao desenvolvimento e manipulação
de equipamentos e processos de produção e ao controle e
processamento de insumos;
• Química básica e fina, para síntese de novos produtos,
isolamento, purificação e desenvolvimento de enzimas;
• Informática e automação para armazenamento das informações
genéticas e produção em escala industrial.

Veja a Figura 1:

Figura 1: Aspecto multidisciplinar da Biotecnologia.


Fonte: Adaptado de Villen (2011, p.1).
130 UNIUBE

Para melhor entender o significado do conceito de Biotecnologia,


observe, no Quadro 1, que esta palavra é composta por três radicais
gregos.

Quadro 1: Significado do termo Biotecnologia

Radical Significado
bio vida;
que define o conjunto de processos baseados em
conhecimentos científicos, e não empíricos, utilizados para obter
tecno um determinado resultado, ou seja, traduz o uso prático da
ciência;
logia estudo.

Fonte: Acervo dos autores.

Segundo Carvalho (1993), Biotecnologia é toda tecnologia de


produção industrial que utiliza seres vivos, ou partes funcionais
isoladas de seres vivos. Porém, atualmente, a diversidade das áreas
que utilizam o conhecimento biotecnológico ampliou a definição do
que é Biotecnologia, que já foi conceituada em diversos documentos
oficiais e por diferentes estudiosos, como no artigo 2º, do Decreto nº
2159/1998, que promulga a Convenção sobre Diversidade Biológica,
o vocábulo Biotecnologia significa:

[...] qualquer aplicação tecnológica que utilize


sistemas biológicos, organismos vivos, ou seus
derivados, para fabricar ou modificar produtos ou
processos para utilização específica.

Silveira, Dal Poz e Assad (2004, p. 18 e 19) completam essa definição


acrescentando que a Biotecnologia também pode ser usada para a
produção de serviços e observam, ainda, que:

[...] o termo Biotecnologia se refere a um conjunto


amplo de tecnologias utilizadas em diversos
setores da economia e que têm em comum o uso
de organismos vivos (ou parte deles, como células
e moléculas) para a produção de bens e serviços.
UNIUBE 131

O Decreto nº 6041, de 08/02/2007, que estabelece a Política de


Desenvolvimento da Biotecnologia e institui o Comitê Nacional de
Biotecnologia, apresenta uma definição que reúne esses dois últimos
conceitos, definindo a Biotecnologia como:

[...] um conjunto de tecnologias que utilizam


sistemas biológicos, organismos vivos ou seus
derivados para a produção ou modificação de
produtos e processos para uso específico, bem
como para gerar novos serviços de alto impacto
em diversos segmentos industriais.

A Biotecnologia pode ser classificada em dois grupos, de acordo


com o nível tecnológico de suas aplicações (Figura 2) (CARVALHO,
1993). Vejamos:

• Biotecnologia clássica ou convencional: ramo das Ciências


Biológicas que utiliza seres vivos encontrados na natureza
e otimizados pela mão do homem para determinada função
produtiva, mediante isolamento, seleção e cruzamentos
genéticos naturais (ainda que induzidos) entre espécies e
variedades sexualmente compatíveis;

• Biotecnologia moderna: ramo das Ciências Biológicas que,


a partir de seres vivos naturais, busca obter outros seres
vivos não encontráveis na natureza, gerados, portanto, pela
aplicação de técnicas não naturais de seleção, transformação
genética e otimização fisiológica.

Figura 2: A definição de Biotecnologia envolve vários segmentos e setores.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.
132 UNIUBE

PESQUISANDO NA WEB

Para saber mais sobre a Comissão Técnica Nacional – CTNBio e a


recente Lei de Biossegurança, as leis 11.105 de 24 de março de 2005,
a lei 11.460 de 21 de março de 2007 e o decreto nº 6041, de 08 de
fevereiro de 2007, acesse: <http://www.ctnbio.gov.br>.

3.2 Implicações éticas da Biotecnologia

Assim como a Biotecnologia moderna, a Bioética, também in-


terdisciplinar, pode servir como mediadora dos avanços dos dife-
rentes saberes da Biotecnologia. Nesse sentido, pode conciliar
adequadamente as novas possibilidades diagnósticas, terapêuticas
e de produção de alimentos com questões éticas que envolvem
dilemas, como a confidencialidade de informações, especialmente
devido à implicação para outros membros da família, ou grupo étnico,
e dos riscos de discriminação genética. Estes dilemas estão ligados à
compreensão da sociedade sobre a importância que é conferida aos
genes na determinação de fatores complexos como a sexualidade,
a inteligência, o comportamento,o crescimento etc... A Biotecnologia
deve, sobretudo, visar à prevenção de doenças, ao aumento de
produção de alimentos, minimizar a manifestação de doenças
genéticas e a compreensão do novo mundo que nos cerca. Muitas
dessas questões envolvem ideias que lidam com o reducionismo
biológico, a dualidade de gene ambiente e principalmente o conceito
de normalidade (MATTE, 2004).

PARADA PARA REFLEXÃO

Os benefícios da Biotecnologia podem ser individuais, mas suas


consequências são coletivas. Uma intervenção biotecnológica, como
um teste genético de investigação de paternidade, um diagnóstico
de doenças pré-natais que podem levar à interrupção da gravidez,
ou o processo de gravidez em idade avançada, pode ser feita numa
pessoa, mas seus resultados terão impacto na família, na população,
bem como nos valores éticos e morais da sociedade.
UNIUBE 133

Assim, a intervenção biotecnológica envolve questões como precon-


ceito, exclusão de benefícios, confidencialidade de informações, criação
de organismos geneticamente modificados, clonagem humana etc.

Para você compreender melhor o alcance das questões sociais


e éticas da Biotecnologia, sobretudo no cotidiano das relações
humanas, é importante compreender um pouco mais da história
da ciência biotecnológica, desde os povos primitivos até o Projeto
Genoma Humano.

3.3 História da Biotecnologia

O termo Biotecnologia foi utilizado, pela primeira vez, em 1919,


por Karl Ereky, um engenheiro agrícola da Hungria. Contudo, as
primeiras aplicações biotecnológicas pelo homem datam de 6000
a.C., quando sumérios e babilônios faziam a fermentação de grãos e
cereais para a produção de bebidas alcoólicas.

Posteriormente, por volta de 2000 a.C., os egípcios passaram a


empregar a fermentação para a fabricação de pães (VILLEN, 2011).
A fermentação também era utilizada para a produção de vinagre,
iogurte e queijos. Numa sequência extraordinária de aplicação do
conhecimento científico, foi possível ao homem identificar a molécula
responsável pelo armazenamento e transmissão de informação
genética – o DNA – e sua manipulação até a clonagem de um
mamífero e o sequenciamento do genoma humano (Quadro 2).

Quadro 2: Principais descobertas que propiciaram o desenvolvimento da


Biotecnologia

Período Descobertas

Produção de bebidas alcoólicas (cerveja e vinho) por meio da


6000 a.C.
fermentação de cereais, por egípcios e babilônios
Produção de pães e queijos, utilizando técnicas de fermentação,
2000 a.C.
por gregos e egípcios

1665 O inglês Robert Hooke revela a existência da célula

1675 Descoberta da bactéria pelo holandês Antony Van Leeuwenhoek


134 UNIUBE

1797 Começa a ser usada a vacina viral contra a varíola

1833 Primeira enzima é isolada por Anselme Payen, na França

1838 A proteína é descoberta por Jacob Berzelius, na Suécia

Gregor Mendel formula a Lei da Hereditariedade por meio de


1865
estudos utilizando ervilhas
É descoberto o ácido desoxirribonucleico (DNA) pelo alemão
1869
Friedrich Miescher
Louis Pasteur descreve os princípios da fermentação
1875
microbiológica
1880 - Surgimento da fermentação industrial – produção de ácido
1910 láctico, etanol e vinagre
1910 -
Síntese de glicerol, acetona e ácido cítrico
1940

1919 Karl Ereky cria o termo Biotecnologia

1940 - Por meio de processos fermentativos, antibióticos são produzidos


1950 em grande escala
James Watson e Francis Crick descrevem a estrutura helicoidal
1953
do DNA, colocando a pedra fundamental da Biologia Molecular
Início da chamada Biotecnologia moderna com o
1970
desenvolvimento da manipulação genética
Determinação da primeira sequência de DNA viral (bacteriófago)
1977
por Sanger
Descoberta do organismo Themophilus aquaticus, que permitiu a
1980
purificação da enzima Taq polimerase
Produção da insulina humana por engenharia genética, primeiro
1982
produto biotecnológico aprovado pelos órgãos de saúde dos EUA
Padronização da Técnica de Reação em Cadeia da Polimerase
1985 – PCR – que possibilitou a duplicação de DNA em laboratório por
Mullins
Sequenciamento completo de um vírus. Desenvolvimento dos
1995
primeiros seres transgênicos e das vacinas de DNA

1996 Clonagem da ovelha Dolly

2004 Projeto Genoma Humano

Fonte: Adaptado de NOGUEIRA (2011) e VILLEN (2011).


UNIUBE 135

PESQUISANDO NA WEB

Em 1996, a clonagem do primeiro mamífero causou um impacto


bastante significativo no cotidiano da sociedade, em especial, no
ambiente da sala de aula. Os alunos têm muita curiosidade sobre o
assunto.

E você, consegue explicar como foi possível criar um clone da ovelha


Dolly? Por que ela teve esse nome? Ela teve uma vida normal ou
apresentou alguma doença? Como ela morreu?
Acesse: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ovelha_Dolly ou ainda www.ghente.
org/temas/clonagem/index_dolly.htm>

3.4 Fundamentos das técnicas de Biotecnologia clássica


Esse ramo da Biotecnologia tem sua origem quando o homem, ao
abandonar o nomadismo, passa a plantar sementes, colher plantas,
frutos e raízes. Surgiu da curiosidade, da observação humana e de
experimentos ao acaso, desenvolvendo-se a partir de processos de
fermentação, para a produção de alimentos e bebidas. Seu auge foi
alcançado com a produção de antibióticos, imunossoros, vacinas e
outros produtos industriais.

A Biotecnologia clássica engloba técnicas que não interferem


ou modificam as moléculas de DNA ou RNA, mas observam os
resultados da aplicação ou da combinação de métodos que alteram
características morfológicas ou bioquímicas que envolvem (Quadro
3), por exemplo:

• processos fermentativos e enzimáticos;


• fixação biológica de nitrogênio;
• cultura de tecidos;
• extração biológica;
• melhoramento vegetal;
• melhoramento animal.
136 UNIUBE

Quadro 3: Aplicações das técnicas de Biotecnologia clássica

Técnicas Aplicações na Produção de:

Processos fermentativos antibióticos, alimentos e bebidas

Fixação biológica de nitrogênio soja e feijão

Cultura de tecidos produção de mudas e melhoramento vegetal

Extração biológica produção de vacinas, soros e biofármacos

espécies com características biológicas


Melhoramento vegetal complementares que quando somadas
configuram vantagens produtivas
indivíduos obtidos após série de acasalamentos
sucessivos com base no isolamento ou
Melhoramento animal
manifestação de uma característica fenotípica
desejável
produção de bioetanol e biodiesel a partir de
Produção de biocombustíveis
matérias-primas renováveis

Fonte: Acervo dos autores.

Para você entender melhor essas técnicas, vamos explicá-las, a


seguir.

3.4.1 Fermentação

A fermentação é um conjunto de reações biológicas anaeróbicas (na


ausência de oxigênio) produtoras de energia metabólica (síntese
de ATP), na qual uma molécula orgânica (em geral, a glicose) é
degradada em compostos mais simples. Essas alterações químicas
produzidas no substrato orgânico são produzidas por enzimas
elaboradas pelos micro-organismos fermentadores.

SAIBA MAIS

A participação destes micro-organismos no processo fermentativo só


foi descoberta no ano de 1875 por Louis Pasteur, derrubando a teoria
até então existente de que a fermentação era um processo puramente
químico.
UNIUBE 137

A fermentação ocorre com a quebra da glicose (ou outros substratos,


como o amido) em piruvato, que depois é transformado em ou-
tro produto, como o álcool etílico e lactato, definindo fermentação
alcoólica e láctica, respectivamente. O oxigênio não é necessário
como aceptor final de elétrons nesta forma de aquisição de energia.
Assim, este processo é denominado de respiração anaeróbica.

Contudo, o processo fermentativo tem uma eficiência 12 vezes menor


em termos de energia, gerando apenas dois ATPs por molécula de
glicose. Mesmo organismos mais complexos, como os mamíferos,
podem realizar fermentação láctea em condições anaeróbias
locais (falta de gordura nos músculos, por exemplo) para manter o
metabolismo por curtos períodos.

Esse processo pode ser estrito, ou seja, a única forma que um


organismo possui para adquirir energia utilizada nas reações do
metabolismo; ou facultativo, representando uma característica
evolutivamente mais favorável. Isto é, melhor adaptada, já que
tanto permite a um organismo realizar fermentação como também
respiração aeróbia, alternando de acordo com as condições do meio
(por exemplo, bactérias facultativas), ou necessidades demandadas
pelo potencial do próprio organismo (por exemplo, atividade esportiva
praticada por atleta maratonista).

O processo de fermentação é também utilizado na produção de mais


de 100 tipos de antibióticos.

Existem diversos tipos de processos fermentativos, que se


diferenciam pelo produto final obtido. São exemplos: fermentação
láctica, alcoólica, butírica, glicerina e acética.

Iremos detalhar a fermentação láctica e a alcoólica, que possuem


em comum a produção inicial de ácido pirúvico.

Fermentação láctica

Esta fermentação tem como produto final o ácido lático, geralmente


produzido a partir da lactose do leite. É causada por bactérias
conhecidas como lactobacilos, utilizadas na produção de queijos,
iogurte e coalhada.
138 UNIUBE

Neste processo, o piruvato e os elétrons de NADH permanecem


no citosol da célula. O piruvato é convertido em ácido láctico, que
será excretado pela célula, e o NADH doa os seus elétrons, sendo
convertido novamente em NAD+, que é importante para as reações
de glicólise (Figura 3).

Figura 3: A fermentação láctica.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Como dissemos, a fermentação láctica é o processo utilizado na


fabricação de produtos derivados do leite. Em resumo, a fermentação
láctica produz duas moléculas de ATP e duas de ácido láctico, a
partir de uma molécula de glicose: C6H12O6  2 ATP + 2 C3H6O3.

CURIOSIDADE

Você sabe por que temos dores musculares após o exercício físico?

Pela fermentação lática no músculo: ao se realizar um esforço


muscular intenso, a quantidade de oxigênio direcionada aos músculos
não é suficiente para fornecer toda a energia que é necessária para
a atividade desenvolvida. Assim, as células musculares passam a
realizar a fermentação láctica, na qual o ácido láctico acumula-se no
interior da fibra causando dores, cansaço e cãibras. Em seguida, uma
parte desse ácido é conduzida pela corrente sanguínea ao fígado
onde é convertido em ácido pirúvico.

Fermentação alcoólica

A fabricação de produtos, como pão e cerveja, é realizada a partir


de alguns fungos (leveduras), denominados como anaeróbicos
facultativos.
UNIUBE 139

O álcool é um produto deste método, que, por isso, é chamado de


fermentação alcoólica. Esse processo também é empregado na
fabricação de vinhos, cervejas e pães.

A fermentação alcoólica é um processo biológico que consiste na


transformação da glicose (açúcar) em álcool e dióxido de carbono
(CO2).

Resumindo, a fermentação alcoólica produz duas moléculas de


ATP, duas de dióxido de carbono e duas de etanol, a partir de uma
molécula de glicose: C6H12O6  2 ATP + 2 CO2 + 2 C2H6O. Veja a
Figura 4:

Figura 4: Fermentação alcoólica.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

SAIBA MAIS

O dióxido de carbono, liberado durante a fermentação alcoólica,


é responsável pelo crescimento de massas de bolo e de pão que
possuem fermento.

A produção de etanol é feita a partir do processamento da cana-de-


açúcar e obedece aos seguintes procedimentos, listados no Quadro
4:
140 UNIUBE

Quadro 4: Etapas e procedimentos no processamento da cana-de-açúcar


1. Moagem da cana, para obtenção do caldo de cana, que contém alto teor de
sacarose (C12H22O11)
2. Produção de melaço, a partir do aquecimento do caldo de cana
3. Fermentação do melaço, por meio do fungo leveduriforme Saccharomyces,
obtendo-se o mosto fermentado
4. Destilação do mosto fermentado

COMPARANDO

Fermentação láctica: C6H12O6  2 ATP + 2 C3H6O3


Fermentação alcoólica: C6H12O6  2 ATP + 2 CO2 + 2 C2H6O

PESQUISANDO NA WEB

O artigo “Dez mil anos de pileque - a história da bebida” traz


interessantes curiosidades sobre o uso e a importância da bebida
alcoólica, pela humanidade.
<http://super.abril.com.br/saude/dez-mil-anos-pileque-historia-
bebida-447717.shtml>.

3.4.2 Antibióticos

A produção industrial de antibióticos iniciou-se nos anos 1940, com


a produção da penicilina. A introdução dos antibióticos na medicina
marcou o início de uma era em que doenças mortais passaram a ter
cura, determinando um aumento na expectativa de vida estimado
em 10 anos nos países industrializados (MENEZES, ALVES &
CARDOSO, 2000).

Mais de 100 tipos de antibióticos são produzidos naturalmente por


diversas espécies de fungos e bactérias. Contudo, o significa-do
biológico da produção de antibióticos pelo micro-organismo produtor
ainda não é muito claro, embora não desconsideramos o seu
significado ecológico para a sobrevivência do micro-organis-mo na
natureza.
UNIUBE 141

De uma forma geral, o esquema básico de um processo fermentativo


para produção comercial de um antibiótico é representado, no Quadro
5, com alguns exemplos de antibióticos e os micro-organismos
produtores correspondentes, no Quadro 6.

Quadro 5: Esquema básico do processo fermentativo para produção de


antibióticos

1. Preparo do inóculo

2. Inoculação em meio de fermentação


3. Incubação em condições de fermentação controladas e aeração forçada
com ar esterilizado
4. Remoção do micélio fúngico por centrifugação e/ou filtração

5. Extração e purificação do antibiótico

Fonte: Acervo dos autores.

Quadro 6: Alguns antibióticos e seu micro-organismo produtor

NOME MICRO-ORGANISMO
Penicilina Penicillium notatum
Tirotricina Bacillus brevis
Griseofulvina Penicillium griseofulvum
Estreptomicina Streptomyces griseus
Bacitracina Bacillus lincheniformis
Cloranfenicol Streptomyces venezuelae
Polimixina Bacillus polymyxa
Clortetraciclina Streptomyces aureofaciens
Cefalosporina Cephalosporium sp
Neomicina Streptomyces fradiae
Oxitetraciclina Streptomyces rimosus
Eritromicina Streptomyces erithreus
Espiramicina Streptomyces ambofaciens
Vancomicina Streptomyces orientalis
Gentamicina Micromonospora purpurea

Fonte: Adaptado de Sebastianes; Pizzirani-kleiner (2008).


142 UNIUBE

3.4.3 Fixação biológica de nitrogênio

O nitrogênio é um elemento fundamental na composição das


biomoléculas, sendo um componente da estrutura de ácidos
nucleicos, aminoácidos, proteínas. Esta característica torna-o vital
à sobrevivência e crescimento dos organismos, com destaque para
as plantas, tornando-se um fator limitante para a produtividade
agrícola. O maior reservatório de nitrogênio é representado pelo
gás atmosférico (aproximadamente 80%) (ARAÚJO & CARVALHO,
2006). No entanto, as plantas não possuem aparato enzimático
para quebrar a tripla ligação da molécula e utilizá-la como fonte de
proteína.

A fixação biológica de nitrogênio (FBN) é o processo pelo qual


este elemento químico é captado da atmosfera, onde se encontra
em sua forma molecular relativamente inerte (N2), e é convertido
em compostos nitrogenados (como amônio ou nitrato), usados
em diversos processos químico-biológicos do solo, especialmente
importantes para a nutrição de plantas (WIKIPÉDIA, 2009). Apesar
de termodinamicamente favorável, a FBN requer uma energia de
ativação extremamente alta, não ocorrendo espontaneamente sem
a presença de catalisadores adequados.

EXPLICANDO MELHOR

Nas raízes de plantas da família das leguminosas (como a soja e o feijão)


encontram-se associadas bactérias diazotróficas, principalmente do
gênero Rhizobium, relação que pode ser definida como um tipo de
simbiose, já que a relação é benéfica tanto para a planta quanto para
a bactéria. Na prática agrícola, a fixação biológica do nitrogênio é feita
utilizando-se estas plantas, com vantagens sobre a adubação mineral,
principalmente do ponto de vista econômico. Outra vantagem é o
total aproveitamento do N fixado, não havendo perdas como podem
ocorrer quando se aplicam fertilizantes (ARAÚJO; CARVALHO, 2006).
Desta maneira, a fixação biológica do nitrogênio é um processo que
não polui o ambiente, enriquece o solo em N e, geralmente, promove
um maior crescimento e desenvolvimento das plantas.
UNIUBE 143

Na natureza, somente um pequeno número de micro-organismos,


denominados diazotróficos ou fixadores de nitrogênio, é capaz de
reduzir nitrogênio atmosférico a amônia. Nesse processo, a quebra
da tripla ligação da molécula do nitrogênio é realizada pelo complexo
enzimático denominado nitrogenase, ocorrendo no interior de
estruturas específicas, denominadas de nódulos, onde bactérias dos
gêneros Rhizobium, Bradyrhizobium e Azorhizobium convertem o N2
atmosférico em amônia (ARAÚJO; CARVALHO, 2006). A amônia é
incorporada em diversas formas de N orgânico para a utilização por
plantas da família das leguminosas.

Evolutivamente, acredita-se que a FBN tenha ocorrido quando as


reservas geoquímicas de nitrogênio fixado se tornaram escassas na
biosfera. O esgotamento dos óxidos de nitrogênio (nitratos e nitritos)
pelos organismos teria limitado seu crescimento e ocasionado
uma pressão seletiva, favorecendo o surgimento da diazotrofia.
Consequentemente, a capacidade de fixar nitrogênio teria sido
um evento relativamente precoce na evolução dos procariontes e
anterior ao surgimento da fotossíntese, uma vez que a nitrogenase
é extremamente sensível à desnaturação por oxigênio. De fato,
acredita-se que a grande homologia compartilhada pelas diferentes
nitrogenases sugeriria sua origem ancestral comum e o fato de que a
diazotrofia tenha sido uma característica importante e não rara entre
os procariontes. Ao longo do tempo, essa propriedade foi sendo
perdida, e se manteve apenas em alguns organismos, as atuais
bactérias diazotróficas.

3.4.4 Cultura de tecidos

A cultura de tecidos in vitro, introduzida no início do século XX,


“compreende a cultura de células, tecidos ou órgãos, em condições
de assepsia e meios de cultura artificiais” (OLIVEIRA, 2000, p. 22).
Possibilita a criação de uma nova planta a partir de uma pequena
parte de uma planta adulta, chamada explante. Esse explante é
cultivado em laboratório, em meios de cultura estéreis e específico e
induzido a se regenerar num vegetal completo, semelhante à planta
original, doadora do explante.

Diferentes tecidos podem ser utilizados como explantes, entre eles:


células isoladas, fragmentos de hastes e folhas, anteras, raízes,
gemas axilares ou apicais e até órgãos de armazenamento.
144 UNIUBE

A técnica deve ser executada em condições de esterilidade, em


câmaras de fluxo laminar horizontal, e as plantas originadas são
conservadas em salas de crescimento adequadas, controlando-se a
temperatura, umidade e o fotoperíodo.

Esta técnica tem como base o fenômeno da totipotencialidade,


isto é, capacidade que a célula vegetal tem de se organizar em um
novo indivíduo, mantendo a informação genética necessária, sem
a ocorrência de recombinação gênica, originando uma nova planta.
Teoricamente, todas as células vegetais possuem a peculiaridade
da totipotência. Contudo, a manifestação da totipotencialidade está
diretamente relacionada com a quantidade de tecido meristemático
contido no explante. Por esta razão, ápices caulinares são melhores
explantes para regeneração de novas plantas, quando comparados
com segmentos de folhas e hastes.

Esta técnica vem sendo bastante utilizada como ferramenta au-


xiliar nos programas de melhoramento vegetal, permitindo o
aperfeiçoamento da interação entre fatores abióticos (nutricionais,
luminosos, temperatura etc.) e bióticos (hormonais e genéticos).
Isso resulta em plantas sadias, fortes e geneticamente superiores,
que podem ser multiplicadas massivamente. Apresenta ampla
importância econômica, pois permite a propagação em maior escala
de plantas de superior qualidade, sem destruir a planta original e
obter plantas de fácil transporte para diversas regiões, além de
permitir a recuperação de plantas de difícil propagação, como por
exemplo, algumas espécies nativas do Cerrado, ou daquelas em
vias de extinção (OLIVEIRA, 2000).

• Técnicas de cultura de tecidos

Micropropagação

A micropropagação é a propagação fiel de um genótipo selecionado


por meio das técnicas da cultura in vitro. A micropropagação se
revelou de grande utilidade na produção de plantas com alto rigor
sanitário e isentas de vírus, apresentando importância prática na
propagação de espécies de interesse florestal e em espécies cujo
modo de propagação é a vegetativa.
UNIUBE 145

A adoção desta técnica permite um rápido aumento no número


de plantas geneticamente idênticas, possibilitando a produção de
mudas durante todo o ano, colaborando, também, na propagação
de plantas cujas sementes apresentam baixo poder germinativo.

Microenxertia

Técnica que consiste em microenxertar, em condições assépticas,


um ápice caulinar, retirado de uma planta matriz, sobre um porta
enxerto estabelecido in vitro.

Outras técnicas

Existem várias outras técnicas de culturas de tecidos utilizadas na


agricultura, são elas:

• cultura de raízes;
• conservação in vitro de recursos genéticos de plantas;
• polinização e fertilização in vitro;
• cultura de embriões;
• cultura de ovários;
• protoplasto;
• indução de mutações in vitro.

3.4.5 Vacinas

As vacinas são preparações que provocam no organismo uma


reação do sistema imunológico idêntica à que ocorreria em caso
de infecção por um agente infeccioso específico, desencadeando
a formação de anticorpos e tornando o organismo imune a esse
agente e às doenças por ele causadas.

História das vacinas

Ao observarem que os sobreviventes de um ataque de varíola não


voltavam a sofrer da doença, diversos povos tentaram provocar a
moléstia de uma forma mais branda. Os primeiros registros desta
prática, que levou o nome de variolização, remontam aos chineses,
146 UNIUBE

no século X. Esta técnica também era conhecida entre diversos


povos da África e da Ásia, como egípcios, persas, indianos e árabes.

A variolização chegou às Américas quando jesuítas inocularam


índios no Brasil, e Thomas Boylston imunizou 243 pessoas durante
uma epidemia em Boston, em 1721.

Desde sua inserção na Europa, a variolização sempre enfrentou


dura oposição, que se agravou com a constatação de que cerca de
2% dos inoculados morriam e muitos desenvolviam formas graves
da doença. Por isso, a prática foi suspensa em muitos locais.

SAIBA MAIS

Edward Jenner, um médico inglês, reparou que as ordenhadoras que


se recuperavam da infecção por vacínia, infecção do gado semelhante
à varíola, porém benigna, nunca contraíam a varíola humana, uma
doença mais grave. Com base nesta observação, em 14 de maio de
1796, Jenner injetou o material de uma pústula de uma ordenhadora
no braço de James Phipps, um menino de oito anos. O garoto contraiu
uma infecção extremamente benigna e, dez dias depois, estava
recuperado. Posteriormente, Jenner inoculou este garoto com varíola
e ele não desenvolveu a doença. Assim se deu a descoberta da vaci-
na (ABBAS & LICHTMAN, 2005; BIO-MANGUINHOS, 2011).

Edward Jenner passou a imunizar crianças com material retirado


diretamente das pústulas dos animais e passado braço a braço. Em
1798, o médico publicou o tratado pioneiro sobre a vacinação (do
latim vaccinus, que significa relativo a ou derivado de vacas): um
inquérito sobre as causas e os efeitos da vacina contra a varíola.

Jenner encarou sérias resistências, já que a classe médica


demonstrava ceticismo. Grupos religiosos alertavam para o risco
da degeneração da raça humana pela contaminação com material
bovino: a vacalização ou minotaurização, como foi chamada. Porém,
em pouco tempo, a vacina conquistou a Inglaterra, com a criação do
primeiro instituto vacínico em 1799. Em 1802 foi fundada a Sociedade
Real Jenneriana para a Extinção da Varíola. A descoberta de Jenner
logo se difundiu pelo mundo.
UNIUBE 147

Em 1799, o imunizante chegou a Portugal dentro de um pequeno


frasco. D. Pedro, futuro imperador do Brasil, e seu irmão foram
inoculados. Em 1804, o marquês de Barbacena trouxe a vacina para
o Brasil, transportando-a pelo Atlântico, por meio de seus escravos,
que iam passando a infecção vacinal um para o outro, braço a braço,
durante a viagem.

A utilização de vacinas tem uma melhor relação custo-benefício no


controle de doenças imunopreviníveis que o uso de medicamentos
para sua cura. Como consequência de muitos anos de investimento
em pesquisa e desenvolvimento científico e tecnológico, as vacinas
são seguras e julgadas essenciais para a saúde pública. Elas podem
ser formadas de moléculas, micro-organismos mortos ou micro-
organismos vivos atenuados (BIO-MANGUINHOS, 2011).

Composição das vacinas

• Moléculas: exemplo de vacina produzida a partir de uma


molécula específica são as vacinas contra os sorogrupos
A, C, Y e W135 da bactéria Neisseria meningitidis, agente
microbiano causador de meningite. Estas vacinas são
compostas pelo polissacarídeo capsular, estrutura do
envoltório bacteriano que, depois de purificada, é capaz de
induzir a produção de anticorpos sem, no entanto, causar
a doença.

• Micro-organismos mortos: a coqueluche é uma doença


causada pela bactéria Bordetella pertussis. A vacina contra
esta doença pode ser produzida tanto a partir da bactéria
inativada (micro-organismo morto) ou de componentes
bacterianos purificados. A vacina contra coqueluche, nor-
malmente administrada junto com as vacinas antitetâni-
ca e antidiftérica (DTP), é produzida a partir do micro-
organismo morto (BIO-MANGUINHOS, 2011).

• Micro-organismos atenuados: as vacinas atenuadas são


compostas por micro-organismos conseguidos por meio
da seleção de cepas naturais e atenuados por meio de
passagens em meios de cultura específicos, em variados
hospedeiros ou por manipulação genética.
148 UNIUBE

Causam infecção sem produzir a doença. Geralmente,


possuem ampla capacidade protetora e com apenas uma dose
conferem imunidade em longo prazo, como, por exemplo, as
vacinas contra sarampo e febre amarela.

Processo de produção da vacina

O processo de produção de uma vacina, desde a sua criação,


passando pelos testes, até a produção em maior escala, pode levar
vários anos, pois se trata de um processo extremamente complexo.
Antes ainda dos cientistas iniciarem a formulação da vacina, os
pesquisadores têm que estudar o vírus ou bactéria em particular.
Basicamente, eles precisam isolar o vírus em um ambiente de
laboratório e descobrir a maneira como este é capaz de produzir a
doença.

Após a vacina ter sido desenvolvida, o processo de teste é executado


em quatro diferentes etapas que podem durar diversos anos. Essa
fase de testes, em geral, é patrocinada por empresas farmacêuticas,
podendo custar centenas de milhões de dólares.

Etapas do processo de produção de vacinas

Inicialmente, os estudos normalmente consistem em testar as vacinas


em vários adultos saudáveis, com baixo risco de complicações.
Os pesquisadores pretendem determinar se a vacina é segura e
se apresenta a resposta imunológica necessária para combater a
doença. Se essa fase não obtiver sucesso, a vacina retorna para a
fase de desenvolvimento ou é abandonada.

Em seguida, no caso de a primeira fase apresentar sucesso, a vacina


vai para a segunda fase do estudo, que envolve algumas centenas
de pessoas do grupo, que deve ser vacinado. A vacina é testada em
centenas de pessoas para, novamente, garantir a sua segurança.
Os pesquisadores também desejam se certificar de que a vacina
causa, de forma consistente, a resposta imunológica desejada.

A terceira fase pode necessitar de vários anos e os estudos são


realizados em vários lugares com milhares e, às vezes, até dezenas
de milhares de pessoas com diversificados modos de vida e de
UNIUBE 149

diferentes países. Os pesquisadores querem comprovar que a


vacina funciona em indivíduos de todos os tipos e em todos os
ambientes. O Food and Drug Administration (FDA) revisa todos os
dados e a metodologia de estudo. Se tudo estiver satisfatório e o
FDA considerar a vacina segura, ela é submetida a um conselho de
peritos em vacinas que dão seus pareceres ao Centers for Disease
Control and Prevention (CDC). Os peritos, então, distribuem suas
recomendações sobre as dosagens, quem deve receber a vacina,
quando deve ser aplicada etc.

Mesmo depois que a vacina tiver sido distribuída, ela ainda necessitará
de mais algum tempo de estudo para assegurar que nenhum efeito
colateral não previsto possa ocorrer.

Após todas essas etapas terem sido alcançadas com sucesso, o


processo de produção industrial de uma vacina, essencialmente, é
constituído das seguintes fases, descritas no Quadro 7:

Quadro 7: Etapas da produção industrial de vacinas

1. Fonte qualificada de antígeno(s): padronizada, potência conhecida, pura,


livre de contaminantes, corretamente armazenada e testada

2. Fonte qualificada de substrato (sistema de propagação: meios de


cultura, cultura celular etc.): padronizada, pura, livre de contaminantes,
corretamente armazenada e testada
3. Propagação do antígeno

4. Coleta e processamento (ex.: separação do antígeno e substrato,


inativação, concentração, envase, liofilização)

Fonte: Adaptado de Merial (2003).

3.5 Melhoramento genético vegetal

Desde os tempos remotos, há cerca de 10 mil anos, o homem busca


obter alimentos de maneira mais produtiva como estratégia de
sobrevivência, principalmente devido ao aumento populacional, rigor
climático e às pragas e doenças de plantas.
150 UNIUBE

Desde as previsões de Malthus, baseadas no fato de que a produção


de alimentos em escala aritmética não seria suficiente para atender
ao aumento da população em escala geométrica, a agricultura e o
agronegócio passam por profundos ganhos em produtividade.

RELEMBRANDO

Certamente você já leu algo a respeito de Thomas Robert Malthus,


que nasceu em 14 de fevereiro de 1766, no condado de Surrey,
Inglaterra, no seio de uma próspera família. Seu pai, Daniel Malthus,
era adepto dos ideais de Jean-Jacques Rousseau e amigo pessoal
dos pensadores David Hume e Godwin. Aos dezoito anos de idade,
em 1784, após receber em casa uma ampla educação liberal, Malthus
foi admitido na Jesus College da Universidade de Cambridge. Lá
estudou Matemática, Latim e Grego, ao mesmo tempo que recebia
formação sacerdotal. Graduou-se em 1788. Em 1798, Malthus
publicou anonimamente seu “Essay on Population” (Ensaio sobre a
população). Casou-se em 1804 e, em 1805, tornou-se professor de
História moderna e Política Econômica no Colégio da Companhia
das Índias Orientais, em Harleybury, Hertfordshire. Provavelmente
foi o primeiro professor de Economia Política de que se tem notícia
─ pelo menos parece ter sido essa a primeira vez em que uma
disciplina acadêmica recebeu tal denominação. Malthus é conhecido
pela formulação a respeito do futuro da humanidade. Uma vez que
a população cresce em progressão geométrica e a produção de
alimentos cresce em progressão aritmética, segundo Malthus, a
tendência é a fome, criando barreiras ao crescimento populacional.
Segundo ele, seria preciso adotar medidas positivas e preventivas,
como o controle de fertilidade, embora acreditasse que a guerra e
outras catástrofes atuavam de forma mais contundente para a redução
populacional. Segundo os críticos posteriores, Malthus não levou em
conta a influência da evolução tecnológica na produção agrícola.

A aplicação do conhecimento biotecnológico no agronegócio tem


gerado ganhos que puderam ser obtidos, basicamente, pela adoção
da seleção natural ou artificial de um vasto repertório de 350 mil
espécies. Dessas espécies, o homem conhece 3 mil e cultiva cerca
de 300, com especial ênfase no melhoramento em 15 delas: arroz,
trigo, milho, soja, sorgo, cevada, cana-de-açúcar, beterraba, feijão,
amendoim, batata, mandioca, coco, cacau, banana entre outras.
UNIUBE 151

Aplicando-se a reprodução sexuada (envolvendo gametas por cru-


zamento ou autofecundação) ou a propagação vegetativa (envolven-
do partes ou mudas), o estudo das qualidades de um cultivo pode
revelar características que, se passadas para outra planta, podem
resultar no ganho de produtividade e resistência contra pragas, es-
tiagem e baixas temperaturas. Os aumentos de produtividade têm
sido obtidos por dois procedimentos: melhoramento genético, que
leva à alteração das frequências de alelos favoráveis na população
e o melhoramento ambiental, que é aquele em que ocorre o apri-
moramento das condições de cultivo (máquinas e insumos). O me-
lhoramento genético passou a ser considerada uma contribuição da
ciência a partir da descoberta das leis de Mendel.

RELEMBRANDO

Frade agostiniano, Gregor Johann Mendel, nascido em 1822 na antiga


Tchecoslováquia, estabeleceu os princípios da segregação dos alelos
e da segregação independente de genes que controlam diferentes
características fenotípicas.

As bases de Mendel foram fundamentais para o nascimento da


genética quantitativa, que agrega o emprego da Biotecnologia
clássica até a segunda metade do século XX. Neste campo do
saber biotecnológico, são empregados termos que merecem ser
conhecidos pelos biólogos:

• germoplasma: conjunto de genótipos com capacidade reprodu-


tiva (sementes e frutos) pertencente a uma espécie;

• herdabilidade (h2): mede a proporção da variação fenotípica


que é devida à natureza genética. Em geral, estima o sucesso
de seleção de um caráter: se a herdabilidade é alta (>0,5) mais
fácil o ganho genético por seleção;

• ganho de seleção: índice que estabelece o ganho de seleção em


indivíduo, descontando-se o ganho da população. Se o indivíduo
melhora uma característica fenotípica em relação ao esperado
em sua população, então, o ganho de seleção é alto;
152 UNIUBE

A escolha do método de melhoramento baseia-se, portanto, na


observação (ou medida) do fenótipo de uma planta parental ou
progênie e no valor de sua herdabilidade, e do sistema de reprodução
da espécie. Há diferentes metodologias para se introduzir uma
característica genética desejável entre plantas diferentes, por meio
de técnicas convencionais como observado nos quadros 8 e 9.

Quadro 8: Principais técnicas clássicas aplicáveis ao melhoramento genético


vegetal por reprodução sexuada (envolvendo gametas e a fecundação para
produção de sementes)

Método Técnica e Resultado

Seleção de caráter com alta herdabilidade a


Seleção Fenotípica partir de uma população bastante variável.
Ex.: tamanho do grão, cor, textura.

Determinado indivíduo na população que


apresenta as características desejadas é
Seleção Individual com Teste
identificado e isolado para proteção de suas
de Progênie
sementes para expansão da característica
selecionada. Ex.: arroz.

Série de retrocruzamentos das plantas


obtidas de uma progênie, a fim de se
Retrocruzamento garantir maior percentual de herdabilidade
do caráter (um dos parentais possui o
caráter). Ex.: suscetibilidade a pragas.

Dois genitores já selecionados por sua


característica são cruzados para se obter a
Método Populacional (Bulk) geração F1, a partir da qual são praticadas
autofecundações sucessivas (F2, F3, F4
etc.). Ex.: leguminosas, cereais e graníferas.

O mesmo método populacional, só que a


partir da geração F2, dá-se a seleção de
Método Genealógico
plantas individuais para se obter a próxima
(Pedigree)
progênie. Ex.: hortícolas, olerícolas e
fibrosas (algodão).

Depende da heterose, ou vigor do híbrido,


a partir do desenvolvimento de linhagens
Híbridos puras por autofecundação, gerando
variedades específicas em relação aos
parentais. Ex.: milho.

Fonte: Acervo dos autores.


UNIUBE 153

Quadro 9: Principais técnicas clássicas aplicáveis ao melhoramento genético


vegetal por propagação vegetativa (envolvendo gemas, ramos, caules, rizomas,
bulbos, estaquiamento, enxerto etc.)

Método Técnica e Resultado

Dois clones com elevada heterozigose que


apresentam características desejáveis são
Hibridização e Seleção Clonal
selecionados e expandido. Ex.: abacaxi,
man-ga, cacau etc.

Em cada geração de progênie com


variabilidade genética, é praticada seleção
Retrocruzamento para as características de interesse presentes
em diferentes parentais que fornecem a
propagação. Ex.: cana-de-açúcar.

Fonte: Acervo dos autores.

3.6 Melhoramento genético animal

A obtenção de animais que agreguem melhores qualidades


produtivas é uma das formas mais clássicas da aplicação do
conhecimento gerado pela genética e Biotecnologia. Por meio da
observação de características fenotípicas desejáveis na geração
parental (machos e fêmeas – população F0), é possível promover a
fecundação (natural ou artificial) para que a progênie (F1) adquira e
manifeste tais características. Essas características podem tornar-se
agregadas às próximas gerações de segregantes (F2) ou não.

Como fruto deste processo de melhoramento, foi possível ao homem


promover aumento da produtividade de carne e de leite em diferentes
raças de animais, como bovinos, ovinos e caprinos, além de peixes,
aves e cavalos, por meio de métodos de genética e Biotecnologia
clássica, conforme resumido no Quadro 10.
154 UNIUBE

Quadro 10: Métodos clássicos de cruzamento (mesma espécie) e de hibridação


(espécies diferentes) empregadas para melhoramento animal

Método Técnica e Resultado


Obtenção máxima de heterose, normalmente
a partir de uma geração parental bastante
Cruzamento simples misturada, com a qual, um dos progenitores é
novamente retrocruzado com sua progênie. Ex.:
aves, bovinos e suínos (produção de carne).
Absorção da característica “nativa” ou da
característica por meio do uso de progenitores
Cruzamento contínuo
de raça geneticamente modificada ou superior.
Ex.: animais de elite, bovinos e equinos.
Utilização alternada de reprodutores de raças
Cruzamento rotacional (ou
diferentes para aumentar o grau de heterose.
alternativo)
Ex.: largamente utilizado para gado de corte.
Introdução de caracteres ou genes de raça
de clima temperado em várias combinações
Formação de mestiços de raças nativas. São conhecidos como meio-
sangue. Ex.: as raças de gado combinado com
holandês e gir.
Desenvolvimento de nova raça a partir da
combinação de caracteres de três ou mais
Formação de novas raças raças parentais. É o mesmo que “composição
de raças”. Ex.: Raça pitangueiras (5/8 Red Poll
e 3/8 Guzerá).
Fonte: Acervo dos autores.

Um programa de melhoramento genético animal simples considera


os seguintes aspectos:

• definição das condições ambientes onde a nova característica


será explorada;
• escolha das raças mais adequadas aos objetivos do melho-
ramento;
• definição das características que serão melhoradas;
• padronização de um sistema de registro de controle do melho-
ramento;
• estabelecimento de programas de avaliação de reprodutores
para transmissão da característica a ser selecionada no grupo.
UNIUBE 155

E os objetivos:

• produção de heterose, dependente do grau de dominância e


da frequência do gene de interesse na população;
• incorporação de genes desejáveis na população, mais rapida-
mente, do que os cruzamentos aleatórios;
• complementação entre raças pela incorporação de caracterís-
ticas e genes desejáveis na população.

3.7 Produção de biodiesel

Biodiesel é um combustível biodegradável derivado de fontes


renováveis, que pode ser obtido por diferentes processos tais como
o craqueamento, a esterificação ou pela transesterificação. Pode ser
produzido a partir de gorduras animais ou de óleos vegetais. Para
isso, existem dezenas de espécies vegetais no Brasil que podem
ser utilizadas, tais como mamona, dendê (palma), girassol, babaçu,
amendoim, pinhão manso e soja, entre outras.

O biodiesel substitui total ou parcialmente o óleo diesel de petróleo


em motores ciclodiesel automotivos (de caminhões, tratores,
camionetas, automóveis etc.) ou estacionários (geradores de
eletricidade, calor etc). Pode ser usado puro ou misturado ao diesel
em diversas proporções. A mistura de 2% de biodiesel ao diesel de
petróleo é chamada de B2 e, assim, sucessivamente, até o biodiesel
puro, denominado B100.

Segundo a Lei nº 11.097, de 13 de janeiro de 2005, o biodiesel é um:

[...] biocombustível derivado de biomassa reno-


vável para uso em motores a combustão interna
com ignição por compressão ou, conforme regula-
mento, para geração de outro tipo de energia, que
possa substituir parcial ou totalmente combus-
tíveis de origem fóssil.

A transesterificação é o processo mais utilizado atualmente para


a produção de biodiesel. Consiste numa reação química dos óleos
vegetais ou gorduras animais com o álcool comum (etanol) ou o
156 UNIUBE

metanol, estimulada por um catalisador, da qual também se extrai


a glicerina, produto com aplicações diversas na indústria química
(Figura 5).

Figura 5: Reação de transesterificação de gordura vegetal e ou


animal que resulta na produção de biodiesel e glicerina.
Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Além da glicerina, a cadeia produtiva do biodiesel gera uma série de


outros coprodutos (torta, farelo etc.) que podem agregar valor e se
constituir em outras fontes de renda importantes para os produtores,
como pode ser observado na Figura 6.

Figura 6: Integração da cadeia produtiva no aproveitamento


dos produtos derivados do biodiesel e bioetanol.
Fonte: Acervo EAD-Uniube.
UNIUBE 157

INDICAÇÃO DE LEITURA

1) O site da Sociedade Brasileira de Biotecnologia é um portal que


aborda diferentes temas, assuntos e diretrizes da Biotecnologia
clássica e moderna. O site SBBiotec está disponível em: <http://www.
sbbiotec.org.br/>

2) O site “Biotec pra galera” é bastante interativo, e possui diversas


ferramentas que permitem ao usuário navegar pelo mundo da
Biotecnologia, usando filmes, aulas, artigos e etc. O site está disponível
em: <http://www.biotecpragalera.org.br/>

3) O artigo “Processo fermentativo para produção de bebida alcoólica


de pupunha (Bactris gasipaes Kunth)” descreve a produção de bebida
alcoólica, a partir da pupunha, utilizando o processo de fermentação
desta fruta.

OLIVEIRA, L.P.; MAEDA, R.; ANDRADE, J.S.; PEREIRA Jr., N.;


CARVALHO, S.M.S.; ASTOLFI FILHO, S. Processo fermentativo
para produção de bebida alcoólica de pupunha (Bactris gasipaes
Kunth). Revista Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento, 2001.
Disponível em: <http://www.inpa.gov.br/pupunha/revista/tecali/tecali-
oliveira-etal_2001.pdf>

Como dito inicialmente, a Biotecnologia envolve áreas do conhe-


cimento diversificadas, incluindo as ciências básicas e aplicadas,
além de outras tecnologias. Podemos afirmar que a Biotecnologia
clássica surgiu da curiosidade do homem, ao desenvolver trabalhos
experimentais que possibilitaram o desenvolvimento de técnicas e
produtos.

Em nosso país, ainda há dificuldades com relação ao domínio e


aplicação de tecnologias pioneiras, utilizadas para a geração de
produtos e serviços. Sendo assim, o conhecimento destes conceitos
básicos e de seu vasto campo de aplicações deve instigar você, aluno,
a uma busca mais aprofundada sobre a aplicação destes métodos
e a possibilidade de aplicações adicionais e ao desenvolvimento de
novas metodologias. Como futuro educador de Ciências Biológicas
é importante que você seja capaz de refletir sobre as consequências
inerentes aos métodos biotecnológicos clássicos sobre o meio-
-ambiente, sobre a sociedade e sobre os indivíduos.
158 UNIUBE

Resumo

Neste capítulo, são muitas as sugestões apresentadas, visando


definir a Biotecnologia. Uma delas é suficiente para alcançar o objetivo
de tomar conhecimento do que hoje se entende por esse ramo da
ciência. Podemos dizer então que é o conjunto de conhecimentos
técnicos e métodos, de base científica ou prática, que permite a
utilização de seres vivos como parte integrante e ativa do processo
de produção industrial de bens e serviços.

As várias tentativas de definição existentes mostram nitidamente que


se trata, portanto, de um campo de trabalho multidisciplinar, tendo a
Biotecnologia por base de ramos de conhecimento que poderiam ser
classificados como fundamentais, ao lado de outros que poderiam
ser agrupados sob a designação genérica de engenharias.

Se for verdade, por um lado, que a Biotecnologia somente passou a


ser considerada altamente prioritária há relativamente pouco tempo,
também é verdade, por outro lado, que processos biotecnológicos
vêm sendo utilizados desde a mais remota antiguidade.

A utilização em maior escala da chamada Biotecnologia “moderna”


teve como ponto de partida a síntese química do DNA (ácido
desoxirribonucleico), realizada por Kornberg, em 1967, que
denominou de “revolução genética” às novas técnicas de manipulação
genética: DNA recombinante e hibridoma.

Atividades

Atividade 1

Desde o tempo de nossos avós e bisavós, era costume separar a


gordura de animais (porco, boi, principalmente) para a produção
de sabão. O nome da técnica biotecnológica envolvida é a de
saponificação. Hoje, com a necessidade de buscar fontes alternativas
e renováveis de combustíveis não derivados do petróleo, surge o
biodiesel.
UNIUBE 159

Pesquise um protocolo que possa ser utilizado para demonstrar


a produção de biodiesel e aprofundar sua reflexão acerca da
sustentabilidade das ações do homem e da utilização de combustíveis
renováveis.

Para sua pesquisa, consulte o endereço:


<http://www.biodieselbrasil.com.br/emcasa/emcasa.html>

Atividade 2

Considerando o conteúdo deste capítulo, descreva qual a importância


da Biotecnologia clássica para o processo de humanização, dos
tempos mais remotos até hoje.

Dos pontos considerados por você em sua resposta, reflita: quais as


consequências que tais ações biotecnológicas podem ter causado
no meio ambiente e na forma pela qual a sociedade moderna se
estrutura?

Atividade 3

Descreva duas técnicas utilizadas na Biotecnologia clássica. Como


você pretende aplicar este conhecimento para seus futuros alunos?

Atividade 4

Nas décadas de 1980 e 1990, o algodão era a principal fonte de


renda de vários municípios do norte de Minas, com 130 mil hectares
plantados gerando milhares de empregos. A escassez de chuvas e a
entrada do bicudo-do-algodoeiro fizeram com que a cultura entrasse
em decadência. A área plantada foi reduzida drasticamente, com o
fechamento das usinas de beneficiamento. Isso trouxe desemprego
e outras dificuldades para a população. Desde 1987, a área a
ser colhida foi reduzida, não apenas em Catuti, mas também na
região norte de Minas Gerais. Na tentativa de reverter tal situação
e buscar opções para os agricultores familiares na região, iniciou-
-se em 2007 o Projeto de Retomada do Algodão no Norte de Minas
Gerais sob a coordenação da Associação Mineira dos Produtores de
Algodão (Amipa).
160 UNIUBE

(Revista de Agronegócios da FGV, maio de 2010)

Suponha que as alternativas apresentadas pela Amipa foi o cultivo


do algodão precoce com fibras coloridas. Essas variedades foram
desenvolvidas por meio de melhoramento genético (seleção
artificial). Além disso, sabe-se que já vêm sendo desenvolvidas, no
Brasil, variedades de algodoeiro transgênico, embora elas ainda não
estejam sendo cultivadas. Sobre este assunto, realize as atividades
a seguir.

a) Explique a diferença entre transgenia e melhoramento genético.


b) Por que o processo de transgenia permite produzir indivíduos
com maior quantidade de características do que o processo de
melhoramento genético?

Atividade 5

Contemplar a beleza das plantas não é só uma atividade prazerosa.


Esta prática alivia o stress e traz benefícios para sua saúde. O mercado
de ornamentais é extremamente dinâmico e demanda lançamento
de novidades constantemente. Para suprir as necessidades deste
mercado, é fundamental um programa de melhoramento genético
sincronizado com as exigências do mercado consumidor. No processo
de cruzamento, o pólen do parental masculino é transferido para o
parental feminino com o objetivo de que as melhores características
dos parentais sejam transmitidas às novas plantas que serão obtidas
a partir da germinação das sementes resultantes desse cruzamento.
Durante o desenvolvimento das plantas, as que apresentam as
características desejáveis são selecionadas.

De acordo com o texto, responda:

O processo descrito refere-se à Biotecnologia clássica ou moderna?


Justifique sua resposta.
UNIUBE 161

Referências
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Lúcia Carneiro. Transgênicos e evolução dirigida.
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BRASIL, Decreto nº 2159, de 16 de março de 1998. Promulga


a Convenção sobre Diversidade Biológica. Diário Oficial
da União de 17/03/1998, p. 1, Brasília, DF, 1998.

BRASIL, Decreto nº 6041, de 08 de fevereiro de 2007. Institui a política de


Desenvolvimento da Biotecnologia, cria o Comitê Nacional de Biotecnologia e
dá outras providências. Diário Oficial da União, de 09/02/2007,
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CARVALHO, A.P. Biotecnologia. Ciência e Tecnologia no Brasil:


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Capítulo Biotecnologia
4 moderna: técnicas

Karine Rezende de Oliveira


Marcelo Fernandes da Silva
Introdução
Este capítulo traz as técnicas da Biotecnologia moderna
que possibilitaram avanços e conquistas da biologia
contemporânea, em especial, aquelas voltadas para área
da saúde, do meio ambiente e da tecnologia. É importante
que você seja capaz de relacionar a evolução técnica da
Biotecnologia, conhecendo seus conceitos e os fundamentos,
e, sobretudo, argumentar sobre as consequências presentes
e futuras para a humanidade.

Objetivos
Ao finalizar os estudos propostos neste capítulo, você deverá
estar apto a:

• identificar as principais técnicas da Biotecnologia


moderna;
• descrever e interpretar os resultados obtidos por cada
técnica;
• exemplificar a aplicação de cada técnica;
• posicionar-se criticamente frente aos princípios da ética
na pesquisa científica, principalmente quanto seus
avanços e implicações.

Esquema
4.1 Considerações gerais sobre a Biotecnologia
4.2 Técnicas de análise molecular
164 UNIUBE

4.2.1 Sequenciamento de DNA


4.2.2 Fragmentação do DNA por enzimas de restrição
4.2.3 Clonagem de DNA com a utilização de plasmídeos
4.2.4 Construção de “biblioteca de genes” de células eu-
cariontes
4.2.5 Separação de fragmentos de restrição por eletro-
forese e “Southern Blotting”
4.2.6 Reação em Cadeia da Polimerase (PCR)
4.2.7 Técnica de hibridização in situ de ácidos nucleicos
4.3 Estudo de células vivas
4.3.1 Cultivo celular
4.4 Recuperação de espécies em extinção
4.5 Influência das modernas técnicas de Biotecnologia na
formação do professor de Ciências Biológicas
4.5.1 Craig Venter – a história do homem que está
mudando o mundo
4.5.2 Criando a vida artificialmente
4.6 A vida artificial e seus novos desafios

4.1 Considerações gerais sobre a Biotecnologia

Conforme estudou, as técnicas da Biotecnologia já eram utilizadas


desde a antiguidade (1800 a.C.), em que se destaca o uso de fermento
na fabricação de pães e de vinhos. Por volta de 1860, botânicos
iniciaram o processo do melhoramento genético cruzando diferentes
variedades de plantas. Os cientistas transferiram e selecionaram
genes para melhorar as qualidades das novas variedades. A maior
parte das espécies cultivadas, incluindo milho, arroz, trigo, tomate, é
resultado dos cruzamentos ao longo do processo evolutivo.
UNIUBE 165

RELEMBRANDO

Observe as informações relacionadas, a seguir, com os diferentes


acontecimentos na ciência antiga, moderna e contemporânea (SILVA-
JUNIOR; SASSON, 2002), estudados no capítulo anterior:

• povos de antigas civilizações, no Egito e na Mesopotâmia,


produziram vinho e cerveja, aproveitando-se da ação dos
microrganismos da fermentação alcoólica;

• a indústria farmacêutica foi capaz de produzir a penicilina,


antibiótico extraído de várias espécies do fungo do gênero
Penicillium, os quais são mantidos em grandes recipientes de
cultura;

• os criadores de animais têm conseguido, ao longo dos séculos,


obter inúmeras raças de animais conforme seu interesse, por
meio de técnicas de hibridação e seleção;

• os biólogos produzem organismos denominados transgênicos, ou


organismos geneticamente modificados, pela inserção de genes
considerados estranhos. Essa é a técnica do DNA recombinante;

• na Escócia, em 1997, aconteceu a clonagem da ovelha Dolly, o


primeiro clone.

Todos esses fatos se referem às variadas técnicas aplicadas à


Biotecnologia. Esta, por sua vez, é considerada uma ciência nova,
que tem como princípio desenvolver técnicas que visam à melhoria
da qualidade de vida do homem. Sendo assim, a Biotecnologia está
voltada diretamente para o ser humano, com diferentes aplicações.

Você certamente leu os capítulos anteriores que destacam aspectos


da Biotecnologia clássica, como por exemplo, o melhoramento
genético a partir de diversos cruzamentos realizados somente entre
indivíduos da mesma espécie ou, em alguns casos, entre indivíduos
de espécies bastante relacionadas, restringindo o intercâmbio de
características apenas aos indivíduos aparentados.
166 UNIUBE

Já no melhoramento genético moderno, por meio do uso da


Biotecnologia, é possível transferir genes entre espécies que
não são compatíveis sexualmente. Isto é o resultado do melhor
entendimento, pelos cientistas, dos processos genéticos ao nível da
molécula do DNA. Um produto geneticamente modificado é aquele
que foi submetido à tecnologia do DNA recombinante para ser
geneticamente alterado.

EXEMPLIFICANDO!

Entre as aplicações, podemos citar a luta pelo diagnóstico mais


preciso e cura de doenças fatais; a produção de novos medicamentos
e vacinas; a redução do custo de produção de medicamentos de
grande uso; e a produção de tecidos e órgãos para transplante etc.

A Biotecnologia moderna, também conhecida como engenharia


genética ou tecnologia do DNA recombinante, envolve modificação
direta do DNA, que representa o material genético de um ser vivo, de
forma a alterar precisamente características definidas do organismo
vivo ou introduzir novas características. Dessa forma, o uso da
Biotecnologia moderna necessita, inicialmente, do conhecimento
e isolamento de sequências de DNA que correspondem a genes
responsáveis em conferir a característica desejada (fenótipo).

A engenharia genética surgiu, na década de 1970, por meio do


trabalho de Paul Berg, em 1971, na Califórnia, e está relacionada
com a manipulação do material genético,
Bacteriófago
que é o DNA. Paul obteve a primeira
molécula recombinada como resultado da
É um vírus que ataca inserção do DNA de um vírus oncogênico
bactérias.
no DNA de um vírus bacteriófago. Essa
Quimera molécula quimera de DNA foi o principal
Um monstro mitológico acontecimento que sustentou a tecnologia
que possui características do DNA recombinante, responsável pe-
de diferentes animais.
lo prêmio Nobel recebido, em 1980, pelo
próprio Paul Berg.
UNIUBE 167

4.2 Técnicas de análise molecular


4.2.1 Sequenciamento de DNA

A estrutura do DNA é mantida por ligações não covalentes (ligações


de hidrogênio) entre as bases nitrogenadas de suas cadeias de
nucleotídeos, sendo possível separar as duas cadeias por meio
do calor e de outros tratamentos como o pH alcalino, por exemplo.
Este processo é denominado desnaturação do DNA. Caso o DNA
desnaturado esfrie lentamente, as cadeias complementares se
emparelham de forma ordenada e se restabelece a conformação
original da molécula. Este processo é denominado renaturação (DE
ROBERTIS; HIB, 2006).

Dessa forma, utilizando essa propriedade do DNA, é possível a realização


de vários processos de manipulação para o estudo dessa molécula,
sendo que um desses processos é o sequenciamento do DNA.

Diferentes métodos de sequenciamento do DNA permitiram co-


nhecer a composição dos genes localizados nos cromossomos.
Conhecendo-se a sequência dos nucleotídeos de um gene, pode-
-se deduzir a sequência dos aminoácidos da proteína que o mesmo
codifica, uma vez que de acordo com o código
genético, cada códon presente no gene cor- Códon
responde a um aminoácido na proteína. E as- Trinca de
sim conhecendo-se a proteína codificada por nucleotídeos que
um determinado gene pode-se com-preender codifica um único
aminoácido.
melhor o papel desse gene e as consequên-
cias na sua alteração.

O método de sequenciamento do DNA mais utilizado é o método


de Sanger (1977) que se baseia no uso de nucleotídeos do tipo
didesoxinucleotídeos (Figura 1) junto com os desoxinucleotídeos
(Figura 1). Quando os didesoxinucleotídeos são incorporados nas
novas cadeias de DNA, eles fazem a terminação dessa cadeia, uma
vez que não possuindo o OH na posição 3’ da desoxirribose, mas
apenas um H, não ocorrerá a adição de um novo nucleotídeo. Dessa
maneira, são produzidos fragmentos de DNA de comprimentos
crescentes, que começam em um ponto comum e possuem um
dos quatro tipos de didesoxinucleotídeos em suas extremidades
terminais (Figura 2).
168 UNIUBE

Figura 1: (A) Estrutura química de um desoxinucleotídeo (dATP) e (B) estrutura química


de um didesoxinucleotídeo (ddNTP).
Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Primer
O processo de sequenciamento do DNA
Fragmento de DNA de se inicia com a desnaturação do DNA
cadeia simples que
deixa exposta sua que se quer analisar para obter moléculas
própria extremidade de uma única cadeia. Em seguida, é
3’, a partir da qual
a DNA polimerase colocado um primer na extremidade 3’ de
agrega os novos uma das cadeias, e com a ação de uma
nucleotídeos à cadeia
em formação. Pode
DNA polimerase que sintetiza a cadeia
ser chamado também complementar irão ser formadas as novas
de oligonucleotídeo ou cadeias (Figura 2).
iniciador.

Figura 2: Etapas do processo de sequenciamento de DNA (Método de Sanger).


Fonte: Acervo EAD-Uniube.
UNIUBE 169

Conhecendo-se a sequência de nucleotídeos de um gene podem


ser localizadas alterações neles e também serem realizadas
comparações com genomas de outros organismos para verificar
semelhanças e assim se estabelecer relações entre espécies ou
indivíduos.

4.2.2 Fragmentação do DNA por enzimas de restrição

As enzimas ou endonucleases de restrição podem reconhecer


sequências no DNA alvo que são formadas por 4, 6 e até 8
nucleotídeos, sendo que essas sequências são chamadas de sítios
de restrição. Cada enzima apresenta seu próprio sítio de restrição, ou
seja, apresenta uma sequência de nucleotídeos que irá reconhecer
no DNA alvo.

A utilização destas enzimas favoreceu o desenvolvimento da técnica


do DNA recombinante, uma vez que elas possibilitam a fragmentação
do DNA para a geração de sequências que possam ser inseridas em
plasmídeos para a construção da molécula do DNA recombinante
(Figura 3).

Figura 3: Construção da molécula de DNA recombinante.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.
170 UNIUBE

4.2.3 Clonagem de DNA com a utilização de plasmídeos

Com a técnica de clonagem do DNA, podem ser geradas moléculas


de DNA recombinante, as quais contêm segmentos de DNA, que
são inseridos em cromossomos circulares bacterianos pequenos,
denominados plasmídeos (Figura 3). Dessa maneira, torna-se
possível o estudo de um gene ou do genoma de qualquer organismo.

Segundo De Roberts e Hib (2006), existem diferentes etapas


envolvidas no processo de clonagem, a partir do uso de plasmídeos.
A primeira etapa envolve a obtenção do fragmento de DNA que se
deseja clonar a partir do genoma da célula ou do organismo, tratando
esse DNA com uma determinada enzima de restrição. O DNA
circular do plasmídeo também é “cortado” com a mesma enzima de
restrição. Dessa forma, serão formadas extremidades que permitem
a união entre essas moléculas para a construção da molécula de
DNA recombinante.

EXPLICANDO MELHOR

Como é empregada a mesma endonuclease para cortar o DNA


eucariótico, neste são gerados segmentos de DNA com extremidades
“adesivas” idênticas às do plasmídeo cortado. Como consequência,
ambos os DNAs (do plasmídeo e da célula eucarionte) ligam-se por
meio de suas extremidades, por ação da DNA ligase. Após a união,
o plasmídeo com o DNA recombinante é introduzido em bactérias.
Devido à função que desempenha, o plasmídeo recebe o nome de
vetor (Figura 3).

Portanto, a partir do isolamento do DNA de uma célula, pode-se


determinar a localização de um gene e realizar o seu isolamento e
multiplicação, processo esse denominado de clonagem gênica.

Transgênico
De posse de um gene clonado num plasmídeo,
ou seja, de uma molécula de DNA recombinante,
Organismo que esta pode ser inserida num organismo para se
apresenta genes
provenientes gerar um transgênico.
de uma espécie
diferente.
UNIUBE 171

4.2.4 Construção de “biblioteca de genes” de células eucariontes

A construção de biblioteca de genes ou bibliotecas genômicas é muito


útil para o estudo do genoma de uma célula ou de um organismo.
Para a realização desta técnica, parte-se do DNA isolado, que é
digerido com uma enzima de restrição, sendo gerada uma enorme
quantidade de segmentos de DNA, chamados de fragmentos de
restrição.

Esses fragmentos por sua vez, são incorporados a vetores (plasmí-


deos, por exemplo), como descrito no item anterior, e, em seguida,
os vetores, com seus fragmentos de restrição, são introduzidos em
bactérias, que são semeadas em meio de cultivo adequado para
que se multipliquem, gerando colônias que irão conter cópias desses
vetores (Figura 4).

Figura 4: Construção de biblioteca de genes ou bibliotecas genômicas.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Dessa forma, é gerada uma coleção de cópias ou clones dos genes


da célula ou organismo que se deseja estudar, e esse conjunto de
clones que tem a totalidade de DNA das células investigadas é
conhecido pelo nome “biblioteca de genes”.
172 UNIUBE

4.2.5 Separação de fragmentos de restrição por eletroforese e


“Southern Blotting”

Segundo De Robertis e Hib (2006), os fragmentos de restrição


podem ser separados, por eletroforese, em um gel de agarose com
base em seus tamanhos, possibilitando a localização deles. Esses
fragmentos contidos nesse gel podem então ser transferidos para
outro suporte como, por exemplo, o mais usado atualmente é a
membrana de náilon através do método de capilaridade.

Para melhor entendimento da técnica, veja a Figura 5.

Figura 5: Demonstração da técnica de Southern blotting.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Acompanhe a descrição da técnica de Southern blotting:

• começa-se tratando o gel com uma solução alcalina que


desnature as moléculas de DNA, para que separem as duas
cadeias;

• em seguida, o gel é colocado em contato com a membrana de


náilon;
UNIUBE 173

• sobre a membrana, são colocadas folhas de papel de filtro e


sobre elas várias folhas secas de papel absorvente;

• sobre as folhas secas é colocado um peso que será mantido


por um período de 16 a 20 horas, e assim irá forçar a passagem
de uma solução de transferência por meio do papel absorvente
e, consequentemente, os fragmentos de DNA do gel irão ser
transferidos para a membrana;

• após o período de transferência, a membrana é separada do


gel, irradiada com luz ultravioleta para a fixação do DNA e
tratada com uma sonda de DNA específica para a região que
se deseja localizar, processo este chamado de hibridação;

• depois da etapa de hibridação, a membrana é colocada em


contato com um filme fotográfico por um período, de modo que
a região do DNA que foi localizada fique impressa no filme.

Para localizar os fragmentos de DNA impressos no filme fotográfico,


bastará confrontar a membrana com o gel. A transferência do DNA do
gel de agarose para a membrana de náilon leva o nome de Southern
blotting, sendo o significado literal (blotting-transferência).

A técnica de Southern Blotting é bastante utilizada no estudo de


determinadas regiões do genoma, com o objetivo de se identificar
alterações estruturais em genes por exemplo.

Essa técnica de transferência de moléculas para suportes (membra-


nas) e detecção de regiões específicas pelo uso de sondas, também
é utilizada para análises de expressão gênica a partir do RNA e, nes-
te caso, é chamada de Northern Blotting. Quando a molécula anali-
sada é proteína, esta técnica é denominada de Western Blotting.

4.2.6 Reação em Cadeia da Polimerase (PCR)

O PCR ou reação em cadeia da polimerase é um sistema de


amplificação in vitro do DNA, pelo qual se pode conseguir, em um
curto intervalo de tempo, grandes quantidades de um gene (ou
174 UNIUBE

parte dele). Isto, a partir de uma quantidade muito pequena de DNA,


até mesmo partindo-se do DNA de uma única célula. Com este
processo, é possível obter os fragmentos de DNA sem o auxílio da
endonuclease de restrição, e não há necessidade de utilizar uma
biblioteca genômica.

A seguir, será realizada uma breve descrição da técnica de PCR.


Para melhor entendimento, veja a Figura 6.

Figura 6: Etapas da técnica de PCR.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Acompanhe o protocolo, passo a passo:

• desnaturação do DNA: o DNA da célula é desnaturado por


aquecimento e são adicionados, ao meio, duas sequências
de oligonucleotídeos (também chamados de primers ou
iniciadores) complementares das sequências situadas nas
extremidades do segmento de DNA que se deseja amplificar;

• hibridação dos iniciadores: uma vez que os iniciadores tenham


encontrado as sequências complementares em meio a todo
o DNA celular, unem-se a elas, o que é possível porque a
temperatura é reduzida;

• extensão dos iniciadores: após a união dos iniciadores, ocorre


a formação de cadeias-filhas, a partir das extremidades 3’
destes iniciadores (extensão dos iniciadores), síntese esta que
é catalisada por uma enzima DNA polimerase especial, extraída
da bactéria Thermus aquaticus, resistente à temperatura
chamada Taq DNA polimerase.
UNIUBE 175

Assim, a Taq DNA Polimerase agrega quantidades suficientes dos


quatro desoxirribonucleotídeos que irão compor os novos fragmentos
de DNA. Quando o processo é concluído, ou seja, os três passos
descritos anteriormente são realizados, obtêm-se dois fragmentos
de DNA a partir de um.

Uma sequência dos três passos descritos é chamada de ciclo e a


técnica de PCR baseia-se na repetição desse ciclo. Partindo-se do
resultado do primeiro ciclo, ao final do segundo ciclo são obtidos
quatro desses fragmentos e, assim, sucessivamente, nos próximos
ciclos. Por esse motivo, o DNA se amplifica acentuadamente por
meio da técnica de PCR (DE ROBERTIS e HIB, 2006).

CURIOSIDADE

A PCR é uma poderosa técnica de diagnóstico médico, em análise


forense e para estudos de evolução molecular. Veja alguns exemplos,
a seguir:

• detecção de bactérias e vírus por meio de iniciadores


específicos;
• detecção de câncer (mutações em genes);
• amplificação de genes e estabelecer parentesco biológico
de paternidade e imigração;
• análise de manchas de sangue e/ou sêmen, em caso de
estupro;
• análise de crimes por meio do DNA obtido de diferentes
fontes.

4.2.7 Técnica de hibridização in situ de ácidos nucleicos

O mapeamento genético pode ser realizado In situ


por meio da técnica de hibridização in situ de
ácidos nucleicos. Isso significa dizer
no local, ou na
amostra obtida.
176 UNIUBE

Existe a possibilidade de se detectar genes, diretamente nos lugares


que eles ocupam nos cromossomos, pelo método de hibridização in
situ (Figura 7).

Figura 7: Demonstração da técnica de hibridização in situ.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Essa técnica consiste na hibridização do gene de interesse, com um


DNA complementar, o qual deve levar um marcador para que possa
ser identificado no tecido. Considerando o marcador fluorescente,
a técnica pode ser denominada de FISH (fluorescent in situ
hybridization).

4.3 Estudo de células vivas

4.3.1 Cultivo celular

Existem dois tipos de cultivo celular: o primário e o de linhagens


estabelecidas.

• Cultivo primário - obtido diretamente dos animais e vegetais

O tecido é separado em condições assépticas e cortado em pequenos


fragmentos tratados com tripsina. Esta enzima proteolítica dissocia
os agregados celulares e gera uma suspensão de células
UNIUBE 177

que poderão ser cultivadas em garrafas específicas para cultivo


celular, utilizando meio de cultura apropriado para cada linhagem
celular.

Outra forma é a colheita destas células na cavidade peritoneal


de camundongos, onde é injetado e posteriormente colhido soro
fisiológico para recuperação de macrófagos peritoneais (Figura 8).

A B
Figura 8: Rato e cultura de macrófagos.
Foto: Karine Rezende de Oliveira.

Na Figura 8, observamos o rato muito utilizado em experimentos para


colheita de macrófagos peritoneais (A) e a cultura de macrófagos
peritoneais (B).

• Cultivo de linhagem de células estabelecidas

Utilizam-se linhagens de células que apresentam crescimento


prolongado, o que demonstra sua natureza celular cancerígena.
Estas células se encontram, na maioria das vezes, formando uma
espécie de “tapete” nas garrafas ou na placa de cultivo.

As linhagens celulares em cultivo são muito úteis em Biotecnologia


moderna como, por exemplo, para o estudo de funções dos genes,
uma vez que essas células podem ser transfectadas com genes de
interesse (inseridos em moléculas de DNA recombinante) para eles
se expressarem. Essas células também podem ser utilizadas para
testes de vacinas de DNA (Figura 9).
178 UNIUBE

Figura 9: (A) Cultura de células epiteliais permanentes; (B)


Estufa para manutenção das células nas placas de cultura.
Foto: Karine Rezende de Oliveira.

4.4 Recuperação de espécies em extinção

Com o avanço da Biotecnologia, já é possível a recuperação de


algumas espécies em extinção.

CURIOSIDADE

Você assistiu ao famoso filme Jurassic Park, de Steven Spielberg?


Nele, os cientistas tentam recuperar seres extintos, os dinossauros,
por meio do material genético de fósseis encontrados durante as suas
escavações no sítio arqueológico.

O processo de recuperação de parte do material genético de fósseis


é possível, e isso tem sido feito, embora não exista a possibilidade
de se recuperar o indivíduo por inteiro. Algumas espécies extintas
recentes ou com parentesco próximo, ainda vivo, podem ser
recuperadas.

Temos, como exemplo, o que aconteceu com a zebra quagga,


extinta há mais de 100 anos e que foi recuperada, recentemente,
por cientistas da África do sul. Os cientistas examinaram o DNA de
zebras de outras espécies que apresentavam características da
quagga (poucas listras na parte traseira, coloração amarronzada)
e compararam com aquelas já extintas, taxidermizadas em museu.
UNIUBE 179

Assim, escolheram as zebras geneticamente mais aparentadas com


a quagga e realizaram cruzamentos, até que começaram a nascer
quaggas (LOPES, 2006).

4.5 Influência das técnicas de Biotecnologia na


formação do professor de Ciências Biológicas

A formação do professor de Ciências Biológicas requer uma


constante atualização sobre as novas tecnologias a serviço da vida,
bem como as implicações e os reflexos sobre todos os organismos,
do ambiente e da vida. Esta formação atualizada contribui para que
os alunos tenham acesso a informações e conceitos úteis para apli-
cação no cotidiano e nas situações em que seja exigida postura
crítica e reflexiva, por exemplo, compreender as informações que
são veiculadas pela imprensa ou pelo senso comum.

PARADA PARA REFLEXÃO

De acordo com o que você aprendeu neste capítulo, e nos anteriores


sobre a Biotecnologia moderna, é possível criar uma célula artificial?
Você saberia como discutir este conteúdo com os seus alunos?

4.5.1 Craig Venter – a história do homem que está mudando o


mundo

Antes de sabermos se é ou não possível à Biotecnologia criar uma


célula artificial, vamos conhecer a história de um geneticista, Craig
Venter, nascido aos 14 dias de outubro de 1946, em Salt Lake City –
Utah, nos Estados Unidos. Após a adolescência, e de ter participado
da guerra do Vietnã, se tornou biólogo com pós-graduação em
Genética. Aos 32 anos, após uma iniciativa pessoal, fundou a
Celera Genomics, uma empresa de capital privado para alcançar
um dos objetivos mais ambiciosos da biologia moderna: sequenciar
o genoma humano.

O Dr. Venter já tinha se tornado uma figura polêmica em 1990,


quando sua companhia, a Celera Genomics, começou a competir (e
180 UNIUBE

conseguir vencer) em relação aos esforços do governo americano


para concluir o Projeto Genoma Humano, o mais rápido possível.
Além de ter tido êxito científico, pois além de ter concluído a primeira
versão do código genético humano, o Dr. Venter é um grande
empreendedor. Análogo ao sucesso na ciência, o Dr. Venter já
contabiliza a patente de mais de 300 genes humanos, levantando a
preocupação com relação aos direitos de patente sobre os segredos
genéticos e moleculares da vida.

Em março de 2010, por meio do Instituto J. Craig Venter, ele assombra


o mundo com o alcance de sua nova ambição: criar e reproduzir
artificialmente a vida em laboratório, originando um micro-organismo
novo, inexistente na face da Terra.

As reações foram imediatas e divididas:

Será que Craig Venter está brincando de Deus? Ou será este o


capítulo mais extraordinário da vida deste pesquisador? O trabalho,
publicado na prestigiada revista Science, mostra como foi possível
sintetizar o genoma de uma bactéria e usá-lo para reprogramar uma
célula, tornando efetivamente uma célula em outra.

Os biólogos conseguiram criar a primeira forma de vida artificial num


experimento original e, empregando a Biotecnologia conhecida,
conseguiram um salto na evolução da construção de micro-
organismos pelo Homem. Controvérsias à parte, este trabalho
ocupou 20 cientistas por mais de 10 anos num custo estimado de
40 milhões de dólares, e é considerado um momento decisivo na
história da biologia.

A vida agora pode ser sintetizada em laboratório em benefício da


humanidade como, por exemplo, criando bactérias despoluidoras,
que eliminam petróleo, retiram gases carbônicos da atmosfera, ou
ainda, que sirvam para produção de novas vacinas.

Entretanto, os críticos, principalmente de grupos religiosos,


condenaram o trabalho de Craig Venter, levantando a possibilidade
de estes novos micro-organismos artificiais escaparem para o meio
ambiente e causarem impactos ambientais inimagináveis, ou pior,
serem usados como armas biológicas pelos bioterroristas.
UNIUBE 181

PARADA PARA REFLEXÃO

Os mais críticos afirmam que Craig Venter está brincando de Deus. O


que você acha? Antes de formar sua opinião, veja como foi possível
criar a vida artificialmente.

SINTETIZANDO...

• Nos Estados Unidos, em fevereiro de 2001, Craig Venter e Francis


Collins fizeram a comunicação conjunta do sequenciamento
completo do código genético humano. Isso foi possível graças a
inovadoras técnicas laboratoriais, associadas à informática;

• também, nos Estados Unidos, em 2010, Craig Venter apresentou


ao mundo, pela primeira vez, uma célula artificial, construída
a partir de organismos vivos, dando origem à vida criada em
laboratório.

4.5.2 Criando a vida artificialmente

O novo organismo é originário de outro preexistente que causa


mastite em cabras, mas sua estrutura celular é inteiramente
sintetizada por um genoma construído no laboratório, a partir de
substâncias químicas primárias e da aplicação das modernas técni-
cas de clonagem e sequenciamento em Biotecnologia. Segundo os
pesquisadores, o novo organismo possui quatro “marcas d’água”
impressas no seu DNA para identificar o que é sintético (novo) e
ajudar a trilhar os descendentes da célula progenitora.

“Nós ficamos extasiados ao perceber que as células funcionavam


com as quatro marcas d’água no lugar” – disse Craig Venter ao jornal
The Guardian. “É uma nova espécie viva, parte do inventário da vida
no nosso planeta”.

“Certamente representa um passo importante em ambas as direções,


científica e filosófica, e que vai mudar nossa visão e definição sobre
o que é vida e como ela funciona” – completa Craig Venter.
182 UNIUBE

PESQUISANDO NA WEB

Para conhecer o trabalho original (em inglês) publicado pela Revista


Science, acesse: <http://www.sciencemag.org>.

O Professor Julian Savulescu, que ministra a disciplina de Ética na


Universidade de Oxford, disse o seguinte: "Venter está escancarando
a porta mais obscura da história da humanidade, e, potencialmente,
influenciando o seu destino no mundo. Ele não está somente
copiando artificialmente a vida, ou modificando-a radicalmente, ele
está seguindo os passos de um Deus: criando uma forma de vida que
nunca havia existido antes na natureza". Ele argumenta: “este é um
passo que nos levará a algo muito controverso: a criação da vida com
habilidades que nunca haviam sido vistas na natureza para controlar
a poluição, produzir novos medicamentos, mas também pode servir
para criar as mais poderosas armas biológicas jamais imaginadas”.
Para Mark Bedau, filósofo do Reed College de Portland, no estado
do Oregon, afirmou que “este é um momento definitivo na história da
Biologia e da Biotecnologia”.

SAIBA MAIS

Agora, como resultado de sua nova descoberta, e de um investimento


de mais de 40 milhões de dólares, estima-se que a patente de Craig
Venter, para esta técnica, esteja próxima a 1 trilhão de dólares. No
Brasil, o órgão que regulamenta os pedidos de patentes é o Instituto
Nacional de Propriedade Intelectual (INPI). Para conhecê-lo, acesse o
site:<http://www.inpi.gov.br>.

Enquanto os cientistas e filósofos iniciam seus debates sobre


as possíveis consequências científicas e morais do trabalho,
a motivação de Venter é puramente comercial. Sua equipe de
cientistas tem outro projeto ambicioso: criar agora organismos que
não sejam somente novos, mas lucrativos. Venter já tem um contrato
com a gigante americana do petróleo a ExxonMobil, para criar
novas algas capazes de absorver dióxido de carbono da atmosfera
e convertê-lo em combustível – uma inovação que pode valer até
UNIUBE 183

mais de 1 trilhão de dólares. A nova bactéria, segundo Venter, é “a


prova de que o conceito de substituir genes por outros com novas
informações programadas é mais forte do que aquele que limitava o
desenvolvimento científico teórico, pois agora, ele é prático”.

Para criar o novo micro-organismo, o time de cientistas liderados


pelo Dr. Venter, começou por reconstruir o genoma de uma bactéria
comum, a Mycoplasma mycoides. A informação genética desejada
pelo Dr. Venter foi adicionada a um sintetizador de DNA, que produziu
pequenas sequências de DNA que foram ligadas umas as outras e
inseridas, primeiramente, numa levedura e, depois, num exemplar
da bactéria Escherichia coli. Este DNA, então, foi reparado pela
célula bacteriana para uni-lo, formando uma única molécula de DNA.

Após várias tentativas dos cientistas, foram adicionadas as “marcas


d’água” entre quase 1 milhão de bases do genoma bacteriano. Estas
marcas não sintetizam nenhuma proteína na célula, mas exibem uma
mensagem que pode ser identificada pelos cientistas para localizar
em quais bactérias - filhas o DNA sintético foi reproduzido. O passo
crucial no experimento era saber se o DNA sintético, presente numa
bactéria, ao ser transferido para outro micro-organismo (retirando-
se o seu genoma natural) poderia re-programar a célula para se
tornar numa nova célula, a partir da síntese de genes artificialmente
colocados nela.

“Foi muito chocante perceber que, após a introdução do DNA artificial,


a célula passou a ler a nova informação e começar a se transformar,
fazendo com que características da primeira célula desaparecessem
e novas características artificiais surgissem, como mágica” – disse
Venter (SAMPLE, 2011).

DICAS

Reveja as técnicas de sequenciamento e clonagem em itens anteriores


deste capítulo.
184 UNIUBE

Venter chama a célula de sintética porque ela sobrevive graças


a um genoma feito pelo homem, e que, apesar de se comportar
como o Mycoplasma mycoides, tem características previamente
programadas.

Para Pat Mooney, líder de um grupo contra a biologia sintética,


este “é um momento da caixa de Pandora, assim como a clonagem
da ovelha Dolly, nós teremos de lidar com o sucesso e o fracasso
deste experimento alarmante” – disse. Para o prêmio Nobel Dr.
Jack Szotak, não se está criando a vida artificialmente, apenas um
genoma muito simples, como uma forma básica de vida. Ainda, ele
argumenta que trocar um genoma natural por outro artificialmente
criado em laboratório não é necessariamente, criar uma nova
forma de vida. Dr. Szotak ainda prevê avanços nesse campo com
resultados práticos para o futuro de nossos filhos, quando micro-
-organismos sintéticos serão indispensáveis à sustentabilidade do
planeta, reparando danos e impactos que o Homem tem causado
pelas gerações atuais.

4.6 A vida artificial e seus novos desafios

Atualmente, a expectativa de vida do homem dobrou em relação


ao século passado, em parte, graças ao avanço biotecnológico.
Enquanto a expectativa de vida era de 40 anos, em 1900; hoje, nos
países desenvolvidos, ela é de cerca de 80 anos. A maior longevidade
do ser humano só foi possível graças aos avanços científicos na
medicina e na alimentação.

A descoberta da penicilina e de várias outras drogas permitiu debelar


doenças anteriormente fatais. A nutrição balanceada, desde o período
intrauterino, permitiu a formação de pessoas saudáveis e com maior
resistência às doenças. Uma das melhores evidências da importância
de uma alimentação nutricionalmente equilibrada é a maior estatura da
população atual, quando comparada à de gerações passadas. Sendo
assim, considera-se que os avanços obtidos nas diferentes técnicas da
Biotecnologia contribuíram, direta ou indiretamente, para que fossem
possíveis todas essas melhorias na qualidade de vida das pessoas.
UNIUBE 185

De acordo com alguns cientistas, já, em 2017, estaremos trabalhando


com plantas artificiais, predadores produzidos artificialmente e armas
biológicas incontroláveis. A ficção científica já se tornou realidade,
graças à moderna Biotecnologia. Hoje, graças ao Dr.Venter, formas
elementares de vida artificial podem ser criadas pelo Homem, e
na verdade, não representam um perigo. Entretanto, o abuso da
manipulação genética pode modificar vírus existentes para criar
novos muito mais contagiosos e virulentos (SAMPLE, 2011).

Aqueles que afirmam que os cientistas não estão brincando de


Deus, mas tornando real uma possibilidade que é a extensão natural
do alcance do conhecimento humano sobre a diversidade da vida,
afirma que estes avanços vão tornar ainda mais sustentável a vida
no planeta num futuro não tão distante.

Portanto, a formação do professor em Ciências Biológicas deve incluir


o debate sobre estas questões científicas e éticas sobre o emprego
da Biotecnologia, uma vez que os alunos irão ver os avanços da
ciência sobre a vida no planeta na televisão, na internet e no celular,
entre outros espaços. E eles não param de chegar.

INDICAÇÃO DE LEITURA

Para aprofundar seus conhecimentos, busque auxílio na seguinte


leitura:

REVISTA BIOTECNOLOGIA, CIÊNCIA E TECNOLOGIA.


Disponível em: <http://www.biotecnologia.com.br>.

Esta revista trata de inúmeros assuntos relacionados à técnica,


aplicações modernas da Biotecnologia por meio de trabalhos científicos
dos renomados pesquisadores da atualidade. Ela tem o apoio da
Sociedade Brasileira de Biotecnologia.
186 UNIUBE

Resumo

Neste capítulo, vimos que a Biotecnologia moderna, também conhe-


cida como engenharia genética ou tecnologia do DNA recombinante,
envolve modificação direta do DNA, que representa o material gené-
tico de um ser vivo, de forma a alterar, precisamente, características
definidas do organismo vivo ou introduzir novas características. Des-
sa forma, o uso da Biotecnologia moderna necessita, inicialmente,
do conhecimento e isolamento de sequências de DNA que corres-
pondem a genes responsáveis em conferir a característica desejada
(fenótipo).

Assim sendo, a aplicação da tecnologia do DNA recombinante tem


sido utilizada para alteração genética de animais, plantas e micro-
organismos. Essa tecnologia moderna permite a transferência do
material genético de um organismo, para outro, de maneira eficiente.
Ao invés de promover o cruzamento entre organismos relacionados
para obter uma característica desejada, cientistas podem identificar
e inserir, no genoma de um determinado organismo, um único gene
responsável pela característica em particular.

Isto permite que as alterações no genoma do organismo sejam


precisas e previsíveis, ao contrário do melhoramento clássico, que
consiste na transferência de genes de um organismo para outro,
por meio de cruzamentos (reprodução sexual), misturando todo o
conjunto de genes dos dois organismos em combinações aleatórias.
Como consequência, o processo de seleção do caráter desejado
demanda uma enorme quantidade de tempo e não é exatamente
preciso. Além disso, os resultados de melhoramento clássico de
animais e vegetais estão limitados à variação natural dentro de
diferentes recursos genéticos.

Com as técnicas de engenharia genética, qualquer gene de qualquer


organismo pode ser isolado e transferido para o genoma de qualquer
outro ser vivo por mais divergente ou distante que seja na escala
evolutiva. Esta possibilidade amplia consideravelmente os recursos
genéticos para o melhoramento de plantas e animais e assim a
obtenção de organismos que contenham características de interesse
da nossa espécie.
UNIUBE 187

Atividades

Atividade 1

Em 1993, Kary Mullis, um geneticista a serviço da Cetus, uma


empresa de Biotecnologia da Califórnia, recebeu o prêmio Nobel
da Química ao desenvolver um método que permite sintetizar, em
poucas horas e in vitro, uma grande quantidade de um determinado
fragmento de DNA. Sobre tal técnica responda:

a) Qual o nome da técnica?


b) Explique de forma detalhada a técnica e qual a sua contribui-
ção para a área da saúde.

Atividade 2

Leia o fragmento a seguir:


O excêntrico bilionário John Hammond (Richard Attenborough),
diretor executivo da InGen, criou o Jurassic Park: um parque temático
habitado por dinossauros clonados a partir do DNA extraído de insetos
preservados em âmbar pré-histórico. O parque está localizado em
uma ilha na costa do Pacífico, Costa Rica. (WIKIPEDIA, 2011, p. 01)

Essa história faz parte do filme “Jurassic Park”, dirigido por Steven
Spielberg. No filme, cientistas retiraram do intestino de insetos
hematófagos fósseis moléculas de DNA de dinossauros, sendo
que a reconstituição dessas moléculas teria sido feita por meio da
inserção de fragmentos de DNA de rã.

Com base em seus conhecimentos sobre as técnicas utilizadas na


Biotecnologia, responda à seguinte pergunta.

Por meio do procedimento realizado no filme é provável a realização


do clone de dinossauros? Justifique sua resposta.
188 UNIUBE

Atividade 3

A bioluminescência é a emissão de luz fria e visível por organismos


vivos. Basicamente uma reação bioluminescente envolve a
oxidação por oxigênio de compostos genericamente conhecidos por
luciferinas. Estas reações são catalisadas por enzimas denominadas
de luciferases. No vaga-lume há um gene que determina a produção
dessa enzima. Um cientista transferiu o gene do vaga-lume que
codifica a luciferase, para uma célula vegetal e, a partir desta, obteve-
-se uma planta inteira. Após ser regada com solução de luciferina, a
referida planta começou a emitir luz.

Explique a técnica biotecnológica utilizada pelo cientista, que


possibilitou a “produção” de uma planta que emite luz.

Atividade 4

Ao longo deste capítulo, você estudou sobre a técnica de hibridização,


que é baseada na detecção de pequenos segmentos de DNA, ou
RNA a partir de “sondas” específicas. As sondas são sequências de
nucleotídeos complementares desenvolvidas a partir de segmentos
conhecidos do DNA ou RNA que se deseja identificar. Neste contexto,
cite os benefícios que a técnica de hibridização trouxe para a ciência,
de uma forma geral.

Atividade 5

O Southern blotting é uma técnica de biologia molecular utilizada


para conferir se uma determinada sequência de DNA encontra-se ou
não presente em uma amostra de DNA analisada. Elabore um texto,
descrevendo a técnica de Southern blotting.
UNIUBE 189

Referências

GIBSON, G. GLASS, J. LARTIGUE, L. NOSKOV, V. CHUANG, R.


ALGIRE, M. et al. Creation of a Bacterial Cell Controlled by a Chemically
Synthesized Genome. Science. 329 (5987): 52-6. 2010.

LOPES, S. Bio. Biotecnologia, Cap. 09. São Paulo: Saraiva, 2006.

REVISTA BIOTECNOLOGIA, CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Disponível


em: <http://www.biotecnologia.com.br>. Acesso em: 11 ago. 2011.

ROBERTIS, E; HIB, J. Bases da Biologia Celular e Molecular.


4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006.

SAMPLE. I. Craig Venter creates synthetic life form. The Guardian.CO.UK.


Versão eletrônica. Disponível em: <http://www.guardian.co.uk/science/2010/
may/20/craig-venter-synthetic-life-form>. Acesso em: 11 ago. 2011.

SILVA-JÚNIOR, C; SASSON, S. Biologia. Biotecnologia, v. 3. Cap. 10.


São Paulo: Saraiva, 2002.

WIKIPEDIA. Jurassic Park. Disponível em: <http://pt.wikipedia.


org/wiki/Jurassic_Park>. Acesso em: 21 fev. 2011.
Capítulo Aplicações da
5 Biotecnologia moderna

Mariana Beatriz Guimarães de Ávila


Marcelo Fernandes da Silva

Introdução

Como vimos, a Biotecnologia consiste num amplo conjunto de


várias tecnologias interligadas a vários setores da economia
que têm por objetivo a produção de bens e serviços que
possuem em comum o fato de utilizar organismos vivos ou
parte deles, assim como moléculas e/ou células (SILVEIRA;
BORGES, 2004).

Na agricultura, o homem busca alternativas que permitam o


aumento da produtividade da área plantada, diminuição do
custo de produção e o mínimo impacto ambiental (ODA, 2003).
Para tanto, os agricultores utilizam, em suas plantações, os
organismos geneticamente modificados (OGM’s), que são
capazes de oferecer uma multiplicidade de aplicações e
benefícios. Porém, os efeitos adversos à saúde humana e ao
meio ambiente, tanto a curto quanto a longo prazo, ainda, não
estão claros.

Segundo Silva (2005), na indústria bioquímica e na saúde, a


Biotecnologia é utilizada na:

• prevenção e diagnóstico precoce de patologias hereditárias;


• correção de algumas anomalias genéticas (terapia gênica);
• produção de moléculas sintéticas capazes de agir como
medicamentos, entre outros.
192 UNIUBE

IMPORTANTE!

A clonagem, técnica que obtém indivíduos geneticamente idênticos,


poderá no futuro, colocar fim às listas de espera por doadores a partir
da produção em série de órgãos para transplante.

Ademais, por meio da biotecnologia é possível o desenvolvimento


de vacinas de origem viral, bacteriana e protozoária, e agentes
imunizantes para diversas enfermidades.

Para Villen (2000), as aplicações da Biotecnologia na área


animal são múltiplas:

• a inseminação artificial tem como objetivos o aumento


da produtividade na produção de leite e de carne;
• a transferência de embriões, oriundos de mães de pro-
dutoras e reprodutoras, é considerada uma alternativa
para a propagação de raças com características raras
de produtividade;
• os animais transgênicos são utilizados como biorreatores
de proteínas de importância biomédica, e para estudar o
mecanismo molecular de patologias humanas, buscan-
do progresso nos tratamentos e possíveis curas dessas
doenças.

Sendo assim, por meio deste capítulo, pretendemos refletir


sobre a aplicabilidade da Biotecnologia, tentando alcançar os
seguintes objetivos.

Objetivos

Após o estudo deste capítulo, você deverá ser capaz de:

• demonstrar os avanços da Biotecnologia, bem como


relacionar a sua importância às suas aplicações, visando,
assim, a formação de um crivo científico em cada aluno;
UNIUBE 193

• reconhecer a importância e o impacto da reprodução


assistida, tanto na ciência, quanto na sociedade;
• demonstrar a importância sociocultural da inovação da
clonagem e transgênicos, bem como ser capaz de ava-
liar o impacto de novas tecnologias;
• reconhecer as diversas aplicações que a Biotecnologia
pode trazer em benefício à sociedade, por meio de fer-
ramentas que permitem novas descobertas e aplicações
na área de biologia e ciências da saúde. Isso, por meio
da busca de novos genes e suas funções, como passos
fundamentais, no sentido de serem implantadas aplica-
ções cada vez mais eficientes.

Esquema

5.1 Aplicações da Biotecnologia moderna


5.1.1 Vacinas gênicas
5.1.2 Aplicações na medicina humana
5.2 Reprodução assistida
5.2.1 Inseminação artificial ou IUI (Intra Uterine Insemination)
5.2.2 Fertilização in vitro ou IVF
5.2.3 Injeção intracitoplasmática de espermatozoides,
microinjeção ou ICSI (Intracytoplasmatic Sperm
Injection)
5.2.4 Transferência intratubárica de gametas ou GIFT
(Gamete Intrafallopian Transfer)
5.3 RNA de interferência
5.3.1 Aplicações do RNAi
5.4 Clonagem
5.4.1 Clonagem natural
5.4.2 Clonagem induzida
5.4.3 Clonagem terapêutica
5.4.4 Benefícios da clonagem
5.4.5 Riscos da clonagem
5.5 Células-tronco
194 UNIUBE

5.1 Aplicações da Biotecnologia moderna

5.1.1 Vacinas gênicas

As vacinas apresentam-se como um fator


Edward Jenner crucial na história da imunologia. A primeira
Edward Jenner foi
vacina, construída por Edward Jenner, em
um naturalista e 1976, contra a varíola, constitui-se como
médico britânico que um marco na erradicação das doenças in-
ficou conhecido pela
invenção da vacina da fecciosas, sendo primordial para as novas
varíola. descobertas que se seguiriam. No Brasil,
Revolta da Vacina a imunização humana ficou marcada com
uma semana de violência sangrenta, na ci-
A Revolta da Vacina foi
um movimento popular dade do Rio de Janeiro, com a revolta da
de insatisfação, devido população pela instituição da obrigatorie-
à Lei Federal nº 1261,
de 31 de outubro de
dade da vacinação implantada em 1904, e
1904, que instituiu a imposta por Oswaldo Cruz, com o intuito de
vacinação antivaríola erradicar a varíola gerando um episódio co-
obrigatória para todo o
território nacional. nhecido como a Revolta da Vacina (MOU-
LIN, 2003).

IMPORTANTE!

Atualmente, existem vários tipos de vacinas, sendo elas:

• vacinas atenuadas, utilizando micro-organismos vivos enfraque-


cidos;
• vacinas inativadas com o agente inteiro; os toxoides, que são to-
xinas inativadas dirigidas contra as toxinas produzidas por um
patógeno;
• vacinas de subunidades, que usam somente os fragmentos anti-
gênicos de um micro-organismo que melhor estimulam uma res-
posta imune;
• vacinas de ácido desoxirribonucleico (DNA) ainda em fase de ex-
perimentos (ANDRADE et al., 2003).
UNIUBE 195

A tecnologia de DNA recombinante pos-


DNA recombinante
-sibilitou a produção das vacinas gêni-
cas, uma forma de imunização promis- Sequência de DNA
artificial que resulta da
sora. Essa tecnologia recente, ainda em combinação de diferentes
experimentos clínicos, evita o contato di- sequências de DNAs.
reto com o pa-tógeno e apresenta redu-
Epítopos
ção dos custos por empregar apenas um
único protocolo para sua produção. Por Epítopo ou determinante
antigênico é a menor
serem estáveis à temperatura ambiente, porção de antígeno com
apresenta grande potencial para a elabo- potencial de gerar a
resposta imune. É o sítio
ração de formulações multivalentes pela de ligação específico
possibilidade de codifi-cação de várias que é reconhecido por
glicoproteínas. Apresenta, ainda, uma um anticorpo ou por um
receptor de superfície de
maior facilidade na manutenção do con- um linfócito T.
trole de qualidade e não são afetadas por
anticorpos maternos. Pode ocorrer um aumento da estimulação da
resposta imune quando há modificação de sequências e a adição de
epítopos heterólogos a uma proteína antigênica (KANO; VIDOTTO,
O; VIDOTTO, M., 2007; AZEVEDO; OLIVEIRA, 1998; BELÁKOVÁ,
et al., 2007).

O primeiro trabalho demonstrando a efe-


Plasmídeos
tividade do uso de DNA purificado como
terapia foi publicado na revista Science, São moléculas
circulares duplas de
há 15 anos (WOLFF et al., 1990). Por DNA adicionais ao
meio de experimentos, os autores de- cromossomo bacteriano
principal, capazes
monstraram que a transfecção de plas- de se reproduzirem
mídeos bacterianos, contendo uma se- independentemente
quência específica de DNA, por meio de do DNA cromossômico
bacteriano e são
uma injeção via intramuscular, acarretaria incapazes de produzirem
na transcrição e expressão dessas sequ- uma infecção, fato este
que confere eficácia e
ências por até dois meses após a injeção, baixa periculosidade
demonstrando também a possibilidade de (GRIFFITHS et al., 2001).
um organismo gerar uma resposta imune
contra as substâncias produzidas pelo plasmídeo. As informações
contidas nesse trabalho induziram novos experimentos utilizando
plasmídeos como possíveis vacinas (FONTOURA et al., 2005).

Os avanços da tecnologia e novas descobertas na Biologia


Molecular possibilitaram inovações para o desenvolvimento das
vacinas de terceira geração ou vacinas gênicas, nas quais os genes
196 UNIUBE

ou fragmentos de genes que codificam antígenos potencialmente


imunizantes são carreados por DNA plasmidial (RODRIGUES
JUNIOR et al., 2004).

As vacinas gênicas são construídas a partir de técnica de DNA


recombinante, utilizando como vetores, plasmídeos bacterianos
(Figura 1).

Figura 1: Produção de vacinas.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Tais vacinas têm por objetivo uma imunização duradoura e específica,


por meio de proteínas antigênicas ou ativação de linfócitos. A
administração da vacina induz a ativação de linfócitos T CD4+
que produzem citocinas, visando à resposta imune e ativação dos
linfócitos T CD8+, proporcionando citotoxicidade direta na célula alvo
(KANO; VIDOTTO, O.; VIDOTTO, M., 2007).

As vacinas gênicas (Figura 2) são formadas por plasmídeos


recombinantes imunogênicos, inoculados com DNA purificado,
que, após uma transfecção em células, passa a produzir proteínas
responsáveis pela imunização contra um patógeno específico
(LÁZARO; ROHR; FERREIRA, 2001).

IMPORTANTE!

É importante enfatizar que os plasmídeos são responsáveis por


carrear o gene codificador da proteína antigênica, que será expressa
no organismo do indivíduo imunizado pela vacina (AZEVEDO;
OLIVEIRA, 2001).
UNIUBE 197

Figura 2: Aplicação de vacina gênica.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Nem tudo, entretanto, é só vantagem quando o assunto é vacinas


gênicas. As possíveis desvantagens incluem:

• a integração do plasmídeo do hospedeiro ao DNA humano,


podendo ocasionar mutações por ativação dos protoncogenes
ou pela inativação de genes supressores de tumor;
• a indução de tolerância gerando falhas no mecanismo de con-
trole comum de infecções, devido à apresentação de antígeno
em longo prazo;
• ou reações autoimunes devido à indução de anticorpos anti-
DNA. Estudos realizados mostram que os títulos apresentados
em seres humanos não induzem qualquer doença (KANO;
VIDOTTO; VIDOTTO, 2007; FONTOURA et al., 2005).

5.1.2 Aplicações na medicina humana

Atualmente, existem vários estudos direcionados para a síntese


de vacinas eficazes contra diversas doenças que afligem pessoas,
mundialmente. Esses estudos objetivam a criação de uma vacina
capaz de induzir uma resposta imune eficaz e duradoura, sendo
muitos destes estudos direcionados para o vírus da imunodeficiência
humana HIV e certos tipos de câncer.
198 UNIUBE

A vacina contra o vírus da imunodeficiência humana foi uma das


primeiras a serem investigadas, mas apresentou baixa eficácia na
estimulação imunidade mediada pelas células T em seres humanos
(BASTOS; HACKER, 2006).

A dengue, uma doença de alta incidência no território brasileiro, é


também alvo de pesquisas no intuito de desenvolver uma vacina de
DNA recombinante contra o vírus. A imunização gerada pela vacina
deve englobar os quatro tipos de vírus, sem facilitar o fenômeno
da penetração viral em macrófagos, por meio dos anticorpos, que
desencadeiam o mecanismo fisiopatológico responsável pela
dengue hemorrágica (FIGUEIREDO, 1999).

A BCG recombinante (Bacilo Calmette-Guérin) – a vacina contra


difteria, tétano e coqueluche – é composta por uma combinação de
frações de toxinas na bactéria Escherichia coli e exibe restrições
quanto a sua utilização, devido à possibilidade de desencadear uma
resistência a antibióticos, em humanos (DIAS et al., 2006).

As vacinas recombinantes para tuberculose exigem que o DNA


utilizado seja rico em lipossomas que facilitem a entrada no
citoplasma das células e o DNA seja liberado para que a imunização
seja eficiente (ALVES FILHO, 2007). Os testes com vacina de DNA
recombinante demonstram melhora no curso clínico de doenças
autoimunes, sendo um dos mecanismos responsáveis por esse
efeito, a modulação da resposta imune antígeno-específico, cuja
sequência de DNA, clonada da vacina, é o antígeno responsável
pela patogênese da doença (FONTOURA et al., 2005).

O HPV (Papilomavírus humano) é um vírus foco de muitas pesquisas


por estar associado com mais de 90% dos cânceres cervicais,
particularmente o HPV tipo 16. O uso de vacinas de DNA como
imunoterapia apresenta alta eficácia em diversos estudos.

Segundo Nadal; Manzione (2006) existem dois tipos de vacinas para


o HPV, classificadas como:

• profiláticas: evitam a infecção pelo vírus HPV e as doenças


associadas ao patógeno;
• terapêuticas: induzem a regressão das lesões pré-cancerosas.
UNIUBE 199

É importante enfatizar que a maior efetividade das vacinas para


o HPV ocorre quando administradas antes do início da atividade
sexual.

Em estudos realizados em 2007, por Hung e colaboradores, a admi-


nistração intradérmica por meio de uma pistola genética – gene gun
– mostrou ser a mais eficaz na indução de respostas dos linfócitos T
às proteínas antigênicas por meio das células dendríticas. Este pro-
cedimento também demonstrou que a união do gene VP22 do vírus
Herpes Simples ao HPV tipo 16 aumentou a expressão da resposta
imune de células T CD8+ de memória e acentuou os efeitos antitu-
morais contra células neoplásicas que expressavam E7.

PESQUISANDO

Pesquise e veja uma figura da pistola genética (Gene gun) no endereço:


<http://www.bio.davidson.edu/courses/Bio111/gun.gif>.

Outras vacinas são desenvolvidas para outras doenças como a


esquistossomose, salmonelose, contra o vírus Herpes Simples,
entre outras. Todas elas necessitam de testes clínicos rigorosos,
resultados positivos e não devem desencadear reações tóxicas aos
seres humanos. Para que assim, em um futuro próximo, elas possam
representar armas poderosas no campo da prevenção de doenças
infecciosas (LUPI, 2003; SILVEIRA et al., 2007).

5.2 Reprodução assistida

O meio natural de se perpetuar uma espécie em diferentes momentos


históricos é a reprodução, sendo esta uma função natural para
todos os seres vivos, desde as espécies mais simples até as mais
complexas, onde se encaixam os seres humanos.

Entretanto, disfunções do organismo humano passaram a ser uma


barreira na tentativa de se reproduzir naturalmente, sendo as mes-
mas ocasionadas por diversos motivos tanto em homens como em
mulheres. Porém, a partir de 1978, o homem deu o primeiro passo
200 UNIUBE

para vencer essas barreiras que se interpunham entre a maneira


natural de se manter espécie. Neste ano, noticiou-se o nascimen-
to do primeiro bebê proveniente de uma técnica de fecundação in
vitro, mérito dado ao obstetra Patrick Steptoc e ao biólogo Robert
Edwards, que possibilitaram o nascimento de Louise Brown, filha de
um casal considerado infértil. A partir deste marco, para reprodução
com acompanhamento médico, os avanços neste campo da medi-
cina tornaram-se enormes, chegando ao auge atual com auxílio da
biologia molecular, tema a ser correlacionado neste trabalho (ANTU-
NES et al., 2003).

Portanto, o estudo das técnicas de reprodução assistida necessita


ser feito de forma crítica, jamais desconsiderando os diversos fatores
que circundam este polêmico tema. A possibilidade de procriação,
mesmo diante de imposições feitas por distúrbios fisiológicos, tomou
uma dimensão ainda maior quando se lançou mão dos chamados
testes pré-implantacionais, que possibilitam aos pais do futuro bebê
saberem se aquele embrião ainda in vitro, em fase de clivagem, será
portador de uma série de síndromes, mesmo antes de ser implantado
no útero da futura mãe.

Logicamente, o sexo do embrião também pode ser determinado,


embora não seja admitida esta seleção de sexagem no Brasil. Portanto,
o diagnóstico genético pré-implantacional (PGD) é uma alternativa ao
diagnóstico pré-natal, sendo realizado em pacientes portadores de
anomalias cromossômicas, diminuindo o número de translocações,
de abortamentos espontâneos e evitando o nascimento de crianças
portadoras de cromossomopatias (MUNNE, 2002).

A possibilidade de se reproduzir com a certeza de que o futuro filho


não será portador de uma série de doenças, de caráter genético,
faz com que a reprodução assistida em conjunto com o diagnóstico
pré-implantacional adquiram caráter seletivo, o que acaba por
desencadear uma série de questões éticas e religiosas, ao passo
que um embrião comprovadamente portador de Síndrome de Down
será, sem dúvida, descartado por aqueles que seriam seus futuros
pais, por exemplo (BENATTI et al., 2007).
UNIUBE 201

5.2.1 Inseminação Artificial ou IUI (Intra-Uterine Insemination)

A Inseminação Artificial é capaz de tratar a infertilidade masculina


─ em casos de incapacidade de ejaculação e de determinadas
alterações na qualidade do sêmen ─ e infertilidade feminina ─ nos
casos de distúrbios de ovulação e de alterações no muco cervical,
que impeçam a livre penetração dos espermatozoides no útero,
alterações nas tubas uterinas e endometriose.

A referida técnica − IUI – (Figura 3) permite a deposição de


espermatozoides diretamente no útero ou cérvix (inseminação
intracervical) sem que haja a copulação natural.

Figura 3: Inseminação artificial.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Tal procedimento é possível por meio da intervenção laboratorial


no que diz respeito à capacitação do espermatozoide bem como a
indução prévia da ovulação. A inseminação artificial é relativamente
simples e não requer cuidados como anestesia ou internação.
A deposição do espermatozoide, previamente centrifugado e
desprovido do líquido seminal, no interior do útero é possível por
meio da introdução de um cateter que percorre o canal vaginal até o
orifício interno do colo uterino. A facilidade em desenvolver a técnica
está principalmente relacionada ao fato de a fecundação ser in vivo,
ou seja, a união do espermatozoide com o ovócito II ocorre no interior
das tubas uterinas.
202 UNIUBE

5.2.2 Fertilização in vitro ou IVF (In Vitro Fertilization)

Esta técnica, também denominada “bebê-proveta” (Figura 4), repre-


senta uma das maiores conquistas no tratamento da infertilidade.

Figura 4: Fertilização in vitro.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

A possibilidade de uma fecundação fora do corpo feminino representou


a solução para disfunções que a simples inseminação artificial não é
capaz de resolver como, por exemplo, qualquer alteração em nível de
tubas, que impede que o espermatozoide chegue até o ovócito, como
laqueadura irreversível, gravidez ectópica ou mesmo endometriose.
A fertilização in vitro também possibilita tratamento de infertilidade
masculina em casos de azoospermia ou espermatozoides com
pouca mobilidade.

5.2.3 Injeção intracitoplasmática de espermatozoides, microin-


jeção ou ICSI (Intracytoplasmatic Sperm Injection)

A ICSI rompeu mais uma barreira na constante busca de tratar


a infertilidade, sendo a mesma indicada para o tratamento da
infertilidade masculina (poucos ou nenhum espermatozoide no
ejaculado, espermatozoides com baixa mobilidade, porcentagem
baixa de espermatozoides com morfologia normal). De acordo com
MOURA et al. (1998) não há diferenças nas taxas de fertilização e
gravidez entre a ICSI e a FIV quando esta é realizada na ausência
UNIUBE 203

do fator masculino de infertilidade, sendo a primeira nitidamente


superior em casos em que a infertilidade tem como precursoras
disfunções masculinas.

A técnica consiste na injeção de um único espermatozoide dentro do


ovócito com auxílio de duas micropipetas. A Injeção Intracitoplasmática
de Espermatozoide é capaz de conduzir o espermatozoide por
meio da zona pelúcida, portanto qualquer fator que impeça que isto
aconteça naturalmente, tais como baixa motilidade e azospermia
são contornados com o procedimento.

A Inseminação (Injeção) Intracitoplasmática é o principal tratamento


do fator masculino em infertilidade (JUNIOR E GONÇALVES, 1995).

5.2.4 Transferência intratubária de gametas ou GIFT (Gamete


Intrafallopian Transfer)

Idealizada pelo médico argentino Ricardo Ash, a transferência


intratubária de gametas (Figura 5), consiste em captar os ovócitos da
mulher por meio de laparoscopia - exame endoscópico da cavidade
abdominal por meio de uma pequena incisão na parede do abdômen
- ao mesmo tempo em que se capta o esperma do marido.

Figura 5: Transferência intratubária de gametas ou GIFT.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.
204 UNIUBE

Na mesma operação, colocam-se ambos os gametas em uma cânula


especial, devidamente preparados, introduzindo-os em cada uma
das tubas uterinas, lugar onde se produz naturalmente a fertilização
(OMMATI, 1998).

SAIBA MAIS

O Conselho Federal de Medicina estabelece novas normas para


reprodução assistida. As mudanças aprovadas refletem a preocupação
do Conselho Federal de Medicina (CFM) com os avanços da ciência
e o comportamento social. Além disso, as mudanças estabelecem
critérios mais rígidos para a transferência embrionária com o
objetivo de reduzir as taxas de gestação múltipla. Tais mudanças
foram aprovadas pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Entre
os destaques, há a permissão para a realização de procedimentos
com material biológico criopreservado (conservado sob condições de
baixíssimas temperaturas) após a morte e a possibilidade de mais
pessoas se beneficiarem com as técnicas, independente do estado
civil ou orientação sexual. Leia mais na resolução disponível no link, a
seguir: <http://www.sbra.com.br/images/stories/ResolucaoCFM.pdf>

5.3 RNA de interferência

Outra área em que a biotecnologia moderna tem trazido grande


avanço é na intervenção do metabolismo celular, impedindo que
a célula possa realizar a expressão de genes em proteínas. A
expressão gênica é um processo de fundamental importância para
todos os organismos vivos e pode-se dizer que é um processo pelo
qual os genes são “ligados” ou “desligados”, já que nem todos (cerca
de 30 mil genes) funcionam ao mesmo tempo em todas as células.

O controle da expressão gênica é, essencialmente, o controle


da quantidade de produtos gênicos presentes em uma célula,
possibilitando alterações bioquímicas na mesma. Logo, as diferen-
ças entre cada tipo de célula de um organismo dependem da
expressão de genes codificadores e o controle dessa expressão
pode ocorrer em qualquer uma das etapas, desde a síntese
de DNA até após a codificação das proteínas, ou seja, controle
UNIUBE 205

pré-transcricional (antes da transcrição), controle transcricional


(durante a transcrição), controle pós-transcricional (após a
transcrição) e controle pós-traducional (ALBERTS et al., 1997).

O termo “silenciamento gênico” refere-se a uma série de meca-


nismos por meio dos quais a expressão de um ou mais genes é
regulada negativamente. Modificações epigenéticas na expressão
gênica são características herdáveis que não podem ser explicadas
por alterações na sequência de DNA, e que podem resultar na
repressão ou ativação (ativação gênica) da expressão do gene
(VAUCHERET et al., 2001).

Até o final da década de 1980, somente modificações na estrutura


da cromatina ou de proteínas eram classificadas como epigenéticas.
Entretanto, durante a década de 1990, um grande número de
fenômenos de silenciamento gênico que ocorriam em nível
transcricional e pós-transcricional foram descritos em plantas, fungos,
animais e protozoários, introduzindo o conceito de silenciamento de
RNA (RNA silencing) (BAULCOMBE, 2000; MATZKE et al., 2001;
ZERBINI et al., 2005).

O componente unificador dos diferentes processos de silencia-


mento de RNA já estudados em diversos organismos é o RNA de
fita dupla (dsRNA). A presença desse tipo de molécula pode induzir
à degradação de RNAs mensageiros (RNAm) homólogos, um
processo conhecido como silenciamento gênico pós-transcricional
(posttranscriptional gene silencing, PTGS) em plantas e RNA de
interferência (RNA interference, RNAi) em animais. Os componentes
da maquinaria de PTGS e RNAi também estão envolvidos no
processamento e funcionamento de microRNAs, uma classe de
pequenos RNAs com função regulatória, que foram originalmente
identificados como responsáveis pela repressão da tradução em
Caenorhabditis elegans (ZERBINI et al., 2005).

O mecanismo de RNAi demonstra que tudo o que se foi pesquisado,


descoberto e acreditado por décadas, vai muito mais além, já
que, hoje, ele é uma prova de que as funções do RNA na célula
não se resumem em transportar as informações do DNA para a
mesma. Esse mecanismo permite a degradação do RNAm de um
gene específico e seu consequente silenciamento, trazendo para
a atualidade uma nova ferramenta na área da Biologia Molecular.
206 UNIUBE

O mecanismo envolve várias enzimas e complexos proteicos que


trabalham juntos desde a identificação das duplas fitas de RNA,
até a degradação do RNA mensageiro. As duplas fitas de RNA po-
dem ser endógenas, ou seja, originadas do metabolismo normal
do organismo, que são chamadas de micro RNAs (miRNAs), ou
exógenas, como material genômico viral, chamadas de double
strand RNA (dsRNA) (LENZ, 2005).

Os miRNAs são RNAs endógenos que possuem cerca de 22


nucleotídeos (REINHART et al., 2002) e exibem importantes papéis
regulatórios em animais e plantas: induzem degradação de RNAs
mensageiros ou reprimem sua tradução. Embora tenham passado
despercebidos até recentemente, os miRNAs formam uma das
mais abundantes classes de moléculas regulatórias de genes em
organismos multicelulares e parecem influenciar a produção de
vários genes que codificam proteínas. Muitos miRNAs apenas
previnem que RNAs mensageiros gerem proteínas, sem promover
sua degradação. Suprimir a tradução, em lugar de destruir as
moléculas transcritas, parece ser um modo melhor de modular a
expressão gênica, pois deixa em aberto a possibilidade de voltar a
realizar a tradução, quando houver interesse (SUNKAR et al.,2005).

A especificidade do mecanismo de silenciamento de RNA foi expli-


cada com a identificação de pequenos RNAs de 21-25 nucleotídeos
(nt), de orientação senso e antissenso, que apresentavam homologia
com o RNA silenciado e que estão associados ao processo. Esses
pequenos RNAs, atualmente denominados small interfering RNAs
(siRNAs), foram primeiramente observados em plantas, sob
diferentes sistemas de indução de silenciamento (introdução de
um transgene com homologia a um gene endógeno e introdução
de um transgene sem homologia com gene endógeno) (HAMILTON;
BAULCOMBE, 1999; ZERBINI et al., 2005).

Além de explicar a especificidade do sistema, o acúmulo de siRNAs


em ambas as orientações sugeriu que a formação de dsRNA ocorre
antes da degradação do RNAm. Estudos adicionais em Drosophila
demonstraram que os siRNAs são resultado da clivagem de dsRNA
injetado na célula, e que servem como “guia” para direcionar a de-
gradação de mRNAs homólogos (BERNSTEIN et al., 2001; ZAMO-
RE et al., 2000; ZERBINI et al., 2005).
UNIUBE 207

Os siRNAs formados pela clivagem das duplas fitas de RNA


correspondem às fitas sense e antisense do RNAm alvo, elas
irão se associar a proteínas celulares formando o complexo de
silenciamento induzido por RNA (RISC), o qual será guiado até o
RNA mensageiro para degradá-lo (BLAU e SEM, 2006). O complexo
RISC possui atividade catalítica que cliva especificamente o mRNA
alvo sem afetar o siRNA guia. A subunidade catalítica é denomina-
da Slicer, e foi demonstrado que mutações em AGO2 (proteína
da família Argonaute, presente no RISC) de mamíferos inibem a
capacidade de clivagem do RISC, indicando que AGO2 é a própria
proteína Slicer (ZERBINI et al., 2005). A endorribonuclease Slicer
cliva o referido RNAm no meio da região complementar a uma das
fitas do siRNA (entre os nucleotídeos pareados nas bases 10 e 11)
degradando-o e impedindo a tradução da informação carregada por
ela (BARBOSA e LIN, 2004).

A Figura 6 traz um esquema de RNAs de dupla fita processados pela


enzima Dicer, tornando-se siRNAs. A fita antissenso dos siRNAs é
incorporada ao complexo RISC, guiando-o ao RNAm alvo. Uma
endorribonuclease, Slicer, também presente no complexo, cliva o
referido RNAm, degradando-o.

Figura 6: RNA de interferência (RNAi).


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

A interferência mediada por RNA é um fenômeno que ocorre


naturalmente nos organismos e parece exercer um papel na
eliminação de RNAs mensageiros anômalos (RNA não genômicos)
e na defesa do organismo contra parasitas moleculares como
transposons (segmentos de DNA que têm a capacidade de se
mover e replicar dentro do genoma) e vírus. Por exemplo, durante
208 UNIUBE

a replicação viral, ocorre replicação do material genético do vírus,


gerando assim duplas fitas de RNA. Essas moléculas são clivadas
pela Dicer de forma que quando a infecção se estabelece de fato, o
complexo RISC ataca os RNA mensageiros virais e a replicação viral
decai (BARBOSA e LIN, 2004).

5.3.1 Aplicações do RNAi

• No câncer

Como você estudou, o câncer é uma patologia caracterizada pela


proliferação exarcebada de células, devido à perda do controle
da divisão celular. A perda deste controle está ligada a mutações
em genes controladores do ciclo celular, como oncogenes, genes
supressores tumorais e de reparo de DNA. O objetivo da utilização do
RNAi é bloquear a expressão de genes controladores do ciclo celular
impedindo o crescimento tumoral, destruindo as células malignas.
Normalmente, em tratamentos como quimioterapia e radioterapia, as
células normais do organismo acabam por serem danificadas. Para
evitar isso, o RNAi pode ser desenhado para silenciar a expressão
de genes presentes especificamente em células tumorais (REDDY,
SARAJAMMA, RAMAKRIHNA, 2006).

• Nas infecções virais

Devido à alta taxa de mutação, apresentada pelos vírus em geral,


terapias antivirais são difíceis de ser desenvolvidas. No entanto,
os estudos com o RNAi apresentam resultados promissores em
relação ao desenvolvimento deste tipo de terapia. Apesar da técnica
de interferência mediada por RNA ser bastante utilizada no estudo
de diversas infecções virais, é nos vírus da hepatite C (HCV) e da
imunodeficiência humana (HIV) que esta técnica é mais aplicada, a
fim de sua maior exploração (CHIU et al., 2003).

Devido ao grande número de estudos e pesquisas sobre o seu


genoma e padrão proteico, o HIV foi o primeiro vírus alvo da técnica
de RNAi. siRNAs desenhados para desenvolvimento de terapias
anti-HIV têm como alvo os mais diversos RNAs mensageiros, sejam
eles codificantes de proteínas virais ou de proteínas do próprio
hospedeiro, necessárias para a replicação e sobrevivência do vírus
no organismo (QUIN et al., 2002).
UNIUBE 209

• Nas desordens degenerativas

Doenças como Alzheimer, Parkinson, Duchene, Huntington são


estudadas e novos alvos para desenvolvimento terapêutico estão
sendo descobertos. A maioria das doenças neurodegenerativas é
resultante de mutações genéticas específicas ou alterações proteicas,
desencadeantes de reações em cascata que culminam com a morte
de células nervosas (REDDY, SARAJAMMA, RAMAKRIHNA, 2006).

Foram desenvolvidos siRNAs alelos específicos para dois importantes


genes envolvidos em doenças neurodegenerativas, AP e Tau. Por
meio do silenciamento destes genes, ficou demonstrado que siRNAs
alelos específicos podem ser úteis para o desenvolvimento de terapia
de desordens degenerativas (MILLER et al., 2003).

Sabe-se que o silenciamento por RNAi pode diminuir a velocidade de


progressão da doença, no entanto, estes são apenas alguns dos alvos
atualmente. Vários outros alvos potenciais para o desenvolvimento
da doença estão sendo estudados (MANFREDSSON, LEWIN,
MANDEL, 2005).

Hoje em dia, a técnica de RNA de interferência é aplicada em


diversas outras áreas e patologias, sendo vista como uma
importante ferramenta para o desenvolvimento de terapias médicas,
principalmente.

5.4 Clonagem

Em fevereiro de 1997, o escocês Ian Wilmut, um brilhante em-


briologista de 52 anos, anunciou a primeira clonagem de um animal
adulto, uma ovelha chamada de Dolly. Esse anúncio fez emergir
uma série de especulações sobre o protocolo utilizado para o
desenvolvimento da ovelha, assim como a possibilidade de clonar
diferentes mamíferos, entre eles o homem, façanha até hoje inédita,
e, devido à alta complexidade do corpo humano, acredita-se que
esse clone nunca será realizado. Antes de qualquer coisa, faz-se
necessário compreender quais os passos realizados por Wilmut até
a formação da ovelha Dolly (Figura 7).
210 UNIUBE

anucleado

Figura 7: O processo de clonagem da ovelha Dolly.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Veja os seguintes passos:

1. O primeiro passo do embriologista, contrariando todas as


normas de fertilização, foi adicionar a um óvulo sem núcleo
(sem informações genéticas) genes provenientes da ovelha
em questão. Este fato por si só gerou várias discussões, visto
que normalmente numa fecundação, deve-se promover o
encontro do espermatozoide com um óvulo e posteriormente
a formação do zigoto.

2. Após a inserção de genes, o óvulo foi implantado em outra


ovelha e deu origem à famosa Dolly. Porém, para que esse fato
ocorresse, especula-se que foi necessária a criação de mais
de 200 ovelhas, que até então nasciam imperfeitas. O grande
dado do pesquisador foi que, por não usar espermatozoides,
e, sim, genes, que já eram especializados, resultariam, então,
em um animal idêntico ao doador. Visto que o núcleo do óvulo
fora retirado, a ovelha nunca poderia herdar material genético
de sua “mãe”, e, o material genético utilizado foi proveniente
de células das glândulas mamárias.
UNIUBE 211

3. A ovelha, contrariando a expectativa de vida da espécie (11 ou


12 anos) morreu prematuramente aos 6 anos e meio, fato que
foi explicado devido ao material genético ter sido retirado de
uma ovelha adulta, o que supostamente fez com que a Dolly
nascesse prematuramente velha.

5.4.1 Clonagem natural

Este tipo de clonagem ocorre em todos os seres assexuados, como


no caso das bactérias, e nos sexuados, como os gêmeos univitelinos
em humanos; nesses casos, os irmãos são geneticamente idênticos.

5.4.2 Clonagem induzida

Ocorre quando um óvulo é fecundado por um espermatozoide, fora


do útero (em experiências de laboratório) e colocado numa barriga
de aluguel. O único fato que explica a utilização deste método seria
pais inférteis que doam seus materiais e utilizam uma barriga de
outra pessoa para gerar seu próprio filho.

5.4.3 Clonagem terapêutica

Neste tipo de experimento (Figura 8), após a fecundação do óvulo, o


mesmo não será colocado num útero, e, sim, utilizado para finalidade
posterior, como o uso das células do blastocisto. Após 3 ou 4 dias de
fecundação, um aglomerado de células dá origem aos blastocistos.
Essas células, denominadas blastômeros, são indiferenciadas, isto
é, podem-se tornar qualquer célula do corpo humano.

Figura 8: Clonagem terapêutica.


Fonte: Acervo EAD-Uniube.
212 UNIUBE

Uma das justificativas plausíveis para estes experimentos seria a


“produção” de órgãos inteiros, o que diminuiria o tempo de espera
nas filas de transplantes e também evitar os riscos de rejeição, já
que o material formador do órgão é proveniente do receptor.

5.4.4 Benefícios da clonagem

Entre os benefícios da clonagem, temos:

• rejuvenescimento: acredita-se que, com o aperfeiçoamento das


técnicas, será possível controlar o processo de envelhecimento;
• cura de doenças genéticas;
• tratamento e cura de leucemias;
• casos de infertilidade;
• recuperação da perda motora por lesão da coluna cervical;
• redução do tempo de espera em filas de transplantes e dimi-
nuição do risco de rejeição;
• implantes dentários;
• recuperação de tecidos infartados.

5.4.5 Riscos da clonagem

• comprometimento da individualidade;
• perda de variabilidade genética;
• envelhecimento precoce;
• aumento do número de anomalias;
• surgimento de “mercado negro” de fetos;
• discriminação dos clones por parte da sociedade.

5.5 Células-tronco

A partir da fusão do óvulo com o espermatozoide (fecundação),


as células resultantes começam a se dividir rapidamente. Quando
o número de células chega a oito, sabe-se que cada uma destas
células é capaz de se desenvolver em um ser humano completo.
UNIUBE 213

Tais células são chamadas de totipotentes. São células-tronco


totipotentes ou embrionárias, de maneira que cada uma delas tem
a capacidade de se diferenciar em qualquer um dos 216 tecidos
(inclusive a placenta e os anexos embrionários) que formam o
organismo humano. Após 72 horas da fecundação, as divisões
celulares dão origem a um aglomerado de, aproximadamente, 100
células (embrião), denominado blastocisto. Nessa fase, ocorre a
implantação do embrião na cavidade uterina. As células internas do
blastocisto originam centenas de tecidos que compõem o organismo
humano - tais células são chamadas células-tronco embrionárias
pluripotentes. Estas células somáticas, ainda iguais, a partir de um
determinado momento, passam a diferenciar-se nos vários tecidos
que vão compor o organismo: sangue, fígado, coração, ossos,
cérebro etc.

IMPORTANTE!

As definições e metodologias empregadas no cultivo e estudo de


células-tronco já foram estudadas no capítulo anterior, de maneira que
iremos nos focar nas possíveis aplicações da utilização de células-
-tronco.

A terapia com células-tronco, ainda em fases de testes e pesquisas,


e seu potencial é objeto de muita especulação, expectativas e
esperanças. Tal terapia consiste em usar grupos de células-tronco no
tratamento de doenças e lesões por meio da substituição de tecidos
doentes por tecidos formados por células saudáveis.

O transplante de medula óssea para o tratamento das leucemias é


uma forma de tratamento com células-tronco de eficácia comprovada.
A medula óssea do doador compatível contém as células-tronco
hematogênicas que irão formar as novas células sanguíneas sadias.
O que pode, no entanto, diminuir de manei-ra drástica o tempo de
espera na fila de transplantes, bem como minimizar os riscos de
rejeição de transplantes autólogos.

Há uma grande variedade de aplicações das células-tronco no trata-


mento de diversas doenças, mas, há também, grandes obstáculos a
serem vencidos.
214 UNIUBE

Entre as dificuldades, há uma série de perguntas que ainda não


foram satisfatoriamente respondidas, tais como, os riscos em longo
prazo, os padrões de inclusão e exclusão do indivíduo e etc.

Um dos principais objetivos do estudo das células-tronco embrio-


nárias é a coleta de informações sobre os eventos complexos que
ocorrem durante o desenvolvimento do embrião humano. É preciso
saber como as células-tronco indiferenciadas tornam-se células
de determinados tecidos. Sabe-se que a manipulação de genes
(introduzindo ou removendo) pode interferir na diferenciação celular.
A melhor compreensão dos controles moleculares e genéticos pode
contribuir para conhecer como doenças do tipo do câncer e doenças
congênitas se originam e como podem, eventualmente, ser mais
adequadamente tratadas.

Algumas linhagens de células-tronco podem ser usadas para testar


a potência e a eficiência de determinadas drogas, como as que
se usam no tratamento de alguns tipos de câncer, por exemplo, e
muitas outras drogas potentes, antes da sua indicação para uso em
humanos, ainda que em caráter experimental.

Talvez, a maior esperança do uso das células-tronco resida na geração


de células capazes de serem usadas como terapia substitutiva de
células danificadas por doenças, em lugar dos trans-plantes. As
células-tronco diferenciadas podem ser usadas em doenças como o
Parkinson, Alzheimer, doenças e traumatismos da medula espinhal,
acidentes vasculares cerebrais, entre outras doenças severas e
incapacitantes. Os estudos com a regenera-ção de células cerebrais
visam buscar a cura ou, pelo menos, a melhora de pacientes
portadores de doenças graves, como as citadas anteriormente, além
de outras degenerações neurológicas menos frequentes.

O Brasil inicia, nos dias atuais, um ambicioso programa de emprego


de células-tronco adultas no tratamento de doenças cardíacas com
aproximadamente 40 centros e 1200 pacientes, visando regenerar
tecidos do coração que foram lesados previamente a partir de
infartos, doença de Chagas, entre outras patologias que acometem o
coração. Os resultados são bem animadores e os grupos de pesquisa
aumentam rapidamente para pesquisas em pacientes diabéticos.
UNIUBE 215

Outros grupos buscam determinar a eficácia do emprego das células-


tronco na regeneração de tecido cerebral e da medula espinhal,
comprometidos por diversos processos patológicos, congênitos ou
adquiridos (SOUZA; ELIAS, 2009).

As aplicações são amplas, a tecnologia ainda engatinha e os


pesquisadores unem forças e compartilham experiências para o
crescimento das pesquisas e, consequentemente, a aplicação de
células-tronco como uma terapia convencional e satisfatória.

Chegamos ao final desse capítulo de estudo. É importante ressaltar


que a busca por novos conhecimentos nos livros didáticos, poderão
levá-lo a um maior aprofundamento do conteúdo e consequente-
mente, a um enriquecimento de suas aprendizagens sobre as
aplicações da Biotecnologia moderna.

PESQUISANDO NA WEB

Para aprofundar seus conhecimentos consulte o endereço, a seguir:

SOUZA, Maria Helena L.; ELIAS, Decio O. As Células-Tronco e o seu


Potencial na Reparação de Órgãos e Tecidos. Manual de Instrução
Programada: Princípios de Hematologia e Hemoterapia. Centro de
Estudos Alfa Rio. Programa de Educação continuada. 2005. Disponível
em: <http://perfline.com/cear/artigos/stem.pdf>. Acesso em 22 dez. 2011.

Resumo

Ao longo deste capítulo, você estudou diversos temas relacionados


à Biotecnologia Moderna, como a fabricação de vacinas gênicas, a
clonagem, a terapia com células-tronco, entre outros.

Segundo a Convenção sobre Biodiversidade Biológica da Organi-


zação das Nações Unidas, a Biotecnologia define-se pelo uso
de conhecimentos sobre os processos biológicos e sobre as
propriedades dos seres vivos, com o fim de resolver problemas e
criar produtos de utilidade.
216 UNIUBE

A Biotecnologia Moderna concentra suas atenções nas pesquisas


com o DNA (material genético). Isso possibilita a modificação dos
genes para, por exemplo, transformar um alimento convencional em
outro que seja mais tolerante aos herbicidas, desenvolver vacinas,
medicamentos e antibióticos que ajudam no combate a várias
doenças, entre outros.

Neste contexto, o ensino de Biotecnologia é de grande importância


em sua formação acadêmica e assume um caráter de urgência
face às situações polêmicas discutidas pela sociedade. Portanto, é
necessário inserir a Biotecnologia nas escolas, fornecendo a base
para a formação de cidadãos mais críticos e atuantes em nossa
sociedade.

Atividades

Atividade 1

Nem sempre apenas os casais inférteis são os que procuram Clínicas


Especializadas em reprodução. Segundo dados do Ministério
da Saúde, a procura por esse tipo de atendimento aumentou
consideravelmente nos últimos anos. Sendo assim, explique a
importância da inovação da Reprodução Assistida e aponte a
vantagem desta técnica.

Atividade 2

Descreva os passos envolvidos no mecanismo de ação do


silenciamento gênico, por meio da interferência de RNAi. Escreva
(explique) sobre uma das aplicações desta nova tecnologia.

Atividade 3

Cite algumas aplicações da Biotecnologia Moderna que podem ser


vistas a todo o momento, no Brasil e no mundo.

Atividade 4

As vacinas apresentam-se como um fator crucial na história da


imunologia. A primeira vacina construída por Edward Jenner, em
1976, contra a varíola, constitui-se como um marco na erradicação
UNIUBE 217

das doenças infecciosas, sendo primordial para as novas descobertas


que se seguiriam. Porém, a tecnologia de DNA recombinante
possibilitou a produção das vacinas gênicas, uma forma de
imunização promissora. Explique de que formas são construídas as
vacinas gênicas e quais suas vantagens.

Atividade 5

Em fevereiro de 1997, o escocês Ian Wilmut, um brilhante embriologista


de 52 anos, anunciou a primeira clonagem de um animal adulto, uma
ovelha chamada de Dolly. Esse anúncio fez emergir uma série de
especulações sobre o protocolo utilizado para o desenvolvimento da
ovelha, assim como a possibilidade de clonar diferentes mamíferos.
Sabe-se que no processo de clonagem, o núcleo dos óvulos é
retirado. Explique por que é utilizado um óvulo anucleado e descreva
sua importância para o processo de clonagem.

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mecanismo de defesa de plantas a vírus. RAPP. V. 13. 2005.
Capítulo
Ética e bioética: uma
questão de conduta
6
e responsabilidade

Tiago Zanquêta de Souza

Introdução
A ética é uma característica ineren-
Consciência moral
te a toda ação humana e, por esta
razão, é um elemento vital na pro- A consciência moral
dução da realidade social. Todo ho- pode ser vista como um
juiz, ou uma voz interior
mem possui um senso ético, uma que ora gera em nós
espécie de “consciência moral”, sentimentos de nostalgia
e prazer, como também
estando constantemente avaliando grandes arrependimentos
e julgando suas ações para saber e remorsos. Esta é uma
característica que nos
se são certas ou erradas, justas ou é dada pela própria
injustas, boas ou más. natureza, e que deve de
ser ouvida e seguida,
porque ela pressupõe o
A matriz cultural que é estabelecida que é para cada indivíduo
por um povo determina se os com- o correto e o incorreto,
ou seja, atua como uma
portamentos humanos se classificam bússola interior, emite
no prisma do certo ou do errado, do conselhos e orienta a
ação, indica-nos o melhor
que é bom ou mau, mesmo que se caminho.
saiba da individualidade da ação do
ser.

O desejo e a vontade de realizações estão diretamente


relacionados à ética, desde que se dê de forma aceitável e
justa a todos os envolvidos em um relacionamento. Por isso,
fundamenta-se no que é de bem e virtuoso, em valores e
condutas presentes numa existência harmônica, feliz e cheia
de plenitude.
224 UNIUBE

Ética prática Já a Bioética é uma ética aplicada,


A ética prática é uma chamada também de “ética prática”,
das áreas em que que visa “dar conta” dos conflitos e
filosofia, praticada na
sua melhor tradição controvérsias morais implicados pelas
argumentativa, práticas no âmbito das Ciências da
demonstra a sua
fecundidade como Vida e da Saúde, do ponto de vista de
instrumento de algum sistema de valores (chamado
abordagem a alguns
dos grandes problemas também de “ética”).
da humanidade.

Como tal, ela se diferencia da mera


Cogência
ética teórica, pois é mais preocupa-
Diz-se do argumento da com a forma e a “cogência” dos
cujas premissas são
todas verdadeiras conceitos e dos argumentos éticos,
e que satisfaz, pois, embora não possa abrir mão
racionalmente e de
maneira coerciva das questões propriamente formais
(que pune), as (tradicionalmente estudadas pela me-
necessidades do
entendimento. Diz- -taética), está incitada a resolver os
se também das conflitos éticos concretos. Tais confli-
regras que devem
ser integralmente tos surgem das interações humanas
cumpridas - sem em sociedades, a princípio, secula-
alterações ou
exclusões por vontade res. Isto é, que devem encontrar as
das partes - por terem soluções para seus conflitos de inte-
argumentos cogentes.
resses e de valores sem poder recor-
Metaética rer, consensualmente, a princípios de
É o estudo do autoridade transcendentes (ou exter-
significado dos termos nos à dinâmica do próprio imaginário
usados no discurso
ético. social), mas tão somente “imanen-
tes” pela negocia-ção entre agentes
morais que devem, por princípio, ser
considerados ética e cognitivamente
competentes.

Por isso, pode-se dizer que a Bioética tem uma tríplice função,
reconhecida acadêmica e socialmente, que você terá a
oportunidade de estudar, nos itens que seguem neste capítulo.
UNIUBE 225

Ao iniciar um tema que envolve a ética como objeto de estudo,


consideramos importante, como ponto de partida, estudar o
conceito de ética, estabelecendo, primeiro, o seu campo de
aplicação.

Bons estudos!

Objetivos

Ao final dos estudos propostos neste capítulo, esperamos que


você esteja apto(a) a:

• definir e diferenciar os conceitos de ética, moral, direito,


valor e eticidade;
• reconhecer as diretrizes e declarações envolvidas na
compilação dos documentos em Bioética;
• relacionar, de maneira cronológica, o surgimento da
Bioética;
• estabelecer a reflexão Bioética;
• reconhecer a importância da Bioética nos diferentes
contextos da atualidade;
• aplicar o código de ética do biólogo.

Esquema

6.1 Construindo a definição de valor, moral, eticidade, ética


e direito
6.1.1 Valor
6.1.2 Moral
6.1.3 Ética
6.1.4 Direito
6.2 Bioética: origens e definições
6.2.1 O Código de Nuremberg
6.2.2 Nascimento da Bioética – passo a passo
6.3 Modelos bioéticos diversos
226 UNIUBE

6.3.1 Ética descritiva e modelo sócio-biológico


6.3.2 Subjetivista ou liberal-radical
6.3.3 Pragmático-utilitarista
6.3.4 Modelo personalista
6.4 Bioética como componente curricular
6.4.1 O código de ética do biólogo
6.5 Temas relevantes em Bioética
6.5.1 Eutanásia
6.5.2 Aborto
6.5.3 Pena de morte
6.5.4 Células-tronco
6.5.5 Reprodução humana assistida
6.5.6 Intervenções terapêuticas na gestação
6.5.7 Clonagem
6.5.8 Doação e transplante de órgãos

6.1 Construindo a definição de valor, moral, eticidade,


ética e direito

Neste primeiro momento, propomos uma revisão dos conceitos:


valor, moral e ética, aparentemente claros para cada um de nós,
justamente pelo fato de serem esses termos muito frequentemente
utilizados, carecendo de maior precisão quanto aos seus significados.

De acordo com Segre; Cohen (2008, p. 17), “uma pessoa não nasce
ética; sua estruturação ética vai ocorrendo juntamente com o seu
desenvolvimento. De outra forma, a humanização traz a ética a seu
bojo”.

Muitas pessoas acreditam que a eticidade, ou a condição de vir a


ser ético, tenha apenas caráter determinístico para ouvir o que “diz o
coração”. Mas, acredita-se que essa seja, apenas, uma característica
de sensibilidade, de percepção dos conflitos entre o “ser ético” para
os que tiverem a capacidade de percepção dos conflitos entre “o
que a cabeça pensa e o que o coração diz”, podendo-se percorrer o
UNIUBE 227

caminho entre a razão e a emoção, posicionando-se na parte desse


percurso que se considere mais adequada (SEGRE; COHEN, 2008).
Esse conflito pode ser avaliado, segundo Segre; Cohen (2008, p. 17),
a partir da óptica proposta por Claude Lévi-Strauss, que alega ser o
homem um ser social (isto é, produto da cultura) e ao mesmo tempo,
um ser biológico (isto é, produto da natureza), portanto, sujeito às
leis culturais e naturais, que muitas vezes são conflitantes, como,
por exemplo, no caso dos desejos incestuosos (natural) e da sua
proibição (cultural).

EXEMPLIFICANDO!

Para podermos exemplificar a passagem do ser biológico para o


psicossocial, pode-se observar a instituição familiar, como propõe Segre;
Cohen (2008, p. 18). Segundo os autores, o ser humano não nasce com
o conceito de família, pois, um pai biológico talvez não assuma a função
de pai “social” (aquele que “cria”), determinando um padrão atípico de
família, que até então deveria ser estruturada e organizada com base
nos graus de parentesco e convivência, tendo, portanto, característica
cultural. Vale ainda ressaltar que, conforme colocam os autores citados
anteriormente, a descoberta da paternidade, estruturante no nosso
modelo atual de família, é um dado que se funda na observação, pois a
descoberta da relação entre procriação e sexo não é um dado imediato
da consciência.

Assim, da mesma maneira com que não se nasce com o conceito de


família, também não se nasce com os conceitos de ética, de valores
e de moral. Esses conceitos serão apreendidos e estruturados a
partir das experiências de vida.

6.1.1 Valor

Para Segre; Cohen (2008, p. 19), o conceito Valor


de valor está intimamente vinculado ao
“Etmologicamente,
sentido atribuído à seleção ou preferência. valor provém do latim
Mas, nem por isso deve-se considerar que valere, ou seja, que tem
alguma coisa tem valor somente por ter sido valor, custo. As palavras
desvalorização, inválido,
escolhida ou preferida, pois essa escolha valente ou válido têm a
ou preferência pode vir acompanhada por mesma origem” (SEGRE;
COHEN, 2008, p. 19).
algum motivo específico.
228 UNIUBE

Valor também pode ser definido como uma crença duradoura em


um determinado modelo de estado de existência ou de conduta,
que é social e pessoalmente adotado, embasado em uma conduta
preexistente. Esses valores podem expor sentimentos, tornando-
-se, em vários momentos, o impulso de nossas lutas e a base de
nossos compromissos. A cultura, a sociedade e a personalidade
antecedem os nossos valores e as nossas atitudes, sendo nosso
comportamento a sua maior consequência (ROKEACH, 1973).

EXEMPLIFICANDO!

Ainda de acordo com Rokeach (1973, p. 73), podem-se exemplificar


os valores culturais por meio do dinheiro, que, para os americanos, é
o mais importante, de maior valor; para os europeus, a equivalência
é cultural; e para os orientais, uma questão de honra. Quanto aos
valores individuais, tem-se como exemplo, as escolhas profissionais,
a opção pela autonomia, dentre vários outros. E, como exemplo de
valores universais, têm-se as religiões, a criminalidade e até mesmo a
proibição por incesto etc.

6.1.2 Moral

Para Barton & Barton (1984), o estudo


Moral da moral consiste espe-cialmente em
questionar-se o que é correto ou incorreto,
Etmologicamente, a
palavra moral origina-se o que é uma virtude ou uma maldade nas
do latim mos morri, que condutas humanas. A moral, para esses
significa maneira de se
comportar regulada pelo
autores, é um sistema de valores, do qual
uso, e de moralis, morais, resultam normas que são consideradas
adjetivo referente ao que corretas por um determinado grupo social,
é relativo aos costumes.
como, por exemplo, os Códigos Civil, Penal,
ou até mesmo os Dez Mandamentos.

De acordo com o dicionário de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira


(2003), moral é o conjunto de regras de conduta consideradas como
válidas, seja de modo absoluto, em qualquer espaço temporal ou
local, seja para grupos ou pessoa determinada.

O ser humano vive em sociedade. Neces-sita, portanto, de regras


de comportamento e princípios éticos cujo objetivo é fazer com que
suas ações sejam em conformidade com a moral.
UNIUBE 229

De acordo com Segre; Cohen (2008, p. 20), a moral pressupõe três


características:

I. seus valores não são questionados;


II. os valores são impostos;
III. a desobediência às regras determina um castigo.

Dessa forma, a moral constitui a parte da filosofia que trata dos


costumes, dos deveres, do modo de agir e de proceder dos homens
para com outros homens. É uma ciência normativa que indica quais
os comportamentos são aceitos pela sociedade. A justiça, entendida
pelos romanos como a vontade constante e perpétua de dar a
cada um o que é seu, ou seja, a justiça entendida como virtude ou
qualidade de espírito, está diretamente ligada às três características
fundamentais da moral.

De certo modo, a justiça é mesmo o conjunto de todas as virtudes,


pois, aquele que dá a todos o que lhes compete, cumpre todos os
deveres para consigo mesmo e para com o próximo, exercendo, por
isso, a moral.

6.1.3 Ética

Ao longo da história, civilizações deixaram exemplos das dimensões


éticas que a caracterizavam. Ilustres pensadores procuraram
entender a conduta humana. A preocupação com esse ramo da
filosofia é milenar. Foi a partir de Sócrates que a filosofia passa a se
ocupar com problemas relativos ao valor da vida. O valor ético, como
o bem ou a justiça, impõe-se de modo imperativo à conduta, mesmo
que as consequências da ação sejam prejudiciais a quem a pratica.

Vários foram os pensadores contemporâneos que vieram a discorrer


sobre o tema, demonstrando que a conduta humana é rica em sua
produção de fenômenos e, portanto, vale a pesquisa no sentido de
conhecê-la.
230 UNIUBE

PESQUISANDO NA WEB

Pesquise sobre a visão dos filósofos, indicados a seguir, em


relação às definições de ética, estabelecidas desde 470 a.C. até a
contemporaneidade.

• Sócrates (470-399 a.C.);


• Platão (427-347 a.C.);
• Aristóteles (384-322 a.C.);
• Thomas Hobbes;
• Baruch Espinosa;
• John Locke;
• Immanuel Kant.

Não deixe de conversar com seu professor-tutor a respeito da pesquisa


realizada, socializando-a também, em momento oportuno, com seus
colegas de turma.

AMPLIANDO O CONHECIMENTO

“Ética é a investigação geral sobre aquilo


Ética que é bom” (MOORE, 1975).

Etmologicamente, a “A ética tem por objetivo facilitar a realização


palavra ética origina-
-se do grego ethos, que das pessoas. Que o ser humano chegue a
significa modo de ser, realizar-se a si mesmo como tal, isto é, como
caráter. Em filosofia, ética pessoa. (...) A ética se ocupa e pretende a
significa o que é bom
para o indivíduo e para a
perfeição do ser humano” (CLOTET, 1986).
sociedade, e seu estado
contribui para estabelecer “A ética é a realização de uma reflexão
a natureza de deveres no
relacionamento indivíduo
disciplinada das intuições morais e das
– sociedade. escolhas morais que as pessoas fazem”
(VEATCH, 2000).

Para Barton & Barton (1984, apud Segre; Cohen, 2008), a ética
está representada por um conjunto de normas que regulamentam
o comportamento de um grupo particular de pessoas, como, por
exemplo, advogados, médicos, professores etc.
UNIUBE 231

É muito comum que esses grupos tenham o seu próprio código de


ética, como no caso dos biólogos, que possuem um código de ética
específico, o Código de ética do Biólogo.

Ainda de acordo com Segre; Cohen (2008, p. 21), a ética se


fundamenta em três pré-requisitos:

• percepção dos conflitos (consciência);


• autonomia (condição de posicionar-se entre a emoção e a
razão, sendo que essa escolha de posição é ativa e autônoma;
• coerência.

Dessa maneira, fica fácil entender o conceito de ética que, neste


capítulo, pretendemos abordar, reservando o termo eticidade para a
aptidão de exercer a função ética.

IMPORTANTE!

Mesmo pretendendo pluralizar ao máximo o conceito de ética,


distinguindo-o de moral, não há como estabelecê-lo sem amarrá-lo
a alguns valores preestabelecidos. Mas, moral e ética não devem ser
confundidos, pois, enquanto a moral é normativa, a ética é teórica,
buscando explicar e justificar os costumes de uma determinada
sociedade, bem como fornecer subsídios para a solução de seus
dilemas mais comuns.

Para Segre; Cohen (2008, p. 22), a grande diferença entre ética e


moral, é que, enquanto a moral é imposta, a ética é atenuante, ou
seja, deve ser apreendida pelo indivíduo, vir de seu interior. Deve ser
percebida.

Então, quando podemos considerar um indivíduo ético?


232 UNIUBE

Podemos considerar um indivíduo ético, quando esse indivíduo


possuir uma personalidade bem integrada, ou seja, quando atingir
uma maturidade emocional que lhe permita trabalhar com as
emoções conflitantes, uma força de caráter, um equilíbrio de vida
interior e um bom grau de adaptação à realidade do mundo.

SAIBA MAIS

Maturidade emocional

Para Klein (1976, apud Segre; Cohen, 2008, p. 23), a maturidade


emocional é a capacidade do indivíduo de transformar-se, ou seja, de
mudar seus desejos, fantasias infantis, em fontes de enriquecimento
da personalidade. Está, também, essa maturidade, diretamente ligada
à capacidade de suportar frustrações, pois dessa forma é que se
pode desenvolver. Uma forma de perceber essa maturidade é aceitar
primeiro as nossas próprias limitações.

DICAS

No link, a seguir, você encontrará vários vídeos do professor Daniel


Godri, um especialista em ética do trabalho. Os vídeos do professor
são excelentes e muito contribuirão com sua aprendizagem.
Você perceberá que a maioria aborda o tema motivação, uma das
ferramentas do trabalho, principalmente para o exercício da ética.

Acesse o site:
<http://www.youtube.com/results?search_query=V%C3%ADdeo+Goldri&aq=f>

Aproveitem!

6.1.4 Direito

O Direito busca o estabelecimento de regras a uma sociedade


delimitada por fronteiras geográficas, ou não, que constituem um
Estado. Todas as leis possuem como base uma atuação territorial,
em que cada Estado garante o bem-estar da comunidade, vivendo
com regras que lhes permitem determinar entre o certo e errado e
aplicar as devidas penas quando essas forem necessárias.
UNIUBE 233

6.2 Bioética: origens e definições

Você sabe como surgiu a Bioética?

Como resposta aos crescentes avanços na ciência e na tecnologia,


que por si só suscitam questões relacionadas à pesquisa, bem como
o questionamento frequente que norteia os padrões científicos e
humanos, fez-se necessário a elaboração de leis, de critérios e de
diretrizes para a condução desses avanços e pesquisas, para o bem
comum, baseando-se nos pilares da educação, justiça e expressão
dos princípios éticos.

Assim surge a Bioética, que tem como objetivo refletir e discutir todas
as questões que até então se mantêm apenas em círculos pequenos
de debates, fazendo assim com que pensemos a respeito da vida,
da morte e suas relações restritas com as leis, valores, ideologias e
julgamentos pré-concebidos.

IMPORTANTE!

Quando surgiram as normas para orientações éticas?

Data de 1900 o primeiro documento contemplando normas e


diretrizes capazes de estabelecer princípios éticos da experimentação
em humanos, formulado pelo Ministério da Saúde da Prússia.
Esse documento compreendia orientações para a manutenção da
integridade moral do experimentador e o consentimento explícito do
sujeito pesquisado, sendo que o sujeito em questão deveria estar
ciente de todos e quaisquer problemas que poderiam surgir no decorrer
da experimentação.

As repercussões desse documento não ultrapassaram os limites


da região, pois, em outra região pertencente ao mesmo país, foi
realizado, em 1930, um teste com vacina BCG em 100 crianças,
sem a obtenção do consentimento de seus responsáveis para a
participação na pesquisa. Esse teste ocasionou a morte de 75 das
crianças no transcurso do projeto, sendo este fato conhecido como
o “desastre de Lubeck”.
234 UNIUBE

Narcisismo
Durante os anos de 1933 a 1945, com a
Descreve a Segunda Guerra Mundial e o narcisismo, o
característica de
personalidade de mundo sentiu-se carente de uma força que
paixão por si mesmo. fosse capaz de discernir entre o absurdo
A palavra é derivada
da mitologia grega. científico e a ética.

AMPLIANDO O CONHECIMENTO

Após esse período de atrocidades e de globalização dos fatos ocorridos


na guerra, foi formulado o primeiro documento internacional, denominado
Código de Nuremberg (1947).

6.2.1 O Código de Nuremberg

O código de Nuremberg continha recomendações éticas necessárias


para nortear a realização de pesquisas científicas que incluíssem
seres humanos como sujeitos. Esse código preconizava a importân-
cia de avaliar o grupo de estudo, garantindo melhores resultados,
minimizando possíveis riscos e originando benefícios aos sujeitos
amostrais. Sendo assim, foi necessária a elaboração de um termo
de consentimento, assinado pelo sujeito, confirmando a sua ciência
para com a pesquisa e deliberando aos pesquisadores responsabi-
lidades totais sobre o grupo de estudo (DINIZ; GUILHEM; SCHUK-
LENK, 2005).

Os anos seguintes foram marcados por diversos acontecimentos


que estimularam ainda mais a pesquisa médica e científica. Entre
os fatos, ressaltamos o ocorrido no ano de 1953, quando a estrutura
do DNA foi completamente decifrada, modificando assim todas
as perspectivas de pesquisa, de diagnóstico, de tratamentos e de
melhoramentos genéticos.
UNIUBE 235

CURIOSIDADE

Você sabe quando aconteceu o primeiro transplante de rins?

Não menos importante foi o ano de 1954 em que foi registrada


a ocorrência do primeiro transplante de rins, realizado entre dois
irmãos gêmeos univitelinos. A cirurgia foi um sucesso, abrindo assim
precedentes para mais avanços.

Segundo Hottois (2001, p. 124 -126), a palavra bioética significa:

[...] um conjunto de pesquisas, de discursos e


práticas, via de regra pluridisciplinares, que têm
por objeto esclarecer e resolver questões éticas
suscitadas pelos avanços e pela aplicação das
tecnociências biomédicas. [...] A rigor, a bioética
não é nem uma disciplina, nem uma ciência, nem
uma nova ética, pois sua prática e seu discurso se
situam na interseção entre várias tecnociências
(em particular, a medicina e a biologia, com suas
múltiplas especializações); ciências humanas
(sociologia, psicologia, politologia, psicanálise...)
e disciplinas que não são propriamente ciências:
a ética, para começar; o direito e, de maneira
geral, a filosofia e a teologia. [...] A complexidade
da bioética é, de fato, tríplice. Em primeiro lugar,
está na encruzilhada entre um grande número
de disciplinas. Em segundo lugar, o espaço de
encontro, mais ou menos conflitivo, de ideologias,
morais, religiões, filosofias. Por fim, ela é um
lugar de importantes embates (enjeux) para uma
multidão de grupos de interesses e de poderes
constitutivos da sociedade civil: associação de
pacientes; corpo médico; defensores dos animais;
associações paramédicas; grupos ecologistas;
agribusiness; indústrias farmacêuticas e de tecno-
logias médicas; bioindústria em geral.

Ressaltamos, diante disso, que a Bioética é uma ética aplicada,


chamada também de ética prática. Tem como objetivo resolver os
conflitos e controvérsias morais implicados pelas práticas, no âmbito
das Ciências da Vida e da Saúde, do ponto de vista de algum sistema
de valores.
236 UNIUBE

Podemos dizer que a Bioética tem uma tríplice função, reconhecida


acadêmica e socialmente. São elas:

• descritiva, consistente em descrever e analisar os conflitos


em pauta;
• normativa com relação a tais conflitos, no duplo sentido de
proscrever os comportamentos que podem ser considerados
reprováveis e de prescrever aqueles considerados corretos;
• protetora, no sentido, bastante intuitivo, de amparar, na
medida do possível, todos os envolvidos em alguma disputa de
interesses e valores, priorizando, quando isso for necessário,
os mais “fracos” (SCHRAMM, 2002).

Reconhecendo ser necessário e oportuno, a comunidade científica,


chefiada por uma comissão de delegações provenientes de di-
ferentes países, declarou os princípios básicos e universais que
servirão de respaldo para a discussão dos crescentes dilemas e
controvérsias que a ciência e a tecnologia apresentam à sociedade
e ao meio científico.

A Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, compilada


entre o ano de 2005, é destinada então aos Estados, fornecendo
subsídios éticos e legais para auxiliar na escolha de decisões e
planejamento de linhas de pesquisas e atuações. Dessa forma,
promove uma estrutura universal de princípios e procedimentos na
formulação de legislação política e ética, assegurando o respeito
pela vida e mantendo o respeito à dignidade humana sem afetar os
direitos humanos.

A promoção do diálogo interdisciplinar, reconhecendo a importância


da liberdade da pesquisa, bem como a sua aplicabilidade na geração
de benefícios, estando e se mantendo de acordo com os princípios
éticos e legais, são itens dispostos na Declaração.

Levando em consideração o respeito à vida e aos indivíduos, deve-


se respeitar a autonomia das pessoas na tomada de decisões,
protegendo os interesses e os direitos dos cidadãos não capazes de
exercerem sua autonomia, sendo passível, assim, de consentimento
prévio qualquer intervenção médica, tanto referente ao diagnóstico
quanto à terapêutica.
UNIUBE 237

Quando no caso de pesquisa científica, deve haver consentimento


por parte dos indivíduos envolvidos, considerando as leis vigentes,
não podendo trazer malefícios aos envolvidos.

A vulnerabilidade humana deve ser respeitada e a integridade


pessoal deve ser mantida, bem como o direito à privacidade de
confidencialidade.

A proteção do ambiente, da biosfera e da biodiversidade, assim


como a proteção das gerações futuras também estão presentes
no conteúdo da Declaração e são de suma importância para a
manutenção do direito à vida, à equidade e à justiça.

PARADA OBRIGATÓRIA

Acompanhe, a seguir, o que propõe o estudioso de Bioética.


“Eu proponho o termo Bioética como forma de
enfatizar os dois componentes mais importantes
para se atingir uma nova sabedoria, que é tão
desesperadamente necessária: conhecimento
biológico e valores humanos.” (POTTER, 1971,
p.79).

6.2.2 Nascimento da Bioética – passo a passo

O desenvolvimento histórico da bioética pode ser estabelecido com


base em quatro momentos bem determinados. São eles:

• a etapa de fundação: relacionada aos anos 1970, quando os


primeiros autores que sobre ela se debruçaram, estabeleceram
as bases conceituais relacionadas a esta nova “Filosofia”;
• a etapa de expansão e consolidação: relacionada com a
década de 80, quando se expandiu por todos os continentes
por meio de eventos, livros e revistas científicas especializadas,
principalmente a partir do estabelecimento dos princípios
bioéticos básicos;
• a etapa de revisão crítica: compreende o período posterior
aos anos 1990 até o início de 2005, que se caracteriza por dois
movimentos:
238 UNIUBE

- o surgimento de críticas ao “principialismo” com


consequente ampliação do seu campo de atuação,
a partir da constatação da existência de “diferenças”
entre os diversos atores sociais e culturas, espaço
em que movimentos emergentes como o feminismo e
de defesa dos negros e homossexuais, entre outros,
adquiriram grande importância;

- a necessidade de enfrentar de modo ético e concreto


as questões sanitárias mais básicas, como a equidade
no atendimento sanitário e a universalidade do acesso
das pessoas aos benefícios do desenvolvimento
científico e tecnológico.

• a etapa de ampliação conceitual: caracteriza-se após a ho-


mologação, em 10 de outubro de 2005, em Paris, da Declaração
Universal de Bioética e Direitos Humanos da UNESCO, a qual,
além de confirmar o caráter pluralista e multi-intertransdisciplinar
da bioética, amplia definitivamente sua agenda para além da
temática biomédica-biotecnológica, para os campos social e
ambiental (GARRAFA, 2005).

Segundo Berlinguer (1993, p. 79), a bioética atualmente se apresenta


como:

[...] a procura de um comportamento responsável


de parte daquelas pessoas que devem decidir
tipos de tratamento e de pesquisa com relação
à humanidade. [...] Tendo descartado em nome
da objetividade qualquer forma de subjetividade,
sentimentos ou mitos, a racionalidade científica
não pode – sozinha – estabelecer os fundamentos
da bioética. Além da honestidade, do rigor científico
ou da procura da verdade – pré-requisitos de
uma boa formação científica – a reflexão bioética
pressupõe algumas questões humanas que não
estão incluídas nos currículos universitários.

Bioética é, segundo Reich (1995, p. 96), “o estudo sistemático das


dimensões morais – incluindo visão moral, decisões, conduta e
políticas – das ciências da vida e atenção à saúde, utilizando uma
variedade de metodologias éticas em um cenário interdisciplinar”.
UNIUBE 239

A capacidade do ser humano de reflexão, de invenção e de busca


contínua por respostas, com base na liberdade da ciência e na
pesquisa, bem como a diversidade cultural como fonte de inovação
e criatividade, são fatores determinantes para o desenvolvimento
científico e tecnológico. Esses fatores podem trazer benefícios aos
indivíduos como único ou grupo, aumentando, assim, a melhoria
e expectativa da qualidade de vida, promovendo o bem-estar do
indivíduo e a reflexão sobre a dignidade do ser humano e ao direito
universal das habilidades fundamentais.

É sabido, e muito bem definido, que as


questões que envolvem a saúde não são Psicossociais
dependentes única e exclusivamente das
Relativo ao
pesquisas e avanços tecnológicos, pois a desenvolvimento por
base deste pilar se constitui de fatores cul- meio da socialização das
turais e psicossociais. Dessa maneira, crianças e adolescentes
de todas as camadas
to-dos os seres humanos, independente sociais, em que cada
de raça, cultura e etnia, devem se fase é responsável por
um “conflito sociocultural”
beneficiar dos padrões éticos da medicina do indivíduo, exigindo
e pesquisa, desenvolvendo assim novos uma superação dessa
crise para chegar ao
enfoques no âmbito da responsabilidade estágio seguinte.
social, asse-gurando, dessa forma, que
o progresso da ciência contribua para
equidade e justiça.

6.3 Modelos bioéticos diversos

6.3.1 Ética descritiva e modelo sociobiológico

Trata-se de uma ética primariamente descritiva, sendo que neste


modelo a sociedade tem o papel central de alterar e produzir
valores e normas funcionais de desenvolvimento que são coerentes
com a própria evolução. Porém, discernir os valores culturais dos
valores provenientes da mudança na natureza evolutiva do homem
é extremante complicado e nem sempre possível, pois a linha que
separa ambas as situações é tênue, e pode variar de acordo com a
cultura local.

É necessário compreender que a verdade, a justiça e o bem são


valores independentes de cultura ou natureza, que por si só
240 UNIUBE

acompanham o homem em todas as épocas históricas; então,


se partimos deste pressuposto que os valores não mudam, não
podemos considerar correto um modelo ético que varia de acordo
com a evolução, a qual nem sempre está ligada à geração contínua
de valores e bens.

6.3.2 Subjetivista ou liberal-radical

O principal elo deste modelo subjetivista ou liberal-radical parte do


princípio básico de que a moral não pode se basear em fatos, e nem
valores transcendentais, apenas sobre as opções e/ou escolhas
realizadas pelos indivíduos. Neste contexto, a liberdade é o limite,
sendo lícito e aceito tudo o que é livremente querido e que não afete
a liberdade do outro.

É nesse modelo que encontramos os temas responsáveis pelas


mais acaloradas discussões, como a liberação do aborto, sexagem
(escolha do sexo do bebê antes da implantação do embrião na
parede uterina), liberdade de pesquisa e eutanásia.

O grande problema é o estabelecimento das normas sociais e a


de-finição de liberdade, pois quão livre deve ser uma pessoa para
que a mesma possa ser responsável por uma escolha tão complexa
como o aborto? A responsabilidade nascente dentro da liberdade é
suficientemente fugaz ao ponto de permitir aos indivíduos viverem
sob as próprias leis?

6.3.3 Pragmático-utilitarista

Modelo pragmático-utilitarista, baseado principalmente no cálculo


das consequências de uma ação, baseando-se na relação custo/
benefício. Os temas envolvidos são relacionados, por exemplo, às
decisões de um médico para com a escolha de uma terapia eficaz
para cada indivíduo, que se baseia nos benefícios e riscos que um
tratamento pode gerar. Nesse modelo não se pode comparar os
benefícios ao dinheiro ou bens materiais resultantes de uma ação.
Por isso, faz-se necessário moderar o utilitarismo da ação, criando
vertentes e regras de benefício mais amplas, como a equidade,
imparcialidade, cálculo de felicidade social, entre outros.
UNIUBE 241

6.3.4 Modelo personalista

O modelo personalista (Figura 1) é criado para resolver todos,


ou em parte, os problemas encontrados nos outros modelos. A
fundamentação do modelo personalista centra-se na objetividade
dos valores e das normas. Nesse sistema, podemos encontrar três
definições:

• personalismo racional: ressalta-se o valor da subjetividade e


da relação intersubjetiva;

• hermenêutico: relaciona-se com o papel da consciência na


interpretação – a realidade vista por meio da própria percepção;

• ontológico: realidade vista por meio de uma compreensão pré-


-determinada, em que esta vivência nada mais é do que uma
essência constituída na essência da unidade corpo-espírito.

Figura 1: Modelos bioéticos.

Sendo assim, o homem é o único ser capaz de realizar autorreflexão


sobre si e o único portador de uma autoconsciência. A consciência,
a liberdade e a razão são vertentes do homem atual, que busca
entender e relacionar os avanços com os valores já preditos pela
sociedade.
242 UNIUBE

6.4 Bioética como componente curricular

A Bioética, enquanto componente curricular, tem como objetivo


incentivar os profissionais à reflexão. Isso, tanto de maneira a
avaliar a própria vida, tendo como base a família, valores adquiridos,
crenças e religiões, bem como à reflexão da sociedade como um
todo, resultando, assim, num pensamento reflexivo sobre os pilares
que regem a nossa sociedade.

Considerando que a Bioética tem como objetivo a reflexão, o


questionamento, ela traz consigo questões relevantes, como por
exemplo, fazendo com que deixemos de pensar somente em nossos
próprios problemas e passando a agir como um cidadão consciente
quanto aos seus próprios direitos e quanto à realidade mundial.

Sabemos que temas como pena de morte, eutanásia e aborto são


extremamente delicados e pouco discutidos. Isso porque se acredita
que apenas os valores pessoais e morais são suficientes para definir
a opinião e a defesa dos ideais preditos. Porém, para que possamos
realmente refletir sobre tais temas, faz-se necessário desnudar a
alma dos conceitos formais e paradigmas e deixar-se envolver pelos
sentimentos nem sempre tão nobres que norteiam tais questões.

Na realidade, as reflexões desses temas culminam em um resgate


dos valores humanos racionais e éticos, capacitando, assim, os
alunos na percepção dos dilemas e na sua reflexão. Diante disso,
as instituições de ensino, que têm como componente curricular a
Bioética têm como objetivo preparar o aluno para uma vida repleta
de diversidade cultural, social e tecnológica.

IMPORTANTE!

“A bioética é o conjunto de conceitos, argumentos e normas que


valorizam e justificam eticamente os atos humanos que podem ter
efeitos irreversíveis sobre os fenômenos vitais” (KOTTOW, 1995, p. 53).

Abordaremos, a seguir, o código de ética do biólogo. Leia-o, com


muita atenção.
UNIUBE 243

6.4.1 O código de ética do biólogo

O código de ética profissional do biólogo foi aprovado em 12 de junho


de 1991(Resolução CFB nº 08). Nele, estão contemplados todos os
deveres e as diretrizes que os biólogos, em exercício, devem seguir,
sendo obrigatório o registro do profissional no Conselho Regional
de Biologia, da respectiva jurisdição, bem como o cumprimento dos
seus deveres e de suas obrigações.

Dentre os dados que constam no tópico dos princípios fundamentais,


destacam-se os artigos referentes:

• à consagração do respeito à vida, mediante qualquer atividade


praticada pelo biólogo;

• à abordagem de como assegurar o bem comum, baseando-


-se na experiência profissional e conhecimento;

• ao compromisso permanente do biólogo na aplicação e na


transferência de conhecimento sobre as diferentes áreas das
Ciências Biológicas.

Assim como todo e qualquer profissional, o biólogo tem direitos e


deveres.

• Quanto aos direitos


Consta que o profissional tem o direito de exercer sua profissão
sem sofrer restrição e/ou discriminação, além de estar ciente
de que deve trabalhar sob condições mínimas para o exercício
profissional.

• Quanto aos deveres


Podemos ressaltar o compromisso em manter-se em aprimo-
ramento constante, assegurando a qualidade de seu trabalho
e melhorando a eficácia de execução. Dedicar-se à profissão e
saber responsabilizar-se apenas pelo que é capaz de exercer
e desenvolver. Contribuir para a disseminação da informação
e a consequente melhora da qualidade de ensino e estudo das
Ciências Biológicas.
244 UNIUBE

EXPLICANDO MELHOR

Defender a dignidade do profissional Biólogo é estar sempre cumprindo


o código de ética profissional.

Você como um futuro profissional, deve ler e compreender o código


de ética do biólogo, comprometendo-se em trabalhar de acordo com
as normas criadas para garantir o bem-estar e assegurar os deveres
e obrigação do profissional.

PESQUISANDO

A íntegra do Código pode ser acessada no site:


<http://cfbio.gov.br/conteudo.php?pagina=Codigo_de_etica>.
Não deixe de conferir!
Aproveite para fazer uma breve reflexão do que você pode perceber
com relação à postura desse profissional no mercado de trabalho.

6.5 Temas relevantes em Bioética

6.5.1 Eutanásia

O termo eutanásia é constantemente utilizado para designar uma


morte suave, com a ausência de um sofrimento aparente, e digna.
Porém, a interpretação de dignidade está intimamente relaciona-
da com as crenças, os valores e a religião, de maneira que, para
evitar problemas éticos e religiosos, a expressão “morte digna” es-tá
aparentemente em desuso.

A ausência de sofrimento é causada pela antecipação voluntária


da morte de uma pessoa, que aos olhos de outros, ou a si própria,
se convencem de que o sofrimento é demais, e que a morte é a
saída mais serena e menos dolorida. Essa antecipação geralmente
é provocada com a ajuda de voluntários da família ou não, que se
submetem a ajudar o indivíduo em questão, concordando, assim,
com a morte antecipada, e com data marcada. A morte geralmente é
ocasionada por compaixão ou puro desespero.
UNIUBE 245

Diante disso, considere a seguinte questão:

Convém ou é permitido deixar morrer um recém-nascido com


malformações genéticas e/ou congênitas, cuja perspectiva de
vida não ultrapassa alguns dias?

A igreja católica e outras religiões opõem-se de maneira categórica,


baseando-se no chamado “duplo efeito” (quer-se um efeito bom,
mas uma decorrência má, não desejada, é previsível e inevitável).

Esse assunto é precariamente discutido e raramente pautado, pois é


quase impossível definir quando uma pessoa deve ou não escolher
pela própria morte, sem levarmos em consideração todas as nossas
crenças, princípios e doutrinas.

A prática da eutanásia não deve ser confundida com homicídio, já


que a morte é uma opção do indivíduo que não suporta mais conviver
com sua própria realidade, e que, mesmo ciente de sua decisão, não
pode, por motivos físicos, favorecer a própria morte.

Compreende-se, atualmente, a eutanásia como o emprego ou


abstenção de procedimentos que permitem apressar ou provocar
o óbito de um doente incurável, a fim de livrá-lo dos extremos
sofrimentos que o assaltam ou em razão de outro motivo de ordem
ética.

A afirmação teórica de que, “em nossos dias de farmacopeia


avançada, toda dor encontra seu antálgico eficaz” não corresponde,
ainda, a uma prática generalizada. Na eutanásia, a morte deve
constituir a finalidade primária e não secundária da intervenção.

A menção de "outro motivo" eventual visa notadamente o óbito de um


doente comatoso, para evitar o sofrimento. Não parece necessário
comentar as qualificações de que é suscetível uma eutanásia
(direta ou indireta, positiva ou negativa, por exemplo), ainda que, na
prática, possa haver hesitação em definir a atuação como eutanásia
(questão a resolver, caso a caso). Realçamos apenas que o caráter
voluntário é obrigatório no agente da eutanásia, e exigido, pelo
menos de maneira implícita, por parte da pessoa que morre, numa
discussão civilizada sobre qualquer eventual descriminalização do
procedimento.
246 UNIUBE

No Brasil, a eutanásia é considerada como um homicídio, porém


tramita no Senado Federal um projeto de lei 125/96, elaborado
desde 1995, que visa estabelecer critérios para a legalização da
chamada “morte sem dor”. Esse projeto prevê a possibilidade de que
pessoas, com um sofrimento físico inviável, possa pedir que sejam
realizados procedimentos que objetivam a própria morte, que deve
ocorrer somente após a autorização de uma junta médica composta
por, pelo menos, cinco membros. Caso o paciente, em questão, não
tenha consciência suficiente para solicitar esta boa morte, a mesma
deve ocorrer a pedido de familiares.

Tramita, também, no Senado, o Anteprojeto de Lei que altera


os dispositivos do Código Penal e oferece outras providências,
legislando sobre a questão da eutanásia em dois itens do artigo 121.

IMPORTANTE!

Homicídio
Art. 121 do Código Penal. Matar alguém:
Pena - Reclusão, de seis a vinte anos.

Eutanásia
Parágrafo 3° do Art. 121 do Código Penal. Matar alguém. Se o autor
do crime agiu por compaixão, a pedido da vítima, imutável e maior,
para abreviar-lhe o sofrimento físico insuportável, em razão de doença
grave:
Pena - Reclusão, de três a seis anos.
Exclusão de Ilicitude
Parágrafo 4° do Art. 121 do Código Penal. Não constitui crime deixar
de manter a vida de alguém por meio artificial, se previamente atestada
por dois médicos, a morte como iminente e inevitável, e desde que haja
consentimento do paciente, ou na sua impossibilidade, de ascendente,
descendente, cônjuge, companheiro ou irmão.

Observa-se que, em ambos os projetos, a falha da compilação das


regras abre margem para inúmeras interpretações, o que vem gerar
novas discussões, impedindo, assim, uma possível aprovação de
tais projetos.
UNIUBE 247

6.5.2 Aborto

Talvez o aborto seja o tema mais discutido e mais controverso


encontrado pela Bioética, desde a antiguidade. Podemos estudar o
aborto de diferentes ângulos, cada qual com sua característica típica
e eventualidade.

Analisando o ponto de vista histórico, dados sugerem que a


interrupção de vida fetal ocorre desde a Antiguidade e Idade Média,
época em que tais fatos foram analisados e julgados, de acordo com
as leis vigentes e com a moral aplicada.

Se pensarmos pelo ponto de vista sociológico, o tema aborda,


no momento atual, a incidência do fenômeno e as condições
econômicas e sociais que o favorecem ou não. Em um aspecto
cultural, a ideia relacionada ao aborto aponta para a necessidade
clara de regulamentar leis que o proíbam ou legalizem o fato, de
maneira que a legalização desta ação pode ser vista como sendo
uma morte cultural, ou, também, uma escolha de civilidade.

No Brasil, atualmente, o aborto é considerado


Anencéfalos
ilegal, exceto nas situações de estupro ou risco
de vida materno, ou, também, constatação de Bebês ou crianças
desprovidas de
bebês anencéfalos. A lei brasileira ainda não massa cefálica
possui subsídios e respaldo suficientes para (cérebro).
concessão de alvarás, sendo que, quando este
ocorre, deve-se constatar a presen-ça de malformações genéticas
por uma junta médica. Porém, a decisão baseia-se nos valores
morais e sociais dos que os julgam, já que não existe um amparo
legal para tais decisões.

O tema está envolto em discussões e debates, pois se trata de uma


interrupção da vida, porém, antes de tudo, devemos compreender e
analisar o que é a vida.

PARADA PARA REFLEXÃO

Quando começa a vida?


A fusão do espermatozoide com o ovócito indica uma nova vida?
A formação do sistema nervoso central é o ponto inicial?
248 UNIUBE

6.5.3 Pena de morte

O crescimento desenfreado da violência, o consentimento dos


órgãos que deveriam nos proteger e o sensacionalismo gerado pela
imprensa nos foca cada vez mais no tema que norteia a pena de
morte.

PARADA PARA REFLEXÃO

Até onde uma pessoa, capaz de cometer os crimes mais mórbidos e


atrozes, pode ser capaz de se regenerar, ou, então, pagar em vida
pelo crime que cometeu?
Com quem devemos argumentar? Com a família cujo membro foi
brutalmente aniquilado? Ou com a família do agressor? Ou, ainda,
com religiosos? Com ateus?

O tema aborda noções de cultura e/ou educação. Dessa maneira,


torna-se um “prato cheio” para discussões e sem nenhuma resposta
digna de nota.

As discussões frente a esse tema surgem desde assuntos


relacionados à Bíblia e também a “novas” teorias de relacionamentos,
baseados em estudos psicológicos ou psicanalíticos.

Para um adequado discernimento ético da questão da pena de


morte, é importante considerar os seguintes aspectos, de ordem
mais prática, que têm sido motivo de discussão, quando abordamos
o assunto.

Veja, com atenção, as situações a seguir, segundo Rocha (2007):

1. A condenação de pessoas inocentes não está


descartada, uma vez que existem riscos de
erros judiciais irreparáveis. Muitos julgamentos,
em diferentes países, não obedecem às normas
internacionais que prevê determinadas garantias.
Em alguns estados dos Estados Unidos, sabe-
se que pelo menos 350 pessoas que foram
condenadas à pena de morte, entre 1900 e 1985,
não eram culpados, ou seja, eram inocentes.
Muitas delas conseguiram evitar a morte, mas o
UNIUBE 249

trauma permanecerá por toda a vida. O “corredor


da morte”, ou seja, o tempo de espera para
execução, compreendido entre a determinação
da pena e o dia marcado para morrer, provoca
nos sujeitos danos psicológicos irremediáveis.

2. Atualmente, existe uma forte tendência ao


refutamento da prática de pena de morte como
forma alternativa de controle da violência. Tem-
se percebido que a criminalidade não se reduziu
mediante essa tomada de decisão. Algumas
pesquisas apontam que cerca de 1% dos policiais
americanos apoiava a pena de morte como forma
de controle dessas ações criminais. De fato,
há outras maneiras para esse controle, como a
oferta de mais empregos, melhoria da situação
econômica, e, consequentemente, social dessas
pessoas, com intensivo combate ao uso de
entorpecentes e diferentes tipos de drogas.

3. A pena de morte já foi fortemente defendida


levando-se em consideração o alto custo financeiro
para a manutenção de um detento no sistema
prisional. Mas, essa fundamentação é descabida,
uma vez que a vida não se sustenta apenas por
motivos e padrões econômicos. Sob o ponto de
vista ético, esse argumento é equivocado.

4. Os mais pobres são, na maioria dos casos, os


mais atingidos pela aplicação da pena de morte,
uma vez que não existem defensorias suficientes
para atender a essa demanda que aumenta a cada
dia nas penitenciárias. A sociedade infelizmente
é excludente e preconceituosa, e a pena de
morte intensifica essa exclusão e, também, a
discriminação.

Faz-se necessário, portanto, repensar as práticas vigentes, na


expectativa de propor uma nova cultura e um novo olhar para esses
casos em que a pena de morte é aplicada. É preciso priorizar atitudes e
valores que buscam a promoção e a defesa da vida, com o objetivo de
impedir a coerção e a aplicação de mecanismos que deixam ainda mais
evidentes, a violência e a morte. E mais, a justiça deve ser entendida
250 UNIUBE

e realizada, para que haja a superação dos problemas sociais que


têm levado centenas de pessoas à morte, não pela criminalidade,
pela aplicação da pena, mas pela miséria, pela fome, desemprego,
má qualidade em educação e saúde, enfim, má qualidade de vida.

6.5.4 Células-tronco

Quanto às células-tronco embrionárias, a nova lei (Lei nº 11.105)


passou a permitir a sua utilização quando:

[...] obtidas de embriões humanos produzidos por


fertilização in vitro e não utilizados no respectivo
procedimento, atendidas as seguintes condições:
(a) – sejam embriões inviáveis, ou (b) - sejam
embriões congelados na data de publicação desta
Lei, depois de completarem três anos, contados a
partir da data do congelamento (Lei n° 11.105, de
24.03.05, art. 5º, incs. I e II).

Além disso, é importante recordar o reconhecimento disso também


no campo do direito. A Constituição Brasileira (art. 5º) dispõe que
o direito à vida é inviolável para todos os seres. O artigo 4º da
Convenção Americana sobre os Direitos Humanos (Pacto de S. José
da Costa Rica), ratificada pelo Brasil, em 1992, estabelece que o
direito à vida começa na concepção.

O Novo Código Civil (em vigor desde jan. 2003), no art. 2º, diz: “a
personalidade civil do homem começa do nascimento com vida; mas
a lei põe a salvo desde a concepção os direitos do nascituro”.

SAIBA MAIS

Para saber sobre as pesquisas que discutem a questão ética quanto


ao uso de células-tronco, acesse: <http://queenofpeacemission.org/
portugues/bioetica.html>.

A questão não pode ser vista de modo isolado, mas como parte de
um contexto maior, em que estão em jogo outras questões referentes
à vida. A ideia de que o ser humano não é inviolável, podendo ser
usado (comprado, vendido, fabricado, destruído) tem se alargado.
UNIUBE 251

6.5.5 Reprodução humana assistida

Ao falar de fecundação artificial ou de bebê de proveta, estamos


tratando de um assunto ainda recente. O primeiro nascimento a partir
do método da fecundação artificial ocorreu na Inglaterra, em 1978
(Louise Brown); e, no Brasil, em 1984. Esta forma de reprodução
humana medicamente assistida foi, aos poucos, se espalhando,
chegando até nosso meio.

Normalmente, os casais que estão tentando conceber um filho há


mais de um ano, sem a utilização de métodos contraceptivos e sem
alcançar o seu desejo, devem procurar uma clínica especializada em
reprodução humana.

IMPORTANTE!

Como está o nosso país em relação a isso?

O Brasil conta com uma estrutura de primeira linha, com especialistas


competentes e técnicas avançadas. Apesar do custo e das dificuldades
que a envolvem, a fecundação artificial, pela sua eficácia, foi se
tornando acessível a muitos casais com problemas de geração de
uma nova vida pelo processo natural.

Mas, esse procedimento científico, por mais atraente que seja, fez
surgir várias questões que ainda estão sendo estudadas, a fim de
se chegar a um discernimento ético-teológico cada vez mais claro e
aprofundado. A problemática não se restringe, porém, ao âmbito da
teologia moral. Há questões de natureza filosófica a serem refletidas,
e de natureza jurídica a serem definidas e regulamentadas. As
técnicas, até agora praticadas, trazem dificuldades admitidas dos
próprios envolvidos, pois os sentimentos, bem como questões fi-
nanceiras e emocionais estão, intimamente, relacionadas a todo o
processo de fertilização.

Entretanto, a questão que torna esse tipo de intervenção, cada vez


mais discutida, baseia-se no fato de que o início da vida é diferente
para cada um que interpreta o tema. Isso porque se trata de um
assunto relacionado diretamente a valores morais, religiosos e
filosóficos (pessoais).
252 UNIUBE

PARADA PARA REFLEXÃO

Nas clínicas de reprodução, os embriões são congelados. Alguns são


implantados no útero da mãe e os demais ficam guardados por tempo
indeterminado.
Nestes casos, é que surge a nova questão bioética. Veja, a seguir, as
dúvidas.
O que fazer com tais embriões? Devem ser descartados? Mas, são
vida? Podem ser utilizados em pesquisas científicas? E se outro casal
tiver interesse?

Após dois anos tramitando em Congresso, uma lei que permite o


uso desses embriões para estudo foi aprovada, porém, as questões
envolvidas ainda não foram dizimadas. O que se sabe, porém, é que
o potencial de pesquisas a ser realizadas e a possibilidade de cura
ou terapia para doenças degenerativas é muito promissor.

6.5.6 Intervenções terapêuticas na gestação

É muito importante estabelecer um discernimento ético quanto


às intervenções terapêuticas no período gestacional. Nesta área,
existem alguns pontos importantes a serem discutidos, dentre os
quais o que cita a atenção e cuidado com os valores do ser humano e
seus direitos, visto que este tipo de intervenção agride não somente
órgãos, tecidos e funções do corpo, mas também a pessoa como um
todo, em seus pensamentos e suas emoções.

Outro ponto de relevância sugere que o propósito de uma intervenção


seja estritamente terapêutico, com o objetivo de cura, visto que as
intervenções no embrião humano não devem proporcionar riscos à
sua integridade, orientando para melhor qualidade em sua saúde,
ou até mesmo para sua sobrevivência individual. De alguma forma,
qualquer que seja a terapia a ser realizada, esta deve ser informada
e plenamente consentida pelos pais.

Existem tentativas de intervenção genética ou cromossômica que


não possuem finalidade terapêutica e, sim, produção de seres
humanos com características selecionadas, tais como sexo ou
outras qualidades previamente estabelecidas.
UNIUBE 253

IMPORTANTE!

Este tipo de experimentação envolvendo embriões e fetos humanos


que não possuem finalidade única e estritamente terapêutica é
considerado ilícito e os pais não podem compactuar com tal intenção!

6.5.7 Clonagem

Trata-se de uma técnica na qual se produz cópias de genes ou células


de um organismo, sendo um processo de reprodução assexuada.
Por se tratar de um fenômeno recente, a clonagem ainda gera várias
discussões e argumentos em meio ao mundo moderno, sendo que
a questão ética torna-se cada vez mais complexa e passível de
condenações, até mesmo entre os cientistas.

Isso se dá devido a várias questões. Dentre elas, destacamos os


riscos para o próprio ser humano, já que as consequências na
manipulação da vida não estão previstas, o que se leva, mais uma
vez, à questão de respeito e de atenção aos direitos humanos e
às leis da natureza: a questão da perda da variedade obtida numa
reprodução sexual, levando à uniformidade gerada pela clonagem.

IMPORTANTE!

Assim, frente a estes e tanto outros pontos, a Donum vitae condena


toda e qualquer tentativa ou intenção de se obter um ser humano por
meio de clonagem, ou qualquer outro método que não tenha ligação
com o processo de reprodução sexual, visto que tais procedimentos se
opõem à dignidade de procriação humana e o direito do ser humano
sobre ela.

6.5.8 Doação e transplante de órgãos

Você é doador de órgãos? Sabe como essa questão é tratada


em nosso país?

A cada dia, a questão da doação e transplante de órgãos tem se


tornado mais importante e também mais delicada, já que nosso país
apresenta uma realidade precária, devido à falta de doadores
254 UNIUBE

e/ou métodos de viabilização dos procedimentos de transplantes e


doações, o que acarreta longas filas de espera.

A discussão deste tema envolve aspectos éticos, médicos, sociais,


legais, religiosos e culturais, que avaliam de forma diferente cada
questão.

EXEMPLIFICANDO!

Por exemplo, o caso de autotransplante, aquele que ocorre dentro de


um mesmo organismo, seja por transferência de tecidos, órgãos do
corpo da mesma pessoa, é encarado de forma mais simples em termos
éticos, que avalia somente a necessidade real de tal procedimento e os
riscos e benefícios envolvidos.

Já os transplantes entre pessoas vivas levam a uma maior discussão


e avaliação médica e ética, visto que podem apresentar níveis maiores
de risco e consequências para a saúde do doador e sua integridade
física e psicológica. É permitida a doação de tecidos, órgãos ou partes
do corpo, desde que sua retirada não apresente prejuízos ao doador e,
inversamente, seja de extrema necessidade ao receptor.

Para suprir a grande demanda existente, o principal meio utilizado


é o transplante realizado a partir de um cadáver, principalmente
quando ele apresentou morte encefálica. Nesta situação, o coração
continua batendo, o que garante irrigação venosa a outros órgãos,
propiciando um aproveitamento dos mesmos, o que não aconteceria
caso houvesse parada total do organismo.

Para isso, já existem várias técnicas médicas precisas que detectam


esta condição, e, para diagnóstico da mesma, é preciso seguir
uma série de recomendações propostas pelo Conselho Federal de
Medicina, como exames complementares com intervalos de tempos,
para que não haja equívocos.

A fim de preservar o respeito ao cadáver, e também aos familiares,


foram discutidas leis e medidas provisórias que afirmam que os
transplantes, ou a retirada de tecidos, ou órgãos do corpo, para
finalidade terapêutica, só ocorrerão mediante a autorização de
familiares próximos, firmado em documento e com presença de tes-
temunhas.
UNIUBE 255

Ainda assim, permanecem as dificuldades de falta de estrutura


hospitalar para o procedimento de doação e recepção dos órgãos, a
pouca ou nenhuma informação da maioria da população em respeito
à morte encefálica, levando à resistência em permitir o transplante, e
até mesmo o receio ao comércio de órgãos.

SAIBA MAIS

Sobre a questão de transplantes, a Igreja se posiciona arguindo que


o transplante se torna imoral e inadmissível quando oferece perigos e
riscos físicos ao doador, levando-o à invalidez ou à morte. De forma
contrária, o transplante de órgãos é, conforme a moral, aceitável
quando não oferece grandes riscos ao doador e que ofereça o bem a
quem recebe.

Assim, a doação de órgãos trata-se, de fato, de um exercício de


solidariedade e atenção tão essenciais em dias atuais. Vale a pena
continuar com constantes esforços e tentativas de conscientização
e alerta para as pessoas, a fim de que a doação de órgãos se torne
um ato constante, fruto de consciência e ação solidária com o intuito
de ajudar e salvar vidas.

Para um maior discernimento a respeito de diversificadas situações


especificamente, outras questões de Bioética poderiam ser listadas,
aprofundando o conhecimento sobre este assunto. Porém, não basta
somente listar e discutir questões bioéticas, ou procurar conhecê-las
e compreendê-las. É preciso compactuar-se com elas, comprometer-
se na busca e cumprimento de suas proposições.

É preciso promover a dignidade humana, lutar por ela, e, para isso,


buscar alternativas e iniciativas concretas, que possam, em meio a
tantas contrariedades, elevar os propósitos de amor e defesa da vida.
256 UNIUBE

Resumo

Você pôde perceber, por meio da leitura desse capítulo, que a Bioética
aqui estudada está diretamente ligada à ética da vida, considerada
particularmente ao nível do humano.

Durante décadas, as preocupações bioéticas foram se acirrando,


ganhando novos contornos, se complexificando, mas a bioética, en-
quanto ramo do conhecimento humano manteve algumas caracte-
rísticas que possibilita distingui-la de outros ramos do conhecimento.

A bioética, nesse sentido, apoia-se mais na razão e no bom juízo


moral de seus investigadores do que em alguma corrente filosófica
ou autoridade religiosa. Sua base é a antropologia, ou seja, a ciência
que estuda o comportamento humano, em sua totalidade e em sua
infinidade de realização como pessoa e, por isso, intimamente asso-
ciada ao que entendemos por eticidade, ética, moral, valores e direito.

Atividades

Atividade 1

Após compreender a interdisciplinaridade existente no estudo da


Bioética, escreva, com suas próprias palavras, o que é Bioética e
qual a sua importância.

Atividade 2

A reprodução assistida, muito difundida no Brasil, ainda esbarra em


questões éticas, religiosas e filosóficas. Relacione algumas dessas
questões e explique-as.

Atividade 3

A eutanásia, como você pôde perceber lendo o capítulo Ética e


bioética: uma questão de conduta e responsabilidade, é alvo de
muitos estudos, sendo de responsabilidade médica e familiar a vida
de um paciente em estado vegetativo, ou seja, inapto para tomada
de decisões próprias.
UNIUBE 257

Para socializar essas informações, você deverá acessar o link:


<http://www.jesussite.com.br/download/EUTANASIA_Julio_Severo.
pdf>.

Nesse endereço, você encontrará a obra: Eutanásia: matando os


doentes, os deficientes e os idosos em nome da compaixão, do autor
Júlio Severo.

Em seguida, você deverá fazer uma leitura e posteriormente


um resumo sobre o que você leu, compartilhando-o, em um dos
momentos de encontro presencial, com seus colegas de turma e
também com seu professor tutor.

Alguns passos devem ser observados para que o resultado final seja
satisfatório. Para sabê-los, acesse o site Rio Vestibular, no endereço,
a seguir:
<http://www.riovestibular.com.br/novosite/dicas_ler.php?id=596>.

Atividade 4

Após sua leitura sobre o tema células-tronco embrionárias, em


relação ao seu uso pela biotecnologia moderna, apresente uma
argumentação, em, no máximo, 5 linhas, sobre o que você pensa a
esse respeito.

Atividade 5

O aborto é, talvez, a problemática mais contraditória que envolve


a questão da intervenção durante o período gestacional. Você é a
favor ou contra? Apresente as reflexões que devem ser realizadas,
de maneira a se posicionar favorável ou não a essa prática,
considerando os princípios da bioética.
258 UNIUBE

Referências

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administration. New York: International Universities, 1984.

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BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei do Senado nº.125, de 1996.

BRASIL. Lei nº 11.105 de 24 de março de 2005. Regulamenta os incisos


II, IV e V do § 1o do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas
de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam
organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, cria o
Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão
Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política
Nacional de Biossegurança – PNB, revoga a Lei no 8.974, de 5 de janeiro
de 1995, e a Medida Provisória no 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os
arts. 5o, 6o, 7o, 8o, 9o, 10 e 16 da Lei no 10.814, de 15 de dezembro de 2003,
e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 28 mar. 2005.

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