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Epidemiologia e

Saúde Pública
Autores: Profa. Anna Carolina Fontes Teles
Prof. Alexandre Luiz Affonso Fonseca
Colaboradoras: Profa. Vanessa Santhiago
Profa. Laura Cristina da Cruz Dominciano
Professores conteudistas: Anna Carolina Fontes Teles /
Alexandre Luiz Affonso Fonseca

Anna Carolina Fontes Teles

Professora adjunta do curso de Biomedicina, Farmácia, Ciências Biológicas, Enfermagem e Nutrição da Universidade Paulista
– UNIP. Biomédica graduada pela Universidade de Mogi das Cruzes – UMC e mestre em Clínica Médica pela Escola de Medicina da
Universidade Lusíadas – Unilus.

Especialista em Hematologia Laboratorial pelo Instituto de Educação e Pesquisa em Saúde de São Paulo – Ipessp.

Atualmente, é supervisora de estágio no Laboratório Escola do curso de Biomedicina da UNIP, em Santos-SP.

Alexandre Luiz Affonso Fonseca

Graduado como cirurgião‑dentista pela Universidade Paulista – UNIP (2000) e especialista em Odontologia para Pacientes
com Necessidades Especiais pela Unesp (2005), especialista em Saúde da Família pela Unifesp (2012) e em Gestão em Saúde
Pública pela ENSP‑Fiocruz (2011).

Mestre em Ciências, com área de concentração em Infectologia e Saúde Pública pelo Hospital Emílio Ribas (2008) e Doutorando
em Ciências pela Faculdade de Medicina do ABC (FMABC).

Possui experiência em atividades assistenciais no SUS desde 2002, no município de Itaquaquecetuba (região metropolitana de
São Paulo). No mesmo local foi gestor em Saúde, atuando como coordenador de Odontologia e coordenador da Atenção Básica/
Estratégias em Saúde da Família (2011‑2013).

Desenvolve atividades docentes na UNIP desde 2008, sendo professor do Instituto de Ciências da Saúde das disciplinas de
Epidemiologia e Saúde Pública, Bioética e Fisiologia Geral e Aplicada.

Atua no EaD na UNIP nos cursos de Ciências Biológicas (Licenciatura) e de Gestão Hospitalar.

Além disso, é tutor/orientador do curso de Especialização em Saúde da Família (EaD) da Universidade Aberta do SUS (UNA‑SUS),
e esse curso é ofertado pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) desde 2012.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

T269e Teles, Anna Carolina Fontes.

Epidemiologia e Saúde Pública / Anna Carolina Fontes Teles,


Alexandre Luiz Affonso Fonseca. 2. ed. São Paulo: Editora Sol, 2020.

200 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e


Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230.

1. Epidemiologia. 2. Prevenção. 3. Vigilância. I. Fonseca, Alexandre


Luiz Affonso. II. Título.

CDU 616-036.22

U504.28 – 20

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
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Vice-Reitora de Graduação

Unip Interativa – EaD

Profa. Elisabete Brihy


Prof. Marcelo Souza
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático – EaD

Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Aline Ricciardi
Virgínia Bilatto
Sumário
Epidemiologia e Saúde Pública

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................9
INTRODUÇÃO......................................................................................................................................................... 10

Unidade I
1 CONCEITOS DE EPIDEMIOLOGIA E BASES HISTÓRICAS.....................................................................11
1.1 História...................................................................................................................................................... 11
1.2 Evolução da Epidemiologia até o século XIX............................................................................. 12
1.2.1 Hipócrates................................................................................................................................................... 12
1.2.2 Miasmas....................................................................................................................................................... 13
1.2.3 John Graunt............................................................................................................................................... 14
1.3 O século XIX............................................................................................................................................. 14
1.3.1 Pierre Louis................................................................................................................................................. 15
1.3.2 Louis Villermé............................................................................................................................................ 15
1.3.3 William Farr................................................................................................................................................ 15
1.3.4 John Snow.................................................................................................................................................. 16
1.3.5 Louis Pasteur.............................................................................................................................................. 16
1.4 A primeira metade do século XX..................................................................................................... 17
1.4.1 Influência da microbiologia................................................................................................................. 17
1.4.2 Oswaldo Cruz e a Escola de Manguinhos...................................................................................... 18
1.4.3 Desdobramento da Teoria dos Germes........................................................................................... 18
1.4.4 Saneamento ambiental, vetores e reservatórios de agentes................................................. 19
1.4.5 Ecologia....................................................................................................................................................... 19
1.4.6 Base de dados para a moderna Epidemiologia............................................................................ 19
1.5 A segunda metade do século XX..................................................................................................... 20
1.5.1 A ênfase das pesquisas.......................................................................................................................... 20
1.5.2 Situação atual........................................................................................................................................... 21
1.5.3 Duas tendências da Epidemiologia atual....................................................................................... 22
1.5.4 História natural da doença.................................................................................................................. 23
1.5.5 Fatores determinantes da doença.................................................................................................... 24
1.5.6 Prevenção.................................................................................................................................................... 24
1.5.7 O modelo da história natural da doença ...................................................................................... 26
1.5.8 Variações na ocorrência de doenças no espaço e no tempo................................................. 27
2 MEDIDAS DE FREQUÊNCIA DE DOENÇA................................................................................................. 35
2.1 Prevalência e incidência..................................................................................................................... 36
2.2 Medindo prevalência e incidência.................................................................................................. 37
2.2.1 Estudos de prevalência.......................................................................................................................... 37
2.2.2 Estudos de incidência............................................................................................................................ 37
2.3 Interpretando as medidas de frequência clínica...................................................................... 38
2.3.1 Definindo o numerador......................................................................................................................... 38
2.3.2 Definindo o denominador.................................................................................................................... 39
2.3.3 Amostragem............................................................................................................................................... 40
2.4 Relação entre incidência, prevalência e duração da doença............................................... 41
2.5 Viés em estudos de prevalência...................................................................................................... 42
2.5.1 Incertezas sobre sequências temporais.......................................................................................... 42
2.5.2 Vieses estudando casos “velhos”....................................................................................................... 42
2.5.3 Usos de incidência e prevalência....................................................................................................... 43
2.6 Sistemas de informação em saúde................................................................................................ 43
2.6.1 Sistemas de gerenciamento de bancos de dados (SGBD)....................................................... 43
2.6.2 Sistemas de informação em saúde no Brasil................................................................................ 44
2.6.3 Classificação internacional de doenças.......................................................................................... 51
2.6.4 Epidemiologia hospitalar...................................................................................................................... 52
2.7 Indicadores de saúde........................................................................................................................... 54
2.7.1 Expressão dos resultados...................................................................................................................... 56
2.7.2 Principais indicadores de saúde......................................................................................................... 58
2.7.3 Indicadores demográficos.................................................................................................................... 64
3 EPIDEMIOLOGIA E PREVENÇÃO.................................................................................................................. 69
3.1 Diagnóstico.............................................................................................................................................. 69
3.1.1 Acurácia do resultado do teste.......................................................................................................... 69
3.1.2 Sensibilidade e especificidade............................................................................................................ 71
3.1.3 Valor preditivo........................................................................................................................................... 73
3.1.4 Estimando a prevalência....................................................................................................................... 75
3.1.5 Processos endêmicos.............................................................................................................................. 75
3.2 Epidemiologia geral das doenças transmissíveis...................................................................... 79
3.2.1 Características de agentes infecciosos nas suas relações com o hospedeiro................. 80
3.2.2 Fontes de infecção (ou de infestação)............................................................................................ 81
3.2.3 Vias de eliminação................................................................................................................................... 82
3.2.4 Vias de transmissão................................................................................................................................. 84
3.2.5 Portas de entrada..................................................................................................................................... 86
3.3 Prevenção................................................................................................................................................. 87
3.3.1 Níveis de prevenção................................................................................................................................ 87
3.3.2 Prevenção primária................................................................................................................................. 88
3.3.3 Prevenção secundária............................................................................................................................ 88
3.3.4 Prevenção terciária................................................................................................................................. 89
3.3.5 Abordagem do exame periódico de saúde.................................................................................... 89
4 VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA.................................................................................................................... 91
4.1 Obtenção de dados............................................................................................................................... 92
4.2 Tipos de dados........................................................................................................................................ 92
4.2.1 Demográficos............................................................................................................................................ 92
4.2.2 Morbidade................................................................................................................................................... 92
4.2.3 Mortalidades.............................................................................................................................................. 93
4.2.4 Áreas e situações de risco.................................................................................................................... 93
4.3 Fontes de dados..................................................................................................................................... 93
4.3.1 Demográficos............................................................................................................................................ 93
4.3.2 Morbidade................................................................................................................................................... 96
4.3.3 Mortalidade................................................................................................................................................ 97
4.3.4 Áreas e situação de risco...................................................................................................................... 97
4.3.5 Laboratórios, farmácias e indústrias de medicamentos........................................................... 98
4.3.6 Imprensa e comunidade....................................................................................................................... 98
4.4 Fluxo de informação............................................................................................................................ 98
4.5 Avaliação da vigilância epidemiológica.....................................................................................103
4.6 Métodos empregados em Epidemiologia..................................................................................103
4.6.1 Estudo de casos......................................................................................................................................104
4.6.2 Limitações do estudo de casos.........................................................................................................105
4.7 Investigação experimental de laboratório................................................................................105
4.8 Pesquisa populacional.......................................................................................................................106
4.9 Critérios para a classificação de métodos empregados em Epidemiologia.................107
4.9.1 Estudos descritivos................................................................................................................................107
4.9.2 Estudos analíticos..................................................................................................................................108
4.9.3 Estudo experimental, do tipo ensaio clínico randomizado..................................................108
4.9.4 Estudos de coorte..................................................................................................................................109
4.9.5 Estudos de caso-controle................................................................................................................... 112
4.9.6 Estudos transversais.............................................................................................................................. 115
4.9.7 Estudos ecológicos................................................................................................................................116

Unidade II
5 HISTÓRICO DAS CONFERÊNCIAS E DECLARAÇÕES EM POLÍTICAS DE SAÚDE......................124
5.1 Conferências e declarações internacionais...............................................................................124
5.1.1 Histórico das conferências................................................................................................................ 124
5.1.2 Declaração de Alma‑Ata.................................................................................................................... 127
5.1.3 I Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde....................................................... 128
5.1.4 Carta de Ottawa.................................................................................................................................... 129
6 HISTÓRICO DAS CONFERÊNCIAS NO BRASIL......................................................................................135
6.1 O desenvolvimento das políticas públicas de saúde no Brasil..........................................136
6.2 Síntese histórica da saúde no Brasil: descoberta, período republicano até 1963....137
6.2.1 De 1500 até o Primeiro Reinado.................................................................................................... 137
6.2.2 Início da República (1889) até 1930............................................................................................. 138
6.2.3 O nascimento da Previdência Social (de 1930 a 1960)......................................................... 140
6.3 O regime militar e as consequências para a saúde pública do Brasil............................143
7 CONSTRUÇÃO DO SUS, SEUS PRINCÍPIOS DOUTRINÁRIOS E ORGANIZACIONAIS..............146
7.1 Legislação e o SUS..............................................................................................................................150
7.1.1 Como se deu a regulamentação e normatização do SUS?...................................................151
7.1.2 Ações a serem desenvolvidas pelo SUS....................................................................................... 154
7.1.3 Papel dos gestores no SUS................................................................................................................ 158
7.1.4 Assistência em saúde no Brasil após a implantação do SUS?............................................ 158
7.2 PSF e Pacs...............................................................................................................................................160
8 TRANSIÇÃO DO PSF PARA O PROGRAMA ESTRATÉGIA EM SAÚDE DA FAMÍLIA (ESF)......160
8.1 Estratégias em Saúde da Família (ESF).......................................................................................163
8.2 Papel dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS)..................................................................165
8.3 Núcleos de Apoio à Saúde da Família (Nasf)...........................................................................166
8.4 Programas de saúde no Brasil........................................................................................................168
8.4.1 Sistema de saúde suplementar no Brasil.....................................................................................171
APRESENTAÇÃO

Caro aluno,

Atualmente podemos dizer que a Epidemiologia constitui a principal ciência da informação em


saúde. Suas raízes históricas podem ser identificadas pela junção de três elementos conceituais,
metodológicos e ideológicos: a clínica, a estatística e a medicina social. A Epidemiologia cada vez mais
ocupa lugar privilegiado de fontes metodológicas para todas as ciências da saúde, ampliando seu
papel na consolidação do saber científico sobre a saúde humana, sua determinação e consequências.
Assim sendo, independentemente de qual seja a sua pesquisa na área da saúde, todos precisam de
conhecimento epidemiológico. Para tal, estabeleceremos alguns objetivos:

• Estudar os principais conceitos necessários para elaboração e/ou compreensão do diagnóstico de


saúde populacional.

• Apresentar a história da Epidemiologia, desenvolvendo seus princípios básicos.

• Discorrer sobre os conceitos básicos da Epidemiologia Geral e sua utilização no campo da saúde.

• Compreender os principais determinantes do processo saúde/doença da coletividade.

• Descrever os principais indicadores de saúde das populações.

• Compreender o significado das principais medidas que avaliam o adoecimento e a morte das
populações.

• Conhecer o perfil e as principais tendências de adoecimento e morte no Brasil.

• Apresentar o raciocínio epidemiológico, seus fundamentos e métodos e também suas aplicações


no âmbito individual e coletivo da saúde.

• Compreender a diferença entre pandemias, endemias e epidemias, com ênfase na análise e


controle das doenças transmissíveis, surtos e epidemias.

• Apresentar os principais métodos de estudo da ocorrência, frequência e distribuição de agravos à


saúde, bem como a busca de causas e soluções para a promoção e proteção em saúde.

• Introduzir os fundamentos do método epidemiológico subjacentes à formulação e avaliação de


ações de saúde pública.

• Reconhecer o uso das informações sobre o perfil das doenças para eleição de problemas
prioritários em saúde e poder organizar intervenções que necessitem de planejamento e avaliação
do atendimento.

9
• Identificar e saber utilizar as principais fontes de informações de saúde disponíveis – dados secundários.

• Discorrer sobre aplicabilidade do conhecimento epidemiológico na avaliação e na gestão de


serviços de saúde.

• Discorrer sobre as políticas públicas de saúde e a construção do SUS; da concepção desse às


prerrogativas atuais.

• Apresentar e descrever os principais programas de saúde no Brasil.

• Enfatizar os Programas de Saúde da Família e de Estratégias de Saude da Família (PSF/ESF) como


redefinição da Atenção Básica no SUS.

INTRODUÇÃO

A Epidemiologia é a ciência que estuda a ocorrência de doenças em populações humanas e seus


fatores determinantes (LILIENFELD, 1980). No início prevaleceu a ideia de que a Epidemiologia se
restringia ao estudo das epidemias de doenças transmissíveis. Atualmente sabe-se que a Epidemiologia
é um campo da ciência que trata dos vários fatores e condições que determinam a ocorrência e a
distribuição de saúde, doença, defeito, incapacidade e morte entre grupos de indivíduos, analisa a
situação de saúde de populações, identifica perfis e fatores de risco, estabelece critérios para a vigilância
em saúde, configurando-se como uma importante ferramenta aos diferentes profissionais, que buscam
efetivamente a compreensão do processo saúde-doença e dos fatores que nele interferem. É ferramenta
indispensável ao entendimento e à aplicação das diferentes práticas para a gestão dos serviços de saúde,
públicos e ou privados, promovendo o adequado atendimento amplo e irrestrito da população aos
serviços de saúde.

10
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Unidade I
1 CONCEITOS DE EPIDEMIOLOGIA E BASES HISTÓRICAS

1.1 História

A Epidemiologia é considerada a ciência básica da saúde coletiva. Tornou-se uma disciplina científica
essencial para todas as ciências clínicas, base da Medicina e das outras formações profissionais em saúde.

Podemos definir Epidemiologia como a abordagem dos fenômenos da saúde-doença por meio
de quantificação, usando o cálculo matemático e técnicas de amostragem e de análise. Apesar do
uso e até abuso da “numerologia”, a moderna Epidemiologia não se resume à quantificação. Cada
vez mais, emprega técnicas alternativas para o estudo da saúde coletiva. Todas as fontes de dados
e de informação são válidas para o conhecimento sintético e totalizante das situações de saúde das
populações humanas.

A Epidemiologia tem experimentado, nos últimos anos, ricos questionamentos acerca de suas
bases, isto é, seus pressupostos teóricos-filosóficos, sua metodologia científica, suas técnicas de
investigação, entre outros. Classificações como Epidemiologia “clínica”, Epidemiologia “social”,
Epidemiologia “crítica” indicam a existência de compreensões diversas em relação à própria
identidade científica desta área. Suspeita-se acerca da cientificidade da Epidemiologia: seria
uma ciência, com seu objeto próprio; ou apenas um método científico, uma forma sistemática de
investigar objetos definidos por outras ciências?

Formando a base destes questionamentos mais amplos, uma série de aspectos particulares
ocupa epidemiologistas e profissionais afins: quais os modelos determinísticos mais adequados
a fenômenos de natureza epidemiológica? Quais os critérios apropriados de validação do
conhecimento? Quais os melhores desenhos de pesquisa? Quais as técnicas mais eficazes para a
compreensão da realidade epidemiológica?

Por trás da aparência operacional dessas questões, estão aspectos mais amplos da vida social. É
possível relacionar a pluralidade e as questões que vêm marcando diversas informações essenciais que
servem de base para o conteúdo da Epidemiologia, com profundas contradições geradas em esferas
mais abrangentes das práticas sociais. Grande parte dos diferentes problemas e respostas que são
formulados ao longo do desenvolvimento da Epidemiologia como ciência pode ser explicada como
sucessos e fracassos, consensos e conflitos, chances e obstáculos na realização de necessidades de saúde
dos diversos indivíduos e grupos humanos vivendo em sociedade (AYRES, 1993).

A partir desta perspectiva, que se entendem a relevância e o vigor do debate científico na Epidemiologia.

11
Unidade I

A história de uma disciplina científica é sempre escrita a partir do ponto em que estamos e faz parte
da identidade desejada de uma comunidade de cientistas.

Nossos epidemiologistas, em sua maioria, são médicos ou enfermeiros. Mas muitos outros profissionais
também se encaminharam para esta especialidade, como demógrafos, cientistas sociais, geógrafos,
biólogos, estatísticos, nutricionistas, matemáticos, historiadores, dentistas e outros. A Epidemiologia
conta assim com o aporte de muitas áreas de conhecimento.

No Brasil, avançou muito nos últimos 20 anos, tanto na área de atuação, quanto nos métodos e nas
técnicas que emprega como no número de profissionais que a ela se dedicam. A partir do século XIX e
das descobertas de Koch e Pasteur, inúmeros cientistas se dedicaram a buscar os agentes de doenças e
identificar os seus ciclos de transmissão. Em todo o mundo, a Medicina Tropical e a Geografia Médica se
afirmaram, acompanhando a expansão colonialista europeia.

No século XIX, no entanto, as doenças, seus ciclos e seus agentes etiológicos foram descritos de
acordo com bases de definição que conservamos até hoje. Essas descrições são entendidas por nós com
maior facilidade e identificadas como “científicas”.

O conhecimento do passado é essencial para entender a situação atual. Através da menção a vultos
ilustres e a acontecimentos decorridos, serão realçados alguns marcos da história da Epidemiologia
(STEPAN, 1976).

1.2 Evolução da Epidemiologia até o século XIX

1.2.1 Hipócrates

Médico grego que viveu há cerca de 2.500 anos, dominou o pensamento médico da sua época e dos
séculos seguintes. Analisava as doenças em bases racionais, afastando-se do sobrenatural. As doenças
para ele eram produto da relação complexa entre a constituição do indivíduo e o ambiente que o
cerca, o que está presente na linha do raciocínio ecológico atual. Este sábio grego estudou as doenças
epidêmicas e as variações geográficas das condições endêmicas. Deixou-nos um juramento que constitui
o fundamento da ética médica e a defesa do exame minucioso e sistemático do paciente, que consiste
em uma base para o diagnóstico e para a fiel descrição da história natural das doenças. Hipócrates, o pai
da Medicina, é considerado por alguns o pai da Epidemiologia ou o primeiro epidemiologista.

A tradição de Hipócrates foi mantida na Roma Antiga por Galeno (138–201), entre outros, preservada
por árabes na Idade Média e retomada por clínicos, primeiro na Europa Ocidental, a partir da Renascença,
e depois em praticamente todas as regiões.

Como afirma Canguilhem (1977), “o passado de uma ciência não se confunde com essa mesma
ciência no seu passado”. Assim, se a obra de Hipócrates está, efetivamente, entre as primeiras referências
em relação aos aspectos externos do organismo individual com fenômenos de saúde e doença, a análise
dos conteúdos conceituais e da estrutura discursiva aponta descontinuidades importantes com a
construção teórica que caracteriza a Epidemiologia. Essas descontinuidades são de tal relevância que
12
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

não se justifica buscar na ciência e na conjuntura hipocráticas as bases da construção do campo objetivo
da Epidemiologia.

A obra de Hipócrates caracteriza-se por três aspectos básicos:

• Os elementos “externos” ao organismo humano são compreendidos como portadores de


qualidades essenciais.

• As qualidades dos elementos externos são entendidas de princípio anterior segundo processos
dedutivos abstratos.

• O conhecimento dos mesmos tem como finalidade a compreensão mais adequada da singularidade
de cada doente a ser tratado pelo médico grego. Essas características do conhecimento hipocrático
e de sua orientação prática deixam claras as descontinuidades anteriormente referidas.

O objeto epidemiológico, tal como concebido hoje, está longe de ser capturado por intermédio
de qualidades essenciais: cada fenômeno epidemiológico tem seu significado determinado pelas
condições objetivas de sua apreensão, e só nessas condições adquire objetividade. Sua caracterização,
por outro lado, não procede de mecanismos dedutivos abstratos, mas é configurada a partir de dados
indutivamente construídos, isto é, de conhecimentos empíricos acumulados pela experiência sensível,
mesmo quando dedutivamente intuídos. Por fim, ainda que possa concorrer para ações de caráter
individual, a inferência epidemiológica refere-se substantivamente a coletivos, a grupos de indivíduos,
não podendo, senão à força de artifícios nem sempre legítimos, ser tomada como expressão objetiva
de condições humanas singulares. Um objeto de conhecimento assim configurado só tem condições
empíricas e lógicas para formar-se muito tempo depois da Antiguidade Clássica. Como questão prática
e como construção abstrata, o objeto da Epidemiologia é produto da modernidade.

Nesse sentido, dois movimentos precisam ser considerados quando se trata de compreender o
nascimento da ciência epidemiológica: de um lado, está o processo de emancipação da dimensão
tecnológica da razão e, de outro, da emancipação dos sujeitos privados na constituição do espaço
público da sociedade, sendo, um e outro, marcos importantes, apenas analiticamente distinguíveis, do
processo de emergência do período moderno na história das sociedades ocidentais (AYRES, 1993).

Parte da contribuição de Hipócrates e Galeno foi perdida ou deturpada. Mesmo a que chegou até
hoje foi relegada a segundo plano, dando lugar a outras explicações. Nessa situação, encontra-se a
Teoria dos Miasmas, vigente há séculos, que dominou o pensamento médico até a segunda metade do
século XIX.

1.2.2 Miasmas

Embora, tenha-se hoje alcançado certo consenso sobre a importância dos determinantes sociais
de saúde (as condições de vida e trabalho dos indivíduos e de grupos da população estão relacionadas
com sua situação de saúde), esse consenso foi sendo construído ao longo da história. Entre os diversos
paradigmas explicativos para os problemas de saúde, em meados do século XIX, predominava a Teoria
13
Unidade I

Miasmática, que conseguia responder às importantes mudanças sociais e práticas de saúde observadas
no âmbito dos novos processos de urbanização e industrialização ocorridos naquele momento histórico.
Estudos sobre a contaminação da água e dos alimentos, assim como sobre riscos ocupacionais, trouxeram
importante reforço para o conceito de miasma e para as ações de saúde pública (BUSS; PELLEGRINI
FILHO, 2007).

Na Teoria Miasmática, a origem das doenças situava-se na má qualidade do ar, proveniente de


decomposições de animais e plantas. A malária, junção de “mal” e “ar”, deve seu nome à crença nesse
modo de transmissão. Os miasmas passariam do doente para os indivíduos suscetíveis, o que explicaria
a origem das epidemias das doenças contagiosas. Ainda hoje o sobrenatural e os miasmas são utilizados
por leigos como explicações para as doenças, levando a numerosas práticas místicas, em que avultam
as danças e o uso de amuletos para afastar danos à saúde ou o emprego de substâncias de odor forte,
como o álcool, a menta e o eucalipto, usados em fricções no corpo ou borrifados no ambiente, em casos
de infecções respiratórias.

O aparecimento da quantificação de temas biológicos e sociais foi um acontecimento de grande


importância, pois encontrou campo fértil na saúde pública e na clínica. Somente há cerca de três séculos
que alguns pioneiros iniciaram tal tipo de abordagem, mediante a utilização de dados de mortalidade.

1.2.3 John Graunt

No ano de 1662, John Graunt (1620–1674) publicou um tratado sobre as tabelas mortuárias de
Londres, no qual analisou a mortalidade por sexo e região. Não havendo na época registros de idade
nas anotações dos óbitos, ele selecionou determinadas causas, como prematuridade e raquitismo, para
estimar a proporção de crianças nascidas vivas e que morriam antes dos seis anos de idade. Pelo seu
pioneirismo na utilização dos coeficientes (óbitos x população), foi considerado o pai da demografia ou
das estatísticas vitais.

1.3 O século XIX

Nesse período, o centro das ciências era a Europa. Uma sucessão de acontecimentos influenciava
profundamente as pessoas e as ideias. A Revolução Industrial na Inglaterra, e um pouco mais tarde
em outros países, produziu um extenso deslocamento das populações do campo para as cidades,
atraídas por emprego nas fábricas recém-criadas. À época, importantes correntes filosóficas e políticas
estavam nascendo ou mostravam as repercussões que causavam, entre as quais a Revolução Francesa
do final do século XVIII e o positivismo, o materialismo filosófico e os movimentos político-sociais da
metade do século XIX. Epidemias de cólera, febre tifoide e febre amarela constituíam graves problemas,
levando a maiores preocupações quanto à higiene, ao aprimoramento da legislação sanitária e à
criação de uma estrutura administrativa para a aplicação das medidas preconizadas. A explicação das
causas das doenças era dividida entre os que defendiam a teoria dos miasmas e os que advogavam a
dos germes.

Franceses e ingleses ocupavam posição de destaque na história da Epidemiologia. Entre os cientistas


franceses do século XIX, lembrados como pioneiros nas correntes dos pensamentos que influenciaram
14
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

a Epidemiologia atual, estão Pierre Louis, Louis Villermé e Louis Pasteur; entre os ingleses, merecem
atenção William Farr e John Snow.

1.3.1 Pierre Louis

Pierre Louis (1787–1872) fundou escola em Paris. Entre as suas obras, encontram-se estudos sobre a
tuberculose e sobre a febre tifoide. Sua maior contribuição foi haver introduzido e divulgado o método
estatístico, utilizando-o na investigação clínica das doenças. Em Paris, àquela época, defendia-se a
contagem rigorosa de eventos para realçar semelhanças e diferenças entre segmentos da população,
na linha abraçada pela Epidemiologia atual. Com essa visão, foi possível a Pierre Louis, ao analisar as
internações hospitalares em Paris – mais especificamente, a letalidade da pneumonia em relação à época
em que o tratamento por sangria era iniciado – revelar a conduta prejudicial representada por essa técnica
no tratamento de pneumonias, muito mais perigosa do que benéfica para os pacientes. Por trabalhos como
esse, Pierre Louis é referenciado como a figura ideal do clínico que usa adequadamente a Epidemiologia e
o modelo para os profissionais de saúde que hoje praticam a Epidemiologia clínica. Alguns o consideram
como o iniciador da Estatística Médica e outros, como o verdadeiro pai da Epidemiologia moderna.

1.3.2 Louis Villermé

Louis Villermé (1782–1863) investigou a pobreza, as condições de trabalho e a repercussão dessas


circunstâncias sobre a saúde da população, realçando as estreitas relações entre situação socioeconômica
e mortalidade. Sua pesquisa sobre a saúde dos trabalhadores das indústrias de algodão, lã e seda é
considerada clássica. Nessa época, havia consciência do papel dos fatores sociais sobre a saúde. Somente
no século XIX, as relações entre condições econômicas e sociais e seus efeitos sobre a saúde foram
mais consistentemente apontadas, expandindo, desde então, a noção de que estas relações devem ser
submetidas à investigação científica.

1.3.3 William Farr

William Farr (1807–1883) estudou em Paris com Pierre Louis e foi influenciado pelo enfoque social que
Villermé conferia às investigações. Retornando a Londres, trabalhou por mais de 40 anos no Escritório de
Registro Geral da Inglaterra. Entre as suas contribuições, destacam-se uma classificação de doenças, uma
descrição das leis das epidemias – ascensão rápida no início, elevação lenta até o ápice e, em seguida,
uma queda mais rápida (Lei de Farr) – e a produção de informações epidemiológicas sistemáticas usadas para
subsidiar o planejamento das ações de prevenção e controle. Nos relatórios anuais do Registro Geral, em que
trabalhou desde a sua fundação, em 1839, apresentava as informações de mortalidade e descrevia situações
que apontavam para as grandes desigualdades, regionais e sociais, nos perfis de saúde.

Os relatórios do Registro Geral da Inglaterra possibilitaram o acesso de estudiosos a informações sobre


saúde, até então não disponíveis. Friedrich Engels (1820–1895) utilizou-as, especialmente, na sua obra A
Condição da Classe Trabalhadora na Inglaterra, em 1844, e Edwin Chadwick (1800–1890), um advogado,
nos seus relatórios sobre a saúde das classes trabalhadoras (1842) e sobre os cemitérios (1843), que
subsidiaram a reforma sanitária inglesa da metade do século XIX. Chadwick, baseado em informações
do Registro Geral da Inglaterra, mostrou a grave situação de saúde de grande parte da população
15
Unidade I

através de constatações como as seguintes: mais da metade das crianças das classes trabalhadoras não
chegava à idade de cinco anos, a idade média do óbito na classe mais abastada era de 36 anos, entre os
trabalhadores do comércio, era de 22 anos e, entre trabalhadores da indústria, de 16 anos.

Em outros centros culturais, a pesquisa das causas da doença também tomou um rumo semelhante,
com ênfase conjunta nos aspectos biológicos e sociais.

1.3.4 John Snow

John Snow (1813–1858) conduziu numerosas investigações para esclarecer a origem das
epidemias de cólera, ocorridas em Londres no período de 1849–1854. Foi assim que conseguiu
incriminar o consumo de água poluída como responsável pelos episódios da doença e traçar
os princípios de prevenção e controle de novos surtos, válidos ainda hoje, mas fixados em uma
época muito anterior ao isolamento do respectivo agente etiológico, o que só aconteceu em
1883. O trabalho de Snow, na compreensão da epidemia da cólera, é considerado um clássico da
Epidemiologia de campo.

A expressão “epidemiologia de campo” significa a coleta planejada de dados. Snow, na tentativa


de esclarecer a etiologia das epidemias de cólera, visitou numerosas residências para detalhado
estudo dos pacientes e do ambiente onde viviam, inclusive com exame químico e microscópico da
água de abastecimento.

A obra deixada por Snow é muito apreciada como um experimento natural: conjunto de
circunstâncias que ocorrem naturalmente, em que as pessoas estão sujeitas a diferentes graus de
exposição a um determinado fator, simulando uma verdadeira experiência planejada. Naquela época,
duas companhias comerciais forneciam à população de Londres a água do rio Tâmisa, retiradas
de locais próximos entre si e muito poluídos. Em determinado momento, uma das companhias
mudou o local de coleta de água para um ponto a montante do rio, antes de sua penetração. Logo,
raciocinou Snow, se a ingestão de água contaminada fosse fator determinante na distribuição
da doença, a incidência de cólera deveria ser diferente entre as pessoas que se abasteciam de
uma ou de outra fornecedora de água. Para comprovar sua hipótese, procurou saber a fonte de
suprimento de cada domicílio onde era registrado caso fatal de cólera. Como o dado não existia
na forma desejada por ele, passou, juntamente com um assistente, a anotar os óbitos registrados
como causados pela doença e a visitar os domicílios para certificar-se da proveniência da água.
Os resultados encontrados mostraram que, nos domicílios abastecidos pela companhia que mudou
o seu ponto de capitação de água, a taxa de mortalidade era várias vezes menor, o que se tornou
uma forte evidência para sustentar a teoria da transmissão hídrica, sobretudo quando não havia
outras diferenças, de cunho social, geográfico ou demográfico, que pudessem explicar variações de
mortalidade entre os clientes das duas companhias.

1.3.5 Louis Pasteur

Pasteur (1822–1895), considerado o pai da Bacteriologia, foi uma das figuras mais importantes da
ciência no século XIX. Foi ele quem registrou as bases biológicas para o estudo das doenças infecciosas,
16
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

influenciando profundamente a história da Epidemiologia. Na verdade, a noção de que as doenças


eram transmitidas por contágio é antiga. No século XVI, Girolamo Fracastorius (1484–1553) descreveu a
transmissão de infecções por contato direto, através de gotículas de saliva e objetos que, contaminados,
propagam a infecção. Nos séculos seguintes, outros cientistas afirmaram que as doenças eram causadas
por agentes animados, diferentes para cada doença, conceito que era negado pelas mais importantes
figuras da época.

Um passo essencial para o desenvolvimento da Teoria dos Germes – que será explicada mais
adiante – foi a descoberta do microscópio, em 1675, por van Leeuwenhoek (1632–1723), que, graças a
este engenho, conseguiu visualizar pequenos seres vivos, aos quais denominou “animálculos”, abrindo
uma nova direção para as investigações.

Pasteur foi a figura central da microbiologia, pois identificou e isolou numerosas bactérias, além
de fazer trabalhos pioneiros de imunologia. Entre as suas muitas contribuições, está o estudo da
fermentação da cerveja e do leite em 1857, seguido pela investigação das bactérias patogênicas e
dos meios de destruí-las ou de impedir sua multiplicação. Ele constatou que os líquidos sem germes
se conservavam livres deles quando devidamente protegidos de contaminação veiculada pelo ar,
por insetos ou por outros meios. Descobriu o princípio da pasteurização em 1865: os micróbios que
causam a transformação do vinho em vinagre podiam ser mortos por meio de várias aplicações de calor,
em temperaturas que causavam danos ao vinho. A convite do governo francês, em 1865, estudou e
identificou os agentes etiológicos e os meios para combatê-los da praga que prejudicava seriamente a
indústria nacional do bicho-da-seda, sendo, portanto, um precursor da colaboração ciência-indústria.
Desenvolveu a vacina antirrábica, cuja aplicação permitiu salvar as pessoas mordidas por cães raivosos,
até então irremediavelmente condenadas à morte.

Os trabalhos de Pasteur, seguidos pelos de Robert Koch (1843–1910) e de outros microbiologistas,


criaram a impressão de que as doenças poderiam ser explicadas por uma única causa, o agente
etiológico, o que passou para a história como a Teoria dos Germes. As pesquisas em Epidemiologia
passaram a ter um forte componente laboratorial, pois parecia evidente que a busca de agentes
para explicar as doenças substituía, com vantagens, a Teoria dos Miasmas, constituindo uma linha
promissora de investigação etiológica. Além disso, trazia para o raciocínio causal uma precisão não
encontrada nas teorias anteriores, seja qual for a comprovação laboratorial da presença de um agente
(ROUQUAYROL, 2003).

1.4 A primeira metade do século XX

1.4.1 Influência da microbiologia

A revolução representada pelo desenvolvimento da bacteriologia, na segunda metade do século XIX,


influenciou profundamente as primeiras décadas do século XX, causando uma substancial reorientação
do pensamento médico, pois alterou os conceitos de doença e contágio. Comprovou-se que seres
microscópicos, dotados de características especiais, detalhadamente descritas, desempenhavam
papel predominante na gênese de muitas doenças. A clínica e a patologia tornaram-se subordinadas
ao laboratório, que ditava também padrões para a higiene e para a legislação sanitária. Nas escolas
17
Unidade I

de saúde pública, tradicionais pontos de formação de sanitaristas, o ensino concentrava-se também


no laboratório. Fundaram-se institutos de pesquisa aplicada em praticamente todo o mundo, nos
moldes do Instituto Pasteur de Paris, criado para facilitar as investigações do pesquisador francês e
de seus discípulos.

1.4.2 Oswaldo Cruz e a Escola de Manguinhos

Oswaldo Cruz (1872–1917), o renomado sanitarista brasileiro, estudou no Instituto Pasteur em


Paris e, no seu retorno ao Brasil, fundou, no início do século, em Manguinhos, no Rio de Janeiro,
o Instituto que hoje tem seu nome, reproduzindo o modelo de sucesso de então e que também se
tornou, com o passar do tempo, um dos poucos exemplos de longevidade de instituições de pesquisa
na América Latina.

Além de criar o Instituto, Oswaldo Cruz empreendeu vitoriosa campanha contra a febre amarela
no Rio de Janeiro e combateu a peste e a varíola, com grande competência técnica, o que lhe valeu
ser reconhecido como um dos grandes vultos da saúde pública brasileira. Entre os que se destacaram
no Instituto Oswaldo Cruz, Carlos Chagas (1879–1934) descreveu a doença individualizada com
características e propriedades inerentes à patologia que leva o seu nome. A descoberta ocorreu em
1909, em Lassance, Minas Gerais, quando lá esteve para colaborar no combate a um surto de malária
que dificultava a construção da estrada de ferro local. Também fez parte do grupo de Manguinhos
o protozoologista Adolfo Lutz (1855–1940), que havia deixado sua posição de diretor do Instituto
Bacteriológico, em São Paulo, em que trabalhara no controle da febre amarela e de outras endemias,
ao lado de outro grande sanitarista, Emílio Ribas (1862–1925). Muitas obras públicas no país foram
facilitadas graças à ação direta dos técnicos do Instituto Oswaldo Cruz, indicando as medidas saneadoras
preventivas que deviam ser tomadas ou, indiretamente, em consequência do treinamento que o Instituto
promovia e das descobertas científicas que ali aconteciam (CHAGAS, 1981).

1.4.3 Desdobramento da Teoria dos Germes

Da virada do século até o fim da Segunda Guerra, a Epidemiologia estava intrinsecamente ligada
à saúde pública que, por sua vez, se constituía como uma especialidade médica. Esta Epidemiologia
visava a entender, prevenir e controlar as doenças infecciosas, dentro de um modelo centrado no
laboratório de microbiologia, na Teoria dos Germes. Neste caso, a Epidemiologia complementava o
conhecimento produzido em laboratório. As conclusões a partir de modelos animais das experiências
laboratoriais não podiam sempre ser consideradas válidas para o homem. Era preciso que se produzissem
evidências em humanos. Ao mesmo tempo, os modelos laboratoriais não podiam reproduzir diversos
aspectos da experiência real das comunidades. Assim, as evidências coletadas em populações humanas
complementavam o conhecimento laboratorial (PENNA,1997).

Os grandes avanços da Bacteriologia fizeram com que, nas primeiras décadas do século XX, os
caminhos da prevenção se fortalecessem através da identificação de agentes etiológicos e dos meios de
combater sua ação mórbida, mediante o aumento da resistência específica do organismo humano, com
o uso das imunizações e da promoção do saneamento ambiental.

18
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

1.4.4 Saneamento ambiental, vetores e reservatórios de agentes

Nos séculos XVIII e XIX, os sanitaristas lutavam pela ampliação do saneamento ambiental, como
forma de enfrentar as doenças contagiosas. Na urbanização das cidades, os médicos eram ouvidos e
aconselhavam a construção de avenidas largas, para facilitar a ventilação e combater os miasmas. A
urbanização do centro da cidade do Rio de Janeiro, com a drenagem de pântanos e a demolição de
morros, desde meados do século XIX, foi profundamente influenciada pelos profissionais de saúde que,
na época, pertenciam a um grupo com visão miasmática das causas da doença. Mas as descobertas
científicas fizeram com que o meio ambiente pudesse ser mais estudado, colocando em destaque o
seu papel na transmissão, visto que ele fornece o substrato não só para grande número de agentes
produtores de doenças, como para hospedeiros suscetíveis.

O campo de investigação expandiu-se para incluir os vetores e os reservatórios de agentes, o que


resultou no esclarecimento do ciclo dos parasitas, ampliando as possibilidades de prevenção. Como
ilustração de investigações orientadas para esclarecer o papel dos mosquitos e outros vetores na
etiologia das doenças infecciosas, empreendidas no final do século XIX e início do século XX, citam-se
as realizadas pelo francês Alphonse Laveran (1845–1922) e pelo inglês Richard Ross (1857–1932) sobre
a malária, as do inglês Patrick Manson (1844–1922) sobre filariose e esquistossomose, as do cubano
Carlos Finlay (1833–1915) e do norte-americano Walter Reed (1851-1902) sobre febre amarela e as do
brasileiro Carlos Chagas sobre a tripanossomíase americana, ou seja, a doença de Chagas.

1.4.5 Ecologia

O conhecimento sobre a transmissão das doenças fez com que a teoria centrada nos germes
cedesse lugar a estudos sobre agente, hospedeiro e meio ambiente, sob a forma de modelos unificados,
iniciando a fase atual, mais sofisticada, de explicação das doenças, baseada na multicausalidade. A
saúde passa a ser mais compreendida e entendida como uma resposta adaptativa do homem ao meio
ambiente que o circunda, e a doença, como um desequilíbrio desta adaptação, resultante de complexa
interação de múltiplos fatores. “Os estados de saúde e doença são a expressão do sucesso ou do fracasso
experimentado pelo organismo em seus esforços para responder adaptativamente a desafios ambientais”
(RIBEIRO, 1997). A Epidemiologia, por sua preocupação com o estudo das doenças em relação a fatores
ambientais, é, então, considerada como “ecologia médica” ou, em sentido amplo, “ecologia da saúde”.

1.4.6 Base de dados para a moderna Epidemiologia

A coleta sistemática de dados sobre as características das pessoas falecidas, em especial a causa mortis,
permitiu o estabelecimento de um sistema moderno de informações, centralizado, útil para a detecção
do aparecimento e do perfil de muitas doenças na comunidade. Assim, as chamadas “estatísticas vitais”,
que incluem informações sobre nascimento e óbitos, tornaram-se uma fonte de dados para a qual se
voltaram, e se voltam, com frequência cada vez maior, os profissionais de saúde, visando a aprimorar o
conhecimento das condições de saúde da população. Sem este sistema oficial de registro, os dados de
óbitos e nascimentos seriam pouco utilizados em saúde, já que para um interessado, isoladamente, seria
praticamente impossível reunir tamanha quantidade de informação.

19
Unidade I

Outros sistemas de informação sobre morbidade e fatores de risco foram inseridos em várias partes
do mundo, de modo a funcionar como elemento de base para possibilitar o melhor conhecimento da
saúde da população e para facilitar as investigações etiológicas.

1.5 A segunda metade do século XX

1.5.1 A ênfase das pesquisas

O século XX testemunhou a mudança do perfil de doenças predominantes, com a importância


crescente das condições crônico-degenerativas como causas de morbidade e mortalidade. A Epidemiologia
progride através da pesquisa sobre muitos temas, entre os quais: a determinação das condições de saúde
da população – a busca sistemática de fatores antecedentes ao aparecimento de doenças, que possam ser
rotulados como agentes ou fatores de risco; e a avaliação da utilidade e da segurança das intervenções
propostas para alterar a incidência ou a evolução da doença, através de estudos controlados.

Determinação das condições de saúde da população

Os inquéritos de morbidade são exemplos de investigação sobre o estado de saúde da


comunidade. Pesquisas desse tipo já haviam sido realizadas em épocas anteriores, mas somente
foram empregadas em grande número e com maior nível de detalhamento na segunda metade
do século XX. O mesmo se passou com os inquéritos de mortalidade, dos quais muitos exemplos
podem ser encontrados na literatura de algumas décadas atrás, mas apenas a segunda metade
do século testemunhou pesquisas dessa natureza, bem controladas e de grande porte, como as
investigações interamericanas de mortalidade.

Investigações etiológicas

Quanto às pesquisas etiológicas, merecem destaque as que evidenciaram o papel da rubéola nas
malformações congênitas e aquelas referentes ao cigarro na etiologia de afecções respiratórias e aos
fatores de risco relacionados às coronariopatias. Para isso, foi necessário o aperfeiçoamento de estudos
controlados, de cunho não experimental, quer prospectivos quer retrospectivos. Os estudos de coorte e
de caso-controle têm sido os principais delineamentos para investigações etiológicas.

Avaliação de intervenções

A partir de meados do século XX, a avaliação de procedimentos preventivos e curativos,


através de estudos populacionais controlados, teve maior espaço na literatura da Epidemiologia.
São exemplos pioneiros as investigações experimentais levadas a efeito para verificar a eficácia
da estreptomicina no tratamento da tuberculose, da fluoretação da água na prevenção da cárie
dentária e da vacina contra a poliomielite. Desde então, esta metodologia passou a ser amplamente
usada, sendo exemplo do seu emprego a avaliação das intervenções adotadas para reduzir a
prevalência de fatores de risco das doenças cardiovasculares (ALMEIDA FILHO, 1992).

20
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

1.5.2 Situação atual

Para lidar com o complexo problema da multicausalidade na realização de estudos analíticos e


afastar as numerosas variáveis confundidoras da interpretação de resultados, foi necessário imprimir
grande complexidade ao arsenal analítico, de caráter estatístico, pouco acessível ao não especialista.
Como consequência, são características marcantes da pesquisa epidemiológica do final do século XX o
rigor metodológico, na tentativa de imprimir imparcialidade da verificação dos eventos; e a sofisticação
do planejamento das investigações e da análise estatística, em computador.

Praticamente todos os agravos à saúde já foram ou estão sendo estudados através de investigações
epidemiológicas. Nas pesquisas etiológicas, são analisados não só os fatores físicos e biológicos, de
indiscutível predominância como foco de interesse nas pesquisas etiológicas, mas também, em número
crescente, os fatores psicossociais. Os agentes microbiológicos e físicos não eram capazes de explicar
todas as questões de etiologia e prognóstico. Isso fez com que os conceitos e técnicas de uso habitual em
outras disciplinas, principalmente em Sociologia e Psicologia, começassem a ser utilizados e incorporados
aos fundamentos e aos métodos da moderna Epidemiologia. A aproximação dessas disciplinas e a
necessidade de melhor precisar as condições de aparecimento e evolução das doenças trouxeram, para a
Epidemiologia, ênfase ainda maior em técnicas quantitativas; os inquéritos em amostras representativas
e o uso de análises estatísticas multivariadas são exemplos. A evolução da técnica foi marcante na
segunda metade do século XX, em grande parte devido às necessidades inerentes às investigações sobre
os múltiplos fatores determinantes das doenças crônicas não transmissíveis (CONGRESSO BRASILEIRO
DE EPIDEMIOLOGIA, 1990).

Parte importante da informação construída pela clínica é reutilizada em uma dimensão coletiva pela
Epidemiologia, dados de mortalidade, morbidade, a presença nas populações de fatores considerados
como de risco para adoecer constitui-se uma das fontes fundamentais de dados para o desenvolvimento
de avaliações de diferentes ordens nos serviços de saúde. A realização destas avaliações, mais frequentes
atualmente, tem tornado evidente que estas informações são fortemente influenciadas pela variabilidade,
ou inconstância, na utilização dos processos tecnológicos de diagnóstico e terapêutica na apreensão
de problemas de saúde aparentemente semelhantes, em específicos sistemas e serviços de saúde. Ou
seja, um processo que, de início, partia do que parecia ser um uso instrumental de uma informação,
apoiada em um conhecimento tomado como invariante, termina por evidenciar algumas dificuldades
nos pressupostos que lhe davam garantia (NOVAES, 1996).

Constatar que aquilo que acontece no exercício cotidiano dos processos diagnósticos e terapêuticos
nos serviços não adere exatamente aos preceitos científicos que supostamente o normatizam é motivo
de permanente insatisfação para as várias áreas do conhecimento que têm os serviços de saúde como
meio ou fim. Insatisfação esta mais acentuada do que aquela habitualmente encontrada nas sociedades
contemporâneas, quando forçadas a constatar que a ciência e a tecnologia têm um grande poder de
intervenção sobre o mundo real, mas não o controlam de forma absoluta, não são capazes de criar uma
nova realidade, completamente racionalizada e sem qualquer tipo de perturbação. O desapontamento
com os profissionais, com as tecnologias e também com os pacientes é geral, pois eles raramente se
comportam como se acredita que deveriam, e é fácil compreender por que a frustração é maior, em
especial na questão da saúde, da vida e da morte.
21
Unidade I

1.5.3 Duas tendências da Epidemiologia atual

No último quarto do século XX, duas tendências, de contornos distintos, marcaram a moderna
Epidemiologia: uma de natureza clínica e outra de cunho social.

Epidemiologia clínica

É o retorno da Epidemiologia ao ambiente estritamente clínico, com a característica de conhecer o local


imediato em que o paciente vive, de modo a verificar as circunstâncias que possibilitam o aparecimento da
doença. A prática clínica sempre foi dependente de informações epidemiológicas, essenciais para o diagnóstico
e para a orientação do paciente. Os médicos foram os primeiros epidemiologistas, os primeiros que usaram
a disciplina para a pesquisa etiológica ou para conferir uma visão mais abrangente, ou ecológica, à saúde.
Mas, na década de 1970, surge algo diferente: um movimento também de médicos, de cunho metodológico,
para utilizar a Epidemiologia e a estatística no ambiente clínico, de modo a trazer maior rigor científico à
prática da Medicina, e que foi denominado Epidemiologia Clínica. Ele consiste na aplicação dos fundamentos
epidemiológicos modernos ao diagnóstico clínico e ao cuidado direto com o paciente.

A Epidemiologia clínica recusa a experiência acumulada pela clínica por considerá-la não científica e,
portanto, não moderna, e até certo ponto, recusa também o conhecimento produzido pela Epidemiologia
retendo dela apenas os principais instrumentos e métodos de investigação. Ao se definir como “um modo de
produzir e interpretar observações clínicas em medicina” (FLETCHER et al., 1982), ao mesmo tempo em que se
coloca como “uma ciência relacionada com a contagem de eventos clínicos que utiliza o método epidemiológico
para proceder a essa contagem e à sua análise” (FLETCHER et al., 1982), ela aparece como síntese entre dois
campos de conhecimento, retendo de um o objeto e de outro, o método. Nesse processo de síntese, corre-se o
risco de que se percam as “virtudes” de ambos (ALMEIDA FILHO, 1992).

É através da Epidemiologia que a Medicina pronuncia seu discurso sobre o social. Mas, ao abrir‑se
para o social, a Epidemiologia fica sujeita a ser invadida por diferentes concepções vindas dele e
apresentar diversos projetos de compreensão e intervenção nas dimensões sociais da saúde e da doença
(MENDES-GONÇALVES, 1990).

A Clínica e a Epidemiologia surgem sob o provisório que marcará toda a época moderna. Tudo o
que é sólido desmancha no ar, isto é, todos os valores, ideias, instituições, saberes estão em constante
transformação. O abandono dessa cultura modernista, rica e vibrante, e o refúgio no individualismo são
os traços mais característicos das duas últimas décadas e é aí que a Epidemiologia clínica surge como
proposta de superação dos impasses da clínica e da Epidemiologia (BARATA,1996).

Epidemiologia social

Trata-se da contestação à visão clássica da Epidemiologia – criticada como reducionista, funcionalista


ou positivista – e que passou a ser conhecida como “Epidemiologia social”. Foi o renascer do estudo da
determinação social da doença. O seu intuito é o de procurar melhor entender a situação de saúde da
população, em especial nas regiões subdesenvolvidas – ou dos segmentos desfavorecidos da população,
mesmo das nações industrializadas – dentro de alguns postulados que são encontrados principalmente
22
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

na Sociologia. Consequentemente, o seu objetivo tem sido o de produzir conhecimentos dentro de


uma lógica até então pouco utilizada ou totalmente esquecida na Epidemiologia. A justificativa de
semelhante enfoque advém da constatação de enormes desigualdades existentes na sociedade e que,
enquanto esse contexto não for resolvido, a saúde dos grupos socialmente menos favorecidos sofrerá as
consequências adversas: a alta prevalência de doenças evitáveis e a dificuldade de acesso aos serviços
de saúde, quando sem necessidade deles (BARRETO, 1990).

A ideia de promover saúde tem se tornado uma força vital no novo movimento de saúde pública,
no qual ela é concebida também como um fenômeno social, que diz respeito à qualidade de vida e
ao capital social. Elementos de capital social tais como: confiança mútua, normas de reciprocidade
ou solidariedade, e engajamento cívico aliados ao crescimento da Epidemiologia social são temas que
poderão trazer novas perspectivas ao campo da saúde pública e da promoção de saúde.

As quatro últimas décadas têm mostrado um interesse crescente em entender como a sociedade
e diferentes formas de organização social influenciam a saúde e o estado de bem-estar. O campo da
Epidemiologia social traz o foco de atenção, antes voltado principalmente para os o fatores de risco para a
saúde a fim de examinar, com mais profundidade, o contexto social em que eles acontecem. Podendo assim
identificar e descrever as condições sociais que parecem influenciar o estado de saúde das populações,
aspectos pouco abordados dentro da Epidemiologia tradicional (SOUZA; GRUNDY, 2004).

Exemplo de aplicação

Nos dias atuais, observamos a necessidade de discussões das relações entre Epidemiologia e Ciências
Sociais na composição do campo da saúde pública.

Reflita como vêm sendo adaptadas categorias das Ciências Sociais pela Epidemiologia, disciplina que
historicamente tem ocupado posição dominante na área da saúde coletiva.

1.5.4 História natural da doença

História natural da doença é o nome dado ao conjunto de processos interativos compreendendo


as inter-relações do agente, do suscetível e do meio ambiente que afetam o processo global e seu
desenvolvimento, desde as primeiras forças que criam o estímulo patológico no meio ambiente, ou em
qualquer outro lugar, passando pela resposta do homem ao estímulo, até as alterações que levam a um
defeito, invalidez, recuperação ou morte.

A história natural da doença, portanto, tem desenvolvimento em dois períodos sequenciados:

• Período epidemiológico ou pré-patogênico: em que acontece a interação homem versus ambiente.

• Período patológico ou de patogênese: são iniciadas as primeiras ações dos agentes patogênicos
sobre o afetado (susceptível).

23
Unidade I

O agente pode ser definido como todas as substâncias, elementos ou forças, cuja presença ou
ausência pode, mediante contato efetivo com um hospedeiro suscetível, constituir estímulo para iniciar
ou perpetuar um processo doença.

• Infectividade: implica a capacidade de o agente etiológico se alojar e se multiplicar no organismo


do hospedeiro, incluindo a transmissão para um novo hospedeiro.

O hospedeiro pode ser definido como organismos passíveis de abrigar ou sofrer influências dos
fatores causais capazes de provocar agravos à sua saúde.

• Patogenicidade: é a capacidade de produzir sinais e sintomas em hospedeiro suscetível.

O ambiente pode ser biológico, nutricional, físico, químico, mecânico ou psicossocial.

1.5.5 Fatores determinantes da doença

• Endógenos: no quadro geral da ecologia da doença, são inerentes ao organismo e estabelecem a


receptividade do indivíduo:

— herança genética;
— anatomia e fisiologia do organismo humano;
— estilo de vida.

• Exógenos: fatores determinantes que dizem respeito ao ambiente.

— Ambiente biológico: determinantes biológicos.


— Ambiente físico: determinantes físico-químicos.

• Ambiente social: determinantes socioculturais.

1.5.6 Prevenção
Bloquear ou interceptar as causas, com o objetivo de
cessar os efeitos

Sendo um conjunto de procedimentos que visam


proteger e melhorar a saúde de uma população e,
portanto, sua qualidade de vida

Figura 1

24
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Níveis de prevenção:

Conhecido como níveis de Leavell, o conceito de níveis de prevenção relata que as atividades dos
médicos e de outros profissionais da saúde têm o objetivo da prevenção.

Quadro 1

Estágio da doença Nível de prevenção Tipo de resposta


Proteção da saúde
Pré-doença Prevenção primária e proteção específica
Doença latente Prevenção secundária Tratamento
Doença sintomática Prevenção terciária Limitação da incapacidade

No nível de prevenção primário, a maioria das doenças não infecciosas pode ser vista como
tendo um estágio precoce, durante o qual os fatores causais iniciarão a produção das anormalidades
fisiológicas. O objetivo, nesse momento, é modificar os fatores de risco (habitação, alimentação,
estilo de vida). Aplicável também nas DCNTs (Doenças Crônicas não Transmissíveis): diabetes,
arterioesclerose, anemias.

Cabem na prevenção primária:

• Ações educativas: conjunto de ações que visam levar à comunidade conhecimentos essenciais
relativos às ações de saúde (programas).

• Ações saneadoras: dirigidas diretamente aos componentes ambientais (controle sanitário de água
e esgoto, alimentos, lixo, solo, vetores).

Proteção específica:

• imunização;

• saúde ocupacional;

• higiene pessoal e do lar;

• proteção contra acidente.

Promoção de saúde:

• moradia adequada;

• alimentação adequada;

• áreas de lazer;

• escolas.
25
Unidade I

O nível de prevenção secundário é a evolução para o período patogênico e o fracasso das ações
realizadas no nível primário, o diagnóstico precoce da fonte da doença neste nível é o principal recurso
de prevenção, assim como a intervenção imediata.

O nível terciário de prevenção é o conjunto de ações desenvolvidas no período patogênico tardio,


tendo como objetivo limitar a incapacitação deixada pela doença e promover a reabilitação do indivíduo
de forma integral na sociedade.

Controle

Controle é o conjunto de medidas ou ações empregadas com o objetivo de reduzir a frequência da


ocorrência da doença, já presente na população, até que essa se detenha em níveis compatíveis com a
realidade existente.

Erradicação

Erradicação é o conjunto de ações dirigidas com fins específicos de eliminar uma doença de um
determinado território.

É um procedimento radical e intensivo, o sucesso depende da integração envolvendo diferentes


segmentos profissionais e múltiplas medidas sanitárias.

1.5.7 O modelo da história natural da doença

Entre as décadas de 1950-70, nasce uma perspectiva da saúde coletiva em âmbito mundial. Diante
da nova ordem do pós-Segunda Guerra Mundial, – mais precisamente no contexto da criação política
supranacional da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização Mundial da Saúde (OMS) – o
conceito de “saúde” ganha nova configuração: “saúde é o estado de completo bem-estar físico, mental
e social e não mera ausência de moléstia ou enfermidade” (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1948).

De modo geral, podemos afirmar que o modelo explicativo multicausal delineado por Leavell e Clark
(1976) privilegia o entendimento da saúde como um processo, por meio do conhecimento acumulado
do campo científico. Nessa lógica causal, o restabelecimento da normalidade está fundamentado
na visão positiva da saúde, que é valorizada pela noção de prevenção sobre as doenças. Ou seja,
procedimentos e ações promotoras de saúde e de prevenção de doenças, aplicadas tanto ao indivíduo
quanto à coletividade de pessoas acometidas ou não por doenças (transmissíveis ou não transmissíveis),
encontram eco no âmbito do conhecimento da saúde humana.

Enquanto no modelo biomédico (unicausal) o conceito de saúde prevalece na condição lógica


exclusivamente em razão da ausência da doença (primordialmente sobre a doença infecciosa); no modelo
multicausal, sistematizado por Leavell e Clark (1976), privilegia-se o conhecimento da história natural da
doença. O conceito de saúde ganha estruturação explicativa pelo esquema da tríade ecológica (agente,
hospedeiro e meio ambiente). Com esses elementos, o proposto modelo epidemiológico englobaria o
modelo biomédico: “conjunto de processos interativos que cria o estímulo patológico no meio ambiente,
26
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

ou em qualquer outro lugar, passando pela resposta do homem ao estímulo, até as alterações que levam
a um defeito, invalidez, recuperação ou morte” (LEAVELL; CLARK, 1976, p. 46). Assim, o conhecimento
epidemiológico ganha novo método para delineamento sistemático da prevenção e controle de doenças
nas populações, uma vez expostos dois domínios possíveis de promoção da saúde: o meio externo, de
onde interagem determinantes e agentes em relação com o meio ambiente; e o meio interno, onde se
desenvolve a doença no organismo vivo. Os fatores externos contribuem para o adoecimento e estão
caracterizados pela natureza física, biológica, sociopolítica e cultural. O meio interno é o lugar individual
onde se processam modificações químicas, fisiológicas e histológicas próprias da enfermidade no
indivíduo doente – enfim, onde atuam fatores hereditário-congênitos, aumento/diminuição das defesas
e alterações orgânicas.

O processo natural da doença, assim instalado no corpo humano, evolui em dois períodos consecutivos:

• O período pré-patogênico, em que a patologia ainda não está manifesta, os determinantes


intrínsecos ao sujeito estruturam disposições ao adoecimento: são os agentes físicos e químicos,
biopatógenos, agentes nutricionais, agentes genéticos, determinantes econômicos, culturais
e psicossociais. Esse período etiológico está também designado no nível de atenção primária,
porque podemos atuar coletivamente agindo com ações de prevenção, promovendo a saúde (com
educação, por exemplo) e fazendo a proteção específica da saúde (por exemplo, com vacinas).

• O período patogênico, no qual já se encontra ativo o processo patológico, período em que a doença
se processa naturalmente no corpo do ser humano, iniciam-se as primeiras alterações no estado
de normalidade, pela atuação de agentes patogênicos. Seguem-se perturbações bioquímicas em
nível celular, provocando distúrbios na forma e função de órgãos e sistemas, evoluindo para as
seguintes possibilidades: defeito permanente (sequela), cronicidade, morte ou cura.

Almeida Filho e Rouquayrol (2002) afirmam que, embora o modelo multicausal da história natural
das doenças tenha por foco reconhecer no processo saúde-doença múltiplas determinações – e por isso
mesmo é que poderia representar um avanço na história da Epidemiologia –, é forte a influência que
recebe do hegemônico modelo biomédico. Para os autores, há uma tendência em valorizar de modo
secundário os determinantes sociais, sobre a qual fazem a seguinte crítica:

• a determinação dos fenômenos da saúde não se restringe à causalidade das patologias (patogênese);

• a história natural das doenças de maneira nenhuma é tão somente natural.

1.5.8 Variações na ocorrência de doenças no espaço e no tempo

A ocorrência de doenças, medida pelos coeficientes de mortalidade ou de morbidade, pode variar de


local para local em um mesmo tempo (variação no espaço), ou de época para época em um mesmo local
(variação no tempo). Tais variações constituem a expressão da intensidade variável de todos os fatores
de doenças que foram analisados e que atuam conjuntamente, com múltiplas e complexas interações,
na maioria das situações.

27
Unidade I

Variações no espaço

Comparações entre continentes, entre partes de um continente, entre países, entre regiões de um
mesmo país, entre localidades ou partes de uma localidade podem apresentar valores diferentes para
os coeficientes estudados. Assim é preciso relembrar o problema de comparabilidade dos dados, seja
quanto à composição das populações, seja quanto à fidedignidade das informações. Havendo condições
suficientes de comparabilidade, o achado de diferenças constitui ponto de partida valioso para que se
procure identificar a participação de fatores conhecidos em relação aos quais os locais comparados
difiram. Essa identificação orienta a adoção de medidas de prevenção.

Assim, se uma localidade apresenta coeficientes de morbidade para a febre tifoide, substancialmente
mais altos do que os observados em outras localidades vizinhas, é comum que se verifique uma
diferença nas condições do tratamento da água da rede de abastecimento, o que indica a forma de
resolver o problema.

Entretanto, quando não são identificadas condições para explicar as diferenças encontradas,
impõe-se a investigação das causas que provocam essa diferença entre os locais; que pode estar
relacionada às características dos habitantes ou dos agentes de doenças ou, ainda, ser dependentes de
fatores ambientais, naturais ou criados pelo próprio homem.

Muito do que se sabe sobre etiopatogenia de doenças, como aterosclerose, a hipertensão, o


diabetes entre outras, resultou de estudos de associações entre sua ocorrência e locais ou grupos
específicos de população.

Deve ser lembrada a importante comparação entre os coeficientes de mortalidade e de morbidade


referente aos habitantes de zonas rurais e urbanas. As cidades eram locais notoriamente insalubres,
especialmente porque, pela maior densidade da população e a inexistência de sistemas elementares
de saneamento básico, elas eram devastadas, periodicamente, por grandes epidemias de varíola,
cólera, peste e febre amarela, bem como apresentavam condições excepcionalmente favoráveis para a
propagação de doenças como a tuberculose e as infecções intestinais.

O saneamento, a melhoria das condições de habitação e as medidas de promoção da saúde


e de proteção específica contribuíram para que, na proporção da intensidade e extensão de sua
efetivação, a situação sanitária das cidades melhorasse; ao mesmo tempo, os progressos alcançados
no sentido de levar às populações rurais muitos dos benefícios da civilização transformaram
substancialmente as condições da vida rural nos países desenvolvidos, de forma que, neles, não
há diferenças apreciáveis nos coeficientes de mortalidade geral, por idade, na zona urbana e na
zona rural. Nas regiões menos desenvolvidas, as melhorias urbanas antecedem as rurais, podendo
inverter a posição histórica anteriormente referida.

Quando estudada a mortalidade por causas determinadas, ou de morbidade específica, diferenças


marcantes podem surgir entre as duas zonas. Em alguns casos, elas são explicáveis em função da densidade
populacional – doenças transmitidas por contágio imediato, especialmente gotículas, os habitantes de
zonas rurais não contraem ou o fazem mais tardiamente. Também pode-se considerar como uma distinção
28
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

entre as zona rural e a urbana as condições de saneamento – ancilostomose e algumas outras verminoses
são mais frequentes em zonas rurais onde haja contaminação superficial do solo com fezes humanas;
infecções intestinais bacterianas são mais frequentes em aglomerações urbanas sem saneamento básico.
E ainda as condições do meio biológico – doenças transmitidas por vetores, como a malária, mais frequentes
em zonas rurais; há exceções dependentes da biologia dos vetores, como é o caso do Aedes aegypti,
essencialmente urbano (BARCELLOS, 2009).

Devido ao seu caráter endêmico, a malária foi responsável em vários momentos da história por
tantas mortes quanto foram as guerras. Durante quase cinco séculos, devastou grande parte da Europa
e do resto do mundo (figura a seguir). O pior período da transmissão dessa doença na Europa tinha
o clima muito mais frio que o atual, durante a Pequena Idade do Gelo na Idade Média. Esta época
era caracterizada por condições sanitárias bastante degradadas. A partir do século XVIII, numerosas
modificações das condições de vida da população, como o saneamento, as melhorias das condições
de habitação, mas também as obras de drenagem, bem como as mudanças de utilização do solo e as
práticas agrícolas, promoveram um recuo da malária em diversas regiões do mundo. No Brasil, até a
década de 1970, havia o registro de incidência da malária em diversas regiões brasileiras, passando a se
reconcentrar mais recentemente na região amazônica.

2002
1994
1975
1965
1946
1900
Sem malária

Figura 2 – Retração das áreas de transmissão de malária no século XX

Saiba mais

O artigo a seguir pode melhor evidenciar a evolução progressiva de um


perfil de alta mortalidade por doenças infecciosas no país:

PRATA P. R. A transição epidemiológica Cadernos de Saúde Pública, Rio


de Janeiro, v. 8, n. 2, p. 168-175, abril/jun.1992. Disponível em: http://www.
scielosp.org/pdf/csp/v8n2/v8n2a08.pdf. Acesso em: 1 jun. 2015.

29
Unidade I

Variações no tempo

A apreciação das variações no tempo envolve a definição da magnitude dos períodos de tempo
sucessivos a serem comparados quanto à ocorrência do fenômeno em causa, seja a mortalidade, geral
ou específica, seja a morbidade para uma doença ou por um grupo de doenças.

Assim, podemos comparar os valores, em anos sucessivos, dos coeficientes de mortalidade geral, dos
coeficientes de mortalidade por câncer do pulmão ou por neoplasmas malignos, dos coeficientes de
incidência da hepatite infecciosa ou de gastroenterites; calculados para um período de ano-calendário,
para uma população, por exemplo.

As comparações em que o ano-calendário representa a unidade de tempo são as mais


frequentemente usadas, para estudo da evolução do fenômeno considerado, ao longo do tempo.
Evidentemente, coeficientes anuais podem ser calculados por um período de 12 meses, coincidindo
com o ano-calendário; assim calculados, a cada mês, sempre abrangendo os últimos 12 meses,
permitem um acompanhamento da tendência evolutiva do fenômeno em causa, sem que seja preciso
aguardar o término do ano-calendário. Com valores referentes a 12 meses, não podem ser apreciadas
variações para mais na ocorrência da doença, caracterizando a situação sob a designação de epidemia.
Para observar as eventuais diferenças estacionais (também referidas como sazonais), é adequado usar
o mês como unidade de tempo, para o cálculo dos coeficientes. Para fins de detecção de ocorrências
epidêmicas, a unidade de tempo conveniente é a semana; para uniformidade dos dados, são fixadas,
internacionalmente, as datas exatas de início de cada uma destas unidades de tempo, designadas por
“semanas epidemiológicas”.

A ocorrência de uma doença, em uma população, depende da interação do conjunto de fatores


relativos ao hospedeiro, ao agente e ao meio; fica fácil compreender que, variando a resultante da ação
dessa multiplicidade de fatores, como decorrência de pequenas variações da intensidade de atuação de
cada um deles, haverá uma variação na frequência de doença com as características que configuraram
a variação casual, ou seja, por obra do acaso.

Nessas condições, quando nenhum dos fatores, especialmente os de maior relevância, está operando
com intensidade não usual, as probabilidades de variação dos coeficientes, em torno do valor médio,
serão dadas pela distribuição normal de Gauss-Laplace. Essa forma de ocorrência de uma doença é que
recebe a designação de endemia; temos, então, um número de casos que oscila, em cada período, anual,
mensal ou semanal, em torno do valor médio, dentro de uma taxa de variação casual que caracteriza o
nível endêmico da doença para a população.

Distribuindo os casos observados, durante o ano, pelos meses em que ocorrem ou pelas semanas
epidemiológicas, verificamos, muitas vezes, que essa distribuição não é uniforme no decurso do ano,
apresentando variações que acompanham a sequência de estações, maiores do que as oscilações casuais
que poderiam ser esperadas.

As curvas de variação estacional da frequência diferem largamente, segundo as doenças: há as


que apresentam o máximo de incidência nos meses mais quentes (febre tifoide, poliomielite e outras
30
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

infecções entéricas, malária e outras doenças transmitidas por certos vetores biológicos ou em que
haja participação de vetores mecânicos, por exemplo); enquanto outras incidem mais nos meses
mais frios (infecções transmitidas pela via respiratória, como a difteria, a gripe, o resfriado comum,
a coqueluche, o sarampo, por exemplo; doenças transmitidas por vetores biológicos que infestam o
homem como ectoparasitas, como é o caso do piolho, da pulga e também do carrapato). Deve-se notar
que o relacionamento com as estações não se limita às doenças transmissíveis, bastando lembrar o caso
das doenças alérgicas dependentes de alérgenos mais abundantes em determinadas épocas do ano,
como acontece com os polens.

Em alguns casos, a transmissão por vetores está relacionada com as condições do meio que favoreçam
a multiplicação. Explicações para outros casos de variação estacional são, ou pouco convincentes, ou
inexistentes. Por este motivo, o estudo das variações e a busca de explicações para elas constituem uma
das formas pelas quais se pode focalizar o problema da causalidade das doenças, a pergunta: “o que há
de diferente, nas épocas comparadas, para causar uma variação na incidência de uma doença em uma
mesma população?” é o ponto de partida para tais investigações.

Outro tipo de variação, também apresentando um caráter cíclico ou periódico, é encontrado quando
os coeficientes de mortalidade ou de morbidade, referentes a uma série de anos, são examinados. Verifica-
se que, com intervalos mais ou menos regulares, há uma elevação dos valores dos coeficientes, tornando
possível a previsão da repetição do aumento ao fim de outros intervalos de tempo aproximadamente
iguais. Exemplos bem conhecidos são fornecidos pelo sarampo, pela rubéola, pela difteria e por algumas
outras doenças transmissíveis. Uma explicação plausível para este fenômeno envolve a consideração da
concentração de suscetíveis na população, medida pela percentagem de indivíduos em tal condição.
Suponhamos uma fonte de infecção, representada por um doente de sarampo; se a percentagem de
suscetíveis na população for alta, os comunicantes serão, provavelmente, suscetíveis, infectar-se-ão
e constituirão novas fontes de infecção. A doença se propaga pela população e um grande número
de casos ocorre. Se, ao contrário, a percentagem de suscetíveis for pequena, poucos ou nenhum dos
comunicantes serão suscetíveis, de forma que o número de novos doentes, e portanto de novas fontes
de infecção, será pequeno, reduzindo as probabilidades de propagação da doença. Assim, mesmo os
suscetíveis que existam, podem escapar ao risco de infecção.

Assim, com os nascimentos que ocorrem, vão sendo acrescentados novos suscetíveis à população
(de imediato ou após a extinção da imunidade passiva de origem materna); também pode, em
certos casos, haver migração de suscetíveis de outras regiões do estado ou do País. Se o número de
indivíduos que passam para imunes, pela doença, for menor do que os novos suscetíveis que surgem,
a proporção deles na população tenderá a crescer. Quando essa percentagem de suscetíveis alcança
um determinado valor que seria o crítico, estabelecem-se as condições acima descritas que levam
à ocorrência de maior número de casos. Para o sarampo, por exemplo, foi mostrado que esse valor
crítico corresponde a cerca de 40% de suscetíveis e que ele é novamente alcançado, depois de baixar
no ano de maior incidência, após cerca de três anos. Assim se explicam as exacerbações periódicas, ou
cíclicas, na incidência do sarampo ou da rubéola, a cada dois a quatro anos. Este prazo, para a difteria,
é usualmente de três a cinco anos. A falta de notificação impede que se disponha, entre nós, de dados
fidedignos para algumas doenças.

31
Unidade I

As variações da ocorrência de doenças no tempo apresentam em comum o caráter cíclico ou


periódico, repetindo-se a cada ano, no caso das variações estacionais, ou após um pequeno número de
anos, no caso das exacerbações periódicas.

De outra natureza são as variações que ocorrem gradualmente durante longos períodos de
tempo, décadas ou séculos, e que por isso se costuma designar por variações ou tendências
seculares. Seu estudo apresenta, usualmente, dificuldades marcantes, mas a importância dos
resultados que podem ser alcançados justifica o volume de trabalho que se desenvolve neste
campo. Devemos lembrar que, dadas as previsíveis mudanças no tamanho e na composição da
população, durante longos períodos de tempo, é preciso trabalhar com coeficientes por sexo e por
idade ou padronizados para sexo e idade.

Além disso, mesmo em países que há mais tempo dispõe de serviços estatísticos bem organizados, de
dados mais antigos, relativos à morbidade, existem (quando existem) apenas para doenças notificáveis
(especialmente algumas das transmissíveis) e para algumas outras, como as formas graves de doenças
mentais, que exijam hospitalização.

No caso das doenças notificáveis, é muito difícil admitir que a notificação tenha sido feita com
frequência suficiente ou, pelo menos, constante ao longo do tempo. Da mesma forma, é improvável que
as possibilidades de hospitalização tenham permanecido constantes. Por isso, o estudo das tendências
seculares tem sido feito, predominantemente, com dados de mortalidade.

Mesmo com esses dados, é necessário um cuidadoso exame do problema focando para apurar
se houve, realmente, modificação na frequência da doença, traduzida pela mortalidade, ou se
ocorreram modificações no diagnóstico, na classificação de causas de morte, na letalidade, na
forma de registro dos óbitos ou na própria composição da população no que diz respeito a outros
fatores, além de idade e sexo.

Variações locais na mortalidade geral ou específica podem surgir quando uma cidade se torna,
progressivamente, um centro médico de importância relevante para a região que a cerca. Se os
óbitos forem tabulados pelo local de sua ocorrência, e não pelo local de residência, o afluxo
de doentes que, vindos da região, procuram hospitais ou serviços existentes no centro maior,
promove um falso aumento da mortalidade que se acentua à medida que a área de influência da
cidade se expande (ALMEIDA, 1989).

Conforme pode ser visto na tabela 1, no Brasil, o coeficiente de mortalidade geral é maior entre
os homens em relação às mulheres, em todos os anos considerados. Contudo, ocorreu redução desse
coeficiente entre 1980 e 2007 (último ano com informações disponibilizadas pelo Sistema de Informação
de Mortalidade do Ministério da Saúde – SIM/MS) para ambos os sexos. Essa redução para o sexo
feminino foi de 13,2%, um pouco superior àquela verificada no masculino, 11,2%.

Da mesma forma, a proporção de óbitos masculinos foi superior em todos os anos considerados,
tendo apresentado ligeiro aumento, passando de 57,4% dos óbitos em 1980 para 58,9% em 1990,
retornando em 2007 para 57,5%, conforme dados da tabela.
32
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

No estado de São Paulo, pode-se observar que os coeficientes de mortalidade são superiores
aos nacionais em todos os anos (tabela 2), mas a redução do coeficiente entre os homens foi de
17,2%, entre 1980 e 2007, maior que a redução nacional e superior àquela observada entre as
mulheres, 13,9%.

A proporção paulista dos óbitos masculinos que, nos três primeiros anos considerados, era superior
à brasileira (alcançando 60% em 1990), em 2007, foi de 56,6%, menor que a observada no País.

Tabela 1 – Número de óbitos e coeficiente de mortalidade geral


(óbitos por mil habitantes) segundo sexo (Brasil – 1980, 1990, 2000 e 2007)1

Masculino feminino Total (2)


Anos
Nº % Coef. Nº % Coef. % Coef.
1980 431.161 57,4 7,3 318.483 42,4 5,3 750.727 6,3
1990 481.696 58,9 6,8 334.738 41,0 4,6 817.284 5,7
2000 552.127 58,3 6,6 393.606 41,6 4,6 946.686 5,6
2007 602.592 57,5 6,5 444.714 42,4 4,6 1.047.824 5,5
2007 – Último ano com informações disponibilizadas pelo MS.
(1)

(2)
Inclui os óbitos com a informação de sexo ignorado.

Fonte: São Paulo (2010).

Na análise dos óbitos do sexo masculino, no Brasil, segundo grupos etários, para os anos de 1980,
1990, 2000 e 2007, conforme a tabela 3, nota-se grande redução proporcional nos dois primeiros grupos
etários que atingiu 82% para os menores de 5 anos e 62% para os de 5 a 10 anos.

Esses fatos refletem a grande redução da mortalidade na infância verificada no País nas últimas
décadas. Deve-se acrescentar ainda o grande incremento verificado na proporção de idosos masculinos
(30% entre os de 60 a 79 anos e 134% entre os com mais de 80 anos).

Contudo, os números nacionais indicam queda pequena no grupo etário de 10 a 19 anos (5%) e
ampliação nos óbitos do grupo de 20 a 39 anos (17%) e de 40 a 59 anos (20%), indicando que essas
faixas etárias continuam submetidas a riscos de mortes evitáveis, provavelmente relacionadas com a
ampliação das mortes por violência.

No estado de São Paulo (tabela 4), pode-se observar que a queda no mesmo período (1980-2007)
foi maior para os grupos etários mais jovens, incluindo a redução significativamente maior no grupo de
10 a 19 anos (32%) e de 20 a 39 anos (10%). Na mesma tabela, nota-se que a tendência de redução dos
óbitos nas faixas etárias mais jovens manteve-se no estado, em 2009, conforme os dados apresentados
a seguir:

33
Unidade I

Tabela 2 – Número de óbitos e coeficiente de mortalidade geral (óbitos por mil habitantes)
segundo sexo (Estado de São Paulo – 1980, 1990, 2000 e 2007)1

Masculino feminino Total (2)


Anos
Nº % Coef. Nº % Coef. % Coef.
1980 103.181 58,8 8,2 72.226 41,2 5,8 175.408 7,0
1990 124.285 60,2 8,1 82.180 39,8 5,3 206.466 6,7
2000 142.505 59,6 7,9 96.451 40,4 5,1 238.959 6,5
2007 138.590 56,6 6,8 106.003 43,3 5,0 244.653 5,9
2007 – Último ano com informações disponibilizadas pelo MS.
(1)

Inclui os óbitos com a informação de sexo ignorado.


(2)

Fonte: São Paulo (2010a).

Tabela 3 – Número e proporção (%) de óbitos do sexo masculino


segundo faixa etária (Brasil, 1980, 1990, 2000 e 2007)

Faixa 1980 1990 2000 2007 Variação %


etária Óbitos % Óbitos % Óbitos % Óbitos % 1980 a 2007
0a4 118.973 27,6 63.538 13,2 44.219 8,0 29.804 4,9 -82,1
5a9 5.057 1,2 4.210 0,9 3.212 0,6 2.702 0,4 -61,8
10 a 19 13.764 3,2 16.790 3,5 18.749 3,4 18.371 3,0 -4,5
20 a 39 52.494 12,2 76.154 15,8 85.666 15,5 85.973 14,3 17,2
40 a 59 84.678 19,6 103.490 21,5 126.060 22,8 141.525 23,5 19,6
60 a 79 119.537 27,7 154.969 32,2 190.657 34,5 213.525 35.4 27,8
80 e mais 32.810 7,6 56.941 11,8 80.081 14,5 107.585 17,9 134,6
Tota(1) 431.161 100.0 481.696 100.0 552.127 100.0 602.592 100.0
Inclui óbitos com idade ignorada.
(1)

Fonte: São Paulo (2010a).

Tabela 4 – Número e proporção (%) de óbitos do sexo masculino


segundo faixa etária (Estado de São Paulo, 1980, 1990, 2000, 2007 e 2009)

1980 1990 2000 2007 Variação % 2009(1)


Faixa
etária Óbitos % Óbitos % Óbitos % Óbitos % 1980 a 2007 Óbitos %

23.505 22,8 12.949 10,4 7.598 5,3 5.007 3,6 -84,1 4.791 3,3
0 a4 827 0,8 801 0,6 532 0,4 452 0,3 -59,3 402 0,3
5a9 3.024 2,9 4.584 3,7 5.159 3,6 2.755 2,0 -32,2 2.452 1,7
10 a 19 13.234 12,8 22.441 18,1 24.611 17,3 15.971 11,5 -10,2 15.825 11,0
20 a 39 23.202 22,5 28.691 23,1 34.802 24,4 35.485 25,6 13,9 36.618 25,5
40 a 59 30.770 29,8 40.562 32,6 50.058 35,1 53.427 38,6 29,3 55,274 38,5
60 a 79 8.276 8,0 13.564 10.9 18.716 13,1 24.917 18,0 124,2 27,542 19,2

Tota(2) 103.181 124.285 142.505 138.590 143.421 100.0


2009 – Informações da Fundação Seade.
(1)

Inclui óbitos com idade ignorada.


(2)

Fonte: São Paulo (2010a).

34
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

2 MEDIDAS DE FREQUÊNCIA DE DOENÇA

No Brasil, Szwarcwald e Castilho (2000) estimaram que 536.920 pessoas com idade entre 15 e 49
anos eram portadoras de HIV em 1998, correspondendo a aproximadamente 0,61% da população nesta
mesma faixa etária. Desde o início da década de 1980, o número de notificações de Aids em indivíduos
com 13 ou mais anos de idade, segundo ano de diagnóstico, veio aumentando em todo País.

Esses números despertam o interesse de muitas pessoas e são citados pelos meios de comunicação
de massa, como em publicações especializadas. Eles nos permitem caracterizar, de diferentes maneiras,
a ocorrência da Aids. Em comum, estas estimativas expressam o quão diferente a infecção pelo HIV e a
Aids tem sido em diferentes momentos, regiões e populações humanas.

Tanto para a população leiga, como para os profissionais de saúde, interessa saber como a epidemia
vem evoluindo, se as atividades de prevenção vêm surtindo os efeitos esperados, se os tratamentos
disponíveis aumentam a sobrevida dos doentes, e se as políticas de saúde voltadas para o controle da
Aids têm sido adequadas. A Epidemiologia tem contribuído de forma consistente para a obtenção de
respostas a estas e outras indagações, relacionadas inclusive a outros problemas de saúde, como, por
exemplo, as doenças cardíacas, as neoplasias, a tuberculose, o diabetes e as violências. Independentemente
da complexidade dos estudos epidemiológicos, assim como dos métodos de análise empregados, tais
respostas baseiam-se em algum tipo de medida de frequência. Quantificar a frequência com que os
problemas de saúde ocorrem em populações humanas é um dos objetivos da Epidemiologia (UNITED
STATES AGENCY FOR INTERNATIONAL DEVELOPMENT, 1998).

As medidas de frequência são definidas a partir de dois conceitos epidemiológicos fundamentais


denominados prevalência e incidência. A prevalência define um número de casos existentes de uma
doença, em um dado momento. Já o conceito de incidência mostra a frequência com que surgem novos
casos de uma doença, num intervalo de tempo. No exemplo apresentado inicialmente, a estimativa
de 30 milhões de pessoas vivendo com HIV em 1998, em todo o mundo, é um exemplo de medida de
prevalência. Por sua vez, as notificações de novos casos de Aids em maiores de 13 anos exemplificam o
conceito de incidência (UNITED STATES AGENCY FOR INTERNATIONAL DEVELOPMENT, 1998).

Outras medidas frequentemente utilizadas na literatura médica e de saúde pública, como as de


mortalidade, letalidade e sobrevida, podem ser entendidas como variações do conceito de incidência.

Foram analisados os dados obtidos através do Sistema de Vigilância Epidemiológica de DST/Aids


do estado de São Paulo (SP), com o intuito de descrever o perfil da epidemia neste estado e discutir os
termos juvenilização, pauperização, heterossexualização e feminização que foram sendo introduzidos
no discurso desta epidemia, na tentativa de acompanhar as mudanças de seus padrões epidemiológicos.

O estado de São Paulo tem sido, desde os primórdios da epidemia, responsável por cerca de 50% do
total de notificações do país, sendo o município de São Paulo o que apresenta o maior número absoluto
de casos de Aids no Brasil, como seria de se esperar, dada a sua densidade populacional e suas demais
características de grande centro urbano.

35
Unidade I

O número de casos de Aids no estado de São Paulo com data de diagnóstico e de notificação até
31 de dezembro de 2001 é de 106.873 e destes, 44% (47.047 casos) são residentes no município de
São Paulo.

No início da epidemia no estado, a imensa maioria dos casos ocorria em homens, e os coeficientes
de incidência no sexo masculino eram expressivamente maiores do que no sexo feminino, mas houve
um aumento tão expressivo no número de casos em mulheres, que a relação masculino/feminino que,
em 1984, era de 27/1, aproxima-se de 2/1 em 1997 e se mantém neste nível, apresentando, a partir de
então, ligeira queda ano a ano (figura a seguir). Os coeficientes de incidência obedecem a um padrão
semelhante ao de número de casos, isto é, aumentam até 1995/1996 para os homens e para o total de
casos, e até 1998 para a população feminina (SANTOS et al., 2002).
50 Feminino Masculino Razão de sexo
30,0
45
Coef. incidência (por 100.000 hab.)

25,0
40
35
20,0

Razão de sexo
30
25 15,0
20
10,0
15
10
5,0
5
0 0,0
1980 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99
Ano de diagnóstico

Figura 3 – Coeficiente de incidência de Aids segundo sexo, razão de sexo e ano de diagnóstico, estado de São Paulo, 1980 a 1999

2.1 Prevalência e incidência

Medidas clínicas importantes de frequência ou probabilidade de eventos são frações nas quais o
numerador é o número de pacientes que experimentam o desfecho (casos), e o denominador é o número
de pessoas em que o desfecho poderia ter ocorrido. Tais frações são proporções matemáticas – mas, no
uso comum, são referidas frequentemente como “taxas” (rates).

Os clínicos encontram duas medidas de frequência: prevalência e incidência. Prevalência é a


fração (proporção) de um grupo de pessoas que apresenta uma condição clínica ou desfecho em
um determinado ponto no tempo. A prevalência é medida pelo levantamento de uma população
definida que contém pessoas com e sem a condição de interesse, num único corte de tempo. Há
dois tipos de prevalência:

• prevalência ponto – medida em cada pessoa no momento do estudo, embora não necessariamente
no mesmo momento para todas as pessoas na população definida;

36
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

• prevalência período – refere-se aos casos presentes em qualquer momento durante um período
específico de tempo.

Incidência é a fração ou proporção de um grupo inicialmente livre de uma condição clínica que se
desenvolve durante um determinado período de tempo. Refere-se então a novos casos de doença que
ocorrem em uma população inicialmente livre da doença; ou desfechos novos como incapacidade ou
morte, que ocorrem em pacientes com uma doença específica.

Cada medida de frequência de doença necessariamente contém indicação de tempo sobre a


população. Com medidas de prevalência, pressupõe-se que o tempo seja imediato, como um único
quadro de um filme em movimento. A prevalência mostra a situação naquele ponto no tempo para
cada um dos pacientes, mesmo que haja a possibilidade de levar várias semanas ou meses para adquirir
observações sobre as diferentes pessoas do grupo estudado. Na incidência, o tempo é essencial porque
ele define o intervalo no qual os indivíduos suscetíveis foram monitorados para detectar o aparecimento
do evento de interesse.

Por que é importante saber a diferença entre prevalência e incidência? Porque elas respondem a
duas questões diferentes:

• Qual a proporção de um grupo de pessoas que tem uma condição clínica?

• Qual a taxa de surgimento de casos novos em um grupo de pessoas com o passar do tempo?

A resposta a uma questão não pode ser obtida diretamente a partir da resposta a outra.

2.2 Medindo prevalência e incidência

2.2.1 Estudos de prevalência

A prevalência da doença é medida pelo levantamento de um grupo de pessoas, algumas doentes


naquele momento e outras sadias. A fração ou proporção do grupo que está doente (casos) constitui
a prevalência da doença. Tais avaliações ou levantamentos de uma população de indivíduos, incluindo
casos e não casos, são chamados de estudos de prevalência. Outro termo usado é o estudo transversal,
porque as pessoas são estudadas em um ponto no tempo (corte transversal). Esses estudos estão entre
os mais comuns de delineamentos de pesquisa relatados na literatura médica.

2.2.2 Estudos de incidência

Em contraste com a prevalência, a incidência é medida identificando inicialmente uma população


livre do evento de interesse, e então a acompanhando através do tempo com exames periódicos para
determinar a ocorrência do evento. A população em investigação em um estudo de incidência, referida
como uma coorte, pode ser constituída de indivíduos sadios seguidos para detectar a emergência da
doença, ou de indivíduos doentes seguidos para detectar os desfechos da doença.

37
Unidade I

Uma segunda abordagem para estimar incidência é medir o número de casos novos de uma população
mutável, em que os sujeitos estão em estudo e são suscetíveis à doença por diversos períodos de tempo.
A medida de incidência derivada de tais estudos é chamada algumas vezes de “incidência-densidade”.
Exemplos típicos são ensaios clínicos de tratamento crônico, em que os pacientes elegíveis são arrolados
por vários anos, de modo que aqueles que entram precocemente são tratados e acompanhados por
mais tempo do que os que entram mais tarde. Na tentativa de manter a contribuição de cada sujeito
proporcional ao seu intervalo de seguimento, o denominador de uma medida de incidência-densidade
não é as pessoas em risco por um período específico de tempo, mas as pessoas-tempo em risco para
o evento. Um indivíduo seguido por 10 anos sem se tornar um caso contribui com 10 pessoas-ano,
enquanto que um indivíduo seguido por um ano contribui apenas com uma pessoa-ano para o
denominador. A incidência-densidade é expressa pelo número de casos novos dividido pelo número
total de pessoas-ano em risco.

A abordagem de pessoas-ano também é útil para estimar a incidência de doença em grandes


populações de tamanho conhecido, quando se dispõe da contagem acurada de casos novos e da
estimativa da população em risco.

A desvantagem da abordagem de incidência-densidade é que ela junta períodos de seguimento de


tamanhos diferentes. Um número pequeno de pacientes seguidos por um longo período de tempo pode
contribuir para o denominador tanto quanto um número grande de pacientes seguidos por um curto
período de tempo. Se esses pacientes com seguimento longo diferirem sistematicamente daqueles com
seguimento curto, as medidas de incidência resultantes poderão ser viciadas.

2.3 Interpretando as medidas de frequência clínica

Para identificar uma prevalência ou incidência, o primeiro passo é a definição cuidadosa do


numerador e do denominador.

2.3.1 Definindo o numerador

Até agora, o termo geral “caso” tem sido usado para indicar um indivíduo que apresenta a doença ou
o desfecho de interesse. Em Epidemiologia clássica, os casos tendem a ser os indivíduos com a doença, e
a prevalência e a incidência referem-se à frequência desses casos sem grupos populacionais, como, por
exemplo, em residentes de uma comunidade. Na clínica, as decisões dependem da informação sobre a
frequência ou taxa de manifestações de doença, tais como sintomas, sinais ou anormalidades laboratoriais;
ou da frequência de desfechos de doenças, tais como morte, incapacidade ou melhora sintomática.

Para interpretar as taxas, é necessário saber a base em que o caso é definido, porque os critérios
usados para defini-lo podem afetar sobremodo as taxas. Para algumas condições, existem critérios
diagnósticos explícitos, amplamente aceitos. Esses critérios demonstram a especificidade requerida para
definir confiavelmente uma doença. Ilustram, também, o contrabalanço entre a definição rigorosa e a
realidade clínica. Se apenas casos considerados definitivos fossem incluídos numa taxa, a maioria dos
pacientes comumente considerados como portadores da doença não seriam incluídos. Por outro lado, a
inclusão de casos considerados prováveis poderia superestimar a verdadeira taxa da doença.
38
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Foram pesquisadas no país, em 2008, 217.709, 254.870 e 271.677 pessoas com 18 anos ou mais de
idade, nas PNADs (Pesquisa Nacional de Amostras de Domicílios) em 1998, 2003 e 2008, respectivamente.

A figura 4, mais adiante, mostra os coeficientes de prevalência de diabetes, segundo sexo e faixa
etária, no Brasil e isoladamente em todas as regiões, em 2008. A prevalência de diabetes entre mulheres
foi maior em comparação com os homens, com maior diferença entre os sexos na região norte, a partir
dos 60 anos. A região sul apresentou prevalência mais elevada entre as mulheres de 70 a 79 anos, em
torno de 21,5%. No entanto, entre os homens da mesma faixa etária, a maior prevalência foi registrada
na região centro-oeste, em torno de 17,3%. Em ambos os sexos, o diagnóstico da doença se torna mais
comum entre indivíduos com idade mais avançada, alcançando menos de 1% dos indivíduos entre 18 e
29 anos e mais de 10% dos indivíduos com 60 anos de idade e mais.

Em 1997 e 2003, o The Expert Committee on the Diagnosis and Classification of Diabetes Mellitus
(2003) reconheceu um grupo intermediário de indivíduos cujos níveis de glicose, embora não
satisfaçam os critérios para Diabetes Mellitus (DM), são elevados para serem considerados normais.
Esse grupo foi definido como Glicemia de Jejum Alterada (GJA) e Tolerância Diminuída à Glicose
(TDG), sendo considerados estágios intermediários na história natural do DM2, hoje conhecido como
pré-diabetes (SOUZA et al., 2012). A GJA é diagnosticada pela glicemia após 8 horas de jejum. A TDG
somente pode ser identificada por meio da realização do teste oral de tolerância à glicose (TTG).
Conforme padronizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), neste teste, é coletada glicemia
após jejum de 8 horas, e nova coleta é realizada após 2 horas da ingestão de 75 g de glicose. Durante
o teste, o paciente não deve realizar exercício físico ou fumar e, nos três dias anteriores ao teste, a
ingestão de carboidratos não deve ser inferior a 150 g, visto que dietas com quantidades menores
podem ocasionar resultados falso-negativos (FREITAS et al., 2012).

2.3.2 Definindo o denominador

Uma taxa é útil a um determinado clínico somente se ele pode decidir a que pacientes ela se
aplica. Para tanto é necessário conhecer o tamanho e as características de indivíduos dos quais os
grupos surgiram.

Normalmente o grupo incluído no denominador de uma taxa é referido como a população em risco,
que significa suscetível à doença ou o desfecho contado no numerador. Por exemplo, a incidência de
câncer de próstata será subestimada se a população em risco incluir mulheres.

O denominador de uma taxa deveria incluir a população relevante à questão em pauta, ou uma
amostra representativa dela. Mas o que é relevante depende da perspectiva de cada um. Por exemplo,
se quisermos saber a prevalência real de artrite reumatoide em norte-americanos, seria preferível incluir
no denominador uma amostra representativa de todo o povo dos Estados Unidos. Mas, se quisermos
saber a prevalência de artrite reumatoide na prática clínica – talvez a fim de planejar os serviços de
saúde –, o denominador relevante seria os pacientes vistos na prática ambulatorial, e não as pessoas
da população em geral. Em um levantamento na comunidade, somente 25% dos adultos com queixas
artríticas e reumáticas (não necessariamente artrite reumatoide) durante uma pesquisa tinham recebido
atendimento para tais queixas de algum profissional ou instituição de saúde (SPITZER et al.,1976).
39
Unidade I

25,0 Brasil 25,0 Região Norte


20,0 20,0
15,0 15,0
10,0 10,0
5,0 5,0
0,0 0,0
18-29 30-39 40-49 50-59 60-69 70-79 80 e + 18-29 30-39 40-49 50-59 60-69 70-79 80 e +
Faixa etária (anos) Faixa etária (anos)
Masculino Feminino Masculino Feminino

25,0 Região Nordeste 25,0 Região Sudeste


20,0 20,0
15,0 15,0
10,0 10,0
5,0 5,0
0,0 0,0
18-29 30-39 40-49 50-59 60-69 70-79 80 e + 18-29 30-39 40-49 50-59 60-69 70-79 80 e +
Faixa etária (anos) Faixa etária (anos)
Masculino Feminino Masculino Feminino

25,0 Região Sul 25,0 Região Centro‑Oeste


20,0 20,0
15,0 15,0
10,0 10,0
5,0 5,0
0,0 0,0
18-29 30-39 40-49 50-59 60-69 70-79 80 e + 18-29 30-39 40-49 50-59 60-69 70-79 80 e +
Faixa etária (anos) Faixa etária (anos)
Masculino Feminino Masculino Feminino

Figura 4 – Coeficientes de prevalência (%) de diabetes segundo sexo e faixa etária – Brasil e grandes regiões – Pesquisa
Nacional de Amostras de Domicílios (PNAD) (BRASIL, 2008)

Entre epidemiologistas, é comum pensar em uma população que consiste de todos os indivíduos residentes
em uma área geográfica. E isso deveria ser para estudos de causa e efeito na população geral. Mas, em estudos
de questões clínicas, as populações relevantes geralmente consistem de pacientes que sofrem determinadas
doenças ou apresentam certas características e que se encontram num cenário clínico parecido àquele em
que a informação será usada. Normalmente esses pacientes são encontrados em um número limitado de
centros clínicos, em que médicos acompanham os pacientes em contexto acadêmico. Podem constituir um
subgrupo pequeno e peculiar de todos os pacientes com tais características clínicas de uma área geográfica,
e podem até ser um grupo não usual de prática ambulatorial.

Qual diferença poderia fazer a escolha de uma população? A questão aqui reside na capacidade de
generalização das taxas observadas.

2.3.3 Amostragem

Dificilmente conseguimos estudar todas as pessoas que têm ou podem desenvolver a condição
de interesse. Normalmente toma-se uma amostra, de modo que o número estudado seja de tamanho
manejável. Isso traz uma questão: a amostra representa a população?

40
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Em geral, há dois modos de se obter uma amostra representativa. O primeiro é a amostra


aleatória simples, em que cada indivíduo da população tem igual probabilidade de ser selecionado.
O termo mais geral, amostra probabilística, é usado quando cada pessoa tem uma probabilidade
conhecida (não necessariamente igual) de ser selecionada. Com frequência torna-se importante
que a amostra inclua um número suficiente de membros de um subgrupo de particular interesse,
como minorias étnicas. Se esses grupos são pequenos, uma amostra aleatória simples de toda
a população pode não incluir número suficiente de membros do subgrupo. Para remediar esse
problema, um segundo modo de obter uma amostra representativa é selecionar aleatoriamente
uma percentagem maior de cada um desses subgrupos. A amostra final ainda representará o total,
se as diferentes frações amostrais forem levadas em conta na análise. Na média, as características
das pessoas nas amostras probabilísticas são similares às da população da qual foram selecionadas,
particularmente se uma amostra grande for escolhida.

Outros métodos de seleção de amostras podem ser viciados e não representarem a população-
fonte. A maior parte dos grupamentos de pacientes descritos na literatura médica e dos encontrados
na maioria das experiências de clínicos são amostras viciadas. Normalmente, pacientes são incluídos
nos estudos porque são atendidos em uma instituição acadêmica, estão disponíveis, concordam em
ser estudados e, talvez, também sejam casos particularmente interessantes e/ou gravemente afetados.
Não há nada de errado com tal conduta – desde que seja entendida a quem os resultados se aplicam
(ou não se aplicam).

2.4 Relação entre incidência, prevalência e duração da doença

Qualquer fator que aumente a duração da doença, ou da manifestação clínica em um paciente,


aumenta a chance de o paciente ser identificado em um estudo de prevalência (quadro a seguir). A
relação entre incidência, prevalência e duração da doença, em uma situação estável, isto é, quando
nenhuma das variáveis muda muito ao longo do tempo, é estimada pela expressão:

Prevalência = Incidência X Duração média da doença.

Quadro 2 – Características da incidência e da prevalência

Característica Incidência Prevalência


Casos novos que ocorrem durante o Todos os casos contados em
Numerador período de acompanhamento em um um único inquérito ou exame
grupo inicialmente livre da doença de um grupo
Todos os indivíduos
Todos os indivíduos suscetíveis que estão
Denominador examinados, incluindo casos e
presentes no início do acompanhamento não casos
Tempo Duração do período Ponto único
Estudo de prevalência (estudo
Como é medida Estudo de coorte transversal)

41
Unidade I

2.5 Viés em estudos de prevalência

Os estudos de prevalência podem ser usados para investigar potenciais relações causais entre fatores
de risco e uma doença, ou entre fatores prognósticos e um desfecho. Duas características de estudos de
prevalência são especialmente problemáticas: a incerteza sobre a sequência temporal e o viés associado
ao estudo de casos de longa duração – casos “velhos”.

Observação

Viés: é um termo usado em estatística para expressar o erro sistemático


ou tendenciosidade.

Exemplo: um estudo transversal mostra que pessoas que não consomem


álcool têm maior prevalência de angina.

2.5.1 Incertezas sobre sequências temporais

Em estudos de prevalência, a doença e seus possíveis fatores de risco são medidos no mesmo
momento e, assim, não fica claro o que veio primeiro. A sequência no tempo fica ambígua e, se ela
é importante na interpretação, precisa ser inferida. Se um fator de risco ou prognóstico sabidamente
antecede o início da doença ou o desfecho – por exemplo, história familiar ou marcador genético –, a
interpretação da sequência causal é menos preocupante. Se um fator de risco ou prognóstico pode ser
uma manifestação da doença ou do desfecho – em teste laboratorial anormal ou um estado psicológico –,
a determinação da sequência temporal fica bem mais difícil. Em contraste, os desenhos de estudo de
incidência incorporam a sequência de eventos, porque as causas possíveis são medidas inicialmente,
antes que a doença tenha ocorrido.

2.5.2 Vieses estudando casos “velhos”

Em um estudo de incidência, todos os casos são novos, e a maior parte dos casos que ocorrem nas
populações em risco pode ser identificada se seguidos com rigor através do tempo. Por outro lado, um
levantamento de prevalência inclui mesclas de casos novos e velhos, que estão disponíveis na ocasião de
um exame, isto é, identificam somente aqueles casos que são diagnosticáveis e estão vivos no momento
do levantamento. Assim sendo, as taxas de prevalência são constituídas de pacientes que foram capazes
de sobreviver à sua doença sem perder suas manifestações clínicas. As diferenças entre os tipos de casos
incluídos no numerador de uma incidência e os incluídos no numerador de uma prevalência podem
influenciar na interpretação dessas taxas.

A prevalência é afetada pela duração média da doença. Casos subitamente fatais da doença seriam
inclusos em um estudo de incidência, mas a maior parte deles não seria captada em um estudo de
prevalência. Por exemplo, 25 a 40% de todas as mortes por doença arterial coronariana ocorrem dentro
de 24 horas do início dos sintomas em indivíduos sem nenhuma evidência prévia de doença. Um estudo
de prevalência subestima os casos de doença arterial coronariana. Por outro lado, doenças de longa
42
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

duração são bem representadas em avaliações de prevalência, mesmo que sua incidência seja baixa. Por
exemplo, embora a incidência da doença de Crohn seja somente em torno de 2 a 7 por 100.000 por ano,
sua prevalência é acima de 100/100.000, refletindo a natureza crônica da doença (SEDLACK et al.,1980).

Taxas de prevalência também incluem seletivamente casos mais graves de doenças não fatais.
Pacientes poderiam não ser diagnosticados em estudo baseado nos sintomas e achados físicos atuais.
Do mesmo modo, pacientes com condições recorrentes, mas controláveis, podem estar bem em um
determinado momento e, assim, não serem descobertos por um único exame. Uma doença sem
remissão, por outro lado, é mais difícil de passar despercebida e, portanto, pode contribuir de modo
desproporcional ao montante de casos em um estudo de prevalência.

2.5.3 Usos de incidência e prevalência

Os médicos utilizam-nas de três maneiras diferentes: para predizer o curso futuro de um paciente;
para atribuir uma probabilidade a um paciente; para fazer comparações.

2.6 Sistemas de informação em saúde

Um sistema é um conjunto integrado de partes que se articulam para uma finalidade comum. Uma
característica fundamental dos sistemas de informação é a sua capacidade de agrupar um grande número
de registros, armazená-los e recuperá-los. Este segmento específico de um sistema de informações
corresponde às funções dos bancos de dados.

Serviços de atendimento em saúde usualmente registram suas atividades. Para realizar um estudo de
demanda, precisamos trabalhar com um conjunto de documentos: primeiro, a relação de atendimentos do
período que pretendemos estudar; a partir desta, levantamos os prontuários dos pacientes e completamos
sua identificação consultando o cadastro de pacientes. De posse deste conjunto de documentos, iremos
contar a frequência de ocorrência de determinados atributos de interesse e produzir um conjunto de
tabelas que caracterizam o perfil da demanda do serviço no período de estudo. Portanto, um conjunto
de objetos – pacientes, profissionais, turnos de atendimento, atividades – geram um número de registros
que são agregados segundo critérios preestabelecidos, criando um conjunto de números que resumem
os registros individuais.

2.6.1 Sistemas de gerenciamento de bancos de dados (SGBD)

Existem várias maneiras de organizar os dados em um SGBD. O tipo mais utilizado é o relacional, em
que a representação de arquivos é organizada em tabelas. Cada linha de uma tabela é um registro e cada
coluna, um campo. Um banco de dados é um conjunto de tabelas que podem ser ordenadas por uma ou
mais colunas, que são chamadas de chaves.

A existência de chaves permite a operação característica que dá nome a um SGBD relacional: a


criação de relacionamentos. A correta organização do desenho de um banco de dados é fundamental
para seu bom desempenho.

43
Unidade I

Para alcançar o objetivo de armazenagem, processamento e recuperação de informações, deve-se


manter um rígido controle de qualidade em todos os elementos que compõem o sistema de informação.

Em primeiro lugar, nenhum sistema pode fornecer informações de melhor qualidade que os
dados que o alimentam. Deve-se evitar ao máximo a multiplicação de etapas de transcrição de
dados, uma vez que, a cada nova etapa, multiplicam-se as chances de preenchimento incorreto.
Os dados devem ser captados o mais próximo possível de sua fonte produtora. Hoje em dia, com
o avanço da rede de computadores, esse objetivo é alcançável na maior parte dos casos. Além
desta estratégia, é comum a realização de três tipos de procedimento para reduzir a ocorrência
de erros na etapa de entrada de dados: a utilização de máscaras de edição, dígitos verificadores
e consultas on-line a tabelas.

2.6.2 Sistemas de informação em saúde no Brasil

Após o crescimento da difusão da tecnologia de informática em nosso País, tornou-se possível o


acesso ágil a bases de dados com informações variadas e desagregadas, sobre registros de nascidos
vivos, mortalidade, doenças de notificação, internações hospitalares, entre outras. Esses bancos de dados
analisados isoladamente ou relacionados representam fontes importantes que podem ser empregadas
rotineiramente na pesquisa científica no campo da saúde pública.

2.6.2.1 Sistemas de Informações sobre Mortalidade (SIM)

Na década de 1970, o Ministério da Saúde (MS) promoveu em Brasília reunião com o objetivo
de implantar um Sistema de Vigilância Epidemiológica em nível nacional. Na primeira reunião,
foi definido que o primeiro subsistema a ser implantado seria o da mortalidade – Sistema de
Informação sobre Mortalidade (SIM). Foi também aprovado o modelo único de Declaração de
Óbito (DO), e definidos fluxo e periodicidade dos dados a serem computados. Nas décadas de 1970
e 1980, o sistema foi todo processado em computadores de grande porte, tendo o MS processado
grande parte das informações.

Na década de 1990, com a implantação de um software desenvolvido pela Fundação Nacional de


Saúde (FNS), para a instalação do SIM em microcomputadores, foi possível a descentralização do SIM
para as Secretarias Estaduais de Saúde (SES).

Em 1994, foi desenvolvido um módulo para o SIM, chamado de Seleção de Causa Básica (SCB).
Este novo módulo seleciona a causa básica de óbito e, acoplado ao SIM, permite o seu uso em todos
os níveis do sistema de saúde. O SCB é considerado um facilitador do processo de descentralização
do SIM para as Secretarias Municipais de Saúde (SMS), entretanto, não elimina a necessidade de
treinamento de codificadores.

Em 1999, foi implantado um novo software do SIM – SIM para Windows, o novo sistema
desenvolvido pelo Datasus facilita o processo de crítica das variáveis, minimizando as inconsistências
nas bases de dados.

44
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

2.6.2.2 Fluxo de informações

As DO são impressas em três vias pré-numeradas sequencialmente, pelo MS, através do Centro
Nacional de Epidemiologia – Cenepi da Fundação Nacional de Saúde – FNS, e distribuídas pelas SES e
SMS, que as repassam aos estabelecimentos de saúde, institutos médico legais, serviços de verificação
de óbitos, médicos e cartórios. O sub-registro, dependendo da eficiência do fluxo utilizado na coleta dos
documentos, varia de estado para estado. O fluxo da declaração de óbito e o destino de cada uma das
três vias podem ser observados na figura a seguir:

Cartório de
Hospital Registro Civil

DN - 1ª via Preenche documento

2ª via
1ª via
3ª via
2ª via Arquiva
Família Encaminhar
3ª via

Secretaria de Secretaria de Unidade de


Cartório Arquiva
saúde saúde saúde

Figura 5 – Fluxo de declaração de óbito

Saiba mais

Para obter mais informações sobre o preenchimento correto da


Declaração de Óbito, acesse o documento no texto:

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Manual


de instruções para o preenchimento da declaração de óbito. Brasília, 2011.
Disponível em: http://svs.Aids.gov.br/download/manuais/Manual_Instr_
Preench_DO_2011_jan.pdf. Acesso em: 11 maio 2015.

2.6.2.3 Codificação das declarações de óbito

O codificador deve ser treinado no uso da Classificação Estatística Internacional de Doenças e


Problemas Relacionados à Saúde – CID. O codificador deve estar apto a saber selecionar a causa básica
da morte, definida como “a doença ou lesão que iniciou a cadeia de acontecimentos patológicos que
conduziram diretamente à morte, ou as circunstâncias do acidente ou violência que produziram a lesão
fatal” (BRASIL, 2001); a fazer crítica quanto ao correto preenchimento de todas as variáveis da DO e,
quando encontrar erros ou campos em branco, buscar a sua correção.

45
Unidade I

• Variáveis:

O formulário atual passou a ser utilizado em 1999, quando da implantação do SIM para Windows.
Este apresenta as seguintes variáveis subdivididas em nove blocos, descritas a seguir:

Bloco I – Cartório – Este bloco se destina a colher informações sobre o


Cartório do Registro Civil onde foi registrado o falecimento. O preenchimento
deste bloco é da exclusividade do Oficial do Registro Civil.

[...]

Bloco II – Identificação – Este bloco se destina a colher informações gerais


sobre a identidade do falecido e dos pais, em caso de óbito fetal ou de
menor de um ano.

[...]

Bloco III – Residência – Este bloco foi desmembrado do Bloco de


Identificação dos modelos anteriores, por questões operacionais, embora
esta variável faça parte do conjunto de identificação do falecido.

[...]

Bloco IV – Ocorrência – Este bloco foi desmembrado do Bloco de


Identificação, dos modelos anteriores. Destina-se a colher informações
sobre o local (área física e não geográfica) onde ocorreu o óbito.

[...]

Bloco V – Óbito fetal ou menor de um ano – Este bloco se destina a colher


informações sobre a mãe, no que se refere à idade, grau de escolaridade,
ocupação, gestação, tipo de parto e peso ao nascer. Deve ser obrigatoriamente
preenchido em casos de óbito fetal ou óbito em menor que um ano.

[...]

Bloco IV – Condições e causas do óbito – Este bloco se destina a


qualificar as condições e causas que provocam o óbito. Contempla o modelo
internacional de Atestado de Óbito adotado pela Organização Mundial de
Saúde – OMS, desde 1948.

[...]

Bloco VII – Médico – Este bloco se destina a colher informações básicas


sobre o médico que assina a Declaração de Óbito – DO.

[...]

46
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Bloco VIII – Causas Externas – Este bloco se refere às causas externas


de óbito. As informações relativas às mortes violentas e acidentais (não
naturais) são de grande importância epidemiológica e são um complemento
ao Bloco VI (BRASIL, 2001, 13-29).

Para efeito de crítica e correção dos dados, as variáveis de cada óbito são classificadas em:

• Indispensáveis – ano do óbito, tipo de óbito, município de ocorrência e causa básica. Não são
computados os óbitos que não tenham a definição dessas variáveis.
• Essenciais – sexo, idade, município ocorrência e de residência, causa básica e tipo de violência.
Essas variáveis que são as mais frequentemente usadas em estudos de mortalidade, têm prioridade
para crítica e correção dos dados.
• Secundárias – todas as demais, embora todas tenham grande importância, mas pelo menor uso
e maior dificuldade de obtenção de níveis satisfatórios de qualidade, não têm caráter prioritário
para crítica.

O Cenepi (Centro Nacional de Epidemiologia) – MS é o responsável pela consolidação das bases


estaduais, fazendo mais uma crítica da base antes de disponibilizar o banco de dados para os usuários.

São possíveis quaisquer tipos de cruzamento destas variáveis. As bases de dados para tabulação
podem ser obtidas através das homepages do Cenepi, Datasus e ainda através do cd-rom distribuído
pela Datasus. As variáveis referentes a nome de falecido e de seus pais, nome do médico e CRM não
estão disponibilizadas, por questões éticas.

Em nível nacional, o SIM está sob a gerência do Cenepi – MS; no estado, das Secretarias Estaduais
de Saúde e no município, das Secretarias Municipais de Saúde. O Sistema tem ainda, como órgãos
assessores de apoio, o Datasus – MS, o Centro Brasileiro de Classificação de Doenças – CBCD – USP e os
Centros de Referência e Treinamento – CRTs (Pernambuco, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul).

• Indicadores:

Entre os indicadores mais difundidos e mais frequentemente elaborados com dados do SIM,
combinados ou não com dados populacionais, destacam-se:

• mortalidade proporcional por causas;

• mortalidade proporcional por faixa etária;

• taxa ou coeficiente de mortalidade geral;

• taxa ou coeficiente de mortalidade por causas e/ou idade específicas;

47
Unidade I

• taxa ou coeficiente de mortalidade infantil;

• taxa ou coeficiente de mortalidade materna.

Embora esses indicadores permitam uma boa avaliação de diferenças existentes entre regiões, outros
mais específicos podem ser construídos. A Rede Integrada de Informações para a Saúde (Ripsa) propõe,
por exemplo, a utilização da porcentagem de óbitos sem assistência médica e por causas mal definidas
no total de óbitos registrados.

A tabela 5 apresenta as SMRs gerais e por grupos de causas de morte, ajustadas por faixa etária
e período de anos-calendário, para a coorte de eletricitários. A SMR, para o conjunto de causas de
morte, mostra uma mortalidade menor na coorte de eletricitários. Da mesma forma, as SMRs, para os
diferentes grupos de causas de morte, apresentaram valores abaixo da unidade.

Tabela 5 – Razões padronizadas de mortalidade (SRMs) por grupos de causas


de morte e respectivos intervalos de confiança

Óbitos Óbitos
Grupos de causas de morte SMR IC 95%
observados esperados
Doenças infecto-parasitárias 13 45,5 0,29 0,17-0,50
Neoplasmas 96 130,9 0,73 0,60-0,90
Doenças de sangue 2 2,0 0,99 0,25-3,95
Doenças das glândulas endócrinas 16 73,2 0,22 0,13-0,36
Doenças do sistema nervoso 1 9,1 0,11 0,01-0,78
Doenças do aparelho circulatório 176 334,9 0,52 0,45-0,60
Doenças do aparelho respiratório 32 75,6 0,42 0,30-0,60
Doenças do aparelho digestivo 28 87,7 0,32 0,22-0,46
Doenças do aparelhogênito-urinário 4 11,5 0,35 0,13-0,93
Causas externas 106 238,9 0,44 0,37-0,54
Todas as causas 498 1.069,6 0,47 0,43-0,51
IC = Intervalo de Confiança

Fonte: Mattos; Sauaia; Menezes (2002, p 227).

2.6.2.4 Sistema de Informações Sobre Nascidos Vivos – Sinasc

Em 1989, foi realizado o Seminário Nacional sobre Informações, quando foram estabelecidas as
bases normativas e operacionais para um Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos, tendo em vista
a importância dessas informações para a construção de indicadores epidemiológicos usados na área da
saúde. Este seminário foi realizado sob a responsabilidade do Grupo de Estatísticas Vitais do Ministério
da Saúde – Gevims, criado através da Portaria 649/GM/MS, de 4 de julho de 1989 (BRASIL, 1989).
Em 1994, foi implementado gradualmente, pelo Ministério da Saúde, o Sistema de Informações sobre
Nascidos Vivos – Sinasc.

O objetivo do Sinasc é reunir informações epidemiológicas referentes aos nascidos vivos em todo
território nacional, tendo como população-alvo toda a população brasileira; sua abrangência geográfica
é nacional, com detalhamento no nível estadual e municipal (BRASIL, 2015).

48
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

A Declaração de Nascido Vivo (DN) é padronizada e é distribuída, em três


vias, para todo o país pelo Ministério da Saúde. A cada parto realizado nos
hospitais ou em outras instituições de saúde, a primeira cópia da DN deve
ser preenchida e enviada para o respectivo departamento de saúde. No caso
de parto residencial, a informação é enviada por um Cartório de Registro
Civil (BRASIL, 2015).

Em 1999, foi implantado um novo software do Sinasc – “Sinasc para Windows”, o novo sistema
desenvolvido pelo Datasus, facilitando o processo de crítica das variáveis e diminuindo as inconsistências
nas bases de dados.

Em 5 de junho de 2012, foi sancionada a Lei nº 12.662 que “assegura validade nacional à Declaração
de Nascido Vivo – DNV, regula sua expedição, altera a Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973, e dá
outras providências” (BRASIL, 2012).

A DNV deve ser preenchida para todos os nascidos vivos no país, o que, segundo conceito definido
pela OMS, corresponde a

[...] todo produto da concepção que, independentemente do tempo de


gestação ou peso ao nascer, depois de expulso ou extraído do corpo
da mãe, respire ou apresente outro sinal de vida tal como batimento
cardíaco, pulsação do cordão umbilical ou movimentos efetivos dos
músculos de contração voluntária, estando ou não desprendida a
placenta” (BRASIL, 2007).

No caso de gravidez múltipla, deve ser preenchida uma DNV para cada criança nascida viva.

A Declaração de Nascido Vivo (DNV) é impressa em papel especial autocopiativo, em três vias,
compondo um jogo com numeração sequencial. Cada bloco contém 30 jogos de formulários. Em
função das características do local de ocorrência do nascimento (hospital, outros estabelecimentos
de saúde, via pública, domicílio ou outro, em conformidade com o Campo 7 do Bloco II), o fluxo
da DN varia, de acordo com o disposto nos artigos 30 a 33 da Portaria nº 116 (BRASIL, 2009).
Segundo o Manual de Preenchimento da Declaração de Nascido Vivo (SÃO PAULO, 2011), devem-se
considerar as:

• Variáveis

Bloco I – identificação do recém-nascido: se destina a colher informações inerentes ao nascido


vivo e contém seis campos.

Bloco II – local da ocorrência: destina-se a colher informações sobre o local onde ocorreu o parto
e contém sete campos.

49
Unidade I

Bloco III – mãe: contém quatorze campos, contempla informações sobre a mãe do recém-nascido
e algumas de suas características tais como escolaridade, ocupação habitual e situação conjugal.

Bloco IV – pai: com apenas dois campos, se destina a colher informações sobre o nome e idade do
pai do nascido vivo a que se refere a DNV.

Bloco V – gestação e parto: com onze campos, destina-se a colher informações sobre as
gestações anteriores (campo 30), a gestação atual (campos 31 a 35), o parto e suas intercorrências
(campos 36 a 40).

Bloco VI – anomalia congênita: com apenas um campo e de natureza descritiva, será preenchido
quando no campo 6 do Bloco I tiver assinalada a opção “1. Sim”. Nele serão informadas as anomalias
congênitas verificadas pelo responsável pelo parto.

Bloco VII – preenchimento: refere-se à identificação do responsável pelo preenchimento da DNV,


constando seis campos.

Bloco VIII – cartório: com cinco campos, destina-se a colher os dados referentes ao Cartório de
Registro Civil onde foi efetuado o registro do nascimento, bem como o número e data do registro.
A responsabilidade pelo seu preenchimento é exclusiva do Oficial do Registro Civil (cartórios).

Cartório de
Hospital Registro Civil

Preenche Preenche documento

1ª via
1ª via
2ª via
2ª via
3ª via
3ª via

Encaminha Família Encaminhar Arquiva

Secretaria de Cartório de Secretaria de


saúde Registro civil saúde

Arquiva

Figura 6 – Art. 30 da Portaria nº 116 de 11 de fevereiro de 2009. Fluxo de Declaração de Nascido Vivo.

50
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Saiba mais

Para obter informações sobre o preenchimento do formulário de


Declaração de Nascido Vivo, acesse o texto:

BRASIL. Ministério da Saúde. Guia de vigilância epidemiológica. Brasília,


2005, p. 70, p. 74-77. (adaptado). Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/
wps/wcm/connect/3463ca004745920f9a61de3fbc4c6735/Guia_Vig_Epid_
novo2.pdf?MOD=AJPERES. Acesso em: 11 maio 2015.

• Indicadores:

Entre os indicadores mais difundidos e mais frequentemente elaborados com dados do Sinasc
combinados ou não com dados populacionais, destacam-se:

A) taxa bruta de fecundidade;

B) taxa bruta de natalidade;

C) taxa ou coeficiente de mortalidade infantil;

D) taxa ou coeficiente de mortalidade materna;

E) proporção de mães adolescentes;

F) proporção de partos cesáreos.

Embora esses indicadores permitam uma boa avaliação de diferenças existentes entre regiões,
outros mais específicos podem ser construídos, como propõe a Rede Integrada de Informações para
a Saúde (Ripsa).

2.6.3 Classificação internacional de doenças

O uso internacional de uma classificação de doenças, para codificar diagnósticos e construir


estatísticas, permite que se façam comparações entre áreas diferentes, inclusive entre vários países. A
classificação deve ser abrangente para conter todos os diagnósticos possíveis e satisfazer os locais onde a
tecnologia e a atenção médica são bastante desenvolvidas como também locais sem essas características
e onde os diagnósticos, algumas vezes, ainda são expressos como sintomas ou sinais. A Classificação
Internacional de Doenças (CID) permite todas as possibilidades de codificação já mencionadas e,
mesmo no caso do aparecimento de uma doença nova, quando há meios de se criar um código para
classificá-la, nem sempre ela é totalmente adequada a algumas necessidades. Exemplo pode ser dado
em relação ao câncer. A CID classifica as neoplasias de acordo com o comportamento (maligno, benigno,
51
Unidade I

in situ etc.) e a localização anatômica. Para profissionais da área de oncologia, saber se um tumor está
na pequena ou na grande curvatura do estômago não é suficiente. A informação adequada seria aquela
que registre também o tipo de célula que forma o tumor ou ainda o estadiamento deste. Para contornar
essa dificuldade, a classificação permite, com o uso de códigos adicionais de uma adaptação da CID para
morfologia dos tumores, a codificação do tipo de célula.

Lista CID-10

A Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (também


conhecida como Classificação Internacional de Doenças – CID 10) é publicada pela Organização
Mundial de Saúde (OMS) e visa a padronizar a codificação de doenças e outros problemas
relacionados à saúde. Ela fornece códigos relativos à classificação de doenças e de uma grande
variedade de sinais, sintomas, aspectos anormais, queixas, circunstâncias sociais e causas
externas para ferimentos ou doenças. A cada estado de saúde é atribuída uma categoria única à
qual corresponde um código CID 10 ([s.d.]).

Consulta CID-10

São possíveis três formas de consultas a CID-10: em formato Help para Windows, em formato HTML
(pelo navegador da internet) e por um programa de pesquisa por termos – Pesqcid. Os dois primeiros
têm conteúdo idêntico, variando apenas o software de apresentação. O terceiro apresenta recursos mais
sofisticados de pesquisa.

2.6.4 Epidemiologia hospitalar

O objetivo da vigilância epidemiológica hospitalar é detectar e investigar doenças de notificação


compulsória atendidas em hospital. A Portaria nº. 2.529, de 23 de novembro de 2004, da Secretaria de
Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde – SVS/MS (BRASIL, 2004), instituiu o Subsistema Nacional de
Vigilância Epidemiológica em Âmbito Hospitalar com a criação de uma rede de 190 núcleos hospitalares
de Epidemiologia (NHE) em hospitais de referência no Brasil.

A finalidade da criação do subsistema é o aperfeiçoamento da vigilância epidemiológica a partir da


ampliação de sua rede de notificação e investigação de agravos, em especial doenças transmissíveis,
com aumento da sensibilidade e da oportunidade na detecção de doenças de notificação compulsória
(DNC). A notificação de DNC permite ao município a adoção de medidas de controle, possibilitando a
interrupção da cadeia de transmissão de doenças entre a população. A instituição da rede de hospitais de
referência serve de apoio para o planejamento das ações de vigilância e constitui ferramenta importante
para o planejamento e gestão hospitalar.

Os profissionais dos núcleos detectam agravos ou DNC a partir da busca em locais estratégicos no
hospital, como o pronto-socorro, unidades de internação, laboratório e ambulatório. Outras fontes
importantes para o conhecimento de agravos de notificação no hospital são a farmácia, o Serviço de
Arquivo Médico (Same) e o laboratório de anatomia patológica. O planejamento e a priorização das
ações com a estruturação das fontes na investigação de casos dependem do tipo de hospital e do
52
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

seu grau de complexidade. É importante a avaliação do perfil do hospital (doenças infecciosas, geral
ou pediátrico), número de leitos, e as unidades de internação (leitos de doenças infecciosas, leitos
pediátricos, leitos gerais).

As fichas de atendimento de pronto-socorro devem ser verificadas diariamente para identificação


de DNC a partir de uma triagem de diagnósticos prévia, dependendo do volume de atendimento e
do perfil hospitalar. Para as unidades de internação, é fundamental a visita diária dos profissionais
do núcleo às enfermarias de doenças infecciosas, pediátricas e clínica médica, bem como às unidades
de terapia intensiva e prontos-socorros. Outras unidades, clínicas e cirúrgicas, devem ser avaliadas
de acordo com a realidade de cada hospital. É fundamental a parceria com o laboratório clínico e
anatomopatológico para o êxito das investigações, pois todos os exames solicitados para DNC deverão
ser conhecidos imediatamente pelo núcleo. Caso a suspeita de DNC não tenha sido detectada pelo
NHE, é possível a notificação oportuna para a implementação de medidas de controle necessárias,
segundo as normas de vigilância epidemiológica. Para o encerramento do caso, é fundamental o acesso
aos resultados laboratoriais e ao prontuário de alta, para o preenchimento da ficha epidemiológica
referente aos campos: evolução, confirmação e critério de confirmação. A integração de todos os
setores do hospital permite ampliar a sensibilidade do sistema da vigilância hospitalar. A investigação
epidemiológica das DNCs é efetuada a partir de fichas epidemiológicas do Sistema Nacional de
Agravos de Notificação (Sinan), específicas para cada agravo.

As fichas epidemiológicas são digitadas no banco do Sinan, com transferência periódica para o
município, conforme estabelecido no sistema de vigilância. A análise do banco de dados das DNCs –
Sinan é realizada pelos profissionais do NHE, com ampla divulgação para todos os profissionais e para a
direção do hospital, permitindo sua utilização na gestão hospitalar.

O Subsistema Nacional de Vigilância Epidemiológica em Âmbito Hospitalar é integrado por todo


hospital em funcionamento no território nacional, independente de sua natureza e da existência
de relação para a prestação de serviços ao Sistema Único de Saúde (SUS). Para os estabelecimentos
integrantes da Rede do SUS, foi instituído o Fator de Incentivo para os Hospitais de Referência
do Subsistema Nacional de Vigilância Epidemiológica em âmbito Hospitalar – FIVEH, transferido
mensalmente do Fundo Nacional de Saúde para os Fundos Estadual ou Municipal de Saúde, que
repassa o recurso diretamente para o hospital. A rede proposta na portaria contemplou 190 Núcleos
Hospitalares de Epidemiologia (NHE) em hospitais de referência no Brasil. Para habilitação e para
recebimento de recursos financeiros do FIVEH, os serviços foram categorizados em três níveis, tendo
como critério de seleção o enquadramento em, no mínimo, uma das condições a seguir:

1. Nível I:

— hospital de referência regional com unidade de emergência e UTI;

— hospital de fronteira internacional com no mínimo 50 leitos;

— hospital geral ou pediátrico, universitário ou de ensino, com no mínimo 100 leitos.

53
Unidade I

2. Nível II:

— hospital geral ou pediátrico, universitário ou de ensino, com no mínimo 100 leitos;


— hospital geral ou pediátrico, universitário ou de ensino, entre 100 e 250 leitos, com unidade de
emergência e UTI;
— hospital especializado em Doenças Infecciosas com menos de 100 leitos.

3. Nível III:

— hospital especializado em Doenças Infecciosas com mais de 100 leitos;


— hospital geral com mais de 250 leitos, com unidade de emergência e UTI.

A sensibilização dos profissionais por meio da retroalimentação é importante para que eles participem
de forma ativa. Vale ressaltar a importância do desenvolvimento de programas para o treinamento de
estudantes, aprimoramento profissional e pós-graduação. Nos NHEs, em especial hospitais universitários, a
capacitação teórico-prática em vigilância epidemiológica em âmbito hospitalar constitui área importante
de aprendizagem clínico-laboratorial e Epidemiologia de DNC, com interface direta entre a assistência e
a prevenção de doenças. À Coordenação Estadual do Subsistema de Vigilância Epidemiológica em Âmbito
Hospitalar, compete proceder à normalização técnica complementar em nível federal, de acordo com a
realidade do seu estado, e apoiar os hospitais na implantação do NHE. Outras funções importantes da
coordenação são: assessorar tecnicamente e supervisionar as ações de vigilância epidemiológica dos NHEs
e monitorar e avaliar seu desempenho, em articulação com os gestores municipais.

2.7 Indicadores de saúde

Em geral, o termo “indicador” é utilizado para representar ou medir aspectos não sujeitos à observação
direta; a saúde está inserida neste caso, assim como a normalidade, a qualidade de vida e a felicidade.

Os indicadores de saúde passam a ser utilizados quando se mostram relevantes, quando são capazes
de retratar com fidedignidade e praticidade, seguidos os preceitos éticos, os aspectos da saúde individual
ou coletiva para os quais foram propostos.

Os indicadores mais apropriados a serem usados em avaliações na área da saúde são:

• validade;
• reprodutibilidade;
• representatividade (cobertura);
• obediência a preceitos éticos;
• oportunidade, simplicidade, facilidade de obtenção e custo compatível.

54
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Validade

No processo de seleção de um indicador a ser usado para refletir uma dada situação, a tarefa inicial
é a delimitação do problema, condição, tema ou evento que necessita ser observado ou medido e para
o qual se escolhe o indicador e se elabora respectiva definição operacional. Alto grau de qualidade
refere‑se à adequação do indicador para medir, ou representar, sinteticamente, o fenômeno considerado.
O indicador deve ser capaz de discriminar corretamente um dado evento de outros, assim como detectar
as mudanças ocorridas com o passar do tempo.

Confiabilidade (reprodutibilidade ou fidedignidade)

Alto grau de confiabilidade significa a obtenção de resultados semelhantes, quando a mensuração


é repetida. Um indicador de baixa confiabilidade não tem utilidade prática, enquanto um de alta
confiabilidade também só tem utilidade se for de alta validade. Estas duas questões metodológicas,
validade e confiabilidade, têm de ser adequadamente resolvidas para que o indicador reflita, com
propriedade, a característica objeto da mensuração.

Representatividade (cobertura)

A representatividade alcançada pelo indicador é outro ângulo a ser considerado. Cobertura é também
um termo muito utilizado com este propósito. Um indicador sanitário será tanto mais apropriado quanto
maior cobertura populacional alcançar.

Quando o indicador provém de um sistema de amostragem, a sua representatividade é garantida


pela utilização de um processo adequado de seleção de unidades componentes da amostra e por um
trabalho de campo que alcance todas, ou quase todas, as unidades que foram selecionadas.

Questão ética

É um imperativo ético que a coleta de dados não acarrete malefícios ou prejuízo às pessoas
investigadas. Isto poderia ocorrer, por exemplo, com a utilização de técnicas invasivas de diagnóstico,
as quais, em vista dos efeitos colaterais, devem ser evitadas quando se almeja quantificar o problema
na coletividade.

A questão ética também se impõe no tocante ao sigilo dos dados individuais, embora este aspecto
seja mais importante em clínica do que em diagnósticos epidemiológicos, pois, nesse caso, a informação
divulgada refere-se ao conjunto da população sob a forma anônima de estatísticas.

O ângulo técnico-administrativo

Do ponto de vista técnico-administrativo, o emprego de indicadores exige consideração detalhada


de outras características, como simplicidade, flexibilidade, facilidade de obtenção, custo operacional
compatível e oportunidade.

55
Unidade I

Observação

Os indicadores de saúde:

• medem a saúde;

• apresentam o risco de adoecer;

• apresentam o risco de morrer;

• mostram a gravidade ou fatalidade;

• mostram os grupos mais atingidos.

2.7.1 Expressão dos resultados

A preparação de indicadores envolve a contagem de unidades – doentes, inválidos, acidentados,


óbitos, episódios etc. – ou a medição de alguma característica em indivíduos e no ambiente: peso, altura,
nível de pressão arterial, de glicose, de colesterol e de mercúrio são exemplos. A maioria dos indicadores
utilizados na rotina é de preparação simples, resumindo-se na contagem das pessoas com determinadas
características e na expressão dos resultados de maneira conveniente.

2.7.1.1 Resultados expressos em frequência absoluta

A forma mais simples de expressar um resultado é através do número absoluto. A imprensa o utiliza
rotineiramente: em um determinado local, foram detectados cinco casos de tuberculose durante o
ano. Tal expressão tem limitações por não se apoiar em pontos de referência que permitam melhor
conhecimento da situação. Se, por coincidência, aqueles números são relativos a residentes em um
pequeno orfanato, a situação é grave; se referem-se à população de um estado, o quadro muda de figura,
tornando-se muito menos sombrio. Mas a apresentação da frequência em números absolutos, por vezes,
é suficiente para causar o impacto desejado. As comparações regionais e as em séries temporais estão,
muitas vezes, nesse caso.

2.7.1.2 Resultados expressos em frequência relativa

Para facilitar as comparações e as suas interpretações, os valores absolutos são expressos em


relação a outros valores absolutos que guardem entre si alguma forma de relação. Vejamos alguns
detalhes destas formas de expressão de frequência relativa, conservando as denominações mais
empregadas para designá-las.

56
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

• Coeficiente (ou taxa)

Nos coeficientes, o número de casos é relacionado ao tamanho da população da qual eles procedem.

Estrutura de um coeficiente:

Coeficiente = Número de casos X constante


População sob risco

Em que:

— No numerador: os casos (de doença, incapacidade, óbito, indivíduos com determinadas


características etc).

— No denominador: a população sob risco (de adoecer, de se tornar incapacitada etc). É o grupo
de onde vieram os casos.

— Constante = 10, 100, 1000, 10 000, 100 000, 1 000 000 etc.; pode ser qualquer múltiplo de
10, que evite muitos decimais e melhor expresse o resultado do final. A constante facilita
a comunicação dos resultados; estes podem ser expressos a constantes; por exemplo, 0,02
significa 2% e 0,002 é o mesmo que 2‰

• Índice

Na área da saúde, o termo “índice” é usado com, pelo menos, dois significados:

— de indicador multidimensional;

— de expressão de um evento sob a forma de frequência relativa, excetuados os coeficientes.

No cálculo dos índices em questão, ao contrário dos coeficientes, o número de casos não está
relacionado à população da qual eles procedem. Por isso, eles não medem risco e, sim, a relação entre
os eventos. Desta maneira, a comparação de índices que usam esta forma de exposição dos resultados
deve ser interpretada com cuidado, pois as diferenças podem ser devidas a mudanças no numerador ou
no denominador dos índices comparados.

Na preparação de um índice, é colocado no numerador o número de eventos de certo tipo; no


denominador, o número de outro tipo de evento. Duas situações podem ocorrer em função de casos
colocados no numerador estarem ou não inclusos no denominador.

Os casos incluídos no numerador são, também, colocados no denominador: trata-se da distribuição


proporcional de casos, que é extensamente utilizada, por sua simplicidade.

57
Unidade I

Os casos incluídos no numerador não são colocados no denominador: a frequência de um evento é


comparada à de outro.

2.7.2 Principais indicadores de saúde

O conhecimento das condições de saúde de uma população implica o manuseio adequado de


numerosas informações.

Em avaliações realizadas na área da saúde, são utilizados indicadores negativos, como a mortalidade
e a morbidade, em lugar dos positivos, do tipo bem-estar, qualidade de vida e normalidade. Alguns outros
indicadores não se enquadram na classificação de positivos ou negativos, sendo exemplos a natalidade
e a fecundidade, embora possam ser feitas correlações com estes significados. Ilustra este ponto a
relação inversa, frequentemente constatada, entre a taxa de fecundidade e o nível de desenvolvimento
socioeconômico de uma região.

Há um número grande de indicadores que estão em uso, em face das muitas dimensões a serem
aferidas. Existem também numerosas maneiras de classificá-los, entre as quais, encontram-se os
indicadores que se referem às condições de saúde das pessoas, às do meio ambiente e às dos serviços de
saúde (CAMINHA; CASARIN; BUENO, 1974).

2.7.2.1 Mortalidade

O primeiro indicador utilizado em avaliações de saúde coletiva, e ainda hoje o mais empregado.
Isso pode ser explicado pelas facilidades operacionais: a morte é objetivamente definida, ao contrário
da doença, e cada óbito tem de ser registrado. O registro obrigatório resulta na formação de uma base
de dados, mantida e atualizada por técnicos do governo, divulgada periodicamente. Esta base de dados
é armazenada em computador, o que facilita a preparação de estatísticas sob diversas formas, cuja
interpretação, mesmo que superficial, forneça um diagnóstico da situação.

Em cumprimento ao art. 2º do Decreto Presidencial n° 3.266 de 29 de novembro de 1999, o IBGE


divulga, anualmente, a tábua completa de mortalidade do Brasil, que é utilizada pelo Ministério da
Previdência Social como um dos parâmetros para determinar o fator previdenciário, no cálculo das
aposentadorias do Regime Geral de Previdência Social (BRASIL, 1999).

A taxa de mortalidade infantil obteve importantes reduções no período: entre 1980 e 2009, a
mortalidade infantil caiu de 69,12 para 22,47 óbitos por mil nascidos vivos. Em 1980, correspondia
a 69,12 óbitos de menores de um ano para cada mil nascidos vivos e, em 2009, passou, para 22,47%.

Dados referentes ao ano de 2010, comparando o Brasil com outros países, podem ser vistos na figura
a seguir:

58
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

África 78,9
Ásia 39,3
Brasil 21,8
Oceania 21,6
América Latina e Caribe 20,3
Europa 7
América do Norte 5,6

Figura 7 – Taxa de mortalidade infantil – 2010 ( ‰)

Limitações do uso da mortalidade como indicador

A análise mais atenta dos parâmetros relativos à mortalidade, como indicador capaz de reavaliar
toda a população, envolve aspectos que merecem ser destacados:

• As estatísticas de mortalidade expressam a gravidade da situação, mas, como o óbito representa


o último acontecimento no processo saúde-doença, as estatísticas de mortalidade refletem uma
história muito incompleta da doença e seus fatores determinantes;

• Os danos que raramente levam a óbito, como os de natureza dermatológica, osteoarticular e


psiquiátrica, praticamente não estão representados nas estatísticas de mortalidade.

• Os óbitos são eventos que incidem, anualmente, em uma pequena parcela da população.
Mesmo as regiões mais subdesenvolvidas raramente têm taxas anuais superiores a 25 óbitos
por mil habitantes. Em muitas situações, como na verificação do estado de saúde de crianças
que frequentam uma creche, os óbitos são exceção, o que aponta para a necessidade de outros
indicadores que funcionarão como parâmetro de avaliação.

• As mudanças nas taxas de mortalidade, com o passar do tempo, são, em geral, de pequena
amplitude, o que as torna pouco úteis para avaliações de curto prazo.

Um indicador só é útil quando classifica corretamente grupos ou subgrupos e os separa


convenientemente. Assim, em numerosas situações, é necessário empregar outros tipos de indicadores,
para substituir ou complementar as informações fornecidas pelas estatísticas de mortalidade.

Lembrete

As medidas de mortalidade são:

• coeficiente geral de mortalidade;

• coeficiente de mortalidade infantil e outros.

59
Unidade I

2.7.2.2 Morbidade

O conhecimento do perfil de morbidade da população é essencial para o pessoal de saúde. As


estatísticas que expressam a situação das doenças na população têm múltipla utilização: elas permitem
inferir os riscos de adoecer a que as pessoas estão sujeitas, bem como constituem indicações a serem
utilizadas na preparação das investigações dos seus fatores determinantes e na escolha das ações
saneadoras adequadas. As medidas de morbidade, comparadas às de mortalidade, são mais sensíveis
para expressar mudanças de curto prazo.

As pessoas variam na maneira como percebem anormalidades ou buscam atenção médica,


de modo que muitas delas não estão representadas nas estatísticas provenientes de sistemas
rotineiros de registro de morbidade. Numerosos fatores intervêm na decisão de procurar ou não
atenção especializada, o que depende do tipo de agravo à saúde, da idade, do sexo, da classe
social e de outras características individuais, familiares, da comunidade e de toda a sociedade.
Dentre os fatores relevantes, cabe destacar a própria existência de serviços na localidade e o nível
de acesso que os indivíduos têm a tais serviços.

Inquéritos

Se não existem sistemas rotineiros adequados ou a informação requerida não é usualmente


registrada, é preciso ouvir e examinar diretamente as pessoas por meio de amostragem ou mesmo
de recenseamentos, de modo a melhor conhecer condições, necessidades e anseios sobre questões de
saúde. Trata-se de alternativa de custo relativamente elevado, para cuja realização deve haver indicação
precisa e objetivos claramente definidos.

A questão central de muitas destas investigações reside na quantificação dos problemas de saúde,
na forma como são percebidos pelas pessoas e na demanda que geram no sistema de atendimento.

Como exemplo, podemos citar a pesquisa desenvolvida no distrito de Itaóca Pedra, pertencente ao
município de Cachoeiro de Itapemirim – Espírito Santo, onde se verificou a morbidade referida aguda,
a partir da aplicação do formulário aos trabalhadores do setor de rochas ornamentais, revelando que
45,5% dos trabalhadores apresentaram algum problema de saúde nos 15 dias anteriores à pesquisa
(BAPTISTINI; BORGES; BAPTISTINI, 2013).

Na tabela 8, observa-se que, dentre os problemas de saúde ocorridos nos 15 dias anteriores à
pesquisa, o maior percentual foi de transtornos osteomusculares (42,3% dos agravos relatados), com
destaque para as lombalgias (34,1%).

Gravidade no processo mórbido

Além do conhecimento da simples ocorrência ou não de danos à saúde, outro ângulo na


mensuração da morbidade diz respeito à gravidade destes danos. As medidas que expressam a
gravidade são muito usadas, por exemplo, nas investigações sobre a história natural da doença e
na aferição da eficácia de tratamentos.
60
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Entre os muitos aspectos passíveis de quantificação, estão o tipo de agravo à saúde e a incidência
de óbitos, de complicações e de efeitos indesejáveis entre as pessoas afetadas por um determinado
dano à saúde. O grau em que os sistemas orgânicos, anatômicos ou funcionais estão comprometidos,
nestas mesmas pessoas, é outra possibilidade de avaliação. Existem muitas opções e escalas de risco para
estimar gravidade:

• Tipo de agravo: há danos à saúde que evoluem com pior prognóstico do que outros.
Alguns podem ser evitados ou tratados com a tecnologia disponível. A incidência com
que estes eventos ocorrem em um grupo populacional pode refletir as condições de
saúde deste grupo.

• Restrição de atividades: muitas avaliações indiretas da gravidade do dano à saúde baseiam-se


na incapacidade funcional gerada pelo processo da doença, medida pela hospitalização e pelo
absenteísmo, pelo confinamento ao leito ou pelas sequelas que produz. Os indicadores baseados
em hospitalização e em absenteísmo têm inconvenientes, pois muitos fatores, além da morbidade
e da gravidade do processo, intervêm na decisão de buscar atendimento, de procurar internação
e de faltar ao trabalho ou à escola.

• Indicadores de gravidade da doença: numerosos indicadores foram desenvolvidos com o


propósito de avaliar a gravidade da doença. Eles são usados, principalmente, em estudos
sobre eficácia de novos tratamentos e na aferição de prognósticos, de custos e da qualidade
do atendimento hospitalar. A comparação de resultados obtidos em diferentes hospitais é
feita usando um desses indicadores, de modo a considerar o tipo de paciente diferenciado,
atendido nos serviços.

A taxa de ataque, expressa em percentagem, nada mais é do que uma forma especial de incidência.
É utilizada quando se investiga um surto de uma determinada doença em um local onde há uma
população bem definida como residência, escola, colônia de férias, pessoas que participaram de um
determinado evento como um almoço etc. Essas pessoas formam uma população especial, exposta ao
risco de adquirir a referida doença, em um período de tempo bem definido.

Para calcular esta taxa, utiliza-se a seguinte fórmula:

Taxa de ataque = n.º de casos da doença em um local e período x 100


população exposta ao risco

61
Unidade I

Tabela 6 – Problemas de saúde apresentados nos 15 dias


anteriores à entrevista pelos trabalhadores do setor
de rochas ambientais. Itaóca Pedra – Cachoeiro de
Itapemirim/ES. Agosto – Novembro 2008

Frequência
Problemas de saúde %* %**
absoluta

1. Problemas osteomusculares 36 42,3 19,2


Dores na coluna, costas, região lombar ou pescoço 29 34,1 15,5
Dores articulares nos joelhos, tornozelos e pés 5 5,8 2,6
Dores articulares nos braços e mãos 2 2,3 1,0
2. Problemas de vias aéreas superiores (inflamação de 19 22,3 10,1
garganta/faringite/gripe/rinite/otite/sinusite)
3. Dor cabeça/Enxaqueca 12 14,1 6,4
4. Problemas gastrointestinais: 6 7,0 3,2
diarreia, 3 3,5 1,6
dor no estômago 3 3,5 1,6
5. Acidente de trabalho: 4 4,7 2,1
corte, 2 2,3 1,0
esmagamento, 1 1,1 0,5
fratura. 1 1,1 0,5
6. Estafa/cansaço/dores no corpo/dores musculares/cãibras 3 3,5 1,6

7. Problemas cardiovasculares 3 3,5 1,6


8. Transtornos mentais 2 2,3 1,0
9. Problemas oculares 2 2,3 1,0
10. Problemas dermatológicos 2 2,3 1,0
11. Problemas renais 1 1,1 0,5
12. Outros (Dor de dente/ dengue/ hérnia/ dor abdominal/ 9 10,5 4,8
sangramento gengiva e dormência/ bronquite)
* Referido por 85 pessoas que responderam apresentar problemas de saúde.
** Frequência relativa ao total de participantes do estudo (187 pessoas).

Fonte: Baptistini; Borges; Baptistini (2013, p. 2019).

Lembrete
Medidas de morbidade:
• coeficiente de prevalência;
• coeficiente de incidência;
• taxa de ataque.

62
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

2.7.2.3 Indicadores nutricionais

Numerosas medidas do estado nutricional das pessoas são usadas na avaliação das condições de
saúde e nutrição de populações. Elas são agrupadas em duas categorias, conforme a avaliação seja feita
de forma indireta ou direta.

Avaliação indireta do estado nutricional

Alguns dos indicadores mais usados para avaliar indiretamente o estado nutricional da população
provêm das estatísticas vitais. Os mais empregados com este propósito encontram-se sob a forma de
coeficientes ou de proporções:

L) a mortalidade pré-escolar (um a quatro anos);

M) a mortalidade infantil (de menores de um ano);

N) a mortalidade infantil tardia (28 dias a 11 meses).

Outra medida indireta é a disponibilidade de alimentos. Podem ser usados muitos outros indicadores
indiretos do estado nutricional, como a renda per capita e a distribuição da renda.

Avaliação direta do estado nutricional

Três enfoques são usados mais frequentemente para produzir indicadores diretos das condições
nutricionais: as avaliações dietéticas, as clínicas (ou clínico-antropométricas) e as laboratoriais.

Desde a realização da Conferência Mundial sobre Alimentação, em 1974, organizada pela Food and
Agriculture Organization (FAO), órgão integrante da Organização das Nações Unidas (ONU), os governos
participantes comprometeram-se a dedicar esforços para garantir o direito inalienável de todo homem,
mulher ou criança estarem de livres do risco da fome e da desnutrição para o desenvolvimento pleno
de suas faculdades físicas e mentais. Quase trinta anos depois, dados apresentados no Segundo Fórum
Mundial de Alimentação em 2002 indicam que a cada ano o número de desnutridos cai oito milhões.
Apesar de parecer muito, a dimensão da fome no mundo é de tal complexidade que, para que em
2015 se alcance a metade do número de desnutridos, esta taxa de redução deve ser de pelo menos
22 milhões por ano. Estes dados explicitam que todas as medidas tomadas até agora resultaram em
pequeno impacto.

As razões para a pequena efetividade das iniciativas podem ser diversas. Do ponto de vista do
planejamento em saúde, a implantação de um sistema prognóstico, para adequado mapeamento
da situação e das necessidades alimentares da população, dos mecanismos e das estruturas já
disponíveis para ações de intervenção, em uma perspectiva de médio e longo prazo, depende
do estabelecimento de políticas públicas em uma perspectiva de continuidade, e com ampla
participação da sociedade e da comunidade acadêmica.

63
Unidade I

No Brasil, a alteração da estrutura socioeconômica da população vem sendo acompanhada da


melhoria dos indicadores de desnutrição. Apesar disso, a insuficiência alimentar ainda é preocupante e
mostra forte associação com renda e escolaridade. A tradução dos indicadores nutricionais e de saúde,
em um país com dimensões territoriais tão grandes e diversidades regionais tão marcantes, encobre
realidades locais que apresentam particularidades, com ilhas de riqueza e a continuidade de situações
de risco em bolsões de pobreza, observando-se claramente a interferência do fator renda quando os
dados são desagregados.

Mesmo em nações desenvolvidas, a questão pode assumir contornos preocupantes, a partir do


entendimento de que situações de insegurança alimentar e nutricional não se restringem à falta de
alimentos, e podem afetar negativamente o consumo e a saúde. Nos EUA, cerca de 10% dos domicílios,
que representam uma população estimada em 33 milhões de pessoas segundo dados de 2000, estavam
expostos a situações de insegurança alimentar. Na Europa, em regiões com elevado nível de renda,
dados do Seneca, um dos mais relevantes estudos sobre saúde e nutrição já realizados, indicaram a
necessidade de acompanhar situações de insegurança alimentar entre idosos, apesar da diminuição dos
casos de desnutrição (DOMENE, 2003).

2.7.3 Indicadores demográficos

Os indicadores demográficos permitem aos demógrafos trabalhar os dados recolhidos sobre uma
população. Para tal, estes estudiosos recorrem a uma série de fórmulas a partir das quais trabalham os
dados brutos obtidos através dos censos populacionais.

O uso dos indicadores demográficos nos permite conhecer as características de uma determinada
população e sua evolução ao longo do tempo no território. O Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) e o Sistema Estadual de Análise de Dados (SEAD) são instituições que disponibilizam à
população informações relacionadas à situação demográfica, socioeconômica, à saúde, ao trabalho, entre
outras – sendo, portanto, importante fonte para pesquisas relacionadas. Atualmente, com os recursos
tecnológicos existentes, não é difícil você encontrar a descrição de um indicador, sua aplicabilidade, sua
fonte de dados, suas limitações. O importante é escolher o que melhor se aplica ao seu objetivo

As condições de saúde da população podem ser estimadas através de indicadores demográficos.


Dentre eles, os que apresentam maior interesse aos campos da demografia e da saúde são a
mortalidade e a esperança de vida. Os níveis de fecundidade e de natalidade e a composição
da população em termos de idade e sexo têm relações estreitas com a saúde e, por isso, são
indicadores valiosos.

Em algumas comunidades, as necessidades de saúde são tão patentes que, mesmo sem informação
precisa sobre os problemas de saúde e sem haver coleta de dados adicionais, o planejamento das
ações está justificado. Nesses casos, uma simples estimativa da distribuição da população, em grandes
grupos – jovens (zero a 14 anos), população economicamente ativa (15 a 64 anos) e idosos (65 anos
e mais) – serve como base para inferências subsequentes. O conhecimento desse e de outros aspectos
demográficos permite estimar, além das necessidades, as demandas, presentes e futuras, de serviços,
leitos, consultas, pessoal e recursos de outra natureza.
64
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Saiba mais

Para conhecer e se atualizar sobre todos os indicadores é de suma


importância que o aluno consulte a:

REDE INTERAGENCIAL DE INFORMAÇÕES PARA A SAÚDE (RIPSA).


Comentários sobre os indicadores demográficos até 2006. [s.d.]. Disponível
em: http://tabnet.datasus.gov.br/tabdata/livroidb/Com2007/Com_GrupoA.
pdf. Acesso em: 9 abr. 2015.

2.7.3.1 Indicadores sociais

As condições socioeconômicas estão intimamente relacionadas à saúde, de modo que são usadas
como indicadores sanitários indiretos, como é o caso da renda per capita, da distribuição da renda, da
taxa de analfabetismo e da proporção de crianças em idade escolar fora da escola. Embora estejam
estreitamente inter-relacionados, os indicadores socioeconômicos nem sempre concordam exatamente
entre si, pois medem diferentes aspectos da vida em sociedade. Assim, novos índices são propostos, na
tentativa de alcançar maior poder discriminatório.

Observação

De acordo com as estimativas oficiais, a esperança de vida ao nascer da


população brasileira experimentou um ganho de 2,6 anos; e ao ultrapassar
66,0 anos, em 1991, aumentou para 68,6 anos, em 2000 (INSTITUTO
BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, [s.d.]).

2.7.3.2 Indicadores ambientais

Se, de um lado, as atividades industriais são responsáveis pela produção de bens e pela geração
de empregos, de outro estão relacionadas à utilização de recursos naturais e à geração de resíduos.
Em um momento em que discutimos a pressão humana sobre o meio ambiente, o grande desafio
consiste em conciliar a preservação ambiental com o aumento da demanda por água, energia elétrica
e combustíveis. Outra questão importante é a capacidade de suporte dos ecossistemas. Há limites
para a pressão que o meio ambiente pode suportar e se estabilizar: a capacidade de regeneração dos
ecossistemas não é infinita nem ilimitada. No entanto, há pouca exatidão e muito desconhecimento
em relação a estes aspectos.

Até o início da década de 1990, observávamos a centralização e a reduzida disponibilidade de


informações como características marcantes dos sistemas de gestão ambiental das organizações.
Havia pouca integração dos sistemas de gestão com os processos produtivos e, principalmente, com
os profissionais. Não há dúvidas de que, nos últimos anos, o aumento da consciência ambiental, o
65
Unidade I

fortalecimento da legislação e o desenvolvimento da tecnologia da informação tornaram os sistemas


de gestão ambiental das empresas mais interativos.

Os indicadores são os elementos utilizados para avaliar o desempenho de políticas ou processos com
o maior grau de objetividade possível. Aplicáveis às questões ambientais, há três tipos de indicadores:
condição, pressão e resposta. O conjunto dos indicadores ambientais pode fornecer uma síntese das
condições ambientais, das pressões sobre o meio ambiente e das respostas encontradas pela sociedade
para a redução do impacto.

Alguns dos principais indicadores de saúde ambiental estão estreitamente relacionados com
o nível socioeconômico da população, entre os quais as condições de moradia e do peridomicílio.
Um importante ângulo da questão ambiental refere-se à cobertura e à qualidade dos serviços de
saneamento básico: abastecimento de água, de esgotos, de coleta de lixo, e de águas pluviais. A eles,
reserva-se a denominação “indicadores sanitários”. Um indicador muito utilizado é a proporção da
população que dispõe de um sistema adequado de abastecimento de água, de eliminação de dejetos
e de coleta regular de lixo.

A industrialização, a urbanização e o aumento da circulação das pessoas têm enorme potencial de


alterar o meio ambiente, daí a preocupação crescente pelo desenvolvimento e pelo uso de indicadores
que meçam a qualidade do ar, das águas e do meio ambiente, em geral, de modo a permitir a vigilância
continuada desta qualidade e a adoção de medidas preventivas e saneadoras imediatas.

Na escolha dos indicadores ambientais, algumas regras devem ser seguidas. Os indicadores devem: ser
simples, de fácil interpretação e capazes de demonstrar tendências; ser relevantes em termos das questões
e dos valores ambientais; facilitar o entendimento dos sistemas de gestão ambiental implementados;
ter uma base científica; considerar as dificuldades de monitoramento (tempo, tecnologia, custos); e
proporcionar bases sólidas para comparações e tomadas de decisão.

Analisando a relação da indústria com as questões ambientais, podemos verificar que a melhoria de
desempenho ambiental já faz parte das prioridades de grande parte das empresas, e este número está
aumentando. As empresas percebem lentamente que podem ganhar, também em termos financeiros,
quando enfrentam todas as suas questões ambientais de forma integrada. Comumente, após a
implementação de um SGA, as empresas observam uma grande economia de energia, um gerenciamento
mais eficiente de seus resíduos, além de uma notável redução no consumo de água.

Observação

Os indicadores ambientais relacionam-se com o Decreto nº 6.101, de


26 de abril de 2007 (BRASIL, 2007), que trata das atribuições do Ministério
do Meio Ambiente, que envolvem: a preservação, conservação e utilização
sustentável de ecossistemas, instrumentos econômicos e sociais para a
melhoria da qualidade ambiental, o uso sustentável dos recursos naturais,
entre outras.
66
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

2.7.3.3 Serviços de saúde

Muitos indicadores são especialmente criados para refletir o que ocorre no âmbito da assistência
à saúde, sob diversos ângulos, considerados em três grandes grupos: insumos, processos e resultados
(SILVA; MEDICI,1988).

Indicadores de insumos

Os recursos utilizados no sistema de saúde são classificados em humanos, materiais e financeiros.

• recursos humanos e materiais (ex.: número de médicos e de leitos hospitalares, por 1000 habitantes);
• recursos financeiros (ex.: gastos com saúde, no Brasil).

Indicadores de processo

O indicador pode não representar insumo, nem efeito – como a manutenção da saúde, a cura da
doença ou a ocorrência de incapacidades ou óbitos – mas refletir detalhes do próprio processo que
conduz a tais efeitos.

Indicadores de resultados

Embora a provisão e o financiamento de serviços de saúde em relação às necessidades da população


não precisem habitualmente de justificativa, pois tais serviços, em tese, têm validade intrínseca, muitos
planejadores e administradores questionam o inquestionável e passam a requerer maiores evidências
dos benefícios dos investimentos feitos no setor. A satisfação do usuário e os indicadores de saúde, sejam
negativos ou positivos, servem para este propósito. Eles fornecem informações úteis para acompanhar
os progressos e redimensionar as atividades.

Nem todos os indicadores têm a mesma sensibilidade para refletir o impacto dos serviços de saúde.
Por exemplo, a mortalidade infantil é influenciada por muitos fatores além dos serviços de saúde. Já a
mortalidade perinatal e a materna são mais sensíveis às mudanças nos serviços de atenção pré-natal,
ao parto e ao puerpério.

Apesar dos indicadores negativos serem largamente majoritários, há um enorme esforço de reflexão
e de pesquisa direcionado para a busca de novos indicadores de impacto, no outro sentido: o de
mensuração dos aspectos positivos da saúde.

2.7.3.4 Indicadores positivos da saúde

Epidemiologia da doença

A maioria dos indicadores utilizados para medir o estado de saúde da população refere-se ao período
patológico, pois informa sobre o número de doentes e óbitos. Tal situação é compreensível e resulta
do fato de que o sistema de saúde está voltado, predominantemente, para o diagnóstico e tratamento
67
Unidade I

dos agravos à saúde. Por exemplo, um especialista em terapia intensiva tende a interessar-se por
desenvolver, aperfeiçoar ou aplicar escalas de gravidade em seus pacientes; os cirurgiões e anestesistas
fazem o mesmo, para os casos cirúrgicos; os financiadores da assistência médica procuram escalas
que permitam o pagamento diferenciado das internações, em função não só do tipo de doenças, mas
também da gravidade dos casos e dos procedimentos envolvidos, pois eles estão associados a diferentes
custos. Estes são exemplos de problemas para os quais os especialistas já trouxeram várias soluções,
continuamente melhoradas, que se materializam em escala de risco para classificar os doentes e que
são extensivamente usadas, na prática. A maioria dos profissionais de saúde está familiarizada com este
tipo de enfoque, dito “enfoque de risco”, e podem, com relativa facilidade, obter os dados para compor
tais escalas. Por isso, é frequente afirmar que praticamos a Epidemiologia da doença.

Epidemiologia da saúde

A construção de indicadores a serem usados para expressar a saúde, e não a doença, necessita da
prévia operacionalização de certos conceitos fundamentais, como os de bem-estar e normalidade, de
modo a incorporar parâmetros mensuráveis, na prática. Como semelhante tarefa é repleta de dificuldades,
a mudança em direção à Epidemiologia da saúde tem apresentado lento progresso. A natureza dos dados,
rotineiramente produzidos pelo atendimento da demanda aos serviços, não favorece a transição, pois não
permite, na atualidade, a sua utilização para mensuração da fase pré‑patológica. Na realidade, trabalhamos
com indicadores negativos, de mortalidade e morbidade, pela incapacidade de desenvolvermos indicadores
positivos, de igual ou maior precisão, e que tenham, pelo menos, a mesma facilidade de obtenção.

Operacionalização da definição de saúde da OMS

A definição de saúde da Organização Mundial de Saúde – “um estado de completo bem estar
físico, mental e social, e não meramente ausência de doença” – sempre foi considerada de difícil
operacionalização, pois é colocada em termos utópicos, embora numerosas tentativas tenham sido
feitas para quantificá-la. Os parâmetros resultantes dos esforços para definir saúde têm em comum o
fato de englobarem múltiplas dimensões, incluindo, por exemplo, a saúde física, a capacidade de realizar
as tarefas do cotidiano, o estado emocional e o ângulo social.

Uma via utilizada na quantificação da saúde é definir os aspectos que serão incluídos na composição
do índice e a forma como eles serão mensurados. Em geral, isso é feito através de extensos questionários,
com vários itens para cada um dos aspectos a serem aferidos, aos quais, por um sistema especificado,
atribui-se certo número de pontos, de acordo com a natureza das respostas. A soma obtida reflete a
posição do indivíduo, na escala de saúde. Os índices de saúde desse tipo começaram a ser criados a partir
da década de 1940, primeiro timidamente e, a partir dos anos 1960, com maior intensidade.

Qualidade de vida

A mensuração da qualidade de vida pode ser feita entre os sadios e entre os doentes, ou seja, em todo
o espectro do processo saúde-doença. Na verdade, é a mensuração da qualidade de vida nos doentes ou
após um episódio potencialmente incapacitante que recebe atenção maior da comunidade científica.
Basicamente esta preocupação tem por motivo o aumento do número de pessoas portadoras de
68
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

afecções crônico-degenerativas aliadas a um número, também cada vez maior, de pacientes submetidos
a tratamentos e diagnósticos de natureza invasiva, a que se seguem efeitos colaterais. O exemplo típico
do processo invasivo é o transplante de coração e de outros órgãos. Porém, há outros procedimentos,
muito mais numerosos, também invasivos, como é o caso das diálises, das irradiações e das intervenções
cirúrgicas, especialmente as mais delicadas, como as que se realizam no cérebro. Não somente as pessoas
idosas estão aqui incluídas, mas as que se encontram em outras fases da vida, como os adultos de
meia‑idade, colocados em unidades coronarianas, ou as crianças submetidas a intervenções realizadas
em unidades neonatais de terapia intensiva. Numerosos exemplos de mensuração da qualidade de vida
de pacientes podem ser encontrados na literatura especializada (ABRASCO,1986).

Saiba mais

Para obter informações atualizadas sobre serviços de saúde é de


extrema importância que o aluno consulte o Portal da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária, disponível no site:

http://portal.anvisa.gov.br.

3 EPIDEMIOLOGIA E PREVENÇÃO

3.1 Diagnóstico

Os médicos dedicam grande parte do seu tempo determinando diagnósticos depois de aplicar vários
testes. A maior parte dos bons clínicos usa juízo crítico, conhecimento amplo da leitura e um tipo de
abordagem empírica própria de como organizar a informação diagnóstica. Entretanto, o clínico também
precisa se familiarizar com alguns princípios básicos para a interpretação dos testes diagnósticos.

Um teste diagnóstico geralmente é concebido como um exame realizado em laboratório. A informação


clínica obtida da história, do exame físico ou de procedimentos de imagem pode ser aplicada quando
um conjunto de achados clínicos serve como teste diagnóstico (WARD et al.,1986).

3.1.1 Acurácia do resultado do teste

Estabelecer um diagnóstico é um processo imperfeito, resultando em probabilidade e não em


certeza de estar correto. Cada vez mais o médico moderno expressa a possibilidade de que um paciente
tenha a doença com o uso de uma probabilidade. Desta forma, faz sentido que ele se familiarize com
as relações matemáticas entre as propriedades dos testes diagnósticos e a informação que fornece
às várias situações clínicas. Em muitos casos, o entendimento dessas questões auxilia a resolução de
algumas incertezas em torno do uso de testes diagnósticos. Em outras situações, apenas melhora o
entendimento da incerteza. Ocasionalmente, pode convencer o médico a aumentar seu próprio nível de
incerteza (GRINER; PANZER; GREENLAND, 1986).

69
Unidade I

Na relação entre um teste diagnóstico e a ocorrência de doença, há duas possibilidades de o resultado


do teste ser correto (verdadeiro-positivo e verdadeiro-negativo), e duas possibilidades de o resultado ser
incorreto (falso-positivo e falso-negativo), conforme observa-se no quadro a seguir.

3.1.1.1 O padrão-ouro

A avaliação de acurácia de um teste baseia-se na sua relação com alguns meios de saber se a doença
está ou não realmente presente – um indicador mais fiel da verdade, geralmente referido como “padrão-
ouro” (gold standard; “teste padrão”). O que acontece é que este padrão-ouro é frequentemente difícil
de ser encontrado. Algumas vezes o padrão-ouro é, por si só, um teste simples e barato, entretanto,
usualmente, não é o caso. Mais frequentemente, para ter certeza de que a doença está realmente
presente ou ausente, deve-se lançar mão de testes relativamente elaborados, caros ou arriscados. Entre
eles, estão a biópsia, a exploração cirúrgica e, certamente, a autópsia.

Para doenças que não são autolimitadas e que costumam se tornar manifestas alguns anos após a
suspeita inicial, os resultados do acompanhamento podem servir como um padrão-ouro. Em tais casos,
a validação do teste é possível, mesmo que a confirmação imediata não seja factível porque o teste
padrão é muito arriscado, demorado ou caro. Deve-se ter cuidado ao decidir sobre a duração do período
de acompanhamento, que precisa ser longo o suficiente para permitir que a doença se manifeste, mas
não tão longo que os casos possam ter se originado após a avaliação inicial.

Quadro 3 – Relação entre teste diagnóstico e ocorrência de doença

Doença
Teste Presente Ausente
Anormal a b a+b
Normal c d c+d
a+c b+d

O uso de testes mais simples como substitutos dos mais elaborados e mais exatos no estabelecimento
da presença de doença é feito com o entendimento de que isso resulte em um risco de diagnóstico
incorreto, o que é justificado pela segurança e conveniência do teste mais simples. Mas pode ser útil
somente quando os riscos de erros de classificação são conhecidos e considerados aceitavelmente
baixos, o que requer dados sólidos que comparem a acurácia do teste contra um padrão apropriado.

Observação

Desejamos uma elevada acurácia de um teste quando:

• A doença for importante, mas curável.

• Existe possibilidade de consequências graves na identificação de


falsos positivos e falsos negativos.
70
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

3.1.1.2 Consequências de padrões imperfeitos

Nem sempre é possível, na prática, saber quão bem os testes em uso se comparam a um padrão
inteiramente fidedigno. É preciso escolher como padrão de validade um teste que, sabidamente, não é
perfeito, mas que é considerado o melhor disponível. Isso pode levar à comparação de um teste fraco
contra outro, um deles sendo considerado como padrão de validade por ter maior uso, ou por ser
julgado superior por um consenso de peritos. Ao proceder assim, pode-se originar um paradoxo. Se
um teste novo é comparado com um teste padrão antigo (mas não exato), o teste novo pode parecer
pior, mesmo sendo realmente melhor. Por exemplo, se o teste novo é mais sensível do que o teste
padrão, os pacientes identificados adicionalmente pelo teste novo seriam considerados falso-positivos
em relação ao teste antigo. Se o novo teste é negativo com maior frequência em pessoas que de fato
não têm a doença, resultados desses pacientes com o novo teste serão considerados falso-negativos
comparados com o teste antigo. Assim, se um padrão inacurado de validade for usado, um teste novo
não poderá desempenhar melhor que seu padrão e parecerá inferior quando estiver mais próximo da
verdade (GRINER; PANZER; GREENLAND, 1986).

3.1.2 Sensibilidade e especificidade

Sensibilidade é definida como a proporção de indivíduos com a doença, que têm um teste positivo
para a doença, um teste sensível raramente não a encontra.

Especificidade é a proporção dos indivíduos sem a doença, que têm um teste negativo. Um teste
específico raramente classificará erroneamente pessoas sadias em doentes.

Sensibilidade = ____a___
a+c

Especificidade = ___d____
b+d

Prevalência = ____a + c_____


a+b+c+d

Valor Preditivo (+) = ____a____


a+b

Valor Preditivo (-) = ___d___


c+d

Onde: a = verdadeiro-positivo;
b = falso-positivo;
c = falso-negativo;
d = verdadeiro positivo.

71
Unidade I

3.1.2.1 Uso de testes sensíveis

Ao selecionar um teste, é necessário considerar sua sensibilidade e especificidade. Um teste


sensível (positivo na presença da doença) é o de escolha quando a penalidade por deixar de
diagnosticar uma doença for grande. Isso é o caso, por exemplo, quando há suspeita de uma
situação perigosa mais tratável. Testes sensíveis também são úteis nas fases iniciais de um processo
diagnóstico, quando um grande número de possibilidades está sendo considerado e se quer reduzi-las.
Os testes diagnósticos são usados nessas situações para excluir doenças – estabelecer que algumas
são possibilidades improváveis. Em suma, um teste sensível é mais útil ao clínico quando o resultado
dele for negativo (WARD et al.,1986).

Lembrete
Devemos escolher um teste sensível quando:
• A doença for grave e não pode passar despercebida.
• A doença é tratável.
• Os resultados falsos não determinam nenhum traumatismo,
psicológico, econômico ou social para o indivíduo.

3.1.2.2 Uso de testes específicos

Testes específicos são úteis para confirmar um diagnóstico sugerido por outros dados. Isso porque
um teste altamente específico é raramente positivo na ausência da doença – dá poucos resultados
falso-positivos. Testes altamente específicos são particularmente necessários quando os
resultados falso-positivos podem lesar o paciente física, emocional ou financeiramente. Assim, antes
que o paciente com câncer seja submetido à quimioterapia, que é um procedimento que acarreta
riscos, trauma emocional e custos financeiros, é geralmente necessário que se faça diagnóstico
tecidual em vez de confiar em exames menos específicos (CATALONA et al.,1991). Resumindo, um
teste específico é mais útil quando o resultado for positivo.

Lembrete
Utilizamos um teste mais específico quando:

• A doença for importante, mas difícil de tratar ou incurável.

• O fato de saber que não se tem a doença tem importância sanitária


e psicológica.

• Os resultados falsos positivos podem provocar traumas psicológicos,


econômicos ou sociais.

72
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

3.1.2.3 Viés

Algumas vezes, a sensibilidade e a especificidade do teste não são estabelecidas independentemente


dos meios pelos quais o diagnóstico verdadeiro é estabelecido, levando a uma avaliação tendenciosa de
suas propriedades. Isso pode ocorrer de vários modos.

Se o teste for avaliado com dados obtidos durante a avaliação clínica de pacientes suspeitos de ter
a doença em questão, um teste positivo pode induzir o médico a continuar procurando o diagnóstico,
aumentando a probabilidade de achar a doença. Por outro lado, um teste negativo pode levar o médico
a abdicar de testes adicionais, tornando mais provável que a doença, se presente, não seja detectada.

Em outras situações, o resultado do teste pode ser parte da informação usada para estabelecer
o diagnóstico; ou, ao contrário, os resultados dos testes podem ser interpretados à luz de outras
informações clínicas ou do próprio diagnóstico final.

3.1.2.4 Acaso

Valores para sensibilidade e especificidade são estimados usualmente a partir de observações


de amostras relativamente pequenas de pessoas com e sem a doença em questão. Devido ao acaso,
(variação aleatória), em uma determinada amostra, particularmente se ela é pequena, a sensibilidade
e especificidade do teste podem não representar os valores verdadeiros, mesmo que não haja vícios no
estudo. Os valores observados são compatíveis com uma faixa de valores verdadeiros, caracterizada
tipicamente pelo “intervalo de confiança de 95%”. A amplitude desta gama de valores define o grau
de precisão das estimativas de sensibilidade e especificidade. Desta forma, valores relatados para a
sensibilidade e especificidade não deveriam ser tomados muito literalmente se estimados por um
número pequeno de pacientes.

3.1.3 Valor preditivo

A sensibilidade e a especificidade são propriedades de um teste considerado ao tomar uma decisão


sobre pedir ou não um exame diagnóstico. Mas, uma vez com o resultado na mão, seja ele positivo ou
negativo, a sensibilidade e a especificidade não têm mais relevância. Isso ocorre porque esses valores
se referem a pessoas sabidamente doentes ou não doentes. Mas, se o diagnóstico da doença já for
conhecido, não é necessário solicitar um teste diagnóstico. O dilema do clínico é determinar se o
paciente tem ou não a doença, dados os resultados de um teste.

A probabilidade de doença, dados os resultados de um teste, é chamada de “valor preditivo do teste”.


O valor preditivo positivo de um teste é a probabilidade de doença com resultado positivo (anormal). O
valor preditivo negativo é a probabilidade de não ter a doença quando o resultado for negativo (normal).

O valor preditivo é uma resposta à questão: “Se o resultado de meu paciente for positivo (ou negativo),
qual a probabilidade de que ele tenha ou não tenha a doença?” O valor preditivo é também chamado de
“probabilidade posterior”, a probabilidade de doença após o conhecimento do resultado do teste.

73
Unidade I

Existem vários termos que sumarizam o valor global do teste. Um deles, a acurácia, é a proporção de
todos os resultados corretos, tanto os positivos quanto os negativos.

3.1.3.1 Determinantes do valor preditivo

O valor preditivo de um teste não é propriedade apenas do teste. Além de ser determinado apenas
pela sensibilidade e especificidade do teste, depende também da prevalência da doença na população
que está sendo testada. Aqui, o termo “prevalência” tem seu significado usual – a proporção de pessoas
com a condição em questão, em uma população definida, em um determinado ponto no tempo. Neste
contexto pode ser também chamada de probabilidade prévia (ou pré-teste), a probabilidade de doença
antes do conhecimento do resultado do teste.

A fórmula matemática que relaciona sensibilidade, especificidade e prevalência ao valor preditivo


positivo é calculada de acordo com o Teorema de Bayes das probabilidades condicionais:

Valor Sensibilidade x Prevalência


preditivo = ______________________________________________________
positivo (Sensibilidade x Prevalência) + (1 – Especificidade) x (1 – Prevalência)

Quanto mais sensível for um teste, melhor será o seu valor preditivo negativo (maior será a segurança do
médico de que um paciente com um resultado negativo não tenha a doença que procura). Em contraposição,
quanto mais específico for o teste, melhor será seu valor preditivo positivo (maior será a segurança de um
médico de que um resultado positivo confirme ou mantenha o diagnóstico procurado). Como o valor preditivo
também depende da prevalência, ele é influenciado pelo contexto em que o teste é aplicado. Resultados
positivos, mesmo de um teste muito sensível, quando se referem a pacientes com alta chance de doença, são
prováveis de serem falso-positivos. Da mesma forma, resultados negativos, mesmo de um teste muito sensível,
quando se referem a pacientes com alta chance de doença, são prováveis de serem falso-negativos. Em resumo,
a interpretação do resultado de um teste diagnóstico, negativo ou positivo, varia de um contexto a outro, de
acordo com a prevalência estimada da doença no contexto específico.

Os esforços atuais para prevenir a transmissão da síndrome de imunodeficiência adquirida


(Aids) através dos produtos hemoderivados é exemplo do efeito da prevalência da doença no valor
preditivo positivo.

Como exemplo pode-se mencionar um teste sanguíneo de anticorpos para o vírus da imunodeficiência
humana (HIV), que é usado para triar doadores de sangue. Num ponto de corte, a sensibilidade é 97,8%,
e a especificidade é 90,4%. Em 1985, o valor preditivo positivo do teste foi estimado com base na
prevalência das unidades de sangue infectadas como sendo em torno de 1/9250 testes. Assim, quase
10.000 unidades teriam de ser descartadas ou sofrer investigação adicional para prevenir uma transfusão
com sangue contaminado. Mas a situação mudou. Na medida em que a prevalência da infecção pelo HIV
aumenta na população geral, melhora o valor preditivo dos testes de rastreamento. Um ano mais tarde,
a United States Agency for International Development (1998) mostra prevalência de 25/10.000 em
67.690 unidades testadas, o que, com níveis semelhantes de sensibilidade e especificidade, produziria
um valor preditivo positivo de 2,5%, muito mais alto do que o de alguns anos antes.
74
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

3.1.4 Estimando a prevalência

Como um clínico pode estimar a prevalência ou a probabilidade de doença no contexto de seus


pacientes para determinar o valor preditivo do resultado de um teste? Existem várias fontes de
informação: a literatura médica, bancos de dados locais e julgamento clínico. Apesar de que esta
estimativa de prevalência seja raramente muito precisa, o erro dificilmente será grande o suficiente para
mudar o julgamento clínico baseado em sua estimativa. De qualquer modo, o processo certamente será
mais acurado que o julgamento sem tais probabilidades explícitas.

Em geral, a prevalência é mais importante do que a sensibilidade/especificidade na determinação


do valor preditivo. Uma razão pela qual isso ocorre é que a prevalência geralmente tem uma faixa de
variação mais ampla. A prevalência de doença em contextos clínicos pode variar de uma fração de per
cento até quase a certeza diagnóstica, dependendo da idade, gênero, fatores de risco e achados clínicos
do paciente. Quando contrastadas duas prevalências de doença hepática: a de um adulto sadio que
não usa drogas (ilícitas ou não) e consome álcool apenas ocasionalmente, e a de um ictérico, usuário
de drogas endovenosas; a variação da sensibilidade e da especificidade é bem menor. Pelos padrões
atuais, não há interesse em teste com sensibilidade e especificidade muito abaixo de 50% mas, se ambas
forem 99%, o teste será considerado fabuloso. Em outras palavras, em termos práticos, a variação de
sensibilidade e especificidade raramente será maior do que duas vezes.

3.1.5 Processos endêmicos

Uma determinada doença pode ser caracterizada como presente em nível endêmico, epidêmico,
com casos esporádicos ou inexistente. O fato de existir um número elevado de casos de uma doença
não significa necessariamente que uma epidemia esteja configurada. Por exemplo, há dezenas de
milhares de novos casos de acidente vascular cerebral (AVC) no Brasil por ano, mas o país não vive
uma epidemia de AVCs.

Em uma definição genérica, epidemia é a ocorrência de uma doença em uma população de forma
não constante (crescente) ao longo do tempo.

Endemia é a ocorrência de uma doença em uma população de forma constante ao longo do tempo,
permitidas as flutuações cíclicas ou sazonais.

A descrição epidemiológica de um evento ficaria incompleta se faltassem informações adequadas


sobre qualquer uma das três vertentes que constituem a Epidemiologia descritiva: as características
da população, do lugar e do tempo. Como exemplo, podemos traçar o perfil da poliomielite ou da
tuberculose (RUFFINO-NETO; PEREIRA, 1981). Além da obtenção das frequências desses eventos entre
os segmentos da população (por sexo e faixas etárias, por exemplo) e entre regiões, será conveniente
também especificar como estas frequências evoluem com o passar do tempo (MORAES; GUEDES;
BARATA, 1985).

75
Unidade I

3.1.5.1 Definindo variações

Variações cíclicas

Caracteriza as oscilações periódicas de frequências.

Variações sazonais

Designa oscilações periódicas de frequência, cujos ciclos configuram ritmo sazonal. O perfil de
numerosos agravos à saúde demonstra oscilações de frequência durante o ano.

Variações irregulares

Algumas epidemias são a expressão de frequências mais elevadas do que as habituais, como ocorrem
em relação ao sarampo e à meningite meningocócica. O aumento do número de casos decorre da ação
de um fator específico, de um episódio inusitado ou de uma combinação de fatores e situações, de modo
que os casos referentes à epidemia misturam-se às frequências endêmicas da doença. Outras epidemias
são acontecimentos pontuais, que tem seu início e término bem delimitados (MORAES et al., 1982).

Muito já se sabe sobre a Teoria das Epidemias e de como lidar com elas. Contudo, por não apresentarem
padrão de periodicidade regular, a prevenção de certas epidemias torna-se difícil de ser alcançada.
Algumas vezes, as causas das elevações de frequências das doenças são facilmente apontadas, pois
estão ligadas a acontecimentos evidentes para a população, tais como as enchentes ou as secas de
grandes proporções. Outras vezes, o aumento de casos só é reconhecido posteriormente, quando os
dados são colocados em uma série temporal (MASCARENHAS, 1973).

Análise das variações irregulares

Os textos especializados sobre séries temporais fornecem orientação sobre formas de análises das
variações irregulares, depois de removidas a sazonalidade, os ciclos e a tendência do evento. O resíduo,
que está livre de qualquer variação regular, é então analisado, à luz de um modelo probabilístico.

3.1.5.2 Epidemia x endemia

Epidemia é a concentração de casos de uma mesma doença em determinado local e época, claramente em
excesso ao que seria teoricamente esperado. Uma epidemia é uma etapa na evolução da doença na coletividade.
Existe uma fase de normalidade, em que as frequências são endêmicas ou não há casos de doença e, outra, de
anormalidade, caracterizada por alta incidência do evento, significativamente bem acima do período anterior.

O número de casos esperados é conhecido como “frequência endêmica”. Quando a doença é


relativamente constante, em uma área, ela é dita “endêmica”, não importando se a frequência é baixa
ou alta. Por vezes, nesse último caso, usa-se a denominação “hiperendêmica”. Uma epidemia de grandes
proporções, envolvendo extensas áreas e um número elevado de pessoas, é dita “pandemia”; o termo
aplica-se, geralmente, a uma doença que passa de um continente para o outro.
76
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

O intervalo de tempo previsto para a ocorrência de uma nova epidemia varia, para cada agravo
de saúde. Em doenças endêmicas, este intervalo pode ser estabelecido até com relativa facilidade
pela análise retrospectiva dos dados de incidência. A ocorrência de um número de casos, além
do esperado, associada ou não a algum evento ambiental de grandes proporções, caracteriza a
variação do tipo irregular e aponta para a necessidade de investigar as suas mais prováveis causas.
Quando a doença só aparece sob a forma de surtos, como no exemplo das intoxicações alimentares,
os conglomerados de casos, com este diagnóstico, são então devidamente investigados (MORAES;
GUEDES; BARATA, 1985).

3.1.5.3 Tipos de epidemia

• Epidemia explosiva: também chamada de “brusca”, “instantânea”, “maciça” ou por “fonte comum”,
“veículo comum”, “foco comum” ou “foco endêmico”, há um aumento expressivo no número de
casos em curto período. Esse aumento é compatível com o período de incubação da doença.

• Epidemia progressiva: ou “de contato” entre a pessoa doente e a sadia, ocorre um aumento
gradativo do número de casos, mas a fonte de infecção não é única, sendo representada por
exposições sucessivas.

3.1.5.4 Investigação de surtos epidêmicos

É frequente a utilização da expressão “investigação epidemiológica” no sentido de investigação de surtos,


abrangendo a identificação de contatos de casos de doença, geralmente infecciosa, com objetivo de determinar
os diversos elos da cadeia de transmissão. No entanto, essa expressão passou a ser entendida de maneira mais
ampla, como sinônimo de “pesquisa epidemiológica”. Assim sendo, adotou-se “investigação epidemiológica de
campo” como uma designação específica para as investigações de surtos.

Essa atividade constitui um desafio para o epidemiologista enfrentar no dia a dia de um serviço de saúde.

Frequentemente, nesses eventos, sua causa, origem e modos de disseminação são desconhecidos, e
o número de pessoas envolvidas pode ser grande.

Por decorrência, temos como objetivo principal das investigações de surtos:

• identificação da sua etiologia;

• identificação das fontes e modos de transmissão;

• identificação de grupos expostos a maior risco.

As epidemias constituem situações anormais que se apresentam para a comunidade como um


evento potencialmente grave, desencadeando pressões sociais que necessitam ser respondidas pelas
autoridades sanitárias com a maior urgência, fato que condiciona o ritmo e as condições do curso da
sua investigação.
77
Unidade I

Um dos objetivos da vigilância em saúde pública é justamente a identificação de surtos, ou seja,


observar os passos previstos para cada sistema de vigilância em termos de uma periodicidade regular na
coleta dos dados, análise e disseminação da informação analisada.

É frequente a identificação de surtos por parte de profissionais da saúde, que alertam as autoridades
sanitárias a respeito da ocorrência de um número inusitado de determinado evento adverso à saúde. Outras
vezes, são os próprios membros do grupo populacional afetado os responsáveis pela identificação do surto.
30 30
30

25

20 20 20
20 18
16
Nº de casos

15
15 13 14
11 11 11 11
10 9

0
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ez

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03

04

05

06

08

09
02
01

10
07
27

28

29

30

31

Dia e mês

Figura 8 – Número de casos diários de dengue que deram entrada na emergência do HGPV

A razão de uma investigação de surto é controlar a epidemia, prevenindo a ocorrência de mais


casos. Antes de estabelecermos a estratégia de controle, é necessário saber em que etapa do seu curso
a epidemia se encontra. O número de casos está aumentando ou o surto já está se extinguindo? A
resposta a essa questão condicionará o objetivo da investigação.

Se a epidemia estiver em curso, o objetivo será prevenir novos casos; portanto, a investigação se
concentrará na extensão do evento, no tamanho e nas características da população sob risco para
delinear e desenvolver medidas apropriadas de controle.

Caso a epidemia já esteja em seu término, o objetivo passa a ser prevenir surtos semelhantes no
futuro; portanto, a investigação deverá centralizar seus esforços principalmente em identificar os fatores
que contribuíram para a ocorrência do evento.

Os esforços na investigação do surto e nas medidas de controle devem ser proporcionais aos
conhecimentos disponíveis a respeito da causa, da origem e do modo de disseminação da epidemia.

Se soubermos pouco a respeito do agente, da fonte e dos modos de transmissão, serão


necessários esforços de investigação para delinearmos as medidas de controle. Ao contrário, se
dispusermos de um bom conhecimento dessas variáveis, estaremos aptos a indicar as medidas
apropriadas de controle.
78
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Quando o surto for de causa e/ou fonte e de modos de transmissão desconhecidos, mas se a doença
for grave e o desenvolvimento da investigação permitir a identificação da possível fonte e/ou modo de
transmissão, as ações de controle poderão ser tomadas antes mesmo da sua conclusão.

Embora a investigação de surtos possa apresentar algumas características semelhantes às da pesquisa


epidemiológica, cabe salientar pelo menos três diferenças importantes entre ambas:

• As investigações epidemiológicas de campo iniciam-se com frequência sem hipótese clara. Geralmente,
requerem o uso de estudos descritivos para a formulação de hipóteses, que posteriormente serão
testadas por meio de estudos analíticos, na maior parte das vezes, de caso-controle.

• Quando ocorrem problemas agudos que implicam medidas imediatas de proteção à saúde
da comunidade exposta ao risco, a investigação do surto deve se restringir, num primeiro
momento, à coleta dos dados e agilizar sua análise, com o objetivo de desencadear rapidamente
as ações de controle.

• A amplitude e grau de aprofundamento de uma investigação de um surto de doença aguda vão


depender do nível de conhecimento da etiologia, da fonte, modos de transmissão e das medidas
de controle disponíveis. Os referenciais teóricos aplicados nas investigações epidemiológicas de
campo originam-se da clínica médica, da Epidemiologia e das ciências de laboratório.

A investigação de surtos constitui atividade que deve ser incorporada por qualquer sistema de
vigilância, não só visando a eventos adversos à saúde, raros e/ou pouco conhecidos, mas também a
doenças cujos conhecimentos estejam bem estabelecidos.

As epidemias devem ser encaradas como experimentos naturais, cuja investigação permitirá a
identificação de lacunas no conhecimento, induzindo o desenvolvimento de pesquisas que poderão
resultar no aprimoramento dos serviços de saúde. Muitas vezes a investigação de um surto que se
apresenta inicialmente como rotineiro pode nos levar à ampliação dos conhecimentos a respeito do
agravo estudado, de seu agente, fonte(s) e modo(s) de transmissão.

Neste último caso, muitas vezes, é necessário descartar ou caracterizar mudanças no comportamento
da doença, do agente, da fonte ou modo de transmissão.

3.2 Epidemiologia geral das doenças transmissíveis

Doenças transmissíveis são aquelas em que ocorre a transmissão de um hospedeiro para outro, de
um agente vivo que, dentro do conceito de multicausalidade, atua como causa necessária da doença.
Por vezes o agente elabora, antes de alcançar o novo hospedeiro, produtos tóxicos que, depois, por
alguma forma, são até este veiculado.

Tendo em conta a existência do agente vivo, a história natural das doenças transmissíveis
apresenta algumas características em comum, cuja compreensão facilita o estudo específico de
cada uma delas.
79
Unidade I

Existem três formas pelas quais pode ser estabelecido o estímulo-doença:

• Infecção: é a penetração, no organismo, de um homem ou de outro animal, de um agente que nele


se desenvolve ou se multiplica; da infecção pode ou não resultar doença, aparente ou inaparente,
usualmente referida como infecciosa. A presença de agentes que poderiam provocar doença se
penetrassem no organismo, na superfície do corpo, em roupas ou objetos de uso, na água ou
outros alimentos ou em quaisquer objetos não constitui infecção, mas sim contaminação.

• Infestação: é o alojamento, com ou sem desenvolvimento e reprodução, de artrópodes na


superfície do corpo ou nas vestes. Também se usa a palavra infestação para designar a existência
de certos animais, especialmente artrópodes e roedores, em objetos e locais.

• Absorção de produtos tóxicos do agente: ocorre, usualmente, por ingestão. Esse item diz respeito
apenas aos casos em que não há infecção, ou seja, quando se trata de toxinas produzidas fora do
organismo do hospedeiro, não incluindo aqueles em que os produtos tóxicos provêm de agentes
antes nele já localizados.

Dessas três formas de estabelecimento do estímulo-doença, a mais frequente, é a infecção. Seja qual for a
forma, é peculiar, no caso das doenças transmissíveis, o fato de, como seu nome indica, ter havido transmissão
do agente vivo que, por si mesmo ou por seus produtos tóxicos, vai constituir o estímulo-doença.

Nessa conceituação se enquadram todas as doenças transmissíveis, mas elas apresentam larga
variedade quanto a cada fase do processo de transmissão (NOVO,1984).

Algumas definições básicas são indispensáveis para destacar claramente as etapas essenciais que
caracterizam o processo de transmissão. Tais definições são as seguintes:

• Fontes de infecção: são representadas por homens ou outros animais vertebrados, infectados,
de cujos organismos o agente vivo pode sair, por alguma forma, para, por algum meio, alcançar,
eventualmente, outro hospedeiro vertebrado.

• Vias de eliminação: são as formas pelas quais o agente deixa a fonte de infecção. Sem uma via de
eliminação disponível, a transmissão não pode ocorrer.

• Vias de transmissão: são os meios pelos quais o agente alcança o novo hospedeiro vertebrado.

• Portas de entrada: são as vias pelas quais o agente penetra no organismo do hospedeiro vertebrado.

3.2.1 Características de agentes infecciosos nas suas relações com o hospedeiro

Por “infectividade”, designamos a capacidade de um agente se alojar e se multiplicar ou se desenvolver


em um hospedeiro. Em animais de laboratório, podemos, experimentalmente, medir a infectividade em
termos de dose infectante. Se da infecção decorrer doença clinicamente reconhecível, sua ocorrência fica
comprovada, mas, nos casos em que as manifestações são escassas ou nulas, métodos bacteriológicos
ou sorológicos podem ser usados para verificar a infecção.
80
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Por “patogenicidade”, designamos a capacidade do agente de provocar a doença, com suas


manifestações clínicas características, entre os infectados suscetíveis. A medida da patogenicidade é
dada, então, simplesmente pela proporção de doentes entre os infectados suscetíveis.

A expressão “virulência” é usada com diferentes significados, por vezes até sinônimos de patogenicidade.
É usual definir a virulência como a expressão do grau de severidade ou gravidade da doença, considerando-
se como critérios de severidade as sequelas sérias e permanentes, como as paralisias na poliomielite, ou a
morte. A medida da virulência seria, com este conceito, dada pela relação entre casos “severos” e o total
de casos; se o critério adotado para classificar os casos como severos é, como frequentemente acontece, a
morte, essa relação se torna igual ao coeficiente de letalidade (ou fatalidade) da doença.

Deve ser lembrado que, tratando-se de características dos agentes em seu relacionamento com
os hospedeiros, os graus de infectividade, patogenicidade e virulência podem variar, para um mesmo
agente, de acordo com o hospedeiro. Mesmo no caso do hospedeiro humano, variações podem ocorrer
em função de idade, sexo, raça, condições de nutrição etc. Fatores de natureza genética desempenham
um importante papel no comportamento do hospedeiro.

3.2.2 Fontes de infecção (ou de infestação)

Para a maioria das doenças transmissíveis que afetam o homem, ele é, em condições naturais, o
único vertebrado suscetível, constituindo a única fonte de infecção. Quando os agentes dispõem, em
condições naturais, de outros hospedeiros vertebrados, estes também podem ser fontes de infecção para
o homem.

O estudo das fontes de infecção implica o estabelecimento de algumas definições pertinentes.

Período de incubação

Intervalo de tempo entre o momento em que ocorre a infecção (ou infestação) e o aparecimento das
primeiras manifestações de doença atribuíveis ao agente em causa. São inespecíficas, traduzindo-se por
sinais e sintomas compartilhados, com variações de natureza e intensidade, por muitos processos infecciosos,
especialmente os de evolução aguda. Quando se trata de indivíduos (ou animais) em relação aos quais se
tenha razões para supor que estejam infectados por um determinado agente, o relacionamento deste
com manifestações inespecíficas pode ser estabelecido. Entretanto, se não soubermos dos antecedentes,
poderíamos atribuir essas manifestações a várias outras entidades, particularmente às das infecções
agudas das vias respiratórias superiores; é usual que se pense tratar-se de resfriado comum. Seja qual for o
grau de especificidade das manifestações, o período de incubação termina quando elas surgem. Para cada
moléstia, em particular, a duração do período de incubação é relativamente constante e previsível, mas,
como qualquer outra característica biológica, apresenta uma amplitude de variação (IVERSSON,1976).

Período prodrômico

Intervalo de tempo durante o qual o paciente apresenta manifestações inespecíficas, desde


o aparecimento dos primeiros sintomas e sinais da doença em causa, até que surjam os que são
81
Unidade I

característicos, permitindo o diagnóstico clínico ou, pelo menos, a formulação de hipóteses diagnósticas
limitadas a um campo mais restrito. Evidentemente, quando os primeiros sintomas e sinais são
característicos, não há período prodrômico. A duração dele também varia, de doença para doença, e de
um paciente para outro, com a mesma doença.

Período de transmissibilidade

Intervalo de tempo, em continuidade ou com intermitências, durante o qual pode ocorrer eliminação
do agente, a partir da fonte de infecção. A eliminação só começa no período prodrômico ou mesmo
apenas em fases mais ou menos avançadas da doença caracterizada. Iniciada a eliminação, ela pode
perdurar por períodos que, mais uma vez, variam de doença para doença.

Com base nas informações, pode ser elaborada uma classificação de fontes de infecção, sejam elas
representadas por homens ou por outros vertebrados, incluindo:

• doentes: típicos ou atípicos (em período prodrômico e subclínicos ou ambulatoriais);

• não doentes ou “portadores” (em incubação, convalescentes ou sãos).

O termo “portadores” designa os indivíduos que, sem apresentarem manifestações de doença


atribuíveis a um determinado agente, constituem fontes de infecção deste. As três categorias de
portadores podem ser descritas como:

• em incubação: não tiveram a doença, não a têm, mas vão tê-la após terminado o período de incubação;

• convalescentes: não têm a doença, mas a tiveram;

• sãos: não têm a doença, não a tiveram e nem vão tê-la.

É claro que uma fonte de infecção classificada como portador em incubação passará à condição de
doente, eventualmente em período prodrômico e depois como caso típico ou atípico; poderá, ainda,
voltar à condição de portador, agora convalescente.

Vale lembrar que, como casos atípicos, são também referidas formas excepcionalmente severas de
algumas doenças, cujas características não usuais tornam o diagnóstico clínico mais difícil.

3.2.3 Vias de eliminação

São variadas as formas pelas quais pode ocorrer a saída de um agente da fonte de infecção. Estas
formas são usualmente designadas por “vias de eliminação” e podem ser divididas em:

• Secreções naso-buco-faríngeas: a boca e as vias respiratórias superiores são normalmente úmidas,


aumentando essa umidade, usualmente, quando há infecção das mucosas que revestem essas
vias. Assim sendo, em cada expiração, especialmente nos casos de tosse ou espirro, a umidade
82
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

é expelida na forma de gotículas que incluem partículas sólidas, tais como células descamadas
e germes da flora normal das cavidades em causa e, eventualmente, agentes de infecção que
constituem o que se designa por núcleos infectantes das gotículas. Além de agentes que se
localizam nas mucosas de revestimento das cavidades, outros para elas podem ser drenados por
secreções ou exsudatos de órgãos ou formações com elas relacionados.

• Fezes: é a via natural de eliminação para agentes cuja localização única ou principal se dá nas
paredes ou na luz do intestino, como acontece com alguns vírus, enterobactérias, protozoários e
helmintos. Além disso, certos agentes são também eliminados pelas fezes após serem levados para
a luz do intestino por secreções de órgãos que têm principal localização.

• Urina: além dos agentes de infecções urogenitais, são eliminados pela urina agentes que
apresentam uma fase septicêmica.

• Sangue: constitui via de eliminação que, em condições naturais, depende da intervenção de um


artrópode hematófago; doenças como a malária e a febre amarela, por exemplo, não podem
ser transmitidas se o agente não for retirado da fonte de infecção pelo artrópode, pois não há
outro meio pelo qual ele possa ser eliminado. Evidentemente, agentes podem ser retirados da
fonte de infecção, com o sangue, quando este é coletado para fins de transfusão ou de exames
laboratoriais, bem como quando adere a agulhas de injeção ou materiais cirúrgicos.

• Escarro: é a via natural de eliminação de agentes localizados na traqueia, brônquios e pulmões;


por adição, em passagem, podem ser acrescentados agentes presentes em secreções naso-
buco-faríngeas.

• Exsudatos, descargas purulentas e descamações epiteliais: aqui se inclui uma variedade de


condições, tais como lesões superficiais abertas, supurações do conduto auditivo, da uretra, da
conjuntiva ocular e outras mucosas, além de células epiteliais infectadas que descamam.

• Leite: um número relativamente limitado de agentes patogênicos é eliminado por esta via.

• Suor: além de agentes de doença da pele, há relatos de achados, no suor, de outros como o bacilo
tífico, por exemplo, quando em fase septicêmica; a importância epidemiológica desta via deve ser
muito pequena.

• Outras vias: além das citadas, duas outras vias de eliminação devem ser consideradas – na
primeira, é em órgãos da fonte de infecção (carnes, vísceras, usualmente) em que o agente está
contido; nas outras, o agente passa através da placenta, do organismo materno para o fetal, nas
infecções congênitas.

Outro aspecto importante a ser ponderado é referente à diferença marcante que há quanto à
continuidade ou intermitência de eliminação do agente, entre as vias representadas por secreções buco-
naso-faríngeas e escarro, de um lado, e por excretas (fezes e urina), de outro. Finalmente, um agente
pode ser eliminado por apenas uma ou por mais de uma via.
83
Unidade I

3.2.4 Vias de transmissão

O meio exterior é, via de regra, desfavorável para agentes etiológicos das doenças infecciosas.
Entretanto, é grande a variabilidade de comportamento que tais agentes apresentam frente às condições,
também variáveis, que têm de enfrentar no meio exterior, especialmente no que se refere à umidade, à
temperatura e às radiações.

Podemos classificar as vias de transmissão segundo o tempo que medeia entre a eliminação do
agente da fonte de infecção e a sua entrada em novo hospedeiro vertebrado.

3.2.4.1 Vias de transmissão que permitem nula ou curta permanência do agente no


meio externo

É indispensável um estreito relacionamento entre a fonte de infecção e o novo hospedeiro vertebrado,


para que ocorra a transferência direta ou praticamente direta do material infectante, recentemente
eliminado e não alterado pelas condições do meio. Podemos dizer que a transmissão ocorre por contágio,
devendo ser distinguidas duas formas:

• Contágio imediato: implica justaposição de superfícies, reduzindo a zero o tempo de exposição


do agente ao meio exterior; esta condição se verifica na transferência do agente durante relações
sexuais, por beijo na boca, por mordeduras e nas infecções congênitas.

• Contágio mediato: sem a justaposição de superfícies, mas sempre com o relacionamento que
assegura tempo de permanência do agente no meio exterior suficientemente curto para que o
material infectante não se altere. Três formas de transmissão devem ser referidas: por gotículas,
por objeto contaminado e pelo mecanismo mão/boca.

Não há, na conceituação de contágio mediato, a possibilidade de rigorosa definição de limites de


tempo; o que mais interessa do ponto de vista epidemiológico é a avaliação do grau de relacionamento
entre a fonte de infecção e o novo hospedeiro, conduzindo ou não à admissão de que a transmissão tenha
ocorrido de modo direto ou praticamente direto. Quando esta admissão não for razoável, pensaremos
em outras formas de transmissão, por núcleos infectantes de gotículas ou por objetos contaminados,
sem as características do contágio.

3.2.4.2 Vias de transmissão que exigem exposição mais prolongada do agente às


condições do meio exterior

Não há passagem direta ou praticamente direta da fonte de infecção para o novo hospedeiro
vertebrado, é comum a chamarmos de “vias de transmissão indireta”.

Podemos dizer que existe, sempre, um veículo, ou vários sucessivos que, na falta do relacionamento
definido no contágio, estabelece a conexão entre a fonte de infecção e o novo hospedeiro vertebrado.
Assim, classificamos as vias de transmissão indiretas segundo a natureza de tais veículos.

84
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Transmissão por vetores

O termo “vetor” designa, em Epidemiologia, artrópodes que, por alguma forma, participam da
transmissão de agentes infectantes. Dois tipos de vetores, essencialmente diferentes, devem ser
considerados: os biológicos e os mecânicos, sendo os primeiros muito mais importantes.

Transmissão pelo ar e por poeiras

Admite-se, atualmente, que constitui uma possibilidade de transmissão de certas doenças, com
graus variáveis de importância segundo a natureza dos agentes infectantes e as circunstâncias, que,
operando por contágio, assumem um significado maior.

Transmissão indireta por objetos contaminados

Foi comprovada a transmissão da varíola ao pessoal da lavanderia de hospitais, por meio de roupas
contaminadas por doentes; nesse exemplo, fica bem evidente a inexistência do relacionamento que
permitiria a transmissão direta ou praticamente direta. O mesmo acontece quando se trata de outros
agentes infectantes contaminando toalhas, roupas de cama, talheres, copos, xícaras e outros objetos
dessa natureza.

Transmissão por alimentos

A contaminação pode ocorrer por várias formas – a água de superfície pode se contaminar em contato
com o solo que esteja contaminado, ao receber descargas de excretas em cursos de água ou reservatórios,
nas canalizações em que é transportada, e, até mesmo, em recipientes em que é guardada para consumo.
As águas de poços podem receber contaminação da superfície, pela abertura superior, ou por infiltração
a partir de fossas vizinhas. O leite e as carnes podem provir de animais infectados; hortaliças podem
ser cultivadas em terrenos adubados com excretas humanos ou animais; ostras podem ser colhidas de
locais onde são descarregados com excretas humanos ou animais; elas ainda podem ser colhidas em
locais onde são descarregados esgotos. A estas e outras formas de contaminação de alimentos, na origem,
juntam-se todas as que, de acordo com as circunstâncias de cada caso, possam ocorrer nas fases seguintes
de transporte, industrialização, armazenamento e comercialização. Mais tarde, durante o período que
precede o consumo, fontes de infecção que manipulem o alimento, para prepará-lo ou para servi-lo,
podem transferir para ele agentes infectantes, pelas mãos ou pela projeção de gotículas. O mais importante
papel na transmissão é desempenhado pelos alimentos consumidos crus. A possibilidade de transmissão
por alimentos depende da capacidade dos agentes infectantes de resistir às condições a que são expostos
e do tempo de exposição; deve-se ter em mente, porém, que alguns alimentos, especialmente o leite e
derivados, podem constituir meios de cultura adequados para alguns agentes.

Transmissão pelo solo

O solo pode participar da transmissão por várias formas – os agentes infectantes nele depositados
(principalmente os eliminados com excretas); nele podem permanecer, por tempo muito longo. Formas
de resistência (esporos) de agentes infectantes, vão infectar o novo hospedeiro através de soluções de
85
Unidade I

continuidade da pele; ovos do agente precisam evoluir no solo antes de se tornarem infectantes; ovos
ou larvas do agente precisam evoluir no solo até alcançarem o estágio de larvas infectantes capazes de
penetrar ativamente através da pele do novo hospedeiro.

3.2.5 Portas de entrada

Conhecendo o mecanismo de transmissão, é fácil compreender que a penetração do agente


infectante no novo hospedeiro pode se dar por uma das seguintes vias:

• respiratória;
• digestiva;
• através de mucosas;
• através da pele.

Há alguma relação entre a via de eliminação e a porta de entrada; assim, por exemplo, agentes
eliminados pelas secreções naso-buco-faríngeas têm como porta de entrada, frequentemente, a via
respiratória, enquanto os eliminados pelos excretas penetram, usualmente, pela via digestiva. Mas há
numerosas exceções a este relacionamento, bastando que se cite a penetração pela pele, de certos
agentes eliminados pelas fezes. Assim, como há, para alguns agentes, mais de uma via de eliminação,
também pode haver, para certos agentes, mais de uma porta de entrada.

3.2.5.1 O novo hospedeiro

Uma vez que se tenha dado a penetração do agente no novo hospedeiro, o processo apresentará
uma das seguintes sequências:

• O agente é destruído pelos mecanismos de defesa do hospedeiro, antes de se dar a infecção.

• O agente não é destruído pelos mecanismos de defesa do hospedeiro e nele se instala, com as
seguintes probabilidades:

— morte do hospedeiro em período relativamente curto;

— morte do hospedeiro após longo prazo (doença crônica);

— o hospedeiro sara, com ou sem sequelas, dentro de um prazo relativamente curto, destruindo
o agente;

— o hospedeiro sara, com ou sem sequelas, após longo prazo, ao fim do qual o agente é destruído
(doença crônica);

— o hospedeiro sara, com ou sem sequelas, permanecendo o agente, em equilíbrio que


eventualmente pode ser rompido.
86
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

A sequência do processo depende da interação de fatores relativos ao hospedeiro e ao agente.

Saiba mais

Para obter informações sobre a transmissão vertical do HIV no Brasil,


consulte o texto:

VERMELHO, L. L.; SILVA, L. P.; COSTA, A. J. L. Epidemiologia da transmissão


vertical do HIV no Brasil. [s.d.]. Disponível em: http://www.Aids.gov.br/sites/
default/files/Epidemiologia_da_Transmissao_Vertical_do_HIV_no_Brasil.
pdf. Acesso em: 8 abr. 2015.

3.3 Prevenção

A manutenção de saúde (promoção/proteção de saúde) constitui grande parte da prática clínica.


Muitas vezes, as atividades podem ser incorporadas ao atendimento usual dos pacientes, como quando
um médico checa a pressão arterial de um paciente com queixa de dor de garganta; algumas vezes, é
agendada uma consulta especial apenas para a manutenção da saúde.

A prevenção na comunidade também é efetiva. Exigência de imunizações para os estudantes,


proibição do fumo em locais públicos e restrições à venda de armas de fogo são exemplos de prevenção
para a comunidade em geral. Para alguns problemas, como acidentes com armas de fogo, a prevenção
na comunidade funciona melhor. Para outros, como o câncer colorretal (SELBY et al.,1993), é o melhor é
o rastreamento em âmbito clínico. Para outros, ainda, esforços clínicos podem complementar atividades
comunitárias, como a prevenção do tabagismo, em que os clínicos auxiliam pacientes individuais a
pararem de fumar, em que a educação pública, as leis e os impostos previnem os jovens de começarem
a fumar (FIORE et al.,1994).

3.3.1 Níveis de prevenção

O Webster’s Dictionary define prevenção como “o ato de impedir que aconteça”. Com essa definição
em mente, quase todas as atividades em Medicina poderiam ser concebidas como prevenção (WEBSTER’s,
1991). Afinal de contas, o trabalho do médico é dirigido para prevenir a ocorrência inoportuna de
morte (desenlace), doença, desconforto, deficiência funcional, descontentamento e despesa. Contudo,
em medicina clínica, a definição de prevenção é usualmente restrita. Embora seja mais praticada agora,
como nunca antes, os clínicos ainda gastam a maior parte de seu tempo diagnosticando e tratando, ao
invés de prevenindo doença.

Dependendo de quando no curso da doença as intervenções médicas são feitas, três tipos de
prevenção são possíveis: primária, secundária e terciária.

87
Unidade I

3.3.2 Prevenção primária

A prevenção primária impede que a doença ocorra por completo, removendo sua causa. É efetuada
com frequência fora do sistema de assistência à saúde, na comunidade. A cloração e fluoração da
rede de água e as leis que obrigam o uso do cinto de segurança em automóveis e de capacetes em
usuários de motocicletas são alguns exemplos. Algumas atividades de prevenção primária ocorrem em
locais específicos de trabalho (uso de tampões auditivos ou máscaras protetoras de poeira), em escolas
(imunizações) ou em locais especializados de atenção à saúde (uso de testes para detectar o vírus da
hepatite B ou o HIV em doadores de bancos de sangue).

A maioria das doenças não infecciosas pode ser vista como tendo um estágio precoce, durante
o qual os fatores causais iniciarão a produção das anormalidades fisiológicas. Na aterosclerose, por
exemplo, pode haver altos níveis de lipoproteína de baixa densidade (LDL) e lipoproteína de muito baixa
densidade no sangue (VLDL), mas nenhum sinal de ateroma durante o estágio pré-doença. O objetivo,
nesse momento, é modificar os fatores de risco em uma direção favorável. Atividades que modificam
a vida, como mudar para uma dieta baixa em gorduras, procurar um programa estável de exercícios
aeróbicos e parar com o tabagismo, são consideradas como sendo métodos de prevenção primária, pois
visam evitar a ocorrência do processo patológico.

3.3.3 Prevenção secundária

A prevenção secundária detecta a doença precocemente quando ela é assintomática e quando o


tratamento precoce pode impedi-la de progredir; exame citopatológico de colo uterino, mamografia
e teste de sangue oculto nas fezes são exemplos (LERMAN et al.,1991). A maior parte da prevenção
secundária é feita em âmbito clínico, e todos os médicos, especialmente os que atendem a adultos,
realizam prevenção secundária. Existem alguns programas de âmbito comunitário (o rastreamento do
diabetes em feiras é um exemplo).

Mais cedo ou mais tarde, dependendo do indivíduo, um processo de doença como a aterosclerose
da artéria coronária progredirá o suficiente para se tornar detectável por testes médicos, mesmo
que o indivíduo ainda seja assintomático. Isso pode ser imaginado como o estado (escondido)
latente da doença.

3.3.3.1 Rastreamento

O rastreamento (triagem) é a identificação de uma doença ou fator de risco não reconhecido por
meio da história clínica (por exemplo, perguntar a um paciente se ele fuma), do exame físico (como
exame de próstata), de um exame laboratorial (como a determinação da fenilalanina sérica) ou de
outro procedimento (como sigmoidoscopia) que possa ser aplicado rapidamente (SELBY, 1993). Testes
de rastreamento separam pessoas que estão aparentemente bem, mas que apresentam uma doença ou
um fator de risco para uma doença, daquelas que não os apresentam. São parte de muitas atividades de
prevenção primária e de todas as de prevenção secundária. Um teste de rastreamento não pretende ser
um diagnóstico. Se o médico não se compromete a investigar posteriormente os resultados alterados e,
se necessário, a prescrever o tratamento, não deveria de modo algum realizar o teste.
88
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Para muitas doenças infecciosas ou não-infecciosas, o desenvolvimento de testes de rastreamento


tem tornado possível detectar doenças latentes em indivíduos considerados em risco. Diagnóstico
pré-sintomático e tratamento através de programas de rastreamento são referidos como prevenção
secundária, porque é uma linha de defesa secundária da doença. Apesar da não prevenirem a causa de
iniciar o processo de doença, podem prevenir as sequelas permanentes.

3.3.4 Prevenção terciária

A prevenção terciária refere-se àquelas atividades clínicas que previnem deterioração adicional
ou reduzem as complicações depois que uma doença já esteja manifesta. Um exemplo é o uso de
betabloqueadores para diminuir o risco de mortalidade em pacientes que se recuperam de um infarto no
miocárdio (SCHAPPERT,1993). Os domínios da prevenção terciária se fundem com a medicina curativa,
aquela bem-realizada vai além de tratar os problemas que os pacientes apresentam. Por exemplo,
em diabéticos, a prevenção terciária requer mais do que o controle adequado dos níveis glicêmicos;
eles precisam de exames oftalmológicos regulares para a detecção precoce de retinopatia diabética,
educação para os cuidados usuais com os pés, investigação e tratamento de outros fatores de risco
cardiovasculares e monitoramento das proteínas urinárias, para que inibidores da enzima conversora de
angiotensina possam ser usados para prevenir insuficiência renal.

A prevenção terciária é particularmente importante para o manejo de pacientes com doença fatal.
A meta aqui não é prevenir morte, mas maximizar o tempo de vida de alta qualidade que ainda resta a
um paciente.

Quando a doença se torna sintomática e a assistência médica é procurada, o objetivo do clínico é


fornecer uma prevenção terciária de modo a limitar incapacidade em pacientes com sintomas precoces,
ou de modo a reabilitar para pacientes com doença sintomática tardia.

Existem poucos, se é que existem, programas de prevenção terciária fora do sistema de assistência à
saúde, mas muitos profissionais de saúde, além dos médicos, atuam neles.

3.3.5 Abordagem do exame periódico de saúde

Ao considerar o que fazer rotineiramente em pacientes sem sintomas de uma determinada


doença, o clínico deve primeiro decidir que problemas médicos ou doenças deveriam tentar prevenir.
Essa afirmação é tão óbvia que pareceria desnecessária. Mas o fato é que muitos procedimentos
preventivos, especialmente os testes de rastreamento, são realizados sem um entendimento claro do
que está sendo procurado. Por exemplo, um exame qualitativo de urina é frequentemente solicitado
por médicos que realizam um exame clínico de rotina em seus pacientes. Mas esse exame pode ser
usado para procurar vários problemas médicos, tais como: diabetes, infecção assintomática do trato
urinário e cálculos renais. É necessário decidir quais, ou talvez qual, dessas condições vale a pena
rastrear antes de solicitar o teste.

Três critérios são importantes para decidir que condições incluir em um exame periódico da
saúde: (a) carga de sofrimento causada pela condição; (b) a qualidade do teste de rastreamento, se
89
Unidade I

algum teste for necessário; e (c) a efetividade da intervenção de prevenção primária (por exemplo,
aconselhamento de pacientes sobre a prática de sexo seguro) ou a efetividade do tratamento de
prevenção secundária após a condição ser encontrada no rastreamento (por exemplo, tratamento de
um câncer de próstata).

Critérios para decidir se uma condição clínica deve ser incluída em exames periódicos de saúde:

• Qual a carga de sofrimento causada pela condição em termos de: morte, doença, deficiência
funcional, desconforto, descontentamento e despesa.

• Quão bom é o teste de rastreamento, se for necessário realizá-lo, em termos de: sensibilidade,
especificidade, simplicidade, custo, segurança, aceitabilidade e efeito do rótulo.

• Para a prevenção primária, quão efetiva é a intervenção? Ou para a prevenção secundária, se a


condição for encontrada, qual a efetividade do tratamento subsequente em termos de eficácia,
adesão do paciente e o tratamento precoce ser mais efetivo que tratamento sadio.

A carga de sofrimento leva em conta a frequência de uma condição de saúde. Muitas vezes,
uma dada condição causa grande sofrimento para os indivíduos desafortunados o suficiente para
adquiri-la, mas é rara demais – talvez no grupo etário específico do paciente – para que seu
rastreamento seja considerado.

Um dilema particularmente difícil deparado por médicos e pacientes é a situação em que uma
pessoa é sabidamente de alto risco para uma condição, mas não há evidência de que o tratamento
precoce seja efetivo. O que podem fazer médico e paciente?

Não há uma resposta fácil para este dilema. Mas se os médicos lembrarem que o rastreamento
não terá utilidade, a menos que a terapia efetiva seja efetiva, eles poderão pesar cuidadosamente a
evidência sobre a terapia com o paciente. Se a evidência for contra a efetividade do tratamento, pode-se
prejudicar, ao invés de ajudar, o paciente com o rastreamento.

3.3.5.1 Quanto prejuízo para quanto benefício?

Promoção de saúde e prevenção de doenças estão se tornando, progressivamente, mais populares.


A meta de manter as pessoas tão saudáveis quanto possível é louvável, mas os conceitos por trás
das metas são complexos. O mais importante: as atividades de promoção de saúde podem causar
prejuízos. De fato, é possível dizer que elas causam usualmente prejuízo, mesmo que totalmente
involuntário. Na melhor das hipóteses, elas custam dinheiro, consomem tempo dos pacientes e muitas
vezes causam desconforto. Na pior das hipóteses, especialmente para aqueles pacientes com resultados
falso-positivos, as atividades preventivas podem causar sério prejuízo físico em um raro paciente, seja por
complicações do rastreamento em si, ou por efeitos adversos dos testes ou tratamentos subsequentes.
Testes falso-positivos também podem causar prejuízos psicológicos. Então, é importante que um clínico
tenha sólidas evidências sobre quanto benefício e quanto prejuízo as atividades de promoção de saúde
podem alcançar. Boas intenções não são o suficiente.
90
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Antes de adotar um procedimento de promoção de saúde em um paciente, especialmente se


o procedimento for controverso entre grupos de especialistas, o clínico deveria discutir os prós
(probabilidades de benefícios conhecidos e almejados) e os contras (probabilidades de efeitos indesejados)
de tal procedimento com seu paciente.

3.3.5.2 Recomendações atuais

Com o progresso da ciência da prevenção, as recomendações atuais para proteção da saúde são
muito diferentes daquelas do passado. Muitos grupos têm recomendado o abandono do exame clínico
anual de rotina, em favor de uma abordagem seletiva, na qual os testes a serem feitos dependem a
idade, sexo e características clínicas da pessoa (aumentando, assim, a prevalência e o valor preditivo).
Tendem a recomendar menos testes do que anteriormente (diminuindo, assim, a percentagem de
pacientes com resultados falso-positivos). Muitos grupos direcionam sua atenção para o processo de
seleção, para decidir que condição médica deveria ser procurada. Há uma preocupação crescente em
delimitar claramente os critérios que os testes devem preencher, antes que sejam incorporados aos
exames periódicos de saúde. Grupos que explicitam critérios para selecionar condições médicas são mais
conservadores em suas recomendações do que os sem os mesmos critérios.

4 VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA

A vigilância epidemiológica é definida pela Lei n° 8.080/90 como:

[...] um conjunto de ações que proporcionam o conhecimento, a detecção ou


prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes
de saúde individual ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar as
medidas de prevenção e controle das doenças ou agravos.

O objetivo principal é fornecer orientação técnica permanente para os profissionais de saúde, que
têm a responsabilidade de decidir sobre a execução de ações de controle de doenças e agravos, tornando
disponíveis, para esse fim, informações atualizadas sobre a ocorrência dessas doenças e agravos, bem
como dos fatores que a condicionam, numa área geográfica ou população definida.

E, ainda, constitui-se importante instrumento para o planejamento, a organização e a operacionalização


dos serviços de saúde, como também para a normatização de atividades técnicas afins.

O interesse em acompanhar a ocorrência de doenças em comunidades com o sentido de prevenir sua


disseminação existe desde épocas remotas. Da necessidade de controlar enfermidades até a concepção
atual de vigilância epidemiológica – informação para ação – um longo caminho foi percorrido.

Neste processo, a vigilância epidemiológica passou por modificações de conceitos e de estratégias


de ação, sem perder de vista o objetivo principal: coletar dados para o desencadeamento de ações
de prevenção e controle. No Brasil, um conceito foi adotado oficialmente para descrever vigilância
epidemiológica como “um conjunto de ações que proporciona o conhecimento, a detecção ou
prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual
91
Unidade I

ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar as medidas de prevenção e controle das


doenças ou agravos” (BRASIL, 1990).

As atividades de vigilância epidemiológica se organizam de modo a garantir o cumprimento de


suas principais funções e envolvem a coleta, o processamento, a análise e a interpretação de dados:
a recomendação, a promoção e a avaliação da eficácia e da efetividade das medidas de controle; e a
divulgação das informações obtidas. Essas etapas são operacionalizadas nas etapas a seguir:

4.1 Obtenção de dados

É uma etapa primordial para o objetivo da vigilância epidemiológica: subsidiar o desencadeamento


de ações de prevenção e controle de doenças e agravos. A qualidade e o valor da informação gerada
dependem da adequada coleta de dados obtidos no local onde ocorre o agravo. Esses dados –
denominados primários ou básicos –, ao serem processados, darão origem à informação que permite
planejar ações. Para que esta etapa se cumpra de modo efetivo, é necessário reconhecer sua importância
e investir em treinamento e reciclagem regulares dos profissionais que atuam nos níveis locais do sistema
de informação. Por analogia com a produção industrial, os dados são a matéria-prima da vigilância
epidemiológica e a informação, o seu produto final.

A etapa de coleta de dados pode ser relacionada às categorias ou tipos de dados de interesse, às
fontes em que estes podem ser obtidos e ao fluxo que devem seguir dentro do sistema de informação.

4.2 Tipos de dados

4.2.1 Demográficos

Os dados demográficos, como o número de habitantes e a sua distribuição, segundo diversos


aspectos (sexo e idade, por exemplo), são utilizados pela vigilância epidemiológica na expectativa de
taxas e coeficientes, possibilitando efetuar comparações entre diferentes grupamentos populacionais.

As bases de dados demográficos mais frequentemente utilizadas são o censo demográfico e o


Sistema de Informações de Nascidos Vivos.

4.2.2 Morbidade

Os dados que permitem conhecer a morbidade em uma população podem se referir à ocorrência
isolada de agravos sintomáticos ou assintomáticos ou a surtos e epidemias. Podem se tratar de dados
sobre doenças já conhecidas e endêmicas, ou que possibilitem a detecção de agravos inusitados (como
o caso da Aids) ou emergentes (como a dengue).

Os dados laboratoriais e o de consumo de medicamentos podem ser utilizados como aliados na


indicação da ocorrência/propagação/controle de doenças. Também o consumo de preservativos pode
ser aproveitado para a avaliação de impactos das medidas de prevenção das doenças sexualmente
transmissíveis.
92
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

A atualização dos profissionais da vigilância com referência aos agravos que vêm ocorrendo em
outras regiões facilita o pronto reconhecimento diante da introdução da mesma doença em local
anteriormente sem casos. Outro dado relevante tem origem no conhecimento dos fluxos de viajantes e
das possíveis endemias que podem se disseminar desta forma.

4.2.3 Mortalidades

Os dados de mortalidade, provenientes de declarações de óbito, apesar de não terem a qualidade


ideal, têm importância capital nas estimativas de indicadores de saúde, sendo reconhecidamente úteis
para este fim. Por exemplo, a distribuição proporcional de óbitos segundo faixa etária é um dos mais
utilizados para conhecer as condições de saúde de grupos populacionais. Além desta aplicação, o
acompanhamento da letalidade por meningite meningocócica permite avaliar a agilidade da assistência
médica em efetuar o diagnóstico e instituir o tratamento. Assim sendo, a vigilância epidemiológica
precisa estar informada sobre a ocorrência dos óbitos em sua área para avaliar a efetividade das ações
e monitorar a situação de saúde.

4.2.4 Áreas e situações de risco

O papel da vigilância epidemiológica não se restringe à interrupção da cadeia de transmissão de uma


doença, mas deve também intervir sobre a rede de acontecimentos que podem originar os agravos à
saúde. Também é importante saber de informações sobre os fatores condicionantes de doenças para que
possa mapear áreas e situações de risco. Dados comumente utilizados para este fim são: condições de
saneamento, abastecimento e qualidade da água, qualidade e distribuição do sangue e uso de agentes
tóxicos ambientais.

Além dos fatores conhecidos, frente à ocorrência de um agravo inusitado ou a uma epidemia, convém
pesquisar outros fatores que possam estar contribuindo para aquela situação naquele momento.

4.3 Fontes de dados

Múltiplas são as fontes de dados utilizadas em vigilância epidemiológica, e a acessibilidade a elas


vem sendo facilitada pela informação crescente. Apesar das limitações, e até mesmo para gerar a
necessidade de aperfeiçoamento, o emprego destas fontes possibilita o entendimento da situação de
modo ágil, abrindo um leque de questões que motivarão novos estudos e desencadearão alternativas
para solucionar possíveis problemas. Entretanto, a necessidade de agilizar o processo de divulgação de
dados deve caminhar ao lado da necessidade de preservar e investir na qualidade da obtenção deles.

4.3.1 Demográficos

Os censos, realizados periodicamente pela maioria dos países, constituem-se na fonte de dados
demográficos de maior aceitabilidade. Estes dados, com tabulações segundo variáveis geográficas e
socioeconômicas e em diversos graus de agregação, são publicados por meio de catálogos impressos e
encontram-se disponíveis através da internet, como site do IBGE (www.ibge.gov.br>) no Brasil.

93
Unidade I

Como exemplo, podemos citar a Resolução da Presidência do IBGE nº 04, de 22 de dezembro


de 2014, em que o IBGE (2014) divulga a área territorial brasileira para o país, unidades da
federação e municípios.

Área Territorial Brasileira

Introdução

As estimativas da população residente para os 5.570 municípios produzidas pelo IBGE


consideram a situação atualizada da Divisão Político-Administrativa Brasileira – DPA.
O reprocessamento dos valores das áreas territoriais, de acordo com a estrutura
político‑administrativa vigente em 01/07/2013, data de referência das Estimativas
Populacionais 2013, incorporaram as alterações de limites territoriais municipais
ocorridas após o Censo Demográfico 2010 e praticadas nas Estimativas Populacionais
de 2011, 2012 e 2013, bem como demais ajustes territoriais ocorridos neste período.
Para a superfície do Brasil foi mantido o valor de 8.515.767,049 km2, publicado no DOU
nº 16 de 23/01/2013, conforme Resolução Nº 01, de 15 de janeiro de 2013.

Motivações das alterações promovidas nos arquivos estaduais e municipais:

• Natureza legal ou judicial.

• Modificações na pertinência territorial de algumas localidades por decisões judiciais


(Liminares e Mandados) ou por parecer normativo da Procuradoria Federal no IBGE.

• Alterações ou ajustes cartográficos comunicados oficialmente ao IBGE pelos


órgãos estaduais responsáveis pela divisão política administrativa no âmbito dos
convênios existentes.

• Ajustes e refinamentos cartográficos dos contornos dos polígonos estaduais


e municipais.

• Inovações tecnológicas advindas de uma melhora significativa das geotecnologias e


dos insumos para identificação e representação cartográfica dos polígonos estaduais
e municipais.

Informações sobre alteração na metodologia para cálculo de áreas municipais

As áreas disponibilizadas foram calculadas por meio do software GEOMEDIA, utilizando-


se a Projeção Cônica Equivalente de Albers, em virtude de ser esta a projeção equivalente
apropriada para tal finalidade, com os seguintes parâmetros para o país:

• Longitude origem: -54°

• Latitude origem: -12°


94
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

• Paralelo padrão 1: -2°

• Paralelo padrão 2: -22°

O sistema de referência utilizado foi o Sistema de Referência Geocêntrico para as Américas


(SIRGAS2000), conforme Resolução do Presidente do IBGE Nº 1/2005, disponível em:
ftp://geoftp.ibge.gov.br/documentos/geodesia/projeto_mudanca_referencial_geodesico/
legislacao/rpr_01_25fev2005.pdf

A definição do sistema geodésico de referência acompanha, em cada fase da história,


o estado da arte dos métodos e técnicas então disponíveis. Com o advento dos sistemas
globais de navegação (i.e. posicionamento) por satélites (GNSS – Global Navigation Satellite
Systems), tornou-se mandatória a adoção de um novo sistema de referência, geocêntrico,
compatível com a precisão dos métodos de posicionamento correspondentes e também
com os sistemas adotados no restante do globo terrestre.

Curiosidades

O maior estado brasileiro continua sendo o Amazonas, com 1.559.148,890 km², que
supera a soma dos territórios das regiões Sul e Sudeste. O estado de menor extensão
territorial, Sergipe, com 21.918,493 km².

O maior município brasileiro, no entanto, fica no Pará é Altamira e tem 159.533,255 km².
Vêm em seguida, Barcelos (122.471,158 km²) e São Gabriel da Cachoeira (109.183,434 km²),
ambos no Amazonas, e Oriximiná (107.603,291 km²), no Pará.

O município mineiro de Santa Cruz de Minas, com área de 3,565 km² é o menor do país.
E segundo menor é Águas de São Pedro, em São Paulo, com área de 3,612 km². Suas áreas
são menores em relação à da Ilha de Fernando de Noronha, distrito estadual de Pernambuco,
que tem 17,017 km².

Fonte: Brasil (2013).

Saiba mais

Outra fonte de dados, imprescindível nos cálculos de estimativas de


expectativa de vida e de fecundidade, origina-se nas estatísticas de nascidos
vivos e está estruturada em sistema informatizado. O site que disponibiliza
as informações é:

www.datasus.gov.br

95
Unidade I

4.3.2 Morbidade

A notificação – comunicação da ocorrência de uma doença ou agravo à saúde feita à autoridade


sanitária por profissionais de saúde ou qualquer cidadão – é a principal fonte de informação sobre a
morbidade da vigilância epidemiológica.

Saiba mais

Atualmente, no Brasil, os dados de doença e agravos de notificação


compulsória alimentam o subsistema de informação da vigilância
epidemiológica e é denominado Sistema de Informação de Agravos de
Notificação – SINAN, também informatizado. As informações podem ser
obtidas em:

www.funasa.gov.br

Saiba mais

Menos utilizado pela vigilância epidemiológica, mas de igual valor para


o diagnóstico de saúde em comunidades e para o planejamento de ações
preventivas e da oferta de serviços de saúde, são os dados de morbidade
do Sistema de Informações de Saúde do SUS (Datasus), através do Sistema
de Informações Hospitalares (SIH-SUS) e do Sistema de Informações
Ambulatoriais (SAI-SUS). Os dados secundários, aqueles que sofrem
alguma tabulação prévia a partir dos primariamente gerados, encontram-
se também disponíveis no site:

www.datasus.gov.br

Alguns agravos à saúde, como as neoplasias, a tuberculose, a hanseníase, o diabetes e a Aids, têm um
sistema especial de registro de morbidade. Estes sistemas (que são usados para os agravos anteriormente
relacionados) foram sendo criados dentro de uma política de controle de doenças baseada em campanhas
e programas de saúde que objetivam oferecer uma assistência integral à saúde, considerando os aspectos
relativos aos diversos níveis de prevenção e assistência médica.

96
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Saiba mais

Os registros sobre as neoplasias podem ser encontrados no site do


Instituto Nacional do Câncer:

www.inca.gov.br

Podem ser tabulados segundo o estado e o órgão atingido, estando


ainda disponíveis análises epidemiológicas atualizadas sobre a incidência
e a mortalidade.

Saiba mais

De modo similar, os registros de Aids, tuberculose, hanseníase e diabetes


podem ser obtidos no site do Ministério da Saúde:

www.saude.gov.br

4.3.3 Mortalidade

Os dados das declarações de óbito são informatizados e dão origem ao Sistema de Informação de
Mortalidade (SIM) e encontram-se também disponíveis em meios eletrônicos (www.datasus.gov.br).

No SIM, os dados de mortalidade podem ser tabulados, em nível nacional, estadual e municipal,
de modo a serem obtidas distribuições dos óbitos segundo as variáveis contidas na causa básica do
óbito. Este sistema, assim como os demais sistemas que têm disponibilizado bases eletrônicas de dados,
encontra-se em permanente aperfeiçoamento e é importante que as notas técnicas sobre a metodologia
aplicada sejam rigorosamente observadas quando da sua utilização.

4.3.4 Áreas e situação de risco

No sentido de prever a ocorrência de agravos e traçar prioridades de intervenção, é necessário manter


atualizadas as informações acerca de áreas, situações e grupamentos humanos expostos ao risco de
adoecer. Esses dados com frequência podem ser obtidos em setores externos à vigilância epidemiológica
e ao próprio setor de saúde. Por exemplo, se o interesse da vigilância epidemiológica estiver em
reduzir a mortalidade por atropelamento, necessita-se conhecer os locais onde o risco de ocorrência
deste evento seja mais elevado para priorizar ações. As ocorrências de acidentes automobilísticos
encontram-se disponíveis em órgãos governamentais de controle do tráfego rodoviário.

97
Unidade I

De modo semelhante, encontra-se o conhecimento sobre o risco de exposição e agrotóxicos


ou há produtos hemoterápicos contaminados e, ainda, dos diferenciais de risco de aquisição de
doenças de veiculação hídrica segundo as condições de saneamento, além dos complexos aspectos
socioculturais e a infinidade de comportamento e hábitos de vida denominados como de risco para
determinadas doenças.

4.3.5 Laboratórios, farmácias e indústrias de medicamentos

Os laboratórios de análises clínicas e os serviços de hemoterapia constituem uma importante fonte


de informação para a vigilância epidemiológica em diversos países. O monitoramento de infecções de
transmissão sanguínea, como a Aids e as hepatites B e C, através do conhecimento da soroprevalência
em doadores de sangue, é frequentemente empregado para comparar regiões e grupos diversos,
segundo o risco.

A curva de produção e consumo de determinados medicamentos pode indicar a existência ou a maior


frequência de certas doenças e, até mesmo, explicar a ocorrência ou ausência de outras. Por exemplo,
o consumo elevado de vermífugos poderia explicar a inexistência de verminoses em comunidades de
saneamento básico deficiente.

4.3.6 Imprensa e comunidade

Aliadas eficientes na obtenção de informações, a imprensa e a comunidade devem ser valorizadas,


em especial em localidades onde a vigilância epidemiológica não está bem estruturada. Além disso,
podem participar de modo eficaz nas etapas de divulgação, multiplicando informações sobre as medidas
preventivas a serem tomadas diante da ocorrência de uma epidemia.

4.4 Fluxo de informação

No Brasil, o Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica foi instituído em 1975, através da


Lei Federal nº 6.529 (BRASIL, 1975), em que também foi criada a obrigatoriedade da notificação
compulsória de doenças. Desde então, a lista nacional de doenças de notificação compulsória vem
sendo periodicamente atualizada.

A portaria nº 1.271, de 6 de junho de 2014 (BRASIL, 2014) define a Lista Nacional de Notificação
Compulsória de doenças, agravos e eventos de saúde pública nos serviços de saúde públicos e privados
em todo o território nacional, nos termos do anexo, e dá outras providências.

Lista Nacional de Notificação Compulsória:

1 – a) Acidente de trabalho com exposição a material biológico; b) Acidente de trabalho:


grave, fatal e em crianças e adolescentes.

2 – Acidente por animal peçonhento.

98
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

3 – Acidente por animal potencialmente transmissor da raiva.

4 – Botulismo.

5 – Cólera.

6 – Coqueluche.

7 – a) Dengue – casos; b) dengue – óbitos.

8 – Difteria.

9 – Doença de chagas aguda.

10 – Doença de creutzfeldt-jakob (DCJ).

11 – a) Doença Invasiva por “haemophilus influenza”; b) Doença meningocócica.

12 – Doenças com suspeita de disseminação intencional: a) antraz pneumônico;


b) tularemia; c) varíola.

13 – Doenças febris hemorrágicas emergentes/reemergentes: a) arenavírus; b) ebola;


c) marburg; d) lassa; e) febre purpúrica brasileira.

14 – Esquistossomose.

15 – Evento de saúde pública (ESP) que se constitua ameaça à saúde pública


(ver definição no art. 2º desta portaria).

16 – Eventos adversos graves ou óbitos pós-vacinação.

17 – Febre amarela.

18 – Febre de chikungunya.

19 – Febre do Nilo Ocidental e outras arboviroses de importância em saúde pública.

20 – Febre maculosa e outras riquetisioses.

21 – Febre tifoide.

22 – Hanseníase.

23 – Hantavirose.
99
Unidade I

24 – Hepatites virais.

25 – HIV/AIDS – infecção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana ou Síndrome da


Imunodeficiência Adquirida.

26 – Infecção pelo HIV em gestante, parturiente ou puérpera e criança exposta ao risco


de transmissão vertical do HIV.

27 – Infecção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV).

28 – Influenza humana produzida por novo subtipo viral.

29 – Intoxicação exógena (por substâncias químicas, incluindo agrotóxicos, gases tóxicos


e metais pesados).

30 – Leishmaniose tegumentar americana.

31 – Leishmaniose visceral.

32 – Leptospirose.

33 – a) Malária na região amazônica; b) malária na região extra Amazônica.

34 – Óbito: a) infantil; b) materno.

35 – Poliomielite por poliovírus selvagem.

36 – Peste.

37 – Raiva humana.

38 – Síndrome da rubéola congênita.

39 – Doenças exantemáticas: a) sarampo; b) rubéola.

40 – Sífilis: a) adquirida; b) congênita; c) em gestante.

41 – Síndrome da paralisia flácida aguda.

42 – Síndrome respiratória aguda grave associada a coronavírus a. SARS-CoV; b. MERS-CoV.

43 – Tétano: a. Acidental; b. Neonatal.

44 – Tuberculose.
100
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

45 – Varicela - caso grave internado ou óbito.

46 – a. Violência: doméstica e/ou outras violências.

b. Violência: sexual e tentativa de suicídio.

Adaptado de: Brasil (2014b).

A inclusão de doenças nesta lista é decidida mediante a consideração conjunta de critérios, de modo
não linear, não sendo necessário o atendimento a todos eles: magnitude, potencial de disseminação,
transcendência, vulnerabilidade, compromissos internacionais, regulamento sanitário internacional e
epidemias, surtos e agravos inusitados.

A notificação deve ser sigilosa e efetuada mediante a suspeita da doença, não sendo necessária a
confirmação do caso, pois costuma resultar em perda de notificação e/ou atraso na tomada de decisão.

O envio de formulários de notificação deve ser realizado mesmo na circunstância de ausência de


casos de notificação compulsória. Esta notificação – denominada de negativa – funciona como indicador
de aceitabilidade do sistema de informação.

Atualmente, o fluxo de informação da vigilância epidemiológica (figura a seguir) está informatizado


e vem sendo aperfeiçoado, tendo em vista que o dado coletado deve ter qualidade e homogeneidade
sem prejuízo à detecção da multiplicidade de situações e à oportunidade da instituição de medidas
de controle.

Unidades ambulatoriais Hospitais Outras fontes


de saúde

Secretaria municipal
do estado

Municipal
Regional de saúde

Estadual
Secretaria estadual de
saúde

Nacional
Ministério da saúde

Figura 9 – Fluxo de informação do Sinan

Propõe-se, de maneira geral, que as fichas individuais de notificação sejam preenchidas pelos
profissionais de saúde nas unidades assistenciais, as quais devem manter uma segunda via arquivada,

101
Unidade I

pois a original é remetida para o serviço de vigilância epidemiológica responsável pelo desencadeamento
das medidas de controle necessárias. Este, por sua vez, além dessa incumbência, deve encaminhar os
formulários para o setor de digitação das secretarias municipais, para que posteriormente os arquivos de
transferência sejam enviados por meio magnético às secretarias estaduais e, em seguida, ao Ministério
da Saúde, conforme periodicidade definida na figura a seguir.

Secretaria municipal de saúde Regional de saúde


Semanal Semanal

Secretaria de estado da saúde Ministério da saúde


1º ao 3º dia útil
15º ao 18º dia útil

Figura 10 – Periodicidade para envio dos arquivos de transferência do Sinan

Preconiza-se que, em todas as instâncias, os dados aportados pelo Sinan sejam consolidados e
analisados e que haja uma retroalimentação dos níveis que o antecedem, além de sua redistribuição,
segundo local de residência dos pacientes objetos das notificações.

Saiba mais

No nível federal, os dados do Sinan são processados, analisados


juntamente com aqueles que chegam por outras vias e divulgados pelo
Boletim Epidemiológico do SUS e informes epidemiológicos eletrônicos,
disponibilizados no site:

www.saude.gov.br

Ao contrário dos demais sistemas, em que as críticas de consistência são realizadas antes do envio
a qualquer outra esfera de governo, a necessidade de desencadeamento imediato de uma ação faz com
que, nesse caso, os dados sejam enviados o mais rapidamente possível, ficando a sua crítica para um
segundo momento – quando do encerramento do caso e, posteriormente, o da análise das informações
para divulgação. No entanto, apesar desta peculiaridade, esta análise é fundamental para que se possa
garantir uma base de dados com qualidade, não podendo ser relegada a segundo plano, tendo em vista
que os dados já foram encaminhados para os níveis hierárquicos superiores.

A partir da alimentação do banco de dados do Sinan, pode-se calcular a incidência, prevalência,


letalidade e mortalidade, bem como realizar análises de acordo com as características de pessoa, tempo
e lugar, particularmente no que se refere às doenças transmissíveis de notificação obrigatória, além
de outros indicadores epidemiológicos e operacionais utilizados para as avaliações local, municipal,
estadual e nacional.

102
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Para que o Sinan se consolide como a principal fonte de informação de morbidade para as
doenças de notificação compulsória, faz-se necessário garantir tanto a cobertura como a qualidade
das informações. Sua utilização, em todo o território nacional, possivelmente, possibilitará a
obtenção dos dados indispensáveis ao cálculo dos principais indicadores necessários para o
monitoramento dessas doenças, gerando instrumentos para a formulação e avaliação das políticas,
planos e programas de saúde, subsidiando o processo de tomada de decisões e contribuindo para a
melhoria da situação de saúde da população.

4.5 Avaliação da vigilância epidemiológica

A avaliação do sistema de vigilância tem como objetivo promover o melhor uso dos instrumentos
do sistema através do desenvolvimento de sua eficiência e efetividade. Os Centers for Disease Control
and Prevention, dos EUA, em 1988, desenvolveram uma metodologia de avaliação de sistemas de
vigilância epidemiológica. Ela avalia a vigilância epidemiológica com base em critérios preestabelecidos
e é internacionalmente reconhecida, o que permite efetuar comparações com avaliações realizadas em
outros países.

A avaliação deve ser permanente em todos os níveis do sistema de vigilância epidemiológica e ser
norteada por dois eixos fundamentais: o evento adverso à saúde sob vigilância e o sistema de vigilância
epidemiológica. O evento é enfocado sob os aspectos da magnitude, transcendência e vulnerabilidade,
e o sistema segundo atributos de utilidade, qualidade (sensibilidade, especificidade, representatividade,
oportunidade, simplicidade, flexibilidade, aceitabilidade e custo).

Para se efetuar esta avaliação, utilizam-se instrumentos que subsidiam a mensuração de cada
um dos aspectos relacionados ao evento e aos atributos do sistema: os indicadores epidemiológicos
e os operacionais. Os indicadores epidemiológicos são utilizados para mensurar questões relativas à
importância do evento, e os operacionais são úteis na avaliação do sistema.

Saiba mais

Para mais detalhes sobre vigilância epidemiológica no Brasil, consulte:

BRASIL. Ministério da Saúde. Vigilância em saúde no SUS: fortalecendo


a capacidade de resposta aos velhos e novos desafios. Brasília, 2006.
Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/vigilancia_
saude_SUS.pdf.

4.6 Métodos empregados em Epidemiologia

A demanda por qualidade máxima do cuidado em saúde, combinada com a necessidade de uso
racional de recursos tanto públicos quanto privados, tem contribuído para aumentar a pressão sobre
os profissionais da área da saúde no sentido de assegurar a introdução de uma prática baseada em
103
Unidade I

evidências científicas. A expressão “medicina baseada em evidência” surgiu na década de 1980 para
descrever a aprendizagem baseada em problemas, usada pela McMaster University Medicine School.
Prática Baseada em Evidência (PBE) e Cuidado em Saúde Baseado em Evidência compreendem os
mesmos conceitos e princípios da Medicina baseada em evidência, sendo empregados por diferentes
profissionais e em diversos contextos de saúde.

No intuito de melhor conhecer a saúde da população, os fatores que a determinam, a evolução do


processo da doença e o impacto das ações propostas para alterar o seu curso, os homens de ciência
desenvolveram numerosas maneiras de abordagem e investigação. Como consequência, existem muitos
métodos a nossa disposição. Na verdade eles são comuns a outros ramos da ciência. Para uma dada
situação ou momento, um deles poderá ser mais adequado do que outro, embora vários sejam usados
no estudo de um mesmo tema. Cada qual tem os seus aspectos positivos e suas limitações, de modo
que, os conhecendo, pode-se antecipar as facilidades e as dificuldades encontradas pelas pessoas que
os utilizam; e julgar, ao avaliar a metodologia empregada, os resultados apresentados e a interpretação
dada, ou seja, se a teoria foi convenientemente aplicada.

Na investigação de um tema, três estratégias independentes de abordagem vêm sendo utilizadas,


de longa data, pelos profissionais da área da saúde: o estudo de casos, a investigação experimental em
laboratório e a pesquisa, considerando a população.

4.6.1 Estudo de casos

O estudo de casos costuma ser a primeira abordagem de um tema. Ele é usado para a avaliação
inicial de problemas ainda mal conhecidos e cujas características ou variações naturais não foram
devidamente detalhadas. Muitas revistas científicas apresentam uma seção de “relato” ou “apresentação
de casos”, para difundir os resultados destes estudos. Trata-se de observar um ou poucos indivíduos com
uma mesma doença ou evento e, a partir da descrição dos respectivos casos, traçar um perfil das suas
principais características.

Essa forma de abordagem e as pesquisas qualitativas, de maneira geral, são usadas em combinação
com as quantitativas, para compor um quadro mais completo da situação. Assim sendo, o estudo de
casos é empregado para enfocar grupos específicos da população ou um particular aspecto de interesse,
não devidamente investigados em pesquisas quantitativas ou que simplesmente necessitem de
suplementação de informações, com maior riqueza de detalhes (LIMA-COSTA; BARRETO, 2003).

4.6.1.1 Aspectos positivos do estudo de casos

Em geral, o estudo de caso é relativamente fácil de ser realizado e de baixo custo. O relato pode
restringir-se a uma simples descrição ou ir mais além, de modo a sugerir explicações sobre elementos
pouco conhecidos, tais como os fatores implicados na etiologia ou no curso de doença, sob vigência
ou não de terapêutica. Em clínica, é possível acompanhar pacientes durante anos, e mesmo décadas,
chegando-se a um quadro repleto de detalhes sobre aspectos evolutivos de uma dada condição. O
estudo de caso constitui-se em um verdadeiro inventário do que acontece genericamente, à luz da
observação de poucos indivíduos. É um enfoque qualitativo e exploratório, embora muitas facetas
104
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

possam ser quantificadas. Um aspecto positivo convém realçar: é a possibilidade de observação


intensiva de cada caso.

4.6.2 Limitações do estudo de casos

Às vezes, a observação restringe-se a situações incomuns de enfermos graves, outras vezes, aos
casos de evolução atípica, de reação inusitada ou de resultado terapêutico inesperado; muito raramente,
abrange pacientes em todas as fases de manifestação da doença.

Além disso, há certa dose de subjetividade na apreciação dos fatos, difícil de contornar, pois o
observador já pode ter uma ideia preconcebida do tema e a faz preponderar.

Apesar das vantagens referentes à facilidade de realização e baixo custo, duas limitações principais
estão presentes no estudo de casos:

• a falta de controle – os casos serviriam para contornar problemas de aferição e comparação;

• número pequeno de indivíduos incluídos para observação – o que aponta para a prudência na
interpretação dos resultados de estudos de casos, especialmente na generalização das conclusões.
De modo geral, este tipo de investigação, como tem sido atualmente empregado na área clínica, é
útil para levantar problemas, muito dos quais são complementarmente investigados com o auxílio
de outros métodos.

4.7 Investigação experimental de laboratório

Nesta segunda modalidade de estudo de um tema, é possível imprimir maior precisão a todas as
etapas de investigação.

Aspectos positivos da investigação de laboratório

O laboratório é o lugar ideal para estudos experimentais. O grau de subjetividade na aferição dos
dados pode ser reduzido, em laboratório, pelo uso de rigorosos controles, que servem também para
parâmetros a fim de comparar os resultados.

Na maioria das vezes, por motivos éticos, o foco da avaliação incide sobre os animais, embora as
pessoas possam ser igualmente alvo deste tipo de investigação, em casos selecionados.

Principal limitação da investigação experimental de laboratório

A questão problemática das investigações em animais reside na extrapolação de resultados para


os seres humanos. Em última análise, este é o ângulo que realmente interessa. A prudência é sempre
recomendada, na extrapolação, visto que diferenças entre espécies podem invalidar as generalizações.

105
Unidade I

4.8 Pesquisa populacional

A pesquisa populacional é a terceira estratégia para estudo de um tema. Ela é a abordagem central
da Epidemiologia, sendo também empregada em outras áreas, como na Genética e nas Ciências Sociais.

Conjuntos formados por indivíduos (particularizados um a um ou agregados por algum critério)


constituem a matéria-prima da investigação epidemiológica. Os agregados de que trata a pesquisa
epidemiológica são quase sempre referidos a uma base geográfica e temporal, constituindo populações
em um sentido estrito. Eles são mais do que o somatório dos indivíduos que os compõem, porque
os coletivos humanos são necessariamente determinados, social e culturalmente. Por esse motivo, a
Epidemiologia estuda duas classes de seres: agregados humanos, coletivos de homens e mulheres e
indivíduos membros desses agregados.

Justifica-se, assim, adotar como principal eixo estruturante da arquitetura da pesquisa


epidemiológica o tipo de unidade de observação e de análise expresso na dicotomia “estudo
agregado versus estudo individualizado”. Após considerar esse critério de base, estudos
epidemiológicos podem então ser classificados de acordo com dois eixos complementares; o
primeiro refere-se ao posicionamento do investigador, e o segundo remete à dimensão temporal
do estudo. O papel do investigador em sua relação com o objeto da investigação compreende
dois tipos: posição passiva e ativa.

O posicionamento passivo implica a observação, da forma mais metódica e acurada possível, dos
processos de produção de doentes em populações, com o mínimo de interferência nos objetos concretos
estudados. O posicionamento ativo atende às estratégias de ação do investigador no sentido de interferir
nos processos de estudos, de maneira sistemática e controlada, resultando no que correntemente se
denomina experimentação. Experimentos constituem manobras de intervenção que têm como objetivo
isolar efeitos, controlar interferências externas e desencadear processos cruciais para o teste de hipóteses.
Para equivaler à polaridade passivo-ativo, no presente contexto, empregamos a oposição operacional
(ainda que limitada e parcial) entre observação versus intervenção.

A temporalidade do desenho do estudo, para o que nos interessa na investigação epidemiológica,


pode ser desdobrada em duas categorias: instantânea e serial.

O caráter instantâneo de um estudo se define quando a produção do dado é realizada em um único


momento no tempo, como se fora um corte transversal do processo em observação. Uma metáfora
espacial do tempo justificaria o uso do termo “transversal” para essa modalidade de desenho.

Por outro lado, qualquer tipo de seguimento em uma escala temporal define o caráter serial de um
dado estudo. Ainda com base na metáfora do “tempo linear”, tem-se empregado o termo “longitudinal”
para essa designação.

106
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

4.9 Critérios para a classificação de métodos empregados em Epidemiologia

Muitos são os critérios empregados para classificar os métodos utilizados na Epidemiologia, entre
os quais:

• o propósito geral, que distingue os estudos descritivos e os analíticos (os últimos também ditos
comparativos ou de testes de hipóteses);

• o modo de exposição das pessoas ao fator em foco, pelo quais são separados os estudos de
observação e os de intervenção (experimentação);

• a direção temporal das observações, que diferencia os estudos prospectivos (coortes), retrospectivos
(casos-controle) e transversais;

• a unidade de observação, que divide as pesquisas em dois tipos: aquelas em que a unidade é o
indivíduo, e as que têm como unidade de observação um grupo de indivíduos: por exemplo, um
município ou país.

Existem outros critérios que geram outras classificações, como os seguintes: longitudinal x transversal,
estudo controlado x não controlado, randomizado x não randomizado, experimental x quase experimental etc.

4.9.1 Estudos descritivos

Os estudos descritivos têm por objetivo determinar a distribuição de doenças ou condições relacionadas
à saúde, segundo o tempo, o lugar e/ou as características dos indivíduos, ou seja, esclarecer: quando, onde
e quem adoece. A Epidemiologia descritiva pode fazer uso de dados secundários (dados preexistentes
de mortalidade e hospitalizações, por exemplo) e primários (dados coletados para o desenvolvimento do
estudo). Também examina como a incidência (casos novos) ou a prevalência (casos existentes) de uma
doença ou condição relacionada à saúde varia de acordo com determinadas características, como sexo,
idade, escolaridade e renda entre outras. Quando a ocorrência da doença/condição relacionada à saúde
difere segundo o tempo, lugar ou pessoa.

Coleta de novos dados

No Brasil, existem importantes bancos de dados secundários – como o Sistema de Informações sobre
Mortalidade (SIM-SUS), o Sistema de Informações sobre Autorizações de Internações Hospitalares
(SIH-SUS) e a Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar (PNAD, 1998) – que podem ser usados em
estudos epidemiológicos.

Usos dos resultados dos estudos descritivos

A inspeção da distribuição das frequências de um evento, sejam elas dispostas em tabelas, gráficos
ou outra forma de expressão de resultados, é utilizada para alcançar dois objetivos principais:

107
Unidade I

• Identificar os grupos de risco, o que informa sobre as necessidades e características dos


seguimentos que poderiam beneficiar-se de alguma forma de medida saneadora – daí a íntima
relação da Epidemiologia com a prevenção de doenças e o planejamento de saúde.

• Sugerir explicações para as variações de frequência, o que serve de base ao prosseguimento


de pesquisas sobre o assunto, através de estudos analíticos – o que atesta o forte
componente de investigação, existente na Epidemiologia.

4.9.2 Estudos analíticos

Tem o objetivo básico de avaliar (não apenas descrever) se a ocorrência de um determinado evento é
diferente entre indivíduos expostos e não expostos a um determinado fator ou de acordo com as características
das pessoas. Estes são estudos realizados com o objetivo específico de testar hipóteses que relacionem eventos:
uma suposta “causa” e um “dado efeito” ou, como habitualmente referido, entre a exposição e a doença.

Os estudos analíticos diferem dos descritivos em um importante aspecto: a presença de um grupo


controle, formado ao mesmo tempo com o grupo de estudo e que serve para a comparação dos resultados.
O modo como os grupos de estudo e controle é formado gera os diversos tipos de estudos analíticos.

De uma maneira esquemática: a investigação de uma relação exposição-doença pode ser feita de
três modos em função de o ponto de partida das observações ser a causa ou o efeito. O investigador
introduz um fator de exposição ou um novo recurso terapêutico e avalia-o, utilizando ferramentas
bioestatísticas. Geralmente, constituem-se na base dos estudos primários.

São três os pontos de partida das investigações analíticas. Visto em um deles, haver duas possibilidades
randomizar ou não para formar grupos, o resultado e um total de quatro delineamentos básicos, em
que há formação de um “grupo de estudo” e de um “grupo controle” para a comparação dos resultados.

4.9.3 Estudo experimental, do tipo ensaio clínico randomizado

O estudo clínico randomizado (ECR) consiste em um tipo de estudo experimental, desenvolvido em


seres humanos e que visa ao conhecimento do efeito de intervenções em saúde. Pode ser considerado
como uma das ferramentas mais poderosas para a obtenção de evidências para a prática clínica.
Associada a essa característica, encontra-se a simplicidade em seu desenho, quando comparado a outros
tipos de estudos. Bons ECRs são capazes de minimizar a influência de fatores de confusão sobre relações
de causa-efeito, quando comparados aos demais desenhos, daí sua grande relevância como fonte de
evidências. No caso específico do ECR, diferencia-se dos demais tipos de estudos clínicos experimentais
pelo fato de que os participantes recebem uma dentre as intervenções propostas de forma aleatória.

No contexto da classificação dos estudos científicos em saúde, pode-se dizer que os ECRs são, em
se tratando de estudos primários, os de maior relevância para a clínica. As revisões sistemáticas, apesar
de serem consideradas ainda mais relevantes, são estudos secundários, ou seja, dependem de estudos
primários com qualidade para derivarem inferências. Daí a grande importância dos ECRs como fonte de
evidências também para as revisões sistemáticas.
108
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

A fim de determinar se um artigo científico refere-se ao relato de um ECR, quatro características


fundamentais devem ser identificadas: a primeira delas é a comparação entre intervenções aplicadas à saúde
de seres humanos, ou seja, estudos sobre aspectos sem relação direta com a saúde ou desenvolvidos em
animais são desconsiderados; um segundo aspecto relevante é a natureza prospectiva, as intervenções são
planejadas antes, e a exposição é controlada pelos pesquisadores; em terceiro lugar, duas ou mais intervenções
são comparadas no estudo. Por intervenção, entendem-se, além de tratamentos para desordens físicas ou
mentais, os regimes preventivos, programas de detecção ou testes diagnósticos (uma pode ser um grupo
controle/sem tratamento). Além disso, uma ou mais das intervenções comparadas pode ser constituída por
um grupo controle, sem nenhum procedimento ativo. Por fim, a aplicação das intervenções deve ser aleatória,
tendo apenas a chance influenciando o processo.

Uma primeira característica do ensaio clínico randomizado é o recrutamento de um grupo comum, a


partir de uma população de interesse. Em seguida é que se decidem quais intervenções os participantes
receberão, por meio da randomização. Tecnicamente, esse processo envolve determinar a alocação
por meio de números obtidos por sorteio, ao invés de características da amostra ou preferência dos
participantes. Após a aplicação das intervenções, realiza-se a leitura de uma ou mais variáveis de
desfecho que, na figura, apresenta-se como presente e ausente (SOUZA, 2009).

4.9.4 Estudos de coorte

O termo coorte é utilizado para nomear um grupo de indivíduos que têm em comum um conjunto
de características e que são observados durante um período de tempo com o intuito de analisar a
sua evolução. Em um estudo de coorte, agrupa-se inicialmente um conjunto de indivíduos (coorte)
que não apresentam o resultado esperado (outcome), geralmente uma doença, mas que podem vir a
apresentá-lo (população em risco). No início do estudo, todos os indivíduos são classificados quanto aos
fatores (possíveis fatores de risco) que se pensa poder estar relacionados com o resultado esperado. Os
indivíduos são, então, seguidos por um período de tempo, analisando-se, depois, quais apresentaram o
resultado esperado, geralmente uma doença (figura a seguir).

Ausência da Exposição ao factor


doença de risco

Expostos
Doentes

Não doentes
População Amostra tempo

Não expostos Doentes

Não doentes

Figura 11 – Representação de um estudo de coorte

Desta forma, podemos estudar o modo como a presença de características específicas influencia o
aparecimento de determinada doença, comparando os riscos daqueles que têm uma característica de
desenvolvê-la com o risco daqueles que não a têm (quadro a seguir).
109
Unidade I

Quadro 4 – Cálculo do risco relativo (RR) num estudo de coorte

Doença

Casos Controles

Expostos A B
Exposição
Não expostos C D
RR = _____A/(A+B)_____
C/(C+D)

A expressão básica de risco é a incidência cumulativa, definida como a proporção de novos casos de
uma doença que surgem numa determinada população durante um período de tempo específico. Nos
estudos de coorte, interessa-nos, normalmente, comparar os riscos de duas populações que diferem
quanto à exposição a um determinado fator. Para comparar riscos, utilizam-se as chamadas medidas de
associação e de impacto, também designadas medidas de efeito, de que em seguida se citam algumas
das comumente usadas em estudos de coorte:

• Risco Atribuível (RA): é uma medida que corresponde à diferença de riscos, ou incidências cumulativas
(IC), entre os indivíduos expostos e os não expostos ao fator em estudo. Responde à questão: “qual
é o risco (incidência cumulativa) adicional de vir a desenvolver a doença devido à exposição ao fator
em causa?”

RA = ICE - ICE

• Risco Relativo (RR): é uma medida de associação, também conhecida por razão de riscos, e
corresponde à razão entre os riscos ou incidências cumulativas dos indivíduos expostos e a dos
não expostos. Responde à questão: “quantas vezes é mais provável os indivíduos expostos virem
a desenvolver a doença em relação aos não expostos?”

ICE
RA =
ICE

• Percentagem de Risco Atribuível (RA%): é uma medida de impacto e é uma estimativa da


“quantidade de doença” que é atribuível, unicamente, à exposição. Representa, também, a
proporção de doença que poderia ser eliminada se fosse removida a exposição.

RA
RA% = x100
ICE

Usando os parâmetros de classificação dos desenhos de estudo, podemos dizer que um estudo
de coorte é observacional, longitudinal, normalmente, prospectivo, descritivo ou analítico, tem como
unidades de análise os indivíduos e, como base de seleção dos participantes, a existência de uma
determinada exposição.
110
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Para além dos estudos de coorte prospectivos, existem dois outros tipos: retrospectivos ou
históricos (em que exposição e tempo de seguimento aconteceram no passado), e os estudos de
coorte duplo ou com controles externos (em que os indivíduos expostos e os não expostos pertencem
a populações diferentes).

Os estudos de coorte têm uma vasta utilização na investigação biomédica, servindo para responder
a vários tipos de questões, dependendo das características dos indivíduos e dos resultados esperados.
Assim, através dos estudos de coorte, pode-se estudar a incidência, os fatores de risco e o prognóstico
de doenças, assim como, avaliar intervenções terapêuticas ou preventivas.

Vantagens

Os estudos de coorte são a melhor alternativa aos experimentais, que são muitas vezes inviáveis em
investigação biomédica. Uma das principais vantagens desses estudos é serem melhores, senão mesmo,
os únicos, métodos de estudar a incidência e história natural das doenças.

Eles seguem a mesma lógica que os ensaios clínicos (“se um indivíduo for exposto a um determinado
fator, desenvolverá ou não a doença?”), e permitem garantir que o fator em causa preceda no tempo o
aparecimento do resultado esperado (outcome), fortalecendo assim a inferência de que o fator pode ser
uma causa do resultado esperado.

Os estudos de coorte são especialmente úteis para estudar doenças potencialmente fatais. Quando são
estudadas, retrospectivamente, é necessário recorrer a dados indiretos (processos clínicos, testemunhos
de familiares etc.), o que torna muito difícil e, por vezes, impossível, a medição de certos fatores. Por
exemplo, um familiar conseguirá, facilmente, dizer se o indivíduo falecido fumava ou não, mas a sua
capacidade de quantificar o número de cigarros que ele fumava por dia será muito mais limitada.

O fato dos estudos de coorte ser prospectivo permite fazer uma medição das variáveis ou fatores
que apresentam, de um modo completo, válido e preciso; primeiro porque determinam exposições no
presente sem ter de recorrer à memória dos indivíduos, ou a outras fontes indiretas, o que poderia
enviesar a determinação. Segundo porque as determinações são feitas antes do resultado esperado,
geralmente, uma doença ter acontecido, evitando, assim, o enviesamento inerente à determinação da
exposição num indivíduo que conhece já o seu estado de doente. Por outro lado, o caráter prospectivo
desses estudos permite analisar a relação entre os fatores em estudo e vários resultados esperados. Por
exemplo, o estudo de todas as doenças relacionadas com os hábitos tabágicos, o que não é possível
com outros estudos. Ainda relacionado com o caráter prospectivo dos estudos de coorte está o fato de
permitirem apresentar resultados com crescentes tempos de seguimento, aumentando, assim, o número
de casos e o poder estatístico do estudo à medida que o tempo de seguimento se torna mais longo, em
detrimento de um modesto aumento no custo do estudo.

Desvantagens

Do ponto de vista puramente científico, a maior desvantagem dos estudos observacionais,


nomeadamente os de coorte, é estarem sujeitos a um número muito maior de vieses, ou erros
111
Unidade I

sistemáticos, que os experimentais, uma vez que não se controla diretamente a exposição ao fator em
estudo. Os fatores de confusão são um importante exemplo desse tipo de erros. As pessoas que são
expostas a um determinado fator de risco, provavelmente, diferem do grupo das não expostas, com
que são comparadas em muitos outros fatores para além daquele que se pretende estudar. Se tais
fatores estiverem relacionados com a doença, poderão ser eles, e não o fator que se pretende estudar,
os responsáveis pela possível associação que se pode encontrar entre o fator em causa e a doença. A
estes outros fatores que estão associados simultaneamente à doença em estudo e ao fator em causa e
que confundem a relação entre este e a doença, dá-se o nome de “fatores de confusão” (confounding
factors). Por exemplo, os hábitos tabágicos podem ser um fator de confusão quando se pretende estudar
a associação entre a prática de exercício físico e o enfarte agudo do miocárdio (EAM). Se os fumantes
praticam menos exercício físico que os não fumantes e têm, ao mesmo tempo, maior incidência de EAM,
então uma aparente associação entre uma menor prática de exercício físico e uma maior incidência de
EAM poderá, na realidade, dever-se ao fator de confusão, ou seja, hábitos tabágicos.

Do ponto de vista prático, uma importante desvantagem dos estudos de coorte é que, se o resultado
esperado, geralmente uma doença, for pouco frequente (o que, normalmente, acontece) um grande
número de indivíduos tem de ser seguido durante um longo período de tempo para poder tirar conclusões.
Assim, os estudos de coorte são um método muito caro e pouco eficaz, especialmente, para estudar
doenças raras. A eficácia de um estudo de coorte é crescente com a frequência da doença em estudo.
Esses estudos são, por isso, muito mais eficazes na averiguação do prognóstico de doenças, em que os
resultados esperados têm, geralmente, uma maior frequência e com tempos de seguimento menores.

Outro fator que pode tornar mais caro e mais difícil a formação de uma coorte é o fato de ser
necessário ter a certeza de que é constituída, no início, por indivíduos que não apresentam o resultado
esperado, exigindo, assim, a disponibilidade e utilização de testes suficientemente sensíveis e específicos
como para poder excluir, com certeza, a doença em causa em todos os indivíduos.

Outro fator é o fato de o seguimento dos doentes nos estudos de coorte dever prolongar-se por um
período de tempo suficientemente longo, para permitir que o risco inerente à exposição se manifeste.
Por exemplo, se pretendêssemos estudar a relação entre a irradiação do pescoço e o cancro da tiroide,
um tempo de seguimento de um ano seria, nitidamente, insuficiente.

Um dos grandes obstáculos à apresentação de conclusões válidas num estudo de coorte prende-se
com as chamadas perdas de seguimento (follow-up). Nesses estudos, idealmente, todos os indivíduos
devem ser observados ao longo de todo o período de seguimento ou até atingirem o resultado esperado,
uma vez que, se as causas e a magnitude do abandono (drop out) estiverem de algum modo, ligados ao
aparecimento da própria doença, as conclusões do estudo poderão ser enviesadas.

4.9.5 Estudos de caso-controle

Ao contrário dos dois delineamentos mostrados anteriormente, o ensaio clínico randomizado e o


estudo de coorte, a investigação do tipo caso-controle parte do efeito para chegar às causas. É, portanto,
uma pesquisa etiológica retrospectiva, feita de trás para frente, só podendo ser realizada após o fato
consumado, ou seja, depois de o efeito já ter ocorrido.
112
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Os estudos tipo caso-controle são indicados em:

• Situações como as encontradas em surtos epidêmicos ou diante de agravos desconhecidos, em que


é indispensável à identificação urgente da etiologia da doença com o objetivo de uma imediata
ação de controle.

• Esse delineamento permite, de forma rápida e pouco custosa, a investigação de fatores de risco
associados a doenças raras e de longo período de latência.

Os estudos tipo caso-controle apresentam, porém, algumas dificuldades:

• A análise retrospectiva dos dados obtidos depende muito da memória dos casos e dos controles, isso
pode gerar vieses de memória. Por exemplo, uma mãe de uma criança acometida de malformação
congênita será capaz de fazer uma descrição com maior riqueza de detalhes e maior precisão
das intercorrências ocorridas durante a gravidez, se comparada com a exposição desses mesmos
eventos realizada por uma mãe de uma criança normal.

• Outro problema é o viés de seleção de casos e controles, que pode ser atenuado se os casos
forem selecionados em uma única área com a observação de critérios bem padronizados para sua
inclusão no grupo.

Nos estudos tipo caso-controle, a classificação de um doente como caso pressupõe uma perfeita
definição das características desse grupo, que deve levar em consideração vários aspectos, entre eles:

• critério diagnóstico;

• aspectos e variedades clínicas;

• estadiamento da doença;

• emprego de casos ocorridos num intervalo definido de tempo (incidência) ou de casos prevalentes
em determinado momento;

• fonte dos casos que podem ser todos os atendidos por um ou mais serviços médicos ou todos os
doentes encontrados na população.

Esses cuidados são indispensáveis para garantir a maior comparabilidade interna entre casos e
controles e, portanto, uma estimativa mais consistente do risco.

A escolha do grupo controle constitui um dos pontos mais importantes do delineamento dos estudos
tipo caso-controle, devendo buscar a máxima semelhança entre casos e controles, à exceção do fato de
os controles não apresentarem a doença objeto do estudo. No entanto, isso é difícil de ser obtido, pois
até irmãos gêmeos são submetidos a diferentes exposições ambientais.

113
Unidade I

De uma maneira geral, para evitar possíveis distorções determinadas pela escolha dos controles
entre pacientes hospitalizados, recomenda-se que esses controles sejam escolhidos entre indivíduos
que vivam na vizinhança dos casos, ou sejam parentes, ou colegas de trabalho ou de escola, ou que
mantenham alguma relação de proximidade com os casos.

Os do tipo caso-controle não permitem o cálculo direto do RR em consequência da forma de


seleção dos participantes – casos (doentes) e controles (não doentes) – que não utilizam denominadores
que expressem a verdadeira dimensão dos grupos de expostos e de não expostos numa população
(SUZUMURA et al., 2006).

Condução do estudo de caso-controle, organização do trabalho de campo, supervisão


e coordenação

Deve-se organizar o trabalho de campo para o recrutamento dos participantes da pesquisa


elegíveis para os grupos caso e controle. Também é necessário estabelecer um sistema de supervisão e
coordenação, para que a pesquisa siga de acordo com o planejamento. Pode ser realizado um estudo
piloto para avaliar a logística do protocolo, porém fica a critério do investigador principal.

Controle de qualidade de dados

Um item pouco citado, mas muito importante em pesquisa é a abordagem para assegurar a qualidade e
consistência dos dados. Na ausência de procedimentos de controle de qualidade apropriados, são comuns
problemas com dados falsos e inconsistentes. Cabe ressaltar a importância da equipe de coordenação e
supervisão para o treinamento e acompanhamento dos entrevistadores. Também é recomendável que
os dados sejam tabulados em planilhas eletrônicas periodicamente, o que direciona o pesquisador para
checar a presença de dados imprecisos.

Análise dos dados

Deve ser feita a comparação da proporção de expostos entre casos com a proporção de expostos entre
os controles. A medida estatística de associação utilizada para o desenho de estudo de caso-controle
é a razão de chances (odds ratio), que se comporta como o risco relativo para os estudos de coorte e é
definida como o quociente entre a probabilidade de um determinado evento ocorrer e a de não ocorrer.
Quanto mais forte for a associação, medida pela razão de chances, maior será a possibilidade de haver
relação causal entre o fator de exposição e a ocorrência de HAS. Além disso, pode ser calculado o risco
atribuível na população (RAP).

Vantagens

Epidemiologistas frequentemente procuram estudos de caso-controle como um dos mais eficientes


tipos de desenho em termos de tempo, custo e esforço, o que é válido, caso a metodologia seja
corretamente empregada.

114
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Desvantagens

Uma importante desvantagem dos estudos de caso-controle é que apenas um desfecho pode ser
estudado, ou seja, a presença ou ausência de HAS, que foi o critério para a seleção das amostras. Mas
a maior desvantagem é sua suscetibilidade a vieses. Eles são decorrentes de duas principais situações:
processo de seleção dos grupos caso e controle e aferição retrospectiva das variáveis preditoras. Os vieses
de seleção devem ser minimizados ao máximo, seguindo as orientações já aludidas sobre os critérios de
seleção dos indivíduos dos grupos caso e controle, observando o pareamento e a captação de pessoas da
mesma área (comunidade, hospital ou clínica). Como a informação sobre o fator de exposição é obtida
após a ocorrência da doença, o participante da pesquisa pode não fornecer os dados corretamente.
Uma das maneiras de se tentar controlar esse viés é coletar as informações necessárias em registros
médicos ou documentos-fonte precedentes ao aparecimento da HAS. Outra maneira de controlar o viés
de aferição é realizar o cegamento dos investigadores e dos pacientes para evitar tendências na coleta
dos dados retrospectivos.

4.9.6 Estudos transversais

Cada indivíduo é avaliado para o fator de exposição e para a doença em determinado momento.
Muitas vezes o estudo transversal é realizado apenas com objetivo descritivo sem nenhuma hipótese
para ser avaliada. Alguns têm usado o termo “levantamento” para denominar estudos transversais
realizados com essa finalidade. O estudo transversal pode ser usado como um estudo analítico para
avaliar hipóteses de associações entre exposição ou características e evento.

No entanto, limitações existem quando se tenta concluir qual a natureza da relação entre exposição
e evento nessas situações. Essa limitação relaciona-se, principalmente, com o fato de que a exposição e
a doença são avaliadas ao mesmo tempo. Uma questão importante que pode ficar sem resposta é sobre
o que apareceu primeiro: o fator de exposição ou a doença. Outro ponto que deve ser observado nestes
estudos transversais é a dificuldade em separar os casos novos da doença dos casos já presentes por
algum tempo. Desta forma, os estudos transversais irão refletir não apenas determinantes de doença,
mas de sobrevida. Apesar das limitações, os estudos transversais, pelo fato de incluir indivíduos com e
sem o evento e de poder avaliar associações entre o evento e exposições ou características, podem ser
considerados um passo adiante na identificação dos determinantes de doenças, quando comparados
com relatos ou séries de casos.

Na verdade, existem situações em que os estudos transversais podem ser considerados


verdadeiramente analíticos. Isso ocorre quando o fator de exposição não sofre influência do tempo.
Diversos exemplos serão encontrados entre aqueles fatores presentes desde o nascimento, como tipo
sanguíneo, sexo (masculino, feminino) e sistema HLA. Como os estudos transversais descrevem o que
ocorre com um determinado grupo e em um determinado momento, eles são importantes guias para
tomadas de decisões no setor de planejamento de saúde. Para o profissional que lida diretamente com
pacientes, os estudos transversais oferecem informações da maior utilidade ao chamar atenção para
características ligadas com a frequência de uma determinada doença na comunidade ou determinado
serviço assistencial. Esses estudos, portanto, podem influenciar o raciocínio clínico e a tomada de
decisões na prática médica.
115
Unidade I

Quando da escolha do desenho de pesquisa, deve ser considerado que os estudos transversais,
habitualmente, exigem menos recursos financeiros e podem ser realizados mais rapidamente do que os
estudos de caso-controle ou coorte. Os estudos transversais também podem ser:

• Comparados – 4.835 indivíduos de 20 a 74 anos foram selecionados aleatoriamente da população


adulta do Rio Grande do Sul para, em sua própria residência, responderem a um questionário
sobre hábitos alimentares e terem sua pressão arterial medida. Os 4.565 indivíduos efetivamente
estudados foram então classificados como consumidores excessivos de sal ou não, e em hipertensos
e não hipertensos.

• Não comparados – (estudo de prevalência) 3.101 moradores da fronteira sudeste do Rio Grande
do Sul foram submetidos à investigação para determinar a prevalência de soropositividade para
hidatidose (SITTA et al., 2010).

Vantagens:

• Fáceis, rápidos e baratos.

• Boa fonte de hipóteses.

Desvantagens:

• Impossível determinar o que ocorre primeiro (causa - efeito).

• Desconhecimento da ação dos fatores no passado.

• Impossibilidade de estabelecer uma prova causal.

4.9.7 Estudos ecológicos

As medidas usadas representam características de grupos populacionais. Assim, a unidade de


análise é a população e não o indivíduo. Um exemplo seria um estudo envolvendo diversas cidades
brasileiras em que se procurasse correlacionar dados sobre mortalidade infantil por cada município
com a renda per capita e índice de analfabetismo do local no sentido de encontrar evidências de que
o nível socioeconômico é um dos determinantes de mortalidade infantil.

Observação

Os principais objetivos dos estudos ecológicos são a identificação de


regiões de sobrerrisco em relação à média global do processo estudado e
a busca de fatores explicativos dos diferenciais de incidência encontrados.

A limitação principal do estudo ecológico é que a relação entre o fator de exposição e o evento pode
não estar ocorrendo no indivíduo. Desta forma uma associação entre uma exposição e evento considerando
116
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

a população não permite afirmar que a exposição está mais presente naqueles que adquirem a doença –
falácia ecológica.

Estes estudos ajudam a identificar fatores que merecem uma investigação mais detalhada através
de estudo com maior capacidade analítica. Por exemplo, a demonstração de uma relação entre venda
de cigarros per capita e mortalidade de doença cardiovascular (DCV) em estudos ecológicos motivou
o planejamento de estudos caso-controle e coorte que vierem a demonstrar de forma bem mais
convincente que o hábito de fumar é um dos fatores determinantes de DCV, particularmente doença
coronariana e acidente vascular cerebral. Os estudos de séries temporais, em que uma mesma área
ou população é estudada em momentos distintos do tempo, são classificados como um subtipo dos
estudos ecológicos. Nesse caso, cada unidade de tempo passaria a ser tratada como uma unidade
ecológica completa.

Vantagens:

• Facilidade de execução.

• Baixo custo relativo.

• Simplicidade analítica.

• Capacidade de gerar hipóteses.

Desvantagens:

• Baixo poder analítico.

• Pouco desenvolvimento das técnicas de análise dos dados.

• Vulnerável à chamada “falácia ecológica”.

Resumo

A Epidemiologia é considerada a principal ciência de informação da


saúde, estuda a frequência, a distribuição e os determinantes dos problemas
de saúde nas populações – é a ciência básica para a saúde coletiva. Tem
como objetivo reduzir as doenças e agravos na sociedade, estudando
principalmente a ausência de saúde.

Em meados do século passado, por ocasião de uma epidemia de cólera


em Londres, John Snow (1854), pela existência de uma associação causal
entre a doença e o consumo de água contaminada por dejetos de doentes,
rejeita a hipótese de caráter miasmático da transmissão. Snow desenvolve
117
Unidade I

uma teoria sobre o modo de transmissão da cólera que, de maneira alguma,


pode ser lida como uma associação causal entre a doença e o consumo de
água contaminada.

Daquela época até o início deste século, a Epidemiologia vem ampliando


seu campo, e suas preocupações concentraram-se sobre os modos de
transmissão das doenças e o combate às epidemias.

Nas primeiras décadas, com a melhora do nível de vida e com o


consequente declínio na incidência das doenças infecciosas, outras
enfermidades de caráter não transmissível (doenças cardiovasculares, câncer
etc.) passaram a ser incluídas como objeto de estudos epidemiológicos.

Atualmente, além de dispor de instrumental específico para análise


do perfil de saúde-doença na população, a Epidemiologia possibilita
evidenciar questões levantadas pelas rotinas das ações de saúde, gerando
novos conhecimentos. Ela busca contribuir para a melhoria da qualidade de
vida e para o levantamento do nível de saúde das coletividades humanas.

A forma mais básica de determinação da frequência é através da


contagem de indivíduos afetados. Em estudos epidemiológicos, é necessário
saber o tamanho da população que deu origem aos casos e em que período
de tempo isso ocorreu.

As medidas de frequência mais comumente utilizadas em Epidemiologia


são a prevalência e a incidência. A prevalência mede a proporção de
indivíduos em uma população que está acometida da doença em um
determinado momento. É uma medida estática, relacionada a um ponto no
tempo, mesmo que a coleta de dados ocorra durante dias, meses ou anos.
A incidência refere-se ao número de novos eventos ou casos que ocorrem
em uma população em risco durante um determinado período de tempo.

A proporção de indivíduos afetados por uma doença em um determinado


momento (prevalência) depende do surgimento de casos novos em função
do tempo (incidência) e da duração desta doença, desde seu início até a
cura ou a morte. Portanto, para uma doença com baixa incidência, mas
que tenha uma demorada resolução, a prevalência será alta com relação
à incidência. Por outro lado, mesmo que a incidência seja alta, mas se a
duração for curta, seja por cura ou por morte, a prevalência não sofrerá
um processo de acumulação como no caso anterior. Será mais baixa
apresentando valores iguais ou ligeiramente maiores que a incidência.

O objetivo da vigilância epidemiológica hospitalar é detectar e


investigar doenças de notificação compulsória atendidas em hospital. A
118
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

notificação de doenças de notificação compulsória permite ao município


a adoção de medidas de controle, possibilitando a interrupção da cadeia
de transmissão de doenças entre a população. A instituição da rede de
hospitais de referência serve de apoio para programar ações de vigilância e
constitui ferramenta importante para o planejamento e gestão hospitalar

A disponibilidade de informação apoiada em dados confiáveis é


essencial para a análise objetiva da situação sanitária, assim como para
a tomada de decisões baseadas em evidências e para a programação de
ações de saúde. Com os avanços no controle das doenças infecciosas e a
melhor compreensão do conceito de saúde e de seus determinantes sociais,
passou-se a analisar outras dimensões do estado de saúde, medidas por
dados de morbidade, incapacidade, acesso a serviços, qualidade da atenção,
condições de vida e fatores ambientais entre outros. Os indicadores de
saúde foram desenvolvidos para facilitar a quantificação e a avaliação das
informações produzidas com tal finalidade.

Além de fornecer matéria-prima essencial para a análise, a


disponibilidade de um conjunto de indicadores tende a facilitar o
monitoramento de objetivos e metas em saúde, estimular o fortalecimento
da capacidade analítica das equipes e promover o desenvolvimento de
sistemas de informação intercomunicados.

É inquestionável a contribuição dada por metodologias diagnósticas


nos levantamentos epidemiológicos de doenças endêmicas. Quando estes
diagnósticos são utilizados como medidores da prevalência, é preciso ter
um bom estudo da sensibilidade e, principalmente, da especificidade do
método empregado.

Para os profissionais que atuam em regiões não endêmicas, o diagnóstico


pode ser realizado, com efeito, através de uma anamnese minuciosa,
incluindo informações sobre a história geográfica, a exposição à água ou
a alimentos potencialmente contaminados, viagens a áreas endêmicas e a
ocorrência de sinais e sintomas associada aos achados ao exame físico são
elementos essenciais para o diagnóstico.

O fato de existir um alto número de casos de uma doença não significa


necessariamente que uma epidemia esteja configurada. Genericamente,
epidemia é a ocorrência de uma doença em uma população de forma não
crescente ao longo do tempo. Endemia é a ocorrência de uma doença em
uma população, constante, ao longo do tempo, permitidas as flutuações
cíclicas ou sazonais.

119
Unidade I

Aumento gradual ou constante do número de casos de uma doença


representa uma alteração do nível endêmico e o aumento brusco do
número de casos caracteriza um processo epidêmico.

Os caracteres epidemiológicos constituem o resultado da estrutura


epidemiológica em cada momento e se expressa pela frequência e
distribuição da doença na população em determinado instante, de acordo
com as variáveis tempo, espaço e pessoa.

A expressão “doença transmissível” se refere a qualquer doença causada


por um agente infeccioso específico, ou seus produtos tóxicos, que se
manifesta pela transmissão deste agente ou de seus produtos, de uma pessoa
ou animal infectado ou de um reservatório a um hospedeiro suscetível, direta
ou indiretamente, por meio de um hospedeiro intermediário, de natureza
vegetal ou animal, de um vetor ou do meio ambiente inanimado. A expressão
doença transmissível pode ser resumida como aquela em que o agente
etiológico é vivo e é transmissível. São doenças transmissíveis aquelas em que
o organismo parasitante pode migrar do parasitado para o sadio, havendo ou
não uma fase intermediária de desenvolvimento no ambiente.

As doenças infecciosas podem assumir várias formas. Uma doença


manifesta é aquela que apresenta todas as características clínicas que lhe
são típicas. Em situação contrária, na infecção inaparente, o indivíduo não
apresenta sinais ou sintomas clínicos manifestos. Fala-se em uma forma
subclínica ou assintomática da doença. Essa forma de infecção tem uma
importância grande em Epidemiologia, devido ao fato de que as pessoas
podem transmitir o agente aos suscetíveis com a mesma intensidade
encontrada na doença manifesta, porém de uma forma oculta.

A vigilância epidemiológica é definida como “um conjunto de ações


que proporciona o conhecimento, a detecção ou prevenção de qualquer
mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual
ou coletiva, com a finalidade de adotar medidas de prevenção e controle
das doenças ou agravos” (BRASIL, 2002). Seu objetivo principal é fornecer
orientação técnica constante para os profissionais de saúde, que têm a
responsabilidade de decidir sobre a execução de ações de controle de doenças
e agravos, tornando disponíveis informações atualizadas sobre a ocorrência
dessas doenças e agravos, bem como dos fatores que a condicionam, numa
área geográfica ou população definida. Constitui importante instrumento
para o planejamento, a organização e a operacionalização dos serviços de
saúde e para a normatização de atividades técnicas afins.

Com a intenção de melhor conhecer a saúde da população, os fatores


que a determinam, a evolução do processo da doença e o impacto das ações
120
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

propostas para alterar o seu curso, os epidemiologistas desenvolveram


numerosos métodos de abordagem e investigação. Atualmente, há muitos
métodos a nossa disposição. Para cada situação, um método poderá ser
mais adequado do que outro, embora vários métodos sejam usados em
um único estudo. Cada método tem os seus aspectos positivos e suas
limitações, de modo que, conhecendo-os, pode-se antecipar as facilidades
e as dificuldades encontradas pelos pesquisadores.

Exercícios

Questão 1. (UFF 2013) Em epidemiologia, a morbidade é estável quando o coeficiente de incidência


e a duração de uma doença permanecem constantes com o tempo. Nesses casos, pode-se afirmar que
a prevalência é igual:

A) Ao produto da incidência da doença pela duração da doença.

B) À soma das taxas de incidência anual da doença.

C) Aos quocientes entre o número de casos de uma doença e a população.

D) À diferença entre casos novos e antigos da doença.

E) À incidência acumulada da doença menos a mortalidade no último ano.

Resposta correta: alternativa A.

Análise das alternativas

A) Alternativa correta.

Justificativa: a prevalência informa o número de casos existentes (casos novos e velhos)


independentemente de quando surgiram, ou seja, descreve a força com que as doenças subsistem na
coletividade. Portanto, prevalência = incidência x duração da doença.

B) Alternativa incorreta.

Justificativa: a soma das taxas de incidência da doença independe de seu surgimento.

C) Alternativa incorreta.

Justificativa: o cálculo do coeficiente de prevalência se dá pelo:

Nº de casos novos + antigos no período x 10n


População
121
Unidade I

D) Alternativa incorreta.

Justificativa: a soma entre casos novos e antigos da doença.

E) Alternativa incorreta.

Justificativa: a incidência acumulada da doença mais a mortalidade no último ano.

Questão 2. (Serctan, 2016) O Ministério da Saúde definiu e publicou no DOU, em 18 de fevereiro de


2016, a lista nacional de notificação compulsória de doenças, agravos e eventos de saúde pública nos
serviços de saúde em todo o território nacional. Sobre o assunto podemos inferir que:

A) A notificação compulsória será realizada assim que houver a confirmação de doença ou agravo.

B) A notificação compulsória negativa deve ser realizada, através de comunicação mensal, pelo
responsável do estabelecimento de saúde à autoridade de saúde, informando que no mês
epidemiológico não foi identificado nenhuma doença, agravo ou evento de saúde pública
constante da lista de notificação compulsória.

C) A notificação compulsória é obrigatória a todos os profissionais de saúde no exercício da


profissão, bem como aos responsáveis por organizações e estabelecimentos públicos, devendo
os estabelecimentos particulares encaminharem às unidades públicas mais próximas para a
realização da notificação.

D) A notificação compulsória, independentemente da forma como realizada, também será registrada


em sistema de informação em saúde e seguirá o fluxo de compartilhamento entre as esferas de
gestão do SUS estabelecido pela secretaria de vigilância à saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS).

E) A notificação compulsória somente será registrada em sistema de informação em saúde públicas,


para os atendimentos realizados em unidades públicas. Já as unidades particulares não necessitam
realizar notificações.

Resposta correta: alternativa D.

Análise das alternativas

De acordo com a Portaria nº 204, de 17 de fevereiro de 2016, que define a


Lista Nacional de Notificação Compulsória de doenças, agravos e eventos de
saúde pública nos serviços de saúde públicos e privados em todo o território
nacional, nos termos do anexo, e dá outras providências.

Fonte: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2016/
prt0204_17_02_2016.html. Acesso em: 14 set. 2019.

122
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

A) Alternativa incorreta.

Justificativa: “Art. 2º Para fins de notificação compulsória de importância nacional, serão considerados
os seguintes conceitos: VI – notificação compulsória: comunicação obrigatória à autoridade de saúde,
realizada pelos médicos, profissionais de saúde ou responsáveis pelos estabelecimentos de
saúde, públicos ou privados, sobre a ocorrência de suspeita ou confirmação de doença, agravo ou evento
de saúde pública, descritos no anexo, podendo ser imediata ou semanal”.

B) Alternativa incorreta.

Justificativa: “Art. 2º, IX – notificação compulsória negativa: comunicação semanal realizada


pelo responsável pelo estabelecimento de saúde à autoridade de saúde, informando que na semana
epidemiológica não foi identificado nenhuma doença, agravo ou evento de saúde pública constante da
Lista de Notificação Compulsória”.

C) Alternativa incorreta.

Justificativa: “Art. 1º Esta Portaria define a Lista Nacional de Notificação Compulsória de doenças,
agravos e eventos de saúde pública nos serviços de saúde públicos e privados em todo o território
nacional, nos termos do anexo”.

D) Alternativa correta.

Justificativa: “Art. 6º A notificação compulsória, independentemente da forma como realizada,


também será registrada em sistema de informação em saúde e seguirá o fluxo de compartilhamento
entre as esferas de gestão do SUS estabelecido pela SVS/MS”.

E) Alternativa incorreta.

Justificativa: “Art. 1º Esta Portaria define a Lista Nacional de Notificação Compulsória de doenças,
agravos e eventos de saúde pública nos serviços de saúde públicos e privados em todo o território
nacional, nos termos do anexo”.

123
Unidade II

Unidade II
5 HISTÓRICO DAS CONFERÊNCIAS E DECLARAÇÕES EM POLÍTICAS DE SAÚDE

5.1 Conferências e declarações internacionais

Já discorremos sobre os aspectos que implicam o processo saúde‑doença. Com isso, vimos o quão
importante é a relação de fatores sociais, pois estes condicionam a saúde da população. Agora falaremos
dos espaços onde são feitas essas discussões, que são as conferências de saúde, apresentando os
documentos que nascem como “produtos” dessas interações coletivas.

Durante a década de 1960, o amplo debate realizado em várias partes do mundo realçando a
determinação econômica e social da saúde abriu caminho para a busca de uma abordagem positiva
nesse campo, visando superar a orientação predominantemente centrada no controle da enfermidade.
Houve necessidade, portanto, de discussões que começassem a tratar os aspectos que envolvessem a
promoção da saúde, e não a doença em si (BUSS; FERREIRA, 2000).

Esses autores ainda afirmam que entre os inúmeros intentos registrados com tal orientação
merecem destaque especial a abertura da China Nacionalista ao mundo exterior. Nesse contexto,
foram observadas grandes e primeiras missões de observação de especialistas ocidentais
promovidas pela OMS, sob a liderança de Halfdan Mahler (1973‑1974), e o movimento canadense
desenvolvido a partir do Relatório Lalonde (1974), posteriormente reforçado no relatório de 1986,
que tratava de saúde para todos.

Com isso, iniciam‑se as conferências internacionais sobre promoção da saúde. Além da OMS,
setores representativos de vários países participam desses eventos, tais como a Organização
Pan‑Americana de Saúde (Opas) e Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em defesa
da ampliação dos campos de ação em saúde e abordagens mais efetivas para o real alcance dos
objetivos traçados.

O objetivo principal dessas conferências é promover o suporte das ideias e medidas necessárias para
as ações em saúde. O resultado da discussão aberta e organizada em cada conferência é expresso por
meio da elaboração final de um documento em defesa da promoção da saúde, salientando o bem‑estar
de todos os povos como requisito essencial para o desenvolvimento dos países e, consequentemente,
para a manutenção da paz mundial.

5.1.1 Histórico das conferências

A 30ª Assembleia Mundial de Saúde, realizada pela OMS (1977), lançou o movimento Saúde para
Todos no Ano 2000 e, como marco inicial dessa programação, em setembro de 1978, foi organizada
124
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

pela OMS e Unicef a Primeira Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, na
cidade de Alma‑Ata, no Cazaquistão. Assistida por mais de 700 participantes, dessa reunião resultou a
elaboração da Declaração de Alma‑Ata, um documento que reafirmou o significado de saúde como um
direito humano fundamental e como uma das mais importantes metas mundiais para a melhoria social.

De acordo com a Declaração de Alma‑Ata, ações no sentido de limitar a desigualdade social deveriam
ser estimuladas e adotadas por todos os países. Isso deveria ocorrer para que a meta de saúde universal
fosse atingida, diminuindo a lacuna existente entre os países em desenvolvimento e os desenvolvidos.

Para tanto, o investimento em atenção primária seria a chave para uma promoção da saúde
equânime e abrangente, por meio de medidas de prevenção e educação em saúde. Chegou‑se, então, ao
consenso de que a promoção da saúde é essencial ao contínuo desenvolvimento econômico e social, à
manutenção da melhoria da qualidade de vida dos homens e à manutenção da paz mundial.

A partir dessa iniciativa, outros movimentos foram organizados periodicamente, em função


da ampliação das ações em saúde, com a inserção de novos elementos e avanços significativos nas
políticas de saúde em diversos países. A Declaração de Alma‑Ata representou o ponto de partida para as
conferências internacionais sobre promoção da saúde.

A partir da Primeira Conferência, foram realizadas várias iniciativas multinacionais, algumas de


caráter internacional e global, e outras duas de caráter sub‑regional. As principais conferências e
movimentos que se seguiram foram:

• I Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde (Ottawa, 1986);

• II Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde (Adelaide, 1988);

• III Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde (Sundsvall, 1991);

• Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde (Bogotá, 1992);

• Primeira Conferência de Promoção da Saúde no Caribe (Porto de Espanha, 1993);

• IV Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde (Jacarta, 1997);

• Rede de Megapaíses para Promoção da Saúde (Suíça, 1998);

• V Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde (Cidade do México, 2000);

• III Conferência Latino‑americana de Promoção da Saúde e Educação para a Saúde (São Paulo, 2002);

• VI Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde (Bangkok, 2005);

• Conferência Internacional de Saúde para o Desenvolvimento (Buenos Aires, 2007).


125
Unidade II

Certamente, uma das primeiras observações relativas ao cuidado da saúde que extrapola a tradicional
abordagem da atenção médica constitui o relato das missões enviadas à China em 1973 e 1974, referindo
um conjunto de atividades para a melhoria da saúde, predominantemente realizadas em ambiente rural
e desenvolvidas pelos chineses desde 1965, com a inclusão das seguintes ações:

• organização da comunidade local;

• atenção aos anciãos, além da assistência do Estado;

• promoção do desenvolvimento de indústrias caseiras;

• ajuda às escolas e serviços em geral;

• organização do povo para cuidar da saúde ambiental;

• realização de cuidados preventivos e tratamentos, incluindo o uso de ervas medicinais;

• apoio desenvolvimento da manutenção da ordem social no tráfego, policiamento e nos incêndios;

• promoção de campanhas de saúde em todos os níveis, visando substituir velhos costumes e


mobilizar a comunidade para: movimentos de massa contra as “quatro pestes”, limpeza das casas,
quintais e ruas, orientação de hábitos higiênicos, manutenção e uso da água potável, construção
de unidades rurais de saúde, preparação de insumos simples (utensílios, pílulas, poções) e controle
da limpeza de locais públicos.

É importante notar que a proposição era correta e desde o princípio apontava na direção da
nova concepção de promoção da saúde, embora não totalmente delineada, porém já valorizando a
saúde como componente central do desenvolvimento humano, ressaltando, sem usar a terminologia
de determinantes da saúde, os fatores necessários para assegurar a qualidade de vida e o direito ao
bem‑estar social.

Na verdade, o texto da Declaração de Alma‑Ata, ao ampliar a visão do cuidado da saúde em sua


dimensão setorial e de envolvimento da própria população, superava o campo de ação dos responsáveis
pela atenção convencional dos serviços de saúde.

Entretanto, estes últimos instintivamente concediam maior prioridade à perpetuação das atividades
com as quais estavam mais familiarizados, que eram justamente aqueles que estão referidos no item V
(destacado a seguir). Além disso, mais diretamente relacionados com os problemas de saúde – são e estão
consideradas no seu sentido clássico de ausência de enfermidade, e não como o completo bem‑estar físico,
mental e social que a própria OMS havia considerado antes, em um gesto, talvez, de excesso de otimismo.

Destacamos a seguir alguns pontos principais da Declaração de Alma‑Ata que demonstram sua clareza:

126
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

I – A conquista do mais alto grau de saúde exige a intervenção de muitos


outros setores sociais e econômicos, além do setor saúde;

II – A promoção e proteção da saúde da população são indispensáveis para


o desenvolvimento econômico e social sustentado e contribui para melhorar
a qualidade de vida e alcançar a paz mundial;

III – A população tem o direito e o dever de participar individual e


coletivamente na planificação e na aplicação das ações de saúde;

IV – A atenção primária de saúde é, ao mesmo tempo, um reflexo e uma


consequência das condições econômicas e das características socioculturais
e políticas do país e de suas comunidades;

V – Compreende, pelo menos, as seguintes áreas: a educação sobre os


principais problemas de saúde e sobre os métodos de prevenção e de luta
correspondentes; a promoção de alimentos e de uma nutrição apropriada; um
abastecimento adequado de água potável e saneamento básico; a assistência
materno‑infantil, com inclusão da planificação familiar; a imunização contra
as principais enfermidades infecciosas; a prevenção e luta contra enfermidades
endêmicas locais; o tratamento apropriado das enfermidades e traumatismos
comuns; e a disponibilidade de medicamentos essenciais;

VI – Inclui a participação, ademais do setor saúde, de todos os setores e


campos de atividade conexas do desenvolvimento nacional e comunitário,
em particular o agropecuário, a alimentação, a indústria, a educação, a
habitação, as obras públicas, as comunicações etc., exigindo os esforços
coordenados de todos estes setores;

VII – Exige e fomenta, em grau máximo, a autorresponsabilidade e a


participação da comunidade e do indivíduo na planificação, organização,
funcionamento e controle da atenção primária de saúde (BRASIL, 2001).

5.1.2 Declaração de Alma‑Ata

No que diz respeito à atenção primária em saúde, não há dúvida da importância da Declaração de Alma‑Ata.

Foi a primeira vez na história da saúde pública que se considerou o seguinte fato: se os países de fato
investissem nesse eixo de atenção em saúde, muitos dos problemas e demandas de saúde da população
poderiam ser minimizados, principalmente se levarmos em consideração a abordagem de prevenção
defendida por Leavel e Clark (1976), conforme já estudamos.

Assim, podemos dizer que a Declaração de Alma‑Ata foi formulada por ocasião da Conferência
Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, reunida em Alma‑Ata, na República do Cazaquistão
127
Unidade II

(ex‑República Socialista Soviética), entre 6 e 12 de setembro de 1978, dirigindo‑se a todos os governos,


na busca da promoção de saúde a todos os povos do mundo.

Tal documento apresenta dez itens que enfatizam a atenção primária à saúde (cuidados de saúde
primários), salientando a necessidade de atenção especial aos países em desenvolvimento.

Defende a busca de uma solução urgente para estabelecer a promoção de saúde como uma das
prioridades da nova ordem econômica internacional, responsabilizando os governos, a OMS, a Unicef e
as demais entidades e organizações.

Com esse perfil e essa característica de “olhar” para a atenção primária em saúde é que a declaração
é eleita pela OMS como sendo um marco, ou melhor, a chave para que seja estabelecida a promoção de
saúde em caráter universal.

Mesmo que os primeiros itens da declaração reafirmem a definição de saúde defendida pela
OMS, como o completo bem‑estar físico, mental e social, e não simplesmente a ausência de doença
ou enfermidade, tais itens são defendidos como direito fundamental e como a principal meta social
de todos os governos. Dessa forma, notamos que já existe nela a proposta de que a desigualdade
social poderá interferir na adoção de políticas de saúde e que os países “em desenvolvimento”
estão muito distantes dos desenvolvidos quando se trata de medidas governamentais que possam
diminuir essa distância.

O documento enfatiza que os países devem buscar como objetivo comum a saúde, ressaltando‑a
como um fator que contribui para a qualidade de vida e paz mundial. Também responsabiliza todos os
países para que esse “bem” seja enxergado como direito e dever de todos, seja nos âmbitos sociais, seja
nos aspectos coletivos.

A Declaração reafirma a responsabilidade de todos os governos pela promoção de saúde,


reivindicando a atenção primária como fator de viabilidade para uma universalização dos cuidados,
mediante a abrangência e a melhoria social que possibilitam, integrando governo com todos os setores
da sociedade e então garantindo a igualdade social.

5.1.3 I Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde

A temática principal dessa conferência era a Promoção da Saúde nos Países Industrializados. O
evento realizou‑se em Ottawa, Canadá (1986). Havia grande expectativa mundial por uma saúde pública
eficiente, partindo dos países industrializados e estendendo tal necessidade aos demais países.

O que se pôde perceber é que essa Conferência deixa claro a inter‑relação existente entre os
conceitos de atenção primária de saúde, promoção da saúde, cidades saudáveis e, além disso, estabelece
itens de grande importância, como: a abordagem intersetorial, a participação e a responsabilidade da
sociedade na formulação de políticas favoráveis à saúde e a uma melhor qualidade de vida, com ênfase
em ambientes saudáveis e equidade, campos que até hoje constituem importantes desafios em se
tratando de SUS.
128
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Por último, observa‑se que é o primeiro “espaço” onde se discute também a reorientação do
sistema de serviços de saúde; mesmo não sendo o foco principal, a Conferência estabelece que é muito
importante essa redefinição e fortalecimento dos serviços para que sejam alcançados a efetividade, a
eficácia e a resolutividade das demandas de saúde da população.

5.1.4 Carta de Ottawa

A Carta de Ottawa foi um documento apresentado na Primeira Conferência Internacional sobre a


Promoção da Saúde. Em suma, tal registro indicava as orientações parar atingir a execução do objetivo
de Saúde para Todos no Ano 2000 e seguintes.

Mesmo que a Conferência tenha sido, antes de tudo, uma resposta à crescente demanda por
uma nova concepção de saúde pública no mundo, observou‑se que as discussões foram centradas
nas necessidades dos países industrializados e, além disso, foram levados em consideração também os
problemas que atingem as demais regiões. Isso reafirma o conteúdo democrático de tal documento.

A Conferência tomou como ponto de partida os progressos alcançados em consequência da


Declaração de Alma‑Ata, em primeira instância, o documento “Os Objetivos da Saúde para Todos” da
Organização Mundial de Saúde e o debate sobre a ação intersetorial para a saúde, discutido um pouco
antes na Assembléia Mundial da Saúde.

Os países que estiveram representados nessa Conferência foram os seguintes: Antígua, Austrália,
Áustria, Bélgica, Bulgária, Canadá, Checoslováquia, Dinamarca, Escócia, Espanha, Estados Unidos da
América, Finlândia, França, Gana, Holanda, Hungria, Inglaterra, Irlanda do Norte, Islândia, Israel, Itália,
Iugoslávia, Japão, Malta, Nova Zelândia, Noruega, País de Gales, Polônia, Portugal, República Democrática
da Alemanha, Republica Federal da Alemanha, República da Irlanda, Romênia, Saint Kitts e Nevis, Suécia,
Sudão, Suíça e União Soviética.

Um dos pontos mais relevantes desse documento é a promoção da saúde, que é definida como uma
maneira de proporcionar às populações as formas e meios necessários para que seja efetivado o processo
de melhora de sua saúde, além de conferir ao indivíduo o poder de exercer maior controle sobre ela.

A proposta da carta está voltada para a questão do alcance ao completo bem‑estar físico, social e
mental, pois isso é condição fundamental para que se reconheça na prática a capacidade de um grupo
de indivíduos ou uma única pessoa de identificar e realizar seus objetivos e/ou aspirações, bem como
satisfazer às suas necessidades, mudando ou adaptando‑se ao meio ambiente. Dessa forma, a proposta
de alcance é bem factível.

Para tal, a Carta de Ottawa oferece subsídios e discute um pouco sobre quais são os pré‑requisitos,
ou seja, quais as formas, trâmites e meandros que deverão ser levados em consideração para que as
condições de saúde sejam atingidas. No quesito coletividade, podemos destacar: a paz, a educação, a
moradia, a alimentação, a renda, um ecossistema estável, a justiça e a equidade social. Para que esses
processos de melhora da saúde ocorram, é preciso seguir os pré‑requisitos descritos.

129
Unidade II

Aprofundando essa questão, temos a necessidade de discutir o conceito relacionado a uma boa
saúde. Nesse debate, devemos estabelecer qual a melhor forma ou modo de se conquistar recursos para
o progresso pessoal, econômico e social, pois isso vai repercutir‑se numa dimensão importante, que é a
da qualidade de vida, o que implica boa saúde.

Evidente que os fatores relacionados à prevenção são de suma importância. Vimos que tais aspectos
seriam aqueles associados às implicações políticas, econômicas, sociais, culturais, e biológicas, de
meio ambiente e de conduta. Então, a proposta é de perceber e proporcionar que os fatores estejam
exclusivamente voltados para que as condições de saúde sejam sempre favoráveis, positivas e, de fato,
possam configurar a promoção de saúde.

Um dos patamares a serem alcançados pela promoção da saúde é justamente a equidade sanitária.
Com isso, sua ação tem o objetivo de reduzir as diferenças no atual estado da saúde e assegurar a
igualdade de oportunidades, promover os meios que permitam a toda população desenvolver ao máximo
seu potencial de saúde potencial. Dessa forma, considera o potencial residual, ressaltando as diferenças
individuais e promovendo condições iguais e reais de desenvolvimento e progresso.

A saúde plena também poderá ser alcançada, desde que o indivíduo tenha condições de assumir o
controle de tudo e de todas suas atividades. Se isso de fato não for possível, algumas questões podem
prejudicar e impactar seu estado de saúde.

Observação

Para que tais processos sejam efetivados, não há diferença de gêneros,


aplicando‑se igualmente a homens e mulheres.

A promoção da saúde exige a ação coordenada de todos os envolvidos: representantes dos governos,
dos setores sanitários e de outros setores sociais e econômicos, bem como as organizações beneficentes,
as autoridades locais, a indústria e os meios de comunicação estarão envolvidos em conjunto com o setor
sanitário, já que não se pode responsabilizar somente este último. Essa ação integrada e coordenada
será realizada na perspectiva de proporcionar as condições prévias para que sejam estabelecidos os
requisitos favoráveis para haver saúde.

Famílias, comunidades, indivíduos de todos os meios sociais podem participar desse processo,
portanto, não existem restrições de pessoas na participação. Obviamente, caberá aos grupos sociais
e profissionais e ao pessoal do grupo sanitário assumir a responsabilidade de atuar como mediadores
entre os interesses que são divergentes.

É de extrema importância considerar a adaptação às necessidades locais e as características específicas


de cada território, como países, estados, municípios e regiões, não deixando de respeitar os sistemas
sociais, culturais e econômicos desses lugares, que incidem e recaem diretamente em estratégias e
programas de promoção da saúde a serem planejados e executados.

130
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

A participação ativa na promoção da saúde implica, sobretudo, a participação ativa, o que exige a
elaboração de uma política pública saudável e aplicável.

Então, a saúde deve ser pauta institucional da agenda do governo em todas suas instâncias. Com isso,
não se deve somente cuidar da saúde, mas reconhecer que, para promovê‑la, é preciso transcendê‑la. O
Poder Público deve se conscientizar de que é totalmente responsável por suas ações. Se atuar devidamente,
pode mudar a vida de muitas pessoas para melhor; porém, se houver omissão, pode causar calamidades.

Fica claro que a ação conjunta contribui para assegurar a existência de bens e serviços mais seguros,
melhor higiene nos serviços públicos e um meio ambiente mais limpo. Portanto, a política de promoção
da saúde deve combinar enfoques múltiplos, permitindo que os diversos aspectos que a compõem
se complementem e configurem a legislação, as medidas fiscais, o sistema tributário e as mudanças
organizacionais. É a ação coordenada que promove a prática da política sanitária, monetária e social,
ensejando uma sociedade equânime.

Essa política requer que se identifiquem e eliminem os obstáculos que impeçam a adoção de medidas
políticas que favoreçam a saúde nos setores não diretamente intrínsecos a ela, fazendo que a sociedade
possa desfrutar das ações de promoção de saúde.

Levando‑se em consideração a complexidade das nossas sociedades e da forma como estão


relacionadas entre si, e ainda o fato de que não se pode separar a saúde dos outros objetivos comuns
para sociedade, ressalta‑se o “elo”, que, de uma forma inerente, une o indivíduo ao seu meio, servindo
como base de uma aproximação socioecológica à saúde.

Portanto, nesse contexto, surge um princípio que deverá ser o grande norteador, ou seja, deverá
guiar o mundo, as nações e as comunidades, com o dever de fomentar o apoio recíproco, para que
protejamos uns aos outros, assim como nossas comunidades e meio natural. Além disso, deve‑se
destacar que a conservação e manutenção dos recursos naturais, isso em todo o mundo, é e sempre será
uma responsabilidade mundial.

É sabido que o trabalho e o lazer devem ser fonte de saúde para a população. Assim, as mudanças
desses cenários afetam sobremaneira os aspectos relacionados à saúde. Nesse sentido, a sociedade
deverá organizar o trabalho de forma que contribua para a criação e manutenção de uma sociedade
saudável. O que se espera quando se tem uma promoção da saúde bem estabelecida e planejada é que
ela possa criar condições agradáveis, seguras e estimulantes, que de fato dignifiquem a figura humana.

De uma forma geral, a proteção de ambientes naturais e artificiais, assim como a conservação dos
recursos naturais, deve fazer parte das prioridades de todas as estratégias de promoção da saúde. Assim,
é essencial que se realize uma avaliação sistemática do impacto que as mudanças do meio ambiente
produzem na saúde, particularmente nos setores da tecnologia, trabalho, energia, produção e urbanismo.
Essa avaliação deve ser acompanhada de medidas que garantam o caráter positivo dos efeitos dessas
alterações. Quando bem empregada, especialmente pelos governantes, a promoção da saúde poderá
assumir essa interface.

131
Unidade II

Nesse processo, destaca‑se a contribuição para que a participação efetiva e concreta da comunidade
seja voltada para a determinação e eleição de prioridades na tomada de decisões e na elaboração
e desenvolvimento de estratégias para alcançar melhor nível de saúde. Por isso que o engajamento
político na participação popular e nas comunidades é de extrema importância.

Para tal prática, deve ficar claro que o desenvolvimento da comunidade baseia‑se nos recursos
humanos e materiais com que conta tanto para estimular a independência e apoio social, quanto para
desenvolver sistemas flexíveis, que reforcem a participação pública e o controle das questões sanitárias.
Esse processo exige um total e contínuo acesso à informação e às medidas sanitárias, assim como a
auxílio financeiro, já que o cuidado e a manutenção dos recursos hídricos são fundamentais para que
essa proposta seja efetivada.

Desse modo, a promoção da saúde também favorecerá o desenvolvimento pessoal e social, de


forma a proporcionar informação e educação sanitária. Além disso, fará com que sejam aperfeiçoadas
as aptidões indispensáveis à vida, já que também se relacionam com o processo de educação e
prevenção em saúde. Nesse contexto, incrementam‑se as opções disponíveis para que a população
exerça maior controle sobre sua própria saúde e o meio ambiente e para que opte por tudo o que
propicie a saúde. Com isso, o indivíduo vai criando poder de decisão, discernindo para aspectos que
recaem numa boa saúde.

Ter os meios necessários é essencial para que a população se prepare para as diferentes etapas
e enfrente as enfermidades e lesões crônicas. Isso só será possível por meio de escolas, lares, locais
de trabalho e ambiente comunitário. Contudo, é preciso que haja participação ativa por parte das
organizações profissionais, comerciais e beneficentes. Nesse processo, as atividades socioeducativas
mais uma vez têm grande valor.

A responsabilidade deve ser compartilhada, e todos devem trabalhar em conjunto para se conseguir
um sistema de proteção da saúde. Nesse contexto, incluímos que a responsabilidade pela promoção da
saúde por parte dos serviços sanitários também poderá ser dividida.

O setor sanitário deve exercer um papel cada vez maior na promoção da saúde, de tal forma que
transcenda a mera responsabilidade de proporcionar serviços clínicos e médicos que não ofereçam
risco sanitário. Esses serviços devem tomar uma nova orientação, que seja sensível às necessidades
culturais e respeite as particularidades dos indivíduos; devem, inclusive, estar passíveis às adaptações
que a sociedade, cultura e comunidade permitem.

Atualmente, pretende‑se gerar uma mudança que produza efeito expressivo na atitude e na
organização dos serviços sanitários, o que exige maior atenção à investigação sanitária, assim como às
mudanças na educação e na formação profissional.

A comunidade, baseada na coletividade, e o indivíduo que a compõe precisam saber que a saúde vive
e se cria na vida cotidiana, ou seja, nos centros educacionais, no trabalho e no lazer.

132
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Lembrete

Em hipótese alguma deverá haver restrições quanto a quem deverá


participar ou ser envolvido no processo. Deve prevalecer o princípio da
igualdade entre os sexos em cada uma das fases do planejamento.

Para o desenvolvimento de estratégias para a promoção da saúde, os cuidados com o próximo, assim
como o planejamento integral e ecológico da vida são essenciais. Tais fatores representam a premissa
básica para iniciar as ações em saúde coletiva.

Dessa forma, o comprometimento dos participantes da Conferência fica restrito a uma série de
ações, que resultarão no planejamento da promoção da saúde e, assim, eles se comprometem a:

• Exigir, do ponto de vista político, que o compromisso firmado entre gestão e comunidade seja
efetivo e coerente, principalmente no que concerne à saúde e equidade em todos os setores.

• Lutar por situações que se afastam dos maus produtos, meios e condições de vida insalubres, má
nutrição e destruição dos recursos naturais, comprometendo‑se, ainda, a focar sua atenção em
questões de saúde pública, que recaem em aspectos de impacto ambientais, sociais e de trabalho, tais
como: a contaminação, riscos profissionais, invasão e crescimento desordenado de áreas não povoadas.

• Proporcionar que não haja diferenças entre as diversas sociedades e entre os indivíduos que fazem
parte delas, bem como tomar medidas contra as desigualdades, inclusive em termos de saúde, que
sejam resultado do que se pratica nessas sociedades.

• Saber e reconhecer na prática que os indivíduos são a principal fonte de saúde. Com isso, permitir
que as ações, de uma forma geral, possam apoiá‑los e capacitá‑los em todos os níveis para que
eles, suas famílias e amigos mantenham um bom estado de saúde, essa é a prerrogativa das
ações de promoção em saúde pública. Em se tratando de coletividade, esses indivíduos devem se
comprometer a aceitar que a comunidade é o porta‑voz fundamental no quesito saúde, condições
de vida e bem‑estar geral.

• Basear a promoção da saúde na redefinição, reorganização e reorientação dos serviços, sobretudo


os sanitários, promovendo a intersetorialidade, a multi e a interdisciplinariedade entre profissionais
e com a própria população e comunidade.

• Conscientizar e reconhecer o fato de que a saúde, sua preservação, promoção e manutenção


constituem a melhor meta e investimento possíveis, sendo considerado o melhor plano para se
viver mais e melhor.

• Considerar a questão ambiental e ecológica, bem como seu impacto em nossas formas e modos
de vida.

133
Unidade II

A Conferência incita e provoca a OMS e os demais organismos internacionais a de fato “promoverem”


saúde, isso em todos os níveis populacionais e comunitários, em todas as faixas etárias, inclusive dá
condições e subsídios para a coletividade, em diversos países, para que sejam estabelecidos programas e
estratégias dirigidas à promoção da saúde.

A prerrogativa da Carta da Conferência era atingir a “Saúde para Todos no Ano 2000”, se os povos,
as organizações governamentais e não governamentais, a Organização Mundial de Saúde (OMS) e todos
os demais organismos interessados juntassem esforços para a promoção da saúde e em conformidade
com os valores sociais e morais inerentes a esta.

Entre 17 a 21 de novembro de 1986, duzentos delegados – de 38 países – reuniram‑se em Ottawa para


trocar experiências e conhecimentos dirigidos à promoção da saúde. A referida declaração foi elaborada
e adotada por uma conferência internacional organizada conjuntamente pela OMS, o Ministério de
Saúde e Bem‑Estar Social do Canadá e a Associação Canadense de Saúde Pública.

Além desses aspectos, o encontro favoreceu um diálogo aberto entre leigos e profissionais
da saúde e de outros setores, entre representantes dos órgãos governamentais, comunitários e
associações beneficentes, assim como entre políticos, administradores e técnicos sanitários,
configurando um movimento democrático e de participação popular que extrapola o controle
social. A reunião respeitou as posições de cada eixo representativo em destaque nas ações de
promoção da saúde.

Como resultado, percebeu‑se que os esforços dos participantes promoveram a coordenação para
elaboração de um documento que claramente traduziu os interesses individuais e coletivos, que foi o
lançamento da proposta Saúde para Todos no ano 2000.

A conferência examina em detalhes as questões discutidas, oferece exemplos concretos e sugestões


práticas para se conseguir um desenvolvimento real, e ainda aponta a ação que se exige das nações e
grupos interessados na perspectiva da promoção da saúde.

O evento foi considerado um avanço enorme, porque se criou um novo conceito de saúde pública, e
reconhecido em nível internacional. Quando implantando por alguns países, trouxe experiências exitosas
para as comunidades que conseguiram se organizar nesse processo e que hoje discutem a promoção de
saúde como prerrogativa da organização do cuidado e dos serviços de saúde, melhorando o acesso, a
resolutividade, a efetividade e qualidade da assistência prestada.

Observação

Notem que a Carta de Ottawa, oriunda da Primeira Conferência


Internacional de Promoção de Saúde, é um marco no que diz respeito aos
países planejarem ações de saúde não para os doentes e suas doenças, mas
sim uma forma de planejamento de ações que impeçam as enfermidades e
suas sequelas graves.
134
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

6 HISTÓRICO DAS CONFERÊNCIAS NO BRASIL

As conferências de saúde se iniciaram há 70 anos, cumprindo o disposto no parágrafo único


do artigo 90 da Lei nº 378, de 13 de janeiro de 1937. Com a Lei nº 8.142, houve consagração no
que diz respeito à obrigatoriedade da realização desses eventos no Brasil. Nesse sentido, e com a
participação de instâncias colegiadas de representantes dos vários segmentos sociais, a missão
delas é justamente avaliar e propor diretrizes para a formulação da política de saúde nos níveis
municipais, estaduais e nacional.

Então, estabeleceu‑se que a periodicidade para realização dessas reuniões deveria ser de quatro
anos. Para tal, é preciso que haja a participação dos movimentos sociais organizados, das entidades
ligadas à área da saúde, dos gestores e dos prestadores de serviços de saúde.

A cada conferência vem sendo observado um aumento significativo na participação do cidadão


comum, o que garante uma participação democrática da população na definição de políticas de saúde,
sua implantação e efetivação de ações que compõem o SUS.

Os indivíduos podem ser convocados pelo Poder Executivo, ou de forma extraordinária, pelos
Conselhos de Saúde. E o fato de serem importantes instrumentos de participação da sociedade nas
questões que implicam organização, deliberações e definições de diretrizes, faz com que sirvam, por
meio dos seus documentos, de base para e elaboração, construção e execução de planos de saúde em
cada uma das instâncias governamentais, definindo ações que são prioritárias e específicas nos âmbitos
municipais, estaduais e federal.

Pode‑se concluir que nesses espaços criados pelas conferências é que a sociedade se articula para
garantir os interesses e reais necessidades da população na área da saúde, assegurando, assim, que os
princípios, doutrinas e diversas formas de pensar o SUS possam ser asseguradas, ampliando junto à
sociedade, de forma segura e correta, informações que são importantes, inclusive para o fortalecimento
do sistema.

Também vamos estudar o impacto que a gestão participativa representa nas questões de saúde
pública do país e, além disso, como tudo isso poderá fortalecer os aspectos e participação na organização,
planejamento e execução do SUS, situações que são de extrema importância para que o nosso “patrimônio”
possa de fato estar assegurando as necessidades e demandas de saúde da população brasileira.

Observação

É evidente que as conferências internacionais e seus documentos para


a saúde pública mundial são essenciais, principalmente se considerarmos
que no Brasil o movimento sanitário e a concepção do SUS ocorreram por
meio de um movimento muito próximo ao observado nesses eventos e em
seus relatórios.

135
Unidade II

Saiba mais

Para mais informações, leia o documento da Carta de Ottawa na íntegra:

CONFERÊNCIA INTERNACIONAL SOBRE PROMOÇÃO DA SAÚDE,


1.,1986, Ottawa. Carta de Ottawa. Ottawa, 1986. Disponível em:
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/carta_ottawa.pdf. Acesso
em: 6 out. 2015.

Exemplo de aplicação

Você será gestor em saúde de um município brasileiro com quase 200 mil habitantes, atuando
como secretário municipal de saúde. Sabemos que uma das ações que fazem alusão à participação
da população nos processos de implantação e implementação do SUS é justamente a organização da
Conferência Municipal de Saúde. Baseando‑se nessa premissa, faça um esquema simples para organizar
esse evento, fazendo que este seja participativo e democrático.

6.1 O desenvolvimento das políticas públicas de saúde no Brasil

Agora vamos construir uma base teórica e histórica que discorrerá sobre como foram se desenvolvendo,
ao longo dos anos, as políticas de saúde no Brasil, compreendendo qual foi a real necessidade da proposta
do nosso SUS.

Deve‑se ressaltar o fato de que o atual modelo de prestação de serviços de saúde do Brasil hoje
visto e entendido como o SUS é resultado de um processo histórico de lutas do Movimento Sanitário
Brasileiro, intensificado a partir dos anos 1970 e 1980, em consonância com as lutas pelo processo de
redemocratização da sociedade brasileira (PEREIRA, 2003).

Segundo Polignano (2012), para analisarmos a história das políticas de saúde no país, é preciso
definir alguns itens importantes. A princípio, destaca a relevância de se entender como a evolução
histórica das políticas de saúde está relacionada diretamente à evolução político‑social e econômica da
sociedade brasileira. Defende, ainda, que o processo evolutivo sempre obedeceu à ótica do avanço do
capitalismo na sociedade nacional.

Concluindo, o autor designa que a saúde jamais foi o foco principal de nosso país, sempre
sendo relegada a um papel secundário. Nesse contexto, esta obra vai discorrer sobre a trajetória do
desenvolvimento das políticas públicas de saúde no Brasil até o momento em que o SUS foi idealizado,
como foi implantado e a forma como tem sido aplicado no Brasil.

136
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

6.2 Síntese histórica da saúde no Brasil: descoberta, período republicano


até 1963

6.2.1 De 1500 até o Primeiro Reinado

Em nosso processo de colonização não havia qualquer modelo de saúde, e isso não foi sequer
cogitado pelo governo de Portugal.

Desse modo, a atenção à saúde limitava‑se aos próprios recursos da terra (plantas, ervas) e
àqueles que, por conhecimentos empíricos (curandeiros), desenvolviam as suas habilidades na
arte de curar.

A vinda da família real ao Brasil criou a necessidade da organização de uma estrutura sanitária
mínima, capaz de dar suporte ao poder que se instalava na cidade do Rio de Janeiro.

Até 1850 as atividades de saúde pública estavam limitadas à delegação das atribuições sanitárias
perante as juntas municipais e ao controle de navios e saúde dos portos.

Verifica‑se que o interesse primordial estava limitado ao estabelecimento de um controle sanitário


mínimo da capital do Império, tendência que se alongou por quase um século.

O tipo de organização política daquela época era de um regime de governo unitário e centralizador,
que era incapaz de dar continuidade e eficiência na transmissão e execução a distância das determinações
emanadas dos comandos centrais.

A carência de médicos no Brasil Colônia e no Brasil Império era enorme. No Rio de Janeiro, em 1789,
só havia quatro médicos exercendo a profissão. Em outros estados brasileiros eram mesmo inexistentes
(POLIGNANO, 2012).

A inexistência de uma assistência médica estruturada fez com que proliferassem pelo país os
boticários (farmacêuticos). Aos boticários cabiam a manipulação das fórmulas prescritas pelos médicos,
mas a verdade é que eles próprios tomavam a iniciativa de indicá‑los, fato muito comum e observado
até hoje.

Não dispondo de um aprendizado acadêmico, o processo de habilitação na função consistia


tão somente em acompanhar um serviço de uma botica já estabelecida durante determinado
período, ao fim do qual prestavam exame sobre alguns aprendizados adquiridos e, se aprovado,
o candidato recebia a “carta de habilitação” e estava apto a instalar sua própria botica
(POLIGNANO, 2012).

Em 1808, Dom João VI fundou o Colégio Médico‑Cirúrgico no Real Hospital Militar, na cidade de
Salvador. No mês de novembro do mesmo ano foi criada a Escola de Cirurgia do Rio de Janeiro, anexa
ao real Hospital Militar.

137
Unidade II

6.2.2 Início da República (1889) até 1930

Após a Proclamação da República, estabeleceu‑se uma nova forma de organização jurídico‑política,


típica do estado capitalista.

Dessa forma, as questões de saúde não foram prioridade, pois essa nova organização do aparelho
estatal assegurou apenas as condições formais da representação burguesa clássica, especialmente a
adoção do voto direto promovida pelo sufrágio universal.

O coronelismo ainda predominava no cenário político. Então, os grandes proprietários de terras


(latifundiários) impunham normas de exercício de poder e representavam os interesses capitalistas
dominantemente agrários.

Observação

O fato curioso é que, nessa fase, somente a eleição do presidente da


República era pelo voto direto, de quatro em quatro anos, o que desencadeou
uma série de levantes e lutas contra os interesses de quem estava inserido
no sistema.

Mesmo que tenha havido dezenove organizações políticas que atuaram até o movimento de 1930,
de fato nenhuma excedeu a disciplina imposta pela defesa de interesses regionais, embora pudessem
compor, eventualmente, alianças que dominaram as práticas políticas até aquela data. Os programas
partidários nunca chegaram a se configurar numa perspectiva de âmbito nacional.

Além do contexto político, ressalta‑se que nesse momento as cidades brasileiras eram assoladas por
epidemias, pois não havia um modelo sanitário implantado no país.

No início do século XX, principalmente no Rio de Janeiro, por conta da situação sanitária existente
na cidade, os navios estrangeiros não queriam mais atracar no porto carioca, situação sanitária essa
que estava configurada no caos, ou seja, caracterizada pela presença de diversas doenças graves que
acometiam à população, como a varíola, a malária, a febre amarela e, posteriormente, a peste, o
que acabou gerando sérias consequências tanto para saúde coletiva quanto para outros setores, por
exemplo, do comércio exterior.

Nesse momento, o presidente do Brasil em exercício, Rodrigues Alves, nomeou Oswaldo Cruz como
Diretor do Departamento Federal de Saúde Pública.

Então, Osvaldo Cruz se propôs a erradicar a epidemia de febre amarela na cidade carioca, criando
verdadeiro exército para tal empreitada, o que assustou muita gente naquela ocasião. Cerca de 1.500
“recrutas” passaram a exercer atividades de desinfecção no combate ao mosquito causador dessa
doença. A falta de esclarecimentos e as arbitrariedades cometidas pelos “guardas‑sanitários” causaram
revoltas na população, e esse modelo de intervenção ficou conhecido como campanhista. Na história
138
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

do Brasil, tem‑se descrita uma verdadeira revolução sobre tal medida adotada, sendo que esse modelo
de campanha, adotado dentro de uma visão militar, em que os fins justificam os meios, utilizava o uso
da força e da autoridade como instrumentos preferenciais de ação.

Existe um episódio que caracteriza muito bem essa prática militar adotada por Osvaldo Cruz. O
próprio presidente Rodrigues Alves solicita que o assistente pare com tais medidas. Os mecanismos
empregados eram vistos como extremistas pela população, como a queima de colchões e de roupas de
doentes. Por conta dessas medidas de desinfecção, o trabalho realizado pelo serviço sanitário municipal
começou a ser questionado, e alguns levantes populares marcaram a época.

Nesse momento, destaca‑se a Revolta da Vacina. O que promoveu tal movimento foi outra medida
imposta por Oswaldo Cruz, a criação da Lei Federal nº 1.261, de 31 de outubro de 1904, que instituiu a
vacinação antivaríola obrigatória para todo o território nacional.

Esse modelo adotado, mesmo com todos os problemas, e apesar das arbitrariedades e dos abusos
cometidos, obteve importantes vitórias no controle das doenças epidêmicas. Uma delas foi erradicar a
febre amarela na cidade do Rio de Janeiro, o que fortaleceu o modelo proposto, tornando‑o a melhor
proposta de intervenção na área da saúde coletiva.

Osvaldo Cruz, ainda nessa época, procurou organizar a diretoria geral de saúde pública, criando uma
seção demográfica, um laboratório bacteriológico, um serviço de engenharia sanitária e de profilaxia
da febre amarela, a inspetoria de isolamento e desinfecção, e o instituto soroterápico federal, e depois
fundou o Instituto Oswaldo Cruz. Atualmente, é um importante órgão de saúde pública, contribuindo
para criação de políticas públicas e tecnologia que implementam o SUS.

De fato, Osvaldo Cruz foi pioneiro em ações de saúde pública. Ele introduziu o registro demográfico,
que permitiu conhecer a composição e os fatos vitais de importância da população, criou o laboratório
como auxiliar do diagnóstico etiológico e propôs a fabricação organizada de produtos profiláticos para
uso em massa.

Em 1920, destaca‑se um grande sucessor de Osvaldo Cruz, Carlos Chagas. Esse mineiro inovou o
modelo campanhista, tornando‑o menos policial e fiscalizador. Com isso, o novo diretor reestruturou o
Departamento Nacional de Saúde, então ligado ao Ministério da Justiça, e introduziu a propaganda e a
educação sanitária na técnica rotineira de ação, que são as primeiras ações de educação em saúde na
história da saúde pública brasileira.

Como havia a eclosão de outras doenças, era preciso criar outros órgãos especializados. À época,
destacam‑se os equipamentos criados na luta contra a tuberculose, a lepra e as doenças venéreas.

A visão de saúde pública era então mais evidente, principalmente se levarmos em consideração
o fato de que a assistência hospitalar, infantil e a higiene industrial estavam cada vez mais
destacadas como problemas individualizados. Foi nesse momento em que houve expansão das
atividades de saneamento para outros estados. É criada uma nova escola, a Escola de Enfermagem
Anna Nery.
139
Unidade II

Vale lembrar que a economia vigente no Brasil nessa época era a agroexportadora. O produto principal
produzido era o café, portanto, as ações do sistema de saúde estavam voltadas para as questões de
saneamento, sobretudo nos locais onde se tinha a circulação de mercadorias que eram exportadas. A
grande preocupação era a qualidade da mercadoria, que não deveria ser contaminada nem transmitir
doenças (MENDES, 1994 apud POLIGNANO, 2012).

Como o modelo atingiu resultados positivos, foi adotado desde o fim do século passado até o início
dos anos 1960. Então, houve o deslocamento das ações para o campo e para o combate das doenças
endêmicas da área rural. Essa expansão se deu porque adquiriu força e conhecimento, com o controle
das epidemias nas grandes cidades brasileiras.

A importância disso é justamente porque a agricultura era a atividade hegemônica da economia


naquela época. Esse modelo de atuação foi amplamente utilizado no combate às diversas endemias, por
exemplo, doença de Chagas, esquistossomose, entre outras.

Saiba mais

Para se aprofundar nos conhecimentos históricos dos aspectos da saúde


social do Brasil, leia:

ALBUQUERQUE, M. M. Pequena história da formação social brasileira.


Rio de Janeiro: Graal, 1981. 728 p.

6.2.3 O nascimento da Previdência Social (de 1930 a 1960)

Nesse período, serão destacados os fatos que levaram ao processo de industrialização do Brasil e
urbanização das principais cidades brasileiras como Rio de Janeiro e São Paulo.

No início do século, a economia nacional era basicamente agroexportadora, voltada para a


monocultura do café.

Com o acúmulo monetário advindo do comércio do café, iniciam‑se no país os processos de


industrialização, com maior expressão no eixo Rio‑São Paulo.

O processo de industrialização no Brasil atraiu os estrangeiros. Houve também o fenômeno da


urbanização. Tais eventos exigiram mão de obra que pudesse suprir a industrialização, por isso a
vinda de imigrantes, sobretudo os europeus, mais especificamente os italianos e os portugueses. Esses
trabalhadores já possuíam grande experiência nesse setor, que já era muito desenvolvido na Europa.

Nessa época, esses operários não possuíam garantias trabalhistas, ou seja, não tinham férias, jornada
de trabalho estabelecida, pensão, auxílio‑doença, tampouco aposentadoria.

140
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Nesse contexto, como muitos imigrantes tinham sido líderes de lutas anarquistas por direitos
trabalhistas, em especial os italianos, os levantes tomaram corpo. Assim, mobilizaram a classe operária
no Brasil, ajudando‑os na conquista de seus direitos trabalhistas.

Na história do movimento operário nacional, destacam‑se duas grandes greves, uma em 1917, e
outra em 1919. Ambas as reivindicações exigiam garantias de direitos trabalhistas, bem como melhorias
nas condições de trabalho.

Além dos direitos trabalhistas, o movimento avançou no campo social. Em 24 de janeiro de 1923, foi
aprovada pelo Congresso Nacional a Lei Eloy Chaves, marco inicial da previdência social no Brasil. Foi por
meio dessa lei que foram instituídas as Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAP’s).

A respeito dessa lei, é preciso fazer algumas considerações importantes. Primeiramente, esse código
deveria ser aplicado somente ao operariado urbano, portanto os trabalhadores rurais não estavam
contemplados por ele. Isso ocorria justamente por interesses de membros do Congresso Nacional, que,
em sua maioria, faziam parte da oligarquia rural, não permitindo que tal benefício pudesse ser estendido
aos trabalhadores rurais.

Esse processo no Brasil tinha tanta intensidade que essa situação perdurou até a década de 1960,
período em que foi criado o Funrural (Fundo de Apoio ao Trabalhador Rural).

As caixas deveriam ser organizadas por empresas, e não por categorias profissionais. A criação de
uma CAP também ficava condicionada ao poder de mobilização e organização dos trabalhadores de
determinada empresa. Além disso, dependia da capacidade deles em reivindicar a sua criação. Nessa
época, devido à importância das ferrovias na economia no país, foram os ferroviários os primeiros a
serem contemplados por esse modelo de CAP.

Segundo Possas (1981), essas CAPs possuíam administração própria para os seus fundos, sendo
formadas por um conselho composto de representantes dos empregados e empregadores.

Além disso, era necessário haver uma comissão para administrar a CAP. Essa comissão era composta
da seguinte maneira: três representantes da empresa, com um deles assumindo a presidência, e os
outros dois representantes dos empregados, eleitos diretamente a cada três anos.

Por meio dos seus representantes, esse tipo de sistema garante aos empregados e empregadores
a participação direta na CAP. Ficou vigente até a criação do INPS (1967), quando foram afastados do
processo administrativo (POSSAS, 1981).

Oliveira e Teixeira (1985) afirmam que, de acordo com o determinado pelo artigo 3° da lei Eloy Chaves,
o Estado não participava propriamente do custeio das Caixas, sendo essas mantidas por: “2 empregados
das empresas (3% dos respectivos vencimentos); empresas (1% da renda bruta); e consumidores dos
serviços das empresas”.

141
Unidade II

Estava então formalizado o tal sistema de Caixas, e as próprias empresas deveriam recolher
mensalmente o conjunto das contribuições das três fontes de receita, depositando o valor diretamente
na conta bancária de sua CAP (OLIVEIRA; TEIXEIRA, 1985).

No artigo 9° da Lei Eloy Chaves, além das aposentadorias e pensões, os fundos proviam os serviços
funerários e médicos. Esse artigo também ressaltava que esses socorros médicos deveriam ocorrer em
caso de doença do indivíduo e de seus familiares ou, ainda, para quem habitasse o mesmo teto e
estivesse sob a mesma economia (BRASIL, 1923).

Os medicamentos disponibilizados eram obtidos com preço especial, o que era determinado pelo
Conselho de Administração. Por fim, tratava a questão da aposentadoria e pensão para os herdeiros, em
caso de morte.

No artigo 27° estavam relacionadas as questões de acidentes de trabalho, obrigando as CAPs a arcar
com a assistência aos acidentados.

Podemos dizer que essas CAPs são respostas das reivindicações operárias no início do século, assim
como a participação do empresariado e do Estado e a crescente importância da questão social, uma vez
que já estava bem fomentado o processo de urbanização no país.

Em 1930, o sistema já abrangia 47 caixas, com 142.464 segurados ativos, 8.006 aposentados, e
7.013 pensionistas.

A partir de 1930, uma nova forma de organização previdenciária se inicia por meio dos IAPs
(Institutos de Aposentadorias e Pensões), desta vez organizados por categorias profissionais e com maior
participação do componente estatal. São fundados os institutos dos marítimos (IAPM), dos comerciários
(IAPC), dos bancários (IAPB) e dos industriários (Iapi), entre outros. Nessa fase, há uma maior contenção
de gastos, tendo a Previdência atravessado um período de acumulação crescente, tornando a assistência
um item secundário dentro dos institutos.

Os superávits dos institutos formam um patrimônio considerável, a ponto de a Previdência


participar nos investimentos de interesse do governo (RONCALLI, 2003). No tocante à saúde pública,
essa fase corresponde ao auge do sanitarismo campanhista, característica marcante da ação pública
governamental do início do século, com a criação do Serviço Nacional de Febre Amarela, o Serviço de
Malária do Nordeste e o da Baixada Fluminense.

Em 1942 cria‑se o Serviço Especial de Saúde Pública (Sesp), responsável por ações sanitárias em
regiões afastadas do país, mas com interesse estratégico para a economia, como a região de produção
de borracha na Amazônia (RONCALLI, 2003).

Não por acaso, o nascimento dos IAPs coincide com uma nova fase da política brasileira, estabelecida
com a Revolução de 1930. Com a ascensão de Getúlio Vargas e a queda das oligarquias do poder,
inicia‑se uma ampla reforma administrativa e política, culminada com a nova Constituição (1934) e a
ditadura imposta por Vargas com o Estado Novo (1937).
142
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Trata‑se de uma fase de profunda centralização e, consequentemente, uma maior participação


estatal nas políticas públicas, que, em razão da característica do governo ditatorial, se corporificaram
em medidas essencialmente populistas.

Assim, nessa fase do governo populista de Getúlio Vargas, marcado por crises que resultaram em
movimentos da classe trabalhadora, diversas outras medidas dentro das políticas sociais foram tomadas
a fim de conter as exigências das diversas categorias de trabalhadores, – estes estavam cada vez mais
organizados, em vez de tentar sanar ou melhorar os problemas estruturais da vida desses profissionais.

Nessa época criou‑se o Ministério do Trabalho, e então foram estabelecidas diversas medidas para a
regulação da atividade sindical, entre outras estratégias de manutenção da legitimidade.

Um aspecto importante desse período é a mudança no modelo econômico e, consequentemente,


altera‑se o foco de atuação da assistência. Com a tendência de declínio da cultura cafeeira e a
mudança de um modelo agroexportador para um de característica industrial, vem à tona a necessidade
de saneamento dos espaços de circulação de mercadorias. Concomitantemente a isso, há também
a imposição de se manter o trabalhador saudável, justamente para manutenção da produção e da
exigência do mercado consumidor em crescente formação.

Depois disso, já na década de 1960, com o advento do regime militar, consolida‑se o modelo
dicotômico de assistência e ações de saúde pública e a Previdência se estabelece como uma corporificação
da cidadania regulada.

Lembrete

Devemos levar em consideração que a história do Brasil permitiu


que a saúde pública pudesse estar atrelada à seguridade social, por isso
que do período do descobrimento do Brasil até a Era Vargas tem‑se uma
intensificação dessa “parceria” marcada pela criação dos IAPs.

6.3 O regime militar e as consequências para a saúde pública do Brasil

O regime autoritário do golpe militar de 1964 trouxe como consequência imediata para as políticas
de saúde no Brasil um total esvaziamento da participação da sociedade nos rumos da Previdência.
De outro lado, também provocou uma centralização crescente da autoridade decisória, marcada pela
criação do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), resultado da fusão dos vários IAPs, em 1966
(OLIVEIRA; TEIXEIRA, 1985).

As políticas de saúde do primeiro período da Ditadura, que compreendeu a fase do “milagre brasileiro”
– entre 1968 e 1974, foram caracterizadas por uma síntese, produto de reorganizações setoriais do
sanitarismo campanhista do início do século e do modelo de atenção médica previdenciária do período
populista (LUZ, 1991).

143
Unidade II

A partir de então foi criada uma estrutura considerável em torno da Previdência Social, com uma
clara vinculação aos interesses do capital nacional e internacional. Nesse sentido, o Estado passa a ser o
grande gerenciador do sistema de seguro social, na medida em que aumentou o seu poder nas frentes
econômica e política, pela elevação nas alíquotas e também no controle governamental por meio da
extinção da participação dos usuários na gestão do sistema, antes permitida na vigência das CAPs e dos
IAPs (MENDES, 1994).

A lógica da prestação de assistência à saúde pelo INPS privilegiava a compra de serviços às grandes
corporações médicas privadas, notadamente hospitais e multinacionais fabricantes de medicamentos.
Estabelece‑se, então, o complexo previdenciário médico‑industrial do conveniado ou credenciado.

Já na metade da década de 1970 é criado o Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social


(Sinpas), do qual fazia parte o Inamps (Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social), que
mantém a estratégia de compra de serviços do setor privado, justificada na época por ser tecnicamente
mais viável, mas que se tratava, em síntese, de uma perversa conjugação entre estatismo e privatismo
(CARVALHO; GOULART, 1998).

Dessa forma, esse modelo excludente provocou uma capitalização crescente do setor privado, no
entanto, a precariedade do sistema, não só da área da saúde, mas em toda a área social, provocava
insatisfação cada vez maior, comprometendo a legitimidade do regime. Os indicadores de saúde da
época, entre eles o coeficiente de mortalidade infantil, pioravam assustadoramente, mesmo em grandes
cidades, como em São Paulo e Belo Horizonte. Intensificam‑se movimentos sociais e as pressões de
organismos internacionais, de modo que, já no governo Geisel, entre 1974 e 1979, há uma preocupação
maior em minimizar os efeitos das políticas excludentes por meio de uma expansão na cobertura dos
serviços (LUZ, 1991; MENDES, 1994).

Ressalta‑se que nesse momento o país foi assolado por algumas epidemias de doenças
infectocontagiosas como a meningite, obrigando o governo a lidar com situações que careciam de
organização e planejamento de serviços de saúde. Devido a essa gestão autoritária, centralizadora e
desqualificada, com o consequente despreparo, muitas pessoas faleceram.

No auge das lutas por políticas mais universalistas e do processo de abertura política em fins dos
anos 1970, amplia‑se o movimento dos profissionais de saúde e de intelectuais da área de saúde
coletiva por mudanças no modelo em vigor. Com o crescimento da insatisfação popular, personificada,
politicamente, na vitória da oposição em eleições parlamentares, este movimento, que ficou conhecido
como Movimento pela Reforma Sanitária, cresce ainda mais. Há a incorporação de lideranças políticas
sindicais e populares e também de parlamentares interessados na causa.

Um dos marcos deste movimento ocorreu em 1979, durante o I Simpósio Nacional de Política de
Saúde, conduzido pela Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados. Na ocasião, discutiu‑se uma
proposta de reorganização do sistema de saúde colocada pelo Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
(Cebes), o representante legítimo do movimento sanitário. Nessa orientação, já há menção a um sistema
único de saúde, de caráter universal e descentralizado (TEIXEIRA, 1989).

144
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Embora inicialmente ignoradas pelo governo, as pressões populares e do movimento sanitário geraram algumas
mudanças significativas no sistema, em particular no campo da extensão de cobertura e da atenção primária,
resultado das repercussões da Conferência Internacional de Saúde de Alma‑Ata (1978), quando o quadro de saúde
brasileiro foi denunciado e as práticas de cuidados básicos de saúde foram estimuladas (WERNECK, 1998).

Em 1981, o Plano Conasp (Conselho Consultivo de Administração da Saúde Previdenciária) incorpora


algumas propostas da Reforma Sanitária, como as Ações Integradas de Saúde (AIS), certamente uma das
primeiras experiências com um sistema mais integrado e articulado.

Por outro lado, houve movimentos populares internos pela democratização e por uma política
sanitária de caráter mais universalista para a concretização de novas alternativas para os sistemas de
saúde centradas na Atenção Primária, e muitos avanços foram conseguidos a partir da atuação
de componentes do movimento sanitário dentro da estrutura do governo.

A metade dos anos 1980 é marcada por uma profunda crise de caráter político, social e econômico. A
Previdência, ao fim de sua fase de capitalização, tinha problemas de caixa oriundos de uma política que estimulava
a corrupção e o desvio de verbas se apresentava sem capacidade para dar conta das demandas criadas. Do outro
lado, o regime autoritário teria que buscar formas de legitimação diante da insatisfação popular.

Na esteira desses acontecimentos, cresce o Movimento Sanitário brasileiro, que teve, como ponto
alto de sua articulação, a VIII Conferência Nacional de Saúde, em 1986, em Brasília.

O momento político propício, com o advento da Nova República, pela eleição indireta de um
presidente não militar desde 1964, além da perspectiva de uma nova Constituição, contribuíram para
que a VIII Conferência Nacional de Saúde fosse um marco dentro do Movimento pela Reforma Sanitária.

Com uma participação de cerca de cinco mil pessoas, entre profissionais de saúde, usuários,
técnicos, políticos, lideranças populares e sindicais, a VIII Conferência criou a base para as propostas de
reestruturação do sistema de saúde brasileiro a serem defendidas na Assembleia Nacional Constituinte,
instalada no ano seguinte.

O relatório da conferência, entre outras propostas, destaca o conceito ampliado de saúde, e este é
colocado como direito de todos e dever do Estado. Também se iniciou a relação do processo saúde‑doença
com as condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte,
emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde. Além disso, tal relatório
apresenta a conquista relacionada a um sistema de saúde que fosse universal, equânime e integral.

Lembrete

A Ditadura no Brasil foi um retrocesso em todos os sentidos. Foi um


período marcado por epidemias que culminaram em muitos óbitos, como a
da meningite, que assolou o país no início da década de 1970 e que durou
até meados de 1977/1978.
145
Unidade II

Saiba mais

Para intensificar o conhecimento sobre o desenvolvimento das políticas


de saúde no Brasil, leia:

GUIMARÃES, R. Saúde e medicina no Brasil: contribuições para um


debate. Rio de Janeiro: Graal, 1979.

7 CONSTRUÇÃO DO SUS, SEUS PRINCÍPIOS DOUTRINÁRIOS E ORGANIZACIONAIS

A criação do SUS é um marco para a saúde pública do Brasil e serviu de referência para uma série
de países, que também consideraram o nosso conceito para definir saúde e estabelecer os serviços de
saúde pública.

Portanto, em seu artigo 196, tem‑se que:

A saúde é direito de todos e dever do estado, garantindo mediante políticas


sociais e econômicas que visem a redução do risco de doença e de outros
agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua
promoção, proteção e recuperação (BRASIL, 1988).

Na mesma lei, o SUS é definido da seguinte forma:

As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e


hierarquizada, e constituem um sistema único, organizado de acordo com
as seguintes diretrizes:

• Descentralização, com direção única em cada esfera de governo;

• atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas,


sem prejuízo dos serviços assistenciais.

Participação da comunidade

Parágrafo único – o Sistema Único de Saúde será financiado, com recursos


do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios, além de outras fontes (BRASIL, 1988).

O SUS tem como prerrogativa o distanciamento do modelo centralizador e autoritário, não mais
considerando as demandas espontâneas como foco na atenção em saúde.

146
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Foi necessário fazer com que o Estado se comprometesse com o bem‑estar social, principalmente em
se tratando de saúde da coletividade, constituindo esse sistema público como um direito do cidadão e
um importante exercício de cidadania.

Dessa forma, nota‑se que o texto da constituição demonstra que a concepção do SUS estava baseada
na formulação de um modelo de saúde voltado para as necessidades da população, e não mais nas
demandas espontâneas, como acontecia antes de sua criação.

A sociedade, engajada pelo movimento das Diretas Já, procurou garantir na nova Constituição os
direitos e os valores da democracia e da cidadania. Evidente que isso estava de acordo com o momento
político que o país vivia na ocasião, ou seja, esta visão refletia o momento pelo qual passava a sociedade
brasileira, recém‑saída de uma ditadura militar, em que a cidadania nunca foi um princípio de governo.

Apesar de o SUS ter sido definido, concebido e descrito pela Constituição de 1988, somente foi
regulamentado em 19 de setembro de 1990 – por meio da Lei nº 8.080. Esta lei define o modus operandi
do SUS, propondo a sua forma de organização e de funcionamento. Mesmo assim, houve alguns vetos,
pelo presidente então recém‑eleito, Fernando Affonso Collor de Melo, que prorrogou ainda mais a
implantação desse sistema.

Observação

O SUS foi concebido a partir de um movimento sanitário e com forte


participação popular, portanto seus princípios e doutrinas são extremamente
democráticos; fazem alusão à vontade da população em ter serviços de
saúde que sejam universais, equânimes e integrais.

Agora vamos abordar algumas dessas concepções. O primeiro ponto que é retratado nessa nova
Constituição é justamente a forma como se define saúde, que é muito mais abrangente do que
qualquer outra:

A saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a


alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho,
a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços
essenciais: os níveis de saúde da população expressam a organização social
e econômica do país (BRASIL, 1988).

Depois disso, houve a concepção de que esse sistema deveria ocorrer como um conjunto de ações
e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da
administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público. A iniciativa privada poderia
participar do SUS em caráter complementar.

Ressaltam‑se ainda as definições de como os princípios doutrinários do SUS foram concebidos.


Assim, ficou estabelecido o seguinte:
147
Unidade II

• universalidade – o acesso às ações e serviços deve ser garantido a


todas as pessoas, independentemente de sexo, raça, renda, ocupação,
ou outras características sociais ou pessoais;

• equidade – é um princípio de justiça social que garante a igualdade


da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer
espécie. A rede de serviços deve estar atenta às necessidades reais da
população a ser atendida;

• integralidade – significa considerar a pessoa como um todo, devendo as


ações de saúde procurar atender a todas suas necessidades (BRASIL, 1988).

Alguns princípios organizativos derivam desses preceitos apresentados:

• hierarquização – entendida como um conjunto articulado e contínuo


das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos,
exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do
sistema; referência e contrarreferência;

• participação popular – pode ser definida como a democratização dos


processos decisórios consolidado na participação dos usuários dos
serviços de saúde nos chamados Conselhos Municipais de Saúde;

• descentralização política administrativa – consolidada com a


municipalização das ações de saúde, tornando o município gestor
administrativo e financeiro do SUS (BRASIL, 1988).

Nesse contexto, com esses processos e definições, identificou‑se que o SUS, em sua concepção, devia
possuir objetivos e atribuições bem definidas e delineadas, como:

• identificar e divulgar os fatores condicionantes e determinantes


da saúde;

• formular as políticas de saúde;

• fornecer assistência às pessoas por intermédio de ações de promoção,


proteção e recuperação da saúde, com a realização integrada das
ações assistenciais e das atividades preventivas;

• executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica;

• executar ações visando à saúde do trabalhador;

• participar na formulação da política e na execução de ações de


saneamento básico;

148
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

• participar da formulação da política de recursos humanos para a saúde;

• realizar atividades de vigilância nutricional e de orientação alimentar;

• participar das ações direcionadas ao meio ambiente;

• formular políticas referentes a medicamentos, equipamentos,


imunobiológicos e outros insumos de interesse para a saúde e a
participação na sua produção;

• controlar e fiscalizar serviços, produtos e substâncias de interesse


para a saúde;

• fiscalizar e a inspecionar alimentos, água e bebidas para consumo humano;

• participar no controle e fiscalização de produtos psicoativos, tóxicos


e radioativos;

• incrementar o desenvolvimento científico e tecnológico na área da saúde;

• formular e executar a política de sangue e de seus derivados (BRASIL, 1988).

Observa‑se que a implantação do SUS não tem sido uniforme em todos os estados e municípios
brasileiros. Isso por conta da abrangência dos objetivos propostos e pela existência de desequilíbrios
socioeconômicos e regionais. Para que isso ocorra, é necessária uma grande disponibilidade de recursos
financeiros, de pessoal qualificado e de uma efetiva política em âmbito federal, estadual e municipal
para viabilizar o sistema.

Em se tratando de financiamento do SUS, a Lei nº 8.080 estabeleceu que os recursos destinados ao


SUS seriam provenientes do Orçamento da Seguridade Social.

A mesma lei, em outro artigo, estabelece como se dará a forma de repasse de recursos financeiros
e como eles seriam transferidos para os estados e municípios. Definiu‑se que os principais pontos
deveriam ser baseados nos seguintes critérios: perfil demográfico; perfil epidemiológico; rede de serviços
instalada; desempenho técnico; ressarcimento de serviços prestados (BRASIL, 1990b).

Houve modificação desse artigo da constituição. Com a edição das NOBs (Norma Operacional Básica),
algumas mudanças foram estabelecidas com a aplicação dessa lei. A NOB trata da edição de normas
operacionais para o funcionamento e operacionalização do SUS de competência do Ministério da Saúde.
Até hoje foram editadas as seguintes: NOB‑SUS 01/91; NOB‑SUS 01/93; NOB‑SUS 01/96.

De alguma forma, durante todo o processo de implantação do SUS, percebe‑se que este sofre com a
instabilidade e diminuição da capacidade da esfera federal na articulação de tomadas de decisão, o que
faz que todos pensem que isso se dá por falta de recursos financeiros.

149
Unidade II

Infelizmente, sabe‑se que os representantes do Ministério da Saúde, ou seja, os ministros da saúde,


são apenas figuras representativas, que sofrem com essas instabilidades da instância federal, transmitindo
uma imagem de instituição fraca e irrelevante.

Mesmo com todas as dificuldades, o país passou a ter um modelo de saúde hegemônico e universal
e, apesar dos problemas enfrentados, pode‑se afirmar que o SUS apresentou progressos significativos no
setor público no nível de atenção primária, mesmo sendo insuficientes para enquadrarmos esse sistema
no formato pelos qual foi concebido e descrito na legislação constituinte.

Observação

As doutrinas que regem o SUS são de extrema importância para que seu
processo de implantação seja efetivado. A hierarquização, regionalização,
descentralização (municipalização) e participação popular, além de estarem
descritas na Constituição de 1988, representam elementos importantes
para que se organize o sistema.

Exemplo de aplicação

Todo gestor em saúde deve estar atento para não ferir os princípios e doutrinas do SUS. Em se
tratando de serviços públicos de saúde no Brasil, não existem preferências de atendimentos, a não
ser aqueles classificados como emergenciais. Destaca‑se que não se pode preterir pacientes por terem
planos de saúde privados, por questões de gênero, credo ou raça, pois todos são iguais perante o SUS;
basta ser brasileiro para ter acesso ao sistema. Assim, o que podemos dizer do gestor público que impede
que determinada pessoa use o sistema porque possui convênio médico privado? Nesse caso, será que
o gestor está, de alguma forma, interferindo no processo democrático de acesso ao SUS? Faça essa
reflexão sobre o assunto apresentado.

7.1 Legislação e o SUS

Em relação à reforma sanitária brasileira, Roncalli (2003) afirma que a incorporação de boa parte das
propostas pela Assembleia Constituinte na elaboração da nova Carta Magna concretiza suas ações no
plano jurídico‑institucional. Essa lei, que ficou conhecida como Constituição‑Cidadã (embora acusada
de tornar o país “ingovernável” por alguns setores), incluiu, no capítulo da seguridade social, a saúde
como direito de todos e dever do Estado, moldando as diretrizes do SUS:

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas


sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros
agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua
promoção, proteção e recuperação (BRASIL, 1988).

150
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Nesse contexto, efetiva‑se a criação do SUS, inserido numa proposta de seguridade social. Sintetiza,
assim, uma política social universalista, que, “resultante de um desenho da Reforma Sanitária, rompeu
e transformou, para melhor, o padrão de intervenção estatal no campo social moldado na década de
1930” (CARVALHO; GOULART, 1998).

7.1.1 Como se deu a regulamentação e normatização do SUS?

Muitos artigos da Constituição, não só os relacionados à saúde, faziam previsão de regulamentação,


que deveria ser realizada em seguida, no prazo de 180 dias. A conjuntura política pós‑constituinte, com o
projeto conservador neoliberal do presidente Fernando Collor de Mello, provoca um atraso considerável
na regulamentação do capítulo da saúde.

Em agosto de 1990, o Congresso Nacional aprova a primeira versão da Lei Orgânica da Saúde (LOS),
a lei nº 8.080, a qual é profundamente mutilada pelos vetos presidenciais, particularmente nos itens
relativos ao financiamento e ao controle social.

Resultado de negociações, uma nova lei, a 8.142, de dezembro do mesmo ano, recupera alguns vetos
e, hoje, o que conhecemos como a LOS é formada pelo conjunto das leis nos 8.080 e 8.142.

O SUS, garantido pela Constituição e regulado pela LOS, prevê um sistema com princípios doutrinários
e organizativos.

Vale relembrar que os princípios doutrinários dizem respeito às ideias filosóficas que permeiam a
implementação do sistema e personificam o conceito ampliado de saúde e o princípio do direito à saúde.
Os princípios organizativos (diretrizes) orientam a forma como o sistema deve funcionar e apresentam
como eixo norteador os preceitos doutrinários, conforme a figura a seguir:

Participação Descentralização e
popular comando único
Universalidade
Equidade
Integralidade

Regionalização e
hierarquização

Figura 12 – Relação entre os princípios e diretrizes do SUS

Portanto, a lógica organizativa e doutrinária do SUS indica um modelo de assistência à saúde cujo
objetivo é o resgate da cidadania. Os preceitos constitucionais e a regulamentação pela lei orgânica
ainda precisavam ser mais claros para operacionalizar o sistema.

151
Unidade II

Desse modo, foram implantadas, a partir de 1991, as Normas Operacionais Básicas (NOBs), que, em
tese, refletem a intenção do Estado em cumprir a Constituição e que servirão para a normatização do
sistema (ROMANO, 1998).

Lembrete

O SUS possui princípios doutrinários e princípios organizacionais,


também chamados de diretrizes, como: a regionalização, hierarquização,
descentralização/municipalização, resolutividade e a participação popular.

A primeira norma operacional (NOB 01/91) foi editada ainda no âmbito do Inamps, instituindo‑se o
pagamento por produção, ou seja, de acordo com os procedimentos realizados no município, era feito
o repasse da verba para cobrir as despesas. Muitos consideraram a NOB 01/91 como um retrocesso
na política de descentralização e no processo de financiamento, pois, além de não ter avançado
nas propostas da lei orgânica de repasse com base em critérios populacionais e epidemiológicos,
transformou, por meio do pagamento por procedimento e na forma convenial, os estados e municípios
em meros prestadores de serviços, cerceando suas prerrogativas de gestão nos distintos níveis de
governo (NORONHA, 2001).

Em 1993, o Ministério da Saúde edita a NOB 01/93 por meio da Portaria nº 545, de 20 de maio de
1993. O Conselho Nacional de Saúde, a partir de um documento intitulado Descentralização das ações
e Serviços de Saúde: a Ousadia de Cumprir e Fazer Cumprir a Lei, discute as teses de descentralização
político‑administrativas vigentes. Com isso, há grandes avanços, principalmente no estabelecimento das
modalidades de gestão municipal (incipiente, parcial e semiplena).

De acordo com a capacidade do município, ele poderia assumir determinadas ações de


complexidade variável em função da sua estrutura de serviços. Na prática, a gestão parcial não gerou
maiores consequências, entretanto, os quase 150 municípios que passaram a trabalhar com a gestão
semiplena e que representavam cerca de 20% da população do país ganharam maior autonomia sobre
suas ações de saúde, por meio do repasse direto dos recursos federais (FERREIRA, 2000; ROMANO,
1998, LEVCOVITZ, 2001).

Em novembro de 1996, após ser discutida durante mais de um ano na Comissão Intergestores
Tripartite e no Conselho Nacional de Saúde, é editada a NOB 01/96. Entre a sua edição e sua implantação
passaram‑se quase dois anos, pois houve morosidade no processo de municipalização durante a gestão
do ministro Carlos Albuquerque.

Com a NOB 01/96, nascem duas modalidades de administração municipal, a gestão plena da Atenção
Básica e a gestão plena do sistema, mas as principais características da nova norma operacional foram
o incremento do repasse fundo a fundo (direto do Fundo Nacional de Saúde para os Fundos Municipais
de Saúde) e a criação da modalidade de pagamento com base populacional, por meio da criação do Piso
Assistencial Básico (PAB).

152
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Os municípios passaram a receber, de acordo com a modalidade de gestão, um montante relativo


ao tamanho populacional para desenvolver atividades de assistência básica, e o valor per capita ficava
em torno de dez reais ao ano. A depender da série histórica dos custos ambulatoriais do município
e de determinados incentivos, (cobertura do Programa Saúde da Família, por exemplo) esse valor
poderia ser aumentado.

Os procedimentos ambulatoriais de média e alta complexidade bem como a assistência hospitalar


continuaram a ser remunerados por procedimento, embora por meio de um sistema mais rigoroso,
hoje configurado como o Sistema Siasus. A sigla SIA representa Sistema de Informação Ambulatorial
(BRASIL, 1996).

A NOB 01/96, a despeito dos avanços que proporcionou, particularmente no incremento do processo
de municipalização, deveria ter sido mais bem interpretada no que diz respeito à manutenção do
pagamento por procedimento nos itens de maior complexidade tecnológica, o que poderia induzir
procedimentos de maior lucratividade aos prestadores (BUENO; MERHY, 1996).

Aliás, isso é um ponto que merece bastante atenção e sempre gera bastante discussão no Brasil.
Geralmente, muitos gestores acreditam que os serviços públicos não são empresas como as privadas
e, portanto, que não precisam obter lucro. Com essa visão desqualificada, acabam não inserindo essas
organizações na lógica do lucro e de metas a serem atingidas.

De qualquer maneira, o discurso do sistema de financiamento com base populacional, antiga


reivindicação do movimento sanitário, embora fragmentada na forma de um subsistema de Atenção
Básica, de certo modo seduziu a intelectualidade da saúde coletiva e hoje há um consenso aparente
de que a NOB 01/96, em seu todo, representou avanços para a consolidação e normatização do
SUS. O assunto ainda gera certa polêmica nas relações de financiamento entre os governos federal,
estadual e municipal.

Nesse contexto, em se tratando da regulamentação e normatização do SUS, observa‑se que


existe uma série de tentativas e de prerrogativas que fixam as questões de financiamento e
regulação do sistema e que, de alguma forma, ainda configuram e resultam num processo de
construção desse sistema. Esse processo tem pontos positivos e negativos, pois tentam, até certo
modo, manter as características democráticas e de conquista popular que o SUS adquiriu como
resultado de lutas do movimento sanitarista.

Lembrete

A Norma Operacional Básica de 1996 (NOB/96) representa um marco


importante no processo de implementação do SUS, não somente porque
reforça o poder municipal como o principal meio de exercício das ações
da saúde, mediante a municipalização, como também prevê o repasse por
meio do Fundo Nacional de Saúde diretamente para os municípios.

153
Unidade II

7.1.2 Ações a serem desenvolvidas pelo SUS

O Ministério da Saúde, por meio da Secretaria Nacional de Assistência à Saúde, em 1990, publicou
um documento que determina quais são as principais ações a serem desenvolvidas nos serviços de
saúde pública do Brasil.

Com nossos estudos até então, notamos que a atenção à saúde no Brasil vem sendo desenvolvida
com ênfase na prestação de serviços médicos individuais, de enfoque curativo, a partir da procura
espontânea aos serviços. Isso representa um modelo centralizado e muito pouco democrático.

O conceito de saúde deve orientar a mudança progressiva dos serviços, o que representa o foco no
atendimento às demandas e necessidades da população, num modelo de atenção integral à saúde, com
ênfase na promoção da proteção, em vez de medidas de recuperação.

Com isso, foram incorporados os conceitos dos processos saúde‑doença já discutidos neste livro,
assim como as formas em que o acesso pudesse ser democratizado. Então, vem à tona a necessidade
de definição dos eixos descritos na LOS: num primeiro momento, para o estabelecimento do SUS, com
orientação e norteamento; depois, para os processos de implementação e sua efetivação.

Em 1990, o Ministério da Saúde, por meio da Secretaria Nacional de Assistência à Saúde, publicou
um documento que determina quais são as principais ações a serem desenvolvidas nos serviços de
saúde pública do Brasil.

Nessa obra, notamos que a atenção à saúde no Brasil vem sendo desenvolvida com ênfase na
prestação de serviços médicos individuais, de enfoque curativo, a partir da procura espontânea aos
serviços. Isso representa um modelo centralizado e muito pouco democrático.

Premissa básica é conhecer as principais características do perfil epidemiológico da população,

não só em termos de doenças de maior prevalência, mas também quanto


às condições socioeconômicas da comunidade, seus hábitos e estilos de
vida e suas necessidades de saúde – sentidas ou não –, aí incluída por
extensão a infraestrutura de serviços disponíveis. As ações de saúde bucal
devem se inserir na estratégia planejada pela equipe de saúde numa
inter‑relação permanente com as demais ações da Unidade de Saúde
vulneráveis (BRASIL, 2004).

Para tal reconhecimento, existe a necessidade de melhor identificar quais os principais grupos de
ações de proteção e de recuperação da saúde a serem desenvolvidas, assim como sua prioridade.

Ações de promoção e proteção de saúde são grupos de ações que podem ser desenvolvidas por
instituições governamentais, empresas, associações comunitárias e indivíduos.

154
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Esses grupos compreendem um elenco bastante vasto e diversificado de ações, de natureza


eminentemente preventiva, que, em seu conjunto, constituem um campo de aplicação do que se
convencionou chamar, tradicionalmente, de saúde pública, ou seja, o diagnóstico e tratamento
científico epidemiológico da comunidade, conforme discutido no início do livro‑texto.

Tais ações visam à redução de fatores de risco, que constituem ameaça à saúde das pessoas, podendo
provocar‑lhes incapacidades e doenças que podem recair nas questões de reabilitação e no tratamento
de sequelas.

São exemplos de ações no campo da promoção: educação em saúde, bons padrões de alimentação
e nutrição, adoção de estilos de vida saudáveis, uso adequado e desenvolvimento de aptidões e
capacidades, aconselhamentos específicos, como os de cunho genético e sexual. Isso também foi
amplamente discutido quando falamos sobre as conferências internacionais de saúde, sobretudo a que
originou a Carta de Ottawa.

É de suma importância que o desenvolvimento dessas ações devam ocorrer de forma


programática e sistemática. Além disso, deve‑se preconizar o uso de linguagem adequada ao
público‑alvo e aos diferentes meios e veículos disponíveis de comunicação para que a comunidade
possa ser alcançada.

No campo da promoção da saúde podem ser incluídas as ações de vigilância epidemiológica,


vacinações, saneamento básico, vigilância sanitária, exames médicos e odontológicos periódicos, entre
outros. É por meio da vigilância epidemiológica que são obtidas as informações para se conhecer e
acompanhar o estado de saúde da comunidade. Depois de traçado esse perfil, é possível criar medidas
de prevenção e controle específicos contra determinado agravo e/ou doença.

São ações de monitoramento e que inclusive fazem uma avaliação de percurso e criam uma série
histórica de como a doença aconteceu, se alastrou, foi contida e de que formas as medidas de prevenção
e controle foram estabelecidas.

A responsabilidade da vigilância sanitária está voltada para a garantia da qualidade de


serviços diversos,

meio ambiente, de trabalho e produtos (alimentos, medicamentos


cosméticos, saneantes agrotóxicos e outros), mediante a identificação, o
controle ou a eliminação de fatores de risco à saúde, neles eventualmente
presentes (BRASIL, 2004).

Vejamos a seguir alguns exemplos de locais onde a vigilância sanitária poderá atuar: unidades
de saúde, restaurantes, academias de ginástica, institutos de beleza, piscinas públicas, entre outros.
O meio ambiente também poderá ser objeto de atuação desse eixo. Com isso, busca‑se evitar ou
controlar a poluição do ar, do solo, da água, a contaminação por agrotóxicos, o uso do mercúrio
nos garimpos etc.

155
Unidade II

Outro importante aspecto estudado e fiscalizado por ela é a saúde do trabalhador.

A Vigilância Sanitária com as suas ações nos locais de trabalho, preocupa‑se,


por exemplo, em assegurar condições ambientais satisfatórias (iluminação,
temperatura, umidade, ventilação, nível sonoro), adequação ergométrica de
máquinas, equipamentos e móveis e eliminação de substâncias e produtos
que podem provocar doenças ocupacionais.

Em relação aos produtos, a vigilância sanitária não se limita apenas


à fiscalização dos artigos já expostos ao consumo, mas efetua, com
prioridade, a inspeção sanitária e técnica das respectivas linhas de
fabricação, de modo a evitar a sua comercialização em condições
insatisfatórias de segurança e qualidade. Os prazos de validade também
são situações fiscalizadas.

Obviamente que todas as ações de promoção e proteção da saúde, acima


descritas, podem e devem ser exercidas (ou desencadeadas), também,
durante o atendimento nas unidades de saúde, ambulatoriais e hospitalares,
com objetivos e técnicas adequados a estes locais.

[...] Ações de recuperação – esse grupo de ações envolve o diagnóstico


e o tratamento de doenças, acidentes e danos de toda natureza, a
limitação da invalidez e a reabilitação. Essas ações são exercidas pelos
serviços públicos de saúde (ambulatórias e hospitalares) e, de forma
complementar, pelos serviços particulares, contratados ou conveniados,
que integram a rede do SUS, nos níveis federal, estadual e municipal,
particularmente nos dois últimos, onde deve estar concentrada a maior
parte dessas atividades.

As ações típicas são: consultas médicas e odontológicas, a vacinação, o


atendimento de enfermagem, exames diagnósticos e o tratamento, inclusive
em regime de internação, e em todos os níveis de complexidade (BRASIL, 2004).

Todas essas ações propostas e descritas devem contemplar as necessidades básicas da população.
É preciso que tudo esteja de acordo com a procura dessas pessoas pelos serviços, o que se denomina
demanda, além de considerar os estudos epidemiológicos que caracterizam determinada comunidade e
seu aspecto de vulnerabilidade social.

Quanto mais rápido e precoce for realizado esse diagnóstico, maior a probabilidade do tratamento
imediato proposto conter os avanços da doença.

Por conta desse cenário é que a atenção primária é a porta de entrada do sistema. Nesse nível, é
possível realizar ações de promoção e prevenção em saúde, além das ações voltadas à recuperação da
saúde, como o diagnóstico precoce e o tratamento imediato.
156
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

A integralidade das ações se dá no momento em que o tratamento é proposto. Assim, o tratamento


deve ser prestado ao paciente portador de qualquer alteração de sua saúde, desde uma afecção
corriqueira, cujo atendimento pode ser efetuado por pessoal de nível elementar, até uma doença mais
complexa, que exige a atenção por profissional especializado e tecnologia avançada.

Uma vez feito o diagnóstico, o tratamento deve ser conduzido com o intuito de impedir o surgimento
de eventuais danos e/ou incapacidades decorrentes dos desdobramentos das doenças.

A reabilitação visa ao tratamento das sequelas que a doença pode ter desencadeado. Portanto,
consiste na recuperação parcial ou total das capacidades no processo de doença e na reintegração do
indivíduo ao seu ambiente social e à sua atividade profissional.

Para tais objetivos de recuperação, podemos utilizar os serviços hospitalares como os comunitários,
justamente para tentar a reinserção desse paciente na sociedade, no campo profissional, afetivo,
cognitivo e de saúde.

Conjugar ações de promoção e proteção às condutas de recuperação de saúde é premissa básica


para planejar práticas aos grupos prioritários ou de risco ou, ainda, de maior vulnerabilidade. As
ações de recuperação da saúde, na maior parte das vezes, podem e devem ser planejadas por meio de
estudos epidemiológicos, definição de cobertura e concentração das ações ambulatoriais e hospitalares,
aplicando‑se parâmetros de atendimento.

Por fim, sabe‑se que essas práticas que recuperam saúde podem estar associadas também com
o diagnóstico e tratamento científico da comunidade; quando as ações promotoras e protetoras são
integradas nesse processo, podemos chamar o movimento de moderna saúde pública.

Observação

Fica evidente que o SUS, além de ser descentralizado na sua gestão, ou seja,
cada esfera governamental possui responsabilidades bem definidas para com
os cidadãos, possui como prerrogativa as ações de saúde que compreendem os
processos de promoção, proteção e recuperação da saúde, tudo previsto em lei.

Saiba mais

Para saber mais sobre atenção básica na saúde, leia:

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde.


Departamento de Atenção Básica. Coordenação Nacional de Saúde Bucal.
Projeto SB Brasil 2003: condições de saúde bucal da população brasileira
2002‑2003: resultados principais. Brasília: MS‑CNSB, 2004.

157
Unidade II

7.1.3 Papel dos gestores no SUS

Já discutimos todos os meandros que levaram a concepção do SUS e também apresentamos de uma forma
bem didática como o sistema público de saúde está configurado nos parâmetros da legislação e da assistência.

Agora precisamos saber quem de fato faz a gestão do sistema e quem são os atores do processo
de implantação e implementação das políticas públicas desenvolvidas, bem como as responsabilidades
e competências desses agentes, sobretudo da municipalidade, pois sabemos que é nessa esfera que as
ações serão desenvolvidas, embora muitas vezes planejadas e financiadas em outras instâncias.

Os gestores têm o objetivo de fazer com que o SUS seja implantado e trabalhe de acordo com os
parâmetros governamentais e seguindo, obviamente, uma lógica organizacional.

Haverá gestores nas três esferas do governo, isto é, no nível municipal, estadual e federal.

Nos municípios, os gestores são as secretarias municipais de saúde ou as prefeituras, sendo responsáveis
por sua administração os respectivos secretários municipais e prefeitos. Nos estados, os gestores são os
secretários estaduais de saúde; no âmbito federal, o Ministério da Saúde. No nível municipal, é dever
dos gestores programar, executar e avaliar as ações de promoção, proteção e recuperação da saúde. O
município deve ser o primeiro e o principal responsável pelas ações de saúde (BRASIL, 2004).

Dessa forma, sempre que a complexidade do problema extrapolar a capacidade do município em resolvê‑lo,
o próprio serviço municipal de saúde deve enviar o paciente para outro município mais próximo e que seja
capaz de fornecer a assistência adequada, ou então pode encaminhar a questão para suportes regionais e
estaduais nas áreas de alimentação, saneamento básico, vigilância epidemiológica e vigilância sanitária.

É muito importante que haja integração entre os municípios para sanar de forma mais rápida os
problemas. Se necessário, as secretarias estaduais de saúde ou o próprio Ministério da Saúde podem intervir.

7.1.4 Assistência em saúde no Brasil após a implantação do SUS?

Antes do início do SUS, havia uma assistência de característica excludente, mercantil, dicotômica e
pouco resolutiva. Esses modelos assistenciais estabelecidos no Brasil se constituíram num desafio para
a implantação do SUS pelo fato deste apontar para uma lógica totalmente oposta, de universalidade,
integralidade e promoção de saúde.

Alguns modelos alternativos já vinham sendo inseridos em certos locais mesmo antes do SUS, por
exemplo, algumas experiências de implantação do Suds (Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde),
que nasceu como estratégia anterior ao SUS e que já trabalhava a partir da ideia de distritos sanitários.

Esses departamentos sanitários nasceram a partir da proposta de Sistemas Locais de Saúde


(Silos) e da Opas. Na verdade, sua organização não deve ser vista de forma isolada dos processos de
descentralização e de democratização do Estado. Trata‑se de uma resposta interna do setor saúde no
sentido de proporcionar maior equidade, eficácia e eficiência às suas ações.
158
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Para Silva Jr. (1998), a base para seu desenvolvimento tem os seguintes princípios fundamentais:

• reorganização do nível central;

• descentralização e desconcentração;

• participação social;

• intersetorialidade;

• readequação dos mecanismos de financiamento;

• desenvolvimento de um novo modelo de atenção;

• integração dos programas de prevenção e controle;

• reforço da capacidade administrativa;

• capacitação da força de trabalho.

Outros modelos (ou propostas de modelos) podem ser resgatados na literatura em saúde coletiva. De fato,
todos são tentativas – algumas bem outras mal‑sucedidas – de implementar o SUS em nível municipal.

De uma forma geral, com todas essas tentativas frustradas, poderíamos dizer que o modelo em si
está dado, ou seja, é o SUS.

As tecnologias que deverão ser desenvolvidas, as formas como a demanda deve ser organizada,
as estratégias de inclusão, o incentivo à participação popular, entre outros, são desdobramentos
importantes, e cada nível deve pensar a melhor maneira de colocá‑los em prática. Aliás, isso são desafios
que constituem o SUS até hoje!

Uma proposta relevante de modelo assistencial que vem sendo desenvolvida é a do Programa Saúde
da Família e dos Agentes Comunitários de Saúde (PSF/Pacs) (RONCALLI, 2003).

Trata‑se da introdução de uma nova lógica na prestação de serviços, particularmente com relação à
atenção primária, segundo os pressupostos do Ministério da Saúde.

Observação

Com a implantação do SUS, é notório que o modelo de saúde adotado


no Brasil é o universal. Isso responsabiliza o Estado no cumprimento das
suas ações e também confere à população o poder de participação nos
processos de implantação, implementação e fiscalização do SUS.
159
Unidade II

7.2 PSF e Pacs

O PSF foi introduzido no Brasil pelo Ministério da Saúde em 1994. Enquanto proposta concebida
dentro da vigência do SUS, teve como antecedente o Pacs, lançado em 1991, o qual já se trabalhava com
a família como unidade de ação programática.

Com os bons resultados do Pacs, particularmente na redução dos índices de mortalidade infantil,
buscou‑se ampliá‑lo e lhe conferir maior resolutividade das ações. Assim, a partir de janeiro de 1994,
começaram a ser formadas as primeiras equipes de Saúde da Família (BRASIL, 1997).

Inicialmente, o PSF ficou sob responsabilidade da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), com a
criação da Coordenação de Saúde da Comunidade (Cosac). Em 1995, o programa foi transferido para a
Secretaria de Assistência à Saúde (SAS), e no ano seguinte já estava em vigor o sistema de financiamento
a partir da tabela de procedimentos do Siasus.

Com a implementação da NOB01/96, no início de 1998, foram criados, além do pagamento per
capita, os incentivos para o Pacs e o PSF. Esses impulsos fazem parte da fração variável do PAB, de
acordo com a faixa de cobertura populacional.

A partir de então, o PSF apresentou um notável crescimento e, atualmente, o programa foi


determinado como sendo a forma de reorganizar, ou melhor, reordenar e fortalecer a Atenção Básica
no Brasil não mais por meio do Pacs, mas sim como modelo de estratégia a ser adotado para que se
cumpram as prerrogativas da atenção e da assistência no Atenção Primária, portanto, definido como
Estratégias em Saúde da Família, ou seja, quais são as forma de lidar com essa família e suas demandas,
necessidades de saúde, vulnerabilidades, fragilidades, entre outros.

Abordaremos todos os meandros dessa transição nos próximos tópicos desta obra.

Saiba mais

Para obter excelentes informações sobre cuidados básicos de saúde, leia:

STARFIELD, B. Atenção primária: equilíbrio entre necessidades de


saúde, serviços e tecnologia. Brasília: Unesco; Ministério da Saúde, 2002.
726 p. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/atencao_
primaria_p1.pdf. Acesso em: 20 set. 2015.

8 TRANSIÇÃO DO PSF PARA O PROGRAMA ESTRATÉGIA EM SAÚDE DA FAMÍLIA (ESF)

De acordo com o documento oficial do Ministério da Saúde, no qual estão explicitados os princípios
do PSF, a ESF ressalta e incorpora os princípios básicos do SUS: universalização, descentralização,
integralidade e participação da comunidade.

160
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

O que se propõe, portanto, é a reorganização da prática assistencial a partir de novas bases


em substituição ao modelo tradicional de assistência, orientado para a cura das doenças e para
o hospital.

A base operacional desse novo sistema é a Unidade de Saúde da Família (USF), que tem como
princípios o seguinte:

• caráter substitutivo: não significa a criação de novas estruturas de


serviços, exceto em áreas desprovidas, e sim a substituição das práticas
convencionais de assistência por um novo processo de trabalho, cujo
eixo está centrado na vigilância à saúde;

• integralidade e hierarquização: a Unidade de Saúde da Família está


inserida no primeiro nível de ações e serviços do sistema local de saúde,
denominado Atenção Básica. Deve estar vinculada à rede de serviços
de forma que se garanta atenção integral aos indivíduos e famílias
e seja assegurada a referência e contrarreferência para os diversos
níveis do sistema, sempre que for requerido maior complexidade
tecnológica para a resolução de situações ou problemas identificados
na Atenção Básica;

• territorialização e adscrição da clientela: trabalha com território


de abrangência definido e é responsável pelo cadastramento e
acompanhamento da população adscrita a esta área. Recomenda‑se
que uma equipe seja responsável pelo acompanhamento de, no
máximo, 4.500 pessoas;

• equipe multiprofissional: a equipe de Saúde da Família é composta


minimamente por um médico generalista ou médico de família, um
enfermeiro, um auxiliar de enfermagem e de quatro a seis agentes
comunitários de saúde (ACS). O número de ACS varia de acordo
com o número de pessoas sob a responsabilidade da equipe – numa
proporção média de um agente para 550 pessoas acompanhadas
(BRASIL, 1997).

É possível ainda a incorporação de outros profissionais na USF ou em atividades de supervisão.


Para o seu gerenciamento, o programa conta com o Sistema de Informações da Atenção Básica
(Siab), cujo banco de dados deve ser alimentado com informações dos municípios participantes
dessa iniciativa.

Concebido inicialmente como programa dentro da Funasa, em pouco tempo o PSF foi considerado
prioritário dentro dos modelos propostos para a Atenção Básica. Atualmente, fala‑se em ESF, embora a
denominação PSF persista.

161
Unidade II

Decerto, a “estratégia” de falar em estratégia, e não mais em programa, foi uma forma de responder
às críticas que eram dirigidas ao programa, taxado de “foquista” e de ser uma medida impositiva, que
não considera as realidades locais.

Segundo o Ministério da Saúde, o discurso da estratégia e a resposta às críticas feitas ao


programa estão bem claras. Destaca que o PSF não é uma cesta básica, que garante a todos só a
atenção primária. Ao contrário, o PSF, ao resolver as questões de saúde da rede básica, vai diminuir
o fluxo dos usuários para os níveis mais especializados, desafogando os hospitais. Assim, racionaliza
o uso dos recursos existentes que, melhor utilizados, garantem a todos o acesso aos procedimentos
mais complexos.

Não se trata de economia de recursos, de uma medicina de pobre para pobres, com utilização de
baixa tecnologia. É uma prática complexa, que requer novos campos de conhecimento, desenvolvimento
de habilidades e mudanças de atitudes.

Em certa medida, políticas assistenciais voltadas para grupos vulneráveis e com baixa tecnologia
se esbarram com a lógica “eficientista” que vem sendo imposta para a criação e execução de políticas
sociais nos países de economia dependente.

Do ponto de vista do discurso oficial, os conceitos de universalidade e equidade podem adquirir


formatos apropriados em função da maneira como se considera o papel do Estado em uma sociedade
desigual. Para Almeida (2000), determinadas medidas racionalizadoras, baseadas na lógica de um
Estado eficiente em detrimento de um organismo redutor de iniquidades, podem justificar a ação em
determinados grupos sociais a partir de um princípio de universalidade equitativa.

Em tese, centrar as ações em setores da sociedade expostos a um maior risco à saúde (e este é um
dos critérios para a priorização de implantação de equipes de PSF) não deixa de ser um princípio de
equidade. A questão imposta nesse raciocínio é que, no mais das vezes, não se trata de uma perspectiva
da implementação de um modelo equânime, mas de uma lógica racionalizadora, em que a contenção
dos gastos regula o acesso aos serviços.

Além disso, como são colocadas as propostas de promoção, prevenção e educação em saúde
nas estratégias, o modelo em questão acaba por privilegiar também aqueles que não são do grupo
vulnerável e que não possuem doença, portanto, pode ser sim uma forma democrática de acesso o
fato de priorizar grupos vulneráveis baseados em condições sociais, geográficas e de levantamentos
epidemiológicos (indicadores de saúde).

Por outro lado, para Dal Poz et al. (1999), existem sim méritos no PSF exatamente pelo fato de expor
certas fragilidades do modelo tradicional. Para os autores, a dualidade universalismo x focalização não
se constitui num problema, na medida em que é possível haver práticas evidenciadas dentro de uma
política universal e não há necessariamente conflito entre focalização e universalização, isto é, os dois
conceitos não precisam ser excludentes, muito pelo contrário, podem ser sinérgicos, o que resultará
numa atenção em saúde mais democrática e com acesso priorizado.

162
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Nesse sentido, o PSF pode ser um instrumento de reorganização da política universal. Então,
diferentes dimensões a respeito dessa estratégia podem ser resgatadas atualmente na literatura
e no discurso da saúde coletiva, que vão desde a interpretação do PSF como uma oportunidade
única (a qual não se deve perder) de resgatar uma prática mais humanista, que gere vínculo,
responsabilização e que dinamize o processo de trabalho, à leitura do processo em seu caráter mais
abrangente e de longo prazo.

Lembrete

O antigo PSF passa a ser chamado de Estratégias em Saúde da


Família (ESF). Assim, por não se tratar mais de programa de saúde,
entende‑se que o Ministério da Saúde considera essa a melhor forma
de organizar as ações que permeiam a Atenção Básica ou Atenção
Primária em saúde.

8.1 Estratégias em Saúde da Família (ESF)

De acordo com a PNAB (2012), o objetivo da ESF é reorganizar a Atenção Básica no Brasil. O Ministério
da Saúde a considera como estratégia de expansão, qualificação e consolidação da Atenção Básica,
pois, além de ampliar a resolutividade e impacto na situação de saúde das pessoas e coletividades,
proporciona relevante relação custo‑efetividade.

Um ponto importante é o estabelecimento de uma equipe multiprofissional. É composta


por, no mínimo:

I – médico generalista, ou especialista em Saúde da Família, ou médico de


Família e Comunidade;

II – enfermeiro generalista ou especialista em Saúde da Família;

III – auxiliar ou técnico de enfermagem; e

IV – agentes comunitários de saúde. Podem ser acrescentados a essa


composição os profissionais de Saúde Bucal: cirurgião‑dentista generalista
ou especialista em Saúde da Família, auxiliar e/ou técnico em Saúde Bucal
(BRASIL, 2000).

Em se tratando de uma proposta de reorganização e redefinição de atributos voltados à Atenção


Básica, existem especificidades bem definidas e estabelecidas pela PNAB (2012). Além da equipe
profissional, destaca as seguintes especificidades:

• o número de ACS deve ser suficiente para cobrir 100% da população


cadastrada, com um máximo de 750 pessoas por ACS e de 12 ACS
163
Unidade II

por equipe de Saúde da Família, não ultrapassando o limite máximo


recomendado de pessoas por equipe;

• cada equipe de Saúde da Família deve ser responsável por,


no máximo, 4.000 pessoas, sendo a média recomendada de
3.000, respeitando critérios de equidade para essa definição.
Recomenda‑se que o número de pessoas por equipe considere
o grau de vulnerabilidade das famílias daquele território, sendo
que, quanto maior o grau de vulnerabilidade, menor deverá ser a
quantidade de pessoas por equipe;

• cadastramento de cada profissional de saúde em apenas uma ESF,


exceção feita somente ao profissional médico, que poderá atuar
em, no máximo, duas ESF e com carga horária total de 40 horas
semanais; e

• carga horária de 40 horas semanais para todos os profissionais


de saúde membros da equipe de Saúde da Família, à exceção dos
profissionais médicos, cuja jornada é descrita no próximo inciso.
A jornada de 40 horas deve observar a necessidade de dedicação
mínima de 32 horas da carga horária para atividades na equipe de
Saúde da Família, podendo, conforme decisão e prévia autorização
do gestor, dedicar até oito horas do total da carga horária para
prestação de serviços na rede de urgência do município ou para
atividades de especialização em Saúde da Família, residência
multiprofissional e/ou de Medicina de Família e de Comunidade,
bem como atividades de educação permanente e apoio matricial
(BRASIL, 2000).

Além dessas composições descritas que configuram a inserção do médico na equipe das ESF, existe
também a possibilidade, conforme a PNAB (2012), de se fazer modificações na carga horária desse
profissional, desde que sejam de caráter transitório e não comprometam o escopo preconizado pelas
estratégias adotadas em Saúde da Família, e que o município se adeque às especificidades citadas
anteriormente num período curto. Essa situação também implica mudanças nos incentivos realizados
pelo Ministério da Saúde, que acabam sendo menores do que os convencionais, justamente por haver
flexibilização da carga horária desses profissionais.

É muito importante que essas equipes de Saúde da Família estejam devidamente cadastradas. Todo
o processo e a combinação das jornadas de trabalho das UBS precisam garantir o maior vínculo e acesso
entre usuários e profissionais.

164
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Lembrete

A equipe de saúde da família é multiprofissional. Trabalha num


território definido e com uma população adstrita, o que permite que
ações específicas de promoção, prevenção e recuperação sejam realizadas
nessa comunidade.

Saiba mais

Saiba mais sobre saúde da família:

BRASIL. Ministério da Saúde. Saúde da família. Uma estratégia para


reorientação do modelo assistencial. Brasília: Ministério da Saúde, 1997.
Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cd09_16.pdf.
Acesso em: 21 set. 2015.

8.2 Papel dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS)

Antes de abordarmos em pormenores a ESF, é fundamental destacar a importância e inserção dos


Agentes Comunitário de Saúde (ACS) nesse cenário.

Muitos autores consideram esses profissionais como os grandes atores da realidade e da lógica de
assistência que ocorre quando as ESF estão configuradas.

Alguns requisitos para tal medida são exigidos, como:

• a existência de uma Unidade Básica de Saúde, inscrita no sistema de


cadastro nacional vigente, que passa a ser a UBS de referência para a
equipe de agentes comunitários de saúde;

• a existência de um enfermeiro para até, no máximo, 12 ACS e, no mínimo,


quatro, constituindo, assim, uma equipe de agentes comunitários de
saúde; e

• o cumprimento da carga horária integral de 40 horas semanais


por toda a equipe de agentes comunitários, composta por ACS e
enfermeiro supervisor (BRASIL, 1997).

Vale ressaltar que esse profissional, obrigatoriamente, precisa fazer parte da comunidade, ou seja,
ele é um sujeito que deverá residir no território de abrangência da UBS, já que é por meio dele que a

165
Unidade II

equipe pode conhecer as particularidades de cada localidade e as interferências sociais que deixam a
comunidade vulnerável, incidindo nas questões do processo saúde‑doença.

Além das atribuições de atenção à saúde e de gestão comuns a qualquer enfermeiro da atenção
básica descritas nesta portaria, os ACS têm o dever de planejar, coordenar e avaliar as ações comuns aos
enfermeiros da Estratégia Saúde da Família.

Observação

Os agentes comunitários de saúde (ACS) representam o elo formado


entre a equipe das ESF e a comunidade, pois é por meio desse profissional
que a equipe passa a conhecer melhor as necessidades do local em questão,
já que também faz parte dele.

8.3 Núcleos de Apoio à Saúde da Família (Nasf)

Os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (Nasf) foram criados com o objetivo de ampliar
a abrangência e o escopo das ações da atenção básica, bem como sua resolubilidade.

São constituídos por equipes compostas por profissionais de diferentes áreas de


conhecimento, que devem atuar de maneira integrada e apoiando os profissionais das
equipes de Saúde da Família, das equipes de atenção básica para populações específicas
(consultórios na rua, equipes ribeirinhas e fluviais etc.) e Academia da Saúde, compartilhando
as práticas e saberes em saúde nos territórios sob a responsabilidade dessas equipes,
atuando diretamente no apoio matricial às equipes da(s) unidade(s) na(s) qual(is) o Nasf
está vinculado e no território dessas equipes.

Os Nasf fazem parte da atenção básica, mas não se constituem como serviços com
unidades físicas independentes ou especiais, e não são de livre acesso para atendimento
individual ou coletivo (estes, quando necessários, devem ser regulados pelas equipes de
atenção básica). Devem, a partir das demandas identificadas no trabalho conjunto com as
equipes e/ou Academia da Saúde, atuar de forma integrada à Rede de Atenção à Saúde e
seus serviços (exemplo: Caps, Cerest, ambulatórios especializados etc.), além de outras redes
como Suas, redes sociais e comunitárias.

A responsabilização compartilhada entre a equipe do Nasf e as equipes de Saúde


da Família/equipes de atenção básica para populações específicas prevê a revisão da
prática do encaminhamento com base nos processos de referência e contrarreferência,
ampliando‑a para um processo de compartilhamento de casos e acompanhamento
longitudinal de responsabilidade das equipes de atenção básica, atuando no
fortalecimento de seus princípios e no papel de coordenação do cuidado nas redes de
atenção à saúde.

166
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Os Nasf devem buscar contribuir para a integralidade do cuidado aos usuários do


SUS principalmente por intermédio da ampliação da clínica, auxiliando no aumento da
capacidade de análise e de intervenção sobre problemas e necessidades de saúde, tanto
em termos clínicos quanto sanitários. São exemplos de ações de apoio desenvolvidas
pelos profissionais dos Nasf: discussão de casos, atendimento conjunto ou não,
interconsulta, construção conjunta de projetos terapêuticos, educação permanente,
intervenções no território e na saúde de grupos populacionais e da coletividade, ações
intersetoriais, ações de prevenção e promoção da saúde, discussão do processo de
trabalho das equipes etc.

Todas as atividades podem ser desenvolvidas nas Unidades Básicas de Saúde,


Academias da Saúde ou em outros pontos do território. Os Nasf devem utilizar
as Academias da Saúde como espaços que ampliam a capacidade de intervenção
coletiva das equipes de atenção básica para as ações de promoção de saúde, buscando
fortalecer o protagonismo de grupos sociais em condições de vulnerabilidade na
superação de sua condição.

Quando presente no Nasf, o profissional sanitarista pode reforçar as ações de apoio


institucional e/ou matricial, ainda que não sejam exclusivas dele, tais como: análise e
intervenção conjunta sobre riscos coletivos e vulnerabilidades, apoio à discussão de
informações e indicadores e saúde (bem como de eventos‑sentinela e casos traçadores
e analisadores), suporte à organização do processo de trabalho (acolhimento, cuidado
continuado/programado, ações coletivas, gestão das agendas, articulação com outros pontos
de atenção da rede, identificação de necessidades de educação permanente, utilização de
dispositivos de gestão do cuidado etc.).

Os Nasf podem ser organizados em duas modalidades, Nasf 1 e Nasf 2. A implantação de


mais de uma modalidade de forma concomitante nos municípios e no Distrito Federal não
receberá incentivo financeiro federal.

O Nasf 1 deverá ter equipe formada por uma composição de profissionais de nível superior
escolhidos entre as ocupações listadas a seguir e que reúnam as seguintes condições:

I – a soma das cargas horárias semanais dos membros da equipe deve acumular, no
mínimo, 200 horas semanais;

II – nenhum profissional poderá ter carga horária semanal menor que 20 horas; e

III – cada ocupação, considerada isoladamente, deve ter, no mínimo, 20 horas e, no


máximo, 80 horas de carga horária semanal.

O Nasf 2 deverá ter equipe formada por uma composição de profissionais de nível superior
escolhidos entre as ocupações listadas a seguir e que reúnam as seguintes condições:

167
Unidade II

I – a soma das cargas horárias semanais dos membros da equipe deve acumular, no
mínimo, 120 horas semanais;

II – nenhum profissional poderá ter carga horária semanal menor que 20 horas; e

III – cada ocupação, considerada isoladamente, deve ter, no mínimo, 20 horas e, no


máximo, 40 horas de carga horária semanal.

A organização do trabalho do Nasf deve seguir as normas publicadas pelo Ministério


da Saúde, destacando os Cadernos de Atenção Básica/Primária que tratam do tema,
descrevendo as diretrizes, o processo de trabalho, as principais ferramentas e as ações de
responsabilidade de todos os profissionais dos Nasf a serem desenvolvidas em conjunto
com as equipes de Saúde da Família, equipes de atenção básica para populações específicas
e/ou Academia da Saúde.

Fonte: São Paulo ([s.d.]).

Observação

Os Nasf são importantes ferramentas que configuram o atendimento


multiprofissional e especializado na Atenção Básica, ou seja, para um
atendimento mais especializado, o paciente não precisa ser encaminhado
para um nível de maior complexidade. Destaca‑se que a equipe é configurada
conforme a necessidade de cada município.

8.4 Programas de saúde no Brasil

Dados atuais do Ministério da Saúde indicam que há grupos que estão mais expostos a riscos na sua
saúde, por exemplo, crianças com menos de 1 ano, gestantes, idosos, trabalhadores urbanos e rurais etc.

Além de aprimorar o atendimento ambulatorial e hospitalar, é preciso intensificar a promoção, a


proteção e a recuperação da saúde.

É nesse ponto que devem atuar os programas de saúde. Contudo, são eficazes apenas quando as
diretrizes vigentes respeitam as condições sociais, epidemiológicas, institucionais e culturais existentes
em âmbito regional ou microrregional.

Além da ESF, o Portal da Saúde dispõe alguns programas e ações específicos para a população do
Brasil. Alguns deles são solidificados, outros nem tanto, e ainda há aqueles em fase de implantação, ou
seja, dependem da adesão dos municípios para executá‑los nas cidades brasileiras.

A seguir, serão descritos os principais programas de saúde do Brasil e as principais ações voltadas
uma vez que são implantados:
168
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

• Provab: o programa leva mais médicos para mais perto da população.


Amplia a assistência principalmente aos usuários do SUS que ainda
têm dificuldades para acessar serviços e profissionais de saúde. Com
isso, as desigualdades regionais relacionadas à presença e permanência
desses trabalhadores são reduzidas.

• Academia da Saúde: lançado em abril de 2011, estimula a criação


de espaços públicos adequados para a prática de atividade
física e de lazer. O objetivo é contribuir para a promoção da
saúde da população.

• Mais Médicos: faz parte de um amplo pacto de melhorias no


atendimento aos usuários do SUS. Com a convocação de
profissionais para atuar na Atenção Básica de municípios com
maior vulnerabilidade social e doenças, o Governo Federal garante
mais saúde para o brasileiro.

• Melhor em Casa: lançado em 8 de novembro de 2011, o programa


amplia o atendimento domiciliar aos brasileiros no SUS. O princípio
é oferecer aos pacientes da rede pública de saúde um serviço
humanizado e acolhedor.

• Farmácia Popular: criado para ampliar o acesso da população a


medicamentos essenciais, que são vendidos a preços mais baixos
que os praticados no mercado. São remédios contra diabetes e
hipertensão, entre outros.

• Cartão Nacional de Saúde: é um instrumento que possibilita a


vinculação dos procedimentos executados no âmbito do SUS ao
usuário, ao profissional que os realizou e também à unidade de
saúde onde foram efetuados.

• Unidade de Pronto Atendimento (UPA): as UPAs 24h são estruturas


de complexidade intermediária entre as UBS e as portas de
urgência hospitalares e, em conjunto com estas, compõem uma
rede organizada de Atenção às Urgências.

• HumanizaSUS: a Política Nacional de Humanização aposta em


estratégias construídas por gestores, trabalhadores e usuários do
SUS para qualificar a atenção e gestão em saúde.

• PNAN: A Política Nacional de Alimentação e Nutrição do


Ministério da Saúde tem o propósito de garantir a qualidade
dos alimentos disponíveis para consumo no país, bem como de
169
Unidade II

promover práticas alimentares saudáveis e prevenir e controlar


distúrbios nutricionais.

• Doação de Órgãos: tem o intuito de conscientizar a população sobre


a importância da doação de órgãos. Destaca que muitos aguardam
uma nobre atitude de doação para sobreviver.

• Samu: o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência tem a finalidade


de prestar socorro à população em casos de urgência. A assistência é
feita depois de chamada para o telefone 192, e a ligação é gratuita.

• Programas de controle do câncer: O Programa Nacional de Controle


do Câncer do Colo do Útero e o Programa Nacional de Controle
do Câncer de Mama têm como objetivos oferecer subsídios para o
avanço do planejamento das ações de controle desses tipos de câncer,
no contexto da atenção integral à saúde da mulher no Brasil. Ambos
foram afirmados como prioridade na Política Nacional de Atenção
Oncológica, em 2005, e no Pacto pela Saúde, em 2006.

• QualiSUS‑Rede: foi instituído como estratégia de apoio à


organização de redes de atenção à saúde. O objetivo é contribuir,
no âmbito do SUS, para a qualificação da atenção, gestão em saúde
e em desenvolvimento de tecnologias por meio da organização de
redes regionais e temáticas de atenção à saúde e da qualificação
do cuidado em saúde.

• Controle do Tabagismo: o Instituto Nacional de Câncer (Inca) é o


órgão do Ministério da Saúde responsável por coordenar e executar
o Programa de Controle do Tabagismo no Brasil. O objetivo é
prevenir doenças e reduzir a incidência do câncer e de outras
doenças relacionadas ao tabaco por meio de ações que estimulem
a adoção de comportamentos e estilos de vida saudáveis.

• Bancos de Leite Humano: a rede brasileira de Bancos de Leite


Humano, criada em 1998 pelo Ministério da Saúde e pela
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), tem o objetivo de promover a
expansão quantitativa e qualitativa dos bancos de leite humano
no Brasil, mediante integração e construção de parcerias entre
órgãos federais, iniciativa privada e sociedade.

• Projeto Expande: lançado em 2001 pelo Instituto Nacional de Câncer


(Inca) e pelo Ministério da Saúde, sua principal meta é estruturar a
integração da assistência oncológica no Brasil, a fim de obter um
padrão de alta qualidade na cobertura da população (BRASIL, [s.d.]).
170
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

8.4.1 Sistema de saúde suplementar no Brasil

8.4.1.1 Histórico

O Portal da Saúde (2015) fala sobre como se estabeleceu o esquema de saúde suplementar no Brasil.
Coube à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) cumprir a Lei nº 9.656, editada em junho de
1998, e então empregá‑lo.

A ANS iniciou suas atividades por meio da Lei nº 9.961, de 28 de janeiro de 2000, como instância
reguladora de um setor da economia sem padrão de funcionamento. A exceção ficava por conta do seguro
de assistência à saúde e das seguradoras, sob o controle econômico‑financeiro da Superintendência de
Seguros Privados (Susep).

A saúde suplementar passou a conviver com o sistema público, consolidado pelo SUS, nascido a
partir da CF de 1988. Com o SUS, a saúde foi legitimada como um direito da cidadania, assumindo
status de bem público. Muitos autores e sanitaristas dizem que foi criado um sistema de saúde
paralelo no Brasil e que este muitas vezes é um concorrente para o SUS, principalmente no que diz
respeito ao controle social.

Historicamente, o ano de 1923 é tido como o marco do início da Previdência Social no Brasil. A Lei
Eloy Chaves, conforme citado anteriormente, promulgada nesse mesmo ano, criava, “[…] em cada uma
das estradas de ferro existentes no país, uma caixa de aposentadorias e pensões para os respectivos
empregados” (BRASIL, 1923).

Essas caixas funcionavam como fundos geridos e financiados por patrões e empregados que, além
de garantirem aposentadorias e pensões, como destacado em suas denominações, também financiavam
serviços médico‑hospitalares aos trabalhadores e seus dependentes.

Embora esse marco histórico não seja comumente apontado como a origem dos planos de saúde
no Brasil, é difícil não notar a similaridade das antigas caixas com as atuais operadoras da modalidade
de autogestão. De fato, em 1944, o Banco do Brasil constitui sua caixa de aposentadoria e pensão
(Cassi), que é o mais antigo plano de saúde no Brasil ainda em operação.

O sistema de saúde brasileiro seguiu a trajetória de outros países latino‑americanos (México, Chile,
Argentina e Uruguai), desenvolvendo‑se a partir da Previdência Social.

Em meados da década de 1950, planos de saúde comerciais, com clientelas abertas, também nascem
no ABC como planos coletivos empresariais por meio da modalidade da medicina de grupo.

Hoje, o setor brasileiro de planos e seguros de saúde é um dos maiores sistemas privados de
saúde do mundo.

171
Unidade II

8.4.1.2 O papel da ANS

Pietrobon (2008), baseada na obra de Duarte (2001), indica que o sistema de atenção médica
suplementar cresceu a passos largos durante a década de 1980, de tal modo que, em 1989, cobria
22% da população total do país. Somente no período 1987/89 incorporaram‑se a esse subsistema
7.200.000 beneficiários.

Atualmente, o número de usuários registrados na ANS é de aproximadamente 45,9 milhões de


beneficiários – no total de vínculos em planos de assistência médica com ou sem odontologia, e planos
exclusivamente odontológicos (CONASS, 2007).

Alguns autores afirmam que existem atualmente um pouco mais de 2.080 operadoras ativas, ou
seja, com beneficiários, tornando o mercado da saúde suplementar concorrencial. Por outro lado, é
preciso repensar e construir modelos de atenção à saúde sob novas bases para aumentar a eficiência,
por meio da otimização de gastos; ampliar a eficácia, elevando e qualificando os resultados; e aumentar
a efetividade, contribuindo mais para uma melhoria da saúde (SCAFF, 2008).

Desde que o sistema privado de atenção à saúde foi regulamentado, em 1988, com a publicação
da Lei nº 9.656/98 e suas sucessivas alterações, foi necessária a implantação da ANS. Com esta, as
empresas operadoras têm procurado se ajustar e se enquadrar aos padrões e normas estabelecidas,
visando a um equilíbrio financeiro interno e à satisfação de seus usuários e prestadores de serviços.
Essa tarefa não tem sido fácil, tendo em vista os desafios e exigências impostos pela agência reguladora
(PIETROBON, 2008).

A ANS é uma autarquia sob regime especial vinculada ao Ministério da Saúde e responsável pela
regulação, normatização, controle e fiscalização das atividades que garantam a assistência suplementar
à saúde. Tem por finalidade institucional

promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde,


regulando as operadoras setoriais, inclusive quanto às suas relações com
prestadores e consumidores, contribuindo para o desenvolvimento das
ações de saúde (BRASIL, 2000).

A ANS possui maior poder de ação,

autonomia administrativa, financeira e política, em relação ao governo,


expressas por uma arrecadação própria e decisões da Diretoria Colegiada
com poder legal para efetivar suas resoluções. Possui, ainda, competência
de polícia normativa, decisória e sancionatória, que é exercida sobre
qualquer modalidade de produto, serviço e contrato que apresente, além da
garantia de cobertura financeira de riscos de assistência médica, hospitalar
e odontológica, outras características que diferenciem de atividades
exclusivamente econômico‑financeiras (PIETROBON, 2008).

172
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

A ANS está organizada em cinco áreas:

1) Diretoria de Normas e Habilitação das Operadoras: é responsável


pela normatização, registro e monitoramento do funcionamento das
operadoras, inclusive intervenção e liquidação.

2) Diretoria de Normas e Habilitação de Produtos: tem a incumbência


pela normatização, registro e monitoramento dos produtos, inclusive
reajuste de planos individuais e familiares.

3) Diretoria de Fiscalização: deve responder por todo o processo de


fiscalização, aspectos econômico‑financeiros, médicos assistenciais,
apoio ao consumidor e articulação com seus órgãos de defesa.

4) Diretoria de Desenvolvimento Setorial: encarregado pelo sistema de


ressarcimento do SUS e pelo desenvolvimento de instrumentos que
viabilizem a melhoria da qualidade e o aumento da competitividade
do setor.

5) Diretoria de Gestão: responsável pelo gerenciamento de recursos


humanos e financeiros, suprimentos, informática e informação
(PIETROBON; PRADO; CAETANO, 2008).

Os objetivos básicos e as estratégias diferenciadas de implementação da regulamentação nascem


claramente do marco regulatório e evoluem a partir da ampliação do conhecimento sobre o setor de
saúde suplementar.

Segundo Pietrobon (2008), os objetivos da regulamentação podem ser resumidos da seguinte forma:

• assegurar aos consumidores de planos privados de assistência à saúde cobertura assistencial


integral e regular as condições de acesso;

• definir e controlar as condições de ingresso, operação e saída das empresas e entidades que
operam no setor;

• delimitar e implantar mecanismos de garantias assistenciais e financeiras que assegurem a


continuidade da prestação de serviços de assistência à saúde contratados pelos consumidores;

• dar transparência e garantir a integração do setor de saúde suplementar ao SUS e o ressarcimento


dos gastos gerados por usuários de planos privados de assistência à saúde no sistema público;

• estabelecer mecanismos de controle da abusividade de preços;

• definir o sistema de regulamentação, normatização e fiscalização do setor de saúde suplementar.


173
Unidade II

As competências estabelecidas pela Resolução RDC nº 1 da ANS são:

• estabelecer critérios de aferição e controle da qualidade dos serviços


oferecidos pelas operadoras de planos privados de assistência à
saúde, sejam eles próprios, sejam referenciados, sejam contratados,
sejam conveniados;

• expedir normas e padrões para o envio de informações de natureza


econômico‑financeira pelas operadoras, com vistas à homologação
de reajustes e revisões;

• proceder à integração de informações com os bancos de dados do SUS;

• requisitar o fornecimento de quaisquer informações das operadoras de


planos privados de assistência à saúde, bem como da rede prestadora
de serviços a elas credenciados (BRASIL, 1997).

A ANS desenvolve e aprimora inúmeros mecanismos para gerar informações relativas ao setor de
saúde suplementar: a constituição de câmaras técnicas; consultas públicas; disque ANS e portal ANS; e
o acesso por meio dos núcleos regionais. Para as ações de fiscalização, existem dois grandes blocos de
atuações estratégicas: medidas preventivas e os regimes especiais (LIMA, 2005).

As medidas preventivas são os processos de ajuste acordados entre a ANS e as operadoras de planos
de saúde e os planos de recuperação. Os regimes especiais são as direções técnicas e fiscais, que são
processos instaurados pela ANS quando as empresas descumprem os mecanismos de ajuste e realizam
processos de monitoramento das anormalidades administrativas. A ANS desenvolve, ainda, dois projetos
para a fiscalização e instrumentos de transformação de comportamento do mercado de planos de
saúde: Cidadania Ativa e Olho Vivo (CONASS, 2007).

Segundo o Conselho Nacional dos Secretários de Saúde – Conasems – (2007), a instituição da ANS
possibilitou um maior conhecimento do setor e a definição de critérios para a entrada no mercado,
funcionamento e acompanhamento econômico‑financeiro das operadoras de planos e seguros de saúde
(LIMA, 2005).

A fiscalização também pretende impedir que operadoras inescrupulosas desprezem os direitos e os


interesses dos beneficiários e obtenham vantagens a suas custas. O aumento dessa regulação causou
expressiva elevação da visibilidade dos problemas estruturais e dos desequilíbrios existentes no setor da
saúde suplementar.

Essa fiscalização não precisa ser unicamente exercida pela ANS, apesar de sua legitimidade e
competência, e pode ser auxiliada pelos Procons, que possuem atividades estaduais e municipais,
bem como por outros órgãos privados, por exemplo, com as experiências de autorregulação
(PIETROBON, 2008).

174
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Com todo o conteúdo exposto, notamos que o número de beneficiários ultrapassou os 40 milhões,
portanto concluímos que a ANS é uma realidade e uma necessidade no setor no Brasil.

A ANS possui excelentes possibilidades com a criação, verificação e divulgação de indicadores da


qualidade da promoção e dos cuidados integrais da saúde, e a busca pela qualificação das operadoras
de seguros de saúde impulsiona a regulação.

Entretanto, há também a necessidade de que a ANS amplie seu escopo de atuação a todos os
tipos de contratos de planos de saúde, já que fica evidente que há necessidade premente de que a
entidade atue mais diretamente nas relações conturbadas entre as operadoras de planos de saúde,
prestadores de serviços e beneficiários, mediando as tensões e contribuindo ativamente para a
melhoria do sistema de saúde como um todo.

Saiba mais

Para saber mais sobre a ANS, leia:

AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR. Resolução da Diretoria


Colegiada – RDC nº 39, de 30 de outubro de 2000. Dispõe sobre a definição,
a segmentação e a classificação das operadoras de planos de assistência à
saúde. Disponível em: http://www.ans.gov.br/index.php?option=com_legisl
acao&view=legislacao&task=TextoLei&format=raw&id=380. Acesso em:
19 set. 2015.

Exemplo de aplicação

Como um gestor em saúde de um município, você é responsável pela configuração de uma Unidade
de Saúde da Família (USF) para quase 12 mil habitantes. Então, deverá planejar quantas equipes seriam
necessárias para compor e atender à demanda dessa comunidade. Além dessas ações, você deve
responder à seguinte questão: é possível configurar um Nasf nesse território?

Resumo

Discutimos nesta unidade sobre as diferenças conceituais entre saúde


pública e saúde coletiva e discorremos sobre a história e desenvolvimento
das políticas de saúde no Brasil até o momento da criação do SUS. Nesse
processo, fica claro que durante toda a história o Brasil foi um país bem
paternalista, intensificando o processo de “parceria” entre a Saúde Pública
e Seguridade Social.

175
Unidade II

No fim da década de 1970 até meados de 1986, o modelo de saúde


vigente era excludente e “hospitalocêntrico”, pois ele era acessado somente
por uma pequena parcela da população, que era trabalhadora e que tinha
carteira assinada, reafirmando o processo de atrelamento de saúde pública
com o de seguridade social.

Abordamos diversos aspectos do processo saúde‑doença e quais


os fatores que determinam as mudanças e o enfraquecimento desse
processo. Compreendemos que moradia, educação, saneamento básico,
alimentação, cultura, transporte coletivo e acesso aos serviços de saúde
impactam diretamente na prevalência e incidência de doenças. Então,
concluímos que isso pode ser positivo, pois os governantes podem prover
melhores condições de saúde, o que diminuiria a ocorrência de doenças
associadas. Também poderá ser negativo, como no caso do Brasil, onde
ainda se nota que muitas residências não possuem saneamento básico,
o que, portanto, é um grande fator de risco para doenças parasitárias,
mesmo em grandes centros urbanos.

Em 1986, depois de uma Conferência Nacional e por meio de um


movimento de luta pelos sanitaristas e pela população, o SUS é concebido.
Dessa forma, um modelo centralizador e excludente dava espaço a um
modelo universal, equânime e integral. Além disso, possui características
norteadoras para ser hierarquizado, descentralizado, regionalizado,
resolutivo e com permissão de participação popular.

Nesse contexto, o SUS é embasado também na Constituição de 1988, por


meio de leis orgânicas como a 8.080 e a 8.142, sendo que a primeira leva em
consideração a questão da universalidade e responsabiliza o Estado sobre o
fato de prover saúde com ações de promoção, proteção e recuperação. Já a
segunda reafirma o tema democrático de participação popular.

Apresentamos, ainda, que a legislação considera os fatores que


condicionam e determinam questões de vulnerabilidade social, que vão
interferir no processo de saúde‑doença da população.

Esta unidade também destaca o quanto é importante a configuração


da Saúde da Família na redefinição da Atenção Básica como a base do
SUS. Se estiver bem estruturada, alguns autores dizem que a Atenção
Básica pode resolver até 80% dos problemas de saúde da população.
Também reforçamos os aspectos doutrinários do SUS em relação aos
princípios filosóficos como universalidade, equidade e integralidade.
Abordamos, ainda, os princípios que regem o sistema, ou seja, as diretrizes
como regionalização, hierarquização, descentralização/municipalização,
resolutividade e participação popular.
176
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

Um item relevante abordado foi o PNAB (2012), documento em que


estão descritas todas as formas e configurações que as equipes dessas ESF
podem assumir, incluindo o número de pessoas que devem ser adstritas em
cada equipe básica e do Nasf.

Além disso, também apresentamos os principais programas de saúde


do Brasil, que são idealizados e planejados de acordo com as maiores
necessidades de saúde da população do país.

Por fim, foi feita uma breve discussão sobre a ANS no Brasil. Explicamos
o seu papel regulador no que diz respeito à saúde privada no país,
relatando que o Governo Federal é responsável por regular e coordenar
os planos de saúde privados, bem como os procedimentos, consultas e
exames por eles ofertados.

Exercícios

Questão 1. (FCC, 2015) A promoção de saúde foi tema de conferências mundiais (Canadá, 1986;
Austrália, 1988; Suécia, 1991; Colômbia, 1992; México, 2000; Tailândia, 2005; Quênia, 2009), que deram
origem a importantes documentos com compromissos a serem assumidos por todos os países. A Carta
de Ottawa (1986) define a promoção de saúde como o processo de capacitação da comunidade para
atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle
desse processo, e enfatiza que para atingir um estado de completo bem-estar físico, mental e social os
indivíduos e grupos devem saber identificar:

A) Medidas necessárias de aprimoramento da saúde e promover a implementação de projetos


pessoais laborais.

B) Processos saudáveis no âmbito das organizações de trabalho e ingressar nos serviços de saúde de
rede pública.

C) Fatores endógenos e exógenos intervenientes nos processos ambientais e fazer escolhas de


trajetória de vida autônomas.

D) Aspirações, satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio ambiente.

E) Sintomas psicológicos e os métodos de cura, obtendo acesso aos serviços necessários para seu
atendimento em clínicas especializadas.

Resposta correta: alternativa D.

177
Unidade II

Análise das alternativas

A) Alternativa incorreta.

Justificativa: visa à implementação de políticas públicas saudáveis.

B) Alternativa incorreta.

Justificativa: à Carta de Ottawa visa à criação de ambientes saudáveis.

C) Alternativa incorreta.

Justificativa: visa ao desenvolvimento de habilidades individuais e coletivas e reorientação de


serviços de saúde.

D) Alternativa correta.

Justificativa: para atingir um estado de completo bem-estar físico, mental e social, os indivíduos e os
grupos devem saber identificar aspirações, satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio
ambiente. A saúde deve ser vista como um recurso para a vida, e não como objetivo de viver.

E) Alternativa incorreta.

Justificativa: visa à capacitação da comunidade.

Questão 2. (Anvisa 2013) Segundo dispõe a Lei nº 8.080/1990, o orçamento da Seguridade Social
destinará ao Sistema Único de Saúde (SUS), de acordo com a receita estimada, os recursos necessários
à realização de suas finalidades, previstos em proposta elaborada pela sua direção nacional, com a
participação dos órgãos da Previdência Social e da Assistência Social, tendo em vista as metas e prioridades
estabelecidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Porém, na composição do referido orçamento, existe
a possibilidade de contar com recursos denominados por lei como “de outras fontes”. É correto afirmar
que são considerados de outras fontes os recursos provenientes de:

A) Serviços que possam ser prestados sem prejuízo da assistência à saúde; alienações patrimoniais e
rendimentos de capital; rendas eventuais, exceto comerciais e industriais.

B) Ajuda, contribuições, doações e donativos; alienações patrimoniais e rendimentos de capital;


serviços que possam ser prestados em caráter de proteção ao meio ambiente e à saúde.

C) Taxas, multas, emolumentos e preços públicos arrecadados no âmbito imobiliário; alienações


patrimoniais e rendimentos de capital; ajuda, contribuições, doações e donativos.

D) Serviços que possam ser prestados sem prejuízo da assistência à saúde; alienações patrimoniais e
rendimentos de capital; ajuda, contribuições, doações e donativos.
178
EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA

E) Taxas, multas, emolumentos e preços públicos arrecadados no âmbito do Sistema Único de


Saúde (SUS); ajuda, contribuições, doações e donativos; alienações patrimoniais de bens públicos
integrantes do Sistema Único de Saúde (SUS).

Reposta correta: alternativa D.

Análise das alternativas

A) Alternativa incorreta.

Justificativa: serviços que possam ser prestados sem prejuízo da assistência à saúde; alienações
patrimoniais e rendimentos de capital; rendas eventuais, inclusive comerciais e industriais.

B) Alternativa incorreta.

Justificativa: ajuda, contribuições, doações e donativos; alienações patrimoniais e rendimentos de


capital. Não estão incluídos os serviços que possam ser prestados em caráter de proteção ao meio
ambiente e à saúde.

C) Alternativa incorreta.

Justificativa: taxas, multas, emolumentos e preços públicos arrecadados no âmbito do SUS, e não
imobiliário; alienações patrimoniais e rendimentos de capital; ajuda, contribuições, doações e donativos.

D) Alternativa correta.

Justificativa: serviços que possam ser prestados sem prejuízo da assistência à saúde; ajuda,
contribuições, doações e donativos; alienações patrimoniais e rendimentos de capital; taxas, multas,
emolumentos e preços públicos arrecadados no âmbito do SUS; rendas eventuais, inclusive comerciais
e industriais.

E) Alternativa incorreta.

Justificativa: taxas, multas, emolumentos e preços públicos arrecadados no âmbito do Sistema Único
de Saúde (SUS); ajuda, contribuições, doações e donativos; alienações patrimoniais e rendimentos de
capital, e não alienações patrimoniais de bens públicos integrantes do Sistema Único de Saúde (SUS).

179
FIGURAS E ILUSTRAÇÕES

Figura 2

HAY, S. I. et al. The global distribution and population at risk of malaria: past, present, and future.
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em: 25 mar. 2015.

Figura 4

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arterial no Brasil: análise da pesquisa nacional para amostra de domicílios, 1998, 2003 e 2008.
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Figura 8

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REFERÊNCIAS

Textuais

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30 de outubro de 2000. Dispõe sobre a definição, a segmentação e a classificação das operadoras de
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182
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Sites

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www.inca.gov.br

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Exercícios

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provas/NS/UFF-Edital-218-2013-Enfermeiro.pdf. Acesso em: 15 out. 2019.

Unidade I – Questão 2: SERVIÇOS DE CONSULTORIA TÉCNICA AOS MUNICÍPIOS (SERCTAM). Prefeitura


Municipal de Quixadá 2016: Enfermeiro. Questão 36.

Unidade II – Questão 1: FUNDAÇÃO CARLOS CHAGAS (FCC). Tribunal Regional do Trabalho da 3ª


Região. Concurso Público para provimento de cargos de Analista Judiciário – Área Apoio Especializado
2015: Especialidade Psicologia. Conhecimentos Específicos. Questão 36.

Unidade II – Questão 2: CETRO CONCURSOS PÚBLICOS. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Concurso Público 2013: Todo os cargos de Nível Superior. SUS, Políticas de Saúde e Epidemiologia.

196
197
198
199
200
Informações:
www.sepi.unip.br ou 0800 010 9000

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