Você está na página 1de 43

Psicologia Aplicada

à Nutrição
Autora: Profa. Najla Mahmoud Kamel
Colaboradoras: Profa. Mônica Teixeira
Profa. Ronilda Ribeiro
Professora conteudista: Najla Mahmoud Kamel

Graduada em Letras pela Universidade de São Paulo (USP) e em Psicologia pela Universidade Paulista (UNIP).
Mestra e doutora em Psicologia Social pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (Ipusp). Especialista
em Avaliação do Ensino Superior pela Universidade de Brasília (UnB) e em Ensino a Distância pela UNIP. Uma
das autoras do livro Da Cultura de Provas para a Cultura de Avaliação e conteudista dos livros-texto Psicologia
do Consumidor e Psicologia Econômica (EaD/UNIP). Atualmente, é professora titular da UNIP/SP das disciplinas
Psicologia Aplicada à Nutrição; Psicologia do Consumidor; Psicologia Aplicada à Fisioterapia; Psicologia Jurídica;
Estatística Aplicada; Bioestatística; Direitos Humanos; Pesquisa de Mercado; Responsabilidade Social; e Tópicos de
Atuação Profissional.

K15p Kamel, Najla Mahmoud.

Psicologia Aplicada à Nutrição / Najla Mahmoud Kamel - São


Paulo: Editora Sol, 2020.

84 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e


Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230.

1. Distúrbios alimentares. 2. Distúrbios psicossomáticos


3. Deficiência de nutrição. I. Título.

CDU 159.9:613.2

U505.91 – 20

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor

Prof. Fábio Romeu de Carvalho


Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças

Profa. Melânia Dalla Torre


Vice-Reitora de Unidades Universitárias

Prof. Dr. Yugo Okida


Vice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa

Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez


Vice-Reitora de Graduação

Unip Interativa – EaD

Profa. Elisabete Brihy


Prof. Marcello Vannini
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático – EaD

Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Bruno Barros
Jaci Albuquerque de Paula
Sumário
Psicologia Aplicada à Nutrição

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7

Unidade I
1 A PSICOLOGIA COMO CIÊNCIA................................................................................................................... 11
1.1 Psicanálise................................................................................................................................................ 17
1.2 Behaviorismo.......................................................................................................................................... 21
1.3 Gestalt........................................................................................................................................................ 23
1.4 Psicologia cognitiva............................................................................................................................. 25
1.5 Psicologia humanista........................................................................................................................... 28
1.6 Psicologia do desenvolvimento....................................................................................................... 29
1.7 Psicologia social..................................................................................................................................... 30
2 PERSONALIDADE E MOTIVAÇÃO................................................................................................................ 32
2.1 Personalidade.......................................................................................................................................... 32
2.2 Motivação................................................................................................................................................. 33
3 PERCEPÇÃO........................................................................................................................................................ 36
4 COMPORTAMENTOS DIVERGENTES.......................................................................................................... 37
4.1 Neuroses.................................................................................................................................................... 37
4.2 Psicoses...................................................................................................................................................... 39
4.3 Perversões................................................................................................................................................. 40

Unidade II
5 DISTÚRBIOS DA ALIMENTAÇÃO.................................................................................................................. 44
5.1 Anorexia nervosa................................................................................................................................... 46
5.2 Bulimia nervosa..................................................................................................................................... 48
5.3 Vigorexia................................................................................................................................................... 49
5.4 Comer compulsivo................................................................................................................................ 50
5.5 Ortorexia................................................................................................................................................... 51
5.6 Drunkorexia............................................................................................................................................. 51
5.7 Obesidade................................................................................................................................................. 51
6 O ESTRESSE E AS DEFICIÊNCIAS DE NUTRIÇÃO................................................................................... 57
6.1 Estresse...................................................................................................................................................... 57
6.2 Burnout..................................................................................................................................................... 61
6.3 Deficiências de nutrição..................................................................................................................... 63
7 DISTÚRBIOS PSICOSSOMÁTICOS............................................................................................................... 64
7.1 Sistema digestório................................................................................................................................ 64
8 DEPRESSÃO E ALTERAÇÕES ALIMENTARES........................................................................................... 68
APRESENTAÇÃO

Esta disciplina tem como objetivo compreender a importância da psicologia, seus principais conceitos
e como ela se relaciona com a área da nutrição. Vamos entender, por exemplo, como o estudo da
percepção, da personalidade e da afetividade das pessoas (seres psicossociais) determinam a relação
entre o comportamento e as suas consequências. Nesse sentido, serão abordados temas importantes
para o profissional da área de nutrição.

Inicialmente, traçaremos um breve panorama de como a psicologia se desenvolveu como ciência.


Em seguida, serão apresentadas algumas das principais teorias psicológicas destacando alguns de
seus conceitos importantes. Verificaremos também quais são os comportamentos considerados como
divergentes, como as neuroses, as psicoses e as perversões.

Posteriormente, vamos descrever os principais distúrbios alimentares, assim como o conceito de


estresse, as deficiências nutricionais, os distúrbios psicossomáticos e, finalmente, como a depressão
provoca alterações alimentares.

Finalmente, será possível compreender a importância do equilíbrio psicossomático na constituição


do ser saudável.

INTRODUÇÃO

Esta disciplina é importante para as diversas áreas profissionais que são comprometidas com a
alimentação. Entender o comportamento de um paciente proporciona maior segurança na tomada de
decisões tanto do nutricionista como de outros profissionais comprometidos com o profissional da área
da nutrição.

Para Vivilaine Maturana (2010): “o ato de comer, muitas vezes, estava relacionado a diversas questões
do âmbito social, estético e emocional, e como estas áreas se encontram quando o olhar sobre as partes
dá lugar à complexidade do todo” (MATURANA, 2010, p. 219).

Sabe-se que muitos pacientes, quando procuram o nutricionista, relatam o quanto é angustiante
a insatisfação com o seu peso e a frustração relacionada às dietas que lhes foram administradas pelo
profissional da área. Essa frustração decorre do fato de que elas não conseguem seguir, por muito
tempo, as regras determinadas pelas dietas.

Nesse sentido, a psicologia pode auxiliar o nutricionista a entender, por exemplo, o que leva as
pessoas a burlarem as dietas, qual a relação desses pacientes com a alimentação, entender por que
algumas pessoas fazem uso da compensação ou da compulsão. Veremos posteriormente, com mais
detalhes, como essas estratégias se desenvolvem.

A esse respeito, Henrique Carneiro (apud MONTANARI, 2013, p. 10) afirma que:

7
A comida para os seres humanos é sempre cultura [...] nunca apenas pura
natureza. A humanidade adotou como parte essencial de suas técnicas de
sobrevivência os modos de produção, de preparação e de consumo dos
alimentos, desde o conhecimento sobre as plantas comestíveis até o uso
do fogo como principal artifício para transformar o alimento bruto em um
produto cultural, ou seja, em comida. A cozinha, assim, funda a própria civilização.

Montanari (2013), complementa ainda:

Comida é cultura quando consumida, porque o homem, embora podendo


comer de tudo, ou talvez justamente por isso, na verdade não come
qualquer coisa, mas escolhe a própria comida, com critérios ligados tanto às
dimensões econômicas e nutricionais do gesto quanto aos valores simbólicos
de que a própria comida se reveste. Por meio de tais percursos, a comida se
apresenta como elemento decisivo da identidade humana e como um dos
mais eficazes instrumentos para comunicá-la (MONTANARI, 2013, p.16).

Atualmente a alimentação não pode ser entendida apenas como uma forma de nutrir o corpo para a
sobrevivência. Trata-se de um processo complexo que tem relação com diversos fatores como históricos,
familiares, sociais, religiosos e emocionais.

Essas relações que o alimento possibilita são mutáveis, pois vão se desenvolvendo em todas as fases
da vida de uma pessoa. Um exemplo importante é a relação de um bebê com a sua mãe. Durante a
amamentação é possível estabelecer uma relação emocional que, quando bem vivenciada entre a criança
e a mãe, será aprendida e levada por toda a vida.

Existem estudos como a da bióloga Suzana Herculano-Houzel (2003, p. 198) explicando a relação da
alimentação na adolescência: “com o cérebro em franca produção de capas gordurosas para suas fibras
nervosas, não é de se espantar que elas gostem tanto de frituras e manteiga em abundância”.

Além disso o adolescente tem a necessidade de pertencer a um grupo e de ser aceito por ele. Ele
é influenciado pelo chamado grupo de referência. Nesse sentido esse grupo passa a ser um guia de
comportamento para esse adolescente incluindo o tipo de alimento que esse grupo faz uso.

Saiba mais
Como afirmado por Renssen e Villela, o adolescente busca maior
independência e autonomia, arriscando-se em relacionamentos fora da
família. Conheça mais sobre o assunto em:
RENSSEN, C.; VILLELA, N. Contribuições de um grupo terapêutico
sistêmico para pais com filhos na fase da adolescência. Rio de Janeiro:
Instituto de Psiquiatria Ipub/UFRJ, 2007.

8
O tipo de alimento e a forma de se alimentar são contextos repletos de sentidos e emoções que vão
sendo passadas pelas famílias. Quando repetimos essas experiências, relembramos a família e passamos
a nos sentir pertencendo a um grupo e a estarmos dando continuidade a uma tradição.

Leonardo (2009) nos mostra como essa relação entre alimento e tradições aparecem em outras
culturas. Segundo ele, na Espanha os amigos se encontram na praça para dividirem sementes de girassol;
no Paraguai, as reuniões acontecem para tomarem chá; na Itália, as refeições têm durações mais longas
objetivando um maior tempo de contato entre as pessoas do grupo; e na cultura árabe, as mulheres
utilizam a preparação da comida para a confraternização.

Com o contato dessa disciplina, vamos conhecer a um pouco da área da psicologia, seus termos
técnicos e como eles se aplicam no entendimento do comportamento humano e em especial no
comportamento alimentar. Assim, desenvolveremos a capacidade de o aluno perceber na prática
os aspectos psicológicos que determinam, consciente ou inconscientemente, os comportamentos
alimentares adequados e patológicos.

9
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

Unidade I
1 A PSICOLOGIA COMO CIÊNCIA

Figura 1 – Psi, o símbolo da psicologia

A palavra “psicologia” deriva das palavras gregas psique, que significa “alma”, e logia, que significa
“estudo de” entendida inicialmente como a ciência que estuda a alma. Atualmente ela é entendida como
a ciência que estuda o comportamento, os processos psíquicos e as interações socioculturais.

No final do século XIX, a psicologia passa a ser reconhecida como uma ciência que compreende
o comportamento humano, tanto o observável quanto o não observável. Esse desenvolvimento se dá
juntamente com o aparecimento do capitalismo, e nesse novo contexto tanto a visão de mundo quanto
a visão sobre o homem sofreram mudanças significativas, fatores determinantes para o surgimento das
primeiras teorias psicológicas que se limitaram à análise da mente e de seus mecanismos. Inicialmente,
a psicologia se interessou pelo comportamento individual e de suas respostas ao ambiente.

Observação

O conceito de ambiente foi entendido posteriormente pelos psicólogos


como sendo constituído tanto pelo ambiente físico quanto pelo social, ou
seja, incluía outras pessoas.

Quando falamos em estudo do comportamento, é importante destacar o conceito de subjetividade


entendido como o nosso modo de agir, de pensar, os nossos pensamentos e as nossas emoções.

As primeiras escolas psicológicas que surgiram foram:

• Estruturalismo: identificado como o estudo da estrutura consciente da mente e do comportamento,


sobretudo das sensações, tendo como representante Edward Titchener (1867-1927). Ele utilizou

11
Unidade I

como método a introspecção, na qual o indivíduo explora seus próprios pensamentos e sensações
para compreender as experiências sensoriais.

• Funcionalismo: objetivava estudar os processos conscientes, não se limitando apenas a estruturas.


Nessa escola, a mente estaria em constante interação com o meio ambiente.

• Associacionismo: fundada por Edward Thorndike (1874-1949), teórico que elaborou a primeira
teoria de aprendizagem. Ela se dá por meio de associação de ideias.

Outros estudos foram se desenvolvendo após o surgimento da psicologia, determinando diferentes


objetos de estudo. Entre eles podemos destacar a psicopatologia, ciência que estuda os estados mentais
patológicos do ser humano. Esses estados patológicos podem determinar uma predominância de
quadros emocionais disfuncionais que, durante a vida do indivíduo, geram sofrimento psíquico.

Ao fazermos uma comparação com a medicina, por exemplo, destacam-se os estudos dos processos
psíquicos que originam os comportamentos físicos, corporais. Nesse momento surge a chamada área da
psicossomática explicando como a mente pode influenciar o funcionamento do corpo.

Ainda, as questões estudadas pela psicologia estão relacionadas à personalidade, à aprendizagem, à


motivação, à memória, à inteligência, ao funcionamento do sistema nervoso, à comunicação interpessoal,
ao desenvolvimento humano, ao comportamento sexual, à agressividade e ao comportamento grupal,
entre outras.

Portanto, ao observarmos a história da psicologia como ciência, nos deparamos com diversas teorias
psicológicas. Para Bock (2002):

O estudo dos fenômenos psicológicos depende da concepção de ser humano,


adotada por cada escola psicológica. Os fenômenos psicológicos referem-se
a processos que acontecem em nosso mundo interno e que são construídos
durante a nossa vida. São processos contínuos, que nos permitem pensar
e sentir o mundo, nos comportarmos das mais diferentes formas, nos
adaptarmos à realidade e transformá-la. Esses processos constituem a nossa
subjetividade (BOCK, 2002, p. 23).

A psicologia como ciência humana permite conhecermos o ser humano e a forma como ele se
relaciona com o mundo. O psicólogo utiliza em seu trabalho o conhecimento científico e técnico
possibilitando diagnosticar os problemas e, a partir da utilização de técnicas adequadas, fazer uma
interpretação e intervenção adequadas.

Essa ciência dispõe de instrumentos próprios para a obtenção de dados sobre os processos psíquicos,
tais como testes psicológicos e técnicas de entrevista e de observação. Podemos destacar que o
conhecimento das teorias psicológicas permite ao psicólogo determinar um caminho mais adequado
para iniciar seu trabalho junto a seus pacientes, seja ele de caráter individual ou grupal, visando sempre
a promoção da saúde mental do indivíduo.
12
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

É importante levar em consideração que a busca pela saúde mental se dá também no sentido
preventivo e, nesse sentido, o psicólogo também pode criar estratégias que evitem o aparecimento
de doenças, distúrbios de comportamento vendo o homem na sua totalidade: como ser biológico,
sociológico, psicológico e, ao mesmo tempo, inserido em um contexto em que ele interage ativamente.

Por volta de 1930, surge a psicologia social. Essa área estuda de que forma ocorrem as interações
sociais, as manifestações comportamentais decorrentes da interação de uma pessoa com outras
pessoas ou a expectativa resultante dessa interação. Nesse momento, o interesse dos psicólogos
passa a ser a investigação das interações dos indivíduos nos grupos e na sociedade. A partir de então,
muitos aspectos foram investigados, como o efeito das organizações sobre os indivíduos; a relação
dos indivíduos dentro de um mesmo grupo e de grupos diferentes; os diferentes tipos de papéis que
o indivíduo assume quando em ambientes diferentes e funções sociais diferenciadas; a dinâmica
de grupos; as atitudes e preconceitos de grupos; conflitos grupais; obediência; e transformações
sociais. Essas informações foram tão significativas que determinaram um interesse pelas empresas
que passaram a colocar em prática esses conhecimentos.

Um estudo muito interessante foi o de Kurt Lewin (1890-1947), cujo modelo descreve que para
haver uma mudança pessoal ou organizacional é necessário passar por três etapas. A primeira é
o descongelamento.

[...] envolve a preparação, em que se reconhece a necessidade de mudança


e abre-se mão das velhas crenças e atitudes. A mudança ocorre na segunda
etapa, geralmente acompanhada de confusão e agonia motivadas pelo
desmantelamento da antiga mentalidade ou sistema. O terceiro e último
estágio, o “congelamento”, ocorre quando a nova mentalidade se cristaliza
e há uma sensação de conforto e estabilidade ocasionada por essa nova
condição (O LIVRO..., 2012, p. 221).

Para Lewin, essa etapa é a mais difícil, uma vez que geralmente resistimos a mudanças e a alterações
em nossa rotina. Para ele, é importante “criar um ambiente de segurança psicológica durante a etapa de
descongelamento” (O LIVRO..., 2012, p. 221).

Lembrete

Para Kurt Lewin, o indivíduo inserido em uma sociedade não era um ser
passivo, diferentemente do behaviorismo, que considerava que a influência
dos outros era que moldava o indivíduo. Para ele, havia uma interação do
indivíduo com o seu entorno.

Um outro estudo foi o de Solomon Asch, que após suas pesquisas, provou que as pessoas se submetem
ao poder do grupo, adotando uma atitude de conformidade em relação a esse poder. De acordo com o
nosso entendimento em relação ao autor, podemos destacar:

13
Unidade I

• O grupo exerce efeitos sociais profundos em seus membros.

• Um certo grau de conformidade colabora para funções sociais importantes.

• As pessoas sentem-se obrigadas a se adequar para pertencer ao grupo.

• São capazes de fingir ou até convencer a si mesmas que concordam com a maioria.

• A tendência à conformidade pode ser mais forte do que os valores ou percepções básicas das pessoas.

Já Erving Goffman (1922-1982) desenvolveu a teoria do gerenciamento de impressões. Segundo


ele, a vida é uma interpretação dramática construída a partir da interação social, que pode ser
comparada a uma peça de teatro. Nesse sentido, ele explica como mantemos e intensificamos nossas
identidades sociais:

Tal qual os atores, as pessoas tentam criar uma impressão favorável de si


mesmas, definindo roteiro, cenário, figurino, habilidades e adereços. [...] há
o “palco” onde atuam nossas personas públicas e os bastidores, onde se
desenrola nossa vida privada. [...] existe uma plateia que assiste ao espetáculo
(O LIVRO..., 2012, p. 228).

Por sua vez, Robert Zajonc (1923-2008) desenvolve a teoria da familiaridade, que se resume da
seguinte forma: “quanto mais se vê, mais se gosta”. Para ele, as preferências que demonstramos não são
racionais:

A exposição repetida a um estímulo gera familiaridade em relação a


ele. A familiaridade produz uma mudança de atitude em relação ao
estímulo, transformando-a em preferência ou afeição. Essa preferência
é emocional e forma-se em nível subconsciente antes que o indivíduo se
dê conta (O LIVRO..., 2012, p. 232).

Há de se registrar que no âmbito da psicologia social existe um denominador comum, cuja


subjetividade é uma dimensão importante.

A subjetividade hoje permanece massivamente controlada pelos dispositivos


de poder e de saber que colocam as inovações técnicas, científicas e
artísticas a serviço das figuras mais retrógradas da socialidade. E, contudo,
outras modalidades de produção subjetiva – processuais e singularizantes –
são concebíveis. Estas formas alternativas de reapropriação existencial e de
autovalorização podem tornar-se amanhã a razão de vida das coletividades
humanas e dos indivíduos que recusam abandonar-se à entropia mortífera,
característica do período que nós atravessamos (JACQUES, 1998, p. 26).

14
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

Tanto a sociologia quanto a psicologia têm demonstrado interesse no estudo dos pequenos grupos
sociais, pensando o grupo como uma intermediação entre o indivíduo e a massa.

Os estudos dos pequenos grupos sociais, embora sejam realizados por


várias áreas de conhecimentos humano-sociais, são em geral associados
com a sociologia e a psicologia. Na psicologia, o estudo sistemático
dos pequenos grupos sociais, buscando compreender a dinâmica dos
mesmos, tem início na década de 1930 e 1940, com Kurt Lewin. Moreno
[Jacob Levy] inicia com o teatro da espontaneidade que vai levar ao
psicodrama. Na área de pesquisa cria a sociometria para o estudo de relações
de aproximação e afastamento entre as redes de preferência e rejeição,
tanto nos grupos quanto na comunidade como um todo. Lewin cria o termo
“dinâmica de grupo”, que foi utilizado pela primeira vez em 1944. Não podemos
esquecer que a preocupação com grupos, tanto de Moreno quanto de Lewin
aparece em seguida às inovações tayloristas e fordistas que levam à elevação
dos lucros, mas também à deterioração das relações tanto dos operários entre
si quanto em relação a chefias e patrões (JACQUES, 1998, p. 200).

Ainda, para Pedrinho Guareschi:

Mais que identificar cosmovisões gerais de pessoas ou grupos, o que na


verdade cremos ser importante e necessário, é revelar como as pessoas
sofrem e são prejudicadas, na sua vida cotidiana, devido a relações que são
estabelecidas de maneira desigual e injusta. Com isso nosso trabalho poderá
contribuir, de maneira iluminadora e emancipatória, na construção de uma
sociedade economicamente justa, politicamente democrática, culturalmente
plural, eticamente solidária (JACQUES, 1998, p. 101).

Nesse sentido, observa-se que a psicologia percorreu vários caminhos aplicando-se a várias
áreas de conhecimento:

Nossa matéria-prima, portanto, é o humano em todas as suas expressões, as


visíveis (o comportamento) e as invisíveis (os sentimentos), as singulares (porque
somos o que somos) e as genéricas (porque somos todos assim) – é o ser
humano-corpo, ser humano-pensamento, ser humano-afeto, ser humano‑ação
e tudo isso está sintetizado no termo subjetividade (BOCK, 2011, p. 8).

Ainda a esse respeito, Bock nos chama a atenção para duas questões importantes:

Os sujeitos são os responsáveis pela sua subjetividade, mas não o fariam se não
fosse a vida coletiva, as construções coletivas simbólicas que permitem que
toda atividade sobre o mundo exterior tenha seu correspondente subjetivo.
[...] A subjetividade não cessará de se modificar, pois as experiências cotidianas
sempre trarão novos elementos para renová-la (BOCK, 2011, p. 10).
15
Unidade I

Observação

Kurt Lewin é considerado o pai da psicologia social e da psicologia


das organizações. Estudou a interação social e os efeitos da pressão social
no comportamento e as dinâmicas de trabalho nas organizações. Entre
suas obras podemos destacar: Teoria Dinâmica da Personalidade (1935) e
Princípios da Psicologia Topológica (1936).

Figura 2 – Psicologia e nutrição, ciências multidisciplinares

Como visto anteriormente, a psicologia é uma ciência que abrange o estudo dos processos e
comportamentos mentais humanos no geral, não apenas dos comportamentos anormais. Assim, o
relacionamento entre o nutricionista e seu paciente torna-se importante, pois não basta apenas
o profissional ter a técnica. Faz-se necessário conhecer a realidade socioeconômica e cultural do
paciente, levando-se em consideração seus valores, suas crenças, o lugar que ele ocupa na família,
entre outros aspectos.

Portanto, o sucesso no tratamento necessita desse conhecimento, que, se satisfatório, será


importante para o diálogo e a confiança, uma vez que o paciente procura o nutricionista porque algo
não está bem com ele. O desafio para o profissional de saúde é de ter uma relação “terapêutica” com
os pacientes, tentar localizar e esclarecer o problema e ajudar a resolvê-lo. É importante deixar claro
que esse conhecimento, esperado do profissional, irá ajudá-lo, inclusive, a procurar ajuda de outros
profissionais, como por exemplo, do psicólogo.

A comunicação entre nutricionista e paciente deve ser efetiva e útil, ao passo que se deve evitar
responder impulsivamente ou dar conselhos sem pensar. É importante que o profissional mantenha um
certo distanciamento do paciente, ação essa que advém de uma maturidade, experiência e prática, o
que demonstra autoconfiança.

16
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

1.1 Psicanálise

Figura 3 – Freud é conhecido como o fundador da psicanálise

Sigmund Freud, fundador da psicanálise, publicou uma ampla obra durante toda a sua vida,
mostrando suas descobertas e formulando leis sobre a estrutura e funcionamento da psique humana.
Freud foi defensor da existência de processos mentais inconscientes. Para ele, o inconsciente é uma
instância psíquica de emoções e sentimentos reprimidos da consciência. A repressão ocorre devido ao
conteúdo insuportável dessas emoções e desses sentimentos. No entanto, há conteúdos que mesmo
num primeiro momento inconscientes podem passar para a consciência. Alguns exemplos podem ser
destacados como os atos falhos, os sonhos e os lapsos de linguagem. Essa passagem, de acordo com
ele, é favorecida pelo estado emocional do indivíduo, porém de forma disfarçada. De acordo com a sua
teoria, o inconsciente exerce um papel importante na determinação do comportamento do indivíduo.
Isto significa que não somos donos de nossas mentes, somos dominados e até mesmo dirigidos por
processos mentais inconscientes, por desejos, por medos, por conflitos e por fantasias.

O método de investigação utilizado na psicanálise é o método interpretativo, que busca significados


ocultos (conteúdos latentes) do que é manifesto pelo paciente. Isso é possível por meio de ações e
palavras que podem ocorrer por meio dos sonhos, dos delírios e das associações livres.

O psicanalista faz uso da análise como técnica de tratamento visando à cura ou ao autoconhecimento.
Dessa forma, a análise busca a origem do sintoma ou do comportamento manifesto ou latente, ou seja,
do conteúdo não verbalizado com o objetivo de integrar tanto os conteúdos inconscientes quanto
os conscientes.

A interpretação dos conteúdos inconscientes pode ser realizada a partir dos sonhos, dos atos falhos
ou das associações livres. É importante enfatizar que para o psicanalista importa tanto o funcionamento
mental normal como o patológico.

Para a psicanálise nada acontece por acaso, há sempre uma determinada explicação para tudo que
acontece. Muito do que aparece em nossas mentes tem uma relação. Aparentemente são encarados
como desconexos.
17
Unidade I

Freud afirma que os instintos, e em especial os sexuais, são forças que nos levam à ação,
permitem o desenvolvimento humano e por isso são vitais. Trata-se de uma energia que atua
tanto internamente quanto externamente na vida do indivíduo. Para ele, esse processo ocorre desde
a infância e posteriormente, na idade adulta, o desenvolvimento sexual se concretiza. Dessa forma, a
sexualidade nos acompanha desde o nascimento até a morte, tornando-se importante na formação
psíquica humana.

Para ele, o instinto tem quatro componentes: uma fonte, uma finalidade, uma pressão e um
objeto. Na fonte é onde surge uma necessidade. A finalidade é reduzir a necessidade fazendo com
que o organismo se satisfaça. A pressão refere-se à quantidade de energia ou força que é investida
para satisfazer ou gratificar o instinto. Finalmente, o objeto de um instinto é qualquer alternativa de
ação ou expressão.

Vejamos um exemplo aplicando os componentes dos instintos na área da nutrição. Imagine uma
pessoa com fome. Quando o corpo consome energia em qualquer atividade, ele vai precisar de energia,
que em nosso exemplo, seria o alimento. À medida que a necessidade aumenta ela vai se tornar
consciente e será manifesta com o surgimento da fome. Se a fome não for satisfeita, a pressão pode
aumentar para que de alguma forma alivie a fome. Todo esse processo deve acontecer com finalidade
de reduzir a tensão provocada pela fome que vem acompanhada por outras ações, como levantar-se, ir
até a cozinha ou a um restaurante escolher várias opções e comê-las.

Portanto, uma pessoa diante de uma necessidade irá buscar uma atividade para reduzir a tensão
para que o corpo volte ao nível de equilíbrio antes de a necessidade surgir. Esse processo de equilíbrio,
tensão e atividade é denominado por Freud de modelo de tensão-redução.

Para Freud, existem dois grupos de instintos: os instintos de vida e os instintos de morte. Os instintos
de vida objetivam a autopreservação da pessoa; os instintos sexuais (que são os mais conhecidos) e a
preservação da espécie.

Os instintos de morte são os instintos cuja energia é dirigida em um sentido mais destrutivo. Além do
conceito do inconsciente e dos instintos, ele apresenta a estrutura do aparelho psíquico composto pelo
id, ego e superego.

O id é a estrutura onde se localizam os instintos de vida e de morte. suas principais características


são: uma instância sem lógica de organização ou juízo de valor. Constitui-se de conteúdos inconscientes,
que são inatos ou adquiridos e que buscam contínua gratificação sob a predominância do denominado
princípio do prazer.

O ego é a estrutura do aparelho psíquico que está em contato com a realidade externa. Essa
estrutura é guiada pelo princípio da realidade. uma de suas características importantes é que ele
equilibra o id e o superego.

Finalmente temos o superego, que é constituído pelas exigências sociais e culturais adquiridas
pelo indivíduo em seu ambiente social. Nesse sentido, o indivíduo vai introjetando as normas e leis
18
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

sociais que irão constituir uma parte da personalidade. Ele representa a força moral em decorrência
dessa internalização.

Freud também nos trouxe outros conceitos importantes, entre eles destacamos:

• A maior parte de nossos desejos e pensamentos reprimidos estão relacionados a conflitos de


ordem sexual que têm origem na infância.

• É na infância que se estrutura a personalidade e por isso, é uma fase importante.

• Existe uma sexualidade infantil e por isso ele coloca a sexualidade no centro da vida psíquica.

• A libido significa desejo ou anseio. Ela é a energia dos instintos sexuais.

Com a psicanálise Freud explica de que forma é possível o indivíduo diminuir a angústia provocada
pelos conflitos internos. Ele contribui, nesse sentido, mostrando o quanto é importante a utilização dos
mecanismos de defesa. A seguir apresentamos alguns tipos de mecanismos de defesa:

• Deslocamento: os sentimentos relacionados a uma memória são deslocados a um conteúdo


psíquico substituto. Exemplo: uma pessoa, ao lidar com uma situação estressante, pode comer
excessivamente para aliviar a tensão.

• Distração: a atenção é desfocada. Exemplo: assistir a uma aula focando a atenção em outros pensamentos.

• Fantasia: criação de um mundo próprio, imaginário. Exemplo: a pessoa que fantasia o par perfeito.

• Identificação: essencial no processo de desenvolvimento psicossexual, garante a internalização de


comportamentos e o estabelecimento do juízo crítico. Exemplo: o adolescente que se comporta
de acordo com o grupo de amigos.

• Negação da realidade: o indivíduo passa momentaneamente a negar um fato real. Exemplo: a


pessoa que se recusa a acreditar na morte de um amigo.

• Racionalização: a pessoa busca apresentar uma explicação coerente, lógica e moralmente aceita
para um comportamento, uma ideia ou um sentimento. Exemplo: uma pessoa que explica que
não consegue seguir uma dieta devido a sua família.

• Regressão: comum em pessoas que não assumem a responsabilidade ou consequência por seus
atos. Exemplo: o adolescente que se comporta como uma criança quando deseja algo.

• Projeção: qualidades, sentimentos e desejos que são expulsos de si e localizados em outra coisa
ou pessoa. Exemplo: quando uma pessoa se queixa a respeito do comportamento de alguém ou
quando a própria pessoa gostaria de ter tal comportamento.

19
Unidade I

• Idealização: o objeto é engrandecido e exaltado psiquicamente. Exemplo: a pessoa que idealiza a


dieta perfeita.

• Sublimação: mecanismo mais evoluído, implica no desempenho de uma atividade humana que
requer sua energia de pulsão sexual para a realização. Pode ocorrer em criações literárias, artísticas
ou intelectuais.

Com o surgimento da psicanálise outros estudos foram se desenvolvendo. A seguir, algumas


considerações sobre outros teóricos que trouxeram trabalhos relacionados à fase oral, que inicialmente
é explicada por Freud.

De acordo com o estudo de Viviliane Maturana (2010), para entender mais sobre a relação estabelecida
pelo indivíduo com a alimentação, é importante conhecer mais sobre algumas teorias psicológicas que
nos levam a pensar sobre a problemática que envolve o sujeito, sua subjetividade e a alimentação.
A autora coloca em evidência o estudo sobre a fase oral, período que dura de 0 a 2 anos, em que a zona de
erotização do bebê é a boca e o prazer ainda está ligado à ingestão de alimentos e à excitação da mucosa
dos lábios e da cavidade bucal. Para ela, na fase oral existe uma necessidade intensa de gratificação e
satisfação. Assim, desde o nascimento, tais necessidades estão concentradas, predominantemente, em
volta dos lábios, na língua e, um pouco mais tarde, nos dentes.

Porém, a psicanálise não destacou apenas a fase oral, para Fadigman e Frager, segundo Maturana
(2010), a pulsão primária do bebê não é social ou interpessoal, mas funciona apenas para receber
alimento para atenuar as tensões de fome e sede. Enquanto é alimentada, a criança é também
confortada, aninhada, acalentada e acariciada. Então, num primeiro momento, ela associa o prazer à
redução da tensão no processo da alimentação. Dessa forma, a boca seria a primeira área do corpo que
o bebê pode controlar. Para Freud, nessa fase, a maior parte da energia libidinal disponível é direcionada
ou focalizada justamente nessa área. Então, ao longo do crescimento da criança, outras áreas do corpo
desenvolvem-se e tornam-se importantes regiões de gratificação.

Ainda segundo Freud, alguma energia é permanentemente fixada nos meios de gratificação oral
também durante a fase adulta, pois existem muitos hábitos orais bem desenvolvidos e um interesse
contínuo em manter prazeres orais. Comer, chupar, morder, lamber ou beijar com estalo, por exemplo,
são expressões físicas desses interesses. Pessoas que mordicam constantemente, fumantes e os que
costumam comer demais, para Freud, são indivíduos parcialmente fixados na fase oral, e cuja maturação
psicológica pode não ter se completado.

Na mesma linha, Fadigman e Frager salientam que a fase oral tardia, depois do aparecimento
dos dentes, inclui a gratificação dos instintos agressivos, como morder o seio, causando dor à mãe e
levando-a à inibição do ato de amamentar e gerando consequências no futuro:

Essa agressividade do ato de morder, somada à privação do seio, pode, mais


tarde, na fase adulta, desenvolver problemas ligados a essa fase, como por
exemplo, o sarcasmo, o arrancar o alimento de alguém, a fofoca e alguns
outros. Para eles [Fadigman e Frager], a transformação dos interesses em
20
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

prazeres orais não foge à normalidade, porém, o que a torna patológica


seria uma sistematização da gratificação nessa área, isto é, se uma pessoa
for excessivamente dependente de hábitos orais para aliviar a ansiedade
(MATURANA, 2010, p. 219).

Se a gratificação sistemática ligada à oralidade pode ser apresentada como uma patologia, a
compulsão alimentar, os parâmetros de saciedade e de satisfação também podem ser estudados por
esse viés.

1.2 Behaviorismo

Alto-falante
Luzes

Alavanca reativa
Alimentador Grade elétrica

Figura 4 – Skinner e suas experiências com ratos

O behaviorismo, conhecido como teoria do comportamento ou teoria comportamental,


desenvolveu-se no século XIX influenciado pelas ciências biológicas. Essa teoria destacou o
comportamento observável do ser humano mostrando que a introspecção não é essencial para seus
métodos. Há de se destacar dois teóricos importantes: Watson e Skinner.

Essa teoria teve como marco inicial um artigo publicado por Watson em 1913, intitulado”Psychology
as the Behaviorist Views it”. Watson nesse artigo chama a atenção para o objetivo dessa teoria: a
predição e o controle do comportamento.

De acordo com Watson, toda aprendizagem depende do meio externo. Dessa forma, todo
comportamento é condicionado (aprendido) e condicionável.

Para o behaviorismo, como o seu objeto de estudo dizia respeito a um objeto observável e mensurável,
este podia ser reproduzido em diferentes condições e em diferentes sujeitos. Os principais pressupostos
de Watson podem ser resumidos da seguinte maneira:

• O comportamento pode ser analisado por métodos científicos objetivos, pois é composto de
respostas dadas no meio externo.

21
Unidade I

• O comportamento é redutível a processos físico-químicos devido a sua composição: secreções


glandulares e movimentos musculares.

• Existe no comportamento um determinismo de causa e efeito, pois há sempre uma resposta


diante de um estímulo eficaz.

• Os processos conscientes não podem ser cientificamente estudados, pois há dúvidas de sua existência.

• O homem passa a ser estudado como um produto do processo de aprendizagem, que se inicia
desde a infância.

• Os behavioristas, de alguma forma, excluem a motivação de seus estudos, pois acreditam que sua
natureza é essencialmente psicológica.

Com relação a essa questão, veremos posteriormente o surgimento de teorias psicológicas que levam
em consideração o quanto a motivação é importante ao determinar comportamentos. Por exemplo: em um
ambiente de consumo e, ainda, permitindo a continuidade de uma dieta.

Outro teórico behaviorista importante foi Skinner que afirmou que: “O objetivo do behaviorismo
é eliminar todo tipo de coerção, transformando o ambiente e ajustando o que nos controla”
(O LIVRO..., 2012, p. 80).

Skinner dá continuidade às descobertas de Watson mostrando que há dois tipos de comportamentos:


o reflexo (não condicionado, não é aprendido) e o operante (aprendido, há uma resposta devido um
estímulo). Por exemplo: é um comportamento reflexo quando uma pessoa saliva diante de um cheiro
de comida. Uma criança que só come todo o almoço se a mãe o recompensar com um presente é um
comportamento operante.

Dessa forma, podemos dizer que existem comportamentos que podem ser aprendidos e outros não.
A aprendizagem passa a acontecer e a se apresentar pelas consequências comportamentais motivadas
pelas condições ambientais facilitadoras ou que dificultam a aprendizagem, a partir da estrutura
estímulo-resposta.

Outros conceitos importantes também foram destacados por essa teoria. O primeiro deles diz
respeito ao reforço positivo, entendido como uma recompensa. Esse tipo de reforço pode determinar
comportamentos e, com isso, fazer com que as pessoas aprendam e repitam tais ações a partir desse
reforço. Assim, ele possibilita o aumento da probabilidade de ocorrência dos comportamentos e é
definido pelo resultado que produz no comportamento.

Além dele, existe o reforço negativo, porém nele o aumento da ocorrência do comportamento
aparece para que o estímulo aversivo desapareça ou seja prevenido. Ele pode ser observado em dois
momentos: por meio da fuga em que a pessoa realiza um comportamento com o objetivo de terminar
com o evento aversivo (negativo); e pela prevenção, na qual a pessoa emite um comportamento para
evitar a ocorrência de um evento aversivo. Por exemplo, uma pessoa que tem muito medo de trovões
22
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

(evento aversivo). Aqui há duas possibilidades de minimizar esse medo: por meio da fuga, em que a
pessoa ao observar um relâmpago, que normalmente vem antes do trovão, pode se esconder em um
lugar seguro dentro de casa (fuga); ou após ver o relâmpago ela pode tampar os ouvidos para não ouvir
o trovão (prevenção).

Necessário destacar que Skinner construiu seus estudos realizando experimentos com ratos, na
denominada caixa de Skinner. Na primeira experiência, ele fez uso do reforço positivo, no caso utilizando
a água, fazendo com que o rato (que ficou um dia inteiro sem tomar água) aprendesse a pressionar
uma alavanca, que encontrava-se dentro da caixa, permitindo que uma gota de água caia no chão e ele
matasse a sua sede. Na segunda experiência, Skinner apresentou a um outro rato (que não estava com
sede) um estímulo aversivo, no caso um choque no assoalho da caixa, que quando o rato pressionasse
a alavanca, mesmo não estando com sede, permitia que o choque terminasse. Nessa experiência fez-se
o uso do reforço negativo. Observamos que nas duas experiências o comportamento de pressionar a
alavanca aumentou: na primeira o comportamento permitia o aparecimento do reforço positivo (água)
e na segunda, o comportamento permitiu a eliminação do reforço negativo (choque).

O behaviorismo pode, nesse sentido, nos descrever e explicar como os comportamentos relacionados
à nutrição são aprendidos e a partir disso temos a possibilidade de modificá-los.

Lembrete

O princípio de condicionamento e estímulo-resposta da teoria


behaviorista pode ser bastante útil para o nutricionista, uma vez que pode
fazer uso de vários reforços positivos para, de alguma forma, mudar o
comportamento alimentar de seu paciente.

1.3 Gestalt

Figura 5 – Gestalt: relação figura e fundo

Outra teoria psicológica importante é a da gestalt, que explica como percebemos o mundo, a nós
mesmos e os outros. Nesse sentido, os estudiosos dessa linha preocuparam-se em compreender os
processos psicológicos que estavam envolvidos no que denominaram ilusão de ótica. Esse fenômeno,
que ocorre com todos, surge quando o estímulo físico é percebido diferentemente do que uma pessoa
tem dele na realidade. Por exemplo, a percepção dos fotogramas estáticos do cinema. O movimento que
vemos na tela é uma ilusão de ótica causada pela pós-imagem da retina (a imagem demora um pouco
23
Unidade I

para se apagar em nossa retina). E como as imagens vão se sobrepondo na retina, temos a sensação de
movimento, mas o que de fato está na tela é uma fotografia estática (BOCK, 2011).

A gestalt também explica a relação entre figura e fundo. A figura é constituída dos aspectos da
experiência, que são eleitos como dominantes e que se sobressaem em relação ao fundo. Já o fundo é
composto pelas experiências anteriores.

Observação

Figura e fundo podem oscilar de acordo com o que é salientado como


relevante pelo psiquismo na situação.

Diferentemente dos behavioristas, os gestaltistas, quando explicam a relação existente entre


estímulo e resposta, trazem uma informação complementar, a de que entre o estímulo e a resposta
existe a percepção.

Essa teoria nos trouxe contribuições importantes para que possamos compreender o que significa
uma boa percepção, que depende de uma “boa” forma. De acordo com a gestalt, a percepção, para ser
efetiva, necessita levar em consideração certos princípios como: fechamento, simetria e regularidade dos
pontos que compõem qualquer figura. Um outro aspecto importante a salientar é a relação parte‑todo:
“[...] o todo não pode ser entendido simplesmente como um conjunto das partes, mas sempre quando
vemos uma parte, ocorre uma tendência à restauração do equilíbrio da forma” (BOCK, 2011, p. 18).

Alguns pressupostos dessa teoria:

• A análise das partes de um objeto não necessariamente proporciona uma compreensão do todo.

• Se o todo se separa, a forma (gestalt) perde sua identidade.

• O estudo da percepção é o tema central dessa teoria.

• O indivíduo é dotado de emoções e percepções que permitem sua vivência.

O fundador dessa abordagem foi Perls, que publicou o livro Ego, Fome e Agressão.

O autor, nessa época, propõe novos elementos para compor a personalidade humana, como o instinto
de fome, a agressão biológica e a necessidade da gratificação.

Nesse sentido, ele atribui estágios no desenvolvimento do instinto de fome: pré-natal (antes do
nascimento), pré-dental (amamentação), incisivo (morder) e molar (morder e mastigar). Esses estágios
estariam envolvendo a alimentação como nutrição e como relação com o mundo. Perls exemplifica
isso citando a impaciência do indivíduo com a alimentação: para ele muitas pessoas têm o hábito de
engolir a comida como se fosse um líquido, demonstrando, de acordo com o autor, uma personalidade
24
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

impaciente desse indivíduo além de uma má relação com a alimentação.

Saiba mais
Conheça mais sobre Frederick Perls e como a gestalt-terapia foi criada:
MATURANA, V. Reflexões acerca da relação entre a alimentação e o
homem. Revista IGT, v. 7, n. 12, p. 219, 2010. Disponível em: https://www.igt.
psc.br/ojs/include/getdoc.php?id=1573&article=292&mode=pd. Acesso em:
30 mar. 2020.

Para os gestaltistas, o estímulo de um ambiente depende da percepção e da interpretação de


uma pessoa. Por exemplo: a percepção de um alimento (estímulo) que se encontra em uma padaria
diferencia-se de uma pessoa que está com fome em relação a uma pessoa saciada.

Além disso, aliado a essa questão da percepção e da interpretação, existe uma hierarquia de
necessidades. Dependendo do sujeito e do momento, surge uma necessidade dominante, aquela que
de alguma forma precisa ser satisfeita.

Para Perls, essa hierarquia das necessidades está sempre sendo operada pelo indivíduo para que o
organismo restabeleça o equilíbrio procurando vias e meios para isso de acordo com a interação com
o meio.

1.4 Psicologia cognitiva

A psicologia cognitiva estuda a cognição e os processos mentais que estão por detrás do
comportamento, ganhando força pelo avanço da tecnologia. Para Bock (2011, p. 18), “hoje, o que temos
são teorias derivadas dessa vertente pioneira, e ela inspirou, em parte, os estudos do campo cognitivista,
que é de muita importância para a psicologia social”.

Para a psicologia cognitiva, a aprendizagem ocorre por meio da educação, pressuposto baseado
em como as pessoas estabelecem associações entre conceitos, memorizam sequências de conceitos,
resolvem os problemas e têm ideias.

Para os teóricos dessa linha, uma aprendizagem é válida quando possibilita formas eficazes de
comunicação para facilitar as associações entre produtos e serviços. Por exemplo: vamos supor que foi
apresentada uma lista com diversos nomes de alimentos para uma pessoa. Se fosse pedido para que ela
se lembrasse das palavras, observaríamos que as mais lembradas seriam as primeiras e as últimas da lista.
Esse fenômeno é chamado de efeito de posicionamento em série.

Um outro aspecto importante dessa teoria é a aprendizagem por associação em par. Por exemplo, a
criação de marcas que sugerem o uso de determinado produto ou serviço.

25
Unidade I

Os estudos dessa linha teórica da psicologia ocasionaram novos olhares para o entendimento do
cérebro. Os psicólogos passaram a estudar os processos mentais, cognitivos, principalmente os que
estavam relacionados com a memória, a percepção e as emoções:

No começo do século XXI, a psicologia cognitiva continua a ser a abordagem


predominante, com grande impacto nos campos da neurociência, educação
e economia. Sua influência estendeu-se ao debate natureza versus criação,
já que, diante das recentes descobertas nas áreas de genética e neurociência,
psicólogos evolucionistas, como Steven Pinker, defendem que nossos
pensamentos e ações são determinados pela constituição do nosso cérebro
e que, a exemplo de outras características herdadas, estão sujeitos às leis de
seleção natural (O LIVRO..., 2012, p. 159).

Um estudo importante nessa área foi o entendimento da estrutura da memória. Após várias pesquisas,
criou-se o modelo de memória de armazenamento múltiplo, que compreende três sistemas:

• Memória sensorial: compreende os cinco sentidos (visão, audição, paladar, tato e olfato). Nela
ocorre a atenção preliminar em que o estímulo é analisado.

• Memória temporária: em que a informação fica temporariamente armazenada. Estudos mostraram


que ela consegue processar de cinco a sete porções de informações, ou seja, se receber muita
informação parte dela será perdida.

• Memória permanente: em que as informações são armazenadas definitivamente.

Esses e outros estudos na área da psicologia cognitiva foram tão importantes que transformaram o
conceito de inteligência. Anteriormente, éramos avaliados quanto à inteligência por meio do chamado
Quociente de Inteligência (QI). Então, a partir dos estudos do psicólogo Daniel Goleman no livro
Inteligência Emocional, aparece a discussão sobre o conceito de inteligência. Para ele, a obtenção de
nosso sucesso é decorrente da chamada inteligência emocional, que está dividida em cinco áreas
de habilidades:

• autoconhecimento emocional;

• controle emocional;

• automotivação;

• reconhecimento de emoções em outras pessoas;

• habilidade em relacionamentos interpessoais.

Dessa forma, percebe-se que para a pessoa ser classificada como emocionalmente inteligente ela
deve ter uma habilidade tanto de entender outras pessoas (inteligência interpessoal) quanto entender a
si mesmo (inteligência intrapessoal).
26
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

Posteriormente outro psicólogo, Howard Gardner, propôs uma divisão da inteligência em sete competências:

• inteligência verbal ou linguística;

• lógico-matemática;

• cinestésica-corporal (capacidade de usar o próprio corpo);

• espacial;

• musical;

• interpessoal;

• intrapessoal.

A inteligência, portanto, é afetada pelo estado emocional do indivíduo.

Outro estudo importante está relacionado às atitudes. Segundo Daniel Katz (1903-1998), as atitudes
teriam quatro funções básicas:

• Função instrumental ajustativa ou utilitária: é a função que tem como premissa o reforço e a
punição. O indivíduo forma sua atitude em torno da recompensa que poderá obter e da forma pela
qual poderá reduzir a insatisfação. São atitudes que procuram maximizar os ganhos e minimizar
os custos.

• Função ego-defensiva: essa função atende a uma necessidade básica do psiquismo em termos de
proteção do eu. Protege o indivíduo distorcendo a realidade se esta se apresentar incongruente
com sua autoimagem e com seus valores.

• Função de expressão de valores: essa função faz o indivíduo expressar atitudes apropriadas a
seus valores pessoais e seu autoconceito. Dessa expressão o indivíduo obteria uma satisfação em
termos de experimentar um estado de congruência. Uma dona de casa que recusa enlatados, por
exemplo, elogiará um restaurante de comida caseira.

• Função de conhecimento: essa função seria necessária para construir seu universo de forma
organizada, procurando dar significado e organização às percepções. Para tanto, elementos que
são percebidos como inconscientes ou incompletos são reorganizados ou modificados para formar
um todo (GADE, 1998, p. 137-138).

Atualmente, segundo Christiane Gade, nenhuma pesquisa consegue afirmar e constatar que uma
mudança de atitude tenha gerado uma mudança no comportamento. Por isso a autora prefere falar em
possibilidades de mudança:

27
Unidade I

As atitudes parecem ter graus de resistência à mudança e dificuldade


em provocá-la. Esta graduação parece ser determinada pelas características e
componentes da atitude a ser modificada, pela personalidade do indivíduo
e sua relação com o grupo social e pelas técnicas utilizadas. Geralmente é
objetivo de mudança de atitude uma modificação da valência da atitude
existente, tentando transformar uma atitude negativa em positiva ou
vice‑versa. Para uma empresa é interessante que o consumidor passe a
gostar do seu produto e a não gostar do produto concorrente. Este tipo de
mudança desejada é denominado incongruente porque o sinal desejado é
oposto ao sinal existente. Outra forma de mudança de atitude é a tentativa
de aumentar o grau negativo de uma atitude negativa ou o grau positivo de
uma positiva (GADE, 1998, p. 141).

1.5 Psicologia humanista

A psicologia humanista, que traz dois teóricos importantes como Rogers e Maslow, tem como pressupostos:

• ela é centrada na pessoa e não no comportamento;

• prioriza a condição de liberdade do sujeito contra a pretensão determinista;

• visa a compreensão e o bem-estar da pessoa e não o controle;

• psicologia não seria a ciência do comportamento, e sim da pessoa;

• crença nas responsabilidades do indivíduo e na sua capacidade de prever as ações mais apropriadas
para serem utilizadas em sua realidade.

Para Rogers, as pessoas se definem por sua experiência. Segundo o autor, todo indivíduo vive em
um mundo de experiência no qual é o centro. Esse mundo particular, composto de eventos, percepções,
sensações, é denominado campo fenomenal ou campo experiencial e está disponível à consciência e que
pode ou não corresponder à realidade objetiva. Dessa forma, o comportamento humano decorre de um
esforço para satisfazer as necessidades humanas.

De acordo com ele, há três condições vistas como eficazes para o aperfeiçoamento da condição humana:

I – consideração positiva incondicional: a pessoa deve aceitar-se como ela é;

II – empatia: é necessário que o indivíduo se coloque no lugar do outro, com os referenciais do outro
tentando sentir o que ele sente; e

III – congruência: relativa à coerência interna que implica em autoconhecimento, transformação do


humano em um ser autêntico, sem disfarces.

28
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

Portanto, Rogers nos apresenta uma teoria centrada no indivíduo.

Outro nome importante dessa área é Maslow, considerado um dos fundadores dessa linha. Ele
estudou a autorrealização humana que procura suas capacidades que muitas vezes estão inibidas.
Resumidamente, o que seria essa autorrealização:

• fazer de cada escolha uma maneira para o crescimento;

• abrir-se para experiências novas;

• arriscar-se no novo;

• decidir sozinho;

• responsabilizar-se e ser honesto por seus atos;

• compreender que as respostas devem ser procuradas nele mesmo;

• desenvolver suas próprias potencialidades;

• reconhecer suas próprias defesas;

• estar ciente de que a insatisfação é inerente ao ser humano.

Maslow construiu a teoria motivacional intitulada Teoria da Hierarquia das Necessidades, que será
apresentada posteriormente. Para ele, a motivação orienta o comportamento e é a força que está por
trás de nossas necessidades. Mais adiante, explicaremos como é entendida essa teoria.

1.6 Psicologia do desenvolvimento

O principal representante dessa psicologia foi o psicólogo Jean Piaget. Sua teoria, denominada
epistemologia genética, parte do princípio de que existe certa continuidade entre os processos biológicos,
a adaptação ao meio e a inteligência. Para ele, a inteligência é usada pelo indivíduo como uma das
formas de adaptação.

A adaptação seria um equilíbrio entre a assimilação e a acomodação, dois outros conceitos


importantes desenvolvidos por ele. A acomodação corresponde à utilização de algo já existente no
mundo que faria parte de seu próprio funcionamento, e a assimilação seria a modificação de esquemas
com o objetivo de o organismo se ajustar às coisas novas que surgem em sua vida

Ele afirma que as estruturas biológicas, sensoriais e neurológicas, vão amadurecendo à medida que
entram em contato com o meio, resultantes da interação do homem com seu meio ambiente.

29
Unidade I

Segundo Piaget, todas as relações que o indivíduo apresenta com relação ao seu ambiente e ao seu
social vão evoluindo em todas as fases de vida, classificando-as em períodos de desenvolvimento:

• Período sensório-motor (0 a 2 anos): a criança começa, através da percepção e de seus movimentos,


a conhecer o mundo que a cerca através da manipulação de objetos. Inicialmente, apresenta
comportamentos reflexos, como a sucção.

• Período pré-operatório (2 a 7 anos): a criança é egocêntrica, apresentando uma leitura da realidade


parcial. Sua percepção abstrata começa a se desenvolver.

• Período das operações concretas (6 a 12 anos): a lógica da criança começa a se desenvolver


e com isso, ela consegue organizar situações. Porém, ela depende do mundo concreto para
realizar abstrações.

• Período das operações formais (12 anos em diante): nesse período, desenvolve-se a capacidade para
o pensamento abstrato, permitindo um modo mais flexível para pensar e manipular as informações.

De acordo com Bock:

Segundo Piaget, cada período é caracterizado por aquilo que de melhor


o indivíduo consegue fazer nessas faixas etárias. Todos os indivíduos
passam por todas essas fases ou períodos, nessa sequência, porém o início
e o término de cada uma delas dependem das características biológicas do
indivíduo e de fatores educacionais, sociais. Portanto, a divisão nessas faixas
etárias é uma referência, e não uma norma rígida (BOCK, 2002, p. 101).

1.7 Psicologia social

A psicologia também desenvolveu estudos sobre a influência dos grupos nos indivíduos. Observa-se
que um grupo não é simplesmente uma reunião de pessoas que riem ou choram juntas, trata-se de um
agrupamento, um agregado social de indivíduos em constante interação que se aceitam mutuamente
e partilham das mesmas metas.

Independentemente do tipo de ambiente, não é possível desprezar o quanto este influencia o


comportamento. De acordo com Mowen (2003), existem cinco tipos de situações de influência:

• Ambiente físico: aspectos físicos e espaciais concretos do ambiente que envolvem uma atividade
de consumo.

• Ambiente social: efeitos que outras pessoas provocam sobre o consumidor durante uma atividade
de consumo.

• Tempo: efeitos da presença ou ausência do tempo nas atividades de consumo.

30
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

• Definição de tarefa: razões que geram a necessidade de os consumidores comprarem ou


consumirem um produto ou serviço.

• Estados antecedentes: estados psicológicos e de espírito temporários que um consumidor traz


para uma atividade de consumo.

Entre as possibilidades de ação de um grupo, ele também pode influenciar ou decidir um


comportamento. Mowen (2003) nos apresenta alguns tipos de grupos:

• Grupo de referência: grupos cujos valores, normas, atitudes ou crenças são usadas por uma pessoa
como um guia de comportamento.

• Grupo de aspiração: grupo ao qual a pessoa gostaria de pertencer. Se for impossível participar do
grupo, ele se tornará simbólico para ela.

• Grupo de dissociação: grupo ao qual a pessoa não quer se associar.

• Grupo primário: grupo do qual a pessoa faz parte e no qual interage ativamente. Se caracterizam
pela intimidade entre seus membros e pela falta de limites para a discussão de vários assuntos.

• Grupo formal: grupo cuja organização e estrutura são definidas por escrito. Por exemplo, sindicatos
trabalhistas, universidades e grupos estudantis.

• Grupo informal: grupo que não tem estrutura organizacional por escrito. Geralmente são baseados
no fator social, por exemplo, um grupo de amigos que se encontram com frequência para praticar
um esporte, jogar cartas ou fazer festas.

Com relação aos tipos de grupos, Gade (1998) afirma que a família é o mais importante dos
grupos primários e é o primeiro agente da socialização do indivíduo. Para ele, grupo de referência é o grupo
de indivíduos igualmente importante, pois seus julgamentos, preferências, crenças e comportamentos
servem de ponto de referência para a orientação do indivíduo, que passa a se comportar como o grupo.

Finalmente, após uma breve apresentação de algumas áreas da psicologia, podemos concluir
que a psicologia nos traz diferentes explicações de como o comportamento humano se desenvolve.
No entanto, não há escola psicológica mais importante ou melhor do que a outra, pois cada uma delas
trouxe descobertas importantes para o mesmo objeto de estudo, o comportamento humano.

Observação

O mapeamento de decisões inconscientes por meio das técnicas da


neurociência tem conseguido explicar o comportamento que vai além de
apenas uma vontade consciente.

31
Unidade I

2 PERSONALIDADE E MOTIVAÇÃO

2.1 Personalidade

A palavra personalidade apresenta variações de significado. Esse fato ocorre devido às influências
de outras áreas de conhecimento, como a antropologia, a sociologia, a filosofia, a biologia e a genética.
No entanto, geralmente representa um conceito de unidade integrativa do ser humano, uma noção
de totalidade.

No senso comum, a personalidade é usada para se referir à capacidade de uma pessoa de tomar
decisões, a uma característica marcante da pessoa como a timidez ou extroversão, por exemplo, ou,
ainda, a alguém importante ou ilustre, ou se a pessoa é boa ou má.

No entanto, para a psicologia, trata-se de um conjunto de características que diferenciam os


indivíduos, cujos atributos dizem respeito à constituição, ao temperamento, à inteligência, ao caráter e a
um jeito específico de se comportar. Essas características são constantes, esperadas daquela pessoa. Dessa
forma, a pessoa torna-se original, possui particularidades permitindo que as outras pessoas esperem
certos comportamentos desse indivíduo em determinados contextos. São elementos temperamentais
herdados e elementos adquiridos durante o desenvolvimento de uma pessoa em interação com o meio.
Ambos os elementos, ao final, formam o mundo interno psíquico de um indivíduo.

Porém, a personalidade não é um aspecto imutável. Certas características vão evoluindo de acordo
com a organização interna da pessoa.

Basicamente, a maior parte das teorias psicológicas apresentou uma definição para o termo personalidade.
Por exemplo, Freud afirma que a estrutura da personalidade já está formada aos 4 ou 5 anos de idade,
enquanto, para Piaget, ela começa a se formar entre os 8 e 12 anos.

A partir do estudo da personalidade, foi possível detectar que alguns distúrbios podem se relacionar
a ela. Mais adiante mostraremos alguns desses distúrbios.

A seguir, de forma sucinta, destacamos algumas teorias da personalidade:

• Teoria psicodinâmica: considera que as origens da personalidade estão nas motivações e nos
conflitos inconscientes, frequentemente sexuais. Para Freud, o desenvolvimento da personalidade
tem sua base principal na satisfação dos instintos sexuais.
• Teoria humanista: as motivações positivas são importantes para o crescimento e a formação da
personalidade, de acordo com Carl Rogers, seu principal representante.
• Teoria dos traços: as pessoas diferem entre si de acordo com o grau que têm de determinado traço
de personalidade, afirma Gordon Allport.
• Teoria da aprendizagem: de base cognitivo-social, localiza as raízes da personalidade nos modos
como as pessoas pensam, agem e reagem ao ambiente.
32
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

• Teoria do apego: o vínculo da pessoa com o mundo é a primeira relação com o meio. Aqui espera-se
que essa relação tenha sido desenvolvida em base segura, na qual a criança percebe o mundo como
um lugar confiável.

Dessa forma, podemos concluir que, independentemente da teoria da personalidade, nosso


comportamento está baseado na forma como interagimos com outras pessoas, com o ambiente, na
forma como aprendemos e no quanto as nossas experiências passadas nos afetam.

Observação

Gordon Allport é considerado um dos fundadores da psicologia da


personalidade. Para o psicólogo, a personalidade é formada por três tipos
de traços. Os cardinais, ou paixões dominantes, como o altruísmo, não
aparecem em todas as pessoas e as que têm costumam ficar conhecidas
por isso. Os centrais, como a honestidade ou a violência, são os traços que
definem a personalidade na falta dos cardinais. Os secundários, como ficar
nervoso ao ser apresentado a estranhos, são traços que vêm à tona em
situações específicas.

2.2 Motivação

A motivação é a alteração do estado de uma pessoa que a conduz para um comportamento voltado
a um objetivo. A motivação diz respeito à direção, intensidade e persistência de um comportamento ao
longo do tempo. Como afirma Michael Solomon (2002):

Entender a motivação é entender por que os consumidores fazem o que


fazem. Por que algumas pessoas escolhem fazer bungee jumping em
uma ponte [...] enquanto outras passam seu tempo livre jogando xadrez
ou trabalhando no jardim? Seja para matar a sede, acabar com o tédio ou
alcançar uma profunda experiência espiritual, tudo o que fazemos tem uma
razão, mesmo se não pudermos articulá-la (SOLOMON, 2002, p. 95).

A motivação é constituída de várias necessidades, sentimentos e desejos que levam a pessoa a esse
comportamento. Ela surge a partir de um estímulo que a conduz a uma necessidade, que em seguida
leva à motivação. O estímulo pode ser: interno, que vem do próprio indivíduo, como a fome ou o desejo
de viajar; ou externo, que pode vir de uma mensagem de propaganda ou de um comentário.

Reconhecer uma necessidade é perceber a discrepância entre uma condição real e uma condição
desejada. Há dois tipos de necessidades:

• Expressão (hedonista): que se refere ao desejo que se tem de atender aos requisitos sociais, do ego
e estéticos, relacionado à manutenção do conceito de si mesmo.

33
Unidade I

• Utilitária: que se refere ao desejo que se tem de resolver problemas básicos do dia a dia.

Entre as teorias de motivação está a teoria da hierarquia de necessidades de Maslow, como já citado
anteriormente. Para Maslow, as necessidades são ordenadas como se estivessem representadas em uma
pirâmide. As necessidades são:

Realizações
pessoais Criatividade, talento,
desenvolvimento pessoal

Reconhecimento,
Estima status, autoestima

Amor, amizade, família,


Social comunidade

Segurança da família, do
Segurança corpo, da propriedade

Comida, água,
Fisiologia abrigo, sono

Figura 6 – Pirâmide de Maslow

No entanto, a hierarquia de Maslow já sofreu críticas, pois acredita-se que os jovens, ao contrário
dos mais velhos, se concentram mais nas necessidades de realização pessoal do que nas fisiológicas.
Nesse caso, autores como Morris e Maisto (2004) explicam que:

De fato, a dificuldade em satisfazer necessidades básicas pode na verdade


promover a satisfação de necessidades superiores: um casal com dificuldades
financeiras para construir uma família pode acabar se aproximando muito
mais como resultado dessa vivência. A teoria de Maslow nos leva a refletir
sobre diversas situações a respeito das diferenças entre as pessoas, a vontade
e as motivações que impulsionam cada sujeito e o desejo de estar no mais
alto grau da pirâmide ou não, tendo em vista que o que é importante
para um pode não o ser para outro. [...] A importância de se conhecer as
teorias da motivação se justifica porque é importante que os profissionais,
principalmente da área da saúde, entendam os mecanismos que levam a
pessoa a apresentar determinados comportamentos, principalmente quando
necessitam aderir a tratamentos específicos. Algumas vezes, o sujeito
pode apresentar dificuldade na aceitação exatamente por não se sentir
motivado ou não acreditar que aquilo será melhor para ele. É fundamental
que o profissional esteja atento às motivações que levaram a pessoa até
o tratamento. Podemos citar como exemplo a pessoa que segue motivada
para o tratamento porque deseja apenas o alívio da sua dor, visto que

34
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

conviver com ela é insuportável. Nesse caso, assim que ela encontra o alívio,
abandona o tratamento. Assim, a motivação não está baseada na busca da
cura ou da melhora prolongada, pois para isso seria necessário que o sujeito
se sentisse motivado, acreditasse e se lançasse para alcançar seus objetivos.
É sempre importante que, para que o sujeito se sinta motivado, ele entenda
o que está acontecendo, a partir de uma linguagem acessível em que haja
espaço para questionamentos. Caso contrário, não será possível sentir
motivação na pessoa, afinal, como se sentir motivado se o indivíduo não
compreende o que está acontecendo com ele? Portanto, é fundamental que,
quando você for um profissional, procure diagnosticar a motivação do seu
cliente para o tratamento. Use de seus conhecimentos técnicos explicando a
ele todas as etapas e condutas do seu trabalho em uma linguagem que ele
possa entender e na qual sinta-se seguro e motivado (p. 265-266).

Ainda sob a ótica da motivação, a teoria das necessidades aprendidas, de David McClelland, se
destaca pelas quatro necessidades básicas aprendidas que levam à motivação. São elas:

• Motivação de realização: lutar pelo sucesso e solucionar problemas.

• Necessidade de associação: fazer amigos e tornar-se membro de um grupo.

• Necessidade de poder: obter e exercitar o controle sobre outras pessoas. Essa necessidade pode
ser: positiva, resultando no poder persuasivo e inspirador; ou negativa, por meio do desejo de
dominar e obter submissão dos outros.

• Necessidade de exclusividade: desejo de nos percebermos como pessoas diferentes e originais.

Um fator importante, relacionado aos profissionais da área da saúde, é o atendimento de pacientes


doentes. Nesse contexto os aspectos motivacionais devem estar presentes na fase do tratamento, uma
vez que é necessário que a pessoa se sinta envolvida para obter o resultado esperado, tanto da parte do
indivíduo que se submete ao tratamento quanto do profissional. Segundo Lindzey, Hall e Thompson (1977):

Um motivo é qualquer coisa que inicia o comportamento. Há duas classes


de motivos: impulsos (ou necessidades) e incentivos. Os impulsos (drives)
são incitações à ação. Impulsos originados em processos orgânicos internos,
identificáveis, são chamados impulsos não aprendidos ou primários. A fome
é um exemplo. Outros impulsos são adquiridos através da aprendizagem; a
competição é um tipo de impulso aprendido (LINDZEY; HALL; THOMPSON,
1977, p. 328).

Os autores se referem ao que denominaram de teoria da redução dos impulsos.

Outros autores, como Morris e Maisto (2004), afirmam que nossas necessidades corporais, como a
fome, por exemplo, criam um estado de tensão ou estimulação, chamado impulso. Dessa forma, para
35
Unidade I

que o organismo retorne ao equilíbrio ele precisa agir, ou seja, o comportamento será a busca por
comida. Essa teoria classifica os impulsos em duas categorias:

• Impulsos inatos: são os impulsos não aprendidos, chamados também de primários. Eles estão
presentes em todos os seres e garantem a sobrevivência das espécies, inclusive a humana. Exemplos
deles são o sexo, a fome e a sede.

• Impulsos secundários: ao contrário dos anteriores, esses são adquiridos por meio da aprendizagem
e podem mudar de uma pessoa para outra, pois cada indivíduo pode sentir-se motivado a buscar
sua satisfação de diferentes maneiras e de acordo com os estímulos que recebeu. Algumas pessoas
são motivadas a praticar boas ações e outras a ganhar dinheiro, por exemplo.

Outro estudo sobre a motivação é a teoria da ativação, explicada por Morris e Maisto (2004):

A ativação se refere a um estado de alerta. O nível de ativação que ocorre


em um determinado momento se apresenta ao longo de um continuum.
Numa ponta, está o estado de alerta extremo; na outra, está o sono. Às vezes,
o comportamento parece ser motivado pelo desejo de reduzir o estado de
ativação; em outros momentos, parece ser motivado pelo desejo de intensificar
esse mesmo estado. Por exemplo: quando você está cansado, tira um cochilo.
Quando está entediado, vê TV (MORRIS; MAISTO, 2004, p. 263).

Cabe, nesse momento, enfatizar a importância do nutricionista como elemento estimulador para
seu paciente. O seu papel é fundamental para motivá-lo a seguir um determinado tratamento.

3 PERCEPÇÃO

Anteriormente, foi apresentada a teoria da gestalt, mostrando o quanto ela interessou-se em explicar
a percepção. A seguir, tendo como foco a área da nutrição, veremos os seguintes conceitos: imagem
corporal, autoimagem e autoestima. Todos esses aspectos interferem na percepção de uma pessoa.

A imagem corporal é como o nosso corpo se parece para nós mesmos, trata-se da representação
mental dele para nós. A autoimagem é o que pensamos de nós mesmos e parte importante dela é
composta pela imagem corporal.

A imagem de nós mesmos são representações descritivas e avaliativas em torno do “ eu” que
determinarão como nos sentimos sobre nós mesmos. Esse sentimento influenciará nossas ações,
interferindo em nossas experiências de vida, em nossa saúde psíquica, na nossa atitude em relação a
nós mesmos e com as demais pessoas.

A autoimagem não é inata, pois ela se desenvolve e evolui a partir das observações dos outros e da
própria auto-observação. Esse desenvolvimento acontece desde a infância. A criança, a partir de suas
experiências, vai reformulando sua autoimagem no sentido de reforçar alguns aspectos ou substituindo-os
36
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

por outros. Dessa forma, podemos observar que em cada período da vida, a autoimagem apresenta
características específicas.

Observação

Pode haver uma distorção quando a imagem refletida no espelho não é


percebida da mesma maneira pela pessoa que se encontra em frente dele.
Trata-se de uma distorção da autoimagem, fato que ocorre com a pessoa
que tem anorexia nervosa, por exemplo.

Todo corpo apresenta as marcas da história de sua existência. Portanto, quanto mais forem os
estímulos e as possibilidades de novas experiências do recém-nascido, por exemplo, mais completa será
sua formação do esquema corporal.

O mesmo é percebido na fase da adolescência, considerada como o período mais crítico para a
formação da imagem corporal. Nela, as transformações corporais ocorrem de maneira muito rápida e na
maioria das vezes a maturidade psicológica e a mental não acompanham as mudanças físicas. Veremos,
posteriormente, que grande parte dos distúrbios alimentares ocorre na fase da adolescência.

Juntamente com a autoimagem e a imagem corporal, um outro fator importante é a autoestima,


sentimento que a pessoa tem sobre si mesma como um todo. Em todas as pessoas existe um potencial
favorável ou não para o seu desenvolvimento, mostrando que tudo dependerá da relação que a pessoa
tem consigo mesma. Dessa forma, o profissional deve ficar atento ao seu paciente, pois às vezes para
a pessoa o recuperar-se pode representar algo que não condiz com o seu merecimento. Por exemplo, a
autoestima positiva pode funcionar como um sistema imunológico da consciência. Em contrapartida,
o indivíduo com baixa autoestima tende a ser pouco exigente com ele mesmo e com o que recebe das
outras pessoas.

Para a psicologia, o estudo da percepção é de extrema importância, pois o comportamento das


pessoas é baseado na interpretação que fazem da realidade, e não na realidade em si. Desse modo
podemos compreender que a percepção do mundo é diferente para cada pessoa, cada um percebe um
objeto ou uma situação de acordo com os aspectos que considera importantes para si. Um exemplo
disso é o fato de as pessoas terem percepções diferentes mesmo passando pelas mesmas experiências.

As percepções podem ser classificadas como normais se realmente correspondem àquilo que o observador
vê, ouve e sente, contudo, podem ser deficientes se houver ilusões dos sentidos ou mesmo alucinações.

4 COMPORTAMENTOS DIVERGENTES

4.1 Neuroses

Freud, entre as suas contribuições, afirmou que o ser humano é um “animal doente”, pois a civilização
exige sacrifícios que causam conflitos inconscientes. O psicanalista contribuiu para o estudo das doenças
37
Unidade I

mentais, dividindo seu campo de estudo em três estruturas psíquicas: neurose, psicose e parafilias.
Na Classificação Internacional de Doenças (CID 10) elas são descritas entre inúmeras outras.

De acordo com ele, as estruturas psíquicas manifestam o jeito como cada um se posiciona diante da
angústia causada pela civilização.

Saiba mais

Para saber mais sobre as doenças mentais:

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico


de transtornos mentais. Porto Alegre: Artmed, 2003.

A neurose é um termo que se refere a qualquer desequilíbrio mental que causa angústia e ansiedade,
porém, ao contrário da psicose e de algumas outras desordens mentais, não impede ou afeta o
pensamento racional, permitindo, dessa forma, que o indivíduo permaneça a realizar suas atividades.
Segundo a psicanálise, a maioria das pessoas é afetada pela neurose de alguma forma.

As neuroses podem ser classificadas em:

• Neurose obsessiva: geralmente são pessoas que tentam resolver os conflitos internos entre a lei
e o desejo, se defendem do mundo que as angustia por sua imprevisibilidade e contingências, e
que vivem nos limites das normas sociais e do senso comum. O conflito entre a obediência à lei
e o desejo pode levar o sujeito, por exemplo, a apresentar sintomas comportamentais repetitivos
ou a viver paralisado por dúvidas e pelo medo de agir.

• Neurose histérica: pressupõe uma posição da pessoa diante da lei do desejo que questiona sua
legitimidade, que, inconscientemente, quer ser chamada à ordem. Essa pessoa acredita que um
dia vai realizar seu desejo dentro da civilização, que, por ora, lhe nega essa realização. Algumas de
suas características são: insatisfação generalizada, que se manifesta em dores no corpo; rebeldia,
e falta de concentração.

• Neurose de angústia: carrega como principal traço a fobia causada por objetos. Tem sua origem
no mesmo fato que é causa das histerias histérica e obsessiva, ou seja, o desejo sexual infantil
recalcado. No fundo, o que causa a neurose de angústia é o medo de castração, medo da
sexualidade que pode, frequentemente, manifestar-se na adolescência.

A neurose pode ser tratada por diferentes métodos. A psicoterapia pode aliviar os sintomas, assim
como alguns medicamentos que podem melhorar a autoestima do paciente.

38
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

4.2 Psicoses

A psicose é um distúrbio psiquiátrico grave em que o paciente perde contato com a realidade, emite juízos
falsos (delírios), apresenta alucinações (percepções irreais quanto à audição, à visão e ao tato) e distúrbios de
conduta que o impossibilitam do convívio social, além de outras formas excêntricas de comportamento.

As psicoses podem ter várias origens, por exemplo, por lesões cerebrais, tumores cerebrais,
esquizofrenia, tóxicos, álcool, infecções, traumas emocionais etc. Algumas são incuráveis, já outras
apresentam cura completa, mas quase sempre é exigido tratamento à base de remédios e nem sempre é
necessária a internação. Nas psicoses agudas, geralmente as psicoterapias são pouco indicadas.

A seguir, estão apresentadas algumas linhas de estudo sobre as origens das psicoses:

• Modelo sociogênico: a sociedade pela sua complexidade e exigência seria a responsável pelo
enlouquecimento humano.

• Modelo organogênico: a origem da psicose deriva de elementos cerebrais, responsáveis pelas


doenças mentais.

• Modelo psicogênico: a dinâmica psíquica é responsável pela doença.

• Modelo organodinâmico: engloba os requisitos biológicos, psicológicos e sociais. Conhecido como


modelo biopsicossocial, é o mais aceito pela área da psiquiatria.

As psicoses podem ser classificadas em maníaco-depressiva, esquizofrênica e paranoica.

A psicose maníaco-depressiva, também chamada de transtorno bipolar, é aquela em que a pessoa


vive fases alternadas de aparente normalidade, euforia e melancolia. As fases de euforia e de melancolia
são desencadeadas pelo que na psiquiatria se chama de evento. Emoções fortes que não atingem pessoas
neuróticas provocam euforia ou depressão nas pessoas que sofrem desse tipo de psicose. Elas costumam
perder o controle de suas vidas nessa fase.

Já a psicose esquizofrênica é aquela na qual a pessoa apresenta uma fala sem rumo, pois,
devido a uma alteração cerebral, ela passa a ter dificuldade em ter um julgamento correto sobre
a realidade, a produzir pensamentos abstratos e a expressar emoções. Trata-se de uma doença
crônica exigindo tratamento por toda a vida.

Fora dos padrões da normalidade encontra-se também quem sofre de psicose paranoica. Nesse caso, a
pessoa apresenta um quadro não confuso, porém delirante. A pessoa pode ter a ilusão de ser perseguido
ou, ao contrário, apresentar algum delírio de grandeza.

39
Unidade I

4.3 Perversões

Hoje as perversões são entendidas como parafilias, que são transtornos do comportamento sexual que
se caracterizam, em geral, por apresentarem práticas e padrões sexuais particulares, que podem ser lesivos
ao indivíduo e seus parceiros. Cabe salientar que não há uma lista definitiva dos tipos de parafilias, porém
as mais comuns são: o sadismo, o masoquismo, o exibicionismo, o voyeurismo ou o fetichismo.

O sadomasoquismo é entendido como uma excitação e prática sexual que envolve dor, humilhação
e submissão.

O exibicionismo diz respeito à tendência de exposição dos órgãos genitais ou masturbação a


estranhos, para chocar o observador.

O voyerismo é uma compulsão em observar pessoas nuas, mantendo relações sexuais ou despindo-se,
sem que a pessoa observada perceba.

Esses comportamentos divergentes foram brevemente apresentados para que se entenda algumas
de suas características, pois, dependendo do tipo de transtorno, o comportamento alimentar dessas
pessoas pode sofrer alterações significativas. Por exemplo, pessoas que sofrem de neurose obsessiva
podem se tornar obsessivas por determinados alimentos.

Resumo

A psicologia como ciência foi reconhecida no fim do século XIX e


por meio dessa nova visão de mundo de indivíduo surgem importantes
teorias psicológicas.

A psicanálise, fundada por Freud, contribuiu com o conceito da existência


dos processos mentais inconscientes, dos mecanismos de defesa e da estrutura
do aparelho psíquico, composto de três sistemas: o id, ego e superego.

O behaviorismo, ou a teoria comportamental, mostrou que o


comportamento é moldado por reforços positivos e negativos. A partir
de estímulos e respostas é possível determinar duas categorias de
comportamento: o condicionamento operante, em que estariam todos
os comportamentos reflexos, involuntários, ou seja, que independem de
aprendizagem anterior; e o condicionamento clássico, que engloba os
comportamentos aprendidos.

A gestalt, também conhecida como teoria da forma, estuda a percepção


para justificar como percebemos o mundo, a nós mesmos e os outros. Essa
teoria investigou a relação de figura e fundo, além de determinar como
ocorre o fenômeno da ilusão de ótica.
40
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

A psicologia cognitiva mostra como as pessoas estabelecem associações


entre conceitos, memorizam sequências de conceitos, resolvem problemas e
têm ideias. Segundo essa linha, a aprendizagem ocorre por meio da educação.

A psicologia humanista se fundamenta nos pressupostos da


fenomenologia e da filosofia existencial, colocando a pessoa em foco,
não o comportamento. Enfatiza também a condição de liberdade contra a
pretensão determinista.

A psicologia do desenvolvimento, e seu principal representante, Jean


Piaget, traz para a luz o desenvolvimento humano a partir de estágios
bem delimitados.

A psicologia social, por sua vez, apresenta estudos importantes sobre a


influência dos grupos e dos ambientes.

Vimos também dois temas importantes para a área da psicologia


e da nutrição, a personalidade e a motivação. A personalidade
normalmente representa uma noção de unidade integrativa do ser
humano, pressupondo uma ideia de totalidade e a possibilidade de
um indivíduo se diferenciar, ser original e ter particularidades. Já a
motivação é a alteração do estado de uma pessoa, conduzindo-a para
um comportamento voltado para um objeto.

Igualmente importante é o estudo da percepção, que engloba o


entendimento de imagem corporal, autoimagem e autoestima. Tanto na
psicologia como na nutrição seu estudo é necessário porque o comportamento
das pessoas é baseado na interpretação que fazem da realidade, e não
na realidade em si. Assim, determinados distúrbios na percepção podem
ocasionar distúrbios alimentares, por exemplo.

Por fim, identificamos os comportamentos divergentes como: neuroses,


psicoses e perversões, contribuições da psicanálise para o estudo da nutrição
aplicada à psicologia.

Exercícios

Questão 1. John C. Mowen, na obra Comportamento do Consumidor (2003), assinala que o


comportamento de um indivíduo sofre influência dos grupos dos quais ele faz parte, dos que deseja
pertencer ou dos que não deseja.

41
Unidade I

Considere as colunas A e B, apresentadas a seguir, com palavras ou expressões sobre o tema, e


identifique a relação correta entre os elementos.

Quadro 1

A – Tipo de grupo B – Características


1. Grupos geralmente baseados no fator social cuja estrutura organizacional não
I – Grupos de referência é registrada por escrito. Por exemplo, grupos de amigos que se encontram com
frequência para compartilharem tempo e atividades.
2. Grupos cuja organização e estrutura são definidas por escrito. Por exemplo,
II – Grupos de aspiração sindicatos trabalhistas, universidades e grupos estudantis.
3. Grupos aos quais a pessoa pertence e interage ativamente. Nesse grupos há
III – Grupos de dissociação intimidade entre os membros e ausência de limites para o debate de vários assuntos.
IV – Grupos primários 4. Grupos aos quais uma pessoa não quer pertencer.
5. Grupos ao quais a pessoa gostaria de pertencer. Caso sua entrada seja impossível,
V – Grupos formais o grupo se torna algo simbólico para a pessoa.
6. Grupos cujos valores, normas, atitudes ou crenças são adotados por uma pessoa
VI – Grupos informais como guia de comportamento.

Assinale a alternativa correta.

A) I – 5; II – 3; III – 6; IV – 2; V – 1 e VI – 4.
B) I – 6; II – 5; III – 4; IV – 3; V – 2 e VI – 1.
C) I – 1; II – 3; III – 5; IV – 2; V – 4 e VI – 6.
D) I – 2; II – 4; III – 6; IV – 1; V – 3 e VI – 5.
E) I – 6; II – 4; III – 2; IV – 5; V – 3 e VI – 1.

Resposta correta: alternativa B.

Análise da questão

Somente a alternativa B está correta e todas as demais incorretas.

Questão 2. Considere as afirmativas a seguir:

I – Entre os autores mais expressivos da psicologia humanista figuram Carl Rogers, Burrhus. F. Skinner
e Abraham Maslow.

II – Para Carl Rogers, cada pessoa é impulsionada a ser competente e capaz, ou seja, é impulsionada
em direção à autonomia.
III – Para Carl Rogers, assim como para Freud, a conduta humana é causada por ocorrências do
passado, tensões vividas na infância e necessidades que, não tendo sido satisfeitas no passado, voltam
a se manifestar no presente.

42
PSICOLOGIA APLICADA À NUTRIÇÃO

IV – Não é a realidade que provoca o comportamento, mas sim o modo pelo qual ela é percebida
pelo indivíduo.

É correto apenas o que se destaca em:

A) I e II.
B) II e III.
C) I e IV.
D) II e IV.
E) II, III e IV.

Resposta correta: alternativa D.

Análise das afirmativas

I – Afirmativa incorreta.

Justificativa: Carl Rogers (1902-1985) e Abraham Maslow (1908-1970) estão entre os autores
mais expressivos da psicologia humanista. Já Burrhus F. Skinner (1904-1990) é um autor expressivo do
behaviorismo, ou teoria comportamental, desenvolvido no século XIX, influenciado pelas ciências biológicas.

II – Afirmativa correta.
Justificativa: uma das grandes contribuições de Carl Rogers no âmbito da psicologia humanista é a
ideia de que todo indivíduo é impulsionado em direção à autonomia. Assim, um organismo deixado livre
se desenvolve rumo à autonomia.

III – Afirmativa incorreta.


Justificativa: enquanto que para Freud a conduta é causada por ocorrências do passado, para Carl Rogers
é causada por tensões e necessidades do presente, as quais o organismo se esforça para reduzir ou satisfazer.

IV – Afirmativa correta.
Justificativa: cada pessoa tem um modo próprio de perceber e interpretar os eventos cotidianos.
Por isso, é correto afirmar que é impossível perceber a realidade em si, já que, sendo diversos os modos
de percebê-la, os comportamentos são provocados pela percepção que se tem dela e não por ela.

43

Você também pode gostar