Você está na página 1de 55

Botânica – Criptógamas

Autora: Profa. Lucimar Barbosa da Motta


Colaboradoras: Profa. Cristiane Jaciara Furlaneto
Profa. Fernanda Torello de Mello
Profa. Laura Cristina da Cruz Dominciano
Professora conteudista: Lucimar Barbosa da Motta

Lucimar Barbosa da Motta, bióloga formada pela Fundação Educacional Miguel Mofarrej de Ourinhos – SP. Mestre
e doutora pela Universidade de São Paulo. Suas pesquisas na área de botânica abordaram temas de pesquisas, evolução
química, taxonômica e ecológicos de plantas nativas, sistemática molecular e potencial de aproveitamento econômico
de espécies nativas. Atua no ensino do nível superior desde 2012, no curso de graduação de Ciências Biológicas, pela
Universidade Paulista, com atuação nas disciplinas das subáreas da Botânica (Botânica de Criptógamas, Botânica de
Fanerógamas, Fisiologia Vegetal e Botânica Econômica).

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

M921b Motta, Lucimar Barbosa da.

Botânica: criptógamas. / Lucimar Barbosa da Motta. – São


Paulo: Editora Sol, 2015.

112 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e


Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XVII, n. 2-047/15, ISSN 1517-9230.

1. Botânica. 2. Criptógamas. 3. Diversidade biológica. I. Título.

CDU 581

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor

Prof. Fábio Romeu de Carvalho


Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças

Profa. Melânia Dalla Torre


Vice-Reitora de Unidades Universitárias

Prof. Dr. Yugo Okida


Vice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa

Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez


Vice-Reitora de Graduação

Unip Interativa – EaD

Profa. Elisabete Brihy


Prof. Marcelo Souza
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático – EaD

Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Gustavo Guiral
Cristina Z. Fraracio
Sumário
Botânica – Criptógamas

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7

Unidade I
1 INTRODUÇÃO À CIÊNCIA DA DIVERSIDADE BIOLÓGICA.....................................................................9
1.1 Introdução à classificação....................................................................................................................9
1.2 Abordagens históricas das classificações botânicas............................................................... 11
1.3 Abordagem histórica das classificações dos seres vivos....................................................... 14
2 ESTUDOS DOS FUNGOS E LÍQUENS.......................................................................................................... 17
2.1 Introdução................................................................................................................................................ 17
2.2 Características básicas dos fungos................................................................................................. 18
2.3 Classificações dos fungos.................................................................................................................. 23
2.4 Líquens: associação entre algas e fungos................................................................................... 25
3 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DAS MICROALGAS..................................................................................... 29
3.1 Introdução................................................................................................................................................ 29
3.2 Cianobactérias........................................................................................................................................ 32
3.3 Seres euglenoides.................................................................................................................................. 34
3.4 Microalgas criptófitas.......................................................................................................................... 35
3.5 Microalgas haptófitas.......................................................................................................................... 36
3.6 Dinoflagelados........................................................................................................................................ 36
3.7 Algas diatomáceas................................................................................................................................ 38
3.8 Algas crisófitas....................................................................................................................................... 39
4 MACROALGAS: ASPECTOS MORFOLÓGICOS, EVOLUTIVOS E ECONÔMICOS............................ 40
4.1 Introdução................................................................................................................................................ 40
4.2 Algas pardas............................................................................................................................................ 41
4.3 Algas vermelhas..................................................................................................................................... 43
4.4 Algas verdes............................................................................................................................................. 45

Unidade II
5 AS PLANTAS E A CONQUISTA DO AMBIENTE TERRESTRE................................................................ 56
6 PLANTAS TERRESTRES AVASCULARES: BRIÓFITAS............................................................................. 61
Unidade III
7 ORIGEM DAS TRAQUEÓFITAS...................................................................................................................... 74
8 PLANTAS VASCULARES SEM SEMENTES: PTERIDÓFITAS.................................................................. 79
8.1 Introdução................................................................................................................................................ 79
8.2 Aspectos reprodutivos......................................................................................................................... 81
8.3 Aspectos vegetativos........................................................................................................................... 83
8.4 Diversidade e classificação................................................................................................................ 85
8.5 Relevância econômica......................................................................................................................... 90
APRESENTAÇÃO

Esta disciplina, Botânica – Criptógamas, apresenta a morfologia e a taxonomia dos criptógamos


clorofilados e aclorofilados (algas, fungos, líquens, briófitas e pteridófitas) incluídos na classificação
atual de seres vivos. Além disso, outros aspectos referentes a esses grupos serão abordados, tais como
potencial econômico, ecologia, ciclos de vida, chaves de identificação, nomenclatura, métodos de coleta
e preparo de material para herborização. A disciplina envolve o estudo de vários grupos de seres vivos, o
que exige revisão prévia dos princípios de sistemática e sistemas de classificação dos seres vivos.

A disciplina tem o objetivo de reconhecer a importância da sistemática no estudo dos seres vivos,
identificar aspectos morfológicos e taxonômicos de criptógamos e relacioná‑los a seus ciclos de vida,
aprender a manusear chaves de identificação, identificar aspectos relevantes da vida dos seres vivos
estudados e conciliar o estudo dos diferentes grupos de seres vivos com a melhoria da qualidade de vida
humana e a preservação do meio ambiente, pois todos esses aspectos são relevantes para diferentes
campos de atuação de biólogos.

Como material auxiliar para a disciplina, este livro‑texto está estruturado em unidades dedicadas a
introduzir a ciência da diversidade biológica; ao estudo dos fungos e líquens; ao estudo das microalgas;
aos aspectos morfológicos, evolutivos e econômicos das macroalgas. Também estudaremos as plantas,
a conquista do ambiente terrestre e as plantas terrestres avasculares (briófitas). Por fim, trataremos da
origem das traqueófitas e das plantas vasculares sem sementes (pteridófitas).

INTRODUÇÃO

O estudo da botânica de criptógamas trata da biologia e da sistemática de organismos, como as


algas, os fungos, os líquens, as briófitas e as pteridófitas, compreendendo um campo importante de
pesquisas na atuação do biólogo, que lida não apenas com o grupo a ser estudado, mas também com as
relações entre os diferentes grupos.

Tais conhecimentos serão fundamentais para entender como esses grupos fazem parte da natureza
e do nosso dia a dia, bem como para planejar projetos de conservação e de uso sustentável, capacitando
assim o profissional com vistas à sua inserção no mercado de trabalho, com sucesso em diferentes áreas
de atuação com tais organismos como o meio ambiente, a biodiversidade, a biotecnologia, ou até a
aplicação econômica.

7
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

Unidade I
1 INTRODUÇÃO À CIÊNCIA DA DIVERSIDADE BIOLÓGICA

1.1 Introdução à classificação

Você se considera uma pessoa organizada?

Figura 1 – Variação de cores em miçangas

Quando deparamos com uma grande variedade de objetos à nossa volta, somos levados pela tendência
a reunir em grupos aqueles que são semelhantes, isto é, a classificá‑los (figura 1). Classificamos as coisas,
porque isso as torna mais facilmente compreensíveis. As ciências responsáveis por esse aspecto são a
Sistemática e a Taxonomia da diversidade biológica. O estudo de ambas abrange diferentes abordagens:
a Sistemática ocupa‑se da diversidade e das relações de parentesco entre os organismos, já a Taxonomia,
das normas de nomenclatura e classificação dos organismos.

Observação

É possível montar a história evolutiva de um grupo através da organização


de informações sobre a morfologia, a ecologia e as inter‑relações entre
organismos.

Corre‑se frequentemente o risco de confundir os termos “classificação” e “identificação”, mas é


importante compreendê‑los bem.

• A classificação de um organismo consiste em sua delimitação entre os táxons apropriados. Ela é


necessária quando se descobrem espécies novas ou se modifica a classificação das já existentes.
9
Unidade I

• A identificação constitui a verificação do táxon em que o organismo está classificado, ou seja, é


relativa apenas aos organismos já descritos anteriormente.

A unidade de classificação é representada pela espécie, definida como um conjunto de indivíduos


semelhantes entre si, capazes de cruzar e produzir descendentes férteis.

Lembrete

Como se viu anteriormente, no decorrer do texto, a palavra aportuguesada


“táxon” (em latim, “taxon”) flexiona, no plural, como “táxons” (em latim, “taxa”).

As principais categorias taxonômicas, as quais todo ser vivo está submetido, são Reino, Filo, Classe,
Ordem, Família, Gênero e Espécie, mas também há categorias adicionais, como Subclasse, Subfamília,
Secção etc. – estas são próprias apenas a alguns grupos mais complexos.

O estabelecimento das regras de nomenclatura científica é atribuído a Carolus Linnaeus e seus


precursores. Entre as regras, as mais importantes são:

• Todo nome científico deve ser escrito em latim ou latinizado.

• O nome deve ser grifado ou impresso em itálico.

• Toda espécie recebe dois nomes (nomenclatura binominal): o primeiro refere‑se ao gênero e o
segundo, à espécie.

• O gênero deve ser escrito com inicial maiúscula.

• A espécie deve ser escrita com inicial minúscula.

• Quando houver subespécie (variedade), a nomenclatura passa a ser trinominal.

Um táxon é um grupo formado por agrupamentos de organismos, como: Reino Plantae, Filo Lycopodiophyta,
Família Lycopodiaceae, Gênero Lycopodium. Os sistemas de classificação devem conter as categorias taxonômicas
organizadas hierarquicamente, dentro das quais diferentes grupos de organismos devem ser situados.

Algumas regras básicas devem ser observadas em relação ao uso correto da nomenclatura botânica,
para que se universalizem os nomes dados aos diferentes táxons. Os nomes científicos de plantas seguem
o Código Internacional de Nomenclatura Botânica (BICUDO; PRADO, 2007), que é atualizado durante
os Congressos Internacionais de Botânica. Esse código não dispõe apenas sobre plantas terrestres, mas
também protistas, algas e fungos.

Os botânicos taxonomistas contam com muitas ferramentas disponíveis para a identificação de


plantas e a mais importante delas é a chave dicotômica, consistindo em um sistema de classificação cujo
10
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

fim é servir à identificação dos distintos grupos taxonômicos, frequentemente artificiais. Os caracteres
têm de ser claros, menos plásticos e com menos métodos ou materiais para sua identificação.

As chaves são geralmente dicotômicas, podendo ser escritas em formato identado ou pareadas.
Ela oferece uma série de alternativas entre dois caracteres mutuamente excludentes: se o usuário
fizer a escolha correta, será levado ao nome do objeto desconhecido. Também existem chaves
de múltiplos acessos, as quais possuem um número muito maior de caracteres que podem ser
consultados em qualquer ordem. Dessa forma, se alguma estrutura estiver faltando no exemplar,
pode‑se pular esse passo e obter um grupo de poucos nomes que poderão corresponder ao
exemplar em questão.

1.2 Abordagens históricas das classificações botânicas

Os primeiros sistemas de classificação surgiram da necessidade de organizar as informações sobre


a utilidade das plantas e de suas periculosidades; atualmente, levam em consideração as afinidades
evolutivas entre os organismos.

Os primeiros sistemas de classificação foram elaborados na Antiguidade. Seu intuito era informar às
pessoas a utilidade dessas plantas. No período entre 370 e 285 a.C., Theophrastus, considerado pai da
botânica, classificou as plantas em árvores, arbustos, subarbustos e ervas, além de muitos dos nomes
atuais de plantas terem sido batizados por ele.

Posteriormente, outro estudioso relevante, Dioscórides, assumiu a missão de melhorar o serviço


médico do Império Romano. Ele coletou plantas em toda a Europa e escreveu o livro De Materia Medica,
no qual descreveu aproximadamente 700 espécies de plantas medicinais. Essa obra foi uma das mais
estudadas durante muitos anos, por todas as autoridades médicas, entre outros leitores.

San Alberto Magno, em 1193, escreveu De Vegetabilis, também descrevendo detalhadamente muitas
plantas; acredita‑se ter sido ele o primeiro a distinguir monocotiledôneas de dicotiledôneas.

Com o surgimento da imprensa nos séculos XVI e XVII, o interesse e a difusão da botânica aumentaram
bastante a partir das muitas publicações a respeito, principalmente na Alemanha.

Observação

Importa ressaltar que as civilizações chinesas e orientais alcançaram


esse nível de conhecimento em plantas existente na Europa muitos anos
antes desse período, consequentemente, dominaram culturas, como as de
arroz, feijão, laranja, pimenta do reino, entre outras.

No início do século XVI, os herbalistas que se interessavam principalmente pelas características


curativas das plantas descreveram e ilustraram, em minúcia, muitas espécies de plantas.
Caesalpino, Bauhin, Ray e Tournefort são pesquisadores de relevância nos séculos XVI e XVII,
11
Unidade I

durante os quais os sistemas artificiais tiveram o único objetivo de situar convenientemente


uma planta em uma classificação e contribuir para sua identificação, sem preocupação com as
relações de afinidade entre si.

John Ray apresentou um sistema de classificação baseado principalmente nas características de


estruturas reprodutivas. Por se valerem de muitos caracteres, os grupos finais das classificações tendem
a ser naturais, e a maioria deles é reconhecida atualmente.

Linnaeus (figura 2) foi naturalista, escritor e médico sueco (1707 – 1778) interessou‑se
por plantas já na infância. Seu pai, pastor luterano, também gostava de botânica – a ponto
de mudar o nome da família para Linné, em homenagem à árvore da tília (em alemão, linde).
O naturalista é considerado pai da Taxonomia, tal como ela é conhecida atualmente, por ter
criado o sistema binomial de nomenclatura, como vimos. Em suas obras Genera Plantarum e
Species Plantarum, elaborou sistema muito útil para identificação de plantas baseado apenas
em características reprodutivas das plantas, embora as relações naturais entre os grupos não
tenham sido enfatizadas (figura 3).

Figura 2 – Retrato de Carolus Linnaeus, naturalista,


escritor e médico sueco (1707 – 1778)

12
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

Figura 3 – Desenhos esquemáticos das características de seus


órgãos de reprodução (anteras, pistilos e ovários) das plantas estudadas por Linnaeus

No final do século XVIII, muitos botânicos dedicaram‑se à busca de afinidades naturais entre
as plantas, passando a empregar um número de caracteres muito superior ao de Lineu para
atingir esse propósito. Michel Adanson, em sua obra Families des Plantes, dá o mesmo peso a
cada caráter observado, valendo‑se de caracteres morfológicos, químicos, ecológicos e biológicos.
Antoine‑Laurent De Jussieu, em Genera Plantarum, observa que certos caracteres têm maior peso
na classificação. Agustin Pyramus de Candolle baseou‑se no sistema de Jussieu e separou algas de
fungos e briófitas. Mais tarde, seu filho Alphonse de Candolle, em 1844, une pteridófitas a briófitas.
E M. Wilkomm, em 1854, apresenta uma das melhores classificações de sua época, segundo a
qual são divididos os vegetais em criptógamas e fanerógamas; desse modo, ele foi um dos
primeiros a separar gimnospermas de angiospermas, levando em consideração monocotiledôneas
e dicotiledôneas como classes de angiospermas.

Durante a segunda metade do século XIX, o estudo da botânica concentrou‑se na Alemanha. O


sistema adotado para a classificação nela tornou‑se exclusivamente morfológica. August W. Eichler,
em 1839, consolida as ideias de Wilkomm, com a separação entre criptógamas e fanerógamas, além de
outras dicotomias importantes, estabelecendo grupos ancestrais ou derivados.

13
Unidade I

Adolf Engler inspirou‑se em Eichler para a elaboração de um sistema de classificação – Syllabus


der Pflanzenfamilien –, o qual é considerado o primeiro autenticamente filogenético, e é base para a
organização de grandes herbários (considerado o que mais se aproxima do ideal, já que procura agrupar
os táxons conforme a ancestralidade e a descendência, considerando tanto os vegetais atuais quanto os
de outras eras geológicas). No início do século XX, Bessey publicou um sistema filogenético baseado nos
princípios da evolução orgânica e, junto aos seus discípulos, estabeleceu diversas tendências evolutivas
aceitas até a atualidade.

Os sistemas de classificação fenética e numérica, conforme indicado em seu nome, baseados em


similaridades fenéticas independentemente das considerações filogenéticas, supõem grande esforço
para compilar o maior número possível de caracteres, não se conferindo, porém, qualquer peso especial
a algum deles. Dentre esses sistemas, podem ser mencionados Cronquist, em 1968 e 1988, e Takhtajan,
em 1969 e 1996, dentre outros, os quais conquistaram grande aceitação, assim como seguimentos
consideráveis, pois seus sistemas continuam sendo mobilizados por alguns pesquisadores (JUDD, 2009).
As classificações de Cronquist abrangem caracteres histológicos e metabólitos secundários.

Os sistemas filogenéticos, assim como a taxonomia numérica, também objetivam conferir mais
objetividade à construção das classificações. Têm sua origem no trabalho do entomólogo alemão Willi
Hennig. A partir da segunda metade da década de 1970, o número de seguidores e publicações em
cladística cresce. Hoje, o que se conhece como cladística reúne quase todas as tendências derivadas
da prática filogenética. Considera‑se transformação o processo histórico real da evolução. Baseiam‑se
em sinapomorfias para construir grupos monofiléticos, e os demais grupos são arbitrários. Após esse
período, a botânica evoluiu e diversificou muito seus métodos, cativando maior aceitação na comunidade
científica, além de atualmente contar com o auxílio da reconstrução filogenética por meio da sistemática
molecular (JUDD, 2009).

1.3 Abordagem histórica das classificações dos seres vivos

O surgimento dos organismos vivos na Terra é um dos fatos mais intrigantes para nós. Várias são
as hipóteses dessa origem. Entre elas, a mais aceita procede de um cenário proposto por Oparin, em
que o oceano primitivo seria rico em compostos químicos energéticos e que a interação entre eles teria
levado à produção de moléculas complexas autorreplicativas, por exemplo, o RNA, que, eventualmente,
por processos ainda não muito claros, tornaram‑se entidades celulares autorreplicativas. Segundo esse
cenário, os primeiros organismos vivos seriam procariontes heterotróficos, tendo as linhas autotróficas
surgido posteriormente. Os eucariontes teriam sido originados a partir de procariontes com capacidade
de fagocitose e que, ao fagocitar outros procariontes, adquiriram capacidades metabólicas adicionais.
Esses procariontes fagocitados foram simplificando‑se e especializando‑se gradualmente, originando as
organelas das células atuais, além de contribuírem com genes para a formação do núcleo. Essa célula
hospedeira primitiva foi denominada de urcarioto.

Inicialmente, todos os seres vivos eram classificados como plantas ou animais, mas, após a invenção
do microscópio, descobriu‑se um mundo de criaturas unicelulares, impossíveis de serem acomodadas
em um desses dois grandes grupos. Por essa razão, foi criada uma terceira categoria de seres vivos: os
protistas. Cientistas do século XIX já tinham percebido a importância de considerações evolutivas no
14
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

estudo dos seres vivos. A árvore filogenética de Haeckel, em 1866, demonstra essa preocupação em
relacionar os diferentes grupos de seres vivos.

A partir da visão clássica de Haeckel, foi desenvolvido o esquema dos 5 reinos de Whittaker (1969),
modelo dominante até a década de 1980, que propõe a seguinte divisão:

• o Reino Monera abrange seres procariontes, como as algas azuis;

• o Reino Protista, compreende os seres eucariontes unicelulares, como alguns grupos conhecidos
por algas e fungos unicelulares;

• o Reino Plantae engloba os seres eucariontes multicelulares autótrofos fotossintetizantes, como


as algas, as briófitas, as pteridófitas e as plantas com sementes;

• o Reino Fungi contém seres eucariontes multicelulares, com nutrição heterótrofa absortiva, como
os fungos verdadeiros;

• e o Reino Animalia compõe‑se de seres eucariontes multicelulares, com nutrição heterótrofa


ingestiva, como os vertebrados e invertebrados.

Apesar de bem aceita, a proposta de Whittaker passou por inúmeras revisões em função da deficiência
de critérios para a reconstrução filogenética.

A partir da década de 1970, viveu‑se um avanço metodológico de enorme impacto na Biologia: a


possibilidade de sequenciamento de DNA. Em 1983, Woese utilizou o sequenciamento de um gene universal,
que codifica para o RNA da subunidade pequena do ribossomo, para construir uma árvore filogenética
universal. Essa árvore, hoje amplamente aceita, divide os seres vivos em três grandes grupos: os eucariontes
(Eucaria), as eubactérias (Bacteria) e as arqueobactérias (Archaea), sendo os dois últimos procariontes. Essa
divisão ficou firmemente estabelecida como a primeira distinção filogenética. Os eucariontes apresentavam
uma série de características comuns, e os procariontes foram reunidos simplesmente por não manifestá‑las.
Não existia, portanto, qualquer razão lógica para considerar os procariontes um grupo filogeneticamente
coerente. Mas, ao longo dos anos, vingou a proposta dos procariontes como um táxon. Woese demonstrou
que os procariontes não integram um grupo coeso, distinguindo‑os em dois grupos: Bacteria e Archaea.

A hipótese de Woese de classificação dos seres vivos em três domínios primários baseia diversos
estudos que têm sido realizados tentando verificar a relação entre esses domínios. Vários estudos têm
postulado que as arqueobactérias e os eucariontes tiveram um ancestral comum, sendo evolutivamente
mais próximos entre si do que o são das eubactérias. Entretanto é possível que esse cenário venha a ser
estendido depois da expansão de sequências de DNA para um maior número de organismos.

Algumas classificações têm o enfoque nos eucariontes, como a proposta inicialmente por Baldauf (2003).
Ela sugere sete grandes grupos para classificar os eucariotos, a saber: Opistocontes, Amebozoa, Rhizaria,
Archaeplastida, Alveolados, Extramenópilas e Discristados, além de outro grupo dentro de Excavados, o qual
inclui formas amitocondriadas. Essa é a proposta aceita por Raven, Evert e Eichhorn (2014), e também o será
neste livro.
15
Unidade I

Tradicionalmente, empregamos o termo “criptógamas” (do grego, “cripto” = oculto e “gamos” =


união sexuada) de forma genérica para englobar algas, fungos, briófitas e pteridófitas. O termo foi
criado por Linnaeus no século XVIII, para designar os vegetais cuja frutificação não se distinguiria a
olho nu. Embora perdure seu emprego para definir aqueles grupos, ele foi abolido dos sistemas de
classificação atuais, pois engloba organismos bastante diversos sem maiores afinidades filogenéticas.
Em outras palavras, o termo não tem significado taxonômico. A diversidade de organismos estudados
em criptógamas vem à tona, por exemplo, desde o sistema de classificação em que elas foram admitidas,
situando‑se justamente em diversos grupos distintos, sem grau de parentesco.

Diante disso, portanto, das criptógamas, abordaremos o estudo dos seres inclusos nos domínios
procarióticos e eucarióticos.

• Entre os procarióticos, estudaremos as cianobactérias, conhecidas como algas azuis.

• No domínio dos eucarióticos, que implica vários grupos, debruçaremo‑nos sobre os fungos
verdadeiros (Reino Fungi), as algas consideradas protistas fotossintetizantes (Reino Protista) e
também as algas correlacionadas com as plantas (algas vermelhas e verdes). Do Reino Plantae,
também serão tratadas as plantas terrestres avasculares, conhecidas como briófitas, e as plantas
vasculares sem sementes, conhecidas como pteridófitas.

Lembrete

Reiteramos que as classificações aqui adotadas tiveram base e foram


adaptadas das propostas de nosso contemporâneo, Peter Hamilton Raven,
um botânico de relevo, nascido na China, mas cuja nacionalidade é
estadunidense, tendo sido diretor da Missouri Botanical Garden por 40 anos.

Saiba mais
Você já ouviu falar no achado que mudou a árvore da vida?
Apesar de toda a oposição a elas, quando de sua exposição, as ideias de
Woese têm prevalecido. Atualmente, pouco se discorda de que bactérias
e arqueias constituam linhagens distintas, não podendo ser mantidas no
mesmo grupo taxonômico, portanto.
Para ler na íntegra o artigo‑homenagem, escrito em memória de Carl R.
Woese, consultar:
COSTA, F. A. P. L. O senhor das arqueias. Observatório da Imprensa, ed.
732, 5 fev. 2013. Disponível em: <http://www.observatoriodaimprensa.com.
br/news/view/_ed732_o_senhor_das_arqueias>. Acesso em: 6 abr. 2015.

16
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

2 ESTUDOS DOS FUNGOS E LÍQUENS

2.1 Introdução

Você sabia que poucas pessoas têm consciência da importância dos fungos em nosso dia a dia?
Basta lembrar que a micologia, a ciência que estuda os fungos, tem ramificações, aplicações e disciplinas
em biotecnologia, medicina, veterinária, zootecnia, agronomia, bioquímica, genética, entre outras.
Estima‑se que cerca de 70.000 espécies foram descritas até o momento, contudo especula‑se que esse
número representa apenas cerca de 5% das espécies existentes de um total de 1,5 milhões de espécies.
Essa afirmação demonstra o quanto o grupo é pouco conhecido e pode representar uma vasta linha de
pesquisa para os futuros biólogos.

Figura 4 – Fotografia do aspecto geral do cogumelo shimeji‑preto (Pleurotus ostreatus)

Cogumelos (figura 4), bolores, leveduras, ferrugens, carvões, entre outros organismos
tradicionalmente considerados fungos são muito diversificados, embora, em muitos casos, pouco
relacionados evolutivamente. Em virtude disso, sua posição entre os seres vivos tem sido polemizada e
continuamente reclassificada. A despeito de serem distintos de plantas e animais, têm sido estudados
em disciplinas de Botânica.

A origem dos fungos vem sendo discutida em alguns estudos, que apontam que eles sofreram um
processo de irradiação há cerca de 1 bilhão de anos, como um grupo independente dos animais. As
evidências fósseis são relativamente pobres, se comparadas a outros grupos, e indicam sua presença no
Proterozoico (900 – 570 milhões de anos). Sua diversidade aumentou durante a Era Paleozoica, com a
presença de todos os grupos atuais.

17
Unidade I

2.2 Características básicas dos fungos

Algumas características básicas dos fungos chamam a atenção, como seu tipo de nutrição. Eles
são heterotróficos, necessitando de fontes de carbono fixadas por outros organismos, vivos ou mortos,
vegetais, animais ou mesmo outros fungos. Manifestam pigmentos responsáveis pelas cores variadas
que apresentam, mas nenhum capaz de absorver energia para síntese de carboidratos a partir do
CO2, como o que acontece com as plantas no processo de fotossíntese. Tal como os animais, têm a
habilidade de transportar enzimas que quebram matéria orgânica (polímeros), as quais são absorvidas
para a nutrição.

Podem ser classificados como fungos sapróbios, quando dependem de matéria orgânica morta, ou
biotróficos, quando de matéria viva.

Um exemplo de fungos sapróbios são os fungos decompositores de matéria orgânica morta


(decompositores primários), vivendo em diferentes tipos de substratos, como solo, folhas e até animais
mortos, desempenhando um importante papel nos processos ecológicos.

Já os fungos biotróficos vivem em associações simbiônticas com organismos vivos, como as


algas, plantas terrestres e animais. Um exemplo pode ser extraído da associação conhecida como
micorriza, na qual as hifas dos fungos invadem as raízes de plantas, trocando substâncias entre os
organismos: a planta fornece carboidratos (sacarose), enquanto os fungos cedem água e nutrientes,
beneficiando a planta.

Estima‑se que 80% das plantas formam associações do tipo micorriza – o que é suficiente
para demonstrar sua importância na natureza e para o homem. São expressões disso, por
exemplo, as orquídeas, que, invariavelmente, são invadidas por fungos associados, assim como os
formigueiros conhecidos popularmente por sauveiros ou formigas cortadeiras: as formigas saúva
não se alimentam das folhas que coletam, pois são incapazes de digerir a celulose. As folhas são
usadas para alimentar os fungos cultivados no interior dos sauveiros que são ingeridos pelas
formigas. Esses fungos biotróficos formam associações simbiônticas (parasitismo, comensalismo
e mutualismo).

Além dos dois grupos, ainda existe um terceiro, que pode ser considerado predador.

Vimos que uma fonte de matéria orgânica é essencial à nutrição dos fungos, mas eles dependem
também de água em estado líquido, tanto para seu crescimento quanto seu desenvolvimento – o que é
essencial para todo processo vital.

Quanto à respiração dos fungos, a maioria também depende do oxigênio para a respiração, portanto,
são predominantemente seres aeróbios. Outra grande parte dos fungos, entretanto, são seres anaeróbios
facultativos, isto é, aqueles que respiram na presença de oxigênio e fermentam em sua ausência.

Alguns fungos são extremamente adaptados às condições ambientais: há os que sobrevivem em


temperaturas extremas, como a do nitrogênio líquido: 195°C negativos.
18
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

A grande maioria dos fungos apresenta crescimento adequado entre 20 e 30°C. O pH ligeiramente
ácido, próximo a 6, é o ideal para a grande maioria dos fungos, diferindo das bactérias, que crescem
melhor em pH alcalino.

Os fungos proliferam nos mais variados ambientes: desde aquáticos, marinhos e de águas continentais
aos terrestres. Esporos resistentes são muito comuns no ar, dispersando‑se facilmente nesse meio. A
diversidade da maioria dos grupos de fungos é maior em regiões tropicais – estudos mostram que as
condições ambientais estão ligadas a essa diversidade.

Cogumelo (Talo)

Hifas

Micélio

Figura 5 – Desenho esquemático com representação do cogumelo (talo) e o conjunto de hifas (o micélio)

Quanto à morfologia, os fungos podem apresentar bastante variação: desde unicelulares a pequenas
colônias ou indivíduos pluricelulares. As células fúngicas agrupam‑se em filamentos, podendo ou não
apresentar septos entre elas, porém, mesmo quando presentes, as funções metabólicas ocorrem sem
impedimentos entre as células. Esses filamentos celulares são denominados hifas e o agrupamento
intenso de hifas ramificadas constitui o micélio. É importante salientar que micélios fúngicos nunca
constituem tecidos. Os cogumelos comumente são caracterizados por corpos (talo) não móveis,
construídos de filamentos alongados microscópicos: as hifas (figura 5).

Observadas em maior detalhe, as hifas são muito simples, notando‑se seu contorno, representado
pela parede celular e seu citoplasma. Podem ser septadas (divididas) ou cenocíticas (figura 6).

As hifas septadas podem apresentar, ao microscópio eletrônico, septo completo, com poro simples
ou poro dolíporo (com espessamento).

19
Unidade I

A hifa cenocítica não apresenta divisões (septo).

Hifas septada Hifas cenocítica

Figura 6 – Desenho esquemático com representação das hifas cenocítica e septada

A composição da parede celular pode revelar‑se quimicamente muito complexa, sobressaindo a


quitina como componente importante. Mas a quitina não está presente em todos os tipos de fungos:
as leveduras, por exemplo, produzem quantidades reduzidas de quitina na parede celular. Outras poucas
espécies, como o grupo de fungos aquáticos, os Chytridiomycetes, não apresentam parede celular. Vale
lembrar que a celulose é um componente da parede celular característico das plantas, mas a quitina é um
componente do exoesqueleto de artrópodes; a presença dessa característica compartilhada evidencia
uma proximidade evolutiva dos fungos com os animais.

Outra característica dos fungos compartilhada com animais é o glicogênio, que representa a principal
substância de reserva dos fungos e dos animais. O glicogênio, bem como o amido, é polissacarídeo
constituído por uma cadeia de monômeros de glicose (um tipo de açúcar).

Quanto à reprodução, os fungos podem apresentar tanto reprodução assexual, aquela que envolve
apenas divisões celulares do tipo mitoses, quanto reprodução sexual, a resultante da união de micélios
ou plasmogamia, com posterior fusão de núcleos ou cariogamia, seguido de sucessivas divisões do tipo
meiose.

Nos fungos, a reprodução assexual é mais comum para multiplicação e dispersão. Ela tem, como
principais função e importância, a troca de material genético e a consequente diversidade genética.
Por meio da reprodução assexuada, várias gerações são produzidas no intervalo de um ano, porém
a reprodução sexuada ocorre, comumente, em uma única época do ano, porque exige condições
ambientais específicas.

A reprodução assexuada pode ser classificada em dois tipos:

• reprodução vegetativa: sem formação de células especializadas e

• reprodução espórica: com formação de células especializadas, ou seja, esporos.

20
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

Um exemplo de reprodução vegetativa nos fungos é o processo brotamento que acontece na


reprodução do Saccharomyces cerevisiae, o fungo do tipo levedura empregado na produção de pão e
cerveja. Na reprodução espórica, os esporos formados na reprodução assexual são derivados da mitose,
sendo muito variáveis, móveis, por meio de um ou dois flagelos, ou imóveis. Na reprodução assexuada, os
esporos são produzidos em grande número, sendo facilmente dispersos pelo ar e resistentes a condições
ambientais extremas, como os fungos patógenos das culturas de plantas, que são especialmente
adaptadas a esse meio de dispersão.

Já a reprodução sexuada, também conhecida como gamética, envolve:

• a isogamia – caso em que os gametas masculino e feminino são morfológica e fisiologicamente


idênticos; e

• a heterogamia, que pode ser do tipo anisogamia – caso em que os gametas são diferentes
no aspecto morfológico, sendo o feminino maior que o masculino, porém ambos móveis –
ou ainda pode ser do tipo oogamia, isto é, gametas com as duas diferenças: a morfológica
e a fisiológica.

Ao final do processo, de todo modo, resultará, sempre, a formação de esporos derivados da meiose.

Os fungos são de extrema relevância para a sobrevivência dos ecossistemas e do homem.


Ecologicamente, são importantes por causa dos seres decompositores e das associações do tipo
micorriza, que são fundamentais para o funcionamento dos ecossistemas, cumprindo o papel de
decompositores primários da matéria orgânica e assumindo a responsabilidade pela reciclagem de
nutrientes, ou seja, pela decomposição de matéria orgânica animal e vegetal e liberação de nitrogênio,
fósforo, potássio, enxofre, ferro, cálcio, magnésio, zinco etc. Liberam para a atmosfera também o
CO2 aproveitado na fotossíntese. Como decompositores, podem representar prejuízos para o homem,
causando o apodrecimento de alimentos.

Já outros fungos despertam enorme consideração nos agricultores não por seus benefícios, mas, ao
contrário, por enormes prejuízos causados pelas pragas das plantas cultivadas.

Os fungos são os mais importantes patógenos das plantas, como as ferrugens do café, da
cana‑de‑açúcar, do milho, do trigo, pragas da batata e muitas hortaliças, os carvões etc. São empregados
fungicidas no combate ao problema. Os fungos são considerados problemas quando afetam seres
humanos ou animais, por exemplo com infecções mortais para o homem, como a pneumonia, provocada
pelo fungo Pneumocystis, e a candidíase, causada pelo fungo Candida albicans.

Muitas vezes, a simples presença de esporos no ar pode ser a causa de alergias no homem e em
outros animais. Alguns fungos produzem em seu metabolismo toxinas conhecidas como aflatoxinas,
que podem chegar a contaminar cereais mal estocados, estes podem transmitir tais toxinas para aves e
mamíferos domésticos via consumo ou contaminar diretamente o homem, podendo causar distúrbios
digestivos ou tumores no homem, assim como levar à morte animais domésticos.

21
Unidade I

Vários fungos têm importância direta na alimentação humana e em processos industriais. Muitos
fungos podem ser consumidos diretamente, sendo muito nutritivos, como os cogumelos champignon
de Paris (figura 7), shimeji e shiitake (figura 8), dentre outros.

Figura 7 – Fotografia do aspecto geral do cogumelo champignon de Paris (Agaricus bisporus)

Figura 8 – Fotografia do aspecto geral do cogumelo shitake (Lentinula edodes)

No Brasil, ainda são consumidos em pequena escala, ao contrário da Europa e do Japão. O fungo
Saccharomyces cerevisiae, conhecido popularmente como fermento de pão, tem sido considerado
a espécie domesticada mais importante para o homem. Esse fungo é envolvido nos processos
fermentativos responsáveis pela fabricação e pela produção de álcool etílico, cerveja, vinho, bem
como em processamento e aromatização de pão. Outros fungos estão implicados na produção
industrial de glicerina, vitaminas, ácidos orgânicos, enzima etc. A fabricação e a aromatização
de certos tipos de queijos, como os tipos camembert, roquefort e gorgonzola, são mediados por
Penicillium roqueforttii.

Os fungos são de grande importância para o homem na produção de antibióticos, como o fungo
Penicillium chrysogenum (figura 9), do qual é obtida a penicilina.
22
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

Figura 9 – Fotomicrografia do aspecto geral do fungo Penicillium chrysogenum

2.3 Classificações dos fungos

Historicamente, houve muitas controvérsias e dificuldades em delimitar os fungos como um


grupo, por conta das inclusões e exclusões muito frequentes no último século. Em anos recentes,
os esforços dos taxonomistas na direção de uma definição filogenética baseada, sobretudo, em
similaridades de sequências relevantes de DNA, aliadas à morfologia e a aspectos fisiológicos,
como produção de açúcares e outros compostos, agregaram informações importantes para a
delimitação do grupo.

Whittaker (1969) propôs a classificação dos fungos em um reino à parte, exclusivo para
organismos eucarióticos, com modo de nutrição por absorção, os quais vivem como sapróbios,
parasitas e simbiontes. Essas classificações já sugeriam que grupos como Oomycota, Myxomycota,
Acrasiomycota e Labyrinthulomycota não seriam monofiléticos. Outros autores sugerem sua
classificação em outros reinos: Oomycota, em Stramenopila, e os demais, e, Protista. Entretanto
esses organismos continuam sendo estudados por micologistas e, por conveniência, são aqui
apresentados em uma categoria denominada “fungos lato sensu” (ou fungos falsos). Hoje, quando
falamos em fungos, é necessário distingui‑los entre as classificações tradicionais (lato sensu, isto
é, em sentido amplo) e a atual (stricto sensu, isto é, sentido estrito, ou, em outra nomenclatura,
fungos verdadeiros).

23
Unidade I

Basidiomycota
Dikarya
Ascomycota
Glomeromycota
Mucormycotina (Zygomycota)
Entomophthorales (Zygomycota) & Olpidium (Chytridiomycota)
Blastocladiales (Chytridiomycota)
Euchytrids (Chytridiomycota)
Microsporidia
Rozella (Chytridiomycota)
Animals

Figura 10 – Classificação adaptada de James et al. (2006)

Estudos ultraestruturais e moleculares recentes conduziram uma verdadeira revolução na


interpretação do que são fungos (figura 10). A classificação mais recente dos fungos verdadeiros
(stricto sensu), baseada em estudos filogenéticos e proposta por um grupo representativo de
micologistas especialistas nos diversos grupos, considera os seguintes filos: Chytridiomycota,
Blastocladiomycota, Neocallimastigomycota, Microsporidia, Glomeromycota, Ascomycota e
Basidiomycota. Esses autores não reconhecem Zygomycota e separam‑no em quatro subfilos:
Mucoromycotina, Kickxellomycotina, Zoopagomycotina e Entomophthoromycotina. Assim, na nova
classificação do reino dos fungos, são considerados 7 filos, 10 subfilos, 35 classes, 12 subclasses e
129 ordens (HIBBETT et al. 2007, JAMES et al. 2006).

Apesar de ainda persistirem controvérsias em relação à monofilia dos Chytridiomycota, esse


grupo continua sendo incluído entre os fungos verdadeiros. Quanto aos filos Blastocladiomycota e
Neocallimastigomycota, eles foram segregados dos fungos flagelados. A inclusão de Microsporidia,
que congrega organismos unicelulares parasitas de animais e protistas, não está confirmada.
Chytridiomycota, Zygomycota e Glomeromycota apresentam hifas contínuas, asseptadas ou
cenocíticas, já Ascomycota e Basidiomycota apresentam hifas regularmente interrompidas por
septos. Os Chytridiomycota possuem centríolos e flagelos, porém, nos demais fungos verdadeiros,
tais estruturas estão ausentes. Esse filo de fungos zoospóricos produz esporos sexuados conhecidos
como oosporos. Zygomycota inclui, entre outros, os mofos de pão e frutas, produzidos por
espécies de gêneros diversos, como Rhizopus e Mucor. Seus esporos sexuados são denominados
zigosporos. Os Glomeromycota são simbiontes obrigatórios que formam micorriza arbuscular;
não se conhece reprodução sexuada no grupo e os esporos, caracteristicamente unicelulares e
multinucleados, são denominados glomerosporos. Os Ascomycota produzem, por reprodução
sexuada, esporos endógenos, delimitados por estruturas especializadas denominadas ascos, que,
em geral, ficam protegidas em ascomas. Incluem fungos filamentosos e leveduras, sendo comuns
espécies de Aspergillus e Penicillium, entre outras. Os Basidiomycota são fungos de morfologia
bastante diversificada que, na reprodução sexuada, formam esporos (basidiosporos) em estruturas
especializadas, os basídios, encontrados em basidiomas que podem ser vistosos e alcançar tamanho
destacado. Incluem os boletos, as orelhas‑de‑pau, as estrelas‑da‑terra, os ninhos‑de‑passarinho
e os cogumelos, entre outros, como as ferrugens e os carvões, conhecidos fitopatógenos que não
formam basidiomas.

24
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

2.4 Líquens: associação entre algas e fungos

Os líquens são associações estáveis entre algas (fotobiontes ou ficobiontes) e fungos (micobiontes)
(figura 11), formando talos capazes de autorreprodução com morfologia e estrutura definidas e constantes.

Sorédio

Camada gonidial
(hifas + algas unicelulares)

Camada medular (hifas)

Rizoides (hifas)

Figura 11 – Desenhos esquemáticos do corte por meio do talo de um líquen


visto ao microscópio óptico, evidenciando hifas do fungo associadas com a alga

São comumente considerados o melhor exemplo de simbiose mutualística. Existem, entretanto,


interpretações diversas quanto à natureza dessas associações:

• Mutualismo: o fungo absorve nutrientes orgânicos derivados das algas, e as algas obtêm proteção,
por exemplo, contra dessecamento e excesso de luz.

• Parasitismo fraco: os fungos parasitam as algas que resistem ao ataque. Esse ponto de vista
baseia‑se no fato de que os fungos emitem haustórios que penetram na parede celular das algas
ou mesmo invadem o citoplasma.

Os fungos podem, ainda, apresentar saprofitismo nas células mortas das algas. Existe um equilíbrio
muito delicado nessa associação. Qualquer distúrbio que altere a taxa de crescimento e/ou mortalidade
de componente micobionte ou fotobionte pode levar à morte da associação. Como consequência do
equilíbrio delicado dessa associação, os líquens são bons indicadores da ação do homem no ambiente,
sendo muito sensíveis à poluição. Assim, a flora liquênica modifica‑se com o grau de poluição, não
estabelecendo associação entre esses diferentes seres em áreas muito poluídas.

25
Unidade I

O micobionte é o componente estrutural dos líquens, sendo o principal responsável por sua
morfologia. O talo dos líquens pode ser classificado em:

• Folhoso: estratificado em muitas camadas diferenciadas, é facilmente removido do substrato pelo


fato de que apresenta rizoides que fixam o talo somente em pontos definidos (figura 12).

Figura 12 – Desenho esquemático de líquen folhoso

• Gelatinoso: não estratificado, sem camadas.

• Crostoso: assemelha‑se ao folhoso, mas adere fortemente ao substrato, além de não apresentar
córtex inferior, nem rizoides (figura 13).

Figura 13 – Desenho esquemático de líquen crostoso

26
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

• Fruticoso: apresenta aspecto arborescente, é estratificado com muitas camadas distintas (figura 14).

Figura 14 – Desenho esquemático de líquen fruticoso

Quanto à reprodução, os líquens são compostos por dois genomas distintos e não apresentam
reprodução gamética. A reprodução vegetativa se dá por:

• Sorédios: estruturas compostas por um conjunto de células de algas envolvidas por hifas de
fungos (figura 15).

Sorédio (algas + hifas)

Córtex superior

Camada gonidial

Camada medular

Córtex inferior

Figura 15 – Desenho de um corte do líquen evidenciando os sorédios

27
Unidade I

• Isídios: pequenos ramos diferenciados do talo que se destacam com facilidade por ação mecânica
das chuvas, ventos etc.

• Fragmentação: fragmentos indiferenciados do talo.

Os líquens apresentam resistência a condições ambientais extremas. Crescem, por exemplo, na


superfície das rochas submetidas a altas irradiâncias e temperaturas, tal como nos polos. A nutrição
independente do substrato, crescendo sobre rochas, troncos ou terra. Dependem, basicamente, da
água das chuvas ou de outras fontes que transportam elementos minerais e orgânicos. Apresentam
crescimento muito lento. Algumas datações sugerem até 4.000 anos de idade para alguns indivíduos. Em
decorrência dessas características, os líquens podem ser pioneiros em ambientes rochosos, provocando
erosão das rochas por sua ação mecânica ou através de ácidos liquênicos (figura 16).

Figura 16 – Detalhe de líquen crescendo sobre a rocha

Fungo produz biodiesel

Pesquisadores da Universidade Rey Juan Carlos, de Madri, e da Universidade de Múrcia,


ambas da Espanha, conseguiram produzir biodiesel do fungo Mucor circinelloides, sem a
necessidade de extrair o óleo de grãos ou outro tipo de biomassa por esmagamento. Nos
processos tradicionais de produção de biodiesel a partir de fontes vegetais, são necessários
o cultivo de plantas oleaginosas, a extração do óleo e a transformação química por meio
da reação de transesterificação para a formação do biodiesel. Pelo novo método, o fungo é
submerso em uma cultura que promove a fermentação do microrganismo e o faz secretar
o próprio óleo sem precisar utilizar as etapas de esmagamento e transesterificação. A
análise do biodiesel mostrou que ele atende aos requisitos estabelecidos pelos padrões
estadunidenses e europeus.

Fonte: Fapesp (2010).

28
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

Exemplo de aplicação

Após ler a reportagem da Fapesp, “Fungo produz biodiesel”, reflita sobre ela e pesquise artigos que
retratam a aplicação dos fungos nas pesquisas biotecnológicas.

3 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DAS MICROALGAS

3.1 Introdução

Definimos “alga” como um termo genérico, desprovido de significado taxonômico, que inclui
organismos que possuem clorofila A e um talo não diferenciado em raiz, caule ou folhas, com hábito
predominantemente aquático. Desempenham função ecológica importante, como produtores primários
dos ecossistemas em que proliferam, sendo responsáveis provavelmente por mais de 50% do total
da produção primária de todo o planeta. O fato de serem clorofilados não implica que sejam verdes,
pois, além da clorofila, possuem outros pigmentos denominados acessórios, os quais podem mascarar
a presença da clorofila, proporcionando às algas colorações avermelhadas, azuladas, pardas ou até
enegrecidas. O termo “alga” inclui organismos de linhagens filogenéticas completamente diferentes, ou
seja, esses organismos não são necessariamente semelhantes entre si e nem sempre resgatam origem
evolutiva próxima.

A Ficologia é ciência que estuda as algas. A etimologia remonta ao termo grego “phykos” (alga).
Constitui o ramo da biologia que abrange a maior diversidade de grandes grupos de organismos nem
sempre relacionados filogeneticamente.

A classificação desses organismos é algo confusa. Tradicionalmente, a diferenciação dos organismos


foi baseada tanto na coloração dos talos verdes, vermelhos ou marrons – como resultado da combinação
dos pigmentos fotossintetizantes contidos em seus plastos (clorofilas e pigmentos acessórios, como
carotenoides, ficobilinas e xantofilas que mascaram a cor verde das clorofilas) – quanto nas características
morfológicas e anatômicas. As classificações têm sofrido alterações decorrentes da aplicação de
ferramentas moleculares, embora grande parte da classificação tenha sido mantida e corroborada
por essa técnica. Entretanto, foi evidenciada a existência de agrupamentos filogeneticamente não
relacionados e que tiveram de ser realocados em grupos taxonômicos distintos (filos, ordens, famílias
etc.) ou em novos grupos criados para acomodar organismos de origens filogenéticas diferentes.

Algumas classificações tratam de vários grupos de algas, como o Reino Protistas. No sistema de
classificação de cinco reinos de Whittaker (1969), por exemplo, os protistas reúnem os eucariontes que
não pertencem ao grupo das plantas, fungos ou animais.

Já as classificações atuais, baseadas em DNA, indicaram que os protistas não formavam um grupo
com origem em comum (monofilético), de tal modo a não ser aceito taxonomicamente. Assim, os
seres do antigo Reino Protista foram redistribuídos em diferentes supergrupos no Domíno Eukarya.
Mas, para facilitar o estudo desses diferentes grupos, algumas literaturas incluem as algas como
protistas fotossintetizantes. As algas do grupo protista tiveram origem em eventos de endossimbiose

29
Unidade I

primária ou secundária, podendo apresentar todos os tipos de clorofila conhecidos. Os protistas não
fotossintetizantes estudados junto às algas são seres filogeneticamente próximos aos organismos que
fizeram endossimbiose no passado ou derivados de grupos fotossintetizantes que perderam a capacidade
de realizar fotossíntese (RAVEN; EVERT; EICHHORN, 2014).

Nesta unidade, adotaremos uma classificação com adaptações para algas proposta por Raven, Evert
e Eichorn (2014), segundo a qual as algas estão abrigadas no domínio de seres procarióticos, incluindo as
cianobactérias, e no domínio de seres eucarióticos, inseridos os protistas autótrofos (fotossintetizantes),
conhecidos como algas, dentre outros grupos.

Entre as algas, há os seres euglenoides, as algas Criptófitas (filo Cryptophyta), Haptófitas (filo
Haptophyta), os Dinoflagelados, as algas Diatomáceas (ou filo Bacillariophyta), as algas douradas (ou
filo Chrysophyta), as algas xantofíceas (ou filo Xanthophyta), as algas pardas (ou filo Phaeophyta), as
rodófitas ou algas vermelhas (filo Rhodophyta) e algas verdes (filos Chlorophyta e Charophyta).

As algas podem ser encontradas em diversos tipos de habitant (plural do termo latino “habitat”),
proliferando em ambientes de água doce e salgada, sobre troncos de árvores, rochas, desertos,
superfície de neves e geleiras, além de fontes termais. As algas marinhas podem variar entre indivíduos
unicelulares microscópicos e formas multicelulares complexas com muitos metros de comprimento. As
algas multicelulares podem abranger uma diversidade enorme de formas. As algas de vida livre podem
formar, principalmente, dois tipos de comunidades:

• fitoplâncton: comunidade formada por microalgas que vivem livres na coluna d’água; e

• fitobentos: comunidade formada por macro ou microalgas que crescem fixas sobre qualquer
superfície passível de ser colonizada, como rochas, esqueletos de corais mortos, animais, plantas
marinhas (macroalgas ou fanerógamas), embarcações naufragadas etc.

Também quanto à organização do talo, as algas abarcam diversidade muito grande. Existem desde
formas microscópicas até formas que atingem 60 metros de comprimento, como as algas pardas
do gênero Macrocystis. Na presente unidade, trataremos dos grupos de algas que se caracterizam
principalmente por apresentar formas microscópicas, conhecidas microalgas.

Microgalgas transformadas

Um grande tanque de vidro transparente para cultivo de microalgas ao ar livre, chamado


fotobiorreator, foi concebido e desenvolvido por uma equipe multidisciplinar composta
por pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e da Universidade
de São Paulo (USP). Entre as inovações, o fotobiorreator possui uma membrana porosa
utilizada para filtrar o meio de cultura que serve como alimento para as células da alga
Chlorella vulgaris – composto por substâncias como nitrato de sódio, fosfato, potássio,
micronutrientes, sulfato e outros elementos inorgânicos. Essa membrana permite, pela
escolha da microalga e da composição nutricional, selecionar o tipo de biomassa que será
obtido no final do processo: proteínas para ração animal, ácidos graxos essenciais, como
30
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

ômega 3, para aplicação nas indústrias alimentícia e farmacêutica, carboidratos usados na


síntese de plásticos ou fertilizantes.

“Por meio de manipulação bioquímica em microalgas, podemos obter biomoléculas de


acordo com a necessidade de matéria‑prima das empresas”, diz a professora Ana Teresa
Lombardi, do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da UFSCar e coordenadora do projeto
na modalidade Pesquisa em Parceria para Inovação Tecnológica (Pite), que faz parte de um
acordo de cooperação da FAPESP com a Braskem. “Dentre as várias aplicações possíveis,
um resultado interessante e promissor que obtivemos foi a peletização [recobrimento] de
sementes de plantas nativas do cerrado com a biomassa algal, que poderão ser utilizadas em
reflorestamento”, relata. A pesquisa foi tema de uma dissertação de mestrado, já defendida.
“Essas sementes envoltas em biomassa e mucilagem algal conseguem aproveitar melhor a
água de chuva, pela maior retenção, o que resultaria em menor mortalidade de sementes
plantadas no campo”, ressalta.

Ana Teresa explica que, no processo de cultivo de algas, é preciso um fluxo contínuo
para a entrada de nutrientes frescos. Só que em alguns momentos há um extravasamento
desse fluxo e é preciso retirar o meio de cultura usado. “No biorreator padrão, quando esse
meio velho é removido, há perda de células, ou seja, é como se tudo tivesse sido lavado.”
Como a membrana tem poros extremamente pequenos, os nutrientes utilizados só saem
depois de passar pelo processo de filtragem. Dessa forma, além da possibilidade de reúso do
meio, é possível escolher a densidade de células que ficará no tanque e o meio de cultura
que entrará no reator pelo fluxo contínuo. “As algas se adaptam rapidamente a mudanças
nos nutrientes porque passam por uma transformação intracelular”, diz Ana Teresa. Ou
seja, elas conseguem fazer uma modificação na sua composição bioquímica dependendo
do ambiente em que vivem. “Transformamos esse atributo microbiológico das algas em um
processo tecnológico”, ressalta a pesquisadora.

O cultivo de microalgas como a Chlorella apresenta elevada produtividade em biomassa


seca, com diversas safras ao longo do ano. Organismos fotossintetizantes, elas transformam
a energia luminosa em energia química acumulada nas ligações que formam carboidratos,
lipídios e proteínas. Além de apresentar grande eficiência fotossintética, elas ainda são
ótimas fixadoras de dióxido de carbono (CO2). “O objetivo principal do projeto, a fixação
de dióxido de carbono, era uma consequência da produção da biomassa com o uso do
fotobiorreator”, diz a pesquisadora. A forma como o equipamento foi construído também
permite um melhor aproveitamento da energia solar incidente, resultando em expressivo
aumento na produção. “Em apenas 24 horas, conseguimos cinco duplicações da população
algal”, diz Ana Teresa.

A princípio o biorreator seria comprado na Holanda. Enquanto esperavam a resposta


do fornecedor, os pesquisadores começaram a construir um protótipo no laboratório,
inicialmente em escala de 200 mililitros. A escala foi aumentada e um outro equipamento
com 200 litros foi construído. “Ele foi tão promissor que desistimos da importação”, conta
Ana Teresa. A próxima etapa foi a construção de um equipamento com mil litros, com todas
31
Unidade I

as variáveis controladas. Até chegar ao fotobiorreator considerado ideal para o projeto,


os pesquisadores – uma bióloga com doutorado em química e uma botânica especialista
em zooplâncton, ambas da UFSCar, além de uma engenheira química e dois engenheiros
mecânicos, da USP – participaram de muitas reuniões. “Fizemos um fotobiorreator de mil
litros totalmente experimental, em que todas as variáveis eram passíveis de controle”,
explica Ana Teresa. Para isso, todos os sistemas – agitação, borbulhamento, filtragem e
fluxo contínuo – foram montados separadamente, para que funcionassem de forma
independente. “O fluxo contínuo independente mantém o ambiente químico relativamente
constante, o que resulta em controle de qualidade do produto final”.

A partir do segundo ano, o projeto ganhou o reforço de uma pós‑doutoranda, bióloga


de formação, com doutoramento em engenharia mecânica e especialista em membranas de
filtragem. Com isso, o reator ganhou membranas submersas comerciais, “fáceis de operar
e trocar”, nas palavras de Ana Teresa. “É um diferencial importante do nosso reator, já que
poucos no mundo contam com esse recurso.” Em dezembro de 2013, após três anos e
oito meses, o projeto foi encerrado. Mas as pesquisas sobre fixação de carbono ainda não
terminaram. “Estamos utilizando agora um método de fluorescência, que também se aplica
a vegetais terrestres, para quantificar o potencial máximo fotossintético da alga”.

Fonte: Ereno (2014).

Nesta unidade, serão abordados também cianobactérias, os seres euglenoides, as algas Criptófitas
(filo Cryptophyta), Haptófitas (filo Haptophyta), os Dinoflagelados, as algas Diatomáceas (ou filo
Bacillariophyta), as algas douradas (ou filo Chrysophyta), todos esses grupos são, na grande maioria das
vezes, microalgas.

3.2 Cianobactérias

O grupo das algas procarióticas, as cianobactérias, conhecidas também como algas azuis ou
cianofíceas, inclui representantes que, muitas vezes, apresentam coloração azul. No entanto, podem ser
esverdeadas, avermelhadas ou enegrecidas. São organismos procarióticos, como as bactérias. No sistema
de classificação de cinco reinos de Whittaker (1969), esse grupo de algas estava posicionado no Reino
Monera, que abrangia procariontes representados pelas bactérias e cianobactérias. Na classificação
atual, esse grupo está posicionado no Domínio Bacteria.

Algas são organismos fotossintetizantes com clorofila A. Existem outras bactérias, que são
fotossintetizantes, mas é possível diferenciá‑las, pois as bactérias não possuem clorofila A. As algas
azuis apresentam oxigênio como produto final da fotossíntese, já as bactérias nunca liberam O2 como
produto final da fotossíntese. Esse grupo de organismos fotossintetizantes não possui flagelos. Algumas
bactérias possuem‑nos e as algas azuis atingem maior complexidade morfológica que bactérias.

As cianobactérias podem viver em ambientes extremamente diversos. A maioria é de água doce,


podendo sobreviver a temperaturas acima de 70 °C em fontes termais ou a temperaturas muito baixas de
lagos gelados. Existem formas marinhas que resistem a altas salinidades ou a períodos de dessecamento.
32
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

Algumas formas são terrestres, vivendo sobre rochas ou solo úmido. Outras vivem em associações com
fungos, como nos líquens e as que se associam a outros vegetais.

A organização do talo da maior parte das cianobactérias é muito simples: podem ser unicelulares,
coloniais ou filamentosas, como a cianobactéria filamentosa Anabaena sp. (figura 17)

Figura 17 – Eletromiografia evidenciando uma cianobactérias filamentosa (Anabaena sp)

As formas filamentosas possuem filamento constituído por tricomas, ou seja, uma sequência linear de
células envolvida por uma bainha de mucilagem. Os filamentos podem ser unisseriados não ramificados
ou ramificados. Podem ser ainda plurisseriados.

São organismos procariontes; portanto, não apresentam núcleo organizado, seu DNA está disperso
no citoplasma. A parede celular desse grupo é semelhante à encontrada em bactérias gram‑negativas,
é complexa e composta por várias camadas, sendo que apenas as duas camadas mais internas são as
mesmas para todas as cianobactérias.

A estrutura das camadas mais externas depende das condições ambientais e da quantidade de
mucilagem secretada; a mucilagem presente em maior quantidade é um tipo de peptídeo (tipo de
carboidrato). O revestimento mucilaginoso forma o que chamamos bainha, fica externo à parede celular;
a mucilagem faz a conexão ao ambiente externo, tornando os nutrientes disponíveis para a célula,
conferindo habilidade às cianobactérias e vantagens sobre outras algas do fitoplâncton. Na periferia da
célula, estão localizados os tilacoides, membranas lipoproteicas, em que estão situados os pigmentos.
Associados aos tilacoides, podem ocorrer pigmentos, como a clorofila A, vários tipos de ficobiliproteínas
– tanto ficocianina (azul) quanto ficoeritrina (vermelho) –, tipos de carotenos, como o β‑caroteno e
xantofilas de vários tipos, porém não ocorre luteína.

As cianobactérias possuem grânulos de amido, também conhecidos como amido das cianofíceas. Ele
é constituído por uma cadeia altamente ramificada, semelhante ao glicogênio.
33
Unidade I

As formas planctônicas de cianobactérias possuem vesículas de gás para a flutuabilidade. À medida que
aumenta a atividade fotossintetizante, vesículas de gás diminuem e, consequentemente, a alga afunda.
Quando isso acontece, a alga é submetida a um ambiente com menos luz; por conseguinte, reduz‑se a
taxa de fotossíntese e as vesículas começam a formar‑se novamente. Dessa forma, a célula volta a flutuar.

Não se conhece reprodução sexuada nas algas azuis. Nunca se observou plasmogamia. No entanto,
existem evidências de combinação gênica. Podem reproduzir‑se de várias formas, como a divisão celular
simples, a fragmentação, os hormogônios (que são fragmentos de tricoma que deslizam na bainha, até a
extremidade do filamento, desprendendo‑se deste e dando origem a um novo indivíduo), os endósporos
(a formação de esporos é feita por meio da divisão endógena do protoplasto em duas ou mais partes,
que emergem quando a parede se rompe) ou o acineto (que se desenvolve a partir de uma célula
vegetativa que se torna maior, com reservas, funciona como um esporo de resistência a condições
ambientais desfavoráveis).

Outra característica que pode ocorrer nas cianobactérias é a presença do heterocito, que é uma
célula de conteúdo homogêneo, parede espessa, geralmente maior que a célula vegetativa e com a
função à fixação de nitrogênio.

Essas algas podem apresentar movimento de deslizamento. Algumas apresentam um movimento


oscilatório nas extremidades. Esse movimento pode se dar em resposta a estímulos luminosos.

Existem vários registros de contaminação de água por toxinas de cianofíceas, que podem levar à morte
dos organismos. Certas cianobactérias são capazes de produzir toxinas e liberá‑las para o meio onde vivem.
Essas toxinas são alcaloides (neurotoxinas) ou peptídeos de baixo peso molecular (hepatotoxinas).

A grande importância econômica das cianobactérias está relacionada às formas fixadoras de


nitrogênio, que, quando presentes ou adicionadas ao solo, podem, em muitos casos, substituir ou
reduzir a utilização de fertilizantes. Além disso, algumas cianobactérias são aproveitadas como fonte
de proteínas: o gênero Spirulina, por exemplo. Da cianobactéria Nostoc ellipsosporum, é extraída uma
proteína, substância potente anti‑HIV, a cianovirina.

3.3 Seres euglenoides

Já no Domínio de seres eucarióticos, há um grupo que costuma ser abordado junto às algas, trata‑se
dos seres euglenoides – do grego, “eu” (bem) e “glene” (encaixe). Em algumas classificações, eles são
considerados Filo Euglenophyta. São seres esverdeados com um ou dois flagelos, unicelulares eucariontes
e características tanto de plantas como de animais. Eles fazem fotossíntese e deslocam‑se no meio com
auxílio do flagelo. A substância de reserva é o paramilo, um polissacarídeo exclusivo das euglenas, não
possui parede celular e o citoplasma apresenta uma mancha ocelar conhecida por estigma, capaz de
perceber variações de intensidade luminosa (figura 18). Vivem principalmente em água doce.

Aceita‑se que o cloroplasto dos euglenoides tenha origem endossimbiótica com algas verdes. Essa
suposição está baseada na semelhança entre os cloroplastos desses dois grupos, ambos apresentam
clorofilas A e B.
34
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

Conhece‑se apenas reprodução vegetativa, por meio de divisão longitudinal da célula. Quando as
condições ambientais tornam‑se desfavoráveis, o indivíduo, que é constituído por apenas uma célula,
transforma‑se em cisto, o qual permanece dormente até que as condições tornem‑se favoráveis. O
principal representante é a euglena.

Vacúolo pulsátil
Estigma
Cloroplasto

Paramilo

Flagelo

Núcleo

Citoplasma

Figura 18 – Desenho esquemático de Euglena viridis

3.4 Microalgas criptófitas

Outro grupo de microalgas a ser abordado são as criptófitas ou criptomônadas (filo


Cryptophyta). São seres unicelulares, com presença de dois flagelos, que podem ser semelhantes ou
não. Recebem esse nome por serem microscópicos. Possuem mastigonemas (trata‑se de projeções
perpendiculares ao eixo principal do flagelo que dão a ele um aspecto semelhante ao de uma
pena), tal característica é própria do grupo. Sua parede celular é constituída por placas proteicas,
localizadas sob a membrana plasmática. São importantes produtores primários, particularmente
ricos em compostos essenciais para o desenvolvimento do zooplâncton. A sexualidade do grupo
ainda é pouco conhecida. Em uma espécie, foi evidenciada a fecundação isogâmica, mas a meiose
nunca foi observada e o ciclo de vida é desconhecido.

Esse grupo pode apresentar organismos fotossintetizantes e outros consumidores de partículas.


Os organismos fotossintetizantes apresentam clorofilas dos tipos A e C, bem como a ficobilina, além
de amido como carboidrato de reserva. Existem indícios de que as criptomônadas surgiram da fusão
de duas células eucarióticas – uma heterotrófica e outra fotossintetizante –, estabelecendo uma
endossimbiose secundária. A presença de ficobilinas, pigmentos conhecidos apenas em cianobactérias
e algas vermelhas, junto à presença de cloroplastos com quatro membranas e de um núcleo reduzido e
amorfo, evidenciaria o processo de endossimbiose secundária.

35
Unidade I

3.5 Microalgas haptófitas

Também são consideradas algas os microrganismos de um grupo conhecido como haptófitas,


que abrange uma gama de organismos presentes no fitoplâncton marinho, além de alguns
poucos de água doce. Esse grupo apresenta indivíduos unicelulares e coloniais, flagelados ou
não. Normalmente, o filo apresenta um apêndice particular, o haptonema – uma estrutura
filamentosa que se prolonga da célula junto a dois flagelos de igual comprimento – e possui
função sensorial. Embora a estrutura do haptonema também seja formada por microtúbulos,
sua organização difere de cílios e flagelos, podendo tanto curvar‑se quanto enrolar‑se, mas não
bater como um flagelo.

Outra característica do grupo é a presença de escamas achatadas de material orgânico calcificado


ou não. Essas escamas são conhecidas como cocólitos. Esse tipo de estrutura evidencia registros fósseis
do grupo de organismos desde o período Triássico.

As haptófitas são seres fotossintetizantes que apresentam clorofilas A e C, os carotenoides, entre


eles um denominado fucoxantina, que expõe coloração marrom dourada, sua reserva de carboidratos é
a crisolaminarina. Entretanto são produtores importantes na cadeia alimentar e participam do ciclo do
carbono, devolvendo‑o ao fundo dos oceanos.

Reprodução sexuada e alternância de gerações já foram verificadas, mas o ciclo de vida


de muitos organismos ainda é desconhecido. Haptófitas são responsáveis por causar vários
danos aos humanos, como florações tóxicas e chuvas ácidas, já que são seres com capacidade
de produzir óxido sulfúrico. Existe um gênero de haptófitas que forma espumas costeiras, elas
têm sido relacionadas a acentuadas concentrações de células da alga colonial Phaeocystis sp.,
em florações consideradas nocivas.

3.6 Dinoflagelados

Os dinoflagelados, em conjunto com os protozoários ciliados e os seres Apicomplexa,


constituem um supergrupo conhecido como Alveolata. Esses organismos compartilham presença
de vesículas sob a membrana plasmática. Para alguns sistemas de classificação, são considerados
algas pirofíceas.

Os dinoflagelados são, em sua maioria, seres unicelulares e com presença de dois flagelos, sendo
que a disposição deles é característica do grupo; um dos flagelos é orientado transversalmente, inserido
em um sulco equatorial que circunda toda a célula partindo sempre em direção ao lado esquerdo e o
segundo flagelo dispõe‑se em posição longitudinal e está em sulco disposto verticalmente (figura 19).
O movimento desses organismos é realizado com o batimento dos flagelos em seus respectivos sulcos,
gerando um movimento giratório semelhante a um pião.

36
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

Flagelo

Figura 19 – Desenho esquemático de dinoflagelados evidenciando a posição dos flagelos

Os dinoflagelados podem ainda apresentar tecas, que são formadas por placas rígidas de celulose
impregnadas com carbonato de cálcio, cujas características morfológicas são importantes para a
identificação taxonômica dos grupos. Existem dinoflagelados imóveis que produzem células flageladas
apenas durante o processo de reprodução sexuada, assim como outros sem placas celulósicas, os quais
são chamados de zooxantelas e, geralmente, ocorrem em simbiose com outros organismos, como os
poríferos, cnidários, moluscos e outros protistas.

Os dinoflagelados são encontrados na massa superficial da água do mar (plâncton), onde


predominam, e na água doce, eles apresentam como carboidrato de reserva o amido e como pigmentos
fotossintetizantes, as clorofilas A e C, bem como carotenoides, entretanto, alguns seres fotossintetizantes
também podem absorver partículas orgânicas e cerca da metade dos dinoflagelados não possui aparato
fotossintetizante, sendo puramente heterotróficos.

Alguns gêneros apresentam bioluminescência (exemplo: Noctiluca) (figura 20). Por meio da oxidação
da luciferina pela luciferase, forma‑se um produto excitado que libera fótons, sendo responsável
bioluminescência nos oceanos.

37
Unidade I

Figura 20 – Fotomicrografia de Noctiluca sp, um dinoflagelado


responsável bioluminescência nos oceanos

3.7 Algas diatomáceas

Outro grupo em destaque no estudo das algas são os Estramenópilos fotossintetizantes. Eles são
conhecidos também como supergrupo Heterokonta. Os Estramenópilos formam um grupo monofilético
(com ancestral em comum) que abrange os grupos dos oomicetos (tipos de fungos), das algas diatomáceas,
das algas douradas (crisofíceas) e algas pardas. Os Estramenópilos possuem a característica comum
geralmente dois flagelos, um liso e outro plumoso. As algas pardas serão abordadas mais adiante, por
tratar‑se de um grupo considerado macroalgas em sua grande maioria.

As algas diatomáceas (Filo Bacillariophyta) são um grupo formado por organismos unicelulares
ou coloniais, desprovidos de flagelos imóveis ou que se movem através de secreção de mucilagem.
Possuem um tipo de parede celular impregnada de sílica denominada frústula, que é composta por duas
valvas de sílica morfologicamente semelhantes e que se encaixam perfeitamente. A presença da frústula
caracteriza uma diatomácea e sua diferente ornamentação ostenta grande valor taxonômico (figura 21).

Figura 21 – Desenhos esquemáticos de alguns tipos de diatomáceas que


existem no plâncton de água doce e no plâncton marinho

38
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

Dois grandes grupos de diatomáceas podem ser reconhecidos por sua simetria: diatomáceas
cêntricas, que são radialmente simétricas, e as diatomáceas penadas que são bilateralmente simétricas.

Figura 22 – Desenhos esquemáticos de diferentes tipos de diatomáceas (penadas e cêntricas)

A reprodução das diatomáceas de forma geral é assexuada, por fissão binária. A reprodução sexuada
irá ocorrer quando a célula, depois de sucessivas divisões celulares, atingir um tamanho reduzido a
ponto de comprometer o metabolismo celular. A reprodução sexuada é oogâmica, isto é, se dá por
meiose gamética, reestabelecendo o tamanho original da espécie. Os gametas masculinos são as únicas
células flageladas no ciclo de vida das diatomáceas e possuem apenas um flagelo do tipo pinado.

As diatomáceas são quase sempre autotróficas e possuem, em seu cloroplasto, tanto as clorofilas
A e C quanto o pigmento fucoxantina. Como nas algas douradas, o carboidrato de reserva das
bacilariófitas é a crisolaminarina. São os organismos aquáticos de distribuição muito ampla, exercendo
um papel muito importante como produtores primários. A maioria das diatomáceas vive nos oceanos,
particularmente os de águas frias. Quando morrem, depositam no fundo as suas carapaças de sílica,
formando depósitos chamados “terra de diatomáceas”. Essa terra é usada na fabricação de pasta
dentifrícia e nos chamados pós‑dentifrícios. É usada para polimento e para fabricação de filtros
industriais, alteando importância econômica.

3.8 Algas crisófitas

Outro grupo de algas Estramenópilos ou heteroconta é formado por crisófitas ou algas douradas,
que são seres unicelulares ou coloniais, às vezes filamentosos abundantes em ambientes de água
doce. Os organismos podem ser nus, providos de uma fina parede celular ou recobertos com escamas
entrelaçadas ou ornamentadas com sílica. Podem ser seres biflagelados ou multiflagelados, como
os outros seres Estramenópilos, sendo que, no caso de possuírem muitos flagelos, eles são desiguais.
As algas douradas podem ingerir partículas orgânicas, como aquelas que ingerem bactérias em
lagos – tornando‑se importantes agentes de controle biológico – ou serem fotossintetizantes –
neste caso apresentam tanto clorofilas A e C quanto o pigmento fucoxantina. Seu carboidrato de
reserva é a crisolaminarina.

39
Unidade I

Quanto à reprodução, é predominante na forma de reprodução assexuada, faz‑se por formação


de zoósporos; já a reprodução sexuada é conhecida em poucas espécies. Alguns gêneros de crisófitas
produzem florações tóxicas denominadas de marés marrons e são responsáveis por odores desagradáveis
em águas de abastecimento.

Os grupos de microalgas abordados no presente capítulo formam o fitoplâncton, comunidade


formada por microalgas que vivem livres na coluna d’água de extrema relevância ecológica, pois
são a base da cadeia alimentar dos ecossistemas aquáticos, uma vez que servem de alimentação a
organismos maiores.

Saiba mais
O diatomito, também chamado de terra de diatomáceas, é uma rocha
sedimentar biogênica, que se forma pela deposição dos restos microscópicos
das carapaças de algas diatomáceas em mares, lagoa e pântanos.
Leia o artigo completo e conheça mais sobre o uso dessa alga:
BRANCO, P. de M. Os muitos usos do diatomito. Brasília: CPRM/Serviço
Geológico do Brasil, 2014. Disponível em: <http://www.cprm.gov.br/publique/
cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=1296&sid=129>. Acesso em: 9 abr. 2015.

4 MACROALGAS: ASPECTOS MORFOLÓGICOS, EVOLUTIVOS E ECONÔMICOS

4.1 Introdução

Como visto anteriormente, o termo “alga” inclui organismos de linhagens filogenéticas completamente
diferentes; esses organismos não são necessariamente semelhantes entre si e nem sempre possuem
origem evolutiva próxima. Mas a ciência que estuda as algas, a ficologia considerada as algas como
sendo organismos talófitos, ou seja, não são diferenciados em raízes, caules e folhas, fotossintetizantes
que possuem em comum o pigmento clorofila a e, com raras exceções, não apresentam um envoltório
de células estéreis nas células reprodutivas.

Vimos que a classificação destes organismos é um tanto confusa. Tradicionalmente, a diferenciação


dos organismos foi baseada na coloração dos talos verdes, vermelhos ou marrons, como resultado
da combinação dos pigmentos fotossintetizantes contidos em seus plastos (clorofilas e pigmentos
acessórios, como carotenoides, ficobilinas e xantofilas que mascaram a cor verde das clorofilas),
e nas características morfológicas e anatômicas. As classificações têm sofrido alterações com o
advento da aplicação de ferramentas moleculares, embora grande parte da classificação tenha sido
mantida e corroborada por esta técnica. Entretanto, foi evidenciada a existência de agrupamentos
filogeneticamente não relacionados e que tiveram de ser realocados em grupos taxonômicos distintos,
ou em novos grupos criados para acomodar organismos de origens filogenéticas diferentes. Durante
muitos anos, algumas classificações bastante aceitas por muitos estudiosos posicionavam a maioria dos

40
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

grupos de algas (exceto as algas cianofíceas) no Reino Protistas; por exemplo, o sistema de classificação
de cinco reinos de Whittaker (1969). Os protistas reúnem os eucariontes que não pertencem ao grupo
das plantas, fungos ou animais; as classificações atuais baseadas em DNA indicaram que os protistas
não formavam um grupo com origem em comum (monofilético), sendo assim não poderia ser aceito
taxonomicamente; os seres do antigo Reino Protista foram redistribuídos em diferentes supergrupos
dentro do Domíno Eukarya. Mas, para facilitar, o estudo desses diferentes grupos, algumas literaturas
trazem as algas como protistas fotossintetizantes (RAVEN; EVERT; EICHORN, 2014). As algas do grupo
protista tiveram origem em eventos de endossimbiose primária ou secundária, podendo apresentar
todos os tipos de clorofila conhecidos. Os protistas não fotossintetizantes, estudados junto às algas,
são seres filogeneticamente próximos aos organismos que fizeram endossimbiose no passado, ou são
derivados de grupos fotossintetizantes que perderam a capacidade de realizar fotossíntese.

Adotamos uma classificação com adaptações para algas proposta por Raven, Evert e Eichorn (2014),
segundo a qual as algas são classificadas no Domínio de seres procarióticos, incluindo as cianobactérias
e as algas do Domínio de seres eucarióticos, os protistas autótrofos (fotossintetizantes). Entre elas, há
os seres euglenoides, as algas Criptófitas (Cryptophyta), Haptófitas (Haptophyta), os Dinoflagelados, o
supergrupo Estramenópilos (formado pelas as algas Diatomáceas (Bacillariophyceae), as algas douradas
(Chrysophyceae) e as algas pardas (Phaeophyceae), e as algas do supergrupo correlacionado às Plantas (são
elas rodófitas ou algas vermelhas (Rhodophyta) e algas verdes (Chlorophyta, Ulvophyceae e Charophyta).

As algas podem ser encontradas em diversos tipos de habitant e variar entre indivíduos unicelulares
microscópicos, que formam o fitoplâncton: comunidade formada por microalgas que vivem livres na
coluna d’água; elas são conhecidas como microalgas e foram abordadas anteriormente. As algas de
formas multicelulares podem apresentar a organização do talo mais complexas, grande parte delas são
caracterizadas como macroalgas e algumas podem atingir 60 m de comprimento, como as algas pardas
do gênero Macrocystis, grupo de algas que juntamente com outros organismos forma as verdadeiras
florestas marinhas, também conhecidas como kelps. As macroalgas podem apresentar uma diversidade
enorme de formas, grande parte delas auxilia a formação da comunidade bentônica que são organismos
que crescem fixos sobre qualquer superfície passível de ser colonizada, como, por exemplo, rochas,
esqueletos de corais mortos etc. Agora, trataremos do estudo dos aspectos morfológicos, evolutivos,
ecológicos e econômicos dos grupos de algas considerados como macroalgas: o das algas pardas
(Phaeophyceae) posicionadas no supergrupo Estramenópilos, e o das algas do supergrupo correlacionado
com as Plantas, são elas rodófitas ou algas vermelhas (Rhodophyta) e as algas verdes (Chlorophyceae,
Ulvophyceae e Charophyceae).

4.2 Algas pardas

As algas pardas (Phaeophyceae), também conhecidas como algas marrons, segundo a classificação
atual, fazem parte do supergrupo Estramenópilos, junto aos oomicetos (tipos de fungos), as algas
diatomáceas e as algas douradas, formando um grupo monofilético, que compartilha um ancestral
comum e apresenta, como principal característica, a presença de dois flagelos: um liso e outro plumoso.
Cerca de 1.500 espécies de algas pardas são conhecidas atualmente. Esse grupo de algas, com exceção
de três gêneros muito raros que ocorrem água doce, ocupam predominantemente mares das regiões
temperadas frias e polares. Nos mares tropicais, as algas pardas apresentam um número reduzido de
41
Unidade I

espécies, mas podem acumular grande quantidade de biomassa. Em certas regiões, essas algas podem
formar imensas massas flutuantes, como, por exemplo, no mar de Sargaços, ao nordeste das ilhas
caribenhas e as florestas marinhas de kelps da costa acidentada da Nova Zelândia, servindo de alimento
ou habitat para toda uma comunidade biológica.

Não há registros de representantes unicelulares no grupo de algas pardas. Seus tamanhos podem
variar de poucos milímetros, podendo chegar a mais de 60 m de comprimento. Os kelps são considerados
populações de algas gigantes (figura 23).

Figura 23 – Detalhe da floresta de algas pardas kelps

Quanto à organização da morfologia do talo, as algas pardas podem apresentar diferentes tipos
de talo, como o filamentoso simples, o filamentoso ramificado e o parenquimatoso. As formas
parenquimatosas podem ter o talo diferenciado em uma parte com função de fixação da alga ao
substrato ou ao apressório, outra parte formando uma haste de sustentação, conhecida como estipe e
sobre a estipe a parte conhecida como lâmina, formada por diversas camadas de células, como é o caso
dos kelps e de Sargassum, um gênero muito comum em mares tropicais.

As paredes celulares das algas pardas são constituídas de celulose e uma matriz mucilaginosa de ácido
algínico, também conhecido como alginato; essa substância têm a função de fornecer flexibilidade e
resistência, ajudando a reduzir a dessecação durante a exposição nos períodos de maré baixa. Em algumas
espécies, é depositado carbonato de cálcio nas paredes celulares, como em algumas espécies de Padina.

Quanto aos pigmentos, as algas pardas caracterizam‑se por possuir além da clorofila A, as clorofilas
C1 e C2. Entre os carotenos, o mais comum é o β‑caroteno e, entre as xantofilas, a mais frequente é a
fucoxantina, um pigmento marrom parcialmente responsável pela cor parda dessas algas. O material de
reserva das algas pardas é a laminarina, um tipo de polímero de origem da glicose e o manitol tipo de
álcool, que ficam depositados nos vacúolos. Alguns gêneros formam vesículas gasosas para flutuação,
como o Sargassum (figura 24).
42
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

Figura 24 – Detalhe da morfologia das vesículas gasosas presentes em Sargassum

4.3 Algas vermelhas

Dentro do grupo de plantas e algas correlacionadas, há as algas vermelhas (Rhodophyta). São


conhecidas atualmente cerca de 6.000 espécies de rodófitas (algas vermelhas). Esse grupo caracteriza‑se
por habitar ambiente marinho bentônicos, sendo predominantes nos mares tropicais, mas existem
algumas espécies de água doce. Em ambientes marinhos, elas ocupam desde a zona superior da região
entremarés até grandes profundidades, havendo registros de algas coralináceas crostosas com mais de
250 metros de profundidade, com pouca quantidade de luz disponível. Isso se deve ao fato de as rodofíceas
possuírem pigmentos fotossintetizantes capazes de absorver a luz com menores comprimentos de onda.

Estruturalmente, esse grupo de alga pode-se apresentar com talo mais complexo, visto que, apenas
poucas espécies desse grupo são unicelulares e microscópicas. As algas vermelhas são quase sempre
filamentosas, mas os filamentos podem-se agregar, formando uma estrutura pseudoparenquimatosa ou
até mesmo em forma de lamina (laminar). Poucos representantes são laminares, como Porphyra (figura 25).

Figura 25 – Detalhe do talo com morfologia laminar em Porphyra SP

43
Unidade I

Os cloroplastos das algas vermelhas possuem apenas clorofila A, apresentando também o


pigmento acessório ficobilina, que muitas vezes pode mascarar a coloração verde da clorofila
tornando a alga vermelha. As ficobilinas (ficoeritrina, ficocianina e aloficocianina) também são
responsáveis pela capacidade de absorção de luz em águas profundas. As condições abióticas do
meio onde vivem também podem ocasionar alterações nos padrões de cores, como a falta de
certos nutrientes na coluna d’água pode fazer com que certas rodofíceas fiquem com a coloração
amarelada. É comum, também, algumas algas vermelhas serem verdes ou marrons, em todo o talo
ou apenas em certas porções, isso pode ser observado na Figura 3, na qual parte do talo da alga
aparece com coloração esverdeada.

Pelo fato de possuírem apenas clorofila A e terem como reserva de carboidrato o amido
das florídeas (molécula semelhante ao glicogênio), associa‑se a origem desses cloroplastos à
endossimbiose com cianobactérias.

O material de reserva das algas vermelhas é um composto que possui propriedades intermediárias
entre o amido (produto de reserva das plantas) e o glicogênio (reserva alimentar dos fungos, bactérias
e de muitos organismos não vegetais), chamado de amido das florídeas, e fica armazenado no
citoplasma. A parede celular é constituída de celulose e uma camada externa de mucilagem, que pode
ser galactana (como o ágar ou e a carragenana). Algumas espécies depositam carbonato de cálcio
em suas paredes celulares, o que lhes confere um aspecto rígido. Por isso, algumas são chamadas de
algas coralináceas (figura 26).

Figura 26 – Aspecto geral da alga vermelha coralináceas

Algumas algas vermelhas podem apresentar uma grande relevância econômica, pois as carrogenanas
e os ágares, retirados de sua parede celular, são utilizados como meios de cultura, espessantes,
geleificantes e base para produção de cosméticos. Também são muito comercializadas e consumidas
44
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

como vegetais no Oriente, como por exemplo o gênero Porphyra sp. Conhecida popularmente por
nori, é usada principalmente no preparo do sushi, prato típico da cozinha oriental e tem uma longa
história de cultivo entre os povos da China e do Japão. Além disso, as algas coralináceas exercem um
papel de cimentação indispensável à formação e à sobrevivência dos recifes de corais, além de serem
produtores primários.

4.4 Algas verdes

As algas verdes, junto às briófitas, pteridófitas e plantas com sementes, formam uma linhagem
filogenética incluindo organismos eucarióticos com um ancestral em comum (monofilético),
o qual compartilha evidências moleculares e estruturais como a presença das clorofilas A e
B, além de armazenamento de amido como substância de reserva. Alguns autores propõem
que essa linhagem seja chamada como um todo de Viridófitas (literalmente, plantas verdes).
Essa linhagem inclui praticamente todos os tipos de morfologia vegetativa, de organismos
unicelulares até as complexas plantas terrestres, e, talvez, graças a essa grande diversidade de
formas, foi a única linhagem dentro das algas a colonizar com sucesso o ambiente terrestre
(JUDD et al ., 2009).

São conhecidas cerca de 17.000 espécies de algas verdes ou clorófitas, sendo muitas delas
unicelulares. As algas verdes estão presentes em ambientes marinhos, mas a maioria encontra‑se em
águas continentais (água doce), sendo que algas verdes de ambiente doce são geralmente unicelulares,
podendo também habitar troncos de árvores, solos, rochas (figura 27), superfícies de neve e viver em
simbiose com fungos (líquens), protozoários, hidras, esponjas e outros animais.

Figura 27 – Aspecto geral de algas verdes desenvolvendo‑se sobre rochas

Os talos das algas verdes multicelulares podem ser filamentosos, foliáceos (parenquimatosos),
cenocíticos ou crostosos (figura 28). Alguns gêneros de algas verdes multicelulares podem ter a forma
pinada, foliácea ou de cacho‑de‑uva, como Caulerpa.
45
Unidade I

Figura 28 – Diferentes tipos morfológicos de algas verdes multicelulares

As paredes celulares da maioria das algas verdes são formadas por celulose e polissacarídeos não
celulósicos. Em certos casos, pode ocorrer o depósito de carbonato de cálcio nas paredes celulares.

Clorofilas A e B, carotenos e xantofilas são os pigmentos encontrados nas clorófitas. A reserva é o


amido, que fica armazenado dentro dos cloroplastos, diferindo das outras algas eucariontes.

Nas clorofíceas, ocorrem reproduções vegetativa, espórica e gamética. A reprodução vegetativa


ocorre por divisão celular simples ou fragmentação. Elas podem se reproduzir pela formação de esporos,
do tipo zoósporos ou aplanósporos.

As clorófitas assemelham‑se às plantas terrestres em várias características importantes, como


presença de clorofilas A e B, amido como material de reserva armazenado dentro dos cloroplastos e
muitos aspectos bioquímicos e ultraestruturais. Essas semelhanças, entre outras, levam a crer que esse
grupo de algas deu origem aos vegetais terrestres.

São reconhecidos cerca de 500 gêneros distribuídos em três classes de algas verdes:
Chlorophyceae, Ulvophyceae e Charophyceae. Esses grupos foram delimitados por estudos
estruturais citológicos e moleculares. As características citológicas capazes de diferenciar classes
estão associadas à divisão celular.

46
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

Nas algas pertencentes às Chlorophyceae, o fuso mitótico não é persistente e um novo sistema
de microtúbulos, o ficoplasto, desenvolve‑se paralelamente ao plano de divisão celular, assegurando
que o sulco de clivagem, resultante da invaginação da membrana plasmática, placa celular, passe
entre os dois núcleos filhos. Nas outras classes de clorófitas, os fusos mitóticos persistem até
serem rompidos pela formação de um sulco ou crescimento de uma placa celular. As Ulvophyceae
apresentam o fuso persistente, mas não têm placa celular, sendo a divisão realizada pelo sulco de
clivagem. Algumas Charophyceae têm um fragmoplasto idêntico àquele das plantas terrestres,
sendo que essa estrutura está orientada perpendicularmente ao plano de divisão celular e orienta
o crescimento da placa celular.

O grupo Chlorophyceae é constituído por organismos de água doce que podem ser unicelulares
ou coloniais. Os seres unicelulares e coloniais podem ou não apresentar flagelo. Colônias móveis,
como as de Volvox, têm seus indivíduos unidos por glicocálice, sendo que os flagelos nessas
colônias apresentam‑se voltados para o meio circundante (figura 29). As colônias não móveis,
que incluem o gênero Hydrodictyon, são constituídas por células grandes, cilíndricas, dispostas
em forma de um único cilindro oco rendado. As Chlorophyceae filamentosas ramificadas e
parenquimatosas incluem as algas de estruturas mais complexas encontradas na classe. As
células dessas algas estão ligadas por plasmodesmos e são especializadas para cada função,
constituindo um tecido vegetal verdadeiro.

Figura 29 – Fotografia de uma colônia móvel de Volvox

A classe de algas Ulvophyceae abrange predominantemente as marinhas, o talo é multicelular,


podendo ser filamentoso, laminar parenquimatoso ou sifonáceo, microscópico e macroscópico.
As células flageladas possuem de dois a muitos flagelos. As algas sifónaceas que apresentam
células grandes e cenocíticas são representadas pelos gêneros Codium, o qual consiste em
uma massa esponjosa de filamentos cenocíticos densamente entrelaçados, Acetabularia, que
apresenta forma de guarda‑chuva, e Caulerpa, que pode ter forma, foliácea (figura 30), pinada
ou de cacho‑de‑uva.

47
Unidade I

Figura 30 – Forma foliácea da alga verde Caulerpa prolifera

Dentre as algas parenquimatosas, pode destacar‑se o gênero Ulva, também conhecido como
alface‑do‑mar (figura 31), que consiste em um talo laminar formado por duas camadas de células
justapostas interligadas por plasmodesmos.

Figura 31 – Alga verde pluricelular do gênero Ulva (Alface‑do‑Mar)

As carofíceas (Charophyceae) são representadas por gêneros unicelulares, coloniais, filamentosos e


parenquimatosos e possuem grande similaridade com as plantas terrestres. Tais similaridades incluem
presença de células flageladas assimétricas, quebra de envoltório nuclear na mitose, fusos persistentes
ou fragmoplastos na citocinese, presença de esporopolenina, presença de precursores da cutícula, bem
como outras características moleculares. Dentro das Carofíceas, os grupos Coleochaetales e Charales
possuem características presentes nas briófitas e plantas vasculares. Além das similaridades já citadas
anteriormente, pode destacar‑se a reprodução sexual oogâmica, anterozoides similares aos das briófitas,
com crescimento apical e os cloroplastos semelhantes àqueles encontrados nos antóceros. Características

48
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

como a presença do um fragmoplasto e a retenção do zigoto coberto por esporopolenina são exclusivas
dessas ordens. Estudos moleculares indicam que Charales é mais próxima das plantas terrestres que
Coleochaetales; essa proposta evolutiva pode ser sustentada também por características morfológicas,
pois o grupo Charales possui o talo com características semelhantes aos tecidos das plantas terrestres.

Saiba mais
Bastante usadas nas indústrias de alimentos e cosméticos, as macroalgas
marinhas têm também um grande potencial biotecnológico. Novos
estudos brasileiros mostram que compostos produzidos por elas têm ação
antioxidante, fotoprotetora e até antitumoral. Elas estão em pudins, loções,
pastas de dente e até na cerveja. São inúmeras as aplicações industriais
de substâncias extraídas das macroalgas marinhas (algas pluricelulares
visíveis a olho nu). Mas seu aproveitamento pode ser ainda mais intensivo:
pesquisas recentes têm mostrado que compostos produzidos por esses
organismos têm um incrível potencial biotecnológico.
Leia o artigo completo e conheça mais sobre o uso das algas:
FRAGA I. O poder das algas. Instituto Ch, Especiais/Reunião Anual da SBPC
– 2010, 28 jul. 2010. Disponível em: <http://cienciahoje.uol.com.br/especiais/
reuniao-anual-da-sbpc-2010/o-poder-das-algas>. Acesso em: 9 abr. 2015.

Resumo

O estudo da sistemática e da taxonomia da diversidade biológica envolve


diferentes abordagens. A primeira está relacionada à diversidade e às
relações de parentesco entre os organismos, já a taxonomia aborda normas
de nomenclatura e de classificação dos organismos. A classificação de um
organismo consiste em enquadrá‑lo em táxons apropriados. A identificação
de um organismo verifica em quais táxons o organismo está classificado, ou
seja, alude sempre a um organismo já descrito anteriormente. As principais
categorias taxonômicas são Reino, Filo, Classe, Ordem, Família, Gênero e
Espécie, mas também há as adicionais, como Subclasse, Subfamília e Secção.
Entre as regras de nomenclatura, há uma que determina que todo nome
científico deve ser escrito em latim ou latinizado e o nome deve ser grifado ou
impresso em itálico. Toda espécie recebe dois nomes (binominal): o primeiro
refere‑se ao gênero e o segundo, à espécie. O gênero deve ser escrito com
inicial maiúscula. A espécie, com inicial minúscula.

Os primeiros sistemas de classificação surgiram da necessidade


de organizar as informações sobre a utilidade das plantas e de suas

49
Unidade I

periculosidades. Atualmente, levam em consideração as afinidades


evolutivas entre os organismos. Inicialmente, todos os seres vivos
eram classificados como plantas ou animais, mas, após a invenção do
microscópio, descobriu‑se um mundo de criaturas unicelulares. Várias
foram as classificações propostas até chegarmos à mais atual, amplamente
aceita, dividindo os seres vivos em três grandes grupos: os eucariontes
(Eucaria), as eubactérias (Bacteria) e as arqueobactérias (Archaea), sendo os
dois últimos procariontes. Em Botânica – Criptógamas, abordamos os seres
inclusos nos domínios procarióticos e eucarióticos. Entre os procarióticos,
as cianobactérias. E entre os eucarióticos, os fungos verdadeiros (Reino
Fungi), as algas consideradas protistas fotossintetizantes (Reino Protista)
e também as algas correlacionadas com as plantas (algas vermelhas algas
verdes). Por fim, do Reino Plantae, as plantas terrestres avasculares e as
plantas vasculares sem sementes.

O grupo dos Fungos é integrado por organismos eucarióticos


heterotróficos, o segundo maior reino, com aproximadamente 1.500
espécies. Esse reino possui características parecidas com as dos animais,
como a presença de quitina e sua reserva de glicogênio. Em sua maioria,
os fungos são constituídos por filamentos microscópicos denominados
hifas, que, em conjunto, formam o micélio. Podem viver livres na água ou
no meio terrestre, onde há predominância de matéria orgânica. Para que
possam absorver a matéria orgânica de que necessitam, os fungos mantêm
três tipos de interações com outros seres vivos: saprofitismo, mutualismo
e parasitismo. Os fungos, junto às bactérias do solo, desempenham
importantíssimo papel na natureza ao atuarem como decompositores,
além de serem colonizadores primários. As importâncias econômicas são
muitas, como o uso direto na alimentação, na fermentação do pão, na
produção de bebidas alcoólicas e na fabricação de antibióticos, além de
serem causadores de prejuízo ao infectarem plantas e animais de interesse
econômico. Muitas vezes, são conhecidos apenas por seus danos à saúde, já
que causam vários tipos de micoses importantes no ser humano.

Historicamente, houve muita controvérsia e dificuldades em delimitar


os fungos como um grupo, com inclusões e exclusões comuns no último
século. Em anos recentes, os esforços dos taxonomistas na direção de
uma definição filogenética baseada, principalmente, em similaridades de
sequências relevantes de DNA aliadas à morfologia e aspectos fisiológicos,
como produção de açúcares e outros compostos, agregaram informações
importantes para a delimitação do grupo. Whittaker (1969) propôs a
classificação dos fungos em um reino à parte, exclusivo para organismos
eucarióticos com modo de nutrição por absorção e que vivem como
sapróbios, parasitas e simbiontes. Estudos ultraestruturais e moleculares
recentes levaram a uma autêntica revolução na interpretação do que são
50
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

fungos. A classificação mais recente dos fungos verdadeiros (stricto sensu),


baseada em estudos filogenéticos e proposta por um grupo representativo
de micologistas especialistas nos diversos grupos, considera os seguintes
filos: Chytridiomycota, Blastocladiomycota, Neocallimastigomycota,
Microsporidia, Glomeromycota, Ascomycota e Basidiomycota. Esses autores
não reconhecem Zygomycota e separam‑no em quatro subfilos.

Outro aspecto relevante no estudo dos fungos é a capacidade de


formação de associações com outros seres, como líquens (associações
estáveis entre algas – fotobiontes – e fungos – micobiontes), formando
talos capazes de autorreprodução, com morfologia e estrutura
definidas e constantes.

As algas habitam ambientes terrestres úmidos ou meios aquáticos,


de água doce ou salgada. Esses organismos, dispostos na superfície
oceânica, compõem o fitoplâncton, que libera, por meio do processo
fotossintético, cerca de 70% a 90% do oxigênio contido na atmosfera.
As algas constituem um grupo artificial, ou seja, sem valor taxonômico,
de organismos fotossintetizantes que não estão todos incluídos do reino
Plantae. Têm como características gerais serem uni ou pluricelulares,
fotossintetizantes e diferenciados das plantas terrestres por não possuírem
embrião e tecidos especializados.

Adotamos uma classificação com adaptações para algas proposta


por Raven (2014), na qual as algas são classificadas no Domínio de
seres procarióticos, que inclui as cianobactérias, e no Domínio de seres
eucarióticas, que inclui vários grupos, entre eles os protistas autótrofos
(fotossintetizantes), conhecidos como algas.

Quanto à organização do talo, as algas apresentam uma diversidade


muito grande. Existem desde formas microscópicas até formas que atingem
60 metros de comprimento, como as algas pardas do gênero Macrocystis.
Nesta unidade, tratamos dos grupos de algas que se caracterizam,
principalmente, por apresentar formas microscópicas, conhecidas
microalgas. Foram abordados: as cianobactérias, os seres euglenoides,
as algas Criptófitas (filo Cryptophyta), Haptófitas (filo Haptophyta), os
Dinoflagelados, as algas Diatomáceas (ou filo Bacillariophyta) e as algas
douradas (ou filo Chrysophyta), todos esses grupos se caracterizam na
grande maioria das vezes na forma de microalgas.

As cianobactérias, ou algas azuis, incluem representantes que muitas


vezes apresentam coloração azul. No entanto, podem ser esverdeadas,
avermelhadas ou enegrecidas. São organismos procarióticos, como
as bactérias, possuem a clorofila A, ficobiliproteínas, que são
51
Unidade I

pigmentos acessórios, e reserva de nitrogênio. A ficocianina, é uma


das ficobiliproteínas mais evidentes. O glicogênio é sua substância de
reserva e elas possuem mucopolissacarídeos presentes na bainha de
mucilagem com ausência de flagelos.

Os seres euglenoides se caracterizam por serem unicelulares; com


cloroplastos originados de simbiose com algas verdes; plastos com
pirenoide; possuírem dois flagelos apicais, um estigma fotorreceptor; e só
sua reprodução assexuada é conhecida. As algas criptófitas se caracterizam
por serem unicelulares, possuírem dois flagelos desiguais e pinados e são
produtores importantes resistentes à sazonalidade. As algas haptófitas
são unicelulares, com dois flagelos desiguais pinados e são produtores
importantes resistentes à sazonalidade. Já os dinoflagelados também são
unicelulares, têm dois flagelos em sulcos (longitudinal e transversal) ou
flagelos ausentes e são causadores da maré vermelha. As diatomáceas
também são unicelulares ou coloniais, com ausência de flagelos ou apenas
um nos gametas masculinos, e sua reprodução assexuada gera diminuição
do tamanho celular e obriga a realização de reprodução sexuada.

O último grupo tratado é o das algas douradas que são unicelulares ou


coloniais, com ausência de flagelos e reprodução assexuada predominante.
Elas causam florações em águas de abastecimento, gerando as chamadas
marés marrons.

As algas podem ser encontradas em diversos tipos de hábitats,


ocorrendo em ambientes de água doce e salgada, sobre troncos de árvores,
rochas, desertos, superfície de neves e geleiras e fontes termais. Os grupos
de microalgas abordados formam o fitoplâncton, comunidade constituída
por microalgas que vivem livres na coluna d’água de extrema relevância
ecológica, pois são a base da cadeia alimentar dos ecossistemas aquáticos,
uma vez que servem de alimentação a organismos maiores.

O termo “alga” inclui organismos de linhagens filogenéticas


completamente diferentes. Esses organismos não são necessariamente
semelhantes entre si e nem sempre possuem origem evolutiva próxima. No
entanto, a ciência que estuda as algas, a ficologia, considera as algas como
sendo organismos talófitos, ou seja, não são diferenciados em raízes, caules
e folhas fotossintetizantes que possuem em comum o pigmento clorofila
A e, com raras exceções, não apresentam um envoltório de células estéreis
nas células reprodutivas.

As algas de formas multicelulares podem apresentar a organização


do talo mais complexas, grande parte delas são caracterizadas como
Macroalgas e algumas podem atingir 60 metros de comprimento, como as
52
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

algas pardas do gênero Macrocystis, grupo de algas que, juntamente com


outros organismos, formam as verdadeiras florestas marinhas, também
conhecidas como kelps As macroalgas podem apresentar uma diversidade
enorme de formas. Grande parte dessas algas auxiliam na formação da
comunidade bentônica, que são organismos que crescem fixos sobre
qualquer superfície passível de ser colonizada, como rochas, esqueletos
de corais mortos etc. Tratamos do estudo dos aspectos morfológicos,
evolutivos, ecológicos e econômicos dos grupos de algas considerados
como Macroalgas; são elas as algas pardas (Phaeophyceae), posicionadas
no supergrupo Estramenópilos, e as algas do supergrupo correlacionado
com as Plantas; são elas rodófitas ou algas vermelhas (Rhodophyta) e as
algas verdes (Chlorophyceae, Ulvophyceae e Charophyceae).

As algas pardas, segundo a classificação atual, fazem parte do


supergrupo Estramenópilos, juntamente com os oomicetos (tipos de
fungos), as algas diatomáceas e as algas douradas, formando um grupo
monofilético que compartilha um ancestral em comum e apresenta como
principal característica a presença de dois flagelos, um liso e outro plumoso.
As algas pardas apresentam clorofilas A e C, entre os carotenoides a
fucoxantina é o pigmento que confere a coloração parda na alga. A parede
celular apresenta celulose na matriz mucilaginosa de alginato. Quase todas
marinhas multicelulares de filamentos ramificados, pseudoparênquima ou
parênquima; as parenquimatosas são as maiores algas existentes e podem
apresentar vesículas de ar.

Dentro do grupo de plantas e algas correlacionadas temos as algas


vermelhas. São conhecidas atualmente cerca de 6.000 espécies. Esse
grupo caracteriza‑se por habitar ambiente marinho bentônicos, sendo
predominantes nos mares tropicais, mas existem algumas espécies de água
doce. Esse grupo apresenta a clorofila A, ficobilinas e carotenoides, sendo
a substância de reserva o amido das florídeas, sendo que a celulose está
presente na parede celular na forma de ágar ou carragenano.

As algas verdes juntamente com as briófitas, as pteridófitas e as plantas


com sementes formam uma linhagem filogenética que inclui organismos
eucarióticos com um ancestral em comum que compartilham evidências
moleculares e estruturais como a presença das clorofilas A e B, bem como
o armazenamento de amido como substância de reserva. Esse grupo de
algas inclui praticamente todos os tipos de morfologia vegetativa, de
organismos unicelulares até as complexas plantas terrestres, e, talvez,
graças a essa grande diversidade de formas, foi a única linhagem dentro
das algas a colonizar com sucesso o ambiente terrestre. As algas verdes
apresentam as clorofilas A e B, além de carotenoides. O amido está presente
como substância de reserva e, como componente da parede celular, há
53
Unidade I

glicoproteínas e celulose. Elas estão distribuídas em três classes de algas


verdes: Chlorophyceae, Ulvophyceae e Charophyceae, esses grupos foram
delimitados por estudos estruturais citológicos e moleculares. Estudos
moleculares indicam que um grupo de Charophyceae é o mais próximo
das plantas terrestres.

Exercícios

Questão 1. (PUC‑SP) Analise as seguintes frases:

I – As diatomáceas são algas microscópicas constituintes do fitoplâncton.

II – As diatomáceas são produtores primários de ecossistemas marinhos.

III – As diatomáceas realizam fotossíntese liberando oxigênio para a atmosfera.

Pode‑se considerar que:

A) Apenas I é verdadeira.

B) Apenas II é verdadeira.

C) Apenas III é verdadeira.

D) I, II e III são verdadeiras.

E) I, II e III são falsas.

Resposta correta: alternativa D.

Análise das assertivas

I – Assertiva correta.

Justificativa: dentre os diversos grupos de algas presentes no fitoplâncton, as diatomáceas e


os dinoflagelados são os grupos de algas mais abundantes.

II – Assertiva correta.

Justificativa: os fitoplânctons, tendo como representantes as diatomáceas, são a base da cadeia


alimentar, uma vez que são o alimento dos organismos de origem animal que compõem o zooplâncton,
que por sua vez serve de alimento para peixes, e assim por diante.

54
BOTÂNICA – CRIPTÓGAMAS

III – Assertiva correta.

Justificativa: estudos comprovam que o fitoplâncton é responsável por 98% do oxigênio presente
na atmosfera do planeta. São mais eficientes do que as florestas na produção de oxigênio, pois liberam
mais oxigênio do que são capazes de consumir, o que não ocorre nas florestas, que produzem muito,
mas consomem igualmente, através de animais e plantas do próprio local.

Questão 2. (Mackenzie, 2002)

Figura 32

O desenho anterior representa o ciclo vital de um fungo ascomiceto. A respeito dele são feitas as
seguintes afirmações:

I – A indica o ascocarpo (corpo de frutificação), constituído por hifas tanto monocarióticas como dicarióticas.

II – B indica o asco, contendo oito ascósporos diploides.

III – A meiose que ocorre em C é denominada zigótica.

Assinale:

A) Se somente I estiver correta.

B) Se apenas I e II estiverem corretas.

C) Se apenas II e III estiverem corretas.

D) Se apenas I e III estiverem corretas.

E) Se todas estiverem corretas.

Resolução desta questão na plataforma.


55

Você também pode gostar