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Controle de Qualidade de

Produtos Farmacêuticos
Autoras: Profa. Marina de Freitas Silva
Profa. Michele Georges Issa
Profa. Michelle Maria Gonçalves Barão de Aguiar
Profa. Sabrina da Silva Sabo
Colaboradores: Prof. Juliano Rodrigo Guerreiro
Prof. Luiz Henrique Cruz de Mello
Professoras conteudistas: Marina de Freitas Silva / Michele Georges Issa /
Michelle Maria Gonçalves Barão de Aguiar / Sabrina da Silva Sabo

Marina de Freitas Silva Michelle Maria Gonçalves Barão de Aguiar

Farmacêutica-bioquímica pela Faculdade de Ciências Farmacêutica (2003) e mestre em Ciências Farmacêuticas


Farmacêuticas de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (2007) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e doutora
em Ciências (2016) pelo Programa de Fármaco e Medicamentos
(FCFRP-USP), mestre (2009) e doutora (2014) em Ciências
da Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, é docente
pelo Programa de Fármaco e Medicamentos da FCF-USP, no curso de Farmácia da Universidade Paulista, orientadora de
com ênfase em Biofarmácia e Farmacotécnica. Atualmente, é projetos de pesquisa de iniciação científica na mesma instituição
docente do curso de graduação em Farmácia e pós-graduação e revisora do periódico Brazilian Journal of Pharmaceutical
em Farmácia Clínica na Universidade Paulista. Docente do Sciences. Possui experiência nas áreas de controle de qualidade
programa de pós-graduação do Instituto Racine e analista de e tecnologia farmacêutica, com ênfase em temas como sólidos,
bioequivalência na Hypera. Possui experiência em estudos de sistemas farmacêuticos e mucoadesivos.
bioequivalência, biofarmacotécnica, correlação in vitro – in vivo
(Civiv), modelagem farmacocinética in silico, desenvolvimento Sabrina da Silva Sabo
de formulações e desenvolvimento analítico e bioanalítico.
Farmacêutica pela Universidade São Francisco (USF) em 2009,
Michele Georges Issa possui especialização lato sensu em Microbiologia Ambiental e
Industrial pela Sociedade Brasileira de Microbiologia (2011‑2012),
doutorado em Ciências pelo departamento de Tecnologia
Farmacêutica (2007), mestre (2011) e doutora (2016) Bioquímico-Farmacêutica da Faculdade de Ciências Farmacêuticas
pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade da Universidade de São Paulo (2017) e pós‑doutorado em
de São Paulo (FCF-USP), com estágio na University of Microbiologia Aplicada pela mesma instituição (2018). Docente
East Anglia, Reino Unido. Foi analista de desenvolvimento na Universidade Paulista no curso de Farmácia desde 2019.
analítico e farmacotécnico na Libbs Farmacêutica e atualmente é Trabalhou durante sete anos (2005‑2012) no Laboratório
pós‑doutoranda na FCF-USP, trabalhando em projetos de pesquisa Universitário de Análises Clínicas do Hospital Universitário São
no Laboratório de Desenvolvimento e Inovação Farmacotécnica Francisco (Bragança Paulista-SP), três dos quais atuou como
(Deinfar). Atua como docente na Universidade Paulista desde responsável técnica pela unidade de microbiologia. Possui
2010 e como professora colaboradora na FCF-USP desde 2020. experiência com microbiologia clínica e industrial, sobretudo
em processos biotecnológicos, com ênfase em bioprospecção e
Possui experiência em desenvolvimento de formulações,
fermentação, bem como produção, purificação e aplicação de
pré‑formulação, dissolução e delineamento experimental. biomoléculas de interesse industrial.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

S586c Silva, Marina de Freitas.

Controle de Qualidade de Produtos Farmacêuticos / Marina de Freitas


Silva, Michele Georges Issa, Michelle Maria Gonçalves Barão de Aguiar, Sabrina
da Silva Sabo. – São Paulo: Editora Sol, 2022.

216 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas


da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230.

1. Controle. 2. Qualidade. 3. Validação. I. Silva, Marina de Freitas. II. Issa,


Michele Georges. III. Aguiar, Michelle Maria Gonçalves Barão de. IV. Sabo,
Sabrina da Silva. V. Título.

CDU 615.1

U515.01 – 22

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
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Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático

Comissão editorial:
Profa. Dra. Christiane Mazur Doi
Profa. Dra. Angélica L. Carlini
Profa. Dra. Ronilda Ribeiro

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista
Profa. Deise Alcantara Carreiro

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Lucas Ricardi
Bruna Baldez
Jaci Albuquerque
Sumário
Controle de Qualidade de Produtos Farmacêuticos
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................9
INTRODUÇÃO......................................................................................................................................................... 10

Unidade I
1 CONCEITOS BÁSICOS EM CONTROLE DE QUALIDADE....................................................................... 11
1.1 Sistema da qualidade farmacêutica ............................................................................................. 11
1.1.1 O gerenciamento de qualidade e a garantia da qualidade.................................................... 13
1.1.2 Boas práticas de fabricação de medicamentos (BPF)............................................................... 14
1.1.3 Controle de qualidade .......................................................................................................................... 16
1.2 Legislações relacionadas ao controle de qualidade................................................................ 18
2 ANÁLISE FARMACOPEICA E ESPECIFICAÇÕES DA QUALIDADE...................................................... 20
2.1 Especificações......................................................................................................................................... 20
2.1.1 Especificações para matérias-primas.............................................................................................. 23
2.1.2 Especificações para materiais de embalagem.............................................................................. 24
2.1.3 Especificações para produtos intermediários e produtos a granel..................................... 25
2.1.4 Especificações para produtos acabados......................................................................................... 25
2.2 Padrões de referência e substâncias químicas de referência.............................................. 27
2.3 Monografias ........................................................................................................................................... 28
2.4 Validação de método analítico ....................................................................................................... 30
3 AMOSTRAGEM................................................................................................................................................... 31
3.1 Tipos de amostragem........................................................................................................................... 33
3.2 Plano de amostragem.......................................................................................................................... 34
3.3 Técnicas de amostragem.................................................................................................................... 37
3.4 Preparo de amostras............................................................................................................................ 38
3.4.1 Cálculos empregados no preparo das amostras.......................................................................... 41
4 MÉTODOS DE ANÁLISE DE MATERIAIS DE EMBALAGEM................................................................. 45

Unidade II
5 CONTROLE DE QUALIDADE DE MATÉRIAS-PRIMAS........................................................................... 56
5.1 Ensaios de identificação..................................................................................................................... 56
5.1.1 Análise das características organolépticas.................................................................................... 56
5.1.2 Ensaios analíticos de identificação................................................................................................... 57
5.2 Ensaios de pureza.................................................................................................................................. 62
5.2.1 Determinação do pH.............................................................................................................................. 62
5.2.2 Impurezas orgânicas: substâncias relacionadas.......................................................................... 63
5.2.3 Impurezas inorgânicas........................................................................................................................... 65
5.3 Ensaios de doseamento...................................................................................................................... 68
5.3.1 Métodos não instrumentais................................................................................................................ 68
5.3.2 Métodos instrumentais......................................................................................................................... 73
6 CONTROLE DE PRODUTOS ACABADOS.................................................................................................... 76
6.1 Líquidos..................................................................................................................................................... 76
6.1.1 pH .................................................................................................................................................................. 77
6.1.2 Aspectos reológicos................................................................................................................................ 78
6.1.3 Características organolépticas e sensoriais................................................................................... 80
6.1.4 Limpidez das soluções............................................................................................................................ 81
6.1.5 Determinação de volume..................................................................................................................... 81
6.1.6 Teste de gotejamento............................................................................................................................. 82
6.2 Semissólidos............................................................................................................................................ 82
6.2.1 Ensaios físicos .......................................................................................................................................... 84
6.2.2 Ensaios químicos...................................................................................................................................... 92
6.2.3 Ensaios microbiológicos........................................................................................................................ 94
6.3 Sólidos......................................................................................................................................................100
6.3.1 Peso.............................................................................................................................................................100
6.3.2 Aspecto......................................................................................................................................................101
6.3.3 Dureza........................................................................................................................................................102
6.3.4 Friabilidade (aparelho: friabilômetro)............................................................................................103
6.3.5 Desintegração (aparelho: desintegrador).....................................................................................103
6.3.6 Dissolução (aparelho: dissolutor)....................................................................................................105
6.3.7 Teor do princípio ativo.........................................................................................................................108
6.3.8 Uniformidade de doses unitárias....................................................................................................119
6.3.9 Granulometria........................................................................................................................................ 120
6.3.10 Ângulo de repouso............................................................................................................................. 122
6.3.11 Umidade: Karl Fischer ou perda por dessecação (avaliação da quantidade de
água no produto evitando alterações no produto)........................................................................... 123
6.3.12 pH............................................................................................................................................................. 123

Unidade III
7 CONTROLE DE QUALIDADE MICROBIOLÓGICO..................................................................................130
7.1 Controle microbiológico de produtos estéreis........................................................................131
7.1.1 Principais fontes de contaminação microbiana........................................................................131
7.1.2 Microrganismos de interesse farmacêutico............................................................................... 134
7.1.3 Cinética de morte microbiana: aspectos logarítmicos.......................................................... 136
7.1.4 Nível de segurança de esterilidade (Sterility Assurance Level – SAL).............................. 138
7.1.5 Teste de esterilidade............................................................................................................................ 143
7.1.6 Teste de pirogênio................................................................................................................................ 148
7.1.7 Salas limpas............................................................................................................................................. 157
7.2 Controle microbiológico de produtos não estéreis...............................................................167
7.2.1 Amostragem, preparação da amostra e diluições seriadas decimais para
análises microbiológicas............................................................................................................................... 167
7.2.2 Teste de limite microbiano e métodos de contagem..............................................................171
7.2.3 Pesquisa de patógenos....................................................................................................................... 179
8 VALIDAÇÃO ANALÍTICA................................................................................................................................188
8.1 Conceitos e importância..................................................................................................................188
8.1.1 Conceitos e definições........................................................................................................................ 188
8.2 Principais parâmetros de validação.............................................................................................190
8.2.1 Seletividade..............................................................................................................................................191
8.2.2 Especificidade..........................................................................................................................................191
8.2.3 Precisão..................................................................................................................................................... 192
8.2.4 Exatidão.................................................................................................................................................... 192
8.2.5 Linearidade.............................................................................................................................................. 194
8.2.6 Limite de detecção............................................................................................................................... 195
8.2.7 Limite de quantificação...................................................................................................................... 196
8.2.8 Robustez................................................................................................................................................... 196
8.2.9 Efeito matriz........................................................................................................................................... 198
8.2.10 Estabilidade........................................................................................................................................... 198
8.3 Validação de métodos microbiológicos......................................................................................198
APRESENTAÇÃO

Desde sempre a qualidade é um aspecto inerente à atividade produtiva. A partir do momento em que
a fabricação de produtos farmacêuticos toma escalas ampliadas, ferramentas que auxiliam o controle da
produção vão sendo desenvolvidas paralelamente ao surgimento de técnicas analíticas mais apuradas.

Nesse sentido, o controle de qualidade – ferramenta da garantia da qualidade no contexto das boas
práticas de fabricação (BPF) – é uma área extremamente abrangente e aplicável tanto na indústria
farmacêutica quanto na farmácia de manipulação.

Este livro-texto foi organizado de modo que seja inicialmente dada uma visão geral do controle de
qualidade. Após discussão dos conceitos fundamentais, uma abordagem sobre análise farmacopeica
e estabelecimento de especificações é apresentada, além de considerações sobre amostragem e
preparo de amostras, sendo a unidade I finalizada com os métodos empregados para a avaliação de
materiais de embalagem.

A unidade II traz os métodos analíticos destinados à avaliação da qualidade de matérias-primas e


produtos acabados, que foram divididos em produtos líquidos, semissólidos e sólidos. Neste ponto, são
enfatizados os ensaios físico-químicos, alguns farmacopeicos e outros relativos ao próprio produto,
sendo considerados não oficiais.

O controle de qualidade microbiológico é abordado na unidade III, com a divisão dos produtos em
estéreis e não estéreis. Será feita uma discussão dos principais testes microbiológicos empregados, além
dos aspectos dos processos de esterilização e produção em ambientes controlados.

Considerando que um método analítico deve ser desafiado de modo a demonstrar a sua adequabilidade
à finalidade pretendida, no tópico final do livro-texto serão tratados os aspectos das validações de
metodologia analítica e de ensaios microbiológicos.

Ao passar por todo o conteúdo do livro-texto, o aluno terá uma boa noção do controle de qualidade
de produtos manipulados e especialidades farmacêuticas.

9
INTRODUÇÃO

Prezado aluno,

A qualidade é questão fundamental na manipulação e produção de medicamentos e cosméticos.


Dentro desse contexto, reside uma das principais atribuições do profissional farmacêutico: o controle de
qualidade. Dada a sua importância, análises para atestar a qualidade, sejam elas de caráter físico‑químico
ou microbiológico, são realizadas em todas as fases da cadeia produtiva, desde a avaliação dos insumos,
passando pelos produtos semiacabados e terminados.

O farmacêutico é peça fundamental nesse processo, atuando diretamente na realização das


análises. É de extrema relevância o desenvolvimento de habilidades para a execução de ensaios
analíticos e interpretação de resultados, além do conhecimento das ferramentas relacionadas ao
funcionamento e implantação do sistema de gerenciamento da qualidade e à aplicação das boas
práticas de fabricação e das boas práticas de laboratório.

Tendo em vista a importância dessas habilidades, o presente livro-texto foi elaborado com o intuito
de convidá-lo a mergulhar nesse cenário, de modo que os princípios do controle de qualidade não apenas
façam parte de sua vivência acadêmica, mas também sirvam de inspiração para a tomada assertiva de
decisões na sua vida profissional.

Esperamos que faça um bom proveito.

Bons estudos!

10
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Unidade I
1 CONCEITOS BÁSICOS EM CONTROLE DE QUALIDADE

A qualidade pode ser conceituada como um grupo de propriedades esperadas de um determinado


produto. Quando esse produto é um medicamento, o campo de estudo que avalia tal quesito é
chamado de controle de qualidade.

Assim, o controle de qualidade é uma área dentro das ciências farmacêuticas que se apresenta como
indispensável na produção de medicamentos. O conceito de qualidade em outras áreas produtivas pode
refletir competitividade, satisfação do consumidor e preferências do usuário a um produto; porém, no
caso de produtos farmacêuticos, é uma obrigação do fabricante assegurar sua qualidade (de acordo com
a legislação sanitária). Isso porque tais produtos podem comprometer a saúde dos que fazem uso deles
caso não atendam às especificações.

A obrigatoriedade da qualidade em medicamentos deve ser cumprida e estar de acordo com a


legislação sanitária vigente. A agência reguladora em território nacional é a Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (Anvisa), responsável por redigir os atos normativos que orientam os estabelecimentos
produtores de medicamentos. A produção de medicamentos, bem como as diretrizes da avaliação da
qualidade, é norteada no Brasil pelas Resoluções RDC n. 301, de 21 de agosto de 2019 (a qual versa
sobre as boas práticas de fabricação de medicamentos), e n. 67, de 8 de outubro de 2007 (que trata das
boas práticas de manipulação de preparações magistrais e oficinais para uso humano em farmácias).
A primeira refere-se ao setor industrial e a segunda, ao setor magistral. Todavia, não são apenas essas
legislações que abordam a qualidade dos medicamentos, como poderá ser visto ao longo do livro-texto.

A qualidade na produção de medicamentos refere-se a atender aos requisitos mínimos de


qualidade, autenticidade e pureza dos produtos e das matérias-primas (insumos farmacêuticos ativos
e excipientes). Esses requisitos, denominados especificações, estão estabelecidos em um compêndio
farmacêutico oficial denominado Farmacopeia Brasileira, que atualmente encontra-se na 6ª edição, a
qual foi publicada em 2019.

1.1 Sistema da qualidade farmacêutica

Na indústria farmacêutica, para que a qualidade seja garantida e os produtos sejam confiáveis, deve
ser implementado o sistema da qualidade farmacêutica. Esse sistema tem como objetivo estabelecer
um modelo eficaz de gestão da qualidade para a indústria farmacêutica referente ao Guia Q10 de
Conselho Internacional sobre Harmonização de Requisitos Técnicos em Produtos Farmacêuticos para
Uso Humano (em inglês, International Conference on Harmonisation of Technical Requirements for
Registration of Pharmaceuticals for Human Use, ou ICH). O ICH congrega autoridade em todo o mundo

11
Unidade I

na regulação de medicamentos e seus fabricantes. Assim, a Anvisa faz parte do ICH, o que permite sua
participação na harmonização da legislação sanitária nacional com a legislação internacional.

O sistema da qualidade farmacêutica foi um modelo proposto pelo ICH considerando os conceitos
de qualidade da Organização Internacional de Padrões (em inglês, International Standards Organization,
ou ISO).

O objetivo é que esse modelo de sistema de qualidade possa ser implementado pelos fabricantes
de medicamentos nas diferentes fases de vida do produto final. Apesar de o sistema da qualidade
farmacêutica ter sido proposto por uma entidade internacional – o ICH –, ele se encontra completamente
contemplado na legislação brasileira sanitária, mais especificamente na Resolução RDC n. 301, de 2019.

Na figura a seguir estão descritos os níveis da qualidade e como ocorrem as relações entre eles.

Sistema da qualidade farmacêutica

Gerenciamento da qualidade

Boas práticas de fabricação


Controle de qualidade
Controle de Controle de
qualidade qualidade
físico‑químico microbiológico

Figura 1 – Níveis da qualidade e suas relações

O sistema da qualidade farmacêutica deve conter as seguintes exigências:

• ser documentado e monitorado, através de revisão gerencial do próprio sistema pela equipe
designada, com fim de permitir o aperfeiçoamento constante das práticas realizadas;

• possuir recursos apropriados e satisfatórios, como instalações, equipamentos e pessoal;

• para implementar ou alterá-lo, devem ser considerados os princípios sobre gerenciamento de risco
(entende-se como risco à saúde a probabilidade de ocorrência de efeitos adversos relacionados a
objetos submetidos a controle sanitário, segundo o Conselho Nacional de Secretários de Saúde)
(BRASIL, 2007b).

Além disso, para que um sistema da qualidade farmacêutica seja considerado satisfatório, deve
assegurar diversos quesitos, alguns descritos no quadro a seguir, segundo a Resolução RDC n. 301,
de 2019. Ainda, a qualidade na produção de medicamentos de uso humano apresenta níveis, os quais
12
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

estabelecem relações entre si, conforme descrito na figura anterior. Desse modo, pode-se observar que
há o sistema da qualidade farmacêutica, o gerenciamento da qualidade, as boas práticas de fabricação
e o controle de qualidade.

Quadro 1 – Quesitos para um sistema da qualidade adequado,


segundo a legislação sanitária vigente

A criação do produto deve ser realizada por meio de projeto, planejamento, implementação, manutenção e melhora constante
de um sistema, o qual possibilite a fabricação reprodutível dos medicamentos, com suas devidas propriedades de qualidade
A criação de medicamentos e seu desenvolvimento devem considerar as boas práticas de fabricação
As atividades relacionadas à produção e ao controle de medicamentos devem ser especificadas de forma compreensível e de
acordo com as boas práticas de fabricação
As responsabilidades gerenciais devem ser claras e especificadas
Deve-se assegurar que a fabricação, o fornecimento e o uso das matérias-primas e materiais de embalagem sejam apropriados
É necessário realizar a escolha e o monitoramento dos fornecedores, e verificar a conformidade de cada recebimento dos
fornecedores previamente aprovados (qualificação de fornecedores)
A qualificação de fornecedores relaciona-se com o conhecimento do material oferecido pelo fornecedor, o que impacta
diretamente na qualidade dos medicamentos fabricados a partir dele
Os resultados da monitorização de produtos e processos devem ser considerados para a aprovação dos lotes, bem como na
pesquisa de desvios e controle para desempenho do processo e para a qualidade do produto
Deve-se realizar os controles requeridos para os produtos intermediários e outros controles em processo e validações
A comercialização e a distribuição de medicamentos devem ser realizadas após a avaliação de cada lote de produto produzido
e controlado, de acordo com seu registro e as normas relacionadas à produção, ao controle e à liberação dos medicamentos,
pela pessoa designada pelo sistema da qualidade farmacêutica
É necessário implementar mecanismos que assegurem que o armazenamento, a distribuição e o transporte de medicamentos
sejam realizados para manter a qualidade durante a vida útil
É preciso prover um processo de autoinspeção que analise periodicamente a afetividade do sistema da qualidade farmacêutica

Adaptado de: Brasil (2019a).

Pode-se notar que o conceito de qualidade vai além de verificar e analisar as matérias-primas,
os produtos intermediários (produtos parcialmente fabricados e que ainda precisam ser submetidos a
mais etapas de produção antes de se tornarem um produto a granel), os produtos a granel (produtos
que foram completamente processados, mas ainda não se encontram em sua embalagem primária),
os produtos acabados e os materiais de embalagem. De fato, a qualidade é de responsabilidade da
administração da empresa detentora da autorização de fabricação do produto e relaciona-se com toda
participação das equipes em todos os níveis da organização e com todas as ações que, em última
instância, podem impactar direta ou indiretamente as propriedades, a estabilidade, a eficácia e a
segurança dos medicamentos fabricados pela empresa.

1.1.1 O gerenciamento de qualidade e a garantia da qualidade

No quesito qualidade, há diversos termos e definições que devem ser esclarecidos para melhor
compreensão de como traçar estratégias periódicas e revisões contínuas dos parâmetros da qualidade.
Alguns deles serão apresentados a seguir.

13
Unidade I

O gerenciamento de qualidade abrange todas as esferas da produção de medicamentos que podem


influenciar em sua qualidade. Ele é representado pelo somatório de todas as ações e arranjos realizados
pela empresa fabricante para garantir a qualidade exigida dos medicamentos e, assim, permitir seu
uso com segurança. Ainda, o gerenciamento da qualidade incorpora as boas práticas de fabricação.
É um conjunto de ações gerenciais que ditam como a empresa estabelece sua política de qualidade,
contemplando objetivos, responsabilidades, planejamentos e controles.

Já a garantia da qualidade pode ser entendida como um conjunto de procedimentos e processos


que busca a prevenção de deformidades, falhas e erros, evitando qualquer tipo de retrabalho e desvios
de qualidade. Isso porque os custos financeiro e humano para reparar os desvios são inegavelmente
maiores do que aqueles para a realização de treinamento de pessoal, qualificação de fornecedores e
controle de qualidade de insumos e produtos acabados – sem contar a imagem negativa que fica para
parte da população quando os desvios levam a recall de produtos, problemas de saúde (que podem ser
graves) e pagamento de indenizações.

Segundo a Resolução RDC n. 301, de 2019, o desvio pode ser definido como o não cumprimento de
exigências estabelecidas pelo sistema de gerenciamento da qualidade farmacêutica.

Na indústria farmacêutica, há um grupo de profissionais contratados que formam um departamento


ou setor, de acordo com cada empresa, responsáveis pela garantia da qualidade. Eles realizam a verificação
das atividades de toda a organização que podem impactar direta ou indiretamente com a qualidade dos
produtos ali fabricados, assegurando que as medidas necessárias sempre serão tomadas por parte de
cada profissional para alcance da qualidade. Entre essas ações e profissionais, encontra‑se o controle
de qualidade, responsável por avaliar a qualidade de insumos, produtos intermediários, produtos a
granel, produtos acabados e materiais de embalagem, de acordo com as especificações. Este será o
assunto do tópico 2 deste livro-texto.

1.1.2 Boas práticas de fabricação de medicamentos (BPF)

Diferentemente de outros países, como os Estados Unidos, o Brasil teve sua agência reguladora
criada bem recentemente, através da Lei n. 9.782, de 26 de janeiro de 1999. Anteriormente à criação
da Anvisa, o próprio Ministério da Saúde, por meio da Secretaria de Vigilância Sanitária, tinha a função de
controlar, regulamentar e inspecionar a produção e as demais atividades relacionadas a medicamentos,
além de outros produtos e serviços de interesse para a saúde.

Como marco regulatório, a primeira legislação sanitária que vigorou no Brasil referindo-se às BPF
foi a Portaria SVS/MS n. 16, de 6 de março de 1995. Essa portaria foi baseada no Guia de Boas Práticas
de Fabricação para a Indústria Farmacêutica, que foi redigido a partir de um fórum promovido pela
Organização Mundial de Saúde (OMS).

Após alguns anos, já sob a responsabilidade da Anvisa, essa portaria foi revogada, e a agência publicou
a Resolução RDC n. 134, de 13 de julho de 2001, seu primeiro ato normativo sobre BPF. Nela, novamente,
as orientações da OMS foram acatadas a respeito da certificação da qualidade de medicamentos, e o
documento contou com um roteiro de inspeção.
14
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Posteriormente, a Resolução RDC n. 134 foi revogada, e a Anvisa publicou então a Resolução
RDC n. 210, de 4 de agosto de 2003, trazendo os critérios de avaliação do roteiro de inspeção para os
fabricantes de medicamentos, pautados no risco à qualidade e à segurança dos produtos farmacêuticos.
Essa resolução ainda consolida a obrigatoriedade de validação de metodologia analítica.

Na sequência, a Resolução RDC n. 210 foi revogada e a Resolução RDC n. 17, de 16 de abril de 2010,
tomou seu lugar. A legislação de 2010 abordava, além das BPF, pontos específicos como validação, água
para uso farmacêutico, medicamentos fitoterápicos, produtos biológicos e principalmente produtos
estéreis. Apresentou, ainda, a obrigação da validação de sistemas computadorizados. Posteriormente,
essa resolução também foi revogada.

Atualmente, é a Resolução RDC n. 301, de 2019, e suas instruções normativas que regem as BPF.
Assim, as empresas fabricantes de medicamentos devem segui-las. Essa legislação é diferente das
anteriores, pois apresenta na própria resolução o sistema da qualidade farmacêutica, mas as demais
normas e diretrizes foram redigidas em instruções normativas. Acredita-se que essa forma visa facilitar
novas publicações e alterações, já que a instruções apresentam trâmites para alteração mais fáceis
quando comparados aos das resoluções.

As instruções normativas e suas ementas são: Instrução Normativa IN n. 35, 36, 37, 38, 39,
40, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 47 e 48, que dispõem de BPF complementares a medicamentos estéreis;
insumos e medicamentos biológicos; medicamentos radiofármacos; gases substâncias ativas e gases
medicinais; medicamentos fitoterápicos; atividades de amostragem de matérias-primas e materiais de
embalagens utilizados na fabricação de medicamentos; medicamentos líquidos, cremes ou pomadas;
medicamentos aerossóis pressurizados dosimetrados para inalação; sistemas computadorizados
utilizados na fabricação de medicamentos; radiação ionizante na fabricação de medicamentos;
medicamentos experimentais; medicamentos hemoderivados; atividade de qualidade e validação;
amostras de referência e retenção, respectivamente.

Assim, é sabido que todas as etapas realizadas em medicamentos, como armazenamento, distribuição
e transporte, podem influenciar na sua qualidade. Todavia, é a fabricação um dos pontos mais críticos e,
por isso, deve ser de grande atenção para a autoridade sanitária.

As boas práticas de fabricação são normas aplicáveis às atividades de produção de medicamentos,


incluindo aqueles destinados a ensaios clínicos, assim como o armazenamento e distribuição de produtos
para saúde. Elas visam garantir que as indústrias farmacêuticas atendam às exigências de identidade,
teor, qualidade e pureza dos medicamentos.

Os regulamentos definem critérios para todas as atividades envolvidas na produção de medicamentos


industrializados, desde a aquisição de insumos farmacêuticos até a comercialização dos produtos, e
ainda não isentam o fabricante de suas responsabilidades, caso os medicamentos apresentem desvios
de qualidade ao chegar ao consumidor final. Para tanto, as BPF abrangem diversas áreas dentro da
indústria farmacêutica, tais como as listadas a seguir.

15
Unidade I

• Métodos: fabricação de produtos; validação de métodos; procedimentos apropriados; análises de


insumos; produtos acabados, intermediários e a granel.

• Equipamentos e infraestrutura: manutenção periódica; qualificação; limpeza; uso correto do


maquinário; controle ambiental.

• Insumos farmacêuticos: qualidade dos insumos farmacêuticos ativos, excipientes e materiais


de embalagem; qualificação de fornecedores; atendimento às especificações para compra de
materiais.

• Pessoal: pessoal qualificado para desempenho de suas atividades; treinamentos e capacitação;


infraestrutura adequada para o exercício de suas atividades.

• Documentação: registro de todas as atividades realizadas.

Para além disso, as BPF fazem parte do gerenciamento da qualidade e garantem que os medicamentos
sejam continuamente produzidos e controlados, considerando os possíveis desvios de qualidade, quando
esses são comparados ao pretendido e requerido à autoridade sanitária no registro do produto, na
autorização para uso em ensaio clínico ou na especificação do produto. Desse modo, o cumprimento
das BPF visa à diminuição de riscos inerentes a qualquer produção farmacêutica, os quais não podem
ser detectados apenas em ensaios feitos em produtos acabados pelo controle de qualidade.

1.1.3 Controle de qualidade

A qualidade dos medicamentos resulta em três propriedades essenciais que os medicamentos devem
possuir: segurança, eficácia e estabilidade. A averiguação da qualidade exige que os profissionais que
nela atuam tenham conhecimentos sólidos de diversas áreas. Sendo assim, o controle de qualidade de
medicamentos é uma atividade privativa do profissional farmacêutico, segundo o Conselho Federal
de Farmácia (CFF, 2002).

Ainda, a administração superior das empresas fabricantes de medicamentos deve designar o


responsável pelo controle de qualidade e este deve ter independência em relação ao responsável pela
produção, para que não ocorram possíveis conflitos de interesse entre a produção e o controle. Ademais,
o responsável pelo controle de qualidade tem como atribuições: aprovar ou reprovar matérias-primas,
materiais de embalagem, produtos intermediários, a granel e acabados; aprovar as especificações,
procedimentos de amostragem e métodos de análise do controle de qualidade; garantir treinamento e
capacitação do pessoal que atua no controle de qualidade; avalizar que as validações obrigatórias sejam
feitas; e assegurar que os ensaios necessários sejam feitos e devidamente documentados. Também é
uma obrigatoriedade que a empresa detentora de registro de medicamentos tenha um departamento
de controle de qualidade que conte com um ou mais laboratórios, infraestrutura, material e pessoal para
o desempenho das atividades estabelecidas pela legislação sanitária vigente.

O controle de qualidade é a parcela das boas práticas de fabricação e refere-se à coleta de amostras,
às especificações e à realização de testes. Ainda compete a ele a organização, a documentação e os
16
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

procedimentos de liberação, os quais asseguram que os ensaios necessários e indispensáveis serão


efetuados e que os materiais serão liberados para uso, ou os produtos serão liberados para comercialização
e/ou distribuição, apenas quando sua qualidade for devidamente comprovada.

Dessa forma, é o controle de qualidade o responsável por avaliar a qualidade das matérias-primas
que serão empregadas para a fabricação dos medicamentos, bem como os materiais de embalagem
e os medicamentos ali fabricados. Também é de sua responsabilidade realizar e monitorar os estudos
de estabilidade dos produtos acabados. Para tanto, o controle de qualidade deve cumprir requisitos
mínimos para averiguar adequadamente esses produtos, conforme a Resolução RDC n. 301, de 2019.
Os requisitos são apresentados a seguir.

• Possuir instalações apropriadas (infraestrutura, espaço, equipamentos, reagentes, materiais,


utensílios, vidrarias, entre outras) na forma de laboratório, pessoal capacitado e treinado e
procedimentos aprovados (devem estar acessíveis para amostragem e ensaio de matérias-primas,
materiais de embalagem, produtos intermediários, a granel e acabados).

• Recolher e manter em sua guarda amostras de matérias-primas, produtos acabados, intermediários,


a granel e materiais de embalagem.

• Ter métodos analíticos validados (a validação de metodologia analítica deve ser realizada conforme
a Resolução RDC n. 166, de 24 de maio de 2017, e definida como a avaliação e sua comprovação
de um método usando ensaios experimentais que confirmem e concedam resultados de que
os requisitos para o uso de tal método são seguros e confiáveis), de acordo com a legislação
sanitária vigente.

• Documentar (manual ou eletronicamente) os procedimentos realizados de amostragem, inspeção e


testes, e garantir que os desvios, se existirem, sejam categoricamente documentados e averiguados.

• Ter guarda de amostras de referências de matérias-primas e produtos acabados para análises


futuras, caso necessárias, e que devem ser mantidos de acordo com suas características e em
conformidade à instrução normativa própria.

• Garantir que todos os lotes só sejam liberados para comercialização e/ou distribuição após a sua
certificação por pessoa encarregada do Sistema de Gestão da Qualidade.

• Registrar os resultados dos ensaios feitos em produtos terminados, a granel, intermediários,


materiais de embalagem e matérias-primas, segundo as suas especificações.

• Registrar os resultados de inspeção.

Tendo o departamento de controle de qualidade todo o aparato necessário para o desempenho


adequado de suas atividades, suas obrigações dentro da indústria farmacêutica estão descritas no
quadro a seguir.

17
Unidade I

Quadro 2 – Atividades desempenhadas pelo departamento


de controle de qualidade

Assegurar a precisa etiquetagem dos recipientes onde serão acondicionados materiais e produtos
Monitorar os estudos de estabilidade (curta e longa duração) de produtos acabados
Participar da investigação de reclamações feitas à empresa sobre problemas de qualidade de medicamentos
Supervisionar o controle de referência e/ou retenção de amostras de materiais e produtos

Essas atividades desempenhadas pelo departamento de controle de qualidade são divididas em duas
áreas a depender das análises. Quando os testes são de caráter físico e/ou químico, como o doseamento de
insumo farmacêutico ativo ou desintegração de comprimidos, eles são feitos pelo controle de qualidade
físico-químico. Já quando os ensaios são de caráter microbiológico, como contagem de microrganismos
presentes em um produto não estéril, são realizados pelo controle de qualidade microbiológico.

Ao longo deste livro-texto, serão descritos detalhadamente os aspectos físicos, químicos e


microbiológicos das análises que devem ser realizadas para garantir que os produtos acabados
apresentem a qualidade desejada pelos pacientes, e que esta seja uma obrigatoriedade do fabricante
de medicamentos.

1.2 Legislações relacionadas ao controle de qualidade

Segundo Abbagnano (2007), lei pode ser definida como uma regra categoricamente necessária, ou
seja, quando é impossível que o fato ocorra de outro modo ou ainda quando há uma força que permita
que determinado ato seja realizado de dada maneira.

No Brasil, a Constituição Federal de 1988, conhecida como Carta Magma, é a lei fundamental e
suprema, sendo considerada a base de todo ordenamento jurídico nacional. Todas as legislações e atos
normativos devem estar de acordo com ela, sem afrontar a lei maior, pois podem ser considerados
inconstitucionais.

A legislação é regida por uma hierarquia jurídica, ou seja, há um ordenamento de como cada ato
normativo é submetido a um ato maior a ele, até que se alcance a Constituição Federal. Todavia, essa
visão não parece ser unânime e há juristas que julgam a inexistência de tal interpretação.

A Constituição Federal, no artigo 200, atribui ao Sistema Único de Saúde (SUS) a competência
de controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para saúde e participar da
produção de medicamentos. Então, segundo a própria Constituição, são deveres do estado, através
do SUS, o controle e a fiscalização de matérias-primas e produtos acabados que possam trazer riscos
à saúde das pessoas, tais como medicamentos, correlatos e cosméticos, bem como os processos para
fabricação, controle, distribuição e comercialização. Nota-se que no âmbito do SUS, para realizar essas
atribuições, foi constituída a Anvisa.

Para o cumprimento da lei fundamental, vários atos normativos foram elaborados e vigoram para
garantir a saúde da população brasileira. A Constituição Federal não contém o detalhamento das regras

18
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

que devem ser seguidas, mas ela promove a base para que legislações possam ser redigidas e mostra como
os processos devem ser realizados. Há as leis complementares, as leis ordinárias, as medidas provisórias, os
decretos-leis, os decretos, as resoluções, as portarias, as instruções normativas e as resoluções do CFF.

Ainda, os atos legais podem perder sua validade e partes deles podem deixar de valer. Quando isso
ocorre, diz-se que o ato ou parte dele foi revogado – logo, esse ato não deve ser mais seguido. Em geral,
quando essa situação ocorre, um novo ato já foi feito. Assim, diz-se que o novo ato está vigente – isto
é, está valendo – e deve ser obrigatoriamente seguido.

Por fim, as legislações podem ser das esferas federal, estadual e municipal. Logo, um ato legal
estadual não pode ser mais exigente que um ato federal, assim como um ato municipal não pode ser
mais restrito que atos estaduais e federais. O ato federal tem validade em todo o território nacional, bem
como o ato estadual se restringe ao seu estado de origem e o ato municipal, ao seu município.

As leis complementares são aquelas que, como o nome sugere, complementam a Constituição Federal.
Elas regulamentam matérias importantes e presentes na Constituição e assumem, assim, o caráter de
lei constitucional. Ainda, apresentam maior valor que outras leis, exceto a própria Constituição. Sem
elas, certos dispositivos constitucionais não podem ser aplicados por falta de detalhamento na lei
suprema. São aprovadas pelo Congresso Nacional (deputados e senadores) por maioria absoluta. Já as
leis ordinárias são as leis propriamente ditas, ou seja, as demais leis, e nelas são abordadas matérias que
não são previstas na Constituição Federal. Devem ser aprovadas pelo Congresso Nacional para serem
validadas e por maioria simples.

No caso do controle de qualidade, as leis relacionadas são as ordinárias. São elas: Lei n. 5.991, de 17 de
dezembro de 1973 (dispõe sobre o controle sanitário de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos
e correlatos, e dá outras providências); Lei n. 6.360, de 23 de setembro de 1976 (dispõe sobre a vigilância
sanitária a que ficam sujeitos os medicamentos, as drogas, os insumos farmacêuticos e os correlatos,
cosméticos, saneantes e outros produtos, e dá outras providências); Lei n. 8.080, de 19 de setembro de
1990 (trata da organização e funcionamento dos serviços de saúde); Lei n. 9.695, de 20 de agosto
de 1998 (dispõe sobre a falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produtos medicinais como
crime hediondo); Lei n. 9.787, de 26 de janeiro de 1999 (define o Sistema Nacional de Vigilância
Sanitária, cria a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, e dá outras providências); Lei n. 9.787,
de 10 de fevereiro de 1999 (altera a Lei n. 6.360, de 23 de setembro de 1976, que dispõe sobre a
vigilância sanitária, estabelece o medicamento genérico).

As resoluções são determinações que indicam o ato pelo qual o poder público decide, impõe uma
ordem ou estabelece uma medida, e partem de órgãos colegiados (como a Anvisa). Elas dispõem de
questões administrativas ou regulamentares. No que se refere ao controle de qualidade, há diversas
resoluções vigentes que abordam diversos temas de atuação, como: boas práticas de fabricação
de medicamentos, uso de compêndios internacionais, validação de metodologia analítica, estudo de
estabilidade, entre outros. Logo, os profissionais dessa área devem estar sempre atentos às legislações
que permeiam sua atuação e acompanhar novas publicações, alterações ou vigência.

19
Unidade I

2 ANÁLISE FARMACOPEICA E ESPECIFICAÇÕES DA QUALIDADE

Os requisitos para quaisquer medicamentos, independentemente do tipo e do modo de produção,


são segurança, eficácia e qualidade. Quando se trata de qualidade de medicamentos, sua avaliação
deve ser objetiva, norteada por limites específicos e preestabelecidos pela autoridade sanitária do país,
compreendidos em um compêndio oficial e em legislações sanitárias vigentes.

Desse modo, os insumos farmacêuticos ativos (IFA), excipientes, materiais de embalagem, produtos
intermediários, produtos a granel e produtos acabados devem ser categoricamente avaliados quanto a
sua qualidade. Essa avaliação é realizada tendo como parâmetros as especificações, as quais determinarão
se os insumos, materiais de embalagem, produtos intermediários, produtos a granel e produtos acabados
estão aptos para o consumo.

No caso dos insumos e materiais de embalagem, sua qualidade deve ser avaliada antes de serem
empregados na produção de medicamentos, para garantir que estejam apropriados para a produção de
medicamentos. Já para os produtos acabados, sua qualidade também deve ser analisada para verificar
se são adequados para o uso da população e garantir que não haverá problemas aos pacientes devido
a questões de qualidade.

Nota-se, então, que é de extrema importância estabelecer os requisitos que vão assegurar que os
insumos farmacêuticos ativos, excipientes, materiais de embalagem, produtos intermediários, produtos
a granel e produtos acabados são apropriados para uso, e isso deve ser feito de forma homogênea, sem
gerar dúvidas ou ficar a critério das empresas fabricantes de medicamentos. Assim, as especificações
devem ser definidas antes do emprego de insumos na produção de medicamentos e na comercialização
dos produtos terminados.

Além dos medicamentos, na área de atuação do profissional farmacêutico, a fabricação e o controle de


qualidade de outros produtos que também podem apresentar riscos à saúde estão sujeitos à fiscalização
da vigilância sanitária (em todas as suas esferas) e às normas sanitárias regulamentadas pela Anvisa.
Esses produtos são os cosméticos, os correlatos e os alimentos (que também podem ser regulamentados
pelo Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento).

Na 6ª edição do volume 2 da Farmacopeia Brasileira são encontrados ensaios de avaliação da qualidade


dos seguintes produtos correlatos: algodão purificado esterilizado, atadura de gaze, esparadrapo, fita
adesiva, gaze petrolato, suturas cirúrgicas absorvíveis (categute), suturas cirúrgicas absorvíveis sintéticas,
suturas cirúrgicas não absorvíveis sintéticas e tecido de gaze hidrófila purificada.

2.1 Especificações

As especificações podem ser definidas como documentos que apresentam as exigências quantitativas,
qualitativas ou semiquantitativas, a depender do tipo de ensaio, descritas de forma clara e objetiva, e
embasam a avaliação da qualidade de insumos e produtos. Elas devem ser autorizadas por profissional
competente e capacitado para tanto e também devem ser datadas.

20
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Quando as exigências são quantitativas, elas devem apresentar o valor ou faixa numérica (limite
máximo e limite mínimo) aceitável, como peso, volume, tempo e percentual (%), juntamente com suas
unidades, em geral no Sistema Internacional de Medidas (SI).

Por consequência, as especificações são estabelecidas pela autoridade sanitária nacional, ficando
agrupadas em um compêndio oficial conhecido como Farmacopeia. No caso do Brasil, a autoridade
sanitária é a Anvisa e o compêndio é denominado Farmacopeia Brasileira. O termo compêndio tem como
definição livro normativo que contém a síntese de um assunto. Em outras palavras, pode-se descrever
como um conjunto de normas e informações sobre uma determinada área do conhecimento. Assim,
a Farmacopeia Brasileira é uma coletânea de ensaios, conhecimentos, informações e especificações
sobre as análises de diversos tipos de insumos, materiais de embalagem e medicamentos. Esses últimos
abrangem as diversas categorias, tais como medicamentos sintéticos, medicamentos fitoterápicos,
medicamentos biológicos, radiofármacos, entre outros. As especificações encontradas na Farmacopeia
Brasileira são chamadas de oficiais ou farmacopeicas. Nesse caso, as especificações estarão descritas em
uma monografia farmacopeica.

Quando as especificações necessárias não estão descritas em monografia da Farmacopeia Brasileira,


a Anvisa, através da Resolução RDC n. 511, de 27 de maio de 2021, pode adotar uma monografia
farmacopeica da última edição dos seguintes compêndios: Farmacopeia Alemã, Farmacopeia dos Estados
Unidos, Farmacopeia Argentina, Farmacopeia Britânica, Farmacopeia Europeia, Farmacopeia Francesa,
Farmacopeia Internacional (escrita pela OMS), Farmacopeia Japonesa, Farmacopeia dos Estados Unidos do
México e Farmacopeia Portuguesa.

Entretanto, o próprio fabricante de medicamentos pode estabelecer especificações para os insumos


que irá adquirir ou para os produtos terminados que fabrica. Essas especificações que não são encontradas
na Farmacopeia Brasileira são denominadas não oficiais ou não farmacopeicas. Nesse caso, há justificativas.

Uma das situações é o fabricante estabelecer parâmetros que acredita serem mais completos sobre
determinados insumos ou produtos acabados, que irão proporcionar a aquisição de insumos específicos
para o fabrico de dado produto. Desse modo, além de o produtor seguir as especificações farmacopeicas,
há o acréscimo de informações específicas que nortearão a compra de insumos. Como exemplo, pode‑se
citar a aquisição de um insumo farmacêutico ativo que deve ter uma granulometria específica para a
produção de comprimidos. Ou seja, durante o desenvolvimento do medicamento na forma de comprimidos,
foi verificado que o IFA com determinada granulometria facilita o processo de compressão, e fora dessa
especificação o produto sofre variações que podem impactar na qualidade. Logo, a empresa estabelece
que o tal IFA deve ter uma dada granulometria, e sua aquisição fica condicionada a essa característica,
apesar de ser um requisito imposto apenas pelo fabricante. Isso não desobriga o fabricante a realizar os
demais ensaios para avaliar a qualidade do IFA, como identificação e teor, por exemplo, mas acrescenta
um ensaio para abranger a situação particular do produto em questão.

Portanto, as especificações são os limites aceitáveis para ensaios específicos que devem ser realizados
pelo controle de qualidade do estabelecimento produtor de medicamentos e detentor do registro de tais
produtos. A descrição desses ensaios, os reagentes necessários, o preparo das amostras, os equipamentos
a serem utilizados e os parâmetros a serem seguidos (tempo, temperatura e velocidade de agitação, por
21
Unidade I

exemplo) estão devidamente descritos na Farmacopeia Brasileira, juntamente com os limites aceitáveis.
Caso seja uma especificação não farmacopeica, o fabricante também deve ter todos esses dados descritos.

Assim, após a realização de determinado ensaio, o resultado obtido será comparado às especificações
e, caso esteja diferente, o ensaio é declarado não conforme, isto é, o resultado não está de acordo
com as especificações. Nesse caso, o objeto da análise (matéria-prima, produto acabado, material de
embalagem ou produto intermediário) não é considerado apto e deve ser descartado.

Na figura a seguir é ilustrado o fluxo de transformação de matéria-prima até chegar a medicamento.

Matérias‑primas

Produto intermediário

Produto a granel

Produto acabado

Figura 2 – Fluxo de transformação de matéria-prima até chegar a medicamento

As especificações a serem seguidas pelos produtores de medicamentos, insumos farmacêuticos


ativos, excipientes e materiais de embalagem constam na Farmacopeia Brasileira e nos protocolos que
o próprio fabricante elabora. Também as especificações devem contemplar água, solvente e reagentes
usados na produção de medicamentos, caso houver necessidade.

Quadro 3 – Relação das especificações farmacopeicas e não


farmacopeicas e os tipos de ensaios

Especificações Ensaios Exemplos de ensaios


Especificações com Ensaios com limites Teor de ranitidina em
limites quantitativos quantitativos comprimidos
Especificações com Ensaios com limites Identificação de lactose
Especificações limites qualitativos qualitativos
farmacopeicas Especificações com Ensaios com limites Ensaio limite para cloretos
limites semiquantitativos semiquantitativos
Ensaios informativos ou Viscosidade para xarope de
Não se aplica para caracterização iodeto de potássio
Especificações com Ensaios com limites Granulometria de IFA para
limites quantitativos quantitativos comprimidos
Especificações com Ensaios com limites -
limites qualitativos qualitativos
Especificações não
farmacopeicas Quantidade limite de
Especificações com Ensaios com limites substância residual (da rota
limites semiquantitativos semiquantitativos sintética do IFA)
Ensaios informativos ou
Não se aplica -
para caracterização

22
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Por fim, é válido ressaltar que alguns ensaios não apresentam resultados que devem ser
comparados com as especificações farmacopeicas, o que acarretaria numa aprovação ou
reprovação. De fato, esses ensaios também estão presentes na Farmacopeia Brasileira ou descritos
em protocolos internos do fabricante e são realizados para verificar características próprias do
produto ou matéria-prima, que podem indicar desvio de qualidade ou impactar na produção, no
caso dos insumos. Esses ensaios são informativos e em geral caracterizam aquilo que está sob
análise, permitindo um conhecimento das propriedades de um produto ou insumo.

Por exemplo, o ensaio de viscosidade para produtos líquidos e semissólidos e insumos líquidos e
semissólidos não possui limites aceitáveis descritos na Farmacopeia Brasileira. Todavia, esse ensaio
se faz importante, pois pode auxiliar a caracterizar tanto um insumo, como glicerina, quanto um
produto acabado, como um xarope medicamentoso. Caso a viscosidade que já é conhecida pelo
fabricante de um xarope esteja distinta do esperado, isso pode ser um indicativo de que algo
durante o processo produtivo pode ter ocorrido e influenciado a mudança da viscosidade. Esse
fato deve ser investigado e deixar alertas os envolvidos com a produção e controle dos produtos.

No quadro a seguir, estão alguns exemplos de ensaios informativos ou para caracterização.

Quadro 4 – Ensaios informativos ou para caracterização, sem


especificações delimitadas, empregados para caracterização do
insumo, material de embalagem ou produto acabado

Determinação de ponto ou faixa de fusão


Determinação de pH
Caracterização sensorial
Viscosidade
Descrição de defeito de embalagem
Ângulo de repouso
Granulometria de pós
Dureza

2.1.1 Especificações para matérias-primas

As matérias-primas, que podem ser definidas como qualquer substância química empregada para
produzir medicamentos (desconsiderando os materiais de embalagem), para circularem nas áreas produtiva
devem estar devidamente aprovadas pelo controle de qualidade.

De fato, as matérias-primas, ao serem recebidas, devem ter uma amostra retirada por representantes
do controle de qualidade em ambiente apropriado e com qualidade de ar semelhante às áreas de
produção. Essa amostra deve ser analisada e sua qualidade verificada, de acordo com as especificações
farmacopeicas e não farmacopeicas.

Durante esse momento, as matérias-primas ficam segregadas em local reservado a itens sob
análise (chamado de quarentena) e recebem uma sinalização (na forma de etiquetas, nesse caso, na
23
Unidade I

cor amarela) na qual é descrito que estão sofrendo avaliação. Logo, tais matérias-primas não
podem ser empregadas para a produção de medicamentos. Após as análises físico-química, físicas
e microbiológicas realizadas pelo controle de qualidade, as matérias-primas podem ser consideradas
aptas ou não para a produção. Quando aptas, considera-se que foram aprovadas, ou seja, estão de
acordo com as especificações. Quando inaptas, julga-se que foram reprovadas, isto é, não estão
conforme as especificações.

A partir desse ponto, as matérias-primas aprovadas recebem uma identificação descrita como
aprovadas (na forma de etiqueta de cor verde) e são encaminhadas para o almoxarifado, onde serão
armazenadas no local apropriado. Porém, as matérias-primas reprovadas não podem ser empregadas na
produção de medicamentos; elas são identificadas como reprovadas (com etiqueta na cor vermelha) e
voltam à área de quarentena, onde ficam até serem devidamente descartadas, conforme as normas de
gerenciamento de registro.

Na figura a seguir é ilustrado o fluxo de entrada de matérias-primas quando são recebidas pelo
produtor de medicamentos.

Recebimento de Amostragem de Análise de matérias‑primas Aprovação das


matérias‑primas matérias‑primas pelo controle de qualidade matérias‑primas

Matérias‑primas Reprovação das Matérias‑primas aprovadas


em quarentena matérias‑primas no almoxarifado

Matérias‑primas reprovadas
em quarentena

Figura 3 – Fluxo de entrada de matérias-primas em empresa produtora de medicamentos

Segundo as boas prática de fabricação de medicamentos, nas especificações de matérias-primas


devem constar: um detalhamento da matéria-prima em questão, contendo nome, código interno,
referência farmacopeica à monografia (se houver), fornecedor (que passou pelo processo de qualificação)
e orientações para amostragem; requisitos quantitativos, qualitativos ou semiquantitativos (o que
for aplicável em cada situação); condições de armazenamento e precauções para armazenamento
(se houver); e tempo máximo para a matéria-prima ficar armazenada antes de uma reanálise.

2.1.2 Especificações para materiais de embalagem

Os materiais de embalagem podem ser descritos como um meio de assegurar aos medicamentos
proteção, identificação, informação, armazenamento e administração. O objetivo da embalagem é
fornecer o acondicionamento do produto farmacêutico e manter a integridade das suas características
originais durante seu prazo de validade.

As embalagens podem ser classificadas em dois tipos: primárias e secundárias. As primárias são os
dispositivos que entram em contato íntimo com o medicamento (como frascos de vidro ou plástico e
tampas). Já as secundárias asseguram proteção física adicional ao medicamento e encontram-se em
contato com as embalagens primárias (por exemplo, caixas).

24
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Os materiais de embalagem do tipo primário não devem interagir com os medicamentos neles
acondicionados, especialmente o teor, pois haveria uma alteração das propriedades da preparação
farmacêutica, comprometendo sua qualidade. Por essa razão, a avaliação da qualidade dos materiais de
embalagem e sua conformidade quanto as suas especificações são de extrema importância.

Os materiais de embalagem primários e secundários devem apresentar informações essenciais a


respeito do medicamento, tais como o nome do produto, a denominação comum brasileira (DCB), a dose
de cada fármaco por unidade farmacêutica, a via de administração, a quantidade de peso total líquido
(ou volume ou unidades farmacêuticas), a forma farmacêutica, nome e endereço do fabricante, restrição
por faixa etária, cadastro nacional de pessoa jurídica (CNPJ), nome do responsável técnico e registro
junto ao Conselho Regional de Farmácia (CRF) do estado.

Dessa maneira, as especificações para materiais de embalagem devem ser escritas de acordo com o
tipo de medicamento, sua composição química e a forma de administração. Também é necessário que
os materiais sejam atóxicos e permaneçam íntegros mesmo em contato com o produto durante o prazo
de validade. Nas especificações devem conter: descrição detalhada do material de embalagem, com
nome, código interno, referência farmacopeica à monografia (caso haja) e fornecedor (devidamente
qualificado); arte dos materiais impressos; instruções para amostragem; quesitos quantitativos,
qualitativos ou semiquantitativos (o que for considerado, a depender da avaliação); condições de
armazenamento e precauções para armazenamento (caso haja).

2.1.3 Especificações para produtos intermediários e produtos a granel

Vamos relembrar as definições de produtos intermediários e produtos a granel, apresentadas


anteriormente:

• produtos intermediários são aqueles que são em parte processados, porém necessitam passar
por mais etapas, para posteriormente se tornarem produtos a granel (exemplo: comprimidos que
passarão pela etapa de revestimento);

• produtos a granel são aqueles que já sofreram todas as etapas do processo de fabricação, faltando
apenas a etapa de acondicionamento em embalagem primária.

As especificações para esses dois tipos de produtos devem contemplar as fases críticas de processos
de produção de medicamentos ou ainda se tais produtos foram adquiridos ou serão despachados.

2.1.4 Especificações para produtos acabados

Produtos acabados são aqueles que sofreram todas as etapas do processo fabril, inclusive o
acondicionamento em embalagem primária. Além disso, são produtos produzidos em concordância com
todas as normas de BPF e qualidade, culminando em conformidade com as especificações. Para garantir
que esses produtos sejam comercializados e distribuídos após a fabricação, os ensaios de controle de
qualidade devem ser realizados e seus resultados comparados às especificações.

25
Unidade I

Nesse momento, após os produtos acabados serem fabricados, eles são segregados em área distinta
dos demais produtos acabados, em quarentena, e recebem sinalização de que estão sob análise.
Representantes do controle de qualidade devem realizar a amostragem, ou seja, retirar uma quantidade
de produto acabado que seja representativa do lote e que ainda permita reanálises no futuro, se
necessário. Enquanto as análises são realizadas, esses medicamentos não podem ser disponibilizados
para distribuição.

Nos laboratórios de controle de qualidade, esses medicamentos são avaliados de acordo com
as especificações; havendo conformidade, são considerados aprovados, isto é, estão liberados
para comercialização e distribuição. Caso os resultados das análises não estejam de acordo com as
especificações, tais produtos não podem ser comercializados e são declarados reprovados. A partir daí,
os produtos podem ser destruídos, descartados (segundo as diretrizes de gerenciamento de resíduos) ou
reprocessados (considerada uma situação excepcional).

As especificações dos produtos acabados, então, compreendem: nome do produto; fórmula; descrição
da forma farmacêutica; instruções de amostragem e análises; detalhamento da embalagem; requisitos
qualitativos, quantitativos, semiquantitativos e limites de aceitação; condições de armazenamento e
prazo de validade.

No quadro a seguir estão descritas as especificações do aciclovir comprimidos, produto acabado, de


administração por via oral, origem sintética, liberação imediata e forma farmacêutica sólida.

Quadro 5 – Exemplo de especificações de produto


acabado sólido, de administração por via oral: aciclovir
comprimidos de liberação imediata

Teste Especificação
Doseamento 95% a 105% da quantidade declarada no rótulo

Ensaio de dissolução Liberação de não menos que 80% da


quantidade declarada no rótulo
± 5% de limite de variação do
Peso médio peso do comprimido
Desintegração Não mais que 30 min
Perda de massa igual ou inferior a 1,5% do peso
Friabilidade do comprimido
Dureza Ensaio informativo
Contagem total permitida de bactérias 103
aeróbias (UFC/g)*

Contagem total permitida de fungos (UFC/g)* 102

Pesquisa de patógenos Ausência de Escherichia coli em 1 g


* Unidade formadora de colônia por grama.

Fonte: Anvisa (2019a).

26
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

2.2 Padrões de referência e substâncias químicas de referência

Para a realização dos ensaios de controle de qualidade e a confrontação dos resultados obtidos
com as especificações, é necessário avaliar se os ensaios que serão empregados reproduzem resultados
compatíveis com as substâncias que serão analisadas. Para tanto, é fundamental o uso de padrões
de referência.

Desse modo, entendem-se como padrões de referência as substâncias com alto teor de pureza
que são empregadas para verificação da qualidade de insumos farmacêuticos ativos, excipientes e
medicamentos que garantem que os métodos analíticos empregados para tal possuam a capacidade de
detectar a presença e/ou a quantidade de certas substâncias.

Os padrões de referência são fornecidos por comitês especializados e associados a farmacopeias,


sendo chamados de padrões farmacopeicos. Assim, o padrão de referência associado à Farmacopeia
dos Estados Unidos (farmacopeia americana) é denominado padrão farmacopeico USP (United States
Pharmacopeia), e assim por diante com os demais padrões.

No Brasil, o padrão referente à Farmacopeia Brasileira é chamado de substância química de referência


(SQR). Sua pureza e distribuição são de responsabilidade do Instituto Nacional de Controle de Qualidade
em Saúde (INCQS), pertencente à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Além do mais, os padrões farmacopeicos (chamados de oficiais) possuem alto valor comparados
às matérias-primas e são empregados para padronizar os insumos como padrões que são usados
rotineiramente nos ensaios de controle de qualidade. Logo, os padrões farmacopeicos ou oficiais são
denominados padrões primários.

Já os padrões que são matérias-primas padronizadas a partir do padrão farmacopeico são conhecidos
como padrões secundários ou padrões de trabalho. Então, sofrem análises comparativas com os padrões
de referência (ou primários). As análises são rigorosas, mediante ensaios padronizados (farmacopeicos
ou não) realizados em dias distintos por analistas também distintos, e os resultados das análises
são submetidos à avaliação estatística. O ideal é que a matéria-prima que será usada como padrão
secundário apresente o mais alto grau de pureza e uniformidade e, obviamente, tenha sido aprovada
pelo controle de qualidade.

Outro ponto importante é que o uso do padrão farmacopeico deve estar em concordância com a
metodologia empregada. Em outras palavras, isso significa que, se o método é da Farmacopeia Brasileira,
o padrão usado deve ser a SQR, e assim por diante.

Por fim, os rótulos dos padrões de referência e documentos (certificados de análise) que os
acompanham devem indicar a pureza, a quantidade, a data de fabricação e a data de validade, e as
condições de armazenamento antes e após a abertura do lacre.

Na tabela a seguir são encontrados alguns exemplos de padrões farmacopeicos do IFA cefadroxil.

27
Unidade I

Tabela 1 – Valores de padrões farmacopeicos do cefadroxil de


diferentes farmacopeias (britânica, europeia e brasileira)

Quantidade de padrão
Cefadroxil Valor (R$)* farmacopeico no frasco
Padrão farmacopeico BP** 1.386,00 100 mg
Padrão farmacopeico EP*** 892,00 150 mg
SQR (FB) 398,00 400 mg
* Cotação realizada em 18 de setembro de 2021.
** Padrão da Farmacopeia Europeia.
*** Padrão da Farmacopeia Britânica.

2.3 Monografias

As especificações dos ensaios que irão verificar a qualidade de insumos, produtos intermediários,
produtos a granel, material de embalagem e produtos acabados estão descritas na Farmacopeia Brasileira.
Contudo, a depender do ensaio, podem estar na parte de ensaios gerais (descritos no volume I) ou na
parte de insumos (descritos no volume II).

Essa segunda parte é organizada de acordo com os insumos e produtos acabados, por ordem
alfabética, agrupados na forma de monografias. Portanto, as monografias são descrições detalhadas
que caracterizam os componentes aos quais se referem, com detalhamento de métodos de análises,
bem como os parâmetros a serem empregados (temperatura e velocidade, por exemplo), equipamentos
e suas especificações.

Há monografias para insumos farmacêuticos ativos, excipientes e produtos acabados. Nelas, as


informações encontradas dependem do tipo de objeto das análises de controle de qualidade.

Para insumos farmacêuticos ativos e excipientes, as informações compreendem:

• nome;

• DCB;

• fórmula estrutural;

• nome químico (segundo a International Union of Pure Applied Chemistry – Iupac);

• especificações;

• descrição das características químicas;

• solubilidade;

• propriedades físicas e físico-químicas;

28
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

• ensaios de identificação;

• ensaios de pureza;

• ensaios microbiológicos;

• ensaios biológicos (quando aplicáveis);

• ensaios específicos;

• ensaios de doseamento;

• materiais de embalagem;

• descrição de armazenamento;

• rotulagem (quando aplicável).

Para medicamentos, as informações compreendem:

• nome do produto, com o nome do IFA e a forma farmacêutica;

• DCB;

• fórmula estrutural;

• ensaios de doseamento;

• ensaios de identificação;

• testes físicos;

• especificações;

• ensaios microbiológicos;

• ensaios biológicos (quando aplicáveis);

• ensaios específicos;

• materiais de embalagem;

• descrição de armazenamento;

• rotulagem (quando aplicável).

29
Unidade I

O fabricante também pode elaborar monografia para determinado produto ou insumo. Isso
geralmente acontece em casos nos quais o produto ou os insumos ainda não estão na Farmacopeia
Brasileira ou outros compêndios oficiais permitidos, ou seja, normalmente ocorre para medicamentos
inovadores, cujos fármacos são inéditos.

No entanto, alguns ensaios farmacopeicos são incorporados em tais documentos, como os ensaios
físicos que são feitos em comprimidos e cápsulas (desintegração, friabilidade, peso médio).

É comum, posteriormente, as farmacopeias adicionarem novas monografias e ensaios a cada nova


edição, buscando sua constante atualização com novos produtos, tecnologias e métodos.

A Farmacopeia Brasileira encontra-se na sua 6ª edição, que data de 2019. Outras farmacopeias, como
a Farmacopeia dos Estados Unidos, são publicadas anualmente, em contínua pesquisa e conformidade
com as inovações na área farmacêutica.

No quadro a seguir, são destacadas algumas farmacopeias, a edição em que cada uma se encontra
e o ano da última edição.

Quadro 6 – Farmacopeias, edições e ano da última edição

Farmacopeia Edição Ano


Farmacopeia Brasileira 6ª edição 2019
Farmacopeia dos Estados Unidos 44ª edição 2021
Farmacopeia Argentina 7ª edição 2002
Farmacopeia Europeia 10ª edição 2022
Farmacopeia Japonesa 18ª edição 2016
Farmacopeia Britânica – 2022
Farmacopeia dos Estados Unidos do México 12ª edição 2020
Farmacopeia Internacional 10ª edição 2020
* Informações consultadas em 18 e 19 de setembro de 2021.

2.4 Validação de método analítico

Em algumas situações, o fabricante não usa o método analítico descrito na Farmacopeia Brasileira ou
em outra farmacopeia permitida pela Anvisa. O produtor prefere ou é obrigado a desenvolver um método
analítico particular para avaliar determinada especificação de um insumo, material de embalagem ou
produto acabado. Isso é permitido pela agência reguladora através da Resolução RDC n. 166, de 24 de
julho de 2017, que dispõe sobre a validação de métodos analíticos.

Portanto, a norma supracitada deve ser seguida e parâmetros devem ser testados para garantir
confiança no método e, consequentemente, nos resultados obtidos a partir dele. Contudo, isso não
interfere na especificação, que deve ser seguida. Tomando como exemplo o medicamento aciclovir
comprimidos, na monografia farmacopeica está descrito que a avaliação de doseamento do fármaco

30
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

no produto tem como especificação uma faixa de 95% a 105% da quantidade declarada no rótulo.
O método analítico preconizado pela Farmacopeia Brasileira (2019) é por espectrofotometria de absorção
no ultravioleta para o teste de doseamento. A empresa fabricante pode optar por desenvolver e validar
um método por cromatografia líquida de alta eficiência com absorção no ultravioleta. Isso significa
que o método é diferente do farmacopeico, porém a especificação ainda é a mesma preconizada
pela farmacopeia.

3 AMOSTRAGEM

Atualmente, no contexto das BPF, a avaliação da qualidade de um produto farmacêutico é iniciada


no recebimento das matérias-primas e materiais de embalagem, sendo realizada em diversos momentos
ao longo da cadeia produtiva. Um produto só será liberado para distribuição e comercialização se todos
os atributos críticos da qualidade forem satisfatórios, ou seja, se estiverem em conformidade com
as respectivas especificações, lembrando que especificações da qualidade representam os limites de
aceitação e são empregadas em todos os tipos de materiais, devendo ser claramente estabelecidas e
de fácil entendimento.

Para o monitoramento da qualidade, uma certa quantidade de amostras deve ser retirada de cada
etapa do processo, de modo que se possa ter uma representação fiel das características do lote como um
todo. Ao receber uma barrica de um IFA, por exemplo, os resultados obtidos com as amostras que foram
retiradas e analisadas devem ser os mesmos para qualquer porção dessa matéria-prima.

Lembrete

Especificações da qualidade representam os limites de aceitação e


são empregadas em todos os tipos de materiais, devendo ser claramente
estabelecidas e de fácil entendimento.

Tomando outro exemplo, como no caso de comprimidos, a condição ideal seria o monitoramento de
todas as unidades, entretanto, durante a avaliação da qualidade, uma série de análises são realizadas, e
algumas delas acabam por destruir a amostra, inviabilizando essa possibilidade. Por outro lado, mesmo
para ensaios que não destruam a amostra, em caso de um lote muito grande, a análise de todas as
unidades acarretaria um tempo demasiado na sua liberação (KOU et al., 2010).

Dessa forma, é possível perceber que o conceito de amostragem é fundamental em uma escala
industrial. Esse é um procedimento que foi inicialmente adotado durante a Segunda Guerra Mundial,
no fornecimento de armas para o exército americano, sendo logo depois introduzido em diversas áreas,
especialmente na indústria farmacêutica (PINTO; KANEKO; PINTO, 2015).

A amostragem é aplicável nas diferentes fases do controle de qualidade: antes, com a análise das
matérias-primas e materiais de embalagem; durante, com a execução do controle em processo; e
após, com a avaliação do produto acabado. Para a sua execução, os analistas do controle de qualidade
devem ser treinados para a realização desse procedimento, que deve seguir um determinado plano de
31
Unidade I

amostragem, conforme o tipo de produto e a etapa do processo. Além disso, todo o procedimento deve
ser registrado para permitir a rastreabilidade das informações.

No caso de matérias-primas, deve haver um espaço destinado à realização dessa amostragem, além
de paramentação e acessórios adequados para a coleta das amostras (GIL; BARBOSA, 2010a; BRASIL,
2019b). No caso de materiais que sejam submetidos à análise microbiológica, esse procedimento deve
ser realizado em um espaço dotado de um fluxo laminar, utilizando materiais e recipientes esterilizados.

Os procedimentos utilizados em qualquer etapa da amostragem devem estar escritos e padronizados,


para evitar qualquer contaminação do material ou comprometimento da sua qualidade (BRASIL, 2019b).

Saiba mais

Para saber mais sobre as recomendações da Anvisa sobre a amostragem


no contexto das boas práticas de fabricação, acesse:

BRASIL. RDC n. 301, de 21 de agosto de 2019. Brasília: Anvisa, 2019o.


Disponível em: https://bit.ly/3D0LH6q. Acesso em: 22 mar. 2022.

Para se ter uma ideia da importância da amostragem em um produto farmacêutico, na figura a


seguir é ilustrada uma análise de risco para a fabricação de um produto na forma de comprimidos.
Nesse tipo de ferramenta são identificados todos os fatores críticos do processo que podem impactar
na qualidade do produto. Assim, na parte relacionada à análise, a amostragem entra como uma das
variáveis que devem ser consideradas.
Operador Secagem Análise

Treinamento Temperatura Método


Fluxo de ar Amostragem
Comprimido
Limpeza Água
Umidade Velocidade
de mistura Pressão Polimorfismo
Tempo Velocidade Tamanho de
Área partícula
produtiva
Alimentação
Granulação Matérias‑primas
Compressão

Figura 4 – Diagrama de Ishikawa da análise de risco de um produto na forma de comprimidos

Adaptada de: ICH (2009, p. 19).

32
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

A etapa de análise é aquela que avalia se o produto cumpre com os critérios de qualidade previamente
estabelecidos. Já o erro total do resultado analítico, como apresentado na equação a seguir, é a somatória
das variâncias da amostragem, do preparo da amostra e da própria análise (KOU et al., 2010):

σ2 = σ2amostragem + σpreparo
2 2
da amostra + σanálise

Observação
A variância é uma medida estatística de dispersão que está relacionada
com os desvios das observações em relação ao valor médio, servindo como
uma indicação da qualidade do resultado analítico.

3.1 Tipos de amostragem

São considerados dois tipos de amostragem: a primária (amostragem de campo), que se refere à
coleta de certa quantidade de amostras diretamente da embalagem original, como no caso de uma
matéria-prima ou de determinada etapa do processo; e a secundária (amostra de laboratório), que
é a amostragem do material que foi entregue ao laboratório de controle de qualidade para análise
(KOU et al., 2010).

Na figura a seguir são apresentados os dois tipos de amostragem.


Amostragem primária Amostragem secundária

Início

Meio

Final

Produção Análise (laboratório)

Figura 5 – Tipos de amostragem: fases do processo de compressão (amostragem primária)


e amostras utilizadas na análise de laboratório (amostragem secundária)

A amostragem secundária está relacionada com a quantidade recomendada nas farmacopeias para
a execução de uma determinada análise. Assim, a quantidade de amostras analisadas é uma parte
do material coletado na amostragem primária, cujo número de coletas foi estabelecido no plano de
amostragem do produto.

Na tabela a seguir, são apresentadas as quantidades requeridas para a realização de alguns ensaios
farmacopeicos para a forma de comprimidos.
33
Unidade I

Tabela 2 – Quantidade de comprimidos necessária


para a realização de alguns testes físico-químicos

Teste Número de unidades requeridas


Peso médio 20
Desintegração 6
Friabilidade 20
Teor 20
Dureza 10
Uniformidade de doses unitárias 30
Dissolução 6

Fonte: Anvisa (2019a).

3.2 Plano de amostragem

A quantidade de amostras a serem retiradas e o modo como essa coleta deve ser realizada devem estar
estabelecidos no plano de amostragem. A elaboração desse plano deve contemplar o tamanho do lote
e a complexidade do material, assim como o conjunto de testes que precisam ser realizados, considerando
a necessidade de repetição (GIL; BARBOSA, 2010a). Entre os critérios farmacopeicos de amostragem,
estão algumas fórmulas estatísticas, como ilustrado nas equações a seguir, que são recomendadas para
a análise de matérias-primas (PINTO; KANEKO; PINTO, 2015). Dependendo do material, o ideal é que
todas as barricas de um lote recebido sejam amostradas, entretanto, nem sempre é possível, sendo então
aplicadas as referidas fórmulas:

n= N

ou

n= N + 1

Onde:

n = quantidade de amostras;

N = tamanho da população.

Tabelas de amostragem também estão disponibilizadas em farmacopeias, como no caso da Farmacopeia


Brasileira (2019), que apresenta uma tabela para a realização de teste de esterilidade, na qual se faz a
indicação do número mínimo de amostras em função do tipo de produto e tamanho de lote produzido.

Além disso, planos de amostragem baseados no padrão americano Military Standard (MIL-STD) são
disponibilizados pela Associação Brasileira de Normas Técnicas, através do documento NBR 5426, que
traz os planos de amostragem e procedimentos na inspeção por atributos.
34
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Um bom plano de amostragem deve ser delineado de modo que se aprove uma alta quantidade de
lotes bons e sejam reprovados aqueles com qualidade inaceitável. Dessa forma, inicialmente devem ser
definidos os valores de nível de qualidade aceitável (NQA), o nível de qualidade inaceitável e os riscos
α e β (o primeiro refere‑se à probabilidade da rejeição de um lote bom e o segundo, à probabilidade de
liberação de um lote ruim).

As figuras a seguir trazem duas tabelas presentes na NBR 5426. Para exemplificar como pode ser
obtido o tamanho da amostra, vamos considerar um lote que produza 1.000 comprimidos, adotando o
nível geral de inspeção II. Em geral, o nível de inspeção e o NQA são determinados pelo fabricante em
função do tipo de produto e de seus atributos de qualidade.

Ao olhar a tabela da figura a seguir, verificamos que a letra J é a indicada para essa situação, e essa
informação será utilizada na tabela seguinte.

Níveis especiais de inspeção Níveis gerais de inspeção


Tamanho do lote
S1 S2 S3 S4 I II III
2-8 A A A A A A B
9 - 15 A A A A A B C
16 - 25 A A B B B C D
26 - 50 A B B C C D E
51 - 90 B B C C C E F
91 - 150 B B C D D F G
151 - 280 B C D E E G H
281 - 500 B C D E F H J
501 - 1.200 C C E F G J K
1.201 - 3.200 C D E G H K L
3.201 - 10.000 C D F G J L M
10.001 - 35.000 C D F H K M N
35.001 - 150.000 D E G J L N P
150.001 - 500.000 D E G J M P Q
Acima de 500.001 D E H K N Q R

Figura 6 – Tabela de codificação de amostragem

Adaptada de: ABNT (1985, p. 7).

Vamos considerar que o atributo avaliado seja o teor de ativo nos comprimidos. Nesse caso, a
variável é bastante crítica, então o NQA adotado deve ser baixo. Dessa forma, ao utilizar um NQA de
0,15, o número de amostras deve ser de 80 unidades (veja a figura a seguir). Ao avaliar os valores de Ac
(número de falhas que permite a aceitação do lote) e Re (número de falhas que implica a rejeição
do lote), verifica-se que não se admite nenhum resultado fora da especificação, uma vez que o número de
falhas permitido para aceitação é 0 e o número de falhas que indicam a rejeição do lote é 1 (veja a
figura a seguir).

35
36
NQA
Unidade I

0,010 0,015 0,025 0,040 0,065 0,10 0,15 0,25 0,40 0,65 1,0 1,5 2,5 4,0 6,5 10 15 25 40 65 100 150 250 400 650 1000

Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re Ac Re

Código de amostras
Tamanho da amostra
A 2 0 1 1 2 2 3 3 4 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22 30 31
B 3 0 1 1 2 3 4 3 4 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22 30 31 44 45
C 5 0 1 1 2 2 3 5 6 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22 30 31 44 45

D 8 0 1 1 2 2 3 3 4 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22 30 31 44 45
E 13 0 1 1 2 3 4 3 4 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22 30 31 44 45
F 20 0 1 1 2 2 3 5 6 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22

G 32 0 1 1 2 2 3 3 4 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22
H 50 0 1 3 4 3 4 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22
1 2
J 80 5 6 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22
0 1 1 2 2 3
K 123 0 1 1 2 2 3 3 4 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22
L 200 0 1 1 2 3 4 3 4 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22
M 315 0 1 1 2 2 3 5 6 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22

N 500 0 1 1 2 2 3 3 4 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22
0 1 3 4 3 4 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22
P 800 1 2
Q 1.250 0 1 1 2 2 3 5 6 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22

1 2 2 3 3 4 5 6 7 8 10 11 14 15 21 22
R 2.000

Usar o primeiro plano abaixo da seta. Se a nova amostragem requerida for igual ou maior do que o número de peças constituintes do lote, inspecionar 100%.
Usar o primeiro plano acima da seta.
Ac - Número de peças defeituosas (ou falhas) que ainda permite aceitar o lote.
Re - Número de peças defeituosas (ou falhas) que implica a rejeição do lote.

Figura 7 – Plano de amostragem simples

Adaptada de: ABNT (1985, p. 8).


CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Estabelecido o número de amostras, o próximo passo é determinar a maneira como a amostragem


deve ser executada e onde elas ficarão armazenadas até a realização das análises.

Observação

Embora a amostragem para a representação do lote e aprovação seja


efetuada com o produto terminado, durante a fabricação também são
realizadas amostragens para o controle das etapas críticas do processo.

3.3 Técnicas de amostragem

Como já comentado anteriormente, a coleta de amostras ocorre em várias fases da produção.


Ao final do processo, os produtos já estão embalados e as amostras são separadas conforme a indicação
do plano de amostragem. Por outro lado, quando o objeto a ser amostrado é a matéria-prima que
está dentro da barrica ou uma solução dentro de um tanque, deve-se ter ferramentas adequadas para
a retirada das amostras. No caso de matérias-primas, é indicado que se faça a limpeza externa da
embalagem, de modo a evitar a contaminação do material.

Na figura a seguir são apresentados exemplos de pás que são utilizadas na amostragem de pós,
geralmente constituídas de aço inoxidável ou polipropileno.

Figura 8 – Exemplos de pás utilizadas na coleta de amostras


sólidas e armazenamento em sacos e frascos

Adaptada de: Raval et al. (2018, p. 309).

Uma observação importante é que muitas vezes faz-se necessária a coleta em diferentes locais do
recipiente da matéria-prima. O mesmo conceito é adotado para a amostragem em um misturador durante
uma etapa de validação do processo de mistura, por exemplo. Para facilitar esse tipo de amostragem
são utilizados acessórios especiais, como os coletores apresentados na figura a seguir, o primeiro com
apenas um ponto de amostragem (a) e o segundo com múltiplos pontos (b). Além deles, uma série de
modelos estão disponíveis comercialmente.
37
Unidade I

A) B)

Figura 9 – Amostradores para pós: A) coletor de amostragem única;


B) coletor de amostragem por câmaras/múltipla

Adaptada de: Raval et al. (2018, p. 310).

Para a amostragem de materiais líquidos e semissólidos (veja a figura a seguir) ou para a coleta de
produtos dentro de tanques são utilizados amostradores do tipo copo (a), coletor com peso (b) ou tubo
de imersão (c). Os dois últimos são utilizados para coleta em locais mais profundos do recipiente.

Recipiente para coleta

Suporte do coletor

A) B) Peso C)

Figura 10 – Amostradores para líquidos: A) copo; B) coletor com peso; C) tubo de imersão

Adaptada de: Raval et al. (2018, p. 314).

3.4 Preparo de amostras

A qualidade de um medicamento não está atrelada somente ao processo de fabricação, mas também
à adequada caracterização desse produto. Logo após a amostragem, a primeira etapa da fase analítica
se dá com o preparo das amostras, de modo que se possa adequar o material para a aplicação de uma
determinada técnica.
38
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Uma vez estabelecido o preparo da amostra, ele deve ser descrito de maneira detalhada na
metodologia e avaliado na validação do método analítico. Para se ter ideia da sua importância, alguns
dados observados indicam que cerca de 1/3 das falhas analíticas estão associadas ao preparo da amostra
(NICKERSON, 2010).

O maior desafio no preparo das amostras é quando se trata da análise das formas farmacêuticas,
havendo a necessidade de extração do ativo (analito) dos demais componentes da formulação, de modo
a eliminar possíveis interferentes na sua determinação.

Para que a análise seja adequada, algumas questões devem ser levadas em consideração (NICKERSON,
2010; ORLANDO; GIL, 2010). Deve-se:

• avaliar a recuperação do analito da matriz, sem degradação;

• utilizar uma concentração dentro da faixa de leitura do instrumento de medida;

• se necessário, proceder com a derivatização da amostra, para que o analito possa ser detectado;

• garantir que a amostra seja compatível com o método de análise;

• utilizar condições razoáveis para o preparo da amostra, como tipo de solvente, volume gasto e
tempo necessário para a extração.

Na figura a seguir são esquematizadas de uma maneira bem simples as etapas que podem ser
necessárias para o preparo de uma amostra em função da forma farmacêutica. De um modo geral, o que
se pretende é a solubilização do fármaco e a eliminação de partículas insolúveis, de modo que se tenha
uma solução sem interferentes. Eventualmente, além dessas etapas pode ser necessária a derivatização da
amostra ou a extração do fármaco para outro solvente que seja mais compatível com o sistema analítico.
Diluição
A) Fármaco em solução Solução pronta para análise
Eliminação de partículas

Solubilização do fármaco Fármaco Eliminação de partículas


B) Solução pronta para análise
em solução
Pó ou suspensão

Dispersão Solubilização do fármaco Fármaco Eliminação de partículas


C) Solução pronta para análise
em solução
Forma sólida Grânulos ou
ou semissólida partículas do
fármaco e
excipientes

Figura 11 – Etapas envolvidas no preparo de amostras derivadas de formas farmacêuticas:


A) soluções; B) pós ou suspensões; C) sólidos e semissólidos

Adaptada de: Nickerson (2010, p. 5).

39
Unidade I

Para facilitar o entendimento sobre a derivatização, tomamos como exemplo a quantificação


de taninos. Além de métodos cromatográficos, também pode ser empregada a espectrofotometria;
entretanto, para que haja sinal do analito, deve-se fazer um tratamento prévio da amostra antes da
leitura. Uma das maneiras é utilizando o reagente de Folin-Ciocalteu, que em meio básico reage com
os polifenóis formando um complexo azul que pode ser quantificado na região do visível (VERZA
et al., 2007).

Entre as técnicas mais empregadas no preparo de amostras estão a extração líquido-líquido e a


extração em fase sólida. A primeira refere-se à utilização de um solvente pelo qual o fármaco tenha
bastante afinidade, mas que seja imiscível com a base da formulação (matriz). Para a seleção do solvente
mais adequado, deve-se ter pleno conhecimento dos fatores relacionados com a solubilização do
fármaco, como o coeficiente de partição entre o solvente e a matriz, a influência de pH e a força iônica
do meio extrativo.

Em alguns casos, a solubilização pode ser facilitada com a trituração do pó, uso de agitadores ou
ultrassom. O tempo para que ocorra a solubilização deve ser avaliado, de modo que se possa extrair o
máximo possível do analito.

A extração em fase sólida (SPE) é uma técnica que utiliza os adsorventes comumente empregados
na cromatografia líquida, sendo aplicável em casos nos quais a matriz em que o fármaco está
veiculado é bastante complexa. Esses adsorventes são comercializados na forma de cartucho ou
disco (veja a figura a seguir) e funcionam como fase normal, reversa ou troca-iônica (conforme o
quadro visto na sequência).

Reservatório Sorvente

Sorvente
Filtros

Cartucho Disco

Figura 12 – Representação de um cartucho e um disco usados na SPE

Fonte: Orlando e Gil (2010, p. 90).

40
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Quadro 7 – Características do analito e da matriz


com a indicação dos grupos adsorventes

Tipo de interação Analito Matriz Grupos adsorventes


C8
Fase C18
Apolar Polar
reversa Fenil
Polimérico
Sílica
Fase Florisil
Polar Apolar
normal Amino
Ciano
Catiônicos Carboximetilsilano
Polar
(bases iônicas ou ionizáveis) Sulfonilpropilsilano
Troca iônica
Aniônicos Dietilaminopropilsilano
Polar
(ácidos iônicos ou ionizáveis) Trietilaminopropilsilano

Adaptado de: Nickerson e Cólon (2011); Orlando e Gil (2010).

Após a filtração da amostra, devem ser utilizados solventes para eluição e recuperação do analito
que ficou retido na fase estacionária. Para a fase reversa, podem ser utilizados metanol, acetonitrila e
hexano, entre outros. No caso da fase normal, são empregados etanol, acetona e metanol. Para cartuchos
de troca iônica, são utilizados tampões com elevada força iônica. Uma condição importante é que o
analito tenha alta afinidade pelo solvente de eluição.

3.4.1 Cálculos empregados no preparo das amostras

Além da preocupação com a extração do analito, deve-se ter cuidado com a realização dos cálculos
associados ao preparo das amostras. Um deles está relacionado com a quantidade de material que deve
ser pesado; o outro, com a diluição das amostras para que a concentração do analito fique dentro da
faixa de leitura.

Vamos começar pelo primeiro caso. Para facilitar o entendimento, analisemos dois métodos analíticos,
o primeiro para o doseamento de matéria-prima e o segundo para produto acabado.

• Doseamento da matéria-prima mebendazol: “Pesar, com exatidão, cerca de 0,225 g da amostra


e dissolver em 30 mL de ácido acético glacial [...]” (ANVISA, 2019a).

• Doseamento de comprimidos de mebendazol: “Pesar e pulverizar 20 comprimidos. Transferir


quantidade equivalente a 50 mg de mebendazol [...]” (ANVISA, 2019a).

Ao comparar os dois métodos, nota-se que, para a matéria-prima, a quantidade de amostra requerida
para pesagem está direta (0,225 g), enquanto no caso dos comprimidos é solicitada uma quantidade de
pó referente aos comprimidos triturados equivalente a 50 mg de fármaco. Essa diferença é atribuída ao
fato de que no produto acabado, além do mebendazol, estão incluídos os excipientes; assim, a tomada
de ensaio (TE) deve ser calculada.

41
Unidade I

Antes da trituração dos comprimidos, deve-se determinar o valor de peso médio das 20 unidades,
de modo que essa informação seja utilizada nos cálculos. Outro fator que deve ser considerado é a
dosagem do fármaco nos comprimidos; nesse caso, faremos o cálculo para a apresentação de 100 mg.
No quadro a seguir são sintetizados os dados que serão utilizados para o cálculo dessa TE.

Quadro 8 – Dados para o cálculo da TE


dos comprimidos de mebendazol

Peso médio de 20 unidades = 280 mg


Valor declarado = 100 mg
Quantidade de fármaco na TE = 50 mg

De posse dos dados do quadro é possível calcular a TE utilizando regra de três simples:
Peso médio dos comprimidos Valor declarado

TE Quantidade de fármaco na TE

280 100

TE 50

280 × 50
TE = = 140 mg
100

Com base no resultado, verifica-se que 50 mg de mebendazol estão contidos em 140 mg de pó


triturado, sendo, então, essa a quantidade que deve ser pesada para o preparo da amostra e a realização
da análise.

O segundo cálculo está relacionado com o ajuste da concentração do analito através da


realização de diluições. Neste caso, vamos tomar como exemplo o método de doseamento por
espectrofotometria dos comprimidos de cloridrato de metoclopramida descrito na Farmacopeia
Brasileira (ANVISA, 2019a).

42
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Exemplo de aplicação

Exemplo 1

Pesar uma TE equivalente a 10 mg de cloridrato de metoclopramida e colocar em um balão


volumétrico de 100 mL; após completar o volume com o diluente adequado, proceder com a diluição
até a concentração de 0,002% (p/V).

Neste caso, o primeiro passo é obter a concentração em mg/mL da solução 1 (C1):

10
=
C1 = 0,1 mg / mL
100
Agora, vamos converter o valor da concentração final (C2) para a mesma unidade (mg/mL):

 p  0, 002 g 2 mg
C2  0, 002%      0, 02 mg / mL
 V  100 mL 100 mL
Tendo os valores das concentrações inicial e final, é possível, a partir da equação a seguir, calcular
o volume que deve ser retirado da solução 1 (V1) para o preparo da solução 2. Suponha que o balão
disponível para diluição seja de 20 mL:

C1 x V 1 = C2 x V2

0, 4
0,1 x V1 = 0, 02 x 20 → V1= → V1 = 4 mL
0,1

Dessa forma, para preparar a solução 2, uma alíquota de 4 mL deve ser transferida da solução 1 para
um balão volumétrico de 20 mL; após completar o volume e homogeneizar a solução, a concentração
será de 0,02 mg/mL.

Vamos supor que a forma farmacêutica a ser analisada agora seja uma solução oral de concentração
0,5 mg/5 mL, cuja dose terapêutica é de 5 mL. A concentração da solução padrão é de 20 µg/mL, e você
deve preparar uma amostra na mesma concentração (Cf). Para saber qual balão deve ser utilizado para
a realização dessa diluição, basta calcular o fator de diluição (FD) da amostra, conforme a equação a
seguir. Considere uma TE de 5 mL:

Quantidade de fármaco na TE (QTE)


FD =
Cf
Cf = 20 µg/mL = 0,02 mg/mL
0, 5
=
FD = 25
0, 02

43
Unidade I

Como o fator de diluição é de 25, para chegar à concentração desejada para o preparo da
solução, o volume de 0,5 mL deve ser inserido em um balão de 25 mL, resultando na concentração
de 0,02 mg/mL ou 20 µg/mL:

0, 5
Cf = = 0, 02 mg / mL
25

Exemplo 2

Vamos considerar uma outra situação, em que para esse mesmo produto a TE seja de 20 mL. Qual
seria o volume do balão a ser utilizado na diluição?

Quantidade de fármaco na TE (QTE):

0,5 mL 5 mL
Quantidade na TE 20 mL
0, 5 x 20
QTE = = 2 mg
5
2
=
FD = 100
0, 02

Nesse caso, para preparar a mesma concentração da amostra é necessário um balão de 100 mL. Caso
não haja disponibilidade de balão com essa capacidade, pode-se trabalhar com balões de volume menor
e proceder com mais de uma diluição (D):

2 25 1
=D = x
50 50 100
Dessa forma, a QTE deve ser diluída em 50 mL no primeiro balão; na sequência, uma alíquota de
25 mL é retirada e adicionada em um segundo balão, chegando na concentração desejada:

2
Cf = = 0, 02 mg / mL
100
Exemplo 3

Com base no que foi discutido, calcule a TE e o FD necessário para a análise de comprimidos de
loratadina 10 mg.

Dados:

a) O peso médio dos comprimidos é de 80 mg, e para a realização do ensaio de doseamento a TE deve
ser equivalente a 25 mg.
b) A concentração de leitura no espectrofotômetro deve ser a mesma da solução padrão 0,0125%.
44
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Resolução

• Cálculo da TE:

80 mg 10 mg
TE 25 mg

80 x 25
TE = = 200 mg
10
• Cálculo do FD:

0,0125% = 0,0125 g / 100 mL = 12,5 mg / 100 mL = 0,125 mg/mL

25
=
FD = 200
0,125

4 MÉTODOS DE ANÁLISE DE MATERIAIS DE EMBALAGEM

Assim como as matérias-primas que fazem parte da formulação, as embalagens também são
consideradas insumos e precisam ter a sua qualidade atestada, principalmente aquelas que estão em
contato direto com o produto (embalagem primária) e auxiliam na manutenção da sua estabilidade.
Entretanto, outras atribuições também podem ser consideradas no contexto das embalagens de
medicamentos, tais como a identificação do produto, a informação ao paciente e o próprio doseamento,
uma vez que, em alguns casos, a dose já vem exata na embalagem primária ou o próprio recipiente é
o dispositivo dosador, como no exemplo dos sprays nasais e das canetas para aplicação de insulina,
entre outros.

A figura adiante traz alguns tipos de embalagens utilizadas em produtos farmacêuticos.

Lembrete

As embalagens dos medicamentos devem trazer informações essenciais


do produto, como nome, substância ativa, dados do fabricante, dose,
via de administração e forma farmacêutica, assim como o nome do
responsável técnico.

45
Unidade I

A) B) C) D)

E)
G)

F)
H)

J) K) L) M) I)

N)

Figura 13 – Exemplos de embalagem primária de medicamentos: A) blíster; B) cartela;


C) sachê; D) embalagem para supositório; E) e F) frascos de vidro; G) frasco-ampola;
H) ampolas de vidro; I) bolsa de plástico para líquidos intravenosos; J) inalador pressurizado;
K) aerossol (embalagem de metal); L) frasco plástico para colírio; M) caneta-seringa
para aplicação de insulina; N) tubo metálico para pomada

Adaptada de: Murdan (2016, p. 1573).

Além do acondicionamento primário, também podem fazer parte da embalagem do medicamento


um envoltório intermediário, que pode ser de plástico para embalagens de injetáveis ou de alumínio
para proteção adicional ao frasco de vidro, e a embalagem secundária. Veja as figuras a seguir.

Figura 14 – Envoltório intermediário para acondicionamento de ampolas

Adaptada de: https://cutt.ly/OSHs7ie. Acesso em: 23 mar. 2022.

46
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Embalagem primária Embalagem secundária Embalagem terciária

Figura 15 – Níveis de embalagem farmacêutica

Adaptada de: Amarji et al. (2018, p. 525).

Independentemente do nível de embalagem, especificações da qualidade são estabelecidas


para todas elas, de modo que o medicamento tenha a sua apresentação padronizada. Um aspecto
fundamental para a embalagem primária é a sua compatibilidade com os componentes da
formulação; assim, vários tipos de materiais são empregados, sendo a sua escolha definida na fase
de desenvolvimento do produto, com os estudos de estabilidade.

Atualmente, além dos resultados da estabilidade, a Anvisa solicita que os fabricantes dos
medicamentos apresentem os estudos de extraíveis e lixiviáveis da embalagem primária, condição
exigida para a obtenção do registro do produto (BRASIL, 2016). Tais estudos estão relacionados com o
potencial de migração de substâncias da embalagem para o produto.

Saiba mais

Para mais informações sobre os requisitos exigidos pela Anvisa, consulte


a legislação a seguir:

BRASIL. RDC n. 73, de 7 de abril de 2016. Brasília: Anvisa, 2016. Disponível


em: https://bit.ly/3D5hBP2. Acesso em: 22 mar. 2022.

Além desses testes, outros relacionados com as características físicas da embalagem também
são realizados, como a integridade do fechamento e a avaliação de aspecto, que serão apresentados
mais adiante.

Em relação à composição, vários são os materiais utilizados nas embalagens de produtos


farmacêuticos: vidro, borracha/elastômero, plástico, papel e alumínio. Para cada um deles há uma
variedade de tipos, e muitas empresas trabalham na produção de embalagens para a indústria

47
Unidade I

farmacêutica. No quadro a seguir são exemplificados alguns testes farmacopeicos para a caracterização
da composição do material de embalagem.

Quadro 9 – Tipos de materiais de embalagem e


exemplos de testes farmacopeicos recomendados

Materiais Tipos Testes


Tipo I – Borossilicato: não alcalino
Alcalinidade
Tipo II – Alcalino tipo sódico/cálcico: alta resistência eletrolítica
Vidro Limite de arsênio
Tipo III – Alcalino tipo sódico/cálcico: média resistência eletrolítica
Capacidade volumétrica total
Tipo IV – Não parenteral (NP)
PEBD – Polietileno de baixa densidade
PEAD – Polietileno de alta densidade
Espectroscopia no infravermelho
PP – Polipropileno
Análise térmica
PVC – Cloreto de polivinila
Metais pesados
PET – Politereftalato de etileno
Plástico Resíduos não voláteis
PETG – Politereftalato de etilenoglicol
Transparência
Aclar – Clorotrifluoroetileno
Capacidade tamponante
EVA – Etil vinil acetato
Permeação vapor/gás
PC – Policarbonato
Poliolefina
Acidez ou alcalinidade
Substâncias redutoras
Tipo I (para soluções aquosas)
Elastômero Metais pesados
Tipo II (para soluções não aquosas)
Análise térmica
Penetrabilidade

Adaptado de: Anvisa (2019a); Rodrigues e Ferraz (2007); Taneja et al. (2018).

Esses testes são bastante importantes e devem fazer parte do certificado de análise desses materiais,
sendo geralmente realizados por seus fabricantes. Entretanto, a responsabilidade também é da empresa
que produz o medicamento, e alguns testes podem ser realizados pelo setor de controle de qualidade
para a confirmação da qualidade do material e a liberação para utilização.

Além da avaliação da composição, a checagem do aspecto do material de embalagem é


muito importante, pois deve-se pensar na segurança do paciente no momento da utilização do
medicamento, na proteção da formulação, assim como na apresentação do produto. É considerada
como defeito (veja o quadro a seguir) qualquer discordância da unidade do material com os
requisitos especificados.

48
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Quadro 10 – Requisitos especificados de embalagem considerando


defeitos críticos e não críticos maiores e menores

Defeitos não críticos


Material Defeitos críticos Defeitos Defeitos
maiores menores
Dobras; rugas; marcas de Pintas pretas;
Quebras; trincas; bolhas; deformações ou molde; partículas de vidro
Vidro pequenas
estrangulamento do corpo; mau fechamento aderidas internamente; pedras; sujidades
enfumaçado
Medidas diferentes do padrão; defeitos
de fabricação (bolhas, rebarbas, Sujeira; várias tonalidades Pequenas
Plástico estrangulamentos, mau fechamento, trincas, de cor; falhas na impressão; manchas e
impressão borrada, cor totalmente diferente manchas acentuadas arranhões
do padrão)
Medidas diferentes do padrão; tampas
quebradas, rachadas e que se quebram no Sujeira; estrangulamento;
fechamento ou não fecham direito; batoque presença de lascas e rebarbas; Pequenas
Tampas de mal embutido; defeitos de fabricação várias tonalidades de cor; manchas e
plástico (bolhas, rebarbas, estrangulamentos, mau falhas na impressão; manchas arranhões
fechamento, trincas, impressão borrada, cor acentuadas
totalmente diferente do padrão)
Sujeira; tonalidade amarelada;
Batoques de rebarba que dificulta o
Medidas diferentes do padrão -
plástico fechamento; manchas
acentuadas

A figura a seguir traz dois exemplos de fissuras que podem ser encontradas em frascos de vidro.

Figura 16 – Exemplos de fissuras em frascos de vidro

Adaptada de: Akers (2010, p. 78).

Outro aspecto bastante importante é a vedação, que varia de acordo com o tipo de material
de embalagem e seu sistema de fechamento. A padronização das dimensões de todas as partes da
embalagem, como frascos, tampas, tampas de borracha e anéis de vedação, é fator crítico, pois um
desvio em relação ao tamanho pode acarretar dificuldades de encaixe no ferramental da máquina de
produção ou no fechamento inadequado da embalagem.
49
Unidade I

Como pode ser observado na figura a seguir, os selos de alumínio precisam estar no tamanho correto
para a vedação dos frascos (a), e o encaixe da tampa de borracha só é possível porque tem a dimensão
adequada em relação à abertura do frasco (b).

A) B)

Figura 17 – Máquinas de envase e fechamento de frascos:


A) etapa de inserção do lacre metálico; B) etapa de colocação da tampa de borracha

Adaptada de: Akers (2010, p. 282-291).

Em alguns casos, o material de acondicionamento é produzido no próprio equipamento de envase,


como em sistemas de Blow-Fill-Seal (BFS). Nesses casos, pellets de polietileno são inseridos na máquina
e os frascos são formados com o aquecimento dos moldes, sendo na sequência realizadas as etapas
de envase e selagem da embalagem. Neste caso, os pellets de polietileno devem ser adquiridos com
a especificação adequada, e análises de controle de qualidade dos frascos são realizadas em amostras
retiradas em vários momentos ao longo do processo. Nesse tipo de embalagem, a vedação é ponto
crítico e o potencial de colapsamento do frasco também é avaliado.

Observação

O potencial de colapsamento está relacionado com a possibilidade


da deformação da embalagem quando submetida a um processo de
autoclavação.

Os blísteres também são exemplos de embalagem que é produzida durante a fabricação do produto,
na fase de colocação dos comprimidos (blistagem). Para isso, rolos de plástico e alumínio (veja a figura
a seguir) são adquiridos com a especificação adequada e amostras devem ser retiradas ao longo do
processo para o teste de vedação.

50
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Rolo de alumínio

Aquecimento

Coleta de blísteres

Comprimidos

Vácuo

Descarte de rebarbas

Lâmina de plástico
Infravermelho

Figura 18 – Etapas da blistagem: moldagem do blíster de


plástico, colocação dos comprimidos e selagem com o alumínio

Adaptada de: Taneja et al. (2018, p. 559).

Esse teste de vedação é conhecido como teste de estanqueidade. Embora existam equipamentos para
essa finalidade, um modo simples de fazer a sua avaliação é pelo mergulho do blíster em uma solução
de azul de metileno em um dessecador acoplado com uma bomba de vácuo. O resultado é considerado
adequado se após um determinado período não houve entrada da solução de azul de metileno na parte
interior da embalagem. Esse teste também pode ser aplicado a outros materiais.

Saiba mais

Para se aprofundar mais no assunto de controle de qualidade de


materiais de embalagem, consulte:

ANVISA. Farmacopeia Brasileira, 6ª edição. v. I-II. Brasília, 2019a.

51
Unidade I

Resumo

Dentro do contexto da manipulação e produção de medicamentos, o


controle de qualidade é o setor que avalia se o produto e os materiais
empregados na sua obtenção atendem aos critérios de qualidade requeridos.
Para isso, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), baseada em
normas internacionais, disponibiliza uma série de itens normativos que
pressupõe a qualidade na indústria farmacêutica.

Nesta unidade, foram inicialmente apresentados os aspectos relacionados


à conceituação e às diretrizes do sistema da qualidade, com ênfase nos
setores da garantia e controle de qualidade e suas respectivas atribuições
no âmbito das boas práticas de fabricação.

A confirmação da qualidade de uma matéria-prima, um produto ou


um material de embalagem só deve ser manifestada mediante a realização
de ensaios da qualidade que sejam capazes de assegurar que os atributos
avaliados estão em concordância com as especificações previamente
estabelecidas. Tais especificações estão distribuídas em todas as fases do
controle da qualidade, podendo ser baseadas em critérios farmacopeicos
ou não. Por outro lado, em geral, a atribuição da qualidade muitas vezes
é realizada pela comparação com um material de referência, chamado de
padrão ou substância química de referência.

Estabelecidos os conceitos iniciais do controle de qualidade, a segunda


metade desta unidade trouxe os aspectos relacionados à amostragem de
materiais para a realização dos ensaios de qualidade e a sua importância no
resultado analítico. Essa coleta de amostras deve seguir um plano de amostragem
fundamentado no tipo de material, na fase do processo e na quantidade de
unidades necessárias para a realização do conjunto de análises e seus retestes.

O sucesso do resultado analítico é dependente não só da quantidade


de amostras, mas também da técnica aplicada na sua preparação,
principalmente quando a amostra a ser analisada consiste em um produto
terminado ou semiacabado, em que os excipientes podem interferir na
determinação da substância ativa. Entre as estratégias de preparo, foram
mencionadas a extração por solventes e os sistemas de extração em fase
sólida (SPE), aplicando os mesmos conceitos da cromatografia.

Por fim, foram apresentados os aspectos pertinentes ao controle de


qualidade de materiais de embalagem, especialmente ao acondicionamento
primário, uma vez que está em contato direto com o produto.

52
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Exercícios
Questão 1. Leia o texto a seguir, referente à Resolução RDC n. 301, de 2019:

Seção III

Do controle de qualidade

Art. 13. O Controle de Qualidade é a parte das BPF referente à coleta de amostras, às especificações
e à execução de testes, bem como à organização, à documentação e aos procedimentos de liberação
que asseguram que os testes relevantes e necessários sejam executados, e que os materiais não sejam
liberados para uso, ou que produtos não sejam liberados para comercialização ou distribuição, até que
a sua qualidade tenha sido considerada satisfatória.
Disponível em: https://cutt.ly/xSHDbkt. Acesso em: 25 jan. 2022.

Avalie as afirmativas a seguir, que foram propostas no âmbito do artigo 14 da Resolução e correspondem
aos requerimentos básicos para que haja o controle de qualidade dos produtos farmacêuticos:

I – Devem existir instalações adequadas, pessoal treinado e procedimentos aprovados que precisam estar
disponíveis para amostragem e teste de matérias-primas, materiais de embalagem, produtos intermediários,
a granel e terminados e, onde apropriado, para monitoramento das condições ambientais para fins de BPF.
II – Os produtos acabados devem apresentar a composição qualitativa e quantitativa em conformidade
com o descrito no registro ou na autorização para uso em ensaio clínico. Os componentes devem ter a
pureza exigida e devem estar em recipientes apropriados e devidamente rotulados.
III – Devem ser registrados os resultados da inspeção e dos testes realizados nos materiais, produtos
intermediários, a granel e terminados, demonstrando que foram formalmente avaliados em relação
à especificação, que deve incluir a revisão e a avaliação da documentação relevante de produção e a
avaliação dos desvios dos procedimentos especificados.

Assinale a alternativa correta:

A) Apenas a afirmativa I é correta.


B) Apenas a afirmativa II é correta.
C) Apenas as afirmativas I e III são corretas.
D) Todas as afirmativas são corretas.
E) Nenhuma afirmativa é correta.

Resposta correta: alternativa D.


53
Unidade I

Análise das afirmativas

I – Afirmativa correta.
Justificativa: corresponde ao inciso I do artigo 14 da Resolução RDC n. 301, de 2019.

II – Afirmativa correta.
Justificativa: corresponde ao inciso V do artigo 14 da Resolução RDC n. 301, de 2019.

III – Afirmativa correta.


Justificativa: corresponde ao inciso VI do artigo 14 da Resolução RDC n. 301, de 2019.

Questão 2. Leia o texto a seguir:

Farmacopeia é o código oficial farmacêutico que estabelece especificações de qualidade dos


produtos farmacêuticos, contemplando monografias, especificações e técnicas gerais que abrangem
desde a matéria-prima até a embalagem final do medicamento. É, portanto, essencial para a rotina do
laboratório de Controle de Qualidade nas indústrias farmacêuticas.

O setor denominado Controle de Qualidade é o responsável pelas análises realizadas em todas as


matérias-primas, produtos em processo e produtos finais. Tal setor deve efetuar amostragens e análises
garantindo autenticidade e confiança nos resultados para então poder realizar a liberação deles. As
análises físico-químicas em conjunto com as microbiológicas são importantes para poder confirmar
a autenticidade e qualidade de matérias-primas. Uma das análises mais importantes em se tratando
de matéria-prima vegetal é a determinação quantitativa dos compostos químicos. Por meio desse tipo de
análise pode-se quantificar o(s) marcador(es) químico(s) da planta, e então avaliar se os resultados
obtidos se encontram dentro de especificações pré-estabelecidas.
Adaptado de: NEMITZ, M. C.; MALLMANN, L.; STEPPE, M. Evolução dos métodos quantitativos
empregados para plantas medicinais ao longo das edições da farmacopeia brasileira. Revista Eletrônica
de Farmácia, v. 13, n. 1, p. 18-27, 2016. Disponível em: https://cutt.ly/FSHGJBl. Acesso em: 27 jan. 2022.

Com base nessas informações e em seus conhecimentos, avalie as afirmativas:

I – A Farmacopeia Brasileira é de responsabilidade da Anvisa, que é a autoridade sanitária brasileira.


II – A Farmacopeia Brasileira é um livro que reúne normas e informações sobre as análises de diversos
tipos de insumos, materiais de embalagem e medicamentos (por exemplo, fitoterápicos e radiofármacos),
todos relacionados à farmacologia nacional.
III – Quando as especificações necessárias para determinado produto ou procedimento não estão
descritas na Farmacopeia Brasileira vigente, devem ser realizados experimentos controlados para
que se criem tais especificações, e elas só poderão ser usadas após a publicação de nova edição da
Farmacopeia Brasileira.

54
CONTROLE DE QUALIDADE DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS

Assinale a alternativa correta:

A) Apenas a afirmativa I é correta.

B) Apenas a afirmativa II é correta.

C) Apenas as afirmativas I e II são corretas.

D) Todas as afirmativas são corretas.

E) Nenhuma afirmativa é correta.

Resposta correta: alternativa C.

Análise das afirmativas

I – Afirmativa correta.

Justificativa: de fato, requisitos básicos devem ser cumpridos nos laboratórios e nas indústrias
farmacêuticas. Esses requisitos, descritos na Farmacopeia Brasileira, são aplicados na aquisição da
matéria‑prima vegetal, no processo produtivo, no controle e na garantia das análises, no armazenamento
e na distribuição, indo até o consumidor final. No Brasil, todas essas etapas são normatizadas e
fiscalizadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que busca proteger e promover a
saúde em nosso país.

II – Afirmativa correta.

Justificativa: para garantir que as análises realizadas na matéria-prima ou no produto acabado


estejam de acordo com o que foi estabelecido pelas legislações e pelos códigos oficiais (ou seja, pelas
farmacopeias), os setores de controle de qualidade devem buscar nas farmacopeias os parâmetros
necessários para avaliarem desde os insumos até os produtos.

III – Afirmativa incorreta.

Justificativa: em situações em que as especificações necessárias não estão descritas na Farmacopeia


Brasileira, existe, sim, a possibilidade de usar a Resolução RDC n. 511/2021 da Anvisa, que permite adotar
uma informação existente na última edição de algumas farmacopeias de outros países ou continentes,
como a americana e a europeia. Tal procedimento agiliza o processo de produção nacional enquanto
especificações para a realidade e as necessidades brasileiras são definidas cientificamente.

55

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