Fichamento Dos Textos de Apoio - Gabriel

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GÊNERO E SEXUALIDADE NOS PCNs: UMA PROPOSTA

DESCONHECIDA
SILVA, Dayse de Paula Marques da – UERJ GT: Gênero, Sexualidade e
Educação / n.23 Agência Financiadora: Sem Financiamento

Gênero e Sexualidade

. Embora gênero e sexualidade sejam dois aspectos diferentes, a estrutura social


confere aos papeis de gênero um padrão culturalmente disseminado. Este é
questionado em toda sua estrutura a partir do momento em que se há dissonâncias
entre performance, identidade, expressão de gênero e a sexualidade propriamente
dita. Ideias como “passivo” e “ativo”, denominações próprias utilizadas para
descrever o papel sexual nas relações de pessoas de gêneros biológicos afins, se
mesclam com as performances de gênero ditas como “coerentes em uma sociedade
binária”
. A princípio, a publicação das PCN’s acarretou em muitos posicionamentos
contrários de alguns educadores, em parte pela problemática não sanada sobre quem
deve ser o principal agente da educação sexual: a família ou a escola. Ademais,
relegar essa responsabilidade aos educadores acarretaria em mais uma grande
responsabilidade e um assunto extremamente delicado no ambiente escolar. Não é
incomum que as pautas em aula que envolvem o tema “sexualidade” ainda causem
desconforto quando debatidas, isso em ambos os lados. Também não há um devido
direcionamento do que deve ser ensinado aos alunos, tocante a temas transversais
como esse
. Já os pesquisadores das relações de gênero discordam das PCN’s pois entendem
que estas guiam o enfoque para a sexualidade em detrimento do gênero que será
visto de acordo com o padrão biológico e ignorando as construções socioculturais ao
redor de tal problemática. Segundo eles, essa dinâmica acabaria por aprofundar as
diferenças acerca da ideia de um papel de gênero e como este costuma se situar no
espectro da sexualidade

Se, por um lado, esta citação insinua uma crítica à naturalidade do corpo através
da afirmação de variações culturais, por outro, ao final do trecho, a sexualidade é
reinscrita como um invariante histórico, uma entidade natural que perpassaria
todas as culturas ainda que se manifeste nestas de formas diferentes. Ainda que o
documento admita manifestações diversificadas da sexualidade, ele não
problematiza a categoria sexualidade sob o ponto de vista de sua constituição
histórica, da mesma forma que em relação a outras categorias, como
homossexualidade e heterossexualidade.
(ALTMANN, 2001, pág. 7. Texto PDF, Sciello)

. É necessário entender a origem do fracasso das PCN’s e dos contrários


posicionamentos dos professores e dos pesquisadores das relações de gênero.
Analisando a estrutura como um todo, se torna lúcido que pautas transversais como
gênero e sexualidade não conseguem ser postas em pauta pela falta de estrutura, e
não necessariamente por culpa dos profissionais da educação
. Contudo, cabe aos pesquisadores uma devida releitura que reconheça as diferentes
realidades em cada ambiente escolar. Como discutir sobre educação sexual em uma
rede de ensino com recursos escassos, professores sobrecarregados, classes de
diferentes faixas etárias e diferentes conhecimentos que precedem as salas de aula?
. Situações como prática sexual precoce é realidade na vida de muitos estudantes, o
que faz urgir ainda mais tal debate. Porém, como estabelecer essa discussão se os
professores não recebem um norteamento ou planejamento efetivo?

Sou professora temporária há quase dez anos nas redes estadual e municipal. Já fiz
três concursos. Num deles, fiquei na 38ª colocação e só convocaram até a 33ª . Os
contratos são de no máximo 12 meses e todo ano é uma angústia esperar para ver
se vou pegar uma classe. E, quando isso acontece, o governo leva de dois a três
meses para fazer o primeiro pagamento. Deveríamos ter os mesmos benefícios que
os efetivos, afinal fazemos o mesmo trabalho que eles. O contratado também não
tem acesso aos cursos que os concursados podem fazer. E, sem uma remuneração
regular, como posso me programar para fazer uma boa capacitação? Os maiores
prejudicados nessa história toda acabam sendo os alunos
(Depoimento. Revista Nova Escola, Abril 2007. pág 33)

. Inúmeros fatores geram entraves no processo de educação sexual nas escolas. Entre
eles: discutir papeis de gênero e o sexo entre pessoas de gêneros afins, redesignação,
abuso sexual, estruturas sociais misóginas, hierarquização e outros fatores em uma
sociedade com raízes conservadoras. Além disso, há a delimitação sobre o espaço
escolar e familiar e até que ponto essa educação influencia ativamente nas relações
parentais. Também vale questionar até onde o professor pode transpassar suas
convicções sobre o tema em prol do ensino e se este o fará de maneira completa
. Elucidando as problemáticas, faz-se entender que o caminho melhor adequado para
saná-las é justamente através do estudo de gênero, não ignorando os princípios e
amarras impostas na relação identidade/expressão/performance, mas justamente se
aprofundando para que estas sejam questionadas, problematizadas e então
contribuam para a formação de um conhecimento capaz de destrinchar as
hierarquizações e promover a equidade. Sanando as dúvidas e entendendo as
cicatrizes históricas, é construído o entendimento das relações sexuais e afetivas
entre pessoas do mesmo gênero como direito inegociável, que diz respeito à vida
íntima de cada indivíduo
. Os campos de estudos de gênero somam ainda mais a esse tema, evidenciando o
corpo biológico como uma estrutura cuja definição não esgota as possibilidades
pretendidas pelo indivíduo.
. Uma proposta viável seria iniciar ao contrário do que é proposto nos PCN’s,
direcionando o primeiro contato para o gênero e não a sexualidade. Ao estabelecer o
conhecimento sobre as hierarquizações, a misoginia, as naturalizações estruturadas
nas culturas, falas, interpretações, por consequente o tema “sexualidade” seria
destrinchado com um olhar mais atento aos papeis propostos para cada lado. Esse
traçar metodológico também se estenderá a situações além da sala, como nas aulas
de educação física, por exemplo, onde serão propostos times mistos, visando a
compreensão das aptidões de cada aluno, sanando questões estruturais e
compreendendo as diferenças fisiologicamente, sem necessariamente apartar o aluno
e aluna da sua área de interesse (compreensão de como os corpos funcionam, quais
seus pontos sensíveis e não sensíveis, em quais este estabelece potência). Contudo,
essas premissas não devem ignorar as fluências orientadas pelos fatores fisiológicos.

Sexualidade dos alunos e professores

Compreender as relações de gênero no ensino fundamental implica aceitar que as


crianças vivenciam a sexualidade.

O educador deve estar sempre atento para a necessidade de repetir o mesmo


conteúdo já abordado. As crianças vivem suas curiosidades e interesses na área da
sexualidade em momentos próprios e diferentes umas das outras, ocorrendo muitas
vezes estudo e a discussão de um tema com pouca apropriação desse conhecimento
para algumas. A retomada é importante e deve ser feita sempre que as questões
trazidas pelos alunos apontarem sua pertinência
(PCNs – Orientação Sexual, pág.143).

A orientação Sexual não-diretiva aqui proposta será circunscrita ao âmbito


pedagógico e coletivo, não tenho, portanto, caráter de aconselhamento individual
de tipo psicoterapêutico. Isso quer dizer que as diferentes temáticas da sexualidade
devem ser trabalhadas dentro do limite da ação pedagógica, sem serem invasivas
da intimidade e do comportamento de cada aluno. Tal postura deve inclusive
auxiliar as crianças e os jovens a discriminar o que pode e deve ser compartilhado
no grupo e o que deve ser mantido como uma vivência pessoal
(PCNs – Orientação Sexual, pág.121).

. Tais informações acabam por criar um terreno turvo para o educador, sem um
devido norteamento de quais assuntos dessa problemática são de domínio público e
quais pertencem à intimidade do educando, inclusive no que se refere a própria
intimidade do professor
. Os PCNs, apontam uma alternativa para o cuidado com a “invasão” e exposição,
apenas quanto as crianças quando abordam o trato do corpo, não apresentando uma
“solução” para os adolescentes.

Nas atividades relacionadas com este bloco é importante que nenhum aluno se sinta
exposto diante dos demais. Um recurso possível para evitar que isso aconteça é o
da criação/adoção de um personagem imaginário pelo grupo de crianças. Por
intermédio deste personagem podem-se trabalhar dúvidas, medos, informações e
questões das crianças ligadas ao corpo, de forma a ninguém se sentir ameaçado ou
invadido em sua intimidade. Com relação à linguagem a ser utilizada para
designar partes do corpo, o mais indicado é acolher a linguagem utilizada pelas
crianças e apresentar as denominações correspondentes adotadas pela ciência (
PCNs – Orientação Sexual, pág.142).
. Embora as PCN’s avancem no que se refere a pluralizar a pauta, não deixando-a
apenas para os psicopedagogos, psicólogos e assistentes sociais. Por consequente,
faz-se necessário maior capacitação dos professores para essa modalidade de ensino

Outro ponto a se considerado para as intervenções do professor nas situações de


manifestação de sexualidade de seus alunos em sala de aula é o referente aos
valores e a ela associados. O professor não deve emitir juízo de valor sobre essas
atitudes, e sim contextualizá-los. O mesmo vale para as respostas que oferece às
perguntas feitas por seus alunos. Por exemplo, se o professor disser que uma
relação sexual é a que acontece entre um homem e uma mulher após o casamento
para se ter filhos, estar transmitindo seus valores pessoais (sexo somente após o
casamento com o objetivo de procriação). É necessário que o professor possa
reconhecer os valores que regem seus próprios comportamentos e orientam sua
visão de mundo, assim como reconhecer a legitimidade de valores e
comportamentos diversos dos seus. Sua postura deve ser pluralista e democrática, o
que cria condições mais favoráveis para o esclarecimento e a informação sem a
improvisação de valores particulares
(PCNs – Orientação Sexual, pág.153).

. Ainda com os devidos encaminhamentos, vale ressalvar que o tema “gênero” pode
ser considerado uma pauta muito contemporânea no campo da problematização.
Muitos juízos de valores estão arraigados e permeados em toda uma estrutura social,
tornando-os difíceis de mitigar. Relegar toda essa carga para um professor sem uma
orientação específica só gera ainda mais entraves ao processo

O gênero como solução estratégica

. É necessário entender as propostas das PCN’s como um avanço das pautas sociais
nas escolas, sendo enriquecedor para alunos e professores. Contudo, tal qual os
currículos em geral, essas propostas devem ser revistas, analisadas em seu cerne e
reformuladas de acordo com as necessidades apresentadas para que se estabeleçam
corretamente e alcancem o devido propósito: educar

O tema Orientação Sexual foi publicado junto com o tema Pluralidade Cultural, no
volume 10, apresentando um material bem mais reduzido, o que revela um
investimento maior no primeiro. De alguma forma, ele ficou associado ao tema
Pluralidade como se este fosse o tema principal, e a orientação sexual um
“subtítulo”, apesar do destaque na capa.

. Um dos pontos também reconhecidos como bloqueio para a real discussão é


justamente o tema “sexualidade”, sendo um rizoma abrangentemente abordado em
detrimento do alicerce no qual este se debruça: o gênero
. A troca do termo “Educação Sexual” para “Orientação Sexual” (termo utilizado
pela comunidade LGBTQIA+) também gerou grande polêmica, ojerizado por
adeptos às conjunturas sociais conservadoras, tornando assim ainda mais difícil
discutir sobre a importância da pauta central na grade curricular estudantil. Essa
publicação publicada junto ao tema Pluralismo Cultural também propunha a
discussão quanto ao direito de expressão sexual de pessoas fora do molde
hegemônico.

É necessário, explorar mais e divulgar, com trabalhos mais sistemáticos junto às


escolas, o que implica efetivamente, o gênero como uma categoria analítica,
favorecendo a identificação de situações onde as relações de gênero, estabelecidas
assimetricamente estão operando e a partir daí, colaborar para desconstruir os
mecanismos que estabelecem a hierarquia, o desrespeito ao outro. Entretanto, esta
ação implica em apresentar alternativas, o que dificulta escapar de propostas que
enquadrem ações em “novos modelos”, mas se, realizadas com flexibilidade e
criatividade pode vir a surpreender o próprio gestor ou consultor que do seu
gabinete não acredita que alguns profissionais da ponta, podem realmente
participar, se convencido da importância de sua interferência.

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