Um abraço que sufoca seriam um “excesso populacional que
não tinha espaço no Velho Mundo”(de
STAM, Robert. Multiculturalismo Darcy Ribeiro, em O povo brasileira: a tropical - Uma história comparativa formação e o sentido do Brasil), com- da raça na cultura e no cinema brasi- bate “verdades” mal teorizadas que leiros. São Paulo: Edusp. 2008, 526p. sustentam a flexibilidade brasileira e a frigidez anglo-saxônica. Demonstra Em Multiculturalismo Tropical afinidades culturais entre o samba e o (2008), Robert Stam analisa o cinema jazz, o soul food1 e a feijoada, o break brasileiro no que tange a questões ét- e a capoeira, afirma o multiculturalismo nicas e raciais. Numa perspectiva inter- como fenômeno pan-americano. Ocor- disciplinar, discute, entre outros temas, re que essas diásporas tiveram muitas como foram construídas as imagens experiências análogas: em nenhuma a do negro e do índio no filme de ficção independência significou liberdade para brasileiro. negros e índios; ambos foram sociedades Logo no início, Robert Stam anun- escravocratas por mais tempo do que cia a ousada preposição subjacente da têm sido sociedades livres; e os mitos obra: “Brasil e Estados Unidos estão do “sonho americano” e da “democracia profundamente interconectados em um racial” encobriram a opressão racial. jogo espetacular de semelhança, dife- Sabemos que categorias raciais rença, identidade e alteridade”. Embora não são naturais, são relativas e situa- tal preposição indique sutilmente uma cionais, portanto, mutáveis. Africanos comparação entre as cinematografias de escravizados antes do colonialismo não ambos, isso não ocorre e muito menos se retratavam como negros, mas como se revela como intenção do autor. O membros de seus grupos: banto, fon, que é posto em debate são os mitos de hausa. Enquanto nos Estados Unidos separação norte-americanos e os mitos a definição do ser negro se baseia na de fusão brasileiros. Nessa concepção, ancestralidade, independentemente do o Brasil é um tipo de “gêmeo sul” dos fenótipo, no Brasil a percepção de raça Estados Unidos, entre outras seme- se concentra na aparência e em pistas lhanças, ambos receberam ondas de socioculturais. imigração similares para então formaram Os dois países, na condição de sociedades multiculturais e poliétnicas, sociedades multirraciais dominadas além disso, suas histórias foram mar- por brancos, apresentam um profundo cadas por uma luta pela independência racismo que muitas vezes se vincula a cultural em relação à Europa. Embora questões de classe. O racismo brasileiro não constituam sociedades idênticas, é pragmático, paternalista, tende a ser são eminentemente comparáveis, seja disfarçado, se expressa em ações e atra- na perspectiva da conquista, das moda- vés da autorrejeição; mesmo as vítimas lidades de escravidão e discriminação, estão sujeitas a adotar discursos raciais ou na religiosidade. É com veemência que Stam com- 1 Comida de raízes negras do sul dos Estados bate a ideia de que os Estados Unidos Unidos.
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hegemônicos; é um racismo sistêmico, os tempos - tendo atuado em Orfeu camuflado, difícil de ser detectado, da Conceição, Também somos irmãos, “enlouquecedoramente abstrato”, dife- Matar ou Correr, Carnaval Atlântida, rentemente dos Estados Unidos, onde Os Cosmonautas, entre tantos outros, o racismo assume a forma de estranha- quase sempre em segundo plano. Era mento metafísico, enraizado, inclusive, uma espécie de “ator negro chave”, associado a atitudes fóbicas em relação que precisava suportar esse fardo da ao corpo. representação solitária do Brasil negro. Os negros nos Estados Unidos No decorrer dos anos 1950, sempre constituíram uma minoria em críticos de esquerda pregam o cinema termos numéricos e em termos de nacional e popular, rompendo com o poder, no Brasil – país que recebeu tom paternalista do cinema preceden- maior contingente de tráfico negrei- te. O autor aponta Rio 40 Graus como ro – os negros constituíram a maioria pioneiro na representação positiva do marginalizada. De um lado, o “racismo negro, o que viria ser marca da obra segregacionista” norte-americano, de de Nelson Pereira do Santos. Já Orfeu outro, a “ideologia do branqueamento” Negro, de Marcel Camus, é acusado de brasileiro e nas palavras do autor: “em- ter iniciado milhões de não-brasileiros à bora os negros norte-americano fossem cultura brasileira, forjando na consciên- relegados ao ‘porão’ da sociedade, ao cia internacional uma associação entre a menos eles dominavam o porão”. tríade: brasilidade, negritude e carnaval. O estudo realizado por Robert No começo dos anos 1960, o mo- Stam revela que nos primórdios do ci- vimento Renascença Baiana gera filmes nema brasileiro, começo do século XX, verdadeiramente ruptórios. Barravento havia desprezo por temas afro-brasilei- de Glauber Rocha é visto como “um ros, enquanto as versões cinematográfi- manifesto político cultural a favor da cas dos romances indianistas eram quase libertação negra” (Celso Prudente, em uma obsessão: O Guarani, Iracema, Barravento – O Negro como Possível Ubirajara. O índio era celebrado como Referencial Estético no Cinema Novo bravo, guerreiro, “ingenuamente bom de Glauber Rocha). Ganga Zumba festeja e profundamente espiritual”. a república quilombola dos Palmares – Já na década de 1930, os ven- ressaltando que Zumbi fundou um pro- tos ideológicos mudaram. Os negros tótipo de uma sociedade “multicultural” tornaram-se presenças significativas em muito antes de o termo ser cunhado musicais modelados com influência nor- - mostra o negro como agente histórico te-americana, conhecidos popularmente ativo, e para Glauber Rocha, é o “único por chanchadas. Nessa época, Carmem filme de diretor branco que não assumiu Miranda surge como figura de caráter uma atitude paternalista”. ambíguo, para os norte-americanos “um É mesmo nos anos 1990 que a pre- emblema burlesco, porém simpático sença de personagens negros nos filmes de pan-latinidade”. Grande Otelo se de ficção é normatizada. Filmes como destaca como o ator negro mais im- Mato Eles?, de Sérgio Bianchi, descons- portante do período - quiçá, de todos trói o discurso indianista caricaturado,
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é estruturado em torno de perguntas questões como essa: “se o racismo no e respostas de múltiplas escolhas que estilo americano pode ser um tapa na não deixam nenhuma opção confortável: cara, o racismo no estilo brasileiro pode “o extermínio dos índios deveria ser: ser um abraço que sufoca”. a)imediato b)lento e c)gradual. No Luna Cristina Castro Nery mesmo período, filmes “etnográficos” Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em tentam despir-se dos vestígios de atitu- Cultura e Sociedade da Universidade Federal des coloniais e surge a “mídia indígena”, da Bahia em que grupos de diferentes tribos são os próprios produtores e receptores. O livro revela que filmes brasi- leiros refletem realidades do ambiente Redação oficial no de maneira filtrada pelas ideologias Manual da Presidência da correntes, o desafio é discernir o pa- República drão estruturante das características atribuídas aos grupos. O autor explica MENDES, Gilmar Ferreira; JÚNIOR, que o cinema é parte de um espectro Nestor José Forster. Manual de maior de representações da mídia, no Redação Oficial da Presidência da qual os negros são sub-representados República. 2. ed. rev. e atual. Brasília: e os indígenas alegorizados. Em suma, Presidência da República, 2002 Multiculturalismo Tropical é uma história comparativa da raça na cultura e no cine- ma brasileiros, mas é também um estudo As empresas e as instituições não da própria história do Brasil através de sobrevivem sem a comunicação. Inde- suas representações cinemáticas. pendentemente do tipo de organização, Trata-se, verdadeiramente, de um este meio mantém e sustenta os relacio- livro de abrangência notável e impres- namentos no ambiente organizacional. siona que Robert Stam – na condição Nesse sentido, escrever exige consciên- de norte-americano – possua, além de cia e reflexão por parte do redator, pois incrível domínio dos temas, sensibilidade influencia diretamente nos propósitos aguçada, capaz de inserir os filmes em que se tem em relação ao destinatário uma rede interminável de relações. das mensagens. A comunicação escrita Já conhecido do leitor brasileiro, refere-se ao registro das informações entre as suas obras foram traduzidas O que circulam nas organizações públicas espetáculo interrompido (1981), Bakhtin e privadas. No contexto das instituições (2000), Introdução à teoria do cinema públicas brasileiras, a Redação Oficial (2004) e Crítica à Imagem Eurocêntrica institui as normas para a elaboração (2006). Esteve ele também por cami- dos documentos oficiais (Ofício, Memo- nhos variados, professor transdisciplinar rando ou Comunicação Interna, entre da Universidade de Nova York, lecionou outros), tendo como propósito tornar a na Tunísia, na França e no Brasil, onde troca de mensagens mais eficiente e efi- desenvolveu pesquisas voltadas para caz, bem como auxiliar no atendimento arte, cultura e política e onde pensou aos princípios da Administração Pública:
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legalidade, impessoalidade, moralidade normas para grafia e digitação de docu- e publicidade mentos, como, por exemplo, as regras Nessa ótica, era de se esperar que utilizadas para endereçamento, grafia de a bibliografia nacional sobre o tema fosse datas e números, siglas, formas combi- um instrumento eficaz para os redatores nadas entre parênteses, espaçamento e na padronização dos documentos ofi- destaques nos documentos, observando ciais. Mas a realidade não é bem assim, apenas a importância de “não haver abu- há disparidades nas orientações sobre so no uso de negrito, itálico, sublinhado, a redação de documentos oficiais. Por letras maiúsculas, sombreado, sombra, exemplo, enquanto o “Manual de Reda- relevo, bordas ou qualquer outra forma ção da Presidência do Brasil”, organizado de formatação que afete a elegância e por Mendes e Júnior, editado pela última a sobriedade do documento”. E, final- vez em 2002, faz indicações em um mente, por apresentar orientações insu- sentido, João Bosco Medeiros, em “Cor- ficientes com relação às normas de ela- respondência: Técnica de Comunicação boração dos documentos oficiais, como, Criativa”, edição de 2006, e Adalberto por exemplo, o modo de estruturar o Kaspary, em “Redação Oficial: normas cabeçalho, a data, a assinatura e o fecho. e modelos”, edição de 2007, seguem Nota-se, ainda, que algumas regras outros caminhos nas mesmas questões. são abordadas até mesmo de maneira Há, no mínimo, falta de similaridade nas contrária às orientações de estudiosos orientações. Embora a escrita se tenha da área. Logo, conclui-se que o Manual modernizado e tenha havido uma mo- apresenta precariamente as normas de dificação na forma rebuscada e prolixa Redação Oficial, aprofundando-se nas de redigir, utilizada no passado, algumas regras gramaticais da Língua Portuguesa obras ainda se encontram desatuali- (ortografia, sintaxe e semântica) e nas zadas e em discordância entre si com orientações sobre o uso correto dos relação às orientações para elaboração pronomes de tratamento e do vocativo de documentos no âmbito oficial. ao se dirigir às autoridades, limitando, O Manual de Redação da Presi- assim, sua área de abrangência ao teor dência da República poderia ser a obra gramatical. Dessa forma, assume uma que melhor auxiliasse as organizações função talvez pouco relevante com- públicas na escrita de seus textos oficiais, parativamente àquela que primordial- contudo, observa-se que tal manual se mente seria de esperar. As Gramáticas apresenta como um guia pouco eficien- de Língua Portuguesa editadas no país te aos redatores. Primeiramente, pelo já oferecem tal conteúdo, não sendo, fato de não conter explanação sobre portanto, necessário que o Manual se as normas específicas de elaboração limite à gramática, visto que os redatores para os modelos oficiais utilizados com e digitadores necessitam obter conheci- frequência nas repartições públicas bra- mentos específicos na área de Redação sileiras (ato, ata, relatório, entre outros), Oficial ao redigir os documentos e cor- mas apenas para o documento ofício, respondências oficiais. Pode ser que, por de maneira escassa e pouco didática. isso mesmo, não haja um consenso entre Segundo, por também não apresentar as próprias instituições públicas do país
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na padronização de seus documentos, unifique a produção de documentos nos como, por exemplo, a normalização de mais diversos setores públicos brasileiros. diversos manuais de Redação Oficial nas Considerando a credibilidade transmitida universidades públicas brasileiras, contri- pelo Manual de Redação da Presidência da buindo para uma diversidade escusada República do Brasil e o potencial intelectual de estruturas oficiais. dos organizadores, a obra deveria nortear Durante a consulta às obras, verifi- tais questões de grafia, estrutura e digita- cou-se que Medeiros e Kaspary abordam ção de documentos oficiais no Brasil, que de forma mais completa e minuciosa os são de crucial importância para alcançar diversos tópicos que a Redação Oficial os objetivos dos processos administrativos abrange. Contudo, em determinados das instituições públicas. Há necessidade pontos de suas obras há divergência nas de atualização e posterior reedição desse prescrições e, ainda, disparidades em Manual como parâmetro de consulta relação a algumas normas preconizadas concreto para os redatores e digitadores pelo próprio Manual da Presidência, das instituições públicas brasileiras, a fim como, por exemplo, a questão da pon- de atender prontamente às necessidades tuação após o vocativo. O Manual reco- práticas de comunicação escrita oficial no menda que se utilize a vírgula, nesse caso, setor público brasileiro. e Kaspary recomenda o uso dos dois pontos após o vocativo dos documentos. Thayana Abreu Viza Figueiredo Pode-se afirmar que as normas, ape- Graduanda do curso de Secretariado Executivo sar de não assegurarem eficácia na produ- Trilíngue da Universidade Federal de Viçosa, ção e compreensão textual, visto que de- Cristiane Cataldi dos Santos Paes pendem de outros fatores, são relevantes Professora do Departamento de Letras da no contexto das instituições do Primeiro Universidade Federal de Viçosa Setor, ao conferirem padronização aos Ana Carolina Gonçalves Reis documentos (legais) que nele circulam. Professora do curso de Secretariado Executivo Logo, faz-se necessário um balizador que Trilíngue da Universidade Federal de Viçosa
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