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Parte I: Mensuração do Comportamento
Natalie Brito Araripe

1.1. Conceito de Mensuração


O que significa mensurar? “Medir é o processo de aplicar categorias
quantitativas para descrever e diferenciar objetos e eventos naturais.
Envolve atribuir um número representando uma extensão de uma
quantidade dimensional para uma unidade apropriada. O número e a
unidade juntos constituem a mensuração de um objeto ou evento”
(COOPER, HERON & HEWARD, 2020, p. 95).
Observe que esse conceito apresenta alguns trechos em negrito. São os
pontos que merecem destaque para a sua compreensão.
Perceba que os autores falam de categorias quantitativas que
descrevem e diferenciam eventos naturais. Por meio da mensuração,
conseguimos atingir o primeiro nível de alcance do conhecimento científico: a
descrição – conseguimos descrever um evento da forma mais objetiva
possível. Essa descrição ocorre por meio de uma quantidade dimensional e
uma unidade apropriada. Você conseguiria descrever o peso de uma pedra
utilizando a unidade metro? Que unidade você deveria usar? E, diante uma
unidade padronizada, qual número indicaria esse peso? Vamos adiante: qual
instrumento de mensuração você utilizaria para essa medida?
Ficou clara a diferença entre unidade, quantidade e forma de
mensuração? Se não tiver ficado claro ainda, escolha qualquer objeto próximo
a você e se faça três perguntas sobre ele? Qual DIMENSÃO RELEVANTE eu
poderia medir (unidade)? Como eu mediria essa dimensão (forma de
mensuração)? Que NÚMERO resultaria essa medição (QUANTIDADE
DIMENSIONAL)?
Nesse ponto, alguns de vocês devem estar se perguntando: ué, mas não
estou aqui para aprender sobre comportamento? E você está ensinando sobre
objeto? Volte ao conceito de mensuração e perceba: você pode mensurar
objetos ou eventos. Comportamento é um evento natural; a análise do
comportamento, inclusive, chega a ser considerada uma ciência natural

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recorrentemente na área (MARR, 2009).
Há três passos para a mensuração de um comportamento: 1. Identificar
o comportamento a ser mensurado; 2. Definir o comportamento em termos
observáveis e 3. Selecionar uma observação apropriada e métodos de
registros de dados (COOPER, HERON & HEWARD, 2020). Falaremos nessa
primeira parte sobre os componentes relevantes para os passos 01 e 02. Na
segunda parte (módulo 02) dessa disciplina, versaremos sobre o passo 03 e,
na terceira parte (módulo 03) iremos um passo adiante da mensuração:
falaremos sobre análise de dados e da qualidade dos dados.

1.2. Passo 01: Identificando o Comportamento a Ser Mensurado


Para identificar o comportamento a ser mensurado, devemos
compreender a importância da sua escolha para a qualidade da medida e as
dimensões quantitativas do comportamento.
Por que devemos mensurar?
O objeto de estudo e intervenção da Análise do Comportamento
Aplicada é o comportamento socialmente relevante (CSR). Acontece que, a fim
de identificarmos um CSR, precisamos identificar e medir a dimensão
considerada socialmente relevante. Identificamos primeiramente o nível de
determinado comportamento e se aquele nível necessita de intervenção.
Supondo que inserimos uma intervenção, é importante medirmos para
sabermos se ela está funcionando, a extensão da mudança, se e quando o
comportamento mudou, a extensão a duração e a magnitude da mudança.
Além disso, é importante sabermos a variabilidade, a estabilidade, a
manutenção e a generalização da mudança. Isso só é possível com a
mensuração (COOPER, HERON & HEWARD, 2020).
Sobretudo, quando não medimos, corremos o risco de descontinuar
uma intervenção efetiva ou de continuar uma intervenção inefetiva, de
acordo com os mesmos autores.
Agora que você já sabe todos os fatores que deve considerar para
inserirmos um instrumento de mensuração correto, deve aprender sobre a
escolha correta da dimensão e do instrumento de mensuração. Para tanto,

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deverá compreender quais são as dimensões mensuráveis de um
comportamento. Observe o esquema abaixo na próxima página.

Extensão Lócus
Repetibilidade
Temporal Temporal

Tempo entre
Frequência Celeração Taxa Duração Latência
respostas

Figura 01: Dimensões mensuráveis do comportamento.

Os retângulos superiores do esquema são relativos às dimensões


mensuráveis do comportamento, também chamadas quantidades
dimensionais. São três (COOPER, HERON & HEWARD, 2020):
• Repetibilidade – Cada instância do comportamento ocorre
repetidamente. São medidas baseadas em repetibilidade: frequência, taxa e
celeração. Essas medidas também são chamadas medidas de ocorrência.
• Extensão temporal – Cada instância do comportamento ocorre em um
período do tempo. A duração é uma medida baseada nessa dimensão. A taxa
e a celeração também derivam dessa dimensão. Essas medidas também são
chamadas medidas baseadas em tempo.
• Lócus temporal - Cada instância do comportamento ocorre em certo
ponto no tempo em relação a outros eventos. Latência e tempo entre
respostas (TER) são as medidas baseadas em lócus. Elas também são
medidas baseadas em tempo.
A frequência de um comportamento é simplesmente a quantidade de
vezes que um determinado comportamento ocorre. Por exemplo: o número de
cigarros que uma pessoa fuma; o número de questões corretas em uma prova,
o número de passos dados por alguém... a frequência pode não ter suficiente
para tomada de decisões, pois não temos outra dimensão para basearmos a
medida.
A taxa, por sua vez, é uma medida bastante utilizada por analistas do
comportamento, justamente por considerar a relação mais simples entre evento
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e tempo. A taxa é relativa à frequência sob duração, ou seja, o número de
respostas sob unidade de tempo. Comumente, encontramos a taxa
representada em termo de respostas por minuto, no entanto, também
encontramos a taxa reportada por 30 segundos 01 hora, 01 dia, 01 mês e até
um ano. Frequência e taxa são medidas úteis para operantes livres
(comportamentos com início e fim discretos). Não são úteis para operantes
restritos a oportunidades.
Quando falamos de medidas de taxas que se estendem por um período,
muitas vezes estamos interessados na evolução dela nesse período, ou seja,
se ela está acelerando ou desacelerando. Para esse cálculo, de taxa por
tempo, usamos uma medida chamada celeração, que seria, portanto, a
unidade de frequência dividida por tempo e por tempo novamente. Um
exemplo: O quanto a taxa de respostas de leitura de palavras por minuto
acelera ou desacelera no tempo? Autores da área de ensino por precisão
(Precision Teaching) utilizam a celeração como medida básica para
aprendizagem.
A Duração de um comportamento é equivalente ao “tempo total
ocupado por um comportamento do início ao fim” (MILTENBERGER, 2020, p.
19). Exemplos: o tempo no qual uma criança usa chupeta por dia; a duração do
comportamento de correr ao redor da casa... para medirmos a duração de um
comportamento em tempo real, geralmente precisamos de um cronômetro.
A latência, por sua vez, corresponde ao tempo desde o início de um
estímulo até o início da resposta que o sucede. Geralmente, a latência se torna
um objeto de interesse de um analista do comportamento quando ela ocorre
em um período muito curto (ex.: aluno que já responde a uma pergunta antes
de a professora terminar) ou muito longo (ex.: a pessoa demora 10s para dizer
o nome em resposta a “qual o seu nome?).
O Tempo Entre Respostas é a medida de lócus temporal que relaciona
uma resposta à próxima subsequente. É o tempo entre duas instâncias
consecutivas da mesma resposta. Utilizado também de forma indireta para o
cálculo da taxa, pois, quanto maior o tempo entre respostas, menor a taxa.
Exemplo: Uma criança escreve 4 palavras na duração de 1 minuto. A taxa seria

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de 4 respostas por minuto e o tempo entre respostas médio seria de 15
segundos. Se ela passar escrever 6 respostas por minuto, a taxa aumenta e o
TER médio cai para 10 segundos. Agora que você já sabe identificar as
dimensões básicas do comportamento, precisará definir o comportamento em
termos observáveis.
Existem ainda medidas que chamamos de definicionais do
comportamento. Isso porque não são relativas a dimensões quantitativas
relevantes, mas sim, como formas de definir uma resposta. São elas:
Topografia e Magnitude. A Topografia é relativa à forma de um
comportamento, ou seja, como ele se apresenta. E a magnitude é a força,
intensidade, energia ou esforço da emissão de uma resposta (ex.: volume da
fala de alguém).

1.3. Passo 02: Definição do Comportamento em Termos Observáveis


Antes de qualquer comportamento ser analisado, precisa ser definido, a
fim de que possa ser replicado (a replicação é uma das características
fundamentais de uma abordagem científica). Observe o que Miltenberger
(2020) afirma sobre o assunto:

“Para definir o comportamento-alvo de uma pessoa em


particular, é preciso identificar exatamente o que a pessoa diz
ou faz que constitui o déficit ou excesso comportamental que
é alvo da mudança. Uma definição comportamental inclui
verbos da ação que descrevem comportamentos específicos
que uma pessoa exibe. Uma definição comportamental é
objetiva e não ambígua” (p. 19).

A fim de o comportamento ser bem definido, a sua definição precisa


atender a três requisitos: deve ser objetiva, clara e concisa. Por objetiva,
entende-se que se refere apenas a eventos observáveis ou traduz um termo
inferencial em mais objetivos. Uma definição clara é aquela sem
ambiguidades. Por fim, uma definição concisa é completa, especifica seus
limites.
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Um exemplo de um tipo de descrição que quase sempre é ambígua é
aquela ligada a rótulos. Exemplo: eu digo que João está teimoso na aula hoje.
Isso pode significar tantas coisas diferentes, pois está sujeito à interpretação.
Outro exemplo clássico: Maria está fazendo birra. Nesse caso, cada um de
vocês que está lendo pode interpretar birra de uma forma diferente.
Vamos pegar esse exemplo delineado por Miltenberger (2020, p. 16),
operacionalizando birra: “Quando Bobby chora e soluça, se deita no chão,
chuta as paredes ou joga brinquedos ou outros objetos no chão, isso é
definido como um comportamento de birra”. Leia novamente a definição e
procure os componentes relativos às características objetiva, clara e concisa
da definição. Verbos como chorar, soluçar, se deitar no chão, chutar paredes
e jogar brinquedos são observáveis e claros (não ambíguos). Ele é completo
pois delimita todos os comportamentos dentro de uma classe de
comportamentos (birra).
Para finalizar esse módulo, sugerimos que você escolha 10
comportamentos do seu cotidiano e operacionalize. Entregue as definições
para duas pessoas diferentes. Elas saberiam exatamente para onde olhar? Se
sim, provavelmente a definição está bem descrita!

Parte II: Mensuração do Comportamento

2.1. Passo 03: Selecionar uma Observação Apropriada e Métodos de


Registros de Dados
Você acabou de estudar, no módulo anterior, sobre a importância da
medida, os tipos de medidas básicas e como definir operacionalmente um
comportamento. Agora vem a parte mais prática e crucial relacionada à
mensuração: os métodos de registro.
Há duas formas de avaliação do comportamento: a direta e a indireta.
Na direta, observamos o comportamento diretamente, enquanto ocorre ou pós
ocorrência (por vídeo). Ela é mais precisa e mais fidedigna. Os métodos de
registro de dados dos quais tratamos nessa parte são relativos a observação
direta do comportamento. A forma de avaliação indireta ocorre por meio de

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alguém ou algo, ou seja, o dado passa pelo “filtro” de alguém. Exemplos de
mensurações indiretas: entrevistas, questionários e checklists. Ela pode ter
vários problemas que prejudicam a qualidade do dado: 1. Depende da
lembrança de quem está relatando; as pessoas que estão relatando podem
não ter o treino de observação adequado e requer que o profissional faça
inferências acerca da relação entre o que é relatado e o comportamento de
interesse (MILTENBERGER, 2020; COOPER, HERON & HEWARD, 2020).
Em relação ao método de registro: o registro pode ser feito por um
método contínuo, por intervalo, ou por medidas derivadas. No método de
registro contínuo, “o observador analisa o cliente continuamente durante um
determinado período e registra cada ocorrência do comportamento
(MILTENBERGER, 2020, p. 18). No registro contínuo, o observador pode
registrar todas as medidas que falamos anteriormente: frequência, taxa,
duração, celeração, latência, intensidade, topografia e tempo entre respostas.
Os métodos descontínuos são relativos aos registros de intervalo e de
amostra. São chamados descontínuos pois consideram intervalos descontínuos
de tempo. Para isso, o profissional divide o período em intervalos e marca a
ocorrência ou não ocorrência do comportamento no período. No final do
período de observação, o profissional registra o percentual de intervalos nos
quais o comportamento ocorreu. Esse tipo de registro é dividido em registro de
intervalo parcial, registro de intervalo total e registro de amostra
momentânea.
No registro de intervalo parcial o profissional registra um x ou outra
marca no intervalo SE O COMPORTAMENTO OCORRER EM QUALQUER
MOMENTO DO INTERVALO. Imagine que você está registrando o
comportamento de rasgar papel de uma criança. Você divide um minuto em
intervalos de 10 segundos. Se, dentro do intervalo de 10 segundos, a criança
rasgar o papel, você marca x naquele intervalo. Se ela não rasgar o papel
naquele intervalo, você não marca nada. Se ela rasgar 2x, você marca
somente uma vez, pois seu objetivo é o de apenas verificar se o
comportamento ocorreu naquele intervalo.

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O sistema de registro de intervalo parcial é mais utilizado para o registro
de comportamentos que o terapeuta deseja diminuir a frequência e para
comportamentos com altas taxas e/ou longa duração. É um sistema que pode
superestimar a duração do comportamento no intervalo ou subestimar a taxa,
portanto, precisa ser bem delineado pelo terapeuta. Comumente, o sistema de
registro de intervalo parcial é chamado apenas de sistema de registro de
intervalo.
No sistema de registro de intervalo total, por sua vez, o profissional
registra o x ou outra marca no intervalo SE O COMPORTAMENTO OCORRER
DURANTE TODO O INTERVALO. Ele geralmente subestima a duração do
comportamento, e por isso é mais utilizado para comportamentos que
desejamos aumentar de frequência. Assim como o sistema parcial, é mais
utilizado para comportamentos contínuos ou que ocorram em altas taxas.
Um exemplo de registro de intervalo total seria: Imagine que você está
registrando o comportamento de rasgar papel de uma criança. Você divide um
minuto em intervalos de 10 segundos. Se, dentro do intervalo de 10 segundos,
a criança passar os 10s inteiros rasgando o papel, você marca x naquele
intervalo. Se ela não rasgar o papel naquele intervalo, você não marca nada.
Se ela rasgar apenas um pedaço do intervalo e parar e outra parte dele, você
não marca nada. No final, você calcula a porcentagem de intervalos marcados.
Por fim, no sistema de registro de amostra momentânea, você
registra um x ou outra marca no intervalo se o comportamento ocorreu NO
FINAL DO INTERVALO, ou seja, a pessoa pode passar o intervalo quase todo
sem se comportar, mas se emitiu o comportamento no final, você marca X. Ele
pode tanto subestimar quanto superestimar a ocorrência do comportamento,
então, deve ser usado com cuidado. Esse sistema é bastante utilizado quando
o terapeuta não tem tempo ou está impossibilitado de observar o
comportamento por períodos mais longos, e apresenta uma variação chamada
PLACHECK, utilizada para o registro de comportamento de pessoas em grupo.
Os registros de medidas derivadas são feitos após o comportamento
ocorrer. Além disso, são usados para cálculo de operantes restritos a
oportunidades de ensino (e, por consequência, não são usados para operantes

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livres).
Compreendem o registro de tentativas até critério e de porcentagem
de oportunidades. O primeiro é relativo à quantidade de oportunidades de
respostas necessárias para se atingir um critério estabelecido pelo instrutor.
Como exemplo, podemos pensar em quantas ocorrências de respostas são
necessárias até a pessoa atingir uma latência de 3s ou um critério de 100% de
acerto. É um sistema bastante usado em treino de tentativas discretas.
O registro de porcentagem de oportunidades, por sua vez, é relativo à
proporção entre dois eventos com a mesma dimensão. Exemplo: Dentro de 10
oportunidades, quantas vezes a criança emitiu a resposta de mando?
Outra forma de registro é o registro de produto permanente. Não é um
método de registro, é relativo ao tempo da mensuração. É utilizada quando o
comportamento resulta em um produto tangível que pode ser registrado. Ele é
um tipo de registro pós-factum, ou seja, é realizado após a ocorrência do
comportamento. Exemplos de produtos permanentes: respostas em exercícios,
bitucas de cigarros jogadas.
Agora que falamos de todos os sistemas de medição, você deve estar
confuso com a quantidade de informações e se perguntando como escolher o
melhor sistema. Essa é uma confusão comum em terapeutas iniciantes e
acontece até com os mais experientes, acredite! Pensando nisso, alguns
autores (LE BLANC; RAETZ; SELLERS & CARR, 2016) elaboraram um
sistema que auxilia terapeutas na tomada de decisão em relação ao sistema de
medida para comportamentos problemas. Mostramos abaixo o sistema
desenhado pelos autores, com tradução livre realizada pela autora desse texto.
O esquema resume pontos importantes que falamos durante esses dois
módulos e coloca em fluxo perguntas relevantes que devem ser feitas pelo
terapeuta no momento de escolha do sistema de mensuração. Observe
atentamente ao esquema, todas as tomadas de decisão e todos os sistemas de
mensuração.

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Figura 02: Modelo de tomada de decisão de sistemas de registro de comportamentos
problemas. Tradução e adaptação livres de Le Blanc; Raetz; Sellers & Carr, 2016
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Por fim, sugerimos que você faça o seguinte exercício: escolha cinco
comportamentos-problemas, reais ou não, e coloque no esquema de tomada
de decisão acima. Observe as diferenças nas perguntas e das decisões
tomadas. Quando chegar ao sistema de mensuração escolhido, volte ao texto e
leia sobre ele novamente. Isso irá te ajudar a entender todo o fluxo!

Parte III - Mensuração do Comportamento – Análise dos Dados


Agora que aprendemos sobre coleta de dados, vamos abordar acerca
de análise de dados. Iniciaremos o módulo falando sobre a qualidade da
medida coletada e depois discutiremos sobre gráficos e análise visual.

3.1. Qualidade da Medida


Quando você coleta dados, você se pergunta se pode confiar neles? Se
eles representam de fato o que está sendo medido? Se o sistema escolhido foi
o mais adequado? Se ele mede realmente alguma dimensão relevante do
comportamento?
Todo analista do comportamento deve se fazer essas perguntas
constantemente. Isso indica que ele está preocupado com a qualidade da
medida. Existem alguns indicadores de qualidade da medida: validade,
fidedignidade e precisão (acurácia).
A validade está relacionada a relevância da medida. A medida produz
um dado diretamente relacionado ao evento? Ela mede uma dimensão
relevante? Suponha que você gostaria de medir a quantidade de vezes que um
adolescente xinga em sala de aula. A duração seria uma dimensão relevante
nesse caso? Não! Se você usasse a duração, provavelmente não teria uma
medida válida.
Existem algumas ameaças à validade da medida: o uso de medidas
indiretas (elas passam por um “filtro” e podem não medir o fenômeno de
interesse); a mensuração de dimensões erradas do alvo e artefatos de
mensuração. Artefatos são dados não representativos do comportamento e
ocorrem devido a escolha errada do sistema de mensuração, mensuração
descontínua mal planejada ou uso de escalas insensíveis (COOPER, HERON

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& HEWARD, 2020).
A fidedignidade de uma medida está relacionada ao fato que que
medidas repetidas produziriam o mesmo valor ao longo do tempo. Uma
ameaça comum à fidedignidade é a deriva do observador. Imagine um
observador que começa a divagar sobre a vida enquanto observa; é provável
que ele passe a produzir medidas menos consistentes, ou seja, menos
fidedignas com o tempo.
Precisão é o índice que afirma que uma medida tem o valor
representando, de fato, o dado real. Se uma criança pula 3 vezes e você
registra uma frequência de 3 pulos, a medida é precisa. Ameaças comuns à
precisão e à fidedignidade são ligadas a erros humanos: treinos inadequados
da equipe, sistemas mal desenhados, expectativa do observador e reatividade
do observador.

3.2. Acordo entre Observadores


Uma forma de verificar a qualidade de uma medida é calculando o
acordo entre observadores (AEO), ou o grau no qual duas pessoas, de forma
independente, chegam aos mesmos dados do mesmo fenômeno. O AEO serve
para determinar a competência de novos observadores, diminui a deriva e
aumenta a confiança no dado.
Existem vários métodos para o cálculo de Acordo Entre Observadores,
que variam de acordo com o tipo de sistema de registro escolhido. Existem
métodos voltados para sistemas de registro de evento, para sistemas de
registro de tempo e para sistemas de registro de amostra de tempo. Segue
abaixo um esquema resumo de todos os métodos de AEO, com algumas
características relevantes. Abaixo desse esquema, uma tabela com as fórmulas
de cada AEO.

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Contagem total

Contagem média por


intervalo
Contagem exata por
intervalo

Tentativa a tentativa

Duração total

Duração média por


ocorrência

Intervalo por intervalo

Intervalos pontuados

Intervalos não pontuados

Imagens 3 e 4: Tipos de AEO e fórmulas de AEO.

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3.3. Exercícios de AEO
Não tem jeito! A melhor forma de aprender a aplicação de fórmulas é
exercitando! Abaixo, alguns exercícios de AEO para você praticar! O gabarito
está logo abaixo.
1. Carlinhos e Letícia estavam observando a frequência por intervalos do
comportamento de Patrícia fazer careta. Eles fizeram o seguinte registro:

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
Carlinhos 0 2 4 3 4 5 4 5 0 2 3 0
Letícia 0 5 5 0 5 5 3 0 5 2 2 3

Com base na tabela, responda às questões abaixo:


A. Há quantos intervalos no total?
B. Em quantos intervalos Carlinhos registrou ocorrência do
comportamento?
C. Quais os métodos de AEO podem ser utilizados no exemplo?
D. Calcule AEO por contagem total.
E. Calcule AEO por contagem média por intervalo.
F. Calcule AEO por contagem exata por intervalo.
G. Qual dos AEO calculados é mais rude? Qual o mais rigoroso?

2. Carlinhos e Letícia estavam observando a duração por intervalos do


comportamento de Patrícia fazer careta. Eles fizeram o seguinte registro:

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Carlinhos 4 4 2 0 3 2 3 5 0 0
Letícia 3 5 2 5 0 5 2 5 3 0

Com base na tabela, responda às questões abaixo:


A. Há quantos intervalos no total?
B. Em quantos intervalos Carlinhos registrou ocorrência do
comportamento?
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C. Quais os métodos de AEO podem ser utilizados no exemplo?
D. Calcule AEO por duração total.
E. Calcule AEO por duração média por intervalo.
F. Qual dos AEO calculados é mais rude? Qual o mais rigoroso?

3. Carlinhos e Letícia estavam observando a ocorrência do comportamento


de Patrícia fazer careta em um sistema de registro de intervalo parcial.
Eles fizeram o seguinte registro (considere x como ocorrência do
comportamento):

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Carlinhos x x x x x x
Letícia x x x x x x

Com base na tabela, responda às questões abaixo:


A. Há quantos intervalos no total?
B. Em quantos intervalos Carlinhos registrou ocorrência do
comportamento?
C. Quais os métodos de AEO podem ser utilizados no exemplo?
D. Calcule AEO intervalo por intervalo.
E. Calcule AEO por intervalos pontuados.
F. Calcule AEO por intervalos não marcados.

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Gabarito dos Exercícios de AEO:

Questão 1:
A. 12 intervalos no total.
B. Carlinhos registrou a ocorrência do comportamento em 09 intervalos (2,
3,4,5,6,7,8,10 e 11).
C. Esse é um registro de frequência (evento). Poderíamos calcular AEO
por contagem total, AEO por contagem média por intervalo e AEO exato
por intervalo.
D. 32/35 x 100 = 91%.
E. (100% + 40% + 80% + 0 + 80% + 100% + 75% + 0 + 0 + 100% + 67% +
0) / 12 = 53%.
F. 3/12 = 25%.
G. O mais rude é o de 91% e o mais rigoroso é o de 25%.

Questão 2:
A. 10 intervalos.
B. Em 07 intervalos (1,2,3,5,6,7 e 8).
C. Duração total e duração média.
D. 67%.
E. 56,2%.
F. O mais rude é o de 100% e o mais rigoroso é o de 43%.

Questão 3:

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Carlinhos x x x x x x
Patrícia x x x x x x

A. 10 intervalos.
B. Em 6 intervalos.
C. Intervalo por intervalo, intervalos pontuados e intervalos não pontuados.

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D. 6/10 = 60%.
E. 4/8 = 50%.
F. 2/6 = 33%.

3.4 Dados Gráficos Para a Comunicação de Relações Quantitativas


Agora que você já sabe medir o comportamento, escolher o sistema de
medidas e verificar a integridade da medida, vamos aprender a graficar uma
medida e fazer análise dos dados gráficos!
Gráficos são ferramentas. Eles servem para comunicar algo, fornecer
base para avaliação e demonstrar a relação entre variáveis. São instrumentos
de fácil compreensão, não dependem de análises visuais, permitem
interpretações individuais e o acesso contínuo ao comportamento do sujeito
(Cooper, Heron & Heward, 2020).
Existem vários tipos de gráficos, mas, para a análise do comportamento
os mais utilizados são os de linha. Os componentes de um gráfico de linha são:

2 4
3
6 5
1
7

Figura 04: Exemplo de um gráfico. Retirado de Moore; Mueller; Dubard; Roberts &
Sterling‐Turner, (2002).

1. Eixo horizontal, x ou abcissa – VI.


2. Eixo vertical, Y ou ordenada – VD.
3. Mudanças na linha de condição.
4. Etiquetas das condições experimentais.
5. Pontos de dado – Representam uma medida.
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6. Trajetória de dados – nível e tendência.
7. Legenda da figura.

Existem outros tipos de gráficos, utilizados com uma menor frequência,


na análise do comportamento. O gráfico de barras, ou histograma, possui
como finalidade uma comparação ampla de muitos dados. Não possui ponto de
dados e nem trajetória. Além disso, não há dimensão comum no eixo x.
O gráfico de respostas acumuladas foi criado por Skinner para
mostrar de forma clara a relação entre comportamento e intervenção. É um
gráfico útil para quando queremos mostrar o número de objetivos e quando
temos a emissão de 1 ou zero comportamentos por dia. Por acumular
respostas, é um gráfico que nunca apresentará uma tendência decrescente.
Quanto maior a inclinação do gráfico, maior a taxa de respostas. Há
duas taxas que observamos em um gráfico cumulativo: a taxa de resposta
geral, observada a partir de uma linha traçada entre o primeiro e o último ponto
de dado, e a taxa de resposta local, com uma linha traçada entre dois pontos
de dados do gráfico, a fim de mostrar a trajetória em um local específico.
O gráfico de dispersão serve para analisarmos as relações temporais
das respostas. Eles detectam correlações entre variáveis. Os gráficos
semilogariticos utilizam uma escala diferente no eixo y e são adequados para
mostrar mudanças proporcionais. Um gráfico utilizado na ABA por determinado
grupo de pesquisadores e profissionais, que trabalham com ensino de
precisão, é o gráfico de celeração padrão. Ele é um gráfico semilogaritmico
utilizado para verificar as mudanças proporcionais no comportamento.

3.5 Interpretação de Gráficos – Análise visual


Uma vez reconhecendo os componentes de um gráfico de linha, é papel
do analista do comportamento saber interpretá-lo. De acordo com Cooper,
Heron & Heward, 2020, analistas do comportamento utilizam uma forma
sistemática para analisar os dados gráficos, chamada análise visual.
A análise visual busca saber se houve mudança significativa, se essa
mudança pode ser atribuída à variável independente, e qual a extensão dessa

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relação. Para tanto, o analista do comportamento observará variabilidade,
nível e tendência dos dados, dentro da mesma condição e entre condições de
um experimento.
Os autores supracitados indicam que, antes de interpretar os dados, o
profissional examine com cuidado a construção geral do gráfico: a legenda, as
linhas e as etiquetas de condições, as variáveis independente e dependente,
os valores numéricos. Depois, eles indicam que se avalie se os pontos de
dados estão devidamente conectados por uma trajetória e o número de pontos
de dados em cada condição. Quanto mais pontos de dados, mais confiança
podemos ter no gráfico. A exceção a essa regra ocorre quando condições
éticas não permitem a tomada de muitos dados ou quando há critérios de
performance estabelecidos para o número máximo de dados.
A variabilidade é o “quão frequente e a extensão na qual medidas
repetidas do comportamento geram diferentes resultados” (COOPER, HERON
& HEWARD, 2020, p. 171). De forma geral, quanto maior a variabilidade,
menos controle temos em relação a um dado, exceto quando o objetivo da
intervenção visa variabilidade.
O nível é “o valor em volta do eixo vertical no qual um grupo de medidas
de respostas converge” (COOPER, HERON & HEWARD, 2020, p. 171).
Geralmente olhamos para o nível médio dos dados, uma linha horizontal
representando a média de uma série de medidas. Quando temos dados com
grande instabilidade, o nível médio deve ser interpretado com cuidado.
A tendência é “a direção geral tomada por uma trajetória. Tendência é
descrita em termos da sua direção (crescente, decrescente e zero tendência),
grau ou magnitude e a extensão da variabilidade dos pontos de dados ao longo
da tendência” (COOPER, HERON & HEWARD, 2020, p. 172).
Após analisar os pontos trazidos anteriormente, o analista do
comportamento irá realizar uma análise visual entre condições. É importante
observar nível, variabilidade e tendência após a retirada ou inserção de uma
variável independente. Avaliar essas três características em conjunto, entre
condições, permitirá o analista do comportamento saber o quão extensas e
significativas foram as mudanças.

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3.6. Tomada de Decisão em Análise Visual
Um grupo de autores desenvolveu, em 2019, um modelo de fluxograma
que auxilia na tomada de decisões clínicas para aquisição de habilidades a
partir de análise visual (KIPFMILLER et al, 2019). O modelo inicia perguntando
se a tendência é crescente. Se sim, o terapeuta deve observar se há 3 ou mais
pontos de dados com critério acima de 80%. Se sim, a intervenção está
considerada completa. Convém lembrar que esse dado de 80% é baseado no
critério que os autores adotaram, outros critérios podem ser utilizados pelos
terapeutas.
Se a tendência for crescente, mas ainda não há dados suficientes para a
tomada de decisão relacionada a completar o programa, o terapeuta deve
continuar. Se a tendência estiver decrescente, ele deverá modificar a
intervenção. Se a tendência não for crescente nem decrescente e houver muita
variabilidade, também deverá modificar. Se, mediante ausência de tendência
crescente ou decrescente, pouca variabilidade e uma tendência reta com os
últimos 10 dados 50% abaixo, eles recomendam descontinuar a intervenção.
Se, nessa última hipótese citada, os últimos 10 dados não estiverem 50%
abaixo, o terapeuta deverá modificar a intervenção. E se, a tendência não
estiver crescendo nem decrescendo, mas não estiver na horizontal e tiver baixa
variabilidade, ele também recomenda continuar a intervenção. Elaboramos,
abaixo, uma tabela com os caminhos prováveis de tomada de decisão:

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Os últimos Os últimos
Tendência 03 dados Tendência Dados Tendência 10 dados
Possib.
“reta”?
Decisão
crescente estão 80% decrescente variados estão 50%
ou acima? ou abaixo?
Intervenção
1 SIM SIM
completa
Continuar
2 SIM NÃO
Intervenção
Continuar
3 NÃO NÃO NÃO NÃO
Intervenção
Modificar
4 NÃO SIM
Intervenção
Modificar
5 NÃO NÃO SIM
Intervenção
Modificar
6 NÃO NÃO NÃO SIM NÃO
Intervenção
Descontinuar
7 NÃO NÃO NÃO SIM SIM
Intervenção

Aconselhamos que você escolha alguns gráficos de intervenção de


artigos da área e pratique a tomada de decisões com pares da área. Imprima
essa tabela ou o gráfico fornecido no artigo original e use no seu dia-a-dia.

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Referências Bibliográficas

COOPER, J. O., HERON, T. E., & HEWARD, W. L. Applied behavior


analysis. Pearson UK. (2020).

KIPFMILLER, K. J., BRODHEAD, M. T., WOLFE, K., LALONDE, K., Sipila, E.


S., BAK, M. S., & FISHER, M. H. Training front-line employees to conduct
visual analysis using a clinical decision-making model. Journal of
Behavioral Education, 28(3), 301-322. (2019).

LEBLANC, L. A., RAETZ, P. B., SELLERS, T. P., & CARR, J. E. A proposed


model for selecting measurement procedures for the assessment and
treatment of problem behavior. Behavior Analysis in Practice, 9(1), 77-83.
(2016).

MARR, M. J. The natural selection: Behavior analysis as a natural


science. European Journal of Behavior Analysis, 10(2), 103-118. (2009).

MILTENBERGER, R. G. Modificação do comportamento: teoria e prática.


Tradução: Visconte, S; e Silva, P. São Paulo: SP: Cenage, 2021, 416 p. (2020).

MOORE, J. W., MUELLER, M. M., DUBARD, M., ROBERTS, D. S., &


STERLING‐TURNER, H. E. The influence of therapist attention on self‐
injury during a tangible condition. Journal of Applied Behavior
Analysis, 35(3), 283-286. (2002).

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