Você está na página 1de 26

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ

Departamento de Ciências Econômicas (DCEC)

Curva de Phillips e as expectativas

Docente: Andreia Andrade dos Santos

Ilhéus, 2023.1
Resumo da aula
• Em 1958, Phillips traçou um diagrama que mostrava a relação entre a taxa de
inflação e a taxa de desemprego no Reino Unido para cada ano de 1861 a
1957. Ele encontrou evidências claras de uma relação negativa entre inflação e
desemprego;
• Dois anos depois, Paul Samuelson e Robert Solow repetiram o exercício para
os EUA, com dados de 1900 a 1960, chegaram a mesma conclusão e batizaram
essa relação (desemprego x inflação) de Curva de Phillips;
• Na década de 1970, porém, essa relação quebrou. Nos EUA, e outros países,
havia inflação alta e desemprego alto, o que contradizia explicitamente a
curva de Phillips original. A curva de Phillips vai ser atualizada e uma nova
relação surgiu, agora sob a forma de uma relação entre a taxa de desemprego
e a variação da taxa de inflação.

A finalidade desta aula é explorar as transformações da curva de Phillips


para o entendimento da relação entre inflação e desemprego.
Inflação, Inflação esperada e desemprego
• O salário nominal W, estabelecido pelos fixadores de salários, depende do nível
esperado de preços, , da taxa de desemprego, u, e de uma variável, z, que captura
todos os outros fatores que afetam a determinação dos salários, desde o seguro-
desemprego até a forma de negociação coletiva:
W = F(u, z)
• Além disso, o preço, P, estipulado pelas empresas (de modo equivalente, o nível de
preços) é igual ao salário nominal, W, vezes 1 mais a margem, m:
P = (1 + m)W
• Podemos utilizar essas conclusões para entender a relação entre Preço esperado e o
preço:
P = (1 + m) F(u, z)
• Ou seja: um aumento do nível esperado de preços leva a um aumento dos salários
nominais W, o que, por sua vez, leva as empresas a elevarem seus preços P,
provocando uma elevação no nível de preços. Um aumento da taxa de desemprego u
leva a uma redução dos salários nominais W, o que, por sua vez, acarreta preços mais
baixos e uma diminuição no nível de preços.
Inflação, Inflação esperada e desemprego
• Será conveniente assumir uma forma específica para a função F:
F(u, z) = 1 – αu + z
• Ela representa a noção de que, quanto maior a taxa de desemprego, menor o
salário; e de que, quanto maior z, mais elevado o salário.
• O parâmetro α (alfa) representa a força do efeito do desemprego sobre o
salário.
• Substituir a função F(u, z) por essa forma específica na equação anterior
resulta em:
P = (1 + m)(1 – αu + z)

• Isso nos dá uma relação entre o nível de preços, o nível esperado de preços e
a taxa de desemprego.
• Agora vamos inserir a inflação:
= (vem da dedução da fórmula anterior)
• = inflação e = inflação esperada
Inflação, Inflação esperada e desemprego

=
Um aumento da inflação esperada, , leva a um aumento da inflação efetiva, .
• Se os fixadores de salários esperam um nível de preços mais elevado, fixam um salário
nominal mais elevado, o que acarreta um aumento do nível de preços.
• Portanto, o fato de um aumento do nível esperado de preços levar a um aumento do
nível de preços efetivo pode ser expresso da seguinte maneira: um aumento da
inflação esperada leva a um aumento da inflação (efetiva).
Curva de Phillips: a primeira versão
• Na primeira versão da Curva de Phillips, idealizada por Phillips, Samuelson e Solow, os
períodos analisados por eles não apresentavam altas taxas de inflação
• Ou seja, nesse período a inflação variava de um ano para o outro em torno de algum
valor constante e a inflação não era persistente, de modo que a deste ano t não
serviria de parâmetro para a do próximo ano.
• Em tal ambiente, faz sentido que os fixadores de salários assumam que, qualquer que
seja a inflação do ano anterior, a inflação do ano presente será simplesmente igual a
(valor constante). Ou seja, não há surpresas. Assim, dada a análise anterior:
=

Para a primeira versão de Phillips: =

Assim:
=
Curva de Phillips: a primeira versão
• Neste caso, de fato havia uma relação negativa entre desemprego e inflação.
Esta é precisamente a relação negativa entre desemprego e inflação que
Phillips encontrou para o Reino Unido, e Solow e Samuelson para os EUA.
• Quando o desemprego era elevado, a inflação era baixa, às vezes até mesmo
negativa. Quando o desemprego era baixo, a inflação era positiva.
• Esses resultados sugeriam que os formuladores de política econômica estavam
diante de um trade-off entre inflação e desemprego. Se estivessem dispostos a
aceitar mais inflação, poderiam atingir menor desemprego.
• A partir do início dos anos 1960, a política macroeconômica norte-americana
visou reduzir continuamente o desemprego e utilizou dessa premissa: para
reduzir o desemprego, teria como contrapartida a ampliação da inflação.
Inflação versus desemprego-EUA, 1948–1969
• A redução contínua na taxa de desemprego nos EUA durante a década de
1960 esteve associada a um aumento contínuo da taxa de inflação.
Inflação versus desemprego- a década de 1970
• Por volta de 1970, a relação entre a taxa de inflação e a taxa de desemprego
quebrou. Não existia mais qualquer relação visível entre essas variáveis em
diversos países
• Mas por que a curva de Phillips original “desapareceu”?
• Porque os fixadores de salários mudaram o modo como formavam suas
expectativas em relação à inflação.
• Essa alteração veio de uma mudança no comportamento da inflação. A
inflação tornou-se mais persistente. Aumentou a probabilidade de a inflação
alta de um ano ser seguida por uma inflação alta no seguinte.
• Assim, as pessoas, ao formarem suas expectativas, começaram a levar em
conta a persistência da inflação.
• Essa mudança na formação de expectativas acabou por modificar a natureza
da relação entre desemprego e inflação.
Inflação versus desemprego- a década de 1970
• Como podemos analisar essa mudança na relação entre desemprego e
inflação?
• Suponhamos que as expectativas de inflação sejam formadas de acordo com a
seguinte equação:
= (1 –θ) + θ
Ou seja:
• A inflação esperada no ano t, , depende em parte de um valor constante, e em
parte da inflação no ano anterior, que denotamos por
• Quanto maior o valor de θ, mais a inflação do ano anterior levará os
trabalhadores e as empresas a reverem suas expectativas sobre a inflação para
este ano, e, portanto, maior será a taxa de inflação esperada.
• Assim, se a inflação passada foi muito alta, a expectativa de inflação para o
próximo período também será.
Inflação versus desemprego- a década de 1970
= (1 – θ) + θ

• E o que aconteceu na década de 1970 com o valor de θ


• Enquanto a inflação se mantinha não persistente, era razoável que
trabalhadores e empresas ignorassem a inflação passada e admitissem um
valor constante para a inflação.
• No período examinado por Phillips e também por Samuelson e Solow, θ era
próximo de zero, e as expectativas eram aproximadamente dadas por = .
Neste caso a curva de Phillips original era:

=
• Neste caso, observaremos uma relação negativa entre desemprego e inflação.
A curva de Phillips e as expectativas
• Quando θ se aproxima de 1, ou seja, a expectativa passa a considerar o período anterior e
não um valor constante, a relação torna-se a seguinte:
=

Ou seja,

A inflação no tempo t vai ser diretamente impactada pela inflação no tempo anterior
(passado)
A curva de Phillips e as expectativas
• A hipótese das expectativas adaptativas afirma que os indivíduos corrigem suas
expectativas levando em considerando os “erros” que cometeram no passado
• Se no período anterior, o agente subestimou a inflação, ele corrigirá sua nova expectativa
levando em consideração essa subestimação;
• Os agentes acham que o passado recente é o melhor previsor para o presente e futuro
• Assim,, quando os indivíduos olham para o passado como o melhor previsor de futuro, a
inflação tende a se perpetuar no nível prevalecente atingido, gerando a chamada inércia
inflacionária
• No longo prazo, o aumento da inflação faz com que os agentes ampliem suas expectativas
inflacionárias, deslocando a curva de Phillips para a direita
• Para que a inflação se reduza desse patamar, ou será necessária a ocorrência de um
choque deflacionário, ou a taxa de desemprego deverá se situar momentaneamente
acima da natural, forçando os agentes a reverem suas expectativas.
• Se o governo, por exemplo, faz alguma política para reduzir o desemprego (ampliando a
oferta de moeda por exemplo), haverá uma menor taxa de desemprego e uma maior taxa
de inflação.
A curva de Phillips e as expectativas
• Se o governo pretender manter indefinidamente o desemprego abaixo da taxa natural
isto irá requerer taxas crescentes de expansão monetária e de inflação
• Dada essa aceleração inflacionária, o trade-off inflação-desemprego só vale no curto
prazo. No longo prazo, a economia não conseguirá manter indefinidamente a inflação
acima da esperada, uma vez que os agentes aprenderam com os erros do passado
• A curva de Phillips de longo prazo a economia se situará na taxa natural de desemprego e
qualquer tentativa de reduzi-la apenas gerará mais inflação
• A introdução das expectativas permite analisar o fenômeno marcante da década de 1970,
a estagflação, que corresponde a presença simultânea de inflação e desemprego. Mesmo
com desemprego, se as expectativas inflacionárias forem elevadas, poderemos ter
inflação com desemprego.
A curva de Phillips e as expectativas
-=

Essa atualização da curva costuma ser chamada de:


• Curva de Phillips modificada ou curva de Phillips aumentada pelas
expectativas, para indicar que (a inflação no passado) refere-se à inflação
esperada para o próximo período
• Ou Curva de Phillips aceleracionista, para indicar que uma taxa de
desemprego baixa leva a um aumento da taxa de inflação e, dessa forma, a
uma aceleração do nível de preços
A curva de Phillips e a taxa natural de desemprego
• A história da curva de Phillips está intimamente relacionada com a descoberta
do conceito de taxa natural de desemprego;
• A curva de Phillips original, se os formuladores de política econômica
estivessem dispostos a tolerar uma taxa de inflação mais alta, poderiam
manter uma taxa de desemprego mais baixa para sempre. E, realmente, por
toda a década de 1960 parecia que estavam certos.
• No entanto, ao final da década de 1960, embora a curva de Phillips original
ainda proporcionasse uma boa descrição dos dados, dois economistas, Milton
Friedman e Edmund Phelps, questionaram a existência desse trade-off
• Para eles, esse trade-off só poderia existir se os fixadores de salários
subestimassem sistematicamente a inflação, sendo pouco provável que
cometessem o mesmo erro para sempre.
A curva de Phillips e a taxa natural de desemprego
• Friedman e Phelps também argumentaram que, se o governo tentasse
sustentar o desemprego mais baixo aceitando uma inflação mais alta, o trade-
off acabaria por desaparecer;
• A taxa de desemprego não poderia ser sustentada abaixo de determinado
nível, um nível que eles chamaram de taxa natural de desemprego. Os
eventos provaram que eles estavam certos e o trade-off entre a taxa de
desemprego e a taxa de inflação realmente desapareceu.
• Atualmente, a maioria dos economistas aceita a noção de uma taxa natural de
desemprego sujeita a muitas ressalvas

• Mas qual a ligação entre a curva de Phillips e a taxa natural de desemprego?


A curva de Phillips e a taxa natural de desemprego
• Por definição, a taxa natural de desemprego é a taxa de desemprego em que o nível
de preços efetivo é igual ao nível esperado de preços. De modo análogo, a taxa
natural de desemprego é a taxa de desemprego em que a taxa de inflação efetiva é
igual à taxa de inflação esperada.
• Representemos a taxa natural de desemprego por . Então, impondo a condição de
que a inflação efetiva e a inflação esperada sejam iguais ( = ):

-= Quanto maior a margem, m, ou


quanto maiores os fatores que
0= afetam a fixação de salários, z,
mais alta será a taxa natural de
= desemprego.
A curva de Phillips e a taxa natural de desemprego
• Com = (m + z = . )e reescrevendo a equação: - =

Teremos: - =

- =- (-)

• Se a taxa de inflação esperada () puder ser aproximada pela taxa de inflação do ano
anterior, , ou seja, a expectativa de inflação está relacionada a informação do
período anterior, a equação finalmente se torna:

-= - ( - )
A curva de Phillips e a taxa natural de desemprego
-= - ( - )
• A taxa natural de desemprego é a taxa de desemprego necessária para manter a
taxa de inflação constante.
• É por isso que a taxa natural é também chamada de taxa de desemprego não
aceleradora da inflação, ou NAIRU (da expressão em inglês non-accelerating
inflation rate of unemployment)
• Assim, quando questiona-se qual tem sido a taxa natural de desemprego nos EUA
desde 1970, questiona-se qual tem sido a taxa de desemprego que, em média, leva
a uma inflação constante?
• Tentar manter o desemprego abaixo desta taxa natural fará com que a inflação
acelere. A economia terá de voltar a taxa de desemprego natural.
Conclusões relevantes
-= - ( - )

• Quando a taxa de desemprego supera a taxa natural de desemprego, a taxa de


inflação normalmente diminui.
• Quando a taxa de desemprego está abaixo da taxa natural de desemprego, a taxa
de inflação normalmente aumenta
• Ou seja, a tendência é que a economia busque a taxa natural de desemprego, o que
pode não ocorrer quando as taxas de inflação estejam variando
• Importante dizer que a relação entre inflação e desemprego pode mudar — e
realmente muda — de um país para o outro e ao longo do tempo.
• Quando a taxa de desemprego supera a taxa natural de desemprego, a taxa de
inflação normalmente diminui. Quando a taxa de desemprego está abaixo da taxa
natural de desemprego, a taxa de inflação normalmente aumenta.
Mudanças na taxa natural de um país para outro

• A taxa natural de desemprego depende de todos os fatores que afetam a


fixação de salários, representados pela variável abrangente, z, pela margem,
m, e pela resposta da inflação ao desemprego, .
• Esses fatores diferem de um país para outro, o que nos leva também para
taxas naturais de desemprego diferentes.
• A resposta para essas diferenças pode estar nos fatores que determinam as
relações de fixação de salários e as relações de fixação de preços.
Mudanças na taxa natural ao longo do tempo
=
• O grau do poder de monopólio das empresas, os custos de insumos que não a mão
de obra, a estrutura das negociações salariais, o sistema de seguro-desemprego, e
assim por diante, provavelmente variam ao longo do tempo, acarretando mudanças
em m ou z e, por conseguinte, alterações na taxa natural de desemprego.
• As variações na taxa natural de desemprego ao longo do tempo são difíceis de
medir. O motivo é que não observamos a taxa natural, apenas a taxa efetiva. Mas
mudanças em linhas gerais podem ser determinadas comparando-se as taxas
médias de desemprego de uma década para a outra.
Inflação alta e a relação da curva de Phillips
• Na década de 1970, a curva de Phillips dos EUA mudou à medida que a inflação se
tornou mais persistente, e os fixadores de salários mudaram a maneira como
formavam as expectativas acerca da inflação.
• Trata-se de uma lição genérica. A relação entre desemprego e inflação
provavelmente muda com o nível e a persistência da inflação. A evidência de países
com inflação alta confirma essa lição. Não somente muda a maneira como
trabalhadores e empresas formam suas expectativas como também alteram-se os
arranjos institucionais.
• Quando a taxa de inflação se eleva, a inflação tende a ser mais variável. Como
resultado, trabalhadores e empresas ficam mais relutantes em fechar contratos de
trabalho que fixem salários nominais por um longo período de tempo. Se a inflação
for mais alta do que o esperado, os salários reais poderão despencar e os
trabalhadores sofrerão uma grande queda em seu padrão de vida.
• Se a inflação for menor do que o esperado, os salários reais poderão aumentar
acentuadamente. As empresas poderão não ser capazes de pagar seus
trabalhadores, e algumas correrão o risco de ir à falência.
Deflação e a relação da curva de Phillips
• O que acontece quando a inflação está muito baixa ou até mesmo negativa?

Consideremos dois cenários.


 Cenário 1- A inflação é de 4% e seu salário nominal sobe 2%.
 Cenário 2- A inflação é de 0% e seu salário nominal sofre um corte de 2%.

• Qual cenário lhe desagrada mais? Você deveria ser indiferente em relação a
ambos. Nos dois casos seu salário real diminui em 2%. Existe alguma
evidência, entretanto, de que a maioria das pessoas considera o primeiro
cenário menos doloroso, e, assim, sofrem de ilusão monetária.
• Quando a inflação é baixa, poucos trabalhadores aceitam um corte nos
salários nominais.
Referência da aula
Básica:

Cápítulo 8- Curva de Phillips, taxa natural de desemprego e inflação


BLANCHARD, Olivier. Macroeconomia. São Paulo: Prentice Hall, 2004. 3ª ed.

Capítulo 7
LOPES, L.M; VASCONCELLOS, M.A.S (org). Manual de Macroeconomia. 3 ed. São Paulo: Atlas,
2008

Você também pode gostar