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A FORMAÇÃO DOS INDIVÍDUOS: A

DESINSTITUCIONALIZAÇÃO

François Dubet  

Revista Contemporaneidade e Educação, ano 3, vol.3, 1998, p.27-33.


DESINSTITUCIONALIZAÇÃO

 Mudança do modo de produção dos


indivíduos nas sociedades contemporâneas
 Instituições (escola, família e Igreja): papeis e
valores “fabricando” indivíduos e
personalidades
 Cada vez mais autônomos: interiorização de
princípios como modo autônomo de ação e de
julgamento de si e dos outros
DESINSTITUCIONALIZAÇÃO

 Na socialização: indivíduo se identifica primeiro


com os adultos, depois com os valores destes
 Escola republicana francesa: forte afirmação de
seus princípios e de suas disciplinas,
aprendizagem de conhecimentos e de métodos,
por meio da identificação do aluno com o mestre
 A escola elementar “fabricava” cidadãos
franceses, o liceu profissional, operários e o liceu
clássico, os homens de cultura
AS MUTAÇÕES DA ESCOLA

 Família: papeis sexuais e de idade se impõem


como realidades, ainda mais por postular a
adequação dos papeis e dos sentimentos
 Igreja: sempre procurou conciliar o dogma e a fé
 Escola republicana: formação dos indivíduos deu
lugar ao sentimento de uma crise indefinida
 Objetivos perderam clareza e unidade: socializar
em uma cultura comum; formação útil para o
emprego; desenvolvimento da personalidade
AS MUTAÇÕES DA ESCOLA

 Difícil se socializar numa única procura de conformidade.

Adolescentes e jovens conseguem mais construir


experiências do que interiorizar papeis
 Escola tradicional: cada tipo de público correspondia a um

tipo de escola; seleção social antes da escola; competição


escolar era fraca; ajustamentos pedagógicos eram fortes
 Escola de massas: seleção no próprio percurso escolar; cada

um age em função de seus recursos, em concorrência


DOS PAPEIS À EXPERIÊNCIA

 Mais dificuldade da escola em administrar relações entre

interior e exterior, mundo escolar e mundo juvenil; não


consegue fixar a vida juvenil fora de seus muros
 Classes médias pressionam para o êxito, engendrando

sentimento precoce de stress


 Classes populares aderem aos valores da escola com

desconfiança profunda (presença do fracasso, sentido


por estudantes como violência)
DOS PAPEIS À EXPERIÊNCIA

 Utilitarismo e sentimento de “violência” começam a

enfraquecer o modelo institucional


 Ginásio: vida adolescente se confronta com a escola, violências

escolares são mais frequentes; funciona quando as famílias


(sobretudo classe média) asseguram controle e “motivação”
 Construir individualidade é “crescer” no mundo escolar e no do

adolescente; alguns vivem só em um destes registros


 Utilidade social dos estudos não é suficiente para dar sentido à

escola
DENTRO, AO LADO, E CONTRA A ESCOLA

 Socialização não é mais - como em Durkheim,


Piaget ou Mead - aprendizagem de
complexidade crescente de papeis, status e
jogos sociais
 Aluno é confrontado com diversidade de
orientações; obrigado a construir por si
mesmo o sentido de sua experiência,
“motivar-se”, dar sentido aos estudos
DENTRO, AO LADO, E CONTRA A ESCOLA

 Integração subjetiva no mundo escolar: melhor quando


culturas escolares e culturas sociais são próximas
 Relação com os estudos é também construída em
termos de interesse intelectual: conciliar “paixões” com
interesses
 A combinação dessas variáveis constitui a experiência
subjetiva de formação de si, em um contexto que
distribui desigualmente os recursos culturais e sociais
DENTRO, AO LADO, E CONTRA A ESCOLA
 Mais favorecidos se socializam e se subjetivam na escola: percebem-se
autores de seus estudos, suas paixões e interesses convergem, têm o
sentimento de se construir e de se realizar nos estudos
 Outros engajam sua personalidade e inteligência em atividades não
escolares, adaptam-se não se integrando
 Outros não podem construir sua experiência escolar: aderem a
julgamentos escolares que os invalidam e os conduzem a perceber-se
como incapazes; a escola não forma indivíduos, ela os destrói
 Alguns resistem aos julgamentos escolares, querem salvar sua
dignidade, reagir ao que percebem como uma violência, retornando-a
contra a escola. Eles se subjetivam contra a escola
O PAPEL E A PERSONALIDADE

Nas instituições os atores são personagens (professor, aluno,


pai...): distância entre papel e
personalidade/sentimentos/emoções; pressão das normas, da
neurose, fruto da interiorização excessiva dos papeis
Outro aspecto é a anomia (ausência de controle interiorizado)

Processos de desinstitucionalização: personalidade pensa antes do


papel, constrói o papel e a instituição
Conservadores denunciam o reino dos desejos; os “donos do
pensamento crítico” denunciam a manipulação pelas indústrias
culturais
O PAPEL E A PERSONALIDADE

 Não compreendem o trabalho que os atores realizam


sobre eles mesmos. Os indivíduos são “obrigados” a
ser livres e a construir o sentido de sua experiência
 O professor é obrigado a construir a situação escolar
antes mesmo de dar aula: “motivar” os alunos com
estratégias múltiplas, colocar-se em cena engajando
sua personalidade. Na escola de massa, a relação
pedagógica é cada vez mais íntima
O PAPEL E A PERSONALIDADE

 Família moderna: adequação dos papéis e dos sentimentos: influência

da escola sobre a reprodução social e declínio das heranças, autonomia


salarial das mulheres, desenvolvimento da contracepção; vida amorosa
do casal e engajamento das personalidades no casal, tornaram-se
essenciais de construção e de estabilidade da família
 Mais a família repousa sobre a afetividade, sobre o amor, mais se

fragiliza (maiores taxas de divórcio e famílias recompostas)


 A vida religiosa contemporânea repousa sobre aseparação do dogma e
da fé: a fé como experiência emocional imediata. Admite-se que a ética
pessoal é superior à obediência ao dogma (somos livres para crer ou não)
Escola

 Espera-se que cada um se aperceba, pouco a


pouco, como o autor de seus estudos. Mas, o
equilíbrio sutil das finalidades da educação
não é fácil de se realizar

 Pode-se massificar a escola sem


transformar profundamente as regras, os
métodos e os objetivos?

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