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Administração?
A performance de discentes gays e bissexuais
em uma graduação heteronormativa
“Eu fui criado para ser hétero, querendo ou não a gente sabe que a família em
si, principalmente quem é convencional fica naquele negócio, na mesmice de
sempre, acha que todo mundo tem que seguir o mesmo padrão”. (José)
“Quando eu tinha nove anos eu fui para o Colégio Militar. [...] pelo meu pai
ser militar, ele já me advertia antes de ir. Antes de eu começar as aulas, ele
dizia ‘tu não fica com essas coisas, tu não fala isso, tu não sei o quê’ [...] Eu
sofri muito”. (Lorenzo)
“E a gerente disse que não queria, porque ela não queria viado trabalhando
com ela. E aí ela me deu um prazo para eu deixar de ser viado. E se eu não
deixasse de ser ela ia me colocar pra fora. E foi o que ela fez”. (Lorenzo)
Análises e discussões
Quais intertextos podem ser identificados nas falas dos discentes?
“Eu acho que uma pessoa séria, responsável... Em relação ao administrador em si,
acredito que em relação a sexualidade, vejo muito o perfil heterossexual. Uma
pessoa séria, comprometida, geralmente branco também”. (Felipe)
“A visão normativa é exatamente essa que gera aquela dúvida 'Será que ele é? Acho
que não! Por que ele se veste assim? Olha a roupa dele! Ele usa barba! Será que
ele é gay mesmo?' [...]. As roupas dizem muito das pessoas, enfim, e o que é
esperado é exatamente isso, a camuflagem, pelo menos na hora do trabalho”.
(Lorenzo)
Análises e discussões
Como as semioses identificadas nos discursos discentes se
relacionam com suas performances?
“É assim que eles acham, ou seja, como eu sou um homem, afeminado, que não
tenho uma voz tão grossa, para eles não é adequado [...]. Eu mesmo acho que hoje
se eu fosse trabalhar em uma empresa eu ia ter que aprender muito, muito”. (Júnior)
Análises e discussões
Como as semioses identificadas nos discursos discentes se
relacionam com suas performances?
Orientação sexual utilizada para diferenciar e hierarquizar sujeitos.
Estrutura de poder que concede (ou não) inteligibilidade sobre os corpos.
Há uma normatização sobre como o(a) profissional (e o/a estudante) deve
performar (associados à (a)normalidade).
Há estereótipo construído e compartilhado do modelo de sujeito
legitimado.
Maior pressão sobre homens afeminados.
A estilização reiterada dos sujeitos no curso não só conforma como
também demanda dos corpos sociais performances compatíveis com a
matriz de inteligibilidade heterossexual.
O aparelho discursivo presente na Administração e as relações de
poder dele desencadeadas parecem reforçar o ideal de fabricar "sujeitos
viáveis" (BUTLER, 1993).
Análises e discussões
Como os discentes enxergam o curso de Administração e o
contexto no qual estão inseridos?
“Eu até brinquei quando entrei na faculdade, que eu escolhi um curso muito hétero
para fazer parte [...] e eu continuo com essa percepção” (Caio)
“É como se não fosse um curso para você, não é um curso que vá lhe contemplar
[...]. Usam isso como desculpa para lhe desqualificar, dependendo da sua
sexualidade e gênero” (Júnior)
“Não é falado sobre isso, sobre as diferenças mesmo de modo geral. [...] boa parte ali
recusa a falar sobre as diferenças também, sabe. Boa parte acha que isso se for bater
em sala de aula é ‘mimimi’, é [perda] de tempo” (Maria)
Análises e discussões
Como os discentes enxergam o curso de Administração e o
contexto no qual estão inseridos?
A graduação em Administração não é tão acolhedora às diferenças de
orientação sexual.
“As pessoas se sentem um pouco julgadas porque sabe que tem gente olhando
para você, falando, rindo, a gente não sabe o que é que estão falando, mas a
pessoa vê que estão em sua direção” (José)
“As pessoas não levam os LGBTs a sério, não levam! Acham que a gente tá ali
para entreter, para fazer graça” (Lorenzo)
Uma professora minha que eu gostava bastante, me identificava muito, quando ela
soube também ela meio que se afastou bastante. E eu fiquei meio que, tipo,
perdida, sem entender” (Bruna)
Análises e discussões
Como as relações presentes no curso de Administração podem ser
caracterizadas a partir dos relatos discentes entrevistados?
"eu encaro a minha presença aqui como essa questão de desmistificar essa
coisa, de mostrar para eles que existe algo mais além, que as relações podem
ser construídas independente da sexualidade" (Lorenzo)
Temor generalizado por parte dos heterossexuais com relação a orientação
sexual alheia.
A não coerência entre a orientação sexual e/ou a performance de
alguns discentes com o aparato ideológico heteronormativo estimula a
produção de atos intolerantes e excludentes.
Análises e discussões
Como pode ser desenhada a prática social sobre a graduação em
Administração a partir dos discursos de discentes gays e bissexuais
do curso pesquisado?
“Tudo bem que é brincadeira, mas toda brincadeira tem fundo de verdade. E
só porque é brincadeira não estou obrigado a gostar”. (Miguel)
“Têm alunos também que meio, não te acolhem pelo seu jeito de ser
também” (Bruna)
Análises e discussões
Como pode ser desenhada a prática social sobre a graduação em
Administração a partir dos discursos de discentes gays e bissexuais
do curso pesquisado?
O curso de Administração é um curso heteronormativo.
A heteronormatividade percebida nesta prática social parece distanciar
sujeitos que não se enquadram no padrão estereotipado sobre a graduação.
Aparelhamento discursivo sexista.
A estrutura de poder desencadeia relações de desigualdade e discriminação.
Há prática discursiva baseada no humor, que reforça a normalidade e
menospreza em tom de ironia as sexualidades "desviantes".
A heteronormatividade evidenciada na prática social da Administração
compele práticas compulsórias aos discentes do curso, sendo regidas por
normas que instigam a repetição de performances legitimadas e que se
amparam na compreensão linear entre corpo, sexo e desejo.
Outras performances "desviantes" mostraram a existência de espaços
de subversão à lógica performativa.
Considerações finais ou iniciais?!
Quais as implicações do discurso normalizador na graduação em
Administração sobre as performances de estudantes gays e
bissexuais do curso?