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O sonho de Cassandra1

Maria de Fátima Magalhães Mariani2


UniCEUB - Graduação em Psicologia

O filme do diretor Wood Allen nos faz refletir sobre alguns conceitos que estamos

discutindo em Psicologia da Personalidade, como o construto cultura, por exemplo.

Cultura é pensada como produção subjetiva no curso dos processos de organização da

vida humana. A tríade do filme, tio e dois sobrinhos se encontram dentro de uma trama

que envolve competitividade, paixão e ambição. Gera-se um sistema de sentidos que

passam a ser compartilhados em função de um objetivo comum: a morte de um rival.

O tio é um homem de negócios prósperos. Os sobrinhos de vida modesta viviam

com os pais. Um deles, Terry, trabalha em uma oficina de carros de luxo e outro, Ian,

trabalha no restaurante do pai. Ian quer crescer, sonha em ter seu próprio negócio: um

hotel na Califórnia. Terry diverte-se com sua namorada e gosta de apostar no jogo. São

jovens e nos horários de folga se divertem com as “garotas” de sua idade. Um barco que

chamaram de Cassandra, foi uma de suas aquisições para a diversão.

O tio rico faz um pacto com os sobrinhos. Ele os ajudaria na realização de seus

sonhos e em troca os usaria para matar um seu inimigo. Um aspecto que poderia ser

pensado aqui são as produções de sentido de uma cultura. Matar alguém é crime

apenável gravemente. Aprendemos a impor limites para nossas ações por meio dos

valores morais. A idéia de assassinar alguém chocou os dois irmãos.

Mas logo Ian se convence em atender ao tio. Ele se envolve com uma atriz e para

impressioná-la se faz passar por um grande empresário, rico e bem-sucedido. Gera mais

uma necessidade que vai contribuir com o sistema de ressignificação de Ian que

1
Texto síntese do debate sobre o filme O Sonho de Cassandra realizado na disciplina Teorias da
Personalidade ministrada pelo Prof. Ph.D. Fernando Rey, no 5º semestre do curso de graduação em
Psicologia no UNICEUB- Brasília-DF.
2
Mestre em Psicologia – UCB – E-mail: fmariani12@hotmail.com
convence Terry ao crime. As emoções dos dois irmãos, formados em uma mesma

família, tomam rumos diferentes frente ao crime. O crime pode ter tido o mesmo

significado para os jovens, mas o valor emocional que teve para cada um é diferente.

Terry passa a ter pesadelos terríveis, a consciência lhe acusa, se sente um monstro. Ian

tira de letra, vai curtir sua namorada passando-se por um empresário de sucesso.

A trama toda se reverte contra Terry. Ian decide combinado com o tio, matar o

irmão para evitar que ele levasse tudo a perder, revelando o crime à polícia. Um novo

sentido se estabelece.

O filme é um bom exercício para se refletir sobre o sentido como uma categoria

particular. Na teoria da subjetividade sentido subjetivo é uma categoria própria do

sujeito. Situa no microcosmo individual do seu autor. O sujeito se constitui quando é

capaz de produzir sentidos.

Na discussão em sala cada um expressou aspectos diferentes do filme. Cada um

atribuiu sentido a partir de seu ponto de vista. Aspectos evidenciados para uns, para

outros não tiveram muita relevância. Nesse momento é que a comunicação se revela

importante. Mediando as interações entre os sujeitos a comunicação exerce seu papel de

construção do simbólico, de troca de sentidos, estabelece uma rede de sentidos

“ressignificados”.

Tentei fazer um exercício analisando o filme pelas principais teorias da

personalidade. Freud analisaria as ações dos sujeitos com base em seus traumas de

infância. Terry viveu o embate psíquico entre o Isso, Eu e Supereu. Evidenciou

ansiedade moral, expressando culpa, vergonha e medo do castigo. Ian talvez tivesse um

Ego mais propenso a ser conduzido pelos imperativos do Isso – as amarras de seu

Supereu eram mais frouxas do que as de seu irmão. Allport utilizaria o método
ideográfico, chamaria a atenção para os traços de personalidade: Terry, contido e

introvertido. Ian, frio e extrovertido.

A teoria da subjetividade interpretaria as ações dos sujeitos com base na

“ressignificação” dos sentidos subjetivos. Os jovens teriam agido por força das

necessidades, configuradas no processo de subjetivação. A teia de emoções

compartilhada nas ações do cotidiano desencadeou o trágico desfecho.

Ao invés de julgar se há culpados ou não, Freud talvez fizesse uma análise de

Wood Allen, autor do filme, atentando para sua libido sublimada na criação do filme.

Em quem estaria representado Allen? - no tio, nos garotos, ou um pouco de si em cada

um? Allport prezaria pelo respeito às diferenças individuais. A teoria da subjetividade

diria que todo valor moral é produzido nas necessidades que motivam as ações do

sujeito, construiria uma crítica à morte do sujeito.

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