Você está na página 1de 12

CASO OU COMPRO UMA BICICLETA?

Uma análise
histórica dos fundamentos que levam ao casamento.

Fernanda Sell de Souto Goulart Fernandes

Guardei
Sem ter porquê
Nem por razão
Ou coisa outra qualquer
Além de não saber como fazer
Pra ter um jeito meu de me mostrar

Achei
Vendo em você
Explicação
Nenhuma isso requer
Se o coração bater forte e arder
No fogo o gelo vai queimar

Pra você guardei o amor


Que aprendi vendo os meus pais
O amor que tive e recebi
E hoje posso dar livre e feliz
Céu cheiro e ar na cor que arco-íris
Risca ao levitar

Nando Reis

O presente texto, sem intenção de esgotar o assunto, trata dos


diferentes fundamentos que levaram sociedades a contrair matrimônio. As uniões, que
ocorriam de forma espontânea no meio social, passaram a ser organizadas pelo casamento,
através da intervenção do Estado. Desde então tem o Estado zelado pela figura
matrimonial. Apesar da possibilidade de uniões informais, inclusive amparadas
constitucionalmente, o número de casamentos cresce a cada dia. Entretanto, a relação
conjugal sofreu mudanças bruscas com a modificação das sociedades. O sustentáculo para a
formação da família através do casamento foi da manutenção da crença religiosa à certeza
do encontro com sua alma gêmea.

Tantos são os doutrinadores que conceituam esta figura tão antiga


e, ao mesmo tempo, tão atual como o casamento.

Em nossa legislação temos, por certeza, que casamento é o vínculo


jurídico entre homem e mulher, gerando para estes direitos e deveres recíprocos, tais como
a fidelidade, assistência, respeito, entre outros.

Rodrigo da Cunha Pereira1, presidente do Instituto Brasileiro de


Direito de Família, define casamento como “contrato de família, solene e especial, entre duas
pessoas, que visam uma comunhão de vidas. Nasce com a vontade das partes de constituírem uma
família, exigindo tal consentimento. Não basta o consentimento, é necessário a sua conformação, que
sejam observadas as normas e os procedimentos próprios, traçados pela lei, de molde a se
aperfeiçoar”.

Para João Batista de Oliveira Cândido2 “Toda e qualquer definição


sobre o casamento sofrerá, ao longo do tempo, alteração significativa, seja em face do enfoque que a
ele se dê: como instituição, como contrato ou como ato; seja em razão das modificações sofridas pela
própria família, e logicamente da própria sociedade. Assim é que numa sociedade que só aceite a
forma monogâmica das relações interpessoais, o conceito de casamento não poderá ser o mesmo de
uma sociedade que aceite as relações poligâmicas. De igual modo se a estrutura familiar se
apresenta diferente, estas alterações passam a ter influência na compreensão do instituto do
matrimônio.”.

Atualmente, o matrimônio baseia-se no Princípio da liberdade, ou


seja, aquele princípio que é fundado no livre poder de constituir uma comunhão de vida
familiar por meio de casamento ou união estável, sem qualquer imposição ou restrição de
pessoa jurídica de direito público ou privado (CC, art. 1.513); baseia-se também, na decisão
livre do casal no planejamento familiar (CC, art. 1.565), intervindo o Estado apenas em sua
competência de propiciar recursos educacionais e científicos ao exercício desse direito; ou
ainda, na livre aquisição e administração familiar (CC, arts. 1.642 e 1.643) e opção pelo
regime matrimonial mais conveniente (CC, art. 1.639); e até na liberdade de escolha pelo
modelo de formação educacional, cultural e religiosa da prole (CC, art. 1.634); e na livre
conduta, respeitando-se a integridade físico-psíquica e moral dos componentes da família.3

ANÁLISE HISTÓRICA
1
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A reforma do Direito de Família. Revista Del Rey, n. 1, dez. 1997
2 CÂNDIDO, João Batista de Oliveira. Direito de Família Contemporâneo. Belo Horizonte: Livraria Del
Rey Editora, 1997, p. 38.
3 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p. 18.
Numa análise histórica constata-se que consoante magistério de
Fustel de Coulanges, no Direito Grego e no Direito Romano não eram levados em
consideração sentimentos e afetos naturais, que poderiam até mesmo existir no âmago dos
corações, porém não teriam qualquer valia para o direito.

Tais sociedades baseavam-se, exclusivamente, na manutenção de


seus credos religiosos. Suas atividades diárias restringiam-se à manutenção do fogo
sagrado pela família. Sendo assim, o fundamento da unidade familiar, para estas
sociedades, baseava-se no prosseguimento do culto religioso.

O que uniu os membros da família antiga foi algo mais poderoso


que o nascimento, o sentimento ou a força física: na religião do
fogo sagrado e dos antepassados se encontra esse poder. A religião
fez com que a família formasse um único corpo nesta vida e na do
além. A família é desta forma, mais uma associação religiosa do que
uma associação natural4 .

Confirmando tal assertiva, tem-se que a palavra grega que


designava família, dizia-se epístion, o que literalmente significa: aquilo que está junto do
fogo sagrado.

Por tal motivo, o casamento tornava-se momento único para


homem e mulher. Esta seria a ocasião, onde o homem receberia na sua casa, aquela que
está a unir-se em sua religião doméstica. Para sua companheira desvendaria todos os ritos
inerentes ao patrimônio de sua família. Já a mulher, abdicaria da religião ao qual cresceu e
aprendeu a cultivar para unir-se a uma nova e estranha religião.

Numa sociedade fundamentada na religião, onde o casamento irá


transformar conceitos religiosos do casal, fica clara a grandeza do matrimônio para gregos
e romanos. Entende-se também, a proibição da poligamia, e a grande dificuldade de
aceitação do divórcio. Este último, com a possibilidade de ocorrência somente em casos
extremos, necessitaria de nova cerimônia religiosa para consuma-lo.

Como a continuação do culto religioso dependia da perpetuação da

4 COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga: estudos sobre o culto, o direito, as instituições da Grécia e
de Roma. p. 34.
unidade familiar, o casamento torna-se obrigatório, e o celibato repudiado. O casamento,
em si, não traz objetivos prazerosos ou de satisfação pessoal ou mútua, porém vem
estampado de obrigações, acima de tudo, religiosas.

Neste momento, constata-se as primeiras leis da moral doméstica, a


de obedecer, por parte da mulher, e a de mandar, por parte do marido. Porém, deveres
consagrados por nossa legislação, também já faziam parte no grego e romano, tais como:
fidelidade e respeito mútuo.

Platão, em sua obra A República, afirma que o mal de toda


sociedade estava baseado na propriedade e na família. Defendia isto, já que acreditava que
havendo propriedade haveria diferentes classes sociais e, por conseguinte, lutas para se
atingir o poder. Já a família, por trazer consigo laços afetivos acabaria por prejudicar a
ação estatal. Sendo assim, Platão defendia a extinção tanto da propriedade quanto da
instituição familiar.5

A razão disso é que o filósofo via na existência das famílias como


então eram compostas, ordenadas em poderosos clãs, com o objetivo de perpetuar sua
crença religiosa, um fator impeditivo para chegar-se à harmonia, visto que, muitas vezes,
os interesses particulares dos clãs conflitavam-se abertamente com os interesse gerais da
pólis.

O casamento monogâmico, tão defendido outrora, existente para


que perpetuasse o poder das famílias, deveria ser abolido, fazendo com que fossem
substituído por cerimônias nupciais coletivas, cujo objetivo era meramente reprodutivo.
Tais casamentos não deveriam ser aleatórios, porém deveriam ser preservadas as classes.

Segundo Platão, não deveria existir qualquer diferenciação entre


homens e mulheres, devendo estas receberem a mesma educação, fornecida pelo Estado,
aos homens.6

Caberiam as mulheres tarefas em comum com os homens, bem


como prestariam serviço militar, acompanhado os regimentos à guerra. O referido autor

5 PLATÃO. A república. p. 30.


6 PLATÃO. A república. 43
acreditava que a presença delas nos campos de batalha aumentaria a valentia dos soldados,
pois eles não desejariam passar por covardes frente aos olhares femininos.

Já Aristóteles, em sua obra “A Política”, admite o casamento e a


unidade familiar como fator para se alcançar uma vida perfeita.

A Cidade é uma sociedade estabelecida, com casas e famílias, para


viver bem, isto é, para se levar uma vida perfeita e que se baste a si
mesma. Ora, isto não pode acontecer senão pela proximidade de
habitação e pelos casamentos. Foi para o mesmo fim que se
instituíram nas cidades as sociedades particulares, as corporações
religiosas e profanas e todos os outros laços, afinidades ou
maneiras de viver uns com os outros, obra da amizade, assim como
a própria amizade é o efeito de uma escolha recíproca7 .

Na teoria Aristotélica, família é uma comunidade formada de


acordo com a natureza para satisfazer as necessidades quotidianas. Neste caso não trata-se
de escolha e sim de fato natural. A união entre homem e mulher teria como objetivo, tão
somente, a procriação.

Afirmava o filósofo, “Devendo o legislador cuidar antes de tudo da


boa conformação do corpo dos súditos que deverá criar, caber-lhe começar por bem
regular os casamentos, determinando a idade e a compleição dos que julgar admissíveis na
sociedade conjugal” 8.

Portanto todos os atos inerentes ao matrimônio deveriam ser


regulados pelo legislador, visto que o sucesso das relações familiares e a felicidade
provinda do matrimônio são objetivos perseguidos pelo Estado.

Para Aristóteles, o adultério é inadmissível:

Quanto às relações após o casamento com outra mulher ou outro


homem que não aquela ou aquele a que se está unido, isto deve ser
considerado como uma diversão absolutamente desonesta. Se ainda
se estiver em idade de ter filhos, o adultério deve ser marcado de

7 ARISTÓTELES. A Política. p. 55.


8 ARISTÓTELES. A Política. p. 70.
infâmia e punido segundo a enormidade do crime9.

Em outra fase, John Locke, em sua obra Segundo Tratado Sobre o


Governo, afirma que Deus ao criar o homem, o fez como criatura sociável, não sendo
conveniente a ele ficar só. O criador instaurou em sua criatura “sentimentos de necessidade,
conveniência e inclinação para a vida em sociedade”10. A primeira sociedade gerada foi através
da união entre homem e mulher, gerando esta filhos e posteriormente servos.

Para Locke, a sociedade conjugal provêm de pacto voluntário entre


o homem e a mulher, com um fim principal que é a procriação. Entretanto, ao contrário de
Aristóteles, o vínculo conjugal não deve restringir-se apenas à procriação, este deverá
permanecer com o intuito de criação dos filhos, até que estes adquiram liberdade de
movimento e com seus próprios esforços sejam capazes de adquirir seu próprio sustento.
Neste autor, também evidencia-se a constatação de deveres conjugais, que segundo ele são
o sustento e amparo mútuos e a comunhão de interesses, que tratará não só daqueles entre
o casal, como também de toda a prole11.

O autor admite que mesmo sendo o casamento um vínculo


duradouro e que carrega em si grandes doses de afetividade, não deve este estar obrigado a
ter caráter vitalício, podendo ainda, com consentimento de ambas as partes, ter duração
pré-fixada e submetê-lo a certas condições como qualquer outro pacto voluntário.

Ainda na visão de Locke, em uma sociedade conjugal serão


suscitados entendimentos contrários e vontades diferentes entre o casal, a solução estaria
na palavra final daquele que seria a cabeça da relação, papel destinado ao homem, por ser
mais capaz e mais forte12. Porém ressalta, que ao contrário de um monarca absoluto, o
poder do marido restringe-se às questões de interesse e propriedade comum, deixando à
livre apreciação da mulher tudo que lhe cabe por direito contratual.

Posteriormente, merece destaque a visão de Hegel, filósofo do


direito, que em sua obra Princípios da filosofia do direito, admite que a família constituiria

9 ARISTÓTELES. A Política. p. 74.


10 LOCKE, John. Segundo Tratado de Governo. p. 65.
11 LOCKE, John. Segundo Tratado de Governo. p. 65.
12 LOCKE, John. Segundo Tratado de Governo. p. 67
uma sociedade natural, em que seus membros estariam ligados simplesmente pelo amor,
confiança e obediência natural13. Cabendo destacar que é precisamente o amor que
proporciona esta coesão e indiferenciação dos membros da família.

Esta sociedade natural alcançaria sua realização plena mediante um


desenvolvimento que percorre três estágios: a) o casamento; b) propriedade, bens de
família e cuidados correspondentes e c) na educação dos filhos e na dissolução da família.

Para Hegel, o casamento é uma relação ética imediata, que contém


o momento da vida natural e a vida em sua totalidade como realidade da espécie e seu
processo.

O autor não considera o casamento como a simples união de dois


sexos ou como um acordo recíproco através de um contrato. Para o autor: “(...) o casamento
não é a relação de um contrato que incide sobre a sua base substancial. Ao contrário, ele sai fora do
ponto de vista do contrato, que é o da pessoa autônoma em sua individualidade, para ultrapassa-
lo”14 .

Prefere considerar o casamento como o simples e livre


consentimento de dois para constituírem um só ser, abandonando nessa unidade, sua
personalidade natural e individual, permitindo através dela alcançar a autoconsciência
substancial.

Hegel afirma:

O casamento é essencialmente monogâmico, porque quem se situa


neste estado e a ele se entrega é a personalidade, a individualidade
exclusiva imediata. A verdade e interioridade desta união (formas
subjetivas da substancialidade) só podem ter origem na dádiva
recíproca e indivisa desta personalidade que, só quando o outro
está incluído nessa identidade como pessoa, isto é, como
individualidade indivisível, adquire o seu legítimo direito de ser
consciente de si no outro15.

13 HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios da filosofia do direito. p. 158.


14 HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios da filosofia do direito. p. 158.
15 HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios da filosofia do direito. p. 161.
A monogamia estaria fundamentada na moralidade objetiva, sendo
este um dos seus princípios absolutos.

Tratando do divórcio, assim como Hegel não admite a coação que


obrigue ao casamento, assim também não há laço de direito positivo que possa manter
unidas duas pessoas quando esta não for o desejo delas. Entretanto

a autoridade moral de um terceiro é necessária para assegurar o


direito do casamento, da substancialidade moral contra a simples
verossimilhança de tais sentimentos e os acasos de uma simples
disposição temporária. Distinguirá ela tais situações da alienação
total e recíproca que é preciso verificar para que, somente nesse
caso, se pronuncie a dissolução do casamento16.

Para Hegel, o homem tem a sua vida substancial real no estado, na


ciência, na luta e no trabalho. Já a mulher possui a “imóvel intuição e o sentimento
subjetivo correspondente à moralidade objetiva, na família onde a mulher encontra aquele
destino substancial que no amor familiar exprime as disposições morais”17.

A figura do homem como a cabeça da família permanece na visão


de Hegel, já que para o autor a família, como pessoa jurídica, será representada perante os
outros pelo homem, que é o seu chefe. Ademais, são seus atributos e privilégios, o ganho
exterior, a provisão das exigências, assim como dispor e administrar os bens da família.
Porém tais direitos e atribuições são discutíveis entre os membros.

Com a inserção no mercado de trabalho, as mulheres vêm


conquistando direitos antes a elas repugnados. As famílias ganharam novas feições. O
reconhecimento das famílias constituídas pela união estável e das famílias monoparentais
trouxeram uma liberdade maior àqueles que possuíam o intuito de formar família. O
casamento deixou de ser a única possibilidade para quem desejasse ter sua descendência
“legitimada”. Sendo assim, o intuito do casamento passou a ser o desejo de estar civilmente
ligado a pessoa amada. O fundamento matrimonial que outrora fora religioso, econômico,
político, passa a ser afetivo.

16 HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios da filosofia do direito. p. 164/165.


17 HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios da filosofia do direito. p. 160
Hodiernamente, o casamento tem como base o afeto. Pessoas se
unem, perante a Estado, com a intenção de realizar o sonho de ser felizes. Segundo Dias18
o sentido da relação matrimonial melhor se expressa pela noção de comunhão de vidas, ou
comunhão de afetos.

Para Barros19 o que “identifica a família é um afeto especial, com o


qual se constitui a diferença específica que define a entidade familiar. É o sentimento entre
duas ou mais pessoas que se afeiçoam pelo convívio diuturno, em virtude de uma origem
comum ou em razão de um destino comum, que conjuga suas vidas tão intimamente, que
as torna cônjuges quanto aos meios e aos fins de sua afeição, até mesmo gerando efeitos
patrimoniais, seja de patrimônio moral, seja de patrimônio econômico. Este é o afeto que
define a família: é o afeto conjugal”.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em brilhante julgado,


dispõe do fundamento para a relação conjugal:

EMENTA: UNIÃO ESTÁVEL. AUSÊNCIA DE


COMPROVAÇÃO DE AFETO, AMOR E RESPEITO ENTRE AS PARTES.
RECURSO NÃO PROVIDO. Reconhecer união estável, sem comprovação de que tenha
ocorrido afeto, carinho e amor entre o casal, apenas com apoio em documentos esparsos
que indicam envio de cartas para um mesmo endereço, ou com base em uma conta
conjunta, é desprezar o valor mais importante para a união de um homem e uma
mulher, que é o amor. Não há, nos autos, nenhuma prova de que apelante e apelada, após
a separação consensual, tenham tido envolvimento afetivo e amoroso. Sem tal prova, que é
fundamental para o reconhecimento de uma convivência entre um casal, não há como
reconhecer uma união estável. Amor não se confunde com negócio, apesar de -
lamentavelmente - alguns insistirem em misturar afeto com dinheiro, carinho com
interesse financeiro. TJMG. 1.0024.03.074138-3/001(1). Relator: MARIA ELZA . Data
do Julgamento: 25/08/2005. Data da Publicação: 16/09/2005 .

Diniz20 em sua obra confirma a posição doutrinária e

18 DIAS, Maria Berenice. Manual das Famílias. p. 139.


19 BARROS, Sérgio Resende de. Revista Brasileira de Direito de Família, v. 14, p. 8.
20 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p. 15.
jurisprudencial da atualidade afirmando que “o fundamento básico do casamento, da vida
conjugal e do companheirismo é a afeição entre os cônjuges ou conviventes e a necessidade
de que perdure completa comunhão de vida, sendo a dissolução da sociedade conjugal uma
decorrência da extinção da affectio, uma vez que a comunhão espiritual e material de vida
entre marido e mulher ou entre conviventes não pode ser mantida ou reconstituída, tal
preceito baseia-se no Princípio da ratio do matrimônio e da união estável”.

Como visto, as transformações no seio familiar trouxeram


conseqüências ao instituto do casamento. O elo de ligação entre os cônjuges é o afeto,
respeito, consideração, lealdade. Nisto baseia-se a relação a dois. E como diria o grande
poeta Vinícius de Moraes:

“(...)E assim, quando mais tarde me procure

Quem sabe a morte, angústia de quem vive

Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):

Que não seja imortal, posto que é chama

Mas que seja infinito enquanto dure.”

CONCLUSÃO

Não obstante as diversas fontes de felicidade pessoal, a formação


da família através do casamento continua sendo objetivo de grande parte das pessoas. O
sonho de encontrar aquele que será a sua metade, seu companheiro para os momentos de
alegria, o suporte para os dias difíceis; é alimentado por todos. O sucesso profissional,
financeiro, religioso, muitas vezes, não apagam a necessidade de encontrar sua alma
gêmea. As estatísticas mostram que, apesar das facilidades das uniões informais, o número
de casamentos vêm crescendo. Como visto, após uma longa evolução dos fundamentos que
levaram pessoas a contrair matrimônio, atualmente, o objetivo da conservação
matrimonial é dar e receber amor21. É o vínculo afetivo o maior sustentáculo da
manutenção do casamento. Surge aqui um enorme desafio. Numa época de pós-
modernidade, onde a necessidade de mudança e procura por experiências novas é
palpitante no coração de cada indivíduo, imperioso se torna o cuidado para que as relações
não sejam descartáveis, num anseio egoísta pela busca do próprio prazer.

BIBLIOGRAFIA

ARISTÓTELES. A Política. Título Original: La politique. Tradução de Roberto Leal


Ferreira. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

BARROS, Sérgio Resende de. A ideologia do afeto. Revista Brasileira de Direito de


Família. Porto Alegre: Síntese, Jul-Ago-Set. 2002, v. 14, p. 9.

CÂNDIDO, João Batista de Oliveira. Direito de Família Contemporâneo. Belo


Horizonte: Livraria Del Rey Editora, 1997.

COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga: estudos sobre o culto, o direito, as


instituições da Grécia e de Roma. Título Original: La Cité Antique. Tradução de Jonas
Camargo e Eduardo Fonseca. São Paulo: Hemus, 1975.

DIAS, Maria Berenice. Manual das Famílias. 4 ed. São Paulo: RT Editora, 2007.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de Família. 11.ed. São
Paulo: Saraiva, 1996. V.5.

HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios da filosofia do direito. Tradução de


Norberto de Paulo Lima. São Paulo: Ícone, 1997.

LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo. Título original: Two Treatises of
Government. Tradução de Alex Marins. São Paulo: Martin Claret, 2002.

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A reforma do Direito de Família. Revista Del Rey, n. 1,


dez. 1997

PLATÃO. A república. Tradução de Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret. 2001.

VILLELA, João Baptista. As novas relações de família. Anais da XV Conferência

21 VILLELA, João Baptista Villela. As novas relações de família. p. 645.


Nacional da OAB. Foz do Iguaçu, set. 1994, p. 645.

Você também pode gostar