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Direitos e deveres

individuais e coletivos I

Marcos Soares* *
Pós-graduado em Direi-
to Tributário pelo Institu-
to Brasileiro de Estudos
Tributários (IBET) e em
Direito Processual Tribu-
tário pela Universidade de
Brasília (UnB). Graduado

Direito fundamentais
em Engenharia Mecânica
pela Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ)
e em Direito pela Univer-
sidade do estado do Rio
As expressões “direitos fundamentais” e “direitos humanos” são quase de Janeiro (UERJ). Profes-
sor de Direito Tributário e
como sinônimos. Direito Constitucional no
Centro de Estudos Alexan-
dre Vasconcellos (CEAV),
A expressão “direitos fundamentais” surgiu na França (1770), no movi- Universidade Estácio de
Sá, Faculdade da Acade-
mento que deu origem à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão mia Brasileira de Educa-
ção e Cultura (FABEC) e
(1789). em preparatórios para
concursos públicos. Atua
como auditor fiscal da Re-
Embora não haja um consenso sobre a diferença entre direitos humanos ceita Federal.

e direitos fundamentais, pode-se dizer que eles contemplam em planos dife-


rentes os direitos relacionados, principalmente, à liberdade e à igualdade.

Enquanto os direitos humanos constam dos tratados e convenções inter-


nacionais (plano internacional), os direitos fundamentais estão positivados
nas constituições de cada país (plano interno).

Os direitos fundamentais representam, via de regra, um direito subjetivo


do indivíduo frente ao Estado.

As constituições modernas, ao darem aos direitos fundamentais uma po-


sição de destaque, passaram a considerar o homem como o principal titular
dos direitos constitucionais.

Cabe destacar, ainda, que os direitos fundamentais, ou pelo menos parte


deles, são atualmente considerados cláusulas pétreas em muitas constitui-
ções do mundo.

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Direitos e deveres individuais e coletivos I

Classificação na Constituição Federal


A Constituição Federal ao tratar dos direitos fundamentais, no seu título
II, divide-os em cinco capítulos, assim denominados:

 direitos individuais e coletivos;

Vara Federal  direitos sociais;

 nacionalidade;

 direitos políticos;

 partidos políticos.

Classificação da doutrina
Os direitos fundamentais são tradicionalmente classificados pela doutri-
na como:

 Direitos de 1.ª geração ou dimensão (liberdades clássicas);

 Direitos de 2.ª geração ou dimensão (direitos sociais);

 Direitos de 3.ª geração ou dimensão (direitos coletivos e difusos).

Os direitos de primeira geração objetivam dar ao homem o direito à li-


berdade na vida civil e o direito de participação política na vida do Estado.
São os direitos e garantias individuais clássicos (direitos civis e políticos). Eles
vieram para proteger o cidadão em face do próprio Estado.

Um dos primeiros registros a respeito de um documento que tenha im-


posto uma restrição ao poder do soberano diante dos seus súditos é a Magna
Carta, elaborada pelos barões ingleses e imposta ao rei João “Sem Terra”, em
15 de junho de 1215.

A Magna Carta objetivava garantir os direitos individuais dos nobres


frente ao Poder Público.

Do teor da Carta, cabe destacar o seu artigo 39, conhecido como cláusula
do law of the lands, em que se estabelece que “nenhum homem livre será

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Direitos e deveres individuais e coletivos I

detido ou sujeito a prisão, ou privado de seus bens, ou colocado fora da lei,


ou exilado, ou de qualquer modo molestado, e nós não procederemos nem
mandaremos proceder contra ele, senão mediante um julgamento regular
pelos seus pares ou de harmonia com as leis do país.”

Assim, os direitos dos barões ingleses acima mencionados só poderiam


ser restringidos mediante a observação da lei do país, da Lei da Terra.

Os direitos de segunda geração abrangem os direitos sociais, econômicos


e culturais. Esses direitos foram reconhecidos, principalmente, no início do
século XX, quando surgiram os direitos sociais (direito ao trabalho, previdên-
cia social etc.).

Os direitos de terceira geração estão ligados ao princípio da fraternida-


de, eles têm por objetivo proteger a coletividade, ou seja, todo o gênero
humano, de forma indeterminada, e não especificamente os interesses de
um indivíduo ou grupo identificado.

Os direitos de terceira geração refletem uma preocupação com as gera-


ções presentes ou futuras. São exemplos de direitos fundamentais de tercei-
ra geração: o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, ao pa-
trimônio comum da humanidade, à comunicação, à paz, ao progresso etc.

Os direitos de primeira, segunda e terceira gerações realçam os ideais


clássicos da Revolução Francesa: liberdade (primeira geração), igualdade
(segunda geração) e fraternidade (terceira geração).

Macete!
LIBERDADE, IGUALDADE, FRATERNIDADE

Novos desafios e problemas clamam por novas gerações de direitos. Seria


uma 4.ª ou até mesmo uma 5.ª geração de direitos, mas isso ainda não é um
consenso.

Alguns autores defendem que a 4.ª geração de direitos englobaria o direi-


to à democracia, ao pluralismo e à informação. Outros ressaltam os direitos
ligados à biotecnologia e aos avanços científicos. De qualquer forma, uma
quarta (ou mesmo uma quinta) geração de direitos fundamentais ainda não
é uma unanimidade.

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Direitos e deveres individuais e coletivos I

Eficácia jurídica
Os direitos fundamentais têm, em regra, aplicabilidade imediata (CF,
art. 5.º, §1.º).

Os direitos e garantias fundamentais deverão ter a máxima eficácia possí-


vel, imediatamente a partir da Constituição.

Entretanto, nem todos foram assegurados por meio de normas de eficá-


cia plena. Alguns direitos fundamentais estão na dependência da elabora-
ção de normas infraconstitucionais para adquirirem sua plenitude e outros
admitem restrições em seu conteúdo, desde que razoáveis, consistindo em
normas de eficácia contida ou restringível.

Cabe destacar, todavia, que mesmo as normas constitucionais de efi-


cácia limitada produzem um mínimo efeito, ou seja, elas têm, ao menos, o
efeito de vincular o legislador infraconstitucional aos seus vetores e de não
permitir a recepção de normas anteriores à Constituição e contrárias a tais
dispositivos.

Por fim, é oportuno fazer algumas observações:

 os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros


decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos trata-
dos internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte,
de acordo com o disposto no §2.º do artigo 5.º;

 os direitos fundamentais não devem ser vistos como normas absolu-


tas, haja vista que poderão ter aplicação restringida na medida em que
se compatibilizam com outros direitos fundamentais;

 a doutrina discute se os direitos fundamentais como um todo estão in-


seridos entre as cláusulas pétreas, uma vez que o art. 60, §4.º, inciso IV, da
CF, arrola entre as cláusulas pétreas os “direitos e garantias individuais”.

O Supremo Tribunal Federal (STF), quando declarou que o princípio da ante-


rioridade tributária gozava dessa proteção, deixou consignado que a expressão
direitos e garantias individuais engloba não apenas os direitos e garantias ins-
critos no artigo 5.o da Constituição Federal, podendo atingir direitos e garantias
contemplados em outros dispositivos do texto maior. Com isso, o fato de os
direitos fundamentais estarem previstos em diversos artigos da Constituição
não impede que a eles não se reconheça a condição de cláusula pétrea.

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Direitos e deveres individuais e coletivos I

Boa parte da doutrina é favorável à tese de que os direitos fundamentais,


e não apenas os direitos e garantias individuais, gozam de proteção cons-
titucional na condição de cláusula pétrea. O STF, entretanto, ainda não se
pronunciou acerca do enquadramento dos direitos fundamentais como um
todo, ainda que de caráter individual, na previsão do art. 60, §4.º, IV, da CF, de
modo que a questão ainda não admite conclusão definitiva.

Dos direitos e deveres


individuais e coletivos
O caput do artigo 5.º da CF diz que são titulares dos direitos e garantias
fundamentais os brasileiros e estrangeiros residentes no país. E quanto aos
estrangeiros não residentes? Não são titulares de quaisquer dos direitos e
garantias fundamentais? É claro que são!

A declaração de direitos fundamentais da Constituição abrange diver-


sos direitos vinculados à dignidade do homem – princípio que o artigo 1.º,
inciso III, da CF considera como um fundamento da República Federativa
do Brasil. O respeito à dignidade de todos os homens não se excepciona
em função da nacionalidade. Logo, os estrangeiros não residentes no país
também estão protegidos por diversos dos direitos fundamentais pre-
vistos no artigo 5.º e em outros artigos da Constituição. Não seria lógico
interpretar-se de outra forma.

Entretanto, alguns direitos são dirigidos ao indivíduo como cidadão bra-


sileiro. Assim, por exemplo, os direitos políticos pressupõem a nacionalidade
brasileira, o direito ao trabalho, em regra, não se estende aos estrangeiros
sem residência no país etc.

Direito à vida (CF, art. 5.º, caput)


O direito à vida é um pré-requisito para o exercício dos demais direitos,
devendo ser considerado sob dois aspectos principais, o direito de continuar
vivo e o de viver com dignidade.

Em função do primeiro aspecto é proibida a pena de morte, salvo em caso


de guerra declarada, nos termos do disposto no artigo 84, inciso XIX. Logo,
nem por emenda constitucional será permitida a instituição da pena de morte
no Brasil, sob pena de ferir a cláusula pétrea do artigo 60, §4.º, inciso IV, da CF.

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Direitos e deveres individuais e coletivos I

O segundo aspecto está ligado à garantia das necessidades vitais básicas


do ser humano e à proibição de qualquer tratamento indigno, como tortura,
penas de caráter perpétuo, trabalhos forçados, cruéis etc.

Princípio da igualdade
(CF, art. 5.º caput e inciso I)
Obedecer ao princípio da igualdade é tratar de maneira igual os iguais e
de maneira desigual os desiguais, na medida das suas desigualdades.

O princípio da igualdade vincula tanto o legislador como os aplicadores


da lei, no sentido de que:

 o legislador, ao elaborar a lei, deve dar tratamento isonômico àqueles


que se encontram em situação equivalente;

 o aplicador da lei, ao aplicá-la aos casos concretos, não deve tratar de


forma desigual os seus destinatários.

Cabe ressaltar que o princípio da igualdade não veda o tratamento discri-


minatório entre indivíduos, quando há razoabilidade para a discriminação.

Diante de um concurso público, por exemplo, são admitidas restrições


(ou favorecimentos) a determinados grupos de indivíduos, como:

 reserva de vagas aos candidatos portadores de deficiência física;

 estabelecimento de idade mínima e máxima para o ingresso no cargo,


dependendo das características específicas das atribuições do cargo;

O Supremo Tribunal Federal tem considerado legítimo, por exemplo, o


estabelecimento de idade máxima para os cargos de agente de polícia,
agente penitenciário e delegado de polícia. Por outro lado, não consi-
derou legítima, por falta de razoabilidade, a fixação de idade mínima
para o cargo de fiscal de tributos estaduais, professor universitário etc.

 estabelecimento de altura mínima para o ingresso no cargo, a depen-


der das características específicas das atribuições do cargo;

O STF considera legítima a fixação de altura mínima para os cargos


de agente de polícia, agente penitenciário etc. Mas o próprio STF já

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Direitos e deveres individuais e coletivos I

considerou inconstitucional a exigência de altura mínima para o in-


gresso no cargo de escrivão de polícia.

 discriminação entre homens e mulheres em concurso público.

Também é legítimo o tratamento discriminatório entre homens e mu-


lheres diante de concurso público, desde que tal discriminação seja
justificável, em face das atribuições do cargo. Não há ofensa ao prin-
cípio da igualdade, por exemplo, na abertura de um concurso públi-
co exclusivamente para mulheres, para o preenchimento do cargo de
agente penitenciário numa prisão feminina.

Não há que se falar em ofensa ao princípio da igualdade se o tratamento


discriminatório é admitido pela própria Constituição.

Assim, se a própria Constituição estabelece que a lei deverá proteger o


mercado de trabalho da mulher, mediante a concessão de incentivos espe-
cíficos (CF, art. 7.º, XX), é porque não há nesta hipótese uma ofensa ao prin-
cípio da igualdade.

Podemos citar, ainda, a previsão de aposentadoria da mulher com menor


tempo de contribuição (CF, art. 40), reserva de certos cargos públicos para
brasileiros natos (CF, art. 12, §3.º), previsão de tratamento favorecido às mi-
croempresas e empresas de pequeno porte (CF, art. 179) etc.

Entendemos ter sido desnecessário o disposto no inciso I do artigo 5.º,


haja vista que o caput já havia falado que todos são iguais e assegurado a
igualdade.

Além disso, cabe lembrar que a dignidade da pessoa humana é um fun-


damento da República Federativa do Brasil, e não há dúvidas de que um tra-
tamento discriminatório iria ferir tal fundamento, o que não seria possível,
mas em função da nossa realidade discriminatória em relação à mulher, o
legislador constituinte preferiu pecar pelo excesso.

Princípio da legalidade (CF, art. 5.º, II)


O princípio da legalidade visa assegurar que só por meio das normas, de-
vidamente elaboradas conforme as regras do processo legislativo previsto

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Direitos e deveres individuais e coletivos I

na própria Constituição, podem-se criar obrigações para o indivíduo, pois


estas são expressão da vontade geral.

O princípio da legalidade não se confunde com o princípio da reserva


legal, já que o primeiro significa a submissão e o respeito à lei, ao Direito, ou
à atuação dentro do que fora estabelecido pelo legislador, enquanto que o
segundo consiste na exigência de que a regulamentação de determinadas
matérias há de ser feita necessariamente por lei formal.

Proteção contra a tortura, tratamento


desumano ou degradante (CF, art. 5.º, III)
Art. 5º [...]

III - Ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante;

[...]

A lei considerará crime inafiançável e insuscetível de graça ou anistia a


prática de tortura.

O repúdio à tortura decorre do processo histórico brasileiro, uma vez que,


no passado, governos ditatoriais se utilizaram desta prática para desarticular
seus opositores.

A Lei 9.455/97 define os crimes de tortura. Quanto ao tratamento desu-


mano e degradante não há uma definição legal do que seja, mas com a uti-
lização do bom senso é possível identificar o seu significado. De qualquer
forma, para fins de prova, é importante ter ciência de que a Constituição da
mesma forma o proíbe.

Entendemos também aqui ter sido desnecessário o disposto no inciso III


do artigo 5.º, em função de a dignidade da pessoa humana ser um funda-
mento da República Federativa do Brasil, mas em função da nossa realidade
(cabe ressaltar que alguns dos parlamentares que integraram a assembleia
constituinte nacional sofreram torturas e tratamento degradante), o legisla-
dor constituinte preferiu, mais uma vez, pecar pelo excesso.

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Direitos e deveres individuais e coletivos I

Liberdade de manifestação de
pensamento, vedado o anonimato (CF, art. 5.º, IV)
O legislador constituinte achou importante assegurar a liberdade de ma-
nifestação do pensamento, até mesmo em função de ter vivenciado um pe-
ríodo de muita censura.

Mas há que se considerar que a liberdade de manifestação do pensamen-


to pode dar ensejo a abusos, que serão passíveis de responsabilização civil e
penal, quando outros direitos fundamentais forem desrespeitados, como a
honra ou a vida privada.

Para que haja equilíbrio entre os direitos, é vedado o anonimato, o que


garante ao lesado o direito de defesa, em uma dupla perspectiva:

 preventiva – o autor da manifestação deve adotar uma postura


responsável;

 repressiva – possibilita ao ofendido o direito de resposta, proporcional ao


agravo além de indenizações por danos materiais, morais e à imagem.

A proibição do anonimato indica que não pode a manifestação ser não


identificada, mas não impede o uso de pseudônimos. Tal vedação também
não veda que os cidadãos anonimamente comuniquem às autoridades pú-
blicas a ocorrência de ilícitos.

Direito de resposta e indenização (CF, art. 5.º, V)


O direito de resposta deve ser encarado sob duas perspectivas: dá ao
ofendido o direito de retificação da informação incorreta, mas também serve
para estabelecer uma espécie de contraditório pelo qual se pode esclarecer
algum mal-entendido ou distorções da informação.

O direito de resposta é sempre proporcional ao agravo e poderá ser cumu-


lado com indenização por danos materiais, morais ou à imagem.

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Direitos e deveres individuais e coletivos I

Liberdade de consciência e de crença; livre


exercício dos cultos religiosos; proteção aos
locais de culto e a suas liturgias (CF, art. 5.º, VI)
Desde o advento da República que há uma separação entre o Estado e a
Igreja, sendo o Brasil um país laico, leigo ou não confessional, não havendo,
portanto, qualquer religião oficial.

Em consonância com isso foi reconhecida a inviolabilidade da liberdade de


consciência e de crença sendo assegurado o livre exercício dos cultos religio-
sos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias.

Há que se destacar que a inviolabilidade da liberdade de consciência e


de crença, e a garantia do livre exercício dos cultos religiosos foi prevista em
uma norma de eficácia plena, enquanto a proteção aos locais de culto e suas
liturgias foi feita por meio de uma norma jurídica de eficácia limitada depen-
dente até os dias de hoje de regulamentação.

Assistência religiosa nas entidades


de intervenção coletiva (CF, art. 5.º, VII)
Entendeu o legislador constituinte ser importante assegurar como um di-
reito fundamental a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e
militares de internação coletiva.

Já existe regulamentação desse inciso em relação às forças armadas (Lei


6.923/81) e aos estabelecimentos prisionais (Lei 7.210/84 – Lei de Execução
Penal).

Escusa ou imperativo de
consciência (CF, art. 5.º, VIII)
Este inciso não se restringe ao serviço militar obrigatório, mas, sem dúvi-
das, é o melhor exemplo.

De acordo com o artigo 143 da CF, o serviço militar é obrigatório para


os homens nos termos da lei. Entretanto, o §1.º do referido artigo dispõe o
seguinte:

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Direitos e deveres individuais e coletivos I

Art. 143. [...]


§1.º às Forças Armadas compete, na forma da lei, atribuir serviço alternativo aos que, em
tempo de paz, após alistados, alegarem imperativo de consciência, entendendo-se como
tal o decorrente de crença religiosa e de convicção filosófica ou política, para se eximirem
de atividades de caráter essencialmente militar.

O direito à objeção de consciência foi assegurado na Constituição, desde


que seja prestado o serviço alternativo.

O serviço alternativo à prestação do serviço militar obrigatório já foi regu-


lamentado em lei (Lei 8.239, de 04/10/91), entretanto não foi implementado
pelas Forças Armadas. Muitos jovens já manifestaram objeção de consciên-
cia em relação à prestação do serviço militar obrigatório, todavia, até o mo-
mento, ninguém efetivamente prestou tal serviço alternativo.

O artigo 3.º da Lei 8.239/91 dispõe o seguinte:


Art. 3º O Serviço Militar inicial é obrigatório a todos os brasileiros, nos termos da lei.
§1.º Ao Estado-Maior das Forças Armadas compete, na forma da lei e em coordenação com os
Ministérios Militares, atribuir Serviço Alternativo aos que, em tempo de paz, após alistados,
alegarem imperativo de consciência decorrente de crença religiosa ou de convicção
filosófica ou política, para se eximirem de atividades de caráter essencialmente militar.

§2.º Entende-se por Serviço Alternativo o exercício de atividades de caráter administrativo,


assistencial, filantrópico ou mesmo produtivo, em substituição às atividades de caráter
essencialmente militar.

§3.º O Serviço Alternativo será prestado em organizações militares da ativa e em órgãos


de formação de reservas das Forças Armadas ou em órgãos subordinados aos Ministérios
Civis, mediante convênios entre estes e os Ministérios Militares, desde que haja interesse
recíproco e, também, sejam atendidas as aptidões do convocado.

Segundo o procurador da República em Santa Maria (RS)1 o serviço alternati- 1


Disponível em: <http://
noticias.pgr.mpf.gov.br/
vo não foi implantado, apesar de as normas necessárias para sua efetivação esta- noticias/noticias-do-site/
copy_of_direitos-do-ci-
rem vigentes há algum tempo. Em função disso, o Ministério Público Federal e o dadao/>. Acesso em: 27
abr. 2011.
Ministério Público Militar em Santa Maria ajuizaram uma ação civil pública.

Na ação se pleiteia a implantação do serviço alternativo e que seja infor-


mado à população o direito ao cumprimento do serviço alternativo em cam-
panha publicitária com “no mínimo, 30% (trinta por cento) do material publi-
2
citário utilizado sobre o serviço militar em todos os meios de divulgação AÇÃO CIVIL PÚBLICA
2008.71.02.000356-3, 2.ª
(televisão, rádio, jornais, cartazes etc.)2”. Vara Federal de Santa
Maria (RS).

Para fins de prova o que importa é que se o jovem se negar a cumprir


o serviço militar e, também se negar a cumprir a prestação alternativa, ele
poderá ser privado de direitos, de acordo com o disposto no artigo 15, inciso
IV, da CF, que dispõe:

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Direitos e deveres individuais e coletivos I

Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos
casos de:

[...]

IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do


art. 5º, VIII;

[...]

Liberdade de expressão (CF, art. 5.º, IX)


A liberdade de expressão é o direito de manifestar livremente opiniões,
ideias e pensamentos. É um conceito básico nas democracias modernas nas
quais a censura não encontra respaldo.

Entretanto, o respeito à dignidade pessoal e também o respeito aos va-


lores da família impõem um limite à liberdade de programação de rádios e
televisão, conforme o disposto no artigo 221 da CF, que diz:
Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos
seguintes princípios:

I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;

II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que


objetive sua divulgação;

III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais


estabelecidos em lei;

IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

Concluindo, cabe registrar que o ser humano não pode ser exposto à
mera curiosidade alheia, nem ser tomado como um simples instrumento de
divertimento, ferindo-se a sua dignidade. Em casos assim, não será legítimo
o exercício da liberdade de expressão.

Inviolabilidade da vida privada,


da honra e da imagem (CF, art. 5.º, X)
Conforme dispôs Marcelo Novelino (2009, p. 396): “A Constituição prote-
ge a privacidade (gênero) ao reconhecer como invioláveis a vida privada, a

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Direitos e deveres individuais e coletivos I

intimidade, a honra e a imagem das pessoas (espécies), assegurando o direi-


to à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

O conceito de vida privada é mais amplo do que o de intimidade da


pessoa. Pode-se dizer que a vida privada é composta de informações, as
quais cabe somente ao seu titular escolher se as divulga ou não. Já a inti-
midade está relacionada ao modo de ser da pessoa, à sua identidade, que
pode, muitas vezes, ser confundida com a vida privada. Pode-se dizer, por-
tanto, que dentro da vida privada ainda há a intimidade da pessoa.

Quanto à questão da imagem cabe citar a súmula 403 do Superior Tribu-


nal de Justiça, de 28/10/2009, que trata da indenização pela publicação não
autorizada da imagem de alguém tem o seguinte teor:
N. 403. Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada da
imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.

A respeito do tema cabe registrar que, no ano 2000, a 3.ª Turma do STJ
garantiu a uma atriz famosa o direito a receber indenização por dano moral
de um jornal carioca, devido à publicação não autorizada de uma foto da
3
atriz retirada de ensaio fotográfico feito para uma revista masculina3. Disponível em: <www.
bombini.adv.br/home.asp
?pag=Noticias&chave=26
Para aceitar o trabalho, a atriz impôs, em contrato escrito, as condições 8&ftr=2011>. Acesso em:
27 abr. 2011.
para cessão de sua imagem, fixando a remuneração e o tipo de fotos que
seriam produzidas, demonstrando preocupação com a sua imagem e a qua-
lidade do trabalho, de modo a restringir e a controlar a forma de divulgação
de sua imagem despida nas páginas da revista. No entanto, o jornal carioca
estampou uma das fotos, extraída do ensaio para a revista em página inteira,
sem qualquer autorização.

Para a Turma, a atriz foi violentada em seu crédito como pessoa, pois cedeu
o seu direito de imagem a um determinado nível de publicação e poderia
não querer que outro grupo da população tivesse acesso a essa imagem. Os
ministros, por maioria, afirmaram que ela é uma pessoa pública, mas nem
por isso deve aceitar que sua imagem seja publicada em lugar que não au-
torizou, e deve ter sentido raiva, dor, desilusão, por ter visto sua foto em uma
publicação que não foi de sua vontade. Por essa razão, deve ser indenizada.

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Direitos e deveres individuais e coletivos I

Sigilo bancário
O sigilo bancário tem sido tratado pelo STF e pelo STJ como tema sujeito
à proteção da vida privada dos indivíduos.

Consiste na obrigação imposta a bancos e seus funcionários de discri-


ção, a respeito de negócios de pessoas com que lidaram, abrangendo dados
sobre abertura e fechamento de contas e sua movimentação.
4
STF-RE 219780/PE, Rel. O direito ao sigilo bancário, todavia, não é absoluto. A jurisprudência4
Min. Carlos Velloso, 2.a T.,
j. 13/04/1999. admite que o sigilo bancário pode ser quebrado:

 por decisão judicial fundamentada;

 por decisão de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), desde que


tomada por maioria absoluta dos seus membros e devidamente fun-
damentada;

 por autoridade fiscal da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos


Municípios, desde que observados os procedimentos legais (Lei Com-
plementar 105/2001, art. 6.º).

Em relação ao terceiro item acima cabe registrar que, em 15/12/2010, foi


5
Disponível em: <www. noticiado no sítio do STF o seguinte5:
stf.jus.br/arquivo/cms/
p u b l i c a c a o I n fo r m at i -
voTe m a / a n exo / 5 . _ I n - STF nega quebra de sigilo bancário de empresa pelo Fisco sem ordem judicial
formativo_mensal_
dezembro_2010.pdf>;
< w w w. j u s b r a s i l. c o m . Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) deu provimento
br/noticias/2510539/ a um Recurso Extraordinário (RE 389808) em que a empresa GVA Indústria e Comércio
stf-nega-quebra-de-sigi-
lo-bancario-de-empre- S/A questionava o acesso da Receita Federal a informações fiscais da empresa, sem
sa-pelo-fisco-sem-ordem- fundamentação e sem autorização judicial. Por cinco votos a quatro, os ministros
judicial>. Acesso em: 27
abr. 2011.
entenderam que não pode haver acesso a esses dados sem ordem do Poder Judiciário.

O caso

A matéria tem origem em comunicado feito pelo Banco Santander à empresa GVA Indústria
e Comércio S/A, informando que a Delegacia da Receita Federal do Brasil – com amparo
na Lei Complementar nº 105/01 – havia determinado àquela instituição financeira, em
mandado de procedimento fiscal, a entrega de extratos e demais documentos pertinentes
à movimentação bancária da empresa relativamente ao período de 1998 a julho de 2001.
O Banco Santander cientificou a empresa que, em virtude de tal mandado, iria fornecer os
dados bancários em questão.

A empresa ajuizou o RE no Supremo contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional


Federal da 4.ª Região, que permitiu “o acesso da autoridade fiscal a dados relativos à
movimentação financeira dos contribuintes, no bojo do procedimento fiscal regularmente
instaurado”. Para a GVA, “o poder de devassa nos registros naturalmente sigilosos, sem a

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Direitos e deveres individuais e coletivos I

mínima fundamentação, e ainda sem a necessária intervenção judicial, não encontram


qualquer fundamento de validade na Constituição Federal”. Afirma que foi obrigada por
meio de Mandado de Procedimento Fiscal a apresentar seus extratos bancários referentes
ao ano de 1998, sem qualquer autorização judicial, com fundamento apenas nas
disposições da Lei 10.174/2001, da Lei Complementar 105/2001 e do Decreto 3.724/2001,
sem qualquer respaldo constitucional.

Dignidade

O ministro Marco Aurélio (relator) votou pelo provimento do recurso, sendo acompanhado
pelos ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cezar Peluso. O
princípio da dignidade da pessoa humana foi o fundamento do relator para votar a favor
da empresa. De acordo com ele, a vida em sociedade pressupõe segurança e estabilidade,
e não a surpresa. E, para garantir isso, é necessário o respeito à inviolabilidade das
informações do cidadão.

Ainda de acordo com o ministro, é necessário assegurar a privacidade. A exceção para


mitigar esta regra só pode vir por ordem judicial, e para instrução penal, não para outras
finalidades. “É preciso resguardar o cidadão de atos extravagantes que possam, de alguma
forma, alcançá-lo na dignidade”, salientou o ministro.

Por fim, o ministro disse entender que a quebra do sigilo sem autorização judicial banaliza
o que a Constituição Federal tenta proteger, a privacidade do cidadão. Com esses
argumentos o relator votou no sentido de considerar que só é possível o afastamento
do sigilo bancário de pessoas naturais e jurídicas a partir de ordem emanada do Poder
Judiciário.

Já o ministro Gilmar Mendes disse em seu voto que não se trata de se negar acesso às
informações, mas de restringir, exigir que haja observância da reserva de jurisdição. Para
ele, faz-se presente, no caso, a necessidade de reserva de jurisdição.

Para o ministro Celso de Mello, decano da Corte, o Estado tem poder para investigar e
fiscalizar, mas a decretação da quebra de sigilo bancário só pode ser feita mediante ordem
emanada do Poder Judiciário.

Em nada compromete a competência para investigar atribuída ao poder público, que


sempre que achar necessário, poderá pedir ao Judiciário a quebra do sigilo.

Divergência

Os ministros Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ayres Britto e Ellen Gracie votaram pelo
desprovimento do RE. De acordo com o ministro Dias Toffoli, a lei que regulamentou
a transferência dos dados sigilosos das instituições financeiras para a Receita Federal
respeita as garantias fundamentais presentes na Constituição Federal. Para a ministra
Cármen Lúcia, não existe quebra de privacidade do cidadão, mas apenas a transferência
para outro órgão dos dados protegidos.

Em regra, o Ministério Público não pode decretar a quebra do sigilo ban-


cário. Segundo a jurisprudência do STF, o Ministério Público somente pode
quebrar o sigilo bancário diante do emprego de verba pública, em respeito
ao princípio da publicidade.

15
Direitos e deveres individuais e coletivos I

Inviolabilidade do domicílio (CF, art. 5.º, XI)


A “casa” do indivíduo foi protegida pela Constituição contra a invasão
por parte de terceiros: somente com o consentimento do morador pode-se
adentrar em sua “casa”, ressalvadas as estritas hipóteses previstas na própria
Constituição.

Quanto a esta questão cabem os seguintes registros:

 em caso de flagrante delito (prática atual de um crime), desastre (desa-


bamento, incêndio etc.) ou para prestar socorro (exemplo: o morador
estar desmaiado) a Constituição autoriza o ingresso a qualquer hora,
durante o dia ou durante a noite, independentemente de autorização
judicial;

 por ordem judicial só é permitido o ingresso durante o dia;

Não há consenso doutrinário sobre o que seja “dia” para a Constituição


Federal. Alguns defendem que seja obedecida a regra do Código de
Processo Civil, que considera dia o período entre 6 e 20h; outros au-
tores (entre eles, José Celso Mello Filho, 1986, p. 442) entendem que o
importante é ainda estar claro, sendo irrelevante a hora.

 a expressão “casa”, utilizada na Constituição, tem alcance amplo, abran-


gendo não apenas a residência fixa do morador, mas também outras
dependências não abertas ao público, ainda que de natureza não resi-
dencial (exemplo: escritório profissional, consultório médico etc.);

 após a Constituição Federal de 1988, as buscas e apreensões adminis-


trativas, nesses ambientes, tornaram-se inconstitucionais.

Sigilo das correspondências (CF, art. 5.º, XII)


Pela leitura do inciso XII do artigo 5.º podemos ter a impressão de que a
inviolabilidade só poderá ser excepcionada no caso das comunicações tele-
fônicas, por ordem judicial. Pode parecer que as demais inviolabilidades – da
correspondência, das comunicações telegráficas e de dados – seriam absolu-
tas, não se admitindo sua quebra nem mesmo por ordem judicial.

16
Direitos e deveres individuais e coletivos I

Porém, dois aspectos merecem ser ressaltados:

 em situações excepcionais, a própria Constituição admite restrições


ao direito ao sigilo de correspondência, de comunicação telegráfica e
telefônica, como nos casos de estado de defesa e estado de sítio (CF,
arts. 136 e 139);

 o constitucionalismo contemporâneo refuta a ideia de qualquer liber-


dade individual absoluta, que não admita ressalvas em face de outras
garantias constitucionais. O STF já se manifestou no sentido de ser
possível, respeitados determinados parâmetros, a interceptação das
correspondências e comunicação telegráficas e de dados sempre que
tais liberdades públicas estiverem sendo utilizadas como instrumento
6
de salvaguarda de práticas lícitas (STF, HC 70.814)6. HC 70814/SP, Rel. Min.
Celso de Mello 1.a T., j.
01/03/1994.
No caso das comunicações telefônicas, o próprio texto constitucional já
admite expressamente a possibilidade de sua violação, mediante intercep-
tação telefônica, desde que após ordem judicial e nas hipóteses e na forma
que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução proces-
sual penal.

São, portanto, três os requisitos necessários para a violação das comuni-


cações telefônicas (interceptação telefônica):

 ordem judicial;

 somente para fins de investigação criminal ou instrução processual


penal;

 somente nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer.

A atuação do magistrado na autorização da interceptação telefônica é li-


mitada pela CF, haja vista que ele só pode autorizar a interceptação para fins
de investigação criminal ou instrução processual penal e, ainda assim, nas
estritas hipóteses e nos termos que a lei estabelecer.
7
Caso haja uma autorização judicial para interceptação telefônica para fins A teoria dos frutos da
árvore envenenada foi
de investigação administrativa (por exemplo no caso de um processo admi- criada pela Suprema Corte
dos Estados Unidos, que
nistrativo disciplinar ou fiscal), ela será inconstitucional, e a prova resultante fez uma analogia ao dizer
que da mesma forma
desta interceptação será ilícita (teoria dos frutos da árvore envenenada7). que os vícios da planta
são transmitidos aos seus
frutos, os vícios de uma
determinada prova conta-
minam as demais provas
que dela se originaram.

17
Direitos e deveres individuais e coletivos I

A regulamentação desse dispositivo foi feita pela Lei 9.296/96. Até a


edição dessa Lei, o STF considerou inconstitucionais todas as interceptações
telefônicas autorizadas pelos magistrados, e determinou a retirada dos autos
das provas obtidas por meio da medida, por serem provas ilícitas.

A Lei 9.296/96 veio legitimar a interceptação das comunicações telefôni-


cas como meio de prova, estendendo também a sua regulação à intercep-
tação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática
(e-mail etc.).

Liberdade de exercício
profissional (CF, art. 5.º, XIII)
A Constituição assegura a liberdade de exercício de qualquer trabalho,
ofício ou profissão, atendidas as qualificações que a lei estabelecer. Essa é
uma típica norma constitucional de eficácia contida, podendo a norma in-
fraconstitucional limitar seu alcance, fixando condições ou requisitos para o
pleno exercício da profissão.

Por exemplo, para exercer a profissão de médico existe uma norma jurídi-
ca que impõe os requisitos necessários para tanto, por exemplo ter concluído
a graduação, ter feito residência, estar inscrito no CRM etc., logo quem não
preencher os requisitos previstos na norma regulamentadora não poderá
exercer a profissão de médico. No caso da profissão de artesão não existe
qualquer exigência prevista em lei para o seu exercício, o que não impede
que no futuro venha a existir tal norma jurídica de modo a restringir o direito
ao livre exercício profissional.

Amplo acesso à informação (CF, art. 5.º, XIV)


Até o século XV, o mundo ocidental estava preso à monarquia absolutista
e às instituições feudais. Essa forma de governo se caracterizou pela concen-
tração total do poder nas mãos de um só indivíduo ou, excepcionalmente,
nas mãos de um grupo de indivíduos.

18
Direitos e deveres individuais e coletivos I

Nesse cenário, era difícil exercer qualquer tipo de liberdade, ainda mais a
de informação.

A igreja, juntamente com o soberano, destruía qualquer tipo de docu-


mento, livro ou informação que pudesse abalar os poderes absolutos.

Somente no século XVI foi possível o aparecimento dos primeiros jornais.


Com o passar do tempo, a importância da informação passou a ser reconhe-
cida e discutida em várias partes do mundo.

Em 1945, as Nações Unidas concluíram que a liberdade de intercâmbio de


ideias e a necessidade de desenvolver os meios de comunicação entre os povos
são essenciais à humanidade. Seguindo este posicionamento, editou uma re-
solução em que recepcionou a liberdade de informação como sendo um direi-
to fundamental do homem e a pedra de toque de todas as liberdades.

Outros textos como a declaração universal dos direitos humanos fizeram


o mesmo. O acesso à informação é o direito que todos têm de buscar as in-
formações, bem como o de procurar diretamente as fontes de informação
nas quais confia.

Dessa forma, o cidadão não pode ser impedido de se informar, e isto foi
assegurado pelo legislador constituinte, sendo vedado ao poder público in-
terferir nesse direito, exceto, é claro, nas matérias sigilosas previstas no artigo
5.º, XXXIII, parte final, da CF.

A este respeito, destaca-se o Decreto 4.553/2002, que regula o artigo 23


da Lei 8.159/91, que diz
Art. 23. Decreto fixará as categorias de sigilo que deverão ser obedecidas pelos órgãos
públicos na classificação dos documentos por eles produzidos.

§1.º Os documentos cuja divulgação ponha em risco a segurança da sociedade e do


Estado, bem como aqueles necessários ao resguardo da inviolabilidade da intimidade, da
vida privada, da honra e da imagem das pessoas são originariamente sigilosos.

§2.º O acesso aos documentos sigilosos referentes à segurança da sociedade e do Estado


será restrito por um prazo máximo de 30 (trinta) anos, a contar da data de sua produção,
podendo esse prazo ser prorrogado, por uma única vez, por igual período.

§3.º O acesso aos documentos sigilosos referente à honra e à imagem das pessoas será
restrito por um prazo máximo de 100 (cem) anos, a contar da sua data de produção.

19
Direitos e deveres individuais e coletivos I

Atividades de aplicação
Julgue as assertivas seguintes como certa ou errada.

1. (Cespe) O livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, des-


de que atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer, é
norma constitucional de eficácia contida; portanto, o legislador ordinário
atua para tornar exercitável o direito nela previsto.

2. (Cespe) Sendo os direitos fundamentais válidos tanto para as pessoas fí-


sicas quanto para as jurídicas, não há, na Constituição Federal de 1988
(CF), exemplo de garantia desses direitos que se destine exclusivamente
às pessoas físicas.

3. (Cespe) A dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos da Repúbli-


ca Federativa do Brasil, apresenta-se como direito de proteção individual
em relação ao Estado e aos demais indivíduos e como dever fundamental
de tratamento igualitário dos próprios semelhantes.

Dicas de estudo
 Use todo tempo disponível para estudar, tenha sempre o material im-
presso para usar no transporte, ao esperar em filas etc.

 Tenha uma Constituição Federal e leia todos os artigos relacionados à


matéria que pretende estudar repetidas vezes.

 Adote um bom livro de Direito Constitucional.

 Sempre inicie o estudo das disciplinas antes mesmo de ver as videoau-


las, desta forma ao assistir as videoaulas você já terá tido algum conta-
to com a matéria e elas serão muito mais produtivas.

 Acompanhe a jurisprudência, principalmente a do STF, e em especial


em questões polêmicas.

 Imediatamente após o estudo de cada tópico faça exercícios sobre o


tema estudado.

 Faça muitíssimos exercícios! Resolva todas as provas anteriores (conhe-


ça profundamente a banca examinadora e leia, atentamente, o edital).

20
Direitos e deveres individuais e coletivos I

 Abuse das marcações nos livros e use esquemas, planilhas e mapas


mentais. Utilize-se de processos mnemônicos. Tudo isso auxilia na
memorização.

 Ao rever a matéria, leia só as marcações e faça os exercícios que você já


assinalou antes. Faça isso, inclusive, na véspera da prova.

 Esteja ciente de que por melhor que sejam as videoaulas assistidas o


que garante a aprovação é a dedicação do aluno.

Boa sorte e sucesso!

Referências
MELLO FILHO, José Celso. Constituição Federal Anotada. 2. ed. São Paulo: Sarai-
va, 1986.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2009.

NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Método, 2009.

PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplica-


do. 4. ed. São Paulo: Método, 2009.

SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 7. ed. São
Paulo: Malheiros, 2007.

______. Curso de Direito Constitucional Positivo. 22. ed. São Paulo: Malheiros,
2003.

Gabarito
1. Errada. A primeira parte do enunciado está correta, pois o livre exercício de
qualquer trabalho, ofício ou profissão, desde que atendidas as qualificações
profissionais que a lei estabelecer, é norma constitucional de eficácia conti-
da. Mas ao concluir dizendo “portanto, o legislador ordinário atua para tor-
nar exercitável o direito nela previsto” o enunciado faz referência a uma nor-
ma de eficácia limitada. Quanto a este tema, cabe o seguinte registro: José
Afonso da Silva (2007) classificou as normas jurídicas constitucionais quanto

21
Direitos e deveres individuais e coletivos I

a sua eficácia em três modalidades que são: 1) Normas de eficácia plena –


produzem os seus plenos efeitos com a entrada em vigor da Constituição,
independentemente de qualquer regulamentação por lei. Portanto, são do-
tadas de aplicabilidade imediata (estão aptas a produzir efeitos imediata-
mente), direta (não dependem de qualquer norma regulamentadora para
produzir efeitos) e integral (produzem seus integrais efeitos). 2) Normas de
eficácia contida – também estão aptas a produzir seus plenos efeitos com a
promulgação da Constituição (aplicabilidade imediata), mas podem ser res-
tringidas. O direito nelas previsto é imediatamente exercitável, mas poderá
ser restringido no futuro. Além de serem dotadas de aplicabilidade imediata,
tem aplicabilidade direta (não dependem de norma regulamentadora para
produzir efeitos), mas não integral (porque estão sujeitas à imposição de res-
trições). As restrições às normas de eficácia contida podem ser impostas: i)
pela lei (art. 5.o, XIII, da Constituição, que prevê que restrições ao exercício de
trabalho, ofício ou profissão poderão ser impostas pela lei que estabelecer
as qualificações profissionais); ii) por outras normas constitucionais (art. 139
da CF, que estabelece restrições ao exercício de certos direitos fundamen-
tais, durante o período de estado de sítio); iii) por conceitos ético-jurídicos
geralmente aceitos (art. 5. º, XXV, da CF, no qual o conceito de “iminente
perigo público” atua como uma restrição imposta ao poder do Estado de
requisitar propriedade particular). 3) Normas de eficácia limitada são aque-
las que produzem seus plenos efeitos apenas depois de regulamentadas.
Elas asseguram um dado direito, mas esse não poderá ser plenamente exer-
cido enquanto não for regulamentado pelo legislador infraconstitucional.
Portanto, são dotadas de aplicabilidade mediata (só produzirão seus efeitos
essenciais depois da regulamentação por lei), indireta (dependem de norma
regulamentadora para produzir seus plenos efeitos) e reduzida (com a pro-
mulgação da Constituição possuem apenas eficácia “negativa”).

2 . Errada. Vários direitos fundamentais destinam-se tanto a pessoas físicas como


jurídicas, como a inviolabilidade da honra e da imagem. Entretanto, alguns
destinam-se exclusivamente a pessoas físicas, como a proteção contra a tor-
tura, tratamento desumano ou degradante ou a vedação à pena de morte.

3. Certa. A dignidade da pessoa humana é um fundamento da República


Federativa do Brasil (CF, art. 1.º, III). Tal fundamento gera desdobramen-
tos ao longo de toda a Constituição, manifestando-se de diversas formas,
entre elas, como proteção que o particular possui frente ao Estado e em
face, também, dos demais particulares. A dignidade da pessoa humana
também não se coaduna com tratamentos desiguais entre semelhantes.
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