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A virtude da ordem
12 de setembro de 2013 / PeFaus@1928
Para um cristão, que vive de fé e de amor, a vida está em ordem quando se encontra
em sintonia com a Vontade de Deus. Se não está em harmonia com o que Deus quer,
com o que Deus nos pede, a vida caminha fora dos trilhos, é uma “desordem”. Por isso,
com muita freqüência deveria sair do nosso coração a pergunta de São Paulo:
«Senhor, que queres que eu faça?» (Atos, 9,6).
Há muitas maneiras de formular essa pergunta. Talvez a mais básica seja a seguinte:
«Na fase atual da minha vida, o que é que Deus quer que eu coloque em primeiro
lugar, que ocupações ou deveres deveria organizar e garantir melhor, porque
precisam ter prioridade sobre as outras coisas? Será a dedicação à família? Ou o
aprofundamento no estudo pro ssional? Ou o tempo necessário para a formação
espiritual as obras de serviço ao próximo…?». É um assunto para meditar
sinceramente, com calma, até chegarmos a conclusões bem de nidas.
Quando, chegando a conclusões, já surge a luz, então é muito importante que ela
ilumine de fato “cada um” dos nossos dias e que, portanto, passemos a perguntar-nos:
«Hoje, que deveres ou tarefas deveriam ser prioritários para mim, quais são os que
Deus me pede que coloque em primeiro lugar? ».
É lógico que essa voz, essas “palavras” do Senhor, só poderão ser bem ouvidas se
soubermos recolher-nos em silêncio na presença de Deus para pensar sinceramente
na nossa vida, num clima de diálogo com Deus.
É importante, neste ponto, perceber que o fato de um dever ser prioritário não
signi ca, via de regra, que seja preciso dedicar-lhe a maior quantidade de tempo. Há
duas maneiras de dar prioridade a alguma obrigação, sem necessidade de prejudicar o
tempo exigido pelas outras ocupações que tomam a maior parte do dia:
Pensemos, em relação a isso, na facilidade com que empurramos para depois deveres
que certamente julgamos (mentalmente) primordiais. Temos consciência de que
alguma coisa é importante e não pode ser largada; mas iludimo-nos, dizendo: “Mais
tarde”; ou então: “Logo que me sobrar um pouco de tempo”. Infelizmente, esse tipo de
reações é freqüente quando se trata de deveres para com Deus: missa dominical,
oração, etc., ou de deveres relacionados com o serviço do próximo.
Falar nessas palavras – organização, plani cação – evoca de imediato, nos tempos
que correm, a frieza empresarial da produtividade e da e ciência. Parecem soluções
muito boas para a indústria e o comércio, e muito ruins para o coração.
Todos temos a experiência de que existe uma ordem que não é boa e que se poderia
chamar «defensiva» ou «bitolada»: é a da pessoa que organiza muito bem os seus
horários, mas não tolera que nada nem ninguém inter ra neles, e se alguém tenta, cai
sobre ela a ira do interrompido. Isso não passa da carapaça com que o egoísta se
protege. Bem sabemos que essa ordem pode tornar-se doentia e atingir requintes de
neurose, de mania.
A virtude da ordem, para o cristão, é outra coisa: é uma maneira de praticar melhor o
amor.
Se nos perguntássemos pelos traços mais essenciais do amor, com certeza todos nós
coincidiríamos em dois deles:
– primeiro: amar é querer bem, o que signi ca, por um lado, querer mesmo, querer de
verdade; e, por outro, querer fazer o bem e tornar feliz – ou agradar – a pessoa
amada;
Procuremos aplicar estas idéias, simples e transparentes, a dois exemplos vivos, que
ilustram o que é a ordem nascida do amor.
Um homem, por exemplo, está habituado a viver à margem do lar. Mulher e lhos
vêem chegar todas as noites um fugaz visitante cansado e mal-humorado, que só
deseja não ser incomodado. Chega tarde, não por necessidade, mas porque se
entretém desnecessariamente com o serviço, ou prolonga o expediente em conversas
de bar com os colegas.
Um belo dia sente a voz da consciência. Compreende que não está dando atenção
su ciente aos seus. E resolve fazer uma pequena modi cação importante: encerrar o
trabalho na hora certa e chegar a casa, no máximo, até tal hora, bem de nida, para
assim dedicar-se mais à família. Faz o propósito e o cumpre. Pois bem, este ato de
ordem é um ato de amor: porque quer sinceramente o bem dos outros, e concretiza o
modo de dar-se a si mesmo.
Vejamos um segundo exemplo: um estudante (um desses católicos “comuns”, que vai à
Missa “quando dá”) entende num dado momento a importância da conversa com
Deus, da oração. Como é possível – diz de si para si – amar a Deus e não falar com Ele,
não ter momentos de intimidade. Antes, pensava vagamente que a oração era uma
coisa boa, e estava disposto a fazê-la – como tantos outros – “quando tiver vontade”,
“quando sentir” … Agora, quer mesmo fazer oração, e reserva para isso um tempo
diário, num horário xo e determinado. Justamente porque “quer mesmo”, de ne um
horário que garanta esse seu querer. Com isto, já está começando a amar, e o seu
amor será mais completo quando se determinar a dar a Deus todos os dias, sem falta,
esse pedaço do seu tempo – uns minutos de oração –, sem car calculando se gosta ou
tem vontade, pensando só em agradar a Deus.
Como são traiçoeiras as faltas de ordem “inocentes”, essas “preguicinhas” que tanto
nos fazem sorrir. Parecem coisa de nada, e podem vir a ser coisa de muito. Um simples
atraso, um descuido, um adiamento escorado numa boa desculpa… são outros tantos
modos de fazer murchar as melhores resoluções e os mais belos ideais. Basta uma
“pequena preguiça” na hora de levantar, para que a oração ou a comunhão seja
abandonada, ou para que o trabalho seja enfrentado atabalhoadamente e sem garra.
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