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UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS


DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
NÚCLEO DE PSICOLOGIA APLICADA

Luiz Felipe Alves Ribeiro

ENFRENTAMENTO DE SI POR SI: Relatório de estágio obrigatório em


Psicologia Clínica (abordagem fenomenológico-existencial)

SÃO LUÍS-MA
2018
LUIZ FELIPE ALVES RIBEIRO

ENFRENTAMENTO DE SI POR SI: Relatório de estágio obrigatório em


Psicologia Clínica (abordagem fenomenológico-existencial)

Relatório de Estágio Obrigatório I do Curso de


Psicologia da Universidade Federal do Maranhão,
realizado no Núcleo de Psicologia Aplicada –
NPA, com duração de 360 horas. Supervisor
Técnico e Docente: Prof. Dr. Jadir Machado
Lessa.

São Luís
2018
1 APRESENTAÇÃO

O presente relatório tem como proposta descrever as vivências e experiências


do aluno estagiário Luiz Felipe Alves Ribeiro durante o seu estágio da graduação do
curso de Psicologia – UFMA, realizado na cadeira de Estágio Disciplinar Obrigatório
I.

1.1. Do campo de estágio

O Estágio Disciplinar Obrigatório I se deu dentro da própria Universidade


Federal do Maranhão - UFMA, no prédio do Centro de Ciências Humanas (CCH), nas
dependências do Núcleo de Psicologia Aplicada (NPA), a clínica escola.

1.2. Do estagiário

Minha escolha pelo estágio na clínica fenomenológica existencial se deu por


afinidade com a abordagem e a vontade de aprender mais sobre a análise existencial
heideggeriana com o Professor doutor Jadir Machado Lessa considerando sua vasta
experiência prática nesse assunto.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Os atendimentos realizados por mim no Estágio Disciplinar Obrigatório I


tiveram como fundamentação a análise existencial heideggeriana somadas a
noções de afetos trazidas por Spinoza/Nietzsche/ Deleuze.

Durante os atendimentos, tentei trazer a noção de que aquilo não era um


processo meu, enquanto terapeuta, quando o cliente trazia suas questões. Vi,
durante toda a prática, as aulas do professor Jadir sobre Heidegger perpassando
e guiando o que eu estava fazendo, no sentido que fui afetado por todas elas e
isso criou alguma mudança em mim. Tanto nesse ponto de que aquele não é
um processo meu e sim do outro, assim, tentei manter esse afastamento das
minhas questões com as questões do cliente, entendendo que ele é uma pessoa
diferente, com questões diferentes, valores diferentes e uma história totalmente
diferente da minha, que até então eu não tinha acesso, entendendo que existia
uma diferença muito grande e que aquilo ali não era um lugar para julgamentos
e imposições de minhas crenças e valores para a vida do cliente, até porque eu
não deveria me colocar num lugar de como se eu soubesse o que é melhor para
ele e, com isso, anular sua voz.

Tentei seguir as instruções dadas e fazer com que o cliente se sentisse


acolhido e não julgado, pois deve-se fazer com que ele perceba que ele tem uma
voz e uma vontade e que essas coisas devem ser respeitas. Assim, devemos
também buscar ter uma atitude muito mais compreensiva do que uma atitude
que busque explicações e buscar culpados para as coisas que são trazidas.

Cabe ressaltar que busquei fazer o que diziam os textos e as aulas e, a


partir da conversa, buscar compreender o que cliente trazia, através da
articulação de suas preocupações pessoais. Desse modo, busquei situá-las num
contexto, procurando compreender os significados pessoais e a importância que
o cliente atribuía a elas.

3 ATIVIDADES DESENVOLVIDAS

As atividades realizadas durante o Estágio Disciplinar Obrigatório I foram: os


atendimentos dos clientes e as supervisões feitas pelo professor Jadir, com a
presença de todos os estagiários.

3.1 Supervisões

As supervisões com o professor Jadir aconteceram todas as semanas, às


quintas-feiras, das 16 horas até as 19 horas, em uma das salas de supervisão do NPA.
Participavam dessas supervisões: Luiz Felipe, Ray Anderson, Francisco de Assis,
Matheus Padilha, Nicolau e Luanda Isna.

Todos os estagiários levavam informações sobre os atendimentos que tinham


realizado durante a semana, bem como dúvidas e suas questões que apareciam do
confronto com os próprios clientes.

3.2 Atendimentos

Tentei fazer cinco triagens. Dessas cinco, só pude realizar três, porque as
outras duas pessoas desistiram antes mesmo da entrevista de triagem. Uma justificou-
se dizendo que estaria viajando e só voltaria em janeiro; a outra não apresentou
justificativa.

Das três pessoas triadas por mim, continuei o atendimento de apenas 2 (duas),
um homem que aqui chamarei de Bruno e uma mulher que chamarei de Lílian.

Bruno relatou que fora abandonado pelos pais, que era carente
emocionalmente, e em suas relações amorosas sempre procurava ser maltratado e
desvalorizado e não mantinha as relações onde era valorizado.

Destaca-se que Bruno faltou no dia marcado para a entrevista de triagem,


remarcando-a para a semana posterior, tendo comparecido. Mais uma vez, na
semana de assinar o contrato, ele faltou sem avisar, assinando-o na semana seguinte,
ocasião em que ficou ciente de suas obrigações. Todavia, na semana posterior faltou
novamente sem avisar, comparecendo apenas uma vez depois de assinar o contrato.

Convém apontar que Bruno faltou outras vezes, mesmo sendo avisado que
seria encerrado seu atendimento como constava no contrato. O caso foi levado para
a supervisão e, por ordem do professor orientador, foi dado encerramento.

Por outro lado, Lilian, anteriormente já mencionada, teve atitude diferente, só


faltou uma vez, inclusive, avisando antes.
Lilian relatou sua frustração por não conseguir passar no vestibular, destacou
seu distanciamento em relação aos pais, disse se sentir sem rumo na vida e
inferiorizada, e mais, sentindo “burra”.
Os atendimentos foram feitos sempre se fazendo intervenções sobre suas
hipostasias sobre si mesma e sobre a vida. A cliente relatou mudanças em sua vida
desde que começaram as sessões.

4 CONCLUSÃO

O conceito mais importante que aprendi durante meu Estágio I foi que a clínica
era, na verdade, enfrentamento, tanto para pessoa do cliente quanto para a pessoa
do terapeuta. Pude comprovar isso na prática, quando observei certas reações dos
clientes e as minhas próprias.

Cabe destacar que para que haja terapia é preciso que haja o encontro entre
as pessoas e os afetos, e havendo esse encontro necessariamente há também o
enfrentamento, o que não necessariamente é algo ruim. A terapia precisa do conflito/
enfrentamento para ir adiante, uma vez que viver é conflitar-se com o mundo e
enfrentar as situações que a vida possibilita. Viver é uma luta pela autenticidade e
pela liberdade, luta essa que não se vence sem o enfrentamento.

A clínica é um encontro de si por si, na medida em que a pessoa se depara


com suas próprias questões e aqui não se fala somente do cliente, mas do próprio
psicólogo também, que lidando com o outro também lida consigo próprio,
possibilitando o que Foucault (2006) chamava de “ética do cuidado de si”, que é voltar-
se para si mesmo e debruçar-se sobre a própria vida.

Nesse sentido, é conflitar-se de si por si. “Uma relação da força consigo, um


poder de se afetar a si mesmo, um afeto de si por si”, nas palavras de Deleuze (2005).
Assim, a clínica possibilita esse encontro, esse confronto, esse enfrentamento que
muitas vezes postergamos porque o enfrentamento conosco mesmo pode ser
doloroso e também angustiante.

Quanto à prática de atender, de receber orientações pelo Professor Jadir e até


mesmo à disciplina como um todo, tenho plena certeza de que foram bem
enriquecedoras para a formação em Psicologia e para a minha própria formação como
pessoa, uma vez que todas as experiências de contatos com o outro tendem a nos
humanizar e possibilizar o enfrentamento de si por si e também do outro, assim como
de contribuir nesse processo de tornar-se autêntico.

Referências
DELEUZE, Gilles. Foucault. São Paulo: Brasiliense, 2005.

FOUCAULT, Michel. A Hermenêutica do Sujeito. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes.


2006.

HEIDEGGER, Martin. Ser e Tempo. 5ª ed. São Paulo: Editora Vozes. 2011.

LESSA, Jadir Machado. A clínica como exercício ético dos encontros afetivos.
Maranhão: EDUFMA. 2014.

LESSA, Jadir Machado. Solidão e Liberdade. Rio de Janeiro: SAEP. 2003.

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