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(Resumo para estudo, sem fins lucrativos ou de publicação científica).

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MORDIDA ABERTA ANTERIOR

Definição
A mordida aberta anterior é definida como a ausência de contato entre as
bordas incisais dos dentes superiores e inferiores, consistindo em uma
discrepância vertical. De modo geral, pode ser classificada em dentoalveolar ou
esquelética, conforme as estruturas envolvidas na má oclusão.

Etiologia
A mordida aberta anterior se desenvolve a partir de diversos fatores etiológicos,
como: respiração bucal (a obstrução nasal pode obrigar a língua a se manter
numa posição projetada para permitir a respiração pelo espaço orofaríngeo ao
invés de nasofaríngeo), hábitos bucais deletérios (sucção de polegar ou
chupeta), anquilose dentária e anormalidades no processo de irrupção.
Amígdalas hipertróficas também podem ser consideradas como um fator
etiológico da mordida aberta anterior. Com o posicionamento mais anterior da
língua, a mandíbula sofre uma rotação no sentido horário e isso faz com que os
dentes posteriores irrompam mais no sentido vertical, o que agrava a mordida
aberta.
A interposição lingual, ou pressionamento lingual atípico, encontra-se presente
em 100% dos casos com mordida aberta anterior. Essa interposição pode ser
classificada como primária, quando consiste na causa principal do
desenvolvimento da má oclusão, ou secundária, quando a língua apenas
adapta-se a uma alteração morfológica já existente, causada pela sucção de
dedos ou de chupeta. A interposição da língua durante a deglutição produz
uma inclinação para vestibular dos incisivos superiores e inferiores,
aumentando o comprimento do arco dentário, com conseqüentes
espaçamentos entre os incisivos. A mordida aberta causada por estas
condições caracteriza-se por um formato mais retangular ou difuso, incluindo
não só os incisivos, como também os caninos.
Portanto, para que o tratamento ortodôntico tenha um resultado satisfatório e
estável, uma abordagem multidisciplinar é necessária, pois não basta apenas a
correção do problema morfológico. Dentre os possíveis tratamentos auxiliares
pode-se citar a Psicologia, a Otorrinolaringologia e a Fonoaudiologia.
Importante lembrar que o padrão de crescimento facial do indivíduo e a
influência causada por hábitos deletérios podem ter papel relevante em
relação à etiologia dessa má oclusão.

Classificação
De modo geral, a mordida aberta anterior pode ser classificada, quanto a sua
etiologia, em dentária ou esquelética (figura 1).
Quanto ao grau de severidade, pode ser classificada em suave (quando há
uma distância de até 2mm da borda incisal), moderada (entre 2 e 4mm) e
severa (maior que 4mm).

1) Mordida aberta anterior dentária


Envolve dentes e processos alveolares, sem um comprometimento esquelético.
Está relacionada aos hábitos; os pacientes costumam apresentar um bom
padrão de crecimento facial.

2) Mordida aberta anterior esquelética


A morfologia da mordida aberta esquelética não se restringe somente à região
anterior. O trespasse vertical negativo se estende desde os dentes anteriores
até pré-molares e molares.
Pode ser caracterizada cefalometricamente por um grande ângulo do
plano mandibular, trespasse vertical anterior negativo, angulação mesial dos
dentes posteriores, divergência dos planos oclusais, arco superior atrésico,
ramo mandibular curto, aumento da AFAI, rotação do plano palatino no sentido
anti-horário, rotação da mandíbula no sentido horário e maior altura alveolar na
região posterior da maxila.

Diagnóstico/Planejamento
Para o planejamento da mecanoterapia a ser instituída durante o tratamento:
• Determinar os fatores etiológicos atuantes;
• Definir o grau de envolvimento dos componentes dentários e esqueléticos;
• Avaliar a quantidade da discrepância anteroposterior;
• Avaliar a quantidade de apinhamento, a vestibularização dos incisivos e a
convexidade do perfil do paciente;
• Analisar o possível grau de colaboração do paciente e entender o
contexo familiar em que ele está inserido, especialmente crianças: fator
psicológico diretamente relacionado a hábitos deletérios;
• Prever se os resultados que poderão ser alcançados com a terapêutica
não cirúrgica conseguirão suprir a expectativa do paciente em relação ao
tratamento.
Tratamento
Primeiramente, deve-se fazer um exame detalhado do paciente para elucidar
as possíveis causas relacionadas ao problema, isto é, o que de fato deve ser
tratado: um problema emocional, um distúrbio respiratório, uma alteração
funcional ou a combinação de todos esses fatores?
O tratamento da mordida aberta anterior nas dentaduras decídua e mista se
baseia na interrupção dos hábitos deletérios, permitindo o desenvolvimento
vertical dos dentes anteriores sem interferências. Quando a mordida aberta
está associada ao padrão de crescimento vertical do paciente, o controle da
dimensão vertical com aparelhos ortopédicos é recomendado (AEB tração alta,
por exemplo). Na dentadura decídua, antes dos cinco anos de idade, utiliza-se
apenas a estratégia de compensação, que consiste em trocar o hábito por um
brinquedo que a criança deseja. Após os cinco anos, na dentadura decídua e
na dentadura mista, utilizam-se a grade palatina ou os esporões linguais.
Obs: Antes dos 4 anos de idade, os hábitos de sucção exercem influência
emocional na criança e superam os prejuízos funcionais que acarretam. A partir
dos 5 anos, se não ocorrer a autocorreção, a má oclusão deve ser
interceptada.

A) Grades palatinas ou linguais


As grades palatinas ou linguais têm o objetivo de corrigir a mordida aberta
anterior, impedindo que a língua se posicione entre os dentes. Podem ser fixas
ou removíveis, dependendo da colaboração do paciente e, normalmente,
utilizadas em dentição decídua/mista.
É recomendável que sejam usadas até a obtenção de 2 a 3 mm de trespasse
vertical positivo e devem ser longas o suficiente para impedir a interposição
lingual (ATENÇÃO: por ser uma estrutura lisa pode permitir que a língua fique
apoiada nela, prejudicando o resultado).
Na presença de uma arcada superior atrésica, podemos usar a grade bipartida
associada a um expansor, fixo ou removível (figura 2).
Obs: Ao encaminhar para a Fono, verificar a necessidade de remover a grade
para que o profissional possa trabalhar.

Figura 2: Haas com grade palatina

B) Esporão
As pontas ativas ou esporões forçam uma mudança na posição de repouso da
língua, permitindo a erupção dos dentes e a correção da mordida aberta
anterior. Podem ser usados também no tratamento de sucção digital crônica e
em casos cirúrgicos, modificando a postura e função lingual, minimizando as
recidivas.
Em comparação com a grade palatina, parecem proporcionar maior
estabilidade pós tratamento, porque causam uma percepção sensional pelo
cérebro, mudando de forma permanente a posição da língua.

C) Bite Block
Aparelho ortodôntico funcional (figura 3) usado para diminuir a mordida aberta
anterior associada à altura ântero-inferior da face excessiva.
A correção ocorre pela interrupção da erupção dentária na região posterior e
extrusão dos incisivos superiores e inferiores, ocasionando rotação para cima e
para frente da mandíbula ou uma direção de crescimento mandibular mais
horizontal.
Sua espessura geralmente excede o espaço livre de 3 a 4 mm; pode-se
associar grade ou molas digitais no aparelho para a correção de hábito de
interposição lingual, hábitos de sucção e para o reposicionamento de um ou
mais dentes individuais. No caso de ser removível, o paciente deve usar por,
pelo menos, 12 horas por dia.

Figura 3: Bite Block

D) Posicionamento diferenciado dos acessórios ortodônticos


Alguns detalhes no posicionamento dos acessórios nos dentes anteriores
podem ajudar na correção da mordida aberta, realizando-se a colagem dos
acessórios mais para a cervical nesses dentes. Automaticamente, ao ser
iniciada a fase de alinhamento e nivelamento, os dentes anteriores sofrerão
maior extrusão que os posteriores, permitindo assim o fechamento mais
eficiente do trespasse vertical negativo nessa região. Além disso, o
deslocamento do posicionamento dos acessórios mais para a cervical tende
a aumentar o torque lingual dos dentes anteriores quando inseridos arcos
retangulares.
Obs: A inclusão dos segundos molares superiores deve ser cuidadosamente
avaliada, pois estes já apresentam irrompimento com angulação distal de
coroa e a colagem do acessório nesse dente poderá provocar sua
extrusão, gerando um contato prematuro, o que levaria ao aumento da
mordida aberta na região anterior.

E) Elásticos anteriores
É fundamental ressaltar que se a mordida aberta é esquelética, os incisivos já
se encontram extruídos devido a uma compensação dentária que ocorre.
Dessa forma, na maioria das vezes, os vetores predominantemente verticais
gerados por este tipo de elástico contra-indicariam o seu uso.
Na literatura, há recomendação para uso de elástico 3/8M, com 150-200g de
força de cada lado (figura 4).
Quanto a rebsorção radicular apical externa, o uso de elásticos intermaxilares
apresenta resultados controversos. Acredita-se que, se usados por mais de 6
meses, seria um fator de risco para desenvolvimento de reabsorção. Para
tanto, uma pausa de 2 a 3 meses durante o tratamento ortodôntico pode
favorecer o processo de cicatrização do cemento desses dentes.
Obs: Se o paciente apresenta um sorriso gengival, o uso de elásticos
anteriores exije atenção redobrada, pois a extrusão dos incisivos pode piorar a
estética.

Figura 4: Elásticos anteriores (Dra Glice Reis)

F) Intrusão de dentes posteriores


A literatura apresenta alguns trabalhos nos quais o tratamento da mordida
aberta anterior foi realizado por meio da intrusão dos dentes posteriores
com miniimplantes (figura 5) e miniplacas. Esse procedimento deve ser
indicado por meio da avaliação da exposição dos incisivos superiores no
sorriso.
Existem grandes vantagens da mecânica de intrusão de dentes posteriores
em relação à extrusão dos incisivos, principalmente quando os últimos
apresentam raízes curtas ou com reabsorção ou quando a sua extrusão
excessiva promoverá estética desfavorável na região anterior. Com a intrusão
dos dentes posteriores por meio da ancoragem absoluta há uma tendência de
ocorrer a rotação da mandíbula no sentido anti-horário, com redução da altura
facial anteroinferior e consequente projeção do mento.
Essa intrusão também pode ser feita com o uso de levantes em resina nos
primeiros e segundos molares superiores, que funcionarão como bite block
(dica do professor Helio Venancio).

Figura 5: Intrusão com miniimplantes

E) Extrações
Algumas características devem ser consideradas para a indicação das
extrações dentárias no tratamento da mordida aberta anterior: discrepância no
sentido anteroposterior (Classes I, II e III), severidade da discrepância negativa
de modelo (apinhamento), quantidade de protrusão dos incisivos e grau
de convexidade do perfil do paciente. Deve-se ter cautela no plano de
tratamento de pacientes que apresentam pouca quantidade de
apinhamento, incisivos verticalizados em relação ao plano oclusal e perfil
facial reto. Extrações dentárias nesses pacientes podem causar a retração
dos lábios durante a mecânica de fechamento dos espaços das extrações e
consequente achatamento do perfil.

F) Ortognática
Em casos que há maior envolvimento de componentes esqueléticos, somente
as compensações dentárias podem ser insuficientes para a correção da
mordida aberta. Nestes casos, geralmente é necessário associar a cirurgia
ortognática ao tratamento ortodôntico, impactando a maxila e permitindo a
rotação mandibular, o que diminui consideravelmente a altura facial anterior.

Contenção
Alguns exemplos de aparelhos que podem servir de contenções ativas
para aumentar a estabilidade dos resultados do tratamento compensatório da
mordida aberta anterior no paciente adulto são: placa de Hawley associada ao
Bite-Block posterior, placa de Hawley com um furo na altura da papila do
forame incisivo (ação recordatória) ou ainda a manutenção dos esporões
colados nos incisivos, além da instituição da terapia miofuncional para
equilibrar as forças musculares da boca (figura 6).
Figura 6: Contenções ativas.
Referências:

Artigos:
R Clin Ortodon Dental Press, Maringá, v. 3, n. 3 - mar/abr. 1998.
American Journal of Orthodontics and Dentofacial Orthopedics September 2003.
R Clin Ortodon Dental Press, Maringá, v. 5, n. 1 - fev./mar. 2006.
Rev. Clín. Ortodon. Dental Press, Maringá, v. 8, n. 3 - jun./jul. 2009.
Orthod. Sci. Pract. 2014; 7(27):252-270.
Rev. Bras. Odontol., Rio de Janeiro, v. 74, n. 2, p. 138-42, abr./jun. 2017.
RFAIPE, v. 7, n. 2, p. 58-65, jul./dez. 2017.
Alterações verticais: análise e tratamento: Alexander Macedo apresenta casos e
argumentos expostos por Fabrício Valarelli e Guilherme Janson para os tratamentos
das alterações verticais, 2018. Acesso: www.ortociencia.com.br/Materia/Index/144107.

Livros:
Ortodontia preventiva e interceptora: mito ou realidade? (Renato Rodrigues de Almeida).
Livro Ortodontia Interceptiva: Protocolo de Tratamento em Duas Fases (Daniela
Gamba Garib, Omar Gabriel da Silva Filho e Tulio Silva Lara).
Ortodontia Preventiva, diagnóstico e tratamento (Jorge Abrão, Alexandre Moro,
Ricardo Fidos Horliana, Roberto Hideo Shimizu).

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