Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Ae Pal12 Teste5 2019 PDF
Ae Pal12 Teste5 2019 PDF
Educação Literária
A (48 pontos)
Lê atentamente o seguinte texto.
Ricardo Reis para diante da estátua de Eça de Queirós, ou Queiroz, por cabal respeito da
ortografia que o dono do nome usou, ai como podem ser diferentes as maneiras de
escrever, e o nome ainda é o menos, assombroso é falarem estes a mesma língua e serem,
um Reis, o outro, Eça, provavelmente a língua é que vai escolhendo os escritores de que
5 precisa, serve-se deles para que exprimam uma parte pequena do que é, quando a língua
tiver dito tudo, e calado, sempre quero ver como iremos nós viver. Já as primeiras
dificuldades começam a surgir, ou não serão ainda dificuldades, antes diferentes e
questionadoras camadas do sentido, sedimentos removidos, novas cristalizações, por
exemplo, Sobre a nudez forte da verdade o manto diáfano da fantasia, parece clara a
10 sentença, clara, fechada e conclusa, uma criança será capaz de perceber e ir ao exame
repetir sem se enganar, mas essa mesma criança perceberia e repetiria com igual
convicção um novo dito, Sobre a nudez forte da fantasia o manto diáfano da verdade, e
este dito, sim, dá muito mais que pensar, e saborosamente imaginar, sólida e nua a
fantasia, diáfana apenas a verdade, se as sentenças viradas do avesso passarem a ser leis,
15 que mundo faremos com elas, milagre é não endoidecerem os homens de cada vez que
abrem a boca para falar. É instrutivo o passeio, ainda agora contemplamos o Eça e já
podemos observar o Camões, a este não se lembraram de pôr-lhe versos no pedestal, e se
um pusessem qual poriam, Aqui, com grave dor, com triste acento, o melhor é deixar o
pobre amargurado, subir o que falta da rua, da Misericórdia que já foi do Mundo,
20 infelizmente não se pode ter tudo nem ao mesmo tempo, ou mundo ou misericórdia. (…)
Ricardo Reis atravessou o Bairro Alto, descendo pela Rua do norte chegou ao Camões, era
como se estivesse dentro de um labirinto que o conduzisse sempre ao mesmo lugar, a este
bronze afidalgado e espadachim, espécie de D’Artagnan premiado com uma coroa de
louros por ter subtraído, no último momento, os diamantes da rainha às maquinações do
25 cardeal, a quem, aliás, variando os tempos e as políticas, ainda acabará por servir, mas este
aqui, se por estar morto não pode voltar a alistar-se, seria bom que soubesse que dele se
servem, à vez ou em confusão, os principais, cardeais incluídos, assim lhes aproveite a
conveniência.
José Saramago, O Ano da Morte de Ricardo Reis, Lisboa: Caminho, 1984, pp. 66-77.
1
PALAVRAS 12
C (16 pontos)
2
PALAVRAS 12
A Gorda
A maior qualidade do escritor será saber do que fala. Do que escreve. Se recorreu à
imaginação, à experiência ou à observação, se se alimentou vampirescamente da realidade
ou se mergulhou em apneia o inconsciente, o método é irrelevante, o que conta é o
resultado, e o resultado depende sempre do conhecimento do objeto – da sua “visão real”,
5 para roubar uma expressão a Virginia Wolf. A segunda maior qualidade do escritor talvez
seja a coragem. Não a coragem física, mas sem dúvida a emocional e intelectual. A escrita
mole, autocomplacente, cheia de sentimentos nobres e mensagens piedosas é de tal modo
falha e mesmo contrária à vida que nada mais merece do que um bocejo. Sem coragem
nunca teriam existido Bovary, Lolita, Catherine Earnshaw ou Maina Mendes, personagem
10
do livro homónimo de Maria Velho da Costa.
A Gorda é o segundo livro de ficção de Isabela Figueiredo, que assinou também
Cadernos de Memórias Coloniais, relato autobiográfico do seu adeus a África.
Apresentando-se como um romance (e como as classificações por género se podem ter
tornado supérfluas ou mesmo obsoletas), abre com uma advertência “Todas as
15 personagens, geografias e situações descritas são mera ficção e pura realidade”. De facto,
entre Maria Luísa, narradora e protagonista, e Isabela Figueiredo, a sua criadora – sabemo-
lo por ter lido Cadernos de Memórias Coloniais – existem afinidades: ambas nasceram em
Moçambique, são professoras, vivem na Outra Banda e podem ser consideradas “mulheres
fortes”. (…)
20 Confesso: em A Gorda, a história de amor, stricto sensu, é o que menos me faz vibrar.
De resto, percebe-se a recusa de floreados estilísticos (embora certas passagens pedissem
mais virtuosismo), aplaude-se a linguagem crua do erotismo e a estratégia de utilizar a
Casa (prolongamento do corpo?) como estrutura orgânica que permite à narrativa fluir não
temporalmente mas emocionalmente. Em resumo: uma lufada de ar fresco na escrita no
25 feminino. Não por acaso falei de Maria Velho da Costa.
2. A autora do texto
(A) destaca o percurso biográfico de Isabela Figueiredo.
(B) reflete criticamente sobre a obra de Isabela Figueiredo.
(C) aprecia criticamente a literatura portuguesa no feminino.
(D) analisa as qualidades do escritor.
3
PALAVRAS 12
3. A Gorda assume-se
(A) como um romance puramente ficcional.
(B) como um texto de memórias.
(C) como um romance amoroso.
(D) como um romance entre a ficção e a realidade.
4. O uso dos dois pontos nos segundo e terceiro parágrafos introduzem, respetivamente
(A) uma enumeração, uma explicação e uma enumeração.
(B) uma enumeração e duas explicações.
(C) uma explicação, uma enumeração e uma fala no discurso direto.
(D) uma explicação e duas falas no discurso direto.
Bom trabalho!