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0501 D Adquirido Moreira
0501 D Adquirido Moreira
Excelentíssimo Sr. Doutor Othon, que é o Diretor do Centro de Estudos, demais integrantes
dessa mesa, minhas senhoras e meus senhores. É com muito prazer e honra que recebi o
convite de vir aqui hoje para dizer algumas palavras sobre um instituto que nos atormenta
bastante a todos nós, que é o instituto do Direito Adquirido.
Eu, quando trato dessa matéria, geralmente começo a examinar as diferentes modalidades
de retroatividade. Em seguida, faço uma análise dos dois sistemas que existem no mundo
com relação ao problema do direito intertemporal em face do respeito do direito adquirido,
o sistema legal e o sistema constitucional.
Em seguida faço uma análise das duas posições doutrinárias a respeito do direito adquirido,
a posição objetiva em que se salienta com o mais renomeado de seus autores, Roubier na
França, e a chamada concepção, ou teoria, subjetiva que tem como o seu mais notável
intérprete o italiano Gabba. E finalmente procuro fazer uma análise com relação ao Direito
Adquirido em face da Constituição e portanto dos poderes constituintes originário e
derivado. E com isso parece-me que há um quadro, embora não perfeito nem completo,
mas um quadro que abarque os principais aspectos desse tema.
Entre os exemplos históricos que são citados, os mais evidentes são um do séc. XII d.C., e
atribui-se ao Papa Alexandre III um cânon (de Direito Canônico) que naquela época tinha
aplicação em toda a cristandade no sentido de que todos os contratos usurários, e aqui a
usura era tomada em sentido canônico e não no sentido romano (sabem os senhores que
em sentido romano a usura é a percepção de juros acima da taxa legal. Já pela concepção
canônica não. Pela concepção canônica, qualquer tipo de juros que decorra de empréstimo
de capital era proibido. E portanto, negócio usurário era negócio que dava margem a
percepção de juros sobre o capital.).
Pois bem, Alexandre III, um Cânon que ficou célebre, determinou que os contratos
usurários, com relação aos juros, fossem considerados nulos, e os juros já percebidos
fossem devolvidos ao devedor, se esse não mais existisse, aos seus herdeiros, e se não
houvessem herdeiros, aos mendigos do local onde o contrato tinha sido celebrado.
Um outro exemplo também histórico e bem mais recente é o da Revolução Francesa em que
uma lei de 1793, depois de fazer a equiparação, para efeito de herança, entre filhos
legítimos e ilegítimos, determinou que todas as partilhas que já tivessem produzido seus
efeitos, seriam desconstituídas para a conseqüência de se admitir que os filhos ilegítimos a
ela pudessem concorrer, e conseqüentemente receber o seu quinhão.
Vejam os senhores que aí nós estamos diante de casos de retroatividade máxima, tendo em
vista a circunstância de que se desconstitui, no passado, fatos ou atos já consumados e
cujos efeitos também já se extinguiram no passado.
Nós, no Brasil, temos um exemplo histórico, que é o exemplo da Constituição de 1937 que
permitia que o Presidente da República, por Decreto-Lei, pudesse desconstituir coisa julgada
pelo Supremo Tribunal Federal quando não concordasse com ela. E nós tivemos um
exemplo com relação ao Imposto de Renda em que uma decisão do Supremo Tribunal
Federal foi desconstituída por um decreto do então Presidente da República. Também aí
estávamos diante de um exemplo de retroatividade máxima, alcançando ato já consumado
no passado e os seus efeitos também consumados no passado.
Então vejam os senhores que nós temos, quanto à intensidade, esses três graus de
retroatividade, a máxima, a média e a mínima.
Por outro lado, quando se examina o problema do direito intertemporal, nós verificamos que
ele se assenta nos diferentes países em dois tipos de sistemas: um sistema legal e um
sistema constitucional. Este é o nosso. E é importante nós fazermos esta distinção e
examinarmos este aspecto porque no sistema constitucional por vezes se pretende a
aplicação de princípios que são compatíveis com o sistema legal, porém incompatíveis com
o sistema constitucional. Assim, no sistema legal, nós temos que há uma lei ordinária que
estabelece que as leis não podem retroagir, não podem, portanto, ser aplicados a fatos
passados ou a efeitos futuros de fatos passados.
Essa norma é uma norma de legislação ordinária. Conseqüentemente, ela não obriga o
legislador, mas obriga apenas o juiz, porque o legislador, por lei especial, se ele entender
que deve dar retroatividade mínima, média ou até máxima a uma determinada lei, que ele
entende que deva ser aplicada para o passado, ele poderá fazê-lo sem revogar a lei geral
que estabelece que o princípio vigorante é o princípio da irretroatividade. Por quê? Porque
se tratará de uma lei especial em face de uma lei geral, e como todos nós sabemos a lei
especial não revoga a lei geral, mas apenas é tratada como uma exceção a essa lei geral.
Conseqüentemente o legislador está de mãos livres para dar efeito retroativo à lei que
quiser, sempre tendo em vista essa circunstância de que se tratará, no caso em que ele der
essa retroatividade, se tratará de uma norma especial que será retroativa apenas para os
casos em que ela for aplicada.
Mas, com relação ao juiz não. O juiz está sujeito à observância daquela norma geral que
declara que as leis não devem retroagir. Sendo que, neste sistema, em que o juiz, esse sim
está vinculado ao princípio geral, nesses sistemas é que surge o problema mais intenso das
chamadas leis interpretativas e das denominadas leis de ordem pública.
Com relação às leis interpretativas, o que sucede é que, em geral se diz que essas leis são
leis que não modificam nada com relação à lei anterior, pois apenas elas vêm dar a
interpretação, que é a interpretação exata da lei anterior. Isso, em matéria de sistema
legal, não tem grande relevo. Terá grande relevo, como nós vamos ver, com relação ao
sistema constitucional, que não admite constitucionalmente, e portanto por um princípio
hierárquico superior, não admite que haja a retroatividade. E aí surge a questão de saber se
a lei interpretativa realmente não modifica em nada a lei anterior, ou se ela apresenta uma
modificação. É muito difícil sustentar que ela não altere em nada a lei anterior, porque
evidentemente, só são editadas leis interpretativas, a chamada interpretação autêntica,
quando o próprio legislador reconhece que a lei por ele editada anteriormente é uma lei que
da margem à controvérsia no terreno da interpretação.
E se essa controvérsia for importante, for relevante, vem o legislador e diz: a interpretação
correta é esta. Ora, com isso, de certa forma, ele acrescenta algo de novo àquela lei
anterior, tendo em vista a circunstância de que, pelo conteúdo significativo dela, eram
admissíveis mais interpretações do que apenas aquela que posteriormente veio o legislador
e é a interpretação que deve ser dada a essa lei anterior. Conseqüentemente com isso se
suprime uma parte do conteúdo significativo dessa norma, considerando-se que as outras
interpretações que não aquela que fora adotado pela lei interpretativa, pela interpretação
autêntica, as outras não mais podem ser adotadas justamente porque ferirão a lei
interpretativa. E aí então se pergunta: com isso não houve uma alteração na lei anterior, e
conseqüentemente não é uma lei nova, que dá um sentido, não novo, mas pelo menos um
sentido único àquela norma anterior que podia ter mais de um sentido, e portanto poderia
ser interpretada diferentemente daquela interpretação que o legislador deu?
Então vejam os senhores que no sistema legal, o que se entende é que as chamadas leis
interpretativas, e o são todas aquelas em que o legislador diz que são interpretativas, o
juiz, ele poderá aplicá-las inclusive para o passado, tendo em vista a circunstância de que
se parte, nesse sistema, da premissa de que a lei interpretativa não introduziu alteração na
anterior. O que ocorria anteriormente é que havia interpretações errôneas, e não aquela
interpretação que o legislador considerou como a correta e conseqüentemente aquela
interpretação que deveria ter sido dada desde o início à lei sem aquela controvérsia. E com
isso o juiz, ainda que a lei interpretativa não diga que se aplica ao passado, ele pode aplicá-
la ao passado porque não haveria propriamente retroatividade. O que haveria seria apenas
a declaração daquilo que já era, e conseqüentemente nada de novo ao que anteriormente
existia.
E o problema também se coloca com relação às chamadas leis de ordem pública. E aqui
ainda com mais relevo porque muitas vezes no sistema como o nosso que é o sistema
constitucional se tem invocado lei de ordem pública para dar efeito retroativo a ela. Isso já
ocorreu com uma certa freqüência inclusive com uma grande maioria dos tribunais
brasileiros. Até mesmo o Superior Tribunal de Justiça, durante muito tempo, se pautou na
orientação de que lei de ordem pública pode ter eficácia retroativa mínima e
conseqüentemente se aplica de imediato.
Mas o que é certo é que a grande maioria da doutrina e da jurisprudência nesses países
admite que nesses casos o juiz possa aplicar essas leis de ordem pública dando-lhe
retroatividade mínima, e por isso é que, por vezes, como aconteceu no Brasil e ainda vez
por outra acontece, ainda se invoca esse posicionamento com relação às leis de ordem
pública embora a Constituição não faça diferença entre lei de ordem pública e lei que não é
de ordem pública uma vez que estabelece que a lei nova, qualquer que seja não poderá
prejudicar o ato jurídico perfeito e o direito adquirido e a coisa julgada.
O sistema constitucional, como eu já disse, é adotado apenas por alguns países, inclusive o
nosso. E, aqui no Brasil, é, justamente, um sistema que dá margem a problemas sérios
tendo em vista a circunstância de que hoje principalmente, sendo o princípio da
irretroatividade uma cláusula das denominadas cláusulas pétreas que os alemães preferem
falar em garantias de perenidade, nós acrescentamos aos problemas já existentes um
problema a mais que, é justamente este, o de que este princípio é uma cláusula pétrea. E
com isso, os problemas que surgem são justamente os de que há uma disponibilidade
praticamente mínima de se dar efeito retroativo a uma norma jurídica. Essa disponibilidade
decorreria, como nós vamos ver, praticamente, do poder constituinte originário. Porque este
sim, pode estabelecer princípios com a determinação de que eles tenham retroatividade
máxima, média e mínima, como nós vamos ver, inclusive, sem estabelecer princípio algum
que vigore em matéria constitucional, é que a Constituição se aplica de imediato ainda que
alcance os efeitos futuros de fatos passados.
Mas o que é certo é que esse sistema, que para nós é fundamental porque infelizmente nós
temos uma série enorme de leis que ou são retroativas por si mesmas, por conterem
dispositivos que determinam a sua retroação, ou são aplicadas retroativamente, uma
grande massa das questões que chegam ao STF são justamente decorrentes desse
problema de direito adquirido por causa da sua sede constitucional - o que é certo é que se
também não tivesse sede constitucional seria uma tragédia nos países do sistema legal as
leis a que se da efeito retroativo são relativamente raras, e aqui no Brasil, apesar do
princípio constitucional, o que sucede é exatamente o contrário. Daí a razão pela qual uma
multidão de questões surge a todo momento com referencia a este problema de direito
intertemporal no que diz respeito a ato jurídico perfeito, de direito adquirido e coisa julgada.
Nesse sistema constitucional, que é o nosso, nós temos um princípio que normalmente se
diz o princípio da irretroatividade. Mas na realidade, pelo menos na aparência, o princípio é
justamente o inverso. É o Princípio da Retroatividade, porque diz a Constituição que a lei
nova não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito, e a coisa julgada. O que
implica dizer que, não havendo um desses três freios, é possível ser retroativa a lei.
Sucede, no entanto, que os casos que não estão abarcados por essas três figuras são em
muito menor número do que os casos que estão abarcados por ela. E se pergunta porque
isso? Por uma razão até bastante singela: é que os conceitos de ato jurídico perfeito, e de
coisa julgada são conceitos singelos, não há dúvida alguma de que ato jurídico perfeito é
aquele cuja celebração , portanto, cujo aperfeiçoamento já se deu no passado. E a coisa
julgada é a decisão judicial da qual não cabe mais recurso.
Por isso mesmo que há alguns recursos extraordinários em que se diz que essa lei não foi
cumprida e portanto esse direito que se tem como existente não existe. E com isso não há
direito adquirido, e com isso há a violação do art. 5º, XXXVI da Constituição.
Ora, aqui evidentemente o que há é negativa de vigência ou não aplicação de norma legal.
Não tem nada que ver com o art. 5º, XXXVI da Constituição que diz respeito a direito
adquirido, mas o direito adquirido na sua concepção para efeito de direito intertemporal, ou
seja, para efeito da verificação de que, realmente, um direito foi adquirido em face da lei
antiga e de alguma forma é alterado ou violado em virtude da lei nova. E mais ainda, não
basta apenas dizer que se trata de um direito que se adquiriu. É preciso que se vá um
pouco além. Daí a razão pela qual, quando nós consideramos o conceito de direito adquirido
em face de um direito intertemporal, em geral nos socorremos da definição que dá Gabba,
que é o grande autor sobre direito intertemporal, cuja complexidade é tamanha que apesar
de ter escrito quatro volumes a respeito, todas as vezes que nós temos um problema mais
grave, lemos os quatro volumes e não encontramos solução.
Pois bem, mas o que é certo é que ele tem aquele conceito clássico de que direito adquirido
é aquele direito que passa a integrar o nosso patrimônio desde o momento em que se
preencham todos os requisitos exigidos pela lei para que surja esse direito que se integra ao
nosso patrimônio.
Mas aí surge a pergunta o que se entende nesse conceito, o que se deve entender por
integrar o nosso patrimônio, incluir-se no nosso patrimônio? Por que se se der à expressão
patrimônio um significado exclusivamente econômico, e portanto avaliado em dinheiro, nós
teremos que em situações como por exemplo o problema de capacidade de fato, não
haveria direito adquirido, é o fato de uma lei anterior declarar que aos 18 anos todos são
capazes de fato e vem uma lei posterior e diz que não, só aos 21 e aí se pergunta: aqueles
que já eram capazes de fato que tinham 18 anos em face da lei antiga mas quando entrou
em vigor a lei nova eles têm 19 anos e portanto ainda não alcançaram 21, eles deixam de
ser capazes? E aí se pergunta qual desses três conceitos - ato jurídico perfeito, coisa
julgada e direito adquirido - se aplica e aí os senhores vêem que em rigor não ocorre
nenhum deles, salvo se se entender que também no ato jurídico perfeito, os fatos jurídicos
perfeitos são também imunes à retroatividade, e aqui nós teríamos um fato. Mas aí se tem
objeção se tem que capacidade não é problema de fato, capacidade é um aspecto da
personalidade, e conseqüentemente não é propriamente um fato. Apenas se adquire com
um fato que é a ocorrência de determinada idade, quando se trata do problema da
capacidade em face da idade.
E aí os problemas surgem, são os problemas vários com várias figuras jurídicas que não se
enquadram exatamente na figura do direito subjetivo que se adquiriu com o preenchimento
de todos os requisitos da lei. Então, têm os senhores que nesse nosso sistema
constitucional nós temos esses três conceitos como freios para impossibilitar a
retroatividade, o que implica dizer que há casos em que é possível haver essa retroatividade
sem ser considerada retroatividade, ou seja, é possível haver a aplicação dessa norma a
fatos anteriores desconstituindo-os sem que se viole o principio da retroatividade porque se
entende que, nesses casos, já que não há ato jurídico perfeito, direito adquirido e nem coisa
julgada, então não há nenhum daqueles freios que impossibilitem a aplicação para trás da
lei nova.
É o que ocorre com as chamadas expectativas de direito, que são justamente aquelas
situações em que os requisitos exigidos pela lei para que se adquira o direito, esses
requisitos ainda não foram totalmente preenchidos. O exemplo clássico é o exemplo do
funcionário público, que, quando ingressa no funcionalismo público, ele ingressa com a
expectativa de no fim de 35 anos se homem e 30 anos se mulher, aposentar-se. E se
sucede que se ele aos 29 anos, caso seja mulher, ou aos 34 anos caso homem, ele tiver
aquela expectativa e a lei garantir aquilo no momento em que ele adquira aquele direito da
aposentadoria, se no entanto vier uma lei nessa época que se modifica e diga que só se
pode aposentar aos 40 anos de serviço público, então nesse caso aquelas pessoas que
tinham aquela expectativa e que ainda não adquiriram o direito porque não preencheram
ainda o requisito dos 35 anos completos, neste caso, estão sujeitos à necessidade de
observância da lei nova e só poderão requerer a sua aposentadoria facultativa aos 40 anos
de serviço público.
Já aqueles que já preencheram esse requisito, entendeu o Supremo Tribunal Federal que
independentemente de requerimento eles já haviam adquirido o direito à aposentadoria e
conseqüentemente poderiam aposentar-se com base justamente na impossibilidade da lei
nova ser aplicada a eles para que não ocorresse o ferimento de um direito adquirido. Então
vejam os senhores que esse conceito de direito adquirido para efeito de direito
intertemporal é um conceito que se nós examinarmos mais de perto em face de outros dois
- o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, nós vamos chegar à conclusão de que, na
realidade, os três poderiam estar compendiados em um só, ou seja, tanto do ato jurídico
perfeito quanto da coisa julgada decorreriam necessariamente o direito adquirido.
Conseqüentemente não haveria em rigor necessidade de valermo-nos desses outros dois
conceitos. Mas a pergunta que se faz é porque isso? A resposta talvez seja uma resposta
pragmática, mas eu nunca encontrei outra.
É que nos conceitos de ato jurídico perfeito e coisa julgada são conceitos singelos a respeito
dos quais não há maior discussão, ao passo que o conceito de direito adquirido é um
conceito bastante controvertido ou pelo menos um conceito cujo conteúdo ainda é bastante
controvertido, e, conseqüentemente, dá margem a muitos problemas. Por isso mesmo é
que os senhores verificam que toda vez que nós podemos lançar mão do ato jurídico
perfeito e da coisa julgada, ninguém vai lançar mão do direito adquirido.
Mas, na realidade, do ato jurídico perfeito, dele decorre o que? Decorre a aquisição de um
direito resultante do aperfeiçoamento daquele ato. Conseqüentemente, de um contrato
decorre os direitos resultados do fato de aquele contrato já se ter aperfeiçoado com a sua
celebração já consumada. E o mesmo com referência à coisa julgada.
Isso é importante porque a nossa Constituição deu margem a um problema que decorre do
art. 17, do ADCT. Problema esse que foi agravado com o art. 29 da Emenda Constitucional
nº 20 de 1998. Com relação ao art. 17 do ADCT, diz a Constituição que os efeitos da
remuneração, das vantagens e dos adicionais, bem como dos proventos de aposentadoria
que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição, serão imediatamente
reduzidos aos limites dela decorrentes não se admitindo, neste caso, invocação de direito
adquirido ou percepção de excesso a qualquer título. E a pergunta que se faz é a seguinte:
por que se colocou isso aqui? Porque, como vamos ver mais adiante, sempre se considerou
que a Constituição tem aplicação imediata. Principalmente em se tratando, apesar de
cláusula pétrea, porque o constituinte originário não está submetido a cláusula pétrea, que
é criação dele, a Constituição pelo menos a originária tem eficácia imediata no sentido de
ter sempre força retroativa mínima. Conseqüentemente esse princípio seria um princípio
despiciendo, porque não era preciso chover no molhado dizendo que não se admite a
invocação de direito adquirido com relação aos efeitos futuros de fatos passados em face da
Constituição nova.
Agora, com a inclusão aqui surge o problema. Por que, se se colocou aqui o direito
adquirido, então é porque deve ter algum sentido. E a pergunta que se faz é a seguinte:
isso abarca também a coisa julgada e o ato jurídico perfeito? Ou abarca apenas o direito
adquirido legalmente?
E é uma controvérsia que ainda não encontrou sua definição pelo Supremo Tribunal Federal,
que é a quem cabe a última palavra em matéria de interpretação constitucional. Mas é um
problema.
Problema que, de certa forma, se agrava com relação ao art. 29 da Emenda Constitucional
nº 20, que não fala nem mais de direito adquirido, que portanto também tem uma norma
semelhante a essa do art. 17 sem no entanto fazer a restrição à invocação do direito
adquirido, surgindo então o problema de se saber será nem o direito adquirido mais poderá
ser invocado em face desse art. 29 da Emenda Constitucional nº 20 , que é aquela que diz
respeito aos servidores públicos, e portanto uma daquelas que mais trabalho dão em
matéria de controvérsia pelo universo imenso de servidores e conseqüentemente o universo
também imenso de interesses a respeito.
Mas, vejam os senhores que até nesse ponto de se saber exatamente se realmente aquele
conceito de direito adquirido abarca, para efeitos constitucionais, os conceitos de ato
jurídico perfeito e de coisa julgada ensejam problemas dessa natureza.
Por outro lado, em se tratando de sistema constitucional, não há que se falar com relação a
retroatividade que se possa dar às chamadas leis de ordem pública. As leis de ordem
pública, tendo em vista que estão também subordinadas ao princípio constitucional da
irretroatividade no que diz respeito ao ato jurídico perfeito, direito adquirido e coisa julgada,
não se pode pretender que leis, pelo fato de serem de ordem pública, que são as leis
cogentes, possam ter efeito retroativo, uma vez que a Constituição não faz qualquer
distinção, e mais, há ainda aquele princípio de que lei de ordem pública teria, pelo lado
oposto, em choque com elas, pois o princípio também é de ordem pública, e aqui mais do
que de ordem pública, um princípio constitucional de respeito ao ato jurídico perfeito, ao
direito adquirido e à coisa julgada em atenção ao princípio da segurança jurídica e
conseqüentemente a um princípio que ainda que não estivesse na Constituição seria
também um princípio também de ordem pública.
Com isso, nós temos as diferenças fundamentais entre o direito intertemporal tratado
legalmente e o direito intertemporal tratado constitucionalmente. Vamos agora verificar se
em matéria de direito intertemporal, todos os sistemas jurídicos lançam mão desses
conceitos de ato jurídico perfeito, direito adquirido e coisa julgada. O que é certo é que, no
geral, não conheço exceções, os países adotam o princípio da irretroatividade no sentido de
que, em geral, as leis não devem retroagir ou mesmo no sistema legal o juiz não pode dar
aplicação retroativa a elas.
Mas, os freios para impossibilitar a retroatividade que entre nós são justamente os
conceitos de ato jurídico perfeito, direito adquirido e coisa julgada, não são seguidos em
todos os sistemas que existem. Nós podemos, a grosso modo, distinguir os sistemas em
dois: o sistema das situações jurídicas objetivas ou subjetivas definitivamente constituídas,
que é o sistema em geral seguido na Europa, e que é defendido com grande intensidade,
com grande força por Roubier, que é considerado o sistema objetivo, de concepção objetiva
desses princípios que impedem a retroatividade, e nós temos o sistema subjetivo, que é
aquele que se centraliza principalmente na figura do direito adquirido que é o sistema
adotado por nós e por outros países e que segue a concepção de Gabba , autor italiano
como já disse, que é o principal autor a sustentar esse sistema subjetivo.
Esses dois sistemas apresentam pontos de contato e pontos de diferença. Pelo sistema de
Roubier, nós temos que é possível distinguir as situações jurídicas definitivamente
constituídas em objetivas e subjetivas. Nas situações jurídicas definitivamente constituídas
objetivas são aquelas em que se tem uma determinada situação em virtude de uma
disposição legal. Ao passo que as situações jurídicas definitivamente constituídas subjetivas
são aquelas que decorrem de relações que não nascem exclusivamente da norma, mas sim
são relações que nascem de, por exemplo, de ato jurídico, como por exemplo, o contrato.
Com relação a essas relações jurídicas definitivamente constituídas subjetivas, nós temos
que a lei não pode retroagir. Com relação às outras a lei retroage.
Isto de certa forma, nós seguimos quando dizemos no Brasil não há o direito adquirido a
regime jurídico. O que na realidade não há é direito adquirido a regime legal, tendo em
vista a circunstância de que nesse caso, o que dá margem a existência daquele direito é
justamente o regime, regime esse que pode ser modificado.
Isso é muito importante, porque, se os senhores forem à Lei de Introdução ao Código Civil,
que declara quais são os conceitos de direito adquirido, ato jurídico perfeito, e coisa julgada,
vejam bem, esses conceitos não são legais, a lei é que os explicita, e essa lei seria
inconstitucional se entendesse que aquela explicitação, e portanto o conceito por ela
adotado, fosse um conceito diverso daquele que a Constituição quis que fosse, e aí se
pergunta quem é que decide isso? É o Supremo Tribunal Federal.
Já houve até uma grande discussão agora no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço se
esses conceitos eram legais ou constitucionais. E mesmo alguns colegas que começaram
sustentando que eram conceitos legais e depois voltaram atrás e adotaram a orientação de
que conceito é constitucional. Porque conceito da Constituição não se interpreta pela lei, é a
lei que se interpreta pela Constituição.
Pois bem, mas sucede que sempre se entendeu que esses conceitos, que são explicitados
pela Lei de Introdução ao Código Civil, são os conceitos compatíveis com aquilo que a
Constituição quis que por eles se entendesse. Tanto isso é verdade que a LICC de 1916 a
1942 adotava justamente essa orientação subjetiva. A lei nova não poderá prejudicar o ato
jurídico perfeito, direito adquirido e coisa julgada. Em 1942 esse art. 6º foi modificado
passando a dizer que a lei tem eficácia imediata. Porém a lei nova não poderá prejudicar as
situações definitivamente constituídas ou o ato jurídico perfeito salvo disposição em
contrário.
Por que é que houve essa modificação? Porque a Constituição de 1937 foi a única das
nossas Constituições que não teve o princípio constitucional da irretroatividade.
Conseqüentemente era possível adotar-se, e se adotou, em parte, o sistema legal que
vigora em outros países que não o nosso. Mas, em 1946, esses conceito da nova redação
pela a LICC na sua redação de 1942, aliás, esse dispositivo foi revogado tendo vista a
circunstância de que a Constituição de 1946 voltou ao sistema antigo ao dizer que a lei nova
não poderia prejudicar o ato jurídico perfeito, direito adquirido e coisa julgada. E por isso
mesmo é que em 1957 foi dada uma nova redação a esse art. 6º para voltar à redação
anterior e compatibilizar-se portanto com a Constituição de 1946 e conseqüentemente com
as que se lhe seguiram de 1967, 1969 e agora de 1988.
Mas se nós formos examinar esses conceitos que estão no art. 6º da Lei de Introdução ao
Código Civil, nós vamos verificar que ela admite também o chamado direito adquirido
condicional e o direito adquirido a termo. Diz a LICC no art. 6º:
"A lei em vigor terá efeito imediato e geral respeitado o ato jurídico perfeito, o direito
adquirido e a coisa julgada.
§1º Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que
se efetuou.
§2º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa
exercer como aqueles cujo começo do exercício tenha termo prefixo ou condição
preestabelecida, inalterável arbítrio de outrem
§3º Chama-se coisa julgada ao caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso."
Pois bem, o que interessa aqui é o problema do direito adquirido condicional e do direito
adquirido a termo, e a pergunta que surge é esta: há direito adquirido condicional? Há
direito adquirido a termo?
Pela Lei de Introdução, que é considerada constitucional nesse ponto, não há dúvida de que
existe direito adquirido condicional, que é aquele que já se adquiriu mas cujo exercício
depende da realização de uma condição, ou o direito adquirido a termo que é aquele que já
se adquiriu mas cujo efeito só começa a produzir no momento em que ocorre o termo.
A pergunta que suge é a seguinte: isso se aplica também a direito público? Em geral não se
encontra, eu, pelo menos, nunca encontrei em livro brasileiro algo a respeito, e em livro
estangeiro, só encontrei um autor estrangeiro, Frederico Cammeo, que tem um tratado de
Direito Administrativo na Itália, e que sustenta muito bem, ao meu ver, e o próprio STF já
começa a adotar essa orientação, que esse direito adquirido condicional e o direito adquirido
a termo não se aplicam com relação ao direito púbico por uma circunstância. Porque, se se
aplicar, nós teríamos um direito adquirido a regime jurídico, tendo em vista a circunstância
de que um indivíduo, quando ingressa no serviço público, ele já tem aquilo que nós hoje
consideramos como expectativa, e que seria já um direito adquirido sob condição, por que é
uma condição inalterável ao arbítrio de outrem segundo a Lei de Introdução ao Código Civil.
E aí se pergunta, nesse caso, nós teríamos uma condição inalterável ao arbítrio de outrem?
De certa forma, teríamos, porque ela poderia ser alterada pela lei nova.
Ora, isto nós afastamos, em geral, pelo princípio de que não há direito adquirido ao regime
jurídico ao regime legal, o que não deixa de ser uma aplicação do sistema de Roubier com
relação a situações definitivamente constituídas legalmente, e não àquelas definitivamente
constituídas por uma causa subjetiva.
Então, vejam os senhores, que tanto o direito adquirido sob condição ou o direito adquirido
a termo, eles se aplicam àqueles casos em que a causa desse direito não é legal, mas sim
contratual. E nesse caso, no contrato, não é possível que por arbítrio de terceiros se
modifiquem aquelas condições decorrentes do próprio contrato. Conseqüentemente isso se
aplica não a regime jurídico, mas apenas a regime de natureza voluntária como é o caso do
regime contratualmente estabelecido.
Então têm os senhores aí que esses dois sistemas, o de Roubier e o de Gabba - vamos
assim denominá-los - eles têm pontos de contato mas têm pontos de diferença, tendo em
vista a circunstância de que são sistemas diversos, embora nem sempre as consequências
tenham que ser necessariamente diversas.
A nossa Lei de Introdução de 1942 ela foi um pouco além porque ela adotou de certa forma
o sistema de Roubier quando falava em situações definitivamente constituídas. E continua
com um sistema subjetivo de Gabba com relação ao ato jurídico perfeito a que também ela
uludia. Sendo que com relação aos dois, como não havia mais o princípio constitucional da
irretroatividade em face da Constituição de 1937, diz salvo disposição em contrário, o que
nos filiava ao sistema legal dos países que o adotam, tendo em vista que passou a ser uma
regra que apenas se aplicava ao juiz mas não impedia que o legislador pudesse dar efeito
retroativo a uma determinada lei por ele editada.
Vamos agora, para concluir essas noções que me parecem fundamentais em matéria de
direito adquirido, vamos examinar o direito adquirido em face do poder constituinte, o que
conseqüentemente para verificar quais são os problemas que surgem com referência ao
direito adquirido encarado sob o ângulo do poder constituinte.
Vamos fazer uma análise sumária dos problemas do princípio da irretroatividade em face do
Poder Constituinte de início da União e depois com relação aos Estados.
E aí nós temos que com referência ao poder constituinte originário, ele não está,
obviamente, sujeito àquilo que ele mesmo criou. Até porque como é ele que cria a
Constituição, e a Constituição só se aplica depois de exaurido o poder constituinte
originário, não se poderia pretender aplicar o artigo 5º, XXXVI, também à Constituição. De
modo que em matéria de poder constituinte originário, o que se tem entendido é que tem
ele a faculdade de quando quiser, mas de modo expresso, estabelecer que determindo
princípio da Constituição na sua relação originária, tem retroatividade máxima ou média.
Mas é preciso que seja expresso. Não sendo expresso, vigora o princípio de que todas as
normas constitucionais têm eficácia imediata, e conseqüentemente eficácia retroativa
mínima, ou seja, alcança os efeitos futuros de fatos passados.
Isso trás problemas também. Nós temos aí essa Emenda Constitucional nº 20, quando
estabelece que, ao contrário da relação originária da Constituição no seu art. 40, quando
estabelece que não é possível haver aquele efeito cascata de vantagens que antes se dizia
só não pode haver esse efeito, quando, ao mesmo título, se der uma vantagem sobre outra
vantagem, hoje acabou isso. Hoje se fala apenas que não se pode haver vantagem sobre
vantagem. E isso já começa a dar problemas para se saber qual é a eficácia desse
dispositivo com relação a situações anteriores e muitas vezes até com relação a situações
em que, os julgados pela instância ordinárias ainda não eram alcançados por essa norma,
mas passam a ser alcançados no momento em que vai a instância ordinária de segundo
grau julgá-los, ou até, alguns já pretendem sustentar, em face do próprio recurso
extraordinário.
Os senhores estão lembrados que as Medidas Provisórias que não são reeditadas ou que
não são convertidas, e portanto são rejeitadas expressamente, elas se desconstituem
retroativamente.
E é isso o que se tem feito, e que há pouco houve uma decisão do Supremo Tribunal
Federal nesse sentido com relação não apenas àquelas hipóteses em que o Congresso
Nacional, por Decreto Legislativo, disciplina especificamente situação surgida nessas
condições, ou seja, situação jurídica que nasceu e se desenvolveu sob a vigência de uma
Medida Provisória que depois foi desconstituída.
Nós tivemos um caso desses na célebre Guerra da Gorjeta que foi o conflito que se
estabeleceu entre de um lado um Presidente da República e de outro o Supremo Tribunal
Federal, na interpretação de uma Medida Provisória, em que o Presidente da República, em
dado momento, ele praticamente quase que disse como Luís XVI "Eu sou o Estado", disse
apenas, "Eu sou a Constituição".
E criou-se um impasse e aí o Poder Legislativo, hoje é o Poder Judiciário que virou "algodão
de cristais" entre o Poder Legislativo e o Poder Executivo, naquela época foi o Poder
Legislativo que encontrou a solução.
Bem, a solução é a seguinte: essa Medida Provisória não será reeditada, e não sendo
reeditada, por um decreto legislativo, nós damos razão ao Supremo Tribunal Federal
enquanto ela vigorou, e admitimos que o Presidente da República edite uma nova Medida
Provisória em que diga justamente o contrário, mas daqui para frente. E se chegou à
conclusão de que foi a grande solução. Porque acabou-se com o conflito e em seguida veio
uma Medida Provisória estabelecendo o que a Medida Provisória pretendesse estabelecer,
constitucionalmente.
Pois bem, mas o Supremo Tribunal Federal já está admitindo atualmente, que a própria lei
de conversão que ela, no dispositivo, e aqui é uma construção curiosa, no dispositivo que
tem eficácia de dar permanência às medidas provisórias que foram reeditadas
normalmente, porque sabem os senhores que aquela cláusula de convalidação que toda
medida provisória traz aquilo é uma impropriedade terminológica, aquilo é cláusula de
continuidade de permanência, mas não está convalidando coisa nenhuma. agora, essa
cláusula de convalidação, em vez de conversão, que enumera em todas as medidas
provisórias, inclusive aquelas que não foram reeditadas a tempo, essa cláusula de
convalidação tem dois sentidos. Com relação àquelas que estão em vigor por reedição, até a
lei de conversão e que portanto foram convertidas em lei, é uma cláusula de permanência,
de modo que a alusão a elas é uma cláusula de permanência. Agora, com relação às
demais, que tiveram algum dispositivo revogados por outras medidas provisórias, ou não
reeditadas, portanto de certa forma, revogadas, ela é uma cláusula de convalidação no
sentido de se entender que ela estabelece a mesma disciplina da medida provisória, apenas
disciplina essa que se aplica àquelas situações jurídicas que ocorreram durante a vigência
dela, e não às demais.
E com isso se admite então que, por lei de conversão, que não pode ser vetada pelo
Presidente da República, porque esse ato é privativo do Congresso Nacional - ele pode vetar
o resto, mas não isso - se admite então que haja essa convalidação no sentido de que essa
disciplina igual a da Medida Provisória, mas uma disciplina que se adstrinja apenas àquelas
relações jurídicas que foram constituídas durante a vigência da Medida Provisória. Então
vejam os senhores que nós temos em nossa Constituição essa exceção expressa ao
Princípio da Irretroatividade.
E o problema que surgiu foi este: então se aplica e com isso conseqüentemente
aqueles que antes tinham que pagar 100, hoje tem que pagar 100 mais a correção
monetária. E o Supremo Tribunal Federal entendeu que isso era inconstitucional com base
no seguinte raciocínio: a natureza daquele débito tributário era de débito tributário de
dinheiro, porque era quantia certa insusceptível de ser alterada pelo seu valor com a
atualização portanto monetária.
Já a lei nova o que fazia? Ela não apenas editava um índice de correção monetária,
mas ela na realidade transformava a natureza jurídica daquela dívida que de dívida de
dinheiro passava a ser dívida de valor. E conseqüentemente com isso ela alcançava, com
relação à natureza da dívida, não era problema aqui de aumento de dívida mas sim de
natureza de dívida, ela alcançava uma dívida que se constituíra anteriormente. Mas essa
dívida não surgia de nenhuma ato jurídico perfeito. Ela surgia de um fato, que era o fato de
no dia 31 o rendimento ter alcançado aquele valor. E por isso então entendeu o Tribunal
que, no conceito de ato jurídico perfeito se englobava também o conceito de fato jurídico
perfeito, ou seja, aquelas situações que decorriam de fatos que por força da lei davam
nascimento a direitos.
Por outro lado, quando nós dizemos que não há direito adquirido contra Constituição
originária, com isso nós estamos apenas aludindo aquele princípio de que a Constituição se
aplica de imediato, e portanto pode ter efeito retroativo mínimo. Não pode é ter aqueles
outros efeitos, salvo quando ela é expressa.
Depois de 1988, o problema se complicou por causa da cláusula pétrea, que no Brasil nós
abusamos dela. Sabem os senhores que a chamada cláusula pétrea é para dar maior
permanência a uma Constituição, mas quando se abusa dela, do número de cláusulas
pétreas, nós temos o contrário. Nós temos o efeito inverso. É que ela pode ser um fator de
destruição da Constituição, porque a Constituição começa a ficar engessada. E aqui no
Brasil o engessamento é ainda maior porque como os direitos fundamentais só do art. 5º,
são 77 pelos seus incisos e além disso ainda há o parágrafo 2º que manda que todos os
outros decorrentes do regime ou da própria Constituição ou dos tratados internacionais
sejam também cláusulas pétreas, nós temos, evidentemente, um número fantástico de
cláusulas pétreas, não considerados os outros direitos que não são individuais: os direitos
sociais e até mesmo as garantias tributárias, como já se tem admitido, para invalidar
emenda constitucional, como ocorreu com o princípio da anterioridade em matéria de IPMF.
Pois bem, então o problema agora se complicou de certa forma, também, por causa
daquele art. 17 do ADCT e do art. 29 da Emenda Constitucional nº 20. Finalmente, o que há
com relação ao poder constituinte decorrente, originário ou derivado, e portanto, o poder
constituinte estadual. Com referência ao poder constituinte estadual não há nenhuma
controvérsia no sentido de que ele está sujeito, tanto o originário quanto o derivado, ao
princípio constitucional federal. Ou seja, a Constituição Estadual não pode dar eficácia
retroativa aos seus dispositivos, que não tem eficácia retroativa porque também as
constituições estaduais estão subordinadas ao princípio do ato jurídico perfeito, direito
adquirido e da coisa julgada como freio da retroatividade por parte da Constituição Federal.
Com isso, tem os senhores, numa visão, ainda que não muito aprofundada, de vários
dos problemas decorrentes deste conceito, que é um conceito que nos dá a todos nós, aos
senhores e a nós, aos senhores para elocubrarem soluções de situações jurídicas, e nós
para não nos enrolarmos nas concepções e construções dos senhores. Mas o que é certo é
que se trata, sem dúvida alguma, de um conceito que gera graves problemas e que por isso
mesmo é um conceito que deve merecer objeto de nosso estudo e da nossa reflexão.
Muito obrigado.