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ART. 2o RELIGIÃO DO ANTIGO EGITO.

I – DO ANTIGO EGITO EM GERAL.

73. A importância da civilização pioneira do Egito e de sua religião está em haver


transmitido influências as mais diversas sobre os judeus, fenícios e gregos.
Os judeus, cuja ideologia é mesopotâmica, ao ficarem séculos no Egito, sofreram fortes
interferências. Depois transferiram aos cristãos de todo o mundo um elenco egípcio de prescrições
morais, ritos e crenças, ainda que com muitas transformações ao meio do caminho.
Salomão casou mesmo com a filha do Faraó (I Reis 3,1)
Os fenícios levaram elementos da civilização egípcia para todas as bordas do mar
mediterrâneo. A pedido de Salomão forneceram artífices para construção do templo de Jerusalém
(Ireis 5,18). Há também uma atuação direta do Egito sobre a Grécia, desde os primórdios de Creta,
até os adiantados tempos do período clássico.
Por estas razões, importa conhecer o velho Egito, no qual se encontram raízes importantes
de culturas posteriores, inclusive de religiões. Estas não constituem criações tão originais, quanto os
seus crentes posteriores supunham ser, e alguns ainda supõem ser.

74. Nem tudo é claro na história egípcia, porque ela não teve historiadores em seu mesmo
tempo. Não obstante restaram representações figurativas e inscrições hieroglíficas.
Ainda muito próximo da extinção desta civilização alguns gregos se referem a ela. Assim foi
que Heródoto (c. 484-420) descreveu muito do que pessoalmente pode ver e compreender. O não
haver feito em tudo exatas interpretações; foi porque se tratava de algo já longínquo.
Também a Bíblia judaica se refere ao Egito; por vezes as suas informações são apresentadas
de maneira fantasiosa e do ponto de vista da epicidade. Esta epicidade, além de exageros, tende em
favor da nação do narrador. Mas a interpretação histórico-crítica encontra ali elementos suficientes
para identificar as dimensões da influência religiosa e moral do Egito sobre os judeus e finalmente
sobre o cristianismo.
Não obstante à ausência de um historiador contemporâneo da mesma civilização egípcia,
poucos séculos depois o sacerdote Maneto (c. 240 a.C.) escreveu, já em grego, as Egípcias
(Aigyptiaká), com a vantagem de ainda ter sabido ler hieróglifos. Estabeleceu as dinastias dos reis,
o que muito facilitou toda a estruturação da história do velho país.
No século 6o da era cristã já ninguém sabia ler os hieróglifos, até porque os cristãos
destruíam sistematicamente os monumentos das religiões contrárias.
Além do já mencionado Heródoto, do século 5o a.C., também os gregos mais recentes
informam sobre o Egito, entre eles Diódoto de Sicília e Estrabão (Geografia), ambos no 1 o a.C., o
mesmo ainda fez Plutarco, especialmente sobre Isis e Osíris, no 1o século d.C.
Além dos mencionados historiadores, também outros sábios da Grécia visitaram o Egito, de
onde poderão ter colhido ensinamentos. Sólon de Atenas (c. 640 c. 548 a.C.), Tales de Mileto
(século 7o - 6º a.C.), Pitágoras de Samos (século 6o), Platão de Atenas (429-249 a.C.), Eudoxo de
Cnido (c. 406-342 a.C.)
Mesmo quando a helenização, a partir do 4 o século a.C., transformou profundamente o
quadro mental do Egito, ele manteve algumas formas do seu antigo modo de pensar e de proceder.
Restavam ainda sinais do monarquismo egípcio, o qual influenciou ao neopitagorismo e foi
finalmente propiciar um monarquismo cristão.
Assim também as práticas neopitagóricas prosseguem sua influência tanto sobre os ritos
como sobre a filosofia neoplatônica. Esta influência se perpetuará no pensamento filosófico e
religioso de judeus e cristão.
Os essênios judeus não constituem uma criação inteiramente original. Seus elementos e
pitagóricos poderão ter relações com o Egito.

75. Decifração da escrita egípcia. O estudo sobre o Egito finalmente deslanchou no final
do século 18, e se deve eventualmente às conquistas do colonialismo europeu no Oriente Médio.
Não obstante à espoliação que se processou com o transporte para museus ocidentais dos materiais
achados, se desenvolveu também uma pesquisa que pôs subitamente a descoberto largos períodos
históricos aparentemente desaparecidos.
A expedição conquistadora de Napoleão Bonaparte de 1789 ao Egito deu oportunidade à
descoberta da Pedra de Roseta, que apresentava o mesmo texto em caracteres gregos, em egípcio
hieroglífico e em egípcio demótico. A decifração foi uma questão de tempo, em que se destacou
inicialmente Champolion (1790-1832).
Em decorrência o estudo histórico-crítico das religiões conseguiu novos desenvolvimentos.
Passamos a conhecer melhor a origem das religiões, de sorte a podermos distinguir entre o que elas
dizem ser, e o que de fato são.

76. Descoberta da literatura egípcia antiga, que, pelo seu conjunto, complementa
importantes informações anteriormente fragmentárias.
Os textos das pirâmides (c.2500 a.C.), das cinco pirâmides de Saqarah, contêm hinos,
fórmulas mágicas, rezas.
Encontraram-se textos oficiais bastante antigos, com editos e narrativas de vitórias.
Biografias as há muito em túmulos.
São de interesse literário, poesias líricas as mais diversas.
Também se encontram novelas, como a História do náufrago, e outras similares às Mil e
uma noites.
Lembrando o pessimismo do livro bíblico Jó, é apreciável pela sua profundidade o Diálogo
entre um homem casado e sua alma (em papiro).
Já no Novo Império (1700-1000 a.C.) subsiste o Livro dos Mortos (vd), cujo verdadeiro
título é Livro da chegada da Luz, com 180 capítulos.
Parecido com o posterior livro bíblico Provérbios de Salomão é o conteúdo de Conselhos do
escriba Amon-en-Hotep a seu filho (papiro); estão literalmente traduzidos algumas das máximas de
Hotep (Prov. 22.17-23.11).
Ainda do Novo Império vêm as novelas: Viagem do sacerdote Wen-Amon na Síria e História
dos dois irmãos, esta bastante trágica e cheia de paixões.
Nos últimos séculos continua a literatura de estilo popular e lendária, além dos textos
burocráticos.
Desta sorte, pois, a egiptologia forneceu muitos materiais para o conhecimento agora mais
pormenorizado do Egito, bem como de sua religião.
Os egípcios já haviam alcançado uma adiantada cultura neolítica pelo ano 5000 a.C., mas
continuaram vivendo em cidades politicamente autônomas.
No final do neolítico, pela volta do ano 3200 a.C., se instituem as dinastias, as quais regeram
unificadamente o país. Já então se utilizavam metais e a escrita para a administração.
Certamente a invenção da escrita resultou de sua mesma necessidade, gerada pela
complexidade da administração de uma sociedade que se tornava progressivamente mais complexa.
Uma rede de funcionários e escribas se estabeleceu, burocratizando, progressivamente a sociedade e
aperfeiçoando inclusive os documentos religiosos.

77. Divisão da história do velho Egito. O longo curso da história egípcia se divide em
períodos chamados:
Antigo Império (desde 3000 a.C.),
Médio Império (desde 2100 a.C.),
Novo Império (de c. 1570 ao seu final 605 a.C.)

78. O Antigo Império foi, do ponto de vista externo, o mais autenticamente egípcio, mas já
então ocorrem as influências da Mesopotâmia. Introduz a construção com tijolos e pedras,
substituindo a de cana e madeira. Até traves de madeira são importadas da Síria, onde elas podiam
ser obtidas, para efeitos maiores, nas construções. A madeira geralmente vinha de navio,
proveniente do Líbano ou através dele.
A construção das pirâmides, peculiar ao Antigo Império, poderá ter sido inspirado no Zigurat
mesopotâmico e de modo geral com o culto nos lugares altos, sugerindo sempre a aproximação
como o céu. As primeiras apresentam degraus, as seguintes são pirâmides.
No curso da V dinastia, com 9 reais, se encontra a influência do clero de Heliópolis, tendo
sido mesmo o primeiro rei um sacerdote de Ra (Rê), Deus-Sol. Passa então o culto de Ra a ser
oficialmente o do Estado, com o abandono de Hórus (também deus Sol). O rei é agora considerado
filho de Ra (filho do Sol) e seu substituto.

79. Na transição do Antigo Império para o Médio Império desfez-se a unidade egípcia,
ocorrendo no Norte ocupações de grupos asiáticos.
Acontecem agora alterações sociais e religiosas. O povo conquista direitos funerários. Os
textos, que até então quase somente se gravavam nas pirâmides, aparecem também nos sarcófagos.
Mas finalmente foram expulsos os asiáticos e reunificadas as cidades egípcias; começa agora
o Médio Império. Verifica-se a influência do Egito para fora dele mesmo.
Continua entretanto a haver de tempo no Egito novas penetrações de povos do deserto. Não
há clareza como pela volta de 1720 a.C. Os hicsos assumem o poder, se por conquista, ou se, como
parece mais provável, por simples crescente domínio político durante algum período de
enfraquecimento do poder geral. Ocuparam todo o Norte, com capital em Ávaris, a leste do Delta,
sendo desinstalado somente pela volta do ano 1550 a.C., pelos egípcios de Tebas, isto é do Sul.
Eram os hicsos formados de semitas (amorritas ou hurritas) e de indo-europeus (hititas),
todos provenientes da Ásia Menor.
A presença dos hicsos facilitou a penetração de outros nômades; entre estes outros se
encontram os israelitas, como relatam a Bíblia, ao se referir ao patriarca Jacó e seus 12 filhos, dos
quais um é Judá. Os hicsos não somente tornam coerente a tradição bíblica da estada dos israelitas
no Egito, como ainda mostram que também estes, como aqueles, podiam ter desenvolvido um
ecletismo religioso.
Mas os hicsos foram logo expulsos, porque representavam um poder político, enquanto os
israelitas permanecerão ainda séculos, porque eram apenas plantadores de cebola e criadores de
cabras.
Especula-se sobre a interação cultural e religiosa então ocorrida. Adataram-se os hinos ao
desenvolvimento maior dos egípcios, mas não se sem deixar traços próprios, de onde um ecletismo.
Desde então aparece em representações artísticas a deusa Isthar (ou Anat), caracteristicamente
apresentada nua. Introduz-se também a esfinge alada, peculiar da Síria. Data deste o uso pelo
egípcio do cavalo, e do carro de combate, recebido também por influência externa dos invasores
agora repelidos.

80. O Novo Império por um longo tempo é uma poderosa potência militar com expansão
até a Síria.
O Faraó Amenófis IV (1372-c. 1354), que mudou seu nome para Akhenaton (= agradável a
Aton), cuja esposa foi a elegante rainha Nefertíti, tentou uma reforma religiosa e artística, e em
favor do deus Aton (um deus solar) retirando o nome de deus Amon nos edifícios. Fundou a nova
capital, a que hoje nos referimos por Tell el-Amarna.
Mas subindo ao poder Horemheb (1343-1314), um sacerdote de Amon, restabeleceu-se o
culto deste. Cresceu agora a pressão dos hititas (indo-europeus), situados para além da Síria. Não
fosse a força egípcia, eles teriam dominado, e o Egito não teria alcançado o final do segundo
milênio como Estado soberano.
Mas era chegado o fim do século de ouro dos Tutmés e Ramsés.

81. Legado cultural. Paradoxalmente, na proporção que o velho Egito declinava


politicamente, continuou a crescer continuou a crescer sua influência cultural, no curso do milênio
final da antiga Era. Portanto, apesar do esplendor do Antigo Império, Médio Império e começo do
Novo Império, a importância cultural do Egito para os povos vizinhos ocorreu sobretudo quando
declinou e passou a se retalhar.
O poder político no milênio a. C., se encontra no Delta (capital Tanis), de outra parte com
uma forte teocracia sacerdotal em Tebas, no Alto Egito.
Desenvolvendo-se a navegação, tal como entre os fenícios e os gregos, estabeleceu-se mais
um motivo para a expansão da influência cultural externa e interna, tanto por obra dos navios
egípcios, como dos navios gregos e fenícios, que aportavam.
O relacionamento diplomático desenvolveu-se, porque os reis tiveram que buscar por vezes
apoio no exterior para se manterem no poder. Foi quando o contato e as concessões permitiram a
intercomunicação da cultura egípcia com as demais, até agora quase impossível.
Em 663 a.C. Tebas foi pilhada por Assurbanipal da Assíria, pelo sábio rei que criara uma
grande biblioteca em Nínive. Os faraós vassalos da Assíria não conseguiram manter-se por longo
tempo.
Reforçaram-se os egípcios com o relacionamento com os gregos; permitiram neste sentido, a
estes, o entreposto comercial de Náucratis, no Delta. Em virtude da prosperidade adquirida, o faraó
Nécao II tentou mesmo expandir-se até a Mesopotâmia. Mas foi derrotado por Nabucodonosor II da
Babilônia, em Karkemish (605 a.C.).

82. Perda definitiva da independência do velho Egito. Aconteceu outra derrota política
dos egípcios, e agora definitiva, quando em 525 a.C. os persas (indo-europeus) invadiram o país e
puseram fim à dinastia vigente, que era a saíta.
Contudo o domínio persa não interrompeu o curso do desenvolvimento cultural do Egito.
Até mesmo ele se facilitou, porquanto os gregos jônios da Ásia Menor e os Egípcios estão sob o
mesmo grande rei.
Já é agora o tempo da Grécia clássica, cujos sábios passaram a visitar a terra das pirâmides.
Heródoto a visitou cerca do ano 425 a.C., ocupando-se dela em longas descrições, o mesmo como
com Babilônia.

83. Helenização pela fundação de Alexandria. Finalmente, integrou-se o Egito no mundo


helênico, por obra da conquista de Alexandre Magno (356-323 a.C.). Quando este entrava no Egito
em 333 a.C., depois de derrotar o rei Dário, persa, fora recebido como um libertador.
A esta altura, porém, a força da civilização grega já era maior, e o Egito foi absorvido, não
só politicamente, mas também culturalmente. A história da época antiga passa definitivamente ao
seu novo período.
Criada a cidade de Alexandria, nela se procedeu ao cadinho das culturas do Egito e da
Grécia. Também ali os judeus desenvolveram uma literatura helenística, traduzindo a Bíblia, além
de escreverem novos livros. Alguns foram anexados pelos católicos ao elenco dos livros do velho
Testamento, não o fazendo todavia os judeus e protestantes.
O alfabeto egípcio, em uma variante fenícia do Sinai, que se transpôs para a região
palestinense e depois para a Fenícia, foi ser finalmente a escrita grega e Ocidental.

II – A RELIGIÃO DO ANTIGO EGITO.

86. A religião do Egito, - que, por muitas vias, diretas e indiretas, se transferiu ao nosso
tempo, - foi de início relativamente totêmica, somada com o culto às forças naturais, além de sua
diversificação em deuses tribais (ou tribais).
A divindade egípcia foi concebida como tendo acima um Deus universal e onipotente com
entidades divinas menores, masculinas se conservou basicamente inalterável no curso do tempo,
ainda que os nomes dos deuses variassem.
As potências transcendentais da religião do Egito são menos enfáticas, que as divindades
desenfreadas e violentas da Mesopotâmia. Enquanto a serenidade domina nos tempos dinásticos do
Egito, aumenta o caráter guerreiro dos deuses babilônicos, ninivitas, hititas, expresso em potências
infernais os monstros disformes, acrescidos depois ainda do fim do mundo catastrófico persa,
depois herdado pelos cristãos.
Ainda assim os deuses egípcios manifestam seu desagrado por meio de pragas e epidemias.
Este aspecto vingativo através de pragas e epidemias como instrumentos das manifestações divinas
se transforma no conceito judaico de administração divina, como se observa nas narrativas sobre os
sucessos e insucessos de raça eleita, e é também a interpretação dos profetas para as aflições deste
povo depois de alcançado por tais desgraças.

87. O panteão das divindades egípcias teve algum desenvolvimento interno. Aconteceu a
evolução, que, do totemismo e animismo, progrediu para um conceito cada vez mais abstrato, e que
permite ver nas figuras exteriores apenas uma representação simbólica dos deuses. O símbolo
influenciou mesmo a arte, que tendeu para o formalismo, representando as formas das espécies, de
preferência aos indivíduos.
Algumas divindades egípcias são de origem externa à nação. Muito cedo foram adotadas as
divindades estrangeiras de Osíris (Deus do Sol noturno, Senhor do mundo inferior, juiz supremo), e
Ptah (cabeça de touro).
Ao tempo dos hicsos se adorava Set (corresponde ao Baal Sírio) e que não desapareceu de
todo após a expulsão dos que o introduziram.
São tipicamente egípcias as divindades cujos símbolos foram tomados a animais africanos:
Toth (cabeça de Íbis), Anúbis (cabeça de cão), Sebek (crocodilo), Udjo (cobra), Ra (cabeça de
falcão), Hórus (idem).

88. O conceito egípcio de divindade. Ainda que as vicissitudes políticas influenciassem a


posição dos deuses na hierarquia nominal, os conceitos como já se adiantou, não mudavam a
respeito da divindade em geral. A teologia se encarregava de dar explicações cosmogônicas e
reordenamentos familiares. Há ciclos em torno de Ra, em torno de Hórus e em torno de Osíris.
Quando regiões ou cidades se unificavam os deuses locais terminavam por criar tríades e até
enéadas, como se fossem antecipações simplistas do que depois se faria mais sofisticadamente com
o Logos neoplatônico ou com a Trindade de pessoas dos cristãos. Portanto, não acontece apenas a
multiplicidade das pessoas divinas, mas uma reordenação e que faz uma história no curso dos
séculos.
Sempre se destacou Osíris, Deus do Sol Noturno, Senhor do mundo inferior (inferno dos
mortos). Assassinado por seu irmão Set, foi ressuscitado por Isis, de quem Osíris também era irmão
e esposo. Osíris é Deus dos mortos e Juiz supremo.
Isis, irmã e esposa de Osíris, com este fazia o par mais importante dos deuses egípcios. É
mãe de Hórus, Deus Sol. O culto a Isis se difundirá no império romano, assumindo aspectos
análogos aos da futura projeção da Virgem Maria dos cristãos. Era protetora das mulheres e das
crianças.
Quanto a Set, já mencionado como correspondente ao Baal sírio, é o Deus das trevas,
havendo assassinado seu irmão Osíris, como também já foi dito.
O culto ao Sol, ou seja a Hórus, estava associados aos faraós. As pirâmides, enquanto
apresentam sua face ao sol, se exercem como um apoio dos raios deste. Expressam não apenas um
monumento funerário, mas também constituem manifestações religiosas como de culto ao sol, ao
qual ainda se associava o culto aso faraós. O trabalho de sua construção era tão só um esforço, mas
uma atividade de cunho religioso em que participava a própria nação, inclusive com cerimoniais.
Entre outros e outros deuses do Egito, há finalmente Javé, que veio a ser adotado como
sendo o nome do deus dos judeus. Talvez se tratasse de um Deus secundário do monte Sinai, onde
era adorado pelo sogro de Moisés.

89. Totemismo. Um estranho associamento entre os deuses egípcios e os animais sagrados.


No primeiro instante este culto surpreendia aos gregos e romanos, porque eram adorados num
sentido totêmico e simbólico, o que não que não era óbvio aos estranhos. Como totens, estes
animais eram intimamente associados, pelas suas qualidades, ao homem.
Dali era um passo para a simbolização dos deuses com as imagens dos animais. A deusa
Hator, em figura de vaca ou novilha, e Anúbis, um cão de guarda, bem associam a vivência de um
povo agrícola. E assim, por razões peculiares, se tornavam símbolos, o touro, a serpente, o leão, o
escaravelho, a rã, o gato, o falcão. Nesta coesão universal das coisas, até os astros do firmamento
passavam a expressar a divindade.
O fetichismo, com suas práticas bizarras, encontrou nesta maneira de ver o caminho aberto.
Que seria a Serpente de Moisés no deserto, senão um animal sagrado egípcio, associado a
virtudes divinas? (Números 21,6-9).
As rãs serviam de amuleto, porque expressam a ressurreição. Supunha-se antigamente que
elas nasciam diretamente do limo, sem pai e sem mãe. O símbolo da rã passou aos cristãos, para
indicar a ressurreição, conforme se induz das lâmpadas da necrópole de Edfu.
Os judeus poderiam ter recebido as idéias da ressurreição, em dupla fonte, - primeiro no
Egito, pelo visto, e depois no mundo persa, ao qual passaram a pertencer, em contato com o com o
zoroastrismo.

90. A natureza humana fora concebida pelos egípcios como composta de três elementos:
corpo, vida, espírito. Acontece aqui algo similar à distinção estóica entre alma e espírito, distinção
que se tornará freqüente também entre os cristãos, notadamente em Paulo Apóstolo.
Os egípcios davam os nomes de ahk para o espírito, o qual é descrito como princípio mortal,
e kha (Ka) para a vida ou alma, que é caracterizado como energia vital, força que mantém a vida.
Ambos os elementos têm continuidade depois da morte do corpo.
Inicialmente o princípio imortal, ou ahk, era estabelecido como existindo, ao que parece,
apenas nos deuses e reis. Evoluiu depois a doutrina, atribuindo-o também aos demais seres
humanos.
Quanto à alma ou Kha, ela precisa para se manter depois da morte, um suporte material, que
é seu mesmo corpo, a este se conserva pelos procedimentos mumificatórios e rituais, sendo o seu
túmulo finalmente a casa da eternidade do Kha, e que deveria em conseqüência ser preparado de
maneira a se conservar. A esta casa mortuária se acrescentavam o mobiliário e alimentos.
De todo este afazer de após morte se ocupava o Livro dos mortos, ali também depositado, e
que ainda pode ler. A denominação do ritual funerário estendido a todos os cidadãos ocorreu no
final do Antigo Império, quando as agitações sociais resultaram em melhorias democráticas.
A religião egípcia não trata pois ao corpo material como se fosse algo impuro ao modo como
o faziam as religiões orientais, depois difundidas no Ocidente por órficos e pitagóricos. A alma não
seria algo vindo de fora para dentro do corpo material, a fim de nele se sentir castigada e nele se
purificar pelo sentimento.
Tal outra maneira de ver, só posteriormente viria também para o Egito, conforme narra
Heródoto. Ela não coincide com a velha maneira de ver egípcia, nem com a grega de Homero, em
que, pelo contrário, corpo e alma são vistos como unidade natural. A morte para o homérico e
ocidental não era uma libertação. Mas o conceito milenar egípcio, contudo não se consolidou, por
causa do poder maior depois adquirido pelos órficos e pitagóricos.

91. A moral e os usos sociais dos egípcios eram conservadores, todavia não rígidos, embora
sem a liberalidade mesopotâmica.
Também a condição da mulher lhe pode ser considerada favorável. Não ocultava seu rosto
com véus, nem era confinada à casa, porquanto participava da vida social. É o que refletem as
representações artísticas e os cânticos de amor.

92. O julgamento dos mortos, com destino definido de acordo com o bem ou o mal
praticado, é uma convicção egípcia, que permanecerá entre algumas seitas judias e o cristianismo.
O Livro dos Mortos, que remonta ao Novo Império (1580 a.C.) é um significativo
documentário da crença do julgamento dos mortos.
As representações pictóricas, encontradas nos monumentos, visualizam o seu conteúdo.
Osíris, como senhor da eternidade, senta-se em seu trono, com o cetro na mão, por trás, suas irmãs
Isis e Nefhys.
O morto é introduzido por Maat, deusa da justiça e símbolo de ordem universal.
São 42 os juízes representando as 42 províncias do Egito. Os israelitas, em função às 12
tribos, dirão que o julgamento será por 12 juízes. Os cristãos acrescentarão mais 12 que serão os 12
apóstolos com Jesus em lugar de Osíris.
No julgamento se encontra em destaque uma grande balança, na qual o peso do coração é
equiparado ao da pluma de avestruz (símbolo da verdade). A pesagem cabe a Hórus (Deus da luz,
filho de Osíris e Isis) e a Anúbis, com sua cabeça de chacal, e guardião. O resultado é anotado sobre
um papiro, por Toth caracterizado pela cabeça de Íris, e Senhor da sabedoria e da escrita.
Um monstro híbrido, o grande devorador, despedaçará a alma do morto se o julgamento for
condenatório.
O juízo final é individual. Não há na religião egípcia a escatologia de um fim do mundo com
um juízo universal como acontece na religião dos persas e posteriormente também no cristianismo.
Dependente inicialmente do pensamento religioso egípcio, também os judeus não apresentam
aquelas outras convicções escatológicas. Só mais tarde a escatologia será integrada no judaísmo,
por influência do zoroastrismo persa (vd), todavia com resistência dos conservadores.

93. O clero detinha importantes funções na religião e vida social do egípcio.


Uma parte do clero se constituía dos sacerdotes funerários com a função de servidores do
Kha, porque tratavam dos ritos da mumificação e da colocação dos corpos mumificados nas
respectivas sepulturas.
Outros sacerdotes tratavam do culto em geral e da administração, porquanto uma parte das
terras e dos produtos; pertenciam aos deuses.
Os mesmos faraós eram na verdade sacerdotes, pelas funções religiosas que também
exerciam. O poder não é democrático e sim autocrático, porque o faraó é o lugar tenente da
divindade.
O clero egípcio sempre exerceu poder considerável. Por vezes a ele resistiram os faraós, ou
o próprio povo.
No Novo Império o sacerdócio passava de pai para filho, tornando-se uma classe ainda mais
defendida. Assim acontecerá também com os judeus cujo sacerdócio pertence à tribo de Levi – tudo
talvez por uma imitação do modelo egípcio.

FONTE: Enciclopédia Simpozio (http://www.cfh.ufsc.br/~simpozio/ )

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