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Justiça Federal da 1ª Região

PJe - Processo Judicial Eletrônico

29/01/2020

Número: 1003384-16.2020.4.01.4000
Classe: AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Órgão julgador: 1ª Vara Federal Criminal da SJPI
Última distribuição : 29/01/2020
Valor da causa: R$ 1.000,00
Assuntos: Dano ao Erário, Enriquecimento ilícito, Violação aos Princípios Administrativos
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? NÃO
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? SIM
Partes Procurador/Terceiro vinculado
Ministério Público Federal (Procuradoria) (AUTOR)
FRANCISCO DE MACEDO NETO (RÉU)
Ministério Público Federal (Procuradoria) (FISCAL DA LEI)
Documentos
Id. Data da Documento Tipo
Assinatura
16295 29/01/2020 13:12 Acp Maternidade Recuperação Inicial
4373
EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA __ª VARA FEDERAL DA SEÇÃO
JUDICIÁRIA DO ESTADO DO PIAUÍ

NF nº 1.27.000.000848/2019-58

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por intermédio do Procurador da Republica signatá rio, vem
perante Vossa Excelência, com fulcro nos arts. 129, III, da Constituiçã o Federal, art. 6º, VII, "a" e “d”, da Lei
Complementar nº 75/93, bem como na Lei n. 8.429/92, que dispõ e sobre as sançõ es aplicá veis aos agentes
pú blicos nos casos de enriquecimento ilícito e subversã o aos princípios que regem a administraçã o pú blica no
exercício de mandato, cargo, emprego ou funçã o na administraçã o pú blica direta, indireta ou fundacional, propor
a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA COM PEDIDO DE TUTELA DE
URGÊNCIA

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em face do DIRETOR GERAL DA MATERNIDADE DONA EVANGELINA ROSA, FRANCISCO DE
MACEDO NETO, portador do CPF nº 160.292.243-87, filho de Maria do Monte Serrate Macedo, com endereço
para intimaçõ es na Av. Higino Cunha, n. 1552, CEP 64014-220, Teresina/PI.

Para tanto, enumerar-se-á , detidamente, os fundamentos de fato e de direito da presente açã o.

I – DO DIREITO E DO CABIMENTO DA AÇÃO

A repressã o de condutas que constituam atos de improbidade administrativa esté prevista na vigente
Constituiçã o da Repú blica (art. 37, §4º). Neste toar, a Carta Magna incumbe ao Ministerio Pú blico a legitimidade
para promover a açã o civil com escopo de punir, por tais atos, os agentes investidos no exercício de funçã o
pú blica.

Os atos considerados ímprobos estã o previstos nos artigos 9º e seguintes da Lei n. 8.429/92, com a
disciplina pormenorizada da atuaçã o do Ministerio Publico para dar fiel cumprimento à quele mandamento
constitucional e ao previsto na Lei Complementar n. 75/93.

A Lei n. 8.429/92 regulamenta tanto o citado dispositivo, como o art. 15, V, ambos da Constituiçã o
Federal, disciplinando os atos de improbidades administrativas praticadas por qualquer agente publico.

II – DA LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

A Lei n. 8.429/92, art. 17, caput, deu legitimidade ativa para o Ministerio Publico promover a Açã o Civil
de Improbidade Administrativa.
E, mais especificamente, a Lei Complementar n. 75/93, Lei Organica do Ministerio Publico da Uniã o,
atribui, ao Ministerio Pú blico Federal, a legitimidade para a propositura de açõ es que tenham por objeto a
probidade administrativa (art. 6º, XIV, “f”).

III- DA COMPETÊNCIA FEDERAL

A lei nº 8.429/92, que dispõ e acerca das ‘’sançõ es aplicá veis aos agentes pú blicos nos casos de enriquecimento
ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou funçã o na administraçã o pú blica direta, indireta ou fundacional e dá
outras providências ‘’, tem como objetivo a tutela da probidade admnistrativa em todas as esferas federativas.

Nesse sentido, a competência é definida em razã o do ente federativo, bem assim da autarquia, fundaçã o ou
empresa pú blica que veio a sofrer os efeitos do ato de improbidade administrativa. Se o ato impugnado causou, ou
deveria causar prejuízo à administraçã o direta ou indireta da Uniã o, mostra-se indubitá vel a competência da Justiça
Federal para processamento e julgamento do feito.

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No caso em tela, cuida-se de irregularidades na aplicaçã o de recursos federais provenientes do Sistema Ú nico
de Saú de. A Maternidade Dona Evangelina Rosa tem natureza jurídica institucional de ó rgã o pú blico do Poder Executivo
Estadual e seu financiamento faz-se, além de outras fontes, mediante Recursos Federais ( Fonte 113).

Nesta linha de intelecçã o, importante esclarecer que o Supremo Tribunal Federal (STF) aplica a Sú mula 208 do
STJ no â mbito cível, conforme ementa a seguir:

Sú mula 208 – Compete a Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de
verba sujeita a prestaçã o de contas perante ó rgã o federal. (Sú mula 208, TERCEIRA SEÇÃ O,
julgado em 27/05/1998, DJ 03/06/1998)

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.


AUSÊNCIA. FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL. INTERESSE
JURÍDICO. UNIÃO. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
HIPÓTESE. DESVIO DE VERBAS. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE SUS. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVI-
MENTO, COM APLICAÇÃO DE MULTA.

I – Foi afastada do cenário jurídico norma que pretendia equiparar a ação por improbidade admin -
istrativa, de natureza civil, à ação penal, estendendo a esses casos o foro por prerrogativa de
função.
II – A Justiça Federal é competente para processar e julgar as causas em que há interesse jurídico
da União (art. 109, I, da CF).
III – A Justiça Federal é competente para processar e julgar as ações de improbidade administra-
tiva que possuam o objetivo de recompor o patrimônio federal lesado mediante desvio de ver -
bas do Sistema Único de Saúde SUS. IV – Agravo regimental a que se nega provimento, com apli-
cação de multa (art. 1.021, § 4°, do CPC). (ARE 1015386 AgR, Relator(a):  Min. RICARDO
LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 21/09/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-206 DIVULG
27-09-2018 PUBLIC 28-09-2018)

No que toca ao SUS, isso se dá principalmente em razã o de interpretaçã o literal do art.33, §4º, da Lei nº
8080/90 que disciplina o Sistema Ú nico de Saú de:

CAPÍTULO II
Da Gestã o Financeira
Art. 33. Os recursos financeiros do Sistema Ú nico de Saú de (SUS) serã o depositados em conta
especial, em cada esfera de sua atuaçã o, e movimentados sob fiscalizaçã o dos respectivos
Conselhos de Saú de.
§ 1º Na esfera federal, os recursos financeiros, originá rios do Orçamento da Seguridade Social,
de outros Orçamentos da Uniã o, além de outras fontes, serã o administrados pelo Ministério da
Saú de, através do Fundo Nacional de Saú de.
§ 2º (Vetado).
§ 3º (Vetado).
§ 4º O Ministério da Saú de acompanhará, através de seu sistema de auditoria, a conformidade
à programaçã o aprovada da aplicaçã o dos recursos repassados a Estados e Municípios.
Constatada a malversação, desvio ou não aplicação dos recursos, caberá ao Ministério
da Saúde aplicar as medidas previstas em lei.

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O dispositivo transcrito revela que quaisquer recursos repassados – nã o importando a que título – estarã o sob
o crivo da fiscalizaçã o do Ministério da Saú de e, consequentemente, da Uniã o.

Outrossim, a Lei nº 8.080/1990 previu, em seu inciso XIX do art. 16, e no § 4º do art. 33, a criaçã o de um Sis-
tema Nacional de Auditoria – SNA – do SUS, efetivada no art. 6º da Lei nº 8.689/1993 1 e regulamentada no Decreto nº
1.651/1995, mantido pela Uniã o, com a participaçã o de Estados, Distrito Federal e Municípios:

Art. 16. A direçã o nacional do Sistema Ú nico da Saú de (SUS) compete:


XIX - estabelecer o Sistema Nacional de Auditoria e coordenar a avaliaçã o técnica e financeira
do SUS em todo o Territó rio Nacional em cooperaçã o técnica com os Estados, Municípios e
Distrito Federal. (Vide Decreto nº 1.651, de 1995).

O Tribunal de Contas da Uniã o tem entendimentos ratificando ser sua a atribuiçã o para fiscalizar recursos
transferidos fundo a fundo, o que revela clarividente interesse da Uniã o:

Número Interno do Documento: AC-0622-08/14-P Colegiado: Plenário


Relator: RAIMUNDO CARREIRO Processo: 017.012/2010-4
Sumário:AUDITORIA. MUNICÍPIO DE BOA VISTA/RR. FISCALIZAÇÃO DE ORIENTAÇÃO
CENTRALIZADA-FOC. AVALIAÇÃO DA APLICAÇÃO DOS RECURSOS DO SUS
TRANSFERIDOS NA MODALIDADE FUNDO A FUNDO. DETERMINAÇÕES.
MONITORAMENTO. DESCUMPRIMENTO DAS DETERMINAÇÕES DESTE TRIBUNAL.
AUDIÊNCIAS. RAZÕES DE JUSTIFICATIVA PARCIALMENTE ACATADAS. APLICAÇÃO
DE MULTA. REITERAÇÃO DE DETERMINAÇÃO. PEDIDO DE REEXAME.
CONHECIMENTO. PROVIMENTO. CIÊNCIA ÀS PARTES.

Número Interno do Documento: DC-0506-31/97-P Colegiado: Plenário


Relator: Iram Saraiva Processo: 022.427/1992-9 Número do acórdão: 506
Ano do acórdão: 1997 Data dou: 28/08/1997
Representação da Assembléia Legislativa de Santa Catarina, para apurar desvios de recursos
federais destinados ao Setor de Saúde do Estado. Diligência "in loco" na Secretaria de Estado de
Saúde/SC. Irregularidades constatadas. Proposta inicial de arquivamento do processo e de
conhecimento ao Presidente da Assembléia Legislativa e ao Tribunal de Contas do Estado. Estudo
para definir a competência do TCU para fiscalizar a aplicação de recursos orçamentários do então
INAMPS repassados a Estados, Distrito Federal e Municípios para financiamento das atividades
hospitalares e ambulatoriais vinculadas ao Sistema Único de Saúde - SUS, com audiência do
MP/TCU.
[…]
Decisão:
O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator, DECIDE:
1 Art. 6º Fica instituído no âmbito do Ministério da Saúde o Sistema Nacional de Auditoria de que tratam o inciso XIX do art. 16 e o § 4º do art. 33 da Lei nº
8.080, de 19 de setembro de 1990.

§ 1º Ao Sistema Nacional de Auditoria compete a avaliação técnico-científica, contábil, financeira e patrimonial do Sistema Único de Saúde, que será realizada
de forma descentralizada.

§ 2º A descentralização do Sistema Nacional de Auditoria far-se-á através dos órgãos estaduais e municipais e de representação do Ministério da Saúde em
cada Estado da Federação e no Distrito Federal.

§ 3º Os atuais cargos e funções referentes às ações de auditoria ficam mantidos e serão absorvidos pelo Sistema Nacional de Auditoria, por ocasião da reestrutu-
ração do Ministério da Saúde, de que trata o art. 13.

§ 4º O Departamento de Controle, Avaliação e Auditoria será o órgão central do Sistema Nacional de Auditoria.

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1 - firmar entendimento sobre a matéria em questão, no sentido de que os recursos repassados pelo
Sistema Único de Saúde – SUS, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, constituem
recursos federais e que, dessa forma, estão sujeitos à fiscalização desta Corte as ações e os
serviços de saúde pagos à conta desses recursos, quer sejam os mesmos transferidos pela União
mediante convênio, quer sejam repassados com base em outro instrumento ou ato legal; […]

Cogniçã o aplicá vel aos recursos do SUS, vez que trata-se, no pensamento majoritá rio, de transferência de fundo
a fundo, nos termos do que dispõ e o §3º do art.77 do ADCT, incluído pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000:

Os recursos dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípiosdestinados às açõ es e serviços


pú blicos de saú de e os transferidos pela União para a mesma finalidade serã o aplicados por
meio de Fundo de Saúde que será acompanhado e fiscalizado por Conselhode Saú de, sem
prejuízo do disposto no art. 74 da Constituiçã o Federal. ( grifei)

Portanto, o que se observa é que a celeuma jurídica acerca da competência da Justiça Federal vem,
paulatinamente, sendo afastada, ratificando a atribuiçã o desse ó rgã o jurisdicioonal. Isso porque, o entendimento
predominante é de que, independente do instrumento ou meio de repasse, o interesse da Uniã o na regular aplicaçã o dos
recursos que repassa, permanece. Outrossim, os aludidos precedentes do STF e do TCU denotam que até mesmo nos
casos em que há incorporaçã o ao patrimô nio local, a questã o controvertida continua com fundo de direito federal.
Dessa sorte, a Sú mula 209 carece, nesta senda, de aplicaçã o, pois nã o obstante os Estados e Municípios tenham
autonomia para gerenciar a verba destinada ao SUS, tal fator nã o elide o interesse da Uniã o na regularidade do repasse e
na correta aplicaçã o dos recursos.
Em técnica hermenêutica analó gica, de se ressaltar que o Egrégio Tribunal da Cidadania ratifica-nos:

Compete a Justiça Federal processar e julgar as açõ es penais relacionadas com o desvio de verbas
originárias do SUS ( Sistema Único de Saúde), independentemente de se tratar de valores
repassados aos Estados ou Municípios por meio da modalidade de transferência ‘’fundo a
fundo’’ ou mediante realização de convênio.
STJ. 3ª Seçã o.AgRg no CC 129386/RJ, Rel. Min. Sebastiã o Reis Jú nior, julgado em 11/12/2013.
STJ. 3ª Seçã o. AgRg no CC 122555-RJ, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 14/08/2013 ( Info 527)

Ressalte-se que o Tribunal de Contas da Uniã o, na decisã o 506/97, vislumbrou até mesmo o cará ter convenial
de tais transferências (SUS)- apesar de serem automá ticos os repasses- e, dessa forma, a natureza federal dos recursos é,
novamente, reforçada, porquanto depende de prévia aprovaçã o pelo ó rgã o federal, o que denota interesse específico e
direto da Uniã o.

Do exposto, clarividente a competência da Justiça Federal para processar o presente feito, cujo objeto envolve a
aplicaçã o de verbas repassadas pela Uniã o ao Estado do Piauí no â mbito do Sistema Ú nico de Saú de.

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IV– DOS FATOS

Ab initio, esta exordial aduz fatos constatados pelo Ministerio Publico do Estado do Piauí, através da
12a Promotoria de Justiça de Teresina/PI, nos autos do Inquérito Civil Pú blico nº 26/2016 (SIMP:
000155027/2016)- do qual foram extraídos os documentos que acompanham esta exordial-, cuja temática inicial
''apurar irregularidades nas condiçõ es de trabalho que comprometem a assistência à saú de pelos pediatras na
Maternidade Dona Evangelina Rosa’'' agigantou-se, culminando, ao fim e ao cabo, na demonstraçã o de uma
miscelâ nea de precariedades neste orgã o.
Sob esse â ngulo, subsidia-nos, ainda, o Tribunal de Contas do Piauí por intermédio do Incidente
Processual (Processo TC Nº 009.855/2018) relacionado ao procedimento de fiscalizaçã o (Auditoria TC Nº
009.706/2018), que trata sobre a evoluçã o da despesa com Prestadores de Serviços da MDER nos exercícios
2015 a 2017. ( Doc. em anexo).

Nã o e demasiado exarar que a competência constitucional deste Parquet Federal é indubitá vel face à natureza
federal das verbas subjacentes, porquanto provenientes do Sistema Ú nico de Saú de – SUS.

V- DO DIREITO

Lançadas essas consideraçõ es iniciais de valor preambular, passa-se ao desate das questõ es jurídicas de fundo
estritamente meritó rio.

Cuida-se aqui de uma pretensã o condenató ria por ato de improbidade administrativa. Antes o que aqui se
propõ e envolve tematica de elevada envergadura constitucional, a qual seja, direitos fundamentais.

V.A - DO DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE

A saú de possui, no Brasil, inequívoca dignidade constitucional, consubstanciada na norma insculpida


no art.196, caput, da Constituiçã o Federal. Ipsis Litteris:

'' A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso
universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação. ''

Trata-se de direito social, espraiado em aspecto positivo, assegurando ao indivíduo o poder de exigir a sua
efetivaçã o.

Com efeito, referida prestaçã o significa um influxo do Status Civitatis, tã o bem desenvolvido por Georg Jellinek 2,
que pode ser sintetizado na prerrogativa de o indivíduo exigir o cumprimento, de forma satisfató ria, dos deveres
inerentes à saú de, vedando-se, para isso, condutas transfiguradores deste fim, especialmente quando emanadas de
gestores pú blicos que atuem diretamente na matéria.

2Status positivo: o indivíduo tem o direito de exigir que o Estado atue positivamente, realizando uma prestação ao seu favor.

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De feito: só se revela a inteira morfologia do direito fundamental à saú de quando os pró prios agentes pú blicos
proporcionam, em suas dependências, uma estrutura adequada.

V.B DA DESORGANIZAÇÃO NO SETOR DE PESSOAL

Compulsando as informaçõ es anexadas, mediante cotejo de ofícios, inspeçõ es in loco, atas de


audiências extrajudiciais e demais miscelâ nea documental, é de se destacar, em icá stica síntese, duas
constataçõ es dramá ticas:

a. A Maternidade Dona Evangelina Rosa (MDER) vivencia notá vel desordem administrativa
na gestã o de pessoal e recursos.

b. A MDER, em corolá rio do aspecto supra, nã o cumpre, no balançar de olhos dos mais esperançosos,
a materializaçã o do direito fundamental à saú de (art.196, da CRFB/88), garantia de 2ª dimensã o
atrelada a um Estado Social fiador de liberdades positivas, cuja aplicaçã o é imediata, por força do art.
5º, §1º, da CRFB/88, de sorte que há carência na garantia da dignidade humana, pedra de toque do
ordenamento constitucional brasileiro.

O requerido, Francisco de Macedo Neto, Diretor-Geral da MDER, reiteradamente e de forma dolosa,


compactua para a perenidade desta situaçã o desordeira, conforme doravante demonstrar-se-á.

V.B1 DA SUBVERSÃO AO DEVER DE PRESTAR CONTAS E A PUBLICIDADE DOS ATOS


ADMINISTRATIVOS

Explica-se: Há , neste aspecto, um quadro calamitoso na MDER. Isto nã o se afirma por afirmar. É que
constatou-se, por intermédio do Incidente Processual (Processo TC Nº 009.855/2018) relacionado ao
procedimento de fiscalizaçã o (Auditoria TC Nº 009.706/2018) instaurado pela Corte de Contas do Piauí,
pagamentos realizados à prestadores de serviços à margem da folha, por meio de notas de empenho, nã o
sendo computados, de seu turno, nas despesas com pessoal. Outrossim, há classificação incorreta de despesas
com o fito de acobertar as irregularidades na contratação destes servidores.

Nos termos do relató rio do Conselheiro Relator, a auditoria constatou os seguintes achados: a) Elevaçã o da
despesa com prestadores de serviços, nos exercícios de 2015 a 2017, na ordem de aproximadamente 85% (Oitenta e
cinco por cento); b) Classificaçã o orçamentá ria incorreta da despesa com prestadores de serviços.

Acrescenta, ademais, a ocorrência de “pagamentos realizados a prestadores de serviços a margem da


folha, por meio de notas de empenho, e a classificação incorreta dessa despesa, com o claro propósito de
ocultar irregularidades cometidas na contratação desses servidores” (grifos nossos).

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Diante de todos esses fatos, o Relator, reconhecendo a precariedade dos serviços pú blicos prestados
pela Maternidade Dona Evangelina Rosa, determinou, cautelarmente, ao Diretor-Geral da MDER, que (Vide
decisã o na íntegra – Doc. anexo):

ATO PROCESSUAL: DM n.º 010/2018 – IC


PROCESSO: TC n.º 009.855/2018
ASSUNTO: Incidente Processual referente a Auditoria TC nº 009.706/2018
ENTIDADE: Maternidade Dona Evangelina?Rosa
RELATOR: Conselheiro Substituto Alisson Felipe de Araujo
PROCURADOR: Plínio Valente Ramos Neto
GESTOR: Sr. Francisco de Macedo Neto (Diretor da Maternidade Dona Evangelina Rosa)

O entendimento sufragado no relató rio de auditoria da Diretoria de Fiscalizaçã o da Administraçã o


Estadual -DAEF II Divisã o Técnica no Processo nº 009855/2018(Doc. em anexo) é ainda mais esclarecedor:

Ademais, as despesas empenhadas no elemento 339036 – Outros Serviços de Terceiros Pessoa Física,
que deveria ser utilizado apenas para o empenhamento de despesas de caráter eventual, não estão sendo
computadas como despesas com pessoal, para efeito do limite de gastos com pessoal estabelecido pela LRF
em seu art. 19, inciso II e art. 20, inciso II.

No texto da LRF, os objetivos estã o claramente dispostos no paragrafo 1º do art.1º, verbis:

“a responsabilidade na gestã o fiscal pressupõ e a ação planejada e transparente, em que se


previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas publicas, mediante o
cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e
condições no que tange a renuncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade
social e outras, dívidas consolidadas e mobiliaria, operaçõ es de crédito, inclusive por antecipaçã o de
receita, concessã o de garantia e inscriçã o em Restos a Pagar.” (grifei)

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Por oportuno, releva frisar que o dever constitucional de justificar a boa e regular aplicaçã o dos
recursos pú blicos é ô nus, diga-se de passagem, estritamente atribuído ao gestor publico. É o que se extrai da
cogniçã o dos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais adiante alinhados:

Leia-se o art. 70, parágrafo único, da CRFB/88:

Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das
entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade,
aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante
controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.

Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que
utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos
quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária.

Leia-se o art.93, do Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967

Art. 93. Quem quer que utilize dinheiros públicos terá de justificar seu bom e regular
emprego na conformidade das leis, regulamentos e normas emanadas das
autoridades administrativas competentes.
Nã o bastasse, salta voluntariamente aos olhos do gestor a ausência de implementaçã o efetiva do Sistema de
Controle do Ponto Biométrico Eletrô nico instituído em 27 de julho de 2016 pelo Decreto Estadual nº 16.688/2016.

Em tempo, o já mencionado diretor da MDER, em sede de audiência extrajudicial, confirmou que o sistema de
controle de pessoal existe, mas nã o funciona (fl.171, da NF).

Vislumbra-se, desse contexto, que cai por terra a transparência e responsabilidade na gestão fiscal
exigidas pela Lei Complementar 101/2000. Vale dizer, o diretor do orgão multicitado, não obstante consciente
das irregularidades, não corrigi os desvios e não se desincumbe do dever de regular aplicação das verbas
públicas, de maneira que contribui para o desequilíbrio das contas estatais.

Está hialina a violação ao princípio da legalidade e publicidade, ante a subversã o à LC 101/2000, aos arts. 70,
parágrafo único, e 169 (limites à execução orçamentária), ambos da CRFB/88 e ao Decreto-Lei nº 200/1967 , em corolá rio
de verdadeira valsa orçamentaria na transparência do setor de pessoal, por efetuar pagamentos na modalidade despesa
(nã o como pessoal, mas simplesmente por ordem bancá ria), bem como desrespeito ao ato regulamentar estadual.

O gestor do ó rgã o que ora faz-se referência nã o detem autorizaçã o legal para tal forma de adimplemento
administrativo. Maria Sylvia Zanella assim esclarece e nos ratifica 3:

Segundo o princípio da legalidade, a Administração Pública só pode fazer o que a


lei permite. No â mbito das relaçõ es entre particulares, o princípio aplicá vel é o da
autonomia da vontade, que lhes permite fazer tudo o que a lei nã o proíbe.

3(DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 21. ed. Sã o Paulo: Atlas, 2008. p.63)

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Em decorrência disso, a Administraçã o Pú blica não pode, por simples ato
administrativo, conceder direitos de qualquer espécie, criar obrigações ou
impor vedaçõ es aos administrados; para tanto ela depende de lei.

V.B2 DO DESVIRTUAMENTO LEGAL DAS CONTRATAÇÕES TEMPORÁRIAS (art.37, inciso IX, da


CRFB/88)

Conforme exarado no art. 37, inciso II, da Constituição Federal, via de regra, “a investidura em cargo ou emprego
píblico depende de aprovação prévia em concurso público (...)”. No entanto, existem situaçõ es em que o concurso pú blico é
dispensado, dentre as quais, a contrataçã o temporá ria por tempo determinado para atender necessidade de excepcional
interesse pú blico:

Art. 37. A administraçã o publica direta e indireta de qualquer dos Poderes da


Uniã o, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios
de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao
seguinte:

II – a investidura em cargo ou emprego pú blico depende de aprovaçã o prévia em


concurso pú blico de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a
complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as
nomeaçõ es para cargo em comissã o declarado em lei de livre nomeaçã o e
exoneraçã o;

IX – a lei estabelecerá os casos de contrataçã o por tempo determinado para


atender a necessidade temporá ria de excepcional interesse pú blico;

De forma prefacial, relevante, também, o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) que,
repudiando o alargamento desarrazoado do instituto descrito no inciso IX, aduziu ser fundamental o
preenchimento dos seguintes requisitos:I. feita por tempo determinado

II. Com o objetivo de atender a uma necessidade temporária

III. Que se caracterize como sendo de excepcional interesse público

IV. Que não haja prorrogações indefinidas.

São inconstitucionais, por violarem o art. 37, IX, da CF/88, a autorização legislativa genérica para contratação temporária e a permissão
de prorrogação indefinida do prazo de contratações temporárias.

STF. Plenário. ADI 3662/MT, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 23/3/2017 (Info 858).

Pois bem. Nas miuças do retroalinhado, depreende-se que a MDER, por meio de seu Diretor, esta contratando à
margem dos delineamentos constitucionais, vez que os serviços de obstetra, técnico, dentre outros, nã o configuram
necessidade excepcional, mas perene, contínua, ante ao fato de comporem a atividade fim e serem a base de sustentaçã o
do atendimento à saú de. Nã o é possível cogitar uma maternidade sem estes profissionais, seria utopia. No ponto, nã o
atendido o requisito II.

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A título ilustrativo, à fl. 108 da NF, consta informaçã o em Ofício elaborado pelo Coletivo dos
Profissionais de Saú de da Maternidade Dona Evangelina Rosa, infra-assinado pela Coordenaçã o de Neonatologia,
de que obstetras que compõ em, portanto, a matiz obreira principal, realizam, reiteradamente, plantõ es extras,
mediante contrato precá rio:

A propó sito, a folha de pagamentos de plantõ es extras dos médicos da maternidade (Doc. em anexo)
demonstra o imenso vulto de recursos destinados a essas contrataçõ es que, desde a origem, sã o irregulares: pediatras
(R$ 107.114,65); obstetras (R$291.786,30); obstetras nã o efetivos (R$ 105.000,00); médico obstetra parecer prontuario
(R$1.800,00); médicos do IPS (120.577.02).

Do mesmo modo, a folha de pagamento de contratados (pessoas admitidas sem nenhum critério de
seleção) de setembro de 2017 (nã o médicos) totalizou o valor bruto (sem os descontos legais) de R$710.878,55 (Doc.
em anexo).

Excelência, a situaçã o se agrava compulsando o Relató rio de Fiscalizaçã o nº 10/18 do COREN/PI (fl.330, da
NF), decorrente de visita realizada em 12 de junho de 2018. Causa perplexidade a desproporçã o entre contratados e
efetivos:

I. ALA “B” (técnicos de enfermagem – 10 efetivos e 11 contratados);

II.UTI Neonatal 1 ( registro de dez técnicos de enfermagem com carga


horária dupla, totalizando 10 plantõ es extras, bem assim enfermeiras com
plantõ es que extrapolam a jornada de trabalho)

III.Centro Cirúrgico (enfermeiros – 03 efetivos e 20 contratados)

Desse modo, o Diretor da MDER está banalizando o permissivo constitucional, distanciando-se do imperativo
de realizaçã o de concursos pú blicos. O resultado é a deficiência na prestaçã o dos serviços, de verificaçã o irredarguível.

Destarte, a realidade é de que a prestaçã o dos serviços de saú de é inteiramente dependente dessa mã o de obra
irregular. Nã o nos deixa à deriva o Planejamento da Maternidade para o ano de 2019:

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Com efeito, para neutralizar as sobreditas carências, sã o realizadas convocaçõ es mediante contratos precá rios
que estã o, face ao prologando curso temporal, se convolando em ares de perpetuidade, de modo a desvirtuarem a pró pria
epistemologia da contrataçã o temporá ria, transmudando-a em aprovaçã o por concurso píblico por vias oblíquas, em
desrespeito aos aludidos parâ metros estabelecidos pelo Excelso Pretó rio.

No mesmo sentido destacou o Tribunal de Contas do Estado do Piauí, no Processo de Auditoria TC nº


009.706/2018 (Doc. em anexo), senã o vejamos:

Os Prestadores de Serviços da MDER não têm natureza eventual, já que está havendo uma continuidade na
prestação desses serviços, estes não poderiam ser empenhados no elemento 33.90.36. Portanto, isso tende a reduzir sua
capacidade financeira para alocar recursos para outras despesas, podendo inviabilizar ou tornar precária a prestação de
serviço de assistência à população, no que diz respeito a aquisições de insumos diversos. A maior parte dos recursos
disponibilizados nesse elemento (33.90.36) é consumido com os Prestadores, representando nos exercícios de 2015, 2016 e
2017, respectivamente: 89,99%, 94,10% e 52,76% do total.

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Digno aqui que, ante ao desvirtuamento das contratações temporárias, ao excessivo valor a elas destinados e a falta de
fundamentação para escolha dos profissionais, há malferimento do princípio constitucional do concurso público
(art.37, II, da CRFB/88), da legalidade, impessoalidade, moralidade.

V.B3 DO EXCESSIVO QUADRO DE FUNCIONÁRIOS NA ATIVIDADE MEIO

Meados da ú ltima década do século XX, a Reforma Administrativa, posta a termo, ainda em 1967, com o
Decreto-Lei 2004 estabeleceu os primeiros ares de superaçã o da administraça$o burocrá tica, tendo em vista os moldes
da modernidade e racionalidade que norteiam o cená rio atual.

Dessa forma, a estrutura da Administraçã o Pú blica possui ênfase na qualidade e efetividade dos serviços
pú blicos, de modo que impera o uso racional dos parcos recursos e a boa estruturaçã o da máquina estatal, sempre
pautados pelo regime jurídico-administrativo, consubstanciado na supremacia e indisponibilidade do interesse
pú blico.

Nesta linha de intelecçã o, a Emenda Constitucional 19/1998, incluiu a eficiência como princípio expresso da
Administraçã o Pú blica, no caput do art.37:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte (...).

Nas liçõ es de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, revela-se inadmissível o comportamento negligente e ineficiente
do gestor da coisa pú blica5:

“o princípio apresenta-se sob dois aspectos, podendo tanto ser considerado em relação à forma de
atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atuações e
atribuições, para lograr os melhores resultados, como também em relação ao modo racional de se
organizar, estruturar, disciplinar a administração pública, e também com o intuito de alcance de
resultados na prestação do serviço público”

A ineficiência de um ato administrativo ou serviço pú blico é plenamente passível de apreciação pelo


Poder Judiciário , sem que este esteja aventurando-se sobre questõ es de mérito, exclusivamente administrativo.
Nesse sentido, entendem Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo 6:

Note-se que, sendo um princípio expresso, a eficiência indiscutivelmente integra o


controle de legalidade ou legitimidade, e não de mérito administrativo. Deveras, a

4 Tal decreto norteou-se pelo fortalecimento da açã o central de planejamento, coordenaçã o e controle, como também, pelo
fortalecimento e expansã o do sistema de mérito e diretrizes em relaçã o ao plano de classificaçã o de cargos.
5 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. Sã o Paulo: Atlas, 2002.
6 ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. 22. ed. São Paulo: Método, 2014. p. 213.

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atuação eficiente não é questão de conveniência e oportunidade administrativa,
mas sim uma obrigação [ato jurídico em sentido estrito]2 do administrador, vale
dizer, não é cabível a administração alegar que, dentre diversas atuações possíveis,
deixou de escolher a mais eficiente porque julgou conveniente ou oportuno adotar
uma outra, menos eficiente.

Decerto, o administrador pú blico precisa ser eficiente, ou seja, pautar sua conduta de forma objetiva e
imparcial, tendo como norte a produçã o de bons resultados.

Vislumbra-se, portanto, dentro dessa nova ó ptica constitucional, um reforço à plena possibilidade de o
Poder Judiciá rio (CF, art. 5º, XXXV), em defesa dos direitos fundamentais e serviços essenciais previstos pela
Carta Magna, garantir a eficiência dos serviços prestados pela Administraçã o Pú blica, inclusive res-
ponsabilizando as autoridades omissas, pois, conforme salienta Alejandro Nieto, analisando a realidade
espanhola, quando o cidadã o se sente maltratado pela inatividade da administraçã o e nã o tem um remédio
jurídico para socorrer-se, irá acudir-se inevitavelmente de pressõ es políticas, corrupçã o, trá fico de influência,
violências individual e institucionalizada, acabando por gerar intranqü ilidade social, questionando-se a pró pria
utilidade do Estado. 7

Do exposto até aqui neste tó pico, passa-se a aná lise de fundo meritó ria dos Atos de Improbidade
Administrativa:

É de fá cil percepçã o, Excelência, que no quadro de recursos humanos da MDER, há um elevado nú mero

de cargos meio com funçõ es nã o devidamente definidas. Ademais, nã o há comprovaçã o de que foram criados
mediante lei, exigência constitucional (art.61,II, a, da CRFB/88). A título ilustrativo: assessor técnico; auxiliar
técnico administrativo; auxiliar administrativo; programador; serviços.

Este fato foi ratificado pelo TCE/PI em Decisã o Monocrá tica de nº 010/2018- IC, em Incidente
Processual (Processo TC Nº 009.855/2018), publicada no Diá rio Eletrô nico na data de 08.06.2018 e ratificada
pelo Plená rio do TCE/PI em 14.06.2018, verbis:

a) Comprove, no prazo improrrogável de 15 (quinze) dias, o AFASTAMENTO de todos os contratados a


partir de janeiro de 2015 que DESEMPENHEM ATIVIDADE MEIO, de natureza meramente administrativa, sob
pena de multa diária de 1.000 UFRs, sem prejuízo de outras sanções que quando do julgamento do mérito do
procedimento de auditoria;

Calha anotar que aná lise da ata de audiência extrajudicial presidida pela representante do Ministério
Pú blico Estadual e realizada em 03 de abril de 2018 (fls. 128/129, da NF) demonstra que há quantidade de
servidores contratados sem concurso publico, no setor meramente administrativo, em desproporçã o geométrica
inversa à s demandas, fato até mesmo já constatado pelo Tribunal de Contas do Estado do Piauí. É dizer, em
termos mais simpló rios, quantidade de serviços aquem a de pessoal.

7 MORAIS, Alexandre: Princípio da Eficiência e Controle Jurisdicional dos Atos Administrativos Discricionários, Revista de Direito Administrativo, Ed. Atlas.

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Nesta senda, digno de nota que a admissã o de todo esse pessoal ocorreu sem concurso pú blico, por
critérios pessoais ou desconhecidos de escolha, sem o menor respeito ao princípio da impessoalidade
objetivamente considerado.

Tal situaçã o - exacerbado quadro de funcioná rios- tem por corolá rio o exponencial aumento nas despesas com
prestadores de serviços no ano de 2017 e, diga-se desde logo, que trata-se do intérregno em que o atual Diretor assumiu
a direçã o do orgã o. Vale dizer, sã o recursos que poderiam e deveriam ser redirecionados ao atendimento direto à saú de,
na compra de insumos e melhoria da qualidade do atendimento.

No ponto, de se ressaltar, em esquema autoexplicativo, o aludido contexto orçamentario:

Despiciendo relatar, mas a situaçã o se agrava quanto da forma de pagamento desse pessoal, através da
modalidade despesa ordinária (mediante empenho e ordem bancária), custeado com recursos da pró pria instituiçã o
que, em tese, deveriam ser aplicados no adimplemento dos fornecedores e funcionamento da maternidade. O impacto
orçamentario e a excessiva oneraçã o aos cofres publicos sã o patentes e demonstrados no item IV.B1 e IV.B3, pelo que
pede-se vênia para evitar repetiçõ es.

É imperioso frisar, novamente, que as despesas com servidores, independentemente do regime de trabalho a
que estã o submetidos, ou da existência ou nã o de processo seletivo, devem integrar a despesa total com pessoal. Desse
modo, é extremamente grave e ilegal o atual Diretor adimplir despesas com os servidores temporá rios à margem da
folha, pois nã o permite contabilizá -las no limite de gastos necessá rios para avaliar o cumprimento de metas fiscais, fator
essencial para a saú de financeira do Estado e consecuçã o do interesse coletivo. Nos é convergente o art.18 da LRF e o
Manual Técnico do Orçamento (MTO):

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Art. 18. Para os efeitos desta Lei Complementar, entende-se como despesa total com pessoal: o
somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos
a mandatos eletivos, cargos, funçõ es ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com
quaisquer espécies remuneratórias, tais como vencimentos e vantagens, fixas e variá veis,
subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e pensõ es, inclusive adicionais, gratificaçõ es, horas
extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuiçõ es
recolhidas pelo ente às entidades de previdência.

36 – Outros Serviços de Terceiros – Pessoa Física: Despesas orçamentarias decorrentes de


serviços prestados por pessoa física pagos diretamente a esta e não enquadrados nos elementos de
despesa específicos, tais como: remuneração de serviços de natureza eventual, prestado por
pessoa física sem vínculo empregatício; estagiarios, monitores diretamente contratados; gratificaçã o
por encargo de curso ou de concurso; diarias a colaboradores eventuais; locaçã o de imoveis; salario
de internos nas penitenciarias; e outras despesas pagas diretamente a pessoa física. [grifo da
auditoria]

Neste toar, a desorganizaçã o do setor meio, a incluir ausência de critérios objetivos de seleçã o, excesso de
contingente humano e pagamentos à margem da transparência, denota inquestioná vel subversão às,
exaustivamente relatadas, eficiência, publicidade e impessoalidade.

Ressalte-se que a aludida forma de pagamento fere de morte o art. 70, pará grafo ú nico, da CRFB, o art. 200 do
Decreto Lei n. 200 ( já transcritos ao norte) e o art.1º, §1º c/c art. 18, ambos da LRF.

Seguindo, o multicitado Diretor acomodou, sob benevolentes contraprestaçõ es financeiras, sem qualquer
concurso pú blico ou teste seletivo, Hiago Bezerra de Macedo (sobrinho do diretor), que recebe por ordem bancá ria, na
fonte de recursos SUS, constando da folha de pagamento de ‘'contratos temporá rios’' não inserida no Portal da
Transparência do Estado.

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As evidências constatam a desonestidade e má fé em lograr vantagens com o mal barateamento da má quina
pú blica. A prá tica remonta ao coronelismo e ao compadrio, fatores que arruínam os cofres pú blicos, cuja gerência deve
ser conduzida com seriedade, ética e zelo. Políticas mesquinhas de inchaço do setor estatal nã o devem prosperar, porque
se assim o fosse, a ruína econô mica e moral seriam inevitá veis.

O princípio da eficiência postula pelo recrutamento de mã o de obra qualificada, em termos de capacitaçã o téc-
nica e vocaçã o para as atividades estatais.

In casu, o que se observa é a projeçã o de um ambiente doméstico na intimidade das repartiçõ es estatais. Obvia-
mente o controle gerencial fica prejudicado. Quando é preciso punir o servidor faltoso, como sancionar um sobrinho?
Como impedir que os colegas nã o-familiares se sintam em posiçã o de menos osbequioso tratamento funcional?

Nã o se pode confundir tomar posse no cargo pú blico e tomar posse dos cargos, na antinomia frontal do con -
ceito de que ‘’ Administrar nã o é atividade de quem é senhor de coisa pró pria, mas gestor de coisa alheia ‘’ ( Rui Cirne
Lima).

Sob esta ó tica, destaco que há expresso nepotismo na MDER, face à nomeaçã o de um sobrinho, parente em
linha colateral de 3º grau, pelo ocupante do cargo em comissã o (Diretor).

A Sú mula Vinculante n. 13-STF, por sua vez, veda a pratica do nepotismo em linha reta, colateral ou por
afinidade, pratica das mais nefastas e incompatíveis com o Estado de Direito Democrá tico, por violar o art. 37 da CF/
1988. É evidentemente imoral, principalmente quando associado a qualquer indicativo de qualificaçã o técnica ou critério
objetivo de seleçã o, posto haver varios outros profissionais aptos ao exercício desse munus pú blico. Desta feita, há vio-
laçã o ao enunciado há muito consolidado:

A nomeaçã o de cô njuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por


afinidade, ate o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da
mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o
exercício de cargo em comissã o ou de confiança ou, ainda, de funçã o gratificada na adminis-
traçã o publica direta e indireta em qualquer dos poderes da Uniã o, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designaçõ es recíprocas, viola a
Constituiçã o Federal.

Destarte, é salutar ressaltar à guisa do exposto, que o nepotismo afigura-se como ato de improbidade adminis-
trativa que atenta contra os princípios da administraço, especialmente a impessoalidade. No ponto, subsidia-nos o Egré -
gio Tribunal da Cidadania

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EX-PREFEITO. APLICAÇAXO DA LIA.


IMPROBIDADE. NEPOTISMO. ATO CONFIGURADO. REEXAME FAJTICO PROBATOJRIO.
2. De acordo com a jurisprudencia do STJ, a Lei n. 8.429/1992 é aplicá vel aos agentes políticos.
3. Conforme pacífico entendimento jurisprudencial desta Corte Superior, improbidade e ilegalidade
tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo, sendo "indispensá vel para a caracterizaçã o de improbidade
que a conduta do agente seja dolosa para a tipificaçã o das condutas descritas nos artigos 9º e 11 da Lei

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8.429/1992, ou, pelo menos, eivada de culpa grave nas do artigo 10" (AIA 30/AM, Rel. Ministro Teori Albino
Zavascki, Corte Especial, DJe 28/09/2011).
4. Hipó tese em que, em face das premissas fá ticas assentadas no acordã o julgado, no sentido da
caracterização do ato de improbidade administrativa, consubstanciada na prática de nepotismo -
nomeação de servidores, parentes do Prefeito Municipal,Vice-Prefeito Municipal e Secretá rios Municipais,
no âmbito do Poder Executivo do Município de Limeira do Oeste, com a indicação expressa do elemento
subjetivo - a revisã o do julgado demandaria, induvidosamente, o reexame de todo material cognitivo
produzido nos autos, desiderato incompatível com a via especial, a teor da Sumula n. 7 do STJ.
5. O fato de a conduta ímproba haver sido praticada antes da ediçã o da Sumula Vinculante n. 13 do
STF (que rechaça o nepotismo), afigura-se desinfluente à configuraça$o do ato ímprobo, eis que a vedaçã o de
tal prá tica decorreu da dicçã o do art. 37 da Carta Magna/1988, ao instituir os princípios da isonomia,
impessoalidade e moralidade, nã o servindo o aludido verbete sumular como marco inicial da prá tica já
vedada pela Constituiça$o.
6. Agravo interno desprovido.
AgIntnoAREsp625949/MG
2014/0314123-7 DJe 08/11/2018

Pois bem. No cotejo do contexto fá tico, é de rigor uma progressão para ceifar qualquer dúvida: Na MDER,
no que concerne à finalidade ú ltima do orgã o, observa-se a efetivaçã o, por parte do Diretor Geral, da já ultrapassada
administraçã o burocrá tica, de forma a utilizar o orgã o como um fim em si mesmo (1-Inchar a máquina estatal 2-
beneficiar parentes; 3-alimentar, de forma desnecessária, a folha salarial do setor meio; 4-criar cargos sem
previsão legal; 5-atécnica na seleção de pessoal) e nã o na consecuçã o do interesse pú blico (administraçã o
gerencial)8.

Ainda no que diz respeito ao pandemonio na organizaçã o de pessoal, poder-se-ia imaginar a ausência de dolo.
Ocorre que, isto nã o merece prosperar. Isto porque sã o inú meras as orientaçõ es dirigidas ao orgã o, na pessoa do seu
gestor maior, o diretor, para regularizar a situaçã o de pessoal: audiências extrajudiciais, ofícios, bem como medida
cautelar do TCE/PI , datada de 08 de junho de 2018 (fl.146, da NF).

Ademais, causa perplexidade, Excelência, que mesmo diante do quadro catastró fico na organizaçã o dos
obreiros e de medida cautelar para reverter a situaçã o, em Decisã o Monocratica nº 010/2018-IC, em Incidente
Processual (Processo TC Nº 009.855/2018), publicada no Diá rio Eletrô nico na data de 08.06.2018 e ratificada pelo
Plenario do TCE/PI em 14.06.2018, o Diretor-Geral quedou-se inerte e descumpriu, inclusive, o item a (Afastamento
dos servidores que ocupem atividade-meio, de natureza meramente administrativa) da determinaçã o, e, desse
modo, a Corte aplicou multa no valor de 278.000,00 UFRs, liquidada em 20 de agosto de 2019, o que denota o seu
pleno conhecimento da situaçã o e insistência em assim permanecer.

É indiscutível o descalabro administrativo. Incorre em duplo erro o administrador que, ante à desorganizaçã o
no setor de pessoal, nã o só deixa de adotar as soluçõ es constitucionalmente recomendá veis, como pratica atos
comissivos, mediante incú ria administrativa – domesticação funcional-, que potencializam a desordem. Nã o há mera
irregularidade, pois traspassou-se o limiar do mérito administrativo (oportunidade e conveniência), de sorte a
alcançar os patamares da arbitrariedade.

8Orienta-se nos resultados e e orientada para os cidadã os. Firma-se em combater o nepotismo e a corrupçã o e nã o adota
procedimentos rígidos. Interesse publico identifica-se com o do cidadã o, sendo estes clientes dos serviços pú blicos.

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Ressoa paradoxal que ao tempo que a atividade-fim e primordial da maternidade, a obstetrícia, seja suprida
mediante contratos precá rios, o setor administrativo repousa em benevolentes disponibilidades de mã o de obra.

Em indisputá vel arremate, passados mais de 2 anos de gestã o, a situaçã o, de forma injustificada, perpetua-se.
Sintoma ló gico é a vultuosa dispensa de quantias em contratos precá rios sem qualquer teste pú blico seletivo.
Inarredá vel, portanto, o descaso perpetrado pelo Diretor – Geral.

V.C DO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO

O elemento subjetivo da conduta, dolo, ganha relevo quando atinente à aspectos intimamente relacionados ao Sr.
Francisco de Macedo Neto. Vale dizer, o pró prio Diretor da MDER consta como credor de serviços na qualidade de
médico radiologista. No portal da transparencia do Estado do Piauí, no campo despesas, perceptível a utilizaçã o de
recursos do SUS para custeio da citada despesa no valor mensal de R$ 5.550,00 (fls.18/24, da NF)

É de se ressaltar que o referido gestor publico nã o detem título de radiologista com registro no CRM/PI,
tampouco no colegio brasileiro de radiologia e diagnó stico por imagem, nos termos da constataçã o nº 493176 do
relató rio de auditoria 17567 do DENASUS (Doc. em anexo).

É certo, portanto, o enriquecimento ilícito, ante ao exercício, de fato, apenas do labor em comissã o e
recebimento de valores relacionados à funçã o que nã o exerce (radiologista) e nã o o poderia, pois nã o detem
capacidade técnica e é incompatível com as diversas atribuiçõ es e carga horaria que exige a gestã o da MDER. Em
outros termos, o Diretor feriu de morte o art. 37, caput, da CRFB/88 – moralidade- e a Lei nº 8.429/92 (LIA).

VI- DO ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL CONCENTRADO

A MDER, segundo dessume-se especialmente do Relató rio de vistoria realizada no dia 12 de junho de 2018 à
fl.157 e da visita de inspeçã o à fl.203, da NF, por omissã o dolosa do seu Diretor, vivencia graves problemas no
atendimento à saude. Ad exemplum, sem qualquer pretensã o de exaurimento, cite-se:

1- Elevados índices de mortalidade materna e perinatal

2- Permanente falta de medicamentos e insumos: UTI Neo I com ausência de reagentes para exames

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laboratoriais e climatizaçã o insuficiente (ambiente inó spito no turno da tarde), demora na entrega de
resultados, falta de papel toalha e sabã o líquido diluído, ausência de medicamentos bá sicos ao funcionamento do orgã o

(Hidralazina, Sulfactante, Midazolan, Enoxaparina, Prednisona, Efedrina, Lindoeaína gel e AZT injetá vel)

3- Estrutura física deteriorada: Centro Obstétrico acumula sujeira e sangue dos procedimentos

cirú rgicos e piso em estado degradante.

4- Insumos basicos estã o em escassez perene: sabã o líquido, papel toalha, dentre tantos outros

registrados em ocorrências internas à s fls. 475/549 da NF.

Sendo a MDER uma unidade gestora independente, com Comissã o Permanente de Licitaçã o, formada por
representantes da Diretoria Administrativo-Financeira e Diretoria Tecnico Assistencial, teve, em expressivo lapso
temporal, independência para comprar tais medicamentos.

Ate o início de 2017, ou seja, antes da gestã o atual, nã o se constatou as mesmas deficiências em medicamentos.
Impera ponderar que o pró prio Diretor-Geral informou que os procedimentos licitató rios para aquisiçã o de
medicamentos e demais insumos levam ate seis meses para serem concluídos (fl.146, da NF).

Destarte, há , portanto, uma falha de gestã o e nã o de recursos, ao menos no que toca aos medicamentos, em
afronta ao princípio da eficiência, vez que em um mesmo contexto orçamentá rio anterior, nã o se apercebeu esta
irregularidade com a potencialidade atual.

No trilhar hermenêutico constitucional comparado, de se averbar, na espécie, a constataçã o nã o de um


contexto de proteçã o deficiente, mas sim de violaçã o maciça e generalizada de direito fundamental de 2ª dimensã o
(saú de), albergando um quantitativo elevado e indeterminado de usuá rios da MDER.

Ato contínuo, a omissã o opera-se de forma reiterada e persistente por parte do Diretor. Isso posto porque
conhecedor das deficiências e detentor de autonomia para reverter nã o todas, mas muitas delas, que sequer existiam
em um mesmo quadro orçamentá rio anterior à sua gesta$o.

A ausência de coordenaçã o adequada, constatada pela omissã o na promoçã o do bem-estar dos dependentes da
MDER e pelos desvios de condutas, ressoa em uma ''falha estrutural'' que está gerando a perpetuaçã o e o agravamento
da situaçã o.

A esta altura, nã o há qualquer medida efetiva para superar este Estado de Inconstitucionalidade. Bem ao revés,
o que se tem sã o justificativas orçamentá rias para esvair-se do cumprimento de uma obrigaçã o legal, a dignidade dos
usuá rios da MDER.

É bom que se esclareça: A reserva do possível nã o é oponível em matéria de mínimo existencial,


especialmente quando no tocante ao direito á vida, garantia que apresenta-se como pressuposto ló gico para todas as
demais resguardadas pela Carta Magna de 1988. Assim, ainda que se reconheça um déficit orçamentá rio, permanece
relevante a omissã o dolosa do Diretor da MDER, pois, como já se disse, principalmente no que toca aos medicamentos,
possuiu, em grande lapso do seu múnus público, autonomia e recursos suficientes, e, ainda assim, nã o conseguiu
reverter o quadro calamitoso do qual é conhecedor.

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Nã o se pode invocar as limitaçõ es orçamentarias como entrave na efetivaçã o dos direitos sociais,
principalmente quando dar-se de forma persistente. Vale dizer, a justificativa financeira nã o pode ser banalizada para
justificar todo o quadro deficitá rio da MDER (estrutura física, ausência de medicamentos e equipamentos e desordem
de pessoal), de sorte a fundamentar a escusa do Diretor Geral em cumprir obrigaçõ es prioritá rias.

Despiciendo relatar, mas de todo o exposto, é notó ria a deficiência de gestã o e a intençã o de acobertá -la
inteiramente sob a justificativa de ausência de recursos. Noutros termos, é bem verdade que o déficit orçamentá rio,
eventualmente, dificulta a conduçã o da máquina pú blica na consecuçã o do interesse coletivo e isto deve ser observado.
Porém, nã o se chancela ao administrador esvair-se de todas as suas responsabilidades e justificar todas as falhas com
espeque neste critério. Falhas pontuais em alguns setores tornaram-se, infelizmente, normais.

Entretanto, quando apresentam-se de forma generalizada, desde a estrutura física, passando pelo setor de
pessoal, medicamentos, equipamentos e por desvios de condutas (já demonstrados), nã o há outra conclusã o se nã o a
desídia administrativa e, muitas vezes, má -fe nos procedimentos licitató rios e no enquadramento de pessoal.

Para agravar, extrai-se do encandeamento fá tico que sã o falhas corolá rias nã o de meras irregularidades, mas
com fincas em condutas voluntá rias e em pleno estado de consciência, vide os atos ilegais citados ao norte no que
concerne ao setor de pessoal. A título ilustrativo da ausência intencional de eficiência, extrai-se da NF à fl.5, que um
enfermeiro efetivo da Maternidade, Tiago de Sousa Macedo, é quem faz contato com os fornecedores.

VII– DA AUTORIA E DA MATERIALIDADE DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

A conduta ímproba foi constatada por meio dos documentos constante nos autos da NF n.
1.27.000.000848/2019-58, cujo conteú do é abrangente e esclarecedor.

No que toca à autoria do presente fato, nã o restam dú vidas de sua centralizaçã o na pessoa do Diretor Geral da
Maternidade Dona Evangelina Rosa, ora requerido. Assim, como gestor do orgã o e, notadamente, dos recursos
repassados, cabia-lhe o dever de boa gestã o e regular prestaçã o de contas, fatores aos quais se furtou, mediante
conduta LIVRE E CONSCIENTE consubstanciando, assim, as condutas ímprobas descritas nos arts. 9, 10 e 11, da Lei nº
8.429/92.

VIII – DOS ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Dessa forma, por todos os fatos descritos, o requerido atentou contra os princípios da Administraçã o
Pú blica, com a clara violação dos deveres de honestidade, imparcialidade, eficiência, legalidade e lealdade,
bem como locupletou-se à s custas do erá rio e contribuiu para que terceiro assim também o fizesse ( sobrinho).
Mais especificamente, o requerido incorreu nas condutas descritas no inciso XI, do art.9º, inciso I, do art.10º e
nos incisos I, II, IV e VI do art.11, ambos da Lei n. 8.429/92, verbis:

Art. 9° Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento


ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em raza$o do

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exercício de cargo, mandato, funça$o, emprego ou atividade nas entidades
mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente:
XI – incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou
valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art.
1° desta lei;

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesã o ao erá rio qualquer
açã o ou omissã o, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriaçã o,
malbaratamento ou dilapidaçã o dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º
desta lei, e notadamente:
I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio partic-
ular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do ac-
ervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei;

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os


princípios da administraça$o publica qualquer aça$o ou omissa$o que viole os
deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade a?s instituiço$es, e
notadamente:
I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele
previsto, na regra de competencia;
II – retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;
IV – negar publicidade aos atos oficiais;
VI – deixar de prestar contas quando esteja obrigado a faze-lo. (grifei)

IX – DAS SANÇÕES

Constatada a prá tica de ato de improbidade pelo requerido, devem incidir as normas legais de penalizaçã o da
conduta ímproba, como decorrência ló gica do comando constitucional (art. 37, § 4º, CF/88), contidas na Lei n.
8.429/92:

Art. 12. Independentemente das sançõ es penais, civis e administrativas, previstas na legislaçã o específica, esta
o responsá vel pelo ato de improbidade sujeito à s seguintes cominaçõ es:

(…)

I – na hipótese do art. 9°, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimô nio, ressarcimento
integral do dano, quando houver, perda da funçã o pú blica, suspensã o dos direitos políticos de oito a dez anos,
pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibiçã o de contratar com o Poder
Pú blico ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de
pessoa jurídica da qual seja só cio majoritá rio, pelo prazo de dez anos;

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II- na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente
ao patrimô nio, se concorrer esta circunstâ ncia, perda da funçã o pú blica, suspensã o dos direitos políticos de cinco a oito
anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibiçã o de contratar com o Poder Pú blico ou
receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa
jurídica da qual seja só cio majoritá rio, pelo prazo de cinco anos;

III – na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da funçã o pú blica, suspensã o
dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneraçã o
percebida pelo agente e proibiçã o de contratar com o Poder Péblico ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou
creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja só cio majoritá rio, pelo
prazo de três anos.

X – DAS PROVAS

Além da prova documental, pretende o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL demonstrar a verdade dos
fatos apontados através de depoimento pessoal do requerido, juntada de novos documentos e tudo mais quanto
se mostre pertinente.

XI-DA NECESSIDADE DE INDISPONIBILIDADE DE BENS

O art. 7º, da Lei nº 8.429/1992, prevê a indisponibilidade dos bens dos indiciados em atos de improbidade
administrativa, nos seguintes termos:

Art. 7o Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar


enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito
representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado.
Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre
bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial
resultante do enriquecimento ilícito.

Consoante ensina a melhor doutrina, a indisponibilidade e o sequestro – termo equívoco empregado pela lei
para denominar uma espécie de arresto com pressuposto específico, pois a medida recai sobre “os bens – isto e, todos
os bens – do agente ou terceiro”, com a finalidade de garantir uma futura execuçã o por quantia certa – de bens,
previstos nos preceitos supramencionados, configuram medidas cautelares autô nomas, apresentando pressupostos
materiais pró prios, que nã o se confundem com aqueles estipulados para as medidas cautelares típicas de arresto e de
sequestro reguladas no Có digo de Processo Civil – CPC.

No caso do sequestro, embora o § 1º do art. 16 determine o processamento da medida de acordo com o


disposto nos arts. 822 e 825, do CPC, o pressuposto material exclusivo para a sua decretaçã o, qual seja a existência de
fundados indícios de responsabilidade, é estabelecido pela Lei de Improbidade.

Portanto, da simples leitura dos dispositivos legais acima transcritos, conclui-se que, ao contrá rio do que se
exige para a decretaçã o daquelas medidas reguladas no CPC, a indisponibilidade e o sequestro disciplinados na Lei de

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Improbidade não reclamam demonstração de fatos indicativos de dilapidação ou ocultação de bens, pois em
relaçã o a essas medidas o periculum in mora é presumido ( Em verdade, trata-se de verdadeira tutela de
evidência), em virtude de peremptó ria disposiçã o constitucional, consubstanciada no art. 37, § 4º, da Carta Magna,
cujo objetivo claro é tornar efetiva a reparaçã o dos danos causados ao patrimô nio pú blico pela improbidade
administrativa, num reconhecimento ostensivo de que a corrupçã o é a grande responsá vel pelas mazelas da sociedade
brasileira.

Assim, a indisponibilidade dispensa essa comprovaçã o, porquanto nã o retira do atingido pela medida a posse
sobre os bens nã o disponibilizados. Na mesma linha, inclusive com decisã o proferida dentro do procedimento de
recursos repetitivos (art. 543-C, do CPC), há o seguinte aresto:

DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. COMPROVAÇAXO DO PERICULUM IN MORA PARA A


DECRETAÇAXO DE INDISPONIBILIDADE DE BENS POR ATO DE IMPROBIDADE. Para a decretação da
indisponibilidade de bens pela prática de ato de improbidade administrativa que tenha causado lesão ao
patrimônio público, não se exige que seu requerente demonstre a ocorrência de periculum in mora.
Nesses casos, a presunçã o quanto à existencia dessa circunstâ ncia milita em favor do requerente da medida
cautelar, estando o periculum in mora implícito no comando normativo descrito no art. 7º da Lei n.
8.429/1992, conforme determinaçã o contida no art. 37, § 4º, da CF. Precedente citado: REsp 1.319.515-ES, DJe
21/9/2012. AgRg no REsp 1.229.942-MT, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 6/12/2012.

Desse modo, a mera demonstraçã o de fundados indícios de responsabilidade é suficiente para a decretaçã o da
indisponibilidade dos bens dos responsá veis, tendo em vista a importâ ncia do bem a ser protegido. É que ao tutelar o
patrimô nio pú blico, a Constituiçã o Federal visa a garantir a satisfaçã o das necessidades bá sicas dos cidadã os.

Outrossim, é consabido que a indisponibilidade deve abranger todos os bens dos requeridos, adquiridos
antes ou após a prática dos atos ímprobos, até o limite do dano causado ao patrimô nio pú blico, ex vi das normas
insertas nos arts. 7º, pará grafo ú nico e 16, § 1º da Lei de Improbidade Administrativa.

A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre bens


[quaisquer bens] que assegurem o integral ressarcimento do dano.

A decretaçã o do sequestro dos bens [isto é, todos os bens] do agente ou


terceiro que tenha enriquecido ilicitamente ou causado dano ao patrimô nio
pú blico da Lei de Improbidade Administrativa.

Diante dos fatos narrados – dilapidação patrimonial em proveito próprio e de outrem-, faz-se necessá rio seja
proferida decisã o liminar concedendo medida cautelar de indisponibilidade de bens, de modo a assegurar o
cumprimento de futura condenaçã o nas sançõ es previstas da Lei nº 8.429/1992.

Conforme demonstrado acima, os atos de improbidade administrativa em questã o afrontaram os princípios


norteadores da administraçã o pú blica bem como vilipendiaram o erá rio. Assim, é mister garantir que, ao final da
presente demanda, sobrevindo condenaçã o pela prá tica de tais atos, o réu possua bens suficientes em seu patrimô nio
para que se efetivem as sançõ es previstas na LIA, sob pena de restar inú til o provimento condenató rio.

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Diante dos fatos narrados e da documentaça$o que acompanha a inicial (NF nº1.27.000.000848/2019-58),
má xime as disposiçõ es do Tribunal de Contas do Estado do Piauí, por intermédio de sua auditoria, que gozam de
presunçã o de legitimidade e veracidade, encontra-se cabalmente demonstrado o fumus boni iuris necessá rio para a
decretaçã o da medida.

Como já dito acima, quanto ao pressuposto do periculum in mora, este é presumido, sendo desnecessá rio a
demonstraçã o de atos concretos e tendentes à dilapidaçã o do patrimô nio pelos demandados para decretaçã o da
medida cautelar de indisponibilidade de bens.

Além disso, ressalte-se ser firme o entendimento do STJ no sentido do alcance da medida de indisponibilidade
a bem de família:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.


IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DECRETO DE INDISPONIBILIDADE. BEM DE FAMÍLIA. POSSIBILIDADE. JURISPRUDÊNCIA DO
STJ.
1. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é assente em admitir a decretação de indisponibilidade prevista
na Lei de Improbidade
Administrativa sobre bem de família. Precedentes: AgInt no REsp
1633282/SC, Segunda Turma, Rel. Ministro Francisco Falcão, DJe 26/06/2017; AgRg no REsp 1483040/SC, Primeira Turma,
Minha Relatoria, DJe 21/09/2015; REsp 1461882/PA, Primeira Turma, Rel.
Ministro Sérgio Kukina, DJe 12/03/2015.
2. Agravo interno não provido.
(AgInt no REsp 1670672/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 30/11/2017, DJe 19/12/2017)

Ante o exposto, faz-se premente seja decretada liminarmente a medida cautelar de indisponibilidade
de bens no montante equivalente à remuneraçã o indevida perfilhada mensalmente multiplicado pelos meses de
recebimento, com vistas à preservaçã o do patrimô nio pú blico e à garantia da efetividade do provimento
jurisdicional, principalmente tendo em conta o seu enriquecimento ilícito às custas do erário (Item IV.C).

XII– DA CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA DE URGÊNCIA DETERMINANDO O AFASTAMENTO


DO ATUAL DIRETOR DA MATERNIDADE DONA EVANGELINA ROSA

As condutas narradas nesta açã o, notadamente em razã o da importâ ncia do Direito Constitucional à Saú de,
trazem à tona a premente necessidade de proteçã o do patrimô nio pú blico do Sistema Ú nico de Saú de, bem como
reestabelecimento da normalidade no aludido orgã o.
É premente a necessidade de realizaçã o de seleçã o objetiva e impessoal para a escolha de novo gestor para a
Maternidade Dona Evangelina Rosa, especialmente em face da, já cabalmente demonstrada, precariedade da prestaçã o
de serviços de saú de, além dos elevados riscos de danos aos munícipes, vez que é uma Maternidade de abrangencia
regional, serviço pú blico essencial que funciona 24 horas por dia.
De toda sorte, nã o obstante seja um cargo em comissã o, tendo em conta os princípios da impessoalidade e
eficiência que regem a Administraçã o Pú blica, mister se faz o afastamento do atual Diretor e, na mesma toada, a feitura

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de um procedimento de escolha pú blico, objetivo e impessoal, apto a selecionar um gestor técnico e com aptidã o para o
cargo.

Há necessidade de uma qualificaçã o técnica mínima para o exercício do cargo comissionado. Tal exegese é
fruto do princípio da Razoabilidade. Ora bem, se é necessá rio a um funcioná rio efetivo, concursado, provar que é capaz,
tanto para conseguir entrar no serviço pú blico quando para progredir na carreira, por que que alguém que nã o
ingressa por mérito cognitivo, mas tã o somente por indicaçã o, deve ser dispensado de demonstrar qualificaçõ es
profissionais para o cargo ao qual foi agraciado?

Dito isto, a consequência, na toada específica, é a apropriaçã o patrimonial dos postos de trabalho, com elevado
grau de politizaçã o da administraçã o pú blica: a) ausência de avaliaçã o de desempenho do gestor maior b) inexistência
de controle interno eficiente c) servidores em desvio de funçã o d) ausência de metas funcionais e) carência de um
sistema de capacitaçã o. Em outros termos, imensurá vel falência administrativa.

O art. 300 do CPC trata da concessã o da tutela antecipada de urgência:

“Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a
probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

§ 1 o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou
fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser
dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.

§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.

§ 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de
irreversibilidade dos efeitos da decisão.”

No caso concreto, a probabilidade do direito relativa à necessidade de afastamento da atual direçã o da MDER
restou evidenciada pelos fundamentos de fato e de direito ja exarados nesta exordial que apontam atos de
improbidade, envolvendo nã o apenas insubmissã o aos princípios do Estado Democrá tico de Direito, como também
enriquecimento ilícito. In casu, pode-se alinhar os seguintes parâ metros para preencher o periculum in mora:
I- Recalcitrâ ncia de tal gestor em nã o cumprir as recomendaçõ es expedidas pelo Ministerio Pú blico
Estadual e determinaçõ es do Tribunal de Contas do Estado do Piauí, em patente demonstraçã o de ineficiência e
descaso na conduçã o do nosocomio. Fatos comprobató rios sã o as intervençõ es postas a termo pelo Conselho Regional
de Medicina, ante a situaçã o caó tico ali presente.

Nesse contexto, decorridos mais de dois anos de gestão, o quadro está ainda mais degradante. O atual Diretor
foi alertado das mais diversas maneiras (Parquet e Tribunal de Contas) e persiste no mesmo quadro e com pioras. Nã o
nos deixa faltar com a verdade os supracitados atos arbitrá rios de enriquecimento ilícito.

Permitir a continuidade da atual gestã o e tornar perene o desmazelo administrativo é compactuar com a
derrocada da saú de no Estado do Piauí.

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II- Evitar que, no exercício de suas funçõ es, possa encontrar facilidades e motivos que o leve a desfalcar
novamente o patrimô nio pú blico.
De acordo com os ensinamentos de Fá bio Medina Osó rio (apud GARCIA; ALVES: 2013, p. 1004), é possível o
afastamento cautelar para atender tal hipó tese, uma vez que a expressã o processual deverá ser interpretada no
má ximo rigor, e que ficando em seu cargo, o agente ímprobo poderá acarretar novos danos ao Ente Pú blico e à
sociedade.

Com efeito, o periculum in mora justifica-se pela necessidade do resguardo dos cofres pú blicos de forma
emergencial e transitó ria, garantindo a Ordem Pú blica e impedindo a continuidade dos atos lesivos. Resta fundado
nessa hipó tese, o receio de dano potencial irrepará vel ao erá rio.

É urgente que a MDER funcione em seu plenitude e dê o retorno esperado para a sociedade. O
periculum in mora milita a favor a sociedade ( ''pro societate'' ). Senão vejamos:

O risco e ínsito à precá ria situaçã o em que vem sendo prestado o serviço de saú de no referido nosocô mio, com
taxa de mortalidade que já ultrapassa 3 (três) vezes a média nacional. Somente no mês de abril de 2018, do dia 1 ao dia
23, foram registrados 23 ó bitos na maternidade, um por dia. O contexto é alarmante e a atual gestã o demonstrou, de
forma hialina, nã o somente ineficiência em superá -lo, como concorrer para sua permanência.

A jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Regiã o, seguindo a linha de entendimento dos demais
regionais e do STJ, entende como possível o afastamento do gestor no intuito de garantir a prestaçã o adequada de
serviço pú blico essencial:

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA- PRESENÇA DE FORTES INDIJCIOS - AFASTAMENTO


DO CARGO - ARTIGO 20 DA LEI 8.429/92 - EFETIVIDADE DA PRESTAÇÃ O
JURISDICIONAL - PODER GERAL DE CAUTELA – INTERPRETAÇAXO SISTEMAJTICA -
VEROSSIMILHANÇA DO PEDIDO - 1- O afastamento de agente público do exercício
do cargo é medida requerida pelos princípios da efetividade da prestação
jurisdicional e do poder geral de cautela diante de quadro fático que aponta para
a verossimilhança do pedido de proteção do serviço público, medida ainda mais
necessária quando tomada para evitar o prosseguimento da prática de atos que
prejudicam a boa prestação de serviço essencial à sociedade. 2- Interpretação
sistemática dos princípios da efetividade da jurisdição, do poder geral de cautela e
do art. 20 da Lei de Improbidade Administrativa. 3 - Agravo provido. (TRF-4ª R. - AI
2008.04.00.046088-5/RS – Rel. Juiz Roger Raupp Rios - DJe 13.05.2009 - p. 277)
(grifouse)

Excelência, data vênia, os infantes que estã o à deriva na MDER nã o possuem uma segunda oportunidade de
viver. A vida é apenas uma passagem, nã o devemos temer nem fugir. É uma só para se dar ao capricho de nã o cuidá -la.
Dito isto, indago: É razoá vel conceder novas oportunidades ao atual Diretor se a mesma prerrogativa nã o é dada aos
filhos das gestantes, cujas vidas, com altos índices bioló gicos de probabilidade, sã o ceifadas?Parece-me paradoxal.

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Daniel Sarmento9, em sua erudita obra intitulada “A Ponderaçã o de Interesses na Constituiçã o”, assevera que:

“Na verdade, o princípio da dignidade da pessoa humana exprime, em termos


jurídicos, a máxima Kantiana, segundo a qual 'o Homem deve ser tratado como
um fim em si mesmo e nunca como um meio'. O ser humano precede o
Direito e o Estado, que apenas se justificam em razão dele. Nesse sentido, a
pessoa humana deve ser concebida e tratada como valor fonte do ordenamento
jurídico, como assevera Miguel Reale, sendo a defesa e promoção de sua
dignidade, em todas as suas dimensões, a tarefa primordial do Estado
Democrático de Direito.” (grifou-se)

Prescindível relatar, mas os dados demonstrativos do periculum in mora sã o autoexplicativos ante ao


exponencial aumento da MORTALIDADE INFANTIL:

O referido pedido de afastamento encontra guarida no art. 20, parágrafo único, da Lei nº 8.429/92 (Lei
da Improbidade Administrativa), o qual estabelece:

“Pará grafo ú nico. A autoridade judicial ou administrativa competente poderá


determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego
ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer
necessária à instrução processual. (grifou-se)

97SARMENTO, Daniel. A ponderaça$o de Interesses na Constituiça$o Federal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, pp 98/99.

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XII– DOS PEDIDOS

Em conclusã o, requer o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL:

1) a decretação liminar de indisponibilidades de bens pertencentes ao requerido, por meio do


Sistema BACENJUD, até o limite do enriquecimento ilícito, nos termos dos artigos 7º e 16º, da Lei nº
8.429/1992, bem como o seu afastamento cautelar, como medidas indispensá veis a garantir o sucesso da
açã o principal já em curso e a incolumidade do erá rio.

2) A notificação do requerido para manifestar-se nos termos do art. 17, §7º, da Lei n. 8.429/92 e,

recebida a inicial, seja citado para contestar a açã o, nos termos do §9º do mesmo dispositivo legal;

3) Ao final, seja a presente ação julgada procedente para condenaçã o nas sançõ es previstas no artigo
12, incisos I e III da Lei de Improbidade Administrativa.

Dá -se à causa o valor de R$ 1.000,00

Teresina/PI, 28 de Janeiro de 2020

KELSTON PINHEIRO LAGES


Procurador da República

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